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Copyright © 2021 Jéssica Oliveira, todos os direitos reservados,

1° Edição — 2021
Criação da capa: vfddesigner
Diagramação: Bruna Oliver
Revisão: Janete Ferreira

1.Literatura Brasileira 2. Romance


3.Romance Adulto 4. Literatura Feminina

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‘comerciais permitidos pela lei de direitos autorais.

Esse é um trabalho de ficção. Nomes, personagens, lugares, negócios,


eventos e incidentes são ou produtos da imaginação da autora ou usados de
forma fictícia. Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas ou
eventos reais é mera coincidência.
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Março 2020
Mergulhada na pequena banheira do loft da minha irmã,
fico revivendo aquele maldito momento, se eu não estivesse
sóbria e medicada, diria que foi apenas mais um dos meus
impulsos. Minha cabeça me diz que eu fiz o certo, mas meu
coração está em pedaços, acho que nunca senti algo assim,
profundamente doloroso, como se alguém tivesse arrancado um
pedaço de mim.
— Linda... — Mica chama baixinho, ela está sentada na
tampa da privada me observando, angustiada. — Me conte o que
aconteceu.
— Eu já disse, nós terminamos, não tem mais nada para
falar.
— Porra, Lindara! — Ela suspira e esfrega as têmporas,
cansada.
— Eu estava arruinando a vida dele! — Grito com lágrimas
escapando dos meus olhos, falar isso em voz alta consegue ser
pior que pensar, parece que torna tudo mais real, é agonizante.
— Vocês estavam bem horas atrás. O que você não está
me contando?
Encaro minha irmã com os olhos marejados.
— Contar? — Pergunto um pouco irritada e esgotada para
discutir. — Você viu o bombardeio de notícias.
— E ele ficou ao seu lado o tempo todo.
— A filha dele está morando com os avós, porque eu não
sou confiável. Michael disse que ia abandonar o caso do
governador para não precisar ficar longe de mim. E o carro dele...
— Bufo ao lembrar o que estava escrito.
— Ah, Linda… — Micaela sussurra e segura minha mão na
borda da banheira com compreensão. — Michael já fez isso uma
vez e não deu certo.
— Fez o quê?
— Amá-la o bastante para deixá-la, mas você não ficou
melhor sem ele e ele também não vai ficar, sem você.
— Ele será mais feliz sem mim. — Afirmo, preciso acreditar
nisso.
— Com a Morgan?
— Uau, Micaela! — Digo arrasada. — Tudo que eu menos
preciso agora é imaginá-los juntos.
— Daqui uns dias não vai precisar imaginar.
— De que lado você está? — Pergunto incrédula.
— Do seu, é óbvio, mas eu não sou cega e não vou mentir
para você. Espero que quando acordar não seja tarde demais. —
Ela diz e sai do banheiro pisando firme.
Se eu acordar. Não posso mais ignorar o fato, que talvez,
essa seja minha realidade agora.

Enrolada em um cobertor no sofá da sala, finjo que assisto


um filme, mas a verdade é que eu não consigo prestar atenção
em nada, tudo que eu olho me lembra do Michael, o que me faz
chorar igual a uma idiota o tempo inteiro.
A porta principal se abre, me endireito no sofá e encaro
minha irmã entrar com Axel e Blake, carregando minhas malas.
Um nó se forma em minha garganta e já sei que irei me debulhar
em lágrimas outra vez.
Eles colocam seis malas grandes no meio da sala e antes
do Axel ir embora, ele me lança um olhar triste.
— Você está bem? — Mica senta ao meu lado e Blake nos
deixa a sós.
— Não. Como ele está?
— Michael foi viajar com Emma e eu não tenho ideia para
onde. Ele deixou uma coisa para você.
Minha irmã abre sua bolsa e tira de dentro um envelope
branco. O abro, contém uma carta dentro, a pego com as mãos
trêmulas.

Querida Lindara
Não é uma carta de despedida.
Você saiu tão inesperadamente aquela noite que não tive
chances de dizer o que eu sentia. Não a procurei porque quero
respeitar o seu espaço e sua decisão, embora seja muito difícil
para mim. Eu sinto sua falta e não consigo deixar de pensar em
você um minuto sequer... acho que vou enlouquecer a qualquer
momento, por isso tomei a decisão de viajar com Emma por
algumas semanas.
Não quero que fique desamparada e sei que não aceitaria
nada de mim, você sempre foi orgulhosa demais. Converse com
Micaela ela saberá o que fazer.
Espero que possamos nos reencontrar e que você volte a
ser a minha Lindara.
Eu amo você.
Com amor Michael

— Linda... — Micaela chama preocupada, engulo o nó que


se forma na minha garganta e entrego a carta para ela, que lê em
silêncio e solta uma longa lufada de ar ao terminar.
— Orgulhosa e cabeça dura. Vem, vamos arrumar um lugar
para suas coisas.
Pego uma mala e subimos para o segundo piso, onde
ficam os dois quartos e o banheiro.
Solto a mala em cima do colchão inflável de acampamento
do Blake, onde ele vem dormindo as últimas duas noites.
Me sinto péssima ao tirar a privacidade dos dois, Micaela
construiu uma família e tudo o que eu menos quero nesse
momento é atrapalhar a vida dela. Assim que eu conseguir um
emprego vou arrumar um cantinho para mim.
Tiramos todas as roupas das malas e começamos a
guardar na pequena cômoda branca no canto do quarto. Quando
ela enche, nós lançamos um olhar para a montanha de roupa em
cima do colchão e bufamos audivelmente.
— Teríamos que comprar mais cinco cômodas, para caber
todas essas roupas. — Mica comenta, me fazendo rir.
— Pegue o que você quiser, o resto eu vou vender.
— Tem certeza que quer vender? Você ainda precisa se
vestir.
— Sim, mas não com casacos de pele e quem precisa de
tantas bolsas e echarpes?
— É elegante. — Ela diz enrolando uma no pescoço.
— Mica eu não tenho nem cama para me deitar, eu não ligo
para elegância.
— Nota-se. — Micaela diz me olhando de cima a baixo, me
fazendo encará-la boquiaberta.
Enquanto ela guarda, em seu quarto, algumas peças de
roupas, bolsas e sapatos que escolheu, fico separando as mais
sofisticadas, que eu provavelmente só usaria em um evento
requintado ou na presença do Michael e como nenhuma dessas
coisas irá acontecer tão cedo, não há porque guardar. Quando
estou quase no fim da última mala, encontro uma bolsa antiga, de
quando ainda trabalhava no café. Vasculho dentro dela e
encontro um envelope pardo. Pego o papel que contém dentro, é
uma carta do Sr. Armstrong.
Leio rapidamente e é basicamente o que Micaela me
explicou, semanas atrás. Exalo baixinho. O que será que esse
homem tem de tão interessante para me contar?
Isso sim é um mistério que eu preciso resolver. Fico me
perguntando qual é a ligação do Dante com Micaela e comigo,
além do caso do meu pai, porque está claro que minha irmã anda
escondendo coisas de mim. E tenho certeza que se eu perguntar
sobre Dante para ela, Mica irá desconversar.
Saio tropeçado no meio das roupas e dos calçados no chão
até encontrar minha bolsa atual, em cima de um pufe, abro e
encontro o meu remédio ao lado do meu solitário anel de
noivado, meu coração se espreme no tamanho de uma ervilha,
respiro fundo e pego meu celular de dentro e sem pensar muito
ligo para ele.
— Oi, Sr. Armstrong. — Digo, sentindo o coração acelerar.
— É bom ouvir sua voz. — Ele fala suavemente.
— Podemos nos encontrar?
— Estava torcendo para ouvir isso, Lindara.
— Me busque amanhã no Conservatório Broadway.
— Eu estarei lá.
Desligo o celular antes que o arrependimento bata e nisso
Mica entra no quarto com as sobrancelhas juntas.
— Estava conversando com alguém?
— Não. — Mecho a cabeça indiferente.
Ela cerra os olhos ainda na dúvida, mas em seguida sorri e
me entrega dois envelopes um mais gordo que o outro.
— Estava guardando, caso um dia precisasse.
— De onde é esse dinheiro? — Pergunto analisando a
quantidade de cédulas que há dentro.
— Um ensaio fotográfico e uma venda de garagem.
— Obrigada, Mica.
Ela assente e me deixa sozinha.
Quando termino de arrumar minhas coisas já está tarde.
Encontro minha irmã e Blake à mesa comendo macarrão com
queijo e bebendo vinho seco. Me junto a eles e tomo um gole da
taça do Blake.
— Pensei que grávidas não pudessem beber. — Comento
quando vejo Mica levar a taça à boca.
— Ela viu um estudo na internet. — Ele diz não muito
contente.
— Eu estou tomando uma taça de três dedos, Blake, não a
garrafa inteira. — Ela fala com acidez. — E você também não
devia estar bebendo, Lindara.
— Eu vi um estudo na internet. — Informo os fazendo rir.
Termino de jantar em silêncio, observando os dois
conversarem, lavo os pratos e depois vou para o quarto de
hóspedes para dar privacidade a eles. Deito no colchão e me
abraço em uma pilha de roupa, algumas delas tem o cheiro dele.

Acordo um pouco depois das dez horas com um cheirinho


maravilhoso de café e muitas risadas do lado de fora. Tomo o
meu remédio, visto um robe preto e espio do segundo piso,
Cheryl está debruçada sobre a mesa, conversando com Micaela.
Volto enjoada para o quarto só de pensar em ter que falar com
ela.
Visto uma calça de couro, uma blusa branca e por cima um
trench coat bege com botões pretos. Pego minha bolsa e coloco
dentro um par de sapatilhas e um collant verde-musgo. Procuro
na pilha de sapatos um par de botas de salto alto marrom com
tiras trançadas em volta, e saio do cômodo penteando meus
cabelos ondulados com as pontas dos dedos para não armá-los.
Desço as escadas pisando firme, chamando a atenção das
duas.
— Bom dia! — Cheryl cumprimenta com um sorriso
acalorado.
— Onde você vai? — Minha irmã pergunta assim que
percebe que eu não tenho a menor intenção de dar atenção a
vadia da Cheryl.
— Treinar. — Aviso, pegando a jarra da cafeteira e
despejando café em um copo descartável. Mica me acompanha
até a porta.
— Você já tomou o remédio?
— Sim.
— Linda. — Ela chama quando saio andando sem me
despedir.
— O quê?
— Eu não sabia que ela viria.
Dou de ombros.
— A casa é sua. Não me espere para o jantar.
Pego um táxi. É a primeira vez que saio sozinha desde que
acordei naquele hospital, no começo eu achava estranho ter
seguranças, não me sentia confortável, mas agora é como se
tivesse algo de errado. Eu não tinha ideia que sentira falta até do
ogro do Axel.
Ao chegar na escola, me recordo que saí às pressas
semana passada e deixei meu patrocinador esperando. Argh! Sr.
Thatcher vai cuspir fogo em mim quando me encontrar.
Entro na sala e encontro Levi e Shade sentados no chão
conversando.
— Bom dia! — Saúdo me sento ao lado de Levi.
— Nossa você está bem? — Levi questiona ao olhar para
meu rosto.
— Por que não estaria?
Ele e Shade se entreolham por um instante.
— Você está com umas olheiras tão grandes, que se
alguém me dissesse que você levou uma surra eu acreditaria. —
Levi diz e Shade levanta as sobrancelhas em concordância.
— Porra! Vocês são muito exagerados.
Caminho até o banheiro e me encaro no espelho
descreditada.
Puta merda! Estou parecendo um panda.
O que eu poderia esperar dormindo três horas por noite, há
três dias.
Lavo meu rosto na pia do banheiro e aproveito para trocar
de roupa.
Quando volto para a sala, os dois me encaram um pouco
cabisbaixos, como se tivessem percebido o que realmente
aconteceu.
— Quer conversar? — Levi pergunta.
— Não, obrigada.
Ele assente.
— E dançar? — Shade sugere.
— Dançar eu quero.
Ele abre um pequeno sorriso e se coloca de pé, me
ajudando a levantar. Levi dá play no celular e a música
Impossible do James Arthur começa a tocar.
Paro atrás do Shade de costas para ele, que se vira em um
movimento rápido e me pega pela cintura, segurando com
firmeza, me levantando acima de seus ombros em seguida,
fazendo meu corpo se curvar sobre ele.
— Estufe o peito, Lindara. — Quase caio de cima do Shade
novamente quando ouço a voz do Sr. Thatcher. Shade me coloca
no chão, mas continua me segurando por uma mão, onde giro
sob ele com uma perna curvada para trás.
— Você tem duas pernas, use uma de apoio. — Ele sibila.
Sinto o suor brotar em minha nuca, cada passo era um
sermão e quando a música finalmente termina, estou rubra de
vergonha.
— Você tem potencial, Lindara. Só precisa ensaiar mais,
senão, não chegará a lugar algum.
Assinto e espero pela reprimenda de ter fugido semana
passada, mas ele apenas se retira da sala em silêncio.
— Você tem potencial! — Levi emita o professor, enérgico,
me fazendo rir.
Levi e Shade tentam me ajudar a dançar com mais
suavidade e flexibilidade, ainda assim me sinto com duas pernas
esquerdas. Se eu não começar a corrigir esses pequenos erros,
minha carreira vai acabar antes mesmo de começar. E terei que
voltar a servir café.
Talvez cursar faculdade, porém, o que? Eu nunca me
imaginei estudando algo que não fosse o balé.
Almoçamos em uma lanchonete que fica dentro da escola,
Penny e Liam nos encontraram lá e me olharam com a mesma
expressão de Levi. Comento com ele brevemente que além de
bagunçar a minha vida sinto que estou atrapalhando a da minha
irmã. Levi como sempre, muito positivo, disse que aos poucos
tudo resolverá por conta própria. Com a minha sorte, duvido.
Caminho em silêncio ao lado deles e fico observando cada
um contar como foi o final de semana, quando chegamos à sala,
meu coração dispara me fazendo parar abruptamente. Dulce está
conversando com Alice em frente à porta. Por um breve momento
penso em faltar a aula, mas Penny me segura pelo pulso e me
puxa em direção a sala, Levi se coloca a minha frente.
As duas me olham e depois se entreolham rindo. Respiro
fundo e as ignoro. Professor Thatcher já está na sala e os demais
tomam seus lugares esperando suas ordens. Paro em frente ao
Levi e me seguro na barra, ele me encara e ergue o queixo em
uma pergunta silenciosa.
— Preciso de um lugar para morar. — Menciono, ele me
fita surpreso, então o professor me chama.
— Srta. Fincher, mostre seu gand jeté.
Solto a barra e me encaminho para o meio da sala.
Sr. Thatcher se afasta me dando mais espaço e fica me
olhando atentamente.
Me distancio dos outros e tento não olhar para nenhum
deles, fechos olhos e faço o passo que me foi pedido.
— Quase, Srta. Fincher. Cuide para não dobrar a perna e
abra mais os braços, você está tensa, faça outra vez. — Ele
ordena e prossegue. — Liam mostre seu grand battement.
O resto da aula prosseguiu tranquilamente, consegui me
conectar melhor com os passos e esquecer por um momento o
que perturba meus pensamentos.
Troco de roupa rapidamente e na saída da sala encontro
Levi escorado na parede do corredor, ele se indireta quando me
aproximo.
— Quer morar comigo? — Ele pergunta de repente.
— Está falando sério!? — Exclamo, não conseguindo
conter um sorriso.
— Sim!
— Quando posso me mudar? — Sinto meu coração
disparar dentro do peito.
— Até hoje se quiser. — Ele fala tão animado quanto eu.
— Não posso, tenho um compromisso. — E só de pensar
sinto meu estômago se contorcer.
Caminho com Levi até o ponto de ônibus em frente à
escola. Ele não força a barra para saber o que aconteceu e eu
aprecio isso nele. Meu novo colega de quarto me explica como é
o apartamento e estranhamente me sinto familiar ao ambiente.
— Aquele carro está com você? — Levi pergunta, olhando
em direção a uma BMW x6 prata. Encaro o carro com os vidros
fumê do outro lado da rua e o farol pisca.
— Bizarro. — Ele comenta.
O carro arranca e faz o retorno parando em nossa frente,
Levi segura meu braço quando a janela do passageiro começa a
descer.
— Espero não ter me atrasado. — Dante me dá um sorriso
caloroso.
Meu amigo me fita sem entender nada. Sem dúvida, isso
ele vai querer saber mais tarde.
Sento no banco de couro e minha calça do mesmo tecido
range quando me ajeito para pôr o cinto, evito revirar os olhos
porque sei que Dante ainda está me encarando.
— Você está bem? — Ele questiona quando meus olhos
encontram os dele, é estranho vê-lo na luz do dia, sem aquela
máscara ridícula de coelho, sua barba está bem-feita, seus lábios
levemente rosados pelo frio e o sorriso que ele está me dando
me intimida um pouco. Ele é muito elegante, nem parece de
verdade, contenho o impulso de tocar em sua pele.
— Estou, obrigada.
— Eu reservei horário em um restaurante, espero que
esteja com fome.
— Nós podemos ir para um lugar mais reservado? —
Pergunto, pois, o que eu menos quero agora, são notícias minhas
sobre estar com outro advogado em um restaurante.
— Claro. Posso perguntar o motivo?
— Michael e eu terminamos. — Digo tristemente.
Seus lábios se entreabrem e sua expressão de confusão é
plausível.
— Eu sinto muito.
Me pego olhando pela janela, pensando no que de tão
importante esse ele tem para falar comigo e nas perguntas que
preciso fazer.
— Você se envolveu com minha irmã? — Indago, pegando
nós dois de surpresa.
— Não. — Dante diz com firmeza.
— Por que eu sinto que todos sabem mais que eu?
— Para protegê-la, talvez.
— Do quê? — Ele mordisca o interior do seu lábio
mexendo a cabeça em negação e penso se a pergunta correta
não seria de quem.
— Chegamos.
Olho para fora do carro e percebo que estamos em frente a
uma incrível mansão, sem portões, nem grades.
Dante segue em frente, a casa fica pelo menos há uns
vinte metros de distância, com um belo gramado e um jardim bem
cuidado.
— Você mora aqui? — Questiono quando ele abre a porta
do carro para mim.
— Não, estamos invadindo. — Ele diz sorrindo, me fazendo
corar, por perguntar algo tão óbvio. — Vamos entrar antes que o
dono nos pegue. — Dante brinca.
— Você é sempre tão engraçadinho?
Ele inclina a cabeça para o lado como se estivesse
ponderando.
— Só com quem eu gosto.
Tento não pensar muito no que sua resposta significa.
Dante coloca a mão em minhas costas para me guiar, por
um segundo penso em me esquivar, mas creio que ele esteja
sendo apenas cavalheiro.
Paramos em frente a uma gigantesca porta branca, ele
digita uma senha em um pequeno dispositivo na parede lateral e
um click audível ecoa em seguida. Isso é o que eu chamo de
abraçar a tecnologia.
— Sinta-se à vontade. — Ele avisa quando entramos.
Dante segue em minha frente, mas ainda estou paralisada,
encantada pelo ambiente. Ao meu lado há uma escada de arenito
em curva subindo para o segundo piso, o teto é alto, oval igual ao
de uma capela.
— Sua casa é incrível. — Comento abismada, caminhando
em frente e olhando para cima, quando paro estou a centímetros
dele. Seus olhos prendem os meus, eles brilham como se
houvessem centenas de estrelas ali, isso é o que o torna tão
intenso. Inteiramente absorta pelo homem a minha frente, tenho
um sobressalto quando ouço um latido alto vindo atrás de mim,
me viro e me deparo com um Husky Siberiano no fim da escada.
Involuntariamente ando para o lado do Dante.
— Ela não morde. — Ele avisa quando o animal, que se
parece muito com um lobo, vem em nossa direção.
— É o que todo dono fala.
A cachorra, cinza com peito branco e olhos semelhante ao
do seu dono, para com a cabeça entre nós dois, fico tensa
rapidamente quando ela esfrega seu focinho em minha mão.
— Snow, suba. — Dante fala com a cadela que o encara,
balançando o rabo. — Agora. — Ele reforça, ela emite um choro
baixinho e obedece.
— Ela é muito linda. — Comento.
— Linda e teimosa, parece alguém que eu conhecia.
Fito Dante de esguelha, mas não ouso pergunta de quem
ele está se referindo.
Adentramos mais a casa, ela não contém divisórias entre a
sofisticada sala, com um grande sofá cinza e algumas poltronas
de couro branco, e a colossal cozinha branca, composta por uma
ilha de mármore cinza e um lustre suspenso em cima dela.
— Agora espero que não esteja com fome. — Ele diz
sorrindo e andando para a cozinha.
— Eu não estou aqui pela comida, Dante — Aviso. Ele faz
a volta na ilha e tira de baixo duas taças e uma garrafa
Chardonnay.
— Eu sei, conversaremos durante o jantar.
Suspiro e me sento à ilha, ele serve as taças e me entrega
uma. Dou um pequeno gole no vinho e o observo tirar seu paletó
e em seguida vestir um avental preto.
Cristo, ele vai cozinhar! Algo me diz que eu deveria ter
ficado de bico calado e ter ido ao restaurante.
— Eu quero respostas. — Falo, quando o vejo fechar a
geladeira com a perna.
Ele caminha até a ilha e solta os ingredientes em cima.
— É justo, pergunte.
— Por que minha irmã mentiu? E por que você e Michael
brigaram?
— Tem certeza que não quer aguardar o jantar ficar
pronto?
O encaro séria, cansada dessa enrolação.
— Você queria me ver, pois bem, estou aqui, agora comece
a falar.
— Nos beijamos, você ficou noiva e depois contou ao
Michael, então veio o acidente...
Meu queixo se estatela no chão e preciso de muita força
para conseguir fechar a minha boca.
— Eu estava traindo ele com você? — Questiono
petrificada.
— Não. Eu roubei apenas um beijo seu.
Coloco-me de pé com o coração parecendo uma britadeira.
Todos esses dias, em todos os momentos que eu falava no nome
do Dante, Micaela ficava histérica e Michael tenso. Não sei o que
mais me deixa com raiva, eles não terem me contado ou eu não
ter a menor ideia do que se passava na minha cabeça naquele
momento.
— Por que você fez isso? — Cruzo os braços fortemente
em frente ao peito. Dante faz a volta na ilha e para na minha
frente.
— Estava tendo uma tempestade de neve, ficamos presos
no último andar e bebemos whisky para nos mantermos
aquecidos. Você estava tremendo de frio, ficamos próximos mais
do que estamos agora e a única luz que tínhamos apagou.
— Isso não explica nada.
— Foi o momento, Lindara.
Me afasto dele e faço um coque em meu cabelo, pois, sinto
meu rosto queimar.
Eu já fazia estupidez antes mesmo de perder a memória,
não sei porque isso me admira ainda.
— Você sente algo por mim?
Dante me encara surpreso e engole todo o seu vinho de
uma só vez.
— Não. — Ele fala simplesmente e pega uma faca de
cortar legumes e começa a picar um tomate.
É uma pergunta razoável, já que ele me beijou e invadiu
uma festa para falar comigo.
— Era isso que você queria me contar? — Tiro o meu
casaco colocando em cima do terno dele.
— Não.
Suspiro. E com as mãos tremendo, paro ao seu lado
pegando uma longa faca sem fio e o ajudo picando um pimentão,
ele enche sua taça até a borda então responde.
— É sobre o se pai, Lindara.
Desço a faca com força no vegetal e na ação acabo
cortando meu dedo indicador.
— Oh, Merda! — Uma onda de dor desce pelo meu corpo
no mesmo instante que o sangue pinga em cima da ilha.
Puxo meu braço contra o peito tentando conter a ardência,
mas ondas de tremores começam a descer pelo meu corpo
rapidamente.
— Me deixa ver! — Ele pega minha mão e a segura com
firmeza, pois, não consigo controlar os tremores e a expressão
que Dante faz quando fita o meu dedo não é muito reconfortante.
— Está doendo muito? — Ele questiona.
— Não. — Minto.
— Então por que está chorando? — Dante indaga me
fazendo perceber que estou entre lágrimas. Ele pega um rolo de
guardanapo na ilha e enrola uma folha em volta do meu dedo,
pressionando com firmeza para bloquear o sangramento.
— Podemos ir a um hospital. — Ele sugere preocupado.
Faço que não com a cabeça, o meu o dedo lateja, respiro
fundo me sentindo amaldiçoada. Dante tira o papel
ensanguentado e coloca outro no lugar, já que o sangue continua
a escorrer.
Fico quieta por um momento e vagarosamente meu
coração começa a desacelerar para um ritmo normal, mas há
uma forte pressão na minha cabeça, me deixando um pouco
enjoada, com certeza pela perda de sangue repentina e porque já
faz mais de sete horas que não como nada.
Dante me encara por um bom tempo sem dizer uma
palavra, até Snow surgir na cozinha e seu focinho encostar na
minha perna.
— Ela gostou de você.
— Ou só está conferindo se ainda estou viva.
Ele ri, no entanto, seu sorriso morre quando seus olhos
param no meu peito, acompanho o seu olhar, minha blusa
coberta de sangue. Oh, que nojo!
— Vou buscar uma camisa para você. — Ele avisa soltando
minha mão. Apenas com esse pequeno movimento, meu dedo
volta a latejar.
— Sinto muito pela bagunça. — Aperto os lábios e olho
para pia, e o chão com vários respingos de sangue.
— É só passar uma água. — Dante diz e me deixa só.
Snow fica sentada no chão me observando andar até a
mesa e me sentar em uma grande cadeira estofada.
— Eu sou um desastre ambulante. — Sussurro para a
cachorra que inclina a cabeça para o lado como se tivesse me
entendido.
Eu o traí e, ainda assim, Michael ficou ao meu lado. Então
depois eu fui lá e ferrei com tudo. Isso vai reter em meus
pensamentos por muito tempo.
— Você está bem? — Dante surge na cozinha abotoando
uma camisa e carregando outra em seu ombro.
Assinto.
— Parou de sangrar.
— Que bom. — Ele deposita a camisa sobre a mesa.
— Eu pedi uma pizza. — Ele diz ficando de costas para
mim, tiro a minha blusa manchada de sangue e visto a dele
rapidamente, é macia, grande e cheirosa... e me faz lembrar do
Michael.
— Não precisava, acho melhor eu ir embora. — Falo me
colocando em frente a ele.
— A bagunça já está feita, Lindara. Vamos nos sentar, que
eu vou lhe contar o que realmente importa. — Pondero por um
momento e realmente a bagunça já está feita.
Assinto, então ele pega a garrafa de vinho e as duas taças
na ilha.
Sentamos no mesmo sofá em frente a uma lareira. Dante
apanha o seu notebook da mesa de centro e coloca em cima das
suas pernas.
— Quando você entrou em coma, eu segui em frente até
onde pude com o caso.
— Pensei que Michael tivesse tirado de você. — Pelo
menos foi o que Micaela me disse, porém, agora nem sei mais no
que acreditar, tudo o que ela me contou até esse momento pode
ser apenas uma mentira para amenizar o que eu causei.
— São só papeis, Lindara. E o que eu precisava já estava
salvo em meu computador. — Ele dá um sorriso travesso. —
Conversei com o Sr. Herbert na metalúrgica e fui bem persuasivo.
Não vou mentir, o seu coma veio a calhar. — Ele diz, me fazendo
arquear uma sobrancelha.
— Que bom que minha desgraça serviu para alguma coisa.
— Menciono sarcástica.
— Ele me deu livre acesso a todos os documentos, que
aparentemente estavam ordem, até o meio ano de 2004, onde as
despesas começaram a aumentar e os lucros a baixar.
— Não entendo, na carta você disse que tinha como provar
que não foi o meu pai.
— Os documentos estão todos em ordem, as contas
também, o seu pai só não ganhou o processo porque faleceu
assim que abriram as investigações, então o caso foi arquivado e
seus bens congelados.
— Se ele não roubou quem estava roubando? — Pergunto
e o vejo franzir os lábios.
— No início de 2004, o seu pai contratou uma secretária,
Elise Butler. — Dante umedece os lábios, fazendo uma pausa. —
Com quem ele teve um caso por aproximadamente um ano.
Um caso?!
Ele continua falando, mas ainda estou absorta pelo o que
acabei de escutar.
Um caso. Meu pai teve a porra de um caso! Será que
minha mãe sabia?
— Isso não pode ser verdade.
Dante solta o notebook em cima da mesa e se volta para
mim.
— Eu sinto muito, Lindara, mas é.
— Eu sou uma idiota por acreditar que era tudo perfeito.
— Você era só uma criança. — Ele segura a minha mão
em cima do sofá. — Tem outra coisa. — Ele me dá um leve
aperto e continua. — Tudo aponta para Elise Butler, a secretária,
que misteriosamente sumiu em 2005.
— Foi quando os meus pais morreram.
— Exato! Eu contratei um detetive e descobri que Elise
Butler morreu no início do ano de 2005, mas a mesma mulher foi
vista em Guatemala no México, usando o nome de Betty
Hendricks.
— Não estou entendendo, Dante. — Digo totalmente
confusa.
— Elise é uma golpista. — Ele esclarece como se fosse
óbvio enquanto mexe em seu notebook.
— Ela ainda vive no México?
— Acredito que sim. — Ele responde e então a campainha
toca, Dante solta o notebook na mesa de centro e vai atender a
porta.
Inclino-me para frente e vejo no notebook a foto de uma
mulher de cabelos pretos, olhos cor de amêndoas e um belo
sorriso. O sorriso que enganou o meu pai.
Irritada, pego a taça de vinho da mesa e tomo tudo em um
gole. Só de imaginá-los juntos, me sinto enojada. Ainda não
acredito que ele fez isso com minha mãe. E nesse momento
percebo que somos muito parecidos, dois traíras.
Dante se aproxima segurando uma caixa de pizza, ele a
coloca na mesa de centro.
— Pepperoni e salada para a minha artista. — Ele enfatiza.
— Você é o patrocinador. — Afirmo me sentindo uma idiota.
Ele assente de lábios apertados.
— Desculpe, mas eu já não sabia mais como chegar até
você.
— Tem mais alguma coisa que eu preciso saber?
Ele me entrega um pedaço da pizza, em seguida enche
nossas taças e senta ao meu lado.
— Elise tem um filho de quase 16 anos, Madison. A
encontramos a partir do garoto.
Pego a taça dele de cima da mesa e viro todo o conteúdo.
— Eu tenho um irmão?
— Sim.
Um riso involuntário escapa de mim.
— Que merda! Não era só um caso, ele tinha a porra de
uma família. — Sussurro injuriada. Isso consegue ser pior do que
roubar, de alguma forma. — Eu não quero nada que venha dele.
— Aviso enchendo a taça e quando vou levá-la a boca, Dante a
pega da minha mão com agilidade.
— Isso é vinho, vá com calma. — Ele repreende.
— Calma? Eu quero me enfiar nessa garrafa e esquecer a
vida perfeita que eu tinha. — Digo em tom de ironia.
— Você está com raiva eu entendo, mas precisa pensar
com clareza. Você tem um irmão, agora.
Se ele acha que isso me deixou animada, está bem
enganado. Pego a taça de novo da mesa e a entorno.
— Não devia ter contado tudo de uma vez. — Dante
suspira.
— Está brincando? Você foi à única pessoa que não mentiu
para mim até agora, não estrague isso.
Meu telefone toca dentro da bolsa na ilha da cozinha, antes
que eu pudesse me mover, ele já está em pé indo buscá-la.
Encaro o meu dedo latejando e o guardanapo está começando a
ficar manchado de sangue.
— Pode pegar para mim? — Peço quando ele solta a bolsa
em meu colo.
Dante a abre e tira de dentro meu collant, as sapatilhas, em
seguida o frasco com o meu remédio, ele me fita e uma pergunta
silenciosa passa em seus olhos, então me entrega o telefone.
— Oi, Mica. — Atendo.
— Onde você se enfiou? — Ela questiona áspera.
— Estou bem, obrigada por perguntar.
— Pelo amor de Deus me diz que você não bebeu!
— Talvez eu tenha bebido um pouco.
— Você é inacreditável! Onde você está? Blake vai buscá-
la.
— Calma! Eu estou na casa de um amigo, cortei meu dedo
fazendo comida, pedimos pizza e estamos bebendo vinho. —
Esclareço.
— Na casa de qual amigo, Lindara?
Encaro Dante, ele me fita sério.
— Do Levi, mãe! — Zombo e ouço Mica bufar.
— Me desculpe se eu surtei, já está bem tarde.
— Eu não vou dormir aqui, Micaela, já estou indo embora.
Está mais feliz agora?
— Se você quiser dormir aí tudo bem, Blake e eu brigamos
e estou tentando me acertar. — Ela sussurra.
— O que você aprontou?
— Eu fiz umas compras para o bebê, exageradas e ele
disse que não podemos ficar gastando como antes.
— Entendo. Tudo bem eu durmo aqui. — Dante franze o
cenho, me despeço de Mica e desligo.
— Não se preocupe eu não vou ficar. — Aviso.
— Pode ficar, já está tarde e tem mais de 14 quartos,
escolha um.
— Você já fez isso com outra cliente?
— Você não é qualquer cliente, Lindara.
E é por isso mesmo que eu deveria ir embora.
— A respeito da empresa, Dante, eu não quero nada.
Cancele tudo, por favor.
— Lindara... — Ele diz surpreendido.
— O dinheiro não me trouxe felicidade até agora. Cresci na
riqueza, até perder os meus pais em um acidente, então fiquei
noiva de um homem rico e o resto você já sabe.
— Você pode pensar com calma e me dizer futuramente.
— Não! Agradeço tudo que fez por mim até agora, mas eu
preciso seguir em frente, o passado e o presente, estão
acabando comigo.
Ele concorda silenciosamente.
— Como se sente a respeito da perda de memória?
Respiro fundo e me escoro para trás no sofá.
— Me diga a coisa mais importante da sua vida. — Peço e
ele me encara com silencioso, apertando os lábios.
— Snow.
O encaro surpresa.
— Imagine perdê-la. Snow simplesmente sumiu, evaporou.
O que você sentiria?
— Não sei, talvez desespero e impotência.
— E um enorme vazio. — Acrescento, sorrio devido à
expressão dele. — Me desculpe se estou sendo chata e
dramática.
— Não está. Deve ser difícil. — Ele supõe me entregando
outro pedaço de pizza.
Mecho a cabeça em negação e começo a contar como foi
acordar no hospital e saber que tudo que eu conhecia havia
mudado, Dante é bem atencioso, fazendo várias perguntas, mas
nenhuma que envolvesse o nome do Michael.
Quando um longo bocejo escapou de mim, percebi que
estava na hora de encerrar a conversa fiada e ir dormir.
Deitada em uma cama incrivelmente confortável, me reviro
de um lado para o outro inquieta e quando paro de barriga para
cima, encaro o teto e o vejo girar como se eu estivesse em uma
roda gigante. Todas aquelas informações deram um nó em minha
mente. De fato, Dante não devia ter contato tudo de uma só vez.
Um irmão. Um pai traidor. Uma golpista.
Aproveito que estou sozinha e exalo aborrecida, sento-me
na cama inquieta e vejo uma sombra pela fresta da porta. Se
fosse algumas semanas atrás eu provavelmente me esconderia,
tão bobinha.
Fico de pé e ando até a porta incrédula, se Dante está
achando que vai rolar alguma coisa ele está redondamente
enganado. Abro a porta abruptamente e encontro Snow sentada
me encarando com a língua para fora da boca.
— Está sem sono também? — Questiono, a cachorra
choraminga. — O que você quer Snow?
A cadela encosta na minha perna chamando minha
atenção, então começa a seguir em frente no corredor que está
sendo iluminado apenas por uma luz fraca que entra pela
claraboia. Ela para no meio do corredor e se vira para mim, como
se tivesse perguntando: Você vem?
Claro, por que não?
Já deve passar das duas da madrugada, mas andar por um
corredor escuro com um cachorro que se parece muito com um
lobo, na casa de um completo estranho é bem mais interessante
do que ficar me revirando na cama.
Sigo Snow na espreita, apenas de meia e camisa no piso
laminado de carvalho. O andar superior é tão extenso que mal dá
para ver todas as entradas. Quando subimos, Dante disse que
estaria no fim do outro corredor a esquerda onde fica a suíte
principal, caso precisasse de alguma coisa. E sinto que é para lá
que Snow está me levando. Paro na curva do corredor para o
outro e dou uma espiada, a esquerda há uma porta dupla branca
e a direita uma preta com aspecto de elevador. Snow para no
meio do corredor me observando, deixando o meu coração
disparado.
No momento em que penso em voltar para o quarto, Snow
começa a andar em direção à porta escura.
Argh, cadela!
A sigo sem prudência alguma, um pouco curiosa sobre o
que teria atrás daquela porta. Paro ao lado de Snow e olho para
trás com uma sensação de estar sendo observada, mas não há
ninguém.
Volto-me para a porta e sem pensar muito a empurro para
trás sem muita força e uma luz vermelha liga no interior. E neste
instante a cachorra atravessa a porta. Porra!
Mal consigo ver o que há lá dentro, acho que enxergo o
meu reflexo em um espelho, e o início de uma cama também,
quando tento ver o resto do ambiente Snow sai da sala
carregando uma corda trançada.
Ando de costas ainda tentando entender o que há lá
dentro, mas está muito escuro para distinguir, então de repente
meu corpo bate contra algo sólido.
Sinto meu coração bombear em meus ouvidos, me viro
para Dante sem nem ideia do que dizer a ele e noto que sua
camisa está aberta.
— O que você está fazendo aqui? — Ele indaga,
inexpressivo.
— Eu... eu… — Meu cérebro falha e parece que engoli
todas as palavras, fecho os olhos desejando desaparecer e
quando os abro Dante me encara sério, ainda esperando uma
resposta.
— Lindara. — Ele diz em tom de advertência.
— Não sei, me desculpe. — Digo e me distancio dele
rapidamente, ando com passos largos até chegar ao corredor do
meu aposento, então corro e entro no quarto, de onde eu não
devia ter saído e me escoro contra a porta.
— Cristo que vergonha! — Digo alto e em minha frente
encontro Snow mordendo a corda trançada. Filha da mãe!
Uma fraca batida soa na porta fazendo meu coração
disparar, Snow se põe de pé e caminha até mim, ela raspa as
patinhas na porta pedindo para sair. Essa cachorra está de
sacanagem com minha cara!
— Ela não vai parar até sair. — Dante avisa.
Ah, céus ele está aqui! Exalo baixinho e abro uma fresta
para Snow passar, fechando-a em seguida.
— Podemos conversar?
Sinto meu dedo e minha cabeça latejarem em sincronia.
Sem escolha eu a abro, Dante está apoiado com um braço na
guarnição, em seguida seus olhos encontram os meus.
— Antes que você diga qualquer coisa. — Menciono
corada por ter dado uma de xereta. — Tenho o péssimo hábito de
agir por impulso, então peço desculpas. — Esclareço e espero
que seja o suficiente, pois, não há outra explicação.
— Tudo bem. Descanse, Lindara. — Ele diz simplesmente
e me deixa sozinha totalmente desorientada.
Respiro fundo fechando a porta e me atiro na cama, se
antes já estava sendo difícil dormir, que dirá agora.

Acordo com uma tremenda dificuldade de abrir os olhos.


Me sento e noto que perdi o curativo que Dante fez para mim
antes de subirmos, ajeito os lençóis e em seguida lavo-me na pia
do banheiro e enrolo um pedaço de papel higiênico no dedo.
Ando para fora do quarto me perguntando se há alguma
forma de sair dessa casa sem chamar atenção. Desço as
escadas silenciosamente e pego minha bolsa em cima do sofá,
preciso tomar meus remédios urgentemente. Quando me
endireito, vejo Dante sentado à ilha, folheando uma revista e uma
mulher baixinha usando avental, parada na sua frente, fazendo
almoço pelo cheirinho de comida.
— Boa tarde! — Ele diz sem desviar os olhos da revista, a
mulher se volta para mim e sorri em um comprimento. Olho as
horas no relógio do celular, marcam 11h36min. Coro ligeiramente.
— Eu sinto muito tê-lo prendido, podia ter me chamado.
— Você não prendeu, Lindara. Cheguei agora a pouco. —
Ele avisa.
O encaro incrédula que ele me deixou presa aqui.
— Sai assim que Mari chegou não se preocupe não a
deixei presa. — Ele diz como se lesse meus pensamentos.
Dante é uma caixinha de surpresas, não sei mais o que
esperar desse homem.
— Comprei uma blusa, caso não queria dar explicações.
Meus lábios se entreabrem involuntariamente.
— Obrigada. — Balbucio.
— Senta, vamos almoçar e depois eu a deixo em casa.
Percebo que Mari lança um olhar de estranheza para ele,
mas continua de cabeça baixa trabalhando.
— Dormiu bem? — Ele questiona.
— Apaguei.
Dante sorri.
Pego meu remédio de dentro da bolsa e sem que eu
precise pedir, Mari traz um copo de suco de melancia para mim e
em seguida ela solta dois pratos com macarrão ao molho à
matriciana em cima da bancada.
— Grazie. — Dante a agradece em italiano e logo depois
ela se retira da cozinha em silêncio.
— Por que o remédio? — Ele questiona repentinamente.
— É um calmante, eu tenho problema para controlar as
emoções.
— Por causa da perda de memória?
Apenas assinto.
Terminamos de almoçar em silêncio. Dante não me
perguntou o porquê eu estava bisbilhotando em suas coisas.
Segurei muito a vontade de questionar o que havia naquele
quarto, mas isso lhe daria chances de tocar no assunto.
Troco de camisa rapidamente em um banheiro do primeiro
piso e quando retorno a sala, Dante me aguarda com um kit de
primeiros socorros e um sorriso, ele faz outro curativo
rapidamente e não consigo evitar ficar enjoada ao ver o pedaço
de pele solta no corte.
Assim que entramos na BMW, passo o endereço de
Micaela para Dante, que assentiu rapidamente ligou o rádio
baixinho em uma estação aleatória.
Chegamos ao loft em menos de 15 minutos, ele desliga o
carro e se volta para mim.
— Eu despejei muitas informações e acho que destruí sua
infância. — Ele aperta os lábios.
— Você não destruiu minha infância, meu pai fez isso. —
Esclareço com um riso.
— Eu sei. Se precisar conversar sobre qualquer coisa me
ligue, por favor.
— Obrigada e desculpe a confusão. — Digo mostrando o
dedo, ele sorri e assim eu deixo o carro.

Realmente meu pai acabou com minha infância, cortar meu


dedo não doeu metade do que estou sentindo agora ao pensar
em quem ele era de verdade.
Dante espera eu fechar os portões para partir. Bato na
porta e sem demora Mica a abre.
— Você não vai para o balé? — Ela pergunta assim que
passo por ela e me atiro no sofá.
— Não. Estou exausta.
— E o seu dedo, como está? — Micaela sonda, sentando
aos meus pés.
Puxo o curativo e mostro para ela, Mica faz ânsia no
mesmo instante.
— O que você estava tentando cozinhar? — Ela questiona,
me fazendo rir.
— Ah, para! Nem está tão feio. — Digo ameaçando
encostar nela, minha irmã se levanta do sofá fazendo careta.
— Parece mais alegre hoje. — Ela comenta.
— Claro, dividir meu dedo em dois, rendeu algumas
gargalhadas. — Zombo. Endireito-me no sofá e encaro Mica por
um momento pensando em perguntar por que ela não me contou
sobre Dante, até onde ela pensou que chegaria mentindo?
— Vou me mudar para a casa do Levi. — Informo e ela me
encara surpresa. — Vocês terão um bebê, Mica. Eu não posso
ficar aqui.
— Em seis meses, Linda. Até lá você já pode ter voltado...
— E eu não vou voltar para ele, Micaela. — Aviso,
deixando-a tensa. — A sua vida não pode parar, nem a minha e
muito menos a dele.
— Por que você insiste em fazer isso? — Ela questiona
irritada, mostrando claramente de qual lado está.
A deixo sozinha na sala e caminho até o quarto com um nó
se formando na garganta e começo a guardar minhas roupas de
volta na mala.
— Ele está com uma puta esperança de que você vai voltar
para ele, tenha a decência de avisá-lo pelo menos. — Micaela
rosna fazendo aquele nó se apertar, como não há respondo ela
sai do quarto batendo o pé com força.
Respiro fundo e continuo guardando minhas roupas em
silêncio. Quando termino envio uma mensagem para o Levi,
pedindo o endereço e avisando que estou pronta para me mudar.
Arrasto duas malas para a sala e encontro Mica vestindo
uma jaqueta de couro vermelha e um pondo um lenço branco em
volta do pescoço.
— Então você irá mesmo. — Ela diz desanimada.
— Eu preciso começar do zero. Você só me entenderia se
soubesse exatamente como é estar no meu lugar. Eu me sinto
com dois pés esquerdos tentando andar para a direta, é uma luta
inútil. E Michael é o homem mais incrível e maravilhoso que eu já
conheci, ele merece alguém à altura, alguém com dois pés
certos. — Esclareço e minha irmã se vira de lado e limpa seus
olhos com delicadeza.
Dou um passo na direção dela, pegando em seu braço.
— Desde quando você se tornou tão chorona?
— Há exatamente três meses. — Ela sussurra.
Tiro o envelope que contém o dinheiro do ensaio fotográfico
da bolsa e entrego a Micaela.
— Você enlouqueceu? — Ela questiona ao encarar o papel.
— Não preciso desse dinheiro, vou começar a procurar
emprego amanhã mesmo e tenho uma reserva da venda de
garagem.
— Eu não posso aceitar. — Ela diz tentando me devolver.
— Para de drama! Se não quiser, guarde para a minha
sobrinha.
— Linda…
— Pegue antes que eu mude de ideia.
Mica dobra o cheque e enfia no sutiã, em seguida me
abraça forte.
— Eu lamento pelas coisas terem mudado tanto.
— Não lamente, eu não me lembro de nada. — Aviso rindo.
Meu celular apita com uma mensagem do Levi, me
passando o endereço e quando eu leio, encaro Mica chocada.
— Levi mora no nosso antigo apartamento.
— Não! — Ela diz boquiaberta e caminha para o meu lado
para ler a mensagem, — Isso é...
— Coincidência, obra de Deus, destino, um sinal de que
estou fazendo a coisa certa?
— Loucura! — Ela sibila.
Desço em frente ao Edifício Havilardy e o encaro por um
instante. Será estranho morar aqui sem Micaela. Foi nossa
primeira casa depois do orfanato, não é luxuoso nem de longe,
mas eu me sentia bem aqui. Entro arrastando minhas malas e no
caminho encontro o Ferdinan, zelador.
— Lindara. — Ele diz um pouco surpreso e torço que Mica
tenha pagado todas as despeças na saída.
— Oi, Ferdinan.
— Não imaginava vê-la tão cedo. — Ele fala com um
sorriso jovial e com algumas perguntas estampadas em seus
olhos, e como ele, ninguém tem coragem de perguntar.
— Ficaram algumas caixas suas na sala comercial, eu não
quis jogá-las fora pensei que pudesse precisar uma hora e
também só não liguei porquê...
Por que eu fui sequestrada? Por que eu estava em coma?
Ou por que eu resolvi passar dos limites numa boate?
Mas é claro que eu não posso dizer isso, então apenas
sorrio e digo:
— Desço pegá-las o quanto antes. — Aponto para as
minhas malas, sinalizando que agora seria impossível, ele
assente.
Aproximo-me do elevador e comprimento um jovem
porteiro do prédio, ele chama o elevador para mim e percebo que
fica me olhando, mas não diretamente.
— Algum problema? — Questiono.
— Ham... não. — Ele fala atrapalhado.
— Nos conhecemos? — Pergunto dado ao meu histórico
eu não duvido de mais nada.
— A senhorita é Lindara Fincher?
Olho para ele com uma sobrancelha arqueada.
— Depende, quem deseja saber?
O porteiro de olhos castanhos e nariz arrebitado dá um
pequeno riso.
— Levi pediu para entregar a chave do apartamento para
uma deusa loira. Então eu disse que precisaria saber mais que
isso para entregar a chave corretamente, mas eu estava
enganado. — Ele diz enfiando a mão no bolso e me entregando
uma chave.
— Você costuma cantar todos os moradores? — Questiono
ao entrar no elevador.
— Não. Só os que valem a pena. — O porteiro diz e
quando as portas se fecham sorrio sozinha, incrédula.
O caminho ainda é tão familiar para mim, parece que eu
estive aqui ontem.
Entro no apartamento com a mesma mobília e aquele
sentimento de: finalmente em casa, se assenta em mim.
Vou até o meu antigo quarto e há uma cama vazia me
esperando, arrasto as malas até lá e me livro das minhas roupas
colocando algo mais solto e confortável como, legging preta,
polainas brancas e um cropped cinza de manga comprida que
com certeza é da Mica.
Ligo o rádio nas alturas, e ao som de Pretty Savage do
BLACKPINK, encho as gavetas e o armário com as roupas de
qualquer jeito.
Quando termino me sinto esgotada, minha cabeça lateja
levemente pelo som alto das músicas, porém, é bom, porque me
impede de pensar em qualquer coisa. Vou até à geladeira e só
encontro bebidas alcoólicas, exalo baixinho e tiro uma garrafa de
vodca.
Vou dançando até o meio da sala com a garrafa e por um
momento me sinto a Micaela. Deixou-me envolver pela música e
danço sem ritmo algum. Apenas danço livre e selvagem como de
fato eu me sinto agora e de repente sinto um apertão na minha
bunda, me viro sobressaltada e Levi está atrás de mim, dançando
também.
Desligo a música quando percebo que tem alguém na
porta, desorientada pelo barulho alto e pela vodca sou obrigada a
me aproximar para saber quem é.
— Eu bati. — O porteiro avisa, segurando duas caixas. —
Eu trouxe suas coisas.
— Entre, Dean. — Levi o convida.
— Estou no meu horário de trabalho.
Meu tarado colega de quarto assente e se despede do
porteiro.
— Uau! E eu pensando que seria o colega de quarto legal.
— Ah, com certeza você é, isso, é só a vodca.
Ele ri.
— Por que não foi na aula hoje?
Me atiro no sofá e Levi senta ao meu lado, tirando a garrafa
da minha mão e bebendo.
— Estou cansada, Levi. — Tomo um gole quando ele me
entrega a garrafa de volta. — Minha infância foi uma mentira, sou
tão azarada que quando perdi a memória só esqueci do
realmente importava.
— E como você sabe que importava?
— Apenas sinto.
— Isso tem a ver com o cara de ontem?
— Ele é meu advogado. — Levi me olha com estranheza.
— Outro advogado e também meu patrocinador.
— E também um stalker maluco? — Ele diz me fazendo rir.
— É. — Concordo e rimos.

Converso abertamente com Levi, coisa que eu nunca farei


com meu psicólogo e muito menos com Micaela. A única em
quem eu cofiava e que agora esconde coisas de mim. Me sinto
mais leve, mas acho que sobrecarreguei o pobre Levi.
Enquanto ele toma um banho reviro as caixas que Dean
trouxe para mim.
Encontro uma caixinha de música com uma bailarina em
cima, que provavelmente nem deve funcionar mais. Jogo-a de
volta no canto e pego de dentro meia dúzia de porta-retratos.
Olho para uma foto dos meus pais, minha mãe parecia tão
feliz e o meu pai ao seu lado a olhava com um largo sorriso.
Traidor! Penso e atiro o porta-retrato com força contra a parede.
— O que foi isso? — Levi sai do banheiro enrolado em uma
toalha.
— O porta-retrato caiu. — Minto, enrugando o nariz.
— Contra a parede? — Ele questiona preocupado.
— Já vou limpar.
Saio em busca de uma vassoura e uma pá.
Agacho-me no chão e começo a juntar os cacos de vidro e
quando pego a foto, um pedaço de papel já amarelado pelo
tempo se solta de trás.
Sentada em frente ao Dr. Giordano, eu o encaro impassível
e um pouco sonolenta pela noite passada. Ele tira sua agenda de
dentro da gaveta e me encara com uma expressão ilegível.
— Como você tem passado?
— Cansada. — Digo e relaxo na poltrona.
— O que tem a deixado cansada?
— Mentiras. Desde que eu acordei, percebi que todos
escondem coisas de mim, por isso eu tomei uma decisão
importante e espero que o senhor respeite.
— Qual decisão, Srta. Fincher? — Ele diz cruzando os
dedos em cima mesa.
— Não vou mais me tratar.
Gary fecha o caderno.
— Por quê?
— Estou tentando lembrar do meu passado, sendo que
tudo que eu tinha não existe mais.
— E acha certo desistir de quem você era por que seu
relacionamento chegou ao fim?
Ah, claro que ele não ia deixar passar esse detalhe. Na
semana seguinte a minha mudança para o apartamento, a revista
Fofocando entre outros sites publicaram uma edição referente ao
baile de cinco anos da O’Connor & Associados, e acrescentaram
o fim do nosso noivado. Os títulos eram simples e todos iguais:
Chega ao fim o noivado do advogado Michael O’Connor e a
dançarina Lindara Fincher.
— Descobri coisas que eu fiz e não me orgulho. Não tem
porque continuar lutando por algo que deseja esquecer.
— E o remédio está tomando corretamente? — Ele
questiona, como se esta decisão fosse outro ato impulsivo meu.
— Não estava.
— E o álcool? — Dr. Giordano rabisca algo em uma folha e
me entrega.
— Somos uma bomba-relógio juntos.
— Receita nova, tome sem ingerir álcool.
Será fácil, depois que fiz a besteira de contar tudo ao Levi,
ele deixou nossa geladeira parecendo o deserto.
— É evidente que você não me conta tudo que está
acontecendo e talvez o que você ache desnecessário, seja o
essencial para que eu possa ajudá-la.
— Eu já tomei a minha decisão.
— Não posso obrigá-la a continuar com o tratamento,
Lindara, mas acredito que ainda nos veremos. — Ele diz, com a
mesma expressão de sempre, impassível.
Desço para o térreo e encontro Levi escorado contra a
parede escutando música no seu iPod. Ele tem sido um grande
amigo nessas últimas semanas e seus conselhos me lembram
um pouco os da Micaela. Sinto falta da minha irmã, tenho tanto
para contar a ela, mas me distanciei depois que ela ligou para
Michael e disse a ele para seguir em frente, sem ao menos me
dar chances de explicar. Levi disse que talvez tenha sido melhor
assim para ambos, apesar disso queria tê-lo visto uma última vez.
Já faz um mês que terminamos e eu não consigo mais lembrar do
seu cheiro, e a sua risada é quase uma miragem em minha
cabeça. Não tivemos muitos momentos especiais juntos, pelo
menos que eu me lembre e como Mica mesmo usou de desculpa,
ele terá muito mais a esquecer do eu. Só que eu não sei se a
velha Lindara está pronta para esquecê-lo.
— Planeta terra chamando Lindara.
— Me desculpe.
Ele sorri e acena para um táxi.
— Então se confessou a ele? — Levi pergunta com um
meio sorriso e passa o endereço ao motorista assim que
entramos.
— Ele não é padre, Levi.
— Sorte a sua, senão já teria sido exorcizada. — Meu
amigo diz, me fazendo rir. — Você contou a ele sobre o que
descobriu e sobre o advogado gostosão? — Ele fala, fazendo o
motorista nos lançar um olhar pelo retrovisor.
— Não e não.
Não tive mais contato com Dante desde a noite que dormi
em sua casa. Ele não mandou e-mail ou ligou, extremamente
profissional. Pensei em ligar assim que encontrei o papel e a
chave, mas não queria tornar aquilo real, quando penso que
estou no caminho certo para tudo voltar ao normal, vem outra
coisa que me tira dos trilhos.
— Você não parece muito bem, o que aconteceu lá? — Ele
questiona parecendo um irmão mais velho.
— Você é sempre tão meiguinho? — Pergunto fazendo-o
cerrar os olhos.
— Sim! Pensei que já tivesse notado isso!
Entramos no Conservatório, Penny e Liam se aproximam
sérios.
— Como você está? — Ela questiona.
— Bem! — Digo e pela expressão deles, parecia que não
era essa resposta que eles estavam esperando ouvir.
— Falem logo seus frouxos. — Alice fala andando até nós.
— Penélope. — Sussurro.
— Michael está de volta na cidade. — Penny comenta
observando a minha reação.
— Uma hora ele teria que voltar. — Digo sem entender
esse melodrama.
— Voltou com bagagem a mais. — Alice cantarola.
— Desembuchem! — Esse suspense está me deixando
irritada.
— Michael O’Connor foi fotografado no aeroporto JFK,
acompanhado por sua filha Emma e uma mulher desconhecida.
Deve ser a vadia da Morgan.
— Eles trabalham juntos. — Aviso tranquilamente, quase
que indiferente, mas por dentro sentindo o coração se apertar.
— É eles deviam estar trabalhando mesmo naquelas fotos
que tiraram deles ontem à noite, em um restaurante com mesa
para dois, à luz de velas.
— Todas as mesas estavam com luz de velas. — Penny
replica revirando os olhos.
— Mas se quer tirar suas próprias conclusões... — Alice
fala pegando o celular.
— Boa tarde! — Professor Thatcher surge na entrada. —
Alguém morreu? — Indaga ao me encarar.
— Não. — Digo com um pequeno riso.
— Muito bem, se arrumem, vamos descer para o auditório
e guardem os celulares agora. — Fala diretamente para Alice que
faz beicinho.
Levi encaixa seu braço no meu de um lado e Penny do
outro e assim seguimos Sr. Thatcher para o auditório, nos fundos
da escola.
— Quer conversar? — Penny pergunta.
— Não.
— Quando vê não é nada. — Levi fala receoso.
Paro abruptamente fazendo-os parar junto comigo.
— Parem! — Digo baixinho, mas firme.
Desvencilho-me dos dois e ando até o lado do Shade, ele
me lança um olhar inescrutável e passa um braço por cima dos
meus ombros em silêncio. Isso é exatamente do que eu preciso
conforto e silêncio.
Micaela me avisou que uma hora isso ia acontecer, só não
imaginava que seria tão rápido.
— Desencana! — Shade fala e me aperta contra seu corpo.
— Você sabe que é mentira e que pode ter trilhões de motivos
para ter rolado aquele jantar.
— Eu estou bem. — Digo, tentando encerrar o assunto.
— Você está com a mesma cara que estava quando pulou
em cima da Dulce. — Ele me imita me fazendo rir.
— Você bem que gostou.
— Ela mereceu. — Ele comenta e me solta assim
chegamos ao auditório.
Sr. Thatcher se posiciona no meio do palco e se volta para
nós, com uma expressão não muito saudável.
— O conservatório fez um sorteio e felizmente, — Ele diz
nenhum pouco feliz. — nossa turma ganhou. Vocês farão uma
apresentação no dia das mães, que será exatamente daqui a um
mês. Nós abriremos a apresentação até os pequenos ficarem
prontos. Seja para pais entediados ou não, a apresentação
acontecerá e para a alegria de alguns, virão patrocinadores
assistir as crianças, aproveitem para se exibirem.
— Claro. — Alice fala um pouquinho ácida.
— Faremos três apresentações, Penélope e Liam
representarão Romeu e Julieta. Levi, Shade e Alice, O fantasma
da Ópera. E você, Lindara... — Ele me analisa como se estivesse
esquecido completamente de mim. — Fará o Cisne Moribundo.
— Thatcher diz sorrindo.

— Moribundo! — Digo exasperada ao Levi quando a aula


chegou ao fim.
— Pensa positivo você fará solo e sorria mais, talvez faça
Cinderela da próxima. — Expõe sarcástico.
— Ele me odeia.
— Ai que triste, ganhou o solo e fica chorando igual a um
bebê. — Alice sibila ao se aproximar com o celular na mão,
pronta para espalhar seu veneno.
Volto-me para ela de olhos cerrados e pergunto com um
sorriso nos lábios:
— O que você quer criatura demoníaca? — Pergunto e ela
sorri, me entregando o celular com as imagens do Michael, mas
eu não o pego. — Sabe Alice eu tenho pena de você. — Digo
silabicamente para ela entender com clareza. — Sua vida deve
ser ridiculamente tediosa e patética para você cuidar tanto assim
da minha. O que você quer? Ser minha amiga? Um autógrafo?
Peça-me o que quiser e saia da porra da minha sombra.
— Você é uma vaca asquerosa. — Ela diz rubra de raiva.
— Me conte uma novidade.
Seguro Levi pelo braço, um pouco receosa de dar as
costas a ela e o puxo fora da escola. A aula demorou mais tempo
do que eu imaginei, o sol até já se pôs.
— Uau! Tomou o seu remédio hoje? — Ele pergunta rindo.
— Eu sei que foi infantil, mas era isso ou eu arrancava os
cabelos dela. — Falo descendo a escada com pressa e quando
estou no último degrau piso em falso e sou obrigada a me agarrar
no Levi para não ir ao chão. — Porra! — Uivo chamando atenção
de algumas pessoas.
Aposto que foi praga daquela vaca. Endireito-me com uma
puta dor no tornozelo e me amaldiçoo por estar com esse maldito
salto alto.
— Levanta a cabeça princesa, senão a coroa cai. — Shade
zomba ao parar abruptamente com a moto em nossa frente.
— Vejo você em casa. — Dou um beijo no Levi e subo na
garupa, Shade mal espera eu colocar o capacete e arranca. Filho
da puta!
Abraço seu corpo com firmeza e escoro a cabeça contra
suas costas para diminuir o vento cortante.
De dia sou uma dançarina de balé clássico e a noite uma
safada de tanga que dança em cima de uma plataforma. Ainda
bem que meus pais já estão mortos, penso e depois percebo
como soou cruel.
Chegamos ao Secrets Bar's em dez minutos, eu mal sinto
meus dedos das mãos e meu nariz está um picolé. Faz quase
três semanas que iniciei como dançaria e honestamente não sei
do que Micaela tanto reclamava, o salário é bom, Shade espanta
os palhaços que tentam passar a mão em mim e a bebida é
liberada, porém, é inútil para mim que não estou bebendo.
Largo meus pertences no armário e encontro Shade na
cozinha, tomando café com alguns seguranças, que ainda não
decorei o nome, mas que mentalmente os chamo de careca um e
dois.
— Fico contente da gente não ter ficado aquela vez. — Ele
fala de repente me fazendo encará-lo surpresa. Sento-me ao lado
dele na pequena mesa, meio bagunçada com garrafas de
cervejas vazias e bitucas de cigarros em pequenos cinzeiros.
Contenho o impulso de recolher e jogar tudo fora, mas já fui
tachada de princesa pelas boas maneiras e por falar
correntemente, o que pelo visto, não é normal por aqui.
— Eu também, você com certeza ficaria igual à Dulce,
grudado no meu pé. — Comento o fazendo gargalhar.
— Você está bem? — Ele pergunta preocupado.
— Eu não sei, não sei o que eu deveria estar sentindo. —
Dou um sorriso fraco. — Passei o dia inteiro me policiando para
não pensar no Michael... eu segui em frente e pedi que ele
fizesse o mesmo, só não imaginei que seria tão rápido.
— Você não tem certeza do que aconteceu.
— E porque não pensar no óbvio? Isso uma hora ia
acontecer, só não pensei que fosse ser angustiante.
— Você o ama? — Candice, surge nos pegando de
surpresa da entrada da sala.
— Acho que sim.
— Ahh! Você é a noiva em coma. — Ela expõe pasma.
— Ex-noiva, ex-coma. — Corrijo-a, a morena peituda e com
sotaque colombiano sorri.

Ficamos jogando conversa fora um bom tempo, até uma


das dançarinas entrar na cozinha pronta para festa. Coloco-me
de pé e sinto uma pontada no meu tornozelo, me seguro na mesa
para ganhar equilíbrio.
Deixo os dois conversando na cozinha e caminho
mancando até o vestiário feminino e dentro do meu minúsculo
armário encontro um short de látex vermelho, um top da mesma
cor e meia arrastão com botas de cano longo. Vai ser uma longa
noite.
Visto a minúscula e promíscua roupa e me encaro no
espelho, pareço ter saído de um filme pornô. Pensando melhor,
Micaela tinha razão, não é só a decência que se perde aqui, a
dignidade também.
Desço para a boate com minha cabeça começando a
latejar, encontro Shade atrás do bar com sua roupa habitual,
nada além do suspensório preto preso na calça de couro.
— Uau! — Ele diz com os olhos arregalados e não é de
admiração.
— Eu sei, parece que eu vesti uma camisinha.
Ele gargalha.
— Se transar hoje, fará o sexo mais seguro de todos.
— Isso não acontecerá tão cedo.
Ele ri e volta a arrumar as bebidas atrás do bar.
Caminho até a plataforma com a bota me machucando,
subo os degraus e abro a grade para entrar nela.
Pergunto-me o que eu tinha na cabeça quando resolvi
aceitar o emprego. Dinheiro fácil. Argh!
— Se anima gata! — Candice grita por cima da música, na
plataforma ao meu lado.
— Eu torci o meu tornozelo, estou com muita dor. — Me
queixo, ela faz beicinho e deixa a plataforma andando até mim, a
morena enfia a mão no decote e tira uma pequena cartela.
— Tome, vai passar já, já. — Ela me entrega um
comprimido.
— O que é isso? — Pergunto analisando a pequena pílula.
— Ketamina, é um anestésico, não irá sentir mais nada,
prometo. — Ela diz com um sorriso, então um segurança se
aproxima indicando que ela precisa voltar para a plataforma.
Descarto o comprimido rapidamente e engulo em seco. Ela
se volta para mim novamente e adiciona: — Só tome meio,
porque é forte demais.
— Eu tomei inteiro. — Aviso e ela aperta os lábios.
— O lado bom é que o seu tornozelo irá parar de doer em
meia hora.
— O lado ruim?
— Vai se sentir nas nuvens ou no inferno, depende de cada
pessoa.
— Meu Deus que remédio você me deu? — Exijo saber,
mas então alguém grita para a peituda voltar para o seu lugar.
— Você ficará bem. — Ela expõe, mas não me convence.
Sinto o meu coração acelerar e já me questiono se é efeito
do remédio. Me obrigo a começar a dançar, já pensando no meu
intervalo que será daqui a quatro horas. Dançar e sorrir enquanto
tudo está desmoronando, claro, parece até uma comemoração
para a desgraça.
Meia hora depois, realmente eu nem sinto mais meu
tornozelo, não sinto nada para ser honesta, a sensação é como
estar nas nuvens ainda mais com toda a fumaça espalhada pela
boate. Consigo me mexer sem esforço algum, penso em até
agradecer Candice pelo remédio, mas desisto quando começo a
enxergar tudo, preto, é como se eu estivesse em um gigantesco
túnel escuro e bem no final dele, há pessoas dançando, coloco
minha mão em frente ao rosto e a enxergo no fim daquele túnel.
Pavor toma conta da minha mente e um formigamento do meu
corpo.
Tento chamar a atenção do Shade para ele me ajudar, mas
até focar em um único lugar está complicado.
Desço da plataforma com muita dificuldade a impressão é
estar presa no corpo de uma pessoa bêbada, mas com a mente
minimamente lúcida. Ando esbarrando em algumas pessoas até
chegar ao bar, com o desespero crescendo em mim.
— Shade. — Grito, mas mal ouço minha voz sair. —
Shade! — Grito de novo e nada.
Pego um dos copos em cima da bancada e atiro contra os
barmens e por sorte não acerto nenhum, eu acho, mas dois deles
se viram para mim confusos.
— O que foi? — Shade questiona ao me ver apoiada contra
a bancada.
— Estou passando mal.
— O quê? Não estou entendo nada.
— Shade. — Seguro sua mão em cima do balcão, ele se
aproxima o suficiente para eu falar perto da sua orelha. — Estou
passando mal. — Digo com extrema dificuldade.
Sem demora ele sai de trás do balcão e me pega no colo,
vejo a festa inteira rodar e sinto que vou vomitar a qualquer
momento, ele me leva até o vestiário feminino e me solta em uma
poltrona.
— Você bebeu, não foi? — Shade pergunta decepcionado.
— Não... — Minha voz sai arrastada.
— Vou ligar para o Levi vir buscá-la.
Assinto, já que falar é inútil.
Shade abre a minha bolsa em cima de uma penteadeira e
tira de dentro o meu celular.
Ouço um baixinho zunido em meu ouvido, como se alguém
estivesse surrando algo para mim. Meu corpo inteiro arrepia e eu
não ideia se é delírio ou medo.
— Ele não atende.
— Dean. — Digo. — Liga para o Dean. — Shade me
encara e ri.
— Você está groguezinha, não está falando coisa com
coisa.
Faço cara feia, irritada, minha vontade é levantar daqui e
dar na cabeça dele por ficar zombando de mim.
— Dean. — Falo devagar enquanto Shade futrica no meu
celular e o coloca na orelha em seguida.
— Está chamando. — Ele avisa, e com uma mão alisando
o suspensório, ele diz ao telefone:
— Oi, é o Shade colega da Lindara, você pode vir buscá-la
no Secrets Bar’s? — Ele pausa, — Acho que ela bebeu todas
que não consegue falar nem o próprio nome. — Encaro Shade
incrédula, Levi vai me matar, se eu já não estiver morta até lá. —
Perfeito. — Ele fala e desliga.
— Eu vou matar você. — Chio entredentes.
— Isso eu entendi. — Ele comenta sorrindo enquanto pega
um pano e solta em cima das minhas pernas. — Eu preciso
descer, Dante disse que chega em dez minutos.
— Eu disse, Dean! — Exclamo irritada.
— Sim, ele já está vindo.
Reviro os olhos, exasperada.
Shade desce e aquele medo de ficar sozinha volta. O que
eu mais temia aconteceu, fiquei presa no meu corpo, só com a
mente funcionando e todos aqueles pensamentos que eu tentei
me livrar durante o dia, ameaçam aparecer, os sentimentos que
eu enfiei em uma caixa, querem transbordar para fora, flashbacks
dançam em minha cabeça... Michael, Morgan, culpa, álcool,
Michael, Michael, Michael... e mais culpa.
— Lindara.
Dante para na minha frente, ele está usando um terno preto e um
sobretudo cinza-escuro parece pronto para ir a uma festa. Ele aperta os
lábios e parece que faz com força.
— Consegue falar? — Ele questiona, apenas nego com a cabeça,
falar para quê? Não ia sair nada bonito. — Você bebeu?
Nego novamente e sinto meus olhos se encherem d’água, de raiva e
de como está situação é horrível.
— Drogas? — Ele insiste, cerro os olhos, irritada e as malditas
lágrimas rolam. Ele se aproxima e tenta passar a mão no meu rosto para
limpá-las, com muita dificuldade me esquivo do seu toque.
— Eu não quis ofendê-la, só preciso saber o que você tem.
Exalo baixinho.
— Ketna. Ketanana. — Fecho os olhos com força.
— Ketamina?
Assinto com um certo alívio, que o meu corpo não me deixa sentir, já
que está anestesiado.
— Você vai ficar bem é um anestésico, passará em algumas horas.
Vou levá-la a um hospital. — Ele diz parando ao meu lado e tirando o pano
que me cobre, seu olhar percorre rápido pelo meu corpo, com certeza esse
gesto me fez corar, mas nem isso eu sinto mais.
— No... quelo hopital. — Informo e sai como se eu estivesse com
uma batata quente na boca.
Dante tira seu sobretudo e o coloca em volta de mim, em seguida ele
me puxa para os seus braços. Envergonhada, escondo meu rosto em seu
peito. Tudo o que eu menos queria era causar uma cena bem no dia em
que Michael voltou à cidade com aquela vaca da Morgan e aqui estou eu,
entorpecida, vestida com uma roupa promíscua e sendo carregada como
uma bêbada depravada. Até prevejo uma manchete e de tudo isso o que
mais me preocupa é Michael me ver com Dante em alguma matéria.
Percebo que chegamos ao lado de fora, quando o som da música
diminuiu e o frio devastador atingiu meu corpo quente.
Dante me coloca no banco da frente com cuidado.
Aconchego-me e fecho os olhos assim que ele desliza para o banco
e nem tento questionar para onde ele vai me levar.
Sinto-me um bebê no embalo do carro e sem demora adormeço. Em
algum momento desperto e ouço Dante falando ao telefone, sobre levar
alguém para os fundos da casa.
Acordo novamente, só que em seus braços, estamos em frente à
porta principal, que sem demora se abre e uma mulher alta de cabelos
pretos aparece na minha linha de visão.
— Você trouxe uma prostituta para casa! — Ela uiva.
— Fale baixo, Trixie! — Dante a reprende calmo, mas sinto todos os
músculos do seu corpo ficarem tensos de irritação.
Até ficaria ofendida, mas dado ao meu estado e a minha roupa eu
não culpo a bela Trixie, e se caso ela for a namorada dele, espero sair
desse estado antes que ela queira botar fogo em mim. Dante começa a
subir as escadas para o segundo piso e a mulher vem atrás tagarelando.
Ai meu Deus! Acho que eu morri e fui para o inferno.
Dante chega à suíte principal e abre a porta com um pontapé, ele
para no caminho impedindo Trixie de entrar no quarto.
— Desça. — Ele diz impassível, então a porta se fecha suavemente
com um click e ele me põe deitada em sua cama.
— Está melhor?
— Não.
— Descanse. Em algumas horas se sentirá melhor. — Ele comenta e
puxa minhas botas com gentileza e as solta no chão. — Preciso descer
antes que mais alguém suba, estou no meio de uma reunião de família,
volto assim que possível e trago algo para você comer.
Abro a boca para tentar me desculpar pelo o inconveniente, mas ele
se antecipa e diz:
— Apenas descanse, Lindara.
Ele me cobre com uma manta marrom e em seguida com um
pequeno controle ele liga a lareira que fica em frente à cama.
Dante abre a porta e Snow entra rápido e pula aos meus pés
deitando ao meu lado e antes de ir embora, lança um olhar para nós duas.
Nem quero pensar na conversa que teremos quando minha língua
voltar a funcionar adequadamente.
Aproveito a sonolência e me deixo adormecer novamente.

Quando acordo, sinto que estou em uma fornalha, meu corpo inteiro
sua, tiro os cobertores de cima de mim e sento rápido demais, por um
momento vejo o quarto girar. A luz está apagada e o ambiente está sendo
iluminado apenas pelo fogo da lareira. Fecho os olhos e respiro devagar, o
ar entra com facilidade e percebo que estou de volta.
Vagueio meu olhar pelo quarto, ele é imenso, quase do tamanho do
meu apartamento.
Porra, quem precisa de um quarto tão grande assim?
As paredes são cinza e a colossal cama fica bem no centro do
cômodo, de um lado há um banheiro com uma grande banheira branca e a
única coisa que a separa do resto, é a extensa parede de vidro.
Em frente da lareira tem duas poltronas pretas e uma delas está
levemente reclinada para trás com Dante adormecido.
Desço da cama, me sentando na extremidade e gemo baixinho em
satisfação quando meus pés tocam o tapete de veludo branco. Snow pula
da cama e para em minha frente, aspiro devagar e sorrio faceira para ela,
por mais que não esteja em um lugar muito apropriado fico feliz em vê-la
novamente.
Quando olho para o lado Dante está se espreguiçando na poltrona,
ele se inclina para frente e dá um grande bocejo.
— Vejo que está melhor.
— Sim, obrigada por ajudar. — Sorrio. — Desculpe a confusão, era
para o Dean ter ido me pegar.
— Dean?
— Ele é funcionário do prédio onde estou morando.
Dante assente.
— Posso perguntar o motivo de estar usando essa roupa?
Argh! Esqueci completamente que ainda estou vestida de
camisinha.
— Eu danço na boate. — Explico. Dante ri, descaradamente. — Qual
é graça, palhaço? — As palavras voam para fora da minha boca, me sinto
corar e agradeço o quarto estar escuro o suficiente para ele não perceber
isso.
Dante fica sério, ou pelo menos tenta.
— Não imagino você dançando vestida nisso, na verdade, é até
difícil vê-la nessa roupa. Você parece tão pura e isso. — Ele encara meu
corpo. — A deixa tão...
— Prostituta? — Digo ao lembrar da Trixie.
— Sensual.
— Está dizendo que eu não sou sensual quando estou normal?
Ele ri.
— Você não espera que eu responda isso, não é?
— Uau! — Falo baixinho e desvio o olhar.
Nunca me vi como uma mulher sexy, mas essa doeu.
— Você é uma das mulheres mais belas que eu já conheci e olha
que já conheci muitas, mas eu não a acho sexy. — Nossa por que ele não
desenha, para eu entender ao quão sexy eu não sou?
— Eu também não te acho sexy. — Menciono e ele gargalha.
— Desculpe, eu não estava pronto para essa conversa.
— Acho melhor eu ir embora agora. — Falo ficando em pé
Dante faz o mesmo e seus olhos desviam para o meu corpo, não
sexy, me fazendo cruzar os braços abaixo dos seios, o que faz com que
eles fiquem mais avantajados.
— Algum problema? — Questiono.
— Retiro o que eu disse. — Ele fala me fazendo rir.
— Que meigo. — Zombo.
— São quase três da manhã, não vá embora agora. — Pede
simplesmente.
— Ok. — Não estou pronta para enfrentar a euforia do Levi quando
ele souber aonde vim parar.

Nos sentamos nas poltronas em frente a lareira com Snow aos


nossos pés, por um momento ficamos apenas observando e ouvindo o
crepitar do fogo. Até que Dante girou minha poltrona com o pé em sua
direção.
— Por que começou a trabalhar em uma boate? — Ele pergunta.
Parece meu óbvio para mim, mas explico.
— Eu não fiz faculdade, não tenho curso e sei fazer apenas duas
coisas, servir café e dançar.
— E por que não escolheu servir café?
— Novecentos e cinquenta dólares por mês em um café. Duzentos
por noite em uma boate e ainda tenho a tarde livre para o balé.
— Três mil, mais estabilidade, de segunda a sexta-feira, das 07:30
às 12:00, sem atrasos.
— Está me oferecendo um emprego? — Pergunto petrificada.
— Sim.
— Eu posso pensar?
— Não. — Ele diz e acabo sorrindo. — Aceite, é uma oportunidade
única.
— Não sei se devo, Dante.
— Por causa dele?
Suspiro e assinto.
— Se eu tivesse no lugar dele iria querer o melhor para você e com
certeza o melhor não é dançando em uma boate a madrugada inteira.
— Por que está fazendo isso?
— Só não quero que passe por isso outra vez.
Assinto.
— E Trixie é sua namorada?
Ele me encara surpreso, com certeza por eu lembrar o nome da
mulher no estado em que eu estava.
— Definitivamente não. — Ele diz com repulsa. — Ela é minha irmã.
Ah meu Deus! A reunião em família.

Passamos um tempo conversando sobre a família dele. Dante foi


bem direto, sua mãe, Donatella, é ginecologista, seu pai está morto e sua
irmã é uma caçadora de marido, o que nos rendeu muitas risadas. Seus
avós maternos Mona e Vincenzo vieram juntos com alguns primos visitá-lo.
Sua família é italiana, mas se mudaram para o Arizona quando ele tinha
dezessete anos.

Acordo com um despertador tocando em algum lugar no enorme


quarto. Sento na cama e procuro por Dante, mas só encontro Snow
choramingando na porta. Esfrego os olhos tentando despertar de vez e
abro a porta para ela sair.
Perambulo pelo quarto atrás de qualquer coisa para vestir, até
descer enrolada em uma toalha seria mais decente do que ir com essa
roupa sexy de látex. Encontro o terno que ele estava usando noite passada
na poltrona em frente a lareira. Visto sem titubear e a vestimenta vai até o
meio das minhas coxas, as botas ficam um pouco abaixo dela, deixando
amostra um pouco da meia arrastão.
Grrr! Ainda pareço uma vadia.
Atravesso a porta sem pensar, antes que eu acabe presa nesta casa
o dia inteiro, preciso ir imediatamente ao Secrets Bar’s e pegar minha
bolsa. O meu celular e o meu remédio estão lá.
Desço as escadas e a única coisa que eu ouço são meus saltos
estalando alto nos degraus de arenito, meu coração começa a acelerar
quando ouço um burburinho vindo da sala e quando penso em me virar e
voltar para o quarto, uma voz ecoa até mim.
— Querida! — Me viro e vejo Trixie, parada entre a sala e a cozinha
ela usa um formidável casaco de pele marrom e seus cabelos escuros
estão encaracolados em frente ao peito.
— Oi. — Digo baixinho, não demorou um segundo e seis pessoas se
juntaram a ela.
Que maravilha!
— Venha, vamos tomar café. — Trixie pede com um largo sorriso.
— Senhor Armstrong está?
O sorriso de Trixie aumenta, ela anda até mim e sua aparência é
intimidante, me lembrando um pouco da atriz Megan Fox no filme que ela é
um demônio.
— Senhor Armstrong foi buscar suas roupas em uma boate. — Ela
diz me fazendo corar. Ela engata seu braço no meu e sinto que faz com
força para eu não me soltar e me puxa em direção aos outros.
— Você é maluca. — Murmuro.
— Você não faz ideia! — Trixie diz e sorri quando nos aproximamos.
Todos me encaram como se eu fosse um animal exótico.
— Buongiorno. — Digo audivelmente para ninguém em especial,
deve ter pelo menos quinze pessoas, algumas na sala e outras na cozinha.
Todos se aproximam e me sinto ridícula por estar vestida desse jeito.
— Trixie nos apresente sua amiga. — Uma senhora sentada ao lado
de um senhor, pede, devem ser Mona e Vincenzo.
— Ah, essa é a namorada do Dante, nonna.
— O que você está fazendo? — Indago quase inaudível, mas com
um sorriso para os avós do Dante.
— Me divertindo. — Ela explica e sorri para os demais.
— Accetta un caffè? — Um homem surge atrás de mim e pergunta.
— No grazie.
Ele sorri.
— O italiano dela é maravilhoso. — Trixie fala ainda me segurando.
— Quer tirar seu casaco, querida? — Uma mulher de cabelos loiros
ondulados surge ao meu lado, seus olhos são azuis como os do Dante e
não demoro muito para perceber que é Donatella.
Gotas de suor começam a brotar na minha pele e contenho a
vontade de sair correndo.
— Não, obrigada.
— Ah, não fique envergonhada. — Trixie encosta no paletó para
tentar abri-lo, mas seguro em sua mão e cravo as unhas no seu dorso.
— Eu disse não, obrigada.
Ela recua ainda sorrindo e me solta.
— Você é a primeira namorada do Dante que conhecemos. — Uma
mulher de cabelos acobreados menciona animada. — Como ele é? — A
pergunta certa é como ele vai ficar quando eu vê-lo. Ele me abandonou
nessa casa de loucos.
Todos me encaram esperando uma resposta, Trixie sorri ainda
animada.
— Não poderia ser melhor. — Anuncio, e todo mundo sorri em
êxtase, como se eu tivesse contado que Dante ganhou o Oscar e não uma
namorada de mentirinha.
— Ah, venha aqui, quero ouvir mais sobre você e meu neto. — Mona
me chama.
— Vai lá, cunhadinha. — Trixie fala com um largo sorriso.
Argh! Como eu queria estar dopada agora.
Caminho até a doce vovó e me sento ao seu lado e quando cruzo as
pernas o vão do paletó se abre, mostrando muito mais do que eu desejava,
me esforço para não revirar os olhos e apenas sorrio para o restante que
se juntam para ouvir nossa conversa.
— Como se chama querida? — A senhora pergunta com um sorriso
perspicaz.
— Lindara Fincher. — Quando digo meu nome, vejo a surpresa na
expressão de Trixie. O sorriso dela desaparece em um piscar de olhos, não
sabia que meu nome causava esse tipo de reação nas pessoas.
— E você faz o que querida? — Agora ela quer minha ficha corrida.
— Sou bailarina.
— Ah, que belíssimo! Dance para nós vermos.
Ah! Que se danem.
Me ponho de pé abruptamente pronta para correr e vejo Dante
parado na entrada da sala segurando a minha bolsa e sem entender porra
nenhuma.
— Você demorou. — Sibilo.
— Ah, ela já estava com saudades, Dante. — Uma mulher comenta
ao lado dele.
— La tua ragazza è bellissima. — A sua namorada é belíssima, suas
palavras ecoam na minha cabeça me fazendo cerrar os olhos para ele,
Dante sorri para a sua avó em agradecimento.
— Nos deem um minuto. — Dante pede e sinaliza para eu ir até ele.
— Não a leve agora, até que enfim aconteceu algo interessante
nessa casa. — Alguém em algum canto fala.
— Nós já voltamos. — Aviso com um sorriso amigável a todos e me
junto ao Dante apressada.
Ele vem logo atrás de mim, subo as escadas, feito um furacão e vejo
que ele precisa se esforçar para me acompanhar, entro em seu quarto e
me viro para ele furiosa.
— Sua irmã é uma... — respiro fundo para não berrar vadia, ele
passa por mim e solta a bolsa na cama.
— Seja lá qual ofensa você esteja pensando, eu concordo, mas não
entendo por que você desceu, e por que está usando meu paletó ou por
que disse que era a minha namorada.
Viro de costas para ele porque sinto que meu coração irá implodir,
respiro fundo então o encaro novamente.
— Primeiro, eu pensei que estivesse só nós dois, você não me disse
que sua família inteira estava hospedada aqui.
— Por que você acha que tenho tantos quartos? — Ele indaga me
fazendo cerrar os olhos.
— Segundo, dê graças a Deus por eu estar usando o seu paletó, se
eu tivesse decido só com isso. — Mostro a roupa de látex. — Seus avós
cairiam duros.
— O meu avô com certeza. — Dante diz com um riso zombeteiro, o
encaro incrédula, mas sou obrigada a rir.
— Terceiro… — Prossigo. — Sua irmã me arrastou até eles e me
apresentou como sua ragazza.
— Por que não negou?
Olho para ele impassível e noto que não tenho resposta para essa
pergunta.
Dante se aproxima e me segura pelos ombros me obrigando a
encará-lo.
— Busquei suas coisas. Troque de roupa e vamos descer esclarecer
tudo.
— Você pode contar a verdade depois que eu for embora? — Ele
franze o cenho em desentendimento. — A nonna gostou de mim e odiaria
passar por mentirosa na frente de tantas pessoas. — Ele ri e assente.
— Estarei te esperando do lado de fora. — Dante avisa, saindo do
quarto.
Coloco as roupas de ontem, uma meia calça grossa, um vestido
preto colado de mangas longas e por cima um sobretudo cor cáqui, com
uma grossa gola marrom aveludada. Jogo as roupas de látex no lixo do
banheiro e calço o sapato que me fez torcer o pé, então percebo que a dor
amenizou com o remédio.
Pego meu celular de dentro da bolsa e a milhares de mensagens e
ligações perdidas.
Levi, Micaela, e o Michael...
Meu coração se espreme rapidamente.
O que será que ele quer comigo?
Clico no número dele, indecisa se devo prosseguir com a ligação e
antes que a chamada iniciasse, Dante abre a porta e entra com os olhos
fechados me fazendo desligar rapidamente.
— Estou vestida. — Anuncio, ele abre os olhos e me fita com o
celular na mão.
— Você está bem? Eu bati e não respondeu.
— Estou. Minha irmã me ligou algumas vezes e faz um tempo que
não conversamos.
— Estão brigadas?
— Ela se meteu onde não devia.
— Parece muito com a Trixie. — Ele diz com um sorriso e depois
apenas me encara impassível, como se estivesse me lendo. — Não é só
isso que a está chateando, não é?
— Não faça isso. — Peço.
Michael ligou faz uns 20 minutos, Dante provavelmente já estava
com meu celular e deve ter visto a chamada.
— Não fazer o que, Lindara?
— Me analisar...
— Não estou analisando, estou dizendo o que qualquer um pode ver.
— Você parece inabalável, decidido, resolvido... como consegue ser
assim?
— Quebrei a cara algumas vezes. A parte mais difícil é descobrir o
que quer.
— E você descobriu?
Ele diminui o espaço entre nós e pega em minha mão, por um
momento penso em afastá-lo, mas ele apenas observa o dedo que eu
havia cortado semanas atrás.
— Da pior forma. — Dante me solta e caminha em direção à porta.
— Você vem?
Esperava outro tipo de resposta, mas não contesto, já tenho meus
problemas e não preciso dos dele para me abalar. Assinto e saímos do
quarto, quando chegamos a curva do corredor, meus olhos se deparam
com a porta escura e metálica a nossa frente.
— Posso fazer uma pergunta?
— Acabou de fazer. — Ele sorri e acrescenta. — Ainda deseja saber
o que a atrás daquela porta, não é?
Coro.
— Você é sempre tão agradável? — Questiono ironicamente.
— Não, pergunte a Trixie.
— Se não se dão bem, por que ela está aqui?
Ele pensa por um instante e então diz cauteloso:
— Me mudei para Nova York assim que completei vinte anos, Trixie
me culpou por tê-la abandonado. Minha família é tradicional, os italianos
estão sempre unidos, mas como ela era nova demais, não a deixaram vir e
nem ir a uma faculdade longe do Arizona.
— Você nunca mais voltou para o Arizona?
— Voltei para resolver pendências, então quando meu pai faleceu
tive que trancar a universidade e ficar um tempo com minha família.
— Eu lamento.
— Já faz tempo, Lindara. Trixie é birrenta e gosta de ser o centro das
atenções.
— Não parecia quando ela me jogou para cima dos seus familiares.
— Eu sinto muito por isso, ragazza.
— Então você nunca apresentou ninguém para eles?
— Não, meus primos pensam que eu sou reservado porque sou gay.
— E isso não o incomoda?
Dante me dá um sorriso formidável.
— Por que incomodaria, eu mal os vejo. Você é que deu esperança
para eles. — Ele diz sorrindo.

Chegamos na escada para o primeiro piso e lá embaixo próximo do


primeiro degrau, Trixie e Donatella conversavam baixo como se tivessem
tramando alguma coisa, as duas sem demora se voltam para nós e
sorriem.
— Você já vai, Lindara? — Trixie fala alto, chamando a atenção de
todos.
— Sim, preciso resolver algumas coisas.
— Que bom, assim estará livre para hoje à noite, é o aniversário da
nonna.
— Espero que Dante tenha a convidado. — Diz a doce velhinha que
surgiu do além, de trás das duas.
— Eu... — Encaro Dante esperando alguma ajuda, mas ele apenas
me observa tranquilo, — Eu adoraria, mas...
— Mas você não quer! — Trixie resmunga.
Argh! Eu mal a conheço, mas já a odeio.
— Mas precisamos comprar um presente primeiro. — Passo minha
mão por trás das costas do Dante como se fosse abraçá-lo, mas lhe dou o
beliscão, mais forte que consigo. Ele arqueia o corpo levemente para frente
e me encara atônito, apenas lhe retribuo com um largo sorriso.
— Ficam tão belos juntos. — Mona comenta, alegre.
— Dante por que não nos contou de sua ragazza antes? — A vovó
quer saber.
— É mio amore, por que você não falou de mim para sua família? —
Questiono tentando deixá-lo em maus lençóis.
E pelo visto funcionou, já que Mona e Donatella o encaram
esperando uma resposta e Trixie nos fita com desentendimento. Acho que
a diversão dela chegou ao fim.
— Eu... — ele abre um sorriso tímido, como se fosse possível, Dante
não tem nada de tímido. — Linda é muito importante para mim, fiquei com
medo que assustassem ela.
As duas olham para ele com pura admiração. Não creio que elas
acreditaram nesta asneira, por um momento me vi em uma novela
mexicana.
Me despeço de todos, um por um, já que a Família Buscapé fez
questão de me abraçar e dar bom dia. Tenho a impressão que sou meio
grossa com esse tipo de situação, a família Armstrong foi muito hospitaleira
e a única coisa que eu queria era sair correndo para o lado o oposto, o que
tem de errado comigo?
Ahh, então eu recordo qual era o tipo de tratamento que eu tinha
com Beatriz e não era nada amigável, não estou acostumada a ser bem
tratada e quando sou, ajo indiferente.
— Não vai mais falar comigo? — Dante pergunta no caminho, depois
de um longo tempo de silêncio.
— Vou, hoje à noite no aniversário da sua avó, mio amore. — Falo
acidamente.
— Você não precisa ir, Lindara.
— Você podia ter dito isso lá, quando eu disse o: “mas”. — Rebato e
Dante sorri. — Do que está rindo, palhaço?
Ele fica sério, me fazendo arquear a sobrancelha e cruzar os braços.
— É segunda vez que me chama de palhaço hoje. — Ele expõe
nada contente.
— Não sabia que estava contando. — Respondo com acidez
novamente.
— Fui um palhaço mesmo, por ter ido buscar você, por ter cuidado
de você, oferecer um emprego para não precisar se vestir igual a uma
prostituta... — Se ele está tentando me fazer sentir mal, devo avisá-lo que
está falando com a Lindara atual.
— Estamos quites, eu não sou sensual e você é um palhaço. — Levo
uma mão à boca para não rir, porém, é impossível e vejo Dante olhando
para mim e sorrindo também.
Entro no elevador um pouco mais aliviada por estar
chegando em casa, um banho quentinho é tudo que eu preciso
para tirar toda a sujeira que rolou na noite passada.
Abro a porta já esperando a fúria do Levi por não ter dado
notícias e quando entro encontro ele e Micaela sentados na sala.
— O que você está fazendo aqui? — Questiono, sentindo
meu coração começar a acelerar.
— Bom te ver também, irmã.
Solto minha bolsa no cabideiro atrás da porta e me
aproximo da Mica, ela se põe de pé e sua barriga é o que se
destaca em seu corpo.
— Onde você estava? — Ela questiona, Levi faz um sinal
com os braços atrás da Mica, chamando minha atenção e
inaudível ele fala: Shade.
— Dormi com o Shade. — Falo rápido demais, me
atrapalhando.
— Não acredito que você está transando com aquele
pivete!
— Eu dormi na casa dele, não com ele. O que você quer,
Micaela?
Ela me encara surpresa pelo meu tom de voz que saiu
mais áspero que eu desejava.
— Michael pediu que eu te entregasse alguns papéis. —
Ela tira de dentro da bolsa um envelope pardo e me entrega.
— O que é isso? — Pergunto.
— Documentos para você seguir em frente com o caso do
seu pai. Ele deixou também uma lista de advogados confiáveis.
Ah, deve ser por isso que ele me ligou.
— Você viu ele? Como ele está? — Pergunto antes mesmo
de ela conseguir abrir a boca.
— Sim, eu vi. Ele perdeu uma esposa, Lindara. Você não
será a maior perda dele.
Encaro-a pasma pela sua hostilidade.
— Mica...
— Eu já estou de saída.
— O bebê… é menino ou menina? — Pergunto assim que
ela abre a porta.
— Menino. — Ela diz e fecha em seguida.
Encaro Levi, sentindo que levei uma rasteira.
— Uau! Você está bem? — Ele questiona.
— Vou ficar. — Informo e ando desalenta para o meu
quarto, meu amigo me segue e se deita ao meu lado.
— Aquilo foi cruel. — Ele comenta.
Foi a mais pura verdade, Michael tinha o seu grande amor
e ela morreu, daí eu virei a estepe e olha só no que deu.
— Minha irmã está com raiva e é nesses momentos que
acabamos falando a verdade. Vamos só mudar de assunto. —
Peço.
— Shade me contou o que aconteceu. Você é a garota
mais azarada que eu conheço.
Ficamos um bom tempo conversando e contei a ele tudo o
que aconteceu ontem à noite e sobre o meu novo emprego
também. Chega de dançar seminua! Quanto eu mais falava do
Dante para Levi, mais ele ficava admirado e extasiado, mas
quando eu contei sobre Trixie ele se levantou da cama
rapidamente, eufórico, dizendo que ela parecia ser maravilhosa, o
que me fez questionar se ele estava me ouvindo de verdade.
Levi se deita ao meu lado novamente e escora sua cabeça
no meu ombro.
— Ahh, Levi — Digo tristonha. — Parece que eu vivo
pisando em ovos desde que eu e Michael terminamos. Tudo que
eu faço, tenho medo que ele descubra e se magoe, não parece
que não terminamos de verdade, entende?
— Todos os finais de relacionamento são assim, primeiro
vem a descrença, a ficha ainda não caiu, parece que é só um
momento ruim e vai passar, mas não passa. Depois a raiva,
quando a ficha cai e ele vai querer tocar fogo em todas as suas
coisas. Digo, ele, porque foi você quem terminou.
— Você não está ajudando.
— Depois vem a carência e a depressão.
— Quantos passos ainda faltam? — Zombo. — Acho que
estou passado pela depressão.
— Aceitação, onde ambos aceitam que chegou ao fim e
que precisam seguir em frente sem culpa de se apaixonar
novamente.
— Eu não quero me apaixonar, é doloroso demais.
— Você precisa de uma motivação, Lindara. Está vivendo
como uma morta viva desde que entrou nesse apartamento. O
que você quer da vida?
— Você sabe o que você quer? — Desconverso, porque
não tenho ideia do que responder.
— Quero ser aceito pelos meus pais da forma que eu sou e
ser o melhor e mais gostoso bailarino de Washington. — Ele diz
com um sorriso de sonhador. — Você é linda, poderosa, só não
tem...
— Memória.
— Exato. Deixe o passado para trás, ou vai passar a vida
se remoendo por algo que não se lembra.
— Você é melhor que meu psicólogo.
Ele ri.

Acordo sozinha me sentindo um pouco tonta, a última vez


que eu dormi tanto assim acho que eu estava em coma. Saio do
quarto com a cabeça latejando e me recordo que não tomei meus
remédios. Merda!
Encontro Levi na sala bebendo vinho e assistindo TV no
escuro.
— Boa noite, gatinha.
Pego meu comprimido na bolsa e os engulo a seco. Me
atiro ao lado dele, que levanta a taça rapidamente para o alto
para não virar.
— Por que não me acordou?
Levi pausa a série e me encara sorridente.
— Para você ter forças hoje à noite. — Ele dá uma
piscadela.
— Você vai comigo. — Aviso me pondo de pé
preguiçosamente.
— Você ficou maluca? — Ele pergunta de olhos
arregalados.
— Você vai! — Afirmo e caminho até o banheiro.
— Lindara! — Ele uiva me fazendo rir.
— Você não me buscou! Dante que foi e a irmã dele me
deixou na maior saia justa, literalmente, na frente de todos. E eu
não confio em mim sozinha com aquela família.
— Ou com Dante? — Ele fala sedutoramente. Tiro minhas
roupas e jogo no Levi, que faz cara de nojo.
— Com todos! Eles pensam que eu sou namorada dele e
vai que a irmã maluca apronte alguma coisa.
— E por acaso eu tenho cara de escudo humano?
— Você vai!
Levi choraminga e resmunga saindo do banheiro.
Tomo meu banho rápido. Já deve ser quase sete horas,
Dante não avisou o horário que viria, mas com base na idade dos
seus avós, não acho que iram jantar muito tarde.
Quando saio do banheiro, meu colega de quarto está
amarrando seus coturnos, ele se põe de pé com um sorrio feroz.
— Para quem não queria ir você se arrumou bem rápido. —
Debocho, Levi está vestindo uma calça jeans e uma jaqueta de
couro preta, com um cachecol cinza-escuro.
— Comida de graça, baby. — Ele diz com uma voz grave
que eu nunca escutei antes e fecha o zíper da jaqueta até em
cima.
— Como está másculo, vão pensar que levei o amante
para o jantar.
— Ai, sério? — Ele fala com um sorriso meigo e com a
cabeça levemente inclina para o lado.
— Não, esquece. — Passo por ele rindo.
Levi me encara duramente, voltando para sua pose de
“mal-encarado”, ele me observa como muitos homens fazem na
rua e se aproxima lentamente, então suas mãos me pegam pela
cintura quase arrancando a minha toalha e ele me puxa para
perto de si. Seguro em seus ombros e mordo o lábio como se
estivesse pedindo por mais. Ele se aproxima ainda me encarando
friamente, contenho a vontade de empurrá-lo, mas quero saber
até onde ele vai com isso. E quando seus lábios encostam
levemente nos meus, ele se distancia com cara de nojo. Até me
sinto um pouco ofendida.
— Urrr! Não consigo. — Fala me fazendo gargalhar.
— Você nunca ficou com uma mulher? — Pergunto.
— Já, mas foi antes de saber realmente do que eu gostava,
é não é de mulher. — Abro a porta do guarda-roupa e ele se
levanta ligeiro parando atrás de mim. — Você ia deixar eu te
beijar? — Agora que ele se deu conta.
— Acho que estou na fase de carência. — Zombo.
— Você é nojenta! Urrr. Vamos escolher algo para você. —
Ele informa passando na minha frente e vasculhando as roupas,
até parece que incorporou Micaela.
Não devia ter pensado na minha nela agora, o jeito que
Mica saiu daqui hoje, ainda está me incomodando, talvez seja
melhor eu fazer uma visita e deixar tudo em pratos limpos, agora
que eu vou trabalhar para o Dante, não vou poder mais esconder
isso de ninguém. Está na hora de arrancar o band aid.
Levi me entrega uma saia de couro de cintura alta e uma
blusa branca de cachemir, com a gola caída.
— Coloque uma bota de salto alto, mas de cano baixo.
Piso firme no chão e estou sentindo a dor voltar para o meu
tornozelo aos poucos, não sei como vou aguentar usar botas por
mais uma noite.
Quando termino de me vestir ele passa uma maquiagem
leve e um batom um pouco mais forte. Quero dar outra
impressão, pois, a de hoje cedo, não gosto nem de lembrar.
Em seguida Levi prende a parte de cima do meu cabelo,
deixando um pequeno topete e na parte de baixo ele alisa
diminuindo o volume dos meus fios ondulados.
— Está perfeito! — Ele diz animado e me encara de olhos
arregalados quando a campainha toca. Levi pega um sobretudo
bege com grandes botões pretos e me ajuda a vestir.
Ando sem pressa até a porta com coração acelerando e
não faço ideia do porquê.
— Tem certeza que você quer que eu vá?
— Sem você eu não saio dessa casa.
Ele revira os olhos.
Abro a porta sem mais protelação e Dante está em pé do
outro lado, usando um vistoso terno preto com um sobretudo
longo e cinza-escuro de lã batida.
— Mamma mia quanto sei bella. — Ele fala com um largo
sorriso.
— Grazie. — Sorrio. — Levi irá conosco. — Acrescento.
Dante desvia os olhos dos meus e busca por meu colega
atrás de mim, então ele sorri e assente.
— Claro.

Descemos todos no minúsculo elevador, Levi fica atrás de


nós, com as bochechas levemente coradas, ele não tira os olhos
do Dante e sei disso porque posso vê-lo pelo espelho a nossa
frente. Mas ele está tão hipnotizado que nem se tocou.
Enfio as mãos no bolso assim que as portas se abrem e
encontro um pequeno e firme papel.
— Tudo bem? — Levi pergunta quando me vê parar no
meio do saguão e encarar o papel.
— Sim... é o cartão de uma detetive.
— Está com problemas? — Dante questiona.
— Não. Ela me deu o cartão, meses atrás, caso eu
quisesse ver a gravação do sequestro.
— Você viu? — Dante pergunta.
— Não, eu tive medo. — Pensando agora é estranho ter
medo de algo que não se lembra.
— Você vai ligar? — Levi questiona.
— Vou, talvez me ajude a lembrar, ou a seguir em frente de
uma vez por todas.
Meu amigo assente em concordância.
— Boa noite! — Dean cumprimenta ao sair da guarita, todo
embelezado.
— Olá, Dean. — Levi dá um grande sorriso. Pervertido!
— Estou indo a um bar, está a fim de ir? — O porteiro
pergunta e os olhos do Levi brilham sutilmente.
— Claro! Eu ia ficar segurando vela à noite inteira mesmo.
— Levi! — Rosno, fazendo os três rirem.
— Você ficará bem. — Ele pisca para mim. — Só não beba
nada ou tome anestésico o suficiente para dopar um elefante,
que ficará bem.
— Obrigada! — Escarneço.
Me viro para Dante e o puxo pelo braço para fora do
edifício sem me despedir. Paramos em frente a BMW, ele abre a
porta para mim e quando ele senta ao meu lado, me fita em
silêncio por um breve momento.
— Você não precisa fazer isso, Lindara. Está indo por
obrigação.
— Me desculpe é que... é estranho. Eu mal os conheço e
você será o meu chefe, e sempre que estamos perto acontece
algo desastroso.
Ele ri.
— Não posso discordar.
Escoro a cabeça no banco e encaro o teto, indecisa do que
fazer, respiro fundo e digo:
— Vamos!
Ele me dá um sorriso formidável.
— Não se sinta pressionada a nada, quando quiser ir
embora me avise e iremos, e se Trixie enlouquecer, de um puxão
de cabelo nela, pois, eu não posso. — Ele pisca.
— Registrado.
Ele começa a dirigir em silêncio, parece estar perdido em
seus próprios pensamentos.
— Qual será minha função no escritório? — Pergunto o
pegando de surpresa.
— Será minha assistente.
— E você precisa de uma ou está fazendo isso por
caridade?
— Preciso. Helena vive reclamando que está
sobrecarregada, mas você obedecerá somente a mim.
— E se eu não obedecer? — Pergunto com um riso.
— Daí eu a castigarei.
— Como? — Questiono, ele me encara pensativo. Mordo o
lábio para não rir da expressão dele.
— Quer mesmo seguir nesse caminho? — Dante pergunta
impassível e seu olhar me faz corar ligeiramente.
— Não, e eu tenho um veto a impor.
— Qual?
— Esse olhar.
Ele gargalha.
— Que olhar?
Olho para ele sedutoramente e dou uma leve arqueada nas
sobrancelhas. Não foi exatamente isso que ele fez, mas já serve
de exemplo.
— Ok, tudo que eu menos quero é fazer você se apaixonar
por mim. — Ele diz sarcástico.
— Uau! Vou abrir a janela para ver se diminuí esse seu ego
inflado.
— Não precisa, já chegamos. — Ele diz com um sorriso
irônico.
Dante desce do carro e em seguida a minha porta é aberta
por um manobrista. Ele estende a mão e me ajuda a sair do
carro.
— Buona notte, signora.
Assinto e o rapaz retribui com um sorriso gentil.
Faço a volta e encontro Dante na calçada, paro ao seu lado
e encaro a fachada do majestoso restaurante, La Pergola. Escrito
em grandes letras pretas, com centenas de luzes amarelas em
cima para destacá-lo.
— Tem certeza que deseja entrar? Depois não terá mais
volta.
— Você está me assustando.
Ele me dá um sorriso perspicaz.
— Já foi em alguma festa italiana?
Apenas faço que não.
— Para tudo tem uma primeira vez. — Dante diz e em
seguida puxa minha mão e enrosca em seu braço, me seguro em
seu bíceps e é inevitável não notar como é grande e duro.
Porra!
Que merda de pensamento foi esse! Berro em minha
mente ao perceber como essa frase saiu imprópria. Coro
veemente.
Um senhor abre a porta de vidro com arabescos dourados
e Dante nos guia para dentro. O restaurante tem o formato oval
com paredes vermelhas e mesas para dois, dispostas próximo da
parede para deixar o centro do salão vazio. O teto é alto e
dourado, e suspenso nele há um descomunal lustre com
pequenas luzes acessas.
Caminhamos para o meio do salão e a música, Funiculì
Funiculà, rompeu alto em algum canto do salão, me dando um
grande susto, Dante ri da minha expressão, mas não diz nada.
Encontramos a família dele do outro lado do restaurante, em uma
grande mesa com poltronas brancas e estofadas.
Dante me ajuda a tirar o sobretudo e depois puxa uma
cadeira para mim. Seria tão mais fácil fazer isso sozinha se não
tivesse uns quinze pares de olhos observando nós dois. Em
seguida ele senta ao meu lado esquerdo, e no meu lado direito se
encontra sua doce irmã, Trixie. O silêncio cai sobre a mesa e noto
que todos ainda nos encaram.
— Estão assustando ela. — Dante avisa e não demora um
segundo até todos voltarem a rir e a conversar.
— É bom tê-la aqui. — Mona fala a minha frente e ao seu
lado se encontra Vincenzo e Donatella, o avô de Dante me
encara com sorriso jovial, já a sua mãe não parece muito
contente. Todas as sogras me odeiam ou é impressão minha?
— Obrigada.
— Nos conte como se conheceram. — Trixie pergunta e a
mãe dela a encara com um olhar de reprovação, pelo visto ela já
está a par da mentirinha. Encaro Dante sentindo as bochechas
aquecerem.
— Linda precisava de um advogado...
— Pensei que ela já tivesse um. — A irmã dele cantarola.
Dante passa o braço por trás da mim e acho que dá um beliscão
sutil em sua irmã, que dá um sobressalto com um gritinho, me
fazendo rir.
— E por que você precisa de um advogado? — Donatella
pergunta.
Começo a contar minha história a eles, deixando de fora os
últimos incidentes e toda a parte que eu não lembro. Quando
termino a mesa inteira está me observando em silêncio.
Argh!
Acabei deixar o aniversário da nonna meio mórbido.
Quem quer saber a história de uma órfã, que ficou pobre e
foi crida com outras 100 crianças, por freiras?
Suspiro.
— Então você é rica? — Trixie pergunta.
— Trix! — Sua mãe a censura e sorri para mim como um
pedido de desculpas. Acho que minha história amoleceu alguém.
— Não.
— Um dia será. — Dante põe sua mão em cima da minha,
na mesa, e dá um leve aperto, arrancando suspiros da vovó.
Sorrio para ele em agraciamento, mas retiro a minha mão em
seguida.
O resto do jantar se desenrolou tranquilamente. A família
do Dante parece muito unida, eles falam muito alto e riem de
tudo, por mais que seja tudo uma mentira, não me sinto perdida
entre eles. Dante e eu ainda somos dois estranhos, mas o mais
estranho, é que não é estranho. Sorrio sozinha.
Nonna e Vincenzo se colocam de pé assim que uma
música lenta começa a tocar.
— O que eles estão fazendo? — Pergunto.
— Nunca saímos sem que eles dancem uma música. —
Donatella explica.
— Eles são tão românticos. — Comento admirada e
observo os dois, indo até o meio do salão e alguns casais de
outras mesas se juntam a eles.
Dante se põe de pé e estende uma mão para mim,
enrubesço ligeiramente. Trixie e Donatella nos encaram
surpreendidas.
— Venha, não é um pedido de casamento é uma simples
dança. — Dante esclarece, estendo a mão para ele e assim nos
juntamos aos outros no meio do salão.
Enrosco meus braços em seus ombros, e Dante envolve
minha cintura com firmeza.
— Falta pouco para você convencer, até a sua irmã, que
somos um casal de verdade.
— E o que mais eu preciso fazer para convencê-la? — Ele
pergunta baixinho em meu ouvido.
— Eu desceria a mão um pouco mais… — Sussurro, ele
escuta atentamente, mas não ousa fazer o que eu digo. —
Deslizaria a outra mão para o meu pescoço e pegaria em meu
rosto o puxando para cima mantendo contato visual. — Ele
suspira em meu ouvido. — E por fim, um beijo demorado.
— Ela com certeza acreditaria. — Dante segura em minha
mão e me gira habilmente, em seguida me puxa para perto de si
novamente e então a música chega ao fim.
— Podemos ir? — Questiono sentindo um leve fisgar em
meu tornozelo, talvez repouso e gelo ajude.
— Claro. Vamos nos despedir primeiro.
Concordo.
Ele pega em minha mão e me leva até a mesa. E seus
familiares ficam em silêncio e um pouco decepcionados quando
Dante avisa que vamos embora. Me despeço deles com dois
beijos no rosto e sorrio a todos que me pediram para visitar o
Arizona. Mesmo que o jantar tenha sido maravilhoso, me sinto
péssima por ter mentido para todas essas pessoas. Eles foram
muito legais comigo e eu os enganei descaradamente.
— Vou acertar a conta, se quiser pode me esperar na
porta. — Dante avisa, enquanto me entrega o sobretudo.
Caminho até a entrada e espero ele voltar. Meu relógio de
pulso indica que passou das onze e meia e já estou caindo de
sono. Se não fosse pelo Dante, esta hora eu estaria iniciando
meu turno no Secrets Bar’s.
— Procurei você na internet.
Ouço atrás de mim e nem me dou o trabalho de mostrar
surpresa.
— Sabia que a conhecia de algum lugar, mas não lembrava
de onde. Você é a noiva sequestrada que ficou em coma, a ex do
Michael O’Connor. — Trixie fala o nome do Michael com repulsa.
— Acabou? — Questiono.
Ela cerra os olhos.
— Ele gosta de você. — Trixie diz se referido ao Dante.
— Foi apenas encenação.
— Não. — Ela diz impassível. — Foi divertido no começo,
mas Dante merece ter um amor de verdade, não alguém pela
metade. Ele não é tão forte quanto parece e tem o péssimo
hábito de escolher a garota errada.
— Eu... — Não tenho ideia do que dizer.
Francamente eu esperava levar um esporro dela, não uma
advertência por estar agindo de acordo com uma situação em
que ela me colocou.
Trixie vê o seu irmão se aproximando e me dá um leve
aperto no braço chamando minha atenção, apenas assinto para
ela, indicando que havia prestado atenção em tudo que ela me
disse. Então ela me deixa sozinha.
— O que ela queria? — Dante questiona ao abrir a porta
para mim.
— Papo de garota.
Ele franze o cenho em desentendimento, mas não insiste.
Entramos no carro em silêncio, Dante parece estar com a
cabeça nas nuvens e eu não paro de pensar no que Trixie disse,
e se for verdade, como vou conseguir trabalhar para ele?
— Foi apenas encenação, não foi? — Pergunto sem
conseguir conter a minha língua.
Ele para em um semáforo e se volta para mim.
— O que te faz pensar que não foi?
Sua irmã, penso, mas isso abriria um leque para outras
perguntas.
— Foi legal. — Falo com estranheza.
— Sim, foi. Eu fiz aquele olhar de novo? — Ele pergunta
com um sorriso, me fazendo rir.
Sinto que Dante fugiu da minha pergunta com outras
perguntas, talvez seja melhor não mexer mais nesse assunto.
Fomos o resto do caminho em silêncio e quando
estávamos perto de chegar ao meu apartamento eu estava quase
dormindo escorada no vidro da janela. Me endireito no banco e
dou um grande bocejo.
— Eu preciso te contar uma coisa que eu já devia ter dito
há algum tempo, mas não sabia como. — Dante diz
simplesmente, mandando todo o meu sono embora.
A sensação foi de tomar uma bofetada na cara, pela forma
que meu sono foi embora e uma agitação iniciou dentro de mim.
— O que? — Pergunto secamente, com medo da resposta.
— No dia do sequestro, eu estava lá. Eu vi tudo e ouvi os
tiros e você sendo levada... eu não sabia que era você, Lindara.
Até saíram as notícias. — Ele fala calmamente.
Meu coração acelera por algum motivo e até os cabelos da
minha nuca arrepiam de uma forma bizarra. Encaro Dante me
sentindo enjoada e sufocada, com um zunido soando em meus
ouvidos.
— Você está bem? Está pálida. — Ele diz, só tenho tempo
de abrir a porta e vomitar para fora do carro.
Dante segura meus cabelos para trás enquanto eu termino
de me limpar.
— Eu preciso subir. — Aviso e desço cuidando para não
pisar na minha sujeira.
— Lindara. — Ele sai do carro e se aproxima. — O que
aconteceu? — Questiona preocupado.
— Eu senti uma coisa estranha... como se eu tivesse em
um pesadelo. — Levo a mão peito como se de repente aquela
agonia pudesse voltar.
— Você está bem. Está aqui, agora. Nada de ruim vai
acontecer. — Ele passa os braços em volta do meu corpo e me
abraça com força.
Respiro devagar e relaxo em seus braços. Garanto que
terei pesadelos hoje à noite.
— Eu subo com você. — Ele avisa, sem me soltar.
Chegamos lá em cima em questão de minutos, assim que
eu abro a porta Levi levanta do sofá e vem até mim, com o
semblante preocupado.
— O que aconteceu? — Ele pergunta ao Dante, quando eu
passo por ele e caminho para o banheiro me limpar, deixando os
dois sozinhos.
Não estou com cabeça para pensar em mais nada, só
quero deitar na minha cama e desmaiar, e quando estou prestes
a fazer isso Levi entra, e se deita ao meu lado.
— O que houve?
— Dante estava lá no dia do sequestro, ele viu tudo, Levi. E
quando ele disse que ouviu gritos, tiros e eu sendo levada. Ahh,
parecia que havia alguém me sufocando.
— Sua mente não lembra, mas seu corpo pelo visto, sim.
— Ele diz e um arrepio sobe pela a minha espinha.
Me abraço no meu amigo o impedindo de deixar o quarto e
adormeço pensando no que ele disse.
Levanto na manhã seguinte me sentindo um trapo,
perambulo até a sala encontro Levi ensaiando balé, ele até
arrastou o sofá para o lado.
— Bom dia, flor do dia! — Ele saúda animado.
— Como você consegue acordar com essa energia toda?
— Questiono me atirando no sofá.
— Fácil, porque eu acordei há cinco horas, corri no Park. O
sol estava radiante e a neve nos abandonando, graças a Deus.
— E como foi o encontro com o Dean ontem?
— Não foi — Ele sorri. — Eu menti para poder ficar em
casa.
— Que belo amigo!
— Mas assim que vocês saíram, nós subimos.
Me sento rapidamente e Levi para de dançar para me
encarar, com um sorriso de orelha a orelha.
— Você deu para ele? — Pergunto de boca aberta.
— O quê? — Ele cora. — Não sua maluca, ele subiu e
bebemos umas cervejas.
— Você chupou, ele? — Questiono, e levo as mãos à boca
pasma.
— Uau! Você acordou com a boca suja.
— Você não respondeu!
— E nem vou, não tem cabimento. Acho que alguém aqui
precisa transar e não sou eu! — Ele rosna, me fazendo cair na
gargalhada.
Levi e eu passamos o domingo inteiro ensaiando em frente
à TV. Porque a partir de amanhã iniciamos os ensaios para as
apresentações de Dia das mães. E começo também meu
trabalho de assistente. Estou ansiosa e um pouco receosa, ver
Dante todos os dias será estranho, ainda mais ter que obedecê-
lo.
Quando ficamos exauridos e com as penas bambas eu me
jogo no sofá e ligo para farmácia. Encomendei o remédio que o
Dr. Giordano me receitou e um analgésico para meu tornozelo,
que parece estar doendo cada vez mais.
Tomei um banho e me sentei na sala com o notebook entre
as pernas, a procura de um figurino interessante para interpretar
o Cisne Moribundo e parece que só perdi o meu tempo, aos
meus olhos eles são todos iguais.
A campainha toca e meu colega corre atender, até já
imagino quem seja.
— Olá, Dean. — Ele cumprimenta o porteiro, sorridente, eu
apenas aceno do sofá.
Levi pega a sacola da farmácia de suas mãos e entrega o
dinheiro em seguida.
— Boa noite, meninas. — Dean fala e dá uma piscadela.
Levi quase vai ao chão extasiado com o charme do
homem, me fazendo rir.
Meu telefone apita com uma mensagem do Dante, fazendo
meu estômago embrulhar.
Dante: Boa noite! Espero que esteja melhor, você me
deixou preocupado.

Suspiro. Levi se prostra atrás de mim no sofá e lê a


mensagem.
— Ele é um charme. — Ele diz extasiado novamente.
— O que eu digo?
Levi toma o celular da minha mão, fazendo meu coração
acelerar. Fico de quatro no sofá o encarando do outro lado.
— Juro que arranco seu brinquedinho se você falar alguma
besteira. — Aviso, o fazendo rir. Ele digita algo e me entrega o
telefone.
— De nada. — Ele fala simplesmente.
Lindara: Olá, estou bem. Melhor agora, na verdade.
Obrigada por se preocupar comigo.
— MELHOR AGORA, NA VERDADE!? — Grito e pulo do
sofá. Levi corre para trás da mesa.
— O quê? Você não está melhor agora? — Ele questiona
com um sorriso.
— Não! Agora estou irritada.
Ele revira os olhos.
Meu telefone apita e Levi se aproxima, cautelosamente.

Dante: Fico feliz em saber. Vejo você amanhã.

— Nossa que frieza. — Ele comenta ao ler a mensagem,


me fazendo cerrar os olhos. — Ah, vai ligar quando para aquela
detetive? — Levi pergunta repentinamente.
— Mandei um e-mail.
— Quando? — Ele pergunta animado.
— Depois que você deu três giros e derrubou o cabideiro
em cima da TV.
Ele ri alto ao lembrar.
— Você passou mal só de ouvir ele falar, será está pronta
para assistir?
— Sinto que aquele vídeo colocará um ponto final em
algumas coisas.
— Está com esperança de se lembrar?
— Talvez.
— Torço por você, minha amiga. — Ele aperta meu ombro,
me encarando, emotivo.
A campainha toca novamente e Levi se dispersa
rapidamente, correndo até a porta. Piranha!
— Dean. — Cumprimentamos juntos, o segurança sorri e
entrega a caixa de pizza ao Levi.
— Quer jantar conosco? — Pergunto, porque tenho certeza
que Levi nunca perguntaria. Dean dá de ombros e fala:
— Claro.
Ele entra e jantamos os três no sofá e rimos muito, Levi fica
enérgico e falante quando Dean está perto, e tenho certeza que o
porteiro sabe o motivo.
Levo os pratos na pia e me despeço dos dois, alegando dor
de cabeça.
Abro o guarda-roupa e reviro-o atrás de uma vestimenta
para usar amanhã, e depois de muita bagunça encontro uma saia
lápis azul-marinho e por incrível que pareça há um terninho da
mesma cor. Não entendo porque Micaela pensou que eu fosse
precisar usar esse tipo de roupa um dia, mas fico grata por tê-la.
Estendo em cima do encosto da cadeira para desamassar,
e pego um sapato preto de salto agulha, de baixo da cama. Sinto
que vou morrer com esse salto amanhã.
Quando termino, encaro a roupa, os sapatos e a bolsa, um
pouco mais positiva. Tenho um trabalho, uma possível profissão.
Acho que estou no caminho certo.
Deito na cama sem muita expectativa de dormir, estou
ansiosa e sem demora começo a viajar em meus pensamentos.
Acordo, sentada em um lugar estranho, parece com um
armazém abandonado, olho a minha volta e não vejo ninguém.
Levanto com medo e sinto dor em todo o meu corpo. Olá. Eu
grito, irracionalmente, mas não obtenho resposta. Levo a mão ao
rosto sentindo algo quente escorrer do meu nariz… É sangue.
Pavor toma conta do meu corpo. Corro sem direção e acabo
dentro de uma pequena sala com muitas caixas, a porta se fecha
em um estampido assim que eu dou as costas a ela e quando me
viro um homem surge do nada e salta em cima de mim, me
segurando forte pelo pescoço. Ele me empurra contra a parede e
me sufoca. Me debato com os pés longe do chão e sem demora
tudo fica um breu.
— Lindara!
Acordo sendo sacudida pelos braços.
Sento na cama com uma imensa falta de ar.
— Você me assustou! Achei que alguém tivesse entrado
aqui. — Levi diz apavorado.
— Foi só um pesadelo.
Eu acho…

Entro no banho com meus músculos endurecidos,


pensando nos pesadelos que eu tinha quando era mais nova e
nenhum se compara a esse, parecia tão real. Que loucura!
Quando saio do banheiro meu despertador está aos gritos.
Me arrumo sem pressa e me encaro no espelho depois de
terminar de calçar os saltos-agulha, fico contente com o que vejo.

— Uau! — Levi assobia.


— Exagerei? — Questiono girando em cima dos saltos,
exibindo meu look, sinto uma pontada em meu tornozelo, não
acredito que ainda está dolorido.
— Você é assistente, eu iria de tênis ou levaria um pelo
menos. — Ele diz rindo.
— O quê? Por quê?
— Eu já fui assistente e caminhava para onde todo mundo
mandava.
— Ele disse que sou vou obedecer a ele.
— Belo jeito de começar sendo odiada por todos.
— Levi! — O repreendo, está me deixando nervosa.
— Você está linda! — Ele diz me segurando pelos ombros,
— Parece uma líder.
— Eu posso ser uma líder. — Digo com um largo sorriso. —
Levi, quando eu voltar, quero esta casa impecável. — Digo em
tom autoritário.
— Vai sonhando, vadia. Mas eu amei o tom de voz, foi
sexy. — Ele fala rindo.
Levi para trás de mim e faz um coque baixo, deixando
alguns fios soltos em frente do meu rosto.
— Ahh, eles vão odiar você. — Ele suspira baixinho e me
deseja boa sorte.

Desço do táxi em frente ao escritório, Armstrong


Advocacia, mas como ainda está muito cedo para subir, vou até a
um Starbucks da esquina e compro um café preto. Por um
momento cogitei em levar para ele também, mas acho que
pareceria bajulador demais.
Entro no edifício e encontro quatro recepcionistas atrás de
um extenso balcão, todas usam uniformes iguais, um vestido
tubinho social, com mangas compridas cinza-claro.
— Bom dia, meninas! Dante já subiu? — Pergunto tentando
parecer natural, mas pelo visto, teve o efeito oposto.
— Bom dia! Sr. Armstrong está na sala dele. — A loira de
sobrancelha bem desenhada fala sem sorrisos. Argh! Claro Sr.
Armstrong.
— Obrigada.
Entro no elevador com meu coração acelerando. Eu culpo
a cafeína e não ansiedade, para saber o que eu farei aqui pelas
próximas cinco horas.
As portas do elevador se abrem. Desço em outra recepção
e caminho até a moça atrás de um balcão branco, ela veste o
mesmo uniforme das meninas lá de baixo e acima do peito
esquerdo há um broche com seu nome, Helena.
Ela se põe de pé assim que percebe minha presença,
parece ser tão fria quanto às meninas lá de baixo.
— Bom dia. Gostaria de ver o Sr. Armstrong. — Me sinto
meio robótica falando dessa forma.
— Lindara! — Ouço atrás de mim, Dante está na entrada
de uma porta, só com a metade do corpo para fora.
— Oi. — Digo meio encabulada.
— Essa é Helena, meu braço esquerdo. — Ele dá uma
piscadela para a mulher, que abre um largo sorriso. — Helena,
Lindara trabalhará conosco. — O sorriso da mulher some
gradativamente. — Venha cá. — Ele faz um gesto com as mãos
para mim. Sou forçada a firmar as pernas, que tremem
levemente.
Entro na sala do Dante, ele já está atrás de uma grande
mesa marrom, com uma pilha de papeis em cima e um notebook
aberto do lado.
— Sente-se. — Pede, Dante ainda está com um grande
sorriso, contenho a vontade de questionar se ele engoliu um
cabide, porém, não seria apropriado.
— Então, Sr. Armstrong, o que você tem para mim? — Digo
e ele me encara com estranheza. — Todas a chamam de senhor,
não quero que pensem que sou diferente. — Me explico.
— Você é diferente. — Ele levanta as mãos para cima. — É
minha cliente também. — Ele pisca.
— Era… mas… — Tento reforçar e ele me interrompe.
— Você vetou o meu olhar, eu veto as formalidades.
— O seu olhar é considerado um assédio, ainda mais você
sendo o meu chefe, eu poderia facilmente processá-lo.
Ele ri alto.
— Você não é fácil. — Dante diz me fazendo rir.
— Não quero tratamento especial.
— Serei profissional. — Ele pisca. — Agora me traga um
café e depois tenho uns documentos para você levar ao fórum.
— Sim, senhor. — Retribuo a piscadela me pondo de pé.
Chego à recepção e solto minha bolsa em um cabideiro
para clientes, mais tarde eu pergunto onde guardo meus
pertences.
Pego um café para ele na máquina ao lado da recepção e
levo dentro de uma pequena bandeja, ouço Helena dar uma
pequena risada, ok, pareço ridícula mesmo, vestida desse jeito
para servir café. Bato na porta e a abro em seguida.
— Seu café, senhor.
— Ah, Lindara, esqueci de mencionar que eu só bebo o
café da Dolce Di Giorno. Fica quinta avenida.
— Sério? — Questiono com a sobrancelha arqueada.
— Você quem disse, sem tratamento especial. — Dante dá
de ombros, apertando os lábios até ficarem finos.
— Claro, senhor. — Estendo a mão pedindo dinheiro.
Sorrindo ele me entrega uma nota de cinquenta dólares.
— Compre um para você o café de lá e magnífico.
Ignoro o seu comentário.
— Qual o sabor o senhor deseja? — Pergunto com um
sorriso forçado.
— Me surpreenda. — Ele diz enérgico, esfregando uma
mão na outra.
Cretino!
Saio do escritório um pouco desapontada. Devia escutar
mais o Levi, assim estaria pelo menos com um sapato mais
confortável. O lado bom é que a cafeteria Dolce Di Giorno fica na
quadra de trás, o lado ruim é que se localiza quase em frente ao
edifício Eiffel. Entro na cafeteria tentando ignorar o outro lado da
rua. Mas quem eu estou querendo enganar, fico olhando pela
vitrine até o café ficar pronto e não vi nada diferente.
Grrr. Me sinto patética.
Pedi o café mais exótico da cafeteria e uau, existem dois
em particular que me assustaram um pouquinho, espero que Sr.
Armstrong goste. Penso ironicamente.

Entro em seu escritório e lhe entrego o copo ainda


quentinho.
— Ocorreu tudo bem? — Questiona.
— Você me pediu café, Dante. Não para defender um
criminoso no tribunal. — Ele me encara surpreso, pelo o meu tom
de voz. — Me desculpe. — Falo em seguida.
— Tudo bem. — Ele toma um gole do café e depois me
encara austero.
— Zhanghu? — Ele questiona.
Não tenho como negar, estou surpreendida dele
reconhecer o sabor um pouco envergonhada também.
— Fiquei na dúvida entre ele e o Civeta. — Mordo o lábio,
para não rir.
— Você é corajosa, não posso negar. — Dante diz e
continua bebendo o café. — Helena te entregará cinco pastas,
cada uma com um endereço diferente, ao entregar a pasta, eles
te entregam um registro em meu nome, traga-os para mim. Ah!
Quando você voltar, assinaremos o seu contrato. — Ele informa.
— Terei que ir a cinco lugares? — Pergunto, praguejando
mentalmente por ter vindo de salto.
— Pegue o meu carro, só o traga intacto, por favor.
— Eu não sei dirigir.
Ele me encara com interesse.
— Por que tem medo, ou por que não quer?
— Porque eu não tenho carro e nem dinheiro para comprar
um.
— Posso ver outra ocupação, assim não terá que sair.
— Não será necessário. — Informo, me encaminhando
para a saída.
— Lindara. — Dante chama. Me viro para ele. — Mari,
encontrou uma chave no carpete do meu quarto. — Ele enfia a
mão no bolso do paletó e me mostra. É sua?
É a chave que eu havia encontrado no porta-retrato, nem
me dei conta que havia perdido deve ter caído da minha bolsa
quando fui trocar de roupa.
— É. — Quando vou pegar a pequena chave de sua mão,
ele segura a minha.
— Sabe o que ela abre? — Ele questiona.
— Não. — Falo e Dante solta a minha mão.
— Um cofre de banco. — Ele explica, o encaro pasma,
então ele prossegue. — São para aqueles cofres pequenos, que
se parece com gavetas.
— Mas não cabe quase nada dentro daquilo. — Comento
um pouco decepcionada.
— São para guardar documentos extremamente
importantes e confidenciais, joias, ou até mesmo a localização de
um corpo morto.
— É da minha mãe. — Esclareço, ele se arruma na cadeira
e aponta para a poltrona a sua frente, então me sento. —
Encontrei há algumas semanas, junto com um papel velho. —
Explico e Dante se debruça sobre a mesa, atraído pela história,
ele cruza os dedos ainda me fitando. — O papel era de uma
agenda, com o desenho de um minicalendário na borda e a data
foi marcada com grande X no dia 4 de dezembro de 2004.
Um mês antes dos meus pais morrerem, reflito.
— Tem algo escrito no papel?
— Não sei, já faz muitos anos, o papel está amarelado e se
desmanchando. O que eu consegui ler foi apenas o nome da
minha mãe e talvez o meu embaixo, LF.
— Ou talvez seja o nome do banco, Líder Financeiro. —
Ele diz e um largo sorriso cresce em seu rosto, seus olhos
brilham de uma forma diferente, felicidade, talvez. — Não está
curiosa em saber o que tem lá?
— Acho que ela sabia da traição, o papel e a chave
estavam escondidos dentro de um porta-retrato. Eu estou
curiosa, mas estou com medo, também.
Me ponho de pé, sentindo que não estou sendo
profissional, devia estar distribuindo as pastas por aí.
— Se um dia quiser descobrir, eu vou com você.
— É muita gentileza sua.
Meu celular apita e vejo que entrou um e-mail, antes
mesmo de saber o que é, meus dedos começam a tremer. Abro a
caixa de entrada, é a resposta da detetive Charlotte.

Bom dia Srta. Fincher

Espero que essa gravação possa ajudá-la.


Qualquer dúvida, não deixe de entrar em contato.

Detetive Charlotte Hann

— Lindara. — Dante para ao meu lado preocupado, o


encaro com o coração disparado.
— Me empresta o seu computador?
Dias se passaram desde que assisti ao vídeo do sequestro,
além de não me lembrar de nada, comecei a ter pesadelos quase
todas as noites. Todos muito confusos e sem nexo. Em um deles
eu estava andando em uma rua escura, sendo perseguida por
homens que eu não conheço.
Esses sonhos embaralhados, tem me tirado o sono de uma
forma preocupante, cheguei a pensar em comprar um remédio
para dormir, já que o calmante que Dr. Giordano, me passou e
não me deixa sonolenta. E mudar a rotina de um trabalho da
noite para o dia, literalmente, também tem me deixado exausta.
No começo pensei que seria estranho trabalhar para Dante,
mas eu mal o vejo. Ele me entrega uma pilha de documentos
para levar em diversos lugares e quando eu volto, ele
normalmente já saiu para almoçar. As meninas do escritório
claramente me detestam, vejo-as cochicharem quando eu entro
no elevador, mas quando estou acompanhada do Dante, o que
raramente acontece, elas parecem nem respirar direito.
Todos os dias antes de subir para o escritório eu compro o
café dele no Dolce Di Giorno, talvez pensem que eu esteja o
bajulando, mas na verdade é para não precisar descer e subir,
estou evitando caminhar mais do que o necessário. As
apresentações do balé são no final de semana e ainda sinto
pontadas no tornozelo, ainda mais quando eu calço as sapatilhas
e amarro a fita, parece que a alguém serrando o meu pé.

Já está quase passando do meio-dia quando chego ao


escritório com os registros, sempre os deixo na sala do Dante, e
hoje quando abro a sua porta, o encontro sentado à mesa.
— Que surpresa vê-lo aqui. — Adentro e lhe entrego os
documentos.
— Uma surpresa boa? — Ele sorri.
— Sim.
Dante se põe de pé e fecha o botão do paletó.
— Almoça comigo? — Ele pergunta de repente.
— Pode ser.
Dante se despede de Helena, que nos lança um olhar
ferino quando entramos no elevador.
— Ela gosta de você. — Aviso ao adentrar o seu carro,
para ter certeza que ninguém nos ouviria.
— Quem?
— Helena. Você nunca percebeu?
— Não, porque não há nada para perceber. — Dante
responde um pouco seco.
— Ai meus Deus! Você já transou com ela! — Exclamo
pasma. — Você comeu a sua secretária! — As palavras
continuam saindo da minha boca, sem controle.
— Acabou? — Ele questiona austero.
— Sim! — Sorrio me voltando para ele ainda boquiaberta.
— Só para deixar claro você não é meu chefe depois do meio-
dia, então posso falar sem medo.
— Você sente medo de mim? — Ele questiona.
— Não, foi só modo de falar. — Dou de ombros e ele me
encara decepcionado. — Não vai me contar? — Indago
interessada em saber como tudo aconteceu.
— Não a nada para contar. — Ele responde secamente e
depois me ignora totalmente como se eu nem estivesse no carro,
então dou uma cotovelada em seu braço chamando a sua
atenção.
Ele para em um semáforo e me encara rindo.
— Você enlouqueceu?
— Como aconteceu? — Ignoro sua pergunta fazendo outra.
Ele aperta os lábios e mexe a cabeça em negação.
— Era sexta-feira à noite, estava bebendo em um bar,
sozinho. Helena sentou ao meu lado, papo vai, papo vem, o resto
você já deve imaginar.
— Você dormiu com uma funcionária, esperava mais de
você.
— Serio, babá? — Ele ressalta e enrubesço dos pés à
cabeça.
— Em minha defesa, eu não lembro de nada.
— Em minha defesa, ela não era a minha funcionaria até
aquele momento. Na segunda-feira descobri que Helena era a
moça que o RH contratou, quando cheguei ao escritório, ela
estava sentada na minha sala esperando as boas-vindas.
— Por que não contratou outra secretária?
— Não parecia o certo a se fazer, Helena tem um currículo
impecável e precisava do emprego. Conversamos e resolvemos
deixar o que aconteceu de lado.
— Quanto tempo faz? — Pergunto após descer do carro.
— Um ano. — Dante responde ao abrir a porta da sua
casa.
Snow desce as escadas correndo e pula em minhas
pernas, enérgica, acaricio a grande cabeça da cachorra.
— E nunca aconteceu de novo?
— Por que está tão curiosa, Lindara? — Ele diz indo em
direção à cozinha, Mari está atrás da ilha preparando a refeição,
ela me dá um largo sorriso.
— Não tenho tido muita emoção na minha vida
ultimamente.
— Mas quando tem, o jornal tem trabalho.
— Isso foi cruel. — Repreendo, mas concordo com uma
risada.
Sentamos à mesa e Mari traz os pratos. É lasanha, meu
estômago se contorce com o cheirinho.
Almoçamos conversando sobre o que eu estou achando do
trabalho e francamente não tenho do que reclamar. Eu não faço
nada além de entregar papeis. Tive a má ideia de perguntar para
a Helena quem fazia esse serviço antes, e ela respondeu sem
fazer questão de esconder a diversão, que era qualquer motoboy.
Pelo visto, Dante não estava precisando tanto assim de uma
assistente e mesmo sabendo a verdade, eu não questionei com
ele. Por mais que seja algo simples, estou gostando.
Termino de comer primeiro e sutilmente tiro a sapatilha dos
pés, embaixo da mesa.
— E o pé, como está? — Ele pergunta repentinamente,
empurrando o prato para longe.
— Doí um pouco, mas piora quando estou com as
sapatilhas do balé.
— Já pensou em ir ao médico?
— Sim, depois que eu me apresentar final de semana.
— E por que não agora, Lindara? Você está mancando faz
dias.
— Eu não estou mancando. — Estou? — Torci com um
salto alto, não deve ser nada demais, se fosse eu não estaria
nem conseguindo andar.
Dante se abaixa e puxa o meu pé para o seu colo.
— O que está fazendo? — Indago perplexa.
Ele me ignora e dobra a barra da minha calça jeans para
cima. Dante pressiona as mãos em meu tornozelo, me fazendo
puxar a perna, mas ele a segura no lugar.
— Está inchado, Lindara. Como você consegue andar a
manhã inteira com o pé assim?
— Coloco gelo depois do balé e tomo um, analgésico.
— Você devia ir ao médico. — Ele diz e começa a
massagear o local da torção, abro a boca para protestar, mas me
calo porque a sensação é maravilhosa.
Mari entra na cozinha e sai rapidamente, Dante ri da
reação da sua governanta.
— Isso é totalmente inapropriado. — Exponho, extasiada
pelos movimentos leves e precisos que ele faz.
— Esqueceu? Eu não sou o seu chefe depois do meio-dia.
— Ele diz com um sorriso.
— Hum… — Emito baixinho, tanto maravilhada quanto em
resposta. — Aposto que você não massagearia os pés da Mari…
— Digo e ele gargalha. — Ou da Helena. — Zombo e os
movimentos cessam, o encaro decepcionada.
Puxo o meu pé da sua perna e calço as sapatilhas.
— Você não pode mencionar isso no escritório, Lindara.
— E com quem eu mencionaria? — Questiono levantando
os braços. — Elas me odeiam.
Dante assente em concordância.
E eu pensando que ele iria começar um discurso tentando
mudar esse pensamento.

Saímos da casa dele sem demora e o caminho para o


Conservatório foi rápido.
Dante contou que sua família ainda pergunta sobre mim e
até mesmo Trixie e Donatella que sabem que era uma farsa,
acreditam que temos algo. Mas a última coisa que eu quero
nesse momento é um relacionamento, ainda mais com Dante,
parece que tudo que há nele é errado, como se fosse algo
proibido.
Encontro meus colegas na sala de aula e corro, mancando,
para o banheiro trocar de roupa, pois, vi o Sr. Thatcher subindo
as escadas logo atrás de mim.
— Está atrasada! — Levi comenta e começa amarrar as
minhas sapatilhas, enquanto eu faço um laço com as fitas do meu
collant preto.
— Almocei na casa do Dante e ficamos conversando, nem
percebi que havia perdido a hora.
— Na casa do chefinho! — Ele diz enérgico.
— Vá com calma. — Aviso quando ele aperta o laço no pé
machucado. — Ele já transou com Helena.
Levi se põe de pé rapidamente, abismado.
Eu conto tudo para ele, que morre de rir e diz que minhas
histórias são as melhores, não sei de onde ele tirou isso.
— Quem te contou? — Ele pergunta enquanto prendo
meus cabelos em um coque apertado e voltamos para a sala.
— Eu adivinhei e ele confirmou. — Levi me encara
boquiaberto e se endireita assim que o professor para na entrada
da porta.
— Boa tarde! — Sr. Thatcher saúda com um sorriso
formidável, Levi me lança um olhar, e até imagino o que ele
pensou: alguém transou. — A apresentação está a duas noites
de nós, e eu vi muita evolução em todos vocês, mas, — Ele
enruga o nariz. — ainda falta, harmonia entre vocês, Penny e
Liam.
Os dois juntos normalmente arrasam, mas já faz algumas
semanas que eles não andam concordando com muita coisa e a
sintonia deles realmente está deixando a desejar.
— Levi, Alice e companhia. — Diz olhando para Shade. —
O fantasma da Ópera conta a trágica história de um triângulo
amoroso, porém, os três ficam tentando ofuscar o brilho um do
outro ao invés de mostrarem paixão. — Ambos se encaram
tensos. — E você, Lindara...
Até imagino as reclamações que sobrou para mim.
— O cisne morre no final, ele tem que expressar tristeza,
abatimento e melancolia, está ótimo e seus passos estão bons.
— Ele aperta os lábios — Mas podem melhorar, sinto você um
pouco dura. Eu quero leveza.
Assinto.
— Agora me mostrem, um de cada vez e os colegas de
vocês irão apontar o que há de errado.
Puta merda, será um massacre.
Me ofereço para ir primeiro, antes que o efeito do
analgésico termine. Ponho-me no meio da sala de costas para
eles, e quando a música Dying Swan de Camille Saint-Saëns
começa a tocar, inicio com pas de bourée couru, é uma série de
pequenos passos nas pontas dos pés, ou seja, três minutos onde
meu tornozelo lesionado fica sustentando todo o peso do meu
corpo em uma única péssima posição.
Inicio a coreografia tentando acrescentar a leveza que o
professor pediu, sem muito sucesso e quando a música chega ao
fim, eu me levanto do chão e tenho que reprimir um grito, com a
dor que estou sentindo, de ficar sentada com a perna flexionada
para trás.
— Alguém gostaria de apontar o que ela errou? — Todos
se entreolham, mas ninguém fala um piu, até me surpreendo por
Alice não ter aberto o bocão. — Alice, por favor. — O professor
pede e ela dá um sorriso forçado.
Desde que a censurei no início do mês, ela me deixou em
paz. Foi espantosa a forma que ela começou a me ignorar e
todas as chances que tinha para me criticar nas aulas, a garota
simplesmente deixou passar.
— Parece que ela está colocando o peso do corpo só em
uma perna.
Levi e Shade me lançam um olhar de reprovação, eles são
os únicos que sabem da minha pequena lesão.
— Alguém mais?
— Os braços. Acho que poderia subir e descer com mais
lentidão. — Liam recomenda, com um sorriso.
— Muito bem notado. — O professor assente.
Me escoro na barra e frouxo o laço da sapatilha, Levi para
ao meu lado preocupado.
— Precisamos conversar. — Avisa.
— Você vai terminar comigo? — Questiono chorosa.
— Você podia usar esse drama para apresentação. — Ele
ironiza.
— O que você aprontou?
— À noite depois que você voltar, conversamos. — Ele diz
me fazendo revirar os olhos. Grrr. Por que me diz que precisa
conversar, se não vai me contar nada agora?!
A aula demorou mais que o normal para chegar ao fim.
Tentamos corrigir os erros apontados pelos colegas, alguns
conseguiram, mas eu não fui um deles.
Me apoiei nos ombros do Levi para sair da sala e nos
degraus subo nas costas do Shade, que fez cara feia quando lhe
dou um tapa na bunda. Quando chegamos lá embaixo me
despeço dos dois e pego um táxi.
No caminho para a casa da Micaela, vou preparando a
mente para tudo o que irei escutar. Já faz tempo que não
conversamos e essa distância está acabando comigo.
Nesses últimos dias eu refleti sobre várias coisas e percebi
que fiz muita, muita merda, mas não conseguia enxergar, até
então.
Bato na porta, com o coração acelerado e me sinto uma
completa idiota por estar nervosa. A porta se abre sem demora e
quem está do outro lado me encara surpreso e um pouco tenso,
eu diria.
— Boa noite, Axel. — Sorrio passando por ele, entrando na
casa que está cheia de pessoas. Todos param o que estão
fazendo e me encaram como se eu fosse um espectro.
— Boa noite! — Cumprimento a todos, que sorriem de volta
um pouco inexpressivos. Uau! Eu ainda causo esse impacto nas
pessoas.
— Oi, Linda. — Harrison, aparece na minha linha de visão
e de trás dele surge Mark com um sorriso cativante.
— Não esperava ver a tropa toda aqui. — Comento com
um sorriso.
— Lindara? — Micaela me chama do segundo piso com
Blake atrás dela.
Passo por Cheryl, Ruby e Éster e subo até a minha irmã.
Não me surpreenderia se visse Michael e Morgan saindo de
algum cômodo da casa, já que os dois estão bem próximos
agora.
— Espero não estar atrapalhando a festa. — Aviso
adentrando o seu quarto.
— Não é uma festa. — Ela fala e fecha a porta atrás de si.
— Tanto faz. — Por algum motivo, sinto que tudo que eu
vim fazer aqui foi por água abaixo. — Eu queria conversar, mas
podemos deixar para outra hora.
— Eu sinto muito por ter dito aquelas coisas. — Mica fala e
se aproxima tensa. — Estava com raiva sendo que quem devia
estar era você. Eu não devia ter me metido e dito ao Michael para
seguir em frente.
— Você fez o que tinha que fazer, tudo bem. Eu estou
conseguindo me reerguer, não bebo nada há quase dois meses e
tenho um trabalho fixo.
— Você parece mesmo bem. — Ela comenta e me abraça
com força.
— E estou e quero voltar para a vida de vocês. — Digo
alisando a barriga dela. — Quantos meses?
— Seis e alguns dias. — Micaela fala com um sorriso de
orelha a orelha.
— Já deram um nome a ele?
— Não, estamos em guerra com os nomes. — Ela revira os
olhos.
Sentamos na cama e conversamos um bom tempo. Depois
de muitas lágrimas e risos, eu não via como contar tudo o que
aconteceu comigo nesses últimos meses, seria como jogar um
balde de água fria nesse pequeno momento que tivemos.
Descemos para a sua reunião de amigos e apenas Black e
Axel estavam na sala. Acho que eu acabei com a festa deles,
pelo menos vão ter assunto para o resto da semana.
Me aproximo do Black e o abraço pela cintura, ele passa os
braços em volta de mim e me aperta com força.
— Sentimos a sua falta, Lin. — Ele diz baixinho e se
distancia para poder me encarar.
— Eu também. Prometo não desaparecer de novo e tenho
um convite a fazer. — Os três me encaram curiosos. — Vou me
apresentar no final de semana. Não é grande coisa, vamos fazer
a abertura para o balé infantil. É dia das mães. — Encaro minha
irmã lhe dou uma piscadela.
Blake fica tenso nos meus braços, o largo e encaro-o de
longe.
— São só três minutos, depois vocês podem ir embora. —
Aviso decepcionada pela reação deles.
— Michael estará lá. — Axel fala de repente.
— O quê? Por quê? — Pergunto confusa, mas em seguida
a ficha cai.
Emma. Como eu sou estúpida!
Nenhum deles responde, dada a minha expressão de
irritação por ter esquecido totalmente da menina e por
estudarmos na mesma escola, e eu nem ter lembrado, ou
pensado nisso. Argh! Eu nem cheguei a conhecê-la além de ver
um porta-retrato dela e de sua mãe em seu quarto, onde eu dormi
a primeira noite depois que sai do coma no hospital.
— Moramos no mesmo condado, uma hora vamos nos ver,
seja no shopping, restaurante ou em uma apresentação de balé.
Por favor, não façam disso uma grande coisa. É importante para
mim. Eu descobri que sou uma péssima bailarina e preciso do
apoio da minha família.
— É claro que iremos. — Mica para ao lado do Blake e
pega em minha mão.
Me sinto aliviada, e um pouco culpada por não ter contado
a verdade. Eu a julguei por esconder tantas coisas de mim, para
me proteger e agora estou fazendo o mesmo.
Conversamos mais um tempo, até Axel se levantar para ir
embora, então percebi que já está ficando tarde para mim
também.
— Pode dormir aqui se quiser. — Mica oferece.
— Levi quer conversar.
— Ele é melhor que eu, como colega de quarto? — Ela
pergunta de braços cruzados, em cima da sua formosa barriga.
— Na verdade, é como morar com você.
Ela fica boquiaberta, fazendo os dois rirem.
— Eu levo você. — Axel avisa.
— Pensei que não fosse oferecer. — Falo fazendo-o sorrir.
Entro no Audi, e quando Axel começa dirigir, o olho por um
momento pensando em perguntar como estão as coisas na casa
do Michael, mas contenho minha língua quanto menos eu saber
melhor.
— Você está bem? — Ele pergunta.
— Estou. — Assinto com a cabeça também.
— Ainda está tentando lembrar?
— Não. No começo era tudo o que eu queria, mas agora,
eu torço para não lembrar.
— Acha que não tem mais volta? — Ele indaga, e noto que
ele está se referindo a mim e ao Michael.
— Eu não sei. — Digo sincera.
Axel não tentou puxar assunto o resto do caminho, e
quando eu desci do carro em frente ao edifício eu disse: Cuide
dele. E por algum motivo, sinto já ter dito isso antes.
Entro no saguão e aperto o botão do elevador e segundos
depois Dean sai da cabine.
— É só carrão que a traz para casa. BMW, Tesla, Audi. —
Ele expõe com um sorriso forçado.
— Está insinuando o que?
As portas do elevador se abrem e eu entro com pressa.
— Nada. — Ele diz e quando as portas se fecham eu as
abro novamente.
— Tesla? Eu nunca andei nesse carro.
Seus lábios separam sutilmente, mas se fecham
rapidamente.
— Um homem veio te procurar, há um mês.
— E você não pensou em me contar isso antes? —
Questiono áspera.
— Ele pediu para não falar nada. — Dean diz me fazendo
cerrar a mandíbula.
— Como ele era? — Meu coração acelera loucamente.
— Alto, bem arrumado, cabelos castanhos-dourado, eu
acho.
— Que dia ele veio? — Rosno a pergunta irritada, sentindo
meu rosto aquecer.
— No dia que você saiu com o cara da BMW.
Foi no mesmo dia que ele me ligou, mas por que Michael
pediu que Dean não me contasse? O que ele queria comigo?
Grrr! Deixo as portas fecharem e subo irritada com o
guarda.
Quando entro no apartamento, meu coração quase para e
Levi me encara com um sorriso amarelo.
— Pode me explicar? — Pergunto ao meu colega de quarto
ao ver duas malas na entrada da sala e Alice no sofá.
Ela se volta para mim com os olhos vermelhos e levemente
inchados de chorar.
— Claro, vamos ao meu quarto. — Ele pede e encaro a
garota novamente, ela está com a cabeça baixa limpando os
olhos. Sigo Levi para outro cômodo sem conseguir esconder
minha irritação.
— Desembucha.
— Ela brigou com os pais e pediu para ficar aqui até
arrumar outro lugar.
— E desde quando viramos albergue?
— Há dois meses quando você precisava de um lugar.
— Ok. Eu arrumo outro. — Aviso passando por ele, Levi me
segura pelo braço.
— Eu não quero que você vá e também não quero que ela
fique...
— Mas? — Digo, porque tenho certeza que ele tem uma
resposta na ponta da língua.
— Você não acha que é o certo a se fazer?
— Honestamente, não! Minha vida está quase perto do
normal. E até algumas semanas atrás ela estava me alfinetando.
— Digo de braços cruzados.
— Ela vai se desculpar. Você está muito irritada, brigou
com a sua irmã?
— Não, só estou com raiva do Dean.
Ele franze o cenho confuso e eu explico o que aconteceu lá
embaixo, agora estamos os dois putos com Dean.
Resolvo um problema e surge outro. Não acredito que vou
ter que morar com a biscate da Alice.
Tiro o meu sapato e visto uma roupa mais leve e sem
vontade nenhuma eu encontro os dois na sala.
— Não espere boas-vindas. — Comento quando ela me
encara.
— Obrigada! Obrigada mesmo por me deixar ficar e me
desculpa pelas coisas horríveis que eu falei.
Assinto. E me atiro no sofá, então Levi puxa as minhas
pernas para cima das dele.
— Nossa o seu tornozelo parece um pãozinho. É por isso
que você não tem dançado direito? — Alice questiona.
— Sim. Eu torci há um mês, depois de dizer que sentia
pena de você. — As palavras simplesmente saem e sinto Levi me
dar um aberto forte no joelho. — Águas passadas. — Acrescento.
— Você devia repousar amanhã, para estar melhor no
sábado.
— Eu preciso ensaiar, errei os passos o mês inteiro.
— Você sabe a coreografia só não está acertando porque
está machucada e quanto mais você se esforça, mais inchado vai
ficar.
— Como você sabe disso? — Levi questiona.
— Ano passado, uma menina machucou o pé ao aterrissar
de um salto, ela estava no meio de um concurso e sabia que se
fosse ao médico não chegaria as semifinais, ela continuou
dançando por dois meses e um dia ela simplesmente não
conseguiu ficar em pé, seu tornozelo estava muito inchado e ela
mal sentia dor, porque tomava muitos analgésicos.
— Kirsten Belline! — Levi menciona boquiaberto e Alice
assente.
— Faz apenas um mês, eu não estou morrendo de dor,
tomo apenas um analgésico por dia e nem está tão inchado. —
Replico e Alice me dá um aperto de repente, me fazendo sentar
rapidamente de dor.
— Você enlouqueceu?
— Eu mal apertei. — Ela avisa dando de ombros.
Vou bufando e mancando para o meu quarto. Talvez sobre
uma coisa ela esteja certa, o repouso. Pego meu celular e mando
uma mensagem ao Dante.
Lindara: Boa noite! Tudo bem se eu faltar amanhã?
Depois de enviar fico encarando o teto, já está tarde e
talvez ele nem veja a mensagem hoje.
Sem demora sua resposta chega.
Dante: Você está bem? Está precisando de alguma coisa?
Lindara: Estou. Só preciso repousar meu pé para a
apresentação de sábado.
Dante: Tudo bem. Aproveite a folga e vá ao médico,
Lindara.
Lindara: Boa noite, Dante.

Envio a mensagem encerrando o assunto, não preciso de


mais um me dizendo o que fazer. Irei ao médico, com certeza,
mas só no sábado depois da apresentação.
Desativo o despertador de sexta-feira e coloco o celular
debaixo do travesseiro.
Fecho os olhos esperando a sono vir, então o celular vibra
na minha cabeça.

Dante: Você é uma cabeça dura, sabia? Como seu


patrocinador o meu dever, seria acionar o Conservatório para sua
segurança. Me dê um bom motivo para eu não fazer isso,
Lindara.
Suspiro.
Lindara: Não tenho um. O balé foi tudo que me restou e
descobri que sou uma péssima bailarina... sinto que estou ficando
para trás. Sou a mais velha, a mais lerda, a mais inflexível.
Dante: Esses são bons e maus motivos, Lindara. Apenas
prometa para mim que irá ao médico depois da apresentação.
Lindara: Prometo.

Fecho os olhos novamente e não me deixo reviver os


eventos de hoje e sem muita esperança de dormir, começo a
pensar no vídeo do sequestro. Eu desci daquele carro com tanta
raiva que quase fui atropelada pelos sequestradores. E até agora
eu me pergunto, por que desci naquela sinaleira se o meu destino
era a casa da Micaela?
Dante estava do outro lado da rua com uma mulher morena
de cabelos perfeitamente ondulados e ela exalava elegância.
Quando questionei quem era a sua amiga no vídeo, ele apenas
respondeu: Ninguém especial, fizemos negócios há algum tempo.

Acordo banhada em suor. Sinto que tive outro pesadelo,


mas não faço questão de tentar lembrar. Levanto e tomo um
banho demorado.
— Bom dia! — Levi e Alice dizem juntos quando entro na
sala.
— Já decidiu o que vai fazer hoje? — Ele pergunta sentado
à mesa.
— Vou ficar em casa e assistir um seriado.
— Tomou a decisão certa. — Alice comenta.
Espero os dois saírem e preparo algo para comer, em
seguida tomo meu remédio e dou uma pequena ajeitada na casa.
Alice teve o bom senso de dobrar os forros de cama e deixá-los
empilhados no sofá aonde dormiu.
Satisfeita com a organização e de barriga cheia, eu me
deito no sofá, e coloco Lúcifer rodar. Perdi minha tarde em frente
à TV, faz meses que não tiro um tempo só para mim.
Está começando anoitecer quando a campainha toca.
Abro a porta e Dean está do outro lado segurando uma
caixa, pego-a da mão dele.
— Me desculpa por ontem, eu devia ter contado antes. —
Ele fala quando vou fechar a porta.
— Ou nunca ter contado. — Aviso e fechando-a em
seguida.
Largo a caixa em cima da mesa e a abro, é o meu figurino
do Cisne Moribundo. Já devia ter chegado há uma semana e
estava começando a me preocupar se não teria que me
apresentar apenas com um collant. O traje é todo branco, e o tutu
é firme, feito de penas, com detalhes prateados fazendo o
contorno dos seios, ele tem o decote no formato de coração e
finas alças transparentes. Veio também duas presilhas de penas
brancas, para pôr no contorno da cabeça.
Jogo tudo de volta na caixa e levo para o meu quarto,
quando solto em cima da cama a campainha toca novamente.
Pronto, acabou a minha paz. Volto para a sala e abro a porta
abruptamente.
— A que devo a honra da sua visita? — Questiono com um
riso, um pouco surpresa.
— Vim oferecer meus serviços como massagista. — Dante
diz sorrindo.
— Fale a verdade, você só não consegue ficar longe de
mim. — Debocho.
Dante sorri, mas não nega.
— Está se sentindo melhor?
— Sim, ficar em casa realmente ajudou.
— Você devia ter me contado sobre o seu pé antes de eu
tê-la mandado ir a tantos lugares.
— Tratamento especial de novo. Helena também ganhou
isso?
Ele aperta os lábios e não responde, então a porta se abre
e meus colegas entram rindo, mas quando nos enxergam
sentados no sofá seus sorrisos somem, porém, os olhos brilham
em curiosidade. Os dois cumprimentam Dante rapidamente e vão
apressados para o quarto rindo.
— Me desculpe. — Peço envergonhada pelo
comportamento deles e Dante apenas sorri.
— Estou indo comer alguma coisa aqui perto, quer ir
comigo? — Ele pergunta se pondo de pé.
— E a minha massagem? — Questiono com a mão na
cintura.
— Eu faço na lanchonete. — Ele avisa com um sorriso no
canto dos lábios.
Me coloco de pé e levo Dante a saída, será melhor ele
esperar lá embaixo até eu ficar pronta. Quando me viro encontro
Alice e Levi atrás de mim, com um largo sorriso.
— O que foi? — Indago, passando por eles, indo para o
meu quarto. Os dois me seguem.
— É o primeiro encontro de vocês? — A garota questiona
curiosa, me fazendo encará-la de olhos arregalados.
— Até parece, Lindara já dormiu na casa dele duas vezes e
almoçou lá ontem, talvez ele esteja atrás da sobremesa. — Levi
debocha.
— Não é um encontro, somos apenas amigos. E Levi,
controle a língua, por favor.
Expulso os dois do quarto e visto uma calça jeans, uma
blusa branca de manga comprida, com pequenos botões pretos
que descem na diagonal. Quando estou calçando as sapatilhas
meu amigo entra.
— Quer que eu arrume o seu cabelo?
— Não, está bom assim. — O encaro séria.
— Ir descabelada, não vai fazer parecer menos um
encontro. — Ele repreende.
— NÃO É UM ENCONTRO! — Rosno saindo do quarto,
pego minha bolsa no cabideiro rapidamente, querendo fugir do
Levi.
Encontro Dante escorado em uma Lamborghini preta e
Dean tagarelando em volta do carro.
— Por que não veio de charrete? Chamaria menos
atenção. — Zombo ao entrar no lustroso carro. É perfeito, tanto
por dentro quanto por fora que parece que foi criado apenas para
ser admirado.
— E onde eu amarraria o meu cavalo? — Ele questiona
com um sorriso e nem me dou o trabalho de respondê-lo.

Dante estaciona em segundos, não deu nem tempo de


aquecer o banco do carro.
A fachada da lanchonete é vermelha, com os letreiros
brancos, escrito John Jay. Dante empurra a porta e um badalar
de sino toca em seguida, chamando a minha atenção. Quase
pergunto a ele se eu já estive aqui, mas acho que ele não saberia
me dizer. A lanchonete não tem nada de luxuosa, o chão é
quadriculado, as paredes são verde-água e a mobília em tons de
vermelho. Sentamos em uma mesa para dois perto das janelas,
no fim do corredor.
— Como conheceu esse lugar? — Pergunto.
— Quando estava na universidade, passava muito tempo
aqui.
Um senhor se aproxima com o cardápio, ergo meu olhar
até ele e sorrio em agradecimento e percebo que o homem me
fitou com estranheza, em seguida olhou para Dante com o rosto
levemente tenso.
— Tudo bem com você, John? — Dante questiona com um
sorriso e o homem responde um: sim, quase inaudível. Estranho!
Porém, o que é mais estranho que Dante em uma humilde
lanchonete?
Encaro o cardápio e ao lado de cada prato há uma imagem
referente à comida.
— Já escolheu? — Ele pergunta ao largar o dele sobre a
mesa.
— Vou querer um Bierock's. — Essa palavra não me é
estranha, acho que eu já estive nesse lugar antes.
Dante chama o atendente de novo e faz nossos pedidos
sem demora.
— Está nervosa com a apresentação de amanhã?
Não estava até Axel abrir a boca e me contar que Michael
estará lá.
Não vou pensar nele, já faz dois meses.
Michael é meu passado. E precisa que ficar no passado!
— Um pouco. — Minto, estou apavorada, é o meu primeiro
solo com o pé machucado.
— Você vai se sair bem.
— Espero que sim. Ai meus Deus, aquilo é uma Jukebox?
— Digo perplexa, faz anos que eu não vejo uma. Dante segue
meu olhar e assente. — Esse lugar é incrível. — Comento.
— Lindara, precisamos conversar. — Ele diz e segura
minha mão cima da mesa, meu corpo estremece.
— Eu já volto. — Aviso puxando a mão, caminho para o
banheiro com as pernas bambas e passo por um quadro com
centenas de fotos uma em cima da outra, pressas por alfinetes.
Me apoio na pia e respiro fundo, toda a vez que Dante diz
essas palavras: Lindara, precisamos conversar. Ele joga uma
bomba em cima de mim. Pode parecer covarde me esconder,
mas acho que já é instintivo. Vejo o perigo e saio correndo para o
lado aposto. Respiro fundo criando coragem e saio do banheiro,
parando no corredor do lado de fora, Dante está com a cabeça
abaixada, pensativo. Exalo baixinho e quando olho para o lado,
há uma foto me chama atenção.
É a Lindsey! Não tem como não reconhecê-la na imagem
ela está igualzinha no porta-retrato no quarto da Emma. Tiro o
alfinete da foto para vê-la por inteiro e a que estava cobrindo-a
cai no chão. Me abaixo para apanhá-la e quando me coloco de
pé Dante está em minha frente, fazendo meu coração acelerar.
— Você me assustou.
— Lindara.
Prendo a foto que caiu ao chão de volta ao quadro e
encaro o verso da foto da Lindsey, “AGORA E PARA SEMPRE,
COM AMOR DANTE”. Viro a foto e sinto meu coração ressoar em
meus ouvidos, dou um passo para trás, adentrando o estreito
corredor.
— Era sobre isso que eu queria conversar. — Ele fala
calmamente.
— Você... — As palavras me fogem. — Michael e essa
mulher...
— Eu e Lindsey namoramos antes dela se casar com
Michael. — Sinto o sangue subir da minha face.
Ele mentiu... Ele mentiu para mim esse tempo todo!
— Você acha que eu sou o que? Um prêmio de
consolação!? — Grito, chamando atenção da lanchonete.
— Se acalme. — Dante pede e estende o braço para me
tocar e instintivamente dou um tapa em sua mão afastando-a.
— Não mande eu me acalmar. — Rosno.
Empurro-o com força contra a parede e passo por ele o
mais rápido que consigo, os clientes me observam alarmados
tentando entender o que está acontecendo. Pego minha bolsa em
cima da mesa e saio da lanchonete transtornada, procurando a
direção para casa.
— Lindara. — Dante está logo atrás de mim.
— Eu confiei em você. — Digo ao me virar para ele. —
Você devia ter me contato!
— Não é tão simples. — Ele fala aflito.
— Na verdade, era, mas agora não faz mais diferença! —
Exclamo enfurecida.
— Converse comigo, por favor...
O encaro por um momento.
Eu tremo tanto que sou capaz de abrir um buraco chão,
estou puta da vida, enraivecida e me sentindo uma completa
idiota. Aponto para um táxi, que para ao meu lado sem demora.
— Fique longe de mim.

Tive uma noite infernal. Literalmente não preguei os olhos


nem por um minuto. Me sinto um zumbi, sentada no sofá da sala
esperando o dia clarear. Peguei todas as informações que meu
cérebro quebrado e inútil se lembra sobre Dante. E tentei
encaixar em algum lugar, mas nada faz sentido. Dante se
aproximou de mim por uma carta anônima no passado,
coincidência ou apenas infelicidade do destino?
Quem enviou aquela carta? Eu já li? Onde ela está?
Depois ele me beija, talvez para me confundir ou causar
ciúmes no Michael. Inferno! Porque eu não lembro!
— Bom dia? — Levi questiona ao entrar na sala. — Você
não dormiu?
— Não.
Ele se joga ao meu lado e tira o meu celular debaixo de si,
com um sorriso.
— Onze chamadas ignoradas e três mensagens não lidas.
Você sabe que não vai terminar assim, não é?
— Óbvio! Dante é ardiloso e persuasivo, e ele sabe mais
de mim do que diz saber, Levi. E eu sou uma cega que
acreditaria perfeitamente em qualquer coisa que ele falasse,
simplesmente para não perdê-lo.
— Perdê-lo? — Levi, pergunta confuso.
— Eu gosto dele, não estou apaixonada ou amando. —
Dou ênfase, para Levi entender que estou sendo honesta, para
ele não começar a criar coisas na cabeça. — Dante foi sincero
comigo desde o princípio, me ajudou e me deu um emprego...
estava bom demais, entende?
— Você é uma presa fácil, está vulnerável e ele sabe disso.
— Alice menciona na entrada da sala quase me matando do
coração.
— Já pensou no que vai fazer? — Levi quer saber.
— Não, passei a noite inteira remoendo isso e agora
preciso me concertar apresentação.
Os dois concordam.
Já era uma desgraça ter que dividir o banheiro com Levi,
agora mais Alice, parece à fila de espera para um show da
Beyoncé.
Coloco uma legging e uma blusa cinza de magas
compridas e desenterro um par de tênis do armário. Encontro os
dois na sala bem-arrumados, ambos me lançam um olhar, mas
não ousam dizer nada. Apanho a caixa em cima da mesa com o
meu figurino e descemos.

Quando chegamos à escola, fomos direto para o auditório,


há um grande camarim todo espelhado, com vinte assentos, dez
de cada lado. Os demais já estão na sala se produzindo e vê-los
quase prontos, faz meu coração começar a acelerar.
— Duzentas e sessenta e seis pessoas, até agora. — Sr.
Thatcher diz, sem esconder sua animação na entrada da sala.
— Quantas mães vieram? — Shade pergunta, com uma
expressão pervertida.
— Muitas, o convite era para os pais e familiares. — Só de
pensar no auditório cheio meu estômago se contorce. — Vocês
três que chegaram agora se arrumem! — Ele fala autoritário. —
Liam e Penny serão os primeiros, depois você, Lindara, e por
último... — ele encara os outros em silêncio e se retira.
Falta uma hora para começar, Penny já está usando um
lindo e delicado vestido azul degradê, com pedras no contorno do
pescoço. Ela se aproxima com um sorriso e sem perder tempo
tiro minhas roupas e com a sua ajuda visto o meu traje, que
desliza pelo meu corpo facilmente. Ajeito meus seios dentro do
decote me sentindo Jessica Rabbit. Espero que essas finas alças
aguentem.
— Você está linda! — Penny comenta, alisando a minha
cintura com as mãos.
— Você e Liam como estão?
Ela se vira e o encara rapidamente.
— Ele disse que gosta de mim. — Cochicha.
— Você não sabia? — Pergunto chocada.
— Óbvio que sim, só não sabia que não estava pronta para
ouvir dele.
— Que merda.
Ela assente.
Levi se aproxima, vestido todo de branco e me empurra
para uma das cadeiras ao lado.
— Vamos arrumar essa juba. — Ele avisa e começa fazer
uma trança holandesa em meu cabelo. — Minha mãe veio, Linda,
ela quer conhecer você. — Ele diz animado.
— Será um prazer conhecê-la.
Levi me gira na cadeira de frente para ele e prende os
grampos nas laterais da minha cabeça. Faceiro, ele começa a
abrir um estojo de maquiagem, mas o impeço.
— O cisne vai morrer não precisa de decoração.
Ele revira os olhos.
— Quer espiar? — Pergunta e não preciso nem responder,
o pego pelo braço e saímos do camarim. Encontramos um monte
de crianças perambulando pelo corredor.
São tão fofas, com os tutus cor de rosa e as purpurinas nas
bochechas. Levi passa por elas rápido e me puxando pela mão.
Nos aproximamos das cortinas baixadas, escutando
claramente o burburinho vindo do outro lado. Espiamos pelos
vãos do tecido e mal dá para ver os acentos vermelhos no meio
de tantas pessoas.
— Lá está a minha mãe! — Ele ponta para um emaranhado
me fazendo rir, é impossível encontrar alguém no meio de tanta
gente. — Ai, Linda e lá está a sua irmã. — Ele aponta para a
direção oposta.
— Está zoando com a minha cara? — Questiono de braços
cruzados.
— Ela está na antepenúltima fileira, da esquerda para
direita, perto da parede.
Busco por Micaela sem muita esperança e a encontro sem
demora, Blake está sentado ao seu lado, com os braços sobre os
ombros dela.
— Você não me disse que seu cunhado era um gato.
— Impossível! Você tem um olho biônico por acaso?! —
Digo pasma, o palco fica a uns 6 metros de distância da primeira
fileira, onde estão sentados alguns patrocinadores. Dante não
está entre eles e agradeço mentalmente por isso.
— Vejo que estão ansiosos.
Nos viramos e o nosso professor nos encara com um
sorriso.
— Lindara, espero que seus passos sejam tão belos
quanto este tutu.
Assinto timidamente.
— Estou fodida. — Falo assim que o professor se retira.
— Você se saíra bem, lembre-se, leveza, tristeza e
lentidão.
— Está descrevendo a minha vida. — Digo o fazendo rir e
em seguida um alto-falante ecoa pelo auditório. Olho para fora
das cortinas mais uma vez e quando meus olhos encontram
Michael sentando, Levi me puxa bruscamente pelo braço.
— Thatcher está nos chamando. — Ele avisa, hesito por
momento em voltar-me para a cortina e buscar por ele, mas
apenas sigo o meu amigo até o camarim.
— Seguinte… — O professor fala, mas de repente fico
surda. Seus lábios se mechem, mas parece que nada sai deles.
Cristo! Acho que estou começando a ter uma crise de ansiedade,
meu corpo treme, minhas mãos e nuca suam.
— Lindara. Linda...? — Alguém bate palmas na frente do
meu rosto. — Tudo bem? — O professor pergunta.
— Sim. — Respondo rapidamente saindo do transe.
— Ok. Penny e Liam, vamos, o enunciador já irá chamá-
los.
Seguimos o professor para o auditório e as cotinhas ainda
estão baixadas, ficamos nos bastidores, enquanto Penny e Liam
se posicionam no meio do palco.
— O que deu em você? — Levi questiona segurando minha
mão, em seguida a solta e me encara apavorado. — Meu Deus,
isso é suor? — Indaga, limpando a sua mão com nojo.
— Eu vi o Michael.
— Você não estava enxergando nada há dez minutos.
Deve ser coisa da sua cabeça.
Ok, pode ser mesmo. Eu não o vejo tanto tempo e é bizarra
a sensação que estou sentindo agora só de pensar nele.
A voz do enunciador ecoa novamente, apresentando o
repertório e as cortinas começam a subir lentamente, meu
coração parece que vai romper em ansiedade.
As luzes estão mais fracas deixando visível somente às
quatro primeiras fileiras.
— Está procurando ele, não é? — Meu amigo questiona ao
perceber que não tiro os olhos da plateia.
— O que você acha?!
— Terceira fileira, reto, em frente ao palco.
Sabia que não era da minha cabeça!
Estou em frenesi, nem sinto mais as pontadas no meu
tornozelo. Pareço uma adolescente procurando o namoradinho
no pátio da escola. Me sinto completamente tola e ainda assim
não deixo de procurar por ele nos assentos.
De repente os encontros: Beatriz, Dylan, Michael e a
Morgan ao seu lado. Meu coração acelera loucamente. O que ela
está fazendo aqui?
Levi me puxa pelos braços de repente, tirando toda a
minha atenção deles.
— Dante está sentado na primeira fileira à esquerda. — Ele
fala simplesmente, encaro Levi sentindo que perdi toda a cor do
rosto.
— Ai meu Pai, você vai ter um treco!
— Levi, estou com uma sensação horrível. — Digo
apavorada, sentindo meu corpo inteiro tremer e a bile subir a
minha boca.
— Assim que você se apresentar, vai passar.
— Michael veio com ela. — Sussurro e Levi assente e me
encara, pesaroso.
— Pelo visto ele já arrancou o band aid, está na hora de
fazer o mesmo. — Meu amigo sugere me dando um aperto nos
ombros. — Você consegue!
Penny e Liam encerram a coreografia, da qual eu não
prestei atenção em nada.
— Sua vez, Lindara. — Sr. Thatcher para ao meu lado. —
Essa expressão está magnifica, era disso que eu estava falando.
Ah, claro, a expressão de quem parece que tomou um tapa
na cara e um chute no estômago.
— Você consegue! — Levi repete quando o professor
Thatcher me leva.
Meu coração está tão acelerado que o único som que eu
escuto é dos meus batimentos e o nó que se formou na boca do
meu estômago é tão apertado que eu começo a me sentir
nauseada.
Me posiciono no início do palco, de costas para a plateia,
então o enunciador comunica o repertório.
— Na performance de O Cisne Moribundo, Lindara Fincher.
Olho para a plateia de esguelha incapaz de controlar minha
ansiedade e vejo Morgan pegar a mão do Michael. Um calor
repentino desce em ondas pelo o meu corpo.
Respire. Respire. Respire!
A luz da plateia se apaga e a do palco se acende fraca e no
tom azul. A música Dying Swan de Camille Saint-Saëns, inicia me
compelindo a dançar.
Adentro o palco de costas e nas pontas dos pés, lembro
descer e subir os braços com mais lentidão como Liam sugeriu.
Ignoro totalmente o latejar do meu tornozelo e distribuo o peso
adequadamente e com leveza me viro para a plateia, giro
lentamente nas pontas dos pés com o corpo curvado para frente,
os braços para trás sempre em movimento. Nunca desejei tanto
criar asas e sair voando. A música tem menos de quatro minutos,
mas a sensação de estar aqui, exposta, faz parecer uma
eternidade. Giro com o meu pé saudável e quando apoio o outro
no chão, sinto uma dor torturante romper em meu tornozelo. Sem
onde me segurar, vou de encontro ao chão e um grito agonizante
escapa dos meus lábios. Choramingo alto segurando o meu pé
como se de alguma forma isso pudesse conter um pouco da dor.
A luz do palco se desliga e a da plateia se acende, sem
demora alguém me pega do chão rápido e forte e me leva para
os bastidores.
— Eu disse para você ir ao médico. — Dante sibila com
irritação.
— E eu disse para você ficar longe de mim. — Rosno.
Em questão de segundos havia um monte de pessoas em
cima de nós, falando alto e perguntando o que havia acontecido.
— O que houve lá, Lindara? — Professor Thatcher
questiona austero.
— Torci o pé há um mês.
Ele me encara com os olhos fulminando.
— A enfermaria está fechada, pode levá-la a um hospital?
— Ele questiona ao Dante, que assente prontamente.
O professor sai apressado e Levi para a nossa frente.
— Peguei suas roupas. Eu preciso me apresentar, mas
encontro você em seguida.
— Avisa a minha irmã que eu estou bem e que eu ligo mais
tarde. — Ele concorda e sai apressado.
— Podemos ir agora? — Dante pergunta sério.
Apenas concordo.
Dante usa a saída dos fundos que dá para o
estacionamento do Conservatório. Ele abre a porta da BMW e me
coloca no assento, rápido. Jogo minhas roupas em cima do porta-
luvas e puxo o meu pé para cima, para tirar a sapatilha.
— Está doendo muito? — Pergunta, ao começar a dirigir.
— O que você acha?! — Respondo ácida, segurando o tutu
para baixo.
Dante dirige o resto do caminho em silêncio e
honestamente eu fico grata por isso. Me dá tempo para refletir. A
apresentação tinha tudo para ser perfeita, porém, foi um desastre
e humilhante.
Além da dor que estou sentindo agora, meu coração dói
também, sei que a escolha foi minha de terminar, mas ver Michael
com outra doeu bem mais do que eu imaginei.
Dante estaciona o carro em frente ao pronto-socorro e bate a
porta com força ao descer, me fazendo ter um sobressalto no
assento, ele abre a minha e me pega com cuidado, sinto todos os
seus músculos tensos contra o meu corpo.
Passamos pelas portas duplas de vidro entrando na clínica.
Ao nos aproximamos de balcão com formato em L, cinco atendentes
se reúnem a nossa frente.
— Torci o tornozelo. — Explico e uma delas, a de cabelo
ruivo preso em um rabo de cavalo, se posiciona em frente a um
notebook. Passo a ela somente as informações básicas, ela
anota rápido e avisa que um médico logo irá me atender, em
seguida me pergunta qual será a forma de pagamento. Fuzilo
Dante com um olhar, por ter me trazido em uma clínica particular.
— Cartão. — Ele responde e me coloca sentada em cima
do balcão me deixando de frente para uma nova plateia. Aceno
gentilmente para uma menininha que fica me olhando.
— Quatrocentos e trinta e cinco dólares, senhor.
Depois que Dante faz o pagamento, uma enfermeira surge
com uma cadeira de rodas, ele me ajuda a sentar e me empurra
para um canto da sala.
Sem demora, um médico atravessa uma porra dupla
marrom e chama o meu nome. Seguimos o homem para dentro
de uma sala espaçosa e clara. Dante me coloca sentada na maca
a pedido do médico, em seguida se escora contra a porta.
Observo o médico se aproximar, ele é baixo, calvo e tem o
sorriso é gentil.
— Sou Dr. Rofman, pode me contar o que houve? — Ele
questiona analisando o meu traje.
Explico exatamente o que aconteceu, sem muita enrolação.
O médico ergue as sobrancelhas e aperto os lábios quando eu
digo que venho ensaiando há um mês com o tornozelo
machucado. Ele apalpa o me aperta me fazendo ranger os
dentes.
— Terá que fazer um raio-X. O que era uma simples torção
pode ter virado uma luxação.
— O que é isso? — Dante pergunta, antes que eu
conseguisse abrir a boca.
— É uma lesão que deixa os ossos posicionados do modo
errado.
O encaro lívida.
— Você ficara bem. — Dr. Rofman me conforta e pega uma
camisola no armário. — Seu parceiro pode lhe ajudar?
Lanço um olhar nada agradável para Dante, quando o vejo
se desencostar da parede.
— Ele não é o meu parceiro. — Esclareço com as narinas
dilatadas, o médico assente e avisa que vai buscar uma
enfermeira nos deixando a sós.
Dante para na minha frente com as mãos no bolso, austero
e não entendo o porquê ele ainda está aqui.
— Por que não me contou antes? — Pergunto, o pegando
desprevenido.
Ele desvia olhos e solta à respiração audivelmente.
— Porque antes não fazia diferença você saber. — Ele me
encara inexpressivo e me irrita não conseguir decifrá-lo.
— E o que mudou agora? — Quero saber, já irritada com
as meias verdades dele.
— Estou apaixonado por você, Lindara. — Dante prende o
meu olhar, meus lábios se entreabrem, um tanto surpresa, jamais
pensei que ele diria isso em voz alta. Ele se aproxima e percebo
que vai me beijar, levo as mãos em seu tórax para empurrá-lo,
mas não o faço e sim o puxo para mais perto. Seus lábios
encontram os meus e sua língua desliza para dentro da minha
boca, devagar e docemente.
Minha cabeça é uma confusão, uma loucura, estou com
ódio dele, mas não consigo afastá-lo.
Alguém bate na porta e abre em seguida, Dante se afasta
rapidamente e a mesma enfermeira que me trouxe a cadeira de
rodas nos encara admirada.
— Precisa de ajuda para colocar o avental? — Ela
questiona na entrada.
— Sim, por favor.
A mulher entra. Dante me lança um olhar incisivo e se retira
da sala.
O silêncio se estende dentro do consultório, a enfermeira
se aproxima por trás e abre meu traje. Estou tão perdida pelo o
que aconteceu que nem importo de ficar nua na frente da mulher.
Dante simplesmente falou que está apaixonado, como se
tivesse dito o sabor favorito do sorvete dele. Pessoas normais
não revelam isso com tanta naturalidade. Revelam?
E o beijo! Porra! O que eu tinha na cabeça, era para eu
estar arrancando verdades dele não trocando saliva. Cristo!

Em menos de meia hora eu fiz o exame de raio-X e o


médico já está me dando o diagnóstico. E para minha alegria não
é uma luxação e sim uma entorse de grau elevado. O doutor
Rofman me repreende dizendo que se eu tivesse procurado um
médico antes teria que ficar apenas uma semana de repouso,
mas agora terei que ficar um mês e usar uma bota imobilizadora.
Ele disse que a minha volta ao balé dependeria da minha
recuperação e me deu alguns remédios para tomar, estou
pensando seriamente em me associar a uma farmácia.
Dante me coloca sentada no banco da frente e não diz
nada. Estou exausta de ter ficado a noite inteira acordada e
preciso fazer um grande esforço para não cair no sono. Escoro a
cabeça contra a janela e só percebo que havia dormido quando
sacolejar do carro para.
— O que estamos fazendo aqui? — Questiono olhando
para fora do carro, para a casa dele.
— Vamos conversar.
Dante desce e me pega novamente, já estou me
acostumando a encará-lo por baixo, seu maxilar é extremante
marcado e ele tem uma pequena cicatriz logo abaixo do queixo
onde pelo visto sua barba desistiu de crescer, deixando uma
modesta falha.
Ele me coloca sentada no sofá e vai até à cozinha.
— Pare de enrolar, Dante. Eu não tenho o dia inteiro.
De fato, eu não tenho mesmo, Levi deve estar preocupado,
Micaela nem se fale e preciso comprar a bota, e um compressor.
Diferente dele, eu não tenho alguém a minha disposição 24 horas
por dia.
Ele volta para a sala carregando uma bandeja com suco de
frutas vermelhas, biscoitos, queijo e geleia, Dante solta ao meu
lado e senta virado para mim seu pomo-de-adão desce e sobe
rapidamente.
— Eu conheci Michael nos últimos anos da faculdade. —
Ele fala simplesmente e percebo que ele não está muito à
vontade com o assunto. — E alguns meses antes de voltar para o
Arizona, conhecemos Lindsey em uma festa. — Ele pausa e
pede: — Coma.
Não sei se sou capaz de engolir, mas pego um pedaço de
queijo e indico com o queixo para ele seguir em frente.
— Ela era incrivelmente linda e ambos nos apaixonamos
por ela na mesma hora. Durante a festa, Michael e Lindsey
ficaram muito próximos, eu imaginava que ela o escolheria, então
eu tive uma ideia que na hora me pareceu perfeita. — Ele revira
os olhos e me recordo do que Trixie falou no jantar: ele tem o
péssimo hábito de escolher a garota errada. Ela podia ter sido
mais clara.
Dante prossegue.
— Chamei a Kirsten, uma das amigas da Lindsey e disse
que Michael estava a fim dela, só que Lindsey não saia de cima.
— Uau! Que idade você tinha na época? — Pergunto
ironicamente.
— Eu era jovem, Lindara e queria sair ganhando
independente de qualquer coisa. Enfim, quando Michael foi ao
banheiro Kirsten foi atrás dele e eu atrás da Lindsey. — Ele
pausa e exala baixinho como se tivesse vergonha do que veio a
seguir. — Eu disse a ela que Michael precisou ir embora e que
não havia ido sozinho, então a convidei para ir a outro lugar,
então nós namoramos por alguns meses.
— A rixa de vocês é por isso? — Pergunto, franzindo o
cenho.
— Depois de um tempo eu tive que voltar para o Arizona
porque meu pai havia falecido. Fiquei longe por meses e nesse
tempo Michael ganhou o coração dela.
E quem pode culpá-la? Michael é incrível, mas Dante
aparentemente sofreu tanto quanto ele.
Essa mulher é uma destruidora de corações, penso.
— Você pediu para ela te esperar?
— Não. Pensei que não fosse necessário. — Dante sorri.
— E para finalizar, eu invadi o casamento deles. Eu pensei que
se ela soubesse que eu ainda a amava, teria uma chance, mas
fui negado outra vez.
— Meu Deus! O casamento! — Digo petrificada. — Você foi
corajoso e um grande babaca.
Ele dá um largo sorriso e assente.
Levo as mãos no rosto e parece que estou em chamas,
essa é a pior história de amor que eu já ouvi na vida. E para
completar a desgraça ela morre, deixando dois homens com o
coração em frangalhos.
Dante segura meus pulsos e os puxa para baixo, mordo o
lábio e não tenho ideia do que dizer, é muita informação mal
processada. Será que Michael já havia me contado essa história?
— Quando você resolveu me falar aquilo no consultório,
chegou a pensar como ficariam as coisas entre nós?
— Eu gosto de você e posso estar sendo presunçoso, mas
eu acho que você sente o mesmo por mim. — Ele umedece os
lábios.
— Não está sendo presunçoso, mas não estou apaixonada,
Dante. — Sua expressão é penetrante, mas inescrutável. — Você
viu a loucura que é a minha vida... por que quer bagunçar a sua?
Está entediado? — Questiono com uma risada.
— Não estou entediado. — Ele pega minha mão e me fita
com intensidade. — Eu quero toda essa loucura, Lindara.
Coro, fazendo-o sorrir.
— Eu não posso me expor... não agora.
Depois do meu pequeno chilique na noite passada percebi
que não adianta mais fugir. Dante parece estar onipresente em
minha vida há algum tempo, todas as minhas decisões me
levaram a ele. E se Michael conseguiu seguir em frente, eu
preciso fazer o mesmo.
— Está me pedindo para esperar? — Ele questiona e um
pequeno sorriso surge no canto dos seus lábios.
— Estou pedindo para você ir com calma, consegue fazer
isso?
— Então não vamos transar hoje? — Ele pergunta com
falsa decepção, me fazendo rir. Puxo minha mão da dele e lhe
dou um tapa de brincadeira. Dante ri e em seguida dá um alto
assobio, em segundos Snow aparece correndo e pula no sofá e
se deitando ao meu lado.

Acordo em minha cama coberta de suor, tive outro


pesadelo, já estou ficando farta disso e começando a ter medo de
dormir. Tomo um banho rápido e coloco um vestido curto, verde e
florido, com as mangas bufantes.
— Bom dia! — Saúdo adentrando a sala mancando. Me
atiro no sofá entre os dois e Levi age indiferente. Ah, ele está
aborrecido, porque eu disse que ligaria ontem e não liguei, e
quando voltei já era tarde e estavam dormindo.
— Me desculpe, não quis acordá-lo. — O puxo para um
abraço. Ele faz cara feia novamente, mas me abraça de volta.
— Que coisa horrorosa é essa? — Ele pergunta de olhos
arregalados, ao me ver colocar a bota imobilizadora, preta com
lacres rosa.
Ontem quando acordei da minha longa soneca no sofá do
Dante, me deparei com os apetrechos que o médico havia
pedido. Obviamente o adverti e pedi que descontasse do meu
salário.
— Conta tudo!
Solto o verbo. Já que eu não posso contar nada para
Micaela, ainda, aproveitei os dois ouvintes que faziam caras e
bocas a cada curva da história. Perguntei-me se eu fiquei com
essa expressão também.
— Vai dar uma chance a ele? — Alice pergunta curiosa,
bebericando o seu chá.
— Sou uma pessoa horrível, se disser que sim?
— Ai Senhor! Obrigado! — Levi diz alto com as mãos para
o céu, nos fazendo rir.
— Não se anime muito, combinamos de ir devagar. — Digo
e meu amigo revira os olhos. — Há cinco meses eu fiquei noiva,
acha mesmo que eu vou me atirar sem paraquedas em um novo
relacionamento?
— Você ficou noiva por um mês. — Levi ri. — E mal se
envolveu com o noivo, que aparentemente já está criando laços
com… — Ele não finaliza, mas foi o suficiente para eu relembrar
a cena no balé.
— Vocês acham que a minha irmã viu Dante no palco? —
Os dois se entreolham rapidamente.
— Sua irmã veio falar comigo assim que você saiu dos
bastidores. — Levi responde. — Ela não viu quem te pegou,
porque desligaram as luzes, mas quando a gente foi se
apresentar Michael e nem a Morgan estavam presentes.

Enfiei na minha cabeça que quanto menos eu pensar no


Michael, melhor. O que é impossível já que meus pesadelos são
quase sempre com ele.
Passamos o domingo inteiro olhando TV e comendo
besteira, fofocamos sobre as outras turmas do Conservatório e a
menina que Shade estava pegando da sala ao lado.
A noite chegou rapidamente, estamos os três à mesa
jantando, até a campainha tocar. Os dois me encaram, como se
eu pudesse saber quem estava atrás porta.
Levi anda até lá e espia no olho mágico, depois me encara
de olhos arregalados fazendo meu coração acelerar e antes que
eu pudesse questionar quem era, ele abre a porta. Meu
estômago embrulha rapidamente e meu coração retumba em
meus ouvidos.
Dylan deu um sorriso que não alcançou os olhos ao Levi,
que fez sinal para ele entrar. Me coloco de pé desajeitadamente e
paro na sua frente sorrindo, feliz em vê-lo.
— Podemos conversar… a sós? — Ele pergunta sem
delongas.
— Claro. — Lanço um olhar para meus colegas se
retirarem da sala. — Quer sentar? — Questiono em frente ao
sofá.
— Não, o que eu tenho a dizer será rápido. — Ele diz me
fazendo engolir em seco. — Dante, não é confiável, ele e Michael
têm um passado complicado e para o seu bem fique longe dele.
— Dylan fala como se tivesse me dando uma ordem.
— Para o meu bem, ou para o bem do Michael? —
Pergunto confusa.
— Por algum motivo Michael ainda se importa com você e
honestamente eu não entendo o porquê. — Ele diz secamente.
— Você é ingrata, mimada e não tem juízo algum, eu sempre
defendi você, Lindara, mas agora parece que está cada vez mais
perdida.
Minha garganta queima como se tivesse em brasa. Abro a
boca para confrontá-lo, mas isso não me levaria a lugar algum.
— Se acabou, eu peço que se retire da minha casa. — Falo
com dificuldade.
Dylan me encara de olhos arregalados, talvez admirado
consigo mesmo por ter dito tanta coisa em tão pouco tempo.
— Lindara...
Evito olhar para ele, meus olhos estão carregados de
lágrimas, apenas aponto para a porta, indicado a saída.
Ele sai e sem demora Levi entra na sala e me encara
pasmo, com certeza ele ouviu toda a conversa que não durou
nem dois minutos, mas foi o suficiente para me desestabilizar.
— O que eu fiz, Levi? — Digo entre lágrimas. — O que eu
fiz para merecer isso?
— Hey… — Ele segura meu rosto entre suas mãos. — Não
fique assim, talvez ele esteja com problemas e só precise de
alguém para descontar.
Assinto e me belisco para ter certeza que não foi mais um
pesadelo, nunca desejei tanto que fosse um.
Deitei em minha cama angustiada, fiquei horas olhando o
teto e a porra do sono não vem. Pego o meu celular para conferir
as horas e há uma mensagem do Dante.

Dante: Oi, como está a dona do meu coração?


Dante coloca um coração quebrado do lado, me fazendo rir.
Oh, ele mandou essa mensagem no início da tarde.
Lindara: Isso foi nojento.
Mando uma carinha vomitando.
Dante: Assim você magoa os meus sentimentos.
Ele manda um rostinho chorando. Fico surpresa de ele
responder tão rápido.
Lindara: Quer vir aqui?
Escrevo e simplesmente envio e depois percebo que já
passou da meia-noite.
Dante: Você está bem?
Lindara: Sim, estou.
Suspiro baixinho e coloco o celular debaixo do travesseiro
novamente e quando olho para a porta Levi e Alice, estão em pé
me encarando feitas duas assombrações.
— Posso ajudar? — Questiono e os dois adentram. Levi
senta ao meu lado e Alice aos pés da cama.
— Na verdade, nós queremos ajudar você. — Ele fala e um
sorrisinho cresce em seu rosto. Está parecendo mais com uma
intervenção, mas não questiono. — Procuramos na internet e
encontramos um grupo de apoio para pessoas que perderam a
memória e nos pareceu uma ótima ideia você participar. Para
você ver que não está passando por isso sozinha.
— Isso existe? — Fico chocada.
— Sim e é online. No conforto da sua casa. — Alice
cantarola e alisa o lençol da minha cama.
— Parece bom, obrigada! — Sorrio animada de verdade.
Os dois se entreolham e dão um rápido soquinho, nos punhos.
Assim que eles saem do quarto, me cubro até a cabeça e
me viro para o lado. Pelo menos terei o que fazer nas próximas
semanas e será legal conversar com pessoas que realmente
sabem o que estou sentindo.
Relaxo e quando estou pegando no sono, ouço uma leve
batida na minha porta.
— Entra! — Grito minimamente irritada e muito sonolenta.
— Hora ruim? — Dante pergunta em pé na porta, o encaro
pálida.
— Não, me desculpe, quando o convidei não vi que estava
tão tarde. — Explico. — Entre. — Peço, ligando a luz do abajur.
Fico levemente envergonhada pela simplicidade do meu
quarto, o banheiro da casa dele é maior que o meu cubículo cor
de rosa.
— Tudo bem, eu durmo tarde. — Ele esclarece, sentando
na cama de frente para mim.
Nas mãos dele há uma pequena sacola de papel vermelho,
ele repara que estou observando e me entrega.
— Não acha meio cedo para presentes?
— Na verdade, está bem tarde. — Dante diz irônico,
olhando as horas no relógio de pulso.
Sorrio e tiro de dentro uma embalagem de bombom.
— Eu ia trazer amanhã, mas já que estou aqui.
— Obrigada. — Falo ao pegar um pequeno bombom e
colocá-lo na boca, ofereço um para ele, mas Dante nega.
— Agora me conte o que houve. — Ele pede.
Respiro fundo e me escoro contra na cabeceira da cama.
— Seu ex-cunhado veio aqui. — Digo, buscando alguma
reação anormal em Dante, mas como sempre sua expressão é
ilegível.
— Brigaram? — Ele questiona calmamente e põe a mão
em minha perna por cima da coberta, eu involuntariamente lhe
dou uma tapa, Dante a tira rapidamente, surpreso.
— Desculpe, não quis passar dos limites.
— Foi o reflexo. — Coro e puxo a sua mão de volta, mas a
fico segurando, me sinto robótica, parece que estou navegando
em águas desconhecidas. Quem sabe nadar por elas me faça
sentir mais humana, penso, mas isso iria totalmente contra ao,
vamos com calma.
— Lindara... — Ele dá um leve puxão em minha mão me
trazendo de volta a realidade.
— Não foi uma briga, foi um desabafo eu acho.
— O que ele disse? — Dante insiste e sinto que estou
andando em círculos para não pronunciar aquelas palavras.
— Que sou ingrata, mimada, sem juízo e que estou cada
vez mais perdida. — Ele senta reto, parece tenso. Omito uma
parte, vai que Dante queira tirar satisfação e tudo que eu menos
quero é arrumar outra rixa eles.
— Eu não preciso convencê-la que isso é mentira, não é?
— Não, Levi já fez isso. — Digo e dou um sorriso torto. —
Tem mais alguma coisa que eu deva saber sobre o seu passado,
Dante?
É difícil acreditar que depois de seis anos, Michael ainda
não esqueceu essa rixa. Ok. Foi horrível a invasão do
casamento, mas Lindsey o escolheu às duas vezes. Por que
Michael não consegue simplesmente deixar de lado, agora que
ele notavelmente está com Morgan?
— Meu pai foi assassinado, mas esse é um assunto que eu
prefiro não tocar. — Ele diz secamente e percebo que Dylan
pregou coisas na minha cabeça. Não vou mais deixar aquela
família me desequilibrar. Eu já faço isso sozinha. Penso
ironicamente.
— Me desculpe. — Digo e desligo a luz do abajur.
— Linda... — O interrompo com um beijo.
— Não diga mais nada. — Peço o puxando pelos ombros,
seus lábios encontram os meus na escuridão do quarto e sua
mão desce para minha cintura e permanece ali. Seguro em seu
rosto e me permito desfrutar dos seus beijos e dessa vez
nenhuma culpa irá me assombrar.
— Se quiser dormir aqui tudo bem, apenas fique com as
calças. — Aviso contra seus lábios ao sentir algo duro roçar em
minha mão, Dante sorri e se afasta.
— Tem certeza? — Ele pergunta jogando os sapatos longe
e se deitando atrás de mim. Rio do seu gesto. Dante ocupa
quase toda a minha cama, agora eu entendo porque ele tem uma
tão grande.
Deito em seu antebraço e ele puxa meus cabelos para trás
delicadamente os tirando do meu rosto.
— Vou sentir sua falta no escritório. — Ele fala se
colocando de lado, me abraçando.
— Eu sei.
— Principalmente desse sarcasmo. — Sua mão escorrega
para o centro da minha barriga, e algo duro pressiona minha
bunda. Sinto o meu rosto aquecer. Fico tensa, indecisa do que
estou sentindo, me viro para ele.
— Dante você está me cutucando. — Ele ri e desce a mão
entre nós e de repente acende uma luz na minha cara.
— É o meu celular, Lindara. — Ele explica com a luz ainda
ligada, coro, e vejo que há uma mensagem da Helena com emoji
de beijinho de minutos atrás. Dante desliga o celular e põe
embaixo do travesseiro.
— Vocês trocam mensagens sempre? — Questiono e me
viro para poder encará-lo, com a pouca claridade que entra da
janela.
— Acho que sim, nunca reparei nisso. Tudo bem?
— Sim, só fiquei curiosa.
Não sei qual é o mais cego, claramente os dois são bem
próximos e já ficaram no passado, será que nunca rolou uma
recaída?
Será que Dante a esqueceu? Porque Helena notoriamente
não.
— Está pensando nela, não é? — Ele questiona.
— Não. — Minto em vão, é obvio que estou.
— Pergunte, Lindara.
— Não quero falar dela. — Informo e viro de costas para
ele novamente.
Dante se aproxima novamente e sua respiração quente
roça em meu ouvido.
— Boa noite, Lindara. — Ele diz e morde o lóbulo da minha
orelha, fazendo um arrepio descer ao longo da minha coluna,
essa foi, com certeza, a sensação mais gostosa que eu tive nos
últimos meses, talvez eu ainda não esteja pronta para dormir.
Devagar, mas nada sutil eu empino a bunda contra ele,
Dante fica tenso, mas sua mão que me segura pela cintura não
move um centímetro do lugar. Mexo o quadril novamente então
ele sussurra em meu ouvido.
— Se você continuar fazendo isso... — Ele pausa. — Eu
não tenho mais nada para tirar do bolso, Lindara.
— Eu não quero que você tire. — Sussurro e levo a mão
dele para baixo da minha blusa.
Dante nem parece estar respirando, ele vagueia por minha
barriga fazendo longas carícias. Os nós dos seus dedos alisam
pecaminosamente o contorno dos meus seios, que ficam
ligeiramente firmes contra o tecido fino do pijama. Ele desce
lentamente em direção ao meu abdômen. Inclino a cabeça para
trás contra o ombro dele, lhe dando total acesso ao meu corpo.
Dante me puxa com robustez e o sinto duro como uma
rocha contra as minhas costas, fazendo calor emanar pelo meu
corpo. Os dentes dele puxam o meu lábio inferior com uma
pressão prazerosa, e quando sua língua roça o céu da minha
boca seus dedos descem para dentro da minha calcinha.
Dante emite um chiado baixinho e ferino quando seus
dedos encontraram minha umidade. Seu polegar percorre aquele
ponto mais sensível, dando uma atenção desejável a ele e me
provocando leves tremores.
Ele morde minha orelha novamente e outro arrepio se
estende por minha coluna.
Gemo baixinho e empino minha bunda contra sua ereção.
Minha pele parece estar em brasa contra as mãos dele e sem
mais delongas Dante desliza profundamente dois dedos dentro
de mim. Estremeço com o seu toque e um ruído lascivo escapa
pela minha boca, então ele gruda seus lábios nos meus para
abafar meu gemido. Seus dedos começam a se mover
torturosamente devagar, então cravo minhas unhas com força no
dorso da sua mão, fazendo-o grunhir em minha boca.
— Você é sempre cruel? — Ele sussurra e seus dedos
deslizam para dentro de mim, me fazendo arquear o corpo.
— Deixe os insultos para outra hora. — Digo baixinho com
a respiração entrecortada. Dante apenas sorri e me beija tão
fortemente, que o prazer irradia de todas as partes do meu corpo,
me fazendo esquecer até de respirar. Me viro para ele, ficando de
barriga para cima e enxergando apenas um vislumbre do seu
rosto.
Ele tira seus dedos de dentro de mim e ergue a minha
blusa libertando os meus seios, seus lábios abocanham o meu
mamilo no mesmo instante que seus dedos afundam em mim
novamente, gemo, gemo e gemo, sentindo o orgasmo se alastrar
em um grau tão intenso que me seguro na mão dele e no lençol,
erguendo o corpo e tentando controlar meus batimentos
cardíacos, seus movimentos foram ficando mais leves e lentos,
até eu relaxar o meu corpo por completo. Eu tremo
descompassadamente e por um curto momento eu quase o
agradeci.
Dante se deita ao meu lado e mantém o braço sob mim.
— Me desculpe se eu fui cruel. — Peço ironicamente,
alisando o dorso da sua mão.
— Eu gosto de uma gata. — Ele diz e beija a minha testa.
E nos braços dele, adormeço.
As semanas se arrastaram muito lentamente, igual a minha
relação com Dante. Ainda estamos na terceira base, muitos
beijos e pequenas caricias. Estou curtindo e aproveitando cada
momento juntos, sem pressão ou cobranças. Ele veio me visitar
algumas vezes durante as semanas já que estava sem condições
de sair por causa da bota imobilizadora. Agora, o meu tornozelo
melhorou o suficiente para eu não precisar usá-la, mas sem
condições de usar saltos ou até mesmo dançar.
Aproveitei as tardes em casa, parar entrar no grupo de
apoio para pessoas que perderam a memória. As reuniões
acontecem por vídeo-chamada e têm pelo menos umas
dezessete pessoas.
Na última chamada de vídeo, uma mulher se apresentou.
Anny, ela disse que havia perdido a memória quando caiu do
segundo piso da sua casa. E três anos depois do acidente, ela a
recuperou no momento em que estava passeando com o seu
cachorro no parque, Anny disse que lembrou de tudo como se
nunca tivesse esquecido de nada. Perguntaram se ficou feliz em
ter recuperado a memória. Ela disse que, definitivamente não.
Muitos confessaram que afundaram em depressão nos
primeiros meses e alguns começaram a beber e a usar drogas
como uma válvula de escape.
Pensando agora, eu tive uma puta sorte por não ter
acontecido algo pior comigo.

Coloco um vestido que se parece muito com uma camisa


social masculina. Ele é vermelho bordo, justo e curto, com botões
pretos e o tecido é levemente amassadinho. Combina
perfeitamente com minha sapatilha preta, que é a única que eu
consigo calçar com o estabilizador do tornozelo.
Pego minha bolsa no cabideiro e quando desço encontro
Micaela entrando no edifício. Uau! Ela está enorme.
— Boa tarde, irmã. — Ela sibila parecendo irritada.
— Olá. — Dou um sorriso forçado.
— A última vez que a vi você disse que não sumiria mais.
— Ela fala zangada.
— Eu machuquei o tornozelo lembra?
Ela encara meu pé e cerra os olhos.
— Está indo onde? — Mica não parece nada contente.
— Comprar absorvente. — Minto com um pouco de medo.
Ela me analisa metodicamente.
— Mentirosa. Qual é o nome dele? — Ela questiona
cruzando os braços.
— Venha, vamos tomar um café. — Digo e a puxo pelo
braço.
Atravessamos o parque lentamente, Micaela grávida
consegue ser mais lerda que eu, com o tornozelo ferrado. Ela me
fuzila de perguntas, sedenta por qualquer informação. E só se
cala quando pedimos nosso café para o atendente da Starbucks.
— Ainda não acredito que você está namorando e não me
contou!
— Primeiro: eu não estou namorando e segundo: não faz
um mês.
— Já transaram? — Mica indaga me fazendo quase cuspir
o café.
— Não! — Digo revirando os olhos, pela intromissão dela.
— Eu nem sei mais o que essa palavra significa.
— Há sete meses você sabia. — Rio.
— Pare de enrolar e me conte! Como ele é? Qual é o nome
dele? O que ele faz? — Ela metralha com as mesmas perguntas
que eu prometi contar somente quando estivéssemos sentadas.
— Ele é alto e tem os cabelos escuros. E trabalha em um
escritório. — Falo simplesmente.
— Uau! Ele parece bem sem graça, normal, mundano. —
Ela diz me fazendo rir.
— Ele não é mundano. — Paro e penso em como
descrever Dante, mas ele é uma incógnita, nem se eu quisesse,
conseguiria. — É diferente. — Digo e Mica faz cara de nojo.
— Quando vou conhecê-lo?
— Em breve.
Apresentar Micaela ao Dante deixará as coisas bem mais
formais e eu não sei se quero isso agora. E também não dá para
esquecer o fato dela já conhecê-lo e saber de toda a história e
não ter me dito porra nenhuma.
Será o inferno na terra quando colocá-los na mesma sala.
— Eu devia ter ficado ao seu lado, meses atrás. — Ela
menciona me pegando de surpresa e segurando minha mão por
cima da mesa. — Estava chateada porque você não estava
fazendo o que eu achava que era o melhor para você, eu devia
tê-la apoiado. Afinal, você passou por tantas coisas que é quase
impossível entender como ainda está viva.
Ela diz isso, mas sinto que há bem mais por trás do que ela
está me dizendo.
— Eles estão juntos, não é? — Pergunto, Micaela sabe
muito bem a quem estou me referindo.
Mesmo os vendo na minha falha apresentação, ainda tenho
um pouco de dúvida e minha mente às vezes parece que tenta
me sabotar.
— Blake acha que sim. Michael mal fica na cidade e com
Andrew Brent de cliente, ele precisou expandir os negócios. Você
estava certa, ele teria muito a perder se abandonasse o
governador.
Pelo menos eu não arruinei totalmente a vida dele.
— O que passou, passou! — Aviso, colocando um ponto
final nesse assunto. — Só vamos prometer que a partir de agora
iremos respeitar as decisões uma da outra mesmo que a
odiamos. — Peço.
— Fechado. — Ela me dá um aperto de mão.
Mica e eu ficamos conversando um bom tempo na
Starbucks, até ela começar a fazer xixi de cinco em cinco minutos
e decidir ir embora. Esperei minha irmã entrar no táxi e pedi um
para mim. Sem demora desço em frente ao escritório do Dante.
Quero surpreendê-lo.
Quando saio do elevador a sala de espera está vazia e a
recepção também. Estranho.
Espero não ter perdido o meu tempo vindo até aqui. Talvez
avisá-lo teria sido uma boa ideia, penso ao abrir a porta do seu
escritório e me deparo com uma cena peculiar.
— Não posso negar que isso nunca tenha me passado pela
cabeça. — Comento ao ver Dante sentado em sua majestosa
cadeira e de quatro no chão, eu só consigo enxergar uma bunda
empinada com os tornozelos cruzados, próximo a lateral da
mesa.
Dante arregala os olhos e fica de pé rapidamente.
Fico admirada ao ver a braguilha da sua calça fechada.
Helena se ajeita sobre os joelhos e se volta para mim,
rapidamente.
— Bom vê-la novamente. — Ela saúda corada, segurando
um pote de balas nas mãos e com uma na boca.
— Ela só está juntando as balas. — Dante explica, encaro
o chão brevemente e de fato, há balas por todo o piso.
— Claro que está. — Digo com naturalidade e pergunto
com um sorriso: — O que mais você gosta de chupar durante o
trabalho, Helena?
Dante fica tenso, dessa vez consigo decifrar bem sua
expressão e é de pura irritação. A mulher arregala tanto os olhos
que eu pensei que saltariam das órbitas. Ela solta o pote com
força em cima da mesa, provocando um estampido e antes de
passar por mim, ela lança um olhar de reprovação para ele.
— Isso foi desnecessário. — Dante diz áspero. Fazendo-
me arquear a sobrancelha.
— Por que você mesmo não pegou as balas? — Questiono
largando minha bolsa em cima da mesa. Ele abre a boca,
pigarreia e a fecha novamente.
Seguro o seu olhar e dou a volta na mesa, parando em sua
frente, Dante não move um músculo do lugar, normalmente ele
me abraça e me beija, mas tratar Helena mal, por algum motivo o
desagradou.
— Você sabe o que ela quer. — Afirmo, colocando uma
mão sobre o seu tórax e segurando seu membro com a outra, o
pegando de surpresa. — Ou você é muito burro para perceber?
Dante puxa minha mão com força, não tenho tempo nem
de ficar espantada e quando percebo já estou sentada em cima
da mesa com ele entre as pernas.
— Quero uma resposta. — Digo quando ele tenta me beijar
e o empurro para longe com o pé, bom.
— Que bicho te mordeu hoje? — Ele desconversa. — Isso
é ciúmes?
Meus lábios se curvam em um sorriso. Dante me analisa e
talvez ele esteja um pouco perdido pelo que acabou de
acontecer.
— Só esperava mais respeito da sua parte.
— Me desculpe. A Helena derrubou o pote e um segundo
depois você entrou.
— Coincidência infeliz, não? — Sorrio, ele se aproxima
novamente e o deixo me beijar, suas mãos correm para minha
cintura me segurando firme e me puxando mais para perto e uma
delas desliza para o interior do meu vestido alisando a minha
coxa com ímpeto.
Estava levantando a bunda da mesa para Dante tirar a
minha calcinha quando o telefone começa a tocar. Ele se
recompõe, com a expressão de irritação e o atende, troca breves
palavras e desliga em seguida.
— Não vim aqui só para surpreendê-lo. — Falo descendo
da mesa quando ele tenta se aproximar. — Quero ver o que tem
no cofre da minha mãe. Mas preciso da certidão de óbito. Como
faço para ter acesso? Procurei na internet e honestamente não
entendi bulhufas.
— Você podia ter perguntado para mim.
— Estou fazendo isso agora.
Ele sacode a cabeça.
Dante senta à mesa e começa a digitar em seu computador
me ignorando completamente. Em seguida ele puxa uma gaveta
de arquivos e me mostra um papel.
— Quando você me contou sobre o cofre, sabia que iria
precisar e solicitei com cartório.
— Oh, obrigada. — Digo admirada e dou a volta na mesa,
sentando em seu colo. — Micaela quer conhecê-lo. — Aviso, ele
me encara atônito e me abraça pela cintura.
— Você quer que eu conheça ela, de novo? — Pergunta
com um sorriso.
Há meia hora eu pensei que não estava pronta, porém, ele
está sendo maravilhoso comigo e está na hora de parar de tratá-
lo como um bote salva-vidas.
— Quero. — Saio do seu colo. — Eu vou me desculpar
com Helena.
— Não precisa fazer isso, Lindara.
— Eu sei. — Comento saindo da sala e fechando a porta.
Em pé na recepção há uma bela mulher curvada sobre o
balcão. Ela se vira para mim e o que chama atenção em seu
corpo é a sua volumosa barriga de grávida.
Ela dá um sorriso genuíno e, por algum motivo, e tenho
certeza que a conheço de algum lugar.
— Lindara Fincher. — Ela sibila admirada e se aproxima.
— Desculpe nos conhecemos? — Pergunto encabulada,
diante dela.
A mulher exala beleza, ela é morena de olhos castanhos e
usa um vestido branco de alcinhas e com uma grossa cinta
pressa a cima da barriga.
— Já, querida, mas felizmente você não lembra. —
Felizmente? — Me chamo Sabrina. — Ela acrescenta.
— E onde eu tive o prazer de conhecê-la? — Pergunto
curiosa e Sabrina me segura abruptamente pelo pulso fazendo
meu coração acelerar, seus olhos me encaram com maldade, e
um sorriso felino cresce em seus lábios. Estreito os meus para ter
certeza do que estou vendo, porque parece uma alucinação.
Puxo o meu pulso da sua mão e dou um passo atrás, me
sentindo enjoada.
— Você está bem? — Ela questiona e quando tenta
encostar em mim novamente, me esquivo.
— Estou. Deve ser pressão alta. — Informo com meu
coração disparado.
— Sabrina. — Dante a chama da entrada do seu escritório.
— Vamos conversar. — Ela comunica e anda até ele com
passos suaves e quando Sabrina para ao lado dele, eu me
recordo de onde a conheço.
Do vídeo do sequestro que a detetive me enviou, semanas
atrás.
Pela forma que Dante a encarou e pelo tom de voz que ele
a chamou, claramente ele não se sente à vontade com ela. E se
a mulher sabe disso, parece não se importar nem um pouco.
Sentindo meu coração voltar ao ritmo normal, me viro para
Helena, que mexe no notebook, me ignorando completamente.
Com razão!
— Me desculpe, foi grosseiro e desnecessário o que eu
disse. — Falo sincera.
— Foi mesmo, mas tudo bem, a situação toda estava
distorcida.
Assinto com um sorriso.
— Sabe se ele está saindo com alguém? — Ela pergunta
de repente, fazendo os meus batimentos acelerar. Dante não
contou para ela e não sei porque isso me impressiona.
— Não sei. — Sussurro, vendo-a mexer em um envelope
preto, com um selo redondo prateado. — O que é isso?
— O convite para a convenção anual dos advogados. Só
os melhores recebem essa belezinha. — Helena diz balançando
o convite e o largando em cima do balcão.
Sem demora a porta do escritório do Dante se abre e
Sabrina passa por ela sorrindo, a mulher fita por um momento e
diz para mim:
— Podemos marcar de sair uma hora, vai se surpreender
com o tanto que eu sei sobre você. — Ela pisca e segue para o
elevador.
O tom de voz dela pareceu meio sarcástico e me deixou
profundamente intrigada. Como será que eu conheci essa mulher
que diz saber tanto de mim?
Dante está sério, parece que estava lidando com o diabo lá
dentro, ele se aproxima e antes que ele pudesse me tocar eu
ando para fora do seu caminho.
— Podemos ir ao banco agora? — Pergunto. Ele concorda
indo buscar a certidão de óbito em sua sala.

Descemos em silêncio. Dante estava perdido em seus


próprios pensamentos, há tanta coisa que eu quero saber,
principalmente sobre aquela mulher que me fez ficar enjoada com
um simples toque.
— Posso fazer uma pergunta? — Quebro o silêncio e ele
me encara esperando fazê-la. — Você está bem? — Não era
bem isso que eu queria questionar, mas ele está sério demais.
— Me desculpe se estou distante… — Ele pausa e morde o
lábio superior o deixando vermelho. — Sabrina é uma pedra no
meu sapato e sempre que ela vem, traz problemas.
— Você sabe de onde ela me conhece?
— Do café que você trabalhava, talvez. — Ele aperta os
lábios e adiciona me olhando seriamente: — Não se aproxime
dela, Sabrina não é de confiança.
— Por quê? O que ela fez?
— Não posso falar, apenas fique longe dela. — Dante
declara, me deixando tensa.
— Tudo bem. — Concordo, mas não prometo.
Entramos no banco Líder Financeiro, Dante caminha com
toda a sua magnitude, chamando atenção das atendentes e não
demora muito até uma delas nos atender.
Sentamos de frente para uma mulher morena de cabelos
curtos e encaracolados, ela veste um terninho vermelho e sua
maquiagem dourada, combina perfeitamente com o broche
dourado que está gravado o seu nome, Eliana Mendes.
— Boa tarde, senhor.
Dante sorri educadamente para ela.
— Quero acessar um cofre locado no ano de 2004.
A mulher o encara perplexa.
— Documento de identificação, por favor.
Agora vem a parte que eu mais temia a burocracia. Dante
explica a situação atual para a moça com uma simplicidade
incrível. Pena que nem tudo foi tão simples assim. Minha mãe
havia pagado apenas cinco anos pela locação. E para eu saber o
tem dentro daquele cofre preciso pagar os onze anos da locação,
que dá exatamente 132 mil dólares.
Dante tira a carteira do bolso e seguro em seu braço
rapidamente.
— O que está fazendo?
— Você não quer saber o que tem lá?
— Por esse valor? Não! Já faz dezesseis anos, pode ter se
desintegrado. Não vou deixar você gastar essa quantia obscena!
— Depois você me paga.
— Como?!
— Você ainda trabalha para mim, considere um
empréstimo. — Ele sorri segurando minha mão. — Estamos aqui
e estou curioso.
O encaro boquiaberta.
— Ok. Mas que fique claro, que se tiver só papel velho e
irrelevante, você perderá 132 mil dólares, por curiosidade.
— Feito! — Mexo a cabeça em negação.
Dante faz um cheque para a moça e em seguida ela me
entrega um formulário para preencher. O fiz com as mãos
trêmulas e devolvi a ela rapidamente. Tento não deixar minhas
expectativas nas alturas, Dante já está fazendo isso por mim.
A moça se põe de pé e acena para alguém, em instantes
uma loira de saia lápis e terninho preto, aparece atrás de nós e
dá um sorriso deslumbrante a ele.
— Podem me seguir, por gentileza. — Ela pede, olhando
diretamente para ele.
Dante põe a mão em minhas costas para me guiar e assim
seguimos a mulher, que nos lança um olhar de confusão.
Realmente, estou um trapo, cabelos longos demais e indomáveis,
sapatilha e um vestido que parece que eu desenterrei do fundo
do guarda-roupa.
Nem nos meus melhores dias eu estive tão arruinada como
estou esse mês.
A loira nos guia por um longo corredor, com dezenas de
portas dos dois lados e sem demora, ela para em frente a uma
grade, digitando uma senha em um aparelho grudado a parede. A
mulher adentra a pequena sala, composta por milhares de
pequenos cofres cinza.
— Chave, por favor.
Pego a pequena chave de dentro da bolsa e entrego a ela.
Encaro Dante, aflita, ansiosa, sentindo meus batimentos
cardíacos elevarem. A atendente abre o cofre e põe a pequena
caixa de metal em cima de uma bancada de vidro que está
disposta no meio da sala. Ela sorri gentilmente e se retira em
seguida.
— Está pronta? — Dante pergunta acariciando minhas
costas.
— Sim. — Digo com um sorriso torto. — Mas abra você. —
Peço sentindo minhas mãos suarem.
Então ele abre sem pestanejar, e um papel branquinho é
visível dentro da pequena caixa. Dante o pega e desdobra em
seguida, ele tenta me entregar, mas eu recuso. Eu mal o enxergo
com os olhos cheios de lágrimas, que dirá conseguir ler algo.
— Me diga o que é.
Ele assente e analisa o papel, em seguida me encara com
as sobrancelhas juntas e percebo pela sua expressão, que talvez
eu não vá gostar do que está escrito ali.
— É um documento de divórcio, Lindara. Assinado
somente pela sua mãe.
Sorrio e Dante me olha confuso.
— Ela ia deixá-lo, Dante. — Eu mal recordo da minha mãe,
os poucos momentos que eu lembro são vagos e nebulosos, e
saber que ela não ficaria com um homem que a traiu me diz
muito sobre quem ela foi. Forte, decidida, corajosa.
— Você está bem? — Ele questiona e me puxa para um
abraço apertado.
— Sim, obrigada por estar aqui. — Digo e enxergo alguns
saquinhos de veludo preto dentro do cofre.
— Quer ver o que tem no resto? — Pergunto com um
sorriso, ele assente animado, pegando um dos saquinhos.
Saímos do banco levando tudo que havia no cofre. E uma
sensação de alívio toma conta do meu corpo. Em cada saquinho
continha joias, de brincos a colares. Não tenho ideia dos planos
que minha mãe tinha para eles. Porém, eu sei exatamente o que
farei com essas belezinhas.

Dante estaciona na frente do meu edifício e se volta para


mim, pensativo.
— Pergunte! — Digo encarando aqueles olhos
hipnotizantes.
— Nós estamos bem? — Ele questiona me deixando
confusa, não entendendo o real significado da pergunta. — Às
vezes eu me pego pensando que... — Ele umedece os lábios. —
Se você recuperar a memória, tudo vai acabar.
Oh. Meus lábios se separam comovida.
— Não penso nisso. — Sussurro fechando minha mão em
volta da dele. — Vamos apenas viver o agora. — Ele assente
com um sorriso fraco quando me aproximo dos seus lábios. —
Me leve para jantar hoje? — Peço.
— Agora eu gostei. — Dante sorri e me beija fortemente,
me despeço dele sem fôlego e desço do carro.
Minhas esperanças de recuperar a memória já morreram
há um tempo e que Deus me proteja se um dia ela voltar.
Já são quase seis horas, subo às pressas para tomar os
meu remédio e um banho antes que Alice e Levi resolverem
dominar o banheiro. E assim que saio os vejo entrando no
apartamento.
Alice que ia ficar até arrumar outro lugar resolveu acampar
no nosso sofá. Ela e o Levi estão cada vez mais próximos e sinto
uma pontinha de ciúmes dos dois. Estou ansiosa para voltar ao
balé. Daqui alguns dias tenho consulta com o médico e ele vai
me dizer se estou apta para dançar.
— Vai sair? — Levi questiona na porta do quarto.
Faço que sim com a cabeça.
— Entra. — Sussurro e Levi já sabe que é fofoca.
Ele senta na ponta da cama e enquanto reviro o meu
guarda-roupas, conto que dia louco e realizador que eu tive.
Manha vida tem sido uma gangorra desde que sai do coma e
agora a sensação é de estar nas alturas, sinto que Dante é
responsável por isso, mesmo que as joias sejam da minha mãe,
nada teria acontecido sem ele, que também as venderá para
mim.
Coloco um vestido preto, longo até abaixo dos joelhos,
justo, modelando as poucas curvas que me sobraram. Pego um
sapato plataforma, debaixo da cama e experimento.
— Sério, vai arriscar? — Levi repreende olhando para os
meus pés.
— Eu vou a um restaurante não correr maratona.
Ele sacode a cabeça em negação.
— Me recuso sair de sapatilha de novo, as pessoas nos
encaram como se Dante estivesse fazendo caridade por estar
comigo.
Meu amigo revira os olhos.
— Você parece feliz. — Ele afirma.
— Estou!
Pego minha bolsa e jogo um batom vermelho dentro.
Quando chego à sala, Dante está em pé na entrada, ele
veste uma camisa polo cinza e uma calça jeans preta, quase
casual.
— O seu tornozelo ainda está melhorando, não acha
melhor usar algo mais confortável? — Ele sugere.
— Eu estou bem. — Digo firme e Dante não insiste, ele
segura a minha mão e assim deixamos o apartamento.
— Você é uma cabeça dura. — Dante diz quando
adentramos o carro.
— Vamos começar com os insultos agora, querido? — Ele
mexe a cabeça em negação.
Não faço ideia em qual restaurante iremos, mas estou
ansiosa para chegar lá. Talvez hoje seja a grande noite, estou
empolgada, pois, as coisas estão dando certo, por que não
comemorar de todas as maneiras possíveis?
Descemos em frente a um restaurante francês Oui
Monsieur. Se localiza em uma das esquinas da Times Square.
Agora que o clima está relativamente gostoso à noite, há também
um espaço pequeno de alimentação do lado de fora.
Entramos no restaurante, ele tem um clima rústico. As
paredes são alaranjadas com colunas gregas, há muitos quadros
pendurados e as mesas são escuras e ligadas a paredes com
bancos estofadas para dois.
Paramos na recepção e um garoto nos atende.
— Tem horário reservado? — Ele questiona nervoso, talvez
seja novato.
— Sim, Armstrong. — Dante responde e o garoto confere
no computador e dá um breve sorriso.
— Me sigam, por gentileza. — Ele diz e sai apressado de
trás do balcão.
O restaurante é maior do que eu imaginava, ele faz uma
curva indo para outra sala, onde há uma segunda entrada.
Sentamos em uma das mesas do meio com Dante de
frente para mim.
— Já esteve aqui antes? — Pergunto.
— Nunca, mas pensei que fosse gostar de comer algo da
sua origem.
— Eu sou americana, Dante. — Ele ri.
— Eu sei, mas sua mãe era francesa.
— Oui. — Concordo com um sorriso.
Um atendente traz o cardápio e fazemos nossos pedidos
rapidamente. Com a fome que eu estou, comeria até um cachorro
quente da carrocinha. Pedimos dois Blanquette de Vitela e um
vinho tinto. Faz tanto tempo que eu não bebo que sou capaz de
ficar bêbada só com o cheiro do álcool.
Dante me encara pensativo, ele corre os dedos por cima da
mesa e segura minha mão, prendendo a minha atenção.
— Preciso fazer uma viagem amanhã. Volto no máximo em
uma semana, acha que consegue sobreviver sem mim até lá? —
Ele pergunta com uma expressão divertida.
— Assim de repente?
— Vou a negócios, Lindara, pretendia convidá-la, mas será
chato demais.
— E posso perguntar para onde você vai?
— Milão.
— Claro, com certeza, seria tedioso demais. — Ironizo.
— Eu estarei em reunião a maior parte do tempo e você
ficaria sozinha. — Ele explica e aperta minha mão.
— Não sabia que fazia negócios tão longe.
— Negócios de família.
— Sua família não mora no Arizona?
— É a família do meu pai que eu vou visitar.
Dante nunca me falou nada sobre a família do pai dele e eu
também não ousei perguntar, ele não parece muito à vontade
quando o assunto é seu pai.
— Daqui duas semanas tenho um evento importante, teria
a honra de me acompanhar?
— É a convenção dos advogados? — Questiono sentindo
um frio na barriga, ele me encara confuso. — Helena me contou.
— Esclareço, ele fica pensativo e depois de um momento
assente.
— Não posso. Me desculpe, mas isso seria nos expor
demais.
— Até quando vai me esconder do Michael? — Ele
pergunta me deixando tensa com o seu tom de voz.
— Até quando vai me esconder da Helena?
— Isso não tem comparação, Lindara.
— Obviamente não, pois, você comeu ela por uma noite e
depois agiu como se nada tivesse acontecido!
O garçom chega com nossos pratos e nos dá um sorriso
preocupado. Dante se endireita na cadeira, hirto. Nossa primeira
discussão em público quem diria que me deixaria tão irritada.
O garçom se posiciona ao meu lado para colocar os pratos
na mesa, calmamente, e quando ele se retira, vejo alguém na
outra ponta do restaurante que faz meu coração refrear, quando
Dante vai olhar para trás seguro em sua mão chamando sua
atenção.
— Me desculpe. — Falo, pois, não vem mais nada a minha
cabeça.
— Não vou pressioná-la, Lindara. — Ele diz com a
expressão insondável.
Os meus olhos desviam para os da Morgan novamente, e
ela dá um pequeno sorriso e ergue uma taça como se tivesse
fazendo um brinde. Vadia! Ela desliza a mão livre sobre a mesa e
pega a do Michael, que está de costas para mim e sinto um certo
alívio por isso.
Comemos em silêncio, nosso pequeno desentendimento foi
como um balde de água fria em nosso jantar e minha vontade de
comemorar foi por água abaixo também.
— Eu vou retocar o meu batom. — Aviso e saio da mesa,
não aguento mais ver Morgan me encarando e rindo, como se
fosse tudo muito divertido.
O banheiro fica no final do restaurante, umas quatro mesas
antes da deles.
Empurro a porta dourada com força e entro no iluminado
banheiro, com seis toaletes e uma extensa pia branca de
porcelana.
Largo minha bolsa em cima da pia e tiro meu batom
vermelho de dentro, me encaro no espelho, meus olhos estão
com uma aparência de exaustão e minhas bochechas levemente
coradas. Quando levo o batom aos lábios, a porta se abre e não
preciso nem me virar para saber que é ela.
— Olá, Lindara. — Morgan saúda e vejo um sorriso
petulante pelo reflexo do espelho.
Viro-me para ela e lhe dou um sorriso tão atrevido quanto o
dela, Morgan usa um vestido branco, justo e de manga longa,
impecável sem um amassadinho.
— Vejo que sua mania de me perseguir ainda não passou.
Morgan sorri mostrando seus dentes perfeitos.
— Me desculpe ser invasiva. — Ela fala com aquele
sotaque britânico que me dói os ouvidos. — Só queria dizer que
Michael está em boas mãos agora. — Diz com a voz delicada,
mas finaliza com um sorriso presunçoso.
Em outras palavras ela está expondo: Em minhas mãos.
— Era tudo o que você queria, não é? — Morgan me fita
pensativa com um olhar inocente e no mesmo instante abre um
sorriso mordaz, a expressão dela passou de santa, a mulher do
diabo em segundos.
— Ele merece alguém a altura, não uma bailarina
desequilibrada que tem ataque de histeria toda a vez que
esquece de tomar uma pílula. — Ela mal respira enquanto destila
seu veneno. — Você estava destruindo com a carreia dele, fez o
que era certo o deixando.
Morgan umedece os lábios vermelhos e ajeita os óculos
com cuidado.
— Você é tão doente quanto eu.
Ela me encara confusa, mas em seguida solta uma
pequena risada.
— Eu não tenho TOC, me desculpe, eu menti. — Ela fala
dando de ombros. — Mas eu já contei ao Michael, detesto
mentiras. E ele foi muito, muito compreensível. — Ela dá ênfase,
fazendo meu coração reverberar em meus ouvidos.
— Espero que sejam muito felizes. — Desejo calmamente
e aperto o batom com tanta força que a tampa salta longe,
Morgan curva os lábios em um sorriso satisfeito, isso me faz
perder totalmente o discernimento e levo o batom na altura dos
seios dela, fazendo um risco até o umbigo.
Seus lábios se entreabriram chocada e os meus também.
— Você enlouqueceu? — Ela diz estridente.
— Sinto muito, esqueci de tomar a minha pílula hoje. —
Dou de ombros, eu nunca estive tão na linha como estou nessas
últimas semanas. Morgan passa por mim e pega um bolo de
papel atoalha, emanando irritação, péssima ideia tentar limpar,
mas não serei eu que vou avisar.
Firmo minhas pernas e me obrigo a deixar o deixo o
banheiro, preciso encontrar Dante e sair desse restaurante agora!
E quando atravesso a porta, Michael ainda está em sua
mesa, porém, olhando na minha direção. Uma mistura de
sentimentos percorre a sua face, ele se levanta, e de repente os
sons dos pratos e das conversas ficam silenciosas. Por um
momento estamos apenas nós dois e mais nada no nosso caminho,
como se tivéssemos em outra dimensão. Damos um passo na
direção um do outro, então ele para de repente olhando além de
mim e quando me viro encontro Morgan com face vermelha,
enraivecida, ela me lança um olhar ferino. Ela caminha até ele com
passos largos e começa a gesticular com os braços, irritadiça. Os
olhos dele encontram os meus e percebo que está com raiva,
engulo em seco, sem saber o que fazer. Michael volta a sua atenção
para ela, ele tira o paletó e a cobre.
Meu sangue parece que vai derreter a minha pele de tão
quente, reúno a resto das minhas forças e me forço a caminhar o
mais rápido que consigo até a minha mesa e Dante não está aqui,
se é possível meu coração acelera ainda mais. Ando até o caixa que
fica ao lado da recepção e ele está lá, pagando a nossa conta,
relaxo momentaneamente.
— Ia ir embora sem mim? — Questiono com um riso
nervoso.
Os músculos ao redor do queixo dele tencionam e suas
sobrancelhas escuras se ergueram levemente. Ele viu!
— Dante... — Digo me sentindo culpada e um sorriso torto
e sexy se abre em seu rosto.
— Eu não ia deixá-la, na verdade, já estava indo atrás de
você. — Ele diz e me estende a mão, a pego sem titubear e
saímos do restaurante.
Quando entramos no carro, achei que ele fosse dizer
alguma coisa, no entanto, ele apenas me leva parar casa, sem
questionar e o silêncio foi perturbador, eu quero me explicar, mas
não tenho ideia de como.
Briguei com Dante. Briguei com Morgan. Recebi um olhar
enraivecido do Michael e o que mais me frustra é que ela dirá a
todos que eu a ataquei primeiro.
A pobre e indefesa Morgan, na verdade, é uma vaca
manipuladora e maquiavélica.
Dante estaciona o carro em frente ao meu edifício, tiro meu
cinto e me viro para ele.
— Essas últimas semanas têm sido incríveis… — Paro e
respiro fundo porque meu coração ainda está acelerado. — Você
tem sido maravilhoso de todas as formas...
— Está terminando comigo? — Ele pergunta com a
expressão neutra.
— Meu Deus, não! — Digo petrificada. — Estou
agradecendo por ficar do meu lado. — Seguro sua mão e Dante
sorri parecendo aliviado. — No restaurante eu... — Busco as
palavras certas, mas elas não veem. — Quando eu estava no
banheiro a mulher, com quem Michael possivelmente está saindo,
foi atrás de mim.
Dante estreita os olhos, sem entender, acredito que ele não
ficou a tempo de vê-la sair do banheiro.
— Brigaram?
Aperto os lábios, e franzo o cenho, culpada.
— Eu meio que a risquei com o meu batom.
Ele fica boquiaberto e em seguida começa a rir.
— Não está com raiva? — Pergunto, sem entender a sua
reação.
— Não! Ela deve ter dito algo muito sério, para você passar
o batom nela.
— Ela disse que eu sou uma desequilibrada. — Tento falar
sério, mas rio, pois, é verdade.
— Eu gosto de todo esse desequilíbrio.
— Você é maluco. — Digo me aproximando dos seus
lábios. — Vou sentir sua falta essa semana. — Aviso roçando
meu nariz no dele e o beijando em seguida.
— Eu espero que sinta. — Ele diz puxando o meu lábio
inferior com os dentes e intensificando nosso beijo.
Saio da clínica alegre, o médico disse que o meu tornozelo
curou muito bem, mas acredita que seja melhor eu ficar afastada
do balé por mais duas semanas. Professor Thatcher vai me
escalpelar quando eu retornar.
Com muito tempo livre, já que Dante ainda está viajando,
aproveito para dar uma caminhada, irei desfrutar o meu tornozelo
saudável.
Na Times Square, entro em uma grande loja de conteúdo
infantil, roupas, brinquedos, entre outras coisas. Sem pressa eu
vago pelos corredores escolhendo algumas roupas para o bebê
da Mica, quero fazer uma visita a ela quando Dante voltar da
Itália, já faz uma semana que ele está lá.
Passo no caixa com um ninho de bebê azul-marinho, tip
tops, bicos, mamadeiras, toalhinhas, acredito que acabei me
emocionando, espero isso a deixe feliz.
Caminho carregada de coisas pensando que está na hora
de pedir um táxi, quando, do nada, sinto um cutucão nas minhas
costas, me viro rapidamente e tem uma e pequena menina loira,
me encarando.
— Linda! — A garotinha grita e se agarra na minha cintura.
— Emma? — Pergunto incerta, ela faz que sim com a
pequena cabecinha chacoalhado os longos cabelos.
— Senti sua falta, Linda.
— Eu também. — Minto, mas acredito que é o que a velha
Lindara sentiria. — Quem está com você? — Pergunto olhando a
nossa volta, a rua movimentada.
— Vovó. — Emma olha para trás e depois para o outro lado
da rua, em seguida me encara confusa.
— Venha, vamos encontrá-la. — Seguro sua mão e
seguimos no sentido oposto ao que eu estava.
— Lembra em qual loja estavam?
Ela me encara pensativa.
— Não. — Emma mexe a cabecinha.
Puta merda! Não faço ideia de como seja a avó de Emma.
— Linda, por que você não volta a ser a minha babá?
— Me desculpe, Emma. Eu tenho outro trabalho agora. —
Explico.
— E é legal? Tem criança?
Penso em Dante e por um momento quase respondo que
sim.
— Não. — Sorrio.
— Podemos tomar um sorvete? — Ela pergunta de repente
quando passamos em frente a uma sorveteria.
— Claro. Só fique perto de mim e olhando a sua volta caso
sua avô apareça.
Ela assente.
Enquanto eu pago dois sorvetes, Emma segura na barra da
minha blusa, procurando pela sua avó na rua mais movimentada
de Manhattan.
Entrego o de banana caramelada para ela e seguro em sua
mão para seguirmos caminhando. Emma fica tagarelando o
tempo inteiro sobre Fiona a cachorra que eu lhe dei de
aniversário, fiquei pasma por não saber disso antes. Quando
chegamos ao fim da rua começo a ficar preocupada.
— Sabe o número da sua avó?
— Sei o do papai, serve?
Merda! Talvez eu possa levá-la até o edifício Eiffel e colocá-
la no elevador, pronto, não preciso encarar Michael, ainda mais
depois da última vez que nos vimos, os olhos dele estavam
cuspindo fogo em minha direção. E de repente me vem à mente
que talvez ele esteja em Albany. Argh!
Pego o meu celular na bolsa e ligo para Michael, sem mais
protelação.
A ligação chama até cair. Ligo para a O’Connor &
Associados e uma recepcionista atende no terceiro toque.
— Oi, é a Lindara, Michael está? — Pergunto atropelando a
saudação da mulher. O telefone fica mudo por um instante.
— Só um momento. — Claro eu tenho todo o tempo do
mundo. — Oi, ele não pode atendê-la nesse momento.
Encerro a chamada e olho para Emma com um sorriso.
— Vamos dar uma volta? — Ela assente alegre
Pegamos um táxi na Times Square, em dez minutos
estávamos no nosso destino, meu coração explodindo no peito,
irritação é pouco para o que estou sentindo agora.
Encaro Emma pelo espelho do elevador, ela faz beicinho,
decepcionada.
— Pensei que fossemos dar uma volta. — Ela choraminga.
— Outro dia, querida. Sua avô deve estar preocupada.
As portas se abrem chamando atenção das pessoas que
aguardam na recepção. Quando adentramos o espaço, as três
recepcionistas nos encararam confusas. Paro em frente a uma
delas, e digo calmamente, do meu jeito:
— Digo ao Sr. O’Connor, que Lindara está aqui com a filha
dele.
Ela assente fazendo pegando o telefone rapidamente e
usando as mesmas palavras que eu usei para avisá-lo.
Não deu nem tempo de agradecê-la quando a porta do
escritório dele se escancarou.
— Emma! — Michael chama surpreso, olhando para ela e
depois para mim. — O que você está fazendo com a minha filha?
— Ele pergunta áspero, puxando a menina para perto de si.
— E vi a Linda pela vitrine e sai correndo atrás dela, daí eu
me perdi da vovó. — Emma explica, ele a escuta atentamente.
— Lindara... — Ele diz em tom de lamentação, olhando
para a minha sacola carregada de utensílios de bebês.
— De nada. — Digo secamente indo em direção ao
elevador.
— Linda, não vai! — Emma pede correndo até as minhas
pernas.
— Lamento, querida, mas agora preciso ir e não corra mais
da sua avó. — Digo limpando o sorvete em seu nariz. O beiço
dela retorna mais pesado dessa vez, com ela assentindo.
Ando até o elevador ouvindo Michael dar uma sequência
infinita de ordens para as secretárias. Chamo o elevador e evito
olhar para trás, sem paciência para aguentar desaforo de mais
ninguém.
— Lindara.
Ouço atrás de mim, me viro para Michael, tentando manter
a calma, mas meu corpo trêmulo se nega, o meu coração dispara
como uma britadeira contra as minhas costelas.
— Fale.
— Obrigado por trazê-la para mim.
Assinto e entro no elevador, quando as portas fecham
cortando o nosso contato visual, precisei me segurar para não
desabar. Meu corpo inteiro parece que entrou em colapso, até
respirar se tornou difícil.
Ele me odeia, sua voz e seus olhos gritam isso para mim.

Chego no apartamento aparentemente vazio e me atiro no


sofá, derrotada, pensando que eu devia ter escolhido vir direto
para casa. Há um tempo ficava imaginando em como seria o meu
encontro com Michael novamente e nunca na minha mente achei
que seria tão frio.
A campainha toca e Alice corre atendê-la, olhando para
mim surpresa, parece que nenhum dos dois me viu chegar.
Micaela passa pela porta parecendo um dragão cuspindo
fogo, suspiro.
— O que eu fiz agora? — Questiono me sentando.
— Blake só me contou hoje que você atacou Morgan no
banheiro de um restaurante... — Ela respira fundo. — Me diga
que não está bebendo, Lindara. — Ela pede rubra.
— Eu não bebo há meses. Estou mais limpa que água
filtrada.
— Então por que, Linda?
— O que Blake contou?
— O que Axel contou a ele, que ouviu os dois falando de
você. Morgan disse que você estava fedendo a álcool quando a
esbofeteou e riscou o vestido dela, no banheiro.
— Ah! Que vaca! — Grito.
— Lindara só riscou ela com o batom. — Levi fala surgindo
pelo corredor e adiciona: — Aquela vaca merecia umas boas
bofetadas pelo que ela disse.
— O que ela disse? — Mica arqueia a sobrancelha.
— Que Michael merece alguém a altura, não uma bailarina
desequilibrada que tem ataque de histeria toda a vez que
esquece de tomar uma pílula.
O queixo da minha irmã caí.
— Ela que aguarde esse bebê nascer que vou mostrar a
ela alguém a altura. — Realmente as duas tem quase o mesmo
tamanho, minha irmã rosna aflita me fazendo sorrir.
— Eu estou bem. — A tranquilizo com um sorriso.
Mica senta ao meu ao lado e ficamos sozinhas na sala.
Conto a ela a respeito do Dylan e em como ele me humilhou, mas
não falo o real motivo para não deixá-la mais agitada, e sobre ter
encontrado com Emma hoje, e como Michael foi receptivo
quando me viu. No momento me vem à mente que talvez até ele
tenha mandado Dylan me dizer aquelas coisas horríveis. Mas não
quero acreditar nisso.
Aproveito e lhe entrego a sacola cheia de mimos, que ela
quase chora os cheirando.
— Fez bem em seguir em frente. — Ela aperta minha mão
com gentileza. — E o seu peguete? Está ficando sério? — Mica
pergunta dobrando um pijaminha e o guardando de volta.
Sorrio igual a uma boba e assinto.
— Humm. Está apaixonada?
Antes que eu pudesse respondê-la a campainha toca.
— É Blake, ele veio me buscar. — Ela avisa e se coloca de
pé com um pouco de dificuldade me fazendo rir, minha irmã se
ajeita e abre a porta.
— Às vezes parece que eu ainda moro... — Ela se cala
abruptamente, quando enxerga Dante em pé na porta, com uma
expressão de preocupação.
Cacete!
— O que você quer aqui? — Micaela uiva.
Dante engole em seco esperando alguma reação minha,
por um momento pensei em fingir demência ou até um desmaio,
no entanto, passo por Micaela e encontro Dante na porta, não
consigo conter um sorriso em vê-lo.
Estendo uma mão para ele e seu corpo relaxa
momentaneamente. Me subestimei, pensei que não fosse sentir
tanta falta dele, durante esse tempo, mas agora vendo-o na
minha frente com todo o seu charme e apreço, fico imensamente
feliz.
— Que merda é essa? — Minha irmã rosna as minhas
costas.
— Ele é o meu peguete. — Dante me lança um olhar
divertido.
— Esse homem, Lindara...
— Eu sei de tudo. — Digo calmamente a interrompendo-a.
— Meu Deus! Por isso você não me contou. — Ela diz
irritada. — Dante é um...
— Pare, Micaela! — Grito tentando abafar o que ela ia
dizer. — Eu não ligo para o que aconteceu no passado dele.
— Que tipo de lavagem você fez na cabeça dela? — Mica
pergunta emanando fúria.
— Não responda. — Digo ao Dante quando ele abre a
boca.
— Prometemos respeitar as decisões uma da outra mesmo
que a odiamos.
Ela ri alto, com ódio emanando dos seus poros.
— Uau! Manipulando a própria irmã. — Mica bate palmas
me fazendo corar.
— Você mentiu para mim, dizendo que havia ficado com
ele. — Aponto para Dante que dá um passo atrás. — Fica aí. —
Sibilo para ele e me volto para minha irmã, com o coração a mil.
— Pensa, se você tivesse me contato a verdade, poderia tê-lo
evitado, pois, eu saberia o que eu fiz e não me aproximaria dele.
— Explico calmamente e recebo um olhar de decepção do Dante,
que se vira em direção à porta. — Fica aí! — Exclamo e seguro o
seu braço. — Você mentiu para mim, Micaela. Dante foi o único
que me disse a verdade, o único que não me julgou, ele me
ajudou, quando você virou as costas para mim e ficou do lado do
Michael!
— Lindara… — Ela está chorando.
— Escolha o seu lado e escolha agora. — Aviso.
Minha irmã ampara a face com as mãos e me seguro muito
para não ir abraçá-la, ela senta no sofá e limpa seus olhos com
delicadeza e mexe a cabeça em negação.
— Ok. — Ela fala simplesmente e dá de ombros se
escorando para trás. — Eu estou grávida demais para isso. —
Mica alisa sua barriga perfeitamente redonda.
Relaxo e sinto o ar voltar para os pulmões.
Me sento na pontinha do sofá e puxo a sua mão, ela hesita,
mas não recua.
— Me desculpe. Eu não sabia como falar e quanto mais
tempo passava mais envolvida eu estava. — Mica me ignora e
encara Dante logo atrás.
— O gato comeu a sua língua, Dante? — Ela questiona
duramente.
Ele apenas lhe dá um sorriso encantador, que com certeza
deixou Micaela se roendo por dentro. Se Dante queria fazer uma
surpresa, ele claramente conseguiu e quase fez minha irmã parir
no meio da sala.
Estendo uma mão para ele, chamando-o. Dante solta uma
maleta preta na estante, que eu nem havia percebido até então e
senta ao meu lado no sofá. Me escoro em seu peito e ele
gentilmente passa o braço em volta da minha cintura, me
abraçando.
— Meu Deus é muito estranho ver isso. — Micaela
comenta petrificada, de olhos arregalados. — Como aconteceu?
— Ela questiona e quando abro a boca, ela estala a língua e diz:
— Quero que ele conte.
Claro que quer, penso ironicamente.
— Boa sorte. — Sibilo para Dante e me coloco de pé. —
Vou fazer um chá. — Aviso e no momento que eu paro em frente
a pia, vejo Levi e Alice no meio do corredor, pasmos. Havia
esquecido completamente dos dois, aceno com um sinal positivo,
avisando que ainda estamos vivos.
Começo a preparar o chá tentando não prestar atenção no
que Dante dizia a ela e em um certo momento jurei ter visto um
sorriso no rosto da Micaela. Não posso dizer que estou aliviada, o
que eu sinto vai bem mais, além disso, são tantos sentimentos
envolvidos, ruins e bons que eu não consigo decifrar.
Entrego o chá aos dois e antes que eu pudesse sentar, a
campainha toca abro a porta rapidamente já imaginado quem
seja.
— Oi, Lin.
— Boa noite, irmão.
Blake me abraça e o sinto ficar tenso em meus braços.
E lá vamos nós de novo.
Dante se põe de pé quando Blake me solta e ando até o
lado dele.
— Surpresaaa! — Cantarolo, vendo-os se entreolharem.
O queixo do Blake desce e sobe, ele engole em seco,
franze os olhos em incompreensão.
— Vamos, eu conto tudo no caminho. — Mica surge ao
meu lado e fala para Blake, que não desvia o olhar do Dante,
parece que ambos estão em uma disputa silenciosa de quem fica
mais tempo sem piscar os olhos.
Me despeço em seguida e fico mais tranquila quando eles
vão embora.
— Se você queria me surpreender conseguiu. — Comento
ao ver Dante se senta novamente e subo em seu coloco de frente
para ele.
— Não imaginei que ela estaria aqui. — Ele fala e noto que
seus pensamentos estão longe.
— Não sentiu a minha falta? — Pergunto segurando seu
rosto.
— Eu nem fui em casa, Lindara. — Ele desliza sua mão
para minha cintura. — Você está linda. — Seus lábios se curvam
em um belo sorriso, então o beijo pegando ele de surpresa.
— Eu estou pronta para o Home Run. — Sussurro contra
seus lábios macios.
— Não sabia que estávamos jogando, senão teria me
empenhado mais. — Ele diz puxando o meu corpo para mais
perto e me beijando fortemente. — Eu tenho novidades para
você. — Dante me coloca sentada no sofá com facilidade e meu
lábio se curva em beiço, ele ri e fica de pé, apanhando a maleta
da estante e a largando em cima da mesa. Paro ao seu lado,
curiosa e no momento em que Dante abre ela o encaro com os
olhos arregalados.
— É todo seu. — Menciona com um sorriso exorbitante.
— Como? — Pergunto encarando a mala carregada de
dinheiro.
— Joias Francesas e originais, valem muito na França.
— Você foi para a França? — Indago boquiaberta.
Dante sorri e dá de ombros como se fosse algo normal, que
se faz toda a sexta-feira à noite.
— Sim, Paris, fica a algumas horas de viagem.
— Você é maluco! — Exclamo o abraçando pela cintura.
— Maluco por você. — Ele beija o topo da minha cabeça.
— Você precisa do dinheiro, eu só fiz o que tinha que ser feito.
Dentro da mala há um inventário, caso queira conferir. — Dou um
tapa em seu braço.
— Eu confio em você. — Deslizo minhas mãos para dentro
do seu paletó, acariciando seu tórax forte. — Quer dormir aqui?
— Questiono descendo minhas mãos, Dante sorri, porém,
impede meus movimentos.
— Estou cansado, preciso colocar o sono em dia. — Ele
segura o meu rosto e me obriga a encará-lo. — Quando fizermos
o Home Run. — Diz com um sorriso torto. — Quero que seja
especial.
— Agora parece que estou tentado arrancar sua pureza.
Ele ri alto.
— Não se preocupe com isso. E saiba que nunca mais vou
assistir Baseball do mesmo jeito.
— Desculpe deixar o jogo mais interessante para você. —
Debocho e seguro suas mãos. — Fica mais um pouquinho.
Ele concorda.
Sentamos no sofá e conversamos sobre como foi a sua
viagem para Itália, Levi e Alice se juntaram a nós e ficamos
admirados pelas histórias que ele contava dos outros países que
ele já conheceu. Senti-me plenamente ignorante diante de tantas
informações.
Minutos depois que Dante vai embora o interfone toca,
corro para atendê-lo, imaginando que ele possa ter esquecido de
algo.
— Oi! — Digo animada.
— É Dean.
Meu sorriso se esvai.
— Pois não, Dean?
— O cara do Tesla passou aqui. — Meu coração acelera
loucamente.
— Ele está aí ainda?
— Não, Lindara. Ele nem chegou a descer do automóvel,
quando o cara da BMW apareceu no saguão ele deu partida.
— Obrigada por avisar. — Desligo sentindo as pernas
bambas.
Respiro fundo, tentando organizar os pensamentos que
parecem que deram um nó em minha mente. Recordo do
desprezo do Michael por mim mais cedo e isso é o suficiente para
não me deixar abalar com sua visita inesperada.
Ando até o meu quarto sentindo meu coração normalizar e
guardo a maleta dentro do meu guarda-roupa. Deito-me na cama
e me obrigo a refletir sobre qualquer coisa que não seja Michael.
Então começo a pensar no dinheiro, nunca tive acesso a tanto e
nesse momento parece que eu estou guardando uma bomba
dentro do armário, não uma pilha de papel que facilmente
compraria uma bomba, sorrio extasiada.
Minha mãe foi muito engenhosa fazendo isso, pena que ela
não está mais aqui.
Acordo e tomo um banho rápido, quero aproveitar o dia e o
dinheiro, quem sabe fazer umas compras para o apartamento?
Coloco um vestido curto, amarelo-queimado, ombro a
ombro, deixando à mostra minha saliente clavícula. E calço uma
sandália preta, com salto plataforma.
— Uau! Vai onde vestida assim? — Levi pergunta, me
dando uma palmada na bunda, quando passo por ele.
Penso em mencionar que Michael esteve aqui, mas prefiro
simplesmente esquecer.
— Primeiro eu vou fazer uma surpresa ao Dante, depois ir
às compras, baby.
— Uhum. Dante. Dante. Dante! — Ele debocha.
— Não seja malvado.
Tomo café rapidamente e me direciono ao quarto ansiosa
para começar o dia, coloco uma quantidade de grana razoável
dentro da bolsa e me despeço do Levi em seguida. É sábado, o
dia está ensolarado e incrivelmente belo. Estou feliz.
Pego um táxi em frente ao edifício, pensando que agora
tenho condições de comprar um carro nem que seja velhinho só
preciso tirar a porcaria da carteira de motorista, com os meus
dois pés esquerdos.
Vou o caminho todo admirando a rua e cantarolando
baixinho a música que toca no táxi, I Like Me Better de Lauv.
Ao chegar à casa do Dante, levo alguns minutos até chegar à
porta principal. Antes que eu tocasse a companhia à porta se
abre e Dante me dá um sorriso gostoso.
— Uau! — Digo pasma, parece que ele estava me
aguardando.
— Snow estava choramingando na porta. — Ele explica. —
Ela gosta mesmo de você.
Adentro a casa e ganho um breve beijo dele, em seguida
aliso a pelagem da cachorra.
— Espero não estar atrapalhando. — Menciono adentrando
a casa e ouvindo apenas o som da TV ligada.
— Você nunca atrapalha.
O sigo para a cozinha e um cheirinho maravilhoso de
comida me atinge, mas não vejo Mari em lugar algum.
— Está cozinhando? — Pergunto soltando minha bolsa em
cima da banqueta.
— Aham, Mari está de férias. — Dante explica ocupando
um lugar atrás da ilha.
— Então estamos a sós? — Mordo o lábio o abraçando por
trás, enquanto ele pica os pimentões.
— Estamos. — Ele diz mordendo um pedacinho e me
olhando de esguelha.
Abro alguns botões da sua camisa e deslizo minhas mãos
para o seu tórax, Dante estremece e se volta para mim, com um
olhar de reprovação.
— O que foi? — Pergunto indiferente, abrindo seu cinto
ainda olhando em seus olhos. Ele morde a ponta do lábio com
um sorriso segurando um pimentão em uma mão e uma faca na
outra.
— Lindara...
— Pode falar. — Digo, depositando um beijo bem no início
do seu peito nu, deslizando as mãos para sua cintura, terminando
de abrir sua calça.
Quando eu desço o seu zíper o som que faz, provoca um
grande sorriso em Dante.
— Está mais feliz agora? — Pergunto correndo minhas
mãos pelo seu corpo.
— Você é terrível. — Ele me beija quente e molhado, do
jeito que eu gosto.
— Sou? — Questiono fingindo desentendimento.
No instante que Dante vai me responder, liberto seu
membro da calça e o seguro com delicadeza, ele é quente e
pesado, perfeito em minha mão. Dante volta a me beijar,
enquanto faço movimentos leves, soltando gemido em minha
boca. Desço vagarosamente beijando o seu peito e o seu tórax,
até ficar de joelhos em sua frente e encarar toda a sua grandeza.
Mordo o lábio com força e Dante dá um sorriso nada sutil.
— Acho melhor você largar essa faca. — Aviso, vendo os
nós dos seus dedos brancos em volta do cabo.
Ele morde o lábio para disfarçar um sorriso torto e antes
mesmo dele soltá-la na pia eu coloco seu pau em minha boca
lentamente.
Dante estremece por inteiro e pragueja baixinho, olho para
ele, que está com os lábios entreabertos e os olhos fechados,
parece que está até tentando controlar os batimentos cardíacos,
já que seu pau está pulsando em minha boca.
Ele se inclina para frente, com meus movimentos suaves e
fluídos, uma mão para no contorno da minha face e a outra eu
acredito que está no armário atrás das minhas costas. Seus
quadris vão de encontro a minha boca, mostrando o quanto ele
está se deleitando.
Deslizo a língua em torno da cabeça e continuo a mover
minha mão para recuperar o fôlego. Dante tira alguns fios de
cabelo do meu rosto e morde o lábio inferior jogando a cabeça
para trás quando volto a chupá-lo, mais rápido e mais forte. E
entre um gemido abafado ele sibila:
— Lindara... devagar. — Mas agora é tarde, estou dando o
máximo de mim, Dante não resiste, ele está mais rígido e sólido
como nunca, o vejo segurar firme na ilha atrás de si, no momento
que ele goza em minha boca, com um gemido abafado.
Coloco-me de pé com a ajuda dele e passo a língua pelos
lábios, provocando-o.
Ele mexe a cabeça em negação e sorrindo, coloca uma
mecha do meu cabelo para trás da orelha, sua mão desce
alisando o meu pescoço, a clavícula, até seus dedos pararem na
extremidade do meu decote e puxá-lo para baixo, descobrindo
meus seios. Ele umedece os lábios sem tirar os olhos deles, esse
simples gesto, fez minha intimidade se agitar.
Estendo minha mão para tocá-lo, porém, Dante é mais
rápido, ele me pega pela cintura e me coloca sentada em cima da
ilha. Seus lábios encontram os meus brevemente e descem
beijando meus seios, Dante abocanha meu mamilo e espalma o
outro com uma força gostosa. Gemo baixou de satisfação.
Dante volta a me beijar e suas mãos correm para baixo do
meu vestido tirando a minha calcinha e a guardando no bolso da
calça. Não pude deixar de sorrir. Ele puxa meu vestido para cima,
me deixando nua sobre a ilha. Seu olhar cai sobre toda a
extensão do meu corpo, mas para entre minhas pernas quando
eu as abro sutilmente, em um convite silencioso.
Ele me lança olhar malicioso e segura minha perna, a
elevando até a altura dos seus lábios. Fico sobre os cotovelos, e
Dante desce beijando e mordendo o interior da minha coxa,
fazendo-me arquejar.
E no segundo que ele chega a minha virilha, o desejo que
está se acumulando entre as minhas pernas é surreal. A língua
de Dante roça no ponto mais alto do meu sexo, me fazendo
estremecer. Ele alisa, esfrega e chupa toda a minha extensão,
me segurando firme pelas coxas. Jogo a cabeça para trás e me
entrego a ele com as mãos em punhos na borda da ilha e com as
pernas sobre seus ombros. As ondas de prazer começam a
tomar conta de mim, gemo o nome de Dante que não facilita, e
segura com força, me deixado sem fôlego e Dante não para até
eu me desfazer em sua boca.
Sento-me na extremidade da ilha com o corpo inteiro
eletrizado e uma puta tremedeira nas pernas, ele se aproxima e
me beija, me segurando pela cintura.
— Eu amo essa ilha. — Comento com a respiração
entrecortada, descendo dela e deslizando pelo corpo dele.
Levanto uma perna e seu pau desliza para o meio das minhas,
quente e macio como veludo e meu sexo pulsa novamente de
desejo.
— Aqui ou no quarto? — Ele questiona baixinho.
— Aqui. — Digo e com um movimento rápido ele me puxa
pelas pernas que se agarram ao seu quadril e me coloca sentada
na ponta da ilha, suas mãos seguram minha cintura com força e
quando eu sinto o seu pau roçando na minha entrada, o empurro
suavemente, o impedindo, ao lembrar que eu não tomo
anticoncepcional.
— Eu não tomo pílula. — Aviso, Dante paralisa. — Tem
camisinha? — Pergunto e sorrio nervosa.
Ele nega lamentosamente e escora a cabeça entre os
meus seios.
— Eu ia comprar mais tarde. — Ele sussurra.
— Oh, eu sinto muito, mas não quero um bebê.
Dante me desce da ilha e me beija, ainda de pau duro.
— Urrr! — Ele rosna baixinho em meu ouvido, arrancando
uma risada de mim. — Tem certeza que não quer um bebê?
Teríamos filhos lindos. — Dante diz apertando a minha bunda e
subindo as mãos para os meus seios.
— Absoluta!
Seu lábio se curva em um beiço lindo.
— Venha, vamos almoçar. — Ele se distancia arrumando
sua cueca de volta ao lugar. Pego o meu vestido do chão e o
visto rapidamente.
— Dante, minha calcinha. — Estendo uma mão para ele,
que lava as suas na pia.
— Vou ficar de recordação.
Gargalho.
— Sério? Vai me deixar sem calcinha? — Pergunto
incrédula.
— Aham. — Ele dá um sorriso malicioso.

Sento à mesa depois de me levar e o espero servir nossos


pratos. É engraçado a forma como me sinto confortável aqui,
Dante é surpreendentemente diferente do que ele aparenta ser.
Ele coloca um prato em minha frente com um bife
malpassado, aspargos, espinafre, ervilhas e purê de abobora.
Torço o nariz involuntariamente.
— Espero que goste de salada.
— Aham. — Emito tirando um sorriso dele.
Ele senta ao meu lado em seguida e me entrega uma taça
de vinho.
— Estive pensando, se ainda estiver a fim de me levar na
convenção. Eu aceito ser a sua acompanhante. — Ele inclina a
cabeça para o lado, pensativo, e enruga o nariz.
— Agora eu já convidei Helena. — Dante fala me deixando
boquiaberta, mordo o lábio e lhe dou um chute por baixo da
mesa. — Ai! — Ele rosna. — Estou brincado. Eu sabia que você
mudaria de ideia, Lindara.
— Como você sabe se nem eu sabia? — Arqueio a
sobrancelha. Dante gargalha.
— Intuição, mio amore. — Ele diz me fazendo revirar os
olhos.
— Agora devolva a minha calcinha. — Peço e seu sorriso
aumenta mais.
— Já disse que vou ficar para mim.
Suspiro, ele ri e não me devolve.
Terminamos de comer e ficamos conversando sentados à
mesa até o vinho acabar, contei a ele que semana que vem já
posso voltar a trabalhar, acredito que ele tenha ficado mais
contente que eu. Só não tive coragem de contar que vi Michael,
não quero pensar nele, ou falar nele.
De repente Dante se levanta.
— Tenho algo para você. — Ele diz e começa a caminhar
para o corredor, mas para quando nota que ainda estou sentada.
— Você vem?
Chegamos ao segundo piso e ao invés de irmos para a
suíte principal, Dante abre a porta metálica digitando o código
sem fazer questão de esconder de mim e uma luz branca se
acende, cerro os olhos em desconfiança. Ele me encara entre a
porta e o corredor.
— Venha matar a sua curiosidade, Lindara. — Ele fala me
fazendo lançar um olhar ferino. Ao longo dessas semanas, estive
aqui algumas vezes, mas nunca soube o que tem atrás dessa
porta e Dante nunca fez questão de me trazer aqui até hoje.
Entro na sala e não é mais nada além de um escritório,
muito estiloso, com um espelho dourado ornamentado atrás de
uma extensa mesa escura e o que eu pensava que era uma
cama, é um grande sofá marrom.
— É um escritório? — Pergunto ainda incrédula.
— O que você pensou que fosse? — Ele questiona com um
riso insolente.
— Luz vermelha, porta metálica. — Ergo os braços para
cima. — Não sei, um quarto do pânico. — Respondo, mas não
era bem essa palavra que eu ia dizer.
Dante ri descaradamente.
— Aqui eu guardo tudo que há mais de precioso. Itens
únicos. Raros. — Ele acrescenta.
Dante se aproxima da mesa e abre uma caixa média de
veludo marrom, na tampa da caixa, pelo lado de dentro está
assinado: Alberta Ferretti, uma famosa estilista de Milão, se me
perguntarem como eu sei disso, eu não tenho ideia.
Ele tira de dentro um vestido rosé gold, com fenda na perna
esquerda e uma longa calda bufante que com certeza se
arrastará pelo chão.
— É lindo! — Comento embasbacada. Reparo que o
vestido tem um longo decote em formato de V e as suas finas
alças brilham como se fossem diamantes.
— Assim como você.
Coro.
Dante me deixa em casa em seguida, a convenção dos
advogados começa em algumas horas e preciso que Levi me
ajude com a maquiagem e o cabelo.
Saio do banho com meu coração acelerado e sinto
borboletas no estômago. Com certeza Michael estará nesse
evento e tenho até medo do que possa acontecer se Morgan e eu
nos encontrarmos. Minha vontade é de fazê-la engolir todas as
mentiras que inventou, ou torná-las verdadeiras.
— Você está tensa! — Levi diz atrás de mim, ondulando as
pontas dos meus cabelos.
— Ah! Levi, estou com medo de como esta noite pode
terminar e também, estou com um sentimento estranho.
Ele aperta meu ombro.
— Esse evento deixará tudo em pratos limpos. Precisa se
acalmar e principalmente tomar o seu remédio. — Ele diz e por
fim desliza a tiara de testa, que veio acompanhado do fabuloso
vestido.
Encaro-me no espelho e pareço uma princesa, a tiara é um
cordão de brilhantes que fica em cima dos meus cabelos, e no
centro da minha testa a uma pequena pedra branca no formato
de uma gota.
— Você está uma deusa!
Sorrio em agradecimento.
Levi me ajuda a colocar o vestido, que desliza
perfeitamente em meu corpo, ajeito meus peitos com cuidado,
parece que a qualquer momento as alças vão arrebentar com o
peso deles. O decote é maior e mais largo do que eu imaginava.
Não deixando muito para imaginação, ainda mais que a fenda se
inicia em meu quadril.
Para finalizar Levi pega a sombra dourada que colocou em
meus olhos e dá uma pincela entre meus seios, me fazendo
brilhar.
— Divirta-se! — Ele diz assim que o interfone toca e a voz
do Dante cantarola meu nome do outro lado.
Ajeito o sapato no pé e pego minha inútil bolsa de mão, que
contém apenas o meu celular e um batom.
— Me liga se precisar sair correndo de lá.
Assinto, nada confiante.
Desço e Dante está escorado na sua luxuosa Lamborghini.
Ele está vestindo um smoking preto que se ajusta perfeitamente
nos seus braços musculosos.
— Uau! — Ele assobia e giro nos saltos para ele analisar
minha graciosidade.
Em seguida me toma nos braços e me dá um longo beijo,
me fazendo estremecer.
— O que eu devo esperar desse evento? — Questiono ao
me ajeitar no banco do carro.
— Uma pequena celebração, onde eles vão cuspir as
mesmas baboseiras de todos os anos, nada que a deixará
entediada prometo. E depois bebida, comida e música.
— É, parece bem divertido. — Digo e soa um pouco
irônico.
Ligo o seu rádio tentando entrar no clima de festa e está
tocando, Play With Fire do Sam Tinnesz com o Yacht Money.
— Espero que esse seja o tipo de músicas que
escutaremos lá. — Comento com um sorriso atrevido.
— Me dê um crédito, nem todos os advogados são
tediosos. — Dante fala e desliza a mão para minha coxa exposta.
O Caminho para a convenção foi bem rápido, afinal fica no
centro de Manhattan.
Descemos na calçada, onde há várias pessoas e todas
muito elegantes, pela primeira vez não me senti um patinho feio
ao lado dele.
Dante coloca a mão na minha cintura e me puxa para perto
de si e desse jeito seguimos o fluxo para dentro do salão.
Paramos para um fotógrafo e tiramos uma rápida foto.
O salão é imenso, há cortinas brancas e pratas em volta de
todo o perímetro. As luzes que vem de cima e do chão são
amareladas, dando uma vibe menos formal. E bem no fundo do
salão há um palco, com um amplo telão logo atrás.
Sentamos em uma mesa redonda com outras pessoas, que
aparentemente, Dante conhece pela forma que se
cumprimentaram. Uma mulher puxa assunto com ele e seu
companheiro parecer estar tão perdido quanto eu.
Um ruído rompe nos altos falantes, chamando a atenção de
todos. As pessoas que estavam em pé se colocam nos seus
devidos lugares e um homem de smoking branco dá as boas-
vindas a todos. Ele faz um pequeno discurso do qual eu não
entendi bulhufas, mas que tirou risos de várias pessoas. As
apresentações e agradecimento seguiram por longos, eternos e
inacabáveis vinte minutos.
Então uma mulher sobe ao palco, ela usa um vestido preto
brilhante.
— Boa noite, consagrados advogados. — Ela fala com um
largo sorriso. — Sem mais delongas, quero aclamar o advogado
mais bem pago e que venceu mais processos no condado de
Manhattan, no ano de 2019.
— Você não me disse que iam premiar alguém. —
Comento admirada.
— Não achei que fosse importante. Está preocupada? —
Ele questiona com um sorriso e antes que eu pudesse respondê-
lo, a mulher que ele estava conversando a nossa frente diz com
um sorriso gentil.
— Dante já venceu dois anos seguidos, está na hora de
deixar um pouco para os outros.
Fico aliviada, se ele perder pelo menos não será um
grande fracasso.
— Parabéns, Michael O’Connor. — A mulher anuncia de
repente, tirando toda a minha atenção do Dante. A face do
Michael surge na telona, ele está sorrindo e não parece nada
surpreso com a premiação. Michael se põe de pé, fechando o seu
smoking preto. Ele parece feliz.
As pessoas começam a bater palmas, inclusive Dante, que
age indiferente, como se fosse qualquer coisa pessoa subindo no
palco.
Michael se coloca ao lado da mulher, que lhe entrega uma
balança da justiça dourada.
— Estou ficando sem discursos. — Ele menciona, fazendo
as pessoas rirem. — Agradeço o reconhecimento e dedico esta
bela balança, a todos os advogados que estão aqui presentes. —
Damos outra salva de palmas enquanto Michael desce do palco,
a câmera o segue até o seu lugar. Em pé lhe esperando está
Morgan, ela lhe dá um breve beijo nos lábios e o abraça em
seguida.
Dante me olha de soslaio, mas não ousa dizer nada. Sinto
meu coração zunir em meus ouvidos e meu rosto aquecer
rapidamente, sorrio tentando não demonstrar o quanto aquela
cena mexeu comigo.
Dante pega em minha mão por baixo da mesa e aperta
como se estivesse tentando meu acalmar.
— Como se faz para beber nesse lugar? — Questiono
assim que a claridade diminui e uma música começa a tocar no
fundo.
— Vamos começar pela comida. — Ele diz com um olhar
de reprovação me fazendo rir.
Dante levanta e estende a mão para me ajudar, paro ao
seu lado e ajeito os meus peitos sutilmente provocando risos
nele. Ele desliza sua mão para minhas costas nuas e me guia
para o bufê de salgados e coquetéis do outro lado do salão.
— Você está bem? — Ele pergunta ao me ver comer um
canapé.
— Sim. — Sorrio.
Ele se aproxima e me beija fortemente.
— Nossa, Dante. Deixe a moça respirar. — Um cara de
cabelos pretos e olhos escuros comenta às nossas costas.
— Lindara, esse é Jeferson, ele só trabalha com as
divorciadas. — Dante diz com um sorriso zombeteiro e o homem
faz cara feia.
— Ficou sabendo da Sabrina? — Jeferson questiona.
Dante nega, impassível.
— Deu à luz hoje à tarde, não pode comparecer ao evento.
— É uma pena. — Dante assente, com um sorriso, nada
pesaroso. — Venha, vamos dançar, Lindara. — Ele me puxa pela
mão, assim que a música Mr. Saxobeat de Alexandra Stan
começa a tocar.
— Aqui? Agora? Você dança? — Pergunto pasma.
— Sim, sim e sim, Lindara. — Ele diz me fazendo rir.
Dante pega em minha mão e me leva para uma pista não
muito grande atrás das cortinas e para minha surpresa já havia
pessoas dançando do outro lado. Nos juntamos a elas e não
demorou muito para ganharmos espaço. Dante dança
maravilhosamente bem, fico até acanhada ao lado dele, ele mexe
os pés e os braços em uma sincronia perfeita, que até quem
estava dançando parou para olhá-lo.
Ele foi diminuindo os movimentos e para na minha frente,
suas mãos descem para o meu quadril e ele me gira rápido,
ficando às minhas costas, colando nossos corpos.
Sorri e seguro em seu pescoço, rebolando a bunda
sutilmente contra o seu colo. Quando a música chega ao fim
meus dedos dos pés já estão latejando.
— Você não me disse que dançava tão bem. — Comento,
enquanto pegamos algo para beber.
— Não gosto de me gabar. — Ele diz com um sorriso
insolente.
— O que mais você esconde de mim?
— Te conto mais tarde. — Ele fala com um sorriso sexy,
enquanto eu ajeito sua gravata borboleta. Dante pega as minhas
mãos no momento que termino e as beija e quando me indireto
ao se lado, encontro Michael, a poucos metros de nós e sua
expressão é rigorosa, fazendo meu coração contrair.
Morgan surge ao seu lado como uma assombração, ela
usa um vestido vermelho-escuro e sem alças, com uma cinta
preta na cintura.
De repente percebo que estamos nos quatro nos
encarando, sinto minhas pernas fraquejarem e acredito que
Dante tenha percebido isso, pois, me segura firme contra o seu
corpo.
— Dante! Estava procurando por você. — Uma senhora de
cabelos curtos e com grandes brincos surge na minha linha de
visão. — Podemos conversar um minuto? — Ela pede com
gentileza a ele.
Dante olha para mim, apertando os lábios, garanto que se
ele pudesse correria dela, mas por algum motivo ele assente.
— Eu vou ao banheiro. — Informo.
— Ok. — Dante dá um beijo no topo da cabeça.
O banheiro fica do outro lado da pista de dança, caminho o
mais rápido que consigo com esses salto-agulha e tento não
erguer o olhar para não chamar atenção indesejada, mas sei que
há um par de olhos me seguindo nesse instante, nada contente.
Entro no banheiro e me escoro contra parede ao lado da
porta com o coração na mão, não demora muito até ela se abrir
novamente. Sabia que Morgan estaria esperando por esse
momento a noite toda. Ela entra no banheiro, mas não me vê
escorada na parede atrás de si.
Eu havia premeditado essa situação, então nem precisei
pensar no que fazer, apenas agi. Segurei na nuca dela e a
empurrei contra a parede a nossa frente.
— Sentiu a minha falta? — Pergunto próxima a sua orelha,
ela tenta se virar, mas jogo o peso do meu corpo para cima do
dela e estalo a língua. — Você não se cansa, não é?
— Você está me machucando! — Ela rosna irritada.
— Você já o tem, por que não me deixa em paz? —
Vocifero.
— Você me humilhou naquele restaurante. — Morgan
choraminga.
— Não se faça de coitada para mim. — Digo entredentes e
pressiono mais sua cabeça na parede.
— Michael saberá disso. — Ela rosna e meus lábios se
curvam em um sorriso.
— Então diga que eu mandei um oi, e que eu sinto falta de
tê-lo entre minhas pernas. — Ronrono contra sua orelha,
provocando-a. Morgan jamais falará isso ao Michael. Ela dá um
pulo para trás, furiosa.
— Eu vou matar você! — Ela grita me provocando risos e
me fazendo lembrar quando eu ataquei Dulce na boate... bem,
aquilo não foi legal.
Em seguida a porta se abre e a mulher que estava sentada
comigo a mesa me encara apavorada. Solto Morgan no mesmo
instante e me retiro do banheiro sem olhar para trás, até dar de
cara com Dante.
— Você demorou. — Ele comenta.
— Me tire daqui. — Imploro, com medo do que pode vir
acontecer.
— O que aconteceu, Lindara?
— Eu te conto lá fora. — Ele assente e não questiona.
Meu corpo treme descontroladamente de nervosismo,
ansiedade e medo. Minha vontade é de tirar os sapatos e sair
correndo deste lugar.
Dante anda na minha frente abrindo caminho para mim e
quanto mais perto estamos da saída, mais pessoas aparecem
cumprimentá-lo, estou começando a me sentir sufocada e
transtornada.
No instante que saímos, o ar livre da noite preenche meus
pulmões.
— Lindara, o que houve? — Ele pergunta preocupado.
Caminho ao longo da calçada me distanciando do evento,
meus batimentos cardíacos começam a diminuir e no segundo
que estou pronta para contar ao Dante o que aconteceu no
banheiro novamente Morgan e Michael aparecem na calçada,
logo atrás de nós.
A tremedeira volta instantaneamente, só que dessa vez
mais forte, sinto que estou à beira de um ataque.
Michael se próxima com a sua face vermelha de
indignação, Dante que está entre nós se volta para ele sem
entender o que está acontecendo.
— Você precisa parar, Lindara! — Michael berra, me
fazendo estremecer.
Minhas pernas amolecem, mas eu as afirmo no chão
incapaz de sair do lugar ou de dizer qualquer coisa, estou
paralisada e com os olhos arregalados.
— Não fale assim com ela! — Dante rosna com cólera para
Michael e segundos depois me fita com um olhar preocupado,
sem compreensão alguma do que está acontecendo.
Então Michael o ataca inesperadamente, feito um animal
irracional.
— Michael! — Grito apavorada o vendo acertar um soco no
rosto de Dante que cambaleia para trás, quase parando ao meu
lado, o barulho seco que ressoou me faz arrepiar.
Dante o empurra para trás com força e ainda assim,
Michael avança cego de ódio e tenta lhe dar outro soco, mas
Dante desvia da sua ira e eu inconscientemente me coloco na
frente.
Quando os nós dos dedos do Michael batem contra o osso
da minha bochecha o impacto é tão forte que não tenho tempo e
nem forças para me segurar no lugar. Tombo rapidamente para
trás e a última coisa que eu lembro, antes da escuridão me levar,
é ouvir o som do meu crânio batendo contra o meio fio.
Acordo vestida num avental branco, dentro de uma
máquina hospitalar, pelo menos é o que eu acho, é redondo e
muito fechado, me sinto sufocada e com muita dor em minha
face. Levo as mãos ao rosto e sentindo pontadas por toda a
minha cabeça, então me recordo o que aconteceu.
Michael me deu um soco tão violento quanto os de
Saymon, lembro nitidamente a dor lancinante que eu senti na
hora aquele homem repulsivo...
— Oh! — Emito com a clareza súbita que imunda a minha
mente. — Oh meus Deus! — Grito
— Lindara, você está dentro de uma máquina de
ressonância, precisa ficar quieta. — A voz de uma mulher ecoa
até mim.
— Eu preciso sair daqui. — Sussurro.
— Precisa se acalmar. — A voz soa suave.
— Não, eu preciso vê-lo. Me tira daqui! — Grito tentando
sair da máquina.
De repente ela começa a se movimentar e quando meu
corpo já está o suficientemente para fora eu sento e pulo da
cama, então uma porta se abre e vários médicos passam por ela.
— Você precisa se deitar. — Uma médica pede.
— De jeito nenhum, eu preciso vê-lo! Eu preciso ver
Michael! — Tento passar por eles, mas um dos médicos me pega
por trás e uma sequência infinita de flashbacks passa em minha
cabeça. Gritos, tiros, socos e a batida de carro...
— Não! Não! Por favor, não me levem! — Grito até sentir
minha garganta arranhar e clamo por Michael, entre lágrimas.
— Você está bem, ninguém a levará. — A médica diz
suavemente, enquanto me colocam no aparelho de novo.
— Você precisa se acalmar, levou uma pancada muito
forte, é normal ficar confusa.
— Não estou confusa! — Rosno, mas a médica não me dá
ouvidos, ela apenas assente para o homem atrás dela, ele sem
demora, para ao meu lado com um sorriso gentil.
— Vamos sedá-la, você acordará em um instante. — O
homem diz gentilmente.
— Não! Eu não dou a minha permissão para fazer isso. Eu
quero sair daqui agora.
— Vou trazer Michael, se você prometer se acalmar. — A
médica propõe, respiro fundo com dificuldade e assinto. —
Alguém encontre esse homem. — Ela manda, então sinto algo
fino e pontudo deslizar para dentro da minha pele.
Encaro a mulher indignada, ela mentiu... ele não virá...
Michael não vira...
Então a escuridão me leva.
Sabia! Eu sabia que ia dar merda!
Quantos acidentes Lindara ainda vai sofrer até esse bebê
nascer, Senhor? Questiono-me, ao entrar no pronto socorro, com
Blake ao meu lado tentando me fazer caminhar mais devagar.
Chego à recepção do mesmo hospital em que Lindara ficou
internada quando estava em coma e uma terrível sensação
familiar me preenche.
— Boa noite! Minha irmã chegou há algumas horas.
Lindara Fincher. — Falo nervosa para a moça da recepção, ela
assente atenciosa e começa a fazer uma busca no seu
computador.
— Ela está sendo atendida nesse momento.
— O que ela tem?
— Isso só os médicos podem lhe informar, senhora. A
médica virá conversar com os familiares daqui há pouco.
Enquanto isso pode aguardar na sala de espera. — Ela
gentilmente sinaliza uma sala ao lado.
— Você precisa se acalmar, o médico avisou que tem
pressão alta e isso não faz bem para nenhum de vocês dois. —
Blake me lembra, alisando minha barriga.
— Como posso me acalmar? — Indago ao entrar na sala
de espera e me deparar com ela cheia.
Dante está em um canto da sala, com Levi e a Alice ao seu
lado e Michael, Dylan e Morgan do outro lado. Todos com a
expressão de um funeral.
— Me expliquem por que a minha irmã está sendo atendida
invés de um de vocês? — Peço simplesmente cruzando os dedos
em frente à barriga.
Ambos me encaram tensos e com expressão de culpa, me
deixando ainda mais irritada.
— Engraçado, os dois são sempre tão cheios de si,
arrogantes e se acham o centro do mundo, e quando acontece
algo que não conseguem resolver, enfiam os rabinhos entre as
pernas e se calam. — Silvo.
— Eu dei um soco no rosto dela. — Michael explica,
fazendo meu coração quase sair pela boca.
Ele leva uma mão ao rosto, desesperado. Noto que os nós
dos seus dedos estão machucados, me fazendo pensar em qual
estado ele deixou Lindara.
— Eu não queria machucá-la, Micaela. Eu juro, você
precisa acreditar em mim. — Ele diz com a voz carregada de dor.
— A culpa não foi sua. — Morgan o consola, alisando suas
costas.
— O que essa mulher está fazendo aqui? — Pergunto me
voltando para o embuste da Morgan, ela abre a boca para se
explicar e Dylan se intromete.
— Os quatros estavam no mesmo evento.
Rio. É claro que eles estavam!
— Isso não responde a minha pergunta, Dylan, mas me faz
questionar o que você também está fazendo aqui? — Arqueio a
sobrancelha fingindo desentendimento e Michael me lança um
olhar de confusão, afinal eu e Dylan sempre nos damos muito
bem.
— Você não sabia, Michael, que Dylan fez uma visitinha
especial a Linda e a chamou de mimada, ingrata e disse que ela
está cada vez mais perdida. Corrija-me se eu estiver errada. —
Digo olhando para Dylan e acrescento: — Não se chuta uma
pessoa que já está no chão.
Sua face se torna carmesim, mas ele não se atreve a dizer
nada.
— Eu não sabia. — Michael fala estarrecido, com os olhos
vermelho e as veias do pescoço saltadas.
— Você também não deve saber que Morgan é uma vadia
cínica e manipuladora. — Cuspo as palavras para cima da
mulher, que me encara petrificada.
— Micaela, não faça isso. — Michael pede e noto que
Morgan relaxa momentaneamente.
— Levi, vem cá. — Chamo e encaro Dante do outro lado da
sala, ele está em silêncio e parece com a cabeça em outro lugar.
— Querida, por que está fazendo isso? — Blake sussurra
atrás de mim.
— Porque Michael só conhece um lado da história, o lado
falso.
Levi para ao meu lado, mais branco que o normal e peço a
ele que explique o que aconteceu no banheiro.
Ele começa nervoso, ainda mais com Morgan o encarando
com os olhos raivosos, e na hora que ele deixa bem claro que
minha irmã está limpa há meses e que não havia batido nela,
Michael lança um olhar furioso na direção dela.
— É verdade? — Ele pergunta, secamente.
Morgan abre os lábios, incrédula e não nega, apenas diz
acidamente.
— Não vou ficar aqui ouvindo isso.
Morgan tenta se distanciar, mas Michael a pega pelo braço
bruscamente.
— Responda. — Ele ordena entredentes.
— Você não vai acreditar em mim mesmo se eu disser que
for. — Ela choraminga e puxa o braço com força, se retirando da
sala.
Foge mesmo vadia! Me seguro para não gritar.
— Michael… — Dylan o chama e Michael o encara
friamente.
— Vá embora. — Ele sibila. — Você já fez o suficiente.
Sinto minha cabeça pulsar e ainda nem amanheceu, temo
o que resta para o fim do dia.
Paro em frente ao Dante, ele está com uma expressão fria
de irritação e seu queixo está levemente roxo como se tivesse
levado um soco. Aposto que ele deseja fazer o Michael
desaparecer daqui, só não entendo porque ele ainda não o fez.
— O que aconteceu lá?
Dante se desencosta da parede e enfia as mãos no bolso.
Ele conta minuciosamente o que houve, fazendo meu estômago
se contorcer com a história.
— Quando chegamos aqui, ela ainda estava inconsciente,
os paramédicos disseram que os médicos fariam uma
ressonância e depois de um tempo, outro médico desceu e
avisou que ela estava com um pequeno hematoma subdural e
por isso terá que ficar em observação.
— Quanto tempo já se passou?
— Quase quatro horas.
Exalo baixinho e Blake me abraça por trás.
— Precisa se acalmar. — Ele sussurra no meu ouvido,
apenas assinto e respiro fundo.
— A médica disse que não é nada complicado. — Dante
tenta me tranquilizar.
Sento ao lado do Levi e me escoro na poltrona verde
musgo, sem saber o que fazer além de esperar. Há um relógio no
alto, no fundo da sala e cada vez que eu o encaro, parece que o
ponteiro está no mesmo lugar.
Michael senta próximo a saída dos fundos e escora a
cabeça contra a parede, isolado. Gostaria de saber o que está se
passando naquele cérebro sadio, enquanto o da minha irmã está
todo ferrado. Se acontecer algo com ela, a culpa o matará, se eu
não matá-lo primeiro.
E Dante, seus olhos não desviam do Michael, eu não
entendo como ainda não se atacaram aqui dentro.
Uma hora se passou e quando estava quase caindo no
sono uma mulher entra na sala com a expressão indecifrável.
Todos nos colocamos de pé em volta dela, exceto Michael
que se mantém distante, porém, prestando atenção em tudo. A
médica veste um uniforme verde claro e uma touca onde alguns
fios pretos do seu cabelo liso despontam.
— São os familiares da Srta. Fincher? — Ela pergunta,
todos assentimos. — Lindara está bem, ela levou alguns pontos
na cabeça e o principal que é o inchaço no cérebro está
diminuído, ela terá que ficar em observação por mais alguns dias.
O aperto do meu peito se suaviza e Blake me abraça com
força.
— Podemos vê-la? — Pergunto.
— Lindara voltou à consciência quando estávamos fazendo
a ressonância, estava muito agitada e confusa, ela pediu pelo
Michael algumas vezes. — A médica responde e a expressão de
Dante endurece rapidamente. — Não podíamos esperar, então a
sedamos, se tiver algum Michael presente nesta sala, acredito
que ela ficará feliz em vê-lo ao acordar.
Ah pobre Dante, Lindara até inconsciente consegue causar
conflito.
— Eu sou o Michael. — Ele diz atrás da mulher, ignorando
Dante que lhe lança um olhar feroz.
A médica dá um sorriso forçado, envergonhada
provavelmente.
— O restante eu aconselho ir para casa, Lindara só pode
ter um acompanhante e o horário de visita começa ao meio-dia.
— Tem alguma previsão de quando ela irá acordar? —
Dante pergunta no segundo que a mulher ameaça a sair da sala.
— Não, por isso não adianta todos ficarem aqui, ela precisa
de roupas e sapato, se alguém puder trazer.
— Eu trago. — Levi fala pegando no braço da Alice, nos
deixando.
A médica nos dá um pequeno sorriso e se retira da sala
com Michael em seu encalço. Dante dá um passo na direção
deles, mas o seguro pelo braço o impedindo.
— Ela está dormindo, Dante. Não vai acontecer nada. Vá
para casa e descanse. — Duvido muito que ele conseguirá fazer
isso, mas ficar aqui, imaginando o que os dois estão conversando
lá dentro, não será fácil.
— Eu não consigo. — Ele diz exasperado e sai na direção
oposta à deles.
Só espero que aqueles três tomem juízo antes que alguém
acabe morto.
Blake e eu decidimos ir embora também, assim posso
dormir algumas horas até chegar o horário de visita.
Abro os olhos com um esforço sobrenatural e enxergo tudo
nebuloso. Minha língua está dormente e tenho a leve sensação
de estar babando.
Uma silhueta para a minha frente e clareia minha visão
com uma espécie de lanterna.
— O efeito do sedativo já está passando, se precisar de
algo peça as enfermeiras. Lindara precisa de silêncio e pouca
claridade. — A pessoa, provavelmente a médica, avisa com
seriedade. — Nos vemos mais tarde, Michael. — Ouço o nome
dele e o monitor que faz a leitura dos meus batimentos cardíacos,
bipa altamente.
— Acredito que ela esteja nos ouvindo. — A médica avisa e
em seguida ouço a porta bater.
Fecho as pálpebras com força fazendo lágrimas rolarem e
me viro na direção dele e quando eu as abro, vejo Michael
sentado na ponta de uma poltrona, ao lado da cama, com os
olhos tão marejados quanto os meus.
— Mi... Mich... — Fecho os olhos com força e tremo de
raiva, por não conseguir nem pronunciar o nome dele.
— Eu estou aqui. — Ele sussurra com a voz rouca e leva
sua mão para tocar em mim, mas para bruscamente.
Tudo que eu mais quero, é tocá-lo e sentir sua pele quente
e macia. Enroscar os meus dedos em seus cabelos e me
afugentar em seu colo, mas depois de tudo que eu fiz, não tenho
certeza se ele suportará ficar perto de mim.
Ergo minha mão e sinto um leve pulsar na cabeça, o ignoro
e deslizo meus dedos para a face dele, sua barba farta roça na
minha pele, Michael a segura no lugar e por um momento chego
a pensar que ele se distanciaria, no entanto, ele acaricia seu
rosto com minha mão e ficamos assim por um tempo, apenas nos
olhando.
— Michael. — Chamo quase inaudível e um olhar pesado
cai sobre mim. — Eu sinto muito. — Sussurro sem ter certeza se
ele está me ouvindo ou entendendo.
— Lindara… — Sua voz sai embargada de um sentimento
que eu não consigo distinguir. — Eu é que devia estar me
desculpando, eu a coloquei aqui... perdi a cabeça...
Ele passa a mão pela face, atordoado, esse pequeno gesto
faz meu coração doer tanto que parece que está se partindo
dentro de mim.
— Você me trouxe de volta.
Pensando agora em como tudo aconteceu seria cômico, se
não fosse trágico.
Michael encontra o meu olhar rapidamente e junta às
sobrancelhas fortemente. Seus lábios entreabrem depois se
apertam e percebo que ele está na dúvida do que eu quis dizer.
— A velha Lindara, voltou. — Digo simplesmente, com
medo de implodir com os sentimentos.
Michael se levanta da poltrona bruscamente e seu
movimento rápido me faz ficar tonta. Ele caminha até o outro lado
do quarto com passos largos, parecendo uma panela de pressão
prestes a explodir.
Aperto no botão na lateral da cama para me sentar e poder
olhá-lo. Michael se volta para mim e mesmo na distância que se
encontra, consigo ver e sentir o alvoroço que está passando na
mente dele.
— Prove. — Ele exige, fazendo meu coração acelerar.
Suspiro baixinho e lembro algo que eu disse a ele pelo
telefone um pouco antes de ser sequestrada.
— Me castigue, me bata, mas não me ignore... eu amo
você... Quando se trata dele é melhor esperar o pior.
Michael mexe a cabeça em negação e leva as mãos ao
cabelo exasperado.
— Me perdoe. — Sussurro, sentindo meus olhos vertendo
em lágrimas.
— Lindara… — Ele diz rouco, como se tivesse algo preso
em sua garganta. — Eu... eu não posso passar por isso de novo.
— Ele diz simplesmente e me abandona no quarto.
Reprimo um grito e contenho o impulso de ir atrás dele.
Michael vai voltar, ele sempre volta. Talvez só precise de tempo
para assimilar, porém, o meu medo é que nesse tempo ele
perceba que não vale apena voltar.

No momento que o sol começa a invadir o quarto pelos


vãos das cortinas, uma enfermeira entra e verifica se eu estava
precisando de alguma coisa, depois de um tempo alguém trouxe
café da manhã, mas só de pensar em comer, meu estômago
embrulha.
Horas se passaram desde que Michael foi embora e ficar
aqui isolada nem é o pior… O pior mesmo é ficar imaginando se
ele vai voltar.
Deito-me de lado e fico cutucando um adesivo da cama,
me lembrar todas as loucuras que eu fiz quando estava com
Dante. Como eu consegui ser tão burra? Como eu pude me
envolver tanto a ponto de gostar dele e me entregar a ele…
Consumida pela dor de cabeça e pelos pensamentos
pungentes, eu me deixo levar em um sono profundo.

Acordo com um enfermeiro moreno, alto e de cabelos


enrolados, medindo a minha pressão.
— Você está bem? Está sentindo alguma dor? — Ele
pergunta com um sorriso gentil.
— Estou bem. — Consigo falar, ele assente e começa a
anotar algo no meu prontuário. — Que horas já são?
— Onze e dezesseis. — Ele responde olhando no seu
relógio de pulso.
— Sabe que horas eu vim para o quarto? — Pergunto e ele
verifica no prontuário.
— Às cinco e cinco da madrugada. — Assinto
decepcionada, minha esperança de Michael voltar, se reduz a
nada, já faz seis horas, ele não voltará e só de pensar meus
olhos se enchem d’água.
— Por que está chorando? — O enfermeiro questiona ao
medir minha febre.
— Nada, só estou me sentindo sozinha. — Ele me olha
confuso.
— Aquele homem não está com você? — Ele se move de
lado e Michael surge na minha linha de visão fazendo meus
batimentos acelerarem.
Ele está sentado em uma poltrona na parede atrás do
enfermeiro. Apenas assinto para o homem incapaz de dizer
qualquer palavra, em seguida ele vai embora nos deixando a sós.
— Você voltou. —
Michael está com a mesma roupa de ontem à noite, só que
amarrotada como se ele tivesse rolado na cama a noite inteira,
ele se põe na minha frente a um braço de distância.
— Eu passei meses esperando esse momento, Lindara...
— Ele pausa e suspira. — Mas preciso de tempo para absorver e
você também deve estar se sentindo confusa.
— Eu não estou confusa. — Falo firme. — Eu estava cega,
não sabia o que estava fazendo. — Me sento rapidamente e
seguro seu braço o surpreendendo.
— Você precisa deitar, Lindara. — Ele avisa me afastando.
Ele está fugindo de mim como o diabo foge da cruz.
— Sabe por que eu desci naquela sinaleira? — Questiono,
ele me encara impassível e mexe a cabeça em negação. —
Dante e Sabrina estavam conversando do outro lado rua.
— Os dois são advogados, isso não significa nada. —
Michael fala simplesmente, como se fosse normal às duas
pessoas que mais queriam ferrar com ele, no mesmo lugar.
— De quem você acha que Dante recebeu a “carta
anônima”? — Faço aspas com os dedos. Aquela carta deve ter
sido forjada pelos dois. — A respeito caso do meu pai, que você
tão gentilmente pediu para Sabrina investigar mesmo eu dizendo
que eu não queria nada daquele dinheiro. — Digo sentindo o
sangue subir para a cabeça e o monitor apita, mandando eu me
acalmar.
Michael fica tenso e pensativo e não demora muito para
sua face ficar rubra, tomada de fúria, confusão e compreensão.
Consigo sentir sua ira espalhar-se pelo quarto.
— Filhos da puta! — Ele silva, fechando as mãos em
punhos.
— Você devia ter me contado sobre Dante.
Michael senta na borda da cama ao meu lado e consigo
relaxar por um momento, fazendo a pressão da minha cabeça se
dissipar.
— Sim, devia.
Pego a mão dele e a seguro em meu colo, Michael fica
imóvel.
— Me diga o que fazer para consertar isso?
— Eu não sei, Lindara. Você está com ele agora. — Ele
expõe amargurado.
— Não me torture com isso, ele não significa nada para
mim, nós nem chegamos a… — Me calo abruptamente, estou
levando essa conversa para um caminho que eu não quero
seguir.
— Não? — Michael questiona quase inaudível, apenas
mexo a cabeça em negação e mordo a ponta do lábio com força
ao lembrar as outras coisas que fizemos.
Meu Deus!
— Eu preciso de você, Michael. — Digo o mesmo que ele
me disse uma vez, bem no início, antes de toda essa merda
explodir.
— Que se foda o universo. — Ele conclui, me fazendo
sorrir e minha face lateja dolorosamente. Levo a mão no rosto e
aliso o lugar machucado fazendo o olhar dele, endurecer.
— Eu estou bem. — Garanto.
— Não minta. — Ele sobe a mão para a minha face e
desliza o polegar pelo contorno do meu rosto.
— Não posso apagar tudo que aconteceu, ou pedir que
você ignore… — Digo puxando a mão dele para dentro das
minhas — Mas eu voltei e você também voltou... o que eu devo
esperar, Michael? — Questiono com medo da sua resposta, mas
sei que vou me arrepender se não perguntar.
Ele umedece os lábios e se põe de pé, seus olhos encaram
os meus com uma tristeza perceptível e não consigo imaginar
tudo que esteja passando na cabeça dele, mas tenho certeza que
ele está se atormentando, supondo coisas que só vai conseguir
saber me perguntando. Seus lábios se abrem, mas antes que ele
pudesse dizer alguma coisa, Dante surge na entrada da porta
com um imenso buquê de rosas vermelhas e um sorriso
acolhedor, fazendo meu coração se espremer no peito e os meus
batimentos dispararem.
— Querida. — Foram as únicas palavras dele.
Michael pressiona os lábios com força, estala o pescoço e
ele fecha as mãos em punhos, eu sei o que ele vai fazer. Tento
pegar em sua mão, mas ele se esquiva de mim e pula em cima
do Dante.
— Michael! — Grito, quando o vejo levantar a mão fechada
para acertá-lo, mas Dante a segura no ar, impedindo de tomar
outro soco.
— Parem! — Grito novamente, fazendo minha cabeça
latejar, as rosas caem no chão, e eles se atacam iguais a dois
búfalos no meio do quarto.
Meu coração acelera loucamente, fazendo o monitor gritar
e ainda assim eles continuam lutando até se tornarem apenas um
borrão escuro a minha frente.
Acordo minutos depois, creio, pois, há um homem juntando
as rosas pisoteadas no chão do quarto e a médica que me
atendeu noite passada está verificando se ainda estou viva.
— Não temos tanta emoção neste hospital desde o Super
Bowl. — Ela comenta com um sorriso.
— Cadê eles?
— Seus namorados, foram expulsos pelos seguranças do
hospital. — Ela diz me fazendo cerrar os olhos.
— Quando vou poder vê-los?
A médica sorri, acho que admirada com minha coragem.
— Na sua alta. Daqui sete dias. — Ela responde e eu exalo
baixinho, irritada. — Lindara, conselho de mulher para mulher…
se cure e fique longe daqueles dois, quando eu entrei aqui você
estava desmaiada e eles se matando ao lado.
Assinto, sentindo as lágrimas escorrerem involuntárias e
explico para a médica que recuperei a memória, por isso a
confusão de ontem e a de agora. Seu queixo cai, perplexa, ela
ficou de analisar a tomografia novamente para saber se passou
algo que ela não tenha detectado. E fico sozinha, não tenho nem
tempo de refletir no que ela disse a respeito dos dois, pois,
Micaela e Levi adentram o quarto.
— Como você está? — Minha irmã questiona sentando ao
meu lado, acariciando minha mão.
— Péssima!
— Nós ouvimos tudo do corredor. — Levi comenta pasmo.
— Eu voltei. — Digo simplesmente e os dois me encaram
confusos como Michael. — A minha memória voltou! — Anuncio
feliz, em alto e bom som, mesmo nessas circunstâncias.
— Como? Meu Deus! Michael sabe? — Mica me metralha
de perguntas com um sorriso exorbitante.
Queria ter visto esta expressão em Michael.
— Não sei como voltou. — Digo com um sorriso. — E sim,
Michael já sabe e me abandonou quando contei, mas depois
voltou então Dante chegou e o resto vocês sabem.
— E Dante sabe? — Levi questiona.
— Não faço ideia.
— Ainda não acredito que você está de volta. Prove! — Ela
ordena. Será que todos vão me pedir uma prova de memória?
Rio.
Levo a mão na orelha como se fosse um telefone e digo:
— Acho que eu estou grávida. — Imito a voz desesperada
que ela fez e acaricio sua barriga em seguida. — Pelo menos
agora nós temos certeza. — Adiciono rindo.
— Já sabe o que vai fazer quando sair daqui? — Levi
pergunta preocupado.
— Enfrentar meus demônios.
Os dois riem.
— Você acha uma boa ideia procurar Dante? — Mica
questiona receosa.
— Eu não vou precisar procurá-lo, tenho certeza que Dante
dará um jeito de chegar até mim.
Passamos a tarde conversando e lembrando cada loucura
que eu fiz desde o ano passado e chegamos à conclusão que no
próximo acidente eu morro. Nem um gato tem tantas vidas assim,
Levi comentou com um sorriso, porém, preocupado.
O horário de visita não demorou muito para chegar ao fim,
meu amigo se ofereceu para dormir aqui, caso eu precisasse de
ajuda, no entanto, tudo que eu preciso agora é de um tempo
sozinha para organizar os pensamentos.
Eu pequei em tantas coisas, fui negligente comigo e com
minha saúde e o que mais me aborrece é que eu precisei
recuperar a memória para me dar conta disso.
Magoei tantas pessoas. Dylan claramente me odeia.
Beatriz quando finalmente estava gostando de mim, acabo
enfiando os pés pelas mãos, e a Emma... penso e choro baixinho,
eu mal a reconheci dois dias atrás.

Os dias foram se passando torturosamente devagar. Levi


veio todos os dias e me trouxe roupas e um celular novo, já que o
meu, acredito que esteja com Dante.
Recebi muitas visitas, até dos seguranças, reunindo um
bocado de enfermeiras no corredor. Evitei perguntar sobre
Michael, o que a médica me disse não sai da minha cabeça: se
cure e fique longe daqueles dois, quando eu entrei aqui você
estava desmaiada e eles se matando ao lado. Passei os dias me
questionando sobre isso e cheguei à conclusão que eles estavam
brigando pela Lindsey outra vez, e isso me irrita profundamente.
Me fazendo questionar o que eu represento para eles, ou
imaginar o que eu tenho parecida com aquela mulher, para
ambos se interessarem por mim.
A médica precisou me dar medicamentos para ansiedade,
pois, estava começando a enlouquecer sem saber o que está
acontecendo do lado de fora, além das notícias da internet, claro.
Alguém fez a gentileza de filmar a briga do renomado
advogado Michael O’Connor socando a ex-noiva em uma calçada
da Times Square. Esse foi o título de uma das matérias. E aquele
povo que estava me chamando de vadia para baixo, estão
mandando mensagens de apoio, hipocrisia é um eufemismo.
Dr. Phil veio me visitar, a pedido da minha médica, e ficou
um tanto atônito na hora em que me viu de mente clara, e por
consequência da sua visita algumas enfermeiras souberam da
minha súbita clareza e outra vez eu fui alvo de fofoca pelos
corredores do hospital, o que levou um dia para cair nos ouvidos
do Dante.
Ele procurou Levi em nosso apartamento e pediu para me
entregar um recado: Antes que eu tomasse qualquer decisão,
precisava de um tempo a sós comigo para se explicar.
Se não tivesse feito merda, não haveria nada para explicar.

— Espero que esteja pronta. — Levi comenta ao adentrar o


quarto.
— Estou por quê?
O meu cérebro já está começando a bugar e estou com o
cheiro de hospital impregnado em meus cabelos. Passei por
tantos exames, avaliações e conversei com um psicólogo, estava
ficando com medo que de ser internada na ala psiquiátrica.
— Os trogloditas estão lá embaixo. — Levi informa.
— Ah, Levi! Vamos pelos fundos.
— Agora não seria uma ótima hora para mostrar a eles de
que lado você está?
— Eu estou do meu lado, quando aqueles dois estão juntos
ficam cegos. Olhe o meu estado, Levi. — Digo apontando para
minha cabeça. — Rasparam uma parte do meu cabelo e me
fizeram ficar presa neste hospital por uma semana. — Exalo
irritada, a minha face está começando a voltar para a cor normal,
mas ainda há pequenos vasos sanguíneos no branco do meu
olho que me fazem parecer o Frankenstein.
— Você está tensa, talvez seja melhor pedir um calmante.
— Ele diz e tom de deboche.
— Só quero ir embora. — Peço manhosa.
Ele sorri e pega a minha mala de cima da cama. Nem
acredito que já faz uma semana que eu voltei a ser eu mesma.
Pés no chão de agora em diante!
Tomei uma decisão muito difícil nesse tempo que passei
aqui. Preciso encarar os fatos e aceitar que nunca vou ter um
futuro como bailarina, estou chegando aos vinte e três anos e
tenho uma grande quantia em dinheiro dentro do meu guarda-
roupa, não posso usar mais a desculpa sobre não ter condições
para ter um futuro melhor.
Quem disse que dinheiro resolve tudo, devia ver o que eu
estou passando agora.
Talvez viajar para longe seja uma boa opção.
Descemos do elevador para o térreo, saindo no
estacionamento. A brisa fresca do verão bate em minhas pernas
de fora fazendo o babado do meu vestido laranja florido erguer.
Ah, delícia, está um calor maravilhoso.
No caminho para casa, fico observando pela janela do táxi
o movimento das ruas, pensando em como contar ao meu amigo
que desisti do meu sonho, não estou a fim de tomar esporro tão
cedo.

— Eu vou tirar uma soneca. — Aviso assim que


adentramos nosso apartamento.
Deito em minha cama confortável e convidativa com
cheirinho de casa e de Dante. Suspiro.
Cristo, o que eu fiz?
É possível gostar e odiar uma pessoa ao mesmo tempo?
Pois, Dante conseguiu dar um nó em minha cabeça, ele me
encontrou triste e sombria e me fez ficar melhor de uma forma
inexplicável.
Eu baixei a guarda e o deixei entrar, não posso dizer que
ele se aproveitou de mim, eu sabia onde estava me metendo,
mas pensar agora nos motivos pelos quais ele se aproximou, me
dá vontade de torcer o pescoço dele.
— Linda. — Levi chama da porta do meu quarto com um
sorriso preocupado.
— O que foi? — Pergunto com um frio na barriga.
Sento-me rápida e acabo vendo vários pontinhos pretos
dançando a minha frente.
— Michael está na porta.
— Pediu que ele entrasse? — Questiono aflita, sentindo
uma agitação nas minhas entranhas.
— Não, você quem decide.
— Deixe-o entrar e peça para Dean não deixar mais
ninguém subir. — Ele assente e desliza para fora do quarto.
Abro a janela rápido, o céu está azul-claro assumindo um
tom acinzentado, me lembrando um pouco do dia que nos
conhecemos, daria tudo para voltar naquele momento.
— Lindara. — A voz de Michael soa baixinho, fazendo
meus batimentos cardíacos tropeçarem.
Viro-me para ele e nosso olhar se fixa por um momento, me
dando tempo de notar a leve mancha roxa na sua têmpora
esquerda.
— Oi. — Digo com a ansiedade se espalhando pelo meu
peito.
— Você está bem? — Ele pergunta, mostrando-se
preocupado e dando um passo para dentro do quarto.
— Vou sobreviver.
Um fraco sorriso surge em sua face.
— Eu não pude voltar ao hospital...
— Eu sei. — O interrompo, porque não quero pensar no
motivo que o impediu.
Michael fica tenso e consigo notar seus músculos rígidos
por baixo da sua camisa raglan, cinza-escura.
— Eu passei esses dias pensando, ainda penso, na
verdade… — Ele umedece o lábio inferior e percebo sua irritação
com o assunto. — Por que ficou com ele? — Michael questiona
me arrancando o ar.
Engulo em seco, sem ter ideia do que dizer, isso é tortura,
não para mim, mas para ele.
— Isso importa? — Pergunto apertando os lábios com
força, sem ideia do que dizer.
— Sim. — Diz simplesmente.
Respiro fundo buscando as palavras certas e percebo que
não existem.
— Ele estava lá, onde quer que eu estivesse, como se
fosse onipresente. Simplesmente aconteceu, não foi
premeditado, pelo menos não da minha parte. — Esclareço
respirando fundo para tomar coragem. — Dante me contou toda
verdade, desde Lindsey.
— E mesmo assim você ficou com ele!? — Michael
exclama, mas não me deixo abalar com o seu tom de voz.
— Sim, ele foi sincero comigo, mais do que você já foi.
— Eu perdi a minha esposa no parto da minha filha,
Lindara. — Ele vocifera e acrescenta com desdém: — Me perdoe
se é algo que eu não gosto de ficar conversando.
— Aceitei ficar com ele depois da apresentação de balé. —
Exponho.
Se é para deixar tudo às claras, essa é a hora.
— Então a culpa é minha? — Ele escarnece.
Dou de ombros, apertando os lábios com força.
— Sente algo por ele, Lindara?
Meu Deus! Onde ele quer chegar com isso?
— Michael. — Digo frustrada, mexendo a cabeça em
negação.
Não posso responder isso, pois, não se mata um
sentimento da noite para o dia e Michael sabe disso.
— Eu te amo, Michael. Amo tanto que dói ver tudo o que fiz
você, comigo, com a gente! — Grito irritada e constrangida. — Eu
não posso mudar o que aconteceu, você está se atormentando e
se torturando, com algo que não significa nada para mim.
Sua garganta oscila brevemente.
— Você não respondeu. — Ele dá um sorriso fraco. — Será
que não significa nada mesmo?
— Estou confusa, Michael. — Digo fechando as mãos em
punhos sem saber como me expressar, com ele me fuzilando
com os olhos. — A Lindara sem memória gosta dele, eu de
agora, o odeio.
Me aproximo dele, fustigada e pego em sua mão, ele não
recua, mas não se aproxima.
— Eu quero ficar com você, ao seu lado. Precisa acreditar
em mim, Michael.
Ele aperta os lábios, levemente rosados.
— Ficar sem você foi a pior coisa que já me aconteceu. —
Ele da um passo a frente e segura meu rosto entre suas mãos.
— Mas? — Pergunto devido ao seu silêncio repentino.
— Quero que me prometa uma coisa, antes de tudo.
Um pedaço de mim, já tem em mente o que ele pedirá.
— O quê? — Meus lábios se mexem por conta própria e
um leve tremor percorre o meu corpo, o silêncio se estende no
pequeno quarto me fazendo ouvir até o martelar do meu coração
em um ritmo descompassado.
— Nunca mais vê-lo. — Michael diz com uma expressão
penetrante, sinto meu rosto aquecer rapidamente, como se
tivesse sido esbofeteada.
— Michael... — Sussurro e suas mãos deixam meu rosto.
Ele me encara decepcionado e seu corpo vacila como se
ele tivesse dando um passo em direção à saída.
— Eu não vou procurá-lo, mas eu não tenho controle sobre
os atos dele.
— Eu vou resolver isso com ele. — Michael fala com as
mãos em punhos.
— Como? Se matando no soco? — Questiono sentindo o
pânico se expandir dentro de mim. — Me deixe resolver isso,
Dante irá me escutar.
Só de ouvir o nome dele, as veias do seu pescoço saltam.
— Não. — Ele recusa secamente.
Respiro fundo e exalo baixinho.
— Você não pode mais vê-lo, Lindara, prometa para mim.
— Ele pede, com os olhos vermelhos, tristes.
— Eu não vou vê-lo, desde que não veja mais Morgan.
— Eu trabalho com ela. — Ela explica.
— Então eu diria que você está em um impasse. — Dou de
ombros.
Michael fica pensativo por um momento.
— É justo.
A sensação de alívio que eu deveria sentir não chegará tão
cedo, a tempestade ainda não passou, ela está se armando
sobre nossas cabeças.
Vendo agora o estado em que Michael ficou, começo a
pensar que nunca mais seremos os mesmos. Eu mudei tanto que
nem eu mesma me reconheço e não sei como faço para voltar a
ser a garota antes do coma.
Depois da nossa conversa acalorada, nos sentamos na
sala. Ficar no quarto com o cheiro do Dante impregnado nos
forros de cama estava me deixando com vontade de arrancar os
lençóis ali mesmo com Michael me olhando.
— Então quer dizer que todos me odeiam? — Pergunto.
— Eu não disse isso. — Ele disfarça um sorriso e contenho
a vontade de acariciar o seu rosto.
Ele parece mais confortável do que quando entrou aqui,
mas ainda assim continua mantendo uma certa distância, toda
vez em que eu o toco, Michael fica tenso e pensativo.
— E o governador conseguiu se livrar da prostituta? —
Pergunto de repente o pegando de surpresa.
— Lindara, me diz que você não comentou isso com
ninguém. — Ele fala sério, me fazendo rir.
— Não! — Digo e ele relaxa momentaneamente, então
deslizo minha mão para sua coxa e Michael a pega no mesmo
instante. — O que foi? — Questiono, deslizando a outra mão para
a sua perna.
— Você está diferente. — Ele diz e por algum motivo
parece uma crítica.
— Em sete meses eu fui sequestrada, fiquei em coma e
perdi de memória. Ainda estou descobrindo como voltar a ser a
mesma, Michael. — Soo mais áspera que eu desejo.
— Eu não quis ofendê-la. — Ele diz acariciando a palma da
minha mão.
— Não ofendeu… — Tento sorrir. — Então, você e a vadia
da Morgan transaram? — As palavras que eu estava me
segurando para não pronunciar desandam para fora da minha
boca, e nem me preocupo em demonstrar surpresa, ao contrário
dele.
Michael pigarreia e percebo que está desconfortável com o
assunto, minha expressão se fecha, apenas de imaginá-lo com
aquela bruxa.
— Não. — Ele conclui, no entanto, a expressão que ainda
está em seu rosto indica que existe um, mas, a caminho.
— Quem? — Questiono, tentando esconder minha
irritação, porém, isso é impossível.
Meu coração acelera loucamente, minhas mãos ficam
trêmulas e começam a suar, instantaneamente. E me questiono:
Que porra é essa que está acontecendo com o meu corpo?
Ahh, ciúmes!
— Isso importa? — Ele indaga, me fazendo estalar uma
sequência de dedos.
— Quem? — Questiono sem me importar de ele dizer que
eu não tenho mais o direto sobre essa pergunta.
Coloco-me em pé me sentindo sufocada.
— Lindara. — Michael chama atrás de mim e me abraça no
instante que eu viro para ele, provocando um tremor na minha
espinha. E por consequência disso começo a imaginá-lo em
movimentos sexuais com outro corpo, me deixando enjoada,
seguro o impulso de querer empurrá-lo para longe. Agora eu
entendo porque ele não quer tocar em mim, ele está com nojo.
Porque é isso que eu estou sentindo agora. Nojo!
— Esqueça isso. — Ele fala e me abraça apertado.
— Que tal você ir embora... — Peço e ele se afasta e me
encara apreensivo. — E, tomar um banho. — Sugiro o fazendo
rir, Michael tenta me abraçar de novo, mas eu me esquivo. —
Podemos jantar em algum lugar. — Sugiro.
— Você está bem para sair?
— Sim.
Levo Michael até a porta, ele se despede, mas sem me
beijar, quando a fecho Levi está entrando na sala. Ele serve uma
xícara de café e se volta para mim com os lábios apertados.
— Desembucha. — Falo e ele mexe a cabeça em negação.
— Fala! — Insisto me aproximando dele.
— As paredes são finas. — Ele comenta rindo. — E, acho
que você não devia dizer amém para tudo que ele quer. — Ele diz
simplesmente, dando de ombros.
— Ah, Levi. — Choramingo. — Ele me pediu uma única
coisa. — Levanto o dedo indicador para enfatizar. — Como eu
poderia dizer que não?
— E Dante como fica nessa história, vai simplesmente
fazer de conta que nunca aconteceu, não vai dar o benefício da
dúvida a ele? — Levi questiona franzindo o cenho.
— Benefício da dúvida? — Escarneço chocada. — As
mentiras nunca irão me fazer esquecer Dante e eu prometi ao
Michael que não vou procurá-lo. Então eu não vou!
— Mas Dante não prometeu nada. — Ele diz com um
sorriso.
— Vai ficar do lado dele? — Pergunto chocada, parece que
voltei meses atrás com Mica.
— Dante gosta de você, Lindara. Você estava feliz. Quer
mesmo voltar para essa bagunça?
— Dante me pôs nessa bagunça na hora decidiu
mancomunar com Sabrina. — Rio e Levi não entende o porquê.
— Como eu fui idiota! — Grito e explico: — Vê-los juntos no
escritório e aquela cobra agindo como se me conhecesse. Em
que mais Dante mentiu para mim, Levi?
— Sinto muito, Linda. — Meu amigo dá um passo na minha
direção e me abraça, forte.
Levi está certo, Dante não prometeu e ele encontrará um
jeito de chegar até a mim, ele sempre encontra. Pensar nele me
murcha todinha. Eu queria conseguir odiá-lo por inteiro, mas tudo
o que passamos juntos não me deixa. Não acredito que tenha
sido tudo uma mentira e essa é a pior parte. Como odiá-lo se ele
fez tanto por mim? Mas como perdoá-lo se ele ferrou com tudo?
Argh!
— Por que está com cara de enterro? — Ele questiona, ao
nos sentarmos no sofá.
— Michael não transou com Morgan. — Digo, precisando
desabafar e Levi me encara pasmo — Mas ele afogou as mágoas
com outra e eu nem posso reclamar.
— Por que não pode? — Ele questiona com um sorriso
zombeteiro e responde a si mesmo: — Ahh! Porque você se
esfregou tanto no Dante como se fosse arrancar o gênio da
lâmpada, do amiguinho dele.
— Obrigada pelo apoio! — Escarneço.
— Ah, Linda. Vocês seguiram em frente, você não
esperava que ele nunca mais transasse na vida, não é? E
imagine que deve ser bem pior para Michael, porque Dante fodeu
com a falecida e vocês dois... bem... — Ele revira os olhos.
— Se está tentando me ajudar, fez um péssimo trabalho!

Tomo um banho pensando no jantar. Estou com uma


sensação estranha... ansiosa, aflita e com medo. Como se fosse
o nosso primeiro encontro outra vez. Entro no meu quarto e
coloco um vestido justo, curto e branco de alcinhas finas e decote
reto, ele contém algumas flores verdes e laranja em um pequeno
babado na barra da saia. Agacho-me aos pés da cama e puxo
uma sandália preta sem salto.
Encaro-me no espelho, insatisfeita e decepcionada, mas
terá de servir, ainda mais que estou evitando o salto-alto. Quanto
mais alto, maior o tombo, penso ironicamente.

— Então? — Pergunto ao sair do quarto e dou uma volta


para o Levi e Alice, avaliarem.
— Ele vai se apaixonar! — Alice brinca, pelo visto Levi já a
atualizou.
— Faça uma trança no meu cabelo. — Peço manhosa,
meu amigo sorri em concordância, mas revirando os olhos.
Quero esconder o local dos pontos que fica um pouco
abaixo da orelha direita, onde rasparam uns dois dedos do meu
cabelo, para minha felicidade, os fios de cima escondem a
incisão.

O interfone toca e eu corro para perto dele, recebendo um


olhar de reprovação do Levi.
— Olá, sentiu minha falta. — Cantarolo.
— Senti, Lindara. — Dante fala, fazendo minhas entranhas
se torcerem e o meu coração quase saltar pela garganta. Me
afasto do interfone, como se estivesse me distanciando dele. Levi
e Alice se aproximam com os olhos tão arregalados quanto os
meus, eu creio.
— Lindara. — Ele chama e sou incapaz de mover um
músculo do lugar. — Eu sei que está me ouvindo...
Dante fica em silêncio e até imagino a expressão que ele
esteja fazendo: olhando para baixo e mordendo a pontinha do
lábio com a face ilegível.
Levo as mãos ao rosto, petrificada e sinto meu sangue
ruborizar em minhas bochechas.
— Converse comigo. — Ele pede fazendo meus olhos
transbordarem em lágrimas.
Aproximo-me do interfone e o aperto com força com as
mãos trêmulas.
— Dante... — Sussurro com a voz entrecortada. — Vá
embora, por favor.
Se Michael chegar eles vão brigar outra vez e eu não sei se
aguento mais um conflito deles.
— Me deixe explicar... — Ele insiste e Levi me lança um
olhar tristonho.
— Dante, eu não posso falar com você. — Digo áspera.
— Michael a proibiu? — Ele questiona duramente.
— Vá embora, Dante. Por favor. — Digo e arranco o
interfone da tomada. — Merda! — Praguejo e antes que eu
pudesse jogar o interfone longe, Levi o tira das minhas mãos e o
solta na mesa rapidamente.
— Acalme-se! — Ele me abraça com força.
— O que eu faço? — Questiono me sentindo perdida.
— Você já escolheu um lado, não há mais nada para ser
feito. — Alice fala simplesmente, — Uma hora ele terá que
aceitar. — Ela aperta os lábios e nos deixa a sós.
Suspiro, me sentindo amaldiçoada.
Levi se distancia de mim e me analisa metodicamente.
— O que? — Pergunto confusa.
— Nada, só estou tentando entender o porquê do alvoroço.
— Ele comenta me deixando boquiaberta.
— Você é malvado!
Ainda rindo ele se aproxima e começa a arrumar os fios
que se soltaram da trança e de repente a campainha toca me
fazendo ter um sobressalto, olho para a porta, mas me nego a
sair do lugar. Então meu amigo anda até lá e espia pelo olho
mágico.
— Sorria. — Ele diz e a abre em seguida.
E foi o que eu fiz. Michael apareceu na entrada segurando
uma pequena cesta de rosas, como as quais ele me deu há muito
tempo em uma sinaleira. Sorrio sensibilizada e uma chama se
acende em meu coração.
Ele está tentando, por nós. E eu vou mover montanhas se
for preciso para tê-lo por inteiro, não só resquício de tudo que nós
já vivemos.
— São lindas! — Comento sentindo a maciez de uma das
pétalas, Michael adentra o apartamento e coloca a cesta em cima
da mesa ao lado do interfone, seu olhar cai sobre ele, fazendo
meu coração acelerar. E antes que eu pudesse abrir a boca para
justificar, Levi pega o aparelho da mesa e resmunga:
— Tirei essa porcaria para limpar. — Ele revira os olhos. —
E quem disse que eu consigo colocar de volta.
Quando Michael se vira para ele, eu lhe dou um olhar de
reprovação.
— Eu arrumo para você. — Michael se oferece e Levi sorri
assanhado, em concordância.
Saímos do apartamento em silêncio e ao entramos no
elevador a inquietação que sinto entre nós, está me corroendo
por dentro.
— Ele interfonou. — Esclareço me livrando de um peso.
— Eu imaginei. — Michael diz em uma calmaria duvidosa.
— Eu não quero mentiras. Não aguento mais essa pressão
entre nós, parece que estou pisando em ovos, eu não sei mais
como me comportar ao seu lado, Michael. — Exponho porque
também quero que ele seja sincero.
Michael pega em minha mão no segundo que as portas do
elevador se abrem.
— Nós sobreviveremos a isso, Lindara. Só precisamos de
tempo.
Assinto, aliviada.
Descemos do elevador em silêncio e meus olhos correm
pelo saguão rapidamente, mas só vejo Dean na entrada da
cabine.
— Oi, Lindara. Há uma entrega para você.
— Para mim? — Pergunto confusa, ele assente e estende
o braço para dentro da cabine, em seguida me entrega um
pequeno envelope preto.
O pego, insegura e aperto o papel, sentindo algo macio.
Meu coração acelera loucamente em reconhecimento do que
contém dentro.
— Obrigada, Dean. — Digo com um sorriso forçado.
Caminho com o envelope na mão, sem ter onde guardá-lo,
na pressa eu acabei saindo sem a minha bolsa e não quero
deixar com Michael.
— Você está bem? — Ele questiona, assim que entramos
em seu novo carro, um Tesla esportivo preto.
— Sim, estou.
Só quero chegar logo no restaurante e jogar esse embrulho
no lixo, penso.
— Não vai abrir? — Ele questiona, olhando para minhas
mãos. Para o envelope.
— Não. — Digo simplesmente.
— Lindara, o que tem aí dentro?
Por que eu fui inventar de dizer que não queria mentiras,
Senhor?
— Você não vai querer saber.
Michael solta um riso forçado.
— Você sabe que me dizer isso, só vai aumentar a minha
curiosidade. — Seu sorriso some e ele acrescenta: — Você disse
que não queria mentiras, lembra?
Inferno!
— Então não me faça mentir. — Peço e amasso o envelope
com força, rompendo o lacre. Respiro fundo sentindo meu
coração tropeçar em meus ouvidos eu pego o conteúdo de lá de
dentro e mostro ao Michael, sua face fica rubra de indignação.
— Sobreviveremos a isso? — Pergunto segurando na
ponta do dedo a calcinha fio dental, laranja com florezinhas
brancas, que Dante guardou noites atrás de recordação.
Sua garganta oscila e percebo que estamos indo mais
rápido que o permitido. Jogo a calcinha em cima do painel e
seguro no braço do Michael chamando a sua atenção.
— Pare o carro, Michael. — Peço.
— Você transou com ele? — Ele pergunta irritado.
— Não! — Grito. — Nós... — Fecho os olhos com força,
pensando em uma forma mais fácil de explicar, mas não existe.
— Nunca chegamos até o final. — Concluo sentindo minha face
ruborizar.
Michael freia de repente e da ré fazendo meu corpo colar
no assento de couro.
— Isso dá no mesmo! — Ele diz entredentes, ao
estacionar, se voltando para mim em seguida com os olhos
fervorosos e eu o encaro com a mesma intensidade.
Eu sei exatamente como Michael se sente, não é porque
Dante é inimigo de longa data, que o meu ódio por ele ter
transado com outra mulher seja menor que o dele.
Solto o cinto, tão rápido quanto penso e colo meus lábios
nos dele violentamente. Estamos pensando muito no que fizemos
com outras pessoas e esquecendo do que realmente importa, de
nós.
A língua dele busca a minha na mesma vivacidade, como
se tivéssemos tentando roubar o fôlego um do outro. Meses se
passaram e eu havia esquecido completamente de seus beijos.
De como ele consegue fazer até minha alma clamar por mais,
apenas com os lábios, daria tudo para parar esse momento, onde
os únicos sons são os pequenos gemidos escapando das nossas
bocas.
— Podemos esquecer isso? — Pergunto contra os seus
lábios.
— Eu vou fazer o possível para esquecer, Lindara. — Ele
diz baixinho colando sua testa na minha e me olhando
profundamente.
Sinto que essa discussão irá se estender por mais vezes.
Queria saber o que a santa Lindsey fez para sobreviver a ira
desses dois.
Entramos no restaurante, o mesmo que viemos no nosso
primeiro encontro, Village Green, naquela época minha única
preocupação era a bruxa Sabrina, que Deus tenha piedade do
filho dela.
— Está com fome? — Michael pergunta puxando a cadeira
para eu sentar.
— Um pouco.
Ele assente e percebo que seremos os dois comendo sem
muita vontade. Também, quem conseguiria comer agora depois
de tanta merda discutida, segundos atrás.
— Podemos fazer terapia de casal. — Sugiro.
— Está falando sério? — Ele franze o cenho com incerteza.
— Não! — Rio e deslizo a mão por cima da mesa, pegando
a dele. — Eu faria se fosse nos ajudar. Chegamos longe demais
para desistir agora. — Digo e um sorriso fácil aparece nos lábios
dele.
Um garçom se aproxima e nos entrega os cardápios.
Vasculho rapidamente e peço um típico prato espanhol, Paella,
dessa vez Michael pediu o mesmo que eu e uma garrafa de vinho
da Saint Julien.
— E a Emma, quando posso vê-la de novo?
Ele sorri diante da minha pergunta.
— Amanhã ela estará em casa. Ela sentiu a sua falta,
Lindara.
— Aquele dia, eu fiquei surpresa por ela ter me
reconhecido.
— Lamento ter sido grosso com você.
— Tudo bem, não estávamos em um bom momento. —
Digo e tomo um gole do vinho, não querendo recordar que ele
esteve no prédio mas não subiu, pois viu o Dante saindo.
— Eu preciso voltar a Albany quinta-feira. — Ele comenta
de repente. — Tenho que finalizar alguns assuntos, depois
Cassian passará a fazer essas viagens.
— Ok. Eu não me preocupo mais com a Morgan. — Digo e
ele me olha com desconfiança me fazendo sorrir. — Aquela noite
no evento, o que ela disse para você?
Michael umedece os lábios, provavelmente se
questionando onde estou querendo chegar com o assunto.
— Que você a prendeu contra a parede e insinuou algumas
coisas no ouvido dela... — Michael se cala quando eu começo a
rir. — Então é verdade? — Ele pergunta e seu lábio se curva em
um sorriso.
— Talvez.
Ele mexe a cabeça em negação.
— Ela tem quase o dobro do seu tamanho. — Michael
comenta desacreditado.
— Eu cresci no Queens, lembra? — Exponho, com um
sorriso.
O jantar não poderia ter sido melhor, dada às
circunstâncias. Sorrir diante de tanto caos é quase um privilégio.
Porém, estar aqui, comendo e bebendo vinho com Michael não
me faz sentir melhor. Eu não consigo simplesmente ignorar o
rastro de bagunça que eu deixei para trás e não ter meios de
consertar me faz querer arrancar os cabelos da cabeça.
— Você está bem? Está distante. — Ele comenta,
terminado de comer um Crème Brûlée.
— Estou.
Mexo cabeça em negação mandando alguns pensamentos
embora e conto ao Michael sobre o dinheiro que eu tenho dentro
do meu guarda-roupa. Não dou muitos detalhes, mas explico a
ele que preciso de um lugar seguro para guardá-lo. Comento
sobre Madson e a visita que eu desejo fazer a ele e a Sra.
Hendricks. Só de pensar em vê-la pessoalmente meu estômago
embrulha e apesar disso não estou disposta a abrir mão desse
encontro.
Michael fica tão surpreso quanto eu, quando descobri. Por
um instante pensei que ele fosse me persuadir a não seguir esse
caminho, mas ele apenas segurou a minha mão e disse que
estaria lá eu quisesse. E é obvio que eu quero.
— Você pode ir comigo nessa viagem. Você me disse uma
vez que nunca viajou para a capital.
— Eu preciso tirar os pontos na sexta. — Aviso, mordendo
o lábio. A garganta dele oscila, até imagino o que esteja
passando pela sua cabeça. — Não tem com o que se preocupar.
— Afirmo e Michael fica tenso, com um olhar severo, que ele
desvia para trás de mim.
Não sei mais o que eu faço para ele acreditar no que eu
digo. Encho a minha taça e antes que eu pudesse levá-la a boca,
alguém para às minhas costas fazendo sombra na mesa.
— Boa noite! — Uma voz feminina soa.
— Boa noite! — Ele saúda rudemente Olívia e noto que seu
olhar severo não era para mim. A repórter que ficava no pé do
Michael o tempo inteiro, louca para tirar qualquer proveito dele,
que nunca deu a atenção desejada que ela almejava, para ao
nosso lado na mesa.
Me sinto em um déjà vu.
— Michael O’Connor. — Ela sibila o nome dele e quase sai
como um miado. — E Lindara Fincher. — Fala um sorriso
forçado. — Estou ligando para você há semanas. — Ela diz
encarando-o.
Olívia desliza sua mão com as unhas bem grandes e
pintadas de vermelho para o ombro dele chamando a atenção.
Michael a encara com um olhar fervoroso e tira a mão dela sem
delicadeza alguma, a mulher ignora seu gesto indelicado e
continua a falar.
— Queremos fazer uma matéria sobre vocês, para explicar
melhor o que houve naquele evento. Até agora só temos
especulações e três olhos roxos.
Encaro os dois e tamborilo os dedos na mesa, pensativa.
Olívia está com um sorriso presunçoso, mesmo com Michael a
encarando como se quisesse parti-la ao meio.
— Não estamos interessados. — Ele fala, fazendo meus
lábios curvarem em um sorriso, e percebendo isso Olívia me ela
me lança um olhar de irritação.
— Micha...
— Você é surda por acaso? — A questiono calmamente,
tentando esconder minha irritação. — Inconveniente você é
tempo inteiro, mas surda... — Faço uma expressão de
desentendimento. A mulher fica tensa e seus lábios se
entreabrem vagarosamente.
— Tenham uma boa noite. — Olívia diz simplesmente e se
retira com as mãos em punhos.
Espero ela se distanciar e me coloco de pé sem conseguir
olhar para ele.
Olívia! Ele transou com a Olívia! Meu cérebro berra.
— Vamos embora! — Aviso saindo da mesa sem esperá-lo,
com meu corpo tremendo igual a uma vara verde. Já era péssimo
imaginá-lo transando com uma mulher sem um rosto... e agora...
Argh! A face da Olívia não sai da minha cabeça.
— Lindara. — Ele me alcança antes mesmo de eu chegar
ao carro.
— Olívia! — Cuspo o nome com repulsa. — Tanta mulher!
Você podia ter transado com uma com cérebro pelo menos. —
As palavras saem carregadas de ódio da minha boca.
— Pare de gritar. — Ele chama a minha atenção e percebo
que há pessoas nos encarando de longe.
— Desculpe… — Peço com esforço e levo as mãos ao
rosto, envergonhada e raivosa.
Michael passa os braços a minha volta e me aperta com
força me fazendo gemer, o encaro confusa.
— Esqueça isso. — Ele pede num sussurro.
Tiro as mãos do rosto e encosto minha testa em seu peito,
sentindo o seu cheiro, tentando bloquear a imensidão de cenas
dos dois juntos que chicoteiam minha mente.
Tá aí uma coisa que eu não me importaria de esquecer.
— Vou fazer o possível para esquecer. — Repito suas
palavras.
Ele beija o topo da minha cabeça e me solta.
— Vou pesquisar um terapeuta. — Michael comenta,
fazendo gracinha.
Entramos no carro em silêncio, aquela cobra apareceu para
pulverizar nosso encontro.
Michael desliza sua mão para minha coxa, acredito que o
nojo dele por mim, esteja diminuindo. Entrelaço nossos dedos e
com a mão livre, aliso toda a extensão do seu braço o resto do
caminho.

Ao chegarmos em frente à casa dele, meu coração se


rompe em um turbilhão de sentimentos, a última vez que eu
estive aqui... mexo a cabeça jogando os pensamentos negativos
para escanteio.
Passamos por dois seguranças no caminho, mas não
conheço nenhum deles.
— Está tentando seguir os passos do nosso primeiro
encontro? — Pergunto ao entramos na casa.
— Talvez. — Michael fala com um sorriso envergonhado e
me segura pelo pulso chamando a minha atenção. Volto-me para
ele com o coração acelerando, ele ainda é capaz de despertar os
sentimentos mais profundos em mim.
Ele sorri como se lesse meus pensamentos e me pega de
súbito, me fazendo segurar em seu pescoço, surpresa. Michael
me leva para o segundo piso, a ansiedade é tanta que minha
vontade é de agarrá-lo aqui nos degraus mesmo.
Ao adentrarmos na suíte principal, noto de imediato que ele
havia mudado alguns móveis e a cama foi um deles. Contenho a
vontade de questionar o motivo quando ele me solta em cima
dela.
Fico sobre os joelhos o encarando, Michael se aproxima e
me segura firme pela cintura, nossos corpos se encostam e ele
roça a ponta do seu nariz no meu e na hora que eu tento beijá-lo,
ele se esquiva com um sorriso.
— Calma, querida. — Ele replica com os lábios quase
colados aos meus. — Você não estava apressada assim na
primeira vez. — Ele completa com um sorriso desafiador.
— Porque eu não sabia o que estava me aguardando.
Agora eu sei. — Digo e o puxo firme pela gravata quando ele
tenta se distanciar. Michael ri com o meu gesto.
— Vou dispensar os seguranças. — Ele avisa, tracejando
as mãos da minha cintura para baixo dos meus braços me
provocando cosquinhas, me contorço rapidamente e o solto, rindo
automaticamente.
— Isso não teve graça! — Xingo alto o vendo se distanciar.
— Então por que riu? — Questiona, mas não espera para
ouvir minha resposta.
Filho da mãe!
Ansiosa e com um enorme frio na barriga eu descido
antecipar as coisas, tiro minha sandália e calcinha jogando-a em
cima de uma poltrona do outro lado do quarto, depois de fazer
isso me questiono se não era melhor ter ficado com a calcinha.
Deito-me para trás impulsivamente e os pontos da cirurgia roçam
no lençol, me fazendo praguejar baixinho.
Encarando o teto eu o espero voltar com uma inquietação.
E quando me viro para o lado, o encontro parado na entrada da
porta me observando com o semblante impenetrável. Me sento
vendo Michael se aproximar lentamente, ele tirou o paletó e a sua
gravata está desfeita sobre seu peitoral, o deixando
tentadoramente sensual.
Quando ele senta na cama, me ponho de joelhos e o
abraço por trás, deslizando um braço em frente o seu pescoço e
outro em seu tórax.
— O que ocupa seus pensamentos? — Pergunto com meu
rosto encostado ao dele, percebendo sua quietude.
— Você. — Ele diz, tirando meu braço de volta do seu
pescoço e se virando para mim.
— Michael... — Balbucio.
— Shhh. — Ele emite baixinho na hora que eu abro os
lábios para questionar o óbvio e me beija, hesito por um segundo,
mas cedo aos seus lábios macios.
Michael me puxa de trás de si com um movimento rápido e
me senta em seu colo de frente para ele. Enrolo sua gravata em
minha mão e o puxo para mais perto grudando nossos lábios.
Seus dedos tracejam minhas coxas com delicadeza até o limiar
da minha cintura, então ele abre os olhos ao notar que não há
tecido algum ali embaixo.
— Surpresa. — Cantarolo contra sua boca e o empurro
para trás com força, deitando-o na cama.
Seguro na extremidade da sua camisa e com ímpeto a abro
arrancando alguns botões que voam espalhados por cima da
cama e do Michael, ele ri e mexe a cabeça em negação.
— Você tem umas 300 iguais a essa. — Aviso.
— Aham. — Ele emite, com um riso.
Suas mãos seguraram minha cintura por baixo do vestido e
sobem até a altura dos meus seios, depois descem alisando meu
tronco, fazendo-me arquear sobre ele.
Gemo baixinho inebriada com o calor das suas mãos em
minha pele.
Com o coração a galope e as mãos trêmulas de excitação,
abro sua calça e com sua ajuda eu a desço revelando toda a sua
magnitude. Mordo a pontinha do lábio com força, faminta por ele.
Michael senta de repente, pegando em minhas nádegas e as
erguendo. Me seguro em seus ombros e quando sinto a sua
ereção próxima do meu sexo, encaixo nossos corpos com um
movimento rápido, arrancando gemidos de nós dois. Ele me beija
brevemente e tira o meu vestido com cuidado, ficando deitado
sobre os cotovelos, me observando.
— Você está tão linda. — Ele diz quando me apoio nos
músculos rígidos da barriga, suas mãos se enterram em minhas
coxas, me fazendo arquejar.
Michael umedece os lábios na hora que eu levanto meus
quadris e começo a fazer movimentos leves. Acaricio seu
abdômen firme, que fica cada vez mais tencionado conforme me
movo. Sua face é um retrato de concentração e êxtase enquanto
ele observa nosso sexo se chocando.
Suas mãos deslizam impetuosamente para o meu
abdômen e tracejam até os meus seios, onde seus olhos os
devoraram. E quando ele os aperta com uma força considerável,
contraio os músculos do meu sexo, sentindo o dele pulsar no
meu interior.
Minha pele queima de desejo por esse homem, quanto
mais forte eu sento nele, maior é o seu aperto em minha cintura,
mas a dor... ah, gemo, toda e qualquer dor que vier disso, é bem
recebida.
Os lábios dele se abrem e um audível gemido escapa por
eles, então eu soube que estava fazendo um excelente trabalho.
Michael se senta de repente e nos gira me deitando na
cama, ainda dentro de mim, ele tira sua camisa com facilidade e
se apoia em um braço ao lado do meu rosto. E no instante que
ele desce para me beijar, seu quadril vem de encontro ao meu,
me fazendo gemer sua boca, ele sorri e se aprofunda ainda mais
em mim.
— Minha… — Ele grunhe. — Você é minha, Lindara. —
Seus movimentos foram ficando mais leves, torturosamente
leves. — Diga, Lindara... diga que é só minha...
Oh, Deus! Ele quer me torturar, de todas as formas.
— Eu sou... — Arquejo e seu pau desliza para fora de mim
vagarosamente. — Sua, Michael! — Grito no momento que ele se
enterra em mim.
Michael morde seu lábio inferior o deixando vermelho, seu
membro desliza impetuosamente para dentro de mim, de novo e
de novo.
A cada toque e a cada olhar dele, parece que surge uma
nova parte em mim, implorando por atenção. Deslizo minhas
mãos para suas costas e desço aranhando sua coluna, Michael
arqueia o corpo me preenchendo ainda mais e a cada aperto, e
estocada, meu corpo treme descompassadamente.
— Oh Deus! — Grito com minha garganta em brasa,
sentindo o prazer irradiar pelo meu corpo. — Michael... — Gemo,
me entregando totalmente a ele, que me dá um sorriso
arrebatador.
Ofegante, deslizo minhas mãos para seus cabelos úmidos
de suor e os puxo suavemente tirando da sua face. Ele encontra
meu olhar e seu ritmo fica mais forte e mais rápido, Michael
morde a ponta do lábio com força e com uma última e potente
estocada se desfaz dentro de mim.
Sua cabeça repousa entre os meus seios, onde ele
deposita um suave beijo e depois se deita ao meu lado,
consumido e ofegante.
— Acredito que não vou mais precisar tirar os pontos,
semana que vem. — Brinco e fazendo-o sentar rapidamente me
tirando um riso.
— Oh céus, Lindara. Eu esqueci completamente. Está
sentindo algo? Está doendo? Me deixe ver. — Ele pede
preocupado tentando me fazer sentar.
— Para! Estou bem. — Aviso com firmeza.
Michael se debruça sobre mim novamente e alisa o cento
da minha barriga.
— Jamais me perdoaria se eu a machucasse novamente.
— Pode me machucar mais vezes desse assim. —
Sussurro, e seus lábios se curvam no sorriso mais lindo que eu já
vi.
— Eu amo você. — Ele diz com naturalidade, não pensei
que fosse ouvir isso tão cedo, sorrio contra a sua mão, que agora
acaricia meu rosto agora.
— Eu amo você mais ainda.
Acordo sentindo uma mão acariciando o meu tronco nu.
Ajeito-me na cama e encontro Michael debruçado sobre mim,
com um sorriso maravilhoso. Até parece uma ilusão, vê-lo aqui,
tão pertinho de mim, podendo tocá-lo sem ter medo de que ele
desapareça segundos depois.
— Bom dia, dorminhoca.
Viro-me para ele me sentindo completamente sonolenta.
— Você já está de roupa. — Digo triste o fazendo rir.
— Fui à empresa e voltei para almoçar com você.
— Faz tempo que eu não dormia tão bem. — Comento
esfregando minha face e me sentando.
— Percebi, já que você estava na mesmo posição de
quando eu saí. — Ele expõe se pondo de pé. — Emma está lá
embaixo, se quiser vê-la.
— Estou morrendo de saudades dela. — Sorrio.
— Dylan e a minha mãe também estão lá embaixo. —
Michael comenta e ouvindo isso, me atiro para trás puxando o
lençol e me cobrindo até a cabeça. — Estão ansiosos para vê-la.
— Não estou saudável o suficiente para enfrentá-los.
— Não foi o que pareceu ontem à noite. — Ele assegura,
me fazendo corar.
Michael sobe em cima de mim, ficando sobre os joelhos,
comigo entre as suas pernas.
— Não se preocupe com eles. — Ele diz após puxar o
lençol do meu rosto. — Dylan não mora mais aqui e minha mãe
viaja hoje à noite.
— Eu desço, mas um olhar torto deles e eu vou embora.
— Eles que vão embora.
Sorrio, feito uma boba e abraço o seu pescoço.
— Ok.
Visto-me rapidamente e me lavo na pia do banheiro e
quando termino, o encontro sentado em uma das poltronas do
quarto, me esperando. Michael se põe de pé com um sorriso
primoroso.
— O que foi? — Questiono desconfiada.
— Estou muito feliz que esteja de volta, Lindara. E, eu
estive pensando… — Michael se aproxima e desliza suas mãos
para os meus braços me puxando para perto de si. — Se você
quiser, podemos continuar de onde...
— Papai. — Ele se cala e nos viramos para a entrada do
quarto, Emma está parada nos observando, ela usa uma saia
jeans e uma blusa cor de rosa com um unicórnio branco
estampado, seus cabelos loiros estão presos em duas tranças.
Michael se volta para mim, mordendo o lábio superior.
— Depois conversamos. — Ele avisa e rapidamente sinto o
desespero crescer dentro de mim. Ele quer continuar da onde
paramos, ou seja, noivos!
E isso nem me assusta, na verdade, é o que eu mais
quero, eu só preciso encontrar o meu anel de noivado.
— Emma! — Digo animada e me abaixo para abraçá-la. —
Meu Deus! Você está enorme. — E cada vez mais parecida com
a sua mãe, penso.
Mesmo que eu tenha visto alguns dias atrás, não me dei
conta do seu tamanho, pois, não lembrava de como era antes.
Está linda demais.
— Você está curada, Linda? — Ela pergunta, curiosa,
acredito que Michael tenha conversado com ela.
— Sim, querida.
— Então você nunca mais vai ir embora?
Encaro Michael de soslaio e me pergunto se esse encontro
não foi armado.
— Vou, mas eu volto.
— Ahh! — Ela resmunga e cruza os braços, fazendo beiço,
tento não rir da sua expressão fofa.
— Emma. — Michael chama, repreendendo-a.
— Mas, papai, ela acabou de chegar e não vai ficar... —
Ela fala com os olhos se enchendo d’água. Encaro Michael
pasma sem saber o que fazer, ele apenas revira os olhos e diz
inaudível, drama. Me seguro para não rir.
— Você não se livrará de mim tão cedo. — Afirmo
apertando a ponta do seu nariz.
Ela abre um ligeiro sorriso e sai do quarto gritando: A Linda
vai ficar! A Linda vai ficar!
E de lá debaixo ouvimos Dylan advertindo-a para ela não
descer os degraus correndo.
Crianças e o dom de entenderem o que bem querem.
— Ela está linda.
— Linda e manhosa.
Pego na mão do Michael antes que ele volte ao assunto e o
puxo em direção à saída. Preciso encontrar aquele anel ainda
hoje!
Ao chegar nos degraus, paro abruptamente ao vê-los
sentados na sala, os dois olham para mim, inexpressivos e sinto
um rebuliço iniciar no meu estômago. Seguro com força no
corrimão e desço os degraus com Michael logo atrás de mim.
— Linda! — Emma fala cortando aquele maldito silêncio. —
Veja como Fiona está grande, também. — Ela diz me trazendo a
cachorra no colo com esforço.
— Está enorme, assim como você. — Comento alisando as
compridas orelhas da cachorra e de repente me lembro de Snow
e meu coração se espreme.
— Lindara. — Dylan chama ficando de pé e Beatriz faz o
mesmo.
Encaro ambos, impassível e sem sorriso.
— Como você está? — Beatriz, questiona, parecendo
levemente preocupada.
— Estou bem. — Digo e Michael passa o braço em volta da
minha cintura chamando minha atenção.
— Está com fome? — Ele pergunta, talvez nem ele esteja
suportando esse embaraço.
— Sim. — Honestamente não estou, mas para sair desse
constrangimento eu diria qualquer coisa.
— Lindara. — Dylan chama de novo quando Michael me
puxa em direção à cozinha, seus lábios se entreabrem como se
tivesse refletindo. — Me perdoe, por tudo que eu disse. Eu sinto
muito de verdade.
Suspiro.
— Mágoas passadas, Dylan. Todos temos muito o que
esquecer.
Ele dá um sorriso fraco e concorda.
Se fosse antigamente eu ficaria tentada a deixá-lo
confortável com a situação, mesmo que o erro tenha sido dele,
mas depois de tantas falhas, minhas, percebi que precisamos
aprender a conviver com os erros.
Sigo Michael para a cozinha e encontro Joana atrás da ilha,
ela me recebe com um largo sorriso, era disso que eu precisava.
Dou a volta até ela, que seca as mãos no avental rapidamente
para me abraçar.
— Bom tê-la de volta, menina.
— Obrigada, Jo. É ótimo estar de volta.
Sento-me à mesa ao lado da Emma, com Michael à nossa
frente. Está tudo tão perfeito, na medida do possível óbvio. Que
me faz pensar: até quando isso irá durar?
— Você caiu na apresentação do dia das mães. — Emma
comenta de repente, me pegando desprevenida.
— Eu havia torcido o tornozelo, meses atrás. — Explico.
— Ficou com vergonha, Linda? — Ela questiona, Michael
me lança um olhar como se pedisse desculpas pelas perguntas
da menina, seu celular apita e ele começar a digitar algo em
seguida.
— Não, querida. Às vezes acontece de escorregar e cair.
— E o homem que a pegou do chão é seu pai?
Ai ai ai, Emma!
Sinto o olhar do Michael parar em mim, mas mantenho o
meu na Emma.
— Não, meu pai faleceu junto com minha mãe, há muito
tempo atrás. — Falo na tentativa de mudar de assunto.
— Você não tem pais? — Emma pergunta surpresa e me
sinto aliviada.
Explico para ela de uma forma menos perturbadora o que
aconteceu e a garota mostra empatia, segurando minha mão por
cima da mesa e depois escorando sua cabeça em meu braço.
— Eu não vou mais fazer balé. — Aviso aos dois, Michael
abre a boca, mas se cala me dando a chance de explicar. — Eu
amo o balé, mas estou começando a odiá-lo, não estou
conseguindo acompanhar a turma.
— Pensei que fosse o seu sonho, Lindara.
— Os sonhos mudam conforme a gente cresce.
Ele assente e não discute.
Joana traz os nossos pratos e se retira em silêncio. Michael
se oferece para cancelar minha matrícula no conservatório, assim
eu não teria que ir até lá. Vou sentir falta dos meus colegas,
mesmo já fazendo muito tempo que não os vejo.
Michael recebe outra mensagem, mas dessa vez fica sério.
— O que foi? — Quero saber.
— Preciso voltar ao trabalho.
— Me dá uma carona? — Me coloco ao seu lado.
— Pensei que fosse ficar aqui. — Ele diz com o cenho
franzido.
— Vai fazer beicinho também, manhoso? — Questiono
tirando uma gargalhada dele. — Eu preciso de roupas limpas e
eu não disse que ficaria. — Esclareço, ele assente desanimado.
Enquanto Michael pega alguns documentos no escritório o
aguardo lá fora. Dylan e Beatriz foram embora sem se despedir,
ainda bem, não preciso de mais drama na minha vida.
Encontro à tropa do lado de fora. Axel e Mark estão ao
lado do Tesla, Blake e Harrison ao lado do Audi com a babá, que
me encara surpresa.
— Olá, vadias. — Digo tirando risos até do Axel.
Converso com os seguranças o mais naturalmente
possível, as coisas precisam voltar a ser como eram antes, mas
não abro mão da minha privacidade e Michael terá que aceitar
isso. Não vou andar com seguranças. Franz... eu mal o conhecia,
mas morreu por um erro meu.
— Vamos. — Michael surge às minhas costas trazendo
Emma nos braços.
Despeço-me da menina e dos demais e entro no Tesla.
— Preciso de um favor. — Falo e ele me encara com
atenção. — Quero viajar para o México assim que possível, Betty
Hendricks mora em Guatemala, mas não tenho ideia de onde.
— Vou pedir para Cassian localizá-la.
— Obrigada. — Sorrio animada.
Aquela pilantra que me aguarde.
Michael estaciona em frente ao edifício e fica observando a
rua por um momento.
— Quer que eu suba? — Ele pergunta.
— Não, precisa. — Solto o meu cinto e lhe dou um beijo
demorado.
— Senti falta disso. — Ele diz contra meus os lábios e puxa
a minha mão para o centro das suas pernas. — Com um beijo,
você me deixa assim. — Coro ao sentir o seu pau duro contra o
fino tecido da calça.
— Talvez você devesse subir, sabe, para acalmar o bicho.
Michael gargalha.
— Infelizmente, preciso trabalhar. — Ele informa e eu faço
beicinho. — Axel pode ficar, caso precise de algo. — Ele oferece
e seus olhos azuis brilham em persuasão.
— Não. — Digo lhe dando um breve beijo e saio do carro.
Michael desce a janela do passageiro e me encara
sorrindo, aceno para ele e subo para o meu apartamento.
Caso precise de algo, penso rindo. Eu preciso é de paz e
sossego, não de alguém na minha cola. Entro no apartamento e
está vazio, fico aliviada, faz tempo que não fico sozinha.
Interfono para o porteiro e peço para não deixar ninguém
subir sem me avisar.
Tomo um banho sem pressa, pensando na noite de ontem.
Sexo com o Michael… não existem palavras no mundo
para descrever o quanto é maravilhoso. Parece que ele foi feito
sob medida para mim. O corpo dele é tão quente e firme nos
lugares certos, que só de pensar faz um calor se alastrar pelo
meu corpo.
Saio do banho me sentindo mais suja do que quando
entrei.
Coloco um vestido azul de alcinhas e começo a busca pelo
bendito anel.
Retiro as roupas do armário e verifico em cada cantinho
dele, nas gavetas, nos casacos, nas malas, até nos sapatos em
baixo da cama e nada de encontrá-lo.
Estou suada e irritada, então resolvo parar e mandar uma
mensagem a minha irmã.

Lindara: Socorrrrrro! Perdi meu anel de noivado!


Envio e caminho, cabisbaixa, até o meu quarto e começo a
dobrar e a guardar as roupas.
Sem demora entra uma mensagem.
Micaela: Cacete, Lindara! Só você para conseguir perder
um anel daquele tamanho.
Ela continua digitando, mas para na hora que eu envio:
Lindara: Não te contei para ser criticada! Procura nas
bolsas e nos bolsos dos casacos que eu dei a você.
Micaela: Ok. Ele pediu a sua mão?
Questiona com um emoji curioso.
Lindara: Não, mas acredito que vai, por isso preciso do
anel!
Micaela: Hahaha! Pensei que fosse porque ele custa
milhares de dólares.

Ai Senhor! Clamo em meus pensamentos. Eu nunca te pedi


nada... rio incrédula.
Atiro-me na cama e fico encarando o teto, letárgica, sem
saber o que fazer.
Momentos depois recebo uma mensagem.

Micaela: Não encontrei em lugar algum.

Argh! Pulo da cama e volto a guardar as roupas no armário,


de qualquer forma.
— Uau! Passou um furacão por aqui? — Levi questiona na
entrada do quarto.
— Perdi o anel. — Praguejo irritada e jogo as roupas para
dentro do armário.
— Aquele com um grande diamante quadrado, repleto de
pedras em volta?
Paro abruptamente.
— Se está zombando por eu ter perdido um anel daquele
tamanho, pode parar!
Ele arregala olhos.
— Está parecendo uma noivazilla. — Ele diz me fazendo
lhe dirigir um olhar assassino. — Eu sei onde está. — Meu amigo
finaliza com um risinho, mas não me conta.
— Levi... — Choramingo, ele gargalha e sai do quarto, o
sigo para a sala e encontro Alice tomando café à mesa.
— Te dou cem dólares! — Ofereço, ele gargalha.
— O que está acontecendo? — Alice quer saber.
— Eu tenho uma informação que Linda precisa e ela quer
me dar 100 dólares.
Alice gargalha junto dele.
— Eu pedia no mínimo 500, mas pela forma que ela está
atucanada acredito que pagaria até mais. — Alice zomba.
— Não esqueça que você está dormindo no meu sofá. —
Sibilo minimamente irritada e me volto para Levi, que me encara
do outro lado da mesa, com um sorriso nos olhos.
— Me responda uma coisa, então eu conto. — Ele pede,
assinto em concordância, responderia qualquer coisa. — Eu vou
ser o padrinho?
— Óbvio que vai. — Afirmo, me aproximando dele e o
pegando pelos braços de supetão.
— Ela não tem escolha. — Alice cantarola.
— Então... — Ele fala em tom de suspense e fecha a cara
quando aperto seus braços com força. — Na sua bolsa preta!
Cacete, você é forte. — Ele diz rápido, se livrando do meu aperto.
— Fica na mesma divisória do seu remédio. — Levi acrescenta.
Oh, fodeu! Meu cérebro berra para mim.
Amparo o rosto com as mãos, aturdida e sem chão.
— Por que não está feliz? — Ele questiona tenso se
aproximando novamente.
— O meu anel de noivado, está na casa do Dante.
Minha pele queima como se tivesse em brasa, hoje está
uma manhã terrivelmente quente, mas não é por isso que os
cabelos da minha nuca suam, fazendo escorrer pequenas gotas
em direção a minha coluna exposta.
Estou sentada na ponta da mesa do escritório do Michael,
com ele dentro de mim, fazendo movimentos intensos e precisos,
que me obrigo a morder o seu ombro de fora, para conter um
gemido que estou segurando há tempos. Michael me desce e me
vira de costas agilmente. Apoio-me na sua grande mesa com as
mãos abertas e quando sinto seu pau roçar na minha entrada,
empino a bunda e me esfrego nele, que desliza para dentro de
mim com facilidade.
Michael me pega com força pelo quadril e sua primeira
estocada fez um gemido escapar pelo menos lábios, me fazendo
mordê-lo com força para conter os próximos. Ele desce uma mão
para a minha bunda e alisa toda a extensão. Em seguida suas
mãos param próximas das minhas sobre a mesa, colando o seu
corpo no meu e mordendo a minha orelha, provocando um longo
arrepio na minha coluna.
— Michael... — Choramingo impotente, sentindo as ondas
de prazer descarregarem em meu corpo como uma corrente
elétrica, pela segunda vez.
— Que? — Ele sussurra contra a minha orelha com a voz
pesada e passa um braço em volta da minha cintura me
segurando com robustez e com uma última e poderosa estocada
o sinto enrijecer dentro de mim.
Seguro-me na mesa com a respiração falha e as penas
bambas.

Resolvi fazer uma surpresa para Michael no escritório já


que eu mal o vi durante a semana e porque ele pegará o voo em
poucas horas. Quero que se lembre o que estará esperando por
ele quando voltar da capital.
Viro-me para ele e percebo que está com uma expressão
de advertência.
— O que foi? — Pergunto, sem entender.
— Vou barrar suas visitas. — Ele avisa, me fazendo rir. —
Sério! — Reforça, mas seu olhar brilha em divertimento.
— Você não ousaria. — Arqueio uma sobrancelha. — Aliás,
eu não te obriguei a nada. — Esclareço, tirando uma risada dele.
Em seguida coloco meu vestido longo e com fenda na
perna esquerda, que foi muito prático de tirar e Michael me ajuda
pondo os meus cabelos para fora dele.
— Vem comigo e tiramos os seus pontos na capital. — Ele
pede, me abraçando e esfregando sua barba macia em meu
pescoço. Me viro para ele e deslizo as mãos para seus ombros
nus e mexo a cabeça em negação, ele bufa baixinho, mas não
insiste.
— Já ficamos meses separados, o que é uma noite? —
Exponho e me arrependo amargamente.
Tenho fugido das conversas sobre recomeçar de onde
paramos e acredito que Michael está começando a pensar que
não queremos a mesma coisa, mas não posso aceitar sem pegar
a droga do anel de volta. Se ele questionar onde está, o que eu
direi a ele?
Levi me aconselhou a contar, depois que ouviu o meu
plano, mas o que me impede de falar, agora, é querer evitar outra
sessão de socos entre Michael e Dante.
— Eu não quero mais ficar longe de você. Quando voltar de
Albany, você não me escapa.
— Não estou fugindo. — Aviso, arrumando sua gravata. —
Eu vou estar aqui esperando por você. — Digo e lhe dou um beijo
caloroso.
Michael me abraça tão forte que por um momento o
imaginei me arrastando para capital a força.
Entendo a apreensão dele por me deixar sozinha em
Manhattan depois de tudo o que aconteceu, mas vou manter
minha palavra e não vou procurar Dante.
Me despeço dele me sentindo um pouco culpada, pelo que
vou fazer, mas será melhor para todos dessa forma.
Quando chego em casa já está passando do meio-dia,
tomo um banho rapidamente, tentando bloquear os pensamentos
do que pode acontecer de errado. Entro em meu quarto e visto
uma legging e uma blusa preta que eu já havia deixado separada,
horas antes. Sento no sofá para calçar os tênis, com o
nervosismo tomando conta e bem na hora prevista Levi entra
acompanhado da Alice, com uma expressão nada contente. Ele
ainda está aborrecido comigo, por eu ter abandonado o balé sem
dar chance a ele de me fazer mudar de ideia.
— Pronta para o crime. — Alice sibila com um sorriso,
fazendo meu estômago embrulhar.
— Lindara, tem certeza disso? — Meu amigo questiona,
receoso.
— Não. — Digo ficando de pé. — Você tem uma hora, Levi.
Coma alguma coisa. — Aviso, ele mexe a cabeça em negação,
sua expressão de temor deve ser o reflexo da minha.
Entro no meu quarto e pego a mochila com os 132 mil
dólares, que eu havia separado mais cedo, antes de ir visitar
Michael, que a esta altura já deve estar indo para o aeroporto,
assim eu espero.
Pego também o meu celular e me aproximo do Levi, que
está escorado no balcão da cozinha, devorando um pedaço de
bolo de chocolate com menta.
— Ligue. — Peço, dando a ele o meu antigo telefone, que
Dante fez questão de entregar ao Levi no Conservatório.
Minha bolsa ele não levou, cachorro!
Bufando Levi pega o telefone em seguida e arqueia as
sobrancelhas quando o põe na orelha, fazendo meu coração
acelerar loucamente, demora segundos para ele levar um dedo à
boca e me silenciar.
— Não, é o Levi. — Ele fala, mas em seguida, fica em
silêncio por um momento, me encarando decepcionado. — Sim,
ela está bem. Podemos conversar no seu escritório, em meia
hora? — Levi assente, como se tivesse concordando com algo e
encerra a chamada. — Você é terrível! — Ele fala me fazendo
encará-lo boquiaberta.
— Você por acaso ficou surdo quando eu contei o que ele
fez?
— As pessoas erram, ele errou e está arrependido. Você
também errou e o Michael a aceitou de volta.
— Ok. E o que você quer eu faça? Que eu fique com os
dois? Um mês para cada um, será que eles aceitam essa
divisão? — Questiono no auge da irritação.
— Dante eu acho que aceita. — Alice pigarreia, ela está
tomando chá, sentada no sofá e nos observando como se
fossemos sessão da tarde.
— Não estou sugerindo isso. — Ele diz se voltando para
mim, na defensiva. — Devia deixá-lo se explicar pelo menos,
para dar um fim descente a toda essa merda.
— Dante é você aí dentro? — Pergunto ironicamente,
cutucando a sua barriga. — Por favor, devolva a porra do meu
anel! — Peço, fazendo-o gargalhar.
— Pelo menos está engraçadinha. — Ele zomba.
— Eu amo o Michael, Levi. Amo tanto que dói. — Digo
levando as mãos ao peito. — Dói em mim saber que eu fiz tanto
mal a ele e que eu não posso fazer nada para mudar isso.
— Eu não conheço a sua história com ele. Só o que está
na internet. — Ele comenta com um riso.
Puxo Levi pela mão, pedindo concentração, não podemos
perder o foco, não há espaço para erros.
— Preciso de meia hora. Quando sair do escritório me
mande mensagem. — Ele assente.
Entrego a mochila ao Levi e descemos juntos, ambos em
silêncio, perdidos nos próprios pensamentos.
— Se cuide. — Ele pede e em seguida entramos em táxis
separados.
No caminho vou pensando que estou fazendo a coisa
certa, mas se é tão certo por que sinto que estou comento um
crime? Obviamente invadir a casa do Dante não é algo para se
comemorar. Só espero que ele não tenha mudado a senha da
entrada principal e que a Mari ainda esteja de férias.
Senhor, proteja-me. Peço quando desço do táxi em frente à
casa.
A esta altura Levi, já deve estar chegando ao escritório,
preciso ser rápida!
Caminho com passos largos, até a porta branca. Vir até
aqui me traz tantas lembranças, que por um momento penso que
Dante abrirá a porta da frente e me receberá com um beijo e um
abraço apertado. Reprimo as fortes emoções que tentam me
derrubar e me esforço para lembrar somente o que ele tentou
fazer, me separar do Michael.
Paro em frente à porta e observo atentamente aquele
pequeno dispositivo que eu o vi desbloquear tantas vezes,
deslizo meus dedos por eles rapidamente. Não demora um
segundo para ouvir o click da porta se abrindo. Meu corpo relaxa
momentaneamente.
Entro na casa e fecho a porta atrás de mim. Não sei se é o
ambiente, ou o cheiro dele que está por todo o lado, mas
lágrimas brotam em meus olhos.
Adentro mais a casa com o coração explodindo no peito e
quando chego ao pé da escada, Snow está lá em cima de
encarando de volta, ela desce rapidamente e pula com suas
patas na minha barriga.
— Olá, garota! — Falo fungando. — E eu que pensava que
você só queria me lanchar. — Brinco e aliso a pelagem dela que
lambe minha bochecha. — Vem, Snow. — Digo subindo a
escadaria correndo, com ela ao meu lado.
Se ninguém veio me receber, está tudo indo de acordo com
o planejado, só preciso encontrar a bolsa e cair fora daqui.
Chego em frente aquela porta metálica, onde Dante disse
que guarda tudo que é precioso, e ela está entreaberta como da
primeira vez. Não tenho dúvidas de que minha bolsa esteja ali
dentro e não penso duas vezes ao caminhar em direção a ela.
Então meu celular vibra na minha cintura. Pego ele
rapidamente e quando vejo a foto do Michael piscar na tela, meu
coração rompe em desespero.
— Oi.
— Oi! — Respondo alarmada, chamando a atenção da
Snow. Se essa cachorra acuar, eu estou fodida. — Já está
entrando no avião? — Questiono sentindo minhas bochechas
ruborescerem.
— Sim, só liguei para dizer que já estou com saudades. —
Filho da mãe, minha culpa só aumenta, até parece que Michael
está me espiando e vendo que estou fazendo merda.
— Também estou com saudades.
Meu telefone apita com uma mensagem do Levi, ele já
deve ter saído de lá e eu ainda nem comece a procurar a droga
da bolsa.
— Lindara? — Michael questiona.
— Oi...
— Estão chamando o meu voo. Amo você. — Ele desliga e
as mensagens do Levi se abrem na tela na mesma hora em que
eu empurro a porta metálica.
Levi: Saia daí agora!
Levi: Dante não está aqui!

Ele está aqui.

Congelo em frente à porta, ouvindo o meu coração disparar


feito um alarme, sinto minhas mãos incrivelmente frias e minha
face fervendo, me dando certeza que estou com as bochechas
rosadas. É exatamente assim que eu fico quando estou
sensibilizada e agoniada.
Nosso olhar se fixa e milhões de pensamentos surgem em
minha mente enquanto os segundos se passam. O silêncio
preenche o ambiente e pelo visto nenhum de nós tem estrutura
para o que vem a seguir.
Dante está todo de preto, sua aparência continua
impecável, só a seriedade em sua face que para mim ainda é
desconhecida.
— Lindara. — Sua voz sai rouca, ele engole em seco e dá
um passo em minha direção.
— Olá, mentiroso, falso e manipulador. — Cuspo as
palavras sentindo o meu corpo começar a tremer, parece que
meu coração foi parar em minha garganta, pois, até engolir se
tornou impossível.
Dante se aproxima com passos largos, ele para na minha
frente com os ombros tensos e aqueles belíssimos olhos
enigmáticos desapareceram, agora estão tristes, dolorosos,
quase comoventes. Seus lábios se entreabrem como se fosse
pronunciar algo, mas se fecham junto dos seus olhos.
— Quero a minha bolsa de volta. — Exijo, forçando as
palavras saírem da minha boca.
— Eu a devolvo, mas converse comigo antes, por favor. —
Ele pede em um tom angustiante, enquanto estende a mão para
trás e a pega de cima da mesa.
Dou um passo na direção dele e a tomo da sua mão.
Automaticamente passo a alça por cima da cabeça,
posicionando-a contra o peito, para ter certeza que dessa casa
eu não saio sem ela.
— Você teve meses para me contar a verdade. — Dou um
passo atrás e de repente ele me pega pelo pulso.
— Espere... — Dante diz num sopro.
Ainda me segurando, seus dedos deslizam pegando nas
pontas dos meus e bruscamente puxo minha mão da dele.
— Eu nunca tive intenção de fazer mal a você.
— Só ao Michael. Nosso relacionamento nunca se tratou
de mim, apenas de vocês três. Lindsey, Michael e você! —
Exclamo, sentindo o rosto umedecer.
— Não é verdade.
— Por que se aproximou de mim, Dante? — Questiono e
ele engole em seco, permanecendo em silêncio. — Você não
consegue nem responder! — Rosno no auge do nervosismo. —
Sabrina… a carta… foi tudo uma farsa. — Choramingo, limpando
as lágrimas da minha face.
— Eu não sabia que acabaria gostando de você... me
apaixonando por você.
Uma risada me escapa e nessa hora, Dante me pega
abruptamente pelos braços parando a centímetros do meu rosto.
— Você pode até dizer que não, mas sentiu cada toque,
cada sensação da mesma maneira que eu, mas negar é mais
fácil do que aceitar.
Seus lábios se aproximam lentamente dos meus.
— Não faça isso. — Recuo no instante que eu sinto sua
respiração quente em minha boca.
— Me escolha. — Ele pede e meus olhos ardem
dolorosamente. — Fique comigo. — Ele sussurra.
Mexo a cabeça em negação e seu polegar apara uma
lágrima na curva do meu queixo.
— Eu me apaixonei por você... — Admitir isso me machuca
assustadoramente. — Mas é ele quem eu amo... sempre foi ele.
— Me dê mais tempo e você me amará também. — Nego
novamente e sinto o aperto em meu braço afrouxar.
— Tudo que começa com uma mentira, não tem chances
de acabar bem.
— Lindara… — Dante fala com a voz carregada de aflição.
— Isso precisa parar aqui. — Aviso exasperada e limpo as
lágrimas com as mãos rapidamente. — Apesar de tudo eu quero
que seja feliz Dante e quero que me deixe ser feliz.
Os lábios de Dante se entreabrem, mas ele não pronuncia
nada, apenas os fecha silenciosamente.
Deixo o escritório com passos largos e corro quando chego
às escadas, sentindo o meu corpo vacilar e pontadas de dores
em lugares inimagináveis. Preciso sair daqui, penso no mesmo
instante que enxergo a porta e de repente ouço alguém esmurrá-
la me fazendo dar um pulo.
Abro-a com as mãos trêmulas.
— Eu estava quase tendo um treco, Lindara! — Levi rosna,
mas depois enruga o cenho com uma expressão de pesar.
— Vamos embora. — Sussurro, estarrecida.
Levi lança um olhar por cima do meu ombro e aperta os
lábios tristemente, coloco a mão em seu peito o conduzindo para
trás. Quando me volto para fechar a porta, Dante está me vendo
ir embora e no momento que o meu olhar encontra o dele, me
vem à mente flashbacks de todas as situações que passamos
juntos. Dos seus olhares de reprovação e persuasão e dos seus
sorrisos tortos e sexys.
Levi puxa a minha mão, me tirando daquela profunda
nostalgia.
Me solto do meu amigo e corro para dentro da casa sem
pensar e só me dou conta no momento que o meu corpo bate
contra o do Dante, com força.
Seus braços me envolvem rapidamente com um forte
aperto, relaxo por um segundo em seu peito e respiro
profundamente.
— Adeus, Dante. — É tudo que eu consigo dizer antes de
sair destruída da casa.
O formigamento que ainda sinto em minha cabeça depois
de tirar os pontos, está começando a me irritar, além do Levi que
fica perguntando como estou a cada dez minutos. Com certeza,
já tive noites piores, só não lembro de nenhuma delas agora.
— Tem certeza que quer fazer isso? — Ele questiona
enquanto esperamos o meu embarque para a capital.
Depois do que ocorreu ontem com Dante, não tenho
dúvidas sobre isso.
Michael merece tanto e eu mereço também. A vida não
devia ser apenas sobreviver, pois, é assim que eu nos vejo, em
uma luta constante para ficarmos juntos.
— Passei a semana inteira organizando essa viagem, acha
que eu vou desistir por causa de ontem?
Meu amigo assente, temeroso por mim.
Ah, ontem depois que cheguei em casa, me atirei na cama
e fiquei paralisada tentando colocar os pensamentos em ordem,
Dante parece que se infiltrou em minha mente, pois, tudo o que
eu conseguia ver e pensar era nele e no estado em que o deixei.
O que aconteceu noite passada definitivamente não estava
nos meus planos. Passei a semana organizando uma surpresa
para o Michael e pensando agora está parecendo mais um ato de
desespero.
Me despeço do Levi e entro no avião assim que anunciam
o meu embarque. Trouxe comigo apenas uma pequena bolsa e o
anel de noivado.

O voo ocorre tranquilamente, graças a Deus! E estar tensa


por inúmeros motivos me ajuda, pelo menos, esquecer que estou
dentro de um caixa metálica com mais de 600 toneladas no ar.
Com a minha sorte, é quase inusitado esse avião ter pousado
sem explodir. Rio, com esse pensamento, enquanto entro em um
táxi.
Ontem de manhã quando fiz a visita ao escritório do
Michael, aproveitei e obriguei Éster me passar o percurso da
viagem dele, Michael deve estar no hotel a esta altura. Liguei
para ele ontem à noite, antes de dormir, estava me sentindo
atordoada, ainda estou, na verdade. Michael soube pela minha
voz que tinha algo de errado e eu nem tentei negar. Então ele me
disse a temível frase: Conversamos quando eu voltar. Segurei a
ansiedade de correr para o aeroporto e vê-lo ontem à noite
mesmo.
No caminho vou observando a cidade, por mais que não
fique tão longe de Manhattan é estranho viajar sozinha para um
lugar desconhecido.
Ao chegar no grande hotel, adentro pensando no que dizer,
já que eu fui contra a tudo que ele me pediu.
O Golden Hills é um prédio espetacular, com o formato
excêntrico, escuro e espelhado em algumas partes. Entro no
saguão de cabeça baixa, as pessoas estão todas muito bem
arrumadas, com ternos e vestidos sofisticados, enquanto eu optei
por um vestido branco, com alças finas e saia rodada na altura da
coxa.
Passo pelo amplo hall e entro no elevador em seguida. Um
funcionário do hotel me questiona qual o andar e eu me gaguejo
toda ao falar.
Meu coração parece uma britadeira em meu peito, a
ansiedade para vê-lo está fazendo minhas mãos começarem a
suarem frias.
Desço em um corredor bem iluminado com poucas portas,
caminho com pressa até a suíte dele e fico a encarando por um
longo momento, tensa. Forço um sorriso, mas as musculaturas
das minhas bochechas não colaboram. Inferno!
Mesmo com receio do que eu posso vir a perder, bato duas
vezes e aguardo.
A porta abre em segundos e o semblante de preocupação
do Michael é perceptível, e muito compreensível. Ele não diz
nada apenas sai do caminho para me dar passagem. Passo por
ele adentrando o grande quarto, com uma cama já estendida e
sua mala em cima do sofá. As cortinas, que dão vista para a
grande cidade, estão abertas deixando o ambiente claro e
sereno. Ao contrário de mim.
Solto minha bolsa em cima de uma pequena mesa redonda
de vidro escuro e me viro para ele.
— O que você fez, Lindara? — Ele pergunta com uma
expressão incompreensível.
Firmo os pés no chão e solto o ar lentamente esperando a
coragem aparecer.
— Eu preciso que me escute, sem me interromper. — Digo
após um suspiro. Michael mexe a cabeça em negação, frustrado,
ignoro o seu gesto e dou um passo em sua direção. — Eu devia
132 mil dólares ao Dante. — Falo e ele estreita os olhos em
preocupação. — Levi levou esse dinheiro para ele no escritório,
enquanto isso eu invadi a casa do Dante para buscar minha bolsa
e ele estava lá. — Aperto os lábios.
Cristo! Quanto mais falo, mais parece uma invenção
absurda da minha cabeça.
Michael passa uma mão pelo cabelo respirando fundo, ele
se vira de costas e seus ombros estão rígidos sob o paletó, quero
tocar nele para acalmá-lo, mas não tenho certeza se é uma boa
ideia.
De repente ele se volta para mim, com a sua face
vermelha, ele está furioso, parece que está prestes a explodir.
— Você foi até lá por causa de uma bolsa, Lindara? — Ele
diz e sua voz aumenta gradativamente em irritação. — Não acha
que está enganando a si mesma com esta história? — Ele
prossegue, ficando cada vez mais sério.
— Eu fui até lá para... — Michael ergue um braço pedindo
para eu me calar.
Cerro o maxilar e obedeço.
— Acabou — Ele fala e me questiono se é uma pergunta
ou uma afirmação.
Eu estou perdendo ele, é tudo que me vem à mente.
— Michael... — Pronuncio com a voz arranhada, me
sentindo quebrada.
Isso não pode estar acontecendo depois de tudo que
passamos.
— Eu te pedi uma única coisa. — Ele ressalta fazendo o
sangue fugir do meu rosto. — Você nunca me ouve! — Ele diz
friamente e sinto um tremor percorrer o meu corpo. Michael dá
um sorriso fraco e mexe a cabeça em negação. — É teimosa. —
Ele enfatiza e engole em seco, sua língua umedece os lábios e
então o vejo exalar. — Acabou, Lindara? — Ele questiona
novamente, mas com clareza.
O ar parece volta a encher os meus pulmões com
facilidade.
— Não quero ficar me preocupando com o pode vir
acontecer hoje ou amanhã. Não quero uma mentira perfeita,
apenas me diga a verdade.
— Eu estou dizendo a verdade. — Falo sentindo um ardor
na garganta.
Um silêncio ensurdecedor toma conta do quarto, nossos
olhares se fixaram por um momento, ele me olha com uma
expressão de mágoa e consternação. Daria tudo para saber o
que está passando na cabeça dele.
Respiro fundo e o abraço forte pela cintura o pegando
desprevenido. Escoro a testa em seu peito e momentos depois
Michael relaxa em meus braços.
— Não fique com raiva de mim. — Peço e o encaro de
baixo, fazendo sua barba roçar na ponta da minha cabeça. Ele
exala baixinho, como se tivesse sido derrotado e passa os braços
em minha volta.
— Por que você faz isso comigo? — Ele sussurra e aperta
os lábios com força. — Precisamos conversar sobre o modo que
você resolve os problemas... — Ele se distancia de mim, levando
todo o seu calor e o seu odor consigo — Pare de mentir para mim
quando for resolvê-los. — Ele fala calmo e me sinto enrubescer
sob o seu olhar.
— Não vou esconder mais nada de você e espero que você
faça o mesmo.
— Eu sempre fui sincero, Lindara.
— Não foi e eu não estou falando de quando eu perdi a
memória. — Respiro fundo, me questionando se essa é uma boa
hora para tocar nesse assunto. — Você o odeia tanto e nunca
quis me explicar o porquê.
Michael fica tenso novamente e limpa a garganta
sutilmente.
— Eu minto e você me esconde coisas. — Comento.
Talvez sejamos o casal perfeito, penso.
— Além de ele tê-la roubado de mim com mentiras e
invadido o meu casamento, tem outro motivo pelo qual eu o
desprezo. — Ele fala com a expressão ilegível, mas o tom da sua
voz me assusta um pouco.
Michael senta na ponta da cama, pensativo, olhando para o
horizonte além da janela.
— Giancarlo Armstrong, o pai do Dante, pertencia a uma
organização de advogados criminalistas, que fica na Sicília.
Michael me encara brevemente e volta-se para suas mãos
entre as pernas.
— Essa organização foi criada no intuito de defender
apenas criminosos de alta classe, chefe de gangues, máfia e por
aí vai. Dante não mencionou isso a você? — Ele pergunta.
Faço que não silenciosamente.
— Comentou apenas que foi assassinado e que preferia
não tocar no assunto. — Exponho um pouco confusa.
— Não há muito que dizer sobre um homem que só
defendia a pior espécie do planeta. — Michael cospe as palavras,
anojado. — Giancarlo, foi assassinado um ano depois que
venceu um caso de violência contra uma menina de treze anos.
— Um sorriso fraco escapa pelos lábios dele, como se tivesse
abismado que aquilo tivesse acontecido.
— Michael... — Falo completamente perdida e sem
entender onde ele quer chegar.
— Treze anos! — Michael exclama e sinto sua indignação.
— O julgamento se prolongou por meses e por falta de provas da
promotoria, o réu foi absolvido. — Ele mexe a cabeça em
negação, furioso.
— Isso é terrível. — Digo, ainda sem entender onde Dante
é o culpado nisso.
— Dante cursou Direito para seguir os passos do pai, mas
mudou para Empresarial, depois que Giancarlo foi assassinado
pelo pai da menina.
— Você o despreza, por algo que ele podia ter se tornado,
mas Dante não é como o pai dele. — Michael se põe de pé e
anda até a janela.
— Dante não tem caráter e nem integridade, ele não mede
as consequências, passa por cima de tudo e foda-se quem
estiver no caminho.
Michael se volta para mim, com a expressão dura, então
olha para o horizonte novamente e diz calmo:
— Pense o que quiser, Lindara. Só não toque mais nesse
assunto, por favor.
Suspiro.
O que ele contou a respeito de Giancarlo me entristeceu e
mesmo não querendo me aprofundar nisso, meu cérebro parece
que insiste em fazer o contrário. Aos olhos de uma leiga, em lei,
não consigo sentir raiva ou aversão por algo que Dante não se
tornou. Ele é gentil, carinhoso e engraçado com todos, é difícil
imaginá-lo defendendo um criminoso em troca de dinheiro.
Michael se volta para mim e a claridade de céu ensolarado
bate em minha face.
— Não vou questionar mais nada que tenha a ver com ele.
— Falo e ele assente, me olhando intensamente.
Meu telefone toca com uma mensagem dentro da bolsa,
cortando o nosso contato.
Verifico a mensagem, é o Levi.
Levi: Então, deu tudo certo?
Lindara: Não. Ligo mais tarde, me deseje sorte. Beijos.

Solto o telefone e pego o anel, talvez agora ele me ouça.


Michael permanece de costas para mim, debruçado sobre
a janela, caminho até ele segurando o anel com firmeza. Cutuco
as suas costas e quando ele se vira, fico de joelhos em sua
frente, ele me encara confuso e com as sobrancelhas juntas.
— Casa comigo? — Pergunto com a mão estendida e o
anel dentro da minha palma, a mostra.
Acredito que ele abre o maior sorriso que consegue então
se ajoelha na minha frente, surpreso e admirado eu diria. Michael
pega o anel da minha mão e ainda olhando em meus olhos ele
desliza em meu dedo com um gesto simples.
— Sim. — Ele afirma fortemente e nos dois sorrimos e nos
abraçamos em seguida.
Michael se levanta e me puxa para os seus braços em
seguida e assim ficamos um bom tempo em frente à janela vendo
o sol de dissipar no horizonte.
Quando o céu começou a se tornar um tom mais
acinzentado, o seu telefone começa a tocar, chamando-o de volta
ao trabalho. Ele fez ligações e mandou alguns e-mails, enquanto
eu olhava as estrelas começarem a surgir.
— Podemos ir embora? — Pergunto, ao me sentar na
cama e observá-lo a folhar alguns papéis.
— Ainda não, Emma. — Ele zomba do meu tédio, me
fazendo rir.
Coloco-me de pé e começo dançar em volta no quarto, giro
em torno dele e pulo para cima do sofá, em seguida me jogo na
cama e Michael nem sequer desvia os olhos dos papéis.
Emma já deve tê-lo feito criar um bloqueio para esse tipo
de situação.
Fico em pé em cima da cama e abro o zíper invisível do
meu vestido que fica na lateral do corpo, o tecido escorrega
facilmente se amontoando aos meus pés. Noto que Michael faz
um esforço grande para não olhar, até eu pular da cama e
começar a rodar apenas de calcinha e sutiã pelo quarto.
— Você venceu. — Ele larga os documentos rapidamente e
me encara com um sorriso exorbitante.
— Não sabia que estávamos jogando. — Debocho quando
ele vem em minha direção e tenta me pegar, mas eu dou uma
cambalhota no colchão e apanho o meu vestido, parando do
outro lado.
— Podemos dar uma volta pela cidade?
— Claro, eu não preciso trabalhar mesmo. — Ele diz
sarcástico e sem pensar eu pego um travesseiro e atiro na
cabeça dele. Michael me olha boquiaberto, me fazendo encará-lo
com a sobrancelha arqueada, com uma expressão de: você não
teria coragem.
Mas ele teve. Michael pula em cima da cama tão rápido,
me dando um puta susto, eu mal tenho tempo de piscar quando
sinto o travesseiro descer forte sobre a minha lombar, me
fazendo cambalear para o lado e cair em cima do sofá.
Cruzo os braços em frente ao peito e o encaro chocada.
Cerro o maxilar para não rir da situação e do semblante de
preocupação dele.
— Você é mais leve que uma pluma. — Ele tenta justificar
sem rir e se agacha em minha frente se a firmando em meus
joelhos com a face rubra.
— Isso vai ter volta. — Aviso com uma risada.
— Mal posso esperar. — Michael me dá um beijo
demorado e antes que as coisas esquentem, me coloco de pé.
Enquanto eu me arrumo, ele faz uma chamada de vídeo
com Emma, que se queixa por não ter vindo junto quando soube
da minha surpresa. Então Michael promete a ela que na próxima
viagem que não fossem a negócios, ela iria junto.
— Vamos?
Faço que sim, e ao adentramos o elevador, Michael me
pega analisando o anel.
— Você foi buscá-lo, não foi? — Ele pergunta de repente.
Assinto com um sorriso.
— Me desculpe por ser tão inseguro. — Ele diz e em
seguida beija o dorso da minha mão.
— Me desculpe por ser tão teimosa. — Falo e seus lábios
curvam em um sorriso maravilhoso.
O abraço com firmeza, se pudesse nunca mais o soltava.
— Admito que eu amo muito isto em você. — Michael beija
a ponta do meu nariz e acrescenta: — E pensando bem eu não
devia ter dito isso.
— Não devia! — Rio me sentindo feliz e repentinamente
me sinto um pouco culpada.
Magoei tantas pessoas para chegar onde estou agora, sofri
igual um cão durante meses e por mais que eu sinta que não
devo ficar chateada por esse sentimento de felicidade, existe um
pedaço de mim que diz que eu não mereço nada disso. Talvez
seja só a minha autopiedade falando, ou o medo de que tudo isso
seja passageiro como muitas outras vezes.
Como posso confiar na felicidade se ela sempre vai
embora?
O telefone do Michael começa a tocar e sou obrigada a
largá-lo. Ele se afasta de mim para atender e apenas fico
observando-o.
— Senhor governador. — Ele saúda. — Ainda estou na
capital… — Michael me fita brevemente e aperta os lábios como
se tivesse indeciso. — Quem estará lá? — Ele questiona,
provocando um rebuliço no meu estômago, lhe dou um sorriso
forçado na hora que ele me olha novamente. — Perfeitamente,
senhor. Estaremos lá.
Esmoreço por dentro, mas sorrio por fora, quando ele se
volta para mim.
— Andrew nos convidou para um jantar. — Michael aperta
os lábios, não parece muito contente.
— Por que não disse não?
— Ele só quer agradecer os serviços, e a sua esposa Alma
estará presente.
— Acho melhor eu ficar no quarto, não me encaixo no
padrão social e sempre falo um palavrão sem querer.
— Dane-se eles, você vem comigo. E depois do jantar te
mostro a beleza da cidade e toda a sua grandeza.
Não sei porque, mas senti malícia nisso.
Descemos conversando em uma tranquilidade maravilhosa.
Nem parece que eu cheguei nesse hotel quase tendo um infarto e
agora estamos indo jantar com um político depravado. Não
entendo como Michael tem estômago para isso, nesse momento
preferia não saber o motivo que o governador precisou do serviço
dele, ainda mais indo jantar com a esposa presente, o que me faz
questionar se ela sabe.
A noite está linda e estrelada, caminhamos sem pressa por
uma longa rua movimentada.
— O que foi? — Pergunto, quando o pego me olhando pela
quinta vez. Ele pigarreia como se estivesse ponderando algo. —
Fale! — Insisto.
— Nós não chegamos a conversar sobre o que fizeram
com você naquele depósito. — Ele diz com uma expressão de
culpa. — Agora que se lembrou, se quiser me contar algo... —
Ele fala devagar como se estivesse buscando as palavras certas.
— Eu estou bem, não aconteceu nada de grave.
O sequestro é uma das coisas que eu venho evitando
pensar desde que recuperei a memória, a sensação de ser
arrastada e jogada dentro daquela van ainda me causa calafrios.
A dor lancinante que senti na hora que Saymon me socava, ou
quando pensei que Phenix e Saymon fossem-me... ahh, sinto
repulsa só de pensar.
— Lindara? — Ele chama e me segura no lugar.
— Oi.
— Eu estou aqui, caso queira conversar. — Ele sugere,
apenas concordo. — Chegamos. — Avisa.
Desvio meus olhos para o restaurante, as portas de vidro
estão abertas para trás e o interior está movimentado. Michael
adentra em minha frente em silêncio, ele sorri para a
recepcionista que mostra reconhecimento no mesmo instante, em
seguida seus olhos curiosos param em mim com uma expressão
de especulação.
Michael me puxa pela mão e me guia como se já
conhecesse bem o lugar. O restaurante é luxuoso e formidável,
parece ter saído de um filme de época. As paredes são de
madeira escura e as mesas claras, com cadeiras esverdeadas e
outras vermelhas. Há um bar no canto e uma larga escada de
madeira ao seu lado, com os degraus bordo.
Michael sorri e acena brevemente para um casal além do
bar.
Alma usa um vestido branco e o cabelo loiro dourado está
preso em um coque apertado, os dois aparentam estar na casa
dos cinquenta anos e o governador é como qualquer outro velho
rico. Bem-arrumado e de cabelos grisalhos.
— Michael, o que eu vou conversar com eles? — Pergunto
e ele não para de andar, mas sibila:
— Ela ama caridade e ajudar os necessitados, e ele... —
Michael aperta os lábios, pensativo, até posso adivinhar o que ele
esteja pensando, mas não ouso dizer em voz alta. Chegamos à
mesa antes mesmo dele conseguir responder.
O governador e a sua esposa se colocam de pé, Michael
nos apresenta brevemente. Comprimento a primeira-dama com
dois beijos na bochecha e o governador beija o dorso da minha
mão, me causando um arrepio estranho que eu desejaria não ter
sentido.
Me sento de frente para a mulher que me encara com um
sorriso jovial.
— Deixarão a cidade hoje? — Andrew questiona e Michael
me lança um olhar.
— Amanhã, hoje é a primeira vez da Lindara na capital.
O casal me encara surpreso.
— Estou ansiosa para conhecer a cidade. — Explico.
— Albany não é dotado de monumentos, igual à
Manhattan, mas também temos nosso tesouro aqui. — A mulher
fala e não consigo deixar de reparar em como ela é elegante,
mesmo sem usar joia a vista, ela exala sofisticação apenas com a
postura e o olhar.
— Aceito sugestões. — Digo acanhada.
A primeira-dama assente animada, ela tem o sorriso
bondoso e parece mesmo ser o tipo de pessoa que gosta de
amparar os necessitados, e antes mesmo de o garçom pegar os
nossos pedidos eu já estava mais à vontade conversando com
ela.
Alma, contou-me a respeito das cerimônias públicas e
organizações sociais que participa para arrecadar dinheiro para
as ONGs, instituições de apoio e orfanatos. Eu achei tudo muito
interessante e triste ao mesmo tempo. Mencionei onde cresci e
os dois ficaram surpresos, tanto por eu ter crescido em um
orfanato e pela primeira-dama conhecer o lugar. Ela percebeu o
meu interesse e me convidou para o próximo evento, e eu aceitei
de bom grado.
Quando o jantar chegou ao fim, estava relaxada e animada.
Michael e o governador apenas nos olhavam rir sem entender
nada, parecia até que nos conhecíamos há anos.

— Sentiremos sua falta aqui na capital, Michael. — Andrew


comenta, na hora que paramos do lado de fora do restaurante.
— Lindara está tirando ele de nós. — Alma diz sorrindo,
fazendo o governador assentir decepcionado, mas com um
sorriso no olhar.
— Lamento. — Aperto os lábios com pesar. — É isso que
acontece quando o passarinho resolve sair da gaiola. —
Acrescento, olhando para Michael que enrubesce rapidamente,
fazendo a primeira-dama dar uma risada maravilhosa. — Nós
voltaremos. — Prometo aos dois, que pelo visto prezam muito o
meu noivo.
Olho para Michael, maravilhada, não há como não amá-lo.
Na sacada da suíte principal eu observo o pôr do sol em
silêncio e tento ignorar a fileira de carros logo abaixo do meu
nariz. Eu não podia estar mais feliz. Tudo está se encaminhando
para o seu devido lugar, mas tenho carregado uma sensação de
que algo ruim vai acontecer e parece que vou levar isso comigo
para sempre. Provavelmente é só a minha cabeça pregando
peças, já que na última festa de noivado, ocorreu uma tragédia
atrás da outra.
— Devo me preocupar? — Micaela questiona, ao me ver
debruçada sobre a balaustrada.
Viro-me com um largo sorriso e encaro minha irmã
radiante, usando um vestido esvoaçante de alcinhas na cor
verde-pinho.
— Sim! Em não parir esse bebê hoje à noite.
Ela sorri e alisa a volumosa barriga.
— Não acredito que você vai viajar amanhã sabendo que
eu posso dar à luz a qualquer momento. — Mica diz cruzando os
braços e fazendo beiço.
— Tente me entender. — Peço acariciando o seu ventre e
sinto o bebê se mexer sob minha mão, é estranho e encantador
ao mesmo tempo. — Voltamos o mais rápido possível.
Ela assente, nada feliz.
— Como estão os ânimos lá embaixo?
— Ansiosos e curiosos. Afinal ninguém imaginou que
fossem noivar novamente, sabe… depois de tudo.
Em outras palavras, depois do Dante.
Já faz dias desde que invadi a casa dele e às vezes me
pego pensando na forma em que tudo começou, e na maneira
ruinosa que acabou. Inferno! Como eu julguei a Lindsey e acabei
fazendo exatamente igual?
Passei dias me sentindo deprimida e cansada, como se o
passar do tempo me desse outra perspectiva de tudo que eu fiz,
consegui enxergar plenamente como eu fui desprezível e
estúpida inúmeras vezes, e além de todos esses sentimentos
infelizes, voltei a ter pesadelos, principalmente com o sequestro,
cada vez mais nítidos e sombrios.
Estava começando a deixar Michael preocupado, ele com
certeza está lidando com tudo melhor do que eu.
Para minha surpresa, fiz uma visita inesperada ao Dr.
Giordano, desejando que ele de alguma forma fizesse sumir o
sentimento que me assolava.
A culpa que eu sentia estar carregando era descomunal.
Era o tipo de culpa que parecia estar presente em forma de peso
sobre os ombros. Enfim, depois de uma longa conversa e muitas
lágrimas, ele disse que preciso me perdoar e com o passar do
tempo ficaria mais fácil.
— Você não vem? — Michael pergunta na entrada do
quarto.
— Estava esperando por você. — Aviso com um sorriso,
ele caminha até nós na sacada.
— Quanto mais rápido nós descermos, mais rápido eles
vão embora e ficamos a sós. — Ele diz com um olhar tentador.
— Que receptivo esse meu cunhado. — Micaela zomba e
se retira lentamente do quarto.
— Você está bem? Porque se não tiver eu posso mandar
todos irem embora.
— Só estou ansiosa com amanhã.
Ele me puxa pelos braços e me pega pela cintura.
— Amanhã resolveremos tudo. Não se prenda a isso só
ficará mais ansiosa.
— Está certo.
Ele assente convencido e quando vai me beijar, Emma
entra correndo no quarto.
— A tia gorda mandou chamar vocês.
Michael a repreende pelos maus modos na mesma hora.
Descemos os três. Emma, como sempre, apressada saiu
correndo em nossa frente.
Nesses últimos dias, passamos muito tempo juntas, eu
dormi aqui a maior parte do tempo, então, quando Emma voltava
de alguma aula eu dispensava a babá e ficava apenas nós duas
até o Michael chegar. E foi ótimo passar esse tempo com ela.
Assistimos a filmes e comemos muitas guloseimas. Ajudei-a com
as atividades das escolas e até a tomar banho, enquanto Emma
fofocava o que aconteceu enquanto eu não estava aqui, me
fazendo rir e querer chorar por ter ficado tanto tempo longe.
Ao chegarmos à escada, a primeira pessoa que entra na
minha linha de visão é o Dylan, ele está aqui desde cedo,
organizou a decoração e o coquetel. Ficou simples e lindo.
Saudei brevemente os convidados, que estão divididos em
grupos. Os amigos do Michael estão juntos com os advogados da
O’Connor & Associados e do outro lado, os seguranças que
querendo ou não, fazem parte da minha vida e não poderiam
faltar. Ao lado deles, Levi e Alice tagarelam animados com
Micaela.
— Uau! Que vestido maravilhoso. — Alice comenta e Levi
assente em concordância alisando o meu tronco em direção à
barriga para sentir o tecido.
Realmente o vestido é fabuloso, na sua cor branca, tão
justo que até parece uma segunda pele. Ele tem uma modesta
fenda e, a única alça que contém, começa do lado esquerdo e
traceja em frente ao meu peito, fazendo o contorno em volta do
meu ombro direito.
— E como andam as coisas? — Levi sussurra curioso.
Semana passada quando ele esteve aqui, me entregou um
recado. Dante foi embora para Seattle e transferiu o escritório
para lá. Me senti culpada, péssima e um pouco aliviada ao
mesmo tempo. Só espero que Dante seja feliz, onde quer que
esteja.
— Não poderiam estar melhor. — Confesso. — Só estou...
— Ansiosa. — Michael advinha atrás de mim, me pegando
de surpresa, olho para ele de cara feia.
— Dessa vez é para valer, então? — Cassian pergunta
parando ao nosso lado.
Direciono um olhar de reprovação para ele, tirando uma
risada do Michael.
— É! Nem que eu precise amarrar essa mulher. — Ele
responde.
— Melhor não, vai que ela goste. — Levi debocha.
— Vocês se uniram para me aporrinhar? — Questiono e os
três se entreolham, e discordam com a cabeça prontamente me
fazendo rir.
Em seguida eu os deixo a sós e vou até à cozinha pegar
algo para beber e encontro Emma comendo o bolo, que ainda
nem foi cortado. Ela me olha com aqueles pequenos olhos azuis
arregalados, a legenda para a expressão da face da menina é:
Fodeu.
Não me aguento e caio na risada.
— Não conte ao papai. — Ela pede, com a ponta do nariz
suja de glacê.
— Eu não vi nada.
Emma assente e sai correndo da cozinha.
Pego um copo de suco em cima da ilha e belisco alguns
canapês, ando faminta ultimamente parece que recuperei o
apetite junto com a memória.
— Lindara. — Ouço um cochicho atrás de mim, engulo o
salgado à força e me viro para Dylan. — Tem um minuto?
Assinto e o sigo para o segundo piso, atrás de mim se
juntam Micaela e Levi. A piranha da Alice ficou paquerando
Harrison e Mark.
Dylan tira uma chave do bolso e abre o seu antigo atelier, o
encaro confusa, ele acende as luzes e o sigo para dentro da sala
quase vazia.
— O que estamos fazendo aqui, Dylan?
Dylan atravessa o quarto e puxa um lençol branco de um
maquinem revelando o mesmo vestido de noiva, que eu havia
provado meses atrás.
— Uau! — Ouço Mica babar no brilhante vestido sereia.
— É seu, se quiser. Podemos tirar as mangas, colocar
decote ou uma calda maior, o que você desejar. — Ele diz
fazendo o meu coração acelerar.
— Ele é… — Me calo na tentativa de encontrar a palavra
ideal.
— Deslumbrante, esplêndido, radiante, exuberante...
— Obrigada, Levi! — Exclamo e meu amigo me dá uma
piscadela. — Ele é tão perfeito que não parece real. — Sussurro
ao me aproximar do manequim.
— Você aceita, então?
— E eu preciso responder? Ele é perfeito!
— Já marcaram uma data ou escolheram o local? —
Micaela questiona, alisando a manga do vestido.
— Ainda não.
Só de pensar na trabalheira que isso vai dar, tenho vontade
de me casar escondida, mas provavelmente seria esfolada viva
por esses três.
— Para que a pressa? — Falo com um riso nervoso. — Eu
não estou grávida e Michael não está morrendo.
— Bons motivos para se casar. — Minha irmã sibila e de
repente sinto que falei merda.
— Michael se casaria até em Las Vegas, se você
desejasse. — Levi comenta ironicamente.
— Não dá ideia. — Dylan cochicha com um sorriso
atrevido.
Ao descermos, os garçons já estavam passando com os
petiscos e as bebidas. A festa ocorreu maravilhosamente bem,
quase nem foi estranho. Recebi alguns olhares curiosos, mas
ninguém ousou questionar nada sobre o nosso repentino
noivado.
Ganhamos muitos presentes e de repente me senti em um
chá de panela, a diversidade de quites de cama, mesa e banho é
gritante. Mas Levi foi além da imaginação, ele nos presenteou
com um kit erótico de algemas de pelúcia, calcinha comestível e
uma camisola de renda, tudo na cor vermelha.
Mesmo estando apenas rodeadas por mulheres, olhar
aquelas peças em cima da bancada me fez enrubescer tirando
risos delas.
Quando, por fim, todos foram embora Michael subiu para
colocar Emma na cama. E eu ainda estou arranjando algum lugar
para os acessórios de cozinha. Joana ficará feliz, me abaixo
sorrindo do meu pensamento, para guardar alguns jogos de
copos e ouço um longo assovio.
— Que visão. — Michael sorri, me endireito e o encaro com
um olhar torto. — Que tal você parar de guardar isso e a gente
estrear um dos presentes? — Ele pergunta e um sorriso diabólico
surge em sua face.
Passo a língua pelos lábios maliciosamente e me aproximo
da ilha, onde restam alguns dos presentes, e pego o fuê com um
olhar indecente.
— Esse batedor de ovos parece interessante. — Indico
analisando o instrumento com animação e tirando uma
gargalhada nele.
— Você não é louca. — Ele se aproxima pegando o fuê da
minha mão.
— Será? — Pergunto contra seus doces lábios.
Michael me segura pela cintura e me coloca sentada em
cima da ilha, ele se enfia entre minhas pernas e me encara
atentamente. Deslizo minhas mãos para o seu rosto e aliso sua
macia barba, enquanto ele me encara com esmero.
— Você está feliz? — Pergunto.
— Quais dos meus sorrisos te passou a impressão errada?
— Ele questiona beijando a parte debaixo do meu queixo.
— Vamos casar! — Falo um pouco pasma. — Você ficará
preso a mim pelo resto da sua vida.
Michael dá um sorriso gostoso.
— Essa é a ideia. — Ele sussurra e acaricia minha coxa
exposta pela fenda e lhe dou um tapa na mão quando ele a
desliza para dentro do vestido. — O que foi? — Ele pergunta
confuso.
— Emma pode nos ver.
— Ela está apagada. — Michael diz e volta a subir sua
mão.
— Ela pode nos ouvir. — Rebato, no instante que ele desce
o fecho do meu vestido.
— Então não faça barulho. — Ele sussurra enquanto desce
beijando o meu pescoço,
— Até parece que eu consigo. — Ralho e
instantaneamente vou inclinando o pescoço para trás, sentindo
um calor abrasador, Michael beija a minha pele, me causando
cócegas.
Ele me pega nos braços e subimos para o quarto, a festa
terminou da melhor forma possível. Comigo nua, exausta e
ofegante. Nunca vou me cansar desse homem. Meu homem.

Acordo na manhã seguinte alarmada. Nosso voo está


agendado para agora de manhã e sinto que a ansiedade vai me
matar antes mesmo de eu chegar lá. Dou um pulo da cama e
arranco o lençol do Michael abruptamente fazendo o resmungar.
— Viu como isso é chato! — Repreendo-o entrando no
banheiro.
Tomo um banho rápido, tentando não perder o foco e me
aprofundar em meus pensamentos. Eu não tenho ideia do que
vou eu encontrar lá, mas preciso disso.
E talvez assim, eu tenha paz de vez.
Saio do banho e encontro Michael sentado na ponta da
cama coçando os olhos, preguiçosamente.
Entro no closet e coloco um vestido preto, que eu havia
separado ontem à noite. Ele é justo e vai até ao meio da perna e
na extremidade ele começa a ficar mais arredondado.
Calço uma sandália de salto alto na cor bege e seco meus
cabelos rapidamente sem me importar de deixá-los rebeldes.
Quando saio do closet, Michael está saindo do banho apenas
com uma toalha enrolada na cintura, ele tem a ousadia de tirá-la
e jogá-la em cima da cama.
— Uau! — Ele comenta mordendo o lábio e tento não
desviar da sua face, pois, seu pau que parece me encarar bem
animado.
Filho da puta! Como consegue ser tão gostoso?
— Obrigada. Agora se arrume!
Ele ri e assente.
— Pensei que essa viagem pudesse ser divertida, mas
parece não vai. — Ele resmunga quando me vê fugir do quarto.
— Eu ouvi isso. — Grito, do corredor.
Ao chegar no primeiro piso encontro os avós maternos de
Emma tomando café da manhã.
— Bom dia! — Saúdo sorrindo e um pouco agitada como
se eu tivesse ligada nos 220. — Obrigada por ficarem com ela.
— Sempre que precisar. Nós mal temos visto Emma
nessas semanas. — Evy se queixa. — Mas fico feliz que agora
ela tenha uma figura materna dentro de casa. — Sorrio e torço
que ele tenha saído natural.
— Você a deixou sem graça. — Luis comenta.
— Eu não sou a mãe dela. — Falo me sentindo corar e
noto que os deixei tensos. — Mas vou cuidar dela como se fosse
minha. — Esclareço e eles relaxam momentaneamente.
Michael entra com Emma na cozinha, interrompendo esse
momento estranho, deixo-os conversando e tomo café
rapidamente, em seguida subo para quarto buscar as malas.
— Lindara.
Me viro para Michael, que parece preocupado.
— Aconteceu alguma coisa? — Pergunto.
— Me diz você, está parecendo agitada. — Ele fala ao se
aproximar e me puxa para perto me obrigando a encará-lo. —
Tem certeza que quer ir adiante com isso? Eu não sei o que você
está procurando, querida, mas não quero que se magoe.
— Eu preciso vê-la, aquela mulher arruinou tudo o que eu
mais amava.
Ele assente silenciosamente.
GUATEMALA
Cinco horas de voo e enfim El Mexico.
Se for possível fiquei mais tensa ainda quando entrei no
avião, senti um tremor nas entranhas e para distrair a minha
mente, Michael tentou me ensinar o básico do espanhol. A cada
frase que saia dos meus lábios nos rendia boas risadas.
— Se quer fazer isso hoje, não podemos demorar. —
Michael avisa, olhando o sol no horizonte pela janela do hotel.
Paro ao lado dele e sinto a brisa quente chocar-se contra a minha
pele.
Não sei se é o clima, mas sinto que estou suando
loucamente.
— Acha que eu sou maluca?
— Você está assustada, não sabe o que a espera, tudo
bem se sentir assim.
Deixamos o belíssimo quarto do hotel, Castel Milagros,
com vista para a praça no centro da cidade e entramos em um
Cadillac preto, alugado. Michael colocou o endereço no GPS e
deu partida no carro que arrancou suavemente tirando um sorriso
dele. Homens.
Ligo o rádio para distrair a mente e ao som da melodia,
Courage To Change da Sia, eu tento relaxar. Na minha cabeça eu
formo cenas e diálogos de tudo que é possível acontecer, mesmo
sabendo que há milhares de fins para cada pensamento.
O sol estava sumindo no horizonte e no GPS nós
estávamos longe do ponto de chegada. Encarar aquela região
vermelha no aparelho faz meu coração acelerar e as minhas
mãos suarem mesmo no ar frio do carro.
Depois de um longo tempo, Michael tenta puxar assunto,
mas eu estou tão tensa e perdida dentro de mim mesma que
simplesmente não consigo me concentrar em nada.
— Podemos voltar amanhã. — Ele sugere. — Você está
parecendo um papel, Lindara.
— Eu estou bem. — Se eu continuar nesse estado de
ansiedade Michael vai me arrastar de volta para Nova York hoje
mesmo. Respiro fundo me sentindo sufocada. E espero que
aquela piranha se sinta exatamente assim quando me vir.
— Não está. — Ele retruca, baixando os vidros da janela, o
ar fresco entra e instantaneamente começo a respirar com mais
facilidade.
— Falta muito? — Pergunto, já que estamos andando a
mais de uma hora e meia, e entramos em uma estrada deserta
há quase uma hora.
— Honestamente, querida, eu não tenho ideia. — Michael
diz apertando a minha coxa com carinho e acelerando. — O GPS
deixou de marcar o local há alguns minutos. — Ele acrescenta
em uma tranquilidade perturbadora.
— Estamos perdidos? — Pergunto um pouco preocupada,
já que está anoitecendo e não há absolutamente nada a nossa
volta, além de mato e feno.
— Não, a vila que Cass localizou deve ficar por aqui. —
Michael continua em frente e começo a me sentir em um filme de
terror. — Querida, estamos bem. — Ele afirma com um sorriso e
olha pelo retrovisor. — Está vindo um ciclista, vamos perguntar
para ele.
— Pode ser, mas abra a sua janela. — Aviso tirando um
riso dele.
Michael reduz a velocidade e liga a luz de teto que ilumina
muito bem o interior do carro. Não demora muito para o ciclista
entrar na minha linha de visão pelo retrovisor, a pessoa
desacelera e para ao lado do motorista.
— ¿Esta perdido?— Ouço a voz de um jovem.
— Sí, ¿Dónde está el Pueblo del atardecer? — Michael
pergunta alguma coisa ao garoto, que enfia a face na janela com
um largo sorriso.
— Americanos! — Ele diz surpreso em nosso idioma. O
garoto usa um boné bem sujo, que pelo cheiro e as machas que
há em sua face aparentam ser óleo de carro.
— Pode nos ajudar? — Pergunto e seus olhos castanhos
caem sobre mim.
— Claro. É só seguir reto, a uns cinco quilômetros.
Agradecemos o garoto que assente e mantém a face na
janela, me deixando apreensiva.
— Buen viaje. — Ele fala com um sorriso simpático.
Michael dá a partida e acelera, o carro anda tão
suavemente que nem parece que estamos saindo do lugar. E não
demora muito para enxergarmos movimento, luz e trailers.
— Que lugar é esse?
— Descobriremos juntos. — Ele diz atravessando um largo
portão de madeira aberto para trás.
Michael reduz a velocidade conforme passamos entre duas
fileiras de trailers um ao lado do outro, em uma estrada de terra.
— Tem certeza que estamos no lugar certo? — Pergunto
quando percebo que algumas pessoas param para nos observar.
Michael me lança um olhar como se tivesse dizendo: acha
que eu a traria no lugar errado?
— Espere no carro. — Ele pede assim que estaciona entre
dois trailers. Assinto sentindo o coração querendo fugir pela boca.
Michael desce e caminha para trás do carro e sem demora
vejo pelo retrovisor dois homens se aproximarem dele. Escuto
claramente eles conversando, mas não compreendo bulhufas do
que estão falando.
Não entendo como Betty veio parar neste lugar deplorável,
depois de ter roubado tanto dinheiro. E Madson, será que mora
aqui, também?
Nunca parei para pensar nele, não consigo imaginar como
ele seja. Se puxou ao meu pai, se é inteligente ou bonito.
Michael esmurra a janela do carro, quase me matando de
susto.
— Porra, Michael! — Chio, com o coração na garganta.
— Pode descer. — Ele avisa.
Saio do carro e percebo que há mais pessoas fora dos
trailers, olhando em nossa direção.
— Então? — Questiono baixo e tento dar um sorriso
simpático para as que estão mais perto.
— Trailer 61. — Ele diz passando o braço em volta da
minha cintura e me levando na direção oposta a que entramos. —
Os moradores disseram que Betty está...
— Morta? — Pergunto antecipadamente.
— Doente.
— E o garoto?
— Não perguntei. Eles pensam que somos da assistência à
saúde.
— Em um Cadillac?
Michael dá de ombros.
— Eles não parecem ter muito conhecimento e nem auxílio.
Suspiro, sem saber o que achar de tudo isso.
— Chegamos. — Michael avisa ao pararmos em frente a
um velho trailer, amarelo e enferrujado em algumas partes. Ele
tem uma pequena tenda diante da porta que está entreaberta,
mostrando um pouco de claridade.
— Querida… — Ele me segura pelo braço, chamando a
minha atenção. — Estamos no México, não faça nenhuma
loucura. — Ele pede com um sorriso fácil.
— Eu não vou matá-la se é isso que está me pedindo. —
Sorrio.
— Bom saber que seu senso de humor ainda está intacto.
— Michael debocha.
O encaro boquiaberta e quando estou pronta para mandá-
lo se foder, a porta do trailer se abre abruptamente. Merda!
— Os dois pretendem bater na porta ou só ficar
cochichando aqui fora? — Uma mulher magra, baixa e de
cabelos pretos como carvão fala com a cabeça para fora, nada
hospitaleira.
Abro a boca, mas parece que engoli as palavras.
— Betty Hendricks se encontra? — Consigo perguntar
impassível.
— Quem são vocês? — Ela questiona com as mãos na
cintura.
— Sou filha de um amigo distante, soube que Betty está
doente e vim oferecer ajuda. — Digo com simpatia e Michael até
me olha de esguelha.
— Não há mais nada para ser feito.
— O que ela tem? — Michael questiona.
— Só um minuto. — A mulher ergue um dedo no ar
enfatizando, ela gira nos calcanhares e some dentro do pequeno
trailer.
O encaro apreensiva e sem entender o que ela quis dizer
com, não há mais nada a ser feito.
A mulher volta e para em cima de um tablado de madeira
do lado de fora.
— Como se chama garota?
— Lindara.
A mulher franze o cenho, mas volta ao seu semblante
normal rapidamente.
— Entre, mas só você. — Ela diz sinalizando para mim.
Michael me segura pelo braço antes mesmo que eu
conseguisse sair do lugar.
— Eu grito. — Sussurro, imaginando no que ele estaria
pensando, seu aperto afrouxa e ele assente nada feliz.
Quando subo no estrado o odor de cigarro barato que
emana da mulher me faz querer tapar o nariz. Ela sorri para mim
como percebesse o meu incômodo, mostrando alguns dentes
amarelados.
— Me chamo Yolanda, aliás.
Entramos. Estamos em uma minúscula cozinha, onde
contém uma pequena pia e um armário em frente à porta e ao
lado esquerdo uma mesa e um sofá para dois, com várias roupas
jogadas em cima.
— O que ela tem? — Sussurro no momento em que meus
olhos enxergam a pequena e debilitada mulher deitada em uma
cama do outro lado do trailer.
— Melanoma metastático. — Yolanda responde, a encaro
com a expressão de um grande ponto de interrogação. — Células
tumorais espalhadas pelo corpo inteiro: fígado, pulmão, ossos,
onde você imaginar.
— Quanto tempo ela tem?
— O médico deu seis meses se ela fizesse o tratamento,
mas ela se nega a fazer, não entendo como ainda está viva.
Paro ao pé da cama. Betty está com os olhos fechados e
deitada com um lençol cobrindo até à altura dos seus seios. Essa
mulher não tem semelhança alguma com a que Dante me
mostrou no computador. Jamais a reconheceria. Na cabeça dela
há um lenço branco com flores amarelas que se parecem
margaridas e na sua frágil face, um tubo conectado ao seu nariz.
— Ignore os acessos. — Yolanda fala atrás de mim.
— Ela tem consciência?
— Às vezes, tem dias que ela nem lembra do pobre Mady.
— Por que me deixou entrar?
A mulher suspira e acende um cigarro ao meu lado.
— Quando descobrimos o câncer, já estava avançado.
Então Betty me contou uma longa história. Ela tinha noção dos
fatos, sabia que tinha meses e escreveu uma carta para eu
entregar ao Mady no momento que chegasse a hora.
— Você leu?
A mulher dá um sorriso que confirma a minha pergunta.
— Lindara Fincher Burrows, está escrito no final da carta.
— Vadia! — Praguejo, tirando um riso da mulher e nesse
exato momento a porta se abre bruscamente e o garoto que nos
ajudou na estrada entra aterrorizado com Michael em seu
encalço.
Puta merda!
— Por que estão aqui? — Ele pergunta aflito, sem entender
nada e tira o boné deixando a mostra seus cabelos loiros, iguais
aos do meu pai.
Pelo caos que se iniciou dentro do pequeno trailer, Betty
acorda com uma crise de tosse.
O garoto me empurra para o lado e passa por mim até
chegar à frágil Betty.
— Mãe. — O ouço chamar baixinho, me causando um
arrepio.
Encaro Michael, ignorando a cena que acontece logo atrás
de mim. Esses são momentos que não quero que fiquem
gravados na minha mente, já tenho muita merda para superar
não preciso mais de uma.
— Vamos embora daqui. — Falo quando chego a seu
alcance.
Eu estava com tanto ódio dessa mulher por tantas razões
diferentes e pensando neste momento, talvez eu só estivesse
procurando um culpado para a vida amaldiçoada que eu tive, e
olhando-a semimorta nessa porra de trailer, nesse fim de mundo,
eu só consigo sentir pena e isso me deixa frustrada, e com raiva.
Chego ao carro com uma puta tremedeira.
— Eu sinto muito, querida. — Michael fala assim que
adentramos o carro.
— Não sinta.
Ele aperta a minha perna com pesar.
— E o garoto? Você pode conversar com ele.
— O meu assunto nunca foi com ele. Não vamos prolongar
isso.
Pela face do Michael ele discorda, mas assente e quando
os faróis ligam, Madson aparece em frente ao carro.
— Ainda dá tempo, Lindara.
O encaro circunspecta e prendo o sinto em seguida.
Levou uma hora para retornarmos ao hotel, Michael fez jus
aos cavalos do carro. Metade do caminho eu fui pensando na
situação daquela família e na outra metade me proibindo de
pensar.
Eu não tenho ligação nenhuma com ele! Fico ruminando e
tentando de uma forma fazer isso ter coerência na minha cabeça.

— Eu notei que não concorda comigo. — Comento


enquanto caminhamos para o quarto. — Eu não tinha ideia do
que esperar, mas jamais imaginei que fosse me deparar com
aquele tipo de situação. — Acrescento.
— O garoto não tem culpa.
— Eu não vim procurar um irmão perdido. Não estou atrás
de uma família eu já tenho uma. — Reforço.
— Ele não tem ninguém.
Paro na entrada do quarto sem entender onde ele quer
chegar.
— E você quer que eu faça o que? — Questiono um pouco
áspera, jogando os braços para o alto.
— Você está sendo infantil. — Ele adverte.
— E você um idiota.
Michael me encara sério e seguro o seu olhar com a
mesma seriedade, ele coloca as mãos na cintura e repito o seu
gesto, e percebo que isso está deixando-o incomodado.
— Eu não quis dizer isso. — Ele relaxa o corpo e umedece
os lábios.
— Você quis, mas tudo bem, não vamos concordar
sempre. Só não vamos baixar o nível dos insultos.
— Baixar o nível, tipo? — Ele se aproxima com um sorriso.
— Você é mal de cama ou o seu pinto é pequeno.
Ele gargalha.
— Sem chance! Nós dois sabemos que isso é mentira. —
Michael fala em tom de repreensão, me puxando pela cintura.
— Será? — Sussurro e solto o peso do corpo contra o dele.
Ele não tenta argumentar novamente e fico grata por isso.
Cansada, suada e coberta de terra vermelha nos cabelos,
decido tomar um banho e para minha surpresa e alegria a
banheira está transbordando. Mergulho e relaxo
momentaneamente.
Por um momento fecho os olhos e desejo acordar em
Manhattan, seria um sonho. Seria um sonho também que tudo
isso não passasse de um terrível engano, mas cada vez que eu
fecho os olhos, me imagino dentro daquele minúsculo trailer. A
face e o cheiro da Yolanda estão cravados na minha mente,
mexo a cabeça como se fosse necessário para conseguir mudar
de pensamento, mas o sorriso e os olhos de pavor daquele
garoto, rompe na minha consciência.
Me aflige imaginar a maneira como ele cresceu, tudo que
ele passou, mas porra a minha vida não foi um mar de rosas
também.
Afundo na banheira e no instante que emerjo, Michael está
parado na porta me observando.
— Não estou tentando me matar, a propósito. — Comento
e ele revira os olhos, então eu chuto a água com o pé em sua
direção, ele abre um sorriso. — Me faça companhia. — Peço
esticando uma perna para fora d’água, fazendo-o me dar um
olhar de reprovação.
Não vamos embora hoje, então torço que amanhã seja um
dia melhor.
Observo Michael tirar as roupas e adentrar a banheira.
— Tá aí uma coisa que nunca fizemos. — Ele comenta ao
sentar aos meus pés.
Inclino-me na direção dele e me apoio em suas pernas
torneadas.
— Sempre tem uma primeira vez para tudo. — Exponho e
nesse momento ele segura a minha nuca com uma mão, e me
puxa para um beijo intenso.
— Uhum papi. — Sibilo, quando minha mão esbarra em
algo avantajado.
Aproximo nossos lábios e seguro o membro dele com
presteza. Ele estremece e um suave gemido escapa da sua boca.
Deslizo o polegar pela cabeça e me pego mordendo o lábio
enquanto o encaro.
— Vai ficar aí admirando, querida? — Michael me lança um
olhar que mostra o desejo e a intensidade, que ele deseja estar
dentro de mim.
— Aham. — Emito com um sorriso atrevido e no mesmo
instante faço movimentos suaves.
Michael fica rígido e morde o lábio deixando-o rosado. Ele
segura na borda da banheira como se tivesse abeira de um
abismo e percebo seus músculos do abdômen contraírem
enquanto o toco com mais intensidade.
Aliso o interior da sua coxa com a mão livre e observo-o
abrir os lábios soltando um fraco gemido.
Ele está tomado de tesão e vê-lo se contorcer debaixo de
mim, não tem explicação é pura tentação. Pensar que estou
destinada a passar o resto da minha vida ao seu lado, só me
deixa mais empenhada. Umedeço os lábios, sabendo que ele vai
gozar a qualquer momento. Eu consigo perceber pela sua
respiração entrecortada, e por ele estar mais sólido que uma
rocha em minha mão.
E quando Michael está chegando lá, ele me para
bruscamente.
— Vamos para o quarto. — Ele avisa, despertando um
largo sorriso em mim.

— Ohh. — Um gemido escapa pelos meus lábios na hora


que eu jogo a cabeça para trás, com uma mão em punho no
lençol e a outra enroscada nos fios dos cabelos úmidos dele.
Inchada e sensível eu mexo o meu quadril contra a sua
língua habilidosa e mordo o lábio com força ofegante, sentindo a
garganta em chamas.
Cacete, como ele consegue ser tão bom nisso? Penso,
arqueando as costas, sentindo uma gigantesca pressão se
acumular no meu ventre e o orgasmo romper impetuosamente.
Totalmente trêmula, apoio-me nos cotovelos e encontro seu
olhar perdido entre as minhas pernas, Michael levanta as
sobrancelhas sutilmente com um riso.
— Venha. — Peço, com meu sexo pulsando, esfomeado.
— Gulosa. — Ele provoca, engatinhando e distribuindo
beijos pelo caminho até ficar cara a cara comigo.
— Terei boas lembranças do México. — Sussurro contra os
seus lábios.
— Boas? — Ele questiona decepcionado e sinto a cabeça
do seu pau entrar vagarosamente.
— Uma lembrancinha. — Brinco, e ele se distância, me
dando um olhar de condenação.
— Essa viagem será inesquecível, Lindara. — Ele diz com
a voz grave e se afunda em mim com força, fazendo um grito
seco escapar dos meus lábios.
— Filho da puta. — Uivo, e sinto o seu pau deslizar para
fora de mim.
Ele me vira de repente de bruços e me puxa pela cintura,
até me deixar de quatro. Me seguro em uma pilha de travesseiro
para ganhar equilíbrio, enquanto Michael alisa minha bunda com
a mão.
Estou frenética e ansiosa ainda mais com Michael
espalhando a umidade com seu membro por toda a extensão do
meu sexo até a altura das minhas nádegas, meu corpo se contrai
no mesmo instante que ele o esfregou em uma área muito
específica.
— Pensando bem eu não preciso de grandes lembranças,
Michael. — Aviso, tensa.
— Agora você vai ter. — Ele fala com um riso e me
preenche com força me segurando pela cintura e me fazendo
estremecer. Gemo alto pela dor e pelo prazer ao sentir engolir
toda a sua grandeza.
— Nada mal. — Digo provocando-o e sentindo a garganta
arranhar, ele se distancia e se enterra em mim novamente.
— É. — Michael sibila, e de repente sinto minha nádega
esquerda fervendo pelo tapa inesperado que ele me dá.
— Filho da mãe! — Grito e sinto suas mãos agarrarem meu
quadril com firmeza, ele estava dando tudo de si e eu daria tudo...
quase tudo de mim. Rio.
Michael alivia o aperto na minha cintura e traceja uma mão
pela minha coluna até alcançar em meus cabelos soltos. Ele
desliza sua mão entre eles e me segura pelo ombro para ir mais
fundo, com mais força.
Um suor frio, ardente e impetuoso cobre o meu corpo, que
dói em lugares inimagináveis. Sinto meu coração acelerar
loucamente e um leve zunido em meu ouvido me diz que não vou
aguentar por muito tempo.
Michael se inclina para frente e desliza sua mão para o
meu clitóris que pulsa violentamente, mas seus dedos me tocam
vagarosamente, testando os meus limites.
— Para de me sacanear! — Resmungo, contendo a
vontade de empurrá-lo e eu mesma acabar com isso. Michael me
puxa para cima me deixando sobre os joelhos, um braço me
agarra logo abaixo dos seios e o outro me provoca muito, muito
lentamente.
— Acalme-se. — Michael sorri contra minha orelha a
mordiscando em seguida, consigo sentir sua respiração irregular,
está tão fodido quanto eu, mas está adorando me torturar.
— Michael. — Clamo e acaba saindo como um miado,
tento me virar, mas ele me segura no lugar e seus dedos
pressionam aquele ponto pulsante com a atenção que eu tanto
desejava me arrancando um grito.
Ele não para um segundo, seus dedos e seu pau se
mexem em uma sincronia perfeita, estou começando a ficar com
as pernas trêmulas, quando ele se afunda em mim uma última
vez e não sai mais.
Me debruço para frente soltando o peso do quadril em suas
mãos e escoro a cabeça no colchão, tomada de suor.
— Odeio você. — Resmungo, sentindo o meu corpo
inteiramente ardendo.
— Obrigado! — Ele diz dando um aperto em minha bunda,
o empurro para trás com o pé e me jogo no colchão abraçando
um travesseiro.
— O México nunca esteve tão atraente. — Michael
comenta e no mesmo instante jogo um travesseiro em cima da
minha bunda, arrancando uma gargalhada dele.
Acordo com a claridade da rua me cegando. Sento-me na
cama completamente sonolenta e sinto o corpo inteiro dolorido, até
parece que eu carreguei pedra noite passada. Michael está
desmaiado ao meu lado, deitado de bruços com a comissão traseira
totalmente exposta, seguro a vontade de lhe devolver a palmada de
ontem, mas só Deus sabe como esse homem tem os glúteos firmes,
doeria mais a minha mão.
Minha barriga ronca parecendo um animal faminto, então me
lembro que a última vez que eu comi foi no avião.
Pulo da cama e pego um vestido curtinho, amarelo e de
alcinha finas com o decote no formato de V. Visto rapidamente e
faço uma trança frouxa.
Saio do banheiro encontro Michael sentado na cama
esfregando os olhos.
— Bom dia, princesa. — Cantarolo. — Vejo que está
animadinho. — Digo quando noto seu pau acenar para mim, Michael
e se cobre sutilmente.
— Quais são os planos? — Pergunta olhando a minha roupa.
— Tomar café, estou faminta!
— E?
— Por enquanto é isso.
Por um momento eu esqueci completamente o motivo de ter
viajado até aqui, e foi maravilhoso.
— Eu vou ligar para Micaela e saber se ela continua grávida, e
pegar uma mesa, não demore. — Aviso pegando o meu celular e
saindo do quarto.
Ligo para Mica talvez ela me dê alguma clareza.
— E aí, meu sobrinho já nasceu?
— Não, mas pela forma que ele se mexe, parece estar
procurando a saída, ou tentando abrir outra. — Ela bufa.
— Sinto muito por não estar aí.
— Já se encontrou com ela? — Micaela pergunta quando
estou entrando no pequeno e sofisticado saguão, chamando
atenção de algumas pessoas sentadas em poltronas contra a
parede, de frente para o balcão da recepção.
— Sim e não. — Digo e me pego procurando a área de
alimentação. — Ela está com câncer, definhando em uma cama,
dentro de um trailer no fim do mundo.
— E agora?
— Ela está morrendo, não importa mais.
— E o garoto? Conversou com ele?
— Não, eu fugi. Entrei em pânico na hora que o vi. — Digo
sentindo o estômago embrulhar ao lembrar. — Me diz o que fazer?
— Ele não tem culpa pela mãe ser uma vaca desprezível. —
Ela faz uma longa pausa. — Você tem uma família.
— Sim, você!
Ouço sua risada.
— Não seremos menos irmãs, por você ter outro irmão. Pare
de ser covarde e converse com o garoto.
— Odeio você! — Sussurro.
— Mentirosa. — Ela diz rindo.
Me despeço da minha irmã quando ouço meu estômago
roncar novamente.
Ando até o balcão e encaro o gentil atendente que usa um
grande sombrero.
— Hola señora.
Micaela morreria se tivesse aqui.
— Desayuno. — Digo de uma forma enrolada e torço que não
tenha saído nenhuma putaria, pois, o atendente se inclina para
frente franzindo o cenho, mas logo sorri como se tivesse
compreendido.
— Café da manhã fica no saguão ao lado. — O rapaz diz em
meu idioma.
Dou um sorriso sem graça e me viro rubra de vergonha, mas
no instante que vejo quem está em minha frente, parece que o
sangue todo se dissipou do meu corpo.
Madson usa uma camisa preta, surrada e desbotada, quem
sabe a mesma de ontem, pelo odor. Ele tira aquele boné encardido
e o segura ao lado do corpo com força, talvez tentando esconder a
tremedeira, mas seus lábios o entregam. Sua face ainda é marcada
pela adolescência, embora seus olhos digam que ele já viu muito
para um garoto de dezesseis anos.
— Eu sei quem você é. — Madson expõe e noto sua garganta
oscilar, petrificado.
Sinto o meu estômago embrulhar abruptamente e mesmo
assim não consigo desviar dos olhos dele.
— Como me encontrou?
— Não há muitos hotéis caros por aqui. — Ele dá de ombros.
Aperto os lábios e concordo. — Podemos conversar, por favor. —
Ele pede de uma forma que não há como negar.
Assinto e indico com a cabeça a direção da área de refeição.

Sentamos embaixo de uma tenda de frente para um ostensivo


e admirável jardim, com muitas plantas e árvores, há até uma ponte
em cima de um pequeno lago. O sol da manhã é terrivelmente
abrasador, mas o que está me fazendo realmente suar é o garoto
em minha frente.
— O que você quer, Madson? — Pergunto com os músculos
rígidos, sentindo o corpo incrivelmente sensível.
— O que eu quero? — Ele pergunta com a voz levemente
alterada, me fazendo encará-lo surpresa. — Você foi até a minha
casa, o que você estava fazendo lá?
Madson segura o boné como se fosse a base que o impede
de desabar, e a minha, surge a alguns metros de distância, com a
expressão preocupada.
Michael senta em uma tenda próxima da nossa, sozinho, e
nos observa de longe.
— Sua mãe foi o motivo da minha visita. — Explico. — Eu não
sabia em qual situação ela se encontrava, sinto muito por você.
O garoto morde o lábio inferior, absorto.
— Yolanda me deu uma carta ontem, mas eu já a tinha lido
escondido. — Ele dá um sorriso fraco como se tivesse recordando.
— Como ele era? — Sua pergunta faz minhas entranhas se
torcerem.
— Eu não lembro. — Sei que meu pai se tornou um mentiroso
e traidor, porém, o garoto não precisa saber disso.
— A mãe disse que ele morreu logo que eu nasci... esse boné
era dele. — Ele acrescenta soltando o na mesa, provocando um
ardor na minha garganta, cerro o maxilar com força, sem saber o
porquê ainda estou o ouvindo.
— O que você quer? — Questiono novamente.
— Você é rica, não é? — Não consigo conter um riso, tal mãe,
tal filho. — A mãe disse na carta que você poderia me ajudar a
conseguir um lugar para morar e um emprego nos Estados Unidos.
— Ele aperta os lábios, e adiciona. — Aqui é bem difícil.
— Eu não tenho dinheiro, Madson, tudo o que eu tinha não me
pertence mais.
— Eu lamento por tudo. — Ele parece realmente lamentar,
que merda!
— Eu não posso ajudá-lo. — Digo e me coloco de pé, ele faz o
mesmo.
Não consigo ajudar a mim, sou complexa, depressiva e
relativamente alterada.
— Não vai ajudar o seu irmão? — Ele questiona frustrado.
— Você não é meu irmão! — Esclareço e quando percebo
Michael está do meu lado.
Distancio-me dos dois me sentindo à beira de um precipício.
Ando tão rápido quanto consigo, mas sem demora sinto mãos me
segurando firme pela cintura.
— O que aconteceu, Lindara? — Michael indaga ao
chegarmos no saguão.
— Betty me deixou responsável de dar emprego e moradia a
um garoto de 16 anos, do qual eu nunca vi na vida! — Digo
apavorada.
— Se nós podemos ajudar, vamos ajudar. — Ele fala dando de
ombros e me obrigando a sentar em uma das poltronas da
recepção.
— Sério? — Questiono irritada. — Ele ainda é uma criança, eu
não posso ser responsável por ele, Michael. — Informo com vontade
de me descabelar.
— Você está surtando. — Ele avisa.
Cruzo os braços tentando conter a inquietação, eu só queria
tomar a porra de um café.
— Quando eu olho para ele, só consigo pensar que a mãe
dele fez a minha sofrer.
— Ele não tem culpa, querida.
— Eu sei disso, mas nunca vou conseguir confiar nele.
— Você o conheceu há 10 minutos, dê o benefício da dúvida a
ele. Vimos o estado de onde eles residem, não dá para chamar
aquilo de lar, as roupas e o cheiro então.
— Por que está fazendo isso?
Michael senta ao meu lado e me puxa para o seu ombro,
acariciando minha cabeça.
— Porque é o certo.
— Acha que estou sendo egoísta?
— Não. Eu entendo o seu medo.
Suspiro, e então o meu telefone toca.
— Oi, Mica...
— Minha bolsa rompeu! — Ela grita, me fazendo distanciar o
celular.
— Merda! — Rosno fazendo Michael franzir o cenho.
— Isso aí! É assim que se comemora a chegada de um
sobrinho.
— Me desculpe, vamos assim que possível.
— Obrigada. Eu preciso de você lá. — Mica choraminga
fazendo drama. — É obvio que eu preciso de você também, amor.
— Ela fala com meiguice e obviamente não foi para mim.
— Manda Blake parar de chorar e levá-la ao hospital.
Ela gargalha.
Desligo e encaro Michael com um frio na barriga.
— Precisamos voltar. — Ele assente e se coloca de pé
olhando além de mim e depois para mim.
— Quer que eu fale com ele? — Questiona.
— Não.
Eu não acredito que vou fazer isso, olho para cima pedindo a
Deus por um sinal de que estou fazendo a coisa certa. Estou
cansada de errar.
Nos aproximamos do garoto, ele segura firme um papel na
mão e me encara como se eu fosse uma espécie de salvação.
— Nós estamos indo embora, minha irmã entrou em trabalho
de parto...
— Tem outra? — Ele me interrompe confuso.
— Sim, de consideração. Enfim, Madson, quando você quiser
ir para Nova York terá um lugar para ficar, mas terá que trabalhar e
estudar. — Ele assente feliz e de repente até um brilho surge em
seus olhos, aproveito e acrescento seriamente: — Uma cagada que
você fizer, pode ser minúscula, eu não ligo, você volta para o buraco
onde você mora. Eu não o conheço direito, não devo nada a sua
mãe e nem a você, então não faça eu me arrepender.
— Não vai se arrepender. Eu prometo.
Sinto um certo alívio, se der merda não posso dizer que não
tentei. Madson me estende o pedaço de papel com as mãos
imundas e trêmulas.
— O número do meu telefone. — Ele explica. — Eu não vou
abandoná-la agora, minha mãe precisa de mim.
— Claro. — Pego o papel e noto que é um origami de um
pequeno pato e no longo pescoço há o número do telefone com uma
caligrafia pavorosa.
— Você que fez? — Questiono ao notar que é o guardanapo
do hotel todo dobrado.
Ele faz que sim, rapidamente.
— Posso anotar em outro lugar se quiser.
— Não... Ele fazia pássaros com papel também. — Comento e
de repente me pego emotiva e me odeio por isso, mas agradeço a
Deus pelo claro sinal.
Deixo Michael e Madson conversando e subo para o quarto às
pressas. Tenho certeza que Michael dará dinheiro ao Madson, pois,
o vi tirar a carteira do bolso antes de dobrar uma curva para o
quarto. Michael é bondoso demais, que me faz sentir até uma
pessoa má, por me negar ajudá-lo de cara.
— Tem um voo em 30 minutos. — Ele avisa ao adentrar o
quarto — Se quiser pegar ele, precisamos sair agora!
— Ok. — Abro minha pequena mala e começo a jogar tudo
para dentro tirando risos dele.

MANHATTAN

Foi uma loucura termos conseguido pegar o voo de volta


naqueles trinta minutos.
Quando descemos no aeroporto JFK, me senti plena, nada
como voltar para casa.
Conversei com Blake antes de entrar no avião e Mica já
estava sendo acomodada em um quarto. Por sorte ela ainda não
está com todos os dedos de dilatação e talvez eu consiga chegar a
tempo para o nascimento, Michael riu na hora que comentei com ele
e me aconselhou a não dizer isso a ela.
Axel nos pegou no estacionamento do aeroporto, até ver
carranca profunda dele, me deixou feliz.
Passei metade do caminho tentando entrar em contato com
Blake, já faz mais de 6 horas que conversamos e agora ele não
atende minhas ligações. Michael está tão tenso quanto eu, a última
vez que ele esteve em uma situação dessas foi quando Emma
nasceu.
No segundo que Axel estaciona em frente ao hospital Medical
Center NY, eu pulo para fora do carro e passo pelas portas
automáticas sem esperá-lo. Paro ao lado do elevador, procurando
no mapa do hospital onde fica a UTI Neonatal.
— Segundo andar, querida. — Michael sinaliza com o dedo o
quadro na parede.
Pego na mão dele e subimos as escadas com pressa,
chegando em uma espaçosa recepção, com as paredes bege e
poltronas marrons, em volta de uma mesa de centro.
— Por gentileza… — Chamo atenção de uma atendente atrás
do balcão. — Onde posso encontrar a paciente Micaela Melchior?
A mulher pede um segundo e faz uma busca no computador.
— No fim do corredor, à esquerda. Lembre-se de se higienizar
antes de pegar o bebê. — Ela avisa e fico emocionada só em ouvir a
palavra bebê.
Caminho com passos largos, ansiosa e louca para conhecê-lo.
Quando chegamos em frente ao quarto, consigo vê-los pela
pequena janela na lateral da porta, Mica segurando um pequeno
pacotinho enrolado em uma manta azul-marinho com desenhos de
estrelas e luas e Blake está sentado ao pé da cama, massageando
os pés da minha irmã.
— Você está bem? — Michael sussurra às minhas costas.
— Sim, estou feliz por eles. Ela tem uma família agora. —
Sussurro.
— Você também tem. — Michael segura em meus braços e
beija o meu ombro.
— Eu tenho, sim. — Digo acariciando sua mão.
Adentramos o quarto em silêncio, Micaela abre um sorriso que
não tem preço.
— Você está um bagaço. — Digo com um riso, analisando
seus cabelos presos em um coque bagunçado e seu avental branco
caindo na lateral do ombro.
— Uma mentirinha não ia te matar, Lindara. — Ela diz ácida,
mas com um sorriso.
Mica vira o neném para mim, ele tem uma carinha de joelho
linda, meio avermelhado parecendo um tomatinho, com um farto
cabelo escuro.
— Quer segurá-lo?
Assinto feliz e me limpo rápido com o álcool em gel que há na
cômoda ao lado da cama.
— Parabéns! — Digo emocionada quando pego o bebê
desajeitada, mas ele cabe perfeitamente na curva do meu braço. —
Ele é perfeito! Eu quero um. — Choramingo, cheirando a cabecinha
do bebê e logo sinto o Michael atrás de mim.
— Espera ela dormir e a gente rouba ele. — Ele sussurra, mas
alto suficiente para todos ouvirem.
— O quê? — Mica finge um chilique.
— Ah, tá bom, quanto você quer nele? — Pergunto e dessa
vez ela encara Blake apavorada.
— Amor, tira o nosso bebê de perto deles!
Me viro para o Michael escondendo o pequeno pacotinho, ele
é tão fofo que eu facilmente o compraria.
— Já escolheram um nome? — Michael pergunta com um
sorriso, alisando a orelhinha.
— Caleb. — Blake responde animado.
— É lindo. — Falamos juntos.
Passo Caleb para Michael e o bebê some no meio de seus
braços.
A visão é maravilhosa.
— Você não vai levá-lo. — Mica sibila para mim.
— Não preciso do seu, adotamos um no México. Ele tem
dezesseis anos e só está esperando a mãe morrer para vir, então
talvez até semana que vem ele já esteja aqui. — Digo com um riso e
os dois me encaram preocupados.
— Cacete! — Mica murmura.
— E como vai ser isso? — Blake questiona e dou de ombros
sem ideia.
— Descobriremos quando ele chegar. — Michael fala.
— Ele vai morar com vocês? — Ela pergunta confusa.
— Nem fodendo. — Comento e vejo Michael tapar as
orelhinhas do bebê, mexendo a cabeça em advertência. — Ficará
no nosso antigo apartamento, com Levi.
Enviei umas vinte mensagens ao meu amigo, dizendo que
precisamos conversar. Não posso ficar com Madson na minha casa,
mal o conheço e vê-lo todos os dias mataria qualquer relação que
podemos vir a ter.
— Vamos arrumar uma escola e um trabalho para o garoto,
depois nos preocupamos com o resto. — Michael acrescenta.
— Você está bem com isso? — Minha irmã questiona
atenciosa.
— É estranho, mas vamos ficar bem. — Afirmo observando
Michael bajulando o bebê.
Ficaremos bem.

GRANDE DIA

Seis meses depois | Março 2021


Ninguém me disse que seria imensamente estressante
organizar um casamento. Por mais que Dylan tivesse tomado a
frente de tudo, ainda assim, ele me enviava mais 300 mensagens
por dia. Chegou um momento que eu perdi o celular de propósito e
Emma o encontrou na casa da árvore.
Não tenho como medir a minha felicidade, amanhã será o
grande dia, tudo que eu preciso é de uma ótima noite de sono, já
que o jantar de ensaio sugou todas as minhas energias.
Depois que Madson veio morar em Manhattan, o que demorou
apenas um mês, eu não tenho mais uma noite de sono descente.
Matriculamos ele em uma escola particular e Michael conseguiu um
emprego de meio período em uma mercearia.
Por mais que estivesse indo tudo maravilhosamente bem,
quando me deito à noite, me fico me perguntando se ele está bem
ou se está precisando de alguma coisa.
— Eu sei que está cansada, mas precisa provar o vestido
mais uma vez. — Dylan avisa debruçado sobre o encosto do sofá,
com um sorriso forçado.
— Não podemos fazer isso amanhã? — Choramingo, sentindo
meus pés latejarem do salto alto.
— Não, a última vez que você provou eu tive que fazer
pequenos ajustes.
— Está insinuando o que, Dylan? — Pergunto ácida.
— Que você atacou a geladeira pelo menos três madrugadas
seguidas. — Levi comenta com deboche.
Não conto mais nada a ele.
— Eu sofro de ansiedade. — Digo chocada. — Eu já estou
ficando sem unhas para roer.
— E eu sem renda para ajustar, Lindara. — Dylan debocha.
De fato, eu andei atacando a geladeira de madrugada, tenho
acordado com uma inquietação, fico me revirando na cama e
quando me dou conta, estou na cozinha procurando algo para
comer.
— Caleb chora bem menos que você, Lindara. — Mica zomba
com o gorducho bebê nos braços. — Prove o vestido! — Ela
manda.
Levanto do sofá e subimos para o antigo atelier do Dylan.
Tiro o meu vestido preto, longo e de mangas esvoaçantes sem
cerimônia e subo no pedestal redondo apenas de calcinha e sutiã.
Dylan aproveita e corre pegar o vestido, animado, ele resmunga,
mas adora as provas de vestido.
Enquanto isso percebo minha irmã me analisando de canto.
— Quer tirar uma foto? — Questiono retoricamente a pegando
de surpresa.
Dylan se aproxima com o exorbitante vestido de cetim branco.
— Levi, me dê uma mãozinha.
— Eu ajudo. — Mica diz animada e entrega o bebê ao Levi.
Os dois passam o vestido pela minha cabeça com facilidade e
quando estão alinhando ele ao meu corpo, sinto uma mão alisando
o meu abdômen, encaro Mica incrédula, a deixando rubra.
— Que palhaçada é essa? — Quero saber.
— O que foi? — Dylan pergunta confuso e Levi se aproxima
com o bebê.
— Micaela está me apalpando. — Esclareço irritada.
— Me desculpe — Ela diz rindo. — Você está...
— Gorda? Sim, Micaela, obrigada por esclarecer o óbvio.
— Você está linda, eu ia dizer.
Cerro os olhos e faço sinal para Dylan prosseguir.
Ele se coloca atrás de mim e começa a abotoar as pequenas
pérolas no meio das minhas costas, o tecido fica justo parecendo
quase um corset e apesar disso não reclamo, mas quando chega à
altura dos seios Dylan para e apenas sinto sua respiração gélida.
— Não fecha, não é?
— Linda… — Ele balbucia.
— Ahh inferno! Preciso de um minuto. — Resmungo descendo
do pedestal, deixo o atelier com o vestido ainda aberto e fecho a
porta com eles lá dentro deixando claro que quero ficar sozinha.
Entro na suíte principal e me atiro na cama, perdida no meio
dos tules e das rendas.
O que está acontecendo comigo?
Amanhã é meu casamento e a droga do vestido não entra e
tudo que eu consigo pensar é em comer, porque de alguma forma
me acalma.
— Querida.
Ergo a cabeça e enxergo a face do Michael, preocupado.
— Não quero conversar. — Aviso.
— Problemas com o vestido?
Lanço um olhar fervoroso para ele, que ergue os braços em
rendição.
— Ele não quer fechar, pela segunda vez. — Explico
queixosa. Michael se deita perto de mim, de lado e fica com a
cabeça apoiada na mão.
— Dylan está aí para ajustar. — Diz tirando alguns fios de
cabelos do meu rosto e adiciona: — Eu não vejo diferença alguma,
você está incrível, talvez seja o vestido.
— Mas por que o vestido berra o contrário? — Pergunto e me
sento com dificuldade. — Abra, pelo amor de Deus. — Imploro.
Michael senta e desabotoa rapidamente.
— Só mais amanhã e podemos tocar fogo nele. — Diz me
fazendo rir.
— Eu já disse que amo você hoje? — Pergunto me virando
para ele.
— Sim. — Ele avisa contra os meus lábios e quando deslizo
minha mão para o meio das suas pernas, ele a segura no lugar.
— Já conversamos sobre isso. — Michael adverte.
— A culpa é sua, você me nega sexo e eu como. Cristo! Como
eu não pensei nisso antes!? — Exclamo.
Me jogo para trás e fico encarando o teto, até Michael se
debruçar sobre mim e aparecer na minha linha de visão.
— Só mais um dia, Lindara.
— Já faz três meses. Eu sinto a sua falta.
— Eu também sinto a sua, querida.
Mentiroso se sentisse não estaria me fazendo esperar.
Há uns três meses e meio, Michael começou agir
estranhamente. Ele dava um jeito de sumir sempre que as coisas
ficavam mais quentes. Comecei a dormir sozinha e quando ele vinha
deitar eu já estava desmaiada. Chegou um dia que eu já estava
cansada dele se esquivar colocando a culpa no trabalho e apareci
no escritório no meio da tarde. Tirei a roupa e disse: você transa
comigo agora ou eu cancelo o casamento.
Nunca falei tão sério.
E funcionou, chegamos a derrubar tudo de cima da mesa. Foi
incrível, mas quando ele chegou em casa no fim daquele dia,
Michael se desculpou pela ausência e pediu que esperássemos até
a lua de mel. Eu achei antiquado, mas como estava satisfeita, não
me opus ao seu pedido, só não pensei que esses três meses
fossem se arrastar.
— Eu tenho uma coisa para você. — Ele deposita um beijo em
minha testa e se levanta.
— Espero que seja um vibrador! — Grito e ouço sua
gargalhada.
— Vai sonhando. — Ele diz em tom de aviso ao adentrar o
quarto carregando uma caixa quadrada de veludo branco.
Michael a solta em cima da cama e tira a tampa, revelando
uma ostentosa coroa de ouro branco, com pequenos brilhantes e
delicados brincos na forma de gota.
— Vamos ficar pobres? — Pergunto posicionando a coroa na
cabeça, tentando firmá-la com o peso.
— Capaz, comprei no eBay. — Ele brinca e acrescenta mais
sério: — Você precisa de algo novo, certo?
Ah, claro a superstição.
Algo novo, velho, emprestado e azul.
Mica me emprestou o persex branco, mas acredito que
faltaram coisas.
— Eu tenho algo para você também. — Comento com um
sorriso.
— Eu não vou cair nessa de novo, Lindara. Amanhã! — Ele
enfatiza, então faço beicinho. — Eu preciso ir, você ficará bem?
— Sim. — Assinto sentindo a ansiedade tomando conta,
Michael para na entrada do quarto e posso ver que ele sente o
mesmo, então antes dele sair eu digo: — Nos vemos no altar.
Ele abre um sorriso satisfatório.
— Eu estarei esperando por você. — Michael afirma e me
deixa só.
Me deito para trás com meus olhos transbordando em
lágrimas.
Malditas lágrimas, além do meu corpo o meu rosto também
ficará inchado.
— Linda? — Ouço Dylan chamar da porta.
— Sou toda sua. — Aviso me sentando novamente.
— Está chorando?
— Não. — Digo secando a face.
— Preciso fazer os ajustes.
Apenas assinto.
Quando entro no atelier só está Levi, mexendo no celular.
— Sua irmã foi embora. — Ele avisa. — Volta só amanhã.
— Ela estava chateada?
— Não, estava bem feliz na verdade.
Que bom!
Subo no pedestal e deixo Dylan marcar as medidas, enquanto
Levi me conta que Madson levou a filha do dono da mercearia no
apartamento e pegou os dois aos beijos no sofá. Depois que a
menina foi embora, ele pediu ao Levi que guardasse segredo. E aqui
está o segredo.
— Vou pedir para o Michael conversar com ele, o que eu
menos quero agora é um bebê para cuidar.
Os dois concordam.

Deito-me sozinha, ruminando o que aqueles dois disseram.


Madson tem se saído muito responsável até então, ele é um garoto
tímido e inocente, e não me deu dor de cabeça como eu pensei que
daria. Ele ficou muito feliz quando entrou em sua nova casa pela
primeira vez, percebi que até as coisas mais simples o deixavam
contente, bom, para quem vivia num trailer em um canto perdido do
México, um apartamento no Central Park é o paraíso.
— Linda, posso dormir com você? — Emma pergunta
entrando no quarto.
— Claro. — Bato no colchão e ela corre para debaixo das
cobertas.
Emma está enorme, com quase sete anos. E pensar que eu
só estou aqui porque essa linda garotinha precisava de uma babá.
— Amanhã vou ter uma família como todo mundo. — Ela fala
em seguida dá um longo bocejo.
— Você já tem querida. — Afirmo abraçando-a, não demora
segundos e eu adormeço.

Acordo com Micaela fazendo cosquinhas nos meus pés. Mal


consigo abrir os olhos, estou acabada, parece que ando matando
um leão por dia e depois comendo-o.
— Vai embora. — Resmungo e puxo a coberta.
— Precisamos conversar. — Ela avisa séria e por algum
motivo o seu tom de voz me deixa preocupada. Me sento e faço
sinal de silêncio para não acordar Emma.
— Vamos ao banheiro. — Mica sussurra.
Pego meu robe branco de cima da poltrona e a sigo.
— O que foi? Caleb está bem?
— Sim, ele está ótimo.
— Então? — Pergunto com um longo bocejo fazendo uma
lágrima escorrer no canto do meu olho.
— Acho que você está grávida. — Ela comenta com
naturalidade, encaro Mica com a visão turva, tentando processar o
que ela acabou de falar. Meu senso de humor anda terrível faz dias,
então eu não sei se é para ser engraçado, ou uma tradição idiota de
deixar a noiva maluca horas antes do casamento.
— Enlouqueceu? — Questiono, jogando água fria no rosto,
para ver se acordo de uma vez.
— Aumento de peso, peitos enormes, irritação, sonolência,
sensibilidade… Você chorou assistindo A Bailarina com Emma.
A encaro chocada.
— Eu ganhei peso porque não transo há meses.
Ela me encara chocada.
— Lindara, pensa um pouquinho...
— Não! Não tem nada para pensar. — Digo secamente. — Em
qual mundo você estava quando eu contei que Michael não pode ter
filhos? — Ela aperta os lábios e seus olhos caem para minha barriga
me fazendo fechar o robe com força.
— É um bom argumento. — Ela sibila. — Mas a sua barriga
está durinha igual a minha quando descobri que estava grávida.
— Durinha de waffles e bacon com ovos.
Ela aperta os lábios, em dúvida.
— Eu comprei seis testes de farmácia.
— Vai distribuir no final da festa? — Pergunto pasma.
— Não! Quando eu pensei que eu estava grávida comprei 10.
— Ela dá de ombros.
— Estava em promoção? — Pergunto com escarnio.
— Ai, Senhor! Para de fazer gracinha, Lindara. — Resmunga.
— Eu estava apavorada.
— Eu não estou, mas você está me deixando. — Digo
incrédula.
Minha irmã se aproxima e me segura pelos braços.
— Eu não queria tocar nesse assunto. — Ela faz uma longa
pausa, fazendo meu coração acelerar. — Lembra quando a Sabrina
engravidou e o Michael foi ao médico? Ele ficou na dúvida...
— Ficou. — Paro e me recordo daquele momento
constrangedor no consultório. — E ele não era o pai, porque não
pode ter filhos. Caralho!
— Você é mais teimosa que uma mula. — Resmunga — Faça
o teste. — Ela pede, enfiando a mão na bolsa e pegando uma
caixinha fina e comprida.
— Mica… — Digo me sentindo enjoada com a situação. — Eu
preciso me arrumar, minha única função hoje é dizer “aceito”.
— E não errar o nome do noivo. — Ela fala com um riso e na
hora que vou sair do banheiro ela se coloca a minha frente.
— Faz a porra do teste, ou eu chamo Michael aqui.
— Meu Deus! Eu vou banir você da cerimônia se continuar
com esse comportamento.
— Lindara, faz! — Ela diz abrindo a caixa e descantando o
plástico em volta do palito.
— Estou ficando com medo de você. — Aviso, preocupada.
— Por favor. — Ela choraminga. — É só urinar.
— Não me diga! — Rosno frustrada, pegando o palito com
força da mão dela. — Pode se virar pelo menos.
Faço o teste rapidamente e o solto em cima da pia, Mica se
vira para ele, enérgica. Até parece que organizaram um bolão para
saber se eu estou grávida.
— Se divirta. — Aviso saindo do banheiro, sem esperar o
resultado.
Emma ainda está apagada na cama, a cubro e desço tomar
café, estou faminta. Se eu disser isso a Micaela, ela dirá que é outro
sintoma de gravidez. Suspiro.
Entro na cozinha e está vazia, relaxo instantaneamente e abro
a geladeira sem culpa, mereço algo gostoso só por aturar as asnices
da Micaela. Gostaria de dizer que nunca a vi tão fora de si, mas
estaria mentindo.
Pego um bolo de chocolate com morangos e um copo de leite.
Dylan que lute em fazer aquele vestido entrar em mim. Rio e quando
fecho a geladeira, Micaela surge atrás da porta.
— Porra! Quer me matar do coração?
— Me desculpe, por antes. — Ela diz pegando uma colher e
beliscando o meu bolo do outro lado da ilha.
— Deu negativo, não é? — Afirmo revirando os olhos e me
sentindo feliz por não dar esse gostinho a ela.
— Me desculpa, Linda. — Ela fala com pesar.
— Tudo bem, Mica. Eu vou fazer dieta depois da lua de mel.
— Enfatizo lambendo a colher, fazendo-a rir.
— E que história é aquela de que vocês não transam mais? —
Ela pergunta curiosa.
Ficamos sentadas à ilha conversando e comendo bolo até o
dia clarear.
É início de março, a temperatura está gostosa e a neve desse
ano foi escassa, para a nossa felicidade, já que a cerimônia ocorrerá
do lado de fora da casa. Ainda não tive a oportunidade de ver como
a decoração ficou, Dylan que organizou tudo. Michael quer que seja
surpresa. Estou ansiosa.
— Bom dia, meninas! — Levi entra bocejando e Dylan
também logo atrás.
Mica e eu nos entreolhamos e apertamos os lábios juntas,
imaginado a mesma coisa, provavelmente.
Dylan rompeu um relacionamento de longa data quando eu
ainda estava sem memória. E nesses meses que passou
organizando meu casamento, ele e Levi ficaram bem próximos, mas
nunca deixaram nada evidente como hoje.
— Bom dia, meninos. — Saúdo, mexendo as sobrancelhas
para Levi com uma pergunta silenciosa. Ele cora ligeiramente.
— Está melhor, Linda? — Dylan pergunta, fito Mica pensando
que tenho todos os motivos para dizer que não.
— Estou ótima, vou me casar com um homem rico. — Digo
rindo. — E que eu amo, é claro.
— O sonho americano. — Levi debocha.
— E as minhas madrinhas, como estão?
— Duas estão aqui. — Dylan responde. — E Harrison, Mark e
Axel já estão com o Michael no hotel.
Convencer aqueles três a serem minhas madrinhas não foi
difícil, ainda mais porque eu os convidei na presença do Michael e
disse que precisava da resposta imediata. Depois comentei por alto
que as madrinhas ganhariam presentes maravilhosos, se sorrissem
durante a cerimônia.
— É só vestir um terno, acho que eles dão conta. — Micaela
comenta.
— Linda, você precisa tomar um banho. Vivian chega em uma
hora, para arrumar você.
— Claro. Levi, gostaria de se juntar a mim? — Pergunto louca
para arrancar umas fofocas dele.
— No banho? Não, obrigado. — Ele diz fazendo gracinha.
Ao chegar no quarto, encontro Emma deitada na cama vendo
desenho em no tablet.
— Não vai tomar café? — Pergunto tirando o robe.
— Não estou com fome agora. — Ela avisa e logo se dispersa
rindo do desenho.
Entro no banheiro e o teste não está mais lá, Micaela ficou
mais abalada que eu, a maternidade mexeu mesmo com ela. Retiro
minha roupa em frente ao amplo espelho e inevitavelmente meus
olhos caem sobre o meu corpo. Aliso meu abdômen e está com um
visível volume, mas o que eu poderia esperar depois de comer dois
pedaços de bolo e um copão de leite há meia hora.
Tomo banho, treinando o meu “aceito”. A última vez que me
senti tão nervosa assim, eu estava sendo jogada dentro de um
furgão. Argh! Péssima comparação.
Enrolo-me em uma toalha e entro no quarto atrás de algo para
vestir.
— Linda, o que isso faz? — Emma questiona sentada na
borda da cama, sacudido o teste.
Merda!
— É um termômetro. — Minto, vestindo o mesmo robe de
antes, rapidamente.
— Ahh… — Ela diz baixinho. — Então eu acho que você está
com febre. — Ela acrescenta tristemente.
— O que, Emma? — Pergunto pegando o palito da mãozinha
dela.
— Viu, positivo para febre. — Ela responde enquanto eu
encaro o teste com meu corpo inteiro tremendo e uma sensação
nauseante me dominando.
Impossível! Impossível! Impossível!
Penso debruçada sobre o vaso, despejando meu café inteiro
para fora.
— Lindara. Você está bem? — Mica pergunta do outro lado da
porta.
Sento-me no vaso e puxo a descarga, hiperventilando. Encaro
aquele pequeno palito e me questionando o óbvio. Como isso foi
acontecer?
Meu Deus!
— Linda?
Abro a porta e encaro Micaela com os olhos arregalados.
— Emma disse que você estava passando mal. — Entrego o
teste para ela e me sento na privada novamente.
— Você disse que deu negativo! — Rosno atordoada. — Isso
é impossível. Deve ser um falso positivo... tem que ser!
— Eu menti. — Ela dá de ombros, a encaro descrente com a
naturalidade que ela me fala. — É muito raro isso acontecer, confie
em mim eu pesquisei na internet. Se deu positivo, é positivo.
— Raro não é impossível. Impossível é eu estar grávida!
— Acalme-se, ficar agitada não fará bem para o bebê.
Cerro os olhos para ela.
Passo as mãos pelo rosto, aterrorizada, isso não podia estar
acontecendo hoje. Era para ser perfeito. Como vou explicar ao
Michael?
— Ah Linda, você vai amar ser mãe. — Ela diz saindo do
banheiro ao meu lado.
— Eu não estou preocupada com isso, Micaela.
— Deve haver uma explicação plausível. Senão, torcemos que
Michael seja religioso. — Ela diz tentando me fazer rir, mas não
consigo pensar em mais nada.
Três meses atrás foi a última vez que transamos, então é isso,
estou gravida de três meses?
Me sento na cama e me atiro para trás, abatida, Mica senta ao
meu lado e desliza sua mão para o meu corpo.
— Dá para parar de me apalpar? — Peço secamente.
— Nossa, me lembro do início, tudo me irritava. Pobre
Michael.
Lanço um olhar fervoroso para ela e me coloco de pé quando
meu celular começa a tocar na cômoda.
É ele.
— Oi. — Digo forçando uma voz natural.
— Querida, você está bem? Emma ligou e disse que está com
febre.
Ai meu Deus!
— Estou ótima, foi um mal-entendido. — Explico.
— Quer que eu vá aí?
Ah, agora ele pensa que eu quero fugir.
— Não, querido. Se arrume e nos vemos em algumas horas.
— Amo você. — Ele se despede e desliga.
Me viro para Micaela, aflita, e mordiscando o lábio.
— Acha errado eu me casar sem contar a ele?
— Não! Michael ama você, ele ficará feliz.
Será? Ele fez vasectomia para não ter mais filhos e agora vai
ter querendo ou não.
Uma batida suave soa na porta, em seguida Dylan enfia a
cabeça para dentro.
— Hora da maquiagem. — Assinto e peço num sussurro para
Mica esconder o teste.
Entro no atelier do Dylan e há uma jovem ruiva descarregando
muita maquiagem em cima de uma penteadeira.
— Febre? — Levi pergunta com uma sobrancelha arqueada e
seus olhos descem sobre meu corpo, mas voltam rapidamente a me
encarar quando eu estalo dois dedos em sua face.
— Quer fazer isso agora? Dylan. — Sibilo, para Levi de olhos
cerrados. E caminho até a maquiadora.
— Olá. — Saúdo me sentando em uma cadeira vermelha de
frente para um grande espelho.
— Queremos naturalidade, Vivian. — Dylan diz olhando para
mim no reflexo do espelho, isso foi tudo que eu pedi a ele.
Naturalidade. Quero que Michael me reconheça quando eu estiver
em pé diante dele no altar.
A mulher assente e me ajeita na cadeira, rapidamente ela
começa a trabalhar em minha face.
Ficar aqui parada sem poder falar ou abrir os olhos é terrível,
me dá muito tempo para refletir, e qualquer pensamento que tento
ter, me leva direto a gravidez. Nunca conversamos sobre filhos e
como eu nunca desejei ter, quando Michael contou que não podia,
não foi um problema para mim. Porém, agora grávida...
Grávida.
A palavra ecoa novamente em minha cabeça e eu a mexo em
negação.
— Não se mecha, estou quase terminando. — Vivian avisa e
de repente suas mãos soltam a minha face e ela me pede para abrir
os olhos. Obedeço prontamente e me deparo com meia dúzia de
cabeças me encarando pelo espelho, entre elas Beatriz e Evy. Meu
estômago embrulha ao encarar Beatriz, às vezes me pego
desejando que Evy fosse minha sogra.
Sento-me e me encaro no espelho, estou espantosamente
bela. Sombras claras com acabamento em dourado e longos cílios,
mas nada muito exagerado.
— Está tão linda, que dá vontade de chorar. — Dylan
comenta.
— Não comece, por favor. — Peço com meus olhos se
enchendo d’água.
— Dylan! — Vivian ralha com ele quando uma lágrima escorre
e ela vem rápida ampará-la.
— Me desculpe. — Ele diz mexendo a cabeça e se
recompondo. — No cabelo queremos divisão ao meio no topo da
cabeça, nada muito preso, um coque baixo e duas tranças na
diagonal. Tente deixar alguns fios soltos para suavizar a face e o
impacto da coroa. E o véu vai logo aqui embaixo. — Sinto Dylan
dançar com meus cabelos nas mãos, mostrando exatamente o
penteado que escolhi noites atrás.
A menina assente e começa a trabalhar novamente, fico
observando todos pelo espelho.
Levi, Evy e Dylan tagarelam de costas para mim em frente ao
vestido preso no manequim, e mais ao lado, Mica está amamentado
Caleb, enquanto brinca com a mãozinha dele. Ahh, fecho os olhos
me sentindo estranha e quando os abro Beatriz está ao meu lado.
— Michael ficará impressionado. — Ela comenta com um
sorriso.
— Obrigada. — É tudo que eu consigo pronunciar.
Tomara que um dia possamos deixar para trás tudo o que
aconteceu. Nesses seis meses nada mudou no meu relacionamento
com Beatriz. Das coisas que foram ditas, não consigo lembrar uma
da qual eu me arrependa e aposto que ela também.
— Um passarinho me contou que precisa de algo velho e azul.
— Ela diz me olhando pelo espelho e com um gesto simples ela tira
o seu anel do dedo anelar e me estende. — Mais velho que o
Michael e azul. — Ela acrescenta fazendo um rebuliço começar no
meu interior e de repente sinto todo o sangue em meu rosto.
— Tem certeza? — Pergunto olhando o anel de platina com
uma delicada pedra azul topázio em cima.
— Claro. Dê a sua filha. — Ela diz com um olhar que sabe
demais. — Ou a Emma.
— Obrigada. — Falo com meus olhos marejados de lágrimas
novamente e deslizo o anel em meu dedo.
Meu Deus, eu vou estar desidratada até o final do casamento.
Quando Vivian termina de fazer o meu penteado só estamos
eu e Dylan no ateliê. Fico em pé sentindo um formigamento na
bunda e subo no pedestal sem pressa. Dylan se aproxima com o
longo vestido e me ajuda a vesti-lo. Me encaro no espelho enquanto
ele fecha os botões com facilidade dessa vez.
O vestido é simplesmente fabuloso, a saia é de cetim e tem
uma longa calda de dois metros, e renda costurada na borda. Na
parte de cima é revestido com renda soutache e um modesto decote
no formato de coração. É um sonho.
— Segure as lágrimas, ainda falta à coroa e o véu. — Dylan
diz se aproximando com os dois.
Ele me entrega o véu que tem mais de quatro metros e na
borda ele contém a mesma renda que a calda. Dylan fixa a cora com
pressão na minha cabeça, em seguida coloca as mãos nos bolsos
do terno azul marinho e pega os brincos que acompanham a coroa e
persex da Mica.
É tanto acessório que começa a me bater um certo
desconforto e uma necessidade urgente de arrancar tudo.
— Respira, Linda.
— Tudo bem por aqui? — Uma voz soa longe e quando me
viro encontro Alma na entrada. Ela se aproxima usando um luxuoso
vestido preto e me abraça pela cintura.
— Você veio! — Digo admirada tentando me recompor.
— Eu não perderia o seu casamento por nada, meu bem.
A primeira-dama e eu nos tornamos boas amigas. Depois que
voltei do México, ela me telefonou dizendo que estava na cidade
para um evento beneficente. Saímos para almoçar e passamos o
resto do dia juntas, foi divertido e libertador ajudar quem realmente
precisa. E por consequência desse evento, sempre que tem algum
próximo de Manhattan, ela me avisa e nos encontramos.
— Você está um arraso. — Ela comenta enquanto Dylan
termina de colocar os brincos.
— Vou te dar um minuto. — Ele avisa e se retira nos deixando
a sós.
— Você está pálida para cacete, Lindara. — Alma diz me
arrancando um sorriso.
Ela é tão pomposa que quando fala besteira eu não me
aguento, nem parece à primeira-dama.
— Estou me sentindo o Snoop Dogg, com tantos
penduricalhos. — Zombo.
— Aqui está mais um. — Ela diz e me entrega uma caixinha
preta.
— Não precisa... — Paraliso e arregalando os olhos para uma
pulseira de brilhantes. — Uau! — Sussurro.
— Segura mais essa Snoop Dogg. — Ela sorri animada. — E
não precisa agradecer, você sabe como eu adoro tirar dinheiro do
Andrews.
Realmente ela adora. E já que ela sabe de todos os podres do
governador, eu não a culpo, só não entendo porque ainda continua
casada.
— Agora me conta, por que está sufocando? Quer fugir, eu te
ajudo, só conta ao Michael.
— É só o nervosismo.
— O que eu vou dizer não vai deixá-la mais tranquila, mas
estará preparada pelo menos. Devem ter umas 150 pessoas lá fora,
ansiosas para ver a noiva. E você parece que comeu algo
estragado, noite passada e esqueceu de pôr tudo para fora.
Vou pôr para fora em seis meses, penso e respiro fundo,
então Emma entra no atelier, vestida de daminha e meu coração
aquece, com a graciosidade dela.
— Estou igual a você, Linda. — Ela comenta sorrindo e
entregando o buquê de rosas brancas e vermelhas.
— Está sim, querida.
Uma batida seca soou na porta.
— Pode entrar. — Aviso e Madson adentra usando um terno
azul marinho, ele será uns dos padrinhos do Michael e está muito
bonito.
Alma convida Emma para dar uma volta no jardim e nos deixa
a sós.
— Você está bonita. — Ele sorri, agradeço, descendo do
pedestal. — Na verdade você sempre está bonita, mas hoje... uau.
— Ele diz com exagero.
— Você está bem, Madson?
— Sim. Obrigado por me convidar. — Madson mexe no terno
e passa uma mão no cabelo espetado. — Acho que nunca estive tão
bonito também.
Sorrimos.
— Está lindo. — Confirmo.
— É uma pena ele não estar aqui para levá-la no altar.
— Ele está de certa forma, não se preocupe com isso.
— Está na hora! — Dylan abre a porta e ouço um acorde de
violino tocar a canção de Chopin, Nocturne, causando um doce
arrepio por baixo da manga do vestido.
Seguro na saia puxando-a para cima e Dylan caminha para
trás das minhas costas, pegando em meu véu e quando estamos
saindo do atelier, vejo o meu reflexo no espelho, meu queixo cai
momentaneamente. Porra! Nunca mais vou tirar essa roupa.
— Precisamos ir. — Dylan gralha às minhas costas.
Meu sangue lateja, parecendo um tambor nos meus ouvidos
quando começo a me mover para o corredor e no instante que
chego à escada, sinto o cheiro de flor de lótus no ar e vejo a sala de
estar transformada com flores, laços e guirlandas para todos os
lados, até o corrimão da escada está decorado com cetim.
Madson acena para mim e abre a porta principal, a música
está chegando ao fim e próxima será a tradicional marcha de
Mendelssohn.
Lá embaixo Emma gesticula para eu descer, animada, ela está
segurando uma cesta de pétalas brancas. Me seguro no corrimão
com força, tentando não pensar na multidão que estará me
encarando quando eu passar por aquela porta.
Firmo as pernas e desço o restante dos degraus me
posicionando na entrada da porta, Dylan faz sinal para Emma ir e
volta para as minhas costas arrumando o longo véu.
— Eu preciso ir agora, querida, conte até dez e venha.
Assinto, segurando o buquê com as duas mãos, tentando
esconder a tremedeira. Dylan me deixa sozinha, olho para trás para
a vastidão da casa e não me sinto só, parece que eu estou onde
devia estar, em meu lar.
Firmo as pernas e peço mentalmente para Deus não me
deixar cair, no instante que saio da casa e sigo o rastro de pétalas
brancas que Emma foi soltando em cima do gramado.
Mantenho o meu olhar no buquê, quando faço a curva saindo
da varanda. Puxo ar com força criando coragem, ergo o olhar, para
uma multidão em pé, voltada para mim. O meu coração explode,
está tudo tão belo, suave, sem exageros.
O meu casamento está acontecendo.
Mal consigo acreditar.
Mal consigo acreditar que tem um bebê dentro de mim.
Não posso pensar nisso agora!
Deslizo para o estreito corredor, desfilando entre as fileiras de
cadeiras enfeitadas com pequenos véus. Sorrio admirada. E no
momento que eu encaro o altar, meus olhos se perdem na
imensidão dos dele.
Minhas pernas fraquejaram e por um milésimo de segundo eu
me sinto travar.
Michael morde o lábio inferior e dá um sorriso devastador, que
me faz corar.
Atrás dele há um amplo portal de madeira, decorado com
cetim e muitas flores. Meus olhos transbordam em lágrimas na
perdição de cada detalhe. Encaro Mica usando um brilhoso vestido
azul-marinho com caimento no decote, ela está em pé com o
restante das madrinhas ao lado esquerdo do altar e todos estão com
sorrisos radiantes.
Estou estendendo a mão ao Michael quando finalmente a
música chega ao fim e um silêncio ensurdecedor toma conta do
ambiente. Meu coração bate em um ritmo descompassado, parece
que até o ministro está conseguindo escutá-lo, pela forma que ele
me olha, ou talvez seja porque minha face esteja corada e tomada
de lágrimas.
— Você está linda. — Michael diz fazendo o meu rosto
incendiar.
Entrego o meu buquê para Mica, que chora tanto quanto eu.
Nos viramos para o ministro Charles ainda com os dedos
enroscados, a mão calorosa do Michael me passa um sentimento de
paz e eu não a largaria por nada.
— Senhoras e senhores estamos aqui para celebrar a união
de Michael O’Connor e Lindara Fincher. — Ele anuncia em alto e
bom som, fazendo sinal para todos sentarem.
Michael se volta para mim e consigo sentir sua agitação, ele
está feliz, radiante como nunca. Consigo ver seus músculos rígidos,
por baixo do seu smoking impecavelmente preto com a gravata
borboleta.
Controlo o meu desejo de tocá-lo e me volto para o ministro.
— Lindara, você aceita Michael como seu legítimo esposo,
prometendo ser fiel, amá-lo e respeitá-lo, na alegria e na tristeza, na
saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, por todos os dias da
sua vida. Até que a morte os separe?
— Aceito. — Digo com a voz baixa e por incrível que pareça,
suave, Michael acaricia os nós dos meus dedos com o polegar e me
dá o mais esplendoroso sorriso que eu já vi.
Enquanto o ministro lê os votos para ele, tudo que eu consigo
pensar é que nada em minha vida fez tanto sentindo quanto agora.
O nosso mundo se colidiu causando uma puta bagunça para ambos
os lados, depois de tanto sofrimento conseguimos dar a volta por
cima e colocá-lo nos eixos. Eu farei de tudo para mantê-lo no lugar.
Quando o ministro termina de citar os votos, Michael me olha
tão intensamente, que faz minhas entranhas se torcerem e fala com
a voz grave, e triunfante.
— Eu aceito. — Ele se vira para trás e pega as alianças com
Dylan.
Michael segura minha mão e desliza a fina aliança dourada
em meu dedo anelar, junto com o anel de noivado. Em seguida ele
me entrega a sua e meus dedos tremem brevemente enquanto eu
deslizo o anel em seu dedo.
— Oficialmente meu. — Aviso, ganhando um sorriso dele.
— Se existe alguém aqui presente que se opõe a este
casamento, por favor, fale agora ou se cale para sempre. —
Quando o ministro profere essas malditas palavras, contenho o
impulso de passar pelo Michael e fuzilar Dylan.
Eu disse a ele que precisava conversar com o ministro sobre
essa parte antes da cerimônia, e ele disse: Deixa que eu resolvo.
O silêncio perpetuou. E eu apenas senti o suave toque do
Michael em meu braço, sinalizando que agora era tarde, estamos
casados.
— Pelos poderes a mim concedidos, eu vos declaro marido e
mulher! O noivo já pode beijar a noiva!
Michael me envolve em seus braços e eu me perco
inteiramente nele, seus lábios macios acariciam os meus com
ternura e lentidão. Fazendo-me esquecer completamente que
estávamos rodeados por uma multidão.
Ao encerramos o beijo, os convidados se levantam e
aplaudem fazendo uma descarga de emoção percorrer meu corpo.
Os padrinhos e as madrinhas foram os primeiros a se
aproximarem para nos abraçar.
Enfim casados. É estranho, mas a sensação é de ter vencido
uma guerra.
— Parabéns, a cerimônia foi linda. — O pai do Michael
comenta com Beatriz ao seu lado. Robert O’Connor, um homem
sério e de poucas palavras, mas grandes demonstrações, afinal foi
ele quem bancou o casamento, como um presente para nós.
— Bem-vinda à família Sra. O’Connor. — Beatriz diz passando
os braços em minha volta. Senhora O’Connor, tá aí uma coisa da
qual terei que me acostumar.

Uma música começou baixinho enquanto ainda estávamos


sendo parabenizados pelos convidados e em seguida teve uma
sessão interminável de fotos. A festa se espalhou quando os
garçons começaram a servir os petiscos e as bebidas.
E o som que antes era suave, executado por cinco violinistas,
se transformou em uma batida constante, fazendo os mais jovens
dançarem sobre centenas de luzes brilhantes.
O sol estava se pondo no horizonte. Tínhamos pelo menos
mais duas horas de festa e então, iriamos para nossa lua de mel.
Distraída, olhando as pessoas dançarem e se divertirem, me
pego pensando em como conversar com Michael, consegui até
esquecer durante a cerimônia, mas toda vez que minha mão esbarra
sobre o meu abdômen, parece que meu instinto emite um sinal de
alerta que não me deixa ignorar.
De repente meu corpo e tomado por trás e braços musculosos
me envolvem em um forte abraço.
— Está pensando em que? — Michael questiona contra a
minha orelha.
— Na nossa lua de mel. — Com certeza lá será um bom lugar
para contar, só espero não estar jogando um balde de água fria em
nossa noite de núpcias.
— Humm. — Ele beija minha orelha me provocando um
arrepio. — Hoje à noite eu vou fazer você gemer tão alto, Lindara,
que vai reverberar até nos sete sinos Pisa. — Ele ronrona como um
amante depravado.
— Pensei que fossemos para França.
— Para você ver como vai ser alto. — Ele diz, fazendo meu
corpo romper em uma gargalhada. Michael me pega pela cintura e
me vira para ele, com um sorriso contagiante.
— O meu marido é um pervertido! — Digo fingindo surpresa.
— Sou o que você desejar, querida. — Ele diz com um olhar
libertino e segura meu quadril fazendo movimentos leves com
nossos corpos, acompanhando uma música muito distante.
— Vai se arrepender de ter dito isso. — Seguro na lapela de
cetim do seu smoking puxando-o para um beijo quente e urgente.
Um beijo do Michael consegue me conflagrar, se eu pudesse o
arrastava para a casa da árvore e consumava o casamento ali
mesmo.
— Deixem um pouco para a lua de mel. — Levi assobia. —
Será que eu posso dançar com a noiva? — Ele questiona me
tomando dos braços do Michael antes que eu pudesse negar. Sei
que ele está cheio de perguntas.
Ele me puxa pelo braço para a pista de dança, onde estão
Blake e Mica se balançando com o bebê no meio deles, é muito fofo.
— Pensei que você fosse tirar os sapatos e sair correndo para
o altar. — Ele comenta, me segurando firme pela cintura e guiando
nossos passos.
— Ficou tão evidente?
— Não tanto quanto a febre. — Ele diz com um riso atrevido.
— Quantos graus você está? Aperto os olhos, depois escoro a
cabeça em seu peito, esmorecida.
— Três graus.
— Isso é maravilhoso. — Levi diz animado.
— Shhh! — Resmungo fazendo-o apertar os lábios e antes
que eu pudesse questionar sobre Dylan sinto um cutucão nas
minhas costas.
— Posso dançar com a noiva?
Meu queixo cai quando vejo quem está atrás de mim.
— Olá, madrinha. — Digo ao Axel que me dá um olhar feio e
me segura pela cintura mantendo uma distância razoável.
— Agora que você é oficialmente a minha chefe, eu quero
avisar que estou me demitindo.
— Oh. — Fico pasma. — Que pena ia te dar um aumento. —
Aviso fazendo-o rir.
— Quero abrir meu próprio negócio e os outros estão comigo.
— Todos? — Questiono decepcionada. — Por que só você
está me dizendo isso, Axel?
— Harrison e Mark iriam chorar junto com você. — Ele diz na
hora que vê minhas lágrimas rolarem. — Vocês são muito
sentimentais. — Ele comenta com um sorriso e acrescenta: —
Estaremos sempre perto, afinal somos as madrinhas. — Ele diz
amável e quando a música termina, Axel se distancia e diz algo que
começa a me preocupar:
— Parabéns pela febre.
Puta merda!
Como ele sabe?
Quem mais sabe?
Preciso pegar Michael e cair fora dessa festa antes que ele
descubra por outra pessoa.
Olho a minha volta a procura dele e vejo um aglomerado de
pessoas bebendo e conversando, menos o meu marido.
— Está na hora da troca de vestido, Lindara. — Dylan surge
por trás e me leva para dentro da casa com passos largos.
— Cadê o Michael?
— O marido é seu. — Ele debocha, me fazendo apertar os
olhos.
— Está saindo com Levi? — O pego de surpresa, enquanto
ele retira a coroa.
— Acho que eu vi Michael dançando com Emma perto do bolo
e por falar nisso precisamos cortá-lo antes de vocês partirem. —
Dylan desconversa como se não tivesse escutado a minha pergunta
e age naturalmente.
Cretino!
Dylan tira meu vestido e o solta na cadeira onde fui arrumada.
Tenho uma sensação de leveza tanto no corpo quanto na cabeça.
Ele passa por mim com rapidez e descobre o vestido pós-cerimônia.
O vestido é parecido com o do casamento, no entanto, ele é
curto, acima dos joelhos e contém duas camadas de tule sobre do
pequeno tecido de cetim. Tem um corte redondo que desenha o
contorno dos meus ombros e seu decote é reto, com muita renda, o
que facilita sua entrada.
O visto com agilidade e presteza, e quando Dylan prende o
último botão eu corro porta fora sem esperá-lo. Ele berra o meu
nome, mas eu já estou longe. No momento em que alcanço a
escada, vejo que os convidados estão dentro da casa, todos
segurando uma taça olhando para mim com o Michael entre eles.
Cacete! Fico pálida rapidamente e desconfortável com toda a
atenção repentina.
— Aí está ela. — Ele comenta com um sorriso amável.
Michael está no centro dos convidados sem a parte superior
do smoking, segurando uma taça para o alto.
— Quando a conheci tive que decidir se iria odiá-la ou amá-la,
não foi uma escolha difícil. — Ele umedece os lábios com um sorriso
e prossegue: — Me apaixonei por ela assim que socou a minha cara
nesta sala de estar. — Diz tirando risos de todos. — E quando
colocou a sua vida em risco para proteger a da minha filha... A partir
daquele dia, eu não vi mais a minha vida sem ela.
Ele estende sua mão em minha direção e antes que pudesse
dar um passo fora do lugar, nossa música rompe pelos cantos da
casa, me arrancado um sorriso. Desço os degraus ávida e com o
coração explodindo no peito me jogo intensamente em seus braços
e Michael me gira no alto.
Eu me senti no ápice da alegria, era tanta felicidade que ela
parecia resplandecer para fora do meu corpo.
Quando alcanço os pés no chão, ele segura firme minha mão
direita e me gira duas vezes me pegando de surpresa e fazendo o
tule do meu vestido subir. Em seguida me puxa fortemente e me
segura pela cintura, com um sorriso glorioso estampando em sua
face.
Naquele momento, eu me perdi naquela imensidão de alegria
e mais nada no mundo importava, apenas nós dois girando naquela
sala.
PARIS

Deixamos a festa logo depois de cortar o bolo. A saída foi tão


bela quanto o início do casamento. Os convidados nos esperaram
ao lado de fora formando um largo e longo corredor. Passamos por
eles levando uma chuva de arroz nas costas. E quando cheguei ao
carro atirei o meu buquê com força acertando Cassian que o lançou
para longe imediatamente. O buquê atingiu Levi que sorriu nervoso
e consequentemente jogou as flores para o alto, que acabaram
caindo nos braços do Dylan. E antes que o buquê voasse outra vez,
eu resmunguei avisando que não era uma bola, então Dylan o
colocou embaixo do braço feliz.
Adentrei o Tesla rindo da situação, o carro estava enfeitado
com longos laços brancos na traseira e uma pequena placa escrita
em vermelho com letra de forma, recém-casados.
Viajamos de jatinho graças ao “benevolente” governador e
chegamos ao nosso destino em tempo recorde. No voo fiquei
criando coragem de falar sobre a febre... mas parecia que ainda não
era a hora certa. Estão aproveitei que estava acabada e adormeci
em um confortável assento com Michael massageando os meus
pés.
Sinto grandes mãos agarrarem meus ombros e me sacudirem
suavemente. Abro os olhos com uma puta dificuldade e junto às
sobrancelhas sem nenhuma compreensão do que estava
acontecendo.
— Chegamos, Sra. O’Connor. — Michael fala me fazendo
despertar, ele sorri e me ajuda a ficar de pé. Dou uma longa
espreguiçada sentindo meu corpo inteiro rígido.
— Bienvenue à Paris. — A comissária anuncia.
Descemos do jatinho na fria madruga da França e já tem um
carro esperando por nós.
Michael tira o seu paletó e põe sobre os meus ombros, sorrio
em agradecimento enquanto ele abre a porta para mim, em seguida
escorrega para dentro do carro e liga o GPS. Nosso Hotel Plaza
Boulevards Royal surge no mapa a menos de quinze minutos, já que
não há trânsito algum neste horário.
— É tão lindo aqui. — Comento quando entramos em uma
avenida vazia.
— É sim. Da próxima vez pode ser uma viagem em família,
Emma ia adorar Paris.
— Ah, ela já está nos cobrando uma viagem há meses.
— Fiquei preocupo quando ela me ligou. — Ele fala me
pegando desprevenida.
Michael desliza sua mão para o interior da minha perna e a
acaricia com o polegar. Consigo sentir o apenas o martelar do meu
coração crescendo. Eu não sei o que dizer. Eu não sei como dizer.
— Está distante, querida, tudo bem?
— Sim. — Afirmo sentindo meu couro cabeludo pinicar. — Na
verdade estou ótima, só um pouco dormente ainda.
Ele imite um hum baixinho, desconfiado e escorrega mais a
sua mão para dentro do meu vestido e no mesmo instante afasto as
pernas, ganhando um sorriso atrevido dele.
— Estamos quase lá. — Ele avisa, com uma mão no volante e
outra em mim.
— Se você continuar fazendo isso, eu também. — Digo com a
voz tensa, sentindo o sangue bombear loucamente enquanto ele me
acaricia por cima do tecido da calcinha.
— Lamento, querida. — Michael estaciona.
— Droga! — Xingo alto, tirando uma risada dele.
Desço do carro, sôfrega e com as pernas bambas, eu preciso
do Michael agora!
Eu tenho seis meses para contar desse bebê, ele pode
esperar mais algumas horas.
O lado de fora do hotel é tão grande que mal dá para ver toda
a sua amplitude, ele é todo branco, com grandes portas francesas.
Parece um palácio contemporâneo.
Enquanto Michael pega o nosso cartão de entrada para a lua
de mel, eu me encontro perdidamente encantada pelos detalhes do
hotel. Portas giratórias, um longo tapete vermelho que se estende a
diversos elevadores.
— Esse lugar é incrível! — Comento dentro do elevador.
— Você precisa ver a suíte.
— Já esteve aqui, Michael? — Pergunto.
— Eu vi as fotos pelo site. Ciumenta! — Ele me pega nos
braços rindo, quando as portas do elevador se abrem.
Michael anda comigo por um longo corredor com inúmeras
portas.
Paramos em frente a uma, com laços dourados e corações
vermelhos pendurados na extremidade e um pouco abaixo do olho
mágico, tem uma plaquinha grafada em dourado também, recém-
casados.
— Bem atenciosos. — Comento, alisando uma das fitas.
Adentramos, o quarto é descomunal igual à cama que está
repleta de pétalas vermelhas e bombons por cima de um lençol
branco. As paredes são claras e a gigantesca porta francesa permite
que a claridade da Torre Eiffel ilumine o interior do quarto.
— É lindo, não é? — Ele sussurra contra a minha orelha, me
causando um calafrio.
— Temos a Torre Eiffel na nossa varanda! — Digo
boquiaberta. — É perfeito, Michael.
Pulo dos braços dele e caminho para a varanda, há uma
pequena mesa de vidro, redonda, e cadeiras de ferro, escuro.
— É tão alto. — Comento me segurando na balaustrada de
concreto olhando para baixo. Michael passa os braços a minha volta
e me puxa para trás com cuidado.
— É muito alto, então fique longe. — Ele adverte com um riso,
mas com um tom de seriedade.
Viro-me para ele e deslizo os braços pelos seus ombros, meu
marido está com um sorriso bobo. Ele desce seu rosto se
aproximando, então esfrega a ponta do seu nariz no meu com
ternura. Solto a respiração lentamente e quando os lábios dele
encontraram os meus, e sua língua enrosca na minha, sinto meu
corpo inteiro pinicar como se houvesse uma descarga elétrica entre
nós.
O beijo fica mais forte a cada momento. Solto-me dele e tiro o
seu paletó deixando-o cair aos nossos pés.
— Bonjour, Monsieur. — Murmuro contra sua boca, quando
ele me puxa com força e consigo sentir seu pau pressionar a minha
barriga.
Michael ri fazendo vento em meus cabelos, ele me pega nos
braços e me carrega para dentro do quarto. Meus lábios grudam nos
dele antes mesmo do Michael me soltar sentada na cama.
Meus dedos ágeis e ávidos correm para sua calça, abro o
botão e a puxo para baixo o deixando apenas de cueca. Sinto que
vou explodir a qualquer momento, eufórica.
Três meses! Quem fica tanto tempo sem transar quando se
tem noivo?
Meu marido rio na hora que o pego pelos ombros e o empurro
para cima cama. Monto nele com o vestido e tudo. Michael senta e
eu volto a beijá-lo.
Ele traceja as mãos até chegar aos meus calcanhares e retira
os meus sapatos. Depois sua mão sobe muito lentamente e abre
vagarosamente cada botão do meu vestido.
— Não seja cruel. — Peço, ansiosa para tê-lo dentro de mim.
— Três meses, querida. Vai valer a espera. Eu prometo. — Ele
sibila, como se quisesse retardar esse momento.
— Com certeza vai!
Não sei se são os meus hormônios, mas nesse momento eu
vejo Michael como um imenso filé malpassado e eu estou louca para
devorá-lo.
Tiro o meu vestido, afoita, ficando apena de calcinha em cima
dele e o deito para trás com gentileza, para ele ver que me preocupo
com os sentimentos dele.
Michael dá um largo sorriso como se percebesse as minhas
intenções e se senta novamente, me fazendo pôr as mãos na
cintura, como uma mãe prestes a xingar o seu filho por mal
comportamento.
— Precisamos conversar primeiro. — Ele informa fazendo
meu corpo inteiro congelar no lugar. Ele sabe e pensar nisso faz
involuntariamente meus olhos se enchem d’água.
Michael me segura pela cintura com firmeza e me encara sem
compreensão alguma.
— Por que está chorando? — Ele pergunta perplexo, quando
levo as mãos ao rosto. — Nós já vamos transar, querida. — Ele
explica me fazendo rir.
— Não é isso. — Engulo em seco, mexendo a cabeça em
negação. — Sobre o que você quer conversar? — Pergunto confusa
e em dúvida.
— Lindara... — Meu nome sai como um sopro pelos seus
lábios e seus olhos se estreitam sem entender o meu abatimento.
— Me fale. — Insisto.
Michael morde o seu lábio inferior até deixa-lo rosado, ele
puxa o ar e sinto que faz com uma certa dificuldade.
— Eu fui ao médico há alguns meses… — Ele pausa e sua
garganta oscila como estivesse ganhando tempo para encontrar as
palavras certas.
— Michael… — Balbucio sentindo uma queimação na
garganta.
— Eu reverti à vasectomia. — Ele fala abruptamente fazendo
minhas pernas amolecerem e meu corpo tremer intensamente.
O pavor que eu passei o dia inteiro percorre pela minha
cabeça e eu apenas me ouço no fundo repetindo inúmeras vezes a
palavra impossível.
Seguro a vontade de gritar com ele por não ter contado,
quando percebo que esse assunto o deixa abatido. Desço do seu
colo e deito na cama, pálida, parece que o sangue do meu corpo
evaporou completamente.
— Eu sempre quis dar tudo a você. — Michael sussurra sem
desviar o olhar de mim, sua mão quente desliza pela minha barriga,
fazendo pequenas e suaves caricias. — Mas não sei se isso será
possível. — Ele acrescenta.
Minha visão fica embaçada pela acumulo de lágrimas e sinto
meu coração refrear em meus ouvidos como uma sirene.
— Diga alguma coisa. — Ele pede.
Seguro em sua mão parando-a em cima do meu ventre, ela
quase ocupa toda a minha barriga.
— Eu estou grávida. — É assustadoramente libertador falar
em voz alta.
Michael desce o seu olhar deslumbrado, ele acaricia minha
barriga e fica encarando-a por um longo momento, absorto, e
quando solto a respiração fazendo-a oscilar, parece que eu o tirei de
algum transe.
— Ah, Michael, eu estava começando a achar que era um
milagre.
— Oh, querida… — Ele sussurra pasmo e esboça um sorriso
que mostra a profundidade das suas emoções. — Você está feliz?
A minha intenção era das melhores. — Michael junta as
sobrancelhas pairando sobre mim. Engato minhas pernas no seu
quadril e o puxo para mais perto deslizando minhas mãos para o
contorno da sua face e acariciando sua barba bem aparada.
— Eu estou muito, muito feliz. — Reforço para ele não ter
dúvidas, e o puxo para um beijo que me aquece rapidamente
inflando o meu sangue. — Agora se você não se importa... — Digo
deslizando minha mão para abrir os botões da sua camisa. — Ainda
temos seis meses para falar desse bebê...
— Sempre tão gulosa. — Michael fica sobre os joelhos e puxa
a sua camisa tirando-a pela cabeça, ele se debruça sobre mim com
seus ombros largos e um sorriso lascivo e sarcástico que combina
perfeitamente com a expressão pervertida dele.
E nesse momento percebo que o meu mundo inteiro se
resume nesse sorriso e a imensidão de caos que passamos juntos,
foi o preço de agora... o preço da felicidade.

...se os sete sinos de Pisa reverberaram, eu não tenho ideia,


mas os três meses de espera valeram apena...

.
Dezembro 2024

Estaciono o Tesla em frente à entrada da casa e antes de


descer eu pego do banco do carona um ramo de rosas vermelhas.
É final da tarde e Lindara já ligou as luzes de natal, nossa
casa parece à vila do papai Noel, com renas, grandes guarda-
chuvas vermelhos cravados no chão e o famoso velho barrigudo
sentado no telhado. As crianças adoram, principalmente Marie,
Emma não acredita mais no velhinho, minha filha está crescendo, já
prevejo dores de cabeça.
Quando estou alcançando a porta eu vejo pela janela as três
mulheres da minha vida na sala de estar.
Lindara está acomodada em uma poltrona marrom com as
pernas cruzadas, Emma está parada do outro lado da mesa centro
provavelmente tentando descobrir como ligar a filmadora. As duas
vão gravar um vídeo para o trabalho da escola, com a temática,
profissão dos pais. Emma escolheu a Lindara, segunda ela, o meu
trabalho não é tão legal, ainda mais agora que me tornei promotor
de justiça e deixei Cass administrando o escritório.
— Em três, dois, um... — Emma sibila de trás da câmera.
— Olá classe, me chamo Lindara O’Connor e sou a mãe da
Emma... Hã... — Lindara trava como se estivesse esquecido às
palavras, fazendo Emma cerrar os olhos atrás da filmadora. — Sou
proprietária de uma fundação beneficente e de um abrigo para
crianças que sofreram abandono ou que vieram de países
estrangeiros...
— Corta! Marie! — Emma berra furiosa dando um baita susto
na Lindara, que se vira para trás seguindo o olhar raivoso de Emma
e encontra nossa caçula atrás da poltrona acenando para o vídeo.
Lindara suspira com um sorriso e relaxa contra a escora da
poltrona.
— Emma, continuaremos depois. — Ela fala, e acrescenta: —
E Marie, não teve graça. — Ela repreende com pulso firme, tirando o
sorriso insolente da face da nossa filha.
Decido entrar e apaziguar as coisas e quando abro a porta
escuto Marie gritar eufórica e correr em minha direção.
— Papai! Papai! Papai! — Seus cabelos loiros ondulados
iguais aos da sua mãe voam para trás com a velocidade que a
pequena corre, só tenho tempo de soltar as rosas no balcão de
entrada, quando ela pula em meus braços, seus olhos azuis brilham
em uma agitação contagiosa.
— Argh! Puxa saco. — Emma sibila fazendo Lindara sorrir e
passar a mão acariciando seus cabelos soltos.
Me aproximo com nossa filha nos braços a jogando para cima,
ela grita faceira, pedindo para ir mais alto. Paro-a no ar e dou uma
fungada em seu cangote tirando boas risadas da pequena Marie, a
solto no sofá e quando me aproximo da Emma, ela emite um
sonoro:
— Nem vem.
Ah essa idade, a pré-adolescência vai acabar comigo.
Pego Emma abruptamente e a deito em outro sofá, ela berra
estridente e esperneia quando eu começo fazer cosquinhas na sua
barriga.
— Mãe, faça alguma coisa! — Ela implora com a face rubra.
— Se ela fazer xixi no sofá você vai limpar. — Lindara avisa
com uma voz de reprovação, me fazendo parar e me virar para ela
com as mãos erguidas em rendição.
— Sua vez, querida. — Digo quando me agacho para beijá-la,
ela sorri contra meus lábios e acaricia minha face delicadamente.
— Você ainda tem amor à vida. — Lindara diz sarcástica como
sempre.
— Como está se sentindo? — Pergunto alisando sua barriga e
sem demora o pequeno Mike começa a dar fortes chutes fazendo a
camada fina do vestido balançar. — Calminha aí amigão, ainda
faltam dois meses. — Sussurro para o bebê, que me responde com
outro chute.
— Inchada, com calor e seios vazando.
Solto um longo assovio e beijo sua volumosa barriga.
— Meninas, peçam brigadeiro para a Joana na cozinha e
depois se arrumem teremos visitas. — Anuncio e pego a minha bela
esposa nos braços com firmeza. Lindara passa mão envolta do meu
pescoço e me encara surpresa.
— Visitas? — Ela questiona, enquanto eu subo as escadas
para o nosso quarto.
— Sim! É véspera de Natal. — Esclareço, ela me fita com uma
expressão que diz: Não me diga, Michael.
— Eu não organizei nada.
— Não se preocupe, eu cuidei de tudo.
Sua expressão se suaviza.
— Ahh. — Ela suspira. — Eu amo você. — Lindara mia
quando a coloco deitada na cama contra uma montanha de
travesseiro.
— Eu sei.
Abro a gaveta da cômoda pegando um óleo de massagem.
— Vou deixar você lubrificada para hoje à noite.
Ela dá um riso fraco e me observa tirar o paletó e os sapatos.
Me sento aos seus pés e deslizo minhas mãos até sua cintura
e puxo sua meia calça preta, deixando ela apenas com um vestido
rosé que modela muito bem as suas belas curvas. Lindara fica
encantadoramente gostosa, grávida. Ela não gosta quando eu digo
isso, pois, não se sente nada sexy e pensa que eu falo por bondade.
Se ela pudesse entrar em minha mente por um segundo e ver
como eu a vejo... curvas firmes e delineadas, seios volumosos e
suculentos...
— Michael? — Ela estala dois dedos em minha face. — A
última vez que você me olhou assim eu engravidei. — Ela diz com a
sobrancelha arqueada, me fazendo lamber os lábios, ao lembrar.
— Foi memorável. — Comento.
— Eu nunca fui uma criança tão feliz naquela casa da árvore
— Ela diz com um sorriso. — Deus! Somos pais horríveis.
— Somos ótimos pais. — Digo pegando seu tornozelo
esquerdo e o colocando em meu ombro. Despejo uma porção
considerável de óleo de amêndoas na palma da mão e observo
Lindara relaxar nos travesseiros, ela coloca os braços atrás da
cabeça, e me olha atentamente.
Tracejo minhas mãos com firmeza da altura do seu tornozelo
até o começo da sua coxa, fazendo uma pressão prazerosa, pela
expressão da minha esposa. Ela fecha os olhos e morde o lábio
inferior quando deslizo as mãos por toda a extensão da sua perna.
— Ah Michael, isso é tão gostoso. — Ela sussurra quando eu
massageio o seu tornozelo em direção ao pé.
— Você não está facilitando para mim, querida. — Aviso
sentido o meu volume se agitar dentro da minha calça.
— Nem vem! — Ela resmunga, imitando Emma. — Você ainda
tem a outra perna.
Ela põe a perna direta em meu ombro, me dando a melhor
visão que eu poderia ter.
Mexo a cabeça em negação e começo a massagear as duas
de uma vez só, fazendo-a jogar a cabeça para trás em uma
gargalhada.
— Agora não tem mais desculpas.
— Ah, é? — Lindara ergue o vestido próximo aos seios, ela
está usando uma calcinha de renda branca que destaca
perfeitamente sua pinta abaixo do ventre.
Ela desce as pernas e eu subo em cima delas, despejando o
óleo na sua protuberante barriga, que arrepia quando minhas mãos
a massageiam, com delicadeza. Suas mãos caem sobre minhas
coxas, enquanto ela me analisa, silenciosa.
Três anos já se passaram desde o nosso matrimônio e eu a
amo na mesma intensidade, senão mais. Sou um homem
privilegiado, mesmo que nós tenhamos tido um começo catastrófico.
Hoje posso dizer que ela trouxe o melhor de mim.
Depois que a nossa vida se tranquilizou conseguimos
conversar abertamente, sem segredos e medos de represálias. Tudo
que Lindara viveu ficara marcado nela para sempre e não de uma
forma boa, e mesmo assim ela sempre enxerga o lado bom de tudo.
Isso é o que eu mais amo nela.
Lindara pega minhas mãos parando-as no lugar, ela segura o
meu olhar em uma expressividade peculiar, que às vezes me faz
questionar se ela sabe no que estou pensando.
— Tenho mais um lugar para você massagear. — Ela diz
abrindo os botões do vestido e expondo os seios.
Lindara arqueia a sobrancelha, me arrancando um sorriso
lascivo.
— Tá esperando o quê? — Ela pergunta, tomando o óleo da
minha mão e o jogando no chão.
Quando o estampido do frasco ecoa, eu já estou debruçado
sobre ela, beijando-a, adorando-a. Lindara geme e corresponde a
todos os meus toques. Posso estar enganado, mas acho que a
gravidez a deixou ainda mais gulosa, só não nos primeiros meses,
às vezes eu tinha uma leve impressão que queria pular em cima de
mim, mas não de uma forma sexual.
Ela me encara com um sorriso, ainda ofegante e quando
aconchega a cabeça em meu peito, o telefone da cabeira da cama
começa a tocar. Lindara suspira e acaricia as minhas costas
enquanto eu atendo.
— Oi. — Digo secamente, tentando esconder a voz rouca.
— Senhor O’Connor, tem um detetive aqui embaixo. — Joana
avisa.
— Já estou descendo. — Desligo o telefone e Lindara me
encara com uma expressão preocupada.
— O que está havendo? — Ela questiona abotoando seu
vestido, enquanto eu procuro minhas roupas, pelos cantos do
quarto.
— Tem um detetive lá embaixo.
Ela franze o cenho sem entender e pula da cama puxando a
calcinha para cima.
— Lindara, me espere. — Peço quando ela passa por mim em
direção porta, ela para e me olha, eu ainda estou nu com as calças
na mão. Lindara sorri e sai do quarto.
Teimosa!
O que um detetive quer em nossa casa em plena véspera de
Natal? Coisa boa não pode ser.
Jogo as calças em cima da cama e entro no closet atrás de
uma cueca, já que a minha sumiu. Pego qualquer uma e visto um
terno cinza escuro, às pressas. Quando adentro o quarto encontro
Marie brincando com o óleo no chão.
— Vamos descer, querida. — A pego nos braços e a jogo por
cima do ombro. Quando chego às escadas, Lindara está sentada em
uma poltrona, com a coluna reta e os braços em volta da barriga, e o
suposto detetive ao seu lado no sofá, ele coloca a mão no ombro dela,
como se quisesse confortá-la.
Não gosto disso.
Desço pisando firme, chamando atenção deles, ponho Marie no
chão quando chego ao primeiro piso e o homem se coloca de pé.
— Boa tarde. Sou detetive Jon King... — O homem veste um
terno escuro e um pesado casaco, o seu cabelo é loiro com um corte
curto.
— Michael. — Lindara sussurra.
— O que aconteceu, querida? — Me agacho em sua frente, seus
olhos estão vermelhos como se quisesse chorar.
— Lembra da caminhonete que encontraram no rio Hudson dois
anos atrás? — Seus lábios se mexem, mas seus olhos estão distantes,
está perdida em seus pensamentos.
— Sim, querida.
A caminhonete encontrada já estava oxidada pelo tempo
embaixo, d’água. Gerou muitas perguntas, mas nenhuma resposta.
Depois de um tempo pararam as notícias e não se ouvia mais falar da
caminhonete, até hoje.
— Foi ela quem causou o acidente há 19 anos. — Ela explica
com um sorriso triste, como se não acreditasse que depois de quase
vinte anos, teria essa informação.
— Você está bem?
— Sim, estou. — Ela mexe a cabeça como se quisesse limpar a
mente. — Só preferia não saber.
— Eu lamento trazer essa informação, senhora. — Jon aperta os
lábios.
Lindara assente para ele com um sorriso amável e isso me parte
o coração. Vê-la sofrer me enfurece, porque não há mais nada que eu
posso fazer, além de confortá-la.
Ponho-me de pé e levo o homem até a saída.
— E o dono na caminhonete? Quem era? — Pergunto ao abrir a
porta principal, maquinando sobre como indiciar esse filho da puta.
Preciso saber de tudo, esse homem não terá a menor chance de sair
impune.
— Como eu havia dito a sua esposa, Jimmy Foster morreu de
cirrose hepática em 2008, com 49 anos.
— Puta merda! — Exclamo, passando a mão pela barba rala,
irritado.
— Eu informei a filha do Jimmy sobre o acidente, ela ficou tão
chocada quanto a vocês.
Assinto e aperto os lábios com força quando vejo três carros
entrarem pelos portões, um atrás do outro.
— Lamento ter estragado a noite de vocês. — Jon fala, saindo da
varanda.
Aceno para o detetive e entro fechando a porta atrás de mim.
Merda!
— Joana atenda a porta para mim. — Peço ao passar em frente
à cozinha. — O cheiro está maravilhoso! — Grito e subo para o quarto
atrás dela.
Por que eu fui inventar de fazer a ceia de Natal?
O quarto está vazio, mas consigo ouvir o chuveiro ligado e uma
fina neblina sair por baixo da porta. Entro sem bater, Lindara está de
costas para mim, com o cabelo preso em um coque e ensaboando o
corpo.
— Querida... — Sussurro.
— Chegaram? — Ela pergunta se virando para mim.
— Sim.
Lindara desliga o chuveiro e se enrola em uma toalha, ela está
agindo naturalmente como se nada tivesse acontecido.
— Michael, eu estou bem! — Ela declara indo em direção closet.
— Nada vai mudar só por que sabemos o nome daquele imbecil. — Ela
diz com uma expressão neutra que não me deixa saber se está
blefando.
Lindara me entrega a parte de baixo da lingerie. Me ajoelho em
sua frente enquanto ela segura em meus ombros ganhado equilíbrio e
a ajudo vestir, em seguida ela pega e desliza pela cabeça um vestido
tricot cinza-claro, ombro a ombro de manga comprida e justo, que
modela bem as curvas do nosso pequeno Mike e ajudo-a a pôr a meia
calça por fim.
— Não sei o que eu faria sem você. — Ela diz quando eu deslizo
a meia-fina em seu corpo.
— Querida...
— Você vai ficar em volta de mim, não vai?
Assinto fazendo-a revirar os olhos.
— Eu estou raiva, Michael. — Ela rosna, desabafando para o
alto. — Estou com raiva porque qualquer pessoa que entra no meu
caminho e me causa algum mal, ela morre, cadê a justiça nisso? — Ela
ri alto agora, me deixando preocupado.
— A morte também é justa. — Comento, e ela mexe a cabeça
em negação.
— Já tenha em mente que se um dia você me sacanear, morrerá
da pior forma. — Ela diz sarcástica. — Talvez eu deva ligar para o
Trevor e a piranha da Sabrina e saber se eles estão com alguma
doença terminal. Daí o ciclo estará fechado.
— Nem se atreva. — Advirto encaixando as sapatilhas.
Dou um beijo no topo da sua barriga e me levanto parando a sua
frente. Abraço-a com força e ela escora sua cabeça em meu peito. É
tão pequena que facilmente desaparece nos meus braços.
— Eu cresci sozinha. — Ela sussurra depois de um tempo. — Foi
difícil no começo, aceitar que meus pais haviam morrido, me adaptar
as outras crianças e a comida... não era tão boa.
— É por isso que você quer levar a Joana para o lar das
crianças?
— Também. — Ela ri e me encara com seus olhos marejados. —
Apesar de tudo eu me dei bem, encontrei a Micaela e fiz a minha
própria família. Eu desejo isso para aquelas crianças todos os dias. —
Ela morde o lábio com força e desliza suas mãos para os meus
ombros. — Jimmy aniquilou a minha infância, mas eu ganhei no futuro.
Você, as meninas, o pequeno Mike, são a minha vida.
— Você é a minha vida. — Digo e dou um beijo na ponta do seu
nariz, Lindara fecha os olhos e respira lentamente.
— Mamãe... — olhamos para a porta e Marie está só com a
cabecinha para dentro, parece que ela advinha quando estou
abraçando, Lindara, ela tem um ciúme absurdo da mãe dela.
Marie abre o resto da porta e caminha até nós, ela estende o
ramo de rosas que eu deixei na entrada mais cedo.
— Ah, são lindas, meu amor. — Lindara diz admirada e sussurra
um baixinho, obrigada, para mim.
— Não demore. — Lindara pede e me dá um beijo antes de sair
do closet com nossa filha.

Solto as belíssimas rosas, que Michael me deu, em cima da


cômoda e desço com Marie, arrumando à grossa e larga gola do meu
vestido que cai sobre os ombros, formando uma nova camada de
tecido em frente aos meus seios. Se vasar leite, estarei protegida,
penso.
Marie deixou de mamar aos nove meses e quando eu pensei que
estaria livre, ganhei um bebê brincalhão de 34 anos.
Chego ao pé da escada e vejo o outro lado da minha família.
Jimmy Foster, já me tirou muito, ele não vai estregar o meu Natal.
Meu amigo, Levi, padrinho da Marie está sentado ao lado do
Dylan, aqueles dois tiveram muitas idas e vindas, mas sobreviveram.
Com certeza os dois anos que Levi passou em Washington dançando
balé, os fizeram perceber que não conseguiam ficar longe um do outro.
E quando Levi voltou a Manhattan para o aniversário de um aninho de
Marie, Dylan fez o pedido de casamento, roubando a cena. Filho da
mãe.
Ao lado dos dois, Madson repousa em uma poltrona, ele está
enorme quase do tamanho do Michael, e cada vez mais parecido com
nosso pai, é o que eu acho pelas fotografias. Ele se tornou um bom
homem, tem um bom trabalho e está cursando engenharia na NYU, só
tem um péssimo gosto para namoradas, não porque eu seja super
protetora, mas todas me lembram da Olívia, piranha interesseira.
— Blake, ajude Lindara, acho que ela empacou na escada. —
Mica zomba, quando me pega admirando a família mais caótica de
todos os tempos.
— Blake, senta! — Uivo descendo os degraus devagar.
Marie se travessa na minha frente e desce para brincar com
Caleb, os dois são inseparáveis como Mica e eu éramos. O menino é a
cara da minha irmã, e graças a Deus ele puxou o gênio do pai: calmo,
sensível e disciplinado.
— Uau! — Dylan fala quando me aproximo. — É para semana
que vem?
O encaro boquiaberta e Levi lhe dá cutucão no braço.
— Não, mas eu adoraria se fosse, parece que eu estou
carregando um gigante.
— Você está ótima. — Madson comenta escondendo um sorriso.
— A Bea me contou logo depois que vocês anunciaram a
gravidez da Marie, que Michael nasceu beirando aos cinco quilos e
com sessenta e quatro centímetros. — Dylan fala com um sorriso que
me deixa na dúvida se é verdade ou não.
— Porrrrra! É quase o tamanho do peru que a Joana está
assando. — Brinco.
— Mãe. — Emma sussurra. Bufo.
— Ahh! Te dou um dólar depois. — Sibilo, ela me encara com um
sorriso vivaz.
Combinamos de por um dólar no pote cada vez que alguém, ou
seja, eu, falar algum palavrão. Eu vou pagar a faculdade dessa menina
ainda.
— Ele está mentindo. — Michael diz ao se aproximar, com uma
expressão zombeteira. — Eu nasci quase com seis quilos. — Ele senta
ao meu lado e passa o braço a minha volta.
— Você era obeso? — Pergunto apavorada, cruzando as pernas
com força.
— Não, eu era grande demais. — Ele gargalha quando vê minha
expressão de terror. — Estou brincando, querida. — Ele sorri beijando
a minha cabeça e pelo reflexo da janela o vejo sinalizando que não é
brincadeira, para os demais na sala.
— Michael! — Reclamo, ele ri novamente e trinca o maxilar
quando lhe deu uma cotovelada na barriga. — É isso que eu sinto toda
a vez que esse gigante resolve mudar de posição. — Aviso.
Deixo a todos conversando e ando até a cozinha, seguindo o
cheiro maravilhoso, Joana trabalhou fervorosamente e eu o dia todo
pensando que ela iria fazer o jantar só para nós.
— Precisa de ajuda, Jo?
— Não, menina, vá descansar. — Ela fala, pondo a mesa.
Descansar é a única coisa que eu tenho feito desde que Michael
me viu padecer para amarrar os tênis. Diante disso deixei Mica tomar a
frente com o lar das crianças. A fundação eu cuido daqui de casa e
aproveito para passar mais tempo com as meninas. Tem sido
maravilhoso.
— Linda. — Levi chama e enrola uma mecha do meu cabelo loiro
no dedo.
— O que você fez? — Pergunto ao ver sua cara de arte.
— Não tem uma maneira fácil de falar isso. — Ele explica e sinto
meu coração acelerar momentaneamente. — Recebi uma proposta
para dançar na, Ópera de Paris.
Meu queixo cai.
— Fomos lá, na lua de mel. — Comento e apenas ao lembrar
meus olhos se enchem de lágrimas. — É simplesmente magnífico. Ai
que ódio! — Grito. — Não posso nem ficar com raiva de você por ir, eu
o mataria se não fosse.
— Obrigado por entender.
— E o Dylan?
— Achou maravilhoso, ele ama Paris e moda. E a mim, é claro.
— Acrescenta por fim.
— O que as peruas estão fofocando? — Mica se aproxima,
usando um longo casaco de pele.
— Levi vai nos abandonar de novo.
— Ah, eu sei. Dylan me contou. — Ela diz com um sorriso. —
Você está bem? Parece que está inquieta.
— Fiquei depois que Michael insinuou que eu posso estar
carregando um titã. — Realmente, isso me chocou um pouco.
Voltamos para a sala e as luzes da árvore de Natal estavam
acesas para as crianças brincarem.
Sentei-me ao lado do Madson, mas não tive coragem de contar
sobre o detetive e toda aquela merda de mais cedo. Não vou
incomodá-lo com isso, pelo menos não agora no Natal, ele está tão
feliz. Todos estavam, por que estragar isso?
O jantar decolou naturalmente como muitas outras vezes, o que
mudou hoje foi apenas a data festiva, os risos e as fofocas continuaram
por um bom tempo. Até eu precisar ir ao banheiro e quando voltei
Micaela e o Dylan estavam colocando a louça suja na lavadora,
enquanto Levi e Madson brincavam com as crianças.
Amo estar grávida. Penso ironicamente.
Observo Michael espionar o que Emma está fazendo no celular,
ao seu lado.
Pobre Michael e você também pequeno Mike, as meninas vão
dominar esta casa, penso alisando a barriga.
Aproximo-me dos dois e estendo a mão para Emma me entregar
o celular, seus pequenos olhos arregalam me fazendo sorrir, mas ela
me entrega sem questionar. Desligo a tela sem olhar o que ela estava
fazendo.
— Você quer de volta?
Michael me encara e uma alegria percorre sua face.
— Sim. — Ela diz calma e me olha, corada.
— Toque Ho Ho Ho da Sia, e pode pegá-lo.
Ela pula do sofá animada e corre para o piano. Michael a fita de
longe e estende a mão para o celular, lhe dou um tapa de leve.
— Você deu um celular para ela, agora aguente. — Sussurro. —
Devia confiar mais nela. — Digo largando o aparelho em cima da mesa
e sento em seu colo vendo Marie e Caleb dançando em volta do piano.
São muito fofos.
— Você bisbilhotou, não é? — Michael pergunta.
— O que você acha? — Murmuro um pouco envergonhada, mas
ela é uma menina inocente de 10 anos e eu uma mãe preocupada. Me
julguem.
— Ah, eu amo você. — Michael me abraça com força e me deita
para trás contra o braço macio do sofá e se debruça sobre mim com
um sorriso exorbitante.
— O que foi? — Questiono olhando em seus olhos e vendo os
pisca-piscas da árvore brilharem em sua face. Ele desvia dos meus
olhos por um momento e observa nossas filhas e amigos dançando e
bebendo em volta do piano.
— Você me faz muito feliz. — Michael responde e deposita um
beijo no canto dos meus lábios.
— E você é a minha felicidade. — Sussurro em seus lábios e
bebê chuta forte contra a mão do Michael nos fazendo rir, então
acrescentarmos juntos: — Vocês são a nossa felicidade.

ATENÇÃO
SPIN-OFF DO DANTE ARMSTRONG SERÁ LANÇANDO NO
COMEÇO DO ANO DE 2022.

Seu romance inicia em Seattle no mesmo mês que a


Linda está se casando com Michael.
Olá para você que chegou até aqui, gostaria de começar agradecendo
pelo apoio e carinho de todos, quero agradecer também aos meus fiéis
leitores do Wattpad, que acreditaram em mim desde o início, e que
continuam me acompanhando. Quero agradecer também a minha irmã
Gislaine e seu esposo Robson, que sempre acreditaram em mim, até
mesmo quando eu não acreditava ser capaz.
Quero agradecer minha amiga Janete Ferreira, autora conhecida como
J. F. Hill, se não fosse por ela, não teríamos uma trilogia hoje. Então
obrigada Jane por me presentear o Dante.
Quero agradecer também ao meu esposo Lucas e meus lindos filhos,
Bernardo, Ohana e Joaquim, que ficaram comigo desde o começo.
Quero agradecer a Deus, por ter me dado esperança e forças para
crescer e ter feito algo maravilhoso.

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