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LICENCIATURA EM PSICOLOGIA
Ano letivo 2022/2023

Joana Conceição 2020235445

PTA | Joana Conceição


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ÍNDICE

AULA 1 – 7 FEVEREIRO ......................................................... 1


AULA 2 – 14 FEVEREIRO ....................................................... 2
AULA 3 – 28 FEVEREIRO ..................................................... 20
AULA 4 E 5 – 7 E 14 MARÇO ................................................ 36
AULA 6 – 21 MARÇO ........................................................... 52
AULA 7 – 28 MARÇO ........................................................... 60
AULA 8 – 11 ABRIL ............................................................. 72
AULA 9 – 18 ABRIL ............................................................. 81
AULA 10 – 2 MAIO .............................................................. 94
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AULA 1 – 7 FEVEREIRO

Saúde mental e Estigma associado

Reflexão sobre o vídeo apresentado

• Questões culturais influenciam a forma como se vê a saúde mental.


• Pessoas com problemas de saúde mental são vistas como “loucas”
• Países com baixo nível económico e/ou em guerra não tem recursos a nível de saúde
(física mas principalmente mental) vulnerabilidade vista como fraqueza

Estudo Epidemiológico Nacional de Saúde Mental


(Caldas de Almeida e Xavier, 2013)

Ø Mais de um em cada 5 dos indivíduos da amostra apresentava uma


perturbação psiquiátrica, nos 12 meses anteriores à entrevista (segunda
prevalência mais alta, a nível Europeu)
Ø As Perturbações de Ansiedade são o grupo com maior prevalência (16.5%)
o As Fobias específicas (8.6%), a Perturbação Depressiva Major
(6.8%), a POC (4.4%) e a Perturbação de Stress Pós Traumático
(2.3%) são as perturbações psiquiátricas mais frequentes na
população estudada.
o As mulheres apresentam maior número de Perturbações
Depressivas e Perturbações de Ansiedade, do que os homens.
Ø Um ano após o começo da perturbação, mais de metade dos indivíduos
ainda não tinha obtido qualquer tratamento
o A mediana do tempo de espera para o tratamento era de 4 anos nos
casos de Depressão Major e de 2 a 3 anos no caso da PP e da PAG
Ø Elevado número de indivíduos a consumirem psicofármacos.
o Quase 1⁄4 das mulheres e 1/10 dos homens da população geral
referiram o uso de ansiolíticos no ano anterior.
o Os ansiolíticos são tomados não só por pessoas com diagnóstico de
Perturbações de Ansiedade, mas também por pessoas com
diagnóstico de Perturbações Depressivas
o 1/10 das mulheres e quase 4% dos homens da população geral usou
antidepressivos nos 12 meses anteriores, quer por Perturbações
Depressivas quer por Perturbações de Ansiedade

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AULA 2 – 14 FEVEREIRO

Medo e Ansiedade

Medo

ü Processo cognitivo
ü Baseia-se numa avaliação de um perigo atual ou
pertenciam numa dada situação (perceção de ameaça)
ü É ativado quando uma pessoa é exposta física ou
psicologicamente a uma situação que considera ameaçadora ou
quando pensa ou fala dessa situação

Ansiedade

ü Resposta emocional à avaliação envolvida no medo


ü Refere-se a sentimentos subjetivos desagradáveis e
sintomas fisiológicos
ü É ativado quando uma pessoa é exposta física ou
psicologicamente a uma situação que considera ameaçadora
ou quando pensa ou fala dessa situação

As palavras “ansiedade” e “angústia”” derivam do termo


grego “agkhô” (αγχθ), que significa estrangular, sufocar,
oprimir.

Sintomas de ansiedade:
Comportamentos de segurança
ü Sintomas cardiopulmunares
o Palpitações Mecanismo de coping desadaptativo
o taquicardia uma vez que não promovem o
o Dispneia confronto com o medo
o sensação de sufocamento (Exemplo: num fóbico social, um
o dor no peito comportamento de segurança, seria, por
ü Sintomas gastrointestinais exemplo, sair sempre com um amigo ou
o sensação de peso de fonte para que os outros não
percebam a sua ansiedade)

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o dor
o náusea
o bolo isofágico (dificuldade em deglutir)
o diarreia
ü Sintomas urinários
o micção frequente
o retenção urinária
ü Sintomas neurológicos
o cefaleias
o vertigens
o tremores
o parestesias
o visão turva
o instabilidade na postura ereta e na marcha

Ansiedade como resposta humana comum com uma função adaptativa e


protetora (que é necessário descobri em cada um):

§ Em quantidade moderada, pode servir para motivar e mobilizar o


indivíduo
§ Reação normal e adequada, quando é desencadeada por uma
interpretação de um perigo real e se dissipa após o perigo ter passado

Ansiedade enquanto mecanismo de resposta implicado na sobrevivência


humana:

§ A ansiedade dar-nos-ia uma vantagem evolutiva que deve ter


contribuído para a adaptação a um meio hostil, preparando-nos para
fugir ou nos defendermos de ameaças (apesar disto, muitas vezes, o
que pensamos é que torna a situação ameaçadora – a psicoterapia tem
um papel nessa consciencialização)

A ansiedade como:
Ø um mecanismo primitivo e automático de
proteção e alerta
Ø alerta para a possibilidade de o indivíduo
se ferir, induzindo-o a parar qualquer
atividade imprudente, protegendo-se

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Paradigma de “reação luta-fuga” de Cannon (1929-935)

Estudou os processos fisiológicos


Homeostase
envolvidos na manutenção da
homeostase. Condição de estabilidade que o
A resposta de luta-fuga corresponde à organismo necessita para
situação em que o indivíduo percebe que realizar as suas funções em
está a ser ameaçado, e ou luta ou foge. equilíbrio com o corpo através
de processos fisiológicos;
Fisiologicamente envolve uma série de
acontecimentos que começam com a processo d regulacao que
estimulação do: mantém o organismo em
constante equilíbrio
• Sistema Nervoso
• Sistema Endócrino.

Nalgumas circunstâncias a resposta de luta-fuga pode


ser adaptativa, porque o organismo é preparado para
ter uma resposta rápida às ameaças físicas. Mas esta
mobilização rápida tem custos, pois perturba o
funcionamento normal e, quando é mantida por
muito tempo, pode levar ao esgotamento das reservas
de energia e potencialmente resultar em problemas de
saúde. As ameaças com uma certa magnitude (níveis de stress críticos)
perturbam a homeostase normal.

Ansiedade enquanto problema clínico:


perturbações de ansiedade
Enquanto que em níveis baixos ou
moderados, a ansiedade é adaptativa, Perturbação de Ansiedade
ajudando-nos na preparação para um
corresponde a uma reação
desafio (exemplo:para um teste
excessiva de mecanismos
escolar), em níveis demasiado
primitivos de defesa, que foram
elevados de ansiedade, a
úteis em termos evolutivos para a
concentração e o desempenho são
espécie humana, mas que
prejudicados e o indivíduo começa a
atualmente podem ser mal
experienciar vários graus de
adaptativos. (Beck)
invalidação no seu quotidiano.

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O pensamento do doente As Perturbações de Ansiedade diferem


entre si:
ansioso é dominado por
temas de perigo, antecipando • nos tipos de objetos ou situações que
para si ou para pessoas induzem medo, ansiedade ou
próximas ameaças físicas, comportamentos de evitamento
psicológicas ou sociais (a (evitamento é comum a todas as
ansiedade é desproporcional e perturbações de ansiedade)
exagerada) • na ideação cognitiva associada.

O indivíduo pode preencher os critérios para uma ou mais perturbações de


ansiedade, dependendo:

ü do foco da apreensão ansiosa


ü dos componentes cognitivos e comportamentais da ansiedade

Perturbações de Ansiedade

1. Perturbação de Pânico
2. Agorafobia
3. Fobia Específica
4. Perturbação de Ansiedade Social (Fobia Social)
5. Perturbação de Ansiedade Generalizada (PAG)
6. Perturbação de Ansiedade de Separação Mutismo Seletivo
7. Perturbação de Ansiedade induzida por substâncias/medicação
8. Perturbação de Ansiedade devida a outras condições médicas
9. Outra Perturbação de Ansiedade especificada
10. Perturbação de Ansiedade não especificada

1. Perturbação de Pânico

O indivíduo experiencia ataques de pânico inesperados


e preocupa-se persistentemente acerca de ter mais
ataques de pânico ou há alterações mal-adaptativas no
seu comportamento devido aos ataques de pânico
[exemplo: evitar fazer exercício físico devido à perceção
de ameaça pela ativação dos fatores físicos que causa
(calor, respiração desregular, taquicardia); locais que não
lhe sejam familiares].

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Ataques de Pânico (diferente de PP)

É um período discreto, no qual se inicia, de modo súbito, intensa apreensão, medo ou


terror, associados com sensações de catástrofe iminente.

Durante estes ataques, estão presentes sintomas como:


o falta de ar,
o palpitações,
o desconforto ou dor no peito,
o sensações de sufoco
o medo de "enlouquecer" ou de perder o controlo
o ...

2. Agorafobia

Ansiedade e medo acerca de 2 ou mais das seguintes situações:

a) Usar transportes públicos


b) Estar em espaços abertos
c) Estar em espaços fechados
d) Permanecer em filas ou multidões
e) Estar fora de casa sozinho

O indivíduo receia estas situações porque tem pensamentos de que a fuga


pode ser difícil e a ajuda pode não estar disponível no caso de ter
sintomas semelhantes ao pânico ou outros sintomas incapacitantes ou
embaraçosos (exemplo: medo a elevadores). Estas situações quase sempre
causam medo ou ansiedade e frequentemente são evitadas e requerem a
presença de uma companhia.

3. Fobia Específica

Ansiedade clinicamente significativa


provocada pela exposição a uma
situação ou objeto temido, que
frequentemente conduz ao
comportamento de evitamento;
medo, ansiedade ou evitamento de
objetos ou situações específicos que
quase sempre são induzidos

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imediatamente à exposição à situação fóbica num grau que é persistente e


desproporcional ao risco (há vários tipos de fobias específicas: animal,
ambiente natural, sangue-injeções, ferimentos, situacional, e outras situações).

4. Fobia Social ou Perturbação de Ansiedade Social

O indivíduo tem medo, ansiedade ou evitamento de interações sociais e


situações que envolvem a possibilidade de escrutínio por parte do outros
(medo de “cair no ridículo”).

Estas interações sociais incluem:


• encontrar-se com pessoas
desconhecidas,
• situações nas quais o indivíduo pode ser
observado a comer ou beber,
• etc.

O indivíduo pensa que está a ser negativamente avaliado pelos outros,


embaraçado, humilhado, rejeitado ou ofendido.

5. Perturbação de Ansiedade Generalizada (PAG)

Ansiedade persistente e excessiva e preocupação acerca de vários domínios,


incluindo trabalho e escola que o indivíduo tem dificuldade em controlar.

Adicionalmente o indivíduo experiencia sintomas físicos,


incluindo:
• dificuldade em descansar
• fadiga fácil
• dificuldade em se concentrar
• irritabilidade
• tensão muscular
• perturbação do sono.

6. Perturbação da Ansiedade Provocada por Outra Condição

Médica

Sintomas de ansiedade proeminentes, que são considerados como


consequência fisiológica direta de outra condição médica.

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7. Perturbação da Ansiedade Induzida por

Substância/Medicação

Sintomas de ansiedade proeminentes, que são considerados como


consequência fisiológica direta do abuso de drogas ou de tratamentos
medicamentosos.

8. Perturbação da Ansiedade sem Outra Especificação

É incluída para codificar as perturbações com ansiedade ou evitamento fóbico


proeminentes, que não preenchem os critérios de nenhuma Perturbação da
Ansiedade específica.

9. Perturbação por Ansiedade de Separação (PAS)

Ansiedade relacionada com a separação das figuras


parentais ou de vinculação, habitualmente desenvolvida na
infância (apesar de se poder manifestar nos adultos), que
se caracteriza por um medo persistente ou ansiedade
acerca de algo de mal poder acontecer a figuras de
vinculação significativas e resultar em:
• perda ou separação
• relutância em se separar de figuras de vinculação,
• pesadelos
• sintomas físicos

Alterações no DSM-5 relativamente às Perturbações de Ansiedade

Ø Os diagnósticos de POC, Perturbação Aguda de Stress e PSPT, foram


colocados em novos capítulos.
Ø O diagnóstico de Agorafobia, Fobia Específica e Fobia Social deixou de
exigir que o indivíduo com mais de 18 anos reconheça o seu medo como
excessivo ou irracional, visto que muitos doentes tendem a sobrestimar
o perigo oferecido pelo objeto ou evento fóbico em questão. A duração
mínima para o diagnóstico dessas perturbações passa a ser de seis
meses para todas as idades
Ø A Perturbação de Pânico e a Agorafobia tornaram-se diagnósticos
independentes, reconhecendo a existência de casos nos quais a
Agorafobia ocorre sem a presença de sintomas de pânico.

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Ø A observação de que o ataque de pânico pode ocorrer em em outras


perturbações mentais, que não as Perturbações de Ansiedade, fez com
que o DSM-5 incluísse o ataque de pânico como especificador para
todas as demais perturbações .
Ø A Perturbação de Ansiedade de Separação (PAS) e o MS saíram do
(extinto) capítulo das “Perturbações Geralmente Diagnosticadas pela
Primeira Vez na Infância ou na Adolescência” e passaram a pertencer
às Perturbações de Ansiedade. Os critérios diagnósticos para a PAS
são semelhantes aos da versão anterior do manual, mas aceitam que
os sintomas tenham início em indivíduos com mais de 18 anos.

Críticas ao DSM-5

1) Revela dificuldades na diferenciação entre o normal e o patológico.


2) Embora pretenda ser ateórico, assenta demasiado no modelo biomédico,
sendo saliente a necessidade de se considerarem outros modelos, como
modelos mais psicossociais e contextuais.
3) Um dos pontos mais vulneráveis centra-se nas elevadas taxas de
comorbilidade, o que de certa forma acaba por se contrapor à aparente”
arrumação” das categorias diagnósticas.
4) O facto de os sintomas serem bastante inespecíficos e flutuantes ao longo
do tempo torna problemática e, em certa medida, arbitrária a separação
conceptual e prática das perturbações.
5) As classificações diagnósticas devem ser vistas como instrumentos
provisórios que vão sofrendo alterações

Elevada comorbilidade entre Perturbações de Ansiedade (DSM-5).

Nos adultos, as comorbilidades comuns incluem FE, PSPT, PP, PAG, FS,
Agorafobia, entre outras.

• No caso da prevalência da PP, esta é elevada em indivíduos com outras


perturbações, particularmente outras Perturbações de Ansiedade (e
sobretudo Agorafobia)
• A maioria dos doentes com Agorafobia também tem outras
perturbações mentais. Os diagnósticos adicionais mais frequentes
incluem outras Perturbações de Ansiedade, Perturbações Depressivas,
PSPT e Perturbação de Uso de Álcool.

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• Em relação às comorbilidades em doentes com o diagnóstico de PAG,


é provável que tenham preenchido, ou preencham, critérios para o
diagnóstico de outras Perturbações de Ansiedade .

Tal como em adultos, as Perturbações de Ansiedade em crianças apresentam


frequentemente comorbilidade entre elas

História dos Conceitos de Pânico e de

Agorafobia

Hipócrates fez descrição mais antiga


Pan - Deus grego da
conhecida de um doente agorafóbico.
fertilidade
◉ Termo agorafobia: usado pela primeira
Agora - termo grego que vez por Westphal (1871), para descrever um
significa lugares de medo específico de espaços grandes e
ajuntamento público abertos.

A Perturbação de Pânico aparece pela primeira vez na DSM-III


§ reaparece novamente na DSM III-R e DSM IV
§ continua a ser descrita na DSM-V

Perturbação de Pânico: “problemas de saúde pública”

Segundo estudos epidemiológicos, 10% da população geral experimentou


alguma vez um Ataque de Pânico

ü Sem tratamento adequado, tem mau prognóstico


ü Consequências negativas para a qualidade de vida
o sofrimento muito acentuado
o limitação na vida do doente
o incapacidade em diferentes áreas da vida do doente
ü Os doentes com PP são os que procuram com mais frequência ajuda
terapêutica
ü É caracterizada por:
o manifestações somáticas muito intensas
o Perceção subjetiva de descontrolo
ü Tem sido muito investigada e têm surgido abordagens terapêuticas
eficazes

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Ataque de Pânico

Período discreto de medo ou desconforto intenso,


durante o qual quatro (ou mais) dos seguintes sintomas
se desenvolvem abruptamente e atingem o seu pico
dentro de 10 minutos:

1. palpitações, batimentos cardíacos ou ritmo cardíaco acelerado


2. suores
3. estremecimentos ou tremores
4. dificuldades em respirar
5. sensação de sufoco
6. desconforto ou dor no peito
7. náuseas ou mal-estar abdominal
8. sensação de tontura, de desequilíbrio, de cabeça oca ou de desmaio
9. desrealização (sensações de irrealidade) ou despersonalização (sentir-
se desligado de si próprio)
10. medo de perder o controlo ou de enlouquecer (11) medo de morrer
11. parestesias (dormências ou formigueiros)
12. sensação de frio ou de calo

Nota:
- Codificar o diagnóstico específico em que ocorre o Ataque de Pânico.
- Sintomas específicos da cultura (p. ex., tinido, dor na nuca, dor de cabeça,
gritos ou choro descontrolado) não devem ser contabilizados como um dos
quatro sintomas requeridos.

Tipos de ataques de pânico:

Ataques de pânico Ataques de pânico inesperados


esperados
Ataques de pânico inesperados são
Ataques de pânico aqueles para os quais não há um
esperados são ataques para desencadeador óbvio no momento da
os quais existe um ocorrência (p. ex., quando em
desencadeador óbvio. relaxamento ou durante o sono (ataque
de pânico noturno).

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Importante: São necessários ataques de pânico inesperados recorrentes para


um diagnóstico de perturbação de pânico.

Os ataques de pânico podem ocorrer no contexto de outra perturbação mental,


como, por exemplo:
o Perturbações de ansiedade
o Perturbações depressivas
o Perturbações bipolares
o Perturbações alimentares
o Perturbação obsessivo- compulsivo
o Perturbações da personalidade
o Perturbações psicóticas
o Perturbações de uso de substâncias

Os ataques de pânico podem ocorrer no contexto de algumas condições


médicas, não satisfazendo os critérios para perturbação de pânico, como, por
exemplo:
o Cardíaca
o Respiratória
o Vestibular
o Gastrintestinal

Perturbação de Pânico

Critérios de Diagnóstico segundo o DSM-5

A. Ambos (1) e (2):


1. Ataques de Pânico inesperados e recorrentes
2. pelo menos um dos ataques foi seguido por um mês (ou mais) de um
(ou mais) do seguinte:
a. preocupação persistente acerca de ter ataques adicionais
b. preocupação acerca das implicações dos ataques ou das suas
consequências (por exemplo, perder o controlo, ter um ataque de
coração ou «enlouquecer»)
c. uma alteração significativa no comportamento relacionado
com os ataques (p.exemplo, comportamentos que têm como

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finalidade evitar ter ataques de pânico, como evitar fazer


exercício físico)
B. Os Ataques de Pânico não são provocados pelos efeitos fisiológicos diretos
de uma substância (por exemplo, abuso de droga, medicação) ou um
estado físico geral (por exemplo, hipertiroidismo).
C. Os Ataques de Pânico não são melhor explicados por outra perturbação
mental

Em contexto de consulta:

Ø Começar por perguntar sobre os sintomas de forma simplificada e


explorar todos os sintomas, enquanto perguntamos vamos dando
psicoeducação (explicar os conceitos e sintomas possíveis).
Ø Pedir para descrever um último, primeiro ou pior ataque de pânico
(quanto tempo durou, o que pensava, onde estava, o que aconteceu- e
não tanto o porquê) e habitualmente começa a perceber se uma
redundância entre os ataques de pânico.
Ø Questionar sobre o ambiente/contexto mais próximo, se convive com
algo semelhante (vulnerabilidade genética) e como lidam com a sua
ansiedade as crenças dos familiares mais próximos podem amplificar a
catastrofização (vulnerabilidade de contexto).
Exemplo: no caso de uma superproteção por parte da mãe, será bom ter
uma consulta conjunta com a mãe e perceber também as crenças da
mãe.
Ø Perceber o curso dos ataques pânico, que mudanças fez na sua vida e
conhecer a sua teoria sobre os seus próprios ataques de pânico

Prevalência:

• As taxas da perturbação apresentam aumento gradual durante a


adolescência, em particular no sexo feminino, e alcançam um pico
durante a idade adulta.
o Indivíduos do sexo feminino são afetados mais frequentemente do
que os do masculino, numa proporção de 2:1.

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o A diferenciação de género ocorre na adolescência e já é observável


antes dos 14 anos de idade.
o Embora ocorram ataques de pânico em crianças, a prevalência geral
do transtorno é baixa antes dos 14 anos (< 0,4%).
• As taxas de prevalência diminuem em indivíduos mais velhos (i.e., 0,7%
em adultos acima de 64 anos), refletindo uma diminuição na gravidade
até níveis subclínicos.
• Na população em geral, a estimativa de prevalência em 12 meses nos
Estados Unidos e em vários países Europeus é de 2 a 3% em adultos e
adolescentes (APA, 2014).
• 2.4 a 2.7% de prevalência em 12 meses (Arch, Landy & Craske, 2013)

Desenvolvimento e Curso:

ü A idade média de início, nos Estados Unidos, é de 20 a 24 anos (APA,


2014).
ü Idade de início entre os 21 e os 23 anos (Arch, Landy & Craske, 2013)
ü Um pequeno número de casos começa na infância, e o início após os
45 anos é incomum, mas pode ocorrer
o Embora a PP seja muito rara na infância, a primeira ocorrência
de "períodos de medo" com frequência remonta a esse período
de desenvolvimento.
o Como nos adultos, a PP em adolescentes tende a ter um curso
crónico e é frequentemente comórbida com outras perturbações
de ansiedade, perturbação depressiva e perturbação bipolar.
ü O curso habitual, se a perturbação não for tratada, é crónico, mas com
oscilações. Alguns indivíduos podem ter surtos episódicos com anos de
remissão entre eles, e outros podem ter sintomatologia grave contínua.
Apenas uma minoria dos indivíduos tem remissão completa sem recaída
subsequente no espaço de poucos anos

Comorbilidade:

§ A Perturbação Depressiva Major ocorre frequentemente em indivíduos


com P.P. (50 a 65%)

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§ Perturbação de Ansiedade Generalizada em cerca de 25%


§ Perturbação Obsessivo- compulsiva em 8 a 10%
§ Fobia Específica em 10 a 20%
§ A Perturbação de Ansiedade de Separação na infância também se
associa com a P.P.
§ A Fobia Social tem sido descrita em 15 a 30% de indivíduos com P.P
§ Comorbilidade com Perturbação Relacionada com Substâncias

Diagnóstico Diferencial

Ø Com Problemas Orgânicos:

A presença de um Problemas orgânicos que podem causar A.P.:


problema orgânico
• Epilepsia do lóbulo temporal
não exclui
• Situações cardíaca
necessariamente a
• Prolapso da válvula mitral
possibilidade de um
• Hipoparatiroidismo
doente ter uma P.P.,
• Hiperventilação
pelo contrário, é até
• Intoxicação por cafeína
frequente que se
• Hipoglicémia
estabeleça uma
• Disfunções do sistema audiovestibular
interação entre
• Feocromocitoma
ambos.

Ø Com outras Perturbações de Ansiedade:

No diagnóstico diferencial com outras Perturbações de Ansiedade é importante


ter em conta:
Ø P. Obsessivo- Compulsiva?
1. O conteúdo do medo Ø Hipocondria?
2. O tipo de Ataques de Pânico Ø P. Pós Stress Traumático?
3. O número de situações Ø Depressão?
evitadas Ø P. Pânico: diagnóstico diferencial?
Ø P. Ansiedade Generalizada?
4. O grau de ansiedade contínua
Ø Fobia Social ?
ou generalizada
Ø Fobia Simples?

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Problema da entidade nosológica da Perturbação de Pânico

1) Os Ataques de Pânico podem estar presentes em muitas outras


Perturbações
2) Os limites entre o pânico e uma ansiedade intensa continuam a não ser
claros
3) O critério quantitativo de ter pelo menos 4 dos 13 sintomas para o
diagnóstico de P.P. continua a ser arbitrário.
4) Alguns autores têm salientado que as bases para estabelecer os
diagnósticos diferencias da Perturbação de Pânico e da Perturbação de
Ansiedade Generalizada são insatisfatórios.
5) Há quem afirme que os Ataques de Pânico são simplesmente um índice de
gravidade de uma perturbação de ansiedade.
6) Ha autores que salientam que todos os Ataques de Pânico conduzem a um
certo “evitamento” e que pode ser difícil identificar o ponto em que este
evitamento é suficiente para que uma pessoa deixe de ter o diagnóstico de
Perturbação de Pânico e passe a ter uma P.P. (?) e Agorafobia

Causas da Perturbação de Pânico

Causas genéticas Causas bioquímicas

Influência de fatores hereditários os Há um aumento da atividade dos


gémeos monozigóticos têm uma sistemas transmissores
prevalência maior, entre si, de P.P. do noradrenérgico e serotoninérgico
que os gémeos dizigóticos

Causas relação com acontecimentos de vida

Encontra-se um maior número de acontecimentos de vida perturbadores


(essencialmente de perda ou ameaça) em indivíduos com P.P. do que em
indivíduos normais.

Os doentes com P.P. são mais perturbados pelos acontecimentos de vida do


que as outras pessoas, considerando-os como mais indesejáveis e
incontroláveis, o que por sua vez leva a uma diminuição substancial da auto-
estima

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Modelos explicativos da P. Pânico

Modelos biológicos Modelos psicológicos

Preconizam que: Baseiam-se em teorias:


• Há uma diferença qualitativa entre o • Psicanalíticas
pânico e outras formas de • Cognitivo-comportamentais
ansiedade. (uns que realçam mais o
• Há um substrato fisiológico, uma papel do condicionamento,
anomalia fisiológica do SN para a outros que são mais
qual existe uma vulnerabilidade cognitivos)
genética

Agorafobia

Critérios de Diagnóstico segundo o DSM-5

A. Medo ou ansiedade marcantes acerca de 2 (ou mais) das


5 situações seguintes:
ü Permanecer em espaços abertos (p.ex.,
mercados, pontes, de desenvolvimento de
sintomas semelhantes ao pânico)
ü Permanecer em locais fechados (p.ex., lojas,
teatros, cinemas)
ü Permanecer numa fila ou no meio de uma
multidão
ü Sair de casa sozinhos
B. O indivíduo tem medo ou evita essas situações devido a pensamentos de
que pode ser difícil escapar ou de que o auxílio pode não estar
disponível no caso de desenvolver sintomas do tipo pânico ou outros
sintomas incapacitantes ou constrangedores (p. ex., medo de cair nos
idosos; medo de incontinência).
C. As situações agorafóbicas quase sempre provocam medo ou ansiedade.

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D. As situações agorafóbicas são ativamente evitadas, requerem a


presença de uma companhia ou são suportadas com intenso medo ou
ansiedade.
E. O medo ou ansiedade é desproporcional ao perigo real apresentado
pelas situações agorafóbicas e ao contexto sociocultural.
F. O medo, ansiedade ou evitamento são persistentes, geralmente durando
mais de seis meses.
G. O medo, ansiedade ou evitamento causam sofrimento clinicamente
significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em
outras áreas importantes da vida do indivíduo.
H. Se outra condição médica (p. ex. doença inflamatória intestinal, doença
de Parkinson) está presente, o medo, ansiedade ou evitamento são
claramente excessivo.
I. O medo, ansiedade ou evitamento não são melhor explicado pelos
sintomas de outra perturbação mental. Por exemplo:
ü os sintomas não estão restritos a fobia específica, tipo situacional;
ü não envolvem apenas situações sociais (como na perturbação de
ansiedade social);
ü não estão relacionados exclusivamente com obsessões (como na
perturbação obsessivo-compulsiva)
ü não estão relacionados exclusivamente com perceção de defeitos
ou falhas na aparência física (como na perturbação dismórfica
corporal)
ü não estão relacionados exclusivamente com medo de separação
(como na perturbação de ansiedade de separação).

Nota: A agorafobia é diagnosticada independentemente da presença de


perturbação de pânico. Se a apresentação de um indivíduo satisfaz os critérios
para perturbação de pânico e agorafobia, ambos os diagnósticos devem ser
dados.

Prevalência

• A prevalência ao ano: 1,7% dos adolescentes e adultos têm um


diagnóstico de agorafobia.

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• Pessoas do sexo feminino têm uma probabilidade duas vezes maior do


que as do masculino de apresentar a perturbação.
• A agorafobia pode ocorrer na infância, mas a incidência atinge o pico no
fim da adolescência e início da idade adulta.
• As taxas de prevalência não parecem variar sistematicamente entre
grupos culturais/raciais

Desenvolvimento e Curso

• A percentagem de indivíduos com agorafobia que relatam ataques de


pânico ou perturbação de pânico antes do início de agorafobia varia de
30% nas amostras da comunidade a mais de 50% nas amostras
clínicas.
• Em dois terços de todos os casos de agorafobia, o início ocorre antes
dos 35 anos.
• Existe um risco substancial de incidência no fim da adolescência e
início da idade adulta, com indicações para um segundo pico de
incidência depois dos 40 anos.
• O início na infância é raro. A idade média geral de início para agorafobia
é 17 anos, embora a idade de início sem ataques de pânico ou
perturbação de pânico anterior seja de 25 a 29 anos.
• O curso da agorafobia é tipicamente persistente e crónico. A remissão
completa é rara (10%), a menos que a doença seja tratada.
• Uma série de outras perturbações (perturbações de ansiedade,
perturbações depressivas, perturbações por uso de substâncias e
perturbações da personalidade), podem complicar o curso da
agorafobia.
• O seu curso de longo prazo e sua evolução estão associados a um risco
substancialmente elevado de perturbação depressiva major
secundária, distimia e perturbações de uso de substâncias.

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20

AULA 3 – 28 FEVEREIRO

A ansiedade e as perturbações ansiosas

Medo

Corresponde a um processo cognitivo definido pela perceção ou avaliação de


um perigo atual/real ou potencial numa dada situação (por exemplo: ser rejeitada,
ser posta de parte, “a maior dor que um ser humano pode sentir é a rejeição de um
ser significante”) .
É ativado quando uma pessoa é exposta física ou psicologicamente a uma situação
que considera a ameaçadora ou quando pensa ou fala acerca dessa situação.

Respostas ao medo que funcionam automaticamente:


1. Fuga
2. Luta
3. Congelamento ou Freezing

“Na guerra, não há heróis nem cobardes” uma vez que a nossa respostas a perigos
externos é automática e impulsiva.

A ansiedade é conceptualizada como uma resposta evolucionária


complexa à perceção/avaliação de uma ameaça.

Componentes da ansiedade

Nível vegetativo Nível motor

corresponde à manifestação a ansiedade motora é composta


orgânica da ansiedade; pelas manifestações de ansiedade
visíveis a nível do comportamento;

Nível cognitivo

a ansiedade cognitiva define a preocupação, os pensamentos ou uma


sucessão de pensamentos dolorosos, desagradáveis que se traduzem,
geralmente, num medo difuso perante perigos reais ou imaginários.

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Ansiedade enquanto resposta adaptativa

A ansiedade enquanto resposta adaptativa corresponde a um mecanismo

primitivo e automático de alarme e de defesa e proteção em relação à ameaça


que possibilita que o indivíduo se defenda, induzindo-o a reagir. No entanto,
esta mobilização rápida tem custos, pois pode perturbar o funcionamento
normal do indivíduo;

A ansiedade corresponde a uma resposta evoluída que permitiu a adaptação


a um meio hostil e repleto de perigos, preparando-nos para reagir de modo
automático face às ameaças (e.g., fugir ou lutar). A resposta ansiosa é a
reação adequada para lidar com uma situação de perigo real e tende a
dissipar-se quando o perigo cessa. Num grau moderado a ansiedade pode
servir para mobilizar o indivíduo em direção a determinados fins adaptativos.

Nós precisamos de algum nível de


ansiedade para nos ativar, para
nos levar a agir e fazer algo
(gráfico). Níveis elevados de
ansiedade estão relacionados a
uma performance maior.

Temos a necessidade de nos afiliarmos desde bebés (para obter mais


recursos) e por isso é que a opinião dos outros é importante e modelamos o
nosso comportamento de acordo com as normas sociais, devendo ser
modelado de forma adaptativa. Ser rejeitado, ser posto de parte, é “a maior dor
que um ser humano pode sentir é a rejeição de um ser significante” e, por isso,
muitas vezes sentimos uma certa ansiedade normativa nas nossas interações
sociais, porque podem representar um risco de rejeição.

Sumário Ansiedade e Perturbações Ansiosas


1. A ansiedade representa um padrão complexo de respostas que envolve
alterações cognitivas, afetivas, fisiológicas, comportamentais e
motivacionais;

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2. A ansiedade representa um legado evolucionário e a sua importância


para a adaptação e sobrevivência não deve ser subestimada;
3. A perceção de ameaça é um antecedente cognitivo da ansiedade;

4. Existe uma continuidade entre ansiedade normal e ansiedade patológica,


sendo a diferença mais de grau do que de tipo;
5. Na ansiedade patológica há uma perceção enviesada e sobreavaliada de
ameaça ou perigo, ou seja, há um enviesamento de um perigo real de uma
determinada situação, enquanto que na ansiedade normal há uma
correspondência entre a avaliação de ameaça e os perigos objetivos do
meio ambiente (Exemplo: quando vemos um leoa ficamos ansiosos e esta
resposta é qualitativamente igual as respostas dadas nas fobias específicas
e ansiógenas; a diferença é a primeira resposta é adequada e adaptativa
ao perigo real e a resposta nas fobias específicas e ansiógenas é um
enviesamento a um perigo)
6. As perturbações ansiosas são mediadas pela ansiedade;
7. Nas perturbações ansiosas existe um enviesamento no processamento
de informação ameaçadora a nível da atenção, interpretação e memória.
8. As perturbações de ansiedade são uma reação excessiva de
mecanismos primitivos de defesa, que foram úteis em termos evolutivos
para a espécie humana, mas que atualmente podem ser mal adaptativos
(Exemplos: uma fobia a aranhas que levou à vontade de desistir do curso
e uma fobia a elevadores ser um impedimento de frequentar aulas pela
necessidade de usar elevadores são exemplos que mostram o impacto da
ansiedade não adaptativa)

As Perturbações de Ansiedade segundo o DSM-5

Ø Um indivíduo pode preencher critérios para uma ou mais perturbações


de ansiedade, existindo uma alta comorbilidade entre as diferentes
perturbações de ansiedade (coexistência de perturbações de ansiedade
numa mesma pessoa); O diagnóstico depende do foco da apreensão
ansiosa e dos componentes cognitivos e comportamentos de ansiedade; é

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23

possível diferenciar os diferentes quadros ansiosos através de uma


observação rigorosa da tipologia de situações que são geradoras de medo
ou evitadas e pela análise do contexto cognitivo (pensamentos e crenças)
associado a estes comportamentos.

O difícil não é compreender as perturbações mas fazer um diagnóstico para


especificar que tipo de perturbações ou fobia específica.
Um ataque de pânico, por exemplo, pode Exemplo: não dizem “tenho uma
estar presente numa: fobia específica; dizem
• perturbação de pânico • “Sou muito nervoso (nervosos

(sintomas de pânico) são os bichos, nós temos


ansiedade), fico a suar muito e
• agorafobia (com medo de ficar
com o coração acelerado”
sozinha, de passar mal)
• “Quando é que isso acontece?”
• fobia específica (com medo que • “No elevador”
o elevado caia) • “So?”

• ansiedade social (porque não • “Já me aconteceu noutros sítios


mas não ao ar livre”
consegue escapar e tem a
Qual será o foco do medo?
possibilidade de lidar com outros).
Situação e a resposta fisiológica são as mesmas, mas há quatro possíveis
diagnósticos; temos que pensar qual é o foco do medo para conseguir perceber
qual é o problema. Quando o doente não consegue dizer qual o foco do medo
(por vezes o medo tem uma resposta difusa, “não sei do que tenho medo”),
temos que pesquisar outras situações para ajudar o paciente a perceber qual
o seu medo.

Ø As Perturbações de Ansiedade tendem a surgir na infância e a persistir


ao longo da vida, quando não são alvo de tratamento.
Há uma taxa de remissão espontânea muito baixa, o que significa que há
indicação para nós termos uma intervenção quando aparecem porque tem
impacto no percurso da vida do indivíduo, tendendo a manter-se sem esta
intervenção

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24

Ø A maioria das Perturbações de Ansiedade ocorre mais frequentemente


em mulheres do que em homens (num rácio aproximado de 2:1).
Ø Cada quadro clínico das Exemplo: rapaz que tinha episódios em que
Perturbações de Ansiedade só se sentia mal e a namorada dizia que era
deve ser considerado quando: ansiedade - ela estava a acabar o estágio
o sintomatologia apresentada para se tornar psicóloga-, até que ele se

pelo paciente não é sentiu mal nos treinos e foi levado para o

atribuível aos efeitos hospital pelos colegas e precisar de ser


operado de urgência porque, na realidade,
fisiológicos de
tinha um problema cardíaco.
substâncias/
Na maior parte das vezes é ansiedade mas
medicamentos ou de uma
temos que prevenir e perguntar sempre se
outra condição médica
não pode haver causas biológicas: “a mim
o a sintomatologia não for parece-me ansiedade mas preciso de um
melhor explicada por uma relatório de um médico que não há nenhuma
outra perturbação mental. origem biológica destes sintomas”

Perturbações de Ansiedade diferem de:

ü medos desenvolvimentais normativos uma vez que nestas perturbações


o medo tem de ser caracterizado como excessivo ou como persistindo
para além do período considerado
como adequado para determinado Nota: o tempo não deve ser
considerado como um critério
nível de desenvolvimento;
exclusivo mas antes como um
ü de ansiedade ou medos transitórios guia, o qual permite alguma
uma vez que são persistentes (e.g., flexibilidade;
normalmente por um período igual ou
superior a 6 meses);

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25

Respostas ansiogénicas são normais em certas alturas do desenvolvimento,


são medos normativos, desenvolvimentais e transitórios, que fazem parte
do desenvolvimento.

exemplo1: medo do escuro numa criança e, consequente, necessidade de


uma luz de presença, é normalmente um medo normativo (Devemos tentar
despatologizar e normalizar o medo do escuro, já que era um medo que
existe desde há muito pelos primórdios da humanidade como adaptativo e
necessário para a sobrevivência)

exemplo2: alguém que esteve na guerra na Ucrânia a ouvir bombas e vem


para Portugal e quando ouve sons semelhantes, tem uma resposta
ansiógena - habitualmente esta resposta é normativa e vai-se extinguindo e
normalizando, tirando nos caso de Stress Pós-Traumático em que não se
extingue (Os medos patológicos, não são transitórios e tendem a
generalizar-se)

Alterações no DSM-5

A atual edição do DSM é caracterizada por várias alterações, em relação ao


capítulo das Perturbações de Ansiedade, incluindo:

• a individualização de novos quadros clínicos (i.e., que foram


acrescentados)
• a omissão de quadros clínicos
• inúmeros ajustes nos critérios exigidos para o diagnóstico de diferentes
condições clínicas.

1. No DSM 5 o capítulo para as perturbações de ansiedade já não inclui a:


a. Perturbação Obsessivo-Compulsiva
b. Perturbação de Stress Pós-traumático
c. Perturbação de Stress Agudo
2. Na Agorafobia, Fobia Específica e Perturbação de Ansiedade Social a
duração de 6 meses, a qual era limitada a indivíduos com idades
inferiores a 18 anos no DSM IV, é agora estendida para todas as idades.
3. Na Agorafobia, Fobia Específica e Perturbação de Ansiedade Social
eliminou-se a exigência que os indivíduos (maiores a 18 anos)
reconheçam a sua ansiedade como excessiva ou irracional;

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26

Uma vez que os pacientes com perturbações de ansiedade tipicamente


sobrestimam o perigo das situações temidas ou evitadas, a avaliação ou
determinação se o medo ou a ansiedade é excessiva ou desproporcionada
deve ser realizada pelo clínico, tendo em consideração os fatores contextuais
que marcam essa situação.

As perturbações que partilham entre si características de medo excessivo


e ansiedade e perturbações do comportamento relacionadas com essas
características podem ser diferenciadas entre si através:
o do tipo de objetos ou situações que induzem o medo,
o do comportamento de ansiedade
o do padrão cognitivo associado.

Fobias Específicas

Característica central: o medo ou ansiedade é


circunscrita à presença de uma situação ou objeto
específico, o qual é designado por estímulo fóbico;

O medo, ansiedade ou o evitamento provocam sofrimento


ou mal-estar clinicamente significativo ou interferem
significativamente com as rotinas normais da pessoa,
funcionamento ocupacional (ou académico),
relacionamentos, atividades sociais ou outras áreas
importantes de funcionamento;

Para diagnosticar uma fobia específica: Efeito lupa

ü a resposta do indivíduo tem de se diferenciar Nas fobias específicas, o


daquela considerada como normal ou foco no objeto
ansiógeno/fóbico é
esperada e de medos transitórios que ocorrem aumentado e o paciente
torna-se perita nesse
frequentemente na população; objeto.
ü o medo ou ansiedade tem de ser intensa,
marcada ou severa;
o A severidade do medo pode variar de acordo com a proximidade em
relação ao estímulo fóbico (e pode ocorrer tanto na presença como

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27

por antecipação da exposição ao objeto ou situação fóbica): quanto


mais próximo do estímulo fóbico, maior será o grau da resposta
ansiogênica
o O medo ou ansiedade pode assumir a forma de um ataque de pânico
com sintomas completos ou limitado;
ü a resposta de medo ou ansiedade deve ser invariavelmente desencadeada
sempre (ou quase sempre) que o indivíduo contacta com o estímulo fóbico
(independentemente da sua intensidade).
Nota: se um indivíduo que só ocasionalmente sente ansiedade quando
enfrenta uma situação ou objeto específico (e.g., experiencia altos níveis
de ansiedade quando voa em apenas 1 em cada 5 voos de avião) não deve
receber o diagnóstico de fobia específica.

A resposta de ansiedade é invariavelmente


desencadeada sempre que o sujeito se confronta com o
estímulo fóbico, no entanto, o grau/intensidade de medo
ou ansiedade expressa pode variar:
• em diferentes ocasiões;
• em função do grau de proximidade do estímulo
fóbico;
• em função de outras variáveis contextuais, como:
o a presença de outras pessoas;
o a duração da exposição;
o e outros fatores percebidos (como “de risco”, tais como a
turbulência em um voo para as pessoas que têm medo de voar
ou para fobia a elevadores a antiguidade do aparelho);

Características Clínicas

ü Ao longo do processo psicopatológico que carateriza esta perturbação


o indivíduo adapta o seu comportamento de modo a prevenir ou minimizar o
contacto com a situação ou objeto fóbico. O evitamento do estímulo fóbico que
caracteriza esta perturbação:

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28

I. Pode levar o indivíduo a Exemplos:


alterar de forma
a) seguir um percurso mais longo no
significativamente as
trajeto diário para evitar pontes por
suas rotinas ao longo do medo de alturas;
tempo; b) evitar entrar num quarto escuro,
II. Pode justificar que com medo de aranhas;
muitos destes pacientes c) evitar aceitar um emprego num
local onde um estímulo fóbico é
não experienciem medo
mais comum.
ou ansiedade no seu dia-
a-dia.
ü Os medos circunscritos a objetos ou situações são muito comuns,
especialmente em crianças, mas em muitos casos o grau de deficiência é
insuficiente para merecer um diagnóstico.
ü Se a fobia não interferir significativamente com o funcionamento do
sujeito ou não provocar claro mal-estar, o diagnóstico não é feito.
ü A ansiedade é excessiva ou desproporcionada em relação ao real
perigo que o objeto ou situação representa

Exemplos:

1. A pessoa que tem medo de cobras a ponto de expressar um medo intenso na


presença de cobras, não receberá o diagnóstico de Fobia Específica se viver numa
área onde não há cobras, se não restringir as suas atividades pelo medo de
cobras e se não se sentir perturbada por ter medo de cobras;

2. No caso do medo a ratos apresentado pela professora, não é uma fobia


específica porque não interfere na rotina quotidiana do paciente por não viver
num contexto em que existam muitos ratos, o que faz com que não sofra ou
provoque um sofrimentos psicológico significativos, ou seja, um impedimento
de viver normalmente, não interfere significativamente com o funcionamento
do sujeito. No entanto, não é uma resposta adaptativa mas não constitui algo
patológico.

ü Os indivíduos com fobia específica reconhecem frequentemente que o


seu medo é excessivo ou irracional, mas tendem a sobreavaliar o perigo
associado às situações temidas, assim a avaliação da (des)proporcionalidade
da resposta ansiosa em determinado contexto deve ser feito pelo clínico.

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Critérios de Diagnóstico de Fobia Específica segundo o


DSM-5

A. Medo acentuado ou ansiedade em relação a (ou desencadeado por)


um objeto ou situação específica (e.g., viajar de avião, alturas, animais,
injeções, ver sangue).
Nota: em crianças o medo ou a ansiedade pode ser expressa por choro,
birras, imobilidade ou pelo comportamento de procurar de um adulto
significativo
B. O objeto ou a situação fóbica provoca quase sempre uma resposta
ansiosa imediata [a resposta de medo ou ansiedade deve ser
invariavelmente desencadeada sempre (ou quase sempre) que o indivíduo
contacta com o estímulo fóbico (e pode ocorrer tanto na presença como por
antecipação da exposição ao objeto ou situação fóbica e a severidade do
medo pode variar de acordo com a proximidade em relação ao estímulo
fóbico)];
C. O objeto ou a situação fóbica é ativamente evitada ou enfrentada com
intensa ansiedade ou mal-estar ;
D. O medo ou ansiedade é excessiva atendendo ao real perigo que o
objeto ou situação representa e ao contexto sociocultural [o medo ou
ansiedade tem de ser intensa, marcada ou severa];
E. O medo, a ansiedade e o evitamento é persistente, apresentando uma
duração de pelo menos 6 meses;
F. O medo, ansiedade ou o evitamento provocam sofrimento ou mal-
estar clinicamente significativo ou interferem significativamente com
as rotinas normais do indivíduo [O medo ou ansiedade pode assumir a
forma de um ataque de pânico com sintomas completos ou limitado];
G. A perturbação não é melhor explicada pelos sintomas de outra
perturbação.

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30

Para diagnóstico em crianças:

• Medos excessivos são muito comuns em crianças, mas são habitualmente


transitórios e não causam um prejuízo significativo, sendo portanto,
considerados adequado ao desenvolvimento. Nestes casos, um
diagnóstico de fobia específica não pode ser realizado.
• É importante avaliar:
o o grau de comprometimento;
o a duração do medo e do evitamento;
o se o padrão de respostas é ou não típico do nível de
desenvolvimento.
• As crianças poderão expressar o seu medo e ansiedade por choro, ataques
de raiva, imobilidade ou comportamento de procura de uma figura de
vinculação significativa.
• As crianças normalmente não são capazes de entender o conceito de
evitamento. O clínico deve reunir informação adicional por parte dos pais,
professores ou outras pessoas significativas.

Os especificadores na Fobia Específica devem ser baseados no estímulo

fóbico:

v Animal: desencadeado por animais (e.g., aranhas, insetos, cães).


v Ambiente natural: desencadeado por situações do ambiente natural
(e.g., alturas, tempestades, água).
v Sangue-Infeções-Ferimentos (e.g., visão de sangue, ferimentos,
agulhas, procedimentos médicos invasivos).
v Situacional (e.g., transportes públicos (aviões), túneis, elevadores,
espaços fechados).
v Outro se o medo foi desencadeado por outro estímulo, (e.g., situações
que podem levar a asfixia ou vómitos).

A resposta fisiológica à situação ou objeto temido pode variar em função de


diferentes especificadores:

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Ø os indivíduos com fobias específicas do tipo animal, situacional ou


ambiente natural tendem a mostrar uma ativação/excitação do sistema
nervoso simpático;
Ø os indivíduos com fobia específica sangue-injeção-ferimentos,
muitas vezes demonstram uma resposta vagal (e.g., desmaio), marcada
por breve aceleração inicial da frequência cardíaca e elevação da
pressão arterial seguido por uma desaceleração do ritmo cardíaco e
uma queda na pressão arterial.

É frequente o mesmo indivíduo apresentar múltiplas fobias específicas.


Nestes casos devem ser atribuídos o diagnóstico de múltiplas fobias
específicas, cada um com um código específico.

Exemplo: se um indivíduo teme tempestades e andar de avião, então seriam


dados dois diagnósticos: fobia específica, ambiente natural, e fobia específica,
situacional.

Prevalência: Diferentes estudos documentam que:


• nos USA, a prevalência na comunidade a 12 meses para fobia
específica é entre 7 a 9%;
• nos países europeus as taxas de prevalência são muito semelhantes
(e.g., ≥ 6%);
• nos países asiáticos, africanos e latino-americanos as taxas são
mais baixos (e.g., 2 - 4%);

Distribuição por género: No sexo feminino a perturbação é mais frequente


do que no sexo masculino (rácio 2:1). Os estudos parecem demonstrar que as
taxas de prevalência por género variam de acordo com diferentes estímulos
fóbicos:
• as fobias a animais, ambiente natural e as fobias específicas
situacionais são predominantemente experimentado por mulheres
• a fobia de sangue-injeção-ferimentos é experienciado quase igualmente
por ambos os sexos

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Idade de início: Fobia específica desenvolve-se frequentemente na infância,


com a maioria dos casos de desenvolvimento antes da idade de 10 anos;
Ø As fobias específicas situacionais tendem a ter uma idade mais
avançada no início do ambiente natural, animal, ou fobias específicas
sangue-injeção-ferimentos.

Evolução:

É hoje claro que as fobias podem ser adquiridas através de diferentes modos
de aprendizagem:

• condicionamento clássico (exemplo: medo de cães quando fui mordida


por um);

• modelamento - é quase copiar uma resposta a um objeto ou situação de


alguém (exemplo: medo de ratos porque a mãe passa a vida a dizer que tem
de ter cuidado com eles porque são perigosos e causam doenças);

• de transmissão de informação (exemplo: anorexia por medo de se


engasgar devido a uma notícia que viu sobre um miúdo que morreu engasgado
num lugar onde ninguém sabia fazer a técnica de Hemelish).

A Fobia Específica pode desenvolver-se após um evento traumático mas


muitos indivíduos com fobia específica não são capazes de recordar a razão
específica para o início de suas fobias.
• Exemplos de eventos traumáticos:
o ser atacado por um animal;
o ficar preso num elevador devido a uma avaria;
o observar outras pessoas durante um evento traumático (e.g., ver
alguém a afogar);
o por transmissão de informação (e.g., TV, conversa de familiares).
• A frequência com que medos de animais (cobras e
aranhas) e de alturas surgem sem a identificação de
experiências traumáticas n a sua origem apoiam as
hipóteses evolucionárias de uma predisposição
biológica para respostas de medo a certos estímulos

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33

que primitivamente constituíram uma ameaça para a espécie.


Nestes casos, as respostas de medo seriam iniciadas por
mecanismos de análises automáticas de estímulos que são sensíveis
a estímulos aversivos biologicamente preparados, como cobras ou
faces iradas.
As fobias específicas que persistem até à idade adulta e raramente têm
remissão espontâneas (aproximadamente 20% dos casos): Há uma taxa de
remissão espontânea muito baixa, o que significa que há indicação para nós
termos uma intervenção quando aparecem porque tem impacto no percurso
da vida do indivíduo, tendendo a manter-se sem esta intervenção.

Diagnóstico Diferencial

ü Agorafobia: A Fobia específica do tipo situacional pode assemelhar-se a

agorafobia na sua apresentação clínica, dada a sobreposição de situações


temidas (e.g., voar, lugares fechados, elevadores). Então como deve ser
elaborado o diagnóstico diferencial entre Fobia Específica e Agorafobia?
o Se o indivíduo teme apenas uma situação agorafóbica, então a
fobia específica (do tipo situacional) deve ser diagnosticada. Se
duas ou mais situações agorafóbicas são temidas, um
diagnóstico de agorafobia é justificado;
o Se as situações são temidas devido ao medo de ser prejudicado
diretamente pelo estímulo (e.g., o medo do avião cair , ou do
ferimento provocado por um animal), um diagnóstico de fobia
específica é mais apropriado.

ü Fobia Social e perturbação de Ansiedade de Separação: Nas Fobias

Específicas é frequente existirem comportamentos de evitamento


semelhantes aos que são apresentados na Fobia Social ou à Ansiedade de
Separação. Então como deve ser elaborado o diagnóstico diferencial
entre Fobia Específica e Fobia Social e em relação à Ansiedade de
Separação?

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o Se as situações são temidos por causa da avaliação negativa, a


perturbação de ansiedade social deve ser diagnosticada, em vez de
fobia específica.
o Se as situações são temidas devido à separação de um cuidador
primário ou figura de vinculação, a perturbação de ansiedade de
separação deve ser diagnosticada em vez de fobia específica.

ü Perturbação de Pânico: Os indivíduos com fobia específica podem ter

ataques de pânico ao confrontarem o estímulo fóbico. Então como deve ser


elaborado o diagnóstico diferencial entre Fobia Específica e Perturbação
de Pânico?
o O diagnóstico de fobia específica deve ser dado se os ataques de
pânico só ocorrem em resposta à exposição a esse estímulo
específico.
o O diagnóstico de Perturbação de Pânico deve ser dado se o
indivíduo também apresenta ataques de pânico inesperado.

ü Perturbação Obsessivo-Compulsiva: Os indivíduos com fobia específica

demonstram níveis exacerbados de ansiedade perante determinado


estímulo. Então o que distingue Fobia Específica e Perturbação Obsessivo-
Compulsiva?
o Se a ansiedade primária em relação a um objeto ou situação é o
resultado de obsessões (exemplo: medo de sangue devido a
pensamentos obsessivos sobre a contaminação; o medo de
conduzir devido a imagens obsessivas de prejudicar outros), e se
forem cumpridos outros critérios de diagnóstico para a
perturbação obsessivo-compulsivo, então a POC deve ser
diagnosticada.

ü Perturbação do Comportamento Alimentar: E se o estímulo fóbico for

um determinado ou vários alimentos? O que distingue Fobia Específica de

uma Perturbação do Comportamento Alimentar?

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o Um diagnóstico de fobia específica não é dado se o comportamento


de evitamento está exclusivamente limitado a alimentos e sinais
relacionados com alimentos e em relação ao medo de ganhar
peso, caso em que um diagnóstico de anorexia ou bulimia nervosa
deve ser considerado

Fobia específica raramente é visto em ambientes médicos-clínicos na


ausência de outra psicopatologia.

A Fobia Específica apresenta elevada comorbilidade com outras


perturbações ansiosas, especialmente com:

• outras fobias específicas (quando se aplica a um caso mais de um


subtipo, todos devem ser assinalados)
• a perturbação de pânico.

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36

AULA 4 E 5 – 7 E 14 MARÇO

Perturbação de Ansiedade Social (Fobia Social)

Perturbação de Ansiedade Social de acordo com o DSM-5:

ü A fobia social é a terceira perturbação psiquiátrica mais comum, seguindo-


se à depressão major e à dependência alcoólica.
ü Os estudos mostram que a fobia social não é apenas um síndroma cultural
embora fatores culturais possam afetar a sua prevalência e variações na
sua expressão clínica.

A ansiedade como uma resposta adaptativa de sobrevivência:

A experiência de graus ligeiros de ansiedade em situações sociais é um


fenómeno frequente, não impede um funcionamento social adequado
podendo mesmo, em certos casos, ter até um efeito benéfico no
desempenho social.

A ansiedade social ou avaliativa deve ser conceptualizada como uma


dimensão com uma variação de grau:
• desde um grau ligeiro a moderados: comum a todos os humanos
e em consonância com determinados contextos, assumindo
possíveis funções reguladoras do comportamento social;
• até a graus extremos: com interferência negativa e significativa no
desempenho social.

Quanto à ansiedade, é sempre preciso fazer a distinção entre os níveis


normais de ansiedade social (em contexto social, é uma resposta normativa,
quando em graus normais e sem impedir um funcionamento social
adequado, relacionada ao desejo de ser aceite e ao medo de ser rejeitado
e criticado) e níveis clínicos de ansiedade clínica.

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37

Estamos perante um caso de fobia social quando:

ü ansiedade experimentada em situações sociais é tão elevada que interfere com


o seu funcionamento social;
ü o receio de ser avaliado negativamente, de parecer ridículo, desajeitado,
tolo ou de não estar à altura da situação e de ver o seu estatuto pessoal
diminuído desperta graus tão elevados de desconforto e medo, que a vida diária
fica severamente limitada.

O indivíduo tende a evitar situações sociais, sendo que este evitamento pode:
§ ser expresso claramente (e.g., não ir a uma festa, ou recusa em ir à escola)
§ assumir formas subtis (e.g., preparação exagerada de um texto para um
discurso, minimizar o contacto ocular, desviar a atenção para os outros).

Pessoas com ansiedade social deixam de fazer atividades essenciais de dia


a dia, porque envolvem um contacto relacional (exemplo: ir à farmácia
envolve contacto com outros, para perguntar o troco ou algo assim; ir num
elevador, em que pode haver conversa de circunstância), e este indivíduo teme
ter um comportamento desadequado e visto como tolo e parvo (“se começar a
gaguejar quando me perguntam as horas, vão achar-me estranho”). A
preocupação com a avaliação dos outros atinge níveis extremos, acreditando
que esta será sempre negativa.

O desejo das pessoas com ansiedade social


é tornarem-se invisíveis (exemplo: pessoa
que sonha várias vezes com ter um cabelo
grande que a tapava e se sentia bem com
isso, porque as pessoas não reparavam
nela).

O Evitamento objetivo (exemplo: não a encontros ou jantares da faculdade,


entro e vou às aulas e saio sem conversa) constitui-se por comportamentos de
segurança.

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Exemplos de Comportamentos de Segurança:


§ olhar para o telemóvel
§ usar óculos de sol
§ ficar na ponta de mesa em jantares
§ decorar textos para fugir ao improviso
§ falar baixo ou muito depressa
§ não ligar a câmera nas aulas online
§ andar com os fones nos ouvidos
§ usar muita roupa mesmo estando com muito calor para disfarçar o suor que
advém da ansiedade
§ segurar o copo ou chávena com muita força para não se notar as mãos trémulas
§ não se levantar para não chamar a atenção e falar o mínimo possível
§ andar sempre acompanhada com alguém conhecido

O que está na base da ansiedade social é o desejo forte de transmitir aos


outros uma impressão favorável/positiva de si e uma marcada
insegurança acerca da sua capacidade de o conseguir, ou seja, uma
crença própria de que a pessoa não é adequada aos outros.
Quando confrontado com este tipo de situações sociais, o
indivíduo com fobia social experimenta a um medo intenso
de fazer uma “triste figura” ou de se comportar de uma
forma humilhante que diminua o seu estatuto social ou
auto-estima, sendo o conteúdo do pensamento do
indivíduo com fobia social dominado por temas de fracasso, falta de
competências necessárias para originar uma impressão positiva,
preocupações com a aparência e com a possibilidade de ser avaliado
negativamente (têm uma sensação de estar encurralados, como por exemplo:
todos a saltar é ridículo e eu a saltar não era natural porque não estou a sentir
a música mas estar aqui parada no meio de todos também é ridículo).
O medo experimentado nestas situações e as suas manifestações
somáticas e cognitivas são frequentemente reinterpretadas como fonte de
ameaça, dado que a possível perceção pelos outros dos seus sintomas de
ansiedade é encarada como fonte de humilhação ou de diminuição
pessoal. Por outras palavras, os sintomas de ansiedade tornam-se uma nova

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forma de desconforto e fonte de ameaça (“e Sintomas físicos comuns


se eles me veem a tremer e a transpirar”). É da ansiedade social:
aqui que surgem os comportamentos de
1. Corar
segurança, para evitar sentir e mostrar 2. Sensação de “branca” ou
esses sintomas, tornar-se invisível, o que vazio no cérebro
muitas vezes funciona da forma contrária, 3. Tensão muscular
tem um efeito preverso porque tornam a 4. Suor
5. Taquicardia
pessoa o centro da atenção (exemplo: “estás
6. Dor de estômago
a usar um casaco com esse calor porquê?
7. Tremores
Não podes estar bem!”).
8. Tonturas
Enquanto psicólogos, não devemos criticar e 9. Falta de ar
avaliar negativamente mas encaminhar para 10. Náuseas
o lado bom (baseada no que é reportado
pela doente) e puxar pela visão positiva da doente (que ele não consegue ver).
Todos nós fazemos enviesamentos mas na perturbação de personalidade,
estes enviesamentos são brutais, só vendo a sua parte negativa.

Caso exemplo: Perante uma determinada situação

Uma rapariga não sabia o que dizer social (“ir ao café”), há a ativação de
num grupo de amigos porque eles só uma crença ou suposição (“o que é
falavam de viagens e ele nunca tinha que eu vou para lá fazer? Só falam de
viajado. Pensava em para de sair com o viagens e eu nunca saí da minha
grupo por esse motivo. Ela podia falar terra” - crença negativa e
dos sítios onde gostava de ir depressiativa) e é ativado o perigo
(encaminhar a paciente para as
social (“vou fazer figura de tola”).
possibilidades de conversa) mas, como
Quando é ativado o perigo social, o
é normal numa pessoa com fobia social,
eu é processado como um objeto e
via sempre o lado mau, dando sempre
esta ativação está ligada a sintomas
uma conotação negativa as situações.
somáticos e cognitivos.
Quando o eu é processado como
objeto, existem dois tipos de
processamento:

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Ø processamento antecipatório (antes da situação acontecer, vejo a

situação pelo prisma da minha ansiedade, enviesando o perigo da situação,


o que faz com que a evitemos)
Ø autópsia (quando vamos à situação, depois desta ter acontecer,

dissecamos tudo o que fizemos, descontextualizando as coisas sempre


com uma auto-avaliação negativa).
Os doentes deixam-se dominar pelo
Pessoas sem a perturbação de
que estão a pensar, fazem uma fusão
ansiedade social, enviesamos
cognitiva denominada de
menos e não nos deixamos
emaranhamento (acreditar que o meu
dominar tanto pelos
pensamento é A verdade). O papel do
pensamentos ansiosos.
terapeuta é desconstruir esta fusão.

Características principais da Fobia Social ou PAS

v medo de não causar uma impressão positiva ou de ser avaliado


negativamente pelos outros em situações sociais;
v hipersensibilidade ao escrutínio dos outros;
v sentimento de avaliação permanente;
v elevada consciência de si mesmo que origina um desconforto severo;
v estado de vigilância permanente, avaliação e comparação com os
outros como tentativas de se protegerem de avaliações negativas;
v em situações sociais percecionam-se como um objeto exposto à
observação e julgamento dos outros: outros, que tendem a encarar
como hipercríticos, predispostos a mostrar a sua superioridade e a
humilha-las.

Critérios de Diagnóstico da Fobia Social (PAS) segundo o


DSM-5

A. Medo ou ansiedade intensa e persistente em uma ou mais situações


sociais nas quais o indivíduo está exposto a possível avaliação ou
escrutínio dos outros.

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Os exemplos incluem interações sociais (e.g., manter uma conversa, encontrar


pessoas desconhecidas), ser observado (e.g., a comer ou a beber), e de
desempenho (e.g., fazer um discurso).
Nota: Em crianças a ansiedade deve também ocorrer em contextos de
interação com pares e não apenas com adultos.
B. O indivíduo teme ter um comportamento ou mostrar sintomas de
ansiedade que serão avaliados negativamente pelos outros (i.e., ser
humilhado, ou sentir-se embaraçado, ou motivar a crítica ou a rejeição por
parte dos outros);
C. A exposição às situações sociais receadas provoca quase sempre
medo ou ansiedade intensa;
Nota: Em crianças, a ansiedade pode ser expressa por choro, ataques
de raiva, agarrar-se a um adulto, congelamento ou mutismo em
situações sociais.
D. As situações sociais são evitadas ou enfrentadas com intensa
ansiedade ou desconforto;
E. O medo ou ansiedade experienciada é excessiva ou
desproporcionada com a atual ameaça que a situação social
representa e atendendo ao contexto sociocultural;
F. O medo, ansiedade e o comportamento de evitamento são
persistentes, apresentando tipicamente uma duração superior a 6
meses;
G. O medo, ansiedade ou evitamento causam um sofrimento ou
desconforto clinicamente significativo e interferem significativamente
com a rotina normal do indivíduo (e.g., académicos, ocupacional, social
ou outras);
H. O medo, a ansiedade, ou evitamento não é atribuído a quaisquer
efeitos fisiológicos de uma substância (e.g., abuso de drogas, ou
medicação) ou de outra condição médica;
I. O medo, a ansiedade, ou o evitamento não é melhor explicado pelos
sintomas de uma outra perturbação mental, tais como perturbação de
pânico, perturbação de dismorfia corporal ou perturbações do espectro
autista;

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J. Se outra condição médica (e.g., Perturbação de Parkinson, obesidade)


estiver presente, o medo, a ansiedade ou o evitamento são claramente
não relacionados ou excessivos.
Ø Especificar se o medo é restrito a Exemplo: um indivíduo que
situações de discursos ou de tem medo de falar em público
desempenho em público: não deverá receber um
o Indivíduos com Fobia Social diagnóstico de Perturbação
de Ansiedade Social, se essa
do tipo de desempenho
atividade não faz parte da sua
apresenta medos de rotina ou da sua rotina
desempenho que causam profissional, e se o indivíduo
prejuízo na sua vida não se sente
profissional (e.g., músicos, significativamente angustiado
com isso.
dançarinos, artistas, atletas)
ou em funções que exigem falar em público regular mas não
temem situações sociais que não impliquem desempenho
o Se o indivíduo evita ou se sente prejudicado no trabalho que tem
(ou que desejaria ter) por causa de sintomas de ansiedade social
então o Critério G deve ser atendido.

——————————————————————————————

Caso prático:

Paciente Manuel, 39 anos, homem, solteiro, estudante (último ano no curso de


gestão), trabalha, mora sozinho em Coimbra. Veio à consulta por iniciativa própria e
sozinho (insight) e diz sentir dificuldades descritas num livro sobre ansiedade social.
Manteve uma postura adequada, com Humor Eutímio, um contacto visual adequado ,
numa atividade colaborante. Diz sentir algumas dificuldades que segundo ele
aparecem num livro “ansiedade social: da timidez à fobia social”, escrito por um
psiquiatra. Ele leu este livro e achou que aquilo descrevia muito bem o seu caso. Sente
dificuldades relacionadas a não ter acabado a licenciatura por estar a trabalhar e por
ter dificuldades em algumas atividades sociais
Quanto às dificuldades, Manuel sente algumas no contexto académico: para pedir
apontamentos, apresentar trabalhos, falar com professores, ir ao quadro e responder
a perguntas dos professores. Sente o coração acelerado e pensamentos de possível
inadequação e possível avaliação negativa pelos colegas e pelos funcionários por

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estar na faculdade há muito tempo. Num contexto social, Manuel apresentava evitava
ir a locais com muita gente e a locais e festas onde se tinha de dançar porque não
sabe dançar e não se sentia confortável a fazê-lo em público e sentia medo de
avaliação negativa de pessoas que não conhece tão bem e ir para sítios que não
conhece bem (critério B e C). Deixou de visitar a sua terra por receio de encontrar
colegas de escola, já que as pessoas acham que ele acabou o curso e não
apresentava sinais de ter sucesso como dinheiro, roupas caras, carro próprio (ia de ir
de autocarro) (critério G). Trabalha numa instituição onde ganha o salário mínimo mas
onde se sente confortável por não implicar muita interação social (está num emprego
onde se sente seguro mas não é o que realmente gosta- pessoas com ansiedade
social não escolhem o que tem significado mas o que acha que consigo fazer, onde
se sentem seguros) (critério G).
Numa situação em que tinha que correr para apanhar autocarro que estava prestes a
sair, Manuel não correu porque achou que as pessoas o podiam achar ridículo.
Manuel não gosta de comer nem beber em público, principalmente quando está
sozinho sozinho, é sempre que entrava alguém no sítio onde ele estava a comer, ele
parava de o fazer. Costuma ficar focado em si (auto-focos)
para ver se está a suar, etc, e não tira o casaco para
esconder o suor e tosse para disfarçar o tremor na voz
(comportamento de segurança). Tem suores intensos e
tensão musculares e acha que estes sintomas físicos
passam uma imagem de insegurança e de ser uma pessoa
estranha.
Está sempre atento a sinais faciais de rejeição nos outros. Nos convívio com os
amigos, só fala quando tem algo de interessante para dizer e diz que estes tem uma
imagem errada de si, mais interessante do que ele é realmente. Diz que mantém um
perfil distante e frio de quem não se preocupa com as coisas. Prefere tolerar
desconforto de querer ir embora de um local cheio do que ser o primeiro a sair porque
tinha que de tomar a iniciativa de se despedir. Não se levanta para ir à casa de banho,
escolhe um lugar específico na mesa e não usa roupa de cor para não chamar a
atenção. Informa-se exaustivamente sobre assuntos valorizados nos grupos e,
mesmo assim, não se sente informado o suficiente. Depois de situações de interação
social, faz autópsias das situações de forma ruminativa e intensa.
No campo amoroso, sente dificuldades em avançar nas relações amorosas e só o faz
quando tem muito sinais positivos de interesse por parte das mulheres; passa uma
imagem ás namoradas de namorado ideal (sair à noite, passear, etc) que lhe dá muito
desconforto. Ele começa a evitar sair, dando desculpas, o que causa problemas no

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relacionamento. Diz preferia que prefere que os relacionamentos acabem do que as


namoradas percebam que ele é tímido e tem ansiedade (sabota os relacionamentos
íntimos apesar de os desejar) (critério E e D)
Quando questionado sobre o início destas dificuldades, não sabe quando estas
dificuldades começaram, mas que foi por volta do início do curso universitário (critério
F). Criado pelo pai e madrasta, depois do desaparecimento da mãe, diz que estes
não o acolhiam bem e tinha uma relação conflituosa com os meios-irmãos. Era alvo
de críticas pelo pai quando fazia algo de errado. Na sua primeira escola, foi rejeitado
pelos colegas pela sua cor mas percebeu que as excelentes notas o tornaram aceite
pelos colegas, chegando a ser popular em eles, e por toda a comunidade estudantil,
uma vez que os professores o usavam muitas vezes como exemplo para a turma. No
fundo, aprendeu que a havia algo nele que o fazia ser rejeitado mas percebe que
quando tem desempenhos excepcionais é aceite [esta é uma aprendizagem perigosa
já que passa a ideia de que “gostam de mim porque eu consigo fazer isto” e não só
porque sim, por quem ele é].
——————————————————————————————

Diagnóstico Diferencial

1) Fobia Social ou PAS vs timidez normativa: A Timidez normativa é


um traço de personalidade comum e não é por si só patológico. No
entanto, quando há um impacto negativo significativo nas áreas social,
ocupacional e outras importantes de funcionar, e quando são cumpridos os
critérios de diagnóstico desta perturbação, então deve ser diagnosticado
como Fobia Social ou PAS.

2) Fobia Social versus Agorafobia: Há comportamentos de evitamento que


são partilhados pelos indivíduos com Agorafobia e os indivíduos com
Perturbação de Ansiedade Social ou Fobia Social.
Então como deve ser realizado o diagnóstico diferencial?
a. Os indivíduos com Agorafobia podem temer e evitar situações
sociais (exemplo: ir ao cinema ver um filme), porque a fuga
pode ser difícil ou ajuda pode não estar disponível em caso de
incapacitação ou da ocorrência de sintomas tipo pânico.

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b. No caso dos indivíduos com Fobia Social ou PAS o medo


relaciona-se com o escrutínio por parte dos outros. Além disso,
os indivíduos com perturbação de ansiedade social tendem a
sentir-se calmos ou tranquilos quando ficam completamente
sozinhos, o que não acontece no caso de agorafobia.

3) Fobia Social ou PAS vs Perturbação de Pânico


a. Indivíduos com Fobia Social ou PAS podem ter ataques de
pânico, mas a preocupação é sobre o medo da avaliação
negativa
b. Na Perturbação de Pânico a preocupação é sobre as
consequências do ataque de pânico em si mesmo

4) Fobia Social ou PAS vs Perturbação Depressiva Major


a. Indivíduos com Perturbação Depressiva Major podem estar
preocupados por serem avaliados negativamente por outras
pessoas, porque se sentem ruins ou não são dignos de ser
amados.
b. Indivíduos com Fobia social ou PAS estão preocupados com
o facto de serem avaliados negativamente por causa de certos
comportamentos sociais ou sintomas físicos.

Impacto na qualidade de vida e limitações associadas à Fobia


Social: o medo e o evitamento experimentado pelos indivíduos com Fobia
Social têm com frequência uma enorme repercussão negativa sobre
diversos aspetos da sua qualidade de vida.

Idade de início
• Os dados sugerem que a fobia social se desenvolve cedo na vida do
indivíduo, frequentemente antes ou durante a adolescência.

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• A idade média de início situa-se entre os 15 e 16 anos, mas pode haver


variações culturais na idade de início.

Prevalência: A prevalência estimada a 12 meses para a perturbação de


ansiedade social nos Estados Unidos é de cerca de 7%.

Distribuição em função do sexo:


• os estudos de prevalência sugerem uma maior prevalência nas
mulheres que nos homens (com ratio entre 1,5 e 2,2);
• na maioria das amostras clínicas, ambos os sexos estão igualmente
representados ou a maioria são homens.

Distribuição em função do estado civil:


• Os indivíduos com Fobia Social têm mais probabilidade de serem
solteiros, divorciados ou separados.
• A associação entre este diagnóstico e o estado civil de solteiro está de
acordo com o que seria de esperar em função das manifestações
clínicas e dificuldades dos indivíduos com fobia social.
• Muito dos medos sociais característicos da Fobia Social interferem
severamente com processos sociais ligados à oportunidade de
conhecimento e estreitamento de relações afetivas (caso prático
exemplo)

Distribuição em função do estatuto socioeconómico:


• a associação entre um estatuto socioeconómico baixo e uma maior
prevalência da fobia social está de acordo com o que acontece em
outras condições psiquiátricas;
• Pode ser explicada através de dois mecanismos:
o influência negativa da fobia social na vida escolar e profissional,
o que se associa a um menor rendimento escolar e
profissional e a um estatuto socioeconómico mais baixo;
o a possibilidade de um estatuto sócio-económico baixo
influenciar diretamente o desenvolvimento da fobia social.

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Etiologia: como acontece para qualquer outra perturbação, a etiologia


da perturbação de ansiedade social é, provavelmente, multifatorial e
multideterminada, englobando uma interação de diversas variáveis,

Fatores genéticos:
• Os estudos sugerem taxas de perturbação de ansiedade social mais
elevadas nos familiares diretos de indivíduos com fobia social,
comparativamente a familiares de outros grupos clínicos ou controlos
normais;
• É estimado um risco 3 vezes maior para familiares de doentes com
fobia social;
• Embora uma predisposição genética para a ansiedade social não esteja
clarificada, constructos temperamentais relacionados parecem ter
um componente hereditário:
o A timidez parece ser um dos fatores de temperamento mais
associados;
o Outro precursor temperamental é a inibição comportamental,
que se refere à tendência para a criança reagir com medo,
timidez, estranheza e constrangimento na interação com
pessoas, objetos ou situações novas.
No entanto esta é uma questão complexa, dada a interação entre fatores
genéticos e ambientais ...

Fatores genéticos vs ambientais:

Estes fatores temperamentais não conduzem necessariamente a um quadro


de ansiedade social: é necessário existir uma interação entre esta
predisposição da criança e o ambiente familiar, podendo os pais ou outras
figuras significativas promover o desenvolvimento adaptativo do seu filho com
inibição comportamental ou timidez, ou interagir de uma forma que pode
aumentar a probabilidade de dificuldades futuras.

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A literatura sugere uma forte evidência para a relação entre determinadas


práticas parentais e o desenvolvimento de ansiedade social dos filhos,
tais como:
o Famílias com menor sociabilidade e um maior evitamento de situações
sociais;
o Isolamento da criança ou restrição de atividades sociais;
o Sobrevalorização da opinião ou julgamento crítico dos outros;
o Comportamento parental mais sobre protetor ou controlador;
o Práticas parentais caraterizadas por rejeição, crítica ou atitudes de
menor cuidado, calor ou afeto;
o Famílias com historia de maior instabilidade (e.g., separação da criança,
conflito parental, história de perturbações mentais, mudanças de
casa/escola/país frequentes);

Relação com os pares: A natureza das relações com os pares pode


desempenhar um papel fundamental na ansiedade social.
ü Vários estudos têm demonstrado que altos níveis de ansiedade social
na infância e adolescência estão associados a negligência ou rejeição
pelos pares, isolamento social e consequente ausência de relações
próximas.

Experiências traumáticas: Embora alguns medos sociais e de desempenho


possam ter tido origem numa exposição a acontecimentos traumáticos, num
processo claro de condicionamento clássico, existe pouca evidência de que
experiências traumáticas tenham um papel dominante no
desenvolvimento da ansiedade social; Assim, a existência de experiências
traumáticas não é um fator necessário nem suficiente, para desencadear uma
fobia social.

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Modelo de Clark e Wells (1995)

sintomas somáticos: Os sintomas físicos da ansiedade são o tremor, o


rubor, a sudação e a tensão muscular e é característico dos indivíduos com
fobia social ou PAS é acreditarem erroneamente que esses sintomas são de
grande visibilidade para os outros e que conduzem a avaliações
negativas pelos outros, sendo interpretados como um sinal de insegurança
ou timidez.

comportamentos de segurança: em muitos


casos, as pessoas com fobia social ou PAS utilizam
complexos comportamentos de segurança com
os quais tentam proteger-se dos seus receios; no
sentido de tentar disfarçar ou diminuir a
visibilidade dos sintomas físicos desenvolvem um conjunto de
comportamentos destinados a disfarça-los, sendo que estes comportamentos
constituem um fator importante de manutenção da fobia social.

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aspetos cognitivos:
ü O conteúdo do pensamento do indivíduo com fobia social ou PAS, quando
confrontado com uma situação social é dominado por
o temas de fracasso
o falta de competências necessárias para originar uma impressão
positiva
o preocupações com a aparência e com a possibilidade de ser
avaliado negativamente.
ü ao nível dos processos cognitivos, a atenção é auto focada, há aumento
da consciência de si mesmo, o que amplifica a perceção da sua
ansiedade e desconforto e diminui a atenção disponível para estímulos
exteriores relacionados com a situação. Assim:
o mostram enviesamentos negativos na auto-perceção.
o envolvem-se em maior grau em pensamentos autoavaliativos
negativos.
o em relação às expectativas acerca de futuras interações sociais, os
fóbicos sociais revelam possuir expectativas mais negativas acerca
das consequências sociais de futuras interações.

ansiedade/processamento antecipatória/o: ao anteciparem uma


situação social receada é frequente as pessoas com fobia social tentarem
antever em detalhe o que poderá acontecer nessas situações; quando iniciam
esta antevisão ficam ansiosos e os seus pensamentos são dominados por
memórias dos seus fracassos em situações anteriores, imagens negativas de
si mesmo na situação e pensamentos automáticos de fracasso. Deste modo,
quando o indivíduo se confronta com a situação, entra nela já com níveis de
ansiedade tão elevados e num modo de processamento auto focado que
o impede de identificar possíveis sinais de aceitação tranquilizadores e o
conduz a um funcionamento social pouco eficaz. Como resultado,
desenvolve-se uma intensa ansiedade antecipatória em relação a este tipo
de situações que pode levar ao seu evitamento sistemático.
Em consequência dos altos níveis de ansiedade e desconforto sentidos nas
situações sociais receadas, os indivíduos com fobia social tendem a organizar

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a sua vida de forma a evitarem essas situações, o que frequentemente


origina limitações severas na sua vida social, profissional e afetiva.

autópsia: Se a ansiedade diminui habitualmente após terminar a situação


social, muitas pessoas com fobia social descrevem um sentimento de
vergonha e de humilhação que persiste por vezes longo tempo após o fim da
interação. Embora o objetivo da autópsia seja uma tentativa de
tranquilização acerca do seu receio de terem sido avaliados
negativamente, o seu resultado é o inverso e ela aumenta habitualmente o
sentimento de humilhação e inadequação social. O sentimento de
humilhação parece estar relacionado com a tendência para realizarem
autópsias da situação, revendo em detalhe tudo aquilo que aconteceu
durante a interação.

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AULA 6 – 21 MARÇO

Perturbação de Ansiedade Generalizada

Características principal e centrais da


Perturbação de Ansiedade Generalizada

A principal característica da PAG é a existência de


uma preocupação excessiva e sentida como
incontrolável (a própria pessoa vê como
excessivo mas também como incontrolável; aqui
não há um foco específico como nas outras
perturbações de ansiedade mas geral)
As caraterísticas centrais da PAG são a
ansiedade e preocupação excessiva acerca de
diversos eventos ou atividades.

O quadro clínico da PAG é dominado por sintomas somáticos da ansiedade


e pela preocupação.

ü A intensidade, duração ou frequência da ansiedade e preocupação é


desproporcional à probabilidade real ou impacto do evento antecipado.
ü O indivíduo tem dificuldades de controlar a preocupação e de evitar que
os pensamentos de preocupação interfiram de forma significativa na
atenção às tarefas.
ü Os indivíduos com PAG preocupam-se frequentemente com
circunstâncias diárias da sua rotina diária, como possíveis
responsabilidades no trabalho, saúde e finanças, a saúde dos membros da
família, desgraças com os filhos ou dependentes, ou
outras circunstâncias menores (como realizar
tarefas domésticas ou se atrasar para
compromissos).
ü Durante o curso da perturbação, o foco da
preocupação pode mudar de uma preocupação para
outra.

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Distinção entre preocupações normais e as preocupações


problemáticas ou patológicas associadas à PAG

Graus ligeiros de preocupação e ansiedade ocorrem na maioria das pessoas


e poderão ser vantajosas e desempenhar funções adaptativas e, por isso,
torna-se necessário distinguir a preocupações normais e as preocupações
problemáticas ou patológicas associadas à PAG.

Wells e Mathews (1994) sugeriram a necessidade de distinguir entre dois tipos


de preocupação:

Uma variedade adaptativa que é Uma variedade maladaptativa


orientada para a solução de que gera uma cadeia repetitiva
problemas e conduz a de pensamentos de
comportamentos focados no consequências negativas.
problema.

O processo de preocupação está associado a uma motivação para prevenir


ou evitar potenciais perigos. Pode ser visto como uma estratégia de coping,
que se torna no foco de problemas.

Estudos que compararam as preocupações normativas e as preocupações


“patológicas” de pessoas com PAG mostraram que não há diferenças
significativas a nível do seu conteúdo, apenas a perceção de controlo os
distingue, ou seja, apenas a perceção de controlo distingue as preocupações
normativas das “patológicas”, e não o seu conteúdo.
Características que distinguem a Perturbação de Ansiedade Generalizada da
ansiedade não patológica:

PAG Ansiedade não patológica


Preocupações são excessivas e Preocupações não são excessivas e
geralmente interferem de forma são percebidas como mais geríveis,
significativa no funcionamento podendo ser adiadas quando surgem
psicossocial (não há perceção de questões mais importantes/urgentes
controlo) (há perceção de controlo)

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Preocupações são mais Preocupações são menos intensa


disseminadas, intensas e e angustiantes, tem menor
angustiantes, tendo maior duração e ocorrem com
duração e ocorrendo sem precipitastes.
precipitastes
Preocupações com grande Preocupações diárias são muito
probabilidade de serem menos prováveis de ser
acompanhadas por sintomas físicos acompanhadas por sintomas físicos
(Exemplo: inquietação, taquicardia
ou sensação de mal-estar).

Os indivíduos com PAG relatam sofrimento


subjetivo devido à preocupação constante e
prejuízo relacionado ao funcionamento
social, profissional ou em outras áreas
importantes de sua vida.
Ø Quanto maior a variação das
circunstâncias de vida sobre as quais a pessoa se preocupa (exemplo:
finanças, segurança dos filhos, desempenho no trabalho), mais
provavelmente é os seus sintomas satisfazerem os critérios para PAG.

Fusão cognitiva

A fusão cognitiva relaciona-se com assumir os nossos pensamentos como A verdade,


imutável, absoluta e irrefutável, a única leitura e interpretação para o positivo e para o
negativo/depreciativo (o que não deve acontecer já que tudo é contextual)
Olhando a história da paciente - “a minha vida é sempre isto, as pessoas desistem
sempre de mim, desistem sempre à primeira”- conseguimos perceber que ela lê os
acontecimentos de uma determinada forma, de modo a irem de acordo às suas
crenças; isto é a fusão, quando só vemos uma parte e interpretamos as coisas da
nossa forma. Ficamos em fusão negativa e depois em ruminação, contamos a história
que nós criamos, como se houvesse sempre um guião que vai dar ao mesmo final,
uma única versão que nos enclausura (mas há várias outras hipóteses e leituras
possíveis).

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Sintomas que apoiam o diagnóstico:

1) Tensão muscular
2) Náusea
3) Fadigabilidade
4) Excessiva preocupação
5) Dificuldades de sono
6) Taquicardia
7) Sudação excessiva
8) Tonturas
9) Entre outros ...

Critérios de Diagnóstico de PAG segundo o DSM-5

A. Ansiedade e preocupação excessivas (apreensão expectante), que


ocorre na maioria dos dias durante pelo menos seis meses, acerca
de um número de acontecimentos ou atividades (tais como trabalho
ou o desempenho escolar);
B. A pessoa tem dificuldade em controlar a preocupação;
C. A ansiedade e a preocupação estão associadas com três (ou mais)
dos seguintes sintomas (com pelo menos alguns sintomas presentes
na maioria dos dias durante seis meses).
1. agitação, nervosismo ou tensão interior
2. fadiga fácil
3. dificuldade de concentração ou esquecimentos devidos à
ansiedade
4. irritabilidade
5. tensão muscular
6. perturbações no sono (dificuldade em adormecer ou permanecer
a dormir, ou sono agitado)
7. Nota: apenas um item é requerido para as crianças.
D. A ansiedade, a preocupação ou os sintomas físicos causam
sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo social, profissional
ou em outras áreas importantes da via do indivíduo;
E. A preocupação não é provocada por um efeito fisiológico direto de
uma substância (por exemplo, abuso de droga, medicação) ou um
estado físico geral (por exemplo, hipertiroidismo);
F. A preocupação não melhor explicada por outra perturbação mental
como, por exemplo:

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a. ansiedade ou preocupação quanto a ter ataques de pânico na


Perturbação de Pânico
b. avaliação negativa na Perturbação de Ansiedade Social
c. contaminação ou outras obsessões na Perturbação Obsessivo
compulsiva
d. separação das fig. de vinculação na Perturbação de Ansiedade
de Separação
e. recordação e memórias de eventos traumáticos na Perturbação
de Stress Pós-Traumático
f. ganho de peso na Anorexia Nervosa
g. queixas físicas na Perturbação de Sintomas Somáticos,
h. perceção de problemas na aparência na Perturbação Dismórfica
Corporal
i. ter uma doença grave na Perturbação de Ansiedade à Doença
j. conteúdo de crenças delirantes na Esquizofrenia;

Prevalência
A prevalência de 12 meses da PAG é de 0,9% entre adolescentes e de 2,9%
entre adultos na comunidade em geral nos Estados Unidos. A prevalência de
12 meses, em outros países varia de 0,4 a 3,6%. A prevalência da PAG na
comunidade contrasta com os dados que mostram ser uma das Perturbações
Ansiosas que menos frequentemente surge para tratamento nos centros de
saúde mental. Esta discrepância poderá não reflectir a natureza pouco
perturbadora da doença, mas pode relacionar-se com a crença entre os
doentes de que as suas dificuldades traduzem uma característica da sua
personalidade que não poderá ser modificada.

Desenvolvimento e Curso
§ Muitos indivíduos com PAG referem que se sentem ansiosos durante
toda a vida
§ A idade média de início (30 anos) é mais tardia do que para outras
perturbações de ansiedade.
§ Os sintomas de preocupação e ansiedade excessivas podem ocorrer no
início da vida, mas manifestam-se como um temperamento ansioso.
§ O início da PAG raramente ocorre antes da adolescência. Os sintomas
tendem a ser crónicos e têm remissões e recidivas ao longo da vida,
flutuando entre formas clínica e sub-clínica da perturbação.
§ As taxas de remissão completa são muito baixas.

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Caso prático:

João tem 22 anos e é solteiro; é estudante universitário


e vive com a mãe e o pai. Foi encaminhado pelo médico
de família por apresentar queixas hipocondríacas
com sintomatologia associada. Já foi acompanhado
por um psicólogo mas desistiu porque se
começou a sentir melhor; retornou depois de voltar a ter
sintomas que interferiam na sua rotina. Apresentou na
consulta uma postura nervosa com tiques corporais
associados a ansiedade.
João diz estar num constante estado ansioso que
considera ser um problema (“A ansiedade acaba por
influenciar a minha maneira de viver”). A ansiedade “limita-o” e está sempre
presente, causando sintomas que não sabe justificar e que “dramatiza”. Esta
ansiedade é sentida em várias áreas e tarefas diárias: “ando sempre muito
inquieto, com o coração a mil; começo sentir os músculos presos, coração
acelerado; a minha mãe fica completamente em branco”. Apresenta medo de
morrer, de sair de casa, qua a ansiedade interfira na dia vida de modo a que
deixe de fazer coisas, ir à sítios específicos e que algo de mal aconteça aos
outros. João tem um grande foco e centralização nos sintomas físicos
(músculos presos, coração acelerado, tremores,..), ou seja, quando fica
ansioso, só se foca nos sintomas da ansiedade e estes acabam por piorar.
Deixou de frequentar o ginásio (já que este ativa os seus sintomas físicos da
ansiedade) e tem dificuldades em adormecer. Ficou muito preocupado com o
diagnóstico de hipocondria da médica. A relação amorosa com a namorada é
uma fonte de preocupação (preocupação com a namorada se magoar, ficar
doente, etc). João aparenta ter uma necessidade de proteção e controlo dos
outros.
As dificuldades atuais tiveram início por volta da altura em que mudou de
escola e 9º ano, sendo que passar muito tempo em casa da avó hipocondríaca
também teve algum impacto nas mesmas (critério 1). Sentia stress
relativamente às notas e testes e tinha sempre que se certificar que quando

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saía de casa ia tudo correr bem. Sentia ansiedade em estar em casa dos avós
e por isso começou a evitar la ir.

——————————————————————————————

Caso Prático Perturbações de Ansiedade

Sara tem 21 anos, é estudante de medicina e vive em


Coimbra há 3 anos. Veio à consulta por indicação do
Médico de família, por apresentar humor depressivo.
Apresenta-se com calças de ganga, camisa, ténis e sweat,
um roupa apropriada à idade e situação económica.
Apresenta uma postura nervosa com tiques corporais de
ansiedade e chorosa.
As dificuldades tiveram início quando entrou para o curso de
medicina em Coimbra. Sentia-se excluída por não ser filha de
médicos: “têm uma força, confiança, que eu não tenho”, “não era
tão inteligente como eles, sentia-me diferente”. No primeiro ano, não conseguiu
fazer todos os exames por conta do stress e da matéria excessiva. No entanto,
tem 2 cadeiras feitas com sucesso.
Uma altura teve uma crise de pânico antes de exame à frente de todos que a
levou ao hospital e sentia muita vergonha por todos terem assistido. Começou
a evitar ir aos exames por sentimentos de incapacidade e por medo de voltar
a passar pelo mesmo. Sente que foi falada na faculdade pela crise de pânico.
Começou a ter medo de ter outras crises de pânico noutros locais
(supermercado e outros locais). Já teve algumas crises de ansiedade depois
da que teve antes do exame.
Quer desistir do curso e só não o faz pela mãe que insiste e pelo pai e porque
ambos se esforçam financeiramente (1000€ por mês para ela) para ela tirar o
curso (sendo que nenhum tem um ordenado elevado). Acha que é um peso
financeiro para os pais (preocupação normativa). A sua rotina é focada no
estudo e é ritualística (perturbação de personalidade obsessiva). Não sai de
casa, não vai às aulas. Sente-se incompreendida pelos pais em relação às
suas dificuldades na universidade. Tem poucos amigos. Sente-se diferente dos

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colegas, menos capaz, uma fraude, e parada no tempo. Nunca se sente segura
para ir a uma frequência ou avaliação. Tem dificuldade em adormecer. Se for
dormir sem o comprimido entra em ruminação sobre a faculdade e os
professores (“tinha quase fobia de me deitar” antes de tomar comprimidos com
medo de voltar a ter ansiedade). Inclui na sua rotina uma série que “não pode
ser de medicina” (porque é ativadora de ansiedade e frustração - não é critério
para uma fobia específica).
Quando vai à terra dela, Sara sente preocupação com quem vai encontrar
porque lhe vão perguntar sobre o curso
Costuma sentir dormência nos braços “coração a bater nos braços”, gaguejar
quando mente sobre estar bem e ter pouca interação nas conversas de café.
Muitas vezes, sente-se alienada nas conversas e tem algumas “brancas”
(cérebro vazio).

ü Se ela só sentisse ansiedade em, por exemplo, em ir ao quadro, de falar


na sala de aula, etc, podia ser uma fobia social do tipo desempenho.
ü Problema é que foi deixado de ir às aulas e ter anulado o contacto com
os colegas de curso que ela dizia ser todos filhos de gente importante
ü Ao fugir de se sentir ansiosa, confirma a sua crença que não consegue
acabar o curso: Há uma fusão cognitiva, ela escolha informação que
confirma e constrói a sua crença.

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AULA 7 – 28 MARÇO

Perturbações do Comportamento Alimentar

Segundo Fairburn e Harrison (2003), a


definição de uma Perturbação do
Comportamento Alimentar implica:

1) que exista uma perturbação clara e


significativa ao nível das atitudes e
hábitos alimentares e dos
Notas:
comportamentos para o controlo do
• A distorção da imagem
peso (controlo do peso ou imagem
é comum mas não é
corporal);
obrigatória;
2) que esta perturbação se reflita num • Há sempre um
disfuncionamento psicológico e/ou instrumento de medida
da saúde física clinicamente em que estes doentes
significativo (torna-se o foco da se focam e que controla
pessoa, a área central é o peso e a uma medida
importante;
imagem corporal, fazendo com que
• A perturbação torna-se
todas as outras áreas dependam e
quase uma
sejam influenciada por esta); característica da
3) que esta perturbação não seja personalidade porque
secundária a outra condição médica não a identificam como
geral ou psiquiátrica (uma doente doença.
com POC pode ter um problema com a
alimentação no que toca ao só comer em casa, só comer alimentos
desinfetados, etc, ou seja, são sintomas que se associam as PCA);

Há um crescente, uma linearidade nestes comportamentos passando:

a) Alimentação normal
b) Alguma dieta e preocupação com alimentação
c) Desordens alimentares

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d) Perturbações clínicas de alimentação

Feeding e Eating Desorders (perturbações de alimentação e de

comportamento alimentar)

Ø Pica – ingestão de coisas não nutritivas (perturbações de feeding, sem


o objetivo de controlo de peso)
Ø Rumination Disorders – aparece em crianças ou em adultos com
défices cognitivos (como pessoas com autismo) que se caracteriza por
comer, engolir, voltar a trazer à boca, comer e engolir (perturbações de
feeding, sem o objetivo de controlo de peso e imagem corporal)
Ø Avoidant Food Intake Disorder - aparece em crianças muito jovens ou
em adultos com défices cognitivos caracterizada pela recusa completa
a alimentos por razões várias, o que pode levar a internamento para
alimentação por sonda (exemplo: criança com 24 meses que não
comia nada a não ser leite o que constitui um grande stress para os
pais; andava sempre a mudar de creche por não aceitavam dar-lhe leite
à frente de outros meninos que estavam a iniciar a introdução alimentar8
(perturbações de feeding, sem o objetivo de controlo de peso e imagem
corporal)
Ø Anorexia Nervosa (saber)
Ø Bulimia Nervosa (saber)
Ø Perturbação Ingestão Alimentar Compulsiva (saber)
Ø Perturbação Alimentar com outra especificação (saber)

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Notas importantes sobre o diagnóstico:

ü Os critérios de diagnóstico para as Perturbações Alimentares no DSM 5


obedecem a um esquema de classificação que é mutuamente exclusivo para
que durante um episódio apenas um destes diagnósticos possa ser atribuído
(tem um mas não tem outra, ou seja, se tiver de anorexia, não tem de bulimia).
Nota: O diagnóstico de Pica pode ser atribuído na presença de qualquer outra
perturbação alimentar.
ü A obesidade não está incluída no DSM-5 como uma perturbação mental.
Contudo, existem associações robustas entre a obesidade e um número de
perturbações mentais [exemplo: BED (ingestão alimentar compulsiva),
perturbações depressivas e perturbação bipolar]

Anorexia nervosa

Característica central da Anorexia Nervosa:

é a ideia sobrevalorizada acerca da magreza, a relevância de


ideias e preocupações que partem de uma premissa básica de
que “É fundamental que eu seja magra”, ou seja, relaciona-se a
crenças acerca da importância e/ou necessidade de ser
magra e ideias que conduzem a um padrão comportamental
que visa a perda de peso.

Características clínicas:
Há três características essenciais da anorexia nervosa:
a) restrição persistente de ingestão de
valores energéticos
• O que é importante para estas doentes
é o número calórico por dia: Há doentes
que preferem doses maiores de comida
pouco calóricas, como alface, e outras
preferem comer uma dose pequena de algo calórico, como um
gelado (o que lhe sabia bem e a enchia e sabia exatamente
quantas calorias estava a comer no caso, por exemplo, de um
gelado do McDonalds)]

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• O que importa para os psicólogos que seguem estas doentes


não é o que comem mas a quantidade em que comem (exemplo:
uma doente que diz que comeu carne de peru, arroz e cenoura
mas numa proporção muito pequena)
b) medo intenso de ganhar Padrão alimentar vai-se tornando mais
peso ou de se tornar restritivo ao longo do tempo, a restrição
gordo, ou apresentação vai sendo progressiva (numa dieta,
de comportamentos para continuar a perder peso tem que
se reduzir mais nas calorias, senão
persistentes que
mantém-se num peso médio).
interferem com o
aumento de peso (Há medida que o peso vai diminuindo, maior é o
medo de aumentar de peso)
c) sobrevalorização do peso ou forma corporal na autoavaliação/
avaliação pessoal
• Uma anoréctica que perde peso, que consegue controlar a sua
imagem, sente-se inicialmente orgulhosa dela própria, sente-se
com poder e com uma sensação de ganho, fazendo uma
avaliação pessoal positiva, porque é difícil resistir à fome mas
nunca ficam tranquilas, o medo de aumentar o peso, a
eminência de ganhar peso também aumenta – sistema drive
em ação (exemplo: quando tiro 19 numa frequência, fico
orgulhosa mas depois volto a ficar preocupada e aflita com a
frequência a seguir)

Mecanismo de sobrevivência à fome:

O organismo para não morrer à fome, adapta-se, reduzindo as funções como o crescimento
(pessoas anorécticas são normalmente baixas e parecem mais novas) e funções vitais como o
coração, os rins, o estômago (ficam muito mal dispostas depois de comer, já que o organismo
não está habituado a quantidades de alimento elevadas, sentem o estômago a distender porque
o tamanho deste e as suas funções são mínimas), funcionando tudo ao mínimo possível, tendo
menos energia. Quando se passa fome, o organismo diminui os gastos todos. Por isso é que as
metas de peso são definidas numa escala progressiva, para o organismo se ir habituando a
maiores quantidades de comida.

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Pessoas com anorexia tem a crença de que ser magra ou ter o corpo ideal
tornaria a sua vida melhor (“se tivesse menos peso, vestiria a roupa x, sentia-
me mais à vontade no meu grupo de amigas, etc”) que é desenvolvida no
sentido de se aproximar e se sentir incluída num grupo com um padrão de
corpo. Mas há medida que o seu estado clínico piora, estás doentes isolam-
se, tendo, assim, a anorexia um efeito paradoxal.

Caso prático

Marta, 16 anos, 1,68 de altura, 37Kg de peso, anoréctica, vivia com os avós.
Dieta simples ao início (14 anos, 55/56kgs) depois de uma férias de Natal em que comia e via
séries. Tinha um padrão alimentar que era familiar, havendo o culto da comida e da
abundância (avós eram gordinhos). O avô disse-lhe “que rabinho rechonchudo”, o que
funcionou como um sinal de alerta e de início para a sua dieta. Os avós e resto da família não
ligavam ao culto do corpo mas a mãe era preocupada com isso é muito afeminanda, avisando-
a que ela tinha pouco cuidado com ela própria (“ainda acabas como os teus avós e tias”). A ,as
gozava com a dieta da filha, não acreditando que “a maior gulosa” o estava a fazer, resultando
com que a Marta aceitasse aqueles comentários como um desafio. Ela começou a reduzir na
quantidade de alimentos calóricos ingeridos como bolos, coisa doces, etc, uma dieta
aparentemente normal mas transformou-se rapidamente numa dieta sem fim (“medo de
engordar cada vez maior”) (doentes anorécticos vão perdendo peso mas aumentando a
rigorosidade da dieta, não havendo nunca um peso ideal ou satisfação com o mesmo- drive).
Colegas de turma que também faziam dieta começaram a elogia-la pelas primeiras perdas de
peso (atenção positiva, reforço social do padrão de uma pessoa com um sistema de afiliação
perdido) e os pais acharam que a dieta era algo normal na idade dela. Ao fim de 2 meses
perdeu 10 kilos sentindo que estava no controlo do seu corpo (sinal de alarme:
emagrecimento rápido e muito acentuado). “Tinha de ter sempre menos peso” e só pensava
em como “resistir à fome” (outro sinal de alerta). A perda de peso e a dieta ganham um caracter
mais rígido e definitivo e houve a adoção de técnicas para disfarçar o facto de não comer (sinal
de alerta: Desculpas para não comer ou para comer isoladamente). “Comer comigo era um
suplício” , porque era muito demorada (Sinal de alertam Desenvolvimento de comportamentos
ritualizados à refeição que tornam a refeição mais longa para enganar a fome e terem a ilusão
que a controlam e as outras pessoas não terem vontade de lhe perguntarem se ela queria
mais). “Era um relógio suíço”, ou seja, insónia terminal devido à fome mas é traduzido como
um sinal de saúde. Os pais obrigaram-na a procurar ajuda quando perdeu 23kgs mas
continuava a dizer que ia melhorar sozinha. Ela achava que “apenas fazia dieta”, não achando
que era anoréctica (“emagrecia como queria”). Começou a ter penugem preta fina e de
crescimento rápido nos braços e nas pernas, uma proteção termina natural que advem da
perda de peso grande. Começou a vestir muita roupa para disfarçar a magreza e para não se
aleijar nas cadeiras da escola, visto que não havia gordura para proteger o cóccix.

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Critérios de diagnóstico da Anorexia Nervosa segundo


DSM-5

A. Restrição na ingestão alimentar que leva a um peso significativamente


baixo para a idade, sexo, etapa desenvolvimental, e saúde física [índice
corporal igual ou maior a17,5 obtido pela equação peso(kg)/(metro x metro)]
Em crianças e adolescentes, peso mais baixo do que o minimamente
expectável (em adolescentes usasse mais o percentil do o Imc)

Nota: O índice de massa corporal (IMC) é uma medida útil para avaliar o
peso tendo em conta a altura;
• Em adultos, um IMC de 18.5 kg/m2 tem sido considerado pelos
Centros para o Controlo e Prevenção de Doenças (CDC) e pela
Organização Mundial de Saúde (WHO) como o limite inferior de peso
normal.
• Enquanto, um IMC inferior a 17.0 kg/m2 é considerado pela WHO
como um indicador de magreza moderada ou severa;
• Na clínica é normalmente utilizado um valor crítico de IMC < 17.5.

O nível/índice de severidade da Anorexia Nervosa é baseado no IMC atual:


a) Ligeira: IMC ≥ 17 kg/m2
b) Moderada: IMC 16 – 16.99 kg/m2
c) Severa: IMC 15 – 15.99 kg/m2
d) Extrema: IMC < 15 kg/m2 (doentes que precisam de serviços de urgência e
internamento porque correm risco de vida grave) (caso prático da Marta: tinha 13)

Estes intervalos correspondem às categorias de magreza em adultos de acordo com a


Organização Mundial de Saúde. Imc é muito prática mas é uma medida muito frágil (ter
mais peso não significa ser gordo). Em crianças e adolescentes, devem ser utilizados os
percentis correspondentes ao IMC;

• Peso significativamente baixo é definido por um peso que é mais


baixo do que o minimamente normal ou, em crianças e adolescentes,
mais baixo do que o minimamente expectável;

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• Em crianças e os adolescentes pode traduzir-se por falhas em


alcançar ganhos de peso expectáveis ou em manter uma trajetória
desenvolvimental normal.
B. Medo intenso de ganhar peso ou de se tornar gordo, comportamentos
persistentes que interferem com o aumento de peso, mesmo tendo um peso
significativamente baixo (pode não ter medo de ganhar peso mas ter
comportamentos para não ter peso) (Indivíduos com esta perturbação
exibem tipicamente medo intenso de ganhar peso ou de ficar gordo. Este
medo intenso de ficar gordo não é habitualmente aliviado por perda de peso
e pode até aumentar mesmo quando o peso diminui.)
C. Distúrbio na forma como o peso ou forma corporal são experienciados,
influência indevida do peso ou forma corporal na autoavaliação, ou
persistente incapacidade para reconhecer a severidade do baixo peso atual
• Alguns indivíduos sentem-se globalmente com excesso de peso,
outros percecionam-se magros mas continuam preocupados que
certas partes do corpo (particularmente o abdómen, nádegas e
coxas) sejam “demasiado gordas”.
• São frequentemente utilizadas uma variedade de técnicas para
avaliar o tamanho corporal e/ou o peso, incluindo pesagens
frequentes, medição obsessiva de partes do corpo e/ou o uso
excessivo do espelho para verificar áreas percecionadas como
“gordas”.
• A perda de peso é frequentemente vista como um feito
impressionante e sinal de extraordinária autodisciplina, enquanto

Tipo restritivo Tipo binge-eating/purgativo

Durante os últimos 3 meses, o individuo não Durante os últimos 3 meses,


se envolveu em episódios recorrentes de o individuo apresentou
binge-eating ou de comportamento purgativo episódios recorrentes de
(i.e., vómito autoinduzido, abuso de laxantes, binge-eating e/ou de
diuréticos ou enemas); Este subtipo descreve comportamento purgativo (ou
apresentações em que a perda de peso é seja, vómito autoinduzido,
alcançada primariamente através de dietas, abuso de laxantes, diuréticos
jejum e/ou exercício físico excessivo. ou enemas)

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que o aumento de peso é percecionado como um fracasso


inaceitável ou falha no autocontrolo.
• Embora alguns indivíduos admitam ser magros, frequentemente não
reconhecem as reais e sérias implicações médicas e limitações
psicossociais associadas ao seu estado de subnutrição

Diagnóstico Diferencial

(1) Anorexia Nervosa vs Perturbação Obsessivo Compulsiva

• POC e a AN partilham diversas características clínicas;


• Na anorexia nervosa, os pensamentos intrusivos, persistentes e
recorrentes em relação ao peso ou alimentação, não são encarados
pelos doentes com AN como absurdos ou irracionais; os
comportamentos de dúvida e de verificação, que surgem
frequentemente em resposta a uma ideia sobrevalorizada associada à
“necessidade de ser magro/a”, não são reconhecidos pelo indivíduo
como excessivos;
• Um diagnóstico adicional de POC deve ser considerado se o indivíduo
apresentar obsessões e compulsões não relacionadas com a comida
(e.g., medo excessivo de contaminação);

(2) Anorexia Nervosa vs Perturbação Depressiva

• muitos dos doentes com Anorexia Nervosa podem preencher os


critérios da Depressão Major, mas muitas vezes estes sintomas
representam sequelas do estado de inanição;
• embora na Depressão possa ocorrer uma grande perda de peso, os
pacientes Anorexia Nervosa diferenciam-se na vivência e significação
da perda de peso.

(3) Anorexia Nervosa vs Perturbação de Ansiedade Social (Fobia Social)

• é frequente na Anorexia Nervosa surgir o medo ou embaraço de comer


em público;

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• quando o doente com Anorexia Nervosa tem medos sociais que são
limitados ao comportamento alimentar, o diagnóstico da Fobia Social
não deve ser estabelecido;
• Nos casos em que surgem outros critérios não associados à
alimentação deve ser explorado um diagnóstico adicional de Fobia
Social.

(4) Anorexia Nervosa vs Fobia Específica

(5) Anorexia Nervosa vs Perturbação de Evitamento/Restrição de


Ingestão de Alimentos

• indivíduos com uma perturbação de evitamento podem exibir uma


perda de peso significativa ou deficiência nutricional, mas não têm medo
de ganhar peso ou de ficar gordo, nem apresentam alterações na forma
como experienciam o seu peso e forma corporal.

(6) Anorexia Nervosa vs Bulimia Nervosa

• Os doentes com BN exibem episódios recorrentes


de binge-eating, e apresentam comportamentos
inapropriados para evitar ganhar peso (e.g.,
autoindução do vómito) e preocupações excessivas
acerca do peso e forma corporal.
• Ao contrário de pessoas com AN, tipo binge-eating/purgativo, indivíduos
com BN mantêm um peso corporal dentro ou acima do intervalo normal.

(7) Anorexia Nervosa vs Condições médicas

• A perda de peso severa pode ocorrer em algumas condições médicas


(doença gastrointestinal, hipertiroidismo, malignidades ocultas, e
síndrome da imunodeficiência adquirida [SIDA]);
• Os indivíduos com estas condições médicas não manifestem alterações
na forma como o peso ou forma corporal são experienciados, medo
intenso de ganhar peso, nem comportamentos persistentes que
interferem com o aumento de peso.

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• A perda de peso aguda associada a condições médicas pode


ocasionalmente ser seguida pelo início ou recorrência de anorexia
nervosa, que pode ser mascarada por condições médicas comorbidas.

Dados Clínicos:

ü a semi-inanição característica da anorexia nervosa e os comportamentos


purgativos que às vezes lhes estão associados, podem resultar em
condições médicas potencialmente fatais;

ü distúrbios fisiológicos, incluindo amenorreia e anomalias nos sinais vitais,


são comuns. Enquanto a maioria dos distúrbios fisiológicos associados à
subnutrição são reversíveis com reabilitação nutricional, alguns,
particularmente a perda da densidade óssea (que torna a pessoa mais
suscetível a partir/quebrar algum osso), podem não ser totalmente
reversíveis;

ü alguns indivíduos com anorexia nervosa não apresentam anomalias nos


dados laboratoriais (há doentes que num estado de magreza extremos
apresentam colesterol alto devido a uma anomalia no corpo que muitas
vezes é lido como fora deste contexto pelo médico de família);

ü Alterações físicas:
o distúrbio do sono;
o disfunções gastrointestinais (obstipação);
o fadiga (perda de energia e cansaço ou momentos de enorme
agitação);
o hipersensibilidade ao som e à luz (intolerância ao som e à luz);
o edema (retenção de água particularmente nos tornozelos)
Exemplo: mulher que tinha “bolas de ténis” nos tornozelos porque
bebia 8 a 10 litros de água por dia
o hipotermia (corpo não produz calor);
o densidade mineral óssea baixa, com áreas específicas de
osteopenia ou osteoporose;

PTA | Joana Conceição


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o parestesias;
o diminuição do nível metabólico;
o diminuição do interesse sexual;
o pele seca;
o perda de cabelo;
o lanugo (penugem preta e fina)

ü Alterações emocionais e sociais:


o Sintomatologia depressiva e ansiosa
o irritabilidade
o labilidade emocional
o isolamento social

ü Alterações Cognitivas:
o Diminuição da capacidade de concentração e de atenção
o empobrecimento da capacidade de julgamento e apatia

Prevalência:
§ a prevalência (12 meses) da anorexia nervosa entre jovens mulheres é
aproximadamente 0.4%;
§ pouco se conhece acerca da prevalência entre homens, considera-se
que a distribuição por sexo apresenta um rácio 10/1 (mulheres/homens)

Início e Curso:
§ a AN começa geralmente durante a adolescência ou início da idade
adulta. Raramente começa antes da puberdade ou depois dos 40 anos,
embora tenham sido descritos casos com inícios precoces ou tardios.
o APA adverte que os clínicos não devem excluir a anorexia nervosa
do diagnóstico diferencial tendo como base apenas uma idade mais
avançada.
§ a hospitalização pode ser necessária:
o para restaurar o peso em pacientes com um estado de
emagrecimento que traduz perigo médico e abordar
complicações médicas (IMC inferior a 13 é considerado critério em
Portugal para cuidados de urgência e internamento hospitalar);

PTA | Joana Conceição


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o para interromper os episódios bulímicos, o vómito e/ou abuso


de laxantes se algum destes comportamentos implicarem riscos
médicos;
o para avaliar e tratar complicações físicas ou psicológicas
associadas sérias
Exemplos: quando uma anorexia se junta a um quadro de
diabetes e os doentes não tomam a insulina para manipular o
apetite e há consequências como a perda de visão; em casos de
mutilação; casos de bulimia, por exemplo, é normal num caso de
perturbação de personalidade borderline
§ A taxa bruta de mortalidade é aproximadamente 5% por década.
§ A morte é uma das consequências comuns das complicações médicas
associadas à perturbação em si e ao suicídio.
§ O risco de suicídio é alto na anorexia nervosa, com taxas de 12 por
100.000 por ano. Assim, a avaliação compreensiva dos indivíduos com
anorexia nervosa deve incluir avaliação da ideação e comportamentos
suicidas, assim como de outros fatores de risco incluindo o historial de
tentativa(s) de suicídio.

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AULA 8 – 11 ABRIL

Perturbações do Comportamento Alimentar

Tópicos para a entrevista clínica:


Avaliação Clínica
1. Dados demográficos, história
a) Peso Corporal e a terapêutica, circunstâncias do início do
História do Peso; tratamento;
b) Episódio bulímico, 2. Peso corporal atual e história
vómito, abuso de ponderal;
laxantes e outros 3. Comportamento de controlo do peso
comportamentos para (frequência, intensidade e duração);
controlar o peso; 4. Ingestão compulsiva e
c) Atitudes em relação ao comportamento alimentar;
peso e formas corporais; 5. Atitudes face ao peso e forma
d) Personalidade e corporal;
funcionamento pré- 6. Sintomatologia física;
mórbido 7. Dados psicológicos, interpessoais e
familiares;

Bulimia Nervosa

Características centrais

ü A importância extrema colocada no peso e formas corporais leva o doente


a restringir a ingestão alimentar de uma forma rígida;
ü A dieta rígida torna o doente física e psicologicamente vulnerável à perda
de controlo temporário sobre a alimentação;
ü A ingestão caótica que constitui a crise bulímica provoca uma acentuada
culpa, vergonha, sentimentos de ineficácia e desvalorização
acompanhados por medo mórbido de engordar;
ü O vómito tem como função eliminar o que foi ingerido e o potencial aumento
de peso, sendo uma tentativa de anulação da culpa;

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ü O vómito e o jejum total nas horas seguintes que inicialmente eram


percebidas pelo doente como estratégias eficazes, tornam-se
comportamentos repetitivos e ineficazes;
ü As contingências biológicas que derivam do ciclo de fome e ingestão
caótica são os grandes responsáveis pela manutenção do ciclo patológico
ingestão compulsiva/ purga;
ü Os pacientes com BN estão geralmente dentro do intervalo normal de peso
ou apresentam excesso de peso (IMC >_18,5 kg/m2 e < 30 em adultos).
o A perturbação pode ocorrer, mas é incomum, em pessoas com
obesidade.
ü Entre os episódios de compulsão alimentar, indivíduos com bulimia nervosa
costumam restringir significativamente o seu consumo calórico total e
optam por alimentos hipocalóricos, ao mesmo tempo que evitam alimentos
que percebem como hipercalóricos ou com potenciais desencadeadores de
compulsão alimentar;

Critérios de diagnóstico de Bulimia Nervosa segundo


DSM-5

A. Episódios recorrentes de compulsão alimentar. Um episódio de binge-


eating é caracterizado pelos dois seguintes critérios:
i. Ingerir, num período discreto de tempo (e.g., num período de 2
horas), uma quantidade de comida definitivamente superior ao que
a maioria das pessoas comeriam num período de tempo ou situação
semelhantes;
ii. Sensação de perda de controlo enquanto se come durante o
episódio (e.g., sensação de que não se consegue parar de comer ou
de controlar o que e quanto se come).
B. Comportamentos compensatórios inapropriados destinados a prevenir o
aumento de peso, como vómito autoinduzido, abuso de laxantes, diuréticos
ou outras medicações, jejum ou exercício excessivo;

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C. O binge-eating e os comportamentos compensatórios inapropriados


ocorrem ambos, em média, pelo menos uma vez por semana durante 3
meses;
D. A autoavaliação é indevidamente influenciada pelo peso ou forma corporal;
E. A perturbação não ocorre exclusivamente durante episódios de anorexia
nervosa.

O nível de severidade é baseado na frequência dos


comportamentos compensatórios inapropriados:

ü Ligeira: 1 - 3 episódios/semana
ü Moderada: 4 - 7 episódios/semana
ü Severa: 8 - 13 episódios/semana
ü Extrema: 14 ou + episódios/semana

Dados clínicos:

Ø A indução do vómito é o método purgativo mais comum, utilizado por 80


a 90% das pessoas com Bulimia Nervosa;
Ø Os efeitos imediatos do vómito incluem:
o alívio do desconforto físico
o diminuição da ansiedade e do medo de engordar.
Ø nalguns casos, o vómito torna-se um objetivo em si mesmo, e a pessoa
ingere compulsivamente alimentos para vomitar e/ou vomita mesmo
após a ingestão de uma pequena quantidade de alimentos;
Ø As pessoas com Bulimia Nervosa podem usar uma variedade de
métodos para induzirem vómito, após o seu uso frequente conseguem
fazê-lo facilmente.

Marcadores Diagnósticos

Diversas anormalidades laboratoriais podem ocorrer em consequência dos


comportamentos purgativos, incluindo:
• Anormalidades eletrolíticas, como hipocalemia (níveis de potássio no
sangue estão excessivamente baixos) que pode provocar arritmias

PTA | Joana Conceição


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cardíacas, hipocloremia (nível excessivamente baixo de cloro no


sangue) e hiponatremia (níveis de sódio no sangue estão
excessivamente baixos).
• A perda de ácido gástrico pelo vómito pode produzir alcalose
metabólica (nível sérico de bicarbonato elevado), e a indução frequente
de diarreia ou desidratação devido a abuso de laxantes e diuréticos
pode causar acidose metabólica.

A inspeção da boca pode revelar perda significativa e permanente do esmalte


dentário;

• a frequência de cáries dentárias também aparece aumentada;


• aumento das glândulas salivares, sobretudo as glândulas parótidas;
• calos ou cicatrizes na superfície dorsal da mão (sinais de Russel);

Prevalência

ü A prevalência de 12 meses da BN entre jovens do sexo feminino é de 1 a


1,5%.
ü A prevalência-ponto é maior entre adultos, já que o perturbação atinge seu
pico no fim da adolescência e início da idade adulta.
ü A perturbação é bem menos comum no sexo masculino do que no feminino,
com uma proporção feminino-masculino de aproximadamente 10:1.

Desenvolvimento e curso

ü A bulimia nervosa começa na adolescência ou na idade adulta jovem.


o A manifestação inicial antes da puberdade ou depois dos 40 anos é
incomum.
ü A compulsão alimentar com frequência começa durante ou depois de um
episódio de dieta para perder peso.

Perturbação de Ingestão Compulsiva

Dados Clínicos

ü A Perturbação de Ingestão Alimentar Compulsiva pode ocorrer em pessoas


com peso normal, com excesso de peso ou com obesidade.

PTA | Joana Conceição


76

ü Esta PCA é consistentemente associada ao excesso de peso e à


obesidade nos indivíduos que procuram tratamento.
ü Esta perturbação parece estar associada a um risco aumentado de ganho
de peso e desenvolvimento de obesidade.

Critérios de diagnóstico de PIC segundo DSM-5

A. Episódios recorrentes de compulsão alimentar. Um episódio de binge-


eating é caracterizado pelos dois seguintes critérios:
I. Ingerir, num período discreto de tempo (e.g., num período de 2
horas), uma quantidade de comida definitivamente superior ao que
a maioria das pessoas comeriam num período de tempo ou situação
semelhantes;
II. Sensação de perda de controlo enquanto se come durante o
episódio (e.g., sensação de que não se consegue parar de comer ou
de controlar o que e quanto se come).
B. Os episódios de binge-eating estão associados a três (ou mais) dos
seguintes critérios;
I. Comer muito mais rapidamente que o normal;
II. Comer até se sentir desconfortavelmente cheio;
III. Comer grandes quantidades de comida quando não existe fome
física;
IV. Comer sozinho devido a sentimentos de embaraço relativos à
quantidade de comida que se está a comer;
V. Sentir-se enojado de si mesmo, deprimido, ou muito culpado depois
de comer.
C. Está presente angústia ou sofrimento marcado relativa à experiência de
binge-eating;
D. O binge-eating ocorre, em média, pelo menos uma vez por semana durante
3 meses;
E. O binge-eating não está associado ao uso recorrente de estratégias
compensatórias (como na bulimia nervosa) e não ocorre exclusivamente
durante a evolução de bulimia nervosa ou anorexia nervosa

PTA | Joana Conceição


77

O nível de severidade é baseado na frequência dos


comportamentos compensatórios inapropriados:

ü Ligeira: 1 - 3 episódios/semana
ü Moderada: 4 - 7 episódios/semana
ü Severa: 8 - 13 episódios/semana
ü Extrema: 14 ou + episódios/semana

Prevalência

ü A prevalência de 12 meses de Perturbação de Ingestão Alimentar


Compulsiva (BED) entre mulheres e homens adultos norte- americanos
(com idade igual ou superior a 18 anos) é de 1,6 e 0,8%, respetivamente;
ü A distribuição por sexo é bem menos assimétrica na BED do que na bulimia
nervosa.

Desenvolvimento e Curso

ü A BED tem início, em geral, durante a adolescência ou na idade adulta


jovem, mas pode ter início posteriormente, na idade adulta.
ü Indivíduos com BED que procuram tratamento costumam apresentar uma
idade superior, quando comparados com os pacientes com bulimia nervosa
ou anorexia nervosa.

Outras Perturbações do Comportamento Alimentar

especificadas:

Esta categoria aplica-se a apresentações clínicas nas quais estão presentes


sintomas característicos de uma perturbação do comportamento
alimentar que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no
funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do
indivíduo, mas que não satisfazem todos os critérios para qualquer
perturbação na classe diagnóstica de PCA.

PTA | Joana Conceição


78

Anorexia Nervosa Atípica: Todos os critérios para anorexia nervosa são


cumpridos, exceto o peso (embora tenha havido uma perda de peso
significativa, o peso encontra- se dentro ou acima do intervalo normal);

Bulimia Nervosa (de baixa frequência e/ou duração limitada): Todos os critérios
para bulimia nervosa são cumpridos, mas o binge-eating e os comportamentos
compensatórios ocorrem, em média, menos de 1X semana e/ou durante
menos de 3 meses;

Perturbação de Ingestão Compulsiva (de baixa frequência e/ou duração


limitada): Todos os critérios da pert. de ingestão compulsiva são cumpridos,
mas o binge-eating ocorre, em média, menos de 1X semana e/ou durante
menos de 3 meses;

Perturbação Purgativa: Comportamento purgativo recorrente que influencia


o peso ou a forma corporal (e.g., vómito autoinduzido; abuso de laxantes,
diuréticos, ou outros medicamentos) na ausência de binge-eating;

Perturbação de Ingestão Noturna: Episódios recorrentes de ingestão


noturna, manifestados por comer após acordar ou pelo consumo excessivo de
comida após uma refeição noturna.
• Existe consciência e memória de que se comeu;
• O night-eating não é melhor explicado por influências externas, como
mudanças no ciclo vigília-sono do individuo ou por normas sociais
locais;
• O night-eating provoca mal-estar significativo e/ou compromete o
funcionamento;
O padrão perturbado de alimentação não é melhor explicado pela perturbação
de ingestão compulsiva ou por outra perturbação mental, incluindo o abuso de
substâncias e não é atribuída a outra condição médica nem a efeitos de uma
medicação.

Modelo transdiagnóstico

PTA | Joana Conceição


79

"more or less the same psychopathology is seen across the eating disorder
diagnoses, and its severity is much the same too"
(Fairburn, 2008, p. 10)

A proposta do Modelo Transdiagnóstico é a criação de uma categoria


diagnóstica única e singular para as PCAs, sem quaisquer subdivisões.
Argumentos a favor da
A psicopatologia das PCAs pode ser
solução transdiagnóstica
compreendida através das duas
componentes: 1) Semelhança das
características
✓ as gerais correspondem a psicopatológicas entre os
diferentes quadros de
características clínicas partilhadas entre
perturbação alimentar;
diferentes condições psiquiátricas;
2) Instabilidade diagnóstica e
nas alta taxa de migração
✓ as específicas dizem respeito às
entre os diferentes quadros
características definidoras e
clínicos de Perturbações do
diferenciadoras das PCA em relação às Comportamento Alimentar;
outras perturbações psiquiátricas;

A psicopatologia específica consiste na sobrevalorização do peso e das formas


corporais e do seu controlo. Este núcleo psicopatológico é específico da
patologia alimentar, sendo central em todos os quadros de PCA e semelhante
tanto nos pacientes do sexo masculino como feminino, tanto em adultos como
adolescentes;

O núcleo de psicopatologia é expresso por um conjunto de atitudes e


comportamentos:
a) a necessidade de controlo do peso, forma corporal e da alimentação e
medo de aumentar de peso ou ficar gordo/a;
b) a dieta ou comportamento alimentar restritivo;
c) os episódios de ingestão alimentar compulsivos;
d) os comportamentos compensatórios inapropriados que visam o controlo
ponderal;
e) a vigilância ou evitamento do peso e forma corporal;

PTA | Joana Conceição


80

f) comportamentos ritualísticos e bizarros em relação ao corpo e à


alimentação;

Se a partilha das características psicopatológicas específicas é evidente


entre todos os quadros clínicos de PCA em observações transversais,
quando se analisam estas perturbações numa perspetiva longitudinal as
semelhanças tornam-se ainda mais óbvias.

O Modelo Transdiagnóstico define a patologia alimentar como um conjunto de


ciclos psicopatológicos que se autoperpetuam:

1. Ciclo de restrição alimentar/valorização

2. Ciclo de restrição/ingestão compulsiva e culpa

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81

AULA 9 – 18 ABRIL

Depressão

“Estar deprimida”, estar


momentaneamente depressivo, é
diferente de uma depressão clínica,
de uma perturbação clinica.

Vídeo (living with depression”)

Nota: Humor irritável como


característica da depressão nos
mais novos, devido a uma desilusão
com a vida, as pessoas e
experiências.

Apesar de haver a mesma identidade diagnóstica, as experiências e a forma


como a perturbação se se desenvolve é diferente de pessoa para pessoa.

Humor, emoção e afetos: semiologia psicopatológica

Semiologia psicopatologica

Emoção Afeto Estado de Humor


“estado emocional que
resposta a curto- resposta
dura já há algum tempo,
prazo emocional em
constituindo uma
dado momento
disposição - reativa ou
Temperamento endógena - para reagir
traços estáveis ao Humor aos acontecimentos com
longo da vida, uma determinada
predisposição Estado afetivo espécie de emoção que
com possível base basal, de ânimo; dá colorido à vida total do
longo-prazo indivíduo”
genética

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82

Perspetiva da Semiologia Psicopatológica

Estado de humor: depressivo (tudo é visto pelo lado


Vídeo “O que é a
negro, ou “sem graça”) depressão?” de Helen
M. Farrell (Tedtalk):
ü Variação diurna? Ou seja, varia da manhã
para a tarde? Humor deprimido matinal
https://www.youtube.co
mais comum na chamada depressão m/watch?v=z-
endógena (Morais e Saraiva, 2015) IR48Mb3W0
ü Predomina a tristeza patológica (ou)
o sem desencadeante,
o com intensidade e duração
desproporcionadas ao precipitante
ü Tríade cognitiva de Beck (visão negativa de
si, dos outros/mundo; do futuro)

O humor depressivo é o sintoma de base das perturbações depressivas


mas não sinónimo, já que:

1. os quadros depressivos envolvem comummente outros sintomas, tais


como:
a. anedonia (= incapacidade de experimentar prazer; insere-se nas
alterações da expressão afetiva e emocional)
b. alterações da energia vital (líbido, sono, redução energia)
c. alterações da atividade motora (hipocinésia);
2. cerca de 10% das depressões caracterizam-se por humor deprimido
ausente ou muito atenuado, ocorrendo equivalentes depressivos
(nomeadamente somáticos)

Perturbações depressivas segundo DSM-5:

Caracterizam-se pela presença de humor Aspetos como a duração,


triste, irritável ou “vazio”, juntamente com momento e suposta etiologia,
alterações somáticas e cognitivas, com permitem destrinçar diferentes
um impacto significativo na capacidade perturbações Depressivas
de funcionamento.

PTA | Joana Conceição


83

Nota: as anteriores edições da DSM consideravam uma categoria designada


por Perturbações Do Humor, que incluía, quer as perturbações depressivas,
quer as perturbações bipolares e relacionadas, categorias que agora
aparecem separadas na DSM-V.

Depressão:

o Perturbação depressiva major


o Perturbação de Regulação do Humor Disruptiva;
o Perturbação Depressiva Persistente (Distimia);
o Perturbação Disfórica pré-menstrual;
o Perturbação Depressiva induzida por substâncias/medicação;
o Perturbação Depressiva devida a outras condições médicas.

Exemplos de doenças orgânicas que podem induzir depressão:


§ doenças endócrinas (e.g., hipo e hipertiroidismo);
§ virais (e.g., pneumonia, hepatite);
§ outras (e.g., artrite reumatoide, carcinoma por explo do pâncreas;
insuficiência renal).

Exemplos de drogas que podem induzir depressão:


§ corticosteroides;
§ citostáticos;
§ estrogénios;
§ progesterona.

Perturbação Depressiva Major

Critérios de diagnóstico de Perturbação Depressiva Major


do DSM-5

A. Estão presentes 5 (ou mais) dos seguintes sintomas durante o mesmo


período de 2 semanas e representam uma alteração do funcionamento

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84

prévio: pelo menos um dos sintomas é 1) humor depressivo ou 2) perda de


prazer ou interesse.
1) Humor depressivo durante a maior parte do dia, quase todos os dias
(triste, vazio, hopless) ou observação feita por outros (e.g., choroso).
Em crianças e adolescentes o humor pode ser irritável;
2) Diminuição clara do interesse ou prazer em todas, ou quase todas,
as atividades durante a maior parte do dia, quase todos os dias (por
relato subjetivo ou descrição dos outros);
3) Perda ou aumento do peso, diminuição ou aumento do apetite. Em
crianças considerar o não atingimento dos aumentos esperados de
peso;
4) Insónia ou hipersónia quase todos os dias;
5) Agitação ou inibição psicomotora quase todos os dias (observável
por outros);
6) Fadiga ou perda de energia quase todos os dias;
7) Sentimentos de desvalorização ou culpa excessiva ou inapropriada
(que pode ser delirante) quase todos os dias;
8) Diminuição da capacidade de pensamento ou concentração, ou
indecisão, quase todos os dias (por relato do próprio ou observação
dos outros);
9) Pensamentos recorrentes acerca da morte (não somente acerca do
medo de morrer), ideação suicida recorrente sem um plano
específico ou uma tentativa de suicídio, ou com um plano específico
para cometer suicídio.
B. Os sintomas causam mal-estar clinicamente significativo ou deficiência no
funcionamento social, ocupacional ou em qualquer outra área importante
C. Os sintomas não são causados pelo efeito fisiológico direto de uma
substância (e.g. droga, medicação) nem por um estado físico geral (e.g.
hipotiroidismo).
D. Pelo menos um episódio depressivo major não é melhor explicado por outra
perturbação.
E. Nunca houve um episódio maníaco ou hipomaníaco (esta exclusão não se
aplica se estes episódios são induzidos por substâncias ou atribuível aos
efeitos fisiológicos de outra condição médica)

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85

Nota. Respostas a uma perda significativa (e.g., luto), podem incluir


sentimentos de tristeza intensa, ruminação acerca da perda, insónia, perda de
apetite e peso, como no critério A, que podem parecer um episodio depressivo.
Apesar destes sintomas se poderem compreender ou poderem ser
considerados apropriados à perda, deve ser cuidadosamente considerada a
possibilidade de existir a presença de um episodio depressivo major, para além
da resposta normal a uma perda significativa.

Distimia

Critérios de diagnóstico de Distimia do DSM-5

A. Humor deprimido na maior parte do dia, na maioria dos dias, indicado por
relato subjetivo ou por observação feita por outras pessoas, pelo período
mínimo de dois anos.

Nota: Em crianças e adolescentes, o humor pode ser irritável, com duração


mínima de um ano.

B. Presença, enquanto deprimido, de duas (ou mais) das seguintes


características :
1. Apetite diminuído ou alimentação em excesso.
2. Insonia ou hipersonia.
3. Baixa energia ou fadiga.
4. Baixa autoestima.
5. Concentração pobre ou dificuldade em tomar decisões. 6.
Sentimentos de desesperança.
C. Durante o período de dois anos (um ano para crianças ou adolescentes) de
perturbação, o indivíduo jamais esteve sem os sintomas dos Critérios A e
B por mais de dois meses.
D. Os critérios para uma perturbação depressiva major podem estar
continuamente presentes por dois anos.
E. Jamais houve um episódio maníaco ou um episódio hipomaníaco e jamais
foram satisfeitos os critérios para transtorno ciclotímico.

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F. A perturbação não é mais bem explicada por um transtorno esquizoafetivo


persistente, esquizofrenia, transtorno delirante, outro transtorno do
espectro da esquizofrenia e outro transtorno psicótico especificado ou
transtorno do espectro da esquizofrenia e outro transtorno psicótico não
especificado.
G. Os sintomas não se devem aos efeitos fisiológicos de uma substância (p.
ex., droga de abuso, medicamento) ou a outra condição médica (p. ex.,
hipotireoidismo).
H. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no
funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida
do indivíduo.

Perturbação Depressiva Persistente (distimia)

Nota: Se os critérios forem suficientes para um diagnóstico de um


episódio depressivo maior a qualquer momento durante o período de 2
anos de humor deprimido, então um diagnóstico separado de depressão

major deve ser feito além do diagnóstico de transtorno depressivo

persistente, juntamente com o especificador relevante (por exemplo, com

episódios depressivos maiores intermitentes, com episódio atual).

Especificar se se associa:
Ø Com angústia ansiosa (pp. 210–211)
Ø Com características atípicas (p. 212)

Ø Em remissão parcial (p. 214)


Ø Em remissão total (p. 214)

Especificar quanto ao seu início:


Ø Início precoce: Se o início for antes dos 21 anos de idade.

Ø Início tardio: Se o início for aos 21 anos de idade ou mais.

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Especificar se (para os últimos 2 anos de depressão persistente


desordem):
a) Com síndrome distitômica pura: Os critérios completos para um

episódio depressivo maior não foram atendidos em pelo menos os 2


anos anteriores.
b) Com episódio depressivo maior persistente: Os critérios completos para

um episódio depressivo maior foram atendidos ao longo do período


anterior de 2 anos.

Perturbação Depressiva Persistente com episódios depressivos maiores


intermitentes:
Ø com episódio atual: os critérios completos para um episódio
depressivo maior são atendidos atualmente, mas houve períodos de
pelo menos 8 semanas em pelo menos os 2 anos anteriores com
sintomas abaixo do limite para um episódio depressivo maior
completo.
Ø sem episódio atual: os critérios completos para um episódio
depressivo maior não são atendidos atualmente, mas houve um ou
mais episódios depressivos maiores em pelo menos nos 2 anos
anteriores.

Especificar a gravidade atual:


1) Leve
2) Moderado
3) Severa

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Perturbação de Desrregulação Disruptiva de

Humor

Critérios de diagnóstico de Perturbação de Desrregulação


Disruptiva de Humor do DSM-5

A. Explosões de temperamento recorrentes severas manifestadas


verbalmente (por exemplo, raivas verbais) e/ou comportamentalmente (por
exemplo, agressão física contra pessoas ou propriedades) que são
grosseiramente desproporcionais em intensidade ou duração à situação ou
provocação.
B. As explosões de temperamento são inconsistentes com o nível de
desenvolvimento.
C. As explosões de temperamento ocorrem, em média, três ou mais vezes por
semana.
D. O humor entre explosões de temperamento é persistentemente irritável ou
irritado a maior parte do dia, quase todos os dias, e é observável por outros
(por exemplo, pais, professores, colegas).
E. Os critérios A-D estão presentes há 12 ou mais meses. Ao longo desse
tempo, o indivíduo não teve um período com duração de 3 ou mais meses
consecutivos sem todos os sintomas nos Critérios A-D.
F. Os critérios A e D estão presentes em pelo menos duas das três
configurações (ou seja, em casa, na escola, com os colegas) e são graves
em pelo menos uma delas.
G. O diagnóstico não deve ser feito pela primeira vez antes dos 6 anos ou após
os 18 anos.
H. Por história ou observação, a idade no início dos Critérios A-E é anterior a
10 anos.
I. Nunca houve um período distinto com duração superior a 1 dia durante o
qual os critérios completos de sintomas, exceto a duração, para um
episódio maníaco ou hipomaníaco tenham sido atendidos.

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Nota: A elevação do humor apropriada ao desenvolvimento, como ocorre no


contexto de um evento altamente positivo ou sua antecipação, não deve ser
considerada como um sintoma de mania ou hipomania

J. Os comportamentos não ocorrem exclusivamente durante um episódio de


transtorno depressivo maior e não são melhor explicados por outro
transtorno mental (por exemplo, transtorno do espectro do autismo,
transtorno de estresse pós-traumático, transtorno de ansiedade de
separação, transtorno depressivo persistente)

Perturbação Disfórica Pré-menstrual

Critérios de diagnóstico de Perturbação Disfórica Pré-menstrual do


DSM-5

A. Na maioria dos ciclos menstruais, pelo menos cinco sintomas devem estar
presentes na última semana antes do início da menstruação, começar a
melhorar dentro de alguns dias após o início da menstruação e tornar-se
mínimos ou ausentes na semana pós-menses.
B. Um (ou mais) dos seguintes sintomas deve estar presente:
a. Labilidade afetiva marcada (por exemplo, mudanças de humor;
sentir-se repentinamente triste ou choroso, ou maior sensibilidade à
rejeição).
b. Irritabilidade ou raiva marcadas ou aumento dos conflitos
interpessoais.
c. Humor deprimido marcado, sentimentos de desesperança ou
pensamentos autodepreciáveis.
d. Ansiedade marcada, tensão e/ou sentimentos de estar ligado ou no
limite.
C. Um (ou mais) dos seguintes sintomas também deve estar presente, para
atingir um total de cinco sintomas quando combinado com os sintomas do
Critério B acima.
a. Diminuição do interesse em atividades habituais (por exemplo,
trabalho, escola, amigos, hobbies).

PTA | Joana Conceição


90

b. Dificuldade subjetiva de concentração.


c. Letargia, fatigabilidade fácil ou marcada falta de energia.
d. Mudança marcada no apetite; comer demais; ou desejos específicos
de comida.
e. Hipersônia ou insônia.
f. Uma sensação de estar sobrecarregado ou fora de controle.
g. Sintomas físicos como sensibilidade ou inchaço dos seios, dor nas
articulações ou músculos, sensação de “inchaço” ou ganho de peso.

Nota: Os sintomas nos Critérios A-C devem ter sido atendidos na


maioria dos ciclos menstruais que ocorreram no ano anterior.

D. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou interferência


no trabalho, na escola, nas atividades sociais usuais ou nos
relacionamentos com outras pessoas (por exemplo, evitar atividades
sociais; diminuição da produtividade e eficiência no trabalho, na escola ou
em casa).
E. O distúrbio não é apenas uma exacerbação dos sintomas de outro
transtorno, como transtorno depressivo maior, transtorno de pânico,
transtorno depressivo persistente ou transtorno de personalidade (embora
possa ocorrer concomitantemente com qualquer um desses transtornos).
F. O critério A deve ser confirmado por classificações diárias prospectivas
durante pelo menos dois ciclos sintomáticos. (Nota: O diagnóstico pode ser
feito provisoriamente antes desta confirmação.)
G. Os sintomas não são atribuíveis aos efeitos fisiológicos de uma substância
(por exemplo, uma droga de abuso, um medicamento, outro tratamento) ou
outra condição médica (por exemplo, hipertireoidismo).

Prevalência das Perturbações Depressivas (OMS, 2017)

A perturbação depressiva carateriza-se essencialmente por:


1) humor deprimido na maior parte do dia
2) diminuição ou perda do interesse em atividades prazerosa
3) perturbações do sono

PTA | Joana Conceição


91

4) perda de energia
5) sentimentos de culpa e desvalorização
6) por vezes, pensamentos recorrentes acerca da morte ou morrer.

A depressão é considerada como uma das primeiras causas de incapacidade


entre todas as doenças e apresenta um risco acrescido de comorbilidade e
suicídio.

Em 2015, cerca de 300


Verifica-se um
milhões de pessoas
acréscimo de 18% dos
apresentavam depressão,
índices de depressão
representando cerca de
desde 2005.
4.4% da população mundial.

Ø A prevalência de 12 meses, nos Estados Unidos, é de cerca 7%


Ø A prevalência em indivíduos de 18 a 29 anos é três vezes maior do que a
prevalência em indivíduos acima dos 60 anos.

Prevalência em Portugal

Os dados epidemiológicos existentes sobre a prevalência da depressão em


Portugal nos diferentes grupos etários e contextos são escassos (Gustafson
et al., 2013).

1) Estudo de Vaz Serra e Firmino (1989) - 17% da população geral


apresentava sintomatologia depressiva.
2) Censo Psiquiátrico Português (2011) - prevalência de 14.9% (Bento,
Carreira, & Heitor, 2011).
3) Estudo Epidemiológico Nacional de Saúde Mental (2013) -
prevalência durante a vida das perturbações psiquiátricas de 42.7% e
das perturbações depressivas de 19.3% (Caldas de Almeida & Xavier,
2013).

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92

Depressão, género e idade

ü O género feminino é um fator de risco para a sintomatologia depressiva


(Kennedy, 2015; Schoevers et al., 2003; Vink et al., 2008)
ü As mulheres experimentam índices de depressão 1,5 a 3 vezes mais
altos do que os homens, começando estas diferenças no início da
adolescência.
ü O aumento da idade é um fator de risco para a sintomatologia
depressiva (Duarte & Matos, 2018; Rico, 2004; Vink et al., 2003

Curso

ü Pode aparecer pela primeira vez em qualquer idade, mas a


probabilidade de início aumenta com a puberdade.
ü Nos Estados Unidos, a incidência parece atingir seu pico na década dos
20 anos.
ü Um início recente está fortemente associado com mais probabilidade
de recuperação em curto prazo, e pode-se esperar que muitos
indivíduos que estiveram deprimidos por apenas alguns meses
recuperem espontaneamente.
ü Características associadas a taxas mais baixas de recuperação,
incluem:
o duração do episódio atual
o características psicóticas
o ansiedade proeminente
o perturbações da personalidade
o gravidade dos sintomas.

Fatores de risco

1) Temperamentais
a. Afetividade negativa (neuroticismo): Altos níveis parecem aumentar
a probabilidade de os indivíduos desenvolverem episódios
depressivos em resposta a eventos stressantes na vida
2) Ambientais

PTA | Joana Conceição


93

a. Experiências adversas na infância, particularmente quando existem


múltiplas.
b. Acontecimentos indutores de stress são precipitantes frequentes de
episódios depressivos majores
3) Genéticos e fisiológicos
a. Os familiares de primeiro grau de indivíduos com PDM têm risco 2 a
4 vezes mais elevado de desenvolver a doença que a população em
geral.
b. Os riscos relativos parecem ser mais altos para as formas de início
precoce e recorrente.
c. O peso da hereditariedade é de aproximadamente 40%.

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94

AULA 10 – 2 MAIO

Depressão
Continuação da aula anterior

Insight
Ø Nos casos menos graves, os doentes conseguem perceber que há um
pensamento tendencialmente negativo.
Ø Nos casos mais graves não há esta perceção.

Procura de ajuda e diagnóstico


A forma destes doentes procurarem ajuda é recorrer a
serviços médicos, não se queixando da sintomatologia
depressiva, mas sim de outros problemas: desta
forma, percebesse o porquê de só 1/3 dos doentes com
depressão serem corretamente diagnosticados e
tratados, visto que, muitas vezes só se queixam de problemas
somáticos e não apresentam isto como um problema emocional. O próprio
clínico tem alguma dificuldade em fazer o diagnóstico. O doente muitas vezes
não se queixa porque tem medo do estigma, ser mal visto pelo médico e que
o diagnóstico de depressão possa ter consequências na sua vida,
principalmente ao nível laboral.

Aspeto mais biológico da depressão – desvio funcional depressivo :


corresponde aquelas alterações conhecidas na depressão, mas que tem um
teor mais biológico e fazem parte destas alterações do desvio funcional
depressivo como:
a) Sono
b) Apetite
c) Peso
d) Líbido
e) Variações diurnas do humor

PTA | Joana Conceição


95

Exemplo de um melancólico – é de manhã que ele se sente pior.

Diagnóstico diferencial - Como distinguir a depressão de outras


perturbações?

Ø Ansiedade
É muito importante percebermos que a comorbilidade entre
ansiedade e depressão é elevada e que há pistas para
podermos distingui-las.
• O doente deprimido apresenta uma maior variação
de diurna de humor do que o doente ansioso.
• Revelam-se mais acontecimentos de perdas
afetivas e há mais insónia terminal e na
ansiedade há insónia inicial. Na depressão
há mais inibição motora e a problemática do suicídio.
• No curso de uma ansiedade é possível desenvolver-se
secundariamente a depressão e vice-versa.
• Importante se algumas manifestações da ansiedade são secundárias a
um estado depressivo - importante perceber a relação que se
estabelece porque isso tem implicações no tratamento.

Ø Esquizofrenia
Em formas mais graves de depressão, o diagnóstico diferencial torna-se difícil.
Há pessoas em depressão que também apresentam delírios.
• Nos doentes deprimidos, a alucinação auditiva tem um conteúdo auto-
depressivo e na primeira pessoa, sendo congruente com o estado
depressivo. Na esquizofrenia é na segunda e na terceira pessoa.
• Há a possibilidade de haver depressão num contexto de esquizofrenia
– perturbação esquizoafetiva
• Habitualmente as ideias delirantes de um doente deprimido inclui os tais
delírios de ruína, delírios de culpabilidade e ideias delirantes mais
hipocondríacas.

PTA | Joana Conceição


96

Ø Demência
Para fazermos um diagnóstico diferencial sobre isto, quando há dificuldade de
atenção (…) é muito importante ver o que é que apareceu primeiro: Primeiro
houve teorização cognitiva ou depressão? Se ele está confuso ou perturbado?
• Se os défices e transtornos cognitivos não são tão generalizados –
depressão.
• Tudo o que seja transtornos cognitivos generalizados e confusão –
demência
A própria forma como o dente está na consulta e se consegue explicar o que
se passou ao longo da vida, mais depressão do que demência. A fonte de
informação dos familiares é muito importante

Ø Diagnostico diferencial com situações orgânicas


A depressão pode coexistir com várias doenças: por exemplo, doença
oncológica, os doentes oncológicos que acabam por se deprimir.
Quando a depressão aparece de uma forma tardia (meia-idade) é muito
importante fazer-se um exame físico deste doente – por exemplo, exames
oncológicos- porque pode haver outro tipo de doenças.

Ø Doenças endócrinas
• Hipertiroidismo – associa-se mais a estados de ansiedade
• É também importante ver a existência de consumos de substâncias, há
vários que podem causas sintomatologia depressiva (exemplo: a pílula,
medicamentos para a hipertensão)

Comorbilidade:
Na depressão é um fenómeno muito importante. Os
deprimidos puros são raros.
• Mais de 75 % dos pacientes deprimidos mostram
outra comorbilidade com outras perturbações
psiquiatras
• A comorbilidade mais estudada é entre ansiedade e depressão: mais
de 50% apresentam os 2 em comorbilidade

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97

• As perturbações de ansiedade têm maior comorbilidade na depressão:


fobia social, pânico, perturbação de ansiedade generalizada
• Relação entre Ansiedade e depressão: dimensão do afeto negativo
o Esta reação foi estudada por autores como Watson - Modelo
tripartido da ansiedade e depressão

Modelo tripartido de Watson e Clark:

O modelo tripartido de Watson e Clark é uma teoria psicológica que descreve


a relação entre emoções negativas, especificamente ansiedade e depressão.
Esse modelo foi proposto por David Watson e David Clark em 1991 e busca
explicar como esses transtornos psicológicos se relacionam entre si.

De acordo com o modelo tripartido, existem três sistemas emocionais básicos


envolvidos:
1) sistema de ansiedade (a ansiedade é caracterizada por um aumento
na ativação, preocupação excessiva e uma resposta de "lutar ou fugir")
2) sistema de depressão (a depressão é marcada por uma diminuição na
ativação, sentimentos de tristeza, desesperança e falta de interesse e
uma resposta de "dar-se por vencido")
3) sistema de afeto positivo baixo.

Segundo o modelo, a ansiedade e a depressão são duas dimensões distintas,


mas relacionadas, que podem ocorrer independentemente uma da outra. A
comorbilidade entre ansiedade e depressão pode ocorrer devido a um terceiro
fator, o sistema de afeto positivo baixo/pensamentos negativos, que se
refere à dificuldade em experimentar emoções positivas, prazer e entusiasmo
na vida (preocupação, nervosismo, irritabilidade, baixa auto-estima). Tanto a
ansiedade quanto a depressão podem estar relacionadas a uma diminuição do
afeto positivo, o que pode contribuir para a ocorrência conjunta desses
transtornos.

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98

Regulação Emocional e Ruminação

A regulação emocional refere-se ao processo pelo qual uma

pessoa modula, controla ou gerencia suas emoções. Envolve a


capacidade de reconhecer, compreender e lidar com as emoções
de maneira saudável e adaptativa. A regulação emocional
desempenha um papel fundamental na saúde mental e no bem-
estar geral.

A ruminação, por outro lado, é um padrão de pensamento

repetitivo e persistente sobre eventos stressantes ou problemas,


especialmente aqueles relacionados a emoções negativas. É um
processo de pensamento autodirigido que envolve a repetição
contínua de pensamentos, preocupações ou reflexões sobre uma
situação emocionalmente carregada, sem chegar a uma solução
ou resolução. A ruminação tende a prolongar e intensificar as
emoções negativas, levando a um estado prolongado de estresse emocional.

Relação entre regulação emocional e ruminação:

ü a habilidade de regular as emoções de forma eficaz pode ajudar a reduzir


a tendência de ruminação. Quando alguém é capaz de identificar suas
emoções, compreendê-las e geri-las de maneira saudável, é menos
provável que se envolva em ruminação excessiva. Por exemplo, estratégias
de regulação emocional, como a expressão emocional adequada, a
resolução de problemas e o desenvolvimento de pensamentos positivos,
podem interromper o ciclo de ruminação.
ü a dificuldade em regular as emoções pode aumentar a propensão à
ruminação. Pessoas que têm dificuldade em lidar com emoções negativas
podem ficar presas em um padrão de ruminação, incapazes de se afastar
dos pensamentos negativos e encontrar maneiras construtivas de lidar com
eles. A ruminação repetitiva pode alimentar as emoções negativas e
contribuir para o desenvolvimento ou agravamento de problemas de saúde
mental, como a ansiedade e a depressão.

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99

Portanto, aprender estratégias de regulação emocional, como o


desenvolvimento da consciência emocional, a prática da atenção plena
(mindfulness), a busca de apoio social e o cultivo de pensamentos positivos,
pode ser útil para interromper a ruminação e promover um melhor equilíbrio
emocional. Além disso, a terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma
abordagem terapêutica comumente utilizada para ajudar as pessoas a
desenvolver habilidades de regulação emocional e interromper padrões de
ruminação negativa.

Exemplos de frases ditas em consulta:

Ø “Vou começar a chorar e não vou conseguir parar” – assustador para os


doentes porque não tem capacidades de regulação emocional. É
necessário trazer à tona emocionalidade negativa para trabalhar a
própria regulação emocional.
Ø “Eu antes chorava e agora não consigo” – habitualmente é sinal de um
evitamento e depressão grave.

Caso prático:

Mulher com 48 anos, solteira e é professora. Foi encaminhada para consultas


porque tem episódios depressivos recorrentes desde os 20 anos – consulta de
psicoterapia
Tem há 7 anos o diagnóstico de uma doença orgânica – doença autoimune.
Estava medicada quando veio para a consulta e já tomava a medicação há
bastante tempo e ela própria aumenta a medicação quando se sente pior e
diminuía quando se sentia melhor.
Veio sozinha e aparenta tristeza, chorava imenso e normalmente quando se
lembrava de algo da vida que não tina corrido de alguém ou a falar de aspetos
recentes como em situações que ela tinha dificuldade em lidar

Dificuldade atuais:

• Elevada habilidade emocional e choro

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100

• Dificuldade em lidar com muitas situações do seu quotidiano – se surge


alguma alteração no horário ela fica irritada e sente que isso lhe estraga
o dia
• Problemas na área da relação com os outros - relacionamento amoroso,
família, quer na escola com alunos, colegas, amigos.
• Tem um namorado, mas ele não assume o namoro – encontram-se
quando ele quer e sobretudo para desenvolver atividade sexual, mostra-
se pouco disponível. Não se sente feliz, mas não é capaz de terminar
esta relação.
• Relação com a família- são frequentes conflitos com a mãe e com o
irmão. Com a mãe a forma de ver as coisas, a diferença de idades e
com o irmão, diferenças de feitio, diferentes formas de lidar com as
situações – ela sente-se distante
• Com os alunos ela relata imensos conflitos – os alunos estão
constantemente a desafiá-la e queixam se dela por tudo. “quando é que
eu me vou passar da cabeça” – há uma visão devastadora sobre os
alunos. “tenho muito medo de me passar da cabeça, que me gravem,
“sabe que isto já tem acontecido com outros colegas” – ela teme isto
• O confronto deixa-a esgotada e sente que não tem apoio dos colegas e
da direção da escola.
• Desvalorização dela própria – é pior professora que os outros
professores
• Está descontente com a sua atividade profissional
• dificuldade de concentração e memória
• A irritabilidade é uma constante no dia a dia –“ se estiver a conduzir
numa rua com transito começo a sentir -me irritada”; conversa de fundo
– deixa a paciente nervosa e irritada
• alterações nos padrões do sono – insónia inicial e terminal
• extremo cansaço
• medo de deixar de ter capacidades para dar aula
• medo que se alguém desconfiasse que ela tinha depressão
• os sintomas e problemas tem uma interferência significativa na sua vida

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101

• utiliza estratégias inadequadas – não era impulsiva está muito +, dá


como exemplo” decidi fazer um teste com apenas 2 questões e depois
arrependeu-se” – agravamento de problemas.
• Continua a fazer poucas atividades que lhe dão prazer – beber café, ver
televisão e palavras cruzadas, no entanto, há alguns dias em que nem
isto consegue fazer e acaba por se isolar.

Tem, no entanto, expectativas positivas em relação à terapia – ela acha q a


psicoterapia a vai ajudar a lidar melhor com os problemas. Dar uma visão
diferente de si, do mundo e do futuro

Este namoro foi terminado - conseguiu ficar sozinha e mais disponível para
outras relações – e foi morar sozinha do decurso deste tratamento.

Reestruturação cognitiva – muito importante. Podemos alterar um ciclo vicioso


alterando comportamentos

Resposta: Perturbação depressiva major

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102

Depressão no Idoso
A Depressão Geriátrica

Tem consequências negativas no funcionamento do indivíduo, como a


redução da qualidade de vida e o aumento da mortalidade (Vink et al.,
2008)

Associa-se:
a) a sofrimento no indivíduo e cuidador,
b) aumento da incapacidade associada a doença física e transtornos
cognitivos,
c) aumento de custos com cuidados de saúde
d) aumento de mortalidade associada com suicídio e doenças físicas.

É frequentemente sub-diagnosticada e secundária a doenças físicas.


Apresenta mais sintoma somáticos ou hipocondríacos e pior resposta
ao tratamento.

O que pode contribuir para dificuldades no diagnóstico e respetiva


intervenção :
1) os idosos podem ter quadros clínicos mais atípicos
2) a falsa crença dos profissionais, da família e do idoso de que a tristeza e a
depressão fazem parte do envelhecimento (Veríssimo, 2006)
3) a tendência dos idosos para exibir queixas somáticas constantes e a sua
maior dificuldade em exprimir sentimentos de tristeza (Firmino et al., 2016).

Prevalência da depressão no idoso

As perturbações depressivas são a segunda principal causa de doença na


população geriátrica, dando o primeiro lugar às patologias cardíacas
(Kennedy, 2015).

ü Um estudo realizado com uma amostra de idosos inscritos nos centros


de saúde em Portugal, com idade igual ou superior a 65 anos, identificou

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103

uma prevalência provável de 42% de sintomatologia depressiva (Sousa


et al., 2010).
ü A prevalência é mais elevada no género feminino do que no masculino
(Kennedy, 2015 ; Schoevers et al., 2003; Vink, Aartsen, & Schoevers, 2008).

Etiologia complexa

ü Aspetos biológicos, socIais e psicológicos


exercem papel importante no desencadear e na
manutenção dos quadros depressivos.
ü A influência do próprio envelhecimento
no aparecimento e curso da depressão não está
muito clara. O ajustamento psicológico à idade é
complexo.
ü Aceitar a doença e a morte também é difícil.

Depressão e ansiedade no idoso

Existe uma associação significativa entre a sintomatologia depressiva e


ansiosa.

ü Byrne (2002) refere que a ansiedade está associada às perturbações


depressivas e às doenças físicas.
ü O estudo de Xavier, Ferraz, Bertolucci, Poyares e Moriguchi (2001), com
uma amostra de idosos com mais de 80 anos, constatou que 10.6% dos
idosos apresentavam sintomatologia ansiosa, e que a mesma
estava associada à sintomatologia depressiva.

É importante que os profissionais considerem a presença de comorbilidades


entre ansiedade e sintomatologia depressiva.

Depressão e demência no idoso

Muitas das vezes, a depressão na terceira idade vem acompanhada de perdas


cognitivas, sendo nestes casos denominada de "pseudodemência

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104

depressiva", o que dificulta o diagnóstico diferencial entre depressão e


demência.

Muitos dos sintomas depressivos, como a desmotivação, apatia, embotamento


afectivo, dificuldades de concentração, discurso e psicomotricidade mais
lentos são também sintomas de quadros demenciais.

Como podemos diferenciar a depressão da demência?

A ordem de ocorrência dos sintomas ajuda a distinguir depressão de


demência: habitualmente os doentes cujas alterações cognitivas precedem os
sintomas depressivos parecem ter maior probabilidade de estarem a
desenvolver uma “verdadeira” demência do que aqueles em que a
sintomatologia depressiva precede as alterações cognitivas.

Doentes com depressão

§ Catastrofizam as suas dificuldades mnésicas e podem até ter


resultados inferiores à média nos testes de memória, mas isto
acontece não por dificuldades mnésicas reais mas por pouca
motivação para o desempenho de tarefas.
§ Habitualmente apresentam maiores dificuldades na memória a
longo prazo, o que poderá ser confirmado através de uma
avaliação de neuropsicologia, que escrutina as várias memórias.
É também fundamental avaliar se as dificuldades mnésicas se
instalaram súbita ou gradualmente e se o idoso tem historial
familiar de depressão ou demência.

Diagnóstico diferencial

Muito frequentemente um quadro clínico de demência pode ser


acompanhado de depressão, o que dificulta o diagnóstico diferencial.

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105

O diagnóstico diferencial deverá ser realizado preferencialmente por um


médico especialista, nomeadamente de neurologia ou psiquiatria, que poderá
requisitar vários exames complementares crânio-encefálicos como a
• T.A.C. (Tomografia Axial Computorizada)
• R.M. (Ressonância Magnética).
É também aconselhável a realização de uma avaliação neuropsicológica.

Depressão Demência

1. Início bem demarcado; 1. Início indistinto;


2. Historial familiar de depressão; 2. Historial familiar de demência;
3. Queixas de perdas cognitivas; 3. Poucas queixas (por parte do
4. História de dificuldades próprio) de perdas cognitivas;
psicológicas ou de crise de vida 4. História de dificuldades
recente; psicológicas ou de crise de vida
5. Perdas cognitivas posteriores à pouco frequente;
sintomatologia depressiva; 5. Alterações cognitivas anteriores
6. Pouco esforço durante a aplicação aos sintomas depressivos;
do exame neuropsicológico; 6. Luta frequente para executar as
7. Maiores défices na memória a tarefas cognitivas;
longo prazo; 7. Maiores défices na memória a
8. Melhoria de défices cognitivos curto prazo;
com medicação antidepressiva; 8. Melhoria pouco significativa dos
défices cognitivos com
antidepressivos

Apoio Social e Depressão

Em diversas faixas etárias é possível verificar o efeito do apoio social na


sintomatologia depressiva.
Ø Num estudo de Wang, Cai, Qian e Peng (2014), com estudantes, verificou-
se que níveis baixos de apoio social aumentam a relação entre o stress
e a sintomatologia depressiva.

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106

Ø Níveis elevados de apoio social podem permitir melhorar a auto-estima


e autoeficácia para lidar com as emoções negativas como a depressão
(Lee, Dickson, & Holmbeck, 2014).

Relativamente às fontes de apoio que protegem da depressão, estas


variam ao longo do ciclo da vida.

Ø O apoio parental é especialmente importante nas crianças e adolescentes


(Gariépy et al., 2016).
Ø O apoio do cônjuge apresenta um efeito
protetor sobretudo nos adultos e nos idosos
(Gariépy et al., 2016).
o Resultados de dois estudos longitudinais
sugerem que uma relação pobre com o
cônjuge (Krause, Liang, & Yatomi,
1989) ou a permanência do cônjuge
num lar (Sonnenberg, van Tilburg, Vink,
& Beekman, 2013) estão associadas à
depressão em idosos do género
masculino.
Ø O apoio familiar pode mudar nos idosos, devido ao envelhecimento ou
falecimento dos familiares e a perda de capacidade de providenciar auxílio
(Gariépy et al., 2016).
Ø O apoio dos amigos é o mais consistente na proteção contra a depressão
nos idosos, sendo considerado adjuvante ao suporte familiar e conjugal.
o A literatura refere que elevada perceção de apoio
social dos amigos está associada
significativamente com menor
sintomatologia depressiva nos idosos
(Okun & Keith, 1998).

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Estudo de Duarte & Matos (2018)

Estudou a importância da perceção de saúde física e do apoio social na


sintomatologia ansiosa e depressiva.

ü Amostra de 655 idosos (com 60 ou mais anos) da população geral


(57.4% mulheres).
ü Amostra de 59 doentes com perturbações emocionais (72.9%
mulheres)
o 43 doentes com depressão (72.8% mulheres).

Encontrou-se um efeito moderador do apoio social na relação entre


perceção de saúde e a sintomatologia depressiva: o apoio social
revelou-se um amortecedor para a sintomatologia depressiva nas mulheres
com baixa perceção de saúde física.

Implicações: É importante aumentar o apoio social, através da criação de


novas redes sociais de apoio, e melhorar as interacções já existentes com os
elementos da rede sociais em que o idoso está inserido.

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108

AULA 11 E 12 – 9 E 12 MAIO

Perturbação Obsessivo Compulsiva (POC)

Pensamentos Intrusivos Exemplos de “obsessões normais”/


pensamentos intrusivos:
são comuns na população em
geral, sendo que desaparecem • Impulso de agredir ou fazer mal a
alguém (Estar à beira de um
fácil e rapidamente.
precipício e pensar “e se eu me
Em termos de conteúdo, os mandasse daqui para baixo?”)

pensamentos intrusivos da • Impulso para dizer inapropriadas


• Impulso para atacar alguém física
população geral são bastante
ou verbalmente
semelhantes às obsessões
• Pensamentos relacionados com
clínicas; mas as últimas violência sexual
provocam muito mais ansiedade • Pensamentos relacionados com o
e não desaparecem tão medo que ocorra um acidente a um
facilmente. ente querido

Todos nós temos pensamentos intrusivos como passar numa ponte e pensar
“e se eu me atirasse lá abaixo?” A maior parte de nós tem este pensamento,
mas depois não se preocupa com isso. Os doentes obsessivos acham que por
pensar numa coisa tem um grande risco de passar ao ato. Pensamentos
intrusivos vêm como um visitante inesperado e deixamos que entre e saia, o
problema das obsessões é que os doentes começam a resistir, não o querem
ter, quando mais não se quer abrir a porta mais ele bate à porta.

Resenha Histórica

A POC tem sido retratada em filmes


(Exemplos do filme “the aviator” e “As
Good as It Gets”).

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109

Doença há muito conhecida, da qual existem muitos testemunhos escritos do


sofrimento e interferência que provoca e das tentativas para a entender e tratar.

No passado entendia-se a perturbação obsessiva como a obsessão do


demónio. Houve sobretudo alguns monges que relataram esta patologia,
climaco no séc. sexto referia-se a pensamentos de blasfémia (inconfessáveis),
tão difíceis de ter que as pessoa tinham dificuldade em tê -los e relatá-los. Ele
escreveu um caso que era descrito assim: uma vez um monge zeloso foi
assoberbado por este.. mas sem resultado”, infligia-se a ele próprio com
pensas, neste caso, jejuns e vigílias. “Se tens pensamentos blasfémicos não
penses que é culpa tua, deus sabe o que está no teu coração... não tentes lutar
contra eles ou resisti-los”. Este monge já tinha a sabedoria que hoje temos
sobre como lidar com estas obsessões. Nos chuc é comum clientes religiosos
que iam para tratamento e tinham também um padre jesuíta para os ajudar a
validar a questão, não se tratava de nada religiosos, tratava-se de uma doença,
ele ajudava na psicoeducação porque era uma autoridade sobre o assunto.

O próprio terapeuta dá alguma autoridade na terapia, as pessoas procurar


porque acham que somos especialistas, pessoas de bem e responsáveis. Mas,
há aqui uma armadilha possível, o doente numa sessão referiu por ex. “a
senhora doutora toca, se você toca é pq não há problema”, mas depois não
conseguem aplicar o mesmo no dia-a-dia. Também é frequente procurarem
ajuda em familiares, por exemplo, uma filha que tem obsessões de duvida,
pergunta à mãe se deixou a porta aberta, a mãe diz que não, então ela não
volta para trás 30 vezes como faria se estivesse sozinha- não é uma verdadeira
exposição, é delegar no outro a responsabilidade, se alguém se
responsabilizar por mim, então eu faço.

Manuel boraneli, monge do séc. xvii salientava que para lidar com os
escrúpulos “quando um homem vai ao mar pela primeira vez...” ideia de que o
interessa é ir fazendo exposição aos seus medos senão ficará mais preso a
eles.

Shakespeare em 2008 tinham também um personagem que era a lady McBeth


que tinha rituais de lavagem que ele ilustra muito bem, esta que se tornou

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110

rainha da escócia cometeu um crime em que alguém teve que morrer para ela
ser rainha e, portanto, imaginava as unhas cheias de sangue

No séc. 19 há um psiquiatra que descreve muito bem uma doente dele que era
a Madame F, uma doente que tratava em paris, descreveu um dia normal da
sua vida, tudo descrito com rigidez e inflexibilidade: acordava às 6 da manhã....
Os pés habitualmente são alvos de preocupação dos obsessivos assim como
os genitais, são deixados para último, usam toalhas diferentes para essas
zonas do corpo.

Durante a 1o metade do sec. XX foi o modelo analítico, a corrente dominante


em termos de terapia, mas na segunda metade a corrente comportamentalista
acabou por ser a corrente dominante, focando-se muito na técnica de
exposição com prevenção de resposta que ainda hoje é a base do tratamento,
depois as correntes cognitivistas começaram a abaordar os pensamentos que
a caracterizam e deram também o seu contributo.

Na segunda metade do sec XX surgem os tratamentos farmacológicos para a


POC, os doentes começam a ser medicados com promipanina e inibidores
recetivos de na seratonina.

Obsessões

São “fenómenos obsessivos” podem


surgir esporadicamente em pessoas
saudáveis em períodos de maior
stress (ex., necessidade de verificar
se deixou fogão desligado), no
contexto de doenças neurológicas
O diagnóstico de POC só é efetuado
(ex., Coreia de Huntington) ou de
se os pensamentos obsessivos se
outras perturbações psiquiátricas
tornarem tão frequentes ou
(ex., depressão major, esquizofrenia)
intensos ou os rituais tão
As obsessões e compulsões não extensos que interfiram com o
são exclusivas da POC. funcionamento diário.

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111

Critérios de diagnóstico de POC

A. Obsessões ou compulsões ou ambas: Obsessões definidas por (1), (2),


(3) e (4):
1. pensamentos, impulsos ou imagens recorrentes e persistentes
que, em algum momento durante a perturbação, são experimentados
como intrusivos e inapropriados e que, na maioria dos indivíduos,
provocam acentuada ansiedade ou sofrimento
2. pensamentos, impulsos ou imagens que não são simplesmente
preocupações excessivas acerca de problemas reais de vida (DSM
IV)
3. a pessoa tenta ignorar ou suprimir tais pensamentos, impulsos ou
imagens ou neutraliza-los com algum outro pensamento ou ação
4. a pessoa reconhece que os pensamentos obsessivos, impulsos ou
imagens são produto da sua mente (não impostos de fora como na
inserção de pensamento) (DSM IV)

Compulsões
Definidas por (1) e (2):
1) comportamentos repetitivos (por exemplo, lavagem das mãos,
ordenações, verificações) ou atos mentais (por exemplo, rezar,
contar, repetir palavras mentalmente) que a pessoa se sente
compelida a executar em resposta a uma obsessão ou de acordo
com regras que devem ser aplicadas de modo rígido
2) os comportamentos ou atos mentais têm como objetivo evitar ou
reduzir o sofrimento ou prevenir algum acontecimento ou
situação temida; contudo, estes comportamentos ou atos mentais ou
não estão ligados de um modo realista com o que pretendem
neutralizar ou evitar ou são claramente excessivos

Nota: Crianças pequenas podem não ser capazes de enunciar os


objetivos desses comportamentos ou atos mentais.

B. As obsessões ou compulsões tomam tempo (p. ex., tomam mais de uma


hora por dia) ou causam sofrimento clinicamente significativo ou

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112

prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas


importantes da vida do indivíduo.
C. Os sintomas obsessivo-compulsivos não se devem aos efeitos
fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento)
ou a outra condição médica.
D. A perturbação não é mais bem explicada pelos sintomas de outra
perturbação mental.

Exemplos:

• Dificuldade de se desfazer de pertences, na presença de uma perturbação


de acumulação
• Preocupação com o comer na presença de uma Perturbação do
Comportamento Alimentar;
• Arrancar cabelos na presença de Tricotilomania;
• Preocupação com a aparência na presença de Perturbação Dismórfica
Corporal;
• Preocupação com drogas na presença de Perturbação por Uso de
Substância;
• Preocupação com os impulsos ou fantasias sexuais na presença de Parafilia;
• Preocupações excessivas, como na perturbação de ansiedade
generalizada
• Preocupação por ter uma doença grave como na perturbação de ansiedade
de doença
• Beliscar a pele, como na perturbação de escoriação [skin-picking]
• Estereotipias, como na perturbação de movimento estereotipado
• Impulsos, como nas perturbações disruptivas, do controle de impulsos e
do comportamento;
• Ruminações de culpa, como na perturbação depressiva maior
• Inserção de pensamento ou preocupações delirantes, como nas
perturbações do espectro da esquizofrenia e outras perturbações
psicóticas
• Padrões repetitivos de comportamento, como na perturbação do espectro
autista

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113

Especificar sobre se o indivíduo tem:


ü Insight ausente/crenças delirantes: o indivíduo está completamente
convencido de que as crenças da perturbação obsessivo- compulsiva são
verdadeiras.
ü Insight bom ou razoável: o indivíduo reconhece que as crenças da
perturbação obsessivo- compulsiva são definitiva ou provavelmente não
verdadeiras ou que podem ou não ser verdadeiras.
ü Insight pobre: o indivíduo acredita que as crenças da perturbação
obsessivo-compulsiva são provavelmente verdadeiras.

Especificar se a POC está relacionada com tiques (história atual ou passada

de perturbação de tiques)

CID - 10

Ao contrário do DSM-V, estabelece um critério temporal: Necessária a


presença de obsessões ou compulsões durante a maior parte dos dias por
um período mínimo de 2 semanas.

POC e Perturbações Relacionadas (Espectro Obsessivo) segundo o DSM-


V
1) Tricotilomania: Comportamentos recorrentes de arrancar cabelos/pelos
2) Perturbação de Escoriação: Escoriação recorrente da pele, resultando em
lesões cutâneas
3) Perturbação Dismórfica Corporal: Preocupação com um defeito imaginário
na aparência ou se uma ligeira anomalia física estiver presente, a
preocupação é marcadamente excessiva
4) Perturbação de Acumulação : Dificuldade persistente de descartar ou de se
desfazer de pertences, independentemente do seu valor real

Conteúdos mais comuns das Obsessões

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114

Habitualmente relacionam-se com tópicos pessoalmente inaceitáveis e


repugnantes:
ü Religiosos
ü Sexuais
ü Somáticos
ü De coleção/ poupança
ü Necessidade de simetria e exatidão
ü Sujidade ou contaminado
ü Agressivos (Exemplo: um jovem tinha imagens de violência em relação
aos pais, ele imaginava como uma grande roda que passava e cortava
os pais aos bocadinhos e fez exposição de imaginação a essa imagem.)

Compulsões mais comuns

Evitamento duma catástrofe antecipada


nos temas das obsessões:
1. Lavagem
2. Limpeza
3. Verificação
4. Contagens
NOTA: lavagens e rituais de ordenação são particularmente comuns em
crianças.

Apesar de existirem obsessivos puros (sem compulsões, p.ex., com obsessões


de conteúdo agressivo, sexual, religioso – Baer, 1994 ); eles são raros
(provavelmente apresentam rituais encobertos e comportamentos de procura
de tranquilização, comportamentos de evitamento), a maioria dos doentes
apresenta obsessões e compulsões.
Ø 96% dos doentes com POC apresentam obsessões e compulsões.
Ø Apenas 2% têm um predomínio de obsessões

ü Há diversidade no modo como é percebida a racionalidade das


obsessões ou compulsões: Há uma diversidade entre doentes, mas também

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115

há alguma mudança do próprio doente (Diversidade interindividuos e


intraindividuos)
Heterogeneidade na POC. Para além de existirem vários tipos de compulsões
e obsessões existem também diferenças na forma como é feita a
racionalização, entre doentes alguns podem ter maior ou menor
racionalidade da sua doença. E, mesmo até ao longo do curso da POC, há
oscilações onde podem perceber aquilo com maior ou menor racionalidade.
Quando começam a achar que faz sentido está associado a maior gravidade
e normalmente já o têm há muito tempo.
ü Desejo ou tentativa de resistir à compulsão variáveis

Assim que a obsessão ocorre, desencadeada por uma grande variedade de


estímulos, é acompanhada por sentimentos de desconforto ou ansiedade e
pela necessidade urgente de neutralizar a obsessão (ou as suas
consequências).

ü Para os doentes com POC, a verificação,

que é suficiente para eliminar a incerteza


"normal", contribui para a dúvida obsessiva
(quanto mais verificam, maior a tendência de
continuar)
ü Evitamento de situações ou objetos que
provocam obsessões.
ü Quando, apesar do evitamento, as
obsessões ocorrem, resultam os rituais.

ü O Evitamento previne a exposição aos pensamentos temidos


ü As compulsões (abertas ou cobertas) terminam a exposição
ü Ambos previnem o confronto com os pensamentos e situações
temidas, mas, ao fazê-lo, impedem uma reavaliação
ü Se o doente cessar estes comportamentos, descobrirá que aquilo que teme
pode não ocorrer de facto

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116

A POC carateriza- As crenças obsessivas mais frequentes são:


se também pela 1. perfecionismo,
presença de 2. intolerância à incerteza,
sintomas como 3. importância e necessidade de controlo dos
evitamento ou pensamentos,
crenças 4. excessivo sentido de responsabilidade
obsessivas. 5. hipervalorização do risco.

Prevalência
Ø Prevalência de 12 meses nos Estados Unidos é de 1,2%, com uma
prevalência similar internacionalmente (1,1 a 1,8%).
Ø O sexo feminino é afetado em uma taxa um pouco mais alta do que o
masculino na idade adulta.
Ø Estudos com crianças e adolescentes mostram que a POC é mais
frequente no sexo masculino.

Evolução
Ø Início habitualmente ocorre na adolescência ou no início da idade
adulta.
Ø Início é gradual (mas também pode ter um início agudo).
Ø Nos Estados Unidos, a idade média de início é 19,5 anos, e 25% dos
casos iniciam-se até os 14 anos de idade.
Ø O início após os 35 anos é incomum, mas ocorre.
Ø Indivíduos do sexo masculino têm idade mais precoce do que os
do sexo feminino: cerca de 25% dos homens têm a perturbação antes
dos 10 anos.
Ø Evolução crónica com aumentos e diminuições dos sintomas,
estando os aumentos dos sintomas relacionados com períodos de
stress.
Ø Aproximadamente 15% apresentam uma deficiência progressiva no
funcionamento social e ocupacional.

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Ø 5% têm uma evolução episódica com sintomas mínimos ou sem


sintomas entre os episódios.
Ø Pode existir substancial lapso de tempo entre o aparecimento dos
sintomas obsessivo-compulsivos e a procura de ajuda (5 a 7.5 anos
entre o aparecimento dos sintomas e a procura de tratamento).

Padrão Familiar

Ø A concordância na taxa do POC é mais elevada em gémeos


monozigóticos que em gémeos dizigóticos.
Ø A taxa do POC nos familiares biológicos em primeiro grau de
sujeitos com POC é mais elevada que a taxa da população em geral.

Contexto cultural

A POC pode ser encontrada em diferentes partes do Mundo e em diversos


contextos culturais.

Ø A prevalência da POC e algumas variáveis demográficas a ela


associadas (ex., distribuição por género, idade de início) são muito
semelhantes entre culturas.
Ø Nos últimos anos verificou-se um aumento das obsessões e
compulsões relacionadas com o vírus da VIH/SIDA e com o
coronavírus SARS-CoV-2 (desde 2020, com o eclodir da pandemia
CIVD-19)

Ø A gravidez, o parto e o puerpério parecem constituir períodos de


maior risco de início ou agravamento dos sintomas obsessivo-
compulsivos.
Ø A POC perinatal
Ø Existência de pensamentos intrusivos “normais” no período perinatal

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Comorbilidade (perturbações mais frequentes)

• 76%: Perturbações de ansiedade (perturbação de pânico, fobia social,


perturbação de ansiedade generalizada e fobias específicas)
• 41%* - 42%**: Perturbações do humor ; Perturbação depressiva
major – 41% ou Perturbação bipolar – 42%)
• 30%: Perturbações de tiques (síndrome de Tourette)
• 23-32%: Perturbações da personalidade
• 12%: Perturbações do espectro da esquizofrenia

Diagnóstico diferencial

1. Distinguir de fenómenos obsessivoides - sintomas associados a


cansaço e stress (distinguem-se não só ela sua intensidade e frequência,
com também por não causarem prejuízo ou incapacidade significativa ao
indivíduo)
2. Perturbações psicóticas - as ideias delirantes são egossintónicas,
interpretadas como pertencendo ao próprio, enquanto que as ideias
obsessivas são classicamente egodistónicas, reconhecidas como próprias
mas absurdas e são refutadas ao máximo. Existência na psicose de
alucinações, delírios e alterações formais do pensamento
3. Perturbação dismórfica corporal- as preocupações da PDC diferem das
obsessões da POC, uma vez que o foco das primeiras centra-se na
aparência física. As obsessões da PDC caracterizam-se por um menor
insight do que as obsessões da POC
4. Perturbação de Personalidade Obessivo-Compulsiva – a presença de
verdadeiras obsessões ou compulsões estabelece o diagnóstico diferencial

Caso Prático

Mulher, 21 anos, estudante (ensino superior);


Agregado familiar: mãe e irmão (19 anos)

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Motivo da consulta: Encaminhada pelo psiquiatra devido a sintomatologia


obsessivo-compulsiva grave, sob o parecer de poder beneficiar de psicoterapia
cognitivo-comportamental, concomitantemente com intervenção
psicofarmacológica.

Dificuldades atuais:
1. Sintomatologia obsessivo-compulsiva.
a. Contaminação e limpeza
• Obsessões recorrentes relacionadas com sujidade e
germes, receando "ficar porca, suja”, bem como
pensamentos de que as coisas "estão contaminadas,
sujas".
• Compulsões: lavagens das mãos, verificações...
• Preocupação e nojo excessivo de excreções ou secreções
corporais.
• Grau de interferência grave, isto é, considera que lhe causa
limitação substancial no desempenho social ou académico
e ocupam-lhe mais de 8 horas por dia.
b. Sexuais e Religiosas
• Existência de pensamentos, imagens ou impulsos sexuais
"proibidos ou impróprios”, obsessões sexuais que envolvem
crianças ou incesto, bem como obsessões sobre
comportamento sexual violento dirigido a outras pessoas.
• Preocupação sobre ter pensamentos blasfemos,
nomeadamente a ocorrência de imagens mentais das
interpretações que faz do diabo.
• Obsessões relacionadas com o que é “certo” ou “errado” do
ponto de vista moral e medo de dizer algo considerado
desrespeitador.
• Compulsões: confessar ou perguntar coisas, principalmente
à mãe, de modo a garantir que não fez nem disse nada de
errado.

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• Grau de interferência moderado, isto é, possui uma


interferência decisiva no desempenho social ou
ocupacional, contudo, ainda manuseável, e ocupam-lhe
mais de 3 horas por semana, mas menos de 1 hora por dia.
c. Simetria, Ordem, Contagem e Organização
• Obsessões sobre precisar que as coisas estejam "mesmo
bem" e sobre simetria, nomeadamente com a letra, contanto
que, muitas vezes, nas aulas, demora muito tempo a tirar
apontamentos a fazer a letra de forma "perfeita”.
• Verifica várias vezes se não comete erros e relê e reescreve
as coisas.
• Reporta que, se iniciar um ritual antes de estudar, sente
necessidade de o finalizar, não o conseguindo interromper,
o que leva a ritualizações consecutivas.
• Compulsões: contagem, ordenação e organização e afirma
ter necessidade de tocar em objetos simétricos.
• Grau de interferência grave e ocupam-lhe até 8 horas
diárias.
d. Dano devido a Lesão, Violência, Agressão ou Desastres
Naturais
• Obsessões relacionadas com a possibilidade de se magoar
a si própria ou sobre ser magoada por outrem, verificando
várias vezes se não se magoou ou foi magoada.
• Obsessões acerca da possibilidade de magoar outras
pessoas ou de ser responsável por algo terrível acontecer,
nomeadamente à mãe.
• Ocorrência de imagens violentas na sua mente, obsessões
acerca da possibilidade de insultar ou dizer obscenidades,
realizar algo considerado embaraçoso, agir sobre um
impulso indesejado.
• Rituais mentais para além da verificação, por exemplo,
tentar ter um pensamento "bom" para desfazer o "mau".

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• Os rituais possuem um grau de interferência moderado


ocupam-lhe até 8 horas diárias.
2. Dificuldades ao nível interpessoal, apresentando episódios de "irritabilidade
súbita.

Diagnóstico do DSM-V:
Verifica-se a presença de obsessões, nomeadamente pensamentos e
imagens, recorrentes e persistentes (durante mais de 8h por dia), que a doente
encara como intrusivos e indesejados, constituindo-se como fatores de
sofrimento.
Estes estão relacionados com diversas temáticas, tal como medo de ser
contaminada, bem como incerteza relativamente ao estado de limpeza dos,
obsessões sexuais e religiosas, de simetria, e de dano, temendo que se não
realizar determinadas ações (rituais), algo de mal aconteça.
A doente evita determinados locais e tenta neutralizar as obsessões através
de ações que possam prevenir/evitar que as suas obsessões, ou que algo
danoso aconteça a alguém (Critério A – (1).
Surgem compulsões, onde a doente se sente compelida a realizar
comportamentos repetitivos, como lavar as mãos e verificar se a sua roupa tem
manchas de sujidade, de forma a evitar a contaminação, e a realizar
determinadas ações, de forma a prevenir a ocorrência desse evento, já que a
doente se sentiria responsável e culpada por não o fazer. Estas compulsões
reduzem a ansiedade e sofrimento gerado pelas obsessões (Critério A – (2)).
A doente afirma que estes comportamentos surgem constantemente durante o
dia, todos os dias, tendo dificuldade em identificar o número total de horas que
ritualiza, já que considera que “pode ser durante 2 minutos, mas depois estar
horas a ruminar”, afirmando ainda ruminar acerca de locais onde tocou há 5
anos. No entanto, localiza a duração de obsessões e compulsões relacionadas
com contaminação, por exemplo, como durando mais de 8h diárias.A sua
sintomatologia acarreta sofrimento significativo e prejudica as diferentes áreas
de vida (Critério B).
Os sintomas não se devem aos efeitos fisiológicos de uma substância ou
condição médica e não são melhor explicados por uma outra perturbação
mental (Critérios C e D).

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Verifica-se a existência de um insight bom ou razoável, uma vez que a doente,


quando não está perante uma situação evocadora de obsessões, consegue
reconhecer que as suas crenças provavelmente não são verdadeiras.
Não foi apurada a presença de história presente ou passada de perturbação
de tiques.
M apresenta um padrão global de instabilidade no relacionamento
interpessoal, na autoimagem e nos afetos, e impulsividade marcada, que se
verifica ao longo de diversos contextos, nomeadamente em tentativas
frenéticas para evitar o abandono, verificadas tanto nos seus relatos onde
indica que, sempre que discute com a mãe, "tenho de resolver logo", devido
ao receio de perder a figura materna e que esta deixe de gostar de si, mas
também nas relações com pares (Critério A1).
Existe uma grande instabilidade nas suas relações interpessoais, uma vez que
esta afirma que, quando é convidada para algo, nunca quer ir, no entanto,
arrepende-se quando não vai, ou, se for, afirma que “depois já não quero ir
embora”. Relata que os seus amigos são "os únicos minimamente estáveis",
no entanto, fica semanas sem lhes responder às mensagens. Reporta também
que "vivo a vida agarrada à minha mãe” e que não vive sem ela, no entanto, é
também com quem mais se chateia e discute. M. não apresenta
relacionamentos amorosos significativos, revela-se difícil avaliar a existência
de ideais opostos de idealização e desvalorização no que concerne às relações
interpessoais (Critério A2, parcialmente cumprido).
M. apresenta uma autoimagem persistentemente instável, dado que a própria,
quando questionada acerca do seu autoconceito, refere que "honestamente,
não sei bem o que acho, varia muito ao longo do dia”, sendo que por vezes
pensa “não valho nada" (Critério A3).
M apresenta acentuada reatividade do humor, nomeadamente um elevado
grau de irritabilidade súbita, nomeadamente quando está em público,
afirmando sentir-se “irritada, como se fosse explodir, fico mesmo com raiva,
tudo me irrita“. Estes acessos de raiva prejudicam o seu funcionamento familiar
e social (Critério A6).
Os episódios de raiva intensa são frequentemente inapropriados, ocorrendo
num vasto nível de áreas, nomeadamente a nível familiar, a nível social, uma

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vez que esta raiva é despoletada por estímulos mínimos quando se encontra
em público e a nível escolar (Critério A8).
Poderão estar presentes sintomas dissociativos graves, face à sua afirmação
de que, nas aulas, tem a sensação de que "acordei e tenho medo de estar ali,
tudo fica amplificado, até o som, é como se estivesse nua, não sei que mal me
podia acontecer” (Critério A9, possivelmente cumprido).
M relata episódios de automutilação, circunscrevendo-se a cortes e
queimaduras, especialmente nos braços e nas pernas, face aos quais a doente
afirma sentir “alivio”. Conta também já ter pensado em suicídio, ainda que não
pense concretizar (Critério A5).

Diagnóstico Diferencial:
§ Na Perturbação Depressiva Major é característica a presença de
ruminações, congruentes com o estado de humor disfórico experienciado,
não sendo, no entanto, percecionadas como intrusivas, ao contrário do que
sucede na Perturbação Obsessivo- Compulsiva.
§ A Perturbação de Ansiedade Generalizada é tipicamente caracterizada
pela presença de um grande número de preocupações, relacionadas com
a vida real, ao passo que, nas obsessões, estas não se circunscrevem a
estes aspetos.
§ No que concerne à Perturbação de Ansiedade Social, ao contrário do que
sucede nesta patologia, a sintomatologia de M, nomeadamente as
situações temidas e os evitamentos realizados, não se circunscrevem a
situações de interação social, estando presente numa vasta multiplicidade
de contextos.
§ Relativamente à Perturbação Obsessivo-Compulsiva da
Personalidade, ainda que a doente apresente algumas crenças
relacionadas com perfecionismo, nomeadamente a simetria das letras,
deve ter-se em conta que muitas destas crenças de necessidade de
simetria se relacionam com a convicção de que tal leva à prevenção de
uma catástrofe.
§ Quanto às Perturbações Psicóticas, ainda que a doente apresente
algumas obsessões e compulsões consideradas bizarras, a doente possui
um bom insight acerca das mesmas, reconhecendo, quando não está

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perante uma situação evocadora de obsessões, as suas crenças


provavelmente não são verdadeiras. Não foram reportadas alterações
formais do pensamento.

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