Você está na página 1de 13

Natália Chiesa ATM23 1

IMUNIDADE INATA
É a defesa não-adaptativa, que forma a primeira barreira para infecções. Alguns
mecanismos da imunidade inata começam a agir imediatamente no encontro com agentes
infecciosos, outros são ativados e amplificados na presença de infecções e em seguida voltam
aos seus níveis basais após o término da infecção. Os mecanismos que atuam na imunidade
inata, porém, não criam uma memória imunológica para uma proteção de longo prazo.
A defesa da imunidade inata depende de receptores codificados na linhagem
germinativa para reconhecer as características comuns dos patógenos. Essa habilidade de
distinguir o próprio do não-próprio, e o reconhecimento de uma vasta classe de patógenos,
contribuem para a indução de uma resposta imune adaptativa.

A LINHA DE FRENTE DA DEFESA DO HOSPEDEIRO:


Os microrganismos patogênicos ou patógenos, são agentes infecciosos que podem
causar doenças e danos aos tecidos. As invasões por microrganismos são inicialmente
contidas por mecanismos de defesa da imunidade inata, que pré-existem em todos os
indivíduos e agem em minutos após o encontro com o agente infeccioso.

1.1) Agentes infecciosos:


Os agentes que causam doenças estão divididos em 5 grupos: vírus, bactérias, fungos,
protozoários e helmintos (vermes).
Agentes infecciosos podem crescer em todos os compartimentos do corpo – extracelular e
intracelular. Tanto a resposta imune inata, como a adaptativa tem diferentes maneiras de lidar
com os patógenos encontrados nesses dois compartimentos.
Patógenos intracelulares obrigatórios, como os vírus, devem invadir a célula hospedeira
para a replicação, já os patógenos intracelulares facultativos, como a microbactéria, podem se
replicar tanto fora como dentro da célula. Os agentes infecciosos intracelulares geralmente
causam doenças por danificarem ou matarem as células hospedeiras, o sistema de defesa inato
tem dois métodos de defesa contra esses patógenos: os fagócitos devem aprisionar o patógeno
antes que ele entre na célula, e as células NK podem reconhecer e matar diretamente a célula
infectada por algum patógeno intracelular.
Quando os patógenos conseguem superar a imunidade inata, eles crescerão e se replicarão
no corpo, causando diferentes doenças. Muitos dos mais perigosos patógenos bacterianos
intracelulares causam doença liberando proteínas toxicas, contra as quais o sistema imune inato
tem pouca defesa. Assim, os anticorpos produzidos pelo sistema imune adaptativo serão
necessários para a neutralização dessas toxinas.
Os microrganismos mais patogênicos têm evoluído e são capazes de superar as defesas da
imunidade inata, sendo necessário que a imunidade adaptativa se inicie para eliminá-los, e
evitar uma reinfecção. Outros patógenos nunca são eliminados por completo pelo sistema
imune, permanecendo no corpo por anos, porém esses patógenos não são letais para todos,
pois eles não poderiam modificar a sua patogenicidade sem alterar a concessão que eles têm
com o sistema imune humano, caso alterassem poderiam causar a morte do hospedeiro, e
consequentemente a sua também.

1.2) Superação das defesas inatas pelos agentes infecciosos:


As superfícies epiteliais do organismo atuam como uma barreira efetiva contra a maioria
dos microrganismos e são rapidamente reparadas se houver algum dano. Além disso, a maioria
Natália Chiesa ATM23 2

dos microrganismos que conseguem atravessar as superfícies epiteliais são eficientemente


removidos pelos mecanismos da imunidade inata.
As doenças infecciosas ocorrem quando o microrganismo é capaz de escapar da defesa inata
do hospedeiro ou dominá-la e, então, esse microrganismo é capaz de se replicar e permitir sua
posterior transmissão dentro dos nossos corpos.
A expansão do patógeno é controlada pela resposta inflamatória, que recruta moléculas e
células efetoras do sistema imune inato. Ao mesmo tempo, uma cascata de coagulação é
induzida para impedir que patógenos se disseminem pelo sangue. A resposta imune inata
induzida atua alguns dias, durante esse tempo a resposta imune adaptativa inicia sua ação em
resposta à apresentação de antígenos do patógeno nos tecidos linfoides locais pelas células
dendríticas.

1.3) Superfícies epiteliais como primeira linha de defesa:


Nossas superfícies corporais são protegidas por epitélios que proporcionam uma barreira
física entre o meio interno e o mundo externo que contém patógenos. As células epiteliais são
unidas por junções oclusivas, que formam um bloqueio efetivo contra o ambiente externo. A
importância do epitélio na proteção contra a infecção torna-se óbvia quando a barreira é
rompida.
Na ausência de ferimentos ou rupturas, os patógenos normalmente atravessam as barreiras
epiteliais, ligando-se a moléculas das superfícies epiteliais dos órgãos internos, ou
estabelecendo uma infecção pela adesão e colonização dessas superfícies. Essa adesão permite
que o patógeno infecte a célula epitelial, danificando o epitélio de modo que possa ser
ultrapassado.
O epitélio interno é conhecido como mucosa epitelial, pois secreta muco, que contém
muitas glicoproteínas denominadas mucinas. Os microrganismos recobertos pelo muco são
impedidos de aderir o epitélio.
Nossas superfícies epiteliais produzem também substâncias químicas que são microbicidas
ou inibem o crescimento microbiano. Os peptídeos antimicrobianos (criptidinas, α-defensinas,
β-defensinas) também tem papel na defesa imune.
A maioria das superfícies epiteliais também podem ser associadas à flora normal de
bactérias não-patogênicas, conhecidas como bactérias comensais, que competem com os
microrganismos patogênicos pelos nutrientes e pelo sítio de adesão das células epiteliais.
Quando essas bactérias são mortas pelos tratamentos com antibióticos, os microrganismos
patogênicos frequentemente as substituem e causam doença.
Natália Chiesa ATM23 3

1.4) Patógenos X Fagócitos:


Se um microrganismo consegue atravessar a barreira epitelial e começa a se replicar no
tecido do hospedeiro, na maioria das vezes, ele é reconhecido imediatamente pelos fagócitos
mononucleares chamados de macrófagos. A segunda maior família desses fagócitos, os
neutrófilos ou leucócitos neutrofílicos polimorfonucleares (PMNs), são células de vida curta no
sangue, porém, não estão presentes normalmente em tecidos saudáveis. Esses dois tipos de
células fagocíticas têm um papel-chave na imunidade inata porque podem reconhecer, ingerir e
destruir muitos patógenos sem a ajuda da resposta imune adaptativa.
Macrófagos e neutrófilos reconhecem patógenos pelos mesmos receptores de superfície
celular que podem discriminar entre as moléculas de superfície expressas tanto pelos patógenos
quanto pelas células do hospedeiro. Em muitos casos a ligação do patógeno a esses receptores
de superfície celular leva à fagocitose, seguido de morte do patógeno dentro do fagócito. A
fagocitose é um processo ativo no qual o patógeno ligado é primeiro circundado pela membrana
fagocítica e então internalizado em uma vesícula ligada à membrana conhecida como
fagossoma. O fagossoma torna-se acidificado, o qual mata a maioria dos patógenos. Além da
fagocitose, os macrófagos e neutrófilos possuem grânulos circundados por membrana,
denominados lisossomas, os quais contêm enzimas, proteínas e peptídeos que podem mediar
uma resposta intracelular antimicrobiana. O fagossoma fusiona com um ou mais lisossomas
produzindo o fagolisossoma, onde o conteúdo lisossomal é liberado para destruir o patógeno.
Os neutrófilos são células de vida curta, pois morrem após terem completado um ciclo de
fagocitose. Os neutrófilos mortos e os que estão morrendo são os principais componentes do
pus, que é formado em algumas infecções por bactérias. As bactérias que dão origem a essas
infecções são denominadas de bactérias piogênicas ou formadoras de pus.
Os macrófagos têm vida longa e continuam gerando novos lisossomos , eles podem fagocitar
patógenos e realizar respiração oxidativa logo após o encontro com o microrganismo infectante,
e isso pode ser suficiente para prevenir uma infecção.
A característica chave que distingue os microrganismos patógenos de não-patógenos é a sua
habilidade de superar a defesa imune inata.
O segundo efeito importante da interação entre patógenos e macrófagos dos tecidos é a
ativação dos macrófagos para liberar citocinas, quimiocinas e outros mediadores que criam um
estado de inflamação no tecido e atraem neutrófilos e proteínas plasmáticas para o local da
infecção. Os receptores que sinalizam a presença de patógenos e induzem as citocinas têm
também um outro papel importante: induzir a expressão das moléculas coestimuladoras tanto
em macrófagos quanto em células dendríticas, células apresentadoras de antígenos que iniciam
uma resposta imune adaptativa.

1.5) Respostas inflamatórias:


A inflamação tem três papéis essenciais no combate às infecções. O primeiro é o de oferecer
células e moléculas efetoras adicionais aos sítios de infecção para aumentar a morte dos
microrganismos invasores pelos macrófagos. O segundo é proporcionar uma barreira física, na
forma de coagulação microvascular, para prevenir a propagação da infecção. o terceiro é o
reparo dos tecidos lesados.
As respostas inflamatórias são caracterizadas por dor, vermelhidão, calor e edema,
refletindo quatro tipos de mudanças nos vasos sanguíneos locais. O primeiro é o aumento do
calibre vascular, levando a um aumento do fluxo sanguíneo no local e a redução da velocidade
do fluido sanguíneo local. A segunda mudança ocorre nas células endoteliais, que passam a
expressar moléculas de adesão celular que promovem a ligação dos leucócitos circulantes. O
Natália Chiesa ATM23 4

fluxo sanguíneo mais lento e as moléculas de adesão que permitem a adesão de leucócitos ao
endotélio e a sua posterior migração para dentro do tecido é chamado de extravasamento.
Após o inicio da inflamação, as primeiras células atraídas para o local são os neutrófilos e os
mastócitos.
A terceira mudança nos vasos é o aumento da permeabilidade vascular. As células que
revestem os vasos sanguíneos se tornam separadas, levando à saída do fluido e de proteínas do
sangue para o tecido, e assim causando edema.
A quarta mudança é a coagulação em microvasos no local da infecção, impedindo assim a
difusão do patógeno para a corrente sanguínea.
Outra maneira que induz uma resposta inflamatória é por meio da ativação da cascata de
complemento.

RECONHECIMENTO DE PADRÕES DO SISTEMA IMUNE INATO:


Determinado grupo de receptores da imunidade inata estará presente em todas as células
de determinado tipo celular. A ligação de componentes específicos dos patógenos por esses
receptores induz respostas rápidas.
Os receptores dos sistema imune atuam de diversas funções, estimulando a ingestão de
patógenos, guiando células para os locais de infecção, e induzindo na produção de moléculas
efetoras que contribuirão para a indução de receptores da imunidade inata e na indução de
proteínas que influenciam a iniciação e o amadurecimento subsequente das respostas imunes
adaptativas.

1.1) Receptores com especificidade:


Os microrganismos carregam padrões repetidos na estrutura molecular da sua superfície.
Essas estruturas repetidas são conhecidas como moléculas padrões associadas aos patógenos
(PAMPS), e os receptores que as identificam são chamados de receptores de reconhecimento
padrão (PRRs).
A lectina ligadora de manose (MBL) é um PRRs. O reconhecimento do patógeno e a sua
discriminação pela MBL se deve ao reconhecimento de uma orientação particular de certos
resíduos de açúcar, bem como espaçamento entre eles, que é encontrado somente em
micróbios. Uma vez formado o complexo MBL-patógeno, este se liga ao fagócito, e
consequentemente ocorre a fagocitose e a morte do patógeno. O revestimento da partícula ou
microrganismo com proteínas que facilitam a sua fagocitose é conhecido como opsonização.
Os fagócitos contêm também receptores de superfície celular que reconhecem diretamente
a superfície do patógeno. Entre esses receptores está o receptor de manose de macrófago, uma
lectina tipo C ligada à célula (dependente de cálcio) que se liga a certas moléculas de açúcar
encontradas nas superfícies de algumas bactérias e de alguns vírus.
O segundo grupo de receptores de fagócitos se chama receptores de varredura, esses
receptores são um grupo de moléculas estruturalmente heterogênias, existindo em pelo menos
seis distintas formas moleculares.
Natália Chiesa ATM23 5

1.2) Receptores semelhantes ao Toll – receptores de sinalização:


Os receptores semelhantes ao toll (TLRs) de mamíferos são membros de um sistema de
reconhecimento e sinalização evolutivamente conservado. Existem 10 genes de TLR expressos
em humanos, e cada um desses genes se dedica ao reconhecimento de um grupo padrão de
moléculas não encontradas em vertebrados, esses padrões são característicos dos componentes
de microrganismo patogênicos em algum dos estágios da infecção. Por ter um limitado número
de genes para reconhecimento, os receptores dos TLRs têm especificidade limitada.
Alguns TLRs podem atuar como receptores de superfície celular, enquanto outros atuam
intracelularmente onde existem patógenos e componentes dos patógenos que foram
capturados para dentro da célula. Os receptores semelhante ao Toll atuam de diferentes
maneiras, o TLR-4 é importante nas respostas as infecções bacterianas, como também está
envolvido na resposta imune do vírus sincicial respiratório, ao passo que o TLR-2 sinaliza a
presença de diferentes constituintes bacterianos, como o LTA das bactérias gram-positivas e
lipoproteínas das bactérias gram-negativas. Assim, os TLRs reconhecem o patógeno e estimulam
respostas celulares direcionadas para o patógeno reconhecido.

1.3) Ligação do CD14 ao receptor TLR-4:


O lipopolissacarídeo (LPS) bacteriano é um componente da parede celular de bactérias
gram-negativas. A injeção sistêmica de LPS no sistema circulatório e respiratório ocasiona
choque dos sistemas, nos humanos chamado de choque séptico, o qual é causado pela
expressão predominante de citocinas, principalmente de TFN-α, como resultado de uma
infecção bacteriana sistêmica incontrolável (septicemia).
Como exemplo de bactéria gram-negativa tem-se a Salmonella, essa bactéria invade a
membrana mucosa, porém pode ser reconhecida por macrófagos e outras células fagocíticas, as
quais permitem a ativação de dois TLRs de superfície celular – TLR-4 e TLR-5 – os quais levam à
produção de TNF-α, causando dessa forma infecção sistêmica por indução da produção de TNF-
α.
O LPS atua através do TLR-4, contudo o TLR-4 sozinho não consegue reconhecer o LPS,
precisando de duas proteínas de superfície celular, a CD14 e a MD-2, para auxilia-lo. A CD14 liga-
se ao LPS, sendo o complexo CD14/LPS o efetivo ligante do TLR-4. Inicialmente, o MD-2 se liga
ao TLR-4 dentro da célula e é necessário para o direcionamento do TLR-4 para a superfície celular
e seu reconhecimento pelo LPS. Quando o complexo TLR-4/MD-2 interagem com o complexo
CD14/LPS, este manda um sinal para o núcleo celular que ativa o fator de transcrição NFKB.

1.4) Proteínas NOD:


Os TLRs estão localizados nas membranas celulares. Outras proteínas semelhantes aos TLRs,
estão presentes no citoplasma e são capazes de se ligar a produtos microbianos e ativar o NFKB,
o qual inicia o mesmo processo inflamatório como os TLRs. Tais proteínas são a NOD1 e a NOD2.
As NODs reconhecem fragmentos de proteoglicanos da parede celular das bactérias. A
NOD2 é capaz de atuar como um sensor geral de infecção bacteriana, e a NOD1 tem pode mais
limitado em perceber as bactérias gram-negativas. As proteínas NOD são expressas em células
que são expostas as bactérias, isto é, em células epiteliais, macrófagos e células dendríticas.
Contudo, nas células epiteliais a expressão dos TLRs é pouca ou ausente, assim, a NOD1 é um
importante ativador da resposta imune inata.
Natália Chiesa ATM23 6

1.5) Produção de citocinas e quimiocinas, e expressão de moléculas co-estimulatórias:


A ativação do NKFB pela via Toll e NOD leva à produção de vários mediadores importantes
da imunidade inata, como as citocinas e as quimiocinas. A via também leva à expressão na
superfície celular de moléculas co-estimulatórias, essenciais para a indução da resposta imune
adaptativa. Essas proteínas, B7.1 (CD80) e B7.2 (CD86), são produzidas pelos macrófagos e
células dendríticas em resposta à sinalização da LPS através do TLR-4.
Para encontrar uma célula T CD4 virgem, a célula dendrítica apresentadora de antígeno deve
migrar para um linfonodo próximo, por onde passam as células T virgens circulantes, e essa
migração é estimulada por citocinas como o TNF-α, o qual também é induzido pela sinalização
do TLR-4. Assim, a ativação da imunidade adaptativa depende das moléculas induzidas como
consequência do reconhecimento do patógeno pela imunidade inata.

O SISTEMA COMPLEMENTO E A IMUNIDADE INATA:


Quando um patógeno rompe a barreira epitelial e as primeiras defesas antimicrobianas do
hospedeiro, ele encontra o principal componente da imunidade inata, conhecido como sistema
do complemento. O complemento é um conjunto de proteínas solúveis presentes no sangue e
em outros líquidos corporais, ele aumenta a opsonização e a morte de bactérias pelos
anticorpos, assim, complementando as ações dos anticorpos. A opsonização se refere ao
revestimento do patógeno por anticorpos e proteínas do complemento, tornando mais fácil que
ele seja capturado e destruído.
O sistema do complemento é composto por mais de 30 diferentes proteínas plasmáticas,
produzidas principalmente no fígado. Na ausência de infecção, essas proteínas circulam na
forma inativa. Na presença de patógenos ou de anticorpos ligados aos patógenos, o
complemento se torna ativado. As proteínas do complemento interagem umas com as outras
formando várias vias diferentes de ativação do complemento, sendo que todas terão o mesmo
final, a morte do patógeno.
Há três vias de ativação do complemento: a via clássica, a via alternativa e a via da lecitina.
As proteases do complemento são sintetizadas como pró-enzimas inativas (zimogênios),
que somente se tornam ativas após a clivagem proteolítica, que acontece em geral por outra
proteína do complemento. As vias do complemento são desencadeadas por proteínas que
atuam como receptores de reconhecimento de padrões para detectar a presença de patógenos.
A detecção do patógeno ativa um zimogênio inicial, desencadeando uma cascata de proteólise
na qual os zimogênios do complemento são ativados em sequência, tornando-se, cada um, uma
protease ativa que cliva e ativa várias moléculas do próximo zimogênio da via.
O complemento também influencia na imunidade adaptativa. A opsonização dos patógenos
facilita a sua captura por células apresentadoras de antígenos fagocíticos que expressam os
receptores do complemento, isso aumenta a apresentação dos antígenos patogênicos às células
T. As células B expressam receptores para as proteínas do complemento, que intensificam suas
respostas aos antígenos revestidos pelo complemento. Vários fragmentos do complemento
podem atuar para influenciar a produção de citocinas por células apresentadoras de antígenos,
influenciando a direção e a extensão da resposta imune adaptativa.

As três vias do complemento são iniciadas de maneiras distintas. A via lectina é iniciada por
proteínas solúveis que se ligam a carboidratos nas superfícies microbianas, a partir disso as
proteases associadas a essas proteínas de reconhecimento ativam a clivagem de proteínas do
complemento e ativam a via. A via clássica é iniciada quando C1, que é constituído por uma
proteína de reconhecimento (C1q) associada a proteases (C1r e C1s), reconhece a superfície
microbiana ou se liga a anticorpos já ligados ao patógeno. A via alternativa pode ser iniciada pela
Natália Chiesa ATM23 7

hidrolise espontânea e pela ativado do componente do complemento C3, que se liga


diretamente às superfícies microbianas.
Quando qualquer via interage com a superfície de um patógeno é produzida uma atividade
enzimática denominada convertase C3. Essa convertase se liga covalentemente à superfície do
patógeno, onde cliva C3 para produzir grandes quantidades de C3b (principal molécula efetora
do sistema do complemento), e C3a, que auxilia na indução das inflamações. O C3b se liga na
superfície microbiana e atua como uma opsonina, permitindo que os fagócitos que possuem
receptores para o complemente capturem e destruam os microrganismos revestidos por C3b.
O C3b também pode se ligar à convertase C3, formando outra enzima, a convertase C5. Esta
cliva C5, liberando o peptídeo altamente inflamatório C5a e produzindo o C5b. o C5b inicia
eventos “tardios” da ativação do complemento, no qual outro conjunto de proteínas do
complemento interage com o C5b para formar o complexo de ataque à membrana na superfície
do patógeno, criando um poro na membrana celular que leva à lise. Contudo, a principal
característica de C3b é a sua habilidade de formar ligações com a superfície microbiana,
permitindo que o reconhecimento intato dos microrganismos seja traduzido em respostas
efetoras.
As vias que causam potentes efeitos inflamatórios e destrutivos são perigosas e devem ser
reguladas. Uma importante proteção é que a chave de ativação do complemento é rapidamente
inativada, a menos que os componentes se unam à superfície do patógeno, onde sua ativação
foi iniciada. Contudo, o complemento pode ser ativado por células que estão morrendo, nesse
caso o complemento auxilia na fagocitose e na eliminação precisa dessas células.

1.1) A via lecitina:


Em geral, os microrganismos possuem padrões repetitivos de estruturas moleculares em
sua superfície, os quais são conhecidos como padrões moleculares associados aos patógenos. A
via lecitina utiliza essas características das superfícies microbianas para detectar e responder
aos patógenos.
A via da lectina pode ser ativada por qualquer um dos quatro diferentes receptores de
reconhecimento de padrões circulantes, que reconhecem os carboidratos nas superfícies
microbianas. O primeiro a ser descoberto foi a lecitina ligadora de manose (MBL), as proteínas
desse tipo são denominadas de colectinas. A MBL possui baixa afinidade pela manose, pela
fucose e por resíduos de N-acetilglicosamina, que são comuns nos glicanos microbianos. Assim,
a MBL possui alta força de ligação para estruturas de carboidratos repetitivas de uma ampla
variedade de superfícies microbianas, incluindo as bactérias gram-positivas e gram-negativas,
quando não estão interagindo com as células do hospedeiro. A MBL é produzida pelo fígado e
está presente em baixas concentrações no plasma da maioria dos indivíduos, mas na presença
de infecção sua produção é aumentada durante a resposta da fase aguda.
As outras três moléculas usadas pela via da lecitina são conhecidas como ficolinas, estas
apresentam especificidade para oligossacarídeos contendo açúcares acetilados e não se ligam
em carboidratos contendo manose.
A MBL forma complexos com a MASP-1 e a MASP-2 serinas-proteases associadas à MBL, que
liga a MBL com um zimogênio inativo. Quando a MBL se liga na superfície do patógeno, ocorre
mudança conformacional nas MASP-2 que permite que ela clive e ative outra molécula de MASP-
2 no mesmo complexo MBL. A MASP-2 então pode clivara componentes C4 e C2. Quando a
MASP-2 cliva o C4, ela libera o C4a, permitindo uma mudança conformacional no C4b que expõe
uma ponte tioéster reativa. O C4b se liga na superfície microbiana próxima por meio dessa ponte
tioéster, onde então liga uma molécula de C2. O C2 é clivado pela MASP-2, produzindo C2a, que
permanece ligado ao C4b, formando o C4b2a, que é uma convertase de C3 da via lecitina. O
Natália Chiesa ATM23 8

C4b2a cliva muitas moléculas C3 em C3a e C3b. Os fragmentos de C3b ligados ao patógeno e o
C3a liberado iniciam a resposta inflamatória local.
Pessoas com deficiência da MBL ou MASP-2 sofrem mais infecções respiratórias por
bactérias durante a infância, indicando a necessidade da via lecitina para a defesa do
hospedeiro.

1.2) Via clássica:


O esquema geral da via clássica é similar ao da lecitina, exceto pelo fato de
que a via clássica utiliza um sensor de patógeno conhecido como complexo C1.
O C1 interage diretamente com alguns patógenos, mas também pode interagir
com anticorpos permitindo que a via clássica atue tanto na imunidade inata,
como na adaptativa.
O C1 é composto por uma grande subunidade (C1q), que atua como sensor
do patógeno, e duas serinas-protease (C1r e C1s), incialmente na forma inativa.
A função de C1 se localiza nas seis cabeças globulares do C1q. quando mais
de uma cabeça interage com o ligante ocorre uma alteração conformacional no
complexo C1r/C1s. A forma ativa do C1r cliva o C1s associado, gerando uma
serina-protease ativa. O C1s atua nos dois componentes C4 e C2, ele cliva C4 produzindo C4b,
que se liga à superfície do patógeno. Então o C4b se liga a uma molécula de C2, que é clivada
pelo C1s para produzir uma serina-protease C2a. Esta produz a convertase C3 ativa, a C4b2a.
O C1q pode se ligar à superfície dos patógenos de várias maneiras diferentes. Contudo, a
principal função do C1q é de se ligar nas regiões constantes dos anticorpos que se ligam ao
patógeno. Assim, o C1q associa as funções efetoras do complemento ao reconhecimento
proporcionado pela imunidade adaptativa. Isso parece limitar a utilidade do C1q até que a
imunidade adaptativa seja iniciada, porém existem anticorpos naturais que são produzidos pelo
sistema imune na ausência de infecções.
Grande parte dos anticorpos naturais são da classe IgM, essa classe é a mais eficaz na ligação
do C1q, fazendo os anticorpos naturais serem um meio efetivo de ativação do complemento
imediatamente após a infecção, levando à eliminação de bactérias.
Natália Chiesa ATM23 9

1.3) Ativação do complemento:


Tanto na via clássica, como na via da lecitina a ativação do complemento é iniciada por
proteínas que se ligam à superfície dos patógenos. É importante que a ativação do C3 também
ocorra na superfície do patógeno, isso é obtido pela ligação do C4b à superfície do patógeno. Se
o C4b não formar essa ligação, a ligação tioéster é clivada pela reação com a água, e o C4b é
inativado de maneira irreversível.
O C2 se torna suscetível à clivagem por
C1s someto quando ligado pelo C4b, assim
a C2a também está confinada à superfície
do patógeno, onde permanece ligada ao
C4b, formando a convertase C3, a C4b2a.
Assim, a clivagem do C3 está confinada à
superfície do patógeno. O C3b também é
inativado por hidrolise se o seu tioéster não
fizer uma ponte covalente, portanto,
somente opsoniza a superfície na qual
ocorreu ativação do complemento. A
opsonização do C3 é mais eficaz quanto
anticorpos também estão ligados à
superfície do patógeno, assim uma
proporção de C3b e C4b reativos vão se
ligar às moléculas de anticorpos por si, essa
combinação de ligações químicas cruzadas
do anticorpo com o complemento é,
provavelmente, o mais eficiente ativador
da fagocitose.

1.4) Via alternativa e amplificação do C3b:


A via alternativa é
chamada assim pois foi
descoberta como uma
segunda via para a
ativação do complemento
após a via clássica ter sido
definida. As características
mais importantes dessa via
são sua capacidade de ser
espontaneamente ativada e sua convertase C3 única, a convertase C3 da via alternativa. Essa
convertase é composta pelo próprio C3b ligado ao Bb, que é o fragmento da clivagem da
proteína plasmática fator B. esta convertase C3, designada C3bBb, desempenha uma função
especial na ativação do complemento porque, ao produzir o C3b, ela pode produzir mais de si.
Isso significa que quando algum C3b tenha sido produzido, independente da via, a via alternativa
pode atuar como uma alça amplificadora para aumentar rapidamente a produção de C3b.
A via alternativa pode ser ativada de duas maneiras. Primeiro, pela ação da via clássica ou
da via lecitina. O C3b produzido por uma dessas vias e covalentemente ligado à superfície
microbiana pode ligar o fato B, isso altera a conformação do fator B permitindo que uma
protease plasmática denominada fator D clive o fator B em Ba e Bb. O Bb permanece associado
Natália Chiesa ATM23 10

ao C3b, formando a convertase C3bBb. A segunda maneira de ativação envolve a hidrólise


espontânea da ponte tioéster do C3 para formar C3(H2O). este C3(H2O) pode se ligar ao fator
B, que é clivado pelo fator D produzindo uma convertase C3 em fase fluida de vida curta, a
C3(H2O)Bb. A C3(H2O) de fase fluida pode clivar várias moléculas de C3 em C3a e C3b.
1.5) Membranas e proteínas plasmáticas que regulam a formação e estabilidade da convertase
C3:
Vários mecanismos asseguram que a ativação do complemento ocorrerá somente na
superfície de um patógeno ou em células do hospedeiro danificadas e não em células normais
ou tecidos do hospedeiro. Após a ativação inicial do complemento, a
intensidade da amplificação por meio da via alternativa é criticamente
dependente da estabilidade da convertase C3, a C3bBb. Essa estabilidade é
controlada por proteínas reguladoras positivas e negativas.
Várias proteínas reguladoras negativas, presentes no plasma e na
membrana das células do hospedeiro, protegem células saudáveis do
hospedeiro de efeitos danosos de uma ativação inapropriada do
complemento. Essas proteínas reguladoras do complemento interagem com
C3b e impedem a formação da convertase ou promovem sua rápida
dissociação. Assim, a alça de amplificação da via alternativa pode prosseguir
na superfície de um patógeno ou nas células danificadas do hospedeiro, mas
não em células ou tecidos normais do hospedeiros que expressem essas
proteínas reguladoras negativas.
O fator D é a única protease de ativação do sistema do complemento que
circula como uma enzima ativa, e não como um zimogênio. Isso é necessário
tanto para o início da via alternativa, quanto para a segurança do hospedeiro,
já que o fator D não tem outro substrato além do fator B ligado ao C3b. Isso
significa que o fator D somente encontra seu substrato na superfície dos
patógenos e em baixos níveis no plasma, onde é permitida a continuidade da
via alternativa.

1.6) Deposição de fragmentos de C3b pela convertase C3, e atividade da convertase C5:
A formação da convertase C3 é o ponto para o qual as três vias da ativação do complemento
convergem. A convertase das vias clássica e da lecitina, a C4b2a, e a convertase da via
alternativa, a C3bBb, iniciam os mesmos eventos subsequentes. Elas clivam o C3 em C3b e C3a.
o C3b se liga covalentemente por meio de sua ligação tioéster às moléculas adjacentes na
Natália Chiesa ATM23 11

superfície do patógeno, caso contrário ele é inativado por hidrólise. O principal efeito da
ativação do complemento é depositar grandes quantidades de C3b na superfície do patógeno
infectante, onde ele forma uma cobertura covalentemente ligada que pode sinalizar a
destruição final do patógeno pelos fagócitos.
O próximo passo na cascata do complemento é a produção da convertase C5. O C5 não
forma ponte tioéster ativa durante sua síntese, mas é clivada por proteases específicas em
fragmentos C5a e C5b. Nas vias clássica e da lecitina, a convertase C5 é formada pela ligação de
C3b com C4b2a, produzindo C4b2a3b. A convertase C5 da via alternativa é formada pela união
do C3b à convertase C3bBb para formar C3b₂Bb. A C5 é capturada por esses complexos de
convertase C5 por meio de ligação ao sítio aceptor do C3b, e logo fica suscetível à clivagem pela
atividade da serina-protease C2a ou Bb. Essa reação, que gera C5a e C5b, é mais limitada que a
clivagem de C3, já que o C5 só pode ser clivado quando se liga ao C3b, que se liga ao C4b2a ou
C3bBb, para formar o complexo C5 ativo.

1.7) Receptores ligados às proteínas do complemento:


A ação mais importante do complemento é facilitar a captação e a destruição dos patógenos
pelas células fagocíticas. Isso ocorre pelo reconhecimento específico dos componentes do
complemento ligados pelos receptores do complemento (CRs) nos fagócitos. Os CRs se ligam
aos patógenos opsonizados com os
componentes do complemento. A
opsonização dos patógenos é a principal
função do C3b e de seus derivados
proteolíticos. O C4b também atua como
opsonina.

1.8) Pequenos fragmentos de algumas proteínas do complemento iniciam uma resposta


inflamatória local:
Os pequenos fragmentos de C3a e C5a atuam em receptores específicos nas células
endoteliais e nos mastócitos para produzir respostas inflamatórias locais. Como o C5a, o C3a
também sinaliza por meio de receptores ligados à proteína G.
Quando produzidos em grande quantidades ou injetados de forma sistêmica, eles induzem
um colapso circulatório generalizado, produzindo uma síndrome similar à do choque observada
em uma reação alérgica envolvendo anticorpos da classe IgE. Tal reação é denominada choque
anafilático, e esses pequenos fragmentos do complemento são frequentemente referidos como
anafilaxotinas.
Essas alterações induzidas por C5a e C3a recrutam anticorpos, complemento e células
fagocíticas para o local de infecção, e o aumento de líquido nos tecidos acelera a movimentação
das células apresentadoras de antígeno, contendo o patógeno, para os linfonodos locais,
contribuindo para o início da resposta imune adaptativa.
O C5a também age diretamente sobre neutrófilos e monócitos, a fim de aumentar sua
aderência às paredes dos vasos, sua migração em direção aos sítios de deposição de antígeno e
sua capacidade de ingerir partículas.
Natália Chiesa ATM23 12

1.9) Proteínas terminais do complemento:


Um dos efeitos mais importantes da ativação do complemente é a reunião de seus
componentes terminais para formar o complexo de ataque à membrana.
O primeiro passo na formação do complexo de ataque à membrana é a clivagem do C5 por
uma convertase C5 para liberar C5b, o C5b inicia a montagem dos últimos componentes do
complemento e sua inserção na membrana celular. Primeiro, uma molécula de C5b liga-se a uma
molécula de C6, e o complexo C5b6 se liga a uma molécula de C7. Essa reação leva a uma
alteração conformacional nos constituintes das moléculas, com exposição de um sítio
hidrofóbico em C7. Sítios hidrofóbicos similares são expostos nos componentes posteriores C8
e C9 que estão ligados ao complexo, permitindo que essas proteínas também se insiram na
bicamada lipídica.
Natália Chiesa ATM23 13

Você também pode gostar