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Técnicas de entrevistas clínicas e

técnicas de avaliação familiar de


psicoterapia de casal e família

AULA 8
Reflexões epistemológicas e metodológicas
sobre a diversidade
• Como compreender a diversidade de olhares
sobre a ciência e a técnica da entrevista familiar?

• A entrevista familiar, assim como a entrevista


individual, é uma atividade complexa com uma
diversidade de funções nas quais são empregadas
diferentes técnicas.
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MODELO QUADRIPOLAR DINÂMICO DE ENTREVISTAS

DeBruyne, Hurmam e Deschoutheete (1977) propõem um modelo quadripolar


dinâmico para transpor a metodologia em ciências sociais à complexidade do campo da
entrevista clínica e da avaliação familiar e suas técnicas (Diniz-Neto, 2005).
Cada pólo relaciona-se com os demais em um processo dinâmico, revelador da tensão
conceitual e do caráter autorreferente de cada abordagem:

Teorias organizam-se ao Fundamenta


redor de questões como:
O que é a família? Como
filosoficamente o
surge ou se desenvolve? Pólo olhar que
Como mantém sua teórico Pólo constrói teorias.
estrutura, sua dinâmica e
seus processos? Como se ENTREVISTA epstemológico
torna saudável ou
disfuncional? Como abordá-
FAMILIAR
la tecnicamente e nela As técnicas têm
intervir? significado apenas
quando compreendidas
O método clínico pode
Pólo Pólo no enquadramento de
sua produção.
seguir uma orientação
técnico
Seus resultados devem
fenomenológica, metodológico ser avaliados em função
psicanalítica, estrutural, da teoria que sustenta
sistêmica ou as técnicas.
construtivista. 3
É dessa dinâmica que emergem
várias abordagens tanto de
avaliação e de entrevista familiar
quanto de propostas terapêuticas,
com seus aspectos comuns e
específicos.
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Construindo teorias da entrevista

• Com a emergência do paradigma psicanalítico como escola teoricamente


dominante e bem articulada, as pesquisas e intervenções em famílias, como o
aconselhamento matrimonial, apropriaram-se de conceitos e teorias da
psicanálise (Sholevar & Schwoeri, 2007).

• Contudo, as técnicas de entrevista e intervenção continuaram individuais em


um primeiro momento.
• Apenas na década de 1930, de modo relutante, Oberndorf (1938) realizou as primeiras
sessões conjugais conjuntas, enquanto outros pioneiros, como Akermam (1938),
realizavam entrevistas familiares.
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• Durante as décadas de 1960 e 1970, surgiram
diversas escolas com diferentes pressupostos,
teorias e técnicas.

• Autores comportamentais cognitivistas e


humanistas compreendem a importância da
abordagem familiar e propõem modelos e técnicas
terapêuticas inspiradas em suas abordagens
(Hanna, 2019).
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• Do ponto de vista técnico de entrevista, autores sistêmicos e psicanalistas ou de
outras abordagens de família passaram a realizar entrevistas conjuntas em
esquemas variados, ora atendendo à família como um todo, ora incluindo apenas
membros da família, ora atendendo a grupos de família ou várias gerações da
família em uma mesma sessão.

• A técnica de entrevista refletia o modelo teórico, sendo possível a presença de um


ou de um par de terapeutas, ou de atendimento com uma equipe de supervisão.
• A diversidade de técnicas utilizadas expande-se exponencialmente: são introduzidas técnicas
dramáticas de confrontação, comunicacionais e narrativas, entre muitas outras, com especial
ênfase nos aspectos verbais e não verbais.
• O quadro de análise e interpretação revela a complexidade das teorizações de cada escola de
terapia e investigação, que focavam o sistema familiar como um sistema estrutural, ou de
comunicação cibernética, ou de comunicação emocional, ou de transmissão transgeracional.
• Todas as abordagens nesse período são marcadas, contudo, pelo viés da primeira cibernética
• Deixaram o território do intrapsíquico para se organizar no contexto do interrelacional (Hanna, 2019).

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• Especialmente dos avanços no campo da cibernética (que veio a
ser conhecido como segunda cibernética ainda no contexto da
cibernética de primeira ordem), a compreensão da família e seu
funcionamento ganhou um novo contexto para se pensar
teoricamente os problemas e as possibilidades de intervenção
através do conceito de retroalimentação positiva.

• A compreensão que passou a organizar a prática da terapia


considerava que os sistemas vivos, como a família, necessitam
ampliar suas possibilidades de modo a garantir sua
sobrevivência.
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Cibernética de Segunda Ordem
• Giro paradigmático:
• Impossibilidade de separação entre sujeito e objeto:
• Um observador se colocar fora do sistema que observa.

• Novos conceitos teóricos e novas práticas a eles correlatas.


• Cibernética – esse avanço resultou em uma mudança –
conhecida como:
• CIBERNÉTICA DE SEGUNDA ORDEM ou CIBERNÉTICA DOS
SISTEMAS OBSERVANTES.
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• Sistemas vivos – Sistemas Humanos:
• Produzem suas próprias mudanças
• Conduzidas e limitadas pela sua organização sistêmica
• Operadas a partir do próprio sistema.

• TERAPIA FAMILIAR
• Mudança tanto no discurso teórico como na prática da terapia.
• Mudança paradigmática.
• abandonou as metáforas teóricas de homeostase, desvios, circuitos cibernéticos,
retroalimentação negativa ou positiva, para inserir-se no campo da linguagem e do
significado.
• Outros conceitos e outras práticas:
• Sistemas linguísticos, narrativa, conversação, dialogo, significado, historias, cultura, co-
construção; terapias de segunda ordem; terapias narrativas; terapias colaborativas.
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Mudança paradigmática –
Pós-moderna
Dois referenciais
Epistemológicos:

Construtivismo Construcionismo Social

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Impossibilidade de um lugar privilegiado de acesso a uma realidade objetiva
Crença na realidade construída a partir do ato de observação que inevitavelmente inclui a
pessoa do observador e suas lentes teóricas idiossincráticas

• AS TEORIAS são vistas como marcos referenciais mais ou menos úteis para nossos
propósitos de dar sentido à nossa prática, à compreensão dos dilemas humanos e à
mudança nos contextos de vida da família.
• AS TÉCNICAS são consideradas como construção de possibilidades para ação e
reflexão, derivando seu valor da possibilidade de favorecer transformações criativas.

• A utilidade das teorias e das técnicas de terapia passou a ser diretamente


compreendida pela sua possibilidade de oferecer subsídios para a construção de
significados organizadores da experiência vivida pela família e para a evolução do
sistema terapêutico (Grandesso, 2002).
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• A palavra técnica implica numa certa habilidade
artesanal: atenção aos detalhes, atendimento à
função do produto e investimento em resultados.
• Ex.: construção de uma parede, gavetas que correm
num móvel certinha, etc...

• Mas em terapia familiar técnica suscita problemas.


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• A técnica por si só não assegura eficácia, se o
terapeuta permanece apegado à técnica, limitando-se
a ser um artesão.

• Seu contato com os pacientes será objetivo,


desprendido e limpo, mas também superficial,
manipulativo em benefício do poder e por último
muito efetivo.
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Qual é a arte da terapia familiar?

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• Significa reunir com a família, experienciar a realidade
com os seus membros, tornar-se envolvido, conceber
como as pessoas de comportam.

• Significa usar a coparticipação para tornar-se um agente


de mudança que trabalha dentro das regras do sistema
familiar com modalidade de intervenção, só possíveis
com essa família, para produzir um modo mais
produtivo dessa família viver.
• Minuchin chama à atenção de não ser a técnica pela
técnica.

• Ele até cita que deveríamos aprender as técnicas e


depois jogar o livro fora. Essa prática ele ilustra na
espontaneidade do terapeuta.

• Minuchin informa que a partir do momento de uma


intervenção com uma determinada técnica é de
responsabilidade desse agente de mudança, o terapeuta.
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Espontaneidade

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O papel do terapeuta é influenciar, é prover
mudanças nas pessoas.
As intervenções ineficazes não se tornam
caóticas ou destrutivas, são simplesmente
assimiladas pela família sem produzir mudanças.

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•Terapeuta assumindo a liderança, porém ele
terá que conquistar o direito de liderar. A
família o acolherá, porém ele terá que se
acomodar, seduzir, submeter, apoiar, dirigir,
sugerir e seguir a fim de conduzir.

•O desafio é entrar no sistema e a habilidade


de separar-se.
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A técnica é o caminho para a mudança, porém é
a conceitualização que o terapeuta tem das
dinâmicas familiares e do processo de mudança
que lhe dará a direção.
A eficácia de uma técnica particular não pode ser
avaliada sem o entendimento do objetivo do
terapeuta.

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•O terapeuta deve reconhecer que seu input
organiza o campo de intervenção e pode até
mudar a explicação que a família dá sobre sua
realidade, porém esta posição cômoda não é
possível.
• Terapeuta como agente de mudança é limitado.

•A família tem capacidade de controlá-lo,


determinando suas respostas complementares
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Sistema familiar da família está
organizado sobre base de apoio,
regulações, alimentação e
socialização de seus membros –
papel do terapeuta é unir-se a
família para repensar ou
modificar seu funcionamento
para desenvolver suas tarefas
com mais eficiência.

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O modo pelo qual a teoria prescreve
técnicas terapêuticas esta nas diferentes
Escolas apresentadas nesta disciplina
•(Estratégica, Estrutural, Transgeracional,
Solução de Problemas, Escola de Milão,
Escola Construtivista)
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Resumo das características e técnicas
de entrevista das escolas de família
mais representativas

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ESCOLAS ESTRATÉGICA ESTRUTURAL TRANSGERACION SOLUÇÃO DE ESCOLA
AL PROBLEMAS ESCOLA DE MILÃO CONSTRUTIVISTA

Representantes Jay Haley Salvador Minuchin Murrey Bowen Jackson, Watzlawick e


Weakland
Pallazoli, Prata, Cechin e
Boscolo
Goolishian, Anderson e
Mahoney

Família como Sistema comunicacional


relacional no qual se
Sistema como grupo natural
estruturado em subsistemas
Sistemas intergeracionais
evoluindo e servindo de
Sistema cibernético
comunicacional,
Uma unidade total inserida
em sistemas maiores com os
Sistema construído na
comunicação e na linguagem.
estabelece desde o início uma que evoluem no tempo. suporte ao processo de retroalimentado. As quais interage. Minimiza Historicamente interpretada,
luta pelo poder e pelo Enfatiza a inter-relação dos diferenciação de seus disfunções são parte de aspectos de hierarquia e mudando no fluxo
domínio da relação. subsistemas. membros. processos homeostáticos, organização na família. comunicacional.
manutenção do sistema e
suas conexões.

Comunicação A comunicação se dá como


um processo de luta pelo
Utiliza a comunicação verbal,
não verbal e metafórica,
Revela os padrões de
relacionamento que se
Verbal e não verbal, com
ênfase no processo
Enfoque nos aspectos verbais
e não verbais, com ênfase no
Atividade intrínseca do estar
vivo. Organiza e constrói a
poder e domínio na relação estimulando a expressão das desenvolvem na família, os homeostático disfuncional aspecto circular e total da realidade. Proporciona
em aspectos verbais e não diferenças por meio da aspectos verbais e não que gera e mantém o comunicação em andamento. encaixes sistêmicos.
verbais. interação. verbais. sintoma.

Sintoma Metáfora do contrato familiar


e da solução de
Pressões intra e
extrafamiliares levam à
Revela aspectos de
indiferenciação emocional da
Como processo
comunicacional que mantém
Como um impedimento da
família continuar o seu ciclo
Como resultado de
construções da realidade e
compromisso. Organizado mudança. O sintoma é visto família que se revela, e é o sistema equilibrado em um de desenvolvimento, por desencaixe comunicacional
em uma sequência como uma estabilização mantido pelos padrão comunicacional meio de uma estabilização sistêmico.
disfuncional de comunicação diante de uma mudança entrelaçamentos triangulares estabilizado no tempo. homeostática disfuncional.
de luta pelo poder. necessária, mas paralisante. dentro da família.

Mudança O terapeuta, instância de


maior poder, rompe a
O terapeuta une-se ao
sistema, criando uma crise
A mudança se dá pela
diferenciação e pela
Alteração de padrões
comunicacionais que
Mudança total do sistema
familiar. Não existe cura, seja
Mudança das construções
sistêmicas. O sintoma
sequência comunicacional terapêutica. Nesse contexto, aprendizagem sobre o modificam a maneira comum na teoria, seja na prática, constrói o sistema. Sistema

.
a mudança poderá ocorrer sistema emocional familiar. de tratar a dificuldade. apenas mudança das autônomo.
que mantém o problema terapeuticamente. configurações.

Agente Perito que usa o poder na


relação com a família para
O terapeuta individual utiliza
o self como caixa de
Terapeuta individual que
interage esclarecendo os
Equipe terapêutica ou
individual, oferecendo um
Equipe terapêutica composta
por um terapeuta e equipe
Interlocutores coconstrutores
da realidade: individual,
terapêutico alterar a comunicação
disfuncional como
ressonância, e as alianças
terapêuticas para alterar o
padrões emocionais e
destriangulando os afetos.
subsistema terapêutico para
estimar o padrão que
de supervisão, procurando
garantir uma objetividade
equipe. Ruptura da hierarquia
formal.
metagovernador. sistema. mantém o problema e a sistêmica, enfatizando o
intervenção que irá alterar o aspecto de não lateralidade.
problema.
Objetivo Romper a sequência
disfuncional, reorganizando a
Estruturar a família, ajudando-
a a lidar com as mudanças
Favorecer o processo de
destriangulação e o processo
Alteração do padrão
comunicacional que mantém
Alteração dos padrões
disfuncionais por meio de
Coconstruir diferentes
descrições da realidade, com
terapêutico família, restabelecendo as
fronteiras geracionais, em um
emergentes. Definir
claramente os subsistemas
de diferenciação emocional
de todos os membros.
o problema, possibilitando a
emergência de um novo
mínima intervenção possível,
ênfase nos aspectos
alternativas mais ricas.
Perturbar os padrões de
novo pacto de poder e familiares e seus papéis. padrão comunicacional. ecológicos do sistema encaixe propiciando
relação na família. familiar. alternativas.

Técnicas de Por meio de observação da


comunicação verbal e não
Por meio de dramatizações,
observação da interação
Nas sessões se observam os
padrões de interações e as
Por meio de focalização
sobre o problema e as
Questionamento circular,
enfocando as diferenças pela
Interlocução com o sistema.
Método compreensivo.
entrevista e verbal, das sequências das
interações.
familiar, das diferenças
individuais e da união ao
triangulações no sistema e
com o terapeuta.
tentativas de resolução. discussão das opiniões de
cada um dos membros sobre
Diálogo terapêutico.

coleta de dados sistema. os outros.

Técnicas Diretivas, tarefas, prescrições


paradoxais, táticas
Dramatização, rearranjo
espacial da família,
Definir os triângulos
emocionais, diferenciar os
Prescrição de tarefas,
prescrição do sintoma,
Questionamento circular,
conotação positiva,
Contexto construtivista,
abandono de técnicas, ou uso
terapêuticas terapêuticas, diretivas
ambíguas, ênfase no positivo,
escalonamento de estresse,
alianças estratégicas, alteração
triângulos, ensinar o
funcionamento emocional e
prescrição paradoxal. prescrição paradoxal,
contraparadoxo.
de todas.

utilização da resistência. do contexto ou efeito do servir de modelo assumindo


Hipnose como modelo. sintoma, designação de a posição “eu”.
tarefas.

Número de Em geral, menos de 12. Semanais no início e com


maior espaçamento no final
Livre, em geral ao redor de
12. Pode incluir as famílias de
No máximo 10 sessões
semanais.
Em geral, 10 sessões mensais. Indefinido

sessões da terapia (mensal). origem.

Estrutura das Sessão simples. Sessão simples. Sessão simples. Sessão, prescrição e pós-
sessão.
Pré-sessão, sessão, intervalo,
intervenção pós-sessão.
Contínua, com intervalo e
intervenção.
sessões
Na mudança da construção das
Promoção de Na sessão e por meio de
tarefas de casa.
Durante as sessões e em
tarefas de casa.
Nas sessões e na
aprendizagem após.
Fora da sessão geralmente
por meio de prescrição
Mudança ocorre entre as
sessões. narrativas comunicacionais.
mudanças paradoxal.

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