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Direito das Coisas - POSSE

1. DEFINIÇÕES

– O que é posse?

Teoria subjetiva, de Savigny: animus (vontade de ter a coisa para si) + corpus
(poder físico sobre a coisa)
Teoria objetiva, de Ihering: corpus (poder físico sobre a coisa)

– Crítica de Pontes de Miranda

A teoria subjetiva é ruim, pois existem muitos casos de posse com corpus e
sem animus (exemplo: inquilino, que não necessariamente quer ser dono do
prédio alugado). A teoria objetiva é melhor, mas ainda assim tem defeitos,
porque há casos de posse sem corpus (exemplo: casa na praia, carro no
estacionamento, herdeiro que acaba de receber a herança). Em suma, segundo
Pontes de Miranda, posse é um poder fático: ou seja, a possibilidade de exercer
poder inerente ao domínio sobre a coisa.

2. NATUREZA

– Controvérsias:

Posse é um fato ou um direito?


Se for um direito, é real ou pessoal?

– Pontes de Miranda: posse é um elemento do suporte fático que cria


um direito, e não o próprio direito. Portanto, posse é fato.

– Savigny e Wodon: posse é fato porque independe das regras do


direito (afinal, já existia antes mesmo de serem criadas as leis). Posse
é direito porque produz consequências jurídicas. Portanto, posse é
simultaneamente fato e direito.

– Ihering: posse é um direito, porque trata de um interesse


juridicamente protegido (concepção de direito para o autor). E esse
direito é real porque a relação se dá entre direito e coisa.

– Beviláqua: posse não é direito real porque inexistem outros direitos


reais além dos citados no Código Civil. Posse é, portanto, um direito
especial.

– Rousseau: a posse não é senão o efeito da força, ou o direito do


primeiro ocupante. Não se confunde com propriedade, que funda-se

num titulo positivo. Portanto, posse é fato.

– Jurisprudência: algumas decisões consideram que a posse é um


direito (real) porque o Código Civil exige a outorga uxória em ações
possessórias.

– Conclusão: a forma mais fácil e segura de enfrentar a questão é


assumir que a posse é fato. Não só pela abundância de argumentos
em defesa da tese, mas também porque se assumirmos que a posse é
direito, será necessário encarar uma sinuca de bico ao discutir se esse
direito é real ou pessoal. Real ele não poderá ser, pois nosso Código
Civil não inclui a posse na lista do art. 1.225 (que elenca os direitos
reais). E também não poderá ser pessoal, já que o Código Civil aborda
a posse separadamente, no livro III (de Direito das Coisas), e não na
parte do Código que trata de contratos. Por fim, também não poderá
ser direito especial, como defendeu Beviláqua, pois se trata de uma
heresia jurídica: só existem dois tipos de direitos, que são reais e
pessoais (os reais são os elencados taxativamente no Código, e todos
os outros são pessoais). Direito especial não existe!

3. CLASSIFICAÇÃO

Posse indireta: é a daquele que cede o uso do bem (exemplo: locador);


Posse direta: é a daquele que recebe o bem, para usá-lo ou gozá-lo,
temporariamente, em virtude de contrato (ex: inquilino);
– Observação: é possível haver mais de um possuidor indireto para o
mesmo bem. Exemplo: usufrutuário que aluga o imóvel para terceiro.
Teríamos, então: nu-proprietário (posse indireta), usufrutuário (posse
indireta), e inquilino (posse direta).
– Efeitos: ambos podem defender a posse, inclusive um contra o outro.
Ademais, há divisão de despesas: algumas competem ao possuidor
direto, outras ao indireto.

Posse natural: quem detém o bem. Exemplo: capatás que recebe um pedaço
pequeno da terra para viver. Com o fim do vínculo trabalhista, acaba a
detenção, e se o detentor insistir em ficar, cometerá esbulho ou turbação.
Posse civil: quem é dono, nos termos da lei.

Composse: duas pessoas que possuem a mesma coisa. Exemplos:


condomínio; irmãos que herdaram um prédio.
– Efeitos: ambos podem entrar com possessória.

Posse justa: não for derivada de violência, clandestinidade ou precariedade.


Posse injusta: derivada de violência, clandestinidade ou precariedade.
– Observação 1: violência = adquirida pela força física ou violência
moral. Exemplo: invasão de terra produtiva.
– Observação 2: clandestinidade = estabelecida às ocultas daquele que
tem interesse em conhecê-la. Exemplo: invasão à noite, às
escondidas, sem violência, para mudar posição da cerca, com o
objetivo de apropriar-se de parte do terreno.
– Observação 3: precariedade = originada do abuso de confiança por
parte de quem recebe a coisa com o dever de restitui-la. Exemplo:
não devolução de imóvel em comodato, ao fim do contrato.
– Efeitos: atos violentos, clandestinos ou precários não autorizam a
aquisição da posse. A violência e a clandestinidade cessam, mas a
precariedade não.

Posse de boa-fé: quando o possuidor desconhece eventual vício da posse.


Exemplo: cliente que compra, num mercado renomado, Nescau barato, mas
que era fruto de carga roubada.
Posse de má-fé: possuidor tem ciência da ilegitimidade de seu direito de
posse. Exemplo: pessoa que compra celular, de um vendedor na rua, um celular
de última geração por um valor muito baixo. Nesse caso, é difícil acreditar que
o comprador não desconfiava que o produto fosse roubado.
– Observação: geralmente a posse de boa-fé anda junto com justa; e de
má-fé anda junto com a injusta. O exemplo de posse de boa-fé
apresentado é um dos possíveis (mas raros) casos em que a posse é
injusta, mas de boa-fé.
– Efeitos: a boa-fé garante o direito à indenização por benfeitorias
necessárias e úteis (art. 1219 do Código Civil). Ademais, a boa-fé
autoriza o usucapião ordinário (art. 1242 do CC).

Posse nova: aquela que tem menos de 1 ano e 1 dia.


Posse velha: aquela que tem mais de 1 ano e 1 dia.
– Efeitos: na posse nova, a reintegração ou manutenção pode ser liminar
em ação possessória. Na velha, não.

Posse provisória: posse, simplesmente. Termo é utilizado em alguns poucos


artigos do Código Civil.
Posse definitiva: propriedade. O termo é juridicamente pouco usado, e
inexiste no Código. Pode ser utilizado para se referir à transformação do
possuidor em proprietário.

Posse ad interdicta: pode ser protegida por interditos possessórios caso for
ameaçada, turbada, esbulhada ou perdida.
Posse ad usucapionem: preenche os requisitos para usucapião.
– Visão heterodoxa de Sérgio José Porto: só a posse ad usucapionem é
posse. A ad interdicta é mera detenção, pois só outorga direitos aos
interditos.
4. AQUISIÇÃO E PERDA

4.1. Aquisição - artigos 1204 a 1209 do Código Civil

– Como e quando a posse é adquirida?

Art. 1.204. Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o


exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.

– Quem pode adquirir a posse?

Art. 1.205. A posse pode ser adquirida:


I - pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante;
II - por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.

A palavra representante, no inciso I, deve ser entendida no seu mais amplo


sentido, e remete aos incapazes e às pessoas jurídicas. Há uma controvérsia
doutrinária em razão do art. 1689 do Código, que preconiza que pai e mãe são
usufrutuários dos bens dos filhos. Sob esse raciocínio, há quem diga que um
menor não pode adquirir (já que quem adquire é o representante), e nem
exercer a posse (já que ela é exercida pelos pais). Tal discussão, contudo, fica
apenas no plano da teoria, pois, na prática, menores adquirem e exercem a
posse (exemplo: quando uma criança vai no mercadinho comprar um sorvete).
A situação confirma a posse como fato, e não como direito.

O exemplo mais comum do inciso II é quando uma pessoa não está em casa, e
um vizinho recebe uma encomenda para ela.

– Transmissão da posse

Art. 1.206. A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com


os mesmos caracteres.

Por exemplo: se uma pessoa tinha uma posse injusta, e vem a óbito, a posse
recebida por seus sucessores continuará sendo injusta.

Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor;


e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os
efeitos legais.

Sucessor universal é aquele que recebe uma cota indeterminada. Geralmente,


ocorre por mortis causa. Já o sucessor singular é aquele que adquire um bem
determinado, individualizado. Nesse caso, a palavra sucessor deve ser
entendida num sentido mais amplo, podendo ser sim um herdeiro, mas também
um comprador ou donatário.

Unir as posses significa, basicamente, somar os tempos de posse. É relevante


para usucapião. Contudo, traz uma consequência negativa: se a posse for
somada, ela traz consigo seus vícios anteriores. Então, por exemplo: se uma
posse é de má-fé, e os tempos foram somados, a má-fé passa também para o
sucessor.

Tal artigo pode ser chamado de “lavanderia da posse”, pois abre brecha para
“limpar os vícios”. Pode não ser a solução mais justa, mas foi a mais prática
encontrada pelo legislador. Por exemplo: seria controverso responsabilizar o
proprietário atual de uma terra porque ela foi adquirida de maneira injusta no
século XIX.

Observação: não existe ato formal de soma das posses ou renúncia.

– Casos que não autorizam a aquisição da posse

Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim
como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão
depois de cessar a violência ou a clandestinidade.

O dispositivo trata de dois assuntos diferentes.

Diferença entre permissão e tolerância: a primeira é expressa, a segunda é


tácita. Caso mais comum: fazendeiro que deixa o vizinho passar por sua terra,
para chegar até a dele. Essa parte foi criada pelo legislador para impedir
usucapião da passada. Na prática, apesar do argumento existir, a chance de
derrota em disputa judicial é grande.

Indivíduo só adquire a posse após o fim da violência ou clandestinidade. Então,


por exemplo: o ladrão, após o roubo de um carro, passa a ser seu possuidor.

– Coisas móveis em imóveis

Art. 1.209. A posse do imóvel faz presumir, até prova contrária, a das coisas
móveis que nele estiverem.

Tal artigo é útil em inventários, já que, geralmente, não se fazem inventários de


bens móveis.

4.2. Perda - artigos 1223 e 1224 do Código Civil

– Quando a posse é perdida?

Art. 1.223. Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do


possuidor, o poder sobre o bem, ao qual se refere o art. 1.196.

Coerência com o artigo 1204: a posse é adquirida quando o indivíduo começa a


exercer poder sobre o bem, e é perdida quando o indivíduo deixa de exercer o
poder sobre o bem.

Art. 1.224. Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o


esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou,
tentando recuperá-la, é violentamente repelido.

Exemplo: professor Marcelo é um fazendeiro rico, que dá aula somente por


hobbie. No meio da aula, recebe uma ligação de seu capatás informando que
sua terra foi invadida. Se ele continua dando aula, e se abstém de retomar sua
fazenda, considera-se a posse perdida. Se ele, ao receber a notícia, vai
correndo para a terra, e é violentamente repelido, também considera-se a
posse perdida. Em que hipótese, então, a posse não seria perdida? Quando a
tentativa de recuperá-la for bem sucedida.

5. EFEITOS

5.1. Interditos possessórios (ações possessórias)

– Tipos de ações possessórias

Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de


turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver
justo receio de ser molestado.

Ação de manutenção de posse = turbação; significado de turbação = ato que


embaraça o livre exercício da posse. Exemplo:
Ação de reintegração de posse = esbulho; significado de esbulho = ato pelo
qual o possuidor se vê despojado da posse. Exemplo: empregado que deixa de
restituir a casa que recebeu de moradia.
Interdito proibitório = ameaça de turbação ou esbulho.

Observação de Vicente Greco Filho = “costuma-se dizer que a turbação é o


esbulho parcial. (…) Se o agente (…) passa a exercer posse exclusiva sobre área
parcial do imóvel, cometeu esbulho dessa parte, e não turbação, porque, nessa
parte, excluiu totalmente a posse do outro”.

Que bom exemplo de turbação, então, podemos citar? O proprietário de gado


que deixa a cerca que o separa do vizinho cair, para que o gado passe a comer
a pastagem do vizinho. Como o vizinho não perdeu a posse, não se trata de
esbulho. É, portanto, turbação, já que se trata de um ato que embaraça o livre
exercício da posse. O vizinho pode entrar com ação de manutenção de posse.

Ressalte-se, ainda, a fungibilidade do art. 554 do Código de Processo Civil,


segundo o qual, ainda que o advogado erre na hora de entrar com a ação
possessória, o juiz não deixará de apreciar o pedido.

– Reações legítimas à turbação ou esbulho


§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por
sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço,
não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.

Legítima defesa da posse = cabe em manutenção da posse; deve ser feita


usando moderadamente os meios necessários.
Desforço (significado: reparar ofensa) imediato = cabe em reintegração da
posse; contanto que o faça moderadamente e logo. Ou seja, a reação não
pode demorar.

– Exceção do domínio

§ 2o Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de


propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.

Tal artigo preconiza que, nas ações possessórias, é irrelevante a exceção de


domínio, ou seja, a alegação das partes de que têm o domínio do bem objeto da
ação possessória. Ou seja, se o réu esbulhados se defender alegando que é
dono da coisa esbulhada, seu argumento não será levado em consideração,
pois nas ações possessórias discute-se posse, e não propriedade.

Exceção: súmula 487 do STF. “Será deferida a posse a quem, evidentemente,


tiver o domínio, se com base neste for ela disputada.”

Doutrina: “Na ação possessória, incumbe ao autor invocar e demonstrar sua


qualidade de possuidor. O réu, por sua vez, deve defender-se alegando melhor
posse. Mas, se ambos, além disso, se qualificarem como proprietários,
sustentando tal qualidade no bojo da ação possessória, o juiz (apenas nesse
caso) poderia julgar com base na propriedade. É preciso que ambos, embora
disputando a posse, o façam apoiando-se na qualidade de proprietários”.

– Com quem fica a posse no curso da ação possessória?

Art. 1.211. Quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-se-á


provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que a obteve de
alguma das outras por modo vicioso.

A posse, provisoriamente, fica com quem está.

– Ação possessória contra terceiro

Art. 1.212. O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização,


contra o terceiro, que recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era.

Em regra, o indivíduo não pode entrar com ação possessória contra terceiro de
boa fé. Mais uma vez, o exemplo do cliente que compra, num mercado
renomado, Nescau barato, mas que era fruto de carga roubada. O cliente
comprou de boa fé. Então o proprietário da carga roubada não pode entrar com
ação possessória contra o cliente. Contudo, se o terceiro sabia que a coisa era
esbulhada, é possível entrar com a ação. Exemplo: pessoa que compra, de um
vendedor na rua, um celular furtado, sabendo que o era.

– Interdito proibitório

O Código Civil pouco fala do interdito proibitório. O CPC é mais rico.

Art. 567, do CPC. O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de ser
molestado na posse poderá requerer ao juiz que o segure da turbação ou
esbulho iminente, mediante mandado proibitório em que se comine ao réu
determinada pena pecuniária caso transgrida o preceito.

Em suma, o interdito serve para pedir ao juiz que comine multa ao possível
agressor, caso ele cometa turbação ou esbulho. Exemplo: fazendeiro que
enxerga o MST acampado em frente a sua propriedade, e teme que ela seja
invadida. Ele pode pedir ao juiz que multe o MST, caso ele realmente invada a
propriedade. Na prática, o dispositivo não funciona muito bem. Como é
possível multar o MST se o movimento não tem CNPJ, e nem dinheiro?

Se a ameaça se confirmar, é necessário petição ou uma nova ação? Uma parte


minoritária dos autores consideram que uma petição é suficiente. Seguindo
esse raciocínio, o interdito proibitório serve para agilizar as coisas. Contudo, a
maior parte da doutrina considera que, caso confirmada a ameaça, será
necessário ajuizar nova ação.

– Imissão de posse

Não há previsão nem fundamento, mas a doutrina defende o cabimento nos


termos do CPC de 1939.

Art. 381. Compete a ação de imissão de posse:


I – aos adquirentes de bens, para haverem a respectiva posse, contra os
alienantes ou terceiros, que os detenham;
II – aos administradores e demais representantes das pessoas jurídicas de
direito privado, para haverem dos seus antecessores a entrega dos bens
pertencentes à pessoa representada;
III – aos mandatários, para receberem dos antecessores a posse dos bens do
mandante.

O inciso I se refere aos casos em que pessoas “compram casa com gente
dentro”. É uma situação problemática, pois quem está na posse do bem pode
ter benfeitorias a serem indenizadas. Ademais, o sujeito que lá está pode alegar
usucapião. De qualquer forma, a imissão de posse serve para quem adquiriu o
bem obter a sua posse. Há, ainda, a possibilidade alternativa de entrar com
ação reivindicatória.

Já o inciso II serve para os novos representantes de uma pessoa jurídica


haverem dos antecessores a entrega dos bens pertencentes à pessoa
representada. Exemplo: ex-reitora da Urcamp, ao deixar o cargo, leva alguns
bens da universidade consigo. O novo reitor, então, pode ajuizar uma imissão
de posse para que a antiga reitora devolva os bens da universidade. Há
também, ainda, a possibilidade alternativa de entrar com ação reivindicatória.

O inciso III é a mesma situação do inciso II, com a diferença de que se trata de
pessoa física, e não jurídica. Nesse caso, não cabe ação reivindicatória.

Observação: não confundir imissão de posse (ação judicial) com imissão na


posse (ato judicial). A imissão na posse confere ao interessado a posse de
determinado bem a que faz jus e da qual está privado, geralmente por meio de
mandado. Exemplo: art. 538 do CPC.

Art. 538. Não cumprida a obrigação de entregar coisa no prazo estabelecido na


sentença, será expedido mandado de busca e apreensão ou de imissão na
posse em favor do credor, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel.

Caso excepcional que justifica a existência da imissão de posse, já que


nenhuma outra ação é cabível: caso do compromissário-comprador que não
recebe a posse do imóvel do vendedor. Ele não pode entrar com reivindicatória,
pois ainda não é dono do imóvel. Também não pode entrar com possessória,
pois nunca teve a posse. E tampouco poderá entrar com despejo, pois o
vendedor não era inquilino. Portanto, nesse caso, somente é possível entrar
com imissão de posse.

– Embargos de terceiros

É uma ação de manutenção ou reintegração quando quem cometeu o esbulho


ou a turbação foi o Poder Judiciário.

Exemplo real: uma revenda de automóveis na cidade vendia o mesmo carro


duas vezes; uma para o comprador legítimo, outra para um laranja. O
comprador legítimo pagava as prestações fielmente, enquanto o laranja não
pagava nada. Após alguns meses, o Poder Judiciário apreendia o carro do
comprador legítimo, devido ao não pagamento de prestações. Como se tratava
de uma fraude, e o comprador legitimo pagava rigorosamente as prestações,
ele poderia entrar com embargos de terceiros. Afinal, ele não tinha nada a ver
com com a dívida do laranja com o banco.

5.2. Frutos

Definição de Clóvis Beviláqua: frutos são “utilidades que a coisa produz


periodicamente, cuja percepção mantém intacta a substância do bem que as
gera”. Exemplos: uva, que é produzida periodicamente, e mantém a parreira
intacta; leite, que é produzido periodicamente, e mantém a vaca intacta.

– Classificação dos frutos para melhor entendimento do Código


Civil:

Frutos percebidos: colhidos.


Frutos pendentes: não colhidos.
Frutos percipiendos: deveriam ter sido colhidos, mas não foram.
Frutos naturais: provém naturalmente da coisa. Exemplo: leite, frutas, animais,
etc.
Frutos industriais: provém da ação humana. Exemplo: produção de uma fábrica.
Frutos civis: provém de uma relação jurídica. Exemplo: aluguéis, juros, etc.

– Frutos aos possuidores de boa-fé

Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos
percebidos.
Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem
ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio;
devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação.

Caso fático que exemplifica o caput: uma pessoa que herdou uma empresa de
10 milhões do pai há cinco anos. Hoje, a empresa vale 50 milhões, devido ao
empenho dele. Agora, essa pessoa descobriu que tem uma irmã, que deveria
ter recebido metade da herança. Problemática: a irmã deve receber metade de
quanto o patrimônio valia na época, ou de quanto ele vale hoje? Resposta:
como a pessoa era possuidora de boa-fé, ela tem direito a todos os frutos.
Portanto, a irmã tem direito somente a metade do patrimônio da época, e não
do atual.

O parágrafo do citado artigo trata de uma situação bem rara: quando o


possuidor tinha boa-fé, e depois a boa-fé cessa.

– Quando os frutos reputam-se colhidos?

Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos,


logo que são separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia.

Ou seja, a uva reputa-se colhida após ser retirada da parreira. O carro reputa-
se colhido após sair da linha de produção. Os juros reputam-se percebidos dia
por dia.

– Frutos aos possuidores de má-fé

Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e


percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o
momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção
e custeio.

5.3. Danos

– Danos causados pelo possuidor de boa-fé

Art. 1.217. O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da


coisa, a que não der causa.

Exemplo: brinquedo que uma criança pega emprestado de outra, e acaba


“quebrando na mão” daquela que pegou emprestado, sem que ela tenha culpa.
Nesse caso, o possuidor não responde pela perda.

– Danos causados pelo possuidor de má-fé

Art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da


coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado,
estando ela na posse do reivindicante.

Em regra, portanto, o possuidor de má-fé responde pela perda ou deterioração,


ainda que acidental. A única exceção é nos casos fortuitos ou de força maior.
Exemplo: casa, na posse do possuidor de má-fé, que foi danificada por alguma
força da natureza. O possuidor, nesse caso, não responde pela perda ou
deterioração.

5.4. Benfeitorias

– Benfeitorias do possuidor de boa-fé

Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias


necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas,
a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o
direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.

Voluptuárias = mero deleite ou recreio. Exemplo: piscina. Podem ser levantadas


pelo possuidor (se possível) se não forem pagas pelo proprietário.
Úteis = aumentam ou facilitem o uso do bem. Exemplo: banheiro novo,
garagem, etc.
Necessárias = têm por fim conservar o bem. Exemplo: consertos, pintura, etc.

Indenização Retenção Levantamento


Necessárias Sim Sim Não
Úteis Sim Sim Não
Voluptuárias* Sim Não Sim
Indenização Retenção Levantamento
Necessárias Sim Sim Não
Úteis Sim Sim Não
Voluptuárias* Sim Não Sim
* Ou levanta (retira), ou recebe indenização. Se o proprietário fizer questão de
indenizar, o possuidor não poderá levantar.

Jurisprudência: concessionária não pode reter veiculo para exigir pagamento


de conserto. Isso porque a concessionária é detentora, e não possuidora.
Portanto, não há direito de retenção.

– Benfeitorias do possuidor de má-fé

Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias


necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem
o de levantar as voluptuárias.

Exemplo dado pelo professor no início da matéria, em que a pessoa, prestes a


ser despejada, é aconselhada pelo advogado a fazer um pequeno banheiro na
casa, de modo a exigir a reter o imóvel pela falta de indenização. Isso não é
possível graças ao referido artigo.

Indenização Retenção Levantamento


Necessárias Sim Não Não
Úteis Não Não Não
Voluptuárias* Não Não Não

– Relação de benfeitorias e danos

Art. 1.221. As benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao


ressarcimento se ao tempo da evicção ainda existirem.

Evicção = perda da posse por determinação judicial. Exemplo: despejo.

Benfeitorias podem deixar de existir? Sim, exemplo: pintura.

– Qual valor das benfeitoras deve ser considerado?

Art. 1.222. O reivindicante, obrigado a indenizar as benfeitorias ao possuidor de


má-fé, tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu custo; ao
possuidor de boa-fé indenizará pelo valor atual.

O reivindicante pode escolher indenizar o possuidor de má-fé tendo como base


o valor atual ou seu custo à época corrigido (geralmente, o que for menor).
Quando o possuidor é de boa-fé, o valor a ser indenizado é o atual.

5.5. Legitimação da Posse

Previsto na Lei 13.465/17. A legitimação da posse confirma que a posse é um


fato. Trata-se de um instrumento de regularização fundiária, para que o poder
público confira título, de modo a reconhecer posses irregulares.

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