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IGREJA, LUGAR DE CELEBRAR A CRUZ

Leitura Bíblica: Efésios 2.11-22

Introdução

Quando observamos o mundo ao nosso redor, é evidente que


vivemos em uma sociedade marcada por divisões, conflitos e
preconceitos. Em 2018, uma pesquisa realizada em 27 nações revelou
que 76% dos entrevistados acreditam que seus países estão divididos.
Aqui, em nosso país, não é diferente, onde 84% dos brasileiros
afirmaram perceber a existência de um racha na nação. Diferenças
políticas e econômicas são apontadas como as principais causas dessa
polarização.

No entanto, como Igreja de Cristo, somos chamados a ser um


exemplo de união e reconciliação em meio a essa realidade
conturbada. Devemos superar as divergências políticas e sociais,
buscando a harmonia e a paz que emanam da comunhão com Cristo.
Como crentes, somos desafiados a ser agentes de amor, compreensão
e respeito, demonstrando ao mundo a verdadeira unidade que Cristo
nos proporciona.

O apóstolo Paulo, em sua carta aos Efésios, ressaltou a importância


dessa unidade em Cristo. Hoje vamos explorar o poder
transformador do texto de Efésios 2:11-22 e descobrir as verdades que
nos são reveladas por meio dessa passagem.

EXPOSIÇÃO
1. A Separação Antes da Reconciliação (v. 11, 12): Paulo começa
dizendo qual era o estado daquelas pessoas antes de terem conhecido
a Cristo. Uma distinção importante precisa ser considerada, que é a
distinção entre judeus e gentios: os judeus eram o povo escolhido por
Deus, descendentes de Abraão, Isaque e Jacó, e haviam recebido as
promessas e alianças divinas. Eles foram circuncidados de acordo
com a lei de Moisés e deveriam seguir os mandamentos e rituais
estabelecidos na Torá. Os judeus tinham um relacionamento especial
com Deus e eram considerados o povo da aliança.

Por outro lado, os gentios eram todos os outros povos, não


pertencentes à linhagem judaica. Eles não compartilhavam das
mesmas promessas, alianças e práticas religiosas dos judeus. Antes
de conhecerem a graça de Deus, os gentios estavam separados da
comunidade de Israel e alheios aos privilégios e alianças prometidas
aos judeus. Eles viviam sem esperança e sem conhecimento
verdadeiro de Deus. A condição dos gentios era de alienação
espiritual e falta de privilégios. É por isso que a Palavra os descreve
nestes termos: estavam sem Cristo, separados da comunidade de
Israel, estranhos às promessas da aliança, não tendo esperança e sem
Deus no mundo. Parece que existe uma progressão nesta reflexão,
sendo que este último ponto é o mais importante dentre todos: vivam
sem Deus no mundo, mesmo tendo expressões religiosas.

2. A Reconciliação em Cristo (v. 13-18): Paulo agora fala sobre a


reconciliação que ocorre em Cristo Jesus. Este movimento de antes
(“outrora”) e “agora” é muito usado pelo Apóstolo. Ele descreve dois
tipos de inimizade que são superados por meio da obra redentora de
Jesus na cruz. Primeiro, há a inimizade entre judeus e gentios, que é
superada pela união em um só corpo, a igreja. Antes, os judeus
consideravam os gentios como impuros e havia uma separação entre
eles. Havia separação em termos litúrgicos, dietéticos e culturais. No
entanto, em Cristo, essa separação é derrubada e ambos se tornam
um novo homem. A palavra "reconciliação" usada por Paulo traz o
sentido de unir duas partes em conflito, trocando inimizade por
amizade. Com o propósito de abater o orgulho dos judeus, Paulo diz
todos aqueles gentios que estavam unidos a Cristo tinham verdadeira
comunhão entre eles. Agora já não mais existe alguma barreira
nacional que separe judeus e gentios. Cristo é a paz, a nossa paz, que
fez de ambos os povos um só povo, o povo de Deus. Uma união
concretizada pela cruz.

Além disso, ele fala da inimizade entre pecadores e Deus, que é


destruída pela cruz de Cristo. A cruz é o lugar onde nossos pecados
são punidos e onde a justiça de Deus é satisfeita. Pela cruz, somos
reconciliados com Deus e temos acesso ao Pai por meio do Espírito
Santo. A iniciativa da reconciliação é de Deus, que supera separação
causada pelo pecado.

Somente em Cristo há acesso direto ao Pai, como um caminho de


aproximação. Cristo é a Porta, o Caminho para o Pai, e por meio Dele
os pecadores reconciliados podem se aproximar com confiança do
trono da graça. A cruz de Cristo não apenas traz unidade entre judeus
e gentios, mas também permite que cada pessoa se aproxime de Deus
e desfrute de Sua graça.
3. A Comunidade Edificada em Cristo (v. 19-22): No final da
passagem, Paulo compara a nova comunidade dos crentes ao templo.
Ele enfatiza que os crentes não são apenas uma nova nação, mas uma
nova humanidade que se estende por todo o mundo. Assim como o
templo em Jerusalém era o ponto focal da identidade de Israel, agora
a nova comunidade dos crentes é o lugar onde Deus habita. Os
crentes são descritos como concidadãos dos santos e membros da
família de Deus. Eles foram edificados sobre o fundamento dos
apóstolos e profetas, sendo Cristo Jesus a pedra angular. O templo
espiritual, que é a nova comunidade dos crentes, está em constante
crescimento e se torna um santuário dedicado ao Senhor.

Essa imagem do templo, que é implícita aqui, destaca a


importância de cada membro no corpo de Cristo e a unidade que deve
caracterizar a comunidade dos crentes. Assim como as pedras (ou
tijolos) individuais se unem para formar o templo, os crentes se unem
para formar a nova humanidade em Cristo. A base da vida cristã é
Cristo, o único alicerce seguro sobre o qual devemos construir nossa
existência. Construir a vida sobre qualquer coisa além de Cristo é
como construir sobre areia, o que é passageiro e inseguro. Somente
em Cristo encontramos segurança e firmeza. Assim, Paulo encerra
sua argumentação destacando a importância de viver alicerçado em
Cristo, em santidade e comunhão com Deus, para que a igreja possa
crescer e cumprir seu propósito como o templo santo do Senhor.

ENSINO/DOUTRINA
Há aqui ensinamentos importantes, meus irmãos, para as nossas
vidas; ensinamentos que estão em harmonia com tudo aquilo que a
Palavra de Deus nos orienta.

1. A Necessidade da Reconciliação: Através das páginas da


Bíblia, somos confrontados com a realidade da nossa necessidade de
reconciliação. Desde o início, o pecado entrou no mundo e separou a
humanidade de Deus. Essa separação nos afasta da Sua presença e da
plenitude da vida que Ele deseja nos dar. No entanto, a Bíblia nos
ensina que Deus, em Sua graça e misericórdia, buscou reconciliar a
humanidade consigo mesmo. Desde o Antigo Testamento até o Novo
Testamento, vemos o plano de Deus se desdobrando para trazer a
reconciliação através do sacrifício de Jesus Cristo. Antes de nossa
conversão, nenhum de nós era afeito a Deus; éramos inimigos de
Deus, filhos da ira, afastados de todo bem e todo impulso espiritual
que nos levasse a Deus.

Mas Jesus Cristo, o Filho de Deus, veio ao mundo como um


sacrifício perfeito e sem mancha para pagar o preço pelos nossos
pecados. Ele tomou sobre Si mesmo o castigo que todos nós
merecíamos, oferecendo-nos meio de sermos reconciliados com Deus.
Através de Sua morte na cruz e Sua ressurreição, Jesus abriu o
caminho para que todos aqueles que creem nele possam
experimentar a reconciliação com Deus. Ao reconhecermos nosso
pecado, arrepender-nos e confiar em Jesus como nosso Salvador e
Senhor, podemos receber o perdão dos nossos pecados e ser
restaurados em um relacionamento íntimo com Deus.
2. Cristo torna o Pai Acessível: Em toda a Bíblia, encontramos
evidências do acesso que Cristo nos dá ao Pai. Desde os primeiros
momentos da queda no Jardim do Éden, Deus estabeleceu um
caminho para que a humanidade pudesse se aproximar Dele. Vemos
essa realidade refletida nas leis e cerimônias do Antigo Testamento,
que apontavam para a necessidade de um mediador. E então, na
plenitude do tempo, Jesus Cristo veio ao mundo como o único e
verdadeiro mediador entre Deus e os homens. Sua morte sacrificial
na cruz e Sua ressurreição abriram o caminho para que todos aqueles
que creem Nele possam se aproximar do Pai e desfrutar de um
relacionamento pessoal com Ele.

Jesus disse: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vem


ao Pai, a não ser por mim" (João 14:6). Ele é a ponte que nos reconcilia
com Deus, eliminando a separação causada pelo pecado. Através de
Sua obra redentora, somos convidados a nos achegar a Deus com
ousadia e confiança, sabendo que fomos perdoados e aceitos por meio
de Cristo.

Esse acesso ao Pai não é reservado apenas a alguns privilegiados,


mas está disponível para todos. O próprio Jesus, manso e humilde de
coração como é, convida a nos arrependermos e confiarmos nEle
como Salvador, para sermos recebidos na família de Deus. Ele mesmo
disse: “Eu sou a porta. Se alguém entrar por mim, será salvo” (Jo 10.9).

3. A Igreja Como Comunidade da Reconciliação: A Bíblia


também nos apresenta a igreja como uma comunidade de
reconciliação. Desde os tempos do Antigo Testamento, Deus escolheu
um povo para ser Seu instrumento de bênção e testemunho ao
mundo. No entanto, a visão de Deus sempre foi maior do que um
grupo étnico ou nação específica. Em Cristo, todas as barreiras e
divisões são superadas. A igreja é chamada a ser uma comunidade de
amor, perdão e reconciliação, onde as diferenças culturais, étnicas e
sociais são deixadas de lado em favor da unidade em Cristo.

Ao longo da Escritura, vemos a ênfase contínua na reconciliação


como parte central do plano redentor de Deus. Desde a promessa feita
a Abraão, passando pela obra de redenção de Israel do Egito, até a
encarnação, morte e ressurreição de Jesus, a reconciliação é um tema
que perpassa toda a história da redenção. E, como membros do corpo
de Cristo, somos chamados a viver essa realidade em nossas próprias
vidas e a compartilhá-la com o mundo ao nosso redor. A igreja é
chamada a ser um lugar onde as diferenças são superadas e onde a
reconciliação é praticada. Paulo escreve em Efésios 2:14: "Porque ele
é a nossa paz, o qual de ambos os povos fez um; e, derrubando a
parede de separação que estava no meio, a inimizade." Através do
sacrifício de Cristo, as divisões são superadas, e a igreja é chamada a
viver em unidade e amor.

Essa reconciliação vai além de apenas unir diferentes grupos


étnicos ou culturais. Ela também abrange a reconciliação com Deus e
uns com os outros. Paulo escreve em 2 Coríntios 5:18-19: "E tudo isto
provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por Jesus
Cristo, e nos deu o ministério da reconciliação; pois que Deus estava
em Cristo reconciliando consigo o mundo, não imputando aos
homens as suas transgressões, e nos confiou a palavra da
reconciliação".

Queridos irmãos e irmãs, ao contemplarmos esses temas


presentes em toda a Escritura, somos confrontados com a nossa
necessidade de reconciliação, com a realidade de que Cristo nos torna
acessíveis ao Pai e com o chamado para vivermos como uma
comunidade de reconciliação. Que possamos meditar nessas
verdades e permitir que elas transformem a maneira como vivemos e
nos relacionamos uns com os outros.

APLICAÇÃO

Como que isso tudo se desdobra em nossa realidade? Há pelo menos


três aplicações práticas para nossas vidas.

1. Corra para Cristo, encontre nEle a bênção da reconciliação:


Apliquemos esse ensinamento prático em nossas vidas diárias.
Reconheçamos nossa necessidade de reconciliação com Deus e
corramos para Jesus Cristo, o único mediador entre Deus e os
homens. Busquemos Sua graça e perdão, rendendo nossas vidas a Ele.
Encontremos em Cristo a paz e a restauração que só Ele pode oferecer.
Deixemos que Sua obra de reconciliação transforme nossos corações
e nos conduza a uma vida de comunhão íntima com o Pai. Deixe de
confiar nos seus méritos para ser aceito por Deus, deixe de pensar que
a salvação, a vida eterna, é uma questão de performance: “se eu for
bem suficiente, Deus me aceitará". Isso é um equívoco. A salvação e a
reconciliação com Deus não são alcançadas por nossos próprios
méritos ou obras, mas pela graça de Deus através da fé em Jesus
Cristo. Em Efésios 2:8-9, está escrito: "Porque pela graça sois salvos, por
meio da fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus. Não vem das obras, para
que ninguém se glorie". Nossa salvação é um presente gratuito de Deus,
e não algo que podemos conquistar por nós mesmos. Portanto, em
termos práticos, você deve abandonar a mentalidade de desempenho
e confiar inteiramente na obra de Cristo em nosso favor.
2. Refugie-se em Jesus, pois nEle há acesso ao Pai: Coloquemos
em prática o ensinamento de buscar refúgio em Jesus. Em meio às
tribulações, desafios e tentações da vida, lembremo-nos de que em
Jesus encontramos acesso ao Pai. Em momentos de angústia,
recorramos a Ele em oração, confiando em Sua fidelidade e poder.
Aproveitemos a liberdade que temos em Cristo para nos achegarmos
a Deus, sabendo que Ele nos ouve e cuida de nós. Encontremos em
Jesus nosso refúgio seguro, nossa fonte de força e consolo em todos
os momentos.

Confie suas preocupações e ansiedades a Jesus, sabendo que Ele


cuida de você. Apegue-se à promessa de que Ele é o seu refúgio
seguro e permita que Sua paz e presença acalmem seu coração.
Convide o Espírito Santo a guiar você em sua jornada com Jesus.
Esteja aberto a Sua direção, correção e fortalecimento, permitindo que
Ele o ajude a enfrentar os desafios e tentações da vida.

Charles Spurgeon, um renomado pregador e pastor inglês,


compartilhou em um de seus escritos uma história impactante sobre
uma velhinha que vivia em uma instituição para idosos pobres.
Durante uma visita, Spurgeon descobriu que ela possuía um antigo
documento bancário que lhe fora dado como lembrança por alguém
muito rico. Curioso, ele decidiu levar o documento a um banco para
verificar seu valor. Para sua surpresa, descobriu que aquele
documento continha uma quantia considerável, suficiente para
proporcionar uma vida confortável àquela senhora pelo resto de seus
dias. A partir dessa experiência, Spurgeon refletiu sobre a realidade
espiritual de muitos crentes. Ele concluiu que muitos deles vivem em
um estado de grande pobreza espiritual simplesmente por
desconhecerem as infinitas riquezas espirituais disponíveis em
Cristo. Vejamos se não é esta a realidade que experimentamos!

3. Viva como reconciliado, na comunidade dos reconciliados:


Vivamos como pessoas reconciliadas com Deus e com os outros.
Como membros da comunidade de fé, sejamos agentes de
reconciliação em nosso meio. Demonstremos amor, perdão e
compaixão em nossos relacionamentos. Busquemos a unidade e a
paz, superando as diferenças e divisões que podem surgir. Sejamos
um exemplo vivo da mensagem do evangelho, vivendo em harmonia
e colaboração. Participemos ativamente da vida da igreja,
contribuindo para a edificação mútua e para o testemunho de uma
comunidade de reconciliados em Cristo.

Cultivemos um coração de amor e perdão, seguindo o exemplo de


Cristo. Estejamos dispostos a perdoar aqueles que nos ofendem e a
amar incondicionalmente, independentemente das diferenças ou
erros passados. Busquemos o diálogo construtivo em nossos
relacionamentos, especialmente quando surgirem conflitos.
Procuremos entender o ponto de vista do outro, demonstremos
empatia e estejamos abertos a encontrar soluções que promovam a
reconciliação e a paz. Engajemo-nos ativamente na vida da igreja,
contribuindo com nossos dons, talentos e recursos para a edificação
mútua. Estejamos envolvidos em grupos de estudo bíblico,
ministérios e projetos que promovam a reconciliação e o crescimento
espiritual.

Conclusão

Em 1971, John Winston Ono Lennon, cantor e compositor


britânico de Liverpool, compôs sua obra mais famosa, cuja letra diz:

Imagine não haver o paraíso

É fácil se você tentar

Nenhum Inferno abaixo de nós

Acima de nós, só o céu

Imagine todas as pessoas

Vivendo o presente

Imagine que não houvesse nenhum país

Não é difícil imaginar

Nenhum motivo para matar ou morrer

E nem religião, também

Talvez você se lembre da música com a letra que expressa essas


ideias.
A canção propõe um cenário utópico no qual não há paraíso,
inferno, países, motivos para matar ou morrer, nem religião. Embora
a intenção por trás dessas ideias seja promover a paz e a harmonia
entre as pessoas, é preciso questionar se essa abordagem é realista e
viável.

Ao afirmar que a fé divide o mundo e que a paz viria com o fim


de todas as religiões, a música adota uma visão simplista e
generalizante sobre a religião. Embora seja verdade que algumas
discordâncias e conflitos têm raízes religiosas, é equivocado afirmar
que a religião é a causa de todos os problemas e que sua eliminação
levaria automaticamente à paz.

O grande problema que causa divisões e conflitos, que permeiam


o mundo em que vivemos é o pecado. Logo, é crucial que a Igreja de
Cristo se posicione como um farol de esperança e reconciliação.
Enquanto a sociedade ao nosso redor se debate com divisões
políticas, econômicas e sociais, somos chamados a transcender essas
barreiras e viver como um testemunho vivo do poder transformador
do evangelho.

Que nos dediquemos, como Igreja de Cristo, a buscar a


reconciliação, a demonstrar amor e a viver como um exemplo vivo de
comunidade reconciliada. Que nossa luz brilhe em meio à escuridão,
revelando o poder redentor de Cristo e inspirando outros a buscarem
a unidade e a reconciliação em suas vidas.
Em nome de Jesus, o Príncipe da Paz, sigamos em frente,
comprometidos com a missão de ser uma comunidade de
reconciliação em um mundo dividido.

Soli Deo Gloria

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