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GT 10 – Informação e Memória
Resumo: Neste trabalho o objetivo é refletir e problematizar sobre a Jurema, tomando como
foco processos religiosos e históricos. Apresentamos neste texto discussões prévias de
pesquisa nos em andamento cujo objetivo é compreender a tradição do culto da Jurema na
Paraíba e sua importância informacional na perspectiva da memória. Nosso principal interesse
é penetrar no modo de ser dessa religiosidade buscando, principalmente, os aspectos ligados
ao fenômeno das crenças populares, posto que, estas pertencem a um olhar temporal de longa
duração e se reproduzem com alterações, transformações e adendos ao longo da história.
Partindo do modo como esse debate tem tido lugar nos estudos sobre a religiosidade juremeira
são utilizados dados bibliográficos e etnográficos, por meio de um compartilhamento das
memórias, com atenção preferencial em relação a tópicos como o ritual e a possessão nos
terreiros, para melhor compreensão do significado dos ritos. Considerando a informação como
fator preponderante nas manifestações religiosas culturais, entendemos que o espaço dedicado
à prática da Jurema pode revelar a dimensão da produção social de informação e
Abstract: This study reflects and debates about the Jurema, focusing on historical and
religious processes. In this text, we present previous ongoing research discussions, which
objective is to understand the tradition of Jurema’s cult in Paraíba and its informational
importance to the memory perspective. Our main interest is to penetrate into the way of life of
this religiosity seeking for, mainly, the aspects related to the phenomenon of popular beliefs,
considering that these belong to a temporal look of long duration and that they reproduce
themselves with alterations, transformations and addendums along history. From how this
debate has been taking place in the studies about the juremeira religiosity, ethnographic and
bibliographic data are used, through a memory sharing, with special attention to some topics
as the ritual and the possession in the terreiros, in order to understand better the meaning of
the religious rites. Considering the information as a preponderant factor in the cultural
religious manifestations, we understand that the space dedicated to the Jurema practice can
reveal the dimension of the social production of information and knowledge. We stress that
the Jurema is a mediumistic religious manifestation, typical from the northeast region, of
spiritual inclusion, conducted to the practice of charity, through spirits that
incorporate terreiros.
1 INTRODUÇÃO
Como ressaltam Sousa e Andrade Júnior (2013), essas religiões contribuíram para a
formação do sincretismo religioso brasileiro e sua simbologia polissêmica colaborou para
formar a cultura brasileira que, com sua capacidade adaptativa, é tributária do pensamento e
da prática religiosas colonial, abarcando em seu interior elementos que ajudaram a modelar o
sincretismo contemporâneo polissêmico típico da mentalidade brasileira. Como afiançam os
autores, a expansão territorial portuguesa, durante o período colonial, foi acompanhada pela
rubrica do catolicismo, símbolo da submissão dos indígenas e, posteriormente, dos escravos
africanos ao poder da coroa portuguesa. Sendo a fé em cristo imposta, indígenas iniciaram
uma fuga em busca de espaços aonde pudessem praticar seus credos sem a punição dos
missionários cristãos (SOUSA; ANDRADE JÚNIOR, 2013). Os autores entendem que não
foi tarefa fácil para os missionários incutir nos nativos a crença em um só Deus e fazer um
processo de ressignificação dos rituais por eles praticados. Muitos se tornavam cristãos
batizados, porém mantinham seus rituais e costumes, alimentado assim, o sincretismo
religioso.
Luiz Assunção, antropólogo, estudioso há décadas dos elementos simbólicos das
tradições indígenas e do universo afro-brasileiro do sertão nordestino, discorre sobre o que
ocorreu entre as matrizes religiosas. Ele explica que nos dias de hoje o culto da Jurema está
presente tanto no litoral como no interior nordestino. Nesse sentido, ele esclarece que:
O Catimbó estava próximo aos símbolos indígenas e aos símbolos católicos, não
demonstrando a existência de símbolos africanos. Também a presença de sacrifícios de
animais, rituais de iniciação, ligação com orixás, culto a exus e pombagira não estão presentes
na Jurema praticada hoje. Porém, como preceitua Vandezande (apud GONÇALVES, 2013,
não paginado), “o Catimbó já se diversificava e se adaptava à emergência de novas demandas
apresentadas pela Federação dos Cultos Africanos e cuja mostra disso, poderia ser sentida nas
práticas recentes das mesas brancas e dos Catimbós umbandistas”. Atualmente, Catimbó é
uma palavra usada com teor depreciativo, mas o Catimbó mudou de nome, se renovou e
incorporou novos elementos, e com nova aparência oficializou-se como religião, diluído na
Umbanda, explica Gonçalves (2013).
Gonçalves (2013) esclarece que a partir da segunda metade da década de 80, outros
terreiros foram surgindo na Paraíba. O Candomblé passa a concorrer com a Umbanda e, neste
confronto, vários adeptos da Umbanda mudam para o Candomblé. Seguindo ainda o
entendimento de Gonçalves (2013), sobre o Candomblé e a Umbanda, destacamos que muitos
dos convertidos não abandonam completamente a Umbanda, e a Jurema vai sendo
desvinculada da Umbanda, recuperando sua autonomia, o que lhe permite ser associada à
outra tradição, sem entrar em concorrência ou conflito com o Candomblé (GONÇALVES,
2013).
Assunção (2006) explica que os Caboclos, Mestres e Reis da Jurema coexistem nos
terreiros com Pretos Velhos, Exus e Pombagira, entidades originalmente cultuadas na
Umbanda, mas que logo foram adicionadas ao Catimbó. Além dos Pretos Velhos, outras
vertentes se juntaram ao Catimbó, a Encantaria, por exemplo, que está presente em parte dos
cultos afro-luso-indígenas no Nordeste. Como preceitua Assunção (2006), os Encantados são
entidades que, segundo a tradição, não morreram, mas antes, se transformaram noutra forma
de vida, material ou espiritual. Eles simbolizam e contribuem para a legitimação de uma
identidade, tendo em vista que boa parte da Encantaria está intimamente ligada ao ambiente
no qual se manifesta.
Na Jurema, muitos rituais foram reelaborados e a partir das adaptações feitas por seus
discípulos, o Catimbó ganhou novo significado. As aproximações de uma religião para com
outra ajudaram a fortalecer e reafirmar a eficácia de um culto aumentando sua capacidade
religiosa. Há nisso, portanto,
Em seus estudos antropológicos, Bastide (1971) deixa claro que o sagrado se define
por criação pura e não repetição e situa-se no domínio do imaginário e não da memória,
mesmo extraindo deles tudo aquilo que podemos chamar de pedagogia da selvageria. A
selvageria consiste na independência de qualquer lei; a disciplina submete o homem às leis da
humanidade e começa a fazê-lo sentir a força das próprias leis.
É possível reconhecer o sagrado como elemento do campo religioso. Suas formas de
organização econômica e social, a distribuição de autoridades, crenças e valores são
construções idealizadas por uma sociedade. Como preceitua Oliveira (1985), por sua vez o
fenômeno da religiosidade popular é um sistema simbólico resultante do trabalho anônimo e
coletivo de agentes sociais, no qual o povo, como participante, produz e reproduz um espaço
religioso, onde os símbolos se recobrem com os nomes do sagrado.
No domínio da Ciência da Informação, podemos dizer que a Jurema constitui-se um
espaço que tem como objeto as práticas sociais de informação, ou a metainformação e suas
relações com a informação. Ou seja, um conjunto de regras e relações tecidas entre os
adeptos, revelando os processos e produções simbólicas e materiais no espaço sagrado.
Diríamos, na esteira do pensamento de Marteleto (2003), que a Jurema é apresentada como
atividade prática, a partir de seu conjunto de regras e relações tecidas entre seus componentes,
de seus processos e produções simbólicas e materiais.
No culto da Jurema as posições dos chefes se definem evocadas de uma autoridade e
de um prestígio. A iniciação aparece por efeito de polarização que permite organizar um vasto
campo semântico, aonde outros elementos vão se inserindo. Essa passagem reconduz a
oposição entre o dom e a iniciação para o ambiente das relações complementares. Não se trata
de processos indiferentes, mas de contextos onde “os meios de comunicação desempenham
um papel fundamental, não só na transmissão do saber informacional ou da imagem do poder,
mas também pode ser instrumento tanto de consolidação das relações de poder quanto da
desmistificação do poder” (ALMINO, 1986).
Como expressa Almino (1986), a informação, pensada no contexto social, é
essencialmente relacional e, portanto, organizativa e organizadora. Sua mensagem ou sentido
dependem da modalidade de interação entre os indivíduos, os quais podem ser denominados
emissor e receptor. É a intenção do emissor e a compreensão do receptor que podem atribuir
significado, qualidade, valor ou alcance à informação. No espaço religioso da Jurema não é
diferente. Por isso, vale levantar alguns dados sobre a Jurema, entre seus adeptos em João
Pessoa.
A visita ao espaço sagrado da Jurema é, antes de tudo, uma vivência afetiva, que nos
aproxima do domínio do sagrado. Pelo simbolismo religioso que possuem os espaços
religiosos e pelo caráter sagrado a eles atribuído, são chamados de “centros de convergência
de fiéis” (GONÇALVES, 2013), que com suas práticas e crenças materializam uma
organização funcional e social do espaço. Os fatores invisíveis presentes nas práticas
religiosas só estarão visíveis se interrogados. Por isso, é essencial desvendarmos os símbolos
da religiosidade juremeira, como mais um meio de conhecimento do sagrado, através dos atos
comportamentais dos fiéis. É, pois, no ritual religioso, vivido no espaço sagrado da Jurema,
que os fiéis desfrutam os bens religiosos. Esse ritual representa um conjunto de práticas
religiosas consagradas no catolicismo popular. É nesse espaço sagrado que estão as
referências da identidade popular cultural dos juremeiros.
Nas palavras de Gonçalves (2013), na Paraíba o espaço religioso se expande com a
abertura de novos terreiros, facilitado pelo pluralismo religioso e pela liberdade de culto. Em
João Pessoa, a sua formação apresenta características peculiares comparando-se a Recife e
Salvador, onde o negro teve papel fundamental.
Segundo Fernandes (1938, p.30), na Paraíba não existiram terreiros tradicionais de
religiões de matriz africana, contudo, vemos emergirem discursos de afirmação da identidade
negra, em que o Candomblé figura como forma pura de manifestação religiosa africana, ideal
difundido e defendido pelos movimentos negros. Gonçalves (2013) esclarece que os rituais
dedicados à Jurema são realizados em momentos separados dos rituais dedicados aos orixás,
que são considerados energias cósmicas e não espíritos que incorporam. Há uma preocupação
entre os adeptos em não misturar diretamente os orixás com a Jurema. Mas, conforme
apresenta Gonçalves (2009, não paginado), notam-se algumas exceções:
O aparato de uma mesa de Catimbó, como descrevem Souza e Andrade Júnior (2013,
p.5),
Consiste na mesa estreita, forrada ou não, onde se misturam garrafadas de
Jurema, cachimbos, imagens de santos, principalmente um crucifixo,
amarrado de cordões e fitas, pequenos alguidares, maracás, bonecas de pano,
cururus secos, fumo de rolo, entre outros. Muitos usam o alguidar sobre
brasas ao pé da mesa, fervendo raízes ou ervas. A sessão tem início com a
abertura da mesa feita em invocações cantadas e velas acessas. Distribuem
entre os presentes, a Jurema. O ritual varia com o fim desejado. Começam a
invocação aos Mestres (há vários mestres) com toadas cantadas em coro.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BECKER, H. Métodos de pesquisa em ciências sociais. 4. ed. São Paulo: Hucitec, 1999.
LÉRY, Jean de. Viagem à terra do Brasil. São Paulo: Edusp 1980.
PARAIBA. Lei Estadual n° 3.443, de 06 de novembro de 1966. Dispõe sobre o exercício dos
cultos africanos no Estado da Paraíba. In: Diário Oficial do Estado, publicado em 10 de
novembro de 1966. Disponível em:
<http://201.73.83.244:8082/sapl/sapl_documentos/norma_juridica/2899_texto_integral.
Acesso em: 22/06/2016.