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A Relação dos Seres Humanos com os Estímulos do Ambiente
Lucelmo Lacerda

Estímulos Reforçadores Primários e Secundários


Vamos voltar lá ao comecinho, às aulas sobre Behaviorismo Radical.
Lembrem-se que o comportamento humano possui 3 níveis de controle: a) o
filogenético (a base biológica); b) o ontogenético (a história de vida do
indivíduo); e c) a cultura.
O primeiro nível, filogenético, não faz parte de minha história individual,
vem antes de mim, trata-se da seleção de características e comportamentos
selecionados na história da espécie, em milhões e milhões de anos.
A mudança de ambiente na África central, aproximadamente onde hoje
fica o Chade, fez com que os primatas que, aleatoriamente, tinham um rabo um
pouco menor e andavam de maneira mais apoiada em somente dois membros,
isto é, de modo bípede, tivessem uma vantagem nesse novo contexto com
muito menos árvores. Os primatas com rabos menores e com maior bipedismo
se equilibravam e locomoviam um pouco melhor e, por isso mesmo, tinham
mais acesso à comida e podiam se livrar mais rapidamente de ameaças e por
isso vivam mais, melhor e tinham mais filhotes, que tinham mais probabilidade
também de terem rabos um pouquinho menores do que a média e entre estes
filhotes, aqueles de rabos ainda menores tinham mais vantagem e por isso,
maior probabilidade de legar seus genes e apresentarem o bipedismo. Isso
aconteceu de maneira consistente durante milhares de gerações, criando uma
espécie simplesmente sem rabo e totalmente bípede na idade adulta.
Esta característica biológica dos seres humanos, implicada diretamente
no comportamento de andar, parte fundamental da forma com que o ser
humano interage com o ambiente, foi selecionada no nível filogenético, eu não
vivi nada disso, foi muito antes de eu nascer, ainda que tenha impacto em que
eu sou e como me comporto, esta é uma característica não aprendida.
Considere então que no campo da Análise do Comportamento usamos
outra palavra como sinônimo de “aprendizagem”, que é “condicionamento”,
então um comportamento que não é aprendido, mas já está presente
independentemente disso também é chamado de Incondicionado. Assim, se

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um comportamento for inato ao organismo, o chamamos de Incondicionado,
como os comportamentos respondentes, que já estudamos lá atrás. Mas isto
também é apresentado na relação que os indivíduos estabelecem com
estímulos do ambiente, um estímulo pode exercer uma influência sobre um
organismo que lhe é inata, não aprendida e, portanto, incondicionada,
enquanto outras relações diferentes precisam ser ensinadas e, portanto, são
condicionadas.
Está difícil de entender ainda, eu sei, mas calma lá. O que é um estímulo
reforçador ou um estímulo punidor? Vamos voltar por aí para que possamos
entender direitinho. Um estímulo é uma mudança física do ambiente, ok, estes
estímulos, quando se seguem a um comportamento, isto é, são consequências
a ele, podem alterar a probabilidade deste comportamento acontecer no futuro,
podem aumentar a probabilidade de o comportamento acontecer no futuro – e
neste caso o chamamos de estímulo reforçador – ou podem diminuir a
probabilidade de comportamento ocorrer no futuro – e neste caso o chamamos
de estímulo punidor.
Assim que nascemos, em geral, certos estímulos nos são aversivos, como
a dor, o frio mais intenso, o calor mais intenso, a sensação de fome ou de
sede, ou seja, são estímulos que nos comportamos para evitar, daí que
também sejam punidores incondicionados, isto é, não aprendidos. Outros
estímulos, por sua vez, são geralmente reforçadores, como o leite, o toque da
mamãe, a retirada do frio, do calor, da sujeira.
À medida em que o tempo passa, aprendemos a lidar com outros
variados estímulos e a relação com eles é aprendida, condicionada, como
nossa relação com o celular, com os livros, com a televisão, com os jogos de
tabuleiro, com as várias manifestações da linguagem, entre outros. A própria
dor, que inicialmente é punidora, pode se tornar reforçadora, veja o caso dos
sadomasoquistas, para os quais a dor é pareada com estímulos sexuais e se
torna também excitante ou ainda as muitas pessoas que passam a detestar
leite, que se torna um estímulo aversivo.
Estes estímulos incondicionados também são chamados de
primários, são aqueles essenciais porque dizem respeito a nossa
sobrevivência, alimentar-se, ir ao banheiro defecar ou urinar, beber água.

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Enquanto os estímulos condicionados são chamados de secundários,
porque são aprendidos e, apesar de muito importantes para nossa vida, não
dizem respeito a nossa sobrevivência, mas a nossa qualidade de vida.

Reforçadores Naturais e Arbitrários


Há uma outra classificação importante a atentarmos aqui, que diz respeito
a reforçadores naturais e arbitrários, que é fundamental reconhecer porque
impacta diretamente em nossa prática como Analistas do Comportamento,
porque nós podemos utilizar, em um processo de ensino, reforçadores
arbitrários ou naturais, mas sempre é preciso levar o processo de ensino de
modo que o comportamento, ao final, fique sob controle dos reforçadores
naturais da tarefa, esse é sempre nosso objetivo.
O que significa um reforçador natural? É aquele que mantém o
comportamento quando ele aparece na vida real, fora de um procedimento de
ensino.
O que significa um reforçador arbitrário? É aquele que alguém planeja e
implementa em um procedimento de ensino e que se difere do que mantém o
comportamento na vida real.
Imagine o caso de Zezinho, ele é um menino com autismo, que não gosta
de brincar de carrinho, que é a brincadeira predileta de seus amiguinhos da
escola e primos da mesma idade. Qual é o reforçador natural da atividade de
brincar de carrinho? Se divertir na interação com os amigos e com os carrinhos
de brinquedo. Mas como dito, isso não é reforçador para Zezinho, ele só quer
saber de celular. O Analista do Comportamento poderia arranjar as coisas de
tal modo que Zezinho, para jogar no celular, deve antes brincar de carrinho, o
que faz com que o reforçador do carrinho, para ele, seja diferente do que o
mantem na vida real, a diversão em si, o celular, neste caso, é um reforçador
arbitrário.
E é um problema a utilização de reforçadores arbitrários? Não, eles
podem e devem ser utilizados, pois podem ser mais fáceis de manipular em
diversos contextos, além de serem os únicos eficazes também em uma série
de situações. Imagine que estamos ensinando um adolescente a pedir para ir
ao shopping, não podemos levar ao shopping em todas as tentativas, mas

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podemos oferecer um reforçador arbitrário ao pedido, desde que, sempre,
todas as vezes, encaminhemos o comportamento para seu reforço natural ao
fim do processo de intervenção.
Assim, eu posso ensinar o Zezinho a brincar de carrinho com o
reforçamento por meio do celular, mas ao fim, devemos tê-lo ensinado a gostar
do carrinho e se divertir com ele. E como isso acontece? Por meio do
condicionamento respondente, o reforçamento pelo celular “transfere
estímulos” para o comportamento que o precedeu, isso é chamado de
Princípio de Premack, que pode ser assim formulado: Todo comportamento
de alta probabilidade, quando emitido contingente à emissão de um
comportamento de baixa probabilidade, tende a aumentar a probabilidade
deste comportamento a que seguiu.
Deixe-me explicar um pouco melhor este Princípio: Imagine uma situação
de liberdade total, a pessoa pode fazer o que bem quiser, sem ninguém ver ou
controlar. Imagine que ela jogue videogame por 6 horas, este é, portanto, um
comportamento de alta probabilidade e digamos que ela leia livros por somente
20 minutos, em média. Digamos que então se estabeleça uma contingência em
que, para que ela possa jogar videogame, ela deva antes ler e que isso ocorra
consistentemente por algum tempo. Após algumas semanas, se colocado
novamente em uma situação de total liberdade, o comportamento de ler, ainda
assim, deve ocorrer em maior probabilidade, a pessoa aprende a “gostar” de
ler.

Reforçadores Específicos e Generalizados


Outro conceito importante é este de reforçadores específicos e
generalizados. Imagine que estejamos em uma conversa com alguém, que nos
pergunta as horas, você ou eu normalmente olhamos em nosso relógio,
observamos a disposição dos ponteiros e respondemos que horas são. Mas
qual é o reforçador deste comportamento? Nosso interlocutor pode sorrir, pode
agradecer, talvez só sair correndo para um compromisso para o qual está
atrasado, não há uma consequência específica e direta para este nosso
comportamento, trata-se de um reforçamento generalizado.

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Agora vejamos uma outra situação completamente diferente, em que
chegamos em um balcão e dizemos “Uma água, por favor!”, neste caso não
adianta que o atendente sorria para mim, me elogie, toque em minha mão, me
dê um joinha, o reforçador para este meu comportamento é um só, específico,
é a água, me dê a água e aí sim, meu comportamento terá alcançado sua
função, que é um reforçador específico.
Quando trabalhamos com uma intervenção comportamental, uma
intervenção ABA, podemos utilizar reforçadores específicos, que podem ser
muito interessantes, podem funcionar muito bem. Mas outra forma de trabalhar,
que é a mais utilizada, é por meio do reforço condicionado generalizado, ou
seja, utilizamos algo que aprendemos que tem o valor reforçador generalizado,
em geral trata-se de um conjunto de fichas, que em princípio não possuem
valor nenhum, mas nós ensinados aos clientes que elas poderão ser trocadas
por coisas diversas (daí o generalizado).
Um outro exemplo deste tipo de reforçamento é o dinheiro, que em si
mesmo não nos serve de nada, mas ele é um reforçador condicionado
generalizado e pode ser trocado por diversas coisas diferentes e por isso
mesmo é tão poderoso. Ocorre que a utilização de reforçadores condicionados
generalizados praticamente impede a saciação, isto porque eu posso usar o
reforçador para trocar por algo que eu queira agora e quando eu já tiver isto
que eu queria, eu posso continuar me comportando para ter acesso agora a
uma outra coisa, e outra, e outra, ou seja, sempre há motivação para coisas
novas.
Daí que seja imprescindível que aprendamos a trabalhar com a Economia
de Fichas, porque ela é extremamente útil no contexto terapêutico e escolar,
pois permite uma maior fluidez no trabalho, já que não se precisa disponibilizar
o reforçador em cada tentativa com acerto e sim ao completar as fichas de uma
prancha e também para reduzir o reforçamento e, portanto, a saciação, já que
o reforço ocorre em pequenas porções, pois são necessárias várias fichas para
ter acesso, além da possibilidade de utilizar as fichas para diferentes
reforçadores, generalizando assim a relação de reforçamento.

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