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Direito das Obrigações II

Formação dos contratos


O contrato é um negócio designado de bilateral ou até plurilateral, uma vez que, por vezes, regulam
interesses de mais de duas partes, como por exemplo, o contrato de sociedade.

A cada passo, os sujeitos vinculam os seus interesses através da manifestação da sua vontade – princípio
da liberdade contratual no art.º 405º CC.

A proposta
Na situação mais comum, em que existem duas partes, uma demonstra à outra a sua intenção de se
vincular contratualmente. A outra parte manifestará, ou não, a sua concordância.

À manifestação da vontade do primeiro chamamos proposta e à do segundo aceitação. A proposta e a


aceitação podem ser simultâneas (contrato entre presentes) ou podem ser afastadas no tempo (contrato
entre ausentes).

O nº 1 do art.º 228º CC diz que a proposta de contrato obriga o proponente. Tal não significa que da
proposta emerge um vínculo contratual. A proposta, por si só, não constitui fonte de obrigação. O que o
legislador pretende significar é que em princípio, a proposta é irrevogável, isto é, o seu autor não pode
retirá-la. De acordo com o CC há que distinguir dois momentos:
 Até ao recebimento ou conhecimento da proposta: a proposta é revogável sem qualquer
responsabilidade para o seu autor. Se a revogação for conhecida antes ou em simultâneo com a
proposta, fica sem efeito;
 Depois do recebimento ou conhecimento da proposta: é irrevogável – art.º 228º e 230º.

Validade da proposta
Em princípio, a proposta tem um prazo de eficácia (validade) que é definido de acordo com as regras
previstas no art.º 228º CC. A proposta caduca, ficando automaticamente sem efeito, se decorrer o
respetivo prazo fixado pelo proponente, sem este ter recebido ou conhecido a aceitação. Nas situações em
que o proponente não fixou um prazo, teremos de distinguir duas situações:
 Pediu uma resposta imediata: o prazo é o necessário para que a proposta e aceitação cheguem aos
respetivos destinatários – art.º 228º, nº1, b) CC.
 Não pediu uma resposta imediata: o prazo é o anterior acrescido de cinco dias – art.º 228º, nº1, c)
CC.

Conteúdo da proposta
A proposta deve ser formulada com os elementos e requisitos necessários para que se enquadre no
contrato, sem necessidade de ulteriores modificações ou aperfeiçoamentos: quanto à forma, deve
obedecer à exigida para o contrato; quanto ao conteúdo deve conter todos os elementos específicos deste.

Se o destinatário diz que aceita a proposta, mas introduz-lhe aditamentos, alterações ou modificações, não
há aceitação, mas sim rejeição – art.º 233º CC. Nesse caso vale como uma nova proposta (contraproposta).
A aceitação não tem de ser, necessariamente, expressa, pode ser tácita, desde que demonstre,
inequivocamente, a intenção de a aceitar – art.º 234º CC.

A aceitação, tal como a proposta, torna-se irrevogável uma vez recebida ou conhecida pelo proponente. Se
o destinatário rejeitar a proposta e posteriormente aceitar a mesma, é esta válida desde que tenha
chegado ao conhecimento do proponente em simultâneo ou antes da rejeição – art.º 235º CC.

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Se o destinatário falecer ou for declarado incapaz antes da aceitação, a proposta caduca – art.º 231º, nº2
CC. Se o proponente falecer ou se tornar incapaz antes de conhecer a aceitação, nada obsta à conclusão do
contrato, salvo vontade expressa ou presumida do autor em contrário – art.º231º, nº1 CC.

Culpa na formação dos contratos


Aquele que proceder com culpa na formação dos contratos responderá perante o outro pelos que assim
lhe causar (culpa in contrahendo) – art.º 227º CC. As partes devem de agir de acordo com as regras de boa-
fé quer durante a fase negociação dos contratos, quer na fase de conclusão dos mesmos. Podem existir
três situações:
 As negociações interrompem-se e, portanto, o contrato não chega a concluir-se (responsabilidade
pré-contratual) – os danos a indemnizar correspondem aos danos que o interessado sofreu por ter
deixado de ver satisfeito o seu interesse, tal como definido;
 O contrato conclui-se, mas sofre de invalidade ou ineficácia;
 O contrato conclui-se válida e eficazmente, mas o modo como foi celebrado gera para uma das
partes danos a indemnizar.

Efeito dos contratos


Os contratos, uma vez celebrados, tornam-se vinculativos, produzido os efeitos que lhe são próprios:
 por um lado, o contrato deve ser pontualmente cumprido – art.º 406º CC;
 por outro lado, uma vez que vincula as partes, não pode modificar-se ou extinguir-se senão por
novo acordo das partes – art.º 406º, nº1 CC.

Por regra, os efeitos dos contratos limitam-se às partes. Como partes devem considerar-se os contraentes
e os seus sucessores. Os contratos só produzem efeitos em relação a terceiros nos casos especialmente
previstos na lei – art.º 406º, nº2 CC. Os contratos não produzem apenas efeitos obrigacionais. Produzem
também efeitos reais, consistindo na constituição, modificação ou extinção de direitos sobre as coisas.

A reserva de propriedade é uma alienação sob condição suspensiva – art.º 409º CC. Quando se aliena uma
coisa sob reserva de propriedade apenas se suspende o efeito translativo; os outros efeitos do negócio
produzem-se imediatamente, mas a transferência de propriedade fica dependente de evento futuro que,
em regra, será o cumprimento total das obrigações da outra parte.

Espécies de contratos
A ampla consagração da regra da livre contratação – art.º 405º - faculta aos interessados o recurso a vários
arranjos contratuais:
 Por um lado, podem ser celebrados contratos cujo modelo abstrato a lei descreve, definindo os
seus elementos e estatuindo os seus efeitos – contratos típicos ou nominados.
 Por outro lado, as partes podem adotar outros modelos – contratos atípicos ou inominados.

Contratos mistos: resultam da fusão de dois ou mais contratos ou partes de contratos distintos, ou da
inclusão num contrato de aspetos próprios do outro. Existe sempre uma fusão.

União de contratos: aqui os contratos mantêm-se diferenciados, conservando a sua individualidade:


cumulam-se, não se fundem.

Quanto ao modo de formação, os contratos distinguem-se em:


 Formais: aqueles em que a manifestação da vontade das partes tem de revestir uma certa forma,
legalmente prescrita, sob pena de nulidade – art.º 219º e 220º CC;
 Não formais: todos os outros.

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Os contratos
No Livro II do Código Civil II

Contratos de Alienação:
 Compra e venda: é o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito,
mediante um preço – art.º 874º CC.
 Troca ou Permuta
 Doação: é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberdade e à custa do seu património,
dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do
outro contraente – art.º 940º CC.

Contratos de Concessão de Gozo:


 Locação: é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário
de uma coisa, mediante retribuição. A locação diz-se arrendamento quando versa sobre um imóvel,
aluguer quando incide sobre coisa móvel – art.º 1022º e 1023º CC.
 Parceria Pecuária: é o contrato pelo qual uma ou mais pessoas entregam a outra ou outras um
animal ou certo número deles, para estas os criarem, pensarem e vigiarem, com o ajuste de
repartirem entre si os lucros futuros em certa produção – art.º 1121º CC.
 Comodato: é o contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra certa coisa, móvel ou
imóvel, para que se sirva dela, com a obrigação de a restituir – art.º 1129º CC.

Contratos de Concessão de Crédito:


 Mútuo: é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível,
ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade – art.º 1142º CC.

Contratos de Sociedade:
 Sociedade: é aquele em que duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços
para o exercício em comum de certa atividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de
repartirem os lucros resultantes dessa atividade – art.º 980º.

Contratos de Prestação de Serviços: é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra
certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição – art.º 1154º CC.
 Mandato: é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais atos jurídicos por
conta da outra – art.º 1157º CC.
 Depósito: é o contrato pelo qual uma das partes entrega à outra uma coisa, móvel ou imóvel, para
que a guarde, e a restitua quando for exigida – art.º 1185º CC.
 Empreitada: é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa
obra, mediante um preço – art.º 1207º CC.

Contratos de Renda:
 Renda Perpétua: é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa soma de dinheiro, ou
qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a segunda se obriga, sem limite de tempo, a
pagar, como renda, determinada quantia em dinheiro ou outra coisa fungível – art.º 1231º CC.
 Renda Vitalícia: é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa soma de dinheiro, ou
qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a segunda se obriga a pagar certa quantia
em dinheiro ou outra coisa fungível durante a vida do alienante ou de terceiro – art.º 1238º CC.

Contratos de Jogo e Aposta:


 Jogo e Aposta: não são contratos válidos nem constituem fonte de obrigações civis; porém, quando
lícitos, são fonte de obrigações naturais, exceto se neles concorrer qualquer outro motivo de
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nulidade ou anulabilidade, nos termos gerais de direito, ou se houver fraude do credor na sua
execução – art.º 1245º CC.

Contratos de Justiça Privada:


 Transação: é o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas
concessões. As concessões podem envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos
diversos do direito controvertido – art.º 1248º CC.

Contrato de Compra e Venda


Art.º 874º e seguintes CC

É o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito mediante um preço. É um
contrato nominado ou típico: art.º 874º CC e art.º 463º e seguintes Código Comercial. É, por regra, um
contrato não formal – art.º 219º CC. Exceção: contratos relativos a bens imóveis – art.º 875º CC.

É um contrato consensual – forma-se pela declaração das partes, não dependendo nem da entrega da
coisa, nem do pagamento do preço. A compra e venda tem um efeito obrigacional e um efeito real:
 Por um lado, determina a constituição de duas obrigações;
 Por outro lado, produz a transmissão de direitos reais – art.º 879º, a) (real quoad effectum).

Efeitos (art.º 879º CC)


 Transmissão da titularidade do direito ou propriedade da coisa;
 Obrigação de entregar a coisa;
 Obrigação de pagar o preço.

Efeito Real
 Verifica-se no momento da formação do contrato, sendo a titularidade ou a propriedade
transmitida com o simples consenso das partes (princípio da consensualidade);
 Correspondendo a um facto aquisitivo de direitos reais, se estes respeitarem a bens imóveis ou
móveis sujeitos a registo, a compra e venda terá de ser registada.

Efeitos Obrigacionais
 O dever de entregar a coisa;
 No caso da compra e venda comercial, o dever de emitir fatura;
 O dever de pagar o preço;
 Pagamento das despesas do contrato – art.º 878º CC.

É um contrato oneroso – existe sempre uma contrapartida pecuniária em relação à transmissão de bens,
importando sacrifícios económicos para ambas as partes. É um contrato sinalagmático – as duas
obrigações que emergem do contrato são causa uma da outra, permanecendo ligadas durante a fase de
execução do contrato.

Em regra, é um contrato comutativo – ambas as atribuições patrimoniais se apresentam como certas


quanto à sua existência e quanto ao seu conteúdo. No entanto, em certos casos (venda de bens futuros)
pode funcionar como um contrato aleatório.

É um contrato de execução instantânea. O seu conteúdo não é delimitado em função do tempo. Mesmo
nos casos de venda a prestações, o seu fracionamento apenas determina a forma de realização da
prestação (obrigação de pagar o preço).

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Proibições Legais de Venda
Venda de coisa ou direito litigioso – art.º 876º, nº1 CC
Desde logo, verifica-se uma remissão para a cessão de créditos ou direitos litigiosos – art.º 579º CC. Diz-se
litigioso o direito que tiver sido contestado em juízo contencioso, ainda que arbitral, por qualquer
interessado – art.º 579º, nº3 CC.

Fundamenta-se no receio que estas pessoas possam atuar com fins especulativos, levando os titulares a
venderem-lhe os bens por baixo preço, a pretexto da sua influência no processo. Se, apesar da proibição,
vier a ser realizada a venda, é esta considerada nula – art.º 876º, nº2 e art.º 580º, nº1 CC. A nulidade não
pode ser invocada pelo comprador (cessionário) – art.º 876º, nº3 e art.º 580º, nº2.

Vendas a filhos ou netos – art.º 877º, nº1 CC


Esta proibição já se encontrava prevista nas Ordenações Filipinas. Tem por fundamento evitar que se
possam fazer doações dissimuladas prejudicando os restantes herdeiros.

Se a venda se realizar esta é anulável – art.º 877º, nº2 CC. O consentimento pode ser suprido
judicialmente. O consentimento pode ser prestado de qualquer forma – art.º 219º CC – e pode ser
prestado tacitamente – art.º 217º CC.

Se a venda for realizada a filhos deve ser exigido o consentimento dos outros filhos (mas não dos netos). Se
a venda for realizada a netos deve ser exigido o consentimento tanto dos filhos que encabeçam a estirpe
como dos netos que sejam irmãos do comprador. A proibição não é extensível à dação em cumprimento
(art.º 837º CC) – art.º 877º, nº3.

Compra de bens do incapaz – art.º 1892º, nº1 CC


É proibido a compra de bens do incapaz pelos seus pais, tutor, curador, administrador legal de bens ou
produtor que exerça as funções do tutor. Esta proibição verifica-se quer ocorra diretamente ou por
interposta pessoa – art.º 579º, nº2 CC.

É anulável o requerimento do menor no prazo de um ano após a maioridade. A compra pode ser
confirmada pelo Ministério Público – art.º 1894º CC (é um ato próprio da sua competência nos termos do
disposto no nº1 do art.º 2º do Dec. Lei nº 272/2001).

Venda entre cônjuges – art.º 1714º CC


Este artigo consagra o princípio da imutabilidade das convenções antenupciais ou regimes de bens
legalmente fixados. Se fosse permitida a venda entre cônjuges estaria a permitir-se tornear este princípio.
A proibição cessa logo que os cônjuges estejam separados de pessoas e bens.

Por outro lado, se, eventualmente fosse permitida, a venda entre cônjuges poderia servir para simular a
doação entre cônjuges, de forma a elidir a regra da sua revogabilidade prevista no art.º 1765º CC.

Comunhão geral de bens: todos os bens são bens comuns, quer aqueles que adquiriram desde a nascença,
quer aqueles que venham adquirir depois do casamento.
Comunhão de bens adquiridos: aplicam-se quando as partes deveriam ou poderiam ter escolhido
qualquer situação, supletivamente aplica-se este regime. O que os cônjuges adquiriram antes do
casamento, os bens são próprios de cada parte, o que for adquirido depois do casamento é bem comum
das duas partes. As heranças ou doações depois do casamento também é um bem próprio.
Separação de bens adquiridos: neste regime, o marido tem os seus próprios bens e a mulher também,
cada bem tem apenas um dono, ou o marido ou a mulher.

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Compra de bens da massa insolvente – art.º 168º CIRE
“Nº1 – O administrador da insolvência não pode adquirir, diretamente ou por interposta pessoa, bens ou
direitos compreendidos na massa insolvente, qualquer que seja a modalidade de venda”. Alguém entra
numa situação de insolvência quando não tem liquidez para cumprir as suas obrigações perante os seus
credores. A insolvência é um processo que corre em tribunal, todo o património do sujeito vai ser
apreendido à ordem do processo.

Modalidades específicas de venda


Venda de bens futuros, de frutos pendentes e de partes integrantes ou componentes de uma coisa
Esta venda é referida no art.º 880º do CC e 467º, nº1 do Código Comercial. Ocorre sempre que o vendedor
aliena bens:
 que não existem ao tempo da declaração negocial (venda de uma fração autónoma de um edifício
ainda por construir);
 que não estão em seu poder (venda de laranjas que vier a colher durante o dia de hoje);
 ou a que ele não tem direito (venda de um bem que terá ainda de ser adquirido a outra pessoa).

No caso de venda de bens a que ainda não tem direito, diferente da venda de coisa alheia, nenhuma das
partes ignora que a coisa não pertence ao alienante, embora exista a expectativa de vir a adquirir. Neste
caso, a transferência de propriedade não ocorre imediatamente, apenas resultando a obrigação do
alienante adquirir a coisa para depois a poder transmitir, sob pena de responder por incumprimento nos
termos do art.º 798º e seguintes.

A venda de bens futuros pode ainda ser considerada como um contrato aleatório (venda da produção de
laranjas do próximo ano). É uma exceção à característica geral de que a compra e venda é um contrato
comutativo (atribuições patrimoniais certas quanto à sua existência e conteúdo).

Neste caso, o comprador está obrigado a pagar o preço, ainda que a transmissão de bens não chegue a
verificar-se (por a colheita se vir e perder, por exemplo). É também conhecida como venda de esperanças –
art.º 880º, nº2.

Venda de bens de existência ou titularidade incerta


Esta modalidade de venda é referida no art.º 881º CC. Existência certa quando não é certo se o bem existe,
e de titularidade incerta quando não é certa a sua existência.

Em princípio, apenas poderão ser objeto de venda as coisas que existem e pertencem ao vendedor, uma
vez que se a venda disser a respeito a coisas inexistentes o contrato é nulo por impossibilidade física ou
legal do objeto (art.º 280º, nº1), nulidade que também se verifica se as coisas não pertencerem ao
vendedor (art.º 892º).

No entanto, se se venderem bens de existência ou titularidade incerta e no contrato se fizer menção dessa
incerteza, o contrato é válido – art.º 881º. Por exemplo, num terreno de que sou proprietário estou
convencido de que existe uma jazida de pedras preciosas e faço a venda das mesmas sem ter a certeza de
existirem.

Neste caso, a lei presume que as partes quiseram celebrar um contrato aleatório, pelo que será sempre
devido o preço, ainda que os bens não existam ou não pertençam ao vendedor (art.º 881º). As partes
podem, porém, elidir esta presunção, recusando ao contrato natureza aleatória, pelo que o preço só será
devido no caso de os bens existirem e pertencerem ao vendedor (art.º 885º, nº1).

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Esta modalidade de venda distingue-se da venda de bens futuros, porquanto não toma por base a
expectativa de uma futura aquisição da coisa, mas antes a incerteza de uma situação presente, relativa à
existência ou titularidade do bem objeto de venda.

E distingue-se da venda de bens alheios porque o vendedor não celebra o contrato na qualidade de
proprietário da coisa. O vendedor ficará apenas constituído no dever de entrega a coisa, se e quando
comprovar que esta existe e/ou lhe pertence. Não existe, pois, nenhuma obrigação de o vendedor praticar
atos necessários para que o comprador adquira os bens vendidos (art.º 880º e 897º).

Venda com reserva de propriedade


A reserva de propriedade vem referida no art.º 409º. A compra e venda a crédito apresenta-se como um
negócio que envolve riscos elevados para o vendedor, porquanto, com a celebração do contrato,
transmite-se a propriedade do bem, sem qualquer garantia quanto ao pagamento do preço.

A razão da existência desta modalidade de venda prende-se com o facto de que, uma vez que a
transferência da propriedade ocorre no momento da celebração do contrato, pode existir a necessidade de
salvaguardar os interesses do vendedor, evitando que o comprador possa vender novamente o bem sem
ter pago a totalidade do preço.

Assim, por acordo das partes, a cláusula de reserva da propriedade implica que a transmissão da
propriedade do bem é diferida por um momento futuro, isto é, o momento em que ocorrer o pagamento
integral do preço. Este acordo das partes é o chamado “pactum reservati dominni”.

Sendo uma venda celebrada sobre condição suspensiva, a titularidade de propriedade permanece com o
vendedor até ao integral pagamento, sendo o comprador um mero detentor (apenas tem o direito de usar
e fruir). A cláusula de reserva de propriedade tem de ser estipulada no âmbito de um contrato de compra e
venda, do qual não pode ser separada. Assim, após a celebração do contrato, não pode ser aditada uma
cláusula de reserva de propriedade.

Estando inserida num contrato de compra e venda a reserva de propriedade tem de obedecer à forma
legalmente exigida para o contrato, podendo ser consensual nos casos em que a compra e venda não
esteja sujeita a forma especial. Apenas é exigida forma escrita para o caso de se tornar necessário a
reclamação de bens da massa insolvente – art.º 104º nº1 CIRE.

A cláusula de reserva de propriedade pode ser celebrada em relação a quaisquer bens, móveis ou imóveis,
mas estes terão de ser coisas específicas e não consumíveis. No caso de bens imóveis ou móveis sujeitos a
registo a cláusula só é oponível em relação a terceiros se se encontrar registada.

Venda a prestações
Encontra-se regulado no art.º 934º e seguintes e refere-se à venda a prestações em geral, ou sem reserva
de propriedade. A expressão “sem embargo de convenção em contrário”, não retira o caráter imperativo
da norma, uma vez que visa proteger a parte mais fraca do contrato – o vendedor – que já transmitiu a
propriedade e ainda não recebeu o preço.

A resolução do contrato a prestações depende de ter sido celebrada ou não uma cláusula de reserva de
propriedade – art.º 934º e 886º. Dispõe o art.º 934º:
 Se a venda foi feita com reserva de propriedade e coisa entregue ao comprador, a falta de
pagamento de uma prestação que não exceda 1/8 do preço de venda não dá lugar à resolução do
contrato (se se tratarem de duas ou mais prestações é independentemente do valor);

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 Também importa a perda do benefício do prazo relativamente às prestações seguintes, salvo
disposição em contrário.
A resolução do contrato não impede o vendedor de exigir simultaneamente ao comprador culpado pelo
incumprimento uma indemnização por todos os prejuízos causados – art.º 801º, nº2 – incluindo uma
eventual deterioração do bem. Para evitar esta situação tornou-se usual a inclusão de cláusulas penais.
Incluídas cláusulas penais, para o caso de o comprador não cumprir, a indemnização acordada não pode
ser superior a metade do preço acordado – art.º 935º.

Importa chamar a atenção que se a venda a prestações for realizada no âmbito de relações de consumo ela
é qualificada como um contrato de crédito ao consumo. São entendidas como um contrato de crédito “as
situações em que o credor concede ou promete conceder ao consumidor um crédito sobre a forma de
diferimento de pagamento”.

Locação-venda (art.º 936º, nº2)


Neste caso as partes estipulam uma locação, mas convencionam que a propriedade passará para o
locatário automaticamente no fim do pagamento de todas as rendas ou alugueres convencionados. Trata-
se de uma união de contratos.

Esta convenção determina que as prestações não correspondem à contrapartida do gozo temporário da
coisa, mas ao pagamento da transmissão da propriedade sobre ela. O contrato, apesar de denominada
“locação” desempenha a mesma função da venda a prestações.

Venda de coisas sujeitas a contagem, pesagem e medição


Regulada nos art.º 887º e seguintes, consiste numa venda de coisas determinadas (perfeitamente
individualizadas e identificadas), ainda que sujeitas posteriormente a uma operação de contagem,
passagem ou medição. O preço vai ser calculado tendo em conta a contagem, a pesagem e a medição. Não
se confunde com a venda de coisas indeterminadas.

A referência das partes à quantidade dos bens vendidos vai implicar uma futura operação de contagem,
pesagem ou medição, a qual coloca o problema de, eventualmente, se verificar uma discrepância entre a
referência contratual e o resultado da operação de contagem, pesagem ou medição.

Exemplo: A vende a B um prédio rústico à razão de 100€/m2.

A venda considera-se efetuada antes da operação, pelo que a discrepância apenas pode ter reflexos para
apuramento do preço.

Venda a retro
É a venda em que se reconhece ao vendedor a faculdade de resolver o contrato – art.º 927º. Nesta
modalidade a transmissão da propriedade não se apresenta como definitiva, na medida em que o
vendedor se reserva a possibilidade de reaver o direito alienado, mediante a restituição do preço e o
reembolso das despesas feitas com a venda.

Esta modalidade de venda tem razão de ser no interesse do proprietário que, devido às suas necessidades
financeiras, se vê na contingência de ter de alienar um bem seu, mas mantém o interesse de o voltar a
adquirir logo que a sua condição financeira lho permita.

Por um lado, representa um negócio de concessão de crédito; por outro, é uma garantia em relação ao
comprador: o pagamento do preço substitui a concessão de um empréstimo do comprador ao vendedor.

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Dada a sua natureza económica, como operação de financiamento, esta figura tem reduzida eficácia
porque se proíbe a atribuição de qualquer vantagem ao comprador – art.º 928º.

Prazo:
 A resolução pode ser exercida dentro de dois ou cinco anos a contar da venda, conforme se trate
de bens móveis ou imóveis, salvo estipulação mais curto – art.º 929º, nº1;
 Se as partes convencionarem prazo que exceda o limite anterior, a convenção considera-se
reduzida a esse limite – art.º 929º, nº2.

Forma:
 A resolução é feita por notificação judicial avulsa;
 Tratando-se de bens imóveis, a resolução será reduzida a escritura pública ou documento particular
autenticado nos 15 dias imediatos à notificação, com ou sem intervenção do comprador, sob pena
de caducidade do direito – art.º 930º.

Venda a contento e venda sujeito a prova


Os art.º 923º e seguintes referem-se a modalidades específicas de venda em que esta se realiza por etapas.
Em ambas as situações, normalmente relativas a bens móveis, se verifica a subordinação do contrato a
uma aprovação da coisa vendida por parte do comprador, da qual vai depender a sua efetiva vigência. Em
ambos os casos, a vigência do contrato fica dependente de um teste a realizar pelo comprador.

Diferenças:
 Na venda a contento, o comprador reserva a faculdade de contratar, ou a de resolver o contrato,
consoante a apreciação subjetiva (gosto pessoal) que vier a fazer do bem-vindo;
 Na venda sujeita a prova está antes em causa uma avaliação objetiva do comprador em relação à
qualidade da coisa, em conformidade com um teste a que esta será sujeita.

A lei admite ter duas modalidades de venda a contento:


 A primeira implica a estipulação de que a coisa vendida terá de agradar ao comprador
correspondendo à tradicional cláusula ad gustum – art.º 923º. Vale como uma proposta de venda;
 A segunda corresponde à concessão de um direito de resolução unilateral do contrato se a coisa
não agradar ao comprador – art.º 924º e 432º. Não é uma condição resolutiva porque não está
sujeito a um acontecimento futuro e incerto.

A venda sujeita a prova é a modalidade de venda que determina que o contrato só se tornará definitivo
após o comprador averiguar, através do prévio uso da coisa, que ela é idónea para o fim a que se destina
e que tem as qualidades asseguradas pelo vendedor – art.º 925º. É qualificada pelo legislador como uma
venda subordinada a uma condição suspensiva.

Venda sobre documentos


Encontra-se regulada nos artigos 937º e seguintes no CC. Por regra, no âmbito da obrigação de entregar a
coisa, compete ao vendedor incluir os documentos relativos à coisa ou direito – art.º 882º, nº2 CC.

Na venda sobre os documentos, como ela tem por objeto a venda de mercadorias representadas por
títulos, considera-se que o vendedor não é obrigado a entregar as mercadorias, bastando-lhe entregar os
respetivos documentos.

A entrega dos títulos legítima o comprador a proceder ao levantamento das mercadorias. A venda não
incide sobre os documentos, mas sobre os direitos incorporados nos títulos que eles representam.
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Compra e venda comercial
Também é uma modalidade específica de venda, regulada nos art.º 463º a 476º do CCOM.

Perturbações típicas do contrato de compra e venda


Regra geral, estas perturbações correspondem a situações de cumprimento defeituoso das obrigações do
vendedor. Porque não são as únicas situações de cumprimento defeituoso há que recorrer à disciplina
geral para as restantes situações.

Venda de bens alheios


Existe venda de bens alheios sempre que o vendedor não tenha legitimidade para realizar a venda, como
sucede no caso de a coisa não lhe pertencer ou de o direito que possui sobre ela não lhe permita a sua
alienação – art.º 892º e seguintes. A venda de bens alheios tem origem no direito romano.

A venda de bens alheios é nula – art.º 892º. Esta nulidade não pode ser invocada pelo vendedor que agiu
de má-fé ou por um comprador que agiu com dolo. Também terceiras pessoas não podem requerer a
nulidade. Não pode ser reconhecida oficiosamente pelo tribunal.

O próprio proprietário também não poderá arguir a nulidade, pois em relação a si o contrato é ineficaz.
Terá de intentar uma ação de reivindicação da propriedade nos termos do art.º 1311º CC.

Esta nulidade, ao contrário da regra geral, pode ser convalidada(sanada) – art.º 895º.

Não obstante, tal nulidade não ocorre se:


 se verificar a venda de coisas futuras – art.º 893º;
 na venda de coisas genéricas que não pertençam ao vendedor – art.º 539º - não é necessária a
qualidade de proprietário ao tempo da celebração do contrato;
 na compra e venda comercial – art.º 467º, nº2 CCOM - é lícita a venda do que for propriedade de
outrem.

Em todos os casos, recai sobre o vendedor a obrigação de aquisição e entrega ao comprador das coisas que
se comprometeu a vender, não sendo, consequentemente, aplicável o regime da venda de bens alheios.

O regime de venda de bens alheios, nos termos do disposto no art.º 892º e seguintes, apenas se poderá
aplicar se vendida como própria uma coisa alheia, específica e presente, fora do âmbito das relações
comerciais.

Outro pressuposto essencial da venda de bens alheios é que o vendedor careça de legitimidade para
efetuar essa alienação. Não haverá falta de legitimidade se houver representação ou o vendedor haja
como um gestor de negócio.

Importa chamar a atenção que, por vezes, apesar de não ser proprietário ou não ter poderes de
representação, pode ocorrer a venda, sem que se aplique o regime da venda de bens alheios, como é a
situação de venda judicial de bens em processos de execução.

Como consequência da venda de bens alheios temos:


 Convalidação – art.º 897º - havendo boa-fé do comprador, o vendedor é obrigado a sanar a
nulidade adquirindo a propriedade ou titularidade da coisa (ao contrário do regime geral);
 Indemnização – art.º 898º a 900º - a possibilidade de atribuição de uma indemnização pelos danos
eventualmente sofridos.
10
A indemnização é devida:
 Por qualquer das partes em caso de dolo – art.º 898º e 253º;
 Pelo vendedor ao comprador de boa-fé com fundamento na garantia da sua legitimidade – art.º
899º;
 Pelo vendedor ao comprador de boa-fé por incumprimento da obrigação de convalidar o contrato –
art.º 897º e 900º;
 Por benfeitorias – art.º 901º e 1273º.

Situação especial é o caso da venda de bens parcialmente alheios – art.º 902º e 292º. Neste caso, por
conjugação com o disposto no art.º 292º, admite-se a possibilidade de o contrato valer na parte restante.

A venda de bens parcialmente alheios pode ocorrer em duas situações:


 O vendedor aliena toda uma coisa, quando apenas é dono de uma parte da mesma (ex: venda de
uma biblioteca que inclui livros pertencentes a terceiros);
 O vendedor aliena toda a coisa, quando é dono, apenas, de uma quota abstrata na mesma (ex:
compropriedade).

Outra situação é a venda de coisa indivisa por apenas um dos seus titulares – art.º 1408º e 2091º - é havida
como oneração de coisa.

Haverá falta de legitimidade, nos termos do art.º 892º, sempre que um ato de disposição sobre a
totalidade ou parte da coisa indivisa seja praticado sem o consentimento dos restantes titulares.

Venda de bens onerados


A venda de bens onerados encontra-se previsto no art.º 905º. Ocorre quando o direito transmitido estiver
sujeito a alguns ónus ou limitações que excedam os limites normais inerentes aos direitos da mesma
categoria. O que caracteriza a venda de bens onerados é a existência de ónus ou limitações no direito
transmitido.

Nem todos os ónus levam à aplicação deste regime, apenas aqueles que normalmente não se verificam,
por exemplo:
 Existência de direitos de gozo (usufruto, uso e habitação ou servidões prediais);
 Existência de direitos reais de garantia (consignação de rendimentos, senhor, penhor, hipoteca,
privilégios ou retenção);
 Locação a terceiro;
 Apreensão judicial (penhora, arresto ou arrolamento).

Efeitos da venda de bens onerados:


1. Anulabilidade do contrato por erro ou dolo
A lei, neste caso, não considera o contrato nulo, mas anulável, desde que se verifiquem os requisitos legais
da anulabilidade.

2. Convalidação do contrato (art.º 906º)


Admite-se que o vício fica sanado se vierem a desaparecer os ónus ou limitações que o direito está sujeito.

3. Obrigação do vendedor fazer convalescer o contrato e cancelamento de registos (art.º 907º, nº1)
Permite ao comprador requerer em lugar da anulação, a expurgação (correção) dos ónus ou limitações.

4. Atribuição de uma indemnização pelos danos eventualmente sofridos


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 em caso de dolo – art.º 908º
 em caso de simples erro – art.º 909º
 por incumprimento da obrigação de fazer convalescer o contrato – art.º 907º, nº1 e 798º e
seguintes.

Redução do preço (art.º 911º, nº1): funciona como uma alternativa à anulação do contrato estabelecida
no art.º 905º.
Venda de coisas defeituosas
Pode ocorrer nas seguintes circunstâncias:
 Se a coisa já é defeituosa ao tempo da celebração e assim é transmitida ao comprador, estamos
perante uma situação de erro do comprador, sendo o contrato anulável nos termos gerais – art.º
913º, 905º, 251º e 247º.
 Se o defeito ocorre após a celebração do contrato, estamos perante uma situação de cumprimento
defeituoso – art.º 918º ou de risco do comprador – art.º 796º, nº1.

É defeituosa a coisa que sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada,
ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor, ou necessárias para a realização daquele fim – art.º
913º, nº1.

São quatros as situações previstas no art.º 913º:


 Vícios que desvalorizem a coisa;
 Vícios que impeçam a realização do fim a que é destinada;
 Falta de qualidades asseguradas pelo vendedor;
 Falta de qualidades necessárias à realização daquele fim.

O regime da venda de coisas defeituosas assenta em dois pressupostos de natureza diferente:


 A ocorrência de um defeito;
 A existência de determinadas repercussões desse defeito no âmbito do programa contratual.

Efeitos:
 Anulação do contrato por erro ou dolo – art.º 913º;
 Reparação ou substituição da coisa – art.º 914º;
 Indemnização – art.º 915º;
 Redução do preço – art.º 913º e 911º, nº1.

Formas e prazos do exercício do direito:


 Em primeiro lugar existe para o comprador o ónus de denunciar ao vendedor os defeitos da coisa –
art.º 916º.
 O ónus apenas é excluído em caso de dolo do vendedor.
 A denúncia pode ser feita de qualquer forma, de acordo com o princípio de liberdade estabelecido
no art.º 219º.

Quanto aos prazos para denúncia, em primeiro lugar variam consoante se trate de bens móveis ou
imóveis:
 Tratando-se de móveis, o prazo de denúncia é de 30 dias depois de conhecido o defeito e dentro
dos seis meses após a entrega da coisa – art.º 916º, nº2.
 Tratando-se de imóveis, o prazo eleva-se para 1 e 5 anos – art.º 916º, nº3.

Direito do consumidor perante a falta de conformidade (Dec. Lei no 67/2003, alterado pelo Dec. Lei no
84/2008 de 21 de Maio):
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 Reparação;
 Substituição;
 Redução do preço;
 Resolução do contrato;
 A estes acresce direito de indemnização.

Neste caso, os prazos de garantia geral são de três e dez anos, consoante se trate de coisas móveis ou
imóveis. Podem, no entanto, os vendedores, proporcionar, voluntariamente, prazos de garantia
superiores.
Contrato de troca ou permuta
Consiste na transmissão recíproca da propriedade de coisas ou outros direitos entre os contraentes.
Atualmente, não tem regulamentação específica no Código Civil, embora exista referência à troca
comercial no art.º 480º CCom.

Não obstante de bens representa a mais antiga “modalidade” contratual conhecida pela humanidade, que
funcionou pelo menos, até ao aparecimento da moeda. Apesar de não ter regulamentação jurídica própria,
continua a ser um meio bastante utilizado na celebração de negócios (imóveis, p.e). É um negócio a título
oneroso, pelo que se aplica o regime da compra e venda – art.º 939º.

Características
Pode ser considerado um contrato nominado, uma vez que existe referência ao mesmo no CCom, mas
atípico porquanto o seu regime não se encontra tipificado na lei, sendo aplicável por remissão da compra e
venda.

É um contrato não formal – art.º 219º - sendo apenas sujeito a forma especial quando estiverem em causa
bens imóveis – art.º 875º. É um contrato consensual, uma vez que não se exige a tradição da coisa para
que se constitua.

É um contrato obrigacional, na medida em que faz nascer a obrigação de entrega para as duas partes –
art.º 879º, al. b) – e real quanto aos efeitos, uma vez que se transmite a propriedade dos bens trocados
por mero efeito do contrato – art.º 879º, al. a) e 408º.

É um contrato oneroso porque implica sacrifícios patrimoniais para ambas as partes. É um contrato
sinalagmático – as obrigações constituem-se tendo a sua causa uma na outra.

É um contrato comutativo uma vez que ambas as atribuições patrimoniais se apresentam como certas. É
um contrato de execução instantânea, porquanto o conteúdo e extensão das obrigações de entrega não é
estabelecido em função do tempo.

Regime aplicável
A troca apenas se distingue da compra e venda quanto ao preço que, neste caso, não é dinheiro, mas um
outro bem de idêntico valor. A celebração do contrato produz, de imediato, a transferência da propriedade
sobre os bens.

Aplicam-se à troca as proibições de venda – art.º 876º e seguintes – e também o das perturbações da
prestação – art.º 892º e seguintes e 913º e seguintes. A troca pode abranger bens futuros. Não são
aplicáveis à troca as normas que pressupõe uma contrapartida pecuniária da alienação (p.e art.º 878º,
883º, 885º e 886º).

Questão doutrinal
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Não é consensual, em termos doutrinários, a qualificação do contrato pelo qual as partes apesar de
continuarem a efetuar a troca, porque os bens têm valores diferentes, uma delas inclui ainda uma
prestação em dinheiro. Parte da doutrina continua a qualificar o contrato como troca. Outra parte da
doutrina entende que, para a qualificação como venda ou troca, deve atender-se ao que partes
consideram mais relevante: o bem trocado ou o dinheiro.
Contrato de doação
É definido como o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património,
dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício de outro
contraente – art.º 940º e seguintes.

O nosso CC, ao contrário de outros ordenamentos jurídicos, regula a doação como um contrato
considerando como essencial a aceitação do donatário. Há situações em que a lei dispensa a aceitação do
donatário, como é o caso dos incapazes, em relação a tudo o que lhe aproveite – art.º 951º, nº2 CC.

Elementos da doação
 Atribuição patrimonial geradora de enriquecimento;
 Diminuição do património do doador;
 Espírito de liberalidade.

Atribuição patrimonial
A atribuição patrimonial pode consistir, quer na disposição de uma coisa ou de um direito, quer na
assunção de uma obrigação. Em qualquer das situações o donatário sofre uma valorização do seu
património.

Diminuição patrimonial do doador


A diminuição patrimonial do doador é um requisito essencial. Sem uma efetiva diminuição patrimonial do
doador não se estará perante uma doação.

Espírito de liberalidade
Significa a existência da intenção de atribuir o correspondente benefício a outrem por simples
generosidade ou espontaneidade e sem qualquer outra intenção. Consiste no fim direto de atribuir um
benefício ao donatário, provocando o seu enriquecimento.

Características
É um contrato nominado ou típico – art.º 940º a 979º CC. Tem um nome e um regime jurídico específico.

É um contrato formal: a lei obriga a que a doação de coisas imóveis seja feita por escritura pública ou
documento particular autenticado e a doação de bens móveis por escrito – art.º 947º, nº 1 e 2. Excetua-se
a doação de coisas móveis, quando acompanhada da tradição da coisa. Pode ser um contrato obrigacional
ou real quanto aos efeitos: transmite-se a propriedade da coisa doada em simultâneo o doador obriga-se a
entregar a coisa doada.

Pode ser um contrato meramente obrigacional se o doador se limitar a assumir uma obrigação de outro
contraente. É um contrato não sinalagmático: em regra, faz emergir obrigações para, apenas, uma das
partes. É um contrato gratuito. Não existe qualquer contrapartida pecuniária em relação à transmissão dos
bens ou à assunção de obrigações.

Pode ser um contrato de execução instantânea, mas também pode abranger prestações periódicas, sendo,
neste caso, um contrato de execução periódica.

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Objeto
A doação não pode incidir sobre bens futuros – art.º 942º, nº1. Esta proibição não abrange as situações em
que as doações incidem sobre universalidades de facto – art.º 942º, nº2. A doação que consistir em
prestações periódicas extingue-se por morte do doador – art.º 943º.

Forma e formação
A doação é um contrato sujeito a forma especial – art.º 947º, nº1 e 2 – apenas dispensando a forma escrita
no caso da doação de bens móveis em que ocorra, em simultâneo, a tradição da coisa doada. A doação
pode ser celebrada, quer entre presentes, quer com ausentes.

A proposta de doação feita a ausentes não caduca nos prazos estabelecidos no art.º 228º, apenas se
verificando essa caducidade se a doação não for aceite em vida do doador – art.º 945º. Enquanto a
proposta não for aceite, o doador poderá proceder á sua revogação – art.º 969º.

A aceitação da doação está sujeita à forma exigida para o contrato – art.º 945º, nº3 – e tem de ser dada a
conhecer ao doador para que possa produzir efeitos – art.º 224º, nº1. Verificando-se a tradição da coisa
móvel para o donatário, a receção por este do objeto doado é considerada como aceitação, não sendo
necessária a prática de mais qualquer ato.

Capacidade
Têm capacidade para fazer doações todos os que podem contratar e dispor dos seus bens – art.º 948º, nº1.
Corresponde a uma capacidade geral da qual só estão excluídos os menores, os interditos e os inabilitados.
A incapacidade para fazer doações não pode ser suprida – art.º 949º, nº2.

Para efeitos de capacidade, a lei considera o estado em que o doador se encontra ao tempo da declaração
negocial – art.º 948º, nº2.

Se o estado da capacidade do doador se alterar entre a declaração negocial e a aceitação da mesma é


relevante apenas a situação da capacidade no momento da declaração negocial.

Podem receber doações todos os que não estão inicialmente inibidos de as aceitar por disposição da lei –
art.º 950º, nº1.

A capacidade do donatário é fixada no momento da aceitação – art.º 950º, nº2. As doações a incapazes
produzem efeitos independentemente da aceitação em tudo o que aproveitar o donatário – art.º 951º,
nº2.

A lei admite a possibilidade de se atribuir o mandato para a atribuição de doação, mas não admite a
possibilidade de, através de mandato, escolher o donatário ou o objeto da doação. O mandato para doar
deve assim incluir a designação da pessoa, bem como o objeto da doação, sendo considerado um mandato
especial – art.º 1159º, nº1.

Nulidade
A doação pode ser nula:
 porque não obedeceu à forma legal – art.º 947º;
 porque se verifica uma situação de indisponibilidade relativa – art.º 953º.

O regime da nulidade é diferente do que vigora para a generalidade dos negócios jurídicos, uma vez que
admite a confirmação da nulidade pelos herdeiros do doador – art.º 968º.

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Efeitos (art.º 954º)
 A transmissão da propriedade da coisa ou titularidade do direito;
 A obrigação de entregar a coisa;
 A assunção da obrigação, quando for esse o objeto do contrato.

Cláusulas acessórias
 Reserva de usufruto
O art.º 958º, nº1 prevê a possibilidade de o doador poder constituir reserva de usufruto, quer a favor de si
próprio, quer a favor de terceiros. No caso de doação a nascituros, presume-se que essa reserva é por ele
instituída até ao nascimento do donatário – art.º 952º, nº2. Ainda assim, o donatário terá, sempre, de
aceitar a doação da nua propriedade.

 Reserva do direito de dispor de coisa determinada ou de certa quantia sobre os bens doados
O doador pode reservar-se a faculdade de dispor por ato inter vivos ou post mortem de qualquer objeto
compreendido na doação ou de qualquer quantia sobre os bens doados, isto é, de uma parte específica do
que constitui o objeto da doação – art.º 959º. Esta faculdade não se transmite aos herdeiros do doador,
pelo que caduca com a sua morte – art.º 959º, nº2.

 Cláusula de reversão
O doador pode determinar que o bem doado regressa à sua titularidade em caso de pré-decesso do
donatário ou do donatário e dos seus descendentes (quando o donatário morre antes do doador),
presumindo-se ser esta última solução aplicável, salvo disposição em contrário – art.º 960º, nº2. A cláusula
de reversão relativa a coisas imóveis carece de ser registada – art.º 960º, nº3.

Em regra geral, este direito de reversão apenas existe depois da morte do donatário e dos seus herdeiros,
para que o direito de reversão seja exercido na morte do doador, é preciso que esta cláusula esteja
expressamente prevista no contrato. A cláusula de reversão tem de obrigatoriamente ser registada, para
proteger terceiros.

 Substituições fideicomissárias
Substituições fideicomissárias ou fideicomissos é uma figura que se encontra prevista na sucessão
testamentária – art.º 2286º - e consiste na disposição pela qual o testador impõe ao herdeiro instituído o
encargo de conservar a herança, para que ela reverta, por sua morte, a favor de outrem. Por força do
disposto no art.º 962º, nº1, elas são admitidas nas doações.

Nota: O doador doa alguma coisa ao donatário, este aceita a doação, mas tem de manter em sua posse a
coisa doada até à sua morte, para que nessa altura a coisa doada seja transferida para outra pessoa.

 Doação sujeita a condição


Apesar de não se encontrar expressamente previsto na lei, é admissível a sujeição da doação a uma
condição (suspensiva ou resolutiva), sendo-lhe aplicável o regime geral da condição – art.º 270º. A sua
verificação é retroativa – art.º 276º - e o negócio na pendência é regulado nos termos dos artigos 272º e
seguintes.

As condições física ou legalmente impossíveis, contrárias à lei, à ordem pública, ou ofensivas dos bons
costumes ficam sujeitas às regras estabelecidas em matéria testamentária – art.º 967º - não sendo assim
aplicável o regime previsto no art.º 271º que determina a nulidade de todo o negócio, mas sim o regime
estabelecido no art.º 2230º (consideram-se não escritas).

 Doação modal
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A lei admite a possibilidade de as doações serem oneradas com encargos – art.º 963º, nº1. O modo ou
encargo consiste numa restrição imposta ao beneficiário da liberdade que o obriga à realização de
determinada prestação no interesse do autor da liberalidade, de terceiro ou do próprio beneficiário.

O cumprimento do encargo pode ser exigido tanto pelo doador, os seus herdeiros ou qualquer interessado
– art.º 965º. No caso de o encargo não ser cumprido, quer o doador, quer os seus herdeiros poderão
resolver a doação, mas apenas se esse direito lhe tiver sido conferido pelo contrato – art.º 966º.

Proibições de doação
À semelhança da compra e venda, existem também diversas proibições de celebração de doações. A lei
pretendeu equiparar as indisponibilidades relativas nas doações às vigentes em sede de sucessões
testamentária – art.º 953º que remete para os artigos 2192º a 2198º.

Assim temos as seguintes proibições de doações, diretamente ou por interposta pessoa – art.º 2198º - a
favor de:
 tutor, curador, administrador legal de bens e protutor – art.º 2192º;
 médicos, enfermeiros e sacerdotes – art.º 2194º e 2195º;
 cúmplice do doador adúltero – art.º 2196º;
 intervenientes na doação – art.º 2197º.

Doação a favor do tutor, curador, administrador legal de bens e protutor


Se a doação é feita durante o período de incapacidade, faltaria ao doador a capacidade ativa para realizar a
doação – art.º 948º. Os art.º 953º e 2192º estabelecem a proibição de os interditos e inabilitados fazerem
doação a favor do seu tutor, curador ou administrador legal de bens, considerando nulas as doações – art.º
2192º.

Doações a favor de médicos, enfermeiros ou sacerdotes


Por remissão do art.º 953º, o art.º 2194º também é aplicável às doações: é nula a disposição a favor do
médico ou enfermeiro que tratar o testador, ou do sacerdote que lhe prestar assistência espiritual, se o
testamento for feito durante a doença e o seu autor vier a falecer dela. Ao contrário do testamento, não se
aplica à doação a exigência de que o doador venha a falecer da doença.

Doações entre cônjuges


É nula a doação entre casados, se vigorar imperativamente entre os cônjuges o regime da separação de
bens – art.º 1762º. A proibição justifica-se porquanto nas doações entre casados, quando admitidas, os
bens adquiridos tornam-se incomunicáveis, isto é, são considerados bens próprios do donatário, seja qual
for o regime de bens. São livremente revogáveis – art.º 1765º.

Doações a partidos políticos


A lei proíbe a realização de quaisquer donativos anónimos, bem como de donativos de natureza pecuniária
ou em espécie a partidos políticos por parte de pessoas coletivas nacionais ou estrangeiras (Lei nº 19/2003
de 20 de junho). Apenas é admitida a doação efetuada por pessoas singulares até ao montante máximo de
25 vezes o indexante de apoios sociais. Estas doações têm de ser tituladas por cheque ou por transferência
bancária.

Em relação às estruturas representativas dos trabalhadores e às associações de empregadores existe uma


proibição de receber doações de entidades a elas estranhas, conforme se encontra estabelecido nos art.º
405º, nº1 e 446º, nº2 do Código do Trabalho.

Modalidades atípicas de doações


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A doação remuneratória
Art.º 941º - é considerada doação a liberalidade remuneratória de serviços recebidos pelo doador, que não
tenham a natureza de dívida exigível. O doador recebeu serviços que não tem obrigação de pagar. No
entanto, ficando grato pelos serviços, quer remunerar quem os prestou, ainda que a tal não esteja
obrigado.

É condição essencial que a remuneração não corresponda a qualquer obrigação. Não deixa, contudo, de
existir uma conexão entre os serviços prestados e a doação. Como não constitui uma dívida exigível a lei
considera que estão presentes os requisitos de liberdade e espontaneidade correspondentes ao animus
donandi e que faltam no animus solvendi.

A doação por morte


Encontra-se quase integralmente proibida no nosso direito. Consiste na situação em que o doador, por
espírito de liberalidade, efetua uma atribuição patrimonial ao donatário, à custa do seu património, mas
que determina que a correspondente aquisição apenas produzirá efeitos com a sua morte.
A lei proíbe, em princípio, a doação por morte – art.º 946º, nº1. Pretende-se evitar um problema
relacionado com o facto de a aceitação ser efetuada em vida do doador, não podendo, posteriormente, ser
revogada – art.º 2179º, nº1. A vontade da lei é a de que as disposições de última vontade do autor da
sucessão correspondam, efetivamente, à última vontade, pelo que devem resultar de um negócio
unilateral – o testamento – e não de um contrato.

A doação por morte pode ser havida como disposição testamentária, se tiverem sido observadas as
formalidades do testamento – art.º 946º, nº2. Estamos perante o fenómeno da conversão de negócio –
art.º 293º - admitindo-se a conversão do negócio nulo num negócio de tipo e conteúdo diferente, sem que
seja necessário demonstrar que a vontade das partes iria nesse sentido. Se a doação por morte tiver
preenchido os requisitos do testamento, é possível converter essa doação num testamento.

A partilha em vida
Corresponde a uma modalidade específica de doação prevista no art.º 2029º. Trata-se de um caso
específico de doação a um, ou alguns, presumidos herdeiros legitimários, em que este(s) assume o encargo
de pagar aos outros, com o acordo destes, o valor em dinheiro correspondente à parte que lhes caberia.
Havendo mais do que um herdeiro, os restantes têm de consentir. O pagamento das tornas (quem recebe
um bem superior à sua quota, tem de compensar os restantes herdeiros) pode realizar-se na altura da
doação ou posteriormente, devendo neste caso ser efetuada a atualização correspondente.

As doações para casamento


É a doação feita a um dos esposados, ou a ambos, em vista do seu casamento – art.º 1753º, nº1. Estas
doações estão sujeitas a grande especialidade, sendo o regime das doações (art.º 940º a 979º) apenas
aplicado subsidiariamente – art.º 1753º, nº2.

É essencial que seja feita em vista do casamento (realiza-se antes do casamento), tendo como donatário
um ou ambos os esposados (art.º 1754º). Podem ser feitas por um ao outro, reciprocamente, ou por um
terceiro a um ou ambos. Só podem ser feitas na convenção antenupcial – art.º 1756º, nº2. P.e: prendas de
casamento.

As doações entre casados


Encontra-se regulada nos art.º 1761º a 1766º. O regime geral das doações (art.º 940º a 979º) funciona
como regime subsidiário. A principal característica é a sua livre revogabilidade – art.º 1765º. A doação
entre casados é proibida nos casos em que vigorar imperativamente entre os cônjuges o regime de
separação de bens – art.º 1762º.
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A doação de coisas móveis, ainda que acompanhada da tradição da coisa, deve constar de documento
escrito – art.º 1763º, nº1. Os cônjuges não podem celebrar doações recíprocas no mesmo ato – art.º
1763º, nº2. Estabelece a lei que só podem ser doados bens próprios do doador – art.º 1764º, nº1 – e que
os bens doados não se comunicam, seja qual for o regime matrimonial – art.º 1764º, nº2.

Perturbações da prestação no contrato de doação

Doação de bens alheios


A doação só pode abranger bens próprios, não podendo, sequer, a doação abranger bens futuros – art.º
942º. Nos termos do art.º 956º, nº2, só haverá responsabilidade se o donatário estiver de boa-fé e se
verifique um dos seguintes factos:
 o doador ter assumido a obrigação de indemnizar;
 ter o doador agido com um dolo;
 ter a doação caráter remuneratório ou ser a doação onerosa ou modal.

Doação de bens onerados ou coisas defeituosas


O doador não responde pelo ónus ou limitações do direito, nem pelos vícios da coisa doada, a menos que,
expressamente, se tenha responsabilizado ou haja procedido com dolo – art.º 957º. Pode ser feita a
doação de uma coisa defeituosa ou que tenha um ónus. O donatário ao aceitar a doação, percebe as
limitações que a coisa tem, portanto, o donatário passa a responder por este ónus.

Extinção das doações


A revogação por ingratidão do donatário
Uma vez aceite, em princípio a doação torna-se irrevogável, só sendo admitida a sua revogação em caso de
ingratidão do donatário – art.º 970º e 974º. Constituem causa de ingratidão:
 O donatário ter sido condenado como autor ou cúmplice de homicídio doloso, ainda que não
consumado, contra o doador ou o seu cônjuge, descendente, ascendente, adotante ou adotado;
 Ter sido condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas;
 Ter o donatário, por meio de dolo ou coação, induzido o doador a fazer, revogar ou modificar o
testamento, antes ou depois da morte;
 Ter o donatário dolosamente subtraído, ocultado, inutilizado, falsificado ou suprimido o
testamento, antes ou depois da morte do doador.
 Ver artigos 2034º e 2166º.

Nos termos do art.º 975º não são admitidas por ingratidão nos seguintes casos:
 As doações para casamento;
 As doações remuneratórias;
 O doador haver perdoado ao donatário.

A colação
Consiste na obrigação que é imposta aos descendentes que pretendam entrar na sucessão do ascendente
de restituir à massa da herança, para efeitos de igualação da partilha, os bens ou valores que lhes forem
doados por este (art.º 2104º, nº1).

A redução por inoficiosidade


São inoficiosas as liberalidades, entre vivos ou por morte, que ofendam a legítima dos herdeiros
legitimários, podendo estas ser objeto de redução por forma a que não venham afetar a legítima – art.º
2168º.

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Sociedade
Art.º 980º CC
É aquele em que duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em
comum de certa atividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros
resultantes dessa atividade.

O contrato de sociedade não está sujeito a forma especial, à exceção da que for exigida pela natureza dos
bens com que os sócios entram para a sociedade – art.º 981º CC. As sociedades são representadas pelos
seus administradores – art.º 996º.
Locação
É o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa,
mediante retribuição – art.º 1022º. A locação diz-se sublocação, quando o locador a celebra com base no
direito de locatário que lhe advém de um precedente contrato locativo – art.º 1060º. Da definição de
contrato de locação resultam três elementos constitutivos:
 Visa proporcionar a outrem o gozo temporário de uma coisa corpórea
Trata-se de uma prestação de conteúdo positivo que constitui uma obrigação do proprietário (locador).
 Obrigação de estipulação de uma contrapartida pecuniária
É um contrato oneroso. A renda ou aluguer surge como uma contrapartida das obrigações do locador. É
uma prestação de cariz pecuniário.

 Apenas pode ser celebrada por um período transitório


O art.º 1025º CC estabelece como prazo máximo de locação os 30 anos. É um contrato temporário. Como
exceção, temos o arrendamento florestal que pode ir até aos 70 anos.

O prazo de 30 anos previsto no art.º 1025º corresponde ao limite máximo do prazo inicial do contrato e
não ao seu limite de duração. Em caso de renovações (art.º 1054º CC) o contrato pode ter uma duração
superior a 30 anos.

Duas modalidades da locação – art.º 1023º CC:


 Arrendamento: quando versa sobre coisa imóvel;
 Aluguer: quando incide sobre coisa móvel.

Modalidades de arrendamento:
 Arrendamento urbano
 Fins habitacionais
 Fins não habitacionais

 Arrendamento rústico
 Rural (fins agrícolas, florestais, pecuária)
 Não rural (outros fins – produção de bens e serviços associados à agricultura)

Características da locação
 Contrato nominado e típico
É reconhecido como categoria jurídica e tem um regime, atualmente, estabelecido no CC, mas também no
Decreto de Lei nº 294/2009 de 13 de Outubro – RAR.

 Contrato consensual
Forma-se pela declaração de vontade das partes, não dependendo da entrega da coisa objeto do contrato.

 Contrato, em regra, não formal


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Os contratos de arrendamento urbano e os contratos de arrendamento rural são obrigatoriamente
celebrados por escrito.

 Contrato obrigacional
Da locação não se geram direitos reais.

 Contrato oneroso
Implica sacrifícios económicos para ambas as partes

 Contrato sinalagmático
As partes ficam sujeitas a obrigações recíprocas.

 Contrato comutativo
As atribuições patrimoniais de ambas as partes – concessão do gozo da coisa e pagamento do preço – são
certas e não aleatórias.

 Contrato de execução duradoura


Os efeitos do contrato prolongam-se no tempo, não se esgotando num único momento.

Objeto da locação
Podem ser objeto da locação tanto as coisas móveis como as coisas imóveis – art.º 1023º CC. A locação
pode abranger tanto a totalidade como parte de uma coisa. Podem, ainda, ser objeto de locação coisas
incorpóreas como o estabelecimento comercial, conforme o disposto no art.º 1109º CC.

Forma do contrato de locação


Como atrás referimos, a regra é a da liberdade de forma – art.º 219º CC. Em determinadas situações a lei
vem exigir forma especial:
 Contrato de arrendamento urbano – art.º 1069º CC – celebrado por escrito de forma a incluir a
licença de utilização e certificado energético, por exemplo;
 O arrendamento rural também deve ser celebrado por escrito – art.º 6º, nº1 – sob pena de
nulidade – art.º 6º, nº2. A entrega do original na Repartição de Finanças deve ocorrer no prazo de
30 dias – art.º 6º, nº3 do RAR.

Capacidade
Têm capacidade para celebrar contratos de locação todos aqueles que puderem contratar e administrar os
seus bens. Excetuam-se, pois, os menores, interditos e inabilitados.

No caso das pessoas coletivas não existe qualquer impedimento na celebração de contratos de locação,
quer enquanto locadora, quer enquanto locatária, agindo através dos legais representantes com poderes
para o efeito.

Efeitos da locação
Obrigações do locador (art.º 1031º):
 De entregar a coisa;
 De assegurar ao locatário o gozo da coisa para o fim a que se destina;
 Pagamentos dos encargos da coisa locada – art.º 1030º;
 Reembolso de benfeitorias – art.º 1046º, nº 1;
 Obrigação de dar preferência em caso de venda ou dação em cumprimento – art.º 1091º.

Obrigações do locatário:
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 Obrigação de pagamento da renda ou aluguer – art.º 1038º, a) e 1039º e seguintes;
 Obrigação de facultar ao proprietário (locador) o exame da coisa locada – art.º 1038º, b);
 Obrigação de não utilizar a coisa locada para um fim diferente daquela a que ela se destina – art.º
1038º, c) e 1027º;
 Obrigação de não fazer dela uma utilização imprudente – art.º 1038º, d) e art.º 1043º;
 Obrigação de tolerar as reparações urgentes, bem como quaisquer outras obras ordenadas por
autoridade pública – art.º 1038º, e).
 Obrigação de não proporcionar a outrem o gozo total ou parcial da coisa, exceto se autorizado pela
lei ou pelo locador – art.º 1038º, f);
 Obrigação de comunicar ao locador a cedência da coisa, quando esta seja permitida ou autorizada –
art.º 1038º, g);
 Obrigação de avisar o locador sempre que tenha conhecimento de vícios da coisa – art.º 1038º, h) e
art.º 1033º;
 Obrigação de restituir a coisa locada findo o contrato – art.º 1038º, i).

Extinção do contrato
São formas de extinção da locação:
 Revogação;
 Resolução;
 Caducidade;
 Denúncia.

Revogação: situação em que as partes põem termo ao contrato celebrando um acordo extintivo – art.º
1082º, nº1 CC. Em regra, deve ser celebrada sob a forma escrita – nº 2 do art.º 1082º CC.

Resolução: consiste na faculdade de qualquer uma das partes poder resolver o contrato com fundamento
no incumprimento da outra parte – art.º 1083º, nº1 do CC. São causas de resolução de iniciativa do
senhorio – art.º 1083º, nº2 CC:
 Violação reiterada e grave de regras de higiene, sossego e de boa vizinhança – al. a);
 Utilização do prédio contrária à lei, aos bons costumes ou à ordem pública – al. b);
 O uso do prédio para fim diverso daquele a que se destina – al. c);
 O não uso do locado por mais de um ano – al. d);
 A cessão, total ou parcial, temporária ou permanente, onerosa ou gratuita – al. e).

São, ainda, causa de resolução pelo senhorio:


 A mora do arrendatário igual ou superior a dois meses no pagamento da renda – art.º 1083º, nº3 e
4 do CC;
 A oposição à realização de obra ordenada por autoridade pública – art.º 1083º, nº3.

As causas de resolução por iniciativa do arrendatário estão relacionadas com situações de incumprimento
das obrigações ou cumprimento defeituoso do locador – art.º 1083º, nº5 e 801º do CC.

Caducidade: consiste na extinção do contrato em virtude da verificação de um facto jurídico stricto sensu –
art.º 1051º do CC. São causas de caducidade – art.º 1051º, al. a) a g):
 Fim do prazo estipulado ou estabelecido por lei;
 Verificação da condição a que as partes subordinaram o contrato;
 Ter cessado o direito ou findarem os poderes de administração com base nos quais o contrato foi
celebrado;

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 Por morte do locatário ou extinção da pessoa coletiva;
 Perda da coisa locada;
 Pela expropriação por utilidade pública;
 Cessação pelo arrendatário dos serviços que determinaram que a coisa locada lhes fosse entregue.

Denúncia e oposição à renovação:


 A primeira aplica-se aos contratos de duração indeterminada e consiste na declaração do senhorio
(mas também do arrendatário) a pôr termo ao contrato;
 A segunda aplica-se aos contratos em relação aos quais foi estipulado um prazo de renovação e visa
impedir que, no final do mesmo, se venha a renovar por outro período – art.º 1054º e 1055º do CC.

A denúncia pode ser realizada por:


 Arrendatário – art.º 1100º do CC;
 Senhorio – art.º 1101º e 1102º do CC.

A oposição à renovação deve ser comunicada à outra parte com a antecedência mínima de:
 120 dias se o contrato tiver o prazo inicial igual ou superior a seis anos;
 60 dias se for superior a um ano e inferior a seis anos;
 30 dias se for superior a três meses e inferior a um ano;
 1/3 do prazo se for inferior a três meses – art.º 1055º, nº1 do CC.

“Cuidados” a ter na celebração do contrato de locação


Conservatória do Registo Predial (aferir da legitimidade e capacidade do Senhorio);
 Quem é o proprietário;
 Existência de ónus (em particular do usufruto).

Repartição das Finanças


 Inscrição na matriz predial

Câmara Municipal
 Existência de licença de utilização (fim a que se destina o imóvel)

Forma
A regra é a da liberdade de forma – art.º 219º CC. Em determinadas situações a lei vem exigir a forma
escrita: arrendamento urbano e arrendamento rural. O contrato de arrendamento deve ser redigido em
três exemplares: um para o arrendatário, um para o senhorio e o terceiro para entregar na Repartição de
Finanças.

Documentos
 De identificação das partes;
 De identificação do imóvel;
 Licença de utilização;
 Certificado energético.

Fim do contrato
 Urbano ou Rural;
 Habitacional ou não habitacional;
 Habitação permanente ou secundária.

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Prazo
 Prazo certo: prazo e forma de oposição à renovação;
 Duração indeterminada – art.º 1094º CC: prazo e forma denúncia.

Renda
 Valor da renda;
 Forma e lugar de pagamento;
 Atualização da renda.

Obras de conservação e benfeitorias


 Possibilidade (ou não) de o arrendatário realizar obras sem prévia autorização do senhorio;
 Existência (ou não) de indemnização em caso de benfeitorias realizadas no locado.

Garantias
 Possibilidade de o senhorio solicitar a entrega do valor correspondente a algumas rendas mensais
como caução;
 Possibilidade de o senhorio exigir a garantia de uma Fiança.

Outros
 Despesas de condomínio;
 Serviços de vigilância e portaria.

Parceria pecuária
É o contrato pelo qual uma ou mais pessoas entregam a outra ou outras um animal ou certo número deles,
para estas os criarem, pensarem e vigiarem, com o ajuste de repartirem entre si os lucros futuros em certa
proporção – art.º 1121º.

Comodato
É o contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra certa coisa, móvel ou imóvel, para que se
sirva dela, com a obrigação de a restituir – art.º 1129º. Se as partes não convencionarem prazo certo para
a restituição da coisa, mas esta foi emprestada para uso determinado, o comodatário deve restituí-la ao
comodante logo que o uso finde, independentemente de interpelação – art.º 1137º.

Mútuo
É o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda
obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade – art.º 1142º.

Forma (art.º 1143º):


 Até 2500€ - liberdade de forma
 De 2501€ a 25 000€ - escrito
 Acima de 25 000€ - escritura pública ou documento particular autenticado.

Usura
 São considerados usurários os contratos onde sejam estipulados juros anuais que excedam os juros
legais em 3% ou 5% conforme exista garantia real ou não – art.º 1146º, nº1.
 Se se tratar de cláusula penal, o limite dos juros é de 7% e 9%.

Prestação de serviço

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É aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho,
intelectual ou manual, com ou sem retribuição – art.º 1154º. São modalidades da prestação de serviços o
mandato, o depósito e a empreitada.
Mandato
É o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais atos jurídicos por conta da outra –
art.º 1157º. Pode ser gratuito ou oneroso, presumindo-se oneroso quando o mandatário faça dessa
atividade profissão, presumindo-se gratuito nos restantes casos – art.º 1158º.

Depósito
É o contrato pelo qual uma das partes entrega à outra coisa, móvel ou imóvel, para que a guarde, e
restitua quando for exigida – art.º 1185º. O depósito pode ser gratuito ou oneroso – art.º 1186º e art.º
1158º.

Empreitada
É o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um
preço – art.º 1207º. Em regra, é um contrato não formal. Na empreitada de obras públicas é exigida a
forma escrita. A empreitada é, sempre, um contrato oneroso.

Direitos do dono da obra:


 Aquisição da receção da obra;
 Fiscalização da obra;

Deveres do dono da obra:


 Pagamento do preço;
 Verificação, comunicação e aceitação da obra – art.º 1218º do CC.

Direitos do empreiteiro:
 Receção do preço;
 Direito de retenção (art.º 758º e 759º).

Deveres do empreiteiro:
 Realização da obra em conformidade com o convencionado – art.º 1208º;
 Fornecimento de materiais e utensílios – art.º 1211º;
 Guarda e conservação da coisa – art.º 1212º;
 Entrega da coisa.

Transferência da propriedade:
 Tratando-se de coisa móvel, a aceitação da coisa importa a transferência de propriedade para o
dono da obra – art.º 1212º, nº1.
 No caso de coisas imóveis, pertencendo o solo ou a superfície ao dono da obra, consideram-se
adquiridos à medida que vão sendo incorporados no solo – art.º 1212º, nº2.

Situações de desconformidade:
 Desconformidade da obra em relação ao que foi convencionado;
 Vícios que excluam ou reduzam o valor da obra;
 Vícios que excluam ou reduzam a aptidão da obra para o seu uso ordinário;
 Vícios que excluam ou reduzam o valor da obra para o uso previsto no contrato – art.º 1208º.

O dono da obra tem direito:


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 Eliminação dos defeitos – art.º 1218º, nº 1 e 2;
 Exigir nova construção – art.º 1222º, nº1;
 Redução do preço – art.º 1222º, nº1;
 Resolução do contrato – art.º 1222º, nº1 parte final;
 Direito de indemnização – art.º 1223º.

Os direitos caducam se não forem exercidos dentro de um ano a contar da recusa da aceitação da obra ou
a partir da denúncia – art.º 1224º, nº1 e 2. Em caso algum, estes direitos podem ser exercidos depois de
decorridos dois anos sobre a entrega da obra.

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