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CRESCIMENTO E

DESENVOLVIMENTO
HUMANO E
APRENDIZAGEM
MOTORA

Rochelle Rocha Costa


Ampulheta de Gallahue
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Esquematizar os princípios lógicos da aquisição de habilidades motoras


por meio da ampulheta de Gallahue.
 Classificar os níveis de cada fase motora específica.
 Apresentar exemplos práticos de como os fatores ambientais e indi-
viduais influenciam o desenvolvimento motor.

Introdução
Você nasce, aprende a sentar, a engatinhar e dá seus primeiros passos.
Cai, levanta e caminha novamente. Quando percebe, já está correndo
e saltando com destreza. Na segunda infância, aprende-se a chutar, a
arremessar, a rebater, etc. Com a chegada da adolescência, atinge-se
a maturidade para decidir em qual modalidade deseja se especializar,
aplicando e refinando as habilidades motoras, até então desenvolvidas,
em situações esportivas e recreacionais.
Essa alteração do comportamento motor durante a vida é chamada
de desenvolvimento motor. O modelo da ampulheta de Gallahue tem
servido como base para a compreensão de como ocorre o processo de
desenvolvimento motor.

Ampulheta de Gallahue
A ampulheta de Gallahue é um modelo teórico de desenvolvimento motor que
fornece orientações para a descrição e explicação do comportamento motor,
conforme representado na Figura 1. A ampulheta em si representa a visão
descritiva do desenvolvimento, ao passo que o triângulo invertido que a cerca,
a visão explicativa, ou seja, a ampulheta representa como é o desenvolvimento
motor em determinada faixa etária e o triângulo corresponde ao motivo dessas
características motoras ocorrerem.
2 Ampulheta de Gallahue

Controle motor de
competência motora

Faixas etárias Heredita- Faixas do


aproximadas do Ambiente desenvolvimento
riedade
desenvolvimento motor

14 anos em diante Estágio de utilização permanente


11 a 13 anos Fase motora Estágio de aplicação
7 a 10 anos especializada Estágio transitório
6 a 7 anos Fase motora Estágio maduro
4 a 5 anos fundamental Estágio elementar
2 a 3 anos Estágio inicial
1 a 2 anos Estágio de pré-controle
do nascimento até 1 ano Fase motora rudimentar Estágio de inibição de reflexos
de 4 meses a 1 ano Fase motora reflexa Estágio de decodificação de informações
dentro do útero até 4 meses Estágio de codificação de informações

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Fatores intrínsecos à tarefa

Figura 1. Ampulheta de Gallahue e fases do desenvolvimento motor.


Fonte: Adaptada de Gallahue e Ozmun (2005, p. 65).

Neste modelo, a ampulheta representa você e ela é preenchida por areia,


que representa o recheio da vida. Como você pode observar, a areia provém
de duas fontes diferentes: um recipiente hereditário e outro, ambiental. A
presença desses dois vasilhames revela que o processo de desenvolvimento
é influenciado tanto pela hereditariedade como pelo ambiente. O recipiente
hereditário possui uma tampa, porque a sua quantidade de areia é fixa, uma
vez que a estrutura genética é determinada no momento da concepção. Por
outro lado, o recipiente ambiental é aberto, o que significa que a areia pode
ser acrescentada nesse recipiente durante todo o ciclo da vida.
A base da ampulheta é composta por quatro fases subsequentes de
desenvolvimento:

 fase motora reflexa;


 fase motora rudimentar;
 fase motora fundamental;
 fase motora especializada.
Ampulheta de Gallahue 3

À medida que a areia, proveniente dos recipientes hereditariedade e am-


biente, é adicionada na ampulheta, o nível de desenvolvimento motor é in-
crementado. Em outras palavras, conforme a criança atinge sua maturação e
é exposta a ambientes que favoreçam seu aprendizado, ela aumenta e refina
suas habilidades motoras, do nível mais básico ao mais complexo, progredindo
para a próxima fase do desenvolvimento até alcançar a competência motora.

Estágios do desenvolvimento motor


Você estudará agora cada uma das quatro fases do desenvolvimento motor
propostas pela ampulheta de Gallahue.

Fase motora reflexa


A fase motora reflexa ocorre desde o desenvolvimento do feto dentro do útero
até aproximadamente o 1º ano. As primeiras formas de movimento humano são
os reflexos. Os reflexos são movimentos involuntários que compõem a primeira
etapa nas fases do desenvolvimento motor. Esses movimentos involuntários
são importantes, porque é por meio deles que o bebê consegue sobreviver na
fase inicial da vida, já que eles permitem a obtenção de informações sobre o
seu corpo e o ambiente.
Os reflexos são categorizados em reflexos primitivos e posturais. Os re-
flexos primitivos são movimentos relacionados à sobrevivência e podem ser
classificados como agrupadores de informações, caçadores de alimentação e
de reações protetoras. Já os reflexos posturais são semelhantes ao comporta-
mento voluntário posterior.
Pode-se citar como exemplo de reflexo primitivo os reflexos de sugar e
de procurar pelo olfato; e entre os reflexos posturais, encontram-se o reflexo
primário de caminhar, reflexo de arrastar-se e reflexo palmar de agarrar. A fase
reflexa é dividida em dois estágios sobrepostos, conforme você verá a seguir.

Estágio de codificação de informações

O estágio de codificação (agrupamento) ocorre, aproximadamente, do período


fetal até o quarto mês após o nascimento. Os reflexos neste período são mo-
vimentos pelos quais o bebê reúne informações, busca alimento e encontra
proteção.
4 Ampulheta de Gallahue

Estágio de decodificação de informações

O estágio de decodificação (processamento) tem início aproximado após o


quarto mês de vida. Durante esse período, ocorre uma crescente inibição de
muitos reflexos que são substituídos por movimentos voluntários.

As idades apresentadas nas fases motoras representam o tempo aproximado durante


o qual determinado comportamento motor é mais frequentemente observado. Essa
idade não deve ser levada como regra, já que ela varia de criança para criança.

Fase motora rudimentar


A fase motora rudimentar perdura desde o nascimento até os dois anos apro-
ximadamente. Nessa fase, são observadas as primeiras atividades motoras
voluntárias, os denominados movimentos rudimentares. A sequência de apa-
recimento desses movimentos é altamente previsível e resistente a alterações,
exceto em condições ambientais extremas. Contudo, o ritmo de aparecimento
dos movimentos varia de criança para criança, uma vez que é dependente de
fatores ambientais, biológicos e da tarefa a ser executada. Os movimentos
rudimentares envolvem movimentos estabilizadores, como controlar a cabeça,
o pescoço e músculos do tronco; movimentos manipulativos, como alcançar,
agarrar e soltar; e movimentos locomotores, como arrastar-se, engatinhar e
caminhar).

Algumas crianças na fase rudimentar ainda não iniciaram a aprendizagem do chute.


Aquelas que já iniciaram apresentam um padrão de movimento muito inicial e rudi-
mentar. Durante o chute, há apenas o movimento de pequena amplitude da perna
que realiza o chute para frente. O movimento é realizado desde o quadril com o joelho
estendido. Algumas vezes, a criança não acerta a bola.
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Dois estágios compõem a fase motora rudimentar, os quais representam


progressivamente ordens superiores de controle motor.

Estágio de inibição de reflexos

A partir do nascimento, tem início o estágio de inibição dos reflexos. Nesse


estágio, os reflexos são inibidos e desaparecem de modo gradual. Os mo-
vimentos voluntários nesse período parecem descontrolados e grosseiros,
visto que o aparato neuromotor do bebê ainda está em estágio rudimentar de
desenvolvimento.

Estágio de pré-controle

Nesse estágio, que tem início por volta do 1º ano, as crianças começam a
apresentar maior precisão e controle sobre os seus movimentos. Elas aprendem
a se equilibrar, manipular objetos e locomover-se de modo proficiente.

Durante as duas primeiras fases do desenvolvimento motor, que correspondem


aproximadamente até o segundo ano de vida, a areia é adicionada na ampulheta
prioritariamente, mas não exclusivamente, pelo recipiente hereditário. Nesse período,
a sequência de desenvolvimento motor é altamente previsível e resistente a alterações
em condições normais. Por exemplo, no mundo inteiro é esperado que a sequência
de aprendizagem da criança seja sentar > ficar em pé > caminhar > correr.

Fase motora fundamental


A fase motora fundamental ocorre dos dois aos sete anos, aproximadamente.
Esse período é marcado pela exploração e experimentação das habilidades
motoras. A criança descobre como executar movimentos estabilizadores,
locomotores e manipulativos (primeiramente de modo isolado e, depois,
de forma combinada) com competência. São exemplos de habilidades fun-
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damentais que devem ser desenvolvidas nessa fase: equilibrar-se de forma


dinâmica e estática, caminhar, correr, saltar, galopar, alcançar, arremessar,
pegar, chutar, rebater, etc.
As habilidades motoras fundamentais são consequência da fase de movi-
mentos rudimentares e da maturação, entretanto, o ambiente possui importante
papel para que o grau máximo de desenvolvimento das habilidades fundamen-
tais seja atingido. A fase fundamental é fragmentada em três estágios distintos.

Estágio inicial

Em geral, crianças de dois a três anos encontram-se no estágio inicial. Esse


estágio é marcado pelas primeiras tentativas da criança de executar uma
habilidade, por isso, os movimentos apresentam elementos faltantes ou são
executados em sequência imprópria. Esse período é caracterizado pelos movi-
mentos cru e desordenado (grosseiramente exagerado ou inibido). Por exemplo,
na habilidade do arremesso, apenas o movimento do braço é executado, e os
movimentos de tronco, quadril e perna estão ausentes. Além disso, a execução
do movimento não é ritmicamente coordenada.

Estágio elementar

O estágio elementar é típico de performance de crianças de quatro a cinco


anos. Esse estágio parece depender, primeiramente, do amadurecimento. Nesse
período, a criança possui um maior controle e melhor coordenação rítmica de
seus movimentos. Contudo, os movimentos ainda parecem um pouco inábeis
e sem fluidez. Por exemplo, na execução do arremesso nesse estágio, a criança
apresenta os movimentos de braço e do tronco, mas a perna do mesmo lado
da mão do arremesso encontra-se à frente.
Muitos indivíduos, adultos e crianças, alcançam somente esse estágio em
atividades básicas como arremessar, pegar e rebater. Eles atingem esse estágio
por maturação, ou seja, pela areia do recipiente da hereditariedade da ampulheta
de Gallahue ter sido totalmente despejada. Entretanto, por falta de estímulo
ambiental (prática, encorajamento e instrução), não atingem o estágio maduro.
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Estágio maduro

Sugere-se que crianças podem e devem atingir o estágio maduro por volta
dos cinco ou seis anos. O estágio maduro é reconhecido por um padrão de
movimento bem coordenado, mecanicamente correto e eficiente. O arremesso,
agora, é executado com movimento de braço, tronco e perna, de forma coor-
denada e fluida.
As crianças que atingem esse estágio apresentam uma rápida melhora da
performance: arremessam mais longe, correm mais rápido, pulam mais alto
e mais longe. Ainda assim, a avaliação do padrão de movimento deve ser
realizada pela técnica e não necessariamente pelo rendimento, visto que uma
criança pode compensar uma inabilidade motora por uma maior força, por
exemplo. A habilidade madura pode ser continuamente refinada. Algumas
crianças atingem esse estágio devido à maturação e a um mínimo de influên-
cia ambiental, contudo, a maioria necessita de oportunidades para a prática,
encorajamento e instrução em um ambiente que propicie o aprendizado.
Cabe destacar que, se o desenvolvimento for retardado ao longo de um
período de anos, algumas habilidades podem nunca atingir o padrão maduro,
caso não haja considerável esforço e influência externa. Caso isso ocorra, as
crianças ficam impossibilitadas de adquirir habilidades esportivas especiali-
zadas durante a segunda fase da infância, adolescência e vida adulta.

No estágio inicial, durante o chute, o movimento dos braços e tronco é escasso. Os


braços permanecem estendidos. A perna que chuta realiza um leve balanceio para
trás durante o movimento preparatório. O movimento para a frente da perna é curto
e não há impulso nessa direção.
No estágio elementar, não se observa mudanças dos movimentos dos braços e do
tronco em relação ao estágio inicial. A perna que realiza o chute realiza também um
movimento para trás na fase de preparação, com leve flexão de joelho e, durante o
chute, o joelho tende a permanecer em flexão.
No estágio final, o braço do lado da perna que executa o chute realiza um movimento
na direção anteroposterior. O tronco é inclinado após o contato com a bola. A perna do
chute realiza um movimento para trás com o joelho flexionado na fase preparatória,
após isso, ela realiza um grande arco até entrar em contato com a bola. Durante o
contato, a perna oposta é flexionada. O chute é executado com impulso completo.
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Fase motora especializada


A fase motora especializada tem início por volta dos sete anos. Nessa fase, o
movimento torna-se uma ferramenta aplicável a atividades motoras complexas,
tanto da vida diária como nos esportes. Durante esse período, as habilidades
fundamentais são refinadas e combinadas para serem utilizadas em situações
com nível de exigência crescente. Três estágios compõem a fase especializada.

Estágio transitório

O estágio de transição geralmente se estende dos 7 aos 10 anos. Esse estágio


é marcado pelo refinamento e aprofundamento das habilidades fundamentais.
Além disso, nesse período, as habilidades fundamentais são combinadas e
aplicadas ao desempenho de habilidades especializadas durante a prática
esportiva e em ambiente recreativo. Por exemplo, a habilidade fundamental
do chute é inserida no contexto de exercícios educativos do futebol.
Nesse momento, os pais e os professores, devem auxiliar a criança a au-
mentar o controle motor e a competência motora em uma variedade de ativi-
dades. Deve-se atentar para não limitar o envolvimento da criança em uma
atividade em prol da especialização em outra, pois o enfoque limitado nesse
estágio possivelmente provocará efeitos indesejáveis nos próximos estágios.
Portanto, é recomendado que as crianças se envolvam em atividades/esportes
diversificados. Do ponto de vista técnico, isso é positivo porque a criança se
tornará proficiente em uma gama de tarefas. Do ponto de vista psicológico, a
especialização precoce prejudica a criança, pois ela poderá chegar ao grupo
profissional muito cedo, sendo submetida a uma rotina intensa de treinos, o
que aumenta a sua chance de dispersão. Programas de educação física devem
introduzir as habilidades esportivas somente depois de a criança atingir o
nível maduro nas habilidades fundamentais. No estágio de transição, o esporte
oficial ainda não deve compor a educação física. Em vez disso, habilidades
básicas, regras e estratégias dos esportes devem ser priorizados.
Ressalta-se que crianças que não desenvolveram as habilidades maduras
não serão bem-sucedidas na aquisição de um gesto esportivo. Esse fenômeno
é denominado de barreira de proficiência. Nesses casos, deve-se retomar o
aprendizado das habilidades fundamentais.
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Estágio de aplicação

Entre os 11 e 13 anos, aproximadamente, a criança está no estágio de apli-


cação, em que o indivíduo se torna capaz de tomar decisões fundamentadas
em fatores da tarefa, individuais e ambientais, sobre a sua participação (ou
não) em determinada atividade. Por exemplo, um indivíduo de alta estatura,
que apresente boa coordenação motora e agilidade e que goste de esportes
coletivos de contato pode optar por especializar-se no basquete. Por outro lado,
um indivíduo com as mesmas características, mas que não goste de esportes
de contato, pode escolher o vôlei. Nesse estágio, ocorre ênfase na forma,
habilidade e precisão crescentes do desempenho motor.

Estágio de utilização permanente

O estágio de utilização permanente inicia por volta dos 14 anos. Esse estágio é
caracterizado pelo auge do processo de desenvolvimento motor. Os indivíduos
selecionam atividades prazerosas e as levam consigo durante a vida, seja por
diversão, aptidão ou satisfação. Nesse contexto, se insere a prática de esporte
de caráter competitivo (a nível escolar, nacional e olímpico) e recreativo.

Na fase especializada, após refinar a habilidade do chute, o indivíduo está apto a


executar o chute de curtas e longas distâncias, com a bola parada ou em movimento,
com diferentes partes do pé (peito do pé ou com os dedos) e de diferentes maneiras
(chute alto, chute à média distância, chute rasteiro).
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Influência de fatores individuais e ambientais


no desenvolvimento motor

Fatores individuais
A hereditariedade é responsável pela tendência de o desenvolvimento hu-
mano ocorrer de modo ordenado e previsível no sentido céfalo-caudal (da
cabeça aos pés) e próximo-distal (do centro do corpo às extremidades), o
que é denominado de sequência desenvolvimentista. Essa tendência pode ser
exemplificada em razão de o bebê obter o controle da musculatura da cabeça
e do pescoço anteriormente ao das pernas (desenvolvimento céfalo-caudal),
bem como o controle dos músculos do tronco anteceder o dos punhos, mãos
e dedos (desenvolvimento próximo-distal).
O controle motor de uma criança também segue uma progressão de padrões
motores globais para movimentos mais refinados e funcionais, processo cha-
mado de diferenciação. Por exemplo, quando um bebê almeja pegar um objeto,
o movimento é bastante deficiente, porque ele não consegue diferenciar braços,
mãos e dedos. No entanto, com o seu desenvolvimento, torna-se capaz de
diferenciar grupos musculares, até atingir um padrão de movimento controlado
e eficiente. Simultaneamente à diferenciação, o processo de integração ocorre.
A integração corresponde à interação coordenada entre músculo e sistemas
sensoriais. No mesmo exemplo anterior, a integração refere-se à interação
entre olhos com o movimento da mão.
Embora o desenvolvimento infantil siga uma sequência universal e resistente
a mudanças, a idade de seu aparecimento pode variar. É comum observar des-
vios de seis meses a um ano. Essa variabilidade está intimamente relacionada
à prontidão. Prontidão refere-se às características do indivíduo e do meio que
tornam uma tarefa apropriada ao domínio de uma criança. Por exemplo, seus
alunos não estarão prontos para executar um rolamento para frente, se não
dominam a progressão de habilidades educativas do posicionamento das mãos
e da cabeça, impulsão de membros inferiores e rolamento sobre as costas. É
necessário fornecer habilidades prévias para atingir as metas.
Por fim, o último fator individual que influencia o desenvolvimento motor
é o período sensível, que corresponde a um período em que aprender novas
habilidades é mais fácil e mais rápido. Uma intervenção adequada nessa
janela de tempo favorece formas positivas de desenvolvimento, mais do que
se essa mesma intervenção ocorresse mais tarde. O período da infância é um
período sensível para a aprendizagem das habilidades motoras fundamentais
e esportivas.
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Fatores ambientais
Historicamente, pensava-se que as crianças desenvolviam suas habilida-
des motoras simplesmente pela maturação. Entretanto, atualmente sabe-se
que os fatores ambientais possuem uma importante função na aquisição das
habilidades motoras. Entre os fatores ambientais, destaca-se a necessidade
de encorajamento, as oportunidades frequentes para praticar, a instrução
qualificada e um ambiente que favoreça o desenvolvimento e refinamento
das habilidades motoras. Em outras palavras, as crianças precisam de alguém
que as encorajem a se movimentar e praticar suas habilidades e que as ensine
adequadamente a realizar o gesto motor, bem como necessitam praticar suas
habilidades frequentemente e em um ambiente propício para o seu aprendi-
zado. Nesse sentido, percebe-se a fundamental importância da presença dos
responsáveis pela criança, normalmente, os pais e o professor. São eles quem
devem oferecer de forma direta ou indireta esses recursos.
As crianças devem ser encorajadas a praticar suas habilidades, a descobrir
e a explorar movimentos. Infelizmente, muitas crianças não recebem o en-
corajamento suficiente para o seu desenvolvimento motor. No cenário atual,
muitos pais trabalham fora e, em outros casos, o pai ou mãe solteiro cuida das
crianças, ocasionando falta de tempo e de disposição para envolver as crianças
em exercícios físicos. Nesse contexto, não raro, a atividade física é trocada
por atividades passivas como a televisão e o computador.
Imagine que a criança esteja no período sensível para a aquisição das
habilidades fundamentais, entretanto, não receba incentivo para se engajar
em atividades físicas. O resultado mais provável é que essa criança não irá
desenvolver as habilidades fundamentais de forma eficiente, bloqueando as
etapas de desenvolvimento subsequentes, o que, por sua vez, prejudicará a
sua inserção em contextos esportivos e recreativos.
Além do encorajamento para a atividade física, as crianças também ne-
cessitam de um ambiente adequado para essa prática. Isso inclui recursos e
materiais disponíveis, por exemplo, se um bebê estiver em um ambiente que
não forneça o apoio necessário (uma mesa ou sofá) para ele se impulsionar e
ficar de pé, ele só irá se colocar na posição ereta quando desenvolver força e
equilíbrio suficientes na perna. Outro exemplo seria um bebê que more em
uma casa precária, de chão batido com cascalhos, em que ele talvez pule as
etapas de arrastar-se e engatinhar até que tenha força e equilíbrio nas pernas
para se colocar de pé. Nos dias atuais, cada vez mais, as crianças moram
em apartamentos ou bairros populosos e não possuem acesso a recursos e
ambientes em que possam correr, pular, arremessar, etc. Por esse motivo,
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elas ficam dependentes da disponibilidade de seus responsáveis de as levar


em um parque ou quadra esportiva, locais que permitem o desenvolvimento
de suas habilidades.
O ambiente adequado também deve estar presente nas aulas de educa-
ção física. Você deve atentar para o número de alunos, espaço e materiais
disponíveis. O número de alunos deve ser adequado para proporcionar um
aprendizado de qualidade para todas as crianças. Imagine, por exemplo, que
você queira ensinar a desenvolver a habilidade do chute em uma classe de 50
crianças. Dificilmente, você conseguirá dar a atenção necessária a cada aluno.
Além disso, você também necessita de um número de materiais adequado.
Se você quer ensinar o chute para turma de 15 crianças e só dispõe de uma
bola, o que irá ocorrer é que enquanto um aluno utiliza o material, todos os
outros estarão parados aguardando, resultando em um tempo muito pequeno
em que o aluno encontra-se realmente engajado na aprendizagem do chute.
A oportunidade para a prática que o encorajamento e o ambiente propor-
cionam não promove o desenvolvimento completo na maioria das crianças.
Para isso, é necessária uma instrução qualificada. Nesse contexto, o professor
é peça fundamental, pois, sem ele, muitas crianças não terão a chance de de-
senvolver suas habilidades fundamentais, aprimorá-las e inseri-las no contexto
esportivo e recreacional.

Durante muitas décadas discutiu-se sobre quais fatores exerciam maior influência no
desenvolvimento motor. Atualmente, respeita-se a importância de cada um dos fatores.
Parece que os fatores individuais atuam mais sobre a sequência dos aparecimentos
das habilidades motoras, ao passo que os fatores ambientais, sobre a época de seu
surgimento.

A chave para um bom entrosamento entre os fatores individuais e ambientais


é ser capaz de identificar quando o indivíduo está maduro para o aprendizado
e, então, possibilitar experiências motoras educativas.
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Referência

GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C. Compreendendo o desenvolvimento motor. 3. ed. São


Paulo: Phorte, 2005. 585 p.

Leituras recomendadas
GALLAHUE, D. L.; DONNELLY, F. C. Educação física desenvolvimentista para todas as
crianças. 4. ed. São Paulo: Phorte, 2008. 725 p.
MCCLENAGHAN, B. A.; GALLAHUE, D. L. Movimientos fundamentales: su desarrollo y
rehabilitación. 3. ed. Buenos Aires: Médica Panamericana, 1985. 223 p.
PAYNE, V. G.; ISAACS, L. D. Desenvolvimento motor humano: uma abordagem vitalícia.
6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. 470 p.

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