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Adorno (1946)
A Escola de Frankfurt nasceu no período entre guerras, com o intuito de tomar uma nova
direção relativamente às ideias de Marx. Considerava-se que as ideias deste não haviam
sido bem interpretadas e não estavam a ser bem utilizadas e, por isso, deviam ser re-
interpretadas e tomar uma nova direção. A Dialética do Iluminismo é escrita por Adorno e
Horkheimer e publicada em 1946, após a Segunda Guerra Mundial. Os autores refletem
acerca dos fundamentos da sociedade moderna e questionam-se acerca de quais seriam
as estruturas que estavam a impedir o pleno desenvolvimento da sociedade e do próprio
ser humano (porque é que, num mundo tão racional e desenvolvido, a tendência era
caminhar para a violência em vez de para a paz?).
O Conceito de Iluminismo
“Enlightment, understood in the widest sense as the advance of thought, has always
aimed at liberating human beings from fear and installing them as masters. Yet the wholly
enlightened earth is radiant with triumphant calamity. Enlightment’s program is the
disenchantment of the world”.
O Iluminismo nasce no século XVIII como atividade racional pensante. A natureza era
algo imprevisível, e por isso o ser humano gerava mitos para explicar aquilo que não
compreendia — o Iluminismo nasceu para tentar contrariar essa atitude humana, para
tentar racionalizar as coisas e explicar os fenómenos da Natureza, libertando-a da carga
mágica que lhe era atribuída (desmistificação do mundo). Este movimento tentou
emancipar os indivíduos e compreendê-los a eles e à Natureza sem ser pela religião (que
deixa de ser a base do conhecimento), mas a sociedade acabou por cair no totalitarismo.
Deste modo, o ser humano distancia-se da Natureza para eventualmente acabar por a
dominar. O homem torna-se um ser cognosciente, separado do mundo natural,
compreendendo-o através do pensamento e da reflexão racional: “Civilization is the
triumph of society over nature”. A lógica Iluminista indica que tudo aquilo que não for
possível ser reduzido a números não passa de uma ilusão.
No entanto, a partir do momento em que foram abertas as portas ao Iluminismo e à
racionalização, foram também abertas as portas à dominação do homem sobre a
natureza e do homem sobre o próprio homem, dominação esta que passa a ser tida como
natural. A Razão, que havia nascido com o intuito de ser uma ferramenta para entender a
realidade torna-se um princípio de dominação sobre as coisas e sobre os homens.
Adorno e Horkheimer não são contra o Iluminismo, mas acham que o pensamento
racional foi levado ao extremo, culminando nos piores regimes do século XX. Propõem o
uso da razão como forma de obter a verdade e conhecimento e não para fins utilitários ou
de dominação. Entendem a verdade como um fim em si mesmo, fonte de satisfação e
crescimento (libertação do indivíduo), e não como um instrumento para submissão da
sociedade.
Paradoxo do Iluminismo: como é que as sociedades humanas, tendo visto desde a sua
génese o pensamento racional a tornar-se a forma principal de compreender a sociedade
e a natureza, desembocaram numa total perversão da racionalidade que foi a ascensão
do nazismo e dos campos de concentração? (foram usados instrumentos racionais para
exterminar os judeus) — como é que o Iluminismo culminou no Holocausto, como é que
as massas educadas caíram nas mãos do despotismo?
As relações entre os seres humanos e até mesmo a relação dos indivíduos consigo
próprios são extremamente afetadas pela objetificação da mente: “(…) industrialism
makes souls into things”. Deixa de ser suposto uma pessoa ter uma alma ou um corpo
próprio para passar a ser meramente um objeto lógico. As qualidades do ser humano são
eliminadas e transformadas em funções que devem cumprir um objetivo racional.
A ordem social passa a ser estabelecida através da propriedade fixa, na qual há uma
dominação de um patrão sobre os seus trabalhadores, uma hierarquia e uma relação de
poder-submissão.
A Indústria da Cultura
“Technical rationality today is the rationality of domination. It is the compulsive character of
a society alienated from itself”. — apesar de estar extremamente racionalizada, a
sociedade é irracional.
Já não são os indivíduos que decidem por si próprios a qualidade das coisas, é a
sociedade e o capital que o fazem. Por exemplo, se um filme ou livro não forem best-
sellers, automaticamente parte-se do princípio de que não têm qualidade. Tudo se resume
a números.
O principal objetivo do entretenimento é evitar que as pessoas pensem, e fazer com que
fiquem aborrecidas ou abstraídas da realidade, nem que seja por um momento. O riso e o
humor presentes na indústria do entretenimento servem como instrumento para simular
uma felicidade que na verdade não existe ou é apenas momentânea. O indivíduo cola-se
à televisão a ver cartoons e a rir-se mas quando o programa acaba, acaba-se também o
momento de felicidade e o homem volta à sua vida rigidamente organizada. Para além do
riso, coloca-se a questão da violêcia. A sociedade moderna aceita/normaliza a crueldade
da violência através do cinema, dos cartoons, etc. — isto pode levar à mais fácil adesão a
movimentos totalitários.
Os filmes e a rádio não precisam de se fazer passar por arte. Não passam de um negócio,
produzem lixo intencionalmente. Os consumidores tornam-se meras estatísticas. Estes
meios acabam também por servir para promover os ideais dos chefes totalitários, como foi
o caso de Hitler, que falava muito pela rádio, com uma grande capacidade de persuasão.
As pessoas aderiam às suas palavras sem pensar muito sobre isso. Estavam formatadas
para ouvir algo e repeti-lo, para receber uma ideia ou uma opinião vinda do líder e aceitá-
la sem hesitação. Foi através desta racionalização extrema que o Iluminismo culminou no
totalitarismo: “On their way toward modern science, human beings have discarded
meaning”.
A cultura apresenta-se como um “bónus”, um prémio, sendo que os seus preços são
relativamente acessíveis a quase todos. Assim, as pessoas sentem-se agradecidas por
verem o seu intenso trabalho recompensado por momentos de lazer baratos. As
paisagens são invadidas por anúncios e o ser humano não consegue escapar da cultura
da indústria e da propaganda, sendo constantemente sujeitado a consumir conteúdo. No
entanto, não se importa. As pessoas querem ser “felizes” e em troca aceitam dedicar-se
totalmente à causa que está a promover essa “felicidade” (neste caso, movimentos
totalitários). É por isto que aceitam ver a sua vida extremamente racionalizada e
organizada, com horários para absolutamente tudo, para trabalhar, para descansar, para
ver um filme.
Trabalho = esforço individual e pensamento lógico, racional, é uma atividade sem sentido,
as pessoas trabalham apenas para ganhar dinheiro para sobreviver — conformismo.
Lazer = momento de desligar do trabalho, de não pensar, isento de qualquer
racionalidade — passividade (esta passividade acaba por ser um pouco contraditória, pois
tudo na cultura do entretenimento deve ser racionalizado e lógico para submeter as
pessoas a um processo que, na verdade, não tem absolutamente nada de racional, que é
o de os manter entretidos e distraídos).
Anti-Semitismo
Gera-se um sentimento de paranóia coletiva (neste caso, relativamente aos judeus) que
favorece o exercício da dominação por parte dos líderes totalitários: “Thought becomes
short-winded, confines itself to apprehending isolated facts”. O pensamento reduz-se a
conhecimento e o pensamento crítico e a auto-reflexão são inibidos, não deixando espaço
para mais nenhuma ideia que não a do líder.
Novamente uma enorme contradição: num sistema tão racional, as pessoas tornam-se
absolutamente cegas e irracionais: “In the world of mass production, stereotypes replace
intellectual categories. Judgment is no longer based on a real act of synthesis but on blind
subsumption”.