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Aula IX: Doença Pulmonar

Obstrutiva I
ASMA
Prof. Gilvano Amorim Oliveira
Grandes Temas em Medicina Interna
Disciplina de Clínica Médica
Faculdade de Medicina PUCCAMP
Aula X: Doença Pulmonar
Obstrutiva II
DPOC
Prof. Gilvano Amorim Oliveira
Grandes Temas em Medicina Interna
Disciplina de Clínica Médica
Faculdade de Medicina PUCCAMP
... De volta às origens
• A palavra "asma" vem do grego ἅσμα (hásma), que significa
"ofegante", "ofegar", "respirar com dificuldade”.
• A palavra "sibilo" vem do latim “sibilus”, que significa "assobio".
Acredita-se que o termo seja onomatopeico, ou seja, que imita o som
que representa o ruído agudo e estridente da passagem com
dificuldade do ar pelo pertuito bronquilar estreitado.
Bases anátomo-fisiológicas iniciais
• A musculatura brônquica é composta por uma camada de músculo
liso;
• Esta camada circunda as vias aéreas, desde a traqueia até as
pequenas vias aéreas (bronquíolos);
• A camada muscular é dividida em três partes: a muscular interna, a
muscular média e a muscular externa.
Bases anátomo-fisiológicas iniciais
• A camada muscular interna é composta por músculo liso circular, que
se contrai para reduzir o diâmetro da via aérea;
• A contração desta camada causa broncoconstrição;
• A camada muscular externa é composta por músculo liso longitudinal,
que se contrai para encurtar a via aérea e reduzir o diâmetro.
Bases anátomo-fisiológicas iniciais
• A camada muscular média da musculatura brônquica é composta por
músculo liso oblíquo, que se contrai de forma helicoidal.
• Na contração dessa camada, as fibras musculares se encurtam e,
como estão dispostas em espiral, haverá efeito nas vias aéreas de
dilatação, semelhantemente ao de um zíper sendo aberto.
Bases anátomo-fisiológicas iniciais
• Essa dilatação aumenta o diâmetro transversal da via aérea,
permitindo a passagem de maior fluxo de ar;
• A dilatação da camada muscular média é mediada por
neurotransmissores como a adrenalina, que se liga a receptores beta-
2 adrenérgicos presentes no músculo liso das vias aéreas e
desencadeia a dilatação das mesmas.
Bases anátomo-fisiológicas iniciais
• Esse mecanismo de broncodilatação é importante na resposta ao
estresse, exercício físico e em situações de emergência respiratória,
quando o organismo precisa aumentar o fluxo de ar para os pulmões
para garantir uma adequada oxigenação
Bases anátomo-fisiológicas iniciais
• A musculatura brônquica é inervada pelo sistema nervoso autônomo,
que regula a contração e o relaxamento dos músculos lisos para
controlar o diâmetro das vias aéreas.
• A estimulação do sistema nervoso parassimpático causa
broncoconstrição, enquanto a estimulação do sistema nervoso
simpático causa broncodilatação.
• Outras substâncias, como histamina e mediadores inflamatórios,
também podem afetar a musculatura brônquica e causar
broncoconstrição.
Conceito

Doença inflamatória pulmonar crônica caracterizada por infiltração de


células, hiper-responsividade das vias aéreas inferiores e limitação
variável ao fluxo aéreo, reversível espontaneamente ou com
tratamento.
Conceito

Doença crônica das vias respiratórias caracterizada por inflamação,


hiperresponsividade das vias aéreas e episódios recorrentes de
sibilância, dispneia, sensação de aperto no peito e tosse. É uma doença
comum, que afeta cerca de 300 milhões de pessoas em todo o mundo,
com uma tendência crescente de prevalência nos últimos anos (Global
Initiative for Asthma, 2021).
Generalidades

• Asma se manifesta por crises recorrentes.


• Os episódios recorrentes se caracterizam por sibilância, dispneia,
aperto no peito e tosse.
• Os episódios são mais prevalentes à noite e pela manhã, ao acordar.
• A infiltração inflamatória envolve linfócitos, mastócitos e eosinófilos.
Epidemiologia

• A asma é uma das condições crônicas mais comuns.


• Afeta tanto crianças quanto adultos.
• De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a asma afeta
cerca de 339 milhões de pessoas em todo o mundo e é responsável
por aproximadamente 1000 mortes diárias.
Epidemiologia

• No Brasil, a asma é uma das doenças crônicas mais comuns;


• Afeta cerca de 10% da população, de acordo com dados do Ministério
da Saúde;
• É responsável por aproximadamente 4000 mortes por ano no país.
Etiologia
• Doença heterogênea com vários fatores de risco;
• Fatores genéticos (predisposição genética);
• Os fatores genéticos envolvem interação de vários genes (Meng &
Rosenwasser, 2010).
• Fatores ambientais como o contato com os alérgenos (ácaros, pólen e
fármacos);
• Infecções virais;
• Poluentes atmosféricos;
• Fatores constitucionais (como atopia).

(Bloemen et al., 2007)


Tripé Fisiopatológico da Asma
• Inflamação das vias respiratórias;
• Estreitamento dos brônquios;
• Aumento da produção de muco.
Inflamação
• Causada por uma resposta exagerada do sistema imunológico a
substâncias inaladas;
• Principais inalantes: ácaros, fezes de ácaros, poeira, pólen, fumaça de
cigarro, entre outras.
• Essa resposta imunológica desencadeia a liberação de substâncias
inflamatórias, como histamina, leucotrienos e prostaglandinas;
• A inflamação reduz o lúmem brônquico e aumenta a produção de
muco pelas células da parede brônquica.
Estreitamento bronquilar
• Resultado de tampão brônquico por muco.
• Estreitamento por edema.
• Resultado por contração dos músculos da parede brônquica.
• A broncoconstrição é causada por diversos fatores, incluindo a
estimulação dos receptores nervosos, a ação de substâncias como a
histamina e o aumento da resposta inflamatória.
Produção de muco
• Na asma, a hiperprodução de muco é um dos mecanismos
responsáveis pela obstrução das vias aéreas.
• A produção excessiva de muco é desencadeada pela inflamação
crônica das vias aéreas, que leva ao acúmulo de células inflamatórias,
como eosinófilos, linfócitos e mastócitos, no revestimento das vias
aéreas.
• Essas células inflamatórias liberam mediadores como a interleucina-
13 (IL-13), que estimula as células caliciformes do epitélio a
produzirem muco.
Produção de muco
• A inflamação também leva a uma alteração na composição do muco,
tornando-o mais espesso e viscoso.
• O muco em excesso se acumula nas vias aéreas, formando um
tampão que dificulta a passagem do ar e aumenta a resistência ao
fluxo aéreo.
• Este tampão causa tosse, sibilância, e dispneia.
Fisiopatologia da Asma
• A inflamação de vias aéreas é a marca registrada da asma.
• As alterações anatomopatológicas mais importantes são:
• infiltração das vias aéreas por células inflamatórias mononucleares
(principalmente linfócitos T CD4 do tipo Th2), eosinófilos, macrófagos
e neutrófilos.
Fisiopatologia da Asma
• A produção de citocinas contribui para a manutenção da flogose e
remodelação brônquica.
• Os principais produtores de citocinas são linfócitos T CD4 Th2,
eosinófilos, células epiteliais, células musculares lisas e fibroblastos.
• A produção de imunoglobulina E (IgE) também tem papel na
inflamação.
Cronologia da Fisiopatologia da Asma

• Produção de mediadores pró-inflamatórios pelos linfócitos T CD4 do


tipo Th2.
• Produção de interleucinas.
• Recrutamento de eosinófilos como resultado da ação de mediadores
pró-inflamatórios e de interleucinas.
• Os eosinófilos são responsáveis pela secreção de inúmeros fatores.
Fisiopatologia da Asma
Os eosinófilos são responsáveis pela secreção de fatores como:
• proteína catiônica eosinofílica (ECP);
• peroxidase eosinofílica;
• (TGF)a;
• (TGF)b;
• GM-CSF;
• IL-4, IL-5, IL-13;
• quemoquinas;
• eotaxina;
• fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF).
Fisiopatologia da Asma – efeitos da flogose
• Hiper-responsividade das vias aéreas;
• Hipertrofia da musculatura lisa brônquica;
• Transformação de fibroblastos em miofibroblastos;
• Produção de colágeno por miofibroblastos;
Fisiopatologia da Asma – efeitos da flogose
• Deposição de colágeno subepitelial dos tipos I, III e V, além de
fibronectina e tenascina;
• Hiperplasia e metaplasia das células caliciformes produtoras de muco
(que leva a mais obstrução em vias aéreas);
• Proliferação de vasos e nervos;
• Aumento da permeabilidade vascular com formação de edema.
Resposta imune na asma
• Contato entre as células apresentadoras de antígeno e o alergéno.
• Diferenciação de células T helper em Th1 e Th2.
• Secreção de IL-4 pelas células Th2, promovendo produção de IgE
pelos linfócitos B.
• IgE liga-se a receptores de alta afinidade de mastócitos e basófilos.
Resposta imune na asma
• A IgE leva a uma resposta imediata.
• Mediadores liberados por mastócitos induz recrutamento e ativação
de células do sistema imunitário, como eosinófilos, macrófagos
alveolares e as células estruturais.
• As células estruturais promovem resposta tardia como resposta
inflamatória, hiper-reatividade, broncoconstrição e remodelação.
Papel dos eosinófilos
• Infiltram a mucosa brônquica e fixam IgE na membrana.
• Da membrana de eosinófilos se libera mediadores a partir do contato
com alérgenos.
• O recrutamento de eosinófilos dependente das citocinas como IL-5,
IL-13, GM-CSF (factor estimulador de colônias e macrófagos) e
quimiocina eotaxina (CCL11),;
• Tais substancias atuam aumentando o recrutamento e a expressão de
eosinófilos.
Benson et al., 2011.
Papel dos neutrófilos
• Os neutrófilos produzem citocinas (como INF-γ, fator de necrose
tumoral (TNFα), IL-1 e IL-6), enzima mieloperoxidase e óxido nítrico.
• Tais produtos provocam espasmo no músculo liso das vias aéreas e a
hipersecreção do muco.
Bloemen et al., 2007.
Potencialização da resposta inflamatória
• O epitélio das vias respiratórias participa da patogênese da asma.
• Aumento na permeabilidade do epitélio asmático permite acesso de
alérgenos inalados para as células basais e tecidos subjacentes das
vias aéreas.
• Este ingresso de alérgenos promove liberação de citocinas pró-
inflamatórias.
• Tais citocinas aumentam ainda mais a hiper-reatividade das vias
respiratórias.
(Holgate, Stephen T., 2008).
A questão da remodelação
• Inflamação persistente das vias respiratórias e a perda progressiva da
função pulmonar levam a remodelação do tecido pulmonar respiratório.
• A remodelação das vias respiratórias resulta da ativação de células
estruturais (como células epiteliais, células do músculo liso e células
endoteliais).
• Esta ativação altera estruturalmente a parede brônquica.
• O estreitamento luminal brônquico promove obstrução do fluxo de ar,
agravando a hipóxia.
• Estas alterações estruturais resultam em hipertrofia e hiperplasia do
músculo liso das vias aéreas, a deposição de colágeno e angiogênese.
(Busse & Lemanske, 2003).
A questão da remodelação
A angiogênese associada à hipoxia é regulada por:

• Fator de crescimento vascular endotelial (VEGF);


• TGF β (fator de crescimento transformante beta);
• Síntese de óxido nítrico induzível (NOS II).
Busse & Lemanske, 2003.
Fisiopatologia da Asma – efeito final da
flogose

Remodelamento brônquico, com aumento da espessura da parede


das vias aéreas de 10 a 300% do nível considerado normal.
Perda funcional e Asma

• O processo inflamatório leva a progressiva deterioração da função


pulmonar.
• O declínio de VEF1 (volume expiratório forçado no primeiro segundo)
por ano é maior em asmáticos que em não asmáticos.
• Esse declínio é ainda maior em asmáticos fumantes.
• O declínio de VEF1 em asmáticos não fumantes pode variar entre 5 e
25 mL por ano.
Perda funcional e asma.

Salbutamol é um agonista seletivo dos adrenoreceptores ß2.


Em doses terapêuticas, atua nos adrenoreceptores ß2 da musculatura
brônquica causando broncodilatação.
• Obstrução reversível de vias aéreas: aumento acima de 10% do VEF1
após inalação de salbutamol;
• Obstrução irreversível de vias aéreas: aumento inferior a 9% do VEF1
após inalação de salbutamol;
• Obstrução irreversível de vias aéreas é fator prognóstico na asma,
assim como longo período de tratamento com corticosteróides.
Diagnóstico de Asma

Deve ser baseado em critérios clínicos e funcionais.


Diagnóstico de Asma – Critérios clínicos
✓Dispneia;
✓Tosse crônica;
✓Sibilância;
✓Sensação de aperto no peito e/ou desconforto torácico;
✓Ocorrência de sintomas particularmente à noite ou nas primeiras
horas da manhã;
✓Apresentação de forma episódica;
✓Melhora espontânea ou após o uso de broncodilatadores.
Diagnóstico – critérios funcionais

➢Baseia-se na presença de obstrução das vias aéreas.


➢Funcionalmente, a obstrução se caracterizada por:
✓redução do VEF1 (inferior a 80% do previsto);
✓relação VEF1 /CVF
Diagnóstico – critérios funcionais
• Redução do VEF1 inferior a 80% do previsto;
• Relação VEF1 /CVF inferior a 75% em adultos e 86% em crianças;
• Aumento de 7% do VEF1 em relação ao valor previsto com uso de
beta-2 de curta duração (broncodilatadores b2-agonistas
de curta ação).
Diagnóstico – critérios funcionais
• Aumento de 200 ml no VEF1 com uso de beta-2 de curta duração.
• Aumento espontâneo do VEF1 de 20% ou mais de 250ml;
• Aumento do VEF1 de 20% ou mais de 250ml após duas semanas de
corticoides;
Diagnóstico – critérios funcionais

• Variação diurna maior que 20% do pico do fluxo expiratório (PFE)


entre a maior e a menor de três medidas efetuadas pela manhã e à
noite em um período de 2 a 3 semanas.
• Aumento de 20% em adultos e 30% em crianças do PFE 15 minutos
após o uso do beta-2 de curta duração;
Diagnóstico – critérios funcionais

• Hiper-responsividade das vias aéreas pelo teste de broncoprovocação


com agentes broncoconstritores (metacolina, histamina, carbacol) ou
com exercício em indivíduos sintomáticos com espirometria normal;
Biomarcadores ASMA
• – Eosinofilia sanguínea > 300/mm3 e associada com exacerbações
graves ou > 400/mm3;
• – Eosinofilia no escarro > 2%;
• – Periostina sérica (estimulada por IL-13) > 50 ng/mL;
• – FeNO > 30 partes por bilhão – ppb (fração exalada de óxido nitroso);
• – Dipeptidil peptidase IV (DPP4) (estimulada por IL13) - níveis de cut-
off ainda não estabelecidos.
Zissler UM, Esser-von Bieren J, Jakwerth CA, Chaker AM, Schmidt- Weber CB. Current and future biomarkers in allergic
asthma. Allergy. 2015;71:475-94.
Diagnóstico diferencial
• fístula traqueoesofágica;
• incoordenação da deglutição;
• bronquiolites;
• massas mediastinais;
• discinesia da laringe;
• obstrução alta das vias aéreas;
• Aspiração de corpo estranho (atenção para sibilância hemitorácicas).
Diagnóstico diferencial
• doença respiratória crônica da prematuridade;
• síndrome de hiperventilação;
• fibrose cística;
• doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC);
• insuficiência cardíaca congestiva (ICC);
• obstrução mecânica das vias aéreas por processo maligno ou benigno;
• embolia pulmonar;
• vasculites: Churg-Strauss, poliarterite nodosa (PAN) e granulomatose de
Wegener;
Diagnóstico diferencial
• disfunção de cordas vocais;
• síndrome carcinoide;
• apneia obstrutiva do sono;
• aspergilose broncopulmonar alérgica;
• infecções virais e bacterianas;
• bronquiectasias;
• alveolite alérgica extrínseca ou pneumonite por hipersensibilidade.
Metas da terapêutica
• Redução do processo inflamatório pulmonar;
• Ausência de sintomas (cuidado! Ausência de sintomas não quer dizer
necessariamente doença controlada. (Isto vale inclusive na crise!).
• Normalização da espirometria;
• Capacidade de exercício normal;
• Redução do risco futuro de exacerbação e perda de função pulmonar;
• Minimização de efeitos adversos do uso crônico de medicamentos
para manutenção da asma.
Parâmetros de resposta terapêutica
• Redução da sintomatologia;
• Redução da limitação para atividades físicas;
• Melhora da qualidade de vida;
• Intensidade do uso de medicação de resgate;
• Parâmetros de função pulmonar;
• Alteração de biomarcadores.
Parâmetros de resposta terapêutica

• A avaliação periódica do controle da asma é um importante marcador


dinâmico do nível da doença;
• A avaliação periódica revela a necessidade de ajuste no plano de
tratamento do paciente;
• A avaliação periódica permite graduação da gravidade da doença;
Fatores agravantes

• Adesão ao tratamento.
• Exposição a inalantes ambientais.
• Tabagismo passivo e ativo.
• Exposição ocupacional.
• Uso de determinados medicamentos.
Aula IX: Doença Pulmonar
Obstrutiva I
ASMA
OBRIGADO!
Terapêutica - generalidades

• Corticosteroides, preferencialmente inalatórios, podem melhorar a


expressão clínica da asma e reduzir a cronicidade da inflamação das
vias aéreas.
• O controle da asma está relacionado a ausência do processo
inflamatório capaz de propiciar aparecimento de sintomas.
• Asma controlada não somente sem ausência de sintomas, mas
espirometria e capacidade de exercício normais;

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