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1 INTRODUÇÃO

Antes de nos aprofundarmos no estudo da posse, é de grande


importância que façamos uma rápida distinção entre posse e propriedade.
Estes conceitos são comumente utilizados como sinônimos na linguagem
coloquial, entretanto no mundo jurídico eles possuem significados
totalmente diferentes.
Posse diz respeito ao estado da coisa que está sendo possuída por
alguém ou que essa pessoa guarda consigo. Já a propriedade está
relacionada ao domínio da coisa, a quem esta coisa pertence.

2 NATUREZA JURÍDICA
É profunda e antiga a divergência sobre a natureza jurídica da
posse. Indaga-se, inicialmente, se a posse é um fato ou um direito. Essa
divergência já era observada nos textos romanos. Muitos séculos se
passaram e a discussão ainda persiste, dividindo-se a doutrina em três
correntes.
A teoria da posse como um direito subjetivo está baseado nos
estudos de Ihering. Para ele, “os direitos são os interesses juridicamente
protegidos”. Como a posse é um interesse juridicamente protegido, o
mesmo classifica a posse como um direito.
Outra corrente sustenta que a posse é um fato, uma vez que não
tem autonomia, não tem valor jurídico próprio. O fato possessório não
está subordinado aos princípios que regulam a relação jurídica.
A corrente mais comum é a eclética, que admite que a posse seja
um fato e um direito. A posse seria por si só um fato, mas um direito em
relação a seus efeitos.

3 TEORIAS SOBRE A POSSE

3.1 Teoria subjetiva de Savigny


Para Savigny, a posse é composta pela junção de dois elementos o
corpus e o animus. O corpus consiste na detenção física da coisa, estar
em contato físico com a coisa, e o animus é o elemento subjetivo, que se
encontra na intenção de possuir a coisa.
A teoria se diz subjetiva em razão do animus. Este último elemento
consiste na intenção de exercer sobre a coisa um poder de interesse
próprio e defende-la contra a intervenção de outrem. Não é propriamente
a convicção de ser dono, mas a vontade de tê-la como sua, de exercer o
direito de propriedade como se fosse o seu titula.
Os dois citados elementos são indispensáveis, pois, se faltar o
corpus, inexiste posse, e, se faltar o animus, não existe posse, mas mera
detenção. A teoria se diz subjetiva em razão deste último elemento. Para
Savigny adquire-se a posse quando, ao elemento material (poder físico
sobre a coisa), vem juntar-se o elemento espiritual, anímico (intenção de
tê-la como sua).
Não constituem relações possessórias, portanto, na aludida teoria,
“aquelas em que a pessoa tem a coisa em seu poder, ainda que
juridicamente fundada (como na locação, no comodato, no penhor etc.),
por lhe faltar a intenção de tê-la como dono (animus domini), o que
dificulta sobremodo a defesa da situação jurídica.
Seguindo a linha de pensamento de Savigny, deveríamos dar
proteção jurídica ao ladrão que roubou a coisa e agora possui o corpus e o
animus domini. Enquanto não daríamos proteção de posse ao locatário,
que apesar possuir o corpus, não possui o animus.
Outro problema da teoria é que consideraríamos que o dono do
veículo que entrou no cinema e o deixou no estacionamento perderia sua
posse, já que não está mais em contato físico com a coisa.
Para suprir estas falhas tanto o conceito do corpus como o do
animus sofreram mutações na própria teoria subjetiva. O primeiro,
inicialmente considerado simples contato físico com a coisa (é, por
exemplo, a situação daquele que mora na casa ou conduz o seu
automóvel), posteriormente passou a consistir na mera possibilidade de
exercer esse contato, tendo sempre a coisa à sua disposição.

3.2 Teoria objetiva de Ihering


A teoria de Ihering é chamada de objetiva porque não dá
importância ao animus, ele dá ênfase ao corpus. Sendo necessário apenas
o elemento objetivo par se caracterize a posse. Entretanto, para Ihering, o
corpus não significa o contato físico da coisa, mas sim conduta de dono.
Tem posse quem se comporta como dono.
A conduta de dono pode ser analisada objetivamente sem a
necessidade de pesquisar a intenção do agente. A posse, então, é a
exteriorização da propriedade, ela é protegida, em resumo, porque
representa a forma como a propriedade se manifesta.
Assim, “o lavrador que deixa sua colheita no campo não a tem
fisicamente; entretanto, a conserva em sua posse, pois que age, em
relação ao produto colhido, como o proprietário ordinariamente o faz. Mas,
se deixa no mesmo local uma joia, evidentemente não mais conserva a
posse sobre ela, pois não é assim que o proprietário age em relação a um
bem dessa natureza.
Para se configurar a posse basta, portanto, atentar no
procedimento externo, uma vez que o corpus constitui o único elemento
visível e suscetível de comprovação. Para demonstrar a posse de minha
casa, de meu gato etc., diz Ihering, “não tenho necessidade de provar que
adquiri a posse; salta aos olhos que eu possuo.
Os materiais de construção não se guardam dentro de casa, por
isso, se estes materiais estão postos do lado de fora da casa, não significa
que não constituem posse de alguém. Assim como não se larga dinheiro
ou objetos preciosos em pleno campo, estes objetos, portanto,
certamente não são possuídos. Cada qual sabe o que fazer com estas
coisas, segundo a sua diversidade, e este aspecto normal da relação do
proprietário com a coisa constitui a posse.
Para Ihering, portanto, a posse não é o poder físico, e sim a
exteriorização da propriedade. Indague-se, diz o aludido jurista, como o
proprietário costuma proceder com as suas coisas, e saber-se-á quando se
deve admitir ou contestar a posse.
Certamente constituem atitudes diferentes apanhar uma nota de
dois reais que está largada na rua e pegar esta mesma nota diretamente
da bolsa de uma mulher.
Ihering afirma que o dinheiro jogado na rua está perdido, pois este
está nessa situação contra a vontade de seu dono. O mesmo não se pode
falar do material de construção que está na rua, pois este está
exatamente o dono queria que estivesse.
Embora, no entanto, a posse possa ser considerada uma forma de
conduta que se assemelha à de dono, aponta a lei, expressamente, as
situações em que tal conduta configura detenção e não posse. Assim, não
é possuidor o servo na posse, aquele que conserva a posse em nome de
outrem, ou em cumprimento de ordens ou instruções daquele em cuja
dependência se encontre.

4 CONCEITO DE POSSE
O Direito Positivo Brasileiro acolheu a teoria positiva de Ihering a
respeito da posse. Entretanto, o Código Civil traz seu próprio conceito de
posse, que é retirado da inteligência do art. 1.196:  Considera-se
possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de
algum dos poderes inerentes à propriedade.
Para melhor compreensão deste conceito é necessário
entendermos os poderes inerentes à propriedade, que são: usar, gozar e
dispor da coisa. Apenas o proprietário exerce de fato estes três poderes.
Por outro lado, o possuidor poderá apenas usar e gozar da coisa.
O artigo 1.198 nos traz o conceito de detentor ao dizer que:
Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência
para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de
ordens ou instruções suas.
Isto quer dizer que nem sempre aquele que estiver na posse será
considerado possuidor. Caso esteja na posse em cumprimento de ordens
ou instruções, ou em nome do possuidor, este será mero detentor. É o
que ocorre com o caseiro ou o locatário, que apesar de usarem e gozarem
das coisas, apenas o fazem por determinação do possuidor.
Outros exemplos de detenção são citados por Pontes de Miranda: a
situação do soldado em relação às armas e à cama do quartel; a dos
funcionários públicos quanto aos móveis da repartição; a do preso em
relação às ferramentas da prisão com que trabalha; a dos domésticos
quanto às coisas do empregador. Em todas essas hipóteses, aduz, o que
sobreleva é a falta de independência da vontade do detentor, que age
como lhe determina o possuidor.

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