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Estratégias de Comunicação Escrita Interna na Empresa

Andrezza Isaac TRONCO


(Iniciação Científica – Secretariado Executivo Trilíngüe)

Resumo

Este trabalho tem como intenção estudar as estratégias de comunicação escrita utilizadas dentro de
uma empresa. O objetivo principal é analisar a interação entre empresa e funcionários, a partir da
análise de dois tipos de documentos autênticos de comunicação interna: o "Ato do Presidente",
comunicação escrita utilizada pela empresa para se comunicar com seus funcionários e a "Solicitação
de Empréstimo Pessoal" comunicação escrita utilizada pelos funcionários para se comunicarem com a
direção da empresa.

Palavras-chave: carta comercial, gênero e secretária.

0. Introdução

Este trabalho é parte da pesquisa de Iniciação Científica “Estratégias de Comunicação


Empresarial Interna”, ainda em desenvolvimento, patrocinada pelo Projeto Pró-Ciência do Centro
Universitário FECAP, sob orientação da Prof. Taïs Bressane.

As mudanças rápidas decorrentes da globalização, das novas tecnologias e da implementação de


novos modelos organizacionais, trouxeram alterações significativas em todas as modalidades de
comunicação empresarial, inclusive na comunicação interna escrita.

Essa interação, na maioria das vezes, é mediada por comunicados, regulamentos, missões,
relatórios, memorandos, solicitações, contratos, e-mails, etc., ou seja, há muito vem assumindo um
papel preponderante nesse processo de mudança das empresas, já que é a partir da linguagem que as
relações sociais se estabelecem.

Este projeto tem como intenção estudar as estratégias de comunicação escrita utilizadas dentro
de uma empresa específica, a partir da análise de dois tipos de documentos autênticos de comunicação
interna: comunicações escritas pela direção da empresa, denominadas Ato do Presidente e
comunicações escritas pelos funcionários, denominadas Solicitação de Empréstimo. Ambos
caracterizam-se como solicitações – a empresa solicita serviços e comportamentos, enquanto os
funcionários solicitam empréstimos. O foco principal estará, portanto, na interação entre empresa e
funcionários, já que terá como objeto de análise a comunicação escrita utilizada tanto pela empresa
para se comunicar com seus funcionários, quanto pelos funcionários para se comunicarem com a
empresa.

Esta escolha partiu da observação das diferenças da comunicação escrita entre


empresa/funcionário e entre funcionário/empresa. Há uma desigualdade fruto da relação de poder entre
os interlocutores que se reflete na linguagem. Segundo Koch (2000) observa-se a necessidade do
conhecimento da língua no contexto social, uma vez que através dela o homem se comunica, estabelece
os mais variados tipos de relação, que o possibilita obter reações ou comportamentos, atuando das mais
diversas maneiras, ou seja, interagir socialmente por meio do seu discurso.

1. Fundamentação Teórica

A pesquisa será norteada pela abordagem da Gramática Sistêmico-Funcional, pelo fato desta
teoria possibilitar a compreensão e análise da linguagem como meio e sistema de comunicação.

Nesta abordagem são levados em consideração os aspectos léxico-gramaticais e seus


significados, sendo estes, enfatizados pela análise da forma e sua descrição. Não possui a intenção de
analisar o certo ou errado e sim o uso adequado ou inadequado de um conjunto de regras da linguagem
dentro de um determinado contexto. (Eggins, 1994)

A abordagem sistêmico-funcional é baseada, portanto, em escolhas lingüísticas feitas para gerar


não apenas um, mas uma série de significados simultaneamente. Esses significados são organizados em
sistemas representados por três grandes metafunções da linguagem, que dizem respeito ao significado
por elas gerado: ideacional, interpessoal e textual. Esses sistemas são acionados para garantir a
interação entre os participantes de um evento comunicativo, ou para nomear ações ou participantes da
mensagem ou, ainda, para tornar a mensagem estruturada e compreensível.

Ideacional: trata da maneira como organizamos nossas experiências e ações do mundo real,
através da língua;
Interpessoal: trata da interação entre as partes envolvidas, ou seja, dos papéis que
desempenham;
Textual: trata da organização interna do texto;

Das três funções, daremos maior enfoque à função interpessoal, que diz respeito à interação
entre os participantes de um evento comunicativo, no contexto empresarial, objeto desta pesquisa.

A metafunção interpessoal
A metafunção interpessoal é definida por Halliday como o sistema que estabelece os papéis de
fala. Quando usamos a linguagem verbal numa interação, estamos estabelecendo uma relação entre os
participantes, uma troca de papéis de fala. Cada interlocutor assume alternadamente os papéis básicos
de “oferecer” e “pedir” bens e serviços ou informações. Estes movimentos irão determinar o que
Halliday define como funções de fala, que são quatro: oferecimento, pedido, declaração e interrogação.
As funções de fala, por sua vez, pressupõem as seguintes respostas, respectivamente: aceitar ou recusar
a oferta, cumprir ou rejeitar o pedido, concordar ou discordar da declaração e responder ou não à
pergunta.

No eixo da informação, as proposições podem acontecer em graus diferentes de certeza ou


probabilidade, através do sistema de modalização. No eixo de bens e serviços, as propostas podem ser
expressas como inclinação ou obrigação/ordem, por meio do sistema de modulação. A esses dois eixos
chamamos de modalidade.

Os recursos de modalidade que os sistemas de modalização e modulação disponibilizam são os


Articuladores modais, os Predicados Cristalizados, os Advérbios modalizadores e os Verbos de atitude
proposicional que podem ser empregados separada ou simultaneamente. Abreu (1991) também
identifica no português o emprego de verbos no passado (em situações em que usaríamos o presente).

Segundo Kress (1991,1993), nunca encontramos os discursos isoladamente, sempre os


encontramos em textos. E estes, por sua vez, surgem a partir de um evento particular. Os significados
encontram sua verdadeira expressão nos textos, as realizações concretas dos discursos. Podemos
concluir então que os significados dos textos são em parte os significados dos discursos presentes que
dão origem a um texto específico. O texto recebe grandes e marcantes influências do meio-social de
que fazem parte. Segundo Thompson, (1996:68) para que possamos identificar as escolhas feitas e os
significados que elas carregam, faz-se necessário que olhemos para fora do texto, isto é, que
investiguemos o contexto no qual ele foi gerado.

A estrutura do meio-social, seus participantes, os objetivos, tornam as situações convencionais


em eventos mais ou menos previsíveis. A essas formas de expressão social denominamos gênero.

Estes conceitos têm fundamental importância nesta pesquisa, porque nos possibilitam
interpretar os dois tipos de documentos escolhidos para análise. Permitem identificar as intenções tanto
dos funcionários como da empresa ao redigirem, através da análise do emprego dos recursos da
modalização e das características do gênero empregados em suas comunicações.

2. Universo da Pesquisa

A empresa escolhida para o estudo é uma estatal de grande porte, do ramo de transportes,
localizada no bairro de Cerqueira César, São Paulo. A empresa tem como objetivo a administração da
contribuição previdenciária de seus funcionários. Atualmente conta com um quadro de
aproximadamente 60 colaboradores, sendo estes funcionários da Patrocinadora (empresa maior).

A comunicação diretoria / funcionário é feita através de e-mails, telefone ou pessoalmente,


variando de acordo com o assunto e a urgência em que devam ser tratados. Sendo assim podemos
perceber que esta empresa possui uma estrutura hierárquica, organizada da seguinte maneira:
Presidência, Diretorias, Chefias de Departamentos e um Departamento Jurídico, cada uma delas
contando com seu próprio quadro de pessoal.

Sujeitos da Pesquisa
A direção da empresa, representada nesta pesquisa pelo seu diretor presidente, através dos
documentos “ATO DO DIRETOR PRESIDENTE” (AP) e os funcionários representados através dos
documentos SOLICITAÇÃO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL – EXCEPCIONALIDADE.
As deliberações da empresa são feitas através do documento “ATO DO DIRETOR
PRESIDENTE” , que se caracteriza por ser um documento emitido em papel timbrado, numerado
seqüencialmente, assinado pelo Diretor Presidente da empresa. É o veículo oficial de comunicação
empresa / funcionário.

A SOLICITAÇÃO DE ·EMPRÉSTIMO PESSOAL – EXCEPCIONALIDADE pode ser


caracterizada como um tipo de comunicação funcionário / empresa em que, através de um formulário
padrão, é possível relatar de próprio punho as reais necessidades do funcionário que precisa adquirir tal
empréstimo, sendo necessário, inclusive, o anexo de documentos que comprovem tal necessidade.

Procedimentos Metodológicos
Corpus de Pesquisa I - Documento “Ato do Diretor Presidente” – Coleta de 10 modelos do
referido documento para análise manual.

Corpus de Pesquisa II – Documento “Solicitação Empréstimo Pessoal – Excepcionalidade” –


coleta de 9 modelos do referido documento para análise manual.

3. Tratamento dos Dados

O objetivo de nossa pesquisa é analisar separadamente cada um dos documentos coletados, a


fim de buscar e observar a estrutura do gênero, em cada um dos documentos, suas características, as
regularidades na sua composição e a existência de um padrão visível. Outro foco é também o emprego
da modalidade em cada gênero, buscando perceber, em cada uma das estruturas, os recursos de
modalização e modulação empregados.

Análise I – Documentos “Ato do Diretor Presidente”

Este tipo de documento caracteriza-se como um gênero específico e regular, já que mantém um
padrão pré-estabelecido de comunicação das decisões da empresa. Por suas características pode ser
considerado como um tipo de regra a ser seguida pelo leitor/funcionário.

“As regras são instruções para comportar-se de maneira tal que acarrete uma ordem que
busca o desejado”. (Kress, 1983)

Para Kress, as regras geralmente aparecem nas relações de hierarquia. Quando são dadas,
pressupõe-se a manipulação do comportamento de quem as recebe. A superioridade do interlocutor,
seja pelo conhecimento ou até mesmo pela condição social, lhe dá a autoridade necessária para emitir
ordens (Kress, 1983)

O emissor da ordem geralmente faz com que o receptor tome conhecimento da ordem proferida
e faz questão de deixar claro que detêm a autoridade, por isso a executa. Ao receptor cabe cumprir a
ordem ou rejeitá-la, o que causaria uma insubordinação.
Quanto maior for a distância entre os interlocutores, maior e com mais evidência poderemos
perceber os comandos de ordem, sendo estes, muitas vezes, abruptos por parte de quem detem o poder.
A medida em que a relação entre os interlocutores vai distanciando-se, é preciso um maior esforço
lingüístico na interação que é conseguido com o emprego da modalidade.

Por isso foi feito um levantamento dos recursos de modalização e de modulação empregados em
cada etapa de desenvolvimento do gênero, em todos os documentos analisados. Desse levantamento
constatamos que os verbos empregados sempre são usados no Imperativo e seguidos de características
que deixam claro a relação hierárquica de poder.

Análise II – Documentos “Solicitação Empréstimo Pessoal – Excepcionalidade”

A solicitação de empréstimo pessoal é redigida como um relato pessoal, muitas vezes apelativo,
em que o funcionário expõe problemas pessoais, a fim de convencer o leitor (a Diretoria) da urgência
de suas necessidades e assim concluir o processo para a aquisição do empréstimo.

Neste tipo de documento a análise foi feita separadamente, observando as peculiaridades de


cada texto, isoladamente. Buscou-se também perceber se havia um padrão para as etapas do
documento, ou seja, introdução, desenvolvimento /justificativa e conclusão. Inclusive se havia
regularidade quanto aos aspectos gráficos (tipo de fonte, formatação de parágrafos, etc) e também a
existência dos recursos de modalidade. Para estes elementos, quando presentes, foram analisados o
momento em que apareciam com maior ou menor freqüência, a intensidade e a finalidade de seu
emprego.

Comparando os resultados das Análises I e II, podemos examinar e detectar as semelhanças e


diferenças em cada uma das interações. Quando a solicitação é feita por parte da empresa (fazendo uso
da pessoa do Presidente), traz as características da “ordem”, e conseqüentemente deve ser cumprida.
Por outro lado, quando a solicitação é feita por parte do funcionário (solicitação de empréstimo), a
comunicação é redigida por meio de formulários, elaborados pela empresa, que de certa forma acabam
por constranger e diminuir o funcionário.

4. Conclusão

Cabe ressaltar que estas são conclusões preliminares, uma vez que a pesquisa não está
concluída, embora já esteja em fase de redação final.

Os documentos Ato do Presidente, utilizados na comunicação Empresa X Funcionário,


representam as decisões tomadas pela empresa, na pessoa do Diretor Presidente. Essas decisões são
apresentadas sem que os motivos ou a causa sejam expostos e cabe ao leitor/funcionário apenas segui-
las, porque foram “ordenadas”.

Já a solicitação de empréstimo é feita pelo preenchimento de formulário, em que o motivo é o


ponto central solicitado. Geralmente esse motivo é exposto pelo funcionário solicitante com uma
narrativa, ou seja, um relato pessoal de assuntos particulares, a fim de convencer o leitor (neste caso a
Diretoria da Empresa) pela emoção dos fatos, muitas vezes comprometedores, ali expressos e atingir
seu objetivo – a liberação do empréstimo.

O que fica patente no confronto dos dois tipos de documentos é a desigualdade de poder entre
os dois pólos da interação. Para a empresa a solicitação tem o valor de ordem explícita que deve ser
acatada e para o funcionário a solicitação é feita a partir da exposição pública de motivos privados,
muitas vezes humilhantes, e sua concretização depende da aprovação da empresa.

Referências Bibliográficas
ABREU, Antonio Soares. Curso de Redação. ed. São Paulo. Ática, 1991

BARBOSA, Alice e OLIVEIRA, Maria do Carmo. Ameaças à Face num Encontro de Transação
Comercial, in the ESP, São Paulo, vol. 15, p - 07 a 19, 1994

BRESSANE, Tais Bittencourt da Rocha. Construção de Identidade numa Empresa em Transformação.


Dissertação (Mestrado) - LAEL- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2000

KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. Argumentação e Linguagem. 6 ed. São Paulo: Cortez, 2000

RAMOS, Rosinda Castro Guerra. Projeção de Imagens através de Escolhas Linguísticas: Um Estudo
no Contexto Empresarial, tese de doutorado, LAEL-PUCSP, São Paulo, 1997

FOWLER, Roger, HODGE, Bob, KRESS, Gunter e TREW, Tony. (1983) Lenguaje y Control

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