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AÇÕES SUPERVISORAS E ORIENTADORAS NO

AMBIENTE ESCOLAR

1
Sumário
NOSSA HISTÓRIA ............................................................................................. 2

GESTÃO PEDAGÓGICA DE SISTEMAS DE ENSINO ...................................... 3

UM DIRIGENTE NÃO É UM PROFESSOR ....................................................... 3


DIRIGENTE TEM PODER.................................................................................. 7
DESENVOLVIMENTO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO ..................... 11
QUEM CUIDA DAS CER: SECRETARIA OU ESCOLA? ................................. 16
GESTOR TAMBÉM PRECISA DE CER ........................................................... 20
TRATANDO AS DESIGUALDADES ................................................................ 25
GESTÃO ESCOLAR DEMOCRÁTICA: APONTAMENTOS SOBRE OS
PRINCÍPIOS E AS FUNÇÕES DE ORGANIZAÇÃO ........................................ 30
REFERENCIAS ................................................................................................ 36

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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GESTÃO PEDAGÓGICA DE SISTEMAS DE ENSINO
UM DIRIGENTE NÃO É UM PROFESSOR

Todas as vezes que participei de encontros para dirigentes municipais de


educação, observei que alguns confundiam o papel do dirigente com o de
professor. Talvez fosse porque quase todos, dirigentes, gestores e consultores,
foram ou ainda são professores. É bom que o dirigente, e quem lhe fala, saibam
tudo sobre o trabalho do professor, que é o centro da educação escolar. Mas o
dirigente precisa colocar-se em seu papel, que é bem diferente do de professor.
Tratar com indiferença não convém. Parece coisa simples e não, falta de
conhecimento. Todos sabem bem o que é um professor, e também que o
dirigente não atua como professor. Então, por que a confusão? Qual o problema?

Por ser um conceito bem conhecido, e mesmo assim com frequência


apresentar-se confuso, pode-se imaginar que as raízes são profundas, que
produzem consequências em longo prazo. Isso justifica nossa atenção. A
confusão pode ser vista tanto entre os dirigentes, em suas falas, e nos trabalhos
que apresentam, como nos consultores que fazem palestras para eles. Os
consultores dizem coisas como: “Isso não é nenhuma crítica a nós professores...”

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(20º Fórum da Undime-MG, 12/04/2007, B. Horizonte), esquecendo-se que são
e não estão falando com professores. Ou, como num caso em que a consultora
referia-se a estudantes com problemas de aprendizagem e que já eram
repetentes: “Você reza para ele não ir e ele é o primeiro a chegar!” (idem –
mesmo fórum e dia da citação anterior). Ela fazia uma brincadeira, e referia-se à
situação do professor, que tem dificuldades para lidar com as diferenças. Está
claro que grande parte dos problemas da educação passa pela situação de aula,
na qual estão envolvidos professor e estudantes. Mas é preciso focalizar melhor.
Qual o papel do dirigente nessas situações? O que ele pode fazer? E, como bem
fazer seu trabalho? O que se espera dos gestores da educação?

Nos encontros do Pradime (Programa do Ministério da Educação para


apoio aos dirigentes municipais de educação – http://pradime.mec.gov.br/ ) a
confusão entre dirigente e professor também acontecia. Coordenei os encontros
do Pradime para municípios das regiões sudeste e sul. Realizamos muitos
encontros de formação e estivemos com os dirigentes de mais de mil municípios.
Quando solicitávamos que o dirigente mencionasse ações, que ele mesmo
pudesse realizar, para estruturar sua Secretaria, tendo em vista problemas de
gestão, apareciam expressões que deixavam perceber que o foco estava no
professor. Sempre havia alguns que apontavam a “falta de comprometimento
dos professores” ou “dos profissionais da educação”. E não se mostravam como
quem está numa posição que pode desenvolver ações para alterar essa
realidade. O aparente “beco sem saída” deve-se ao fato de colocarem-se na
expectativa de que o outro mude, no lugar de se questionarem: o que o dirigente
da educação pode fazer para mudar essa situação? Ou, que fatores colaboram
para que essa situação exista, e que fatores podem colaborar para evitá-la?

Também quando atuei como professor no curso Gestão Escolar e


Tecnologias (Almeida, 2006; Vallin e Rubim, 2007), ou no curso Escola de
Gestores, do MEC (Vallin, 2007), os gestores de escolas básicas
frequentemente mostravam colocar-se no papel do professor, e não em seu
papel de diretor.

Esses fatos justificam que é preciso construir uma melhor compreensão


do papel do dirigente e dos gestores de todos os níveis que compõem a rede de
ensino.

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A complexidade do papel. Qualquer trabalho, papel, ou responsabilidade,
pode ser visto dentro de certa mobilidade e liberdade, mas em especial os mais
complexos e desafiantes irão exigir mais de cada um e de nós mesmos. Nessa
definição de papel nem sempre o que se espera de nós está claro para os outros.
Nem mesmo o Prefeito, diplomado pelo povo e que delegou autoridade aos
Secretários, tem facilidade para explicar completamente o papel do dirigente da
educação. Hoje, e cada vez mais, as instituições e os trabalhos estão envolvidos
em situações novas e as soluções para os problemas nem sempre estão dadas
em algum manual de conhecimento. Com muita razão, a gestão da educação
deve ser vista como um grande desafio.

Um dirigente precisa saber explorar as leis, precisa ser capaz de aprender


sobre elas, criar oportunidades de discussão, e colaborar para que seus pares
aprendam com ele. Precisa também aprender, desenvolver-se, e ensinar
técnicas de administração, com o uso de TICs (Tecnologias de Informação e
Comunicação) inclusive. Deve aprender, desenvolver-se, e ensinar sobre
controles financeiros. O mesmo sobre pedagogia. Muitas são as áreas de
conhecimento envolvidas nessa função. Nas publicações Pradime de 2006 em
vários dos nove temas aparecem descrições e análises sobre as funções do
dirigente municipal de educação, mas em especial no texto 2 (Sari et al, 2006, p.
122) pode-se encontrar a descrição e classificação dessas funções.

Por outro lado, cada vez menos é suficiente ser um dirigente técnico
compreendido como aquele que sabe e aplica o conhecimento estabelecido nas
universidades e publicações, e dentro do que é esperado pelas pessoas e pelo
sistema. Cada vez mais se espera que o dirigente tenha um lado político e
estratégico, sendo criativo e tendo iniciativa, dialogando com a comunidade do
município, investigando e bem interpretando a alma da comunidade.

Por isso, não basta conhecer o que se define como papel do dirigente de
educação e sobre como fazer esse trabalho. O melhor é trabalhar descobrindo
e (re)inventando esse papel e educando quem estiver por perto para
compreendê-lo. Esse é um aspecto estratégico e importante.

Nessa busca pelos limites e possibilidades do papel, não basta fazer o


melhor. A comunidade do município também precisa entender assim. Primeiro,

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porque quando ninguém nos entende, não há colaboração e até há os que
trabalham contra. E isso leva tudo a perder. Então, é preciso trabalhar também
na educação dos que estão por perto, para que nos entendam e avancem junto.
Depois, porque muitas vezes não estamos no melhor caminho. Escutar e
examinar as discordâncias sempre pode ser uma boa estratégia. Ajuda-nos a
perceber problemas e aprender coisas que nos farão melhorar.

É preciso tatear os limites dessa identidade, desse papel que vai sendo
construído na ação. Isso sempre deverá ser feito com diálogo e com
negociações. Quando as relações com a população ou com profissionais da
educação ficarem tensas, pode-se ter certeza de que há algo em nós mesmos
que pode colaborar para melhorar a situação.

Dessa forma o estabelecimento de novos limites do trabalho e do papel


do dirigente acontecerá na ação, com o fazer do que é preciso ser feito.
Primeiramente pode-se fazer o que for possível, dentro da visão que se tem, sem
grandes questionamentos. Resolver a situação usando os próprios
conhecimentos, habilidades, sensibilidade e intuição. Estando já em ação haverá
oportunidade para se pensar nos limites do papel, das responsabilidades, dos
conhecimentos, das análises, e da organização e assim re-inventar a prática,
sistematicamente.

As carências. A situação de carência é relatada e marcada com frequência


pelas pessoas que estão em cargos de gestão (dirigentes, supervisores,
diretores de escola etc.). O que muitas vezes se expressa é uma atitude de
passividade e conformismo, acompanhada de queixas de vários tipos, que
justificariam a impossibilidade de transformação do sistema de ensino e seus
elementos. (Vallin, 2004, pp. 86 a 91).

Tendo iniciado a atuação como dirigente ou gestor com certo entusiasmo,


depois da tomada de conhecimento da situação, uma das primeiras questões
que surgem é: como aumentar os recursos financeiros? Ou, como é possível
trabalhar os graves problemas da educação diante da carência e falta de
recursos do sistema de ensino e das escolas?

É importante começar por ai. Se não forem resolvidas essas questões


elas poderão paralisar o restante dos pensamentos e ações. Carências existem.

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Disso ninguém tem dúvida. Os recursos são limitados e não dão conta de todas
as demandas e necessidades. Mas, isso é o trivial. Dizer só isso seria uma
grande inocência. Trazendo o foco para o papel do dirigente, talvez o melhor
fosse um autoquestionamento: o que pode fazer um dirigente diante disso? Ou
então a questão: o que podemos fazer de melhor com os recursos, legislação,
pessoal e situação que temos?

No primeiro momento o dirigente pode aceitar a situação (recursos


financeiros, legislação, e pessoal) e passar a trabalhar com o que tem e com o
que existe. Isso não impedirá que, paralelamente, e também mais para frente,
ele lute para conseguir mais dinheiro para a educação, ou mudanças na
legislação, ou substituição de algumas pessoas. O dirigente pode atuar em duas
frentes. Uma delas é na sociedade, de maneira geral, na luta para que os
recursos destinados à educação sejam ampliados, sejam maiores. A outra frente
de luta é o estabelecimento de parcerias, e a busca de programas, de projetos,
de financiamentos, além dos que já dispõe. Essas duas frentes podem ser
trabalhadas. Mas é importante que a espera do aumento dos recursos, ou a
espera de novos recursos, não paralise a gestão. A gestão, portanto, pode lutar
pelo aumento dos recursos, mas não deve estar vinculada a isso. Quem estiver
no papel de dirigente precisa sentir-se confortável para fazer uma gestão dentro
do que existe hoje. Mesmo que se dedique paralelamente à luta para mudar tal
situação.

No âmbito interno, a boa gestão fará diminuir os possíveis desperdícios e


maus usos. Mesmo em condições de carência, os recursos (financeiros, prédios,
mobiliário...) serão mais bem aproveitados, direcionados para as principais
prioridades, minimizando os problemas mais graves e tornando as ações mais
efetivas. É preciso entender e acreditar que uma boa gestão pode modificar
grandemente os resultados da educação.

DIRIGENTE TEM PODER

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Então, depois de delimitado e equacionado o problema das carências, que
foco dar à gestão da educação? Por onde começar?

O foco central da educação é o ensino e a aprendizagem, que acontece


em vários locais e ambientes, mas principalmente em aula, nas relações entre
professor e estudantes. Mas antes de pensar diretamente nos resultados de
aprendizagem dos estudantes e na operacionalidade da gestão pedagógica, é
preciso acreditar na gestão, no âmbito do município e na posição do dirigente. A
maneira como o dirigente atua, tem uma grande influência em todas as demais
ações, situações e resultados da educação. É verdade que o dirigente não
resolve nem muda nada sozinho, mas é também verdade que sua atitude e
ações podem colaborar muito, ou atrapalhar muito.

Um fato real que mostra quanto uma boa gestão faz diferença pode ser
visto numa publicação sobre a educação no município de Sobral, no Ceará.

[...] dispondo apenas dos recursos financeiros ordinários alocados pelo


município para a educação, sem fugir à condição de dificuldades e de carências
com que se defronta a maior parte dos municípios brasileiros (p. 12) [...] na
gestão municipal de 2001-2004, Sobral conseguiu resultados que indicam uma

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grande melhoria na qualidade da educação do município A rede municipal de
educação multiplicou por, pelo menos, dois, sua capacidade de fazer com que
as crianças das séries iniciais do ensino fundamental aprendam a ler e escrever
(INEP/MEC, 2005, p. 16).

A experiência de Sobral foi um exemplo de boa gestão municipal da


educação como tantos outros que existem pelo Brasil. Exemplos sobre como a
gestão pode fazer a diferença podem ser vistos no Laboratório de Experiências
Inovadoras em Gestão Educacional (http://www.inep.gov.br/laboratorio/). Uma
equipe de pessoas trabalha com o objetivo de reconhecer os municípios e
dirigentes que têm iniciativas inovadoras que contribuam para o alcance dos
objetivos e metas do Plano Nacional de Educação, bem como mobilizá-los para
organizar relatos sobre sua prática, e dar apoio para que suas experiências
sejam publicadas. Mais de duzentos dirigentes municipais apresentaram
experiências em 2006, das quais vinte foram selecionadas para publicação.

O papel do dirigente municipal de educação deverá aliar conhecimento,


dedicação e habilidade para o trato com as pessoas. Dados os mesmos recursos
e as mesmas condições (físicas, históricas e culturais) a maneira como
acontecerá a gestão pode levar a resultados muito diferentes.

O dirigente de educação, acima de tudo, deve estar aberto a novas


aprendizagens. Mas conhecimentos não bastam. É preciso aliá-los à gerência
de conflitos pessoais e institucionais, com postura inclusiva e de liderança
democrática, para unir forças e conseguir uma sinergia, maximizando o
aproveitamento das habilidades, talentos e vontades das pessoas. Começando
pelas pessoas mais diretamente envolvidas com o dirigente, ele pode deflagrar
a criação de uma rede humana de colaboração, que irá se fortalecendo como
liderança democrática, e que sustentará o trabalho com diálogo, planejamento,
ações coordenadas, avaliações e realimentações de planejamento.

Desse modo, quem assume a gestão da educação municipal precisa


construir-se como um líder.

Não se trata do líder como é visto no meio empresarial. Não cabe aqui
nenhuma crítica às lideranças das instituições privadas, que visam o lucro, mas,
tratando-se da esfera pública, deseja-se que a palavra líder, e liderança,

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signifiquem o papel de quem dá vida ao coletivo, colocando-se como servidor da
coletividade, colaborando para que todos cresçam em resultado e em
autonomia, cada um a seu modo, respeitando as diferenças, potenciais e
preferências. Só uma liderança democrática fará sentido ao papel do dirigente
da educação pública.

Uma boa gestão pode ajudar a germinar e florescer sementes que já


existem e que podem estar adormecidas e até abafadas. A atitude do dirigente
da educação desafiando, apoiando e organizando talentos, e a relação de
respeito e participação entre sua pessoa e outras pessoas envolvidas, poderá
criar uma empatia e boa vontade, de forma que as energias existentes se
realimentem e se multipliquem. Ou, o contrário. Todos podem assumir posições
individualistas, e até atuarem como opositores do dirigente e do sistema.

Somente uma liderança democrática é capaz de dialogar com todas as


pessoas envolvidas, e estabelecer com elas os melhores caminhos e opções.
Somente a gestão democrática pode desenvolver a verdadeira liderança, cuja
autoridade é sólida, baseada em laços de confiança e competência. O dirigente
precisa trabalhar para isso e assumir esse papel de liderança.

Convicto destas ideias e pensando na ação, por onde começar a gerência


de talentos? Talvez a pergunta que melhor oriente nessa hora seja: quais são as
pessoas diretamente envolvidas com o dirigente da educação de um município?
São aquelas que trabalham na SME (Secretaria Municipal de Educação, ou
órgão correspondente), tanto os mais administrativos, quanto os mais
pedagógicos e os mais operacionais, mas também as ‘equipes gestoras’ das
UEs (Unidades Escolares e outras instituições da educação), além de outras
lideranças naturais do município, interessadas na educação. Assim, o dirigente
deve cuidar e dar atenção primeiramente a estas pessoas.

O dirigente municipal pode dedicar-se a construir e cuidar de espaços de


diálogo com e entre essas pessoas. Alguns espaços são coletivos. Neles
acontece o estudo coletivo, o planejamento coletivo e a reflexão coletiva. Estes
são naturalmente alimentados por momentos e trabalhos individuais. Outros
diálogos funcionam melhor em espaços reservados.

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É o caso da gestão de conflitos, e da preparação e articulação de pautas
e objetos para os momentos coletivos, entre outros. Essa lógica do diálogo
coletivo é algo semelhante ao que acontece num ambiente de escola, tão
conhecido da maior parte dos dirigentes. A diferença está nos focos e nos atores,
que são o pessoal de apoio (pedagógico e administrativo) da Secretaria ;
gestores das instituições escolares ; pessoal do Conselho Municipal de
Educação ; representantes de Conselhos Escolares ; e outras lideranças
interessadas na educação no município.

Muitas vezes o coletivo ainda nem existe. Existem as pessoas, os cargos,


os lugares e momentos, mas não existem articulações e relacionamentos
pessoais com qualidade suficiente para que as pessoas sintam-se como parte
de um mesmo movimento. A experiência do Projeto CER mostrou bem que é
possível articular um sentimento de coletivo e que isso faz brotar talentos e
energias que antes pareciam inexistir (Vallin, 2004, p. 180). Não é verdade que
as pessoas sejam só egoístas e individualistas. As pessoas gostam de
pertencerem a um movimento organizado e que evolui, principalmente quando
sentem que têm um lugar seu nesse coletivo e que suas energias são bem
aproveitadas.

DESENVOLVIMENTO DOS PROFISSIONAIS DA


EDUCAÇÃO

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Agora podemos voltar àquele primeiro problema que sempre é citado: a
falta de comprometimento dos professores ou, de uma maneira mais ampla, dos
profissionais de educação, a falta de motivação, o desânimo, as faltas
excessivas, a falta de empenho e de prazer no trabalho. Primeiro, é importante
observar que isso não é geral. Há muita gente trabalhando com prazer na
educação e, apesar das carências (Vallin, 2004, pp. 86 a 91), a maioria
apresenta-se comprometida e responsável. Mesmo assim, pode-se estudar o
que colabora para que haja mais entusiasmo, prazer e comprometimento. Deve-
se questionar e investigar: que condições podem estar faltando a esses
profissionais para que façam um bom trabalho? E nessa questão, entre outras
coisas, é importante que se escute os próprios trabalhadores. Mas é preciso que
todos se aprofundem e se envolvam com tais questões. A reflexão sistemática

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sobre o que acontece nas ações práticas da escola, e a construção de novos
planos de ação que serão colocados em prática, farão com que as pessoas
desenvolvam suas competências, bem como consigam melhorar os resultados.

O trabalhador da educação (professor e outros) que tem a oportunidade


de melhorar sua prática participando ativamente dos estudos, discussões e
replanejamentos, assume seu papel de sujeito, e trabalha com mais prazer e
comprometimento. A reflexão e a ação se impõem, quando não se pretende,
erroneamente, dicotomizar o conteúdo da forma histórica de ser do homem
(Freire, 1987, p. 52). Pensando sobre o agir, fazendo novos planos, e agindo
conforme o planejado abre-se um caminho sem fim de melhorias e de prazer no
trabalho. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode
melhorar a próxima prática (Freire, 1996, p. 43 e 44). As pessoas (professores e
outros) normalmente não sabem que são capazes de construir teorias tão
valiosas quanto qualquer outra. Mas “ao alcançarem, na reflexão e na ação
comum, este saber da realidade, se descobrem como seus refazedores
permanentes” (Freire, 1987, p. 56)

A espiral da aprendizagem (Valente, 2002) ajuda a compreender o ciclo


reflexão-ação-reflexão. Dentro da reflexão estão a avaliação sistemática dos
resultados das ações práticas (em aulas e outros espaços com estudantes), os
estudos teóricos relacionados aos problemas práticos emergentes, e o
planejamento que é a construção de planos sobre o que será feito nas próximas
ações práticas. O desenho é uma espiral porque são ciclos que crescem sempre,
que se ampliam. A reflexão acontece de várias formas, em momentos de
discussão (no coletivo), em momentos individuais de estudo, também acontecem
reflexões durante as ações concretas (a aula ou outras situações da escola), e
durante o planejamento das futuras ações. Na representação foi incluída a
avaliação, para frisar que deverá haver energias (momentos, pessoas, ações,
recursos etc.) dedicadas especialmente à avaliação dos resultados (de
aprendizagens por estudantes). O planejamento deve ali ser visto como uma
preparação para a ação concreta e não como uma atividade burocrática, feita
para “inglês ver”. Os momentos coletivos de reflexão (avaliação, estudo,
planejamento) podem ser chamados de ‘educação permanente’ ou ‘formação
continuada e em serviço’. Espera-se que todos os trabalhadores da educação

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participem permanentemente, e com continuidade, de grupos de estudos, e que
esses estudos sejam iluminados por teorias e relacionados com a resolução de
problemas emergentes e práticos (Freire, 1996).

Essas ideias são bem aceitas em todos os cantos da educação, mas são
poucos os lugares em que se conseguiu fazer funcionar bem a ‘educação
permanente’. Afirmo isso baseando-me em observações que fiz em mais de dez
anos de trabalho com escolas, públicas e privadas, em mais de dez estados
brasileiros, em muitos municípios em que tive oportunidade de trabalhar. Em
minha tese podem ser vistas maiores informações e justificativas sobre “porque
o horário pedagógico funciona mal” (Vallin, 2004, p.117 ). Em alguns lugares a
dificuldade apontada é a falta de tempos institucionais que possam ser
dedicados à reflexão coletiva. Em outros, existem tempos institucionais
reservados para a reflexão, mas o coletivo não consegue se organizar, ou
aqueles tempos são consumidos com atividades operacionais. Quase sempre os
trabalhadores de educação (professores e outros) mostram-se carentes de
momentos e situações em que possam compartilhar suas ideias e problemas,
bem como conhecer as experiências dos colegas e desenhar planos conjuntos.
Sentem falta de algo que sustente o trabalho colaborativo e coletivo. Dai a
questão - como fazer para que os trabalhadores da escola operem de forma
coletiva e crítica, e se fortaleçam na condição de sujeito histórico (aquele que
participa ativamente da construção de sua história)?

O pessoal da Secretaria de Educação pode dar apoio à organização da


educação permanente na escola. Mas não pode ser um apoio que crie
dependência, não um apoio que tenha a pretensão de resolver certos problemas,
mas um apoio no sentido de criar um movimento próprio, ajudar a criar uma
personalidade do coletivo, criar uma unidade do coletivo de profissionais da
escola. A questão que se coloca nessa situação é: como desenvolver nas
escolas a competência para fazer a gestão da educação permanente de seus
profissionais? O Projeto CER (Vallin, 2004) foi uma pesquisa-ação nesse campo
e pode ser tomado como exemplo. Foi uma experiência com escolas públicas
(estaduais em SP), que apresentavam todo tipo de carência, das que
normalmente são encontradas na realidade brasileira, sem nenhuma condição
especial, a menos da aceitação que as pessoas tiveram para participar, e com

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isso organizar o coletivo em busca de melhorias. Foram conseguidos bons
resultados devido ao empenho de muitas pessoas, em longo prazo (3 anos) e a
“duras penas”. Os resultados observados foram: (1) foi dedicado mais tempo
para a educação continuada de professores, e por isso as ações em aula foram
mais planejadas; (2) os momentos de educação continuada de professores
foram mais bem planejados e refletidos, com pessoas das três escolas em
conjunto, e em parceria com o pesquisador; (3) foram criadas condições para
que professor assumisse melhor o papel de sujeito, porque ele apresentava sua
prática pedagógica, seus planos, seus desafios ou suas descobertas para o
coletivo de educadores, e porque era autor de suas propostas; (4) foram criadas
condições para construção de conhecimento sobre a docência (isso acontecia
quando o professor podia aprender com a prática de seus colegas, além da
leitura de artigos de autores reconhecidos; (5)as leituras e momentos mais
teóricos foram mais contextualizados e desmitificados; a educação continuada
de professores desenvolveu-se de forma integrada com a organização escolar;
(6) os estudos e discussões de teorias pedagógicas aconteceram de forma
integrada com as discussões disciplinares específicas.

Enfim, percebeu-se, pela experimentação prática, que é possível construir


uma escola mais cidadã, dentro das condições normais existentes em escolas
públicas. Isso trouxe grande satisfação aos profissionais das escolas que
participaram. Aquela experiência mostra caminhos que são possíveis de serem
trilhados. As conclusões do Projeto CER apontam conhecimentos (quatorze
ideias) que foram aprendidos e podem servir de base para outras situações
(Vallin, 2004, p. 191). A ideia de espiral da aprendizagem (figura 1) orientou a
criação e a sustentação dos grupos de educação permanente ou das CER
(Comunidades escolares de Estudo, planejamento, avaliação e Reflexão sobre
a prática). Essas ideias colaboram para que se tenha uma continuidade entre:
(1) os sonhos, planos e os momentos de planejamento coletivo, (2) a ação
prática propriamente dita e (3) a reflexão sobre a ação, com análise, avaliação
(de resultados na aprendizagem dos estudantes), e comparação de resultados
obtidos com os desejados.

Educação permanente poderia ser entendida como algo que se faz de


forma diretiva, em que há uma programação de conteúdos a serem aprendidos,

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são passadas informações e desenvolvidas dinâmicas pedagógicas, de forma
que todos venham a apresentar os conhecimentos pré-estabelecidos, como
acontece tradicionalmente nas escolas superiores de graduação ou de pós, para
professores e gestores da educação. Mas para desenvolver a autonomia e a
crítica de cada trabalhador e do coletivo (Freire, 1996) é preciso tratar os
educadores como sujeitos históricos, e por isso analisar sua situação prática de
trabalho e agir para transformá-la, conforme seus sonhos e crenças. Assim, o
educador elege problemas a serem estudados, e cujos elementos e relações
serão mais bem conhecidos. Para que exista uma comunidade (ou grupo), será
preciso que as pessoas se disponham a conhecer os dilemas umas das outras,
estabelecendo pontos em comum e colocando-se de forma solidária, estudando
e planejando juntas.

É comum que existam nas escolas momentos chamados de planejamento


que ocorrem de forma pontual, e desligados do que realmente irá acontecer nas
ações em aula e em outros espaços de educação. Assim, na espiral da
aprendizagem (figura 1) o planejamento deve ser entendido como algo diferente
disso. Deseja-se que os momentos de planejamento sejam sistemáticos e
frequentes, distribuídos ao longo do ano com regularidade, e representem
verdadeiramente a construção de planos que serão levados à prática.

Há um conhecimento importante na criação e manutenção desses grupos.


O coletivo não se organiza por si só. As CER não se formam de maneira
espontânea. Ao contrário, mesmo reservando certos horários para que um grupo
de trabalhadores se reúna para estudar, não será fácil que eles sintam-se e
operem como grupo ou comunidade. Marisa Garcia, em sua tese de doutorado
analisa o que acontece no horário pedagógico de uma escola pública durante
aproximadamente 1 ano (Garcia, 2003). É preciso haver um movimento de
gestão democrática para organizar o coletivo. Será necessário um sistemático e
competente esforço de gestão democrática. E isso poderá ser feito por uma
pessoa ou por uma equipe gestora.

QUEM CUIDA DAS CER: SECRETARIA OU ESCOLA?

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Quem fará a gestão da educação permanente dos professores e outros
que trabalham na escola?

Existirão vários grupos, na organização da educação permanente dos


profissionais de educação de uma escola, e mais ainda no município. Por isso
pode-se pensar em uma rede de pessoas em posição de gestão. Não se trata
de uma rede de hierarquia, mas de uma rede de ajuda, uma rede de gestão
democrática, que (1) assegure a existência e bom funcionamento dos grupos;
(2) cuide para que todos tenham voz e participação; (3) para que exista liberdade
para a diversidade e para as diferenças; (4) mas que se preocupe também com
a existência de uma unidade, formada pela composição das várias partes, que
se conhecem e que conversam entre si.

Não é uma diversidade individualista, em que cada um só sabe de si e


ninguém se importa com os outros. Está ideia constitui o centro do conceito e
também da operacionalidade da gestão pedagógica da rede escolar do
município.

Neste ponto nos deparamos com uma grande dúvida. Quem deve cuidar
da educação permanente: o pessoal de apoio da Secretaria de Educação?
Empresas especializadas? ONGs? Consultores contratados para isso? Ou, a
educação permanente do professor (e demais trabalhadores da educação) deve
ser gerida internamente às escolas? Talvez a melhor resposta seja: as duas
coisas juntas, ou, nem só uma, nem só outra. O pessoal da Secretaria Municipal
de Educação, o pessoal de apoio, visita as várias escolas e trabalha para que
exista certa unidade interescolar, para que a educação do município seja
cuidada. Cuidada quer dizer o seguinte: que exista uma estrutura de encontros
com ações, espaços e tempos reservados para isso, além de pessoas que
cuidem (que ajudem, que colaborem) para a educação permanente dos que
trabalham na escola. Se for assim, será natural que, nas escolas e nos lugares
onde houver maiores dificuldades, haverá mais ajuda do pessoal da Secretaria
de Educação. Quando não houver grandes dificuldades, o papel do pessoal da
Secretaria será o de fazer com que as pessoas das diferentes escolas se
enxerguem, se conheçam, colaborem umas com as outras e se sintam

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pertencendo a um mesmo grupo. Supondo que os gestores e lideranças das
escolas tenham capacidade, talento, empenho e responsabilidade em relação à
educação permanente dos profissionais que nela trabalham, ainda assim
precisarão ter apoio da Secretaria Municipal de Educação, para criar espaços de
diálogo entre escolas para que: (1) cada escola conheça o que as outras vêm
fazendo, (2) as melhores ideias possam circular, (3) as pessoas tenham
referências externas e com isso sintam-se mais seguras no que fazem, (4) as
pessoas sintam-se parte de um mesmo movimento.

Então, esses são dois importantes papéis da Secretaria de Educação em


relação às escolas: (1) dar apoio, fazendo com que existam espaços de diálogo
interescolar, e (2) fornecer uma ajuda mais próxima para as escolas que
apresentem maiores dificuldades na gestão dos espaços internos de educação
permanente.

É bom lembrar que os gestores e lideranças de dentro das escolas têm


um importante papel na educação permanente dos professores e dos demais
profissionais da educação. Cada escola tem uma realidade um pouco diferente,
umas das outras. Esse é um dos motivos pelo qual se deseja que a educação
permanente dos profissionais da educação não seja uma coisa centralizada
somente em ações geridas pela Secretaria Municipal de Educação. Esses
momentos e situações de formação precisam acolher a diversidade das
situações e realidades das escolas. Por isso não se deseja que as ações sejam
iguais para todas as escolas do município. Quando dirigente e pessoal de apoio
da Secretaria Municipal de Educação percebem, aceitam, e até gostam de tais
diferenças entre unidades escolares a rede municipal consegue melhores
resultados. As situações não são iguais. As escolas são diferentes. Elas
precisam ter essa liberdade e viver suas diferenças.

Outro motivo pelo qual não se deseja que a educação permanente dos
profissionais da educação seja uma coisa única, centralizada em ações geridas
pela Secretaria Municipal de Educação, é que as pessoas gostam de viver como
sujeitos que são. Quando a Secretaria age de forma centralizadora, ela tolhe,
inibe, limita ou restringe a possibilidade de que cada escola, com seus gestores,
professores e outros profissionais, pense e estude por si própria, e planeje suas
ações por si própria. O ideal é que a educação permanente dos professores e

18
demais profissionais da educação tenha uma vertente forte na própria escola. O
ideal será que a escola se organize, que faça a gestão desses momentos por ela
mesma, que faça as pautas, gerencie as discussões, organize as criações e
planos de ação, e tome suas decisões, e que a Secretaria de Educação fique no
apoio às pessoas de gestão da escola..

Como vimos, a educação permanente tem esses dois lados: o lado da


Secretaria da Educação e o lado da escola.

Mas há casos em que a escola (ou instituição escolar) não tem a


capacidade para criar e gerir bem os grupos, situações e momentos da educação
permanente de seus trabalhadores ou, as pessoas de gestão, e lideranças, da
escola não sabem bem como fazer a sua parte na educação permanente.
Nesses casos é necessário que haja um apoio maior da Secretaria da Educação
para que despertem para esse papel e se apropriem dele, ganhem capacidades
para tal, ganhem segurança, emancipem-se em relação à gestão dos grupos de
educação permanente.

Isso é uma das coisas mais comuns nas escolas. Quase sempre, em
quase todas as escolas, se encontra esse problema. Esse é um problema central
da educação brasileira (e provavelmente não é só no Brasil): as pessoas da
escola têm dificuldade para gerir a educação permanente de seus profissionais
(na maioria professores, mas também merendeiros, porteiros, pessoas que
fazem cópias, pessoal administrativo, e os próprios gestores escolares). Se a
escola não tem essa competência precisará receber cuidados especiais,
desafios e ajuda para que a desenvolva. A escola precisará fazer parte de um
processo de aprendizagem. Não mais um processo de aprendizagem de
indivíduo, mas um processo de aprendizagem de instituição. As pessoas de
gestão e lideranças precisam aprender e se organizar para saberem cuidar dos
grupos de educação permanente da escola. Por isso, também as pessoas em
posição de gestão na escola devem ter seus grupos e momentos de
aprendizagem. Devem participar de Comunidades de Estudo, planejamento e
Reflexão sobre a ação prática (CER).

19
GESTOR TAMBÉM PRECISA DE CER

Para que as pessoas que trabalham em uma escola consigam ambientes


e situações realmente educativos, é preciso haver unidade, harmonia e sintonia
entre elas. Isso depende muito das pessoas que se dedicam à gestão. Mas não
basta ser nomeado, eleito ou concursado. É preciso conquistar o
reconhecimento das pessoas. Conforme pesquisas (Vallin, 2004, p. 192) as
escolas que apresentam melhores resultados possuem uma liderança maior que
se dedica à organização do coletivo e que lhe dá sustentação.

Outras pessoas (lideranças) ajudam na gestão da escola, do ponto de


vista da gestão de relacionamentos interpessoais, do ponto de vista da ‘formação
em serviço’, e de situações gerais envolvendo alunos. Mas essas lideranças só
se constituem em função da atuação da liderança maior. Se a liderança maior

20
for autoritária, essas lideranças não se explicitam. Não emergem. (Vallin, 2004,
p. 192)

Essa organização democrática do coletivo não é facilmente encontrada,


mas quando acontece, em geral, é a própria diretora (ou diretor) quem conquista
a liderança maior. Acontecem casos em que a liderança maior está no cargo de
coordenador pedagógico, vice-diretor, ou outro. Também os professores ou
outros trabalhadores da escola, quando dispõe de tempo para dedicar-se ao
coletivo, podem assumir a liderança maior. Em geral, o professor não dispõe de
tempo. Precisa dedicar-se às aulas, e tem estudantes dependendo de si, horário
atrás de horário. Precisa deslocar-se para uma função de gestão para poder
desenvolver sua capacidade e dedicação à liderança.

Assim, para que a escola se organize, para que tenha um grupo de


profissionais que atuam como sujeitos e que trabalham em conjunto, para que
seja boa em educação, primeiro é preciso que alguém assuma a liderança maior.
Em segundo lugar, é preciso que outras lideranças sejam reconhecidas,
incentivadas e apoiadas. Desse modo será formada uma rede de pessoas e
haverá um coletivo. Internamente à escola, esperava-se o mesmo modo que no
cenário municipal: que liderança se traduza em serviço ao coletivo, isto é
dedicação ao fortalecimento e autonomia do coletivo. Posturas individualistas ou
de vaidade não colaboram para a construção do coletivo. São necessárias
lideranças democráticas.

Sabendo que a formação do coletivo depende da gestão escolar e que a


qualidade do ensino depende disso, o dirigente municipal apoiará esse
movimento. Mas enquanto os coletivos não se apresentam organizados de forma
democrática e harmônica, o dirigente, e outros da educação municipal, não
podem dar apoio somente às pessoas que estão oficialmente em cargos de
gestão nas escolas, pois estarão desperdiçando importantes energias, que estão
nas lideranças naturais que existem pelo sistema escolar (professores, pais,
estudantes e outros). Devem procurar alternativas, além daquelas formalmente
constituídas. Por outro lado, não devem desprezar o poder e a influência dos que
estão nas posições estratégicas dos cargos de gestão. Assim, o dirigente deve
olhar para as duas possibilidades, com atenção e cuidado. Sempre que se

21
conseguir colocar as lideranças naturais nos cargos de gestão o resultado
melhorará. Mas esse é um movimento dinâmico que exige dedicação e atenção.

Numa escola há várias pessoas que em funções de gestão: diretor, vice-


diretores, coordenadores pedagógicos, supervisores escolares, coordenadores
de turno, coordenadores de projeto, e outros. São os que possuem horários e
atribuições para dedicar-se ao coletivo. O coletivo por pessoas e pelas relações
e situações entre elas. São professores, estudantes, familiares, demais
funcionários e outras pessoas, que aparecem menos, mas que de alguma forma
participam da escola. Em cada município, e estado, são usados nomes
diferentes e também a organização dos papéis nas escolas acontece de formas
diferentes. Embora existam várias pessoas dedicadas à gestão da escola, nem
sempre essas pessoas trabalham em equipe. Se isso acontecer será melhor
para a escola.

O melhor modelo para dirigir uma escola não é um modelo centralizado


na figura do diretor, mas sim o trabalho em equipe dos profissionais em cargo de
gestão, com liberdade para estabelecer dinamicamente os papéis e
responsabilidades (Vallin, 2004, p. 192). Em cada momento e situação, a pessoa
de gestão (ou grupo de pessoas) que assumirá uma responsabilidade do
contexto poderá ser diferente. A assunção de responsabilidades não será coisa
estática, fixa.

Essa dinâmica acontecerá tanto na questão de horário, pois cada um tem


um horário diferente, e em cada turno da escola as responsabilidades ficarão
com diferentes pessoas da ‘equipe gestora’, assim como deverá haver uma
unidade de gestão na escola e conforme as questões que surgirem as
responsabilidades poderão ser assumidas por um ou outro. Por isso fala-se em
‘equipe gestora’ ou pessoas em posição de gestão escolar. Para não entrar no
detalhe de quem estará em cada papel, e para não amarrar as funções.
Deixando em aberto essa possibilidade de movimento haverá melhores
condições da equipe responder aos desafios que se impõem.

As pessoas em posição de gestão nas escolas também precisam


participar de Comunidades de Estudo, planejamento e Reflexão sobre sua ação
prática (CER). O que se encontra, normalmente nas escolas, são situações em

22
que essas pessoas não participam de nenhum grupo de estudos ligado ao
trabalho. Quando existem momentos e oportunidades de ‘formação’, falta
continuidade, regularidade, e prioridade. Encontra-se um momento aqui, outro
acolá, sem que se tenha uma continuidade nos estudos, planejamentos,
avaliações e reflexões dos gestores escolares. Ou então são oferecidos cursos,
que podem ser ótimos, mas que não se relacionam com o planejamento da ação
prática no coletivo escolar, e não dão conta da resolução de problemas do
cotidiano. Também aqui é preciso que alguém esteja atento à espiral da
aprendizagem (figura 1) e cuide para que haja continuidade entre ação,
avaliação, reflexão, estudos e planejamento, e que isso seja feito em
comunidade e não individualmente. O que existe para gestores escolares, em
geral, são as reuniões para tratar de problemas emergenciais e muitas vezes
são reuniões circunscritas aos atores mais diretamente envolvidos com a
emergência, ou na operação de um determinado projeto ou programa.

Acontecem também, num coletivo geral de diretores de unidades


escolares, reuniões de avisos e de informações operacionais. Ora, isso não pode
ser visto como diálogo, nem como reflexão conjunta. Numa reunião desse tipo
os ‘gestores escolares’ são colocados no papel operativo, e não como sujeitos
que refletem sobre sua prática e a reconstroem. É preciso criar oportunidades
de fala e de escuta, desafiá-los a pensar soluções, analisar situações, construir
conceitos, planejamento de soluções em conjunto, e que depois sejam aplicadas
em ações nas escolas.

As pessoas de gestão muitas vezes têm autonomia operativa e até


intelectual, mas não costumam ter oportunidades regulares para trabalhar em
parceria com gestores de outras escolas, participando de grupos de estudos que
estejam ligados ao planejamento e ao tratamento dos problemas emergentes de
suas escolas. Os gestores escolares normalmente conhecem pouco sobre o que
acontece em outras escolas, no âmbito da gestão. Os intercâmbios e trocas de
experiências e informações acontecem de forma casual, condicionados à
iniciativa particular de cada um, e vinculados às amizades pessoais, ou
circunstâncias históricas (pessoas de uma escola que vão trabalhar em outra) É
preciso que as CER façam parte da estrutura da educação.

23
Portanto, um dos grandes desafios da educação do município será fazer
com que existam e tenham continuidade as CER (Comunidades de Estudo,
planejamento e Reflexão sobre sua ação prática) dos gestores escolares,
constituindo-se num canal de tratamento dos problemas de gestão emergentes
do cotidiano das escolas.

Retornando ao papel do ‘dirigente municipal da educação’, percebe-se


que é preciso continuar a olhar todo esse conjunto: escolas, gestores,
professores, mas voltemos à questão inicial – qual o papel do dirigente perante
todos os profissionais de educação?

Ele poderá assumir diretamente o papel de quem cuida das CER, sendo
o principal gestor da educação permanente dos gestores escolares. Mas talvez
isso não possa ser feito de forma direta o tempo todo. Provavelmente existirão
outras pessoas da equipe de apoio da Secretaria Municipal de Educação, ou
contratados pontualmente (empresas, ONGs, consultores), que também
trabalharão na educação permanente dos gestores das escolas. Deseja-se e
espera-se que sejam formados grupos, ou comunidades de estudos, em que os
próprios gestores escolares tenham uma participação ativa, crítica, de
cooperação e criatividade. Espera-se que eles coloquem-se como sujeitos de
sua própria educação permanente. Mas isso não dispensa o cuidado e a
atividade do ‘dirigente municipal da educação’, e de sua equipe.

O dirigente municipal poderá cuidar e participar mais diretamente e mais


frequentemente de um grupo com pessoas mais próximas de si e estes
cuidariam da criação e manutenção dos demais grupos nos vários níveis. Dessa
forma a criação e manutenção dos espaços de diálogo e educação permanente
na forma de Comunidades de Estudo, planejamento e Reflexão sobre sua ação
prática (CER), seria uma política pública da educação municipal.

O que é uma política pública? Política é (Rocha et al, 2006, p. 39 e 54)


um corpo de ideias, princípios e diretrizes que se concretizam em objetivos e
metas que orientam a definição de ações, organizadas de maneira articulada e
coerente em programas e projetos. As políticas são (ou deveriam ser)
suprapartidárias. Devem avançar (ou deveriam avançar) além do tempo de um
governo no poder. Não são ações ou programas episódicos, ou de um governo.

24
A articulação e coerência do conjunto de ações devem superar a fragmentação
e o isolamento de projetos e programas que, às vezes, apesar de serem meios,
terminam tornando-se fins.

As políticas devem ser estabelecidas com a participação de vários


segmentos sociais, acompanhadas e reavaliadas por e com todos,
sistematicamente. Se houver grupos de educação permanente para todos os
trabalhadores da educação, em todos os níveis, será possível operacionalizar o
acompanhamento de todos, com avaliações e redirecionamentos nas ações.
Uma das políticas da educação do município será a criação, apoio e
fortalecimento das Comunidades de Estudo, planejamento e Reflexão sobre sua
ação prática (CER), para todos os trabalhadores da educação, formando uma
rede humana de diálogo.

Outras políticas serão tratadas no diálogo dessa rede: planejando-as,


executando, revendo maneiras de atingir metas, revendo ações e métodos, se
questionando e se ajudando mutuamente. As políticas educacionais devem estar
expressas em termos de metas que sejam claras para todos; a aprendizagem
dos estudantes deve estar em primeiro lugar; as metas devem ser passíveis de
serem avaliadas; o dirigente municipal tem um papel estratégico, pois ele
vocaliza os principais pontos da política e lidera a avaliação. Dirigente municipal,
pessoal de apoio da secretaria de educação, gestores escolares, conselheiros
municipais, conselheiros escolares e lideranças naturais do município devem
conhecer os indicadores que podem sinalizar o sucesso da política educacional
e acompanhar a evolução desses indicadores (Bonamino et al, 2006, v.1, p. 174).

Ter esses rumos de forma clara, e estabelecidos em comum, irá permitir


a racionalização dos recursos e energias existentes e poderá tornar
compreensível o processo em nível municipal para a maioria dos envolvidos.

TRATANDO AS DESIGUALDADES

Para completar o papel do dirigente e a gestão pedagógica, deve ser


lembrado que hoje, no Brasil, somos “campeões” em desigualdade social.

25
Embora isso já seja visto como parte da normalidade aponta para injustiças
alarmantes. A boa educação das crianças é um direito. A escola pública tem a
responsabilidade de criar condições para que essa boa educação aconteça,
principalmente nas situações em que família e comunidade apresentem maiores
fragilidades e dificuldades. Além de ter políticas que promovam a melhoria das
escolas em geral, é preciso lembrar que em cada município há escolas situadas
em regiões com maiores carências.

Nelas os pais dos estudantes têm menos condições de colaborar com a


aprendizagem escolar, e o próprio ambiente e situação em que vivem, é mais
distante das letras, dos números, dos símbolos escolares, e das reflexões mais
abrangentes sobre sociedade e natureza. Essas escolas precisam de maior
apoio, de forma a diminuir as desigualdades. Quando o município dá condições
iguais para todas as escolas pode estar reforçando a desigualdade social. As
mais frágeis precisam receber apoio mais forte.

Cada dirigente municipal deve se questionar – há escolas em meu


município que apresentam piores resultados? Depois pode procurar - o que
poderia ser feito para compensar tal situação? E finalmente, voltando o foco para
seu próprio papel - o que pode o dirigente municipal de educação fazer para
diminuir a injustiça em seu município?

Dizem que “o recurso deve ser colocado onde está o discurso”. Ao


estabelecer as regras para distribuição de verbas do orçamento é preciso agir
de forma desigual, procurando compensar as localidades de maior carência. Mas
a política pedagógica do município também terá efeitos na compensação das
desigualdades. Na visão mais tradicionalmente aceita em nossa sociedade, a
que é vista como escola de qualidade (muitas vezes são as escolas privadas,
frequentadas pelos filhos da classe média), pode ser um instrumento de
perpetuação da desigualdade e da dominação de uns sobre os outros (Rocha et
al, 2006, p. 29, visão de Bordieu). Processos de repetição de enunciados
conceituais, de reprodução de procedimentos padronizados, currículos
cristalizados e rituais pedagógicos podem contribuir para a desigualdade social
(Rocha et al, 2006, p. 55). Para que o estudante tenha um ambiente em que se
construa como sujeito que é, os conteúdos e suas verdades devem ser
apresentados e trabalhados em termos científicos e históricos. O conhecimento

26
e as verdades devem ser vistos como provisórios e com diferentes pontos de
vista e interpretações. Deve-se trabalhar com espaço para a dúvida, para a
experimentação, a formulação e verificação de hipóteses, a fundamentação de
ideias e a leitura de mundo. Deve-se valorizar o questionamento, ligando
incerteza a conhecimento.

Exercitar conclusões e sínteses, em diálogos coletivos. Desenvolver e


valorizar o hábito de construir conhecimento (Rocha et al, 2006, p.56). É isso o
que procura indicar a espiral da aprendizagem: reflexão sobre as ações práticas
e renovação da maneira de agir em função das reflexões (individuais e coletivas).
Para trabalhar com as classes carentes, devem ser reconhecidas as presenças
e não ausências (Rocha et al, 2006, p. 57). O mesmo vale quando se trabalha
com professores ou gestores que apresentam limitações e carências.

Assim, o papel do dirigente da educação do município é o de criar


condições para que as UEs (Unidades Escolares), outras instituições ou espaços
educativos, e o pessoal de apoio da SME (Secretaria Municipal de Educação),
tenham personalidade e unidade, e que participem de rede de diálogos. Para
isso deverá cuidar para que as Comunidades de Estudo, planejamento e
Reflexão sobre a ação prática (CER) existam e se fortaleçam. O dirigente deve
cuidar para que a construção de conhecimentos aconteça também na educação
permanente, em todos os níveis. O diálogo em nível municipal estaria ligado aos
diálogos internos às UEs, e estes ligados a movimentos de (re)orientação
curricular (Rocha et al, 2006, p. 58). O olhar sobre as vocações naturais do
município, e a articulação de currículos e cursos coerentes com as necessidades
locais, que valorizem a cultura do município (Rocha et al, 2006, p. 50 e 51),
ambos podem colaborar para diminuir a desigualdade, valorizando o que é
possível e necessário para as pessoas. Cabe ao dirigente criar condições para
que exista e funcione bem a educação permanente, ou ‘formação continuada’
(Rocha et al, 2006, p. 61). Essa deve envolver os vários segmentos e também o
pessoal de apoio da SME, do conselho municipal de educação e dos conselhos
escolares, formando uma trama de “círculos de diálogo”, que planeja ações e
discute a resolução de problemas, examina e reflete sobre avaliações de
resultados. O dirigente deve implantar e valorizar processos avaliativos
comunitários (Rocha et al, 2006, p. 65) que sustentarão todo esse processo e

27
trama, ligando estudantes, professores, gestores, familiares, funcionários,
parceiros, pessoal de apoio, objetivos, políticas, resultados e desafios.

Muitas vezes a falta de tempo é apontada como grande dificultador da


existência ou da continuidade e regularidade dos momentos da educação
permanente.

Por isso é preciso que se veja a questão do tempo como um problema


educativo. É preciso que as pessoas da escola, e dos sistemas de ensino, se
coloquem em comunhão, buscando valorizar cada momento vivido no coletivo,
valorizando a reflexão em comunidade, com estudo e trabalho pedagógico. É
preciso ver o educador como um sujeito que, em diálogo com seus pares e com
a comunidade, constrói e reconstrói (a prática educativa, os ambientes de
aprendizagem, o jeito de fazer escola) e não como um aplicador de processos
ou reprodutor de esquemas de ensino. (Vallin, 2005)

Se as ideias da espiral da aprendizagem forem usadas pelos professores,


os estudantes serão tratados como sujeito, qualquer que seja a idade, e portanto
poderão participar do currículo. Mais que isso, participarão continuamente
dessas escolhas. Portanto, cabe ao dirigente e à rede de educação aceitar e
buscar essa participação cidadã dos estudantes, nas atividades e planejamentos
da escola. Uma Escola Cidadã, nos moldes defendidos pelo Instituto Paulo
Freire, é aquela que desenvolve e cultiva um ambiente de prática e descoberta
da cidadania, preocupada com uma escola pública de qualidade e para todos.
Para que se tenha um ambiente de cidadania para o estudante, o professor
também precisa viver e atuar na profissão como cidadão. Para isso, também os
demais funcionários da escola e os familiares dos estudantes precisam ser
incluídos e respeitados como cidadãos que são. E a cadeia de relações cidadãs
vai se estendendo e passa pelos gestores escolares, pessoal da Secretaria de
Educação, pessoal dos conselhos escolares, do conselho municipal e outras
pessoas interessadas e participantes da educação.

Todos são sujeitos e devem uns colaborar com os outros, compreendendo


os papéis, responsabilidades e direitos de cada um, cada um respeitando os
demais, cada um se dispondo a ouvir e a ajudar os demais, cada um
conseguindo sentir-se animado para dizer sua palavra e mostrar suas ideias aos

28
coletivos nos quais participa. Moacir Gadotti fala da educação para e pela
cidadania neste início do século XXI, e apresenta dez componentes para a
Escola Cidadã (Gadotti, 2000)

E os pais, como podem ajudar? Que participação podem ter? Como


conseguir uma boa participação dos pais, ou responsáveis pelos estudantes?
Uma vertente será o estímulo para que conversem com seus filhos sobre as
aulas e aprendizagens. A escola trabalhará na mobilização deles para que haja
mais conversa em casa sobre a escola e o desenvolvimento escolar. Nessa
conversa podem considerar que a escola precisa servir para a vida. Os pais não
precisam entender de pedagogia, nem de métodos, nem de conteúdos. Não
precisam assumir o papel dos educadores. Podem melhorar a qualidade deles
mesmos como pais ou responsáveis. Para conseguir isso a escola pode
desenhar e desenvolver ações específicas junto aos estudantes e familiares. Do
ponto de vista do dirigente municipal, ele e sua equipe podem sensibilizar e
colaborar para que as escolas preocupem-se com isso e que desenvolvam tais
ações. Podem ainda promover avaliações nesse âmbito e trazê-las para o
diálogo com as escolas.

Outra vertente boa e interessante nesse campo de ideias é o conselho de


classe e série com a participação de pais, estudantes, professores, funcionários
e gestores. Essa situação precisa ser construída e alimentada por momentos
anteriores. Nos bastidores, em momentos mais reservados, os gestores da
escola podem construir bases que darão sustentação às relações no coletivo
maior. Assim, o dirigente pode também estar, com a equipe de apoio da
Secretaria, procurando sensibilizar e colaborar para que as escolas preocupem-
se com isso e que desenvolvam tais ações. Podem ainda promover avaliações
nesse âmbito e trazê-las para o diálogo com as escolas.

Enfim, a educação municipal vai se constituir a partir de um conjunto de


círculos de diálogos, que formará uma trama, uma rede de grupos ou
comunidades, nos diversos níveis, entrelaçados, conversando entre si. Desse
modo, todos que fazem parte do processo de educação do município serão
tratados como sujeitos, e estarão atuando como sujeitos, cada um participando
dos diálogos em seu grupo, e os que fizerem parte da gestão participarão em
dois níveis: em um deles como gestor do grupo (ou participante da equipe

29
gestora), e em outro como um dos pares, simplesmente. Cada comunidade se
orientará conforme a espiral de aprendizagem (figura 1), e ao mesmo tempo, no
nível municipal, as decisões e os planos de ação serão construídos
colaborativamente, e respeitando a inteligência da comunidade e a participação
de pessoas em diversos segmentos.

GESTÃO ESCOLAR DEMOCRÁTICA: APONTAMENTOS


SOBRE OS PRINCÍPIOS E AS FUNÇÕES DE ORGANIZAÇÃO

30
A escola, ao lado da família, do Estado e da sociedade, é uma das esferas
onde são desenvolvidos os processos educativos. Além disso, tem papel
fundamental na formação para o trabalho e exercício da cidadania, conforme
exposto na Lei n° 9.394/96. Tais princípios são objetos de inúmeras discussões,
suscitando propostas de reestruturação do sistema educacional em seus
aspectos macro e micro estruturais. A complexidade do funcionamento dos
sistemas educacionais é crescente, tal fato é evidenciado pela diversidade de
funções e das necessidades de atendimento às especificidades das instituições,
das comunidades, dos alunos e dos professores.

Neste contexto, estruturas administrativas altamente burocratizadas não


dão conta de atender e captar as demandas locais e globais, tornando-se
inoperantes. Faz-se necessária a descentralização administrativa e financeira, a
autonomia e participação, o que possibilita maior capacidade de adaptação às
condições locais e ao enfrentamento dos problemas cotidianos.

Deste cenário, emergem os estudos e as discussões sobre a gestão da


educação que precisa superar as práticas arraigadas pelo enfoque limitado da
administração.

A gestão escolar constitui uma dimensão e um enfoque de atuação que


objetiva promover a organização, a mobilização e a articulação de todas as
condições materiais e humanas necessárias para garantir o avanço dos
processos socioeducacionais dos estabelecimentos de ensino, orientados para
a promoção efetiva da aprendizagem pelos alunos, de modo a torna-los capazes
de enfrentar adequadamente os desafios da sociedade globalizada e da
economia centrada no conhecimento (LUCK, 2000, P. 8).

Cabem à gestão escolar, o direcionamento e a mobilização da cultura da


instituição, bem como a busca de alternativas em todas as frentes e poderes
inter-relacionados.

O objetivo da gestão nada mais é do que a promoção de aprendizagens


efetivas e significativas aos sujeitos escolares, contribuindo para o
desenvolvimento de competências demandadas pela vida em sociedade. Diante
destes desafios, ganham importância os estudos sobre a gestão da escola e a
atuação dos profissionais que a promovem. Subsidiar a ampliação das

31
compreensões sobre a gestão, investigar processos e propor alternativas é,
portanto, uma tarefa aberta a contribuições.

Para tanto, é importante questionar: qual a concepção de gestão das


escolas da minha cidade? Quais as diferenciações e particularidades da gestão
dos sistemas educacionais públicos e privados? Qual o significado da gestão e
da gestão democrática? Por que a gestão escolar brasileira é pautada pela
gestão democrática? Como a escola pode ser organizada? Quais os princípios
da gestão escolar democrática?

Com a abertura política e a promulgação da Constituição Federal de 1988,


a gestão educacional democrática passou a se constituir como um dos princípios
orientadores dos processos educativos. Nesse sentido, a gestão democrática
tem, além da dimensão exógena (a escola como espaço de socialização,
produção/apropriação do conhecimento e formação profissional), uma dimensão
endógena (organização e funcionamento interno).

Em linhas gerais, o que distingue as escolas que desenvolvem a gestão


democrática são os princípios que pautam suas práticas. Na perspectiva da
gestão democrática, são fundamentais os princípios da autonomia,
descentralização e participação. Em alguns casos, a autonomia escolar é
reduzida ao âmbito financeiro. No entanto, este princípio é muito mais
abrangente e fundamental para a gestão democrática, pois inclui aspectos
jurídicos, financeiros, pedagógicos e administrativos.

A estruturação da autonomia escolar demanda a existência e organização


de gestão colegiada, eleição de diretores e ação conjunta em torno de um projeto
pedagógico. A autonomia pressupõe um processo de mediação entre os sujeitos
e, em função disso, requer a participação dos segmentos da unidade escolar.
Por isso, a criação de ambientes participativos e de descentralização das
atividades educacionais, tais como os Conselhos Escolares, Conselhos de Pais
e Mestres e Grêmios Estudantis, entre outros exemplos, constituem-se como
uma condição básica da gestão democrática.

A gestão escolar democrática é caracterizada pelo reconhecimento da


necessidade de descentralização, autonomia e participação dos envolvidos nos
processos educativos, desde a sala de aula até a gestão dos sistemas

32
educacionais. Portanto, constitui uma organização complexa que envolve
múltiplos atores, múltiplas funções e atribuições.

A gestão escolar democrática é integrada por segmentos diferenciados –


pais, professores, alunos, agentes administrativos, etc. – que constituem
relações educacionais e de trabalho interligadas.

Conforme Ferreira (2000),

a escola está inserida na “sociedade global” e chamada “sociedade do


conhecimento” onde violentas e profundas transformações no mundo do trabalho
e das relações vêm causando impactos desestabilizadores a toda a humanidade,
e consequentemente exigindo novos conteúdos de formação, novas formas de
organização e gestão da educação ressignificando o valor da teoria e da prática
da administração e da educação (p. 296, grifos do autor).

Para Ferreira (2000), “gestão” significa ato de gerir, gerência,


administração, tomada de decisão, organização, direção, ou seja, tem a
finalidade de impulsionar uma organização a atingir seus objetivos, a
desempenhar seu papel e sua função social. A gestão escolar contempla, pelo
menos, três áreas, as quais funcionam de modo integrado e sistêmico: gestão
pedagógica, gestão de pessoas e gestão administrativa.

A gestão pedagógica está relacionada aos processos educativos,


estabelecendo objetivos para o ensino e definindo as linhas de atuação em
função dos objetivos e do perfil da comunidade. Além disso, propõe metas de
atuação, define conteúdos curriculares, avalia e acompanha as propostas
pedagógicas como um todo. O diretor é um dos articuladores da gestão
pedagógica, ao lado do coordenador pedagógico e dos demais profissionais da
educação.

A gestão de pessoas, como o próprio nome expressa, envolve a gestão


de pessoal: equipe escolar, alunos, comunidade, entre outros. Constitui a parte
mais sensível de toda a gestão, pois está pautada na comunicação e nas
relações entre as diferenças. Fazer com que as pessoas trabalhem em conjunto,
contornem problemas e questões de relacionamento, faz da gestão de pessoas
um desafio a ser construído e fortalecido diariamente.

33
A gestão administrativa envolve desde as questões de patrimônio, o
prédio e os equipamentos materiais que a escola possui, até a legislação escolar,
gestão financeira, entre outros. Dessa forma, a equipe gestora tem como função
coordenar e orientar todos os esforços, para que a escola, como um todo,
produza os melhores resultados possíveis no sentido de atendimento às
necessidades dos processos de ensino e aprendizagem.

A escola, integrada a um sistema de educação nacional, possui, assim,


como um sistema, diversos “órgãos” com respectivas funções. A função de
diretor e vice-diretor de escola se caracteriza pelo desempenho de ações
especializadas, neste caso, de administração, que se traduzem em atribuições.
As funções fazem parte da organização do sistema administrativo da escola, por
isso, diz-se que a função é o esforço orientado no sentido de realizar uma
atividade útil à vida e ao desenvolvimento do sistema.

As funções se realizam por atos ou atribuições indispensáveis ao


desempenho das atividades escolares. Em síntese, as atribuições são o
conteúdo da função e esta, por sua vez, é o conteúdo do cargo. Isto é, as funções
de diretor dão sentido ao cargo de diretor: as responsabilidades que assume são
decorrentes do cargo que aceitou. O maior ou menor número de funções
exercidas por um diretor vai depender do seu estilo de administração, do
tamanho e das finalidades da escola, dos profissionais de apoio, etc.

No entanto, podemos pensar em, pelo menos, nove funções do diretor ou


administrador:

 planejamento e tomada de decisões: organização, planejamento e


sistematização de atividades presentes e futuras. Exige
conhecimento da política educacional do país e do sistema de
ensino em que está integrado, conhecimento do projeto político-
pedagógico da escola, etc.;
 em que está integrado, conhecimento do projeto político-
pedagógico da escola, etc.;
 organização, coordenação e entrosamento: coordenar as
atividades para alcançar níveis de integração, delegar

34
responsabilidades, organizar pessoas, materiais e procedimentos,
etc.;
 assistência à execução: acompanhamento do trabalho, visando à
melhoria do desempenho, ao assessoramento, ao incentivo, ao
apoio às atividades de inovação e ao clima favorável às mudanças;
 comunicação: fluxo das informações entre os atores escolares e os
níveis de organização;
 avaliação: acompanhamento, regulação e replanejamento.
Avaliação externa, interna e auto avaliação.

Sabe-se que, na maior parte das escolas brasileiras, as funções do diretor


escolar se diferenciam de uma escola para outra. Muitos diretores fazem
merenda, substituem professores, auxiliam na limpeza, cuidam da horta e do
jardim, são orientadores educacionais, bibliotecários, entre tantas outras
atividades, o que faz com que tenham funções indefinidas, dificultando a
realização das atividades relacionadas às suas atribuições.

A eficiência e eficácia da gestão escolar não depende unicamente de seu


gestor, mas, sim, do envolvimento, da responsabilidade e participação da
comunidade escolar, em que o Círculo de Pais e Mestres e/ou o Conselho
Escolar, os alunos, professores e demais profissionais da educação, em um
trabalho conjunto, buscam os mesmos objetivos para que o ideal de educação,
desejado por cada um, possa ser contemplado. Para que isso ocorra, é preciso
que seus membros compreendam suas atribuições e juntos construam acordos
que façam com que o cotidiano da escola seja de relações educativas e
democráticas.

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REFERENCIAS
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