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Julho 2023
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POR 1 ANO E
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UM NÚMERO EXTRA
ISSN 1982-3193
São Tomás Magno (Editorial) . . . . . . . . . . . . . 5
Revista de cultura A voz dos Papas –
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.. 32
e inspiração católica Coloquemo-nos na escola
Beata Susana Águeda
publicada por: de São Tomás
Deloye – “Felizes aqueles
Associação Brasileira
Arautos do Evangelho
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.. 6 cuja vida é pura”
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.. 44
Assinatura e
atendimento ao assinante:
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.. 18 História para crianças... –
(11) 2971-9050 Humildade, prudência A torre que tocou o Céu
(nos dias úteis, de 8 às 17:00h) e piedade
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.. 46
Assinatura e Participação
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.. 22
Assinante (anual): .............. R$ 204,00 únicos Os Santos de
Participante (por tempo indeterminado): Luzeiro do senso católico
cada dia
Colaborador.................... R$ 40,00 mensais
Benfeitor......................... R$ 50,00 mensais
Grande Benfeitor............ R$ 60,00 mensais
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.. 26 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.. 48
Exemplar avulso................ R$ 17,00
Amar e conhecer é Nada além de Tomás
Os artigos desta revista poderão ser contemplar!
reproduzidos, desde que se indique a fonte
e se envie cópia à Redação. O conteúdo das
matérias assinadas é da responsabilidade
dos respectivos autores.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.. 28 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.. 50
Grande, ademais, foi a sua disciplina nos estudos, cujo mestre só poderia ser um
Santo magno, de nome Alberto. Escreveu mais de uma centena de obras, boa parte
delas por encomenda de diversos interlocutores, desde Papas, reis e nobres, até cole-
gas e confrades.
Grande catedrático na Universidade de Paris, as suas concorridíssimas aulas
atraíram não somente a atenção dos jovens, como o olhar invejoso de seus pares.
lória
los de g Assim, também nímias foram as contendas com seus opositores. Não obstante, a ver-
Sete sécu
dade sempre lutou a seu favor.
Grande poeta da Eucaristia, compôs admiráveis hinos a Jesus Sacramentado,
São Tomás de como o Adoro te devote, que continuam ainda hoje a inspirar a piedade católica.
Aquino, detalhe Grandes ainda foram os seus milagres, pelo que dele comentou João XXII: “Es-
(editado) de creveu tantos artigos quantos milagres realizou”.
“Madonna Grandes, por fim, foram as honras a ele atribuídas, a ponto de Bento XV afirmar
delle ombre”, por que a Santa Igreja assumiu como própria a doutrina do Aquinate.
Fra Angélico - Poderíamos continuar percorrendo os grandiosos predicados do Anjo das escolas,
Museu de São muitos deles ilustrados nas páginas desta edição. Insistimos, porém, em atribuir-lhe o
Marcos, Florença título de magno, e assim se espera que a Igreja o faça no futuro pois, à diferença dos
(Itália) alexandres e napoleões, a magnificência do Angélico cruza os séculos da História e
Foto: Reprodução
permanece ainda viva em nossos dias.
Isso porque Tomás de Aquino não ostentou a vanglória dos césares nem recebeu
o incenso obscurecido dos bajuladores, mas foi coroado com a mais grandiosa das
glórias: a da santidade, cujo reconhecimento da Igreja pela canonização ocorreu no
dia 18 de julho de 1323, há exatos setecentos anos. Então se abriu para ele a luminosa
via dos autenticamente magnos. ²
Coloquemo-nos na escola
de São Tomás
O esforço da mente humana, nos recorda o Aquinate com sua própria vida, é
sempre iluminado pela oração, pela luz que procede do Alto. Só quem vive com
Deus e com os mistérios pode compreender também o que eles dizem.
oje gostaria de completar, nossas, São Tomás, utilizando inclu- Deus, subdivide-se em três partes e é
riência dos sentidos, São Tomás ofe- em si mesma perfeita, pois possui as
rece uma resposta muito elaborada, cinco características que uma oração
e recorda que se trata de uma dúvida bem recitada deveria possuir: aban-
inconsistente, porque a inteligência dono confiante e tranquilo; conveni-
humana é limitada e não pode conhe- ência do seu conteúdo, porque – ob-
São Tomás de Aquino - Igreja de
cer tudo. Só se pudéssemos conhecer Nossa Senhora da Consolação, serva São Tomás – “é assaz difícil
perfeitamente todas as coisas visíveis Carey (Estados Unidos) saber precisamente o que é oportuno
e invisíveis, então seria uma autêntica pedir e o que não o é, a partir do mo-
estultice aceitar verdades por pura fé. mento que nos sentimos em dificul-
De resto, é impossível viver, observa A finalidade da dade diante da seleção dos desejos”;
São Tomás, sem confiar na experiên- e, além disso, ordem apropriada dos
cia dos outros, aonde o conhecimento sagrada doutrina pedidos, fervor de caridade e sinceri-
pessoal não chega. consiste em fazer dade da humildade.
Por conseguinte, é racional ter fé Como todos os Santos, também
em Deus que Se revela e no testemu- com que Deus seja São Tomás foi um grande devoto de
nho dos Apóstolos: eles eram poucos, Nossa Senhora. Ele A definiu com
simples e pobres, amargurados por conhecido como um apelativo maravilhoso: Triclinium
causa da Crucifixão do seu Mestre; e, totius Trinitatis, triclínio, ou seja, lu-
no entanto, muitas pessoas sábias, no-
princípio e fim de gar onde a Trindade encontra o seu
bres e ricas se converteram em pouco todas as coisas descanso porque, em virtude da En-
tempo à escuta da sua pregação. Com carnação, em nenhuma criatura como
efeito, trata-se de um fenômeno histo- n’Ela as três Pessoas Divinas habitam
ricamente prodigioso, ao qual é difícil Divino, São Tomás faz algumas con- e sentem a delícia e a alegria por viver
poder dar outra resposta racional, a siderações. na sua alma cheia de graça. Pela sua
não ser a do encontro dos Apóstolos Afirma que a Fé cristã, tendo em intercessão, nós podemos obter todo o
com o Senhor ressuscitado. conta o mistério da Encarnação, é re- auxílio. ²
vigorada; a esperança eleva-se com
Ter um só coração com Cristo maior confiança, ao pensamento de
Comentando o artigo do Sím- que o Filho de Deus veio entre nós, Excertos de: BENTO XVI.
bolo sobre a Encarnação do Verbo como um de nós, para comunicar aos Audiência geral, 23/6/2010
a Evangelho A
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: xam a rede para a praia, sentam-se e recolhem
44
“O Reino dos Céus é como um tesouro es- os peixes bons em cestos e jogam fora os que
condido no campo. Um homem o encontra não prestam. 49 Assim acontecerá no fim dos
e o mantém escondido. Cheio de alegria, ele tempos: os Anjos virão para separar os homens
vai, vende todos os seus bens e compra aque- maus dos que são justos, 50 e lançarão os maus
le campo. na fornalha de fogo. E aí haverá choro e ran-
45
O Reino dos Céus também é como um com- ger de dentes.
prador que procura pérolas preciosas. 46 Quan- 51
Compreendestes tudo isso?” Eles responde-
do encontra uma pérola de grande valor, ele vai, ram: “Sim”. 52 Então Jesus acrescentou: “As-
vende todos os seus bens e compra aquela pérola. sim, pois, todo o mestre da Lei, que se torna
47
O Reino dos Céus é ainda como uma rede discípulo do Reino dos Céus, é como um pai de
lançada ao mar e que apanha peixes de todo família que tira do seu tesouro coisas novas e ve-
tipo. 48 Quando está cheia, os pescadores pu- lhas” (Mt 13, 44-52).
Ou tudo, ou nada…
Diante da fascinante beleza do Filho de Deus e do dom
extraordinário de ser chamado ao Reino dos Céus, cabe
a nós uma renúncia completa ao que deles nos afasta:
entregar tudo, sob pena de não termos dado nada.
I – Por que falar em parábolas? ças, inclusive as incuráveis, eram sanadas por
O Evangelho selecionado pela Santa Igreja, Ele com facilidade pasmosa e a alimentação não
Mestra infalível da verdade, para este 17º Do- representava mais um problema diante de tanto
mingo do Tempo Comum corresponde ao trecho poder. Tal perspectiva atraía não só pessoas de
final do capítulo 13 de São Mateus, no qual Nos- bem, como incontáveis interesseiros.
so Senhor ensina mediante metáforas: “Tudo isto Por isso, ao ser interrogado por seus segui-
disse Jesus à multidão em forma de parábola. De dores sobre o motivo pelo qual pregava ao povo
outro modo não lhe falava, para que se cumprisse em parábolas, Nosso Senhor responde com ri- Em cada
a profecia: ‘Abrirei a boca para ensinar em pará- gor: “A vós é dado compreender os mistérios do
bolas; revelarei coisas ocultas desde a criação’” Reino dos Céus, mas a eles não. […] Eis por que uma das três
(13, 34-35). lhes falo em parábolas: para que, vendo, não ve- parábolas
Aos discípulos Ele explicava em privado o jam e, ouvindo, não ouçam nem compreendam.
significado das alegorias, a fim de os instruir Assim se cumpre para eles o que foi dito pelo propostas
adequadamente e prepará-los para serem os profeta Isaías: Ouvireis com vossos ouvidos e
mestres da Igreja, como explica São Tomás de não entendereis, olhareis com vossos olhos e por Jesus aos
Aquino.1 A multidão que O ouvia, porém, não não vereis, porque o coração deste povo se en- discípulos,
lograva penetrar os arcanos da Boa-Nova anun- dureceu: taparam os seus ouvidos e fecharam os
ciada por Jesus. Nesse sentido, Ele Se mostra se- seus olhos, para que seus olhos não vejam e seus ressalta-se
vero em relação aos que O escutavam, por uma ouvidos não ouçam, nem seu coração compre-
simples razão: seus corações estavam longe da enda; para que não se convertam e Eu os sare” um aspecto
verdade pois, imbuídos de espírito utilitário, (Mt 13, 11-15).
almejavam apenas se beneficiar dos milagres Em sentido oposto, as três parábolas propostas
da doutrina
operados pelo Divino Taumaturgo. A perspec- no Evangelho de hoje parecem ditas na intimida- evangélica
tiva de uma mudança de vida na linha da san- de, nos intervalos que mediavam entre as diver-
tidade, insistentemente pedida pelo Salvador, sas pregações do Senhor. Interrogados pelo Mes-
não lhes importava. Ali Se encontrava, segundo tre, os discípulos afirmam ter entendido seu sig-
seus desviados conceitos, um Profeta fora de sé- nificado, sinal de estarem em consonância com a
rie, capaz de resolver as situações mais adversas Revelação. À luz dos comentários que delas faz o
mediante prodígios extraordinários, o que tor- Doutor Angélico, meditemos sobre esses divinos
nava a vida mais segura e prazerosa; as doen- ensinamentos, de altíssimo valor para cada fiel.
condido no campo. Um homem o encontra priedade o Sagrado Coração de Jesus, que contém
por inteiro, e o mantém escondido. Cheio de alegria, ele todas as riquezas da sabedoria e da ciência. Por-
vai, vende todos os seus bens e compra aque- tanto, o Reino dos Céus se identifica com a Pes-
participando le campo”. soa de Nosso Senhor, considerada na plenitude de
sua santidade, enquanto Redentor que estende aos
da riqueza homens sua ação salvífica. O campo, por sua vez,
infinita que representa o solo fértil e virginal da Santa Igreja, o
qual esconde o Divino Tesouro. Tendo encontrado
nos oferece a Esposa Mística de Cristo, devemos deixar tudo a
fim de a ela pertencer por inteiro, participando da
riqueza infinita que nos oferece.
A beleza e sublimidade do
ensinamento evangélico
45
“O Reino dos Céus também é como um
comprador que procura pérolas preciosas.
46
Quando encontra uma pérola de gran-
de valor, ele vai, vende todos os seus bens e
compra aquela pérola”.
o bem e o mal. O fim do mundo, porém, nos põe deram: “Sim”. 52 Então Jesus acrescentou:
diante da única alternativa verdadeira: a salvação “Assim, pois, todo o mestre da Lei, que se
No que se ou a condenação. torna discípulo do Reino dos Céus, é como
Quem atravessará as gloriosas portas do Paraí- um pai de família que tira do seu tesouro
refere ao so? A própria sequência das parábolas no-lo indi- coisas novas e velhas”.
ca. Só os que souberem atribuir o devido valor ao
destino eterno, tesouro escondido e à pérola preciosa serão cons- Os discípulos foram examinados pelo Senhor
não existe uma tituídos, nas palavras de São Paulo, “herdeiros de e passaram bem pela prova. Eles haviam compre-
Deus e coerdeiros de Cristo” (Rm 8, 17). Aqueles endido o sentido espiritual escondido nas pará-
terceira via: que, embora evitando os excessos dos facínoras, bolas, de sorte que se preservaram da maldição
tenham vivido fora da prática dos Mandamentos de Isaías referida no início destas linhas. Eram
ou se vai para – e aqui cabe lembrar ser o primeiro deles o mais assim esclarecidos pela luz do Espírito Santo,
esquecido e o mais relevante – serão lançados na graças ao enlevo que tinham em relação a Jesus e
o Céu, ou para fornalha de fogo pelos Anjos justiceiros. Em fun- à união de corações com Ele.
o inferno… ção desta realidade compreende-se que a Deus ou Por isso, a seguir o Divino Mestre os chama de
se dá tudo, ou não se dá nada… “mestres da Lei”, não mais da caduca Lei Mosai-
Quem Na atualidade, infelizmente, a pregação sobre ca, mas sim do Reino dos Céus. São Tomás explica
a verdade dogmática do inferno caiu no esqueci- com agudeza o sentido desse apelativo: eles se tor-
atravessará mento, quando não é vista com suspeita, como algo naram anunciadores de Cristo ao escreverem seus
as gloriosas superado. Entretanto, em quinze ocasiões Nosso mandamentos nas tábuas dos próprios corações e
Senhor ameaça seus ouvintes com essa punição dos demais.
portas do
Paraíso?
Ralph Hammann (CC by-sa 4.0)
Reprodução
Itinerário angélico
de um varão
Entre suas fileiras, a família dominicana conta um sol de grandeza
incomparável. Coube a esse astro beneficiar a Igreja com a luz de
seu ensinamento e, sobretudo, com o calor de sua santidade.
õ Rodrigo Siqueira Pinto Ferreira
T
omás nasceu nos arredores com a Ordem dos Pregadores, recém- Boaventura. Nesse período teceu os
de Aquino, em finais de -fundada por São Domingos de Gus- comentários ao livro das Sentenças
1224 ou princípios do ano mão, sentiu-se sobremaneira atraído e de Pedro Lombardo, como também ao
seguinte, no seio de uma ingressou em suas fileiras. Evangelho de São Mateus e ao Livro
das famílias mais ilustres do Reino da Entretanto, por ser mendicante, a de Isaías. Quatro anos mais tarde, es-
Sicília. Entre seus parentes figuram o Ordem chocava os padrões mundanos creveu a Suma contra os gentios, obra
Imperador Barba Roxa, seu tio, e Fre- de então, de maneira especial os ob- na qual se abordam os princípios filo-
derico II do Sacro Império, seu primo. jetivos de realização humana de seus sóficos que sustentam a fé cristã.
Desejosos de verem um de seus re- pais. Por isso, sua mãe ordenou aos ou- Seu prestígio de sábio e de santo
bentos no trono abacial do Mosteiro de tros filhos que sequestrassem Tomás e chegara aos mais altos meios eclesiás-
Monte Cassino, situado nas redonde- o levassem de volta para casa. ticos. No período entre 1259 e 1268,
zas do feudo familiar, seus pais pro- foi convocado para acompanhar a
videnciaram o ingresso do pequeno
Mestre em Paris corte pontifícia nas viagens pela Itá-
Tomás na vida religiosa. Mal contava Cessada a prisão entre os seus em lia como teólogo-consultor do Papa.
ele seis anos e já se encontrava nas 1245, o jovem religioso foi conduzido Conciliava seu novo encargo com a
vias do grande São Bento. Provido pelo próprio superior-geral dos domi- magistratura em Paris.
de um espírito profundo e ao mesmo nicanos à então capital do pensamen-
tempo elevado, refletia sobre as verda- to cristão: Paris, a “nova Atenas”. Foi
Devoto ardoroso do
des da Fé que ouvia. Ainda no início no Convento de Saint-Jacques que ele Santíssimo Sacramento
de sua instrução, ficou conhecido por encontrou o ambiente de recolhimento Tanto amor Tomás nutria pelo Pão
inquirir de seus confrades uma expli- e meditação necessários para o bom dos Anjos que era o primeiro a des-
cação cabal de quem era Deus. aproveitamento de seus estudos. A fim pertar durante a noite, para prostrar-
de cursar Teologia ingressou na uni- -se diante do sacrário. Ao tocar o sino
Contato com a Ordem versidade, onde teve por companheiro para as Matinas, voltava sigilosamen-
dos Pregadores o Doutor Seráfico, São Boaventura, e te para sua cela a fim de que ninguém
Devido a certas dissensões havi- por guia e mestre Santo Alberto Mag- o notasse. A Divina Providência,
das entre o Sacro Império e Roma, no, o Doutor Universal, a quem seguiu porém, dispôs os acontecimentos de
seus pais o encaminharam a Nápoles três anos mais tarde para Colônia. modo a manifestar ao mundo o ardor
aos quatorze anos, a fim de estudar Em 1252, aos vinte e sete anos, vol- eucarístico que transbordava do cora-
as artes liberais na universidade que tou a Paris enquanto bacharel e come- ção deste grande homem.
lá acabara de ser constituída. Foi du- çou a lecionar a fim de obter o título de Conta-se que Urbano IV, no intui-
rante esse período que floresceu sua mestre. Em março de 1256, recebeu a to de criar um ofício próprio para a
verdadeira vocação. Tomando contato licentia docendi juntamente com São recém-instituída Solenidade de Corpus
1
Os títulos grafados entre as- cílios, teólogos e universida- les catholiques. Lyon: Emma- 4
CHESTERTON, Gilbert Keith.
pas no presente artigo, que des a São Tomás de Aquino, nuel Vitte, 1895, p.380-381. Santo Tomás de Aquino. Bio-
não tenham outra referên- reproduzida por: JOYAU, OP, grafia. São Paulo: LTr, 2003,
2
SÃO TOMÁS DE AQUINO.
cia, são parte de uma compi- Charles-Anatole. Saint Tho- p.105.
Rigans montes, Proœmium.
lação de elogios feitos ao lon- mas d’Aquin, patron des éco- 5
Idem, p.103.
go dos séculos por Papas, con-
3
Cf. Idem, c.2.
6
Idem, p.105.
Ide a Tomás!
Ante o reconhecimento prestado pela Igreja ao legado de
São Tomás, uma pergunta se põe: combater e menosprezar
o genuíno ensinamento tomista não é lutar contra a própria
doutrina católica?
õ Eduardo José Ribeiro Matos
O
s católicos de hoje muitas c ontrária. Guiada pelo Espírito San- No mundo em que vivemos é
vezes carecem de noções to, sempre engendrou filhos que, difícil ter noção do que foi verda-
elementares acerca de contra as expectativas do poder das deiramente esse período histórico.
sua religião. Alguns nem trevas, brilharam como verdadeiros Muito eloquentes são as palavras de
sequer conhecem os motivos que os sóis de santidade, apontando aos ho- Leão XIII ao descrevê-lo: “Tempo
levam a ela pertencer. Não se dão con- mens, pela doutrina e pelo exemplo, o houve em que a filosofia do Evange-
ta de que sua Igreja é uma instituição verdadeiro rumo a seguir. lho governava os Estados. Nessa épo-
divina, fundada há mais de dois mil Dentre esses luminares destaca- ca, a influência da sabedoria cristã e
anos pelo Verbo Encarnado, sobre a -se, por sua lógica cristalina, São To- a sua virtude divina penetravam as
qual paira a promessa da imortalida- más de Aquino. leis, as instituições, os costumes dos
de. Por ela, mártires entregaram suas povos, todas as categorias e todas as
vidas, sacerdotes e simples leigos lu-
O mundo medieval relações da sociedade civil. […] Or-
taram até a morte, doutores gastaram Com o passar dos séculos a Fé ganizada assim, a sociedade civil deu
sua existência no estudo e desenvolvi- cristã, batalhadora e vitoriosa, fez frutos superiores a toda a expectati-
mento de sua doutrina. florescer uma era impregnada de va, frutos cuja memória subsiste e
Talvez esse desconhecimento da bênçãos espirituais, em que os ho- subsistirá, consignada como está em
grandeza da Igreja se deva ao fato de mens, vivendo em torno da Igreja e se inúmeros documentos que artifício
que seus maiores tesouros permanecem nutrindo de seu ensinamento, chega- algum dos adversários poderá cor-
invisíveis para grande parte dos fiéis. ram a um desenvolvimento teológico romper ou obscurecer”.1
Com efeito, em dois milênios ela ad- nunca antes visto: a Idade Média. Essa época, na qual as escolas e
quiriu, pelo aprofundamento das verda- as universidades floresceram com
des da Fé reveladas por Deus, riquezas imenso vigor, tinha a fé como base
incomparavelmente mais valiosas que Dentre aqueles que de seu trabalho intelectual. O ensino
todas as preciosidades materiais que or- continuava a apoiar-se na Hierarquia
nam seus templos ao redor do mundo. ao longo da História Eclesiástica, mas, ao mesmo tempo,
Tais riquezas a tornam Mãe e Mes- iluminaram o rumo procurava perscrutar os dados da Re-
tra da verdade não somente de um velação para chegar a novas e inédi-
povo, mas da humanidade inteira. E, dos homens com sua tas conclusões.
por isso, trata-se de uma Igreja de ca- A Teologia, “rainha das ciências”,
ráter universal, católica. doutrina, destaca-se via sua serva, a Filosofia, assumir
Ao longo dos séculos, ela se man- uma importância crescente. Sobre
teve imaculada e fiel na pregação
São Tomás por sua o que a Teologia ensinava aos cris-
da verdade, apesar de, por vezes, lógica cristalina tãos, em geral todos estavam de
as aparências sugerirem uma ideia acordo. Entretanto, questionava-se
Kralj
te platônica. O aristotelismo, com alguns pressupostos da fé acessíveis
Gustavo
seu realismo e seus métodos raciona- à razão natural, como a existência e
listas, era pouco conhecido. Isso se a unicidade de Deus, bem como ilus-
devia, em grande parte, ao fato de os trar, mediante oportunas similitudes,
escritos do Estagirita terem chegado certas verdades de fé e refutar racio- São Tomás pregando - Convento de
ao Ocidente, através de traduções nalmente os argumentos que se lhe São Domingos, Lima; na página anterior,
do árabe ao latim, com não poucos opunham.3 Ele percebia que o aristo- manuscrito da obra “Commentaria
in Aristotelis Politicorum”, do Doutor
erros e falsas interpretações. Basta telismo, purificado das interpretações Angélico - Biblioteca Nacional
dizer que, segundo algumas dessas errôneas dos árabes, podia fornecer à da Espanha, Madri
versões, Deus não seria o criador do Teologia bases muito mais sólidas do
universo… que as do agostinianismo platônico.
A controvérsia atingiu tal ponto Tendo estudado com Santo Alber- Percebendo que o
de tensão que, em 1210, um concí- to Magno em Paris e em Colônia, São
lio parisiense chegou a excomungar Tomás foi além da empresa de seu aristotelismo poderia
os aristotélicos. A situação, porém, mestre e utilizou-se do aristotelismo
mudaria com Gregório IX, e logo a para sintetizar a Filosofia Antiga e o dar à Teologia bases
Filosofia aristotélica ganharia ci- dogma cristão. Nascia uma das sólidas, Tomás serviu-
dadania no mundo cristão. maiores obras filosóficas e teo-
O primeiro teólogo que em- lógicas que os séculos veriam. -se dele para sintetizar
pregou o conjunto da Filosofia Um diálogo amistoso en-
aristotélica para apoiar sua tre fé e razão, onde uma a Filosofia Antiga
doutrina teológica foi o fun- auxilia a outra, tornou- e o dogma cristão
dador da escola francisca- -se uma das notas mais
na, Alexandre de Hales. peculiares do pensa-
Mais original e mais pro- mento do Aquinate. rava a luz de Jesus para ser completa.
fundo ainda foi o domini- É o que Bento XVI Esta foi a grande ‘surpresa’ de São
cano Santo Alberto Mag- comenta em uma au- Tomás, que determinou o seu cami-
Reprodução
no, para quem a razão não diência geral no ano de nho de pensador. Mostrar esta inde-
só tinha o direito, mas 2010: “O mundo da ra- pendência de Filosofia e Teologia e,
também o dever de de- cionalidade, a Filosofia ao mesmo tempo, a sua relacionali-
monstrar o que é demons- pensada sem Cristo e o dade recíproca, foi a missão histórica
trável a respeito da fé, e mundo da fé são com- do grande mestre”.4 Além disso, entre
cujo projeto consistia em patíveis? Ou então se seus escritos de maior renome encon-
tornar os ensinamentos de excluem? […] São To- tra-se, por exemplo, a Suma contra os
Aristóteles acessível aos más estava firmemente gentios, na qual ele demonstra racio-
latinos, incorporando na convencido da sua com- nalmente, para aqueles que não pos-
cultura ocidental a vasta patibilidade; aliás, que a suem fé, as razões para crer.
herança científica Filosofia elabora- Mas a atividade de São Tomás não
que o mundo árabe da sem o conhe- se reduziu à sua magistral síntese en-
Aristóteles, detalhe de “Triunfo de
havia conservado e São Tomás de Aquino”, por Benozzo cimento de Cristo tre fé e razão. Sua incomparável obra
acrescentado.2 Gozzoli - Museu do Louvre, Paris praticamente espe- teológica – cuja maior expressão é,
ensinamento tomista está em íntima os outros Doutores e Vaticano [I], pode-se dizer que São
consonância com o Magistério da Tomás interveio nas deliberações
Reprodução
Por fim, vale a pena lembrarmos uma pergunta se apresenta: aqueles
que a doutrina teológica de São To- que visam combater e menosprezar o
más de Aquino se tornou “lei da Igre- genuíno ensinamento tomista não es-
ja” quando o novo Código de Direito São Tomás de Aquino, por tão lutando contra a própria doutrina
Canônico14 demonstrou categórica Fra Angélico - Galeria Nacional e, mais, contra a própria “mentalida-
da Úmbria, Perúgia (Itália)
preferência pelos ensinamentos desse de” da Igreja?
doutor na formação dos clérigos. Encontramo-nos há sete séculos
A todos os que da canonização de um dos maiores
Aos que procuram a verdade luminares do Cristianismo, e nunca
Uma das notas características e até vivem da verdade estivemos tão necessitados de seus
essenciais da elaboração do pensa- ensinamentos!
mento de São Tomás está na sua con- e para a verdade, Se somos daqueles que, de fato,
vicção sobre a unicidade da verdade: querem que reine a verdade de sem-
Deus é a Verdade Absoluta e todas as
este grande Santo pre, a verdade católica, a única e
outras verdades que existem esparsas foi e sempre será um imutável verdade, por que não re-
pelo universo são decorrentes desta, corremos ao ensinamento e à valiosa
primeira e essencial. ponto de referência intercessão de São Tomás? Parafra-
Muitos séculos se passaram desde seando a passagem bíblica (cf. Gn
a morte do Doutor Angélico, ao lon-
incomparável 41, 55), resta-nos recomendar com
go dos quais o mundo foi se transfor- toda a propriedade: “Ide a Tomás!”
mando. Na sociedade atual, em que -la, as pessoas se negaram a procurá- A todos os autênticos amigos da sa-
reina o relativismo, a famosa indaga- -la onde ela realmente está. bedoria, os que vivem da verdade e
ção de Pôncio Pilatos torna-se cada Quantas filosofias novas surgiram para a verdade, este grande Santo foi
vez mais frequente: “Que é a verda- quais “pedras de tropeço”! Quantos e sempre será um ponto de referência
de?” (Jo 18, 38). Mais do que ignorá- modos de vida divergentes do Evan- incomparável. ²
1
LEÃO XIII. Immortale Dei, 3
Cf. SÃO TOMÁS DE AQUI- munis” Ecclesiæ. Romæ: Edi- 10
SÃO JOÃO PAULO II. Fides
n.28. Petrópolis: Vozes, 1960, NO. Super De Trinitate. Proœ- trice Nazionale, 1914, p.45. et ratio, n.43.
p.15. mium, q.2, a.3. 6
INOCÊNCIO IV, apud 11
Idem, n.44.
2
Cf. SÁNCHEZ HERRERO, 4
BENTO XVI. Audiência geral, LEÃO XIII. Æterni Patris. 12
LEÃO XIII. Æterni Patris.
José. Historia de la Iglesia. II: 16/6/2010. 7
LEÃO XIII. Æterni Patris.
Edad Media. Madrid: BAC,
13
Cf. BENTO XVI. Audiência
5
JOÃO XXII, apud BER-
2005, p.406-407.
8
Idem, ibidem. geral, 2/6/2010.
THIER, OP, J. J. Sanctus Tho-
mas Aquinas. “Doctor Com-
9
SÃO PAULO VI. Lumen ec- 14
Cf. CIC, cân.252 §3.
clesiæ, n.8.
H
istoriadores desprovi- Sim, ele foi com muito mais pro- mostras de uma probidade digna de
dos de senso religioso priedade um Santo do que um estu- um fiel filho de São Domingos.
amiúde criam uma vi- dioso, e pouco lhe teria valido sua
são unilateral a respeito eminente inteligência se para os ho-
Varão de traços psicológicos
de pessoas ilustres que tiveram como mens houvesse dirigido seus esforços excepcionais
eixo de sua existência uma vida de- intelectuais, e não para a glória de A imagem que possamos conce-
votada a Deus. Tais biógrafos falham, Deus e benefício da Igreja. ber de um Monte Cassino ainda pré-
sem dúvida, ao apreciar somente uma Boa parte de seus acertados juí- -medieval, nas encostas rochosas do
ou outra qualidade dos personagens zos, baseados num bom senso ada- Vale Latino, com seus diversos mon-
retratados, esquecendo-se do basilar mantino, tiveram como fundamento ges aí orantes, nunca será demasia-
princípio filosófico de que “o todo sua integridade interior, isto é, sua do poética para nela inserirmos a de
vale mais do que as partes”. vida virtuosa, da qual fluiu toda uma Tomás de Aquino admirando as vias
Referindo-se a São Tomás de espiritualidade capaz não apenas de pelas quais da criação pode-se ascen-
Aquino, por exemplo, não pou- fecundar a Idade Média, mas de se der ao Criador.
cos historiadores o estigmatiza- estender até nossos dias, apesar dos Pensativo e recolhido, sempre
ram com qualificativos unilaterais caminhos sinuosos pelos quais ela propenso a refletir sobre a causa das
– tais como, grande luminar da precisou serpear de lá para cá, por coisas, as características da índole psi-
inteligência, sol do pensamento causa dos diversos desvios ideológi- cológica de Tomás começaram a se
cristão, pensador inigualável, etc. – cos da sociedade. amoldar: analítico e observador, quase
externando partes da verdade, mas Com essa visualização – que pro- taciturno, detentor de um temperamen-
não o seu todo. pende a não dissociar o Santo do es- to muito mais dado ao afável e fleumá-
Com efeito, ao considerarmos fi- tudioso, ou então, o Santo do filósofo, tico, ia-se tornando uma pessoa calma,
guras de alto quilate como São To- e sim considerar que, mesmo antes de equilibrada e isenta de agitações, con-
más, não podemos deixar em segundo a Igreja tornar Tomás de Aquino um soante ao seu avantajado porte.
plano o adjetivo de caráter ontológico fiel intérprete seu, proclamou-o San- Tais atributos, longe de torná-lo
que, a justo título, precede nome tão to1 – passemos à abordagem dos traços apático, faziam-no descontraído – qua-
invulgar: Santo! interiores deste varão que sempre deu se imperturbável – e propenso à vida
GioSim (CC by-sa 4.0)
Francisco Lecaros
dentes, mas progresso racional do tão natural como esse espantoso des-
conhecido para o desconhecido”,6 vendador do transcendente”8 que, em
respeitando os limites da razão, até face dos disputados convites de ser
onde ela possa chegar auxiliada pela comensal à mesa de reis e nobres, ou
graça divina; sem, porém, transpor de ser conselheiro de Papas, ou ainda
as barreiras do divino com especula- de ser herdeiro de posses a conferir um São Tomás teve a missão de tornar
ções humanas. alto status social, tudo rejeita. universal a devoção eucarística, eixo
de sua espiritualidade
Destarte, “nenhum autor respeita Basta aludirmos aos seguintes epi-
São Tomás de Aquino, por António
melhor a necessária distinção entre sódios: a instâncias de sua família, São André - Museu de Aveiro (Portugal)
[a Filosofia e a Teologia] – embora Tomás foi convidado pelo Papa Ino-
faça da primeira, dentro de uma bem- cêncio IV a aceitar os benesses da rica Devoção tão arraigada e sincera
-ordenada hierarquia de valores, a cú- Abadia de Monte Cassino; fato que, que, se posto algum problema para o
pula da segunda”.7 mais tarde, ao que parece, foi repetido Aquinate, antes de pretender resolvê-
São Tomás é, pois, honesto em seu por Clemente IV. Além disso, quantas -lo seu maior afã era dirigir-se logo à
pensar! chamadas ao episcopado, a receber capela, colar sua fronte ao tabernácu-
dioceses das mais cobiçadas… lo e haurir de Jesus-Hóstia as luzes in-
Humildade: o fundamento Seriam razões desses reiterados telectuais necessárias para solucionar
das virtudes convites o elevado prestígio que al- a questão.
Vale ressaltar que, na trajetória de cançou, o sangue nobre que o distin- Por isso, em Cristo escondido sob
sua vida discreta e cheia de luz, muito guia, seus grandes dotes de orador, os véus do Sacramento, São Tomás
dessa honestidade reluzirá por meio ou, então, sua santidade? Em face de encontrou a fonte segura, cristalina e
de outra virtude que lhe é base e su- todos eles, a posição evasiva – e as- inextinguível para suas explicitações,
porte: a humildade. sertiva – do “boi mudo” foi a única que fazem mais bem à Igreja pela pie-
Humildade que, na vida cotidiana, resposta que receberam.9 dade com a qual foram abordadas, do
se traduz pela docilidade com a qual que pela clarividência com a qual fo-
trata seus irmãos de hábito, como nos
Piedade: eixo da espiritualidade ram expostas.
comprova o fato a seguir. Certo dia Por conseguinte, foi no estado reli- Não é de surpreender, portanto,
um frade modesto, que não o conhe- gioso, por meio do qual o homem sub- que a Teologia tomista tenha prati-
cia, requisita sua companhia e o obri- mete-se ao homem por amor a Deus, camente se tornado a da Igreja, vis-
ga a uma fatigante jornada. Quando como por amor ao homem Deus Se to que de São Tomás, embebido pela
o informam de quem tem por compa- lhe submeteu, que São Tomás quis virtude da religião, abriram-se pano-
nheiro, o religioso, confundido, pede- viver e cumprir até o fim sua missão. ramas inéditos à fé, como prova o es-
-lhe desculpa. E como os circunstan- Missão esta que compreendia não tilo arquitetônico que lhe foi contem-
tes se admiram de tanta docilidade, apenas a tarefa de professor, de escri- porâneo, o gótico, expressão material
São Tomás os faz observar que a per- tor ou de conselheiro de Papas, mas das mesmas verdades apontadas com
feição da vida religiosa supõe, antes de tornar universal algo de muito novas harmonias, luzes e cores.
de tudo, a obediência. mais precioso, que viria a ser o pilar
Humildade que, na aplicação das da catolicidade da Igreja e o eixo da
Prudência: norma de conduta
potências humanas da inteligência e da espiritualidade de São Tomás: a devo- Edifica-nos constatar como um
vontade, não encontra melhor exemplo ção eucarística. sem-fim das explicitações de São To-
1
Faz-se alusão ao fato de São 3
PIO XI. Studiorum ducem. 8
Idem, p.117. 10
SÃO TOMÁS DE AQUINO.
Tomás ter sido canonizado em Suma Teológica. I-II, q.58, a.3.
4
AMEAL, João. São Tomás de 9
Cabe ressalvar que, reconheci-
18 de julho de 1323, somente
Aquino. Iniciação ao estudo do já por muitos de seus con- 11
Idem, q.57, a.5.
cinquenta e um anos após sua
da sua figura e da sua obra. temporâneos como um lumi-
morte, mas ter sido reconheci-
12
Cf. Idem, ibidem.
3.ed. Porto: Tavares Martins, nar, São Tomás acabou exer-
do como Doutor da Igreja ape- 13
Cf. Idem, I-II, q.58, a.4; II-II,
1947, p.131. cendo a tríplice tarefa de pro-
nas em 1567. q.47, a.1-4.
fessor, escritor e conselheiro
5
GUILHERME DE TOCCO,
2
Tomou-se como parâmetro de de Papas. Não obstante, o San- 14
GUILHERME DE TOCCO,
apud AMEAL, op. cit., p.136,
observação a seguinte com- to nunca aceitou nenhuma es- op. cit., p.146.
nota 2.
posição caligráfica do Santo: pécie de dignidade ou honra-
cod. Autogr. F. 101va 1-27, re-
6
AMEAL, op. cit., p.147. ria eclesiástica.
15
PIO XI. Studiorum ducem.
ferente à q.6, a.1 e q.3, ad 1-4 7
Idem, ibidem.
do Super De Trinitate.
inteira submissão à
doutrina da Igreja
São Tomás com a “Suma contra os gentios” - Mosteiro de São Domingos, Lima
Amar e conhecer
é contemplar!
O Doutor Angélico explicita diversos matizes que a contemplação
deve manifestar nas almas que desejam, ainda nesta terra, ver
a face do Senhor, e nos apresenta o Discípulo Amado como
protótipo do contemplativo.
õ Ir. Ana Rafaela Maragno, EP
A vida contemplativa
consiste em amar
a Deus, já que a
caridade faz arder
nosso coração no
desejo de ver a
face do Criador
Leandro Souza
Reprodução
Dessa forma, como o deleite se ção – a meditação faz-se necessária.
obtém quando é alcançado o objeto
amado, o termo da vida contemplati-
A realidade invisível contemplada
va consiste no deleite de conhecer o nos efeitos divinos
objeto desejado. A cada novo degrau Assim, a vida contemplativa abar-
de conhecimento, o amor se torna ca dois elementos: o principal e o se-
mais intenso, visto que o conheci- cundário. O primeiro é a contempla-
mento produz amor, e o amor, por sua tio da verdade divina, fim de todas as
parte, almeja conhecer sempre mais. ações humanas e plena alegria eter-
Cogitar, meditar, contemplar
Convém ainda considerar que o Como favor recebido,
homem chega à intuição da verdade
de forma progressiva, mediante mui- a contemplação pode
tos atos. Assim, embora a vida con- provir de Deus, por
templativa se consuma em um único
ato – o conhecimento e o amor da um dom, ou dos
verdade –, ela comporta muitos atos
que preparam essa ação suprema. Se- homens, através de
guindo o ensinamento de Ricardo de
São Vítor, São Tomás6 diferencia os
um ensinamento
termos cogitação, meditação e con- oral ou escrito
templação ao longo desse processo.
A cogitação é o exame dos mui- São Domingos, por Fra Angélico - Museu
tos elementos dos quais se pretende de São Marcos, Florença (Itália)
O reverso do Céu
É
comum, em noites particularmente lindas Então nos é reservada o que se chama a beati-
e agradáveis, sairmos à varanda de casa tudo incomprensibilitatis, a bem-aventurança dos
para observar as vastidões do firmamento que não entendem, mas, por terem uma alma res-
povoado de astros. No espírito humano sensível, peitável e hierárquica, ficam encantados em admi-
essa contemplação causa verdadeiro deslumbra- rar e contemplar: “É incompreensível para mim;
mento! […] porém, Deus compreende. Ó maravilha!”
Ora, as constelações foram assim dispostas por Saibamos, portanto, que o melhor de tudo não
Deus e, como todas as realizações d’Ele, reves- será quando virmos e entendermos a ordem das es-
tem-se de imensa pulcritude. Devemos compreen- trelas, e sim quando contemplarmos a Deus face a
der que elas nos falam do Criador e representam, face, e n’Ele percebermos o insondável da ordena-
até certo ponto, o “avesso do tapete” para quem ção estelar. Nessa hora compreenderemos, outros-
não conhece a visão de conjunto que o próprio Al- sim, como terá valido a pena viver para amá-Lo e
tíssimo possui do céu estrelado, e não o considera adorá-Lo, para O servir e imitar. Teremos procu-
de acordo com determinada ordem que, da terra, rado conhecer essa ordem no sentido superior da
não nos é compreensível. palavra, isto é, em última análise o divino governo
O Eterno Senhor, para nos incutir o desejo de do Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis,
participar da sua sabedoria, constituiu o universo símbolos d’Ele, a Perfeição das perfeições!
dessa maneira, como se nos dissesse: ‘Meus filhos
de todas as épocas, o reverso do tapete de minha CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio.
morada é esse esplendor. Subam para além, e vo- Bem-aventurança da admiração.
cês encontrarão a ordenação misteriosa e insondá- In: Dr. Plinio. São Paulo.
vel que agora não podem vislumbrar!” Ano IX. N.94 (jan., 2006); p.4
elevado”; ampla, pois se estende à requinte de sua contemplação ao trans- São João atingiu tal profundidade
consideração de seu poder sobre todas mitir a incompreensibilidade do Verbo, de visão e foi elevado aos cumes do
as coisas – “toda a terra está repleta que era desde o início, estava junto de conhecimento mediante a caridade.
de sua majestade”; e perfeita, uma vez Deus, é o próprio Deus (cf. Jo 1, 1-2). O amor à Palavra Encarnada fez com
que o levou a aderir com o afeto e o “João não só ensinou como Jesus Cris- que, ainda vivendo nesta terra, ele
entendimento à Suma Verdade con- to, Palavra de Deus, é Deus elevado ascendesse às alturas celestes, onde
templada – “o que estava abaixo d’Ele sobre todas as coisas, e como através abarcou a amplidão do firmamento
tomava o templo” (Is 6, 1.3). d’Ele tudo foi feito, mas também que e inebriou-se no deleite da Verdade
O Evangelho do Apóstolo Virgem por Ele somos santificados e a Ele ade- imutável, experimentando, pois, a
constitui a mais bela manifestação do rimos pela graça que em nós infunde”.14 contemplatio perfeita! ²
1
Cf. CONTEMPLAÇÃO. In: 3
Cf. Idem, a.1. 6
Cf. Idem, a.3. 11
SÃO TOMAS DE AQUINO.
BERARDINO, Angelo Di Lectura super Ioannem. Prolo-
4
Cf. SÃO TOMÁS DE AQUI- 7
Cf. Idem, a.4.
(Org.). Dicionário patrístico e gus, n.10.
NO. Compendium Theologiæ.
de antiguidades cristãs. Petró-
8
Idem, I-II, q.3, a.8.
L.I, c.104. 12
Idem, n.2.
polis: Vozes, 2002, p.337. 9
Cf. Idem, ibidem.
5
Cf. SÃO TOMÁS DE AQUI- 13
Idem, n.1.
2
SÃO TOMÁS DE AQUINO. 10
Cf. Idem, II-II, q.180, a.5.
NO. Suma Teológica. II‑II,
Suma Teológica. II-II, q.180,
14
Idem, n.8.
q.180, a.1.
a.4.
E m certo período da infân- Assim aconteceu com alguns cientis- O teólogo, o poeta e o Santo
cia, surgem na cabeça da tas, filósofos, compositores, poetas e Como visto na biografia que abre
criança inúmeras pergun- escritores que imortalizaram sua me- esta sequência de artigos sobre o Dou-
tas que denotam o desejo mória ao marcar a História com enge- tor Angélico, por ocasião da institui-
de investigar e compreender o mundo nhos fabulosos. ção da Solenidade de Corpus Christi,2
que a circunda: é a famosa idade dos Sem dúvida alguma, entre essas Urbano IV encarregou São Tomás de
“porquês”… figuras está o grande São Tomás de compor o ofício da celebração. Entre-
O jovenzinho começa a singrar o Aquino. Custa acreditar que uma úni- tanto, ultrapassando as expectativas, o
misterioso mar do conhecimento, e a ca mente tenha explicitado tantas ver- Santo-poeta produziu “uma joia litúr-
cada “descoberta” sente a alegria de dades! Por sua admirável inteligência gica que vem desafiando sete séculos,
mais uma batalha ganha, de mais um aliada a uma eminente santidade, foi e que talvez sigamos cantando na eter-
terreno conquistado! No variado leque louvado por teólogos, Bispos e Pontí- na bem-aventurança”.3 Todo o conjun-
de interrogações que o assaltam, uma fices de todos os séculos, e com mui- to de orações e hinos que o compõe é
das perguntas que costumam surgir é: ta razão Leão XIII o compara ao sol, considerado como “o mais terno, de-
“como o olho, sendo tão pequeno, tem pois “animou o mundo com o calor voto e profundamente teológico que se
a capacidade de abarcar tantas coisas, de suas virtudes e o iluminou com conhece na Sagrada Liturgia”.4 Dele
como a vastidão do mar, a imensidade esplendor”.1 recolhemos o Adoro te devote, o Lau-
do céu, a extensão das montanhas?…” da Sion e o Ave verum, entre outros.
E o pequeno passa seus dias à pro- Como salienta Biffi, São Tomás
cura de uma resposta convincente que Nesta antífona estão soube não apenas elaborar magistral-
tranquilize suas indagações – a qual mente sua teologia eucarística, mas
pode tardar anos em elucidar-se com- consignadas as três sua “contemplação da Eucaristia foi
pletamente – até que, talvez numa car- realidades que todo tão intensa que fez desabrochar sua
teira escolar, ele aprende como funcio- veia poética e infundiu os acentos da
na o sistema ótico do ser humano. Só Sacramento abarca: lírica numa irrepreensível e esmerada
aí seu espírito repousa, com o alívio de linguagem dogmática, e dela surgi-
ter chegado a mais uma conclusão! em relação ao passado, ram sequências e hinos que todos nós
Ora, tal como o olho tem a possibi- conhecemos e ainda cantamos”.5
lidade de abarcar tantas coisas, Deus
presente e futuro de Nesse Ofício de Corpus Christi,
criou certas almas com a capacidade nossa santificação encontramos uma antífona pequena
de sintetizar realidades vastíssimas. em tamanho, mas gigante em conteú-
1
LEÃO XIII. Æterni Patris. 3
FARREL, OP, Walter; HE- Teológica. 3.ed. Madrid: BAC, 6
Cf. SÃO TOMÁS DE AQUI-
ALY, STD, Martin J. El libro 1964. v.I, p.51. NO. Officium Corporis Chris-
2
Em 11 de agosto de 1264, Ur-
rojo de Dios según Santo To- ti Sacerdos. Vesp. II. Antipho-
bano IV emitia a Bula Transi- 5
BIFFI, Inos. L’Eucaristia in
más de Aquino. Pamplona: na ad Magnificat.
turus de hoc mundo, pela qual San Tommaso “Dottore Eu-
Don Bosco, 1980, p.598.
determinava a solene celebra- caristico”. Teologia, misti- 7
Cf. SÃO TOMÁS DE AQUI-
ção da festa de Corpus Christi 4
RAMÍREZ, OP, Santiago. In- ca e poesia. Siena: Cantagalli, NO. Suma Teológica. III, q.60,
em toda a Igreja. troducción general. In: SÃO 2005, p.9. a.3; q.73, a.4.
TOMÁS DE AQUINO. Suma 8
Idem, q.73, a.5.
Altar durante uma Missa na Basílica de Nossa Senhora do Rosário, Caieiras (SP)
tempos, uma vez que ela é a garantia capaz de interpor-se em tal doação;
da glória futura”.18 se for para o bem do outro, ele esta-
Efetivamente, para que ninguém
Há uma “ponte” entre rá disposto a entregar até a própria
julgue que o Reino dos Céus é con- o amor manifestado existência. Exemplo máximo dessa
quistado por um esforço pessoal, ex- realidade nos ofereceu o Salvador,
plica o Doutor Eucarístico que neste na Última Ceia e o ao morrer e entregar-Se aos homens
Sacramento recebemos Aquele que, em Corpo, Sangue, Alma e Divin-
em virtude de sua Morte e Ressurrei-
holocausto consumado dade: “Ninguém tem maior amor do
ção, abriu-nos as portas do Paraíso.19 na Cruz, pois o que aquele que dá a sua vida por seus
E este efeito escatológico do Ban- amigos” (Jo 15, 13).
quete Eucarístico é confirmado pelas verdadeiro amor só se Houve, portanto, uma como que
próprias palavras de Nosso Senhor: “ponte” entre o amor manifestado
“Tenho desejado ardentemente co- comprova no sacrifício durante a Última Ceia e o holocausto
mer convosco esta Páscoa […]. Pois consumado durante a Paixão. Donde
vos digo: não tornarei a comê-la até Dor e amor: sacrifício se pode concluir que o Divino Mestre
que ela se cumpra no Reino de Deus” que conduz à glória quis nos ensinar que sem sofrimento
(Lc 22, 15-16). Ora, o que levou Deus a dar-nos não há amor, pois o verdadeiro amor
Nossa união com Nosso Senhor tanto? O amor! Um amor desmedido, só se comprova no sacrifício.
Jesus Cristo e com os demais mem- inteiro, completo… propriamente in- Não desprezemos essa lição do Se-
bros de seu Corpo Místico aqui na finito. Um amor que Se aniquilou a nhor que diariamente temos diante de
terra, por meio da Eucaristia, é uma Si mesmo em favor daqueles a quem nós, nos altares do mundo inteiro, e
pré-figura da felicidade que teremos amava, derramando seu Sangue, ao saibamos abraçar com generosidade
no Céu! Se o convívio entre aqueles ser pregado numa Cruz. todas as provas e cruzes que a Provi-
que se amam causa tanta alegria nesta Quando existe um amor verdadei- dência nos envie, sabendo que no fim
vida, o que dizer de nossa plena união ro e puro, ele leva o amante a querer receberemos uma recompensa dema-
com Deus e com os bem-aventurados dar-se inteiramente ao amado, de siadamente grande: a perfeita união
na eternidade? maneira que nem a vida corporal é com Cristo no Céu! ²
9
Cf. Idem, ibidem. 12
SÃO TOMÁS DE AQUINO. 15
Cf. SÃO TOMÁS DE AQUI- 18
TORREL, Jean-Pierre. Saint
Suma Teológica. III, q.73, a.5. NO. Suma Teológica. III, q.79, Thomas en plus simple. Paris:
10
Cf. RATZINGER, Joseph. La
a.4-7. Cerf, 2019, p.81.
Eucaristía centro de la vida: 13
Cf. Idem, a.3.
Dios está cerca de nosotros. 16
SÃO JOÃO DAMASCENO. 19
Cf. SÃO TOMÁS DE AQUI-
14
ALASTRUEY, Gregorio. Tra-
2.ed. Valencia: EDICEP, 2003, De fide orthodoxa. L.IV, c.13: NO. Suma Teológica. III, q.79,
tado de la Santísima Eucaris-
p.32. PG 94, 1154. a.2.
tía. 2.ed. Madrid: BAC, 1952,
11
SAYÉS, José Antonio. El mis- p.225. 17
SÃO TOMÁS DE AQUI-
terio eucarístico. 2.ed. Ma- NO. Suma Teológica. III, q.79,
drid: Palabra, 2011, p.23-24. a.2, ad 1.
“Felizes aqueles
cuja vida é pura”
A vida religiosa levada com perfeição transladou-se da abadia a
uma casa de família, e desta a uma escura prisão. A Providência
preparava assim a vitória de uma vítima de agradável odor,
martirizada pelo furor revolucionário.
õ Ir. Maria Susana Carneiro, EP
A
sete quilômetros da cidade Dentre estas se destacam, pela pa- Sérignan, Susana Águeda Deloye,
de Orange, no sul da Fran- ciência e heroísmo, trinta e duas re- filha de José Alexis Deloye e Susa-
ça, encontra-se a pequena ligiosas levadas ao cadafalso por sua na Jean-Clerc. Seus pais, fervorosos
Capela de Gabet. Um olhar fidelidade à Santa Igreja. E na van- católicos, souberam dar-lhe uma
naturalista e distraído poderia consi- guarda do virginal e angélico cortejo educação exemplar, alicerçada em
derá-la como mais um monumento de das mártires de Orange, esteve a Bea- sólidos princípios de amor à religião,
piedade, entre os inúmeros que exis- ta Susana Águeda Deloye. que resplandeceriam durante as per-
tem esquecidos pela Europa. A reali- seguições pelas quais ela atravessa-
dade, porém, é outra. Trata-se de um
Na juventude, resplandece ria no futuro.
precioso relicário dos restos mortais um chamado Após passar uma infância virtuo-
de mais de trezentas vítimas da san- No dia 4 de fevereiro de 1741 sa e saudável, quando contava vinte
grenta Revolução Francesa. nascia, na então tranquila cidade de anos de idade pediu permissão aos
Fotos: Reprodução
Uma pequena capela perto de Orange é o precioso relicário dos restos mortais de mais
de trezentos mártires da Revolução Francesa
Capela de Gabet, Orange (França); à direita, local onde os mártires foram enterrados
Reprodução
to, guardavam elas firmemen- convocando a fiel religiosa
te alicerçado na alma o amor a depor no tribunal. Ela mal
do Mestre que as chamara e a teve tempo de se despedir
esperança no Reino que lhes das suas irmãs, às quais nun-
aguardava após as lutas desta ca mais tornaria a ver, e foi
vida. Eis a razão da alegria e imediatamente levada para o
constância que demonstraram banco dos réus. Havia ali uma
no cativeiro. quinzena de pessoas chama-
Para a surpresa de Susa- das a julgamento. Entre elas,
na, muitas eram as freiras ali Susana pôde reconhecer o
confinadas. Apesar de per- Pe. Lusignan, com o qual ha-
tencerem a congregações di- via feito o percurso de Sérig-
versas e seguirem diferentes nan a Orange.
regras, um só ideal as anima Viot, o acusador público, fez
nessa circunstância: continua- todos conhecerem os “crimes”
rem vivendo como religiosas. em função dos quais seriam
“[Trata-se de] transformar o julgados o sacerdote e a religio-
purgatório em uma antecâmara sa. “Lusignan, ex-padre, e Su-
do Paraíso. Todas sabem que sana Águeda Deloye, ex-re-
quando subirem à superfície ligiosa, são ambos culpados
da terra e encontrarem a luz do dos mesmos delitos: inimigos
dia, será para entrar na glória da liberdade, tudo tentaram
eterna. [...] A prisão deve ser para destruir a República pelo
um prolongamento do claustro, fanatismo e pela superstição;
para permitir a cada qual ter refratários à lei, recusaram
Prestar o juramento revolucionário
uma vida de silêncio, de oração consistia numa verdadeira apostasia;
prestar o juramento que ela
e de oferecimento”.2 Susana nunca trairia seu Senhor e preferia lhes exigia”.4
Aos poucos, organizam re- perder o corpo que a alma! Susana foi a primeira a ser
gras e horários. Às cinco horas Religiosas prestes a serem guilhotinadas, interrogada. Sendo a única
da manhã, meditação; às seis, por Paul Hippolyte Delaroche mulher presente e a primeira
D
ona Lucilia se esmera- comerem dessas saborosas frutas no e lembrava as verdades eternas; e o
va por dar a seus filhos, intervalo das aulas. dos alunos, empolgados, naquele pós-
em casa, a melhor edu- -guerra, pelas “modernidades” soezes
cação possível. Contu-
Dois mundos de Hollywood, e atraídos pelos costu-
do, em 1919, tendo Plinio atingido a em constante oposição mes simples e fáceis daí decorrentes.
idade adequada para tal, viu-se ela No primeiro dia de colégio, após Não era difícil distinguir aqui e acolá
na contingência de, não sem grande uma ou duas aulas, chegou a hora do os primeiríssimos germens das ten-
apreensão, ter de matriculá-lo numa recreio. Ao sair para o amplo pátio, dências anarquistas e libertárias que
escola. Naturalmente deveria ser a Plinio procurou seus primos com o décadas mais tarde infectariam a so-
melhor de São Paulo – na ocasião, o olhar, em meio àquela multidão de ciedade.
Colégio São Luís, dos padres jesuí- meninos correndo de um lado para o No colégio, essas duas influên-
tas. Era sob a orientação dos discípu- outro e gritando, pois eles lhe haviam cias antagônicas se alternavam na-
los de Santo Inácio que o menino de- prometido apresentá-lo aos demais turalmente várias vezes ao longo do
via continuar seus estudos, mas isto colegas. E onde estariam as cobiça- dia. Iniciado o intervalo das aulas,
não bastava para tranquilizar seu das cerejeiras? Por fim um deles apa- saíam todos em fila, em silêncio, até
maternal coração. Possuía ela intei- receu, ofegante, agitado: a entrada do pátio, e um mestre muito
ra noção dos perigos que, já naquele — Plinio! – gritou. jovem, revestido do traje eclesiásti-
tempo, podia acarretar o convívio — E as cerejeiras, onde estão? – co, fazia soar um apito. A esse sinal,
entre estudantes. perguntou o novo aluno, desejoso de, dir-se-ia que um turbilhão se desata-
Qual seria a reação de seu filho ao já naquele primeiro intervalo, deliciar- va sobre os meninos, impelindo-os
entrar em choque com um mundo tão -se com seu manjar preferido. a correr nas mais variadas direções.
oposto à preservação moral, inerente à — Vamos jogar futebol! – respon- Dentre eles, alguns mais agitados se
atmosfera do lar? Resistiria ele, ou se deu o primo. reuniam num ponto costumeiro do
deixaria arrastar por más influências Para Plinio começava a dura ba- recreio para contar certo gênero de
recebidas de novos companheiros? Só talha da vida, com suas tragédias, piadas, ou para criticar e ridiculari-
o futuro o diria. desilusões e fracassos, pela qual todo zar determinados professores; outros,
Um dia o próprio Plinio abordou filho de Adão irremediavelmente tem para tramar alguma pequena sedição
o assunto dos estudos com sua mãe. de passar. A primeira decepção foi a contra uma norma disciplinar incô-
Seus primos, que já frequentavam de não encontrar as sonhadas cere- moda. A grande maioria era arrasta-
aquele colégio, haviam-no convi- jeiras. Depois, ante seus olhos, dois da por seus liderzinhos, ao sabor das
dado insistentemente a ir estudar mundos se desenvolviam lado a lado, ondas dos novos tempos.
também com eles. Um primo mais porém em constante oposição: o dos Por mais que aqueles bons e pie-
chegado, a fim de atraí-lo com mais padres que, voltados para o sagra- dosos sacerdotes jesuítas pregassem
facilidade, dissera que no pátio do do, por seu porte grave e seus trajes a doutrina ortodoxa durante meses a
recreio havia muitas cerejeiras, sen- austeros, criavam em torno de si um fio, ao se reunirem os alunos no re-
do um dos passatempos dos alunos ambiente que simbolizava a tradição creio, um argumento ou um chiste,
lançado por um menino numa con- pela fidelidade reciprocamente sobre o assunto. Fiel à
versa de cinco minutos, podia redu- Certa vez, porém, notou brusca educação que recebera dela, Plinio, no
zir a nada todo o esforço despendido mudança. Plinio chegou com uma pi- colégio, fora de início muito afável e
pelos mestres, durante horas e horas lha de livros e de cadernos debaixo de cerimonioso, enquanto alguns de seus
de aulas. cada braço. O portão do jardim esta- companheiros usavam maneiras “es-
Plinio não se deixou dominar pelo va com o trinco aberto. Ele lhe meteu portivas”, tidas por varonis. Em pouco
ambiente e embora sua aparência físi- um pontapé e, depois de entrar, em- tempo, notou ele a necessidade, para
ca – tez muito branca, cabelos louros purrou-o com o ombro para fechar; se fazer respeitar pelos demais alu-
e corpo franzino – não fosse própria a atravessou o jardim com passo rápido nos, de mostrar-se enérgico no trato
intimidar seus interlocutores, decidiu e duro, e subiu a escada correndo, sal- e impor-se quase à força, quando não
enfrentar a situação. No fundo, opta- tando os degraus de dois em dois. fossem suficientes os argumentos da
ra pela luta, a fim de preservar em sua Dona Lucilia, que observava da ja- razão. Decidiu então ensaiar o modo
alma aquela inocência que Dona Lu- nela, tirou num instante todas as con- de ser “esportivo”, que realmente lhe
cilia com tanto zelo protegera e culti- clusões do que vira, pensando consi- granjearia simpatia junto a certos co-
vara em sua primeira infância. Agora go: “Ele já está igual aos outros. Está legas.
cabia-lhe, e só a ele, manter intacta e todo transformado”. Não obstante esta Nesse diálogo explicativo entre mãe
imaculada a veste branca que recebe- apreensão cravada na alma, recebeu-o e filho, Plinio fez ver a Dona Lucilia
ra no Batismo: a fé e a castidade. com o mesmo afeto de sempre, nesse que, apesar dessa transformação, toda
dia talvez mais que o normal, apenas exterior e comandada pelo senso prá-
Apreensão materna se limitando a perguntar: tico, absolutamente nada mudara em
Dona Lucilia discretamente obser- — Filhão, como correram as aulas? seus princípios e em sua fidelidade à
vava as mínimas reações do filho, para Ouviu apenas a resposta que Plinio educação recebida em casa. O que sua
ver se ele estava resistindo às más in- habitualmente lhe dava, pois era óti- carinhosa mãe reconheceu com facili-
fluências, ou se, de modo imperceptí- mo aluno: dade e de bom grado. ²
vel, ia-se deixando levar por elas. Pelo — Muito bem, mãezinha!
modo de Plinio falar, gesticular, tra- E até o fim do curso no colégio, Extraído, com pequenas
tar os outros e, sobretudo, por aquele tudo continuou na mesma, no transfor- adaptações, de: Dona Lucilia.
“sexto sentido” que só o desvelo ma- mado modo de ser de Plinio, até que, Città del Vaticano-São Paulo: LEV;
terno dá, ela procurava discernir nele anos depois, sua mãe e ele se abriram Lumen Sapientiæ, 2013, 244-249
Eric Salas
Daniele Sacelotti
Emilio Paez
Junior Gonçalves
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St
Ricardo Schneider
em Santa Catarina.
Destacam-se também as cerimônias realizadas em Roma,
Veneza e Mira, na Itália; na Catedral madrilena da Almudena,
na Espanha; no Santuário Nacional de Nossa Senhora de Fáti-
ma em Namaacha, Moçambique; nas cidades de Hudson (MA) e
Miami, nos Estados Unidos, Medellín, El Retiro e Tocancipá, na
Colômbia, Quito, Cuenca, Ibarra e Manta, no Equador, Asunción
e Ypacaraí, no Paraguai, Santo Domingo e Bonao, na República
Dominicana, bem como no Canadá, México, Guatemala, Nica-
rágua, Costa Rica, El Salvador, Peru, Bolívia, Chile, Uruguai,
Argentina e África do Sul. Itália
Stephen Nami
Marcelo Vicenti
Xavier Jacob
Chile Paraguai
Roberto Hernández
David Ayusso
Roberto Salas
Antônio Lutiane
Tatiane Oliveira
neficiou trinta alunos com cinco mil pos Católicos dos Estados Unidos
dólares para os gastos acadêmicos, está promovendo uma peregrinação
repercutiu favoravelmente entre os eucarística pelo país, que deve ter
estudantes, animando muitos outros dois meses de duração: iniciada no
a abraçarem essa mudança, mesmo Multitudinária homenagem à domingo de Pentecostes, dia 19 de
sem receberem o benefício. Segundo Virgem dos Desamparados maio, ela concluirá em 16 de julho,
o depoimento dos jovens, o fato de Por ocasião do centenário da coro- data inaugural do congresso. Dividi-
passar um semestre sem usar os apa- ação canônica da Virgem dos Desam- da em quatro rotas diferentes, a pe-
relhos melhorou sua concentração e parados, doze mil pessoas encheram regrinação percorrerá cerca de dez
produtividade, e os ajudou a encon- a Praça de Touros de Valência, Espa- mil quilômetros e visitará sessenta
trar momentos para a oração, leitura e nha, numa histórica celebração. e cinco dioceses, ocasião em que
conversa com os amigos, num mundo A Grande Vigília Diocesana foi os fiéis poderão participar de Cele-
que fica além das telas de seus telefo- presidida pelo Arcebispo Metropoli- brações Eucarísticas, Adorações ao
nes inteligentes. tano, Dom Enrique Benavent Vidal, e Santíssimo e palestras sobre este au-
contou com momentos de oração, de- gusto Sacramento, entre outras ati-
poimentos, meditação, cantos, Ado- vidades e devoções.
ração ao Santíssimo Sacramento e Em harmonia com esse empenho
Rosa-Maria Rinkl (CC by-sa 4.0)
Francisco Lecaros
com os restos mortais de seu santo protetor, a fim de defendê-la do avanço árabe
na península.
Ao longo da História, milhares de peregrinos veneraram a relíquia, obten-
do especial proteção em tempos de epidemias e pestes. Trata-se de uma parte
do braço esquerdo da Cruz, abrigada num relicário de prata, e nela é possível “Lignum Crucis” do Mosteiro de
ver o local onde pregaram a mão do Salvador. São Turíbio de Liébana (Espanha)
Irmãs da Caridade emblemáticas cruzes heráldicas com está notavelmente preservado. A no-
deixam Nova York flores de lis deram lugar a folhas de tícia se espalhou pelas redes sociais,
As Irmãs da Caridade de Nova bordo canadense. levando à Abadia de Nossa Senhora
York, a primeira congregação reli- Embora o gesto acabe por negar os de Éfeso milhares de visitantes dese-
giosa feminina erigida em solo norte- séculos de história e tradição cristã josos ver o corpo e pedir a intercessão
-americano, deixarão a cidade mais de da nação, a governadora-geral do Ca- da religiosa falecida.
duzentos anos após sua fundação por nadá, Mary Simon, julga que a nova A Ir. Wilhelmina fundou a Con-
Santa Elizabeth Ann Seton em 1809. coroa desprovida de símbolos religio- gregação das Beneditinas de Maria
A comunidade – outrora muito pujan- sos reflete o “desejo de evoluir para Rainha dos Apóstolos em Gower,
te nos Estados Unidos – não recebeu atender às necessidades e circunstân- Missouri, no ano de 1995. Sua vida
nenhuma nova vocação nos últimos cias do país”. de profunda piedade mariana e amor
vinte anos, o que levou as diretoras a à vida religiosa marcou fortemente a
tomarem a difícil decisão de iniciar o comunidade e ainda hoje é fonte de
“caminho de conclusão” do instituto. inspiração para as monjas.
Embora satisfeitas pela ação evan-
gelizadora realizada em escolas e
Mais uma capela de
hospitais do país ao longo destes Adoração Perpétua
Reprodução
A torre que
tocou o Céu
Uma construção misteriosa… tinha só os
fundamentos, um pouco do piso e alguns
centímetros de parede. Que arquiteto
a concluiria?
õ Lorena Mello da Veiga Lima
coisa útil em Aristóteles também. os fundamentos, um pouco do piso e minha experiência me diz que, quan-
Este, ouvindo seu nome, aproxi- alguns tantos centímetros de parede do a Providência conserva a vida de
mou-se. levantada. E explicou: alguém de modo tão surpreendente,
— Com licença, me chamastes? — Vede, está sendo construída como fez com o menino que estava ao
Posso ajudar? uma torre que chegará à porta das lado dela, é porque lhe reserva algu-
Os dois permitiram que ele entras- moradas santas. ma missão.
se na conversa e lhe contaram tudo — Ó Beleza suprema – exclamou Os Anjos se entreolharam e sorri-
quanto discutiam. Então o mestre a Águia de Hipona –, trata-se de uma ram. Aquele que estava com as mãos
grego se pronunciou: nova Babel?! desocupadas tinha expressões mais
ão
perseguido. Obrigado a abando- 28. Santos Prócoro, Nicanor, Ti-
uç
od
nar a Diocese de Segni, refugiou-
pr
mão, Pármenas e Nicolau. Cin-
Re
-se em Monte Cassino. co dos sete “varões de boa repu-
19. Santa Áurea, virgem e már- Santo Alberico Crescitelli tação, cheios do Espírito Santo e
tir (†856). Conduzida diante dos de sabedoria” (At 6, 3), escolhidos
monástica. Ordenado presbítero,
juízes em Córdoba, Espanha, ab- pelos discípulos para auxiliar os
fundou o mosteiro de Fontenelle,
jurou da Fé cristã por temor, Apóstolos.
célebre na Idade Média como cen-
mas logo se arrependeu e foi tro de espiritualidade e escola de 29. Santa Marta.
martirizada. artes e ofícios. São Guilherme Pinchon, Bis-
20. Santo Elias Tesbita, profeta. po (†1234). Bispo de Saint-Brieuc,
23. XVI Domingo do Tempo
Santo Apolinário, Bispo e Comum. França, brilhou por sua bondade e
mártir (†séc. II Ravena - Itália). simplicidade e por defender os di-
Santa Brígida, religiosa
São Vulmaro, presbítero reitos da Igreja e da sua grei.
(†1373 Roma).
(†c. 700). Religioso beneditino da
abadia de Hautmont, levou duran- Beata Joana de Orvieto, vir- 30. XVII Domingo do Tempo
te um tempo vida eremítica e fun- gem (†1306). Religiosa das Irmãs Comum.
dou, posteriormente, dois mostei- da Penitência de São Domingos, São Pedro Crisólogo, Bispo
ros no norte da França. em Orvieto, Itália. Ardorosa de- e Doutor da Igreja (†c. 450 Ímo-
vota da Paixão do Senhor. la - Itália).
21. São Lourenço de Bríndisi, pres-
24. São Charbel Makhluf, presbíte- Beato Manes de Gusmão,
bítero e Doutor da Igreja (†1619
ro (†1898 Anaia - Líbano). presbítero (†c. 1235). Irmão de São
Lisboa).
Beata Ludovica de Saboia, Domingos e seu colaborador na ex-
Santo Alberico Crescitelli,
presbítero e mártir (†1900). Sacer- religiosa (†1503). Filha do Beato pansão da Ordem dos Pregadores.
dote do Pontifício Instituto para Amadeu, Duque de Saboia. Ten- Morreu em Caleruega, Espanha.
as Missões Estrangeiras, assassi- do se casado com Hugo, príncipe 31. Santo Inácio de Loyola, presbí-
nado com requintes de crueldade de Chalon, enviuvou ainda jovem
tero (†1556 Roma).
nas proximidades de Yang Xian, e abandonou as honras e riquezas
São Fábio, mártir (†303/304).
China. mundanas para fazer-se clarissa
Cristão condenado à morte em
da reforma de Santa Coleta.
22. Santa Maria Madalena. Cesareia da Mauritânia, atual Ar-
São Vandregísilo, abade 25. São Tiago Maior, Apóstolo. gélia, por recusar-se a portar a ban-
(†c. 668). Abandonou a corte do Santa Maria do Carmo S allés deira do governador numa cerimô-
Rei Dagoberto e abraçou a vida y Barangueras, virgem (†1911). nia pagã.
A
Escola Cusquenha de pintura Por isso, foi também cognominado recendo-o com o “obséquio”. Em certa
caracteriza-se pela aplicação Doutor Comum. ocasião, tendo rogado o auxílio divino
de cores vivas, pelos dese- No lado oposto, aparece um uni- para interpretar intricadas passagens
nhos vibrantes e pela plurali- córnio, associado pela mitologia à do profeta Isaías, São Tomás granjeou
dade de ornamentos. Para representar pureza. Ora, tal virtude foi a mais fre- a sábia assistência dessas colunas da
o Príncipe da Escolástica não foi dife- quentemente atribuída ao Aquinate Igreja. Depois disso, os tomou como
rente: o painel está repleto de alegorias, nos testemunhos de sua canonização. intercessores para a redação de suas
cujo significado custa redobrada aná- Esse fato se deve à sua vitória contra obras, como a Catena Aurea – em la-
lise. Além disso, as inscrições latinas a luxúria quando a própria família, tim, corrente de ouro – alegoricamen-
estão truncadas. Tais características, contristada pela vocação religiosa te representada sobre os ombros.
contudo, mais do que uma dificuldade, dele, inseriu-o em cárcere privado A placidez do Santo não lhe foi
constituem um estímulo a esquadri- com uma meretriz, para o tentar. O empecilho para combater o mal. A sua
nhar a obra de arte com atenção. jovem Tomás a repeliu com um tição pena é como a flecha septiforme do
Na cena, mimetizando a Virgem em chamas, sendo por isso premiado Paráclito, que lhe inspira diretamente
Maria, São Tomás de Aquino tem a com um cíngulo de castidade, t razido pelo ouvido. Seus escritos se nutriram
lua sob seus pés, na qual se lê: “O es- do Céu por uma dupla de Anjos, de uma intensa vida de oração – desta-
tulto muda como a lua” (Eclo 27, 12), como os representados à esquerda. ca-se o rosário preso à cintura – e por
ao passo que os sábios, como ele, es- Em referência a esse episódio, foi- uma entranhada devoção à Eucaristia –
tão “vestidos de sol” (cf. Ap 12, 1), -lhe outorgado o título de Doutor An- plasmada pelo ostensório junto ao pei-
conforme a inscrição de sua cintura. gélico no século XV. Por essa razão to –, da qual foi o poeta por excelência.
Sempre imitando Nossa Senhora, ele é aqui representado com asas de O olhar do Aquinate se fixa na
o Santo combate uma hidra, símbolo Anjo e louros de honra sobre a cabe- Igreja, sustentada aqui pela Suma
da heresia. A mão que agarra a lua é ça, além de barrete doutoral e faixas Teológica, em cujo corte se lê o célebre
de Martin Bucer, luterano e ex-domi- acadêmicas em azul e vermelho, co- veredicto de João XXII em sua canoni-
nicano, que teria proferido as palavras res das cátedras de Filosofia e Teolo- zação: “Escreveu tantos artigos quanto
ali gravadas em parte: “Tire Tomás [e gia respectivamente. milagres realizou”.
eu destruirei a Igreja]”. Nessa disputa, As fontes e os jardins ao redor são Da cruz emanam as mesmas pa-
bem sabemos quem triunfou… emblemas da ciência e da sabedoria lavras proferidas por Jesus ao Angé-
Diante da heterodoxia, o Santo na universidade: hão de fluir como as lico, três meses antes de sua morte:
Doutor permanece sereno, conforme a águas e florescer para além de seus “Escreveste bem de Mim, Tomás”. O
sua alcunha de “boi mudo” represen- quadrantes. Donde o Mestre das Esco- imaginativo pintor cusquenho coloca
tada no canto inferior esquerdo. A esse las ser assim invocado: “Vós sois a mi- ainda as seguintes palavras nos lábios
respeito, declarou o seu mestre Santo nha glória e minha coroa” (cf. Fl 4, 1). do Santo Doutor: “Não teria escrito
Alberto Magno: “Chamamo-lo de ‘boi Abaixo dos Anjos lê-se que eles o bem do Filho, se tivesse escrito mal
mudo’, mas ele, por sua doutrina, res- confortaram com a sua “diligência”, sobre a Mãe”.
soará um mugido tal, que repercutirá ao passo que do outro lado se apre- O Aquinate, na realidade, teve um
no mundo inteiro”.1 E assim se fez… sentam São Pedro e São Paulo, favo- rapto místico, que o levou a anelar o
Céu e a lançar ao fogo todas as suas compensa por teu labor?” Ao que A resposta de Cristo bem poderia ser:
obras por reputá-las como palha em o Santo respondeu: “Nada além de “Nada além de Tomás!” ²
relação ao que vira… Ainda bem que Vós, Senhor”.2
um secretário conseguiu salvá-las! Após contemplar os plúrimos pre- 1
GUILHERME DE TOCCO. Ystoria
Na verdade, depois do elogio, dicados do Angélico Doutor nesta tela, Sancti Thome de Aquino, c.13. Toronto:
Nosso Senhor perguntou-lhe: “O poderíamos retrucar a Jesus de modo PIMS, 1996, p.118.
que receberás de Mim como re- análogo: “O que mais falta a Tomás?” 2
Idem, c.34, p.162.
Reprodução
G raças ao impulso dos frades pregadores, dentre os quais se destaca São Tomás de Aquino, a
Escolástica atingiu o ápice de seu brilho, maravilhando o mundo inteiro pela perfeita exposi-
ção da Teologia e da Filosofia. A Igreja confiaria à Ordem Dominicana a custódia do sagrado de-
pósito da Revelação, e seus membros seriam qualificados de “martelos da heterodoxia”.
[Essa família religiosa completou] o quadro das principais correntes de espiritualidade que com-
punham, em toda a sua riqueza de matizes, a glória da Civilização Cristã. Nessa era abençoada
cumpriu-se de certo modo o pedido do Pai-Nosso: “Seja feita a vossa vontade assim na terra como
no Céu”. E daí resultou o desabrochar da santidade em todas as classes e estados de vida.