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SINOPSE: A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA PEC DO PACTO FEDERATIVO.

Estéfane Costa Barros2


Manuela Ithamar Lima3

1 DESCRIÇÃO DO CASO
A análise acerca do poder constituinte derivado tem base em seu conceito. Por poder
constituinte derivado, tem-se a ideia de força competente capaz de modificar ou reformar a Lei
Superior, por meio de emendas constitucionais ou de retificações periódicas, autorizadas pelo
poder constituinte originário, o qual limita a sua ação, transformando-o, assim, em um poder
constituído e amplamente subordinado, de forma a não ultrapassar a autoridade outrora
prescrita.
No caso abordado, o conflito gira em torno da PEC nº 188/2019 que é denominada
PEC do Pacto Federativo, a qual promoveu, dentre outras coisas, a inclusão do art. 115 nos
versos da Constituição Federal, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias que se
refere à extinção de municípios com menos de 5.000 habitantes e a alteração dos arts. 198 e 212
da CF, os quais preveem a unificação dos gastos mínimos em educação e saúde, a fim de que
os Estados imponham a sua autonomia sobre esses direitos.
Por essa razão, a tese manifestada por um Senador do estado de Goiás apresenta a
ideia do dilema da inconstitucionalidade da PEC, referindo-se à suposta violação aos limites
materiais do poder da reforma, na forma do art. 60, § 4º, da CF, impetrando, dessa maneira, um
Mandado de Segurança ao STF. Ante o exposto, indaga-se: o Mandado de Segurança impetrado
pelo referido Senador possui razões legítimas para ser julgado assertivamente, mesmo que isso
implique em um confronto direto com o Ministério da Economia?

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE
2.1 Descrição das decisões possíveis
a) O Mandado de Segurança é legítimo e pode ser julgado de forma assertiva;
b) O Mandado de Segurança não é legítimo e não pode ser julgado de forma assertiva.

1
Case apresentado à disciplina de Teoria do Direito Constitucional do Centro Universitário Dom Bosco - UNDB
2
Aluna do 2º período, do Curso de Direito, da UNDB
3
Professora, Mestra.
2.2 Descrição dos argumentos

a) O poder constituinte derivado, por se tratar de um poder constituído pela


Constituição Federal (e de constituído, tem-se a definição de algo que é delegado, determinado),
não é agraciado com o direito de soberania perante a Lei Superior, tornando-o limitado a fins
de controle constitucional. Daí, dentre outras limitações, destaca-se a limitação material, que se
refere às cláusulas pétreas constitucionais, as quais garantem a imutabilidade dos versos
regulamentares.
Para Pedra (2006, pág. 137), as cláusulas pétreas constituem um núcleo intangível
que garantem a estabilidade da Constituição e conservam-na de alterações que extingam o seu
núcleo essencial, ou causem ruptura ou eliminação do próprio ordenamento constitucional,
sendo assim, a segurança da imutabilidade da identidade da Constituição e dos seus princípios
fundamentais, como os elencados no art. 6 da CF.
Dessa forma, a aplicação da PEC nº 188/2019, ao promover medidas de equilíbrio
fiscal, dentre elas a realocação de municípios com menos de 5.000 habitantes para municípios
maiores, fere as cláusulas concebidas na Constituição Federal ao contrapor o princípio do
federalismo cooperativo, apresentado na forma dos arts. 60, § 4º, I e 1, da CF, os quais são
cláusulas pétreas e se referem à forma federativa do Estado de Direito e à união indissolúvel
dos representantes do mesmo.
É o que diz Camargo e Hermany (2020, pág. 158):

Uma reforma pode ter como fundamento o aperfeiçoamento do texto constitucional,


mas deve-se manter fiel aos seus princípios basilares, sem alterar ou suprimir a base
em que se funda o Estado Democrático de Direito. Desse modo, observa-se que o
intuito da PEC 188/2019 é alterar não a forma federativa, mas, suprimir entes que
compõem a federação brasileira, confrontando-se diretamente com a limitação de
cláusula pétrea, declarada no artigo 60, parágrafo 4º, inciso I da Constituição Federal.
Torna-se, assim, o dispositivo de extinção de pequenos municípios, inconstitucional
por ferir ordenamento pétreo na Constituição.

Isto posto, é notória a inconstitucionalidade da PEC nº 188/2019 no que diz respeito


à reforma no art. 6 da CF que aborda os direitos sociais brasileiros. É, de todo modo, uma
afronta à República Federativa, uma vez que com a proposta de exclusão dos municípios
inferiores, haverá a extinção das competências concedidas por lei. Nesse diapasão, torna-se
válida a expedição do Mandado de Segurança, a fim de garantir a efetividade dos direitos sociais
brasileiros.
b) A Constituição Federal, para Zart (2007, pág. 23), é a norma reguladora da
atividade dos poderes públicos instituídos, bem como é o limite de suas atuações. Destarte, vale
inferir que ela é dotada de supremacia e que ela não é respaldada em vícios, ou seja, não possui
contradições, mas tem fim em si mesma.
Diante disso, faz-se necessária a reflexão acerca da efetividade das cláusulas
pétreas, que conduzem ao entendimento da aplicação da PEC nº 188/2019, a qual, pela própria
Constituição, não pode ser considerada como inconstitucional, na forma do art. 60, CF, por não
proporcionar ameaças aos direitos sociais brasileiros.
Brandão (2010, pág. 13) afirma que:

A eficácia protetiva das cláusulas pétreas contra as emendas refere-se, portanto, à


norma de direito fundamental e não ao dispositivo que a prevê, de modo que o simples
fato de uma emenda alterar a redação dos respectivos dispositivos não implica,
inarredavelmente, a sua inconstitucionalidade. Ao contrário, não há óbice a que sejam
desenvolvidos ou modificados os textos normativos, desde que preservada a essência
da norma objeto da proteção.

De acordo com Favero (1997, pág. 54), a reforma dos versos constitucionais tornou-
se o instrumento do equilíbrio entre a realidade jurídica e a realidade política de um Estado de
Direito, impedindo que a constituição fique reduzida a um conjunto de fórmulas sem nenhuma
projeção prática. Em outras palavras, o acréscimo do parágrafo único no art. 6, da CF, não
configura um ato inconstitucional, uma vez que esse acréscimo resultaria na manutenção
econômica do país.
Em síntese, o art. 5 da CF é o princípio norteador dos direitos da dignidade humana,
respaldando a PEC nº 188/2019 no que tange à preocupação com o desenvolvimento individual
dos municípios a serem realocados. A garantia de uma maior produtividade, bem como o
amparo às gerações futuras, caracteriza o interesse de proporcionar a efetividade dos direitos
sociais. Diante disso, afirma-se que o Mandado de Segurança impetrado não é legítimo e não
deve ser julgado de forma assertiva.

2.3 Descrição dos critérios e valores

- Direitos sociais: possibilidade de uma vida digna baseada na efetividade das


necessidades básicas;

- Constitucionalidade: Ação concordante com as normas versadas numa


Constituição.
REFERÊNCIAS

BRANDÃO, R. São os direitos sociais cláusulas pétreas¿ Em que medida¿ Custos Legis:
Revista Eletrônica do Ministério Público Federal, Brasília - DF, v. 2, págs. 1-25, 2010.
Disponível em:
http://www.prrj.mpf.mp.br/custoslegis/revista_2010/2010/aprovados/2010a_Dir_Pub_Branda
o.pdf. Acesso em: 11 de set. 2020.

CAMARGO, D.A; HERMANY, R. A NECESSIDADE DE REFORMA DO PACTO


FEDERATIVO BRASILEIRO: UMA ANÁLISE DA PEC 188/2019 QUE EXTINGUE
MUNICÍPIOS. Revista Videre: ver, olhar, considerar, Dourados – MS, v.12, nº 23, 2020.
Disponível em: http://ojs.ufgd.edu.br/index.php/videre/index. Acesso em: 11 de set. 2020.

FAVERO, E.R. REFORMA CONSTITUCIONAL: A QUESTÃO DO EQUILÍBRIO


ENTRE A ESTABILIDADE E A NECESSIDADE DE EVOLUÇÃO DAS
CONSTITUIÇÕES RÍGIDAS. 1997. Dissertação (Mestre em Direito) – Centro de Pós-
graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Videira - SC, 1997.
Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/30358303.pdf. Acesso em: 11 de set. 2020.

PEDRA, A.S. Reflexões sobre a teoria das cláusulas pétreas. Brasília, a. 43, nº 172, 2006.
Disponível em: https://d1wqtxts1xzle7.cloudfront.net/61466985/Clausulas_petreas20191209-
88910-913ra6.pdf?1575920014=&response-content-
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Id=APKAJLOHF5GGSLRBV4ZA. Acesso em: 12 de set. 2020.

ZART, R.E. O PODER CONSTITUINTE DERIVADO E A SISTEMÁTICA DAS


EMENDAS CONSTITUICONAIS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. 2007.
Dissertação (Mestre em Direito) – Centro de Ciências Jurídicas, políticas e sociais –
CEJURPS, Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, Itajaí – SC, 2007. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/download/teste/arqs/cp063593.pdf. Acesso em: 10 de set.
2020.

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