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Chama-se metabolismo ao conjunto de reacções químicas que ocorrem nas células, e que lhe permitem
manter-se viva, crescer e dividir-se. Classicamente, divide-se o metabolismo em:
Existe uma grande variedade de vias metabólicas. Em humanos, as vias metabólicas mais importantes
são:
via das pentoses-fosfato - síntese de pentoses e obtenção de poder redutor para reacções anabólicas
β-oxidação dos ácidos gordos - transformação de ácidos gordos em acetil-CoA, para posterior utilização
pelo ciclo de Krebs.
gluconeogénese -síntese de glucose a partir de moléculas mais pequenas, para posterior utilização pelo
cérebro.
vias metabólicas, glicólise, glicogénio, via das pentoses fosfato, ciclo de Krebs, ciclo da ureia, ácidos
gordos
As diversas vias metabólicas relacionam-se entre si de forma complexa, de forma a permitir uma
regulação adequada. Este relacionamento envolve a regulação enzimática de cada uma das vias, o perfil
metabólico característico de cada órgão e controlo hormonal.
Regulação da glicólise
fosfofrutocinase: inibida por ATP e por citrato (que sinaliza a abundância de intermediários do ciclo de
Krebs). É também inibida por H+, o que é importante em situações de anaerobiose (a fermentação
produz ácido láctico, que faz baixar o pH). Provavelmente este mecanismo impede que nestas situações a
célula esgote toda a sua reserva de ATP na reacção da fosfofrutocinase, o que impediria a activação da
glucose pela hexocinase. É estimulada pelo substrato (frutose-6-fosfato), AMP e ADP (que sinalizam falta
de energia disponível), etc.
piruvato cinase: inibida por ATP, alanina, ácidos gordos e por acetil-Co. Activada por frutose-1,6-
bisfosfato e AMP
Regulação da gluconeogénese
citrato sintase: é inibida pelo próprio produto, citrato. Também inibida por NADH e succinil-CoA
(sinalizam a abundância de intermediários do ciclo de Krebs).
isocitrato desidrogenase e a-cetoglutarato desidrogenase: tal como a citrato sintase, são inibidas por
NADH e succinil-CoA. A isocitrato desidrogenase também é inibida por ATP, e estimulada por ADP.Todas
as desidrogenases mencionadas são estimuladas pelo ião cálcio.
O fígado possui uma hexocinase com pouca afinidade para a glucose e que não é inibida por glucose-6-P.
Portanto, a glucose só é fosforilada no fígado quando existe no sangue em concentrações muito elevadas
(i.e. depois das refeições). Assim, quando a concentração de glucose no sangue é baixa o fígado não
compete com os outros tecidos, e quando os níveis de glucose são elevados o excesso de glucose é
convertido pelo fígado em glicogénio.
A entrada dos acil-CoA na mitocôndria é um factor crucial na regulação. O malonil-CoA, que se encontra
presente no citoplasma em grande quantidade em situações de abundância de combustíveis
metabólicos, inibe a carnitina aciltransferase impedindo que os acil-CoA entrem na mitocôndria para
serem degradados. Além disso a 3-hidroxiacil-CoA desidrogenase é inibida por NADH e a tiolase é inibida
por acetil-CoA, o que diminui a degradação de ácidos gordos quando a célula tem energia em
abundância.
O fluxo metabólico na via das pentoses-fosfato é determinado pela velocidade da reacção da glucose-6-
fosfato-desidrogenase, que é controlada pela disponibilidade de NADP+.
Cérebro
Utiliza normalmente apenas glucose como fonte de energia. Armazena muito pouco glicogénio, pelo que
necessita de um fornecimento constante de glucose. Em jejuns prolongados, adapta-se à utilização de
corpos cetónicos. É sempre incapaz de utilizar ácidos gordos.
Fígado
Uma das suas principais funções é manter o nível de glucose no sangue, através da gluconeogénese e da
síntese e degradação do glicogénio. Realiza a síntese de corpos cetónicos em situações de abundância de
acetil-CoA. Responsável pela síntese da ureia.
Tecido adiposo
Sintetiza ácidos gordos e armazena-os sob a forma de triacilgliceróis. Por acção do glucagon, hidroliza
triacilgliceróis em glicerol e ácidos gordos, que liberta para a corrente sanguínea em lipoproteínas.
Músculo
Utiliza glucose, ácidos gordos, corpos cetónicos e aminoácidos como fonte de energia. Possui uma
reserva de creatina fosfatada, um composto capaz de fosforilar ADP em ATP e assim produzir energia sem
gasto de glucose. A quantidade de creatina presente no músculo é suficiente para cerca de 3-4 s de
actividade. Após este período, realiza a glicólise, primeiro em condições anaeróbicas (por ser bastante
mais rápida do que o ciclo de Krebs) e posteriormente (quando o aumento da acidez do meio diminui a
actividade da fosfofrutocinase e o ritmo da glicólise) em condições aeróbicas.
Rim
Pode realizar a gluconeogénese e libertar glucose para a corrente sanguínea. Responsável pela excreção
de electrólitos, ureia, etc. A síntese de ureia, que ocorre no fígado, usa HCO3-, o que contribui para a
descida do pH sanguíneo. Situações de acidose metabólica poderão portanto ser agravadas pela acção do
ciclo da ureia. Nestas circunstâncias, o azoto é eliminado pela acção conjunta do fígado e do rim: o
excesso de azoto é primeiro incorporado em glutamina pela glutamina sintase. A glutaminase renal cliva
então a glutamina em glutamato e NH3, que excreta imediatamente. Este processo permite a excreção
de azoto sem eliminar o anião bicarbonato.
Controlo hormonal
É efectuado principalmente por duas hormonas sintetizadas pelo pâncreas: a insulina e o glucagon. A
insulina é libertada pelo pâncreas quando a concentração de glucose no sangue é elevada, i.e., sinaliza a
abundância de glucose. A insulina estimula a entrada de glucose no músculo, a síntese de glicogénio e a
síntese de triacilglicéridos pelo tecido adiposo. Inibe a degradação do glicogénio e a gluconeogénese. O
glucagon é produzido pelo pâncreas quando os níveis de glucose no sangue baixam muito, e tem efeitos
contrários aos da insulina. No fígado, o glucagon vai estimular a degradação do glicogénio e a absorção
de aminoácidos gluconeogénicos. Vai também inibir a síntese do glicogénio e promover a libertação de
ácidos gordos (a nível do tecido adiposo).
O glicerol pode seguir para a glicólise depois de oxidado a dihidroxiacetona fosfatada na face externa da
membrana interna da mitocôndria. Os dois electrões libertados nesta oxidação são recebidos pela
ubiquinona (Q), que os transfere para a cadeia transportadora de electrões.
Metabolismo do glicerol
Os ácidos gordos terão um destino diferente: a β-oxidação, que ocorre na mitocôndria. Antes de
entrarem na mitocôndria, os ácidos gordos são activados. A reacção de activação ocorre no citoplasma, e
consiste na sua transformação em acil-CoA. Como sabemos do ciclo de Krebs, as ligações tioéster são
muito energéticas: para a fazer, um ATP é hidrolizado a AMP (equivalente à hidrólise de 2 ATP em 2 ADP).
A b-oxidação dos ácidos gordos consiste num ciclo de 3 reacções sucessivas, idênticas à parte final do
ciclo de Krebs: desidrogenação, hidratação da ligação dupla formada e oxidação do álcool a uma cetona:
Por acção da enzima tiolase, liberta-se acetil-CoA, e um acil-CoA com menos dois carbonos que o acil-
CoA original.
tiolase
A repetição do ciclo permite a degradação total de um ácido gordo de cadeia par em acetil-CoA, que
pode entrar no ciclo de Krebs, onde é completamente oxidado a CO2. É por isso impossível utilizar acetil-
CoA para produzir oxaloacetato para (a partir deste), realizar a gluconeogénese.
Os ácidos gordos insaturados seguem um percurso semelhante, embora novas enzimas sejam
necessárias para a oxidação na proximidade da ligação insaturada. No caso desta ligação se localizar num
carbono ímpar, intervém a Δ3, Δ2-enoil-CoA isomerase. Esta enzima transfere a ligação dupla do carbono
3 para o carbono 2, permitindo a continuação da β-oxidação. Neste ciclo de β-oxidação não se forma
FADH2.
No caso da ligação dupla se localizar num carbono par, é necessária a intervenção da 2,4-dienoil-CoA
reductase: a presença das ligações duplas conjugadas faz com que a reacção de hidratação tenha mais
tendência a ocorrer no carbono 4 do que no carbono correcto (2). A 2,4-dienoil-CoA reductase
transforma as ligações conjugadas Δ4, Δ2 numa única ligação dupla Δ3. Os electrões necessários para
esta conversão provêm do NADPH. O processo continua seguidamente de forma análoga à oxidação de
ácidos gordos insaturados em carbono ímpar.
Um ácido gordo de cadeia ímpar dá origem, na última ronda do ciclo a acetil-CoA e propionil-CoA. Para
que este possa ser utilizado pelo ciclo de Krebs, é necessário adicionar-lhe um átomo de carbono, o que é
feito por carboxilação. O metilmalonil assim formado é então rearranjado a succinil-CoA, numa reacção
assistida pela cobalamina (a vitamina B12).
O succinil-CoA é oxidado pelo ciclo de Krebs a malato, que depois de passar para o citoplasma pode ser
utilizado na gluconeogénese. No citoplasma pode também ser descarboxilado a piruvato pela enzima
málica, com produção simultânea de NADPH:
O piruvato pode entrar na mitocôndria, e ser completamente oxidado a CO2 pelo ciclo de Krebs.
os ácidos gordos difundem-se livremente para dentro do peroxissoma, não precisando de ser
transportados pela carnitina. Os produtos de oxidação seguem para a mitocôndria, depois de
esterificarem a carnitina.
a oxidação do acil CoA não é feita pelo FAD, mas pelo oxigénio, produzindo peróxido de hidrogénio.
A tiolase peroxissomal é praticamente inactiva com acil-CoA com menos de 8 carbonos. Por isso, a
degradação de ácidos gordos no peroxissoma é incompleta.
Uma grande quantidade do acetil-CoA produzido pela b-oxidação dos ácidos gordos nas mitocôndrias do
fígado é convertida em acetoacetato e b-hidroxibutirato (também denominados corpos cetónicos). Estes
compostos podem ser usados pelo coração e pelos músculos esqueléticos para produzir energia. O
cérebro, que normalmente depende da glucose como fonte de energia, pode também utilizar corpos
cetónicos durante um jejum prolongado (maior do que 2-3-dias). A síntese de corpos cetónicos começa
pela condensação de duas moléculas de acetil-CoA, para formar acetoacetil-CoA:
O acetoacetato assim produzido passa para a corrente sanguínea e é distribuído pelos tecidos. Uma vez
absorvido, reage na mitocôndria com o succinil-CoA, produzindo succinato e acetoacetil-CoA, que pode
ser clivado em duas moléculas de acetil-CoA.
A síntese de ácidos gordos é feita a partir de acetil-CoA. No entanto, o processo é endergónico, pelo que
o acetil-CoA deve ser previamente activado. Este é portanto carboxilado pela acetil-CoA carboxilase, uma
enzima que tal como as outras carboxilases (p.ex., do piruvato ou do propionil-CoA) possui biotina:
malonil-CoA
O malonil é então transferido para a proteína transportadora de acilos (ACP), dando a origem a malonil-
ACP. Este será então condensado com acetil-ACP (sintetizado de forma semelhante a partir de acetil-
CoA).
malonil ACP
Em animais, todos os passos da síntese do ácido palmítico (o ácido gordo saturado com 16 carbonos) são
catalizados pela sintase dos ácidos-gordos, uma enzima bastante grande que leva a cabo todas as
reacções seguintes desta via. O butiril-ACP produzido na primeira reacção vai ser transformado em butil-
ACP. A sequência de reacções é o inverso da que ocorre na b-oxidação, i.e., redução, desidratação e
hidrogenação:
Ácidos gordos insaturados ou de cadeia mais longa são produzidos a partir do ácido palmítico por acção
de elongases e desaturases.
Note que a síntese de ácidos gordos ocorre no citoplasma, ao passo a a síntese de acetil-CoA ocorre na
mitocôndria. É por isso necessário transportar acetil-CoA para o citoplasma. Isto é feito pelo sistema de
transporte dos ácidos tricarboxílicos, também chamado ciclo do citrato: o citrato formado na mitocôndria
por condensação do acetil-CoA com oxaloacetato difunde-se para o citoplasma, onde é clivado pela
citrato-liase em acetil-CoA e oxaloacetato, que é depois reduzido a malato, que se pode difundir de volta
para a mitocôndria. Por acção da enzima málica, o malato também pode ser usado para produzir parte
do NADPH necessário para a síntese dos ácidos gordos. O restante NADPH deve ser produzido pela via
das pentoses-fosfato.
A desaminação da maior parte dos aminoácidos envolve uma transaminação prévia, que consiste na
transferência do seu grupo amino para um a-cetoácido, produzindo o aminoácido correspondente ao a-
cetoácido e o a-cetoácido correspondente ao aminoácido original. Geralmente o aceitador do grupo
amina é o a-cetoglutarato, que é convertido em glutamato:
As causas da toxicidade do amónio não estão bem elucidadas, mas sabe-se que quando a concentração
de amónio é muito alta, este reage com o glutamato para formar glutamina, numa reacção catalizada
pela glutamina sintase.
Para repôr os níveis de glutamato, outros aminoácidos reagem com o a-cetoglutarato por transaminação.
O resultado é o progressivo esgotamento das reservas de a-cetoglutarato e glutamato, com
consequências particularmente lesivas a nível cerebral.
A ureia é sintetizada no fígado, que depois a secreta para a corrente sanguínea, de onde será excretada
pelo rim. A reacção global do ciclo da ureia é:
O primeiro passo é a formação de carbamoil-fosfato, uma forma activada de azoto:
O grupo carbamoil é então transferido para a ornitina para produzir citrulina. Esta duas moléculas são
aminoácidos "especiais", i.e., não fazem parte da estrutura de proteínas.
Estas duas primeiras reacções ocorrem na mitocôndria. A citrulina é então transferida para o citoplasma,
onde ocorre o resto do ciclo.
O fumarato pode entrar no ciclo de Krebs para produzir NADH e oxaloacetato, que por sua vez pode ser
reconvertido em aspartato por transaminação.
A hidrólise da arginina produz ureia e ornitina, que depois de reentrar na mitocôndria pode recomeçar o
ciclo.
O ciclo da ureia tem um elevado custo energético, equivalente à hidrólise de 4 ATP a 4 ADP. No entanto,
este custo pode ser recuperado na cadeia transportadora de electrões, uma vez que um NADH é
produzido na desaminação do glutamato e outro NADH na posterior oxidação do fumarato a
oxaloacetato, o que é equivalente a cerca de 6 ATP.
3. Ciclo de Krebs
O piruvato produzido na glicólise ainda contém bastante poder redutor (verifique o estado de oxidação
de cada um dos seus carbonos e compare-o com o estado de oxidação do carbono no CO2). Este poder
redutor vai ser aproveitado pela célula no ciclo de Krebs. Em primeiro lugar, o piruvato é utilizado para
produzir acetil-CoA, que é uma forma activada de acetato (CH3COO-)
Nesta reacção intervém a piruvato desidrogenase. É uma enzima bastante complexa, que contém
bastantes cofactores: lipoamida, FAD, coenzima A. A hidrólise da ligação tioéster (S-C=O) do acetil-CoA é
bastante exergónica, pelo que a sua formação exige energia. Essa energia provém da descarboxilação do
piruvato (note que o piruvato tinha três carbonos e a porção acetil do acetilCoA apenas possui dois: o
grupo carboxilato migrou como CO2). A energia proveniente de descarboxilações é frequentemente
usada pela célula para empurrar um equilíbrio no sentido da formação de produtos, como se verá em
várias reacções do ciclo de Krebs e na gluconeogénese.
Na primeira reacção do ciclo de Krebs, o acetil-CoA é adicionado a oxaloacetato, dando origem a citrato,
numa reacção de adição aldólica. A hidrólise do tioéster ajuda a deslocar o equilíbrio no sentido da
formação de produtos:
Ciclo de Krebs : citrato sintetase
Tal como o piruvato, o a-cetoglutarato é um a-cetoácido, i.e., possui um grupo carbonilo adjacente ao
grupo ácido carboxílico. É portanto de prever que reaja exactamente como o piruvato, i.e., que a sua
descarboxilação forneça energia suficiente para que se forme uma ligação tioéster com a coenzima A. E é
isto que de facto ocorre... A enzima responsável por esta reacção, a a-cetoglutarato desidrogenase, é
aliás bastante análoga à piruvato desidrogenase na sua composição e cofactores.
Ciclo de Krebs : cetoglutarato desidrogenase
A ligação tioéster do succinil-CoA é, como todas as ligações tioéster, bastante energética.A sua hidrólise
vai constituir o único ponto do ciclo de Krebs onde ocorre produção directa de ATP (ou equivalente).
O succinato é, tal como o oxaloacetato, um produto com quatro carbonos. A parte final do ciclo de Krebs
consiste em regenerar o oxaloacetato a partir do succinato. O succinato é primeiro oxidado a fumarato,
pelo complexo succinato desidrogenase (também denominado complexo II), que se encontra na face
matricial da membrana interna da mitocôndria. A oxidação de ligação simples a dupla (alcanos a alcenos)
tem um potencial demasiado elevado para que os electrões possam ser aceites pelo NAD+ (E0=-320 mV).
A célula utiliza portanto FAD (E0= 0 mV)como aceitador destes electrões. A hidratação do fumarato
produz malato, que depois é oxidado a oxaloacetato, completando o ciclo. Uma sequência semelhante de
reacções ocorre na b-oxidação dos lípidos.
Acetil-CoA + oxaloacetato + 3 NAD+ + GDP + Pi +FAD --> oxaloacetato + 2 CO2 + FADH2 + 3 NADH + 3 H+ +
GTP
Glicolise : hexocinase
A membrana celular é impermeável à glucose-6-fosfato, que pode por isso ser acumulada na célula. A
glucose-6-fosfato será utilizada na síntese do glicogénio (uma forma de armazenamento de glucose) ,
para produzir outros compostos de carbono na via das pentoses fosfato, ou degradada para produzir
energia - glicólise.
Para poder ser utilizada na produção de energia, a glucose-6-fosfato é primeiro isomerizada a frutose-6-
fosfato. A frutose-6-fosfato é depois fosforilada a frutose-1,6-bisfosfato numa reacção catalizada pela
fosfofrutocinase. Este é o ponto de não-retorno desta via metabólica: a partir do momento em que a
glucose é transformada em frutose-1,6-bisfosfato já não pode ser usada em nenhuma outra via.
Os aldeídos têm potenciais de oxidação redução bastante baixos (cerca de -600 a -500 mV). A reacção de
oxidação do gliceraldeído-3-fosfato pelo NAD+ (E0=-320 mV) é portanto bastante espontânea. É uma
reacção tão exergónica que pode ser usada para produzir ATP (a produção de ATP a partir de ADP e Pi
pode ser realizada se existir uma diferença de potencial de cerca de 180 mV). A produção de ATP é feita
em dois passos. No primeiro, dá-se a oxidação do gliceraldeído-3-fosfato e a fosforilação do ácido
produzido.
Glicolise : gliceraldeído-3-fosfato e formação do primeiro ATP
Os ácidos fosforilados (tal como os fosfoenóis e os fosfoguanidinos) têm grupos fosfatos bastante
energéticos: a saída do grupo fosfato dá origem a espécies muito mais estabilizadas por ressonância. O
grupo fosfato do carbono 1 do 1,3-bisfosfoglicerato pode por isso ser transferido para ADP, produzindo
ATP.
Na glicólise gastam-se portanto dois ATP, e produzem-se quatro ATP. O NAD+ tem de ser regenerado, caso
contrário a glicólise pára, uma vez que é substrato de uma das reacções. Em condições aeróbicas, o
NADH transfere os seus electrões para a cadeia transportadora de electrões. Na ausência de O2 o NADH
transfere os seus electrões para o próprio piruvato, dando origem a lactato. É o que se denomina
fermentação : um processo em que o aceitador final dos electrões provenientes da degradação é um
produto orgânico da própria degradação.
Fermentação
Na fermentação, a molécula que recebe os electrões do NADH (ou FADH2) é um produto da mesma via
metabólica que produziu o NADH (ou FADH2). Por exemplo, nos músculos, durante exercício físico
intenso, o NADH produzido na glicólise transfere os seus electrões para o piruvato (uma molécula
orgânica produzida também pela glicólise), dando origem a lactato.
fermentação láctica
(A relação entre a descida do pH dos músculos durante a produção do lactato e a ocorrência de cãibras é
discutida em pormenor nestes dois artigos). Esta é a fermentação láctica . Existem muitos outros tipos de
fermentação em microorganismos, sendo o mais conhecido a fermentação alcoólica:
fermentação alcoólica
Respiração
Na respiração, a molécula que recebe os electrões do NADH (ou FADH2) não é um produto da mesma via
metabólica que produziu o NADH (ou FADH2). Existem microorganismos que utilizam como aceitador de
electrões SO42-, SeO42- ,NO3-, NO2-, NO, U6+ (urânio), Fe3+, H+, etc. Os mamíferos utilizam O2, e a sua
respiração é por isso chamada respiração aeróbica. A respiração aeróbica ocorre na membrana interna da
mitocôndria, que contém os complexos proteicos de transferência electrónica. Cada um destes
complexos recebe electrões de uma molécula e transfere-os para outra molécula diferente, e o conjunto
chama-se por isso cadeia transportadora de electrões:
citocromo bc1 ou complexo III. Recebe os electrões do ubiquinol produzido pelos complexos I e II, e
transfere-os para o citocromo c, uma pequena proteína solúvel presente no espaço intermembranar.
(Mais pormenores, incluindo uma estrutura tridimensional manipulável, aqui).
citocromo c oxidase ou complexo IV. Transfere quatro electrões para o O2, reduzindo-o a duas moléculas
de água. Estes electrões provêm de outras tantas moléculas de citocromo c. (Mais pormenores, incluindo
uma estrutura tridimensional manipulável, aqui)
ATP sintetase, teoria quimiosmótica, Mitchell Nos complexos I, III e IV a transferência electrónica liberta
energia suficiente para transportar H+ da matriz mitocondrial para o espaço intermembranar. Isto
provoca um aumento da concentração de H+ (e do potencial eléctrico) no espaço intermembranar, i.e.
um maior potencial químico do H+ no espaço intermembranar do que na matriz. No entanto, quando se
têm duas soluções de potencial químico diferente separadas por uma membrana, o soluto tem tendência
para se deslocar do local onde o seu potencial químico é maior para o local em que o seu potencial
químico é menor (o que, para uma substância sem carga eléctrica, é equivalente a mover-se dos locais de
maior concentração para os de menor concentraçao).
A quantidade de ATP produzida pela ATP sintetase está por isso relacionada com a diferença de
concentração de H+ através da membrana. Uma vez que a oxidação do NADH provoca transferência de
protões da matriz para o espaço intermembranar em 3 complexos (I, III e IV) ao passo que a oxidação do
FADH2 só provoca essa transferência em dois complexos (III e IV) a quantidade de ATP produzida a partir
do NADH é maior do que a produzida a partir do FADH2. São produzidos quase 3 ATP por NADH e quase 2
ATP por cada FADH2.
O NADH não consegue atravessar a membrana da mitocôndria. Existem por isso processos para transferir
os electrões do NADH produzido no citoplasma durante a glicólise para a cadeia transportadora de
electrões. Estes são:
Vaivem do malato
o vaivém do glicerol-3-P. Neste vaivém, que é muito activo no tecido adiposo castanho, o NADH
citoplasmático transfere os seus electrões à dihidroxiacetona-fosfato (DHAP), que é um intermediário da
glicólise. Esta transforma-se em glicerol-3-P, que pode doa os seus electrões à ubiquinona através de uma
glicerol-3-P desidrogenase situada na face externa da membrana interna da mitocôndria. Neste caso
produzem-se aproximadamente 2 ATP por cada NADH citoplasmático.
Vaivem do glicerol-3-P
É possível ocorrer respiração mitocondrial sem produção de ATP: basta arranjar uma forma de fazer com
que os protões regressem à matriz sem passarem pela ATP sintetase. Isto pode ser feito com ionóforos:
moléculas lipossolúveis com capacidade de transportar iões. São produzidas p. ex. por plantas, para se
defenderem de fungos parasitas. No tecido adiposo castanho, existe uma proteína (a termogenina) que
funciona como canal de protões na membrana interna da mitocôndria: o regresso dos protões à matriz
através dessa proteína em vez da ATP sintetase é responsável pela geração de calor característica deste
tipo de tecid
A glucose-6-P é primeiro oxidada no seu carbono 1, dando origem a uma lactona (um ácido carboxílico
cíclico). Os electrões libertados são utilizados para reduzir uma molécula de NADP+. O anel é então
aberto por reacção com água:
A descarboxilação do gluconato liberta dois electrões, que vão reduzir outra molécula de NADP+. Obtém-
se assim um açúcar de 5 carbonos, a ribulose-5-fosfato, que por isomerização é transformado em ribose-
5-P. (Na figura assinalam-se a verde as diferenças entre os isómeros).
Por transferência de dois carbonos da xilulose-5-P para a eritrose-4-P, forma-se outra molécula de
frutose-6-P e uma molécula de gliceraldeído-3-P:
pentoses fosfato: reciclagem de pentoses
Gluconeogénese
Existem duas formas principais de manter os níveis de glucose no sangue entre as refeições: a
degradação do glicogénio e a gluconeogénese. A Gluconeogénese consiste na síntese de glucose a partir
de outros compostos orgânicos (piruvato, succinato, lactato, oxaloacetato, etc.). O processo é bastante
semelhante ao inverso da glicólise. De facto, quase todas as reacções da glicólise são reversíveis em
situações fisiológicas. As três excepções são as reacções catalizadas por:
piruvato cinase
fosfofrutocinase
hexocinase
gluconeogénese : piruvato,oxaloacetato,fosfoenolpiruvato
gluconeogénese - frutose-1,6-bisfosfatase
A frutose 1,6-bisfosfatase existe em quase todos os tecidos, mas a glucose-6-fosfatase existe apenas no
fígado e no rim, o que lhes permite fornecer glucose ao resto do organismo:
gluconeogénese - glucose-6-fosfatase
Durante o exercício físico intenso, o lactato produzido nos músculos é enviado para a corrente sanguínea,
e pode ser utilizado pelo fígado para sintetizar novas moléculas de glucose. Apesar de se gastarem no
fígado 6 ATP por cada molécula de glucose assim sintetizada, e de estas apenas gerarem 2 ATP no
músculo em condições anaeróbicas, o processo é vantajoso pois permite a manutenção do exercício (o
que pode ser determinante para a sobrevivência do indivíduo, p. ex. permitindo escapar a um predador,
ou a continuação da perseguição a uma presa).
GLICOGÉNESE
Logo que entra na célula, a glucose é fosforilada a glucose-6-P pela enzima hexocinase:
glucose-6-P
A membrana celular é impermeável à glucose-6-fosfato, que pode por isso ser acumulada na célula. A
glucose-6-fosfato será utilizada na síntese do glicogénio (uma forma de armazenamento de glucose), na
síntese de outros compostos de carbono na via das pentoses fosfato, ou degradada para produzir energia
- glicólise.
glicogénio
Para poder ser utilizada na síntese do glicogénio, a glucose-6-fosfato é primeiro isomerizada a glucose-1-
fosfato, pela enzima fosfoglucomutase.
fosfoglucomutase
A adição de glucose-1-P ao carbono 4' de uma extremidade da cadeia de glicogénio não é uma reacção
favorecida termodinamicamente em condições fisiológicas, uma vez que o potencial de transferência de
fosfato das ligações C-O-P normais é bastante baixo. Por isso, a glucose-1-P vai ser activada, i.e., vai ser
transformada numa espécie com alto potencial de transferência de fosfato. Isto é conseguido por reacção
com uridina trifosfatafa (UTP, uma molécula análoga do ATP, mas com uridina no lugar da adenina).
UDP-glucose
Esta reacção, só por si, não parece ser termodinamicamente favorável, pelo que se poderia pensar que
não teria utilidade. No entanto, o pirofosfato (PPi) que se forma nesta reacção pode ser hidrolizado,
numa reacção bastante exergónica. A eliminação do PPi empurra o equilíbrio no sentido de formação da
UDP-glucose, ilustrando mais uma vez o princípio da utilização de uma reacção bastante exergónica para
tornar espontânea uma outra reacção que de outra forma não seria favorecida termodinamicamente.
A UDP-glucose tem um elevado potencial de transferência de fosfato, o que lhe permite doar glucose à
extremidade 4' de uma cadeia de glicogénio, numa reacção catalizada pela glicogénio sintase:
glicogénio sintetase
A glicogénio sintase só consegue adicionar glucose a cadeias de glicogénio pré-existentes, i.e., não é
capaz de começar a síntese de uma nova molécula de glicogénio. A síntese do glicogénio é iniciada pela
adição de uma molécula de glucose a um resíduo de tirosina de uma proteína denominada glicogenina.
As ramificações são realizadas por uma "enzima ramificadora". Esta actua sobre cadeias lineares de
glicogénio com pelo menos 11 glucoses. A enzima ramificadora (amilo(1,4 -->1,6)-transglicosilase)
transfere segmentos terminais de glicogénio de cerca de 7 resíduos de glucose para o grupo OH no
carbono 6 de um resíduo de glucose (que pode estar na mesma ou noutra cadeia). As ramificações
devem estar a pelo menos 4 resíduos de distância uma da outra.
Degradação do glicogénio
glicogénio fosforilase, que cliva uma ligação a(1-4) com fosfato inorgânico (Pi). Esta enzima só cliva
resíduos de glucose que estejam a mais de 4 resíduos de distância de uma ramificação. Utiliza piridoxal,
um derivado da vitamina B6, como cofactor.
glicogénio fosforilase
Uma molécula de glicogénio com ramos de apenas 4 glucoses (o que se denomina uma "dextrina-limite")
não pode ser degradada apenas pela glicogénio fosforilase. Necessita da acção da enzima seguinte:
enzima desramificadora do glicogénio: transfere três resíduos de glucose de uma ramo limite para outro
ramo. O último resíduo da ramificação (com uma ligação a(1-6)) é eliminado por hidrólise, dando como
resultado glucose livre e glicogénio desramificado. A hidrólise é catalizada pela mesma enzima
desramificadora.
A glicogénio fosforilase é bastante mais rápida do que a enzima desramificadora, pelo que os ramos
exteriores do glicogénio são degradados muito rapidamente no músculo em poucos segundos quando é
necessária muita energia. A degradação do glicogénio para lá deste ponto exige a enzima desramificadora
e é portanto mais lenta, o que explica em parte o facto do musculo só poder exercer a sua máxima força
durante poucos segundos.
glucose-1-P to glucose-6-P
A glucose 6-fosfato pode então ser utilizada na glicólise. Ao contrário do músculo, o fígado (e em menor
extensão, o rim) possui glucose-6-fosfatase, uma enzima hidrolítica que cataliza a desfosforilação da
glucose 6-fosfato, o que lhe permite fornecer glucose ao resto do organismo:
glucose-6-fosfatase
A glicogénio fosforilase é activada por uma sequência de reacções de activação desencadeadas pela
ligação de uma hormona a um receptor membranar específico. A hormona responsável pelo processo é
diferente no fígado e no músculo, e isto está relacionada com o diferente papel destes órgãos e com as
enzimas neles presentes:
o músculo não possui glucose-6-fosfatase, e não pode por isso transformar a glucose-6-P (que não pode
sair da célula)em glucose (que pode sair das células). O glicogénio do músculo é por isso uma reserva de
glucose-6-P para consumo póprio em situações de emergência. A sua degradação é estimulada pela
ligação de uma hormona que sinaliza situações de perigo: a adrenalina (também chamada epinefrina).
o fígado possui glucose-6-fosfatase, e pode por isso transformar a glucose-6-P (que não pode sair da
célula) em glucose (que pode sair das células). O seu glicogénio é por isso uma reserva de glucose para
utilização por outras células em períodos de carência de glucose. A sua degradação é estimulada pela
ligação de uma hormona libertada pelo pâncreas qundo os níveis de glucose no sangue estão baixos: o
glucagon.