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RESUMO

Roseméri Simon Bernardi

PICHON-RIVIÈRE, Enrique. Teoria do Vínculo. Págs. 49 a 109.

O vínculo é sempre um vínculo social, mesmo sendo com uma só pessoa;


através da relação com esta pessoa repete-se uma história de vínculos determinados em
um tempo e em espaços determinados. Por essa razão, o vínculo se relaciona
posteriormente com a noção de papel, de status e de comunicação.
Não existem relações impessoais, uma vez que o vínculo de dois se estabelece
sempre em função de outros vínculos condicionados historicamente no sujeito e que,
acumulados nele, constituem o que denominamos o inconsciente. O inconsciente,
portanto, é constituído por uma série de pautas de conduta acumuladas em relações com
vínculos e papéis que o sujeito desempenha frente a determinados sujeitos. Então,
quando deposita sobre outro sujeito, mediante o mecanismo de deslocamento ou de
projeção, um determinado objeto interno, estabelece com ele um vínculo fictício, como
o é, por exemplo, o vínculo transferencial, onde o analista chega a ter as características
de uma figura anterior e é operante, justamente por isso, no tratamento: porque através
da transferência é possível reviver o vínculo primitivo que o paciente tem com sujeitos
primários, de sua primeira época de vida. Desse modo, é possível retificar a natureza
dessas imagens e fazer a aprendizagem da realidade, a aprendizagem em sentido geral.
O campo da psiquiatria é o campo dos objetos internos. Os vínculos entre o eu e
o objetos internos marcam fortemente o vínculo externo.
Em psicologia, a descoberta do outro é guiada por momentos de insight desse
mundo interno, que funciona com uma dialética interna particular e que pode servir de
abordagem da realidade e orientar um determinado tipo de investigação.

Vínculo racional e irracional

A psiquiatria atual é uma psiquiatria social, no sentido de que não se pode pensar
em uma distinção entre indivíduo e sociedade. É uma abstração, um reducionismo que
não podemos aceitar porque temos a sociedade dentro de nós. Nossos pensamentos,
nossas ideias, nosso contexto geral é, na realidade, uma representação particular e
individual de como captamos o mundo de acordo com uma fórmula pessoal, de acordo
com nossa história pessoal e de acordo com o modo pelo qual esse meio atua sobre nós
e nós sobre ele.
As palavras racional e irracional devem ser consideradas, em termos de vínculo,
como graus de esclarecimento ou graus de conhecimento da natureza do vínculo.
Dizemos que uma relação é objetal e racional quando é conhecida conscientemente e
conscientemente administrada. Mas, ao mesmo tempo, sabemos que esse vínculo que
chamamos racional está geneticamente ligado a vínculos irracionais. A transformação
do irracional em racional pode se realizar em termos de espiral, como uma
transformação dialética; isso quer dizer que certas quantidades de irracionalidade se
transformam em qualidades de racionalidade à medida que o processo psicanalítico
avança. A psicoterapia tem por finalidade tornar racional um vínculo irracional, porque
a neurose pode ser definida pela predominância de um vínculo irracional que é operante
na prática e na práxis desse sujeito em sua relação com o mundo.

Vínculo, campos de interação e de conduta

O objetivo central das investigações psicológicas é o campo psicológico. O


campo psicológico é o campo das interações entre o indivíduo e o meio. Por isso,
podemos dizer que o próprio objetivo da psicologia é o campo da interação.
Ao elaborar a teoria do vínculo, Pichon a diferencia da teoria das relações de
objeto concebida pela Psicanálise (que descreve as possíveis relações de um sujeito com
o objeto sem levar em conta a volta do objeto sobre o sujeito, isto é, uma relação linear),
propondo, então, o estudo da relação como uma espiral dialética onde tanto o sujeito
como o objeto se realimenta mutuamente. É sempre uma situação em forma de espiral
contínua, onde o que se diz ao paciente, por exemplo-interpretação, no caso de um
vínculo terapêutico - determina certa reação do paciente que é assimilada pelo terapeuta
que, por sua vez, a reintroduz em uma nova interpretação.
A teoria do vínculo tem um caráter social na medida em que compreende que
sempre há figuras internalizadas presentes na relação, quando duas pessoas se
relacionam, ou seja, uma estrutura triangular. O vínculo é bi-corporal e tripessoal, isto é,
em todo vínculo há uma presença sensorial corpórea dos dois, mas há um personagem
que está interferindo sempre em toda relação humana, que é o terceiro. Neste sentido,
vínculo é uma estrutura psíquica complexa.
Para o autor, o objeto de formação do profissional deve instrumentar o sujeito
para uma prática de transformação1 de si, dos outros e do contexto em que estão
inseridos. Defende ainda a ideia de que aprendizagem é sinônimo de mudança, na
medida em que deve haver uma relação dialética entre sujeito e objeto e não uma visão
unilateral, estereotipada e cristalizada.
A aprendizagem centrada nos processos grupais coloca em evidência a
possibilidade de uma nova elaboração de conhecimento, de integração e de
questionamentos acerca de si e dos outros. A aprendizagem é um processo contínuo em
que comunicação e interação são indissociáveis, na medida em que aprendemos a partir
da relação com os outros.
Em todo interior de um grupo as relações intensas que são caracterizadas pelos
papéis e funções de cada um exige ações que se completam com o modo de viver o
grupo e pertencer a ele. Nessa perspectiva, cada elemento do grupo familiar tem papel a
cumprir e, toda a sua forma de agir, comunicar, pensar e sentir, influenciará no
funcionamento desse grupo.
Foram nas atividades e análise de grupos que Pichón desenvolveu os conceitos
de verticalidade e horizontalidade. O primeiro se trata da história pessoal de cada
integrante, história essa que faz parte da determinação dos fenômenos no campo grupal,
por horizontalidade entende-se como a dimensão grupal atual, elementos que
caracterizam o grupo.
A intersecção entre a verticalidade e a horizontalidade dá origem aos diferentes
papéis que o indivíduo assume no grupo. Os papéis se formam de acordo com a
representação que cada um tem de si mesmo que responde as expectativas que os outros
têm de nós. Constata-se a manifestação de vários papéis no campo grupal, destacando-
se o papel do porta-voz, bode expiatório, líder e sabotador.

Porta-voz: é aquele que expressa às ansiedades do grupo, ele é o emergente que


denuncia a ansiedade predominante no grupo a qual está impedindo a tarefa;
Bode expiatório: é aquele que expressa à ansiedade do grupo, mas diferente do
porta-voz, sua opinião não é aceita pelo grupo, de modo que este não se identifica com a
questão levantada gerando uma segregação no grupo, pode-se dizer dele como
depositário de todas as dificuldades do grupo e culpado de cada um de seus fracassos;

Líder: A estrutura e função do grupo se configuram de acordo com os tipos de


liderança assumidos pelo coordenador, apesar de a concepção de líder ser muito
singular e flutuante. O grupo corre o risco de ficar dependente e agir somente de acordo
com o líder e não como grupo;

Sabotador: é aquele que conspira para a evolução e conclusão da tarefa


podendo levar a segregação do grupo;

No início do grupo, os papéis tendem a ser fixos, até que se configure a situação
de lideranças funcionais. Todo grupo denuncia, mesmo na mais simples tarefa, um
emergente grupal. Este é exatamente aquilo que numa situação ou outra se enche de
sentido para aquele que observa para quem escuta. O observador observa o existente
segundo a equação elaborada por Pichón.

EXISTENTE ===>> INTERPRETAÇÃO ===>> EMERGENTE ===>> EXISTENTE

O existente só ocorre à medida que faz sentido (para o observador) e a partir de


uma interpretação se torna o emergente do grupo. Este novo emergente leva a um novo
existente, o qual por sua vez requer uma nova interpretação, que levará o outro
emergente. O coordenador toma um papel muito importante à medida que é dele que
emanam as interpretações, ele é quem dá o sentido ao grupo, e é este sentido que
mobilizará uma aprendizagem, uma transformação grupal. Ele atua primariamente como
um orientador que favorece a comunicação intergrupal e tenta evitar a discussão frontal.
Para Pichon, grupo operativo é um instrumento de trabalho, um método de investigação
e cumpre, além disso, uma função terapêutica, pois, se caracteriza por estar centrada, de
forma explícita, em uma tarefa que pode ser o aprendizado, a cura, o diagnóstico de
dificuldades, etc. Sua teoria tem como premissa principal o indivíduo inserido em um
grupo, percebendo a intersecção entre sua história pessoal até o momento de sua
afiliação a este grupo (verticalidade), com a história social deste grupo até o momento
(horizontalidade).

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