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CONTRATO DE MÚTUO

33. Noção
O art. 1142º CC indica três notas distintas como caracterizadoras do mútuo
legalmente típico:
- Uma parte, designada mutuante, empresta certa coisa a outra, o
mutuário;
- Depois, o objecto emprestado é dinheiro ou outra coisa fungível, e, por
fim;
- O mutuário fica obrigado a restituir outra tanto do mesmo genro e
qualidade.
O mútuo proporciona apenas uma cessação temporária de uso de bens.
Deste modo, de acordo com uma sistematização de índole económica e social o
mútuo integra-se com a locação (art. 1022º CC) e o comodato (art. 1129º CC),
na categoria de contratos que proporcionam o gozo de bens alheios.
O mutuário recebe a coisa para retirar dela o aproveitamento que a mesma
proporciona, incorrendo numa obrigação de restituição. Não se trata, porém, de
restituir a própria coisa, individualmente considerada, mas outro tanto do mesmo
género e qualidade.
O mútuo é, pois, na sua essência, um contrato pelo qual uma parte cede
temporariamente a outra um valor patrimonial. A obrigação que dele resulta para
o mutuário é uma obrigação genérica. Pode por esta razão afirmar-se que, pelo
mútuo, o direito de propriedade do mutuante sobre a coisa mutuada é substituído
no seu património por uma pretensão à “restituição”.
A fungibilidade a que a lei se refere, isto é, a susceptibilidade de as coisas em
causa serem substituídas na mesma função por outras do mesmo género,
qualidade e quantidade (art. 207º CC) é a designada fungibilidade convencional.
O que caracteriza o mútuo oneroso é o pagamento de juros como retribuição
por parte do mutuário, não se pode pôr em dúvida que um dos termos da
correspectividade económica reside nessa remuneração.
O mútuo legalmente típico é, pois, o contrato pelo qual uma das partes, o
mutuante, como ou sem retribuição renúncia temporariamente à disponibilidade
de uma certa quantia de dinheiro ou ao equivalente a certa coisa fungível que
cedeu à outra parte, o mutuário, para que este delas possa retirar o
aproveitamento que as mesas proporcionam.
O mútuo é, na sua natureza, um contrato real, no sentido do que só se
completa pela entrega (empréstimo) da coisa.

34. Mútuo consensual


Considerar a entrega da coisa como um elemento de qualificação do mútuo
legalmente típico oferece, a base adequada ao enquadramento do denominado
mútuo consensual. Designa-se um contrato de conteúdo idêntico ao mútuo típico
excepto no afastamento da entrega do momento estipulativo para o momento
executivo do negócio. Alguém obriga-se a entregar certa coisa, em mútuo. A
entrega já não surge com um acto espontâneo, indispensável ao surgimento do
contrato, mas como um acto derivado, praticado em execução ou cumprimento
desse contrato.
O mútuo consensual é frequentemente considerado como um contrato atípico,
e na realidade assim deve ser. Pouco significado teria esta afirmação, porém, se
levasse a tornar inaplicáveis a este contrato o conjunto de regras relativas ao
mútuo legalmente típico.
35. Contrato promessa de mútuo
É geralmente afirmada a admissibilidade da celebração de contratos
promessa de mútuo, à qual não se reconhece, com efeito, qualquer
impedimento.
Contrato promessa de mútuo, nos termos do art. 410º/1 CC é a convenção
pela qual uma ou ambas as partes se obrigam à futura celebração de um contrato
de mútuo.
Atendendo a que o acordo de vontades acompanha ou precede, em via de
regra, a entrega da coisa, é possível configurar, conclusivamente, quatro
situações jurídicas diferentes:
a) O acordo representa um momento do inter negocial que, com a posterior
entrega da coisa, conduzirá à formação de um mútuo legalmente típico. A
não concretização da entrega pode implicar responsabilidade pré-
contratual, nos termos do art. 227º CC.
b) O acordo dirige-se a pôr a cargo de uma ou de ambas as partes as
obrigações de posterior celebração de um contrato de mútuo. A não
celebração do contrato prometido pode implicar a responsabilidade
obrigacional (art. 798º CC).
c) O acordo consubstancia a imediata celebração de um contrato em cujo
conteúdo se inscreve uma obrigação de entrega (mútuo consensual). A
obrigação inexecutada pode ser judicialmente exigida (arts. 817º e 827º
CC).
d) O acordo é acompanhado da entrega da coisa. Realiza-se de imediato o
interesse contratual do mutuário.

36. Forma do mútuo


As declarações de vontade que integram o acordo, elemento indispensável
para o aperfeiçoamento de qualquer contrato, têm de se exteriorizadas por forma
reconhecível, por mais que seja. Nesta perspectiva, o mútuo tanto é um contrato
consensual como solene, porquanto embora a lei por vezes admita a liberdade
de forma, noutras requer forma especial para a respectiva celebração.
As exigências legais especiais relativas à forma do mútuo encontram-se
consagradas no art. 1143º CC.
A forma é um requisito ad substantiam do contrato, de acordo com a regra
geral consignada no art. 364º CC. A respectiva inobservância importa, assim, a
invalidade do contrato, conforme desde logo refere o art. 219º CC.
A invalidade é, no entanto caso concreto, a nulidade do contrato (art. 220º
CC), devendo consequentemente ser repetido aquilo que foi prestado (art. 289º/1
CC).

37. Efeitos do mútuo


a) Transferência de propriedade
O mutuário não tem a obrigação de restituir a própria coisa entregue, mas
outra do mesmo género e qualidade.
Quanto à forma de eficácia a que dá lugar, o mútuo é um contrato real (quod
effectum). É certo que este contrato ano tem directamente por objectivo a
transferência da propriedade sobre a coisa mutuada, assumindo o efeito
translativo um valor meramente instrumental: é mais efeito do que causa.
Já no mútuo consensual a obrigação de entrega a cargo do mutuante pode
ter por objecto uma coisa indeterminada, em regra genérica. Neste caso,
contudo, a transferência de propriedade ocorre apenas quando da respectiva
entrega, por aplicação directa do art. 1144º CC. Configura-se aqui uma das
excepções mencionadas na parte final do art. 408º/1 CC. Igual solução sempre
se alcançaria de uma interpretação extensiva deste preceito.
b) Obrigação do mutuante
Sendo a entrega da coisa um elemento necessário ao aperfeiçoamento do
mútuo legalmente típico, desde não resulta para o mutuante uma obrigação de
a entregar, pelo que a lei não faz qualquer referência.
No regime legal deste contrato apenas se identificam as eventuais obrigações
derivadas para o mutuante de vício jurídico ou material da coisa mutuada. Com
efeito o art. 1151º CC consagra a aplicação à responsabilidade do mutuante, no
mútuo gratuito, do disposto no art. 1134º CC relativo ao comodato.
c) Obrigações do mutuário
A definição legal de mútuo realça o carácter restituitório deste contrato, sendo
a respectiva disciplina essencialmente dirigida à regulação da obrigação de
restituir.
O contrato de mútuo, segundo o art. 1145º CC tanto pode ser gratuito como
oneroso, presumindo-se oneroso em caso de dúvida. É oneroso quando, por
efeito da convenção das partes ou da referida presunção legal, são devido juros
como retribuição.

38. Extinção do mútuo


Resulta do art. 1148º CC que este contrato extingue-se pelo decurso do prazo
estipulado. Visa-se, assim, o período do tempo pelo qual o mutuante cede a
tomador do crédito a valuta, o qual é normalmente referenciado pelo
aprazamento da obrigação de restituição a cargo deste último.
No mútuo oneroso este prazo presume-se estabelecido, como dispõe o art.
1147º CC no interesse de ambas as partes.
No mútuo gratuito aplica-se a regra geral do art. 779º CC considerando-se o
prazo estipulado em benefício do devedor (mutuário). Este tem, por conseguinte,
a possibilidade de cumprir antecipadamente, sem que o credor (mutuante) o
possa exigir.
Na falta de estipulação de prazo são aplicadas as regras consignadas no art.
1148º CC. Nos termos gerais nos ns.º 1 e 2 deste preceito, tratando-se de mútuo
gratuito a obrigação do mutuário vence-se trinta dias após a exigência do seu
cumprimento (art. 1148º/1 CC) e tratando-se de mútuo oneroso qualquer das
partes pode pôr termo ao contrato desde que o denuncie com uma antecipação
mínima de trinta dias (art. 1148º/2 CC).
Preliminares do contrato.
Contrato promessa.
Mútuo legalmente típico.

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