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Universidade do Sul de Santa Catarina – Campus UnisulVirtual

Unidade de aprendizagem Virtual: Direito de propriedade

Transcrição acessível da web aula, unidade 1 – com o título de “Posse e


interditos”, disponível no EVA.

Prof. José Isaac Pilati

Parte 1

Olá pessoal, vamos tratar nessa web aula um assunto muito interessante,
posse e interditos, está no livro 3 do código civil, parte especial, direito das
coisas.

O direito das coisas, ele trata da posse e dos direitos reais, a posse é a
dimensão visível dos direitos reais, e os direitos reais, são a parte abstrata do
direito das coisas. Vamos tratar, portanto, daquelas coisas que podem ser
tocadas, as relações jurídicas e situações jurídicas que se estabelecem em
cima das coisas que podem ser tocadas pela pessoa humana. Vamos tratar em
10 itens, então vejamos: o conceito de posse, a sua natureza, origem e razões
históricas; muito importante para entender o conceito de posse, os dois grande
domes da posse que são a separação em relação a propriedade e a separação
em relação a detenção e regras básicas da posse. Ai estaremos habilitados a
avançar para a classificação da posse, são diversas classificações, depois
vamos tratar da aquisição e da perda, e finalmente, vamos tratar dos efeitos da
posse.
Parte 2

Muito bem, então vamos agora para o conceito de posse. O conceito de posse,
o melhor que vejo, é do código civil italiano, artigo 1196 que diz que: A posse é
o poder sobre a coisa, e portanto, correspondente a atividade do proprietário do
titular da propriedade, ou de outro direito real. Então, exatamente, o direito das
coisas tem quatro grandes gomos, o primeiro é a posse, o segundo é o direito
sobre a coisa própria, a propriedade, o terceiro é direto real sobre coisas
alheias, de gozo, e o quarto é direito real sobre coisas alheias, de garantia.

Então como estou dizendo, a posse é a dimensão visível dos outros três
gomos, por isso que ela não é um direito real, ela é um fato, então, vamos olhar
novamente o conceito do artigo 1196 do código civil italiano, posse é poder
sobre a coisa, ou seja, esse estado visível, desse fato, que se manifesta em
uma atividade correspondente, sempre a maneira, ao exercício da propriedade,
ou então de outro direito real, ou seja, a posse pode ser uma posse a título de
proprietário ou então usufrutuário, superficiário um enfiteuta, e sempre da
maneira como o titular de um direito real, dessa natureza, se comporta.

Então por exemplo: o proprietário pode ter um bem fechado o ano inteiro, por
exemplo uma casa de praia, pode ter um terreno completamente aberto e todo
mundo entra e sai do terreno, por que é assim que os proprietários se
comportam naquela região, ou pode ser, por exemplo, uma casa no centro da
cidade que todo mundo mantém fechada e se alguém deixar aberto, portões e
portas, está dando uma notícia, uma mensagem de abandono, por que não é
assim que o proprietário se comporta.

Agora, existe situações, que parece posse mas não são, são casos de
detenção, então esses aspectos é que nós vamos ver agora, ao tratarmos do
conceito, no item seguinte vamos tratar de sua natureza jurídica.
A natureza jurídica da posse é um fato, é um fato juridicamente relevante, e
portanto, autônomo em relação a propriedade, ele em si, não tem anda a ver
com a propriedade, porque a propriedade é um direito abstrato, ele é um
registro de imóveis, ele é a decorrência de um modo de aquisição, agora, a
posse não, a posse é um fato, você esta vendo a posse do meu relógio, a
posse do meu óculos, você esta vendo aqui numa situação de fato, e essa
situação jurídica, do meu relógio ou de meu óculos, tem uma tutela jurídica por
interditos, e portanto, uma tutela jurídica muito diferente da tutela jurídica
especificamente da propriedade ou de outro direito real.

Parte 3

Muito bem pessoal, então agora vamos falar de uma coisa que você não
encontra no manual, que é a explicação da origem histórica e a razão da
existência da posse separada da propriedade.

A origem é o direito romano, mas uma maneira muito interessante, veja: foi
uma criação da jurisdição romana e de caráter processual, por que? Porque no
direito romano, a pessoa que sentenciava o feito, não era a mesma pessoa que
ordenava o processo, quem ordenava o processo era uma criatura chamada
pretor, um magistrado, e esse pretor ele reunia as partes e balizava a o que um
tinha alegado, o que o outro tinha alegado, colocava tudo num formulário, para
encaminhar para um juiz decidir, então ele era o detentor da jurisdição mas ele
não podia julgar, ele era obrigado a delegar a jurisdição, o julgamento.

Muito bem, na hora que ele reunia as partes, qual era a preocupação dele? A
preocupação dele era, como ficaria a coisa, o objeto do litígio, enquanto o juiz
não desse a sentença, porque por exemplo, se fosse uma junta de bois, bois
podem causar danos as pessoas, bois tem necessidades, devem ser
alimentados,e fim, é um problema muito sério, pode morrer durante o litígio.
Então o pretor tinha essa preocupação primeira, como proteger a coisa? Ora,
se ele depositasse os bois, perante a autoridade romana, isso daria despesa e
problema, então ele tinha que arranjar uma melhor maneira, e ele pensou em
deixar com uma das duas partes. Como ele não podia antecipar o mérito da
demanda, porque seria um abuso, porque era um juiz quem iria decidir, um juiz
nomeado, que ainda não tinha conhecido da lide, ele teve que escolher critérios
distintos para ver com qual dos dois ele iria deixar a coisa, então, ele pensou
assim: eu vou estabelecer 2 critérios, o primeiro, se um deles estiver com a
coisa a mais de um ano eu vou deixar com ele, esse é meu primeiro critério, e
se aquele que comparecer em juízo com a coisa, ele estiver a menos de um
ano, eu vou perguntar para ele como que ele adquiriu, se ele adquiriu, a posse,
de forma violenta, clandestina ou precária, em relação ao adversário, eu vou
mandar trocar de mãos, se não houve violências, se ele recebeu “nas boas”,
conforme o direito, conforme o jus, eu vou deixar com ele, então ele tinha um
critério para proteger a coisa, no inicio da lide, antes da decisão da questão de
fundo, e sem tocar a questão de mérito. Então, com isso, ele estava
separando, radicalmente, o mérito da demanda, ou seja, nós diríamos hoje, a
questão do direito real da situação de fato, e ai, essa palavra, ou a palavra que
decidiu isso, que definiu, melhor dizendo, era interdito, interdictum, ou seja, dito
entre duas pessoas, ou seja, o pretor estava dando uma ordem para as partes,
que um dos dois ia ficar com a coisa durante o litígio, até o juiz dar a sentença,
cuidando dela, e que se ele não cuidasse direitinho, ele iria responder por isso,
e se ele não vencesse a demanda, depois ele veria com a outra parte como
seria a indenização desse período, em que a parte ficou indevidamente com a
coisa.

Portanto, a origem da posse, tem um caráter processual, e por isso que ela não
se toca, absolutamente, com a questão de mérito, ou seja, com a questão dos
direitos reais, e por isso que a posse esta na inauguração do direito das coisas,
e que trata dos direitos reais, mas não é direito real, ela é um fato, porque ela
esta preocupada apenas com a situação de fato.
Parte 4

Muito bem, outra preocupação que vem, então, a seguir, é a separação entre
posse e propriedade, só com a história que eu contei para vocês, vocês já
entenderam, ou seja, a posse esta no campo do jus possessionis e tem uma
proteção interdital, uma tutela jurídica por interditos, que hoje nós chamamos
também de ações possessórias, então, essa é a realidade da posse. A posse é
protegida por um interdictum, por uma ordem do pretor, que hoje é uma ordem
judicial, porque hoje o processo é diferente do que na época em que surgiu
essa separação.

Já o direito real, a propriedade e os outros direitos reais, estão noutro campo,


do jus possidendi, ou seja, estão no campo da tutela petitória. Então, é só você
imaginar: o pretor esta com a posse, no campo do interdictum, e aquele juiz
que vai decidir a questão de fundo, a questão de mérito, ele está no campo
petitório, do jus possidendi, ou seja, no campo do direito real, são duas coisas
completamente distintas.

Bom pessoal, outro ponto importante é a separação posse detenção, porque o


poder sobre a coisa, esse fato visível, que eu estou dizendo que é posse, nem
sempre é. Em alguns casos não é posse, é detenção, e ai nós voltamos aquela
velha polêmica conhecida entre Savigny e Ihering.

O Savigny entendia que posse, só tem quem tem animus domini, então só
existe um único possuidor, por exemplo: quando eu alugo um imóvel, eu sou o
possuidor, e o meu inquilino é o detentor, porque quem tem animus domini sou
eu, se eu entrego o meu imóvel em usufrutuo, eu sou o possuidor, o
usufrutuário é o detentor. Mas ai diz o Savigny: entretanto, tanto o usufrutuário,
como o inquilino, tem proteção possessória, apesar de serem detentores por
exceção.

Agora, o Ihering disse: Não! Todo poder sobre a coisa, todo esse ato visível,
sempre é posse, e só será detenção nos casos em que a lei as classificar como
detenção. Então por exemplo: você pode olhar no código civil, o artigo 1198 e o
artigo 1208, tratam de casos de detenção. Então empregado, por exemplo,
que usa um óculos de proteção para solda, ele tem detenção desse óculos,
porque o óculos é da empresa embora esteja no poder dele. Agora, é o código
civil que esta dizendo pelo artigo 1196 que esse caso é um caso de detenção.

Muito bem, mas o problema o Ihering é que ele, então, tratou como possuidor o
usufrutuário e o inquilino, então o que ele fez? Ele institui dois possuidores, e ai
ele teve que, na forma do artigo 1197, instituir uma distinção, em possuidor
direto e possuidor indireto. Então, eu que alugo o imóvel sou o possuidor
indireto e o meu inquilino é o possuidor direto, o usufrutuário é o possuidor
direto, e o proprietário, possuidor indireto.

Isso nos traz alguns problemas no dia-a-dia, porque me parece que, a teoria do
Savigny, é mais fácil de se entender e de se praticar, mas também, as duas
estão corretas e nós adotamos a teoria do Ihering

Parte 5

Muito bem, agora, isso visto, vamos tratar das regras básicas da posse,
primeira delas: separação entre posse e propriedade, ou seja, um esta na
dimensão do jus possessionis, e portanto da proteção interdital, ou das ações
possessórias, e o outro, esta no campo do jus possidendi, ou seja, da proteção
petitória, então, exatamente como vimos essa separação foi feita pelo pretor
romano.

A segunda regra é que, a posse, o fato da posse, sempre é a regra geral,


detenção é exceção, são os artigos 1198, 1208, e também a outras situações
jurídicas que se enquadram como detenção.

A terceira regra, é que o caráter da posse, não pode ser alterado


unilateralmente, é o artigo 1203 do código civil. Por que se não fosse assim,
haveria uma grande insegurança jurídica, por que de repente alguém que
recebe um bem, a um título de posse, e de repente ele quer transformar em
outra situação, vai querer por exemplo se apoderar da coisa, usucapir-se da
coisa, o inquilino por exemplo. Então, o direito estabelece que, ninguém pode
alterar, unilateralmente, o caráter da posse, o caráter da posse é aquela
característica que ela tem quando ela surge, porque o caráter da posse,
responde aquela pergunta, como você adquiriu a posse dessa coisa? Ai, esse
ato inaugural de entrada nessa posse, é o que vai definir o caráter dessa
posse.

Outra regra, é a do 922 do CPC, que é o caráter dúplice da posse, se nós


voltarmos para aquela historia inicial que nós contamos do pretor romano, nós
vamos entender isso perfeitamente, porque o pretor romano quando recebia as
partes, ele tanto poderia conceder a posse para o autor quanto para o réu,
dependendo da história, aquele que estava com a mais de um ano com a coisa
ou então quem tinha a menos de um ano sem violência, clandestinidade ou
precariedade contra a outra parte. Então esse artigo, 922, diz que, se alguém
no direito brasileiro propuser uma ação possessória quanto o outro, esse outro
pode, na contestação, independentemente a reconvenção, alegar que ele é o
possuidor e pedir a proteção desse mesmo juiz da causa possessória, o juiz no
final o que fará, julgara procedente, ou a petição inicial ou a contestação, a
resposta do réu, ou seja, ele vai conferir a posse para uma das duas partes e
essa parte, é a que poderá ficar com a coisa, durante o litígio posterior petitório,
se vier, se acontecer.

Outra regra interessante, quem nunca teve posse não tem direito a proteção
possessória. Então, imagine assim, eu tenho alguma coisa na minha posse,
transmito para uma outra pessoa, essa pessoa para outra, e aquela para outra,
e enfim... segue numa verdadeira cadeia de sucessão. Agora, de repente, a
margem surge uma outra pessoa que se diz possuidor, e ai ele aliena o seu
direito para B, B para C, para D, para H, agora, essa ultima pessoa, que tem
essa pretensão, nessa cadeia sucessória lateral, ela não tem ação
possessória, contra o ultimo da minha cadeia, porque toda cadeia dela, nunca
esteve na posse. Então, é exatamente essa a regra, quem nunca teve posse,
não tem direito a interdito, então toda aquela cadeia sucessória, não tem direito
a interdito.

Outra regra interessante, é que, a ação possessória, o processo possessório,


ele é de cognição parcial, ou seja, ele só cuida do fato, de ver quem vai ficar
com a coisa durante o litígio, que poderá vir a seguir, um litígio petitório, e
exatamente, isso se diz que é um processo especial de cognição parcial, ele
não conhece de todo litígio, ele só conhece de um aspecto dele, que é essa
dimensão provisória da posse.

Outra regra interessante, só se pode ter posse onde se pode ter propriedade e
também só a uso capeão onde se pode ter posse. Então, se alguém quer ter
posse de um terreno público, em princípio, uma praça por exemplo, a praça é
um bem público insuscetível de apropriação privada, então é insuscetível de
posse; um órgão de transplante, por exemplo um coração, ou então, o sangue
que está lá no hospital disponível para cirurgias, esse hospital ele não tem
posse, e portanto ele não tem direito a uso capeão desse sangue, porque é um
bem fora do comércio, ou seja, ele está mais na questão dos direitos de
personalidade do que no campo do direito das coisas, não tem nada a ver com
o direito das coisas, então, isso reflete também na proteção possessória.
Direito autoral, por exemplo, não se protege com um interdito possessório
porque ele tem uma natureza de direito pessoal, ele não incide sobre coisas
corpóreas.

Outra regra interessante é que o possuidor sempre está numa situação mais
favorável do que qualquer outra pessoa que não esteja na posse, ou seja,
perante qualquer direito possessório, ou outro, aquele que está na posse goza
de uma situação privilegiada para o direito, ou seja, a posse sempre é um
ponto de partida para um triunfo em outros aspectos do direito, essa é uma
dimensão importante.

Outra regra interessante, duas pessoas não podem possuir, in solidum, ao


mesmo tempo, esse princípio eu tirei de Lafayette Rodrigues Pereira, do
clássico Direito das Coisas dele. Ou seja, ou a posse nova se instala e a posse
velha se extingue, ou a posse velha se mantém ou se reestabelece e a posse
nova não emplaca, essa é a realidade da situação possessória.

Outra regra interessante, e que eu queria que você considerassem muito, por
que isso é muito importante, nós temos que considerar sempre dois aspectos,
se a posse saiu das mãos do possuidor, contra sua vontade, por exemplo por
esbulho, por violência, ou se saiu com seu beneplácito, por exemplo: se eu dou
em comodato um bem a uma pessoa, esse contrato que eu firmei com essa
pessoa, é ele quem manda, então, saiu espontaneamente da minha mão, eu
me demiti voluntariamente da coisa, e isso da uma outra dimensão. Então, as
vezes, na solução possessória, esse aspecto é decisivo, uma coisa é eu
enfrentar um terceiro que usurpou a minha posse, que se apoderou do que era
meu, e outra coisa é eu lutar contra uma pessoa, um terceiro por exemplo, que
adquiriu de alguém a quem eu transmiti a posse, é muito mais complicada essa
situação, para mim possuidor, do que essa outra situação. Essa regra é muito
importante, não esqueça dela.
Outra regra importante, é a consideração de acessio possessionis e successio
possessionis. Acessio possessionis é a união de posse entre duas pessoas
quando uma transmite posse para a outra entre vivos, por exemplo, eu adquiro
de você uma posse, eu tenho direito pela acessio possessionis de somar a
minha posse a sua, e minha situação pode ficar melhor do que a suapor eu ser
um terceiro de boa fé, por exemplo, você adquiriu de ma fé, mas eu estava de
boa fé quando adquiri de você, então, eu poderei não só fazer a soma das
posses, como também posso deixar de fazê-lo, se isso pode me prejudicar, por
exemplo, no caso de um uso capeão ordinário, isso você pode discutir com o
seu professor, então, nem sempre é conveniente somar as posses. Mas a
acessio possessionis ela se dá nessa dimensão, intervivos, entre um
transmitente e um adquirente. Agora a successio possessionis, ela se dá numa
sucessão universal, mortis causa, quando alguém recebe por herança, qual é a
realidade da successio possessionis? A realidade ou verdade desse deireito é
que, o herdeiro, recebe as coisas das mãos, ou do patrimônio do falecido, na
mesma situação jurídica que se encontrava no patrimônio do falecido, ou seja,
se o falecido, o autor da herança, ou de cujos, e ele possuía de ma fé, o
possuidor, mesmo que Le não tenha sabido, que ele não tenha nenhuma
participação nesse episódio, ele também será possuidor de má fé, por que ele
fica no lugar do morto. Agora, no caso do legatário também, então o legatário
não é herdeiro, mas um dos bens da herança foi deixado para ele por
testamento, mas se esse bem foi mal havido, pelo falecido, esse legatário
também vai ter uma posse com as mesmas características negativas, com os
mesmos vícios, que se continham na mão do falecido.

Foi um prazer ter estado com vocês nessa web aula, muito obrigado, bom
proveito a todos.

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