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Praticar e compreender a Pedagogia da

Alternância dos CEFFAs


Coleção Aidefa (Alternativas Internacionais em Desenvolvimento,
Educação, Família e Alternância
- Praticar e compreender a Pedagogia da Alternância dos CEFFAs
Jean-Claude Gimonet

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Gimonet, Jean-Claude
Praticar e compreender a Pedagogia da
Alternância dos CEFFAs / Jean-Claude Gimonet ;
tradução de Thierry de Burghgrave. –
Petrópolis, RJ : Vozes, Paris : AIMFR –
Associação Internacional dos Movimentos
Familiares de Formação Rural, 2007. – (Coleção
Aidefa – Alternativas Internacionais em
Desenvolvimento, Educação)
Bibliografia.
ISBN 978-85-326-3485-6
1. Educação alternativa 2. Educação não-formal
3. Ensino – Métodos 4. Movimento dos Centros
Familiares de Formação por Alternância – CEFFAs
5. Pedagogia I. Título.

07-3900 CDD-371.04

Índices para catálogo sistemático:


1. Pedagogia da Alternância : Educação 371.04
JEAN-CLAUDE GIMONET

Praticar e compreender a
Pedagogia da Alternância dos
CEFFAs
Tradução de Thierry de Burghgrave

EDITORA
VOZES
Petrópolis

Associação Internacional dos Solidarité Internationale des Instituto de Cooperação


Movimentos Familiares de Mouvements Familiaux pour Belgo-Brasileira para o
Formação Rural la Formation Rurale Desenvolvimento Social
© 2007, Editora Vozes Ltda.
Rua Frei Luís, 100
25689-900 Petrópolis, RJ
Internet: http://www.vozes.com.br
Brasil

Em co-edição com:
AIMFR
Associação Internacional dos Movimentos Familiares de
Formação Rural
e-mail: aimfr@m.fr.asso.fr
http://www.fondation-mfr.org./

Esta publicação teve o apoio de:


SIMFR – Solidariedade Internacional dos Movimentos Familiares Rurais
DISOP-BRASIL – Instituto de Cooperação Belgo-Brasileira para o
Desenvolvimento Social

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reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios
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qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora.

Editoração: Fernando Sergio Olivetti da Rocha


Projeto gráfico: AG.SR Desenv. Gráfico
Capa: Diogo Müller e José Almeida Neto

ISBN 978-85-326-3485-6

Este livro foi composto e impresso pela Editora Vozes Ltda.


A educação... é a grande viagem de cada
indivíduo no seu universo interior e no
universo que o cerca.
Moacir Gadotti

Nem eu, nem ninguém, pode percorrer este


caminho por ti. Tem de percorrê-lo por ti
mesmo. Ele não está longe, está acessível.
Talvez te encontras nele desde o teu
nascimento sem sabê-lo. Talvez esteja em
todo lugar, sobre a água e sobre a terra.
Walt Withman
SUMÁRIO

Prefácio (Juan Cano), 9

Aviso, 11

Introdução geral, 13

Primeira parte – Praticar a Pedagogia da Alternância, 19


1. Da idéia até a elaboração de uma Pedagogia da Alternância, 21
2. As atividades e os instrumentos da alternância, 28
3. A organização e a gestão da formação, 64
4. A animação e a gestão das relações, 81
Conclusão da primeira parte, 99

Segunda parte – Compreender a Pedagogia da Alternância, 101


5. A alternância no horizonte educativo, 103
6. Os contornos e os componentes da Pedagogia da Alternância, 118
7. Aprender na formação em alternância, 130
8. Vivenciar e fazer viver a alternância: uma nova profissão da
formação, 145
Conclusão da segunda parte, 153

Conclusão geral – Um caminho-método para o amanhã e a era


planetária, 154

Bibliografia, 161

Índice, 165
PREFÁCIO

Este é o primeiro livro na língua portuguesa que trata de um dos com-


ponentes maiores do Movimento dos Centros Familiares de Formação por
Alternância – CEFFAs: a Pedagogia da Alternância. Deve-se à autoria do
antigo diretor do Centro Nacional Pedagógico das Maisons Familiales Ru-
rales (Casas Familiares Rurais) da França, Jean-Claude Gimonet.
É um livro-síntese sobre o que representa este processo de formação,
ao mesmo tempo sob o ângulo de sua prática, ou seja, suas atividades, ins-
trumentos e organizações pedagógicas e, sob o ângulo de uma reflexão,
através de uma abordagem mais geral, para melhor situá-lo no campo da
formação de hoje e entender-lhe os seus mecanismos.
Inicialmente vem uma primeira parte sobre a prática da formação al-
ternada, para dar o sentido geral, os objetivos, a implementação das ativi-
dades e dos instrumentos, elaborados, progressivamente, no decorrer do
tempo...
Uma segunda parte surge, como o expressa seu título, para ajudar a
compreender o que é a Pedagogia da Alternância, situando suas especifici-
dades em relação às diferentes correntes e métodos pedagógicos pratica-
dos, mas, também, “desmontando” seus componentes e seus mecanismos.
Uma abordagem sob o prisma da complexidade. De fato, com a alternân-
cia, entra-se numa pedagogia da complexidade e na educação sistêmica.
De onde uma luz, em referência a conceitos mais teóricos, sobre as nature-
zas e os processos de aprendizagens em alternância, para melhor entender
as dificuldades da implementação das formações alternadas e das exigên-
cias para os diferentes atores: os “alternantes” que são as pessoas em for-
mação, os pais ou mestres de estágio profissionais, os monitores e as moni-
toras, obedecendo a denominação usada nas formações realizadas pelo mo-
vimento dos CEFFAs.
Um capítulo é dedicado a estes(as) últimos(as), sendo considerados(as)
as “molas mestras” do sistema: seus papéis, mas, também, as exigências e
as condições do exercício do que o autor chama “uma nova profissão da

9
formação”. Parece-lhe, de fato, que, diante das evoluções que se desenham
em todas as áreas, a escola do século XXI e as profissões da formação não
poderão mais permanecer como são atualmente, e que a de “monitor(a) de
CEFFA” prefigura estas necessárias evoluções.
E é no futuro, aliás, que nos projeta a obra, sob a forma de conclusão,
pelo título “Um caminho-método para o amanhã e a era planetária”. Porque
se precisa pensar numa educação que leve em conta “o mais local” para en-
contrar nele o humo de sua formação, de suas perspectivas de vida, de ações
e de engajamentos, mas, também, uma educação que se abre sobre a globali-
dade do mundo, do planeta. Pensar uma “educação planetária”. Em outras
palavras, uma educação para estar, ao mesmo tempo, no local e no global.
Um livro de prática e de reflexão... um livro que perpassa o passado e
um futuro que se desenha, mas ainda não está escrito... para colocar em
evidência os fundamentos desta pedagogia que fez suas provas desde a sua
criação, há setenta anos, para mostrar os parâmetros permanentes através
do tempo e do espaço.
Juan Cano
Presidente da Associação
Internacional dos Movimentos
Familiares de Formação Rural – AIMFR.

10
AVISO

A implementação da Pedagogia da Alternância abordada neste livro é


situada voluntariamente num contexto institucional determinado: o dos
CEFFAs – Centros Familiares de Formação por Alternância. Várias razões
explicam este posicionamento.
A primeira consiste em que toda pedagogia é singular, levando-se em
consideração o sistema institucional no qual é praticada. Ela representa
um de seus componentes e o projeto educativo implementado, as finalida-
des perseguidas, lhe dão e definem sua orientação e suas modalidades pró-
prias. O que se pratica nos CEFFAs é, desta maneira, específico e não é um
modelo universal.
Por isto – e é a segunda razão – este livro foi escrito pensando primeiro
nos atores dos CEFFAs: os administradores, os pais, os diretores, monito-
res e outros agentes educativos, mas também os jovens ou adultos em for-
mação para que encontrem alguma grade de leitura de sua prática, quem
sabe indicadores para viver e fazer viver melhor a formação alternada. Este
escrito compreende deste modo, ao mesmo tempo, orientações metodoló-
gicas, elementos de análise e a referência a alguns conceitos mais gerais.
A terceira razão da fixação nos CEFFAs está ligada ao fato que este mo-
vimento educativo, ao desenvolver-se no tempo e no espaço, quantitativa e
qualitativamente, tornou-se complexo. Sua grande diversificação coloca
questões de coerência das práticas no seio de um mesmo conjunto e, por
isso mesmo, de identidade institucional. Pareceu-me, unicamente do pon-
to de vista da Pedagogia da Alternância desenvolvido aqui, que seria talvez
útil tentar fazer algumas ordenações, alguns esclarecimentos, encontrando
o que é comum nas variedades de alternância praticadas hoje. Trata-se
também, para fazer isto, de proceder a alguma organização e hierarquiza-
ção para ir ao essencial, ou, em outras palavras, de diferenciar os parâme-
tros constantes dos evolutivos.
Enfim, como outra razão para a produção deste trabalho, encontra-se a
constatação de que, ao meu conhecimento, os escritos relativos aos elemen-

11
tos constitutivos da Pedagogia da Alternância nos CEFFAs encontram-se
dispersos em publicações diversas (livros, revistas, periódicos...) que tratam,
cada uma, de um “pedaço” do sistema sem que nenhuma delas apresente
uma globalidade coerente a seu respeito. Tendo sido, várias vezes, solicitado
em reuniões, sessões de formação e outros seminários para apresentar a coe-
rência de conjunto do sistema-alternância das MFR (Maisons Familiales Ru-
rales) em conseqüência do estado de complexidade mencionado acima, pa-
receu-me que tal iniciativa podia conter algum interesse.
Oxalá este livro possa contribuir, à sua maneira, com os atores dos
CEFFAs e, talvez, além do exemplo singular, ter alguma repercussão nos
meios preocupados com a formação e inserção destes inúmeros jovens que
só querem manifestar seu potencial e exercer um papel na sociedade.

12
INTRODUÇÃO GERAL

A arte de fazer refletir o antigo sobre o novo, a ordem sobre


a desordem, os riscos calculados com a fidelidade, o espírito
crítico com o conformismo, esta arte tem um nome: é o que
os antigos chamavam de sabedoria.
Jean Onimus

Eis talvez um objetivo imediato e para o futuro de nossos


CEFFAs: testemunhar, em nossa sociedade em crise, a
importância de ligar audácia e sabedoria.
André Duffaure

Há 70 anos, as MFR vêm percorrendo um longo trajeto institucional


1
e pedagógico . Da idéia básica à implementação, a caminhada foi compri-
da e estafante. E portanto, ao longo da caminhada, de ano em ano, pri-
meiro na França, depois, progressivamente, em todos os continentes, cri-
ações aconteceram, adaptações foram feitas para responder às caracterís-
ticas e necessidades locais. Os públicos, as formações, as estruturas das
MFR foram se diversificando. De um sistema quase homogêneo no que
diz respeito à origem e à cultura predominante dos atores – a cultura
camponesa – as MFR têm de enfrentar, hoje, uma grande heterogeneida-
de. Disto resulta, aí e acolá, uma complicação que torna difícil a gestão de
cada uma e do conjunto.
A diversidade torna-se a regra hoje. Aqui, as MFR têm antiguidade com
os riscos de enfraquecimento da dinâmica criativa e/ou animadora, bem
como de deslocamento imperceptível do movimento para uma instituição e
sua rigidez. Aí, precisa submeter-se às exigências administrativas que levam
aos desvios pedagógicos funcionamentos institucionais. Alhures, para aten-

1. Para conhecer este trajeto, tomar como referência o trabalho de R. García-Marirro-


driga e P. Puig sobre “O movimento educativo dos CEFFAs no mundo. Formação em
alternância e desenvolvimento local” e livros franceses de pioneiros como A. Duffaure e
D. Chartier.

13
der novas necessidades (outros públicos, outros setores profissionais a serem
investidos...) é preciso proceder a severas adaptações... Tanto é que, se não
se precaver, pode decorrer disto uma tendência, seja em prosseguir tranqüi-
lamente o caminho ao repetir a experiência passada, seja em tornar os funcio-
namentos ou os comportamentos por demais rígidos, seja, ainda, em mode-
lar-se e nivelar-se no contexto do momento para continuar a viver nele. O
lugar e o peso do presente, em relação ao passado e o futuro, nos funciona-
mentos institucionais, devem reter a atenção. Se as contingências do presen-
te (as regulamentações, as necessidades imediatas, os modos, as tarefas, a
economia...) invadem o espaço, as práticas e os espíritos, corre-se o risco da
normalização, da uniformização, da perda de pertinência, de originalidade,
de identidade e de criatividade. Gera-se e administra-se mais do que se cria,
porque precisa referências, disponibilidade, mas, também, visão e, mesmo,
utopia para criar. Há adaptação com os riscos de perda das referências per-
manentes, dos traços característicos da identidade.
Coloca-se, então, a questão da unidade do movimento das MFR através do
2
planeta. Mas, uma unidade na diversidade . Esta unidade só pode existir se
cada MFR atende alguns traços fundamentais de uma identidade comum.
Na França, diante desta questão, a União Nacional das MFR tinha
3
enunciado, naquele tempo, “a carta de identidade” das MFR. A saber:
• finalidades: – de um lado, a educação, a formação profissional e geral
associadas e a orientação dos adolescentes, e, de outro lado, a contribui-
ção para o desenvolvimento do meio;
• um contexto de implantação e de ação: o meio rural;
• uma estrutura, ao mesmo tempo jurídica e de participação e respon-
sabilização das famílias: a associação;
• um método pedagógico: a alternância com suas implicações quanto
ao papel educativo dos pais e mestres de estágio profissionais e suas
técnicas e instrumentos pedagógicos;
• uma estrutura educativa: o internato e o pequeno grupo;
• uma equipe educativa animadora do conjunto.

2. Cf. GIMONET, J.-C. À la recherche d’une unité dans la diversité – La construction du


puzzle des CEFFAs d’Amérique Latine [Exposé de synthèse des Rencontres de Puerto
Iguazu/Misiones/Argentina, 04-06/04/2001].
3. PUIG CALVÓ, Pedro. Que orientação profissional é possível promover no Ensino
Fundamental. In: Revista da Formação por Alternância – CEFFAs, n. 1, set./2005, p. 29.
Brasília.

14
É evidente que uma carta de identidade tal é evolutiva. Mas, ao fazer
mudanças, convém interrogar-se sobre os fundamentos a serem preserva-
dos, sobre os parâmetros constantes e os evolutivos.
P. Puig fornece outro quadro que ele chama de quatro pilares do CEFFA.
A saber:
• os 2 pilares da ordem das finalidades: a formação integral e o desen-
volvimento do meio;
• os 2 pilares da ordem dos meios: a associação e a alternância.
Propõe a seguinte representação gráfica:

Os quatro pilares dos CEFFAs

Formação Desenvolvimento
integral do meio
Finalidades
Projeto pessoal Socioeconômico,
humano, político...

Alternância: Associação:
Meios pais, famílias,
um método pedagógico profissionais,
instituições

Estes “pilares” constituem as invariáveis do movimento mundial dos


CEFFAs, mas apresentam um caráter muito geral. Por isto, é necessário en-
tender-se sobre o conteúdo e as modalidades de implementação de cada
um deles, o que pede:
• especificar as finalidades, porque várias interpretações são possíveis
e várias nuances podem existir em função dos contextos locais;
• precisar a natureza, as razões de ser, os funcionamentos e a animação
da associação;
• definir a alternância tal como é entendida a AIMFR, já que várias for-
mas existem na variedade deste método.

15
É esta alternância que este livro se propõe a examinar de maneira mais
precisa.
Para fazê-lo, propõe um desenvolvimento coerente com o seu objetivo.
De fato, a formação por alternância dos CEFFAs obedece a um processo que
parte da experiência da vida quotidiana (familiar, profissional, social) para
ir em direção à teoria, aos saberes dos programas acadêmicos, para, em se-
guida, voltar à experiência, e assim sucessivamente. Um grande psicólogo,
Jean Piaget, definiu este processo através da fórmula “praticar e compreen-
4
der” . “Praticar” significa o fazer, a ação, a experiência, enquanto “compre-
ender” quer dizer a reflexão sobre a experiência, sua superação, ou, ainda, a
passagem dos fatos às idéias, às leis, às teorias. Mas, ação e reflexão entrela-
çam-se, dando lugar a esta outra fórmula de Piaget: “Agir em pensamento” e
“Compreender em ação”.
Logo, em plena coerência, este livro se inscreve nesta lógica. De onde
seu título, mas também sua estrutura para o caminhar da ação, da imple-
mentação de atividades e de instrumentos, para uma explicitação dos pro-
cessos, das implicações da Pedagogia da Alternância, tanto do ponto de
vista das instituições quanto dos atores envolvidos.
A obra divide-se, por isto, em duas partes e oito capítulos.
A primeira parte – Praticar a Pedagogia da Alternância – analisa sua
implementação prática em quatro capítulos.
• O primeiro, intitulado “Da idéia até a elaboração de uma Pedagogia
da Alternância”, traz a gênese e o processo de elaboração deste método de
formação no seio das MFR da França. Da idéia genial do início até a sua
construção, a caminhada foi lenta e arriscada, porque, de um lado, precisa-
va inventar uma pedagogia que não existia e, de outro lado, ao se colocar
como método fugindo do existente, seus iniciadores tiveram que enfrentar
numerosos obstáculos e, muitas vezes, lutar contra tudo.
• O segundo capítulo apresenta “As atividades e os instrumentos da al-
ternância” sem os quais a Pedagogia da Alternância corre o risco de ficar
na intenção ou de ser uma fórmula vazia. Sua implementação é questão de
atitudes, de técnicas e de saber-fazer pedagógico para que tenham êxito,
mas, também, de compreensão do seu sentido e de sua razão de ser no pro-
cesso educativo e formativo.
• O terceiro capítulo trata da “Organização e gestão da formação”, ou
seja, das seqüências de alternância, dos planos de formação, mas, também,
dos planejamentos semanais (ou das sessões). A Pedagogia da Alternância,

4. PIAGET, J. Réussir et comprendre. Paris: PUF, 1974.

16
enquanto pedagogia da complexidade, supõe aceitar o incerto, o imprevis-
to, o aleatório que surgem da vida e de cada alternante. A desordem decor-
rente disto deve ser compensada e regulada através de organização para
construir ordem nos conhecimentos.
• Enfim, o quarto capítulo, em transição com a segunda parte, relacio-
na-se com “A animação e a gestão das relações” institucionais e de atores
que supõem a Pedagogia da Alternância. Que sejam os alternantes, os pais,
os mestres de estágio, os monitores e outros agentes educativos do CEFFA,
cada um tem papel específico a desempenhar. É na diferença e na comple-
mentaridade destes papéis e funções, nas atitudes impregnadas de educa-
ção dos jovens que se encontram as chaves do “Praticar, conseguir de outro
jeito” (“Réussir Autrement”) que prega o movimento educativo dos CEFFAs.
Disto resulta uma exigência de relações densas entre os atores.

A segunda parte – Compreender a Pedagogia da Alternância – deixa o


terreno da ação, para apresentar, em quatro outros capítulos, elementos
de uma problemática geral da alternância pedagógica.
• Assim, o quinto capítulo situa “a alternância no horizonte educativo”
a partir de um olhar sobre as correntes gerais da pedagogia. A saber, a da
pedagogia tradicional, centrada no programa e no mestre, a da pedagogia
ativa, centrada sobre a criança, ou o educando, e depois a pedagogia cen-
trada na realidade ou pedagogia da complexidade que abarca e supera as
duas outras correntes. A emergência da alternância no decorrer das déca-
das passadas e o seu lugar, hoje, no campo da formação, deixam transpare-
cer que se trata menos de um paliativo do que de uma alternativa educativa
para os tempos vindouros.
• O sexto capítulo define “os contornos e os componentes da Pedagogia
da Alternância” ao demonstrar que, longe das abordagens binárias muitas
vezes utilizadas na sua apresentação, é sob o ângulo da complexidade que
convém abordá-la. Assim, percebe-se que existem diversas variedades de al-
ternância, verdadeiras e falsas, e que a alternância, mais do que um simples
método, deve ser considerada como um verdadeiro sistema educativo.
• O sétimo capítulo coloca a alternância do ponto de vista da pessoa
em formação. A partir de um olhar sobre os processos gerais da aprendiza-
gem, é a especificidade do “Aprender na formação em alternância” que
está sendo examinada na sua complexidade. De fato, em formação alterna-
da, os saberes encontram-se em espaços e tempos diferentes. Por isto, tra-
ta-se de gerir interfaces e unificar saberes dispersos. É, para cada um, o pre-
ço da alternância integrativa.

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• O oitavo e último capítulo “Vivenciar e fazer viver a alternância” se
relaciona com a função e os papéis daqueles que animam o sistema educa-
tivo dos CEFFAs, “as monitoras e os monitores”. Eles são a alma e os ani-
madores do sistema. De suas atitudes, capacidades e competências, de sua
formação e de sua implicação dependem, por uma grande parte, a eficiên-
cia da alternância. Com certeza, mostram o exemplo de “uma nova profis-
são da formação”.
Por fim, a conclusão não hesita em situar a alternância pedagógica
para além de um método, como um sistema educativo para o amanhã na
era planetária.
Oxalá estes diferentes conteúdos, destinados a todos os atores dos
CEFFAs, possam fornecer informações, mas, também, grades de análise e
de reflexão para “praticar” e “compreender”, no dia-a-dia, a Pedagogia da
Alternância que vivenciam. Oxalá possam eles ajudar a firmar este pilar
dos CEFFAs que representa a alternância e consolidar, desta maneira, a
identidade do movimento. Talvez possam servir também de elos entre os
diversos CEFFAs a fim de “praticar e conseguir de outro jeito” (“Réussir
Autrement”) juntos.

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PRIMEIRA PARTE
Praticar a Pedagogia da Alternância

Nosso método é uma forma de pensamento, uma maneira


de encarar a realidade, de abordar as ciências do que se
vive, de estimar aquele que aprende de forma diferente
enquanto aluno e, ao mesmo tempo, de considerar o meio
profissional, técnico, humano, como suporte dos programas
de formação.
André Duffaure

Conseguir algo com êxito não se faz por decreto. É algo


que se espera, se constrói.
Alain Bentolila

Introdução

A distância é grande entre a idéia ou o conceito e a prática da alternân-


cia, e aqueles que a percorrem logo o percebem. De fato, sua implementa-
ção requer um dispositivo pedagógico, isto é, uma organização, atividades,
técnicas e instrumentos específicos. No seio das Maisons Familiales Rura-
les na França ou dos CEFFAs no Brasil, elaborou-se uma metodologia, pro-
gressiva no tempo e ajustada em função dos contextos, da evolução das for-
mações, dos públicos recrutados, até mesmo das exigências administrati-
vas. Todavia, importa que os processos, a organização geral dos percursos,
os instrumentos, permaneçam coerentes com o projeto educativo e os prin-
cípios gerais do movimento.
Com a Pedagogia da Alternância deixa-se para trás uma pedagogia
plana para ingressar numa pedagogia no espaço e no tempo e diversifi-
cam-se as instituições, bem como os atores implicados. Os papéis destes
não são mais aqueles da escola costumeira. O jovem (pré-adolescente, ado-
lescente, ou jovem adulto) em formação, isto é, o “alternante”, não é mais
um aluno na escola, mas já um ator num determinado contexto de vida e
num território. Sua família é convidada a participar ativamente de sua edu-

19
cação, de sua formação, acima de tudo porque é jovem. O mestre de está-
gio profissional torna-se um formador de fato. Na MFR ou no CEFFA os
“formadores” patenteados que são os “monitores” têm uma função e pa-
péis bem mais amplos que aqueles de um docente ou de um professor. E
todos estes atores são chamados a cooperar, a complementar-se nas suas
diferenças. Por isto, a eficiência da alternância é ligada à qualidade relacio-
nal existente entre eles para implementar as atividades e os instrumentos
pedagógicos específicos do método.

20
1
DA IDÉIA ATÉ A ELABORAÇÃO DE UMA
PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA

Como sempre acontece no mundo, aquilo que na origem só


era um acaso ou um meio de sobrevivência, vê-se
imediatamente transformado e utilizado em instrumento de
progresso e de conquista.
Pierre Teilhard de Chardin

Um presente sem passado não tem futuro.


Fernand Braudel

Não é o caso de expor aqui toda a história da Pedagogia da Alternância


no seio das MFR (Maisons Familiales Rurales – Casas Familiares Rurais) da
França. Pioneiros a escreveram com grande precisão e verdade porque
1
dela foram atores privilegiados . Todavia, para introduzir-se neste concei-
to de formação e neste método pedagógico, parece necessário retratar, num
curto capítulo, seu espírito e seu processo.

Uma caminhada criativa

É um processo complexo que se operou nesta caminhada criativa. Pa-


rece também refletindo uma atitude coerente com o seu objetivo: a forma-
ção por alternância. E, sem dúvida, pode ser, para os movimentos MFR dos
diferentes países, rico em ensinamentos para construir, afirmar e implan-
tar esta pedagogia renovadora.
Os fundadores das primeiras MFR não tinham nenhum passado insti-
tucional e pedagógico do tipo de escola que iam criar, já que este não exis-
tia. Tampouco tinham conhecimento das pesquisas e inovações pedagógi-
cas. Seu modelo era aquele da escola que tinham deixado, muito cedo, no
término do ciclo primário. Seu passado institucional encontrava-se no seio
do sindicato no qual atuavam e do movimento cristão de ação social Le Sil-

1. NOVE-JOSSERAND, F. L’étonnante histoire des Maisons Familiales Rurales. Paris: Fran-


ce-Empire, 1987.

21
2
lon, de Marc Sangnier , do qual tiravam ensinamentos condizentes ao seu
lugar e seus papéis de atores responsáveis pelo desenvolvimento pessoal e
do meio em que viviam. Este movimento os alimentava através de sua mili-
tância, de sua energia, de suas análises e reflexões, dos valores que prega-
va, de suas perspectivas e de suas esperanças. Sindicalistas, eram atores en-
gajados no seu meio. Estavam impregnados da preocupação pelo futuro de
seus filhos, de sua profissão, da agricultura, da vida rural.
Foi na simplicidade do quotidiano que nasceu a pedagogia da comple-
xidade que inventaram:
• Simplicidade de um problema posto em 1935, num vilarejo da Fran-
ça, para uns pais agricultores: seu filho, um adolescente, não quer ir
para a escola secundária.
• Simplicidade da questão decorrente disto: “o que propor-lhe para
continuar os estudos?”
• Simplicidade do encontro com o vigário do povoado, na beira da es-
trada, para expor este problema.
• Simplicidade da solução encontrada com outros: “criar uma escola
que não mantenha os adolescentes presos entre quatro paredes, mas
que lhes permitam aprender através dos ensinamentos da escola, com
certeza, mas também através daqueles da vida quotidiana, graças a uma
alternância de períodos entre o ambiente familial e o centro escolar”.
Tudo isto parecia bem simples. Só em aparência, porque atrás daquilo
tudo se escondem processos bem mais complexos. Mesmo assim, isto pare-
ceu evidente para estes pais inventores de uma nova fórmula. Representa-
va para eles, simplesmente, o bom senso porque eram eles mesmos pessoas
da complexidade, confrontadas diariamente com esta na relação com a
terra, com os elementos climáticos, com a vida, aquela das culturas e das
criações, na relação com o contexto local, físico, humano e cultural, econô-
mico, político... Tratava-se, para eles, de criar “uma escola da terra, pelas
pessoas da terra e para as pessoas da terra” segundo esta expressão encon-
trada no Québec.
Após a invenção, precisava construir uma pedagogia. Para os fundado-
res, o passado em questão de pedagogia se encontra no ensino tradicional.
Claro que no início este serve de referência, mas logo enxerga-se sua inapti-

2. SANGNIER, M. (1873-1950). Seu movimento, criado no final do século XIX, milita e


age através de círculos de estudo, de jornais, entre os quais Le Sillon, de conferências...
para reconciliar sua fé na Igreja com suas idéias republicanas, e, de maneira mais
abrangente, o povo e a Igreja, opondo-se, ao mesmo tempo, aos conservadores católi-
cos e aos radicais ateus. Ele traça um caminho da educação popular.

22
dão. Começa então um amplo movimento de pesquisa-ação, como se diz
hoje. A prática do dia-a-dia, a experimentação, as tentativas/erros cuja análi-
se, a reflexão e sempre o bom senso e a intuição permitem elaborar instru-
mentos, metodologias e princípios pedagógicos. É o tempo em que nas MFR
não existem aqueles que conhecem a Pedagogia da Alternância e os que a igno-
ram. Nenhum ensinamento se torna possível neste sentido, já que os saberes
não existem. Devem ser construídos. Deste jeito, animados por uma dinâmi-
ca criadora, todos contribuem para a elaboração das atividades, dos instru-
mentos, das organizações didáticas, dos princípios e métodos próprios das
MFR. Vive-se de cheio o processo de produção de saberes e dos valores edu-
cativos do meio de vida na sua escala real. Elabora-se assim uma pedagogia
3
da relação, do encontro, uma pedagogia da partilha . Um processo está
acontecendo, o da formação por alternância em toda a sua complexidade.
A Pedagogia da Alternância elaborou-se não através de teorias, mas,
antes, pela invenção e implementação de um instrumental pedagógico que
traduzia, nos seus atos, o sentido e os procedimentos da formação. Em ou-
tras palavras, neste processo criativo, prevaleceu a ação, a experiência, o
4
sucesso no sentido de J. Piaget , isto é, um pensamento em ação. E só é de-
pois – talvez também um pouco ao mesmo tempo – que, sempre segundo a
lógica piagetiana, opera-se a abordagem da compreensão e que uma teori-
zação pode ser levada em frente. Uma teorização, não para si mesma, mas
como processo de compreensão, ao mesmo tempo para nutrir a experiên-
cia, a ação do terreno, dar-lhes sentido. Deste jeito, para situar-se no hori-
zonte educativo, não estar só e isolado, mas em relação com os outros e, às
vezes, para municiar-se de argumentos a fim de se defender dos donos do
tradicionalismo ou dos poderes administrativos.
E, para isto, homens e movimentos trabalharam de maneira subjacen-
te. Na origem encontra-se o movimento de ação social Le Sillon, de Marc
Sangnier, e depois o pensamento de um grande filósofo personalista,
Emmanuel Mounier, a metodologia do “Ver – Julgar – Agir” deste grande
5
e bonito movimento de educação popular, a “JAC” , mas também o espíri-
to e os procedimentos da educação nova e de outros pensadores e peda-
6
gogos servem como referências ou prestam sua contribuição . Encontros e

3. DAIGNEY, J.C. A alternância, uma pedagogia da partilha. In: Juntos, construímos o


nosso futuro – Formação, solidariedade, desenvolvimento [Atos do Congresso da AIMFR,
Bruxelas, 22-23/11/2000 – Difusão AIMFR].
4. PIAGET, J. Réussir et comprendre. Paris: PUF, 1974.
5. JAC: Movimento da Juventude Agrícola Católica.
6. Pode-se notar os empréstimos, antes de tudo, às correntes da pedagogia ativa com
Decroly e seu método dos “centros de interesse”, R. Cousinet e o trabalho livre em gru-

23
intercâmbios aconteceram em diferentes momentos com a universidade
para aclarar-se, nutrir-se em toda complementaridade e reciprocidade e,
como em qualquer processo de formação alternada, ultrapassar a prática e
7
os saberes da experiência. Primeiro, foi o encontro de A. Duffaure , então
diretor da União Nacional das MFR da França e articulador deste processo
de criação, com universitários da Sorbonne. Em seguida veio a colaboração
8
com a Escola Prática de Estudos Superiores em Ciências Sociais de Paris e
9
enfim com a Universidade de Tours em parceria com o Centro Pedagógi-
co Nacional de Chaingy. Encontro com universitários, com certeza, mas só
com aqueles movidos por uma renovação pela pedagogia e por uma cons-
ciência, um pensamento e práticas pedagógicas e educativas complexas e
sistêmicas. Eles desempenharam o seu papel de universitários sem interfe-
rir no funcionamento institucional. Alimentaram, de seu jeito, as práticas,
permitindo fazer um passo na obtenção de maior clareza. Foi o encontro
da experiência com a ciência, como acontece também em toda formação em
alternância. Mas, neste processo de inovação e de construção, os agricul-
tores antecederam os universitários.

Um universo cheio de sentido

Uma dinâmica geral anima então toda esta caminhada criativa que só
pode resultar em movimento. Este está sendo orientado, fortalecido, até
transcendido por uma reflexão sobre a pessoa humana, alimentada pela
10
corrente filosófica do personalismo de Emmanuel Mounier e, depois, por
outros filósofos, pedagogos, pesquisadores e pensadores como já foi dito
anteriormente. Um projeto global existe e traz uma visão do homem, da
sociedade, da ruralidade, do desenvolvimento. O sentido da responsabili-
dade, do poder, está presente. Vive-se num “universo cheio de sentido”.
Um gosto de liberdade e do fazer por si mesmo estimula as energias.
Sabe-se por que se cria uma MFR, porque ela existe. Essa escola nova deve
ser a da pequena região, não uma escola agrícola a mais, como as outras,
mas uma escola para formar os agricultores e contribuir para o desenvolvi-

pos, J. Dewey e a relação entre experiência e educação, C. Freinet e o texto livre ou a bi-
blioteca de trabalho, M. Montessori, mas, também, as orientações de Steiner, da Escola
Alsaciana... Depois, mais tarde, os aportes de J. Piaget, como indicado anteriormente,
C. Rogers, B. Schwartz... mas, também, P. Freire e A educação como prática da liberdade,
pelos seus métodos de alfabetização.
7. A saber, R. Cousinet, J. Robert, M. Debesse.
8. Mais especificamente, o Colégio Cooperativo e seu responsável H. Desroche.
9. Convém mencionar, neste sentido, as contribuições essenciais de G. Lerbet, G. Pineau
e P. Bachelard, Universidade de Tours.
10. MOUNIER, E. Le Personnalisme. In: Que sais-je. Paris, PUF, 1971.

24
mento do país. Uma escola que seja a sua e da qual assumem a gestão e to-
das as responsabilidades, agrupando-se em associação, uma forma jurídica
que confere uma força e um poder. Uma escola para as famílias e os agricultores,
e, além disto, para homens e mulheres da região. Deste modo, aquilo que estariam
semeando ou plantando, através de um enraizamento profundo num terri-
tório, teria alguma perenidade. Surge a consciência dos múltiplos serviços
que esta “nova escola” deve oferecer e dos papéis multidirecionais e interde-
pendentes que deve desempenhar em relação aos adolescentes rurais, às fa-
mílias, à agricultura, à ruralidade e, de maneira mais ampla, em relação à
educação e à sociedade. O discurso é amplo e possui grandeza. É sistêmico,
global, portador de uma ética, de um projeto para o homem nestes períodos
de grandes transformações, até mesmo de mutação. Está virado ao futuro
para “aclarar o futuro, não em seguir as lições do passado, mas avançando
11
para um futuro promissor e prometido” , pensava-se.
Em seguida, os fundadores da segunda geração encontram suas ener-
gias na dinâmica da reconstrução do pós-guerra na França e da grande os-
cilação da agricultura com a revolução verde. As MFR (CFR) que criam ins-
crevem-se, inteiramente, nesta ampla transformação da agricultura e da
ruralidade, trazendo nesta sua contribuição pela formação dos jovens e fu-
turos sujeitos. Esta vai de par, em muitos lugares, com a vulgarização agrí-
cola. É uma época de engajamento, de militantismo de pais e de agriculto-
res, fundadores das MF, mas, também, dos diretores e dos monitores des-
tas. Todos estão atrelados em comum a um amplo programa de desenvol-
vimento. Não se torna necessário incitar ao engajamento, à conduta de
ações de desenvolvimento, acontece por si mesmo. É a época em que a qua-
se totalidade dos sujeitos do movimento pertencem a uma mesma cultura,
a uma mesma família: a da agricultura e da ruralidade. Todos tendem a ob-
jetivos próximos ou similares, dirigidos para o futuro. Logo, a pedagogia,
as aulas, a formação encontram um direcionamento, adquirem sentido. A
alternância se vive quase por si mesma. Porém, esta pedagogia nova não é
evidente e precisa ser definida, iniciada, fundada.
Um processo similar existe, em seguida, nos setores do artesanato, dos
serviços, do comércio, quando as MFR extrapolam o campo da agricultura
para abrir-se às profissões do mundo rural a fim de manter sua vitalidade.

11. Segundo MORIN, E. e col. Une éducation pour l’ère planétaire. Paris: Balland, 2003.

25
Uma conquista da autonomia

Não tem caminhada, avanços, progressos, superação para qualquer


pessoa como para qualquer instituição sem que haja passos para frente a
cada dia para existir e crescer. E, nesse processo de construção de uma pe-
dagogia, vários caminhos tiveram de ser inventados e traçados para que es-
tes passos para frente tenham continuidade. A saber:
• a elaboração e a implementação de um instrumental e de um disposi-
tivo pedagógico carregando o sentido da ação educativa;
• a formação inicial e contínua dos formadores chamados “monitores”
por causa de seus papéis e da função de articuladores desta pedagogia
complexa;
• a pesquisa a fim de trazer a luz da ciência e um espírito científico;
• a informação e a animação institucional;
• a defesa de uma especificidade pedagógica e organizacional, ou seja,
12
de uma autonomia junto às instâncias políticas e administrativas .
Porque tudo se une, tudo trabalha no mesmo tempo, tudo interage no
seio de um sistema educativo:
• sem instrumentos, a idéia fica estéril;
• sem formação dos monitores e sem animação institucional os desvios
e a perda de identidade se tornam possíveis;
• sem pesquisa arrisca-se ficar no mesmo lugar, perder a vigilância ou
enclausurar-se em funcionamentos ideológicos;
• sem lutar para garantir seu lugar, fica fácil ser recuperado ou sufoca-
do por outros. E sem uma margem suficiente de autonomia, um movi-
mento educativo deste, uma pedagogia desta, não pode existir com au-
tenticidade.
E esta questão da autonomia, com suas margens de liberdade, foi e per-
manece fundamental:
• autonomia em relação aos programas, reescrevendo-os, a fim de tor-
ná-los mais inteligíveis, de hierarquizar os conteúdos em função das
orientações de formação;
• autonomia em relação à gestão e à forma de distribuição do progra-
ma (organização, instrumentos didáticos...);

12. Neste sentido, as MFR (CFR) da França têm trazido uma colaboração de primeira
ordem para o reconhecimento oficial da alternância como via de formação completa,
participando na elaboração de uma lei (Lei de 2 de agosto de 1960 sobre o ensino e a
formação profissional agrícola). Cf. em seguida, no cap. 5.

26
• autonomia na denominação, na forma de exercício, a qualificação, os
estatutos e os papéis dos “formadores” chamados monitores.

Conclusão

O processo de criação da Pedagogia da Alternância esteve coerente


com o seu objetivo. Os agricultores inventores e seus porta-vozes pedagó-
gicos não se basearam em teorias ou conceitos para colocá-los em prática
de maneira dedutiva. Não, eles perceberam, escutaram e se conscientiza-
ram dos problemas, das necessidades. Questionaram-se, formularam hipó-
teses e têm enunciado soluções... Em seguida, inventaram, realizaram, agi-
ram, implementaram, arriscaram. Uma vez engajada a ação, observaram,
escutaram, olharam as práticas. Analisaram, destacaram os componentes
do sistema e os fatores de êxito e de fracasso... Disto tudo extraíram idéias,
pensamentos, saberes e conhecimento, mesmo que fossem empíricos...
Confrontaram com outros, diferentes, para atingir outros saberes, outros
conhecimentos mais amplos no campo das ciências educativas... para en-
tender melhor, agir melhor a fim de prestar um serviço educativo, respon-
der às necessidades, contribuir para o desenvolvimento das pessoas e do
meio rural.
Esta caminhada criativa tornou-se uma ação – pesquisa- formação perma-
nente. Uma caminhada feita de tentativas e de ensaios, de empirismos e de
reflexões, de desordem e ordem, de informação e de formação, de estrutu-
rações e de organizações para existir, afirmar-se, chegar, gerir suas depen-
dências, ganhar em autonomia, ser si mesmo e solidário... Na verdade, esta
criação foi um processo complexo. Foi na França. Mas no Brasil, na Argen-
tina, no Uruguai e em todos os países da América Latina, no Québec, na
África, na Ásia, na Oceania... é bem capaz que uma caminhada similar
aconteça para que possa afirmar-se um movimento educativo inovador e
portador de esperança.

27
2
AS ATIVIDADES E OS INSTRUMENTOS
DA ALTERNÂNCIA

Nunca separar a cultura da natureza e de suas leis.


Célestin Freinet

Conceber um método que seja também o instrumento do


aluno e não somente do educador e que identifique o
conteúdo da aprendizagem com o processo mesmo da
aprendizagem.
Paulo Freire

Sem instrumentos apropriados permitindo sua implementação, a alter-


nância permanece sendo uma bela idéia pedagógica, porém sem realidade
efetiva. Porque tudo se prende e a alternância, como outros métodos, fun-
13
ciona como um sistema em que os diferentes componentes interagem . Sem
projetos ou sem rumos a dar o sentido, as técnicas e os instrumentos pedagó-
gicos podem ser percebidos como justaposições de atividades escolares e sua
implementação faltar-lhe alma e dimensão. A eficiência educativa e formati-
va da alternância é ligada à coerência, existindo entre todos os componentes
da situação de formação e, notadamente, entre as finalidades, os objetivos e
os meios do dispositivo pedagógico.

Os fundamentos de um dispositivo pedagógico

O dispositivo pedagógico representa o subsistema operacional do sis-


tema de formação alternada. Finalidades e princípios presidem sua imple-
mentação.

1. As finalidades
Como enunciadas na introdução, elas são de dois tipos:
• de um lado, a formação integral da pessoa, a educação e, de maneira
concomitante, a orientação e a inserção socioprofissional;

13. Cf. cap. 5: “A alternância no horizonte educativo”.

28
• de outro lado, a contribuição ao desenvolvimento do território onde está
14
sendo implantado o CEFFA .

2. Os princípios
2.1. A primazia da experiência sobre o programa
A Pedagogia da Alternância dos CEFFAs representa um caminhar per-
manente entre a vida e a escola. Sai da experiência no encontro de saberes
mais teóricos para voltar novamente à experiência, e assim sucessivamente.
Desta maneira, coloca-se para o alternante uma dupla relação:
• ao trabalho e ao mundo da produção e seus saberes, à vida social e
econômica, ambiental e cultural dos lugares onde vive, de um lado;
• a um lugar “escolar” com suas atividades, sua cultura e seus saberes,
de outro lado.
Disto decorrem três exigências:
• a experiência deve ser considerada, ao mesmo tempo, como suporte
de formação, reservatório de saberes e cadinho educativo;
• ela é o ponto de partida do processo para aprender segundo a lógica
15
do “praticar e compreender” e antecede, desta maneira, o tempo es-
colar;
• no ritmo de alternância, a duração da experiência é pelo menos igual,
até mesmo superior à duração da estadia no CEFFA.

2.2. A articulação dos tempos e dos espaços da formação


Ela se impõe para uma formação contínua na descontinuidade das ati-
vidades. Atividades e instrumentos são indispensáveis para:
• fazer a ligação e possibilitar a interação entre os dois espaços-tempos;
• ter continuidade na sucessão das microrrupturas que representa a
passagem de um ao outro no plano relacional, afetivo e cognitivo;
• ter coerência, unidade e integração.

14. Estas finalidades são desenvolvidas no cap. 6: “Os contornos e os componentes da


Pedagogia da Alternância”.
15. Cf. cap. 7: “Aprender na formação em alternância”.

29
2.3. Um processo de alternância num ritmo em três tempos
1. O meio familiar, 2. O CEFFA 3. O meio
profissional, social
• Experiência • Formalização- • Aplicação-ação
• Observações, estruturação • Experimentação
investigações, análise • Conceitualização • (Saberes-ações)
• (Saberes experienciais) • (Saberes teóricos e
formais)
Estes três tempos constituem uma seqüência de alternância ou unidade
de formação.

Seqüência de alternância ou unidade de formação

Meio vivencial CEFFA


CEFFA Meio vivencial

Preparação Experiência-Investigação Formalização-Conceitualização


Ação
Nova seqüência

2.4. O princípio da formação profissional e geral associadas


Este princípio responde a uma dupla obrigação:
• de um lado, levar em conta a experiência onde prevalece o sociopro-
fissional com uma visão e uma exigência de qualificação profissional
nos ciclos deste tipo;
• de outro lado, atingir a finalidade primeira dos CEFFAs, que é a da
formação integral da pessoa no máximo de suas possibilidades.
Uma e outra se servem mutuamente, mas levando em conta os perfis
de aprendizagem do público recrutado, os conteúdos profissionais mais
práticos, concretos e familiares, colocam-se geralmente na frente para tra-
16
zer os conteúdos gerais mais teóricos e mais abstratos .

2.5. O princípio de cooperação, de ação e de autonomia


Um alternante só pode se tornar ator de sua formação e ganhar pro-
gressivamente em autonomia. E esse ganho de autonomia lhe permite

16. Cf. cap. 7 relativo aos processos de aprendizagens em formação alternada.

30
aprender mais e melhor. De fato, o que aprende fora do CEFFA lhe confe-
re, quando volta nele, o poder de um saber que nem os monitores e nem os
outros membros possuem. Por isso, os saberes dos alternantes do grupo,
colocados em comum e partilhados, constituem um suporte essencial de
aprendizagens.

2.6. A associação dos pais e mestres de estágio profissionais como parceiros e


co-formadores
A alternância diversifica e multiplica os co-formadores: pais, responsá-
veis de empresas, mestres de estágio e tutores, monitores do CEFFA e ou-
tros intervenientes, mas também os alternantes do grupo. A formação al-
ternada não atinge sua plena eficiência se os pais e os mestres de estágio
deixam de desempenhar seus papéis de formação e de educação. Os moni-
tores não podem nada sem eles e o dispositivo pedagógico deve levar isto
em consideração
Por isso, em toda Pedagogia da Alternância é fundamental uma peda-
gogia da cooperação, uma partilha do poder educativo.
Resulta destas finalidades e princípios um conjunto de organizações,
de atividades, de técnicas e de instrumentos de natureza diferente: A saber:
• atividades e instrumentos de investigação dos espaços-tempos e ex-
periências familiares, profissionais e sociais;
• atividades e instrumentos de junção entre o meio de vida e o CEFFA;
• atividades e instrumentos que dão acesso aos dados e disciplinas dos
programas acadêmicos e de unificação dos saberes;
• atividades e instrumentos de avaliação;
• uma organização temática das seqüências de alternância como uni-
dades de formação;
• uma orquestração do conjunto do percurso dado pelo Plano de For-
mação;
• uma organização específica das semanas de formação no CEFFA
(planejamento semanal);
• atividades e instrumentos de relacionamento entre os co-formadores.

O Caderno de Vida ou Caderno da Realidade: o instrumento básico da


Pedagogia da Alternância dos CEFFAs

Se a experiência encontra-se no ponto de partida do processo pedagó-


gico, ainda precisa que ela seja explorada, analisada, expressa e confronta-

31
da para se tornar um suporte de formação e de educação. Esta é a razão de
ser do Caderno da Realidade como primeiro livro a ser construído. Um li-
vro de vida, rico em si mesmo de informações, análises e aprendizagens va-
riadas. Mas também um livro ao qual vão se articular, em seguida, os livros
acadêmicos para enriquecê-lo e construir o grande livro dos saberes a se-
rem aperfeiçoados e das aprendizagens a serem feitas no presente de um
percurso para o futuro.

1. Gênese e evolução
A implantação da alternância demonstrou imediatamente a necessi-
dade de uma atividade e de um instrumento pedagógico específicos para:
• de um lado, permitir, aos filhos e filhas de agricultores da época, a
observação e a análise direta da prática agrícola de sua roça aos pais de
colaborarem na formação de seus filhos, trazendo sua experiência e
seu saber-fazer;
• de outro lado, estabelecer um elo orgânico entre a experiência da
profissão, da vida familiar e social na qual se insere o jovem adolescen-
te e o período escolar.
A primeira resposta foi dada através de uma monografia do povoado
ou comunidade. Esta foi rapidamente abandonada porque, pelo fato de
ser por demais fora e afastada da experiência e das preocupações dos jo-
vens e de seus pais, só suscitava desinteresse. A solução foi encontrada
propondo para cada aprendiz “elaborar um estudo progressivo, deta-
lhado e preciso da célula profissional que lhe era familiar, na qual estava
atuando, aquela que começava a despertar nele alguma preocupação, ou
17
seja, a roça familiar” .
Por isso, o instrumento que juntava o conjunto das observações, análi-
ses e reflexões e estava sendo construído ao longo da formação, foi chama-
do de “caderno da exploração familiar”. Para as meninas, o processo simi-
lar para as atividades domésticas recebeu o nome de “caderno de casa”.
Em seguida, a mesma caminhada foi seguida pelas Maisons Familiales Ru-
rales (Casas Familiares Rurais) que foram abertas no setor de artesanato,
nascendo assim o “caderno da empresa”.
Hoje, a diversificação de esferas de atividades, tanto através da orienta-
ção profissional quanto por nível, modificou a unidade de espaço de alter-

17. DUFFAURE, A. & ROBERT, J. Une méthode active d’apprentissage agricole – Les cahi-
ers de l’exploitation familiale. Paris: EAM, 1955.

32
nância fora do CEFFA em todo o percurso da formação. As primeiras de-
nominações (caderno de exploração, caderno de casa, caderno de empre-
sa) perderam, em grande número de situações, seu primeiro sentido. Por
isso, hoje em dia, coloca-se muitas vezes a questão do nome do dossiê das
pesquisas, dos estudos de estágio – como muitas vezes são chamados – ela-
borados progressivamente. Qual é o documento que confere a unidade, coerência
ao conjunto dos estudos, das pesquisas, das descobertas, das reflexões e relatos de
vida de 2, 3 ou 4 anos de existência nesta fase importante da construção da pessoa?
• Alguns o denominam “dossiê dos estudos de alternância”. Isto não
faz sentido porque a alternância não poderia ser assimilada à estadia
no meio de vida extra-escolar.
• Outros o intitulam “caderno ou dossiê de estágios”. É verdade no que
diz respeito às formações profissionais aonde os jovens estão essencial-
mente em estágio nas empresas, mas fica, todavia, limitado porque o
campo profissional não é exclusivo. E, com certeza, é redutor em rela-
ção aos primeiros ciclos e para toda formação mais geral, porque a es-
tadia fora do CEFFA leva também em consideração a vida familiar, so-
cial, cultural...
• A denominação “caderno da realidade” ou “caderno de vida” ou ain-
da “caderno do meio de vida” também está sendo utilizada. É mais glo-
balizante e não deixa de ter sentido com a condição de que sejam leva-
dos em consideração os diferentes setores da vida e as atividades ine-
rentes (familiais, profissionais, sociais).
• Enfim, de maneira mais abreviada, diz-se também “o plano de estu-
do”. Não pode ser certo porque este só representa um “pedaço” de
uma atividade mais global.
Da nossa parte escolhemos a denominação “caderno da realidade” por
nos parecer a mais apropriada e também a mais comum.

2. Uma atividade global


A atividade pedagógica “O Caderno da Realidade” desenvolve-se no
espaço-tempo da formação em quatro fases:
• plano de estudo ou guia de pesquisa elaborado pelo grupo-classe antes
da saída do CEFFA;
• durante a estadia na família e/ou no meio profissional, a realização e a
expressão, por cada um, das pesquisas ou estudos;
• ao retornar no CEFFA, acontece a apreciação, por um dos monitores,
do documento escrito trazido e seu melhoramento;

33
• a formatação do estudo, ou seja, sua transcrição como também sua ilus-
tração para construir um documento personalizado de qualidade, a ser con-
siderado como a “obra-prima” agradável ao olhar e a ser conservado
cuidadosamente.
A colocação em comum constitui seu prolongamento normal bem como a
visita de estudo e as “aulas teóricas”. O Caderno da Realidade, na verdade, só
adquire todo o seu sentido para o alternante, bem como para os monitores e
os pais ou mestres de estágio, na medida em que se integra no conjunto do
processo de formação do qual é a peça mestra. Caso contrário, ele está sendo
reduzido a um simples instrumento didático.

3. Aplicar bem o caderno da realidade


Esta atividade de formação e de educação inventada pelos CEFFAs
para viver a alternância exige um conjunto de condições, tanto na questão
do conteúdo, da prática pedagógica quanto da implicação dos atores in-
teressados.

3.1. A pertinência dos temas de estudo


Cada ciclo de formação contém um grande número de temas de estudo
relativos à diversidade das situações que fazem parte da vida de cada alter-
nante. A saber: estudos sobre a vida profissional, com certeza, mas também
sobre a vida familiar, sobre a vida social e sobre a vida pessoal. A partir da
orientação dos ciclos, um ou outro componente de vida está sendo mais le-
vado em conta, mas todos permanecem presentes se, todavia, se vislumbra
uma formação que não seja somente tecnicista.
Todavia, as pesquisas ou estudos propostos só apresentam um interes-
se duradouro se os alternantes encontram neles uma utilidade, um signifi-
cado, um sentido. Para que isto aconteça, três elementos de pertinência de-
vem ser considerados:
• Pertinência em relação às atividades, às preocupações, à experiência,
ao contexto de vida, aos papéis desenhados no Plano de Formação. O inte-
resse encontrado pelo alternante repercute assim sobre o dos adultos sus-
cetíveis de lhe dar uma ajuda.
• Pertinência em relação à evolução do jovem em seus interesses, suas
sensibilidades, suas capacidades de apreender o meio ambiente, seu com-
portamento inicial ao abordar uma profissão, suas relações para com os
adultos, pais e/ou mestres de estágio.
• Pertinência também em relação à cultura do meio, caracterizada pe-
los seus modos de pensar, sua linguagem, suas formas de expressão. A di-

34
versidade de públicos provoca às vezes situações multiculturais tanto pro-
fissionais quanto étnicas no meio dos grupos. As dificuldades que decor-
rem disto para a gestão pedagógica criam o risco de reduzir a preocupação
para com as singularidades culturais de cada um e de generalizar como na
escola tradicional.
A questão da escolha dos estudos como da progressão se revelam então
de primeira importância. Não é o programa em base de noções que deter-
mina estas escolhas, mas, sim, a progressão dos adolescentes ou adultos. É
nesta base que se constrói o Plano de Formação.

3.2. A aplicação de uma metodologia


A condução pedagógica desta atividade pelos monitores implica atitu-
des, saber-fazer e técnicas específicas. Seus papéis se assemelham muito
aos da animação pedagógica.

1) Uma metodologia para a construção do plano de estudo


O plano de estudo, como instrumento de pesquisa ou guia de trabalho,
determina, em boa parte, a motivação do alternante e dos adultos que o
acompanham. Determina também a qualidade do estudo realizado. Sua
construção se reveste da maior importância para atingir os efeitos forma-
dores esperados.
Esta construção supõe duas fases:
• a primeira diz respeito à elaboração do conteúdo, ou seja, o conjunto
dos pontos que a pesquisa vai tocar;
• a segunda tem a ver com a forma escrita do plano de estudo ou guia de
pesquisa entregue aos alternantes antes de sua saída do CEFFA.
A elaboração do conteúdo do plano de estudo reside, por excelência, numa ativi-
dade oral do grupo, que tem por objetivo, através de um trabalho de anima-
ção do monitor, fazer emergir o conjunto dos pontos a serem estudados so-
bre o tema proposto. Trata-se menos de fazer surgir perguntas do que per-
mitir uma tomada de consciência das questões que surgem.
Elaborar o conteúdo do plano de estudo é provocar o intercâmbio no meio
do grupo, deixar que as práticas sejam expressas, as experiências, os conhecimentos,
as interrogações dos alternantes a respeito do tema. É convidá-los a procurar
o “porquê e o como” das coisas, as circunstâncias das ações e sua razão de
ser. É ainda levá-los a avaliarem, a darem seu ponto de vista como atores
socioprofissionais.

35
Os Cadernos da Realidade não poderiam limitar-se a estudos tecnicis-
tas, monográficos, sem vida e sem implicação do autor. Eles almejam, ao
contrário, uma abordagem personalizada de sucessivas experiências que se
traduzem através de pedaços sucessivos e progressivos de relatos de vida.
A construção do plano de estudo representa um outro tempo da atividade
do monitor. Ela consiste em dar forma ao conjunto dos elementos de estudo
extraídos junto ao grupo. A saber:
• Dar uma estrutura para facilitar as observações, as pesquisas, os inter-
câmbios e a redação do texto a ser produzido. Ela convida a escrever ou
contar situações, fatos precisos, a analisá-los, para, em seguida, estabelecer
comparações no espaço e no tempo (o passado e o futuro) antes de convi-
dar a uma reflexão pessoal sobre o tema estudado. Uma estrutura dessas é
essencial nos primeiros tempos da formação para impulsionar um proces-
so de pesquisa e de expressão. Facilita uma construção progressiva de sa-
beres. Ajuda na estruturação do pensamento. É, no mesmo tempo, segura-
dora porque oferece um quadro de trabalho. Fica claro que deve evoluir
com o tempo para ficar menos rígida quando a condução de uma pesquisa
é mais assumida.
• Traduzir o conteúdo em questionamento. O guia de pesquisa não é o ques-
tionário do monitor que enumera perguntas a serem respondidas. É pro-
duto do próprio jovem. É o instrumento que construiu com outros (os cole-
gas do grupo e o monitor) para realizar uma pesquisa. Ele traduz as ques-
tões que convém fazer a respeito do tema abordado. Por isso, trata-se:
- de um lado, de um questionamento personalizado e implicante (isto é, for-
mulado no “eu” ou “nós”);
- de outro lado, de um questionamento aberto que coloca em movimento,
em atitude de busca e desperta a curiosidade. Por isto, as questões fe-
chadas que induzem respostas “sim” ou “não” devem ser excluídas.
A passagem na prática de redação do monitor das perguntas que colo-
ca (formulação na 2ª pessoa) para as que o alternante se coloca (formulação
na 1ª pessoa) se torna muitas vezes difícil porque ela obriga a descentrar-se
para o outro, a uma mudança da relação de autoridade que se transforma
então numa autoridade pedagógica com o objetivo de tornar o outro “au-
tor de si mesmo”.

2) Uma metodologia para a apreciação e a formatação do estudo


Este tempo torna-se também muito importante para a motivação e a
qualidade dos futuros trabalhos. É, antes de tudo, um momento de encon-
tro, de ligação entre os dois espaços-tempos da formação, uma interface.

36
Trata-se menos, para o monitor, de corrigir como se faria para um dever
escolar que de conversar sobre a estadia que acaba de acontecer, de admi-
rar-se, de questionar, de formular suas observações, de propor pistas de
melhoramentos. É neste momento privilegiado que o monitor descobre as
situações de vida do jovem, que recebe saberes da prática e, conseqüente-
mente, aprende.
Torna-se ao mesmo tempo uma atividade de avaliação formativa, já que
se trata de apreciar no seu desenvolvimento e na sua forma o texto redigido
para melhorá-lo e valorizá-lo. Trata-se neste caso de uma tarefa pedagógica
de aconselhamento, de orientação, de acompanhamento.
O plano de estudo encontra seu acabamento no “Caderno da Realida-
de”, ou outra denominação, segundo a terminologia utilizada, progressi-
vamente constituído por cada alternante. Sua qualidade, conferida através
de uma paginação, ilustrações e uma composição gráfica cuidadosa, tor-
na-se fator de valorização e de reconhecimento do trabalho fornecido. O
18
futuro interesse e implicação, em grande parte, dependerão disto .

3.3. A motivação e a implicação dos atores


Alternantes, pais, mestres de estágio, monitores, todos enfim são en-
volvidos e interagem. Todos dependem da motivação e da implicação de
cada um. Os monitores, com toda evidência, vêm na frente. São eles que indi-
cam o caminho, dinamizam a atividade ou deixam de fazê-lo, injetam sentido.
Seu conhecimento do meio, das práticas profissionais, sua atitude, seu rela-
cionamento com o meio profissional, familial e social dos alternantes, seu
saber-fazer pedagógico, o lugar e o valor que conferem a esta atividade no
processo de formação tornam-se fatores de seu êxito.
4. Compreender o Caderno da Realidade
O Caderno da Realidade é uma atividade fundamental com efeitos
múltiplos, tanto de natureza pedagógica quanto formativa e educativa.
• Primeiro efeito: a articulação dos espaços-tempos da formação (meio de
vida e CEFFA) permitindo criar um elo, liga, continuidade e unidade entre
eles. Ela contribui, desta maneira, dando sentido às atividades e estudos de
natureza diferente, em que pode prevalecer seja o aspecto mais prático,
seja o aspecto mais teórico e escolar.

18. Cf. a nota na seqüência “Por uma pedagogia da obra”.

37
O caderno da realidade CEFFA
CEFFA
Estadia no meio vivencial

• Segundo efeito: para cada alternante, a exploração, a descoberta do meio


de vida familiar, profissional e social num território com componentes físi-
cos, humanos, culturais, históricos... Cada meio de vida representa um su-
porte de atividades e de experiências de várias naturezas, uma reserva de
saberes diversos e múltiplos. Cada meio de vida destes é portador de uma
cultura local que se faz presente nos fatos e nos gestos, na linguagem e nos
comportamentos. Ele se torna então, na lógica da formação alternada, um
reservatório de formação e de educação, um componente maior das apren-
dizagens e da construção da personalidade do jovem. Por isto, convém aju-
dá-lo a apreender seu meio ambiente, vivendo e atuando nele, mas tam-
bém através da discussão, da confrontação dos pontos de vista, da reflexão
sobre a ação. O plano de estudo pretende, neste sentido, ajudar o alternan-
te a captar e entender melhor o ambiente onde cresceu, onde vive: suas di-
mensões, suas riquezas, seus limites... o que há de extraordinário sob a ba-
19
nalidade aparente do quotidiano . Importa permitir-lhe não somente de
enxergá-lo, mas também de analisá-lo, de discuti-lo com um espírito críti-
co. A base da formação geral se encontra aí, através desta situação que se
opera no tempo e no espaço e que permite compreender melhor onde es-
tamos e quem somos.
• Um terceiro efeito diz respeito às relações, encontros, ao diálogo que,
na adolescência, não sendo sempre evidentes em relação aos adultos, se
encontram facilitados, até mesmo provocados. Ainda mais porque eles in-
cluem pedidos de informação com os atores do meio, incitam os encontros
com as experiências de adultos do tempo atual, mas também do passado
junto às pessoas mais velhas. A pedagogia pertinente para a adolescência é
uma pedagogia do encontro e da confrontação: encontro e confrontação de ex-
periências (as experiências vividas dos adultos e as vividas ou a serem vivi-
das dos adolescentes), encontros e confrontações de situações, de pessoas,
de gerações, de idéias, de projetos... Disto tudo vai depender a construção
da identidade bem como o processo de orientação.

19. A. Duffaure, afirmando, neste sentido, que “o plano de estudo é colocar uma dose
de extraordinário no banal”.

38
• Um quarto efeito tem a ver com a expressão que se opera ao longo da
atividade tanto na sua forma oral quanto escrita e gráfica. Interrogar, dis-
cutir, debater com os pais, os mestres de estágio, depois com os monitores
e os outros membros do grupo-classe, mas também escrever, fotografar,
desenhar, ilustrar... constituem um tanto de atividades de expressão fo-
mentadas pelo plano de estudo. É o meio para contar instantes de vida,
construir narrações de vida. O documento resultante disto tudo pode en-
tão pegar a dimensão de um “livro de vida” com a condição que ele traduza
uma expressão pessoal, um envolvimento onde se acham presentes, além
dos fatos, opiniões, sentimentos, reflexões, pensamentos. Eis por que os
Planos de Estudo não podem restringir-se somente a estudos técnicos, des-
crições ou monografias por demais externos à pessoa.
• Quinto efeito: a formação geral. Seu desenvolvimento através da for-
mação tecnológica ou profissional sempre foi e fica sendo a finalidade dos
CEFFAs, obedecendo o conceito de formação associada definida em seu tem-
20
po . A formação geral, ou seja, uma formação global, não é resultado da
quantidade de noções ensinadas, mas, sim, de uma lenta construção da
pessoa, de uma maturação em suas diferentes dimensões (intelectuais, afe-
tivas, físicas, manuais, relacionais...). Não é de ordem quantitativa, mas,
sim, qualitativa, ou seja, ligada aos passos dados, às relações que se estabe-
lecem entre os diferentes campos de conhecimento, aos processos que se de-
senrolam. O plano de estudo representa a base do processo de formação ge-
ral ao permitir assentar as novas aprendizagens nos interesses da pessoa, na
experiência vivida e analisada.
Por outro lado, ele evita a dicotomia trabalho manual/trabalho intelec-
tual garantindo a manutenção de uma atividade intelectual, não por ela
em si, mas associada, integrada à atividade quotidiana de trabalho, de la-
zer, de relacionamento, ou seja, simplesmente, de vida. Ele ajuda a manter
permanentemente a relação “ação – reflexão – ação” sem a qual não existe
formação em alternância digna deste nome.
• Sexto efeito: uma preparação para a formação permanente. Trata-se
mais, com certeza, de um efeito a longo prazo, como resultado da aprendi-
21
zagem deste caminho-método que representa o “ver – julgar – agir” en-
gendrado pelo processo do Plano de Estudo.

20. DUFFAURE, A. Une nouvelle étape de l’enseignement agricole em France: la for-


mation associée. In: Documents UNMFREO, n. especial, mar.-abr./1963. Paris. • GIMO-
NET, J.C. La formation générale associée à la formation professionnelle [Communica-
ção nas jornadas Bacs Professionnels, 13-14/12/1990.
21. Em referência à fórmula do movimento da JAC (Juventude Agrícola Católica).

39
É também por isto que o Plano de Estudo, longe de querer obter um es-
tudo exaustivo de um problema, sempre deve ser visto como um treina-
mento para o estudo contínuo de uma realidade que se renova sem cessar.
Trata-se, em cada instante do percurso formativo e qualquer que seja o ní-
vel do ciclo, de fazer apreender e expressar, através das atividades, os pro-
blemas que surgem, as soluções procuradas e/ou encontradas, a experiên-
cia e as práticas das pessoas e da profissão, para buscar, superando-se, no-
vas luzes. É, em outras palavras, construir uma metodologia da aprendiza-
gem e da ação que, antes de tudo, é uma questão de atitude antes de consti-
tuir um saber-fazer e um saber.

Para concluir
O Caderno da Realidade e atividades inerentes constitui a peça mestra
da Pedagogia da Alternância dos CEFFAs, porque permite efetivamente
de considerar e utilizar o espaço-tempo da vida socioprofissional como
componente real da formação. Seus efeitos formadores são múltiplos e es-
senciais para o alternante. Mas não são menos essenciais para qualquer um
dos co-formadores que o acompanham: os pais, os mestres de estágio pro-
fissionais, os monitores e os membros do grupo ao qual pertence. O ques-
tionamento que provoca é interpelador para todos e constitui uma apren-
dizagem de um olhar crítico e reflexivo sobre o quotidiano da vida. É a ra-
zão pela qual as atividades em redor do Caderno da Realidade supõem, na
gestão pedagógica, um investimento em tempo e exigem um espaço signi-
22
ficativo nos planejamentos semanais .
Fica claro que estes propósitos apresentam um ideal-tipo que rara-
mente é atingido. Todavia, é na medida em que se aproxima dele que a Pe-
dagogia da Alternância do movimento educativo dos CEFFAs se inscreve
no “Réussir Autrement” – “Conseguir, alcançar de outro modo”, que rei-
vindica e o torna diferente de outras formas de alternância em formação.

NOTAS COMPLEMENTARES
23
Por uma pedagogia da obra
“Na origem dos CEFFAs, o caderno de exploração constituía a “obra-
prima” dos alunos”. Esta frase chama atenção. Não para falar do passado

22. GIMONET, J.C. Le planning hebdomadaire. In: Le Lien des Responsables, jun./1999.
Paris: UNMFREO.
23. Comunicação do autor feita num seminário no Centro Pedagógico Nacional das
MFR da França em 2001.

40
no sentido de culto ao passado e de nostalgia, mas para voltar às fontes, à
memória das coisas e por que colocar novamente esta problemática na or-
dem do dia não é, hoje, sem sentido para falar da pedagogia dos CEFFAs e
não somente de Pedagogia da Alternância.
As pedagogias da alternância de que todo mundo fala hoje são muito
diversas. E aquela dos CEFFAs pode se afogar e se perder nesta diversida-
de aliás interessante para responder às múltiplas situações de formação e
evitar a uniformização mais banal. Ora, um dos traços de identidade da pe-
dagogia dos CEFFAs tem, justamente, a ver com esta obra-prima.
O que significam as duas palavras da expressão “obra-prima”?
• obra significa produção, trabalho de qualidade. De maneira mais ampla,
a obra é o conjunto das produções de um autor, de um criador.
• prima significa estar na frente, em primeiro lugar.
A obra-prima representa então a obra perfeita, fruto de uma criação
pessoal. É também a obra que coloca na frente.
Neste caso, sim, do ponto de vista da pedagogia dos CEFFAs, a produ-
ção literária e gráfica em forma de caderno, de dossiê, de documento, de relatório,
que é o resultado das investigações, pesquisas, discussões, confrontações e
reflexões sobre suas atividades e seus contextos de vida, pode revestir, para o
adolescente, esta dimensão de obra-prima. Ela pode, ao contrário, permanecer
sendo uma cópia banal, um mero dever escolar que, como outros, será ob-
jeto da mais banal pontuação e assim dar continuidade ao processo de es-
colarização, se não lhe der uma dimensão expressiva suficiente.
As pesquisas e os estudos realizados no período no meio socioprofissio-
nal da formação podem conduzir o adolescente a produzir e, em seguida, a
encontrar uma obra-prima, se:
1) Os materiais, a matéria, o conteúdo forem substanciais, isto é, se os
Planos de Estudo permitirem uma leitura apurada, circunstanciada, crítica
da realidade de vida através das pesquisas, das discussões e reflexões dos
adolescentes sobre momentos de vida familial, profissional, social com suas
atividades, suas dificuldades, suas satisfações, sua prática. Se permitirem
captar as dimensões culturais do ambiente onde cada um vive. Se oportuni-
zarem encontros, relações, diálogo, confrontação com os atores deste am-
biente. Mas também se propiciarem abordagens no tempo e no espaço
onde pessoas trabalham e atuam, fazem e desfazem a história, o ambiente,
os contextos de vida e sua cultura.
Só poderia haver obra-prima se houver material para ser modelado, se
os jovens estiverem capazes de descobrir o extraordinário na banalidade apa-
rente do quotidiano.

41
2) Haverá obra-prima se o escrito decorrente das pesquisas traz a di-
mensão da expressão pessoal com o envolvimento que ela supõe. Se o adoles-
cente é conduzido a narrar instantes de vida, espaços de vida, se ele, em ou-
tras palavras, desenvolve relatos de vida. O documento que decorre disto
pode então tomar a dimensão de um “livro de vida” com a condição que
seja portadora de um envolvimento onde, além dos fatos e das opiniões, es-
tejam presentes sentimentos, reflexões, pensamentos. Eis por que os Ca-
dernos da Realidade não podem ser reduzidos a meros estudos técnicos,
descrições ou monografias demasiadamente afastadas da pessoa.
3) Haverá obra-prima se um verdadeiro trabalho de elaboração se opera na
volta no CEFFA, o que significa dizer apreciação e melhoramento com a aju-
da dos monitores, colocação em comum, apresentação, ilustração levando a
um documento personalizado de qualidade, a uma obra pessoal (observa-se,
hoje, neste sentido, a utilização da informática).
4) A noção de obra-prima vai aparecer se esta atividade, com todo o sa-
ber que ela traz, for colocada na ponta do processo de formação, isto é, se der
uma direção, um sentido às atividades e aos saberes que a prolongam: os
saberes do grupo através da Colocação em Comum, os de práticos através
da visita de estudo ou a intervenção externa, os do monitor através das au-
las, os dos livros, revistas, jornais, televisão e internet através de pesquisas e
de trabalhos documentários... De fato, na concepção da Pedagogia da
Alternância dos CEFFAs, são os saberes da vida que vêm à frente dos da es-
cola. Passa-se do grande livro da vida, do grande livro da natureza para o
livro impresso. É claro que esta lógica implica uma organização pedagógi-
ca séria que se traduz através do Plano de Formação, do trabalho por te-
mas, dos planejamentos semanais, do instrumental pedagógico.
Produção e encontro da obra-prima pelo adolescente durante sua formação...
uma perspectiva que confere um sentido à pedagogia, que define um modelo
pedagógico: o da pedagogia ativa, da pedagogia da experiência, da pedago-
gia da busca, de uma pedagogia que leva a aprendizagens por produção de
saberes mais do que por consumo. É por ocasião da produção de obras-pri-
mas – em se tratando de um relatório, de um documento de pesquisa, de um
memorial de estudos... – que implica a expressão escrita em todos os seus
componentes, a expressão gráfica, a apresentação, a estética... o trabalho
bem-feito... que se constroem os saberes porque, ao conectar-se com os seus
conhecimentos, passa-se por si próprio e expressa-se novamente as informa-
ções recebidas dos outros.
Quando se faz isto tem-se o sentimento de ter trabalhado por conta
própria, e não, de maneira escolar para alguém, por uma nota ou para

42
uma escola. Interiorizou-se. Colocou-se nisto não somente seu intelecto,
mas também seu afeto, sua sensibilidade, suas angústias, sua relação implí-
cita para com os outros, seu amor-próprio. Superou-se a si próprio. Não
houve somente um trabalho, mas realizou-se uma obra e a auto-estima
bem como a autonomia aumentaram. Sente-se uma satisfação e um orgu-
lho. Não se esquece facilmente seu documento, mas, ao contrário, é gosto-
so voltar a ele, olhá-lo, manuseá-lo, mostrá-lo, partilhá-lo. O trabalho se es-
quece, mas a obra permanece e o orientador sente o mesmo orgulho. Apren-
damos a modelar a matéria, a praticar uma pedagogia da obra.

A Colocação em Comum: a atividade-junção dos dois espaços-tempos


da formação alternada

A formação alternada supõe, para o alternante, passagens e transições


de um lugar de vida a outro, de um tipo de experiência a outro, de um
campo de conhecimento a outro, do individual ao coletivo do grupo... Para
o monitor, estas passagens e estas transições se colocam em termos de
acompanhamento, de atitudes e de animação pedagógica.
Por isso, a cada volta do alternante no CEFFA, o intercâmbio informal
do que cada um viveu de essencial no seu ambiente de vida e depois a ativi-
dade mais formal que consiste na Colocação em Comum, constituem estes
momentos e estas atividades de junção no processo de formação.

1. Ser bem-sucedido na Colocação em Comum


A Colocação em Comum encontra suas raízes no Plano de Estudo; ela os
prolonga e os supera pela generalização que opera. Ser bem-sucedido na Co-
locação em Comum supõe satisfazer condições de fundo e de forma.

1.1. O conteúdo
O valor da Colocação em Comum depende então, em grande parte,
dos estudos realizados pelos alternantes. Seu conteúdo e sua riqueza orien-
tam e determinam o que precisa ser colocado em comum a fim de garantir
um acréscimo e um enriquecimento dos estudos pessoais. Trata-se, de fato,
de favorecer uma expressão e uma confrontação do ganho da experiência;
em seguida, chegar a sínteses, a idéias gerais e a um questionamento. É na
medida em que ela propicia a cada um de progredir que ela se torna inte-
ressante de maneira duradoura. Por isto, nem tudo deve ser colocado em
comum e para cada uma delas é preciso fazer escolhas em função daquilo
que permitirá superar os aportes de cada um, de descobrir outra coisa.

43
Uma irá insistir sobre a relação das experiências, outra sobre as compara-
ções, outra ainda sobre a análise através da busca das causas, dos motivos
ou das conseqüências, ou observando as evoluções e suas incidências, etc. A
determinação do objeto da Colocação em Comum só poderá ser feita de-
pois de ter tomado conhecimento dos Planos de Estudo.

1.2. A realização
Ela supõe procedimentos, formas de trabalho apropriadas e uma vigo-
rosa animação por parte dos monitores.
Os procedimentos de Colocação em Comum são diversos:
• Com o grupo todo, através de um trabalho de animação geral do mo-
nitor, que por perguntas e incentivos convida uns e outros a se expres-
sarem, provoca a análise, a reflexão, faz surgir um questionamento,
ajuda o processo intelectual. Esta modalidade impõe-se nos primeiros
tempos da formação para dar-lhe o sentido e a prática.
• Por pequenos grupos, que procedem como descrito acima, ou então,
que são convidados a debater sobre um determinado problema.
• Através de exposições mais firmes de alguns membros do grupo, segui-
dos de aportes complementares ou contraditórios dos outros, etc.
Os procedimentos devem ser mudados e renovados para evitar a mo-
notonia e o desinteresse, mas também para experimentar metodologias di-
ferentes e assimilá-las.
As propostas ou questionamentos formulados pelo monitor para ori-
entar a Colocação em Comum podem tomar formas mais ou menos direti-
vas: de um quadro a ser preenchido até uma pergunta mais ampla e mais
livre, passando por um questionário mais apertado. Lá onde as perguntas
são importantes devido a sua pertinência, sua clareza, sua incitação à análi-
se e à reflexão. A variedade e a progressão devem ser procuradas na difi-
culdade e para deixar cada vez mais as iniciativas com o grupo.
A tomada de notas das informações trocadas e seu reagrupamento sob
a forma de relato se impõem. O relato materializa e valoriza a Colocação
em Comum. Ele se torna um documento interessante para os alternantes,
para os monitores, mas também para os pais e/ou mestres de estágio.
Como relato, ele se limita ao conteúdo da Colocação em Comum e não
acrescenta nada. Sob a forma de um texto estruturado e construído, ele
agrupa os dados recolhidos e dá conta do processo intelectual operado
pelo grupo para ir da expressão dos fatos e de suas comparações até a sín-
tese, até as idéias gerais, aos problemas e às questões.

44
2. Compreender a Colocação em Comum
Para explorar os ganhos adquiridos através da experiência, a Coloca-
ção em Comum constitui a segunda atividade-chave da Pedagogia da Alter-
nância. Seus efeitos formativos e educativos são conseqüentes porque ela
desempenha funções maiores.

2.1. Uma função de articulação dos dois espaços-tempos da alternância


Enquanto atividade de junção, como descrito anteriormente, ela cons-
titui o segundo elo do processo de formação.
Ou seja, representada da seguinte forma:

Meio vivencial
CEFFA Meio vivencial
2) Colocação
1) Plano de estudo
em comum

A Colocação em Comum valoriza os Planos de Estudo e demonstra sua


utilidade. Mas ela cria também a necessidade de aportes complementares
através do questionamento ou hipótese que faz nascer. Assim, ela introduz
as outras atividades da formação. A Colocação em Comum, olhada sob este
ângulo, aparece, no processo do estudo de um determinado tema, como
um tempo de problematização.

2.2. Uma função de ensino mútuo e de aprendizagens de conhecimento


Possibilitando a partilha dos ganhos adquiridos, das descobertas e das
interrogações no seio do grupo, toda Colocação em Comum torna cada al-
ternante “docente” em relação aos seus pares. Cada um oferece aos outros
matéria para aprender. Ela lhe confere um poder através dos saberes que
só ele possui. Cada um pode receber dos outros noções, reflexões de or-
dem tecnológica, profissional, humana... Suas aprendizagens também es-
tão sendo estimuladas pela confrontação das idéias e pela caminhada de
análise e de síntese que vai sendo operada. O valor pedagógico das expe-
riências partilhadas e confrontadas é bem mais forte que aquele das infor-
mações acumuladas nos livros ou dadas pelo monitor durante “aulas”.
É uma pedagogia da partilha e da cooperação que funciona na Colo-
cação em Comum, uma pedagogia da ação, da implicação e da respon-
sabilização.

45
2.3. Uma função de abertura e de junção
A Colocação em Comum ajuda cada um a situar e ultrapassar seu caso
particular, a não se limitar à experiência de sua família ou de seu empreen-
dimento. Ela propicia uma abertura para outros modos de agir, outras pro-
fissões, outras experiências, outras idéias e culturas. Ela permite assim, do
ponto de vista psicológico, situar-se melhor na sua especificidade e dife-
rença, e, do ponto de vista cultural, adquirir um conhecimento mais amplo
do seu meio, das profissões, dos problemas de todo tipo, da sociedade.

2.4. Uma função de desenvolvimento da expressão e das aprendizagens metodo-


lógicas
Toda Colocação em Comum representa, para o alternante, a transfor-
mação de um trabalho escrito em uma conversa com os outros membros do
grupo. Cada um se vê, desta maneira, confrontado com as dificuldades e exi-
gências da expressão oral: a relação com os outros, a elocução, a estrutura-
ção, a comunicação. As anotações, a redação de relatórios, levam à expressão
escrita e outros valores formadores. Mas a Colocação em Comum representa
uma aprendizagem da participação em debate, em trabalho de grupo, do
uso da palavra e da animação, na medida em que, ao longo do tempo, ela
está sendo cada vez mais assumida pelo próprio grupo. As Colocações em
Comum oferecem, desta maneira, suportes essenciais e progressivos para to-
das estas aprendizagens.

2.5. Uma função socioeducativa


A Colocação em Comum é essencialmente uma atividade de grupo,
com todos os jogos de relacionamento entre si e os outros que ela produz.
Ela é uma atividade psicossocial. Ela possibilita a confrontação necessária
entre si e os outros para “crescer”, posicionar-se, conquistar mais autono-
mia, construir sua identidade, percorrer a distância entre si e os outros. Ela
se torna uma atividade de socialização. Ela induz na dialética do “eu” e do
“nós”, da personalização e da socialização, sem a qual o desenvolvimento
pessoal fica parcial.
Mas é fonte, também, de aprendizagens relacionais e sociais em vista
do presente e do futuro. De fato, trocar, partilhar, confrontar, cooperar
exige de cada um de falar, de dizer, de afirmar, mas também de escutar, de
entender, de compreender, de relativizar. Em outras palavras, a relação
supõe atitudes de nuance, de tolerância, de respeito, de aceitação da dife-
rença. Trata-se, pelos outros e com eles, de uma contribuição com a forma-
ção global da pessoa, sua educação que pode ter incidências sobre o funcio-
namento do grupo e, principalmente, sobre os futuros comportamentos.

46
Para o monitor, a Colocação em Comum, é, fundamentalmente, uma ativi-
dade de animação pedagógica. A saber: propor dinâmicas, orientações de
trabalho, facilitar, dinamizar, regular as trocas, fazer com que os pontos
de vista sejam mais precisos, relativizados, contenham nuances, orientar um
processo intelectual... Sua competência como animador encontra aqui uma
oportunidade de se exercer e de se desenvolver. Ela exige disponibilidade
e capacidade em receber e compreender os aportes do meio (profissional,
cultural...) para exprimir nuances, retificar, provocar a reflexão. O conheci-
mento técnico, a mesma profissão ou a proximidade cultural pode, neste
sentido, representar fatores facilitadores. Esta competência exige do mo-
nitor, através de visitas e encontros, a apreensão periódica das situações de
vida dos alternantes, para uma melhor percepção de sua experiência.
Em conclusão, negligenciar ou passar por cima da Colocação em Co-
mum significa amputar o processo de formação alternada e tirar dos alter-
nantes uma atividade fundamentalmente educativa. A responsabilidade do
CEFFA está em jogo, como também a da equipe pedagógica.

A visita de estudo ou a intervenção: o encontro e a descoberta

As visitas de estudo, como atividades fora do CEFFA, e as intervenções


no próprio CEFFA propiciam aos jovens descobertas de realizações, de em-
preendimentos, de organismos, de serviços, de lugares... e oportunidades de
encontro com seus atores... Umas e outras podem prolongar diretamente a
Colocação em Comum para fornecer uma luz diferente sobre o tema trata-
do ou, então, situar-se após algumas “aulas” ou aportes teóricos para ilus-
trar ou concretizar.
A dimensão dos encontros humanos propiciados através destas ativida-
des é de primeira grandeza para os adolescentes, numa idade de constru-
ção da identidade.

1. Realizar uma boa visita de estudo e/ou intervenção


É, antes de tudo, sua pertinência que constitui um primeiro elemento de
êxito. Pertinência relativa ao tema tratado e ao conteúdo da semana, mas
também em relação à maturidade e às capacidades dos alternantes. O valor
de uma visita ou de uma intervenção consiste na descoberta que acontece,
nas diferenças que se acham, mas, também, na força do testemunho, nas ati-
tudes das pessoas que acolhem, falam e explicam.
Os três tempos (antes, durante e depois) da realização merecem atenção.
O antes se refere à preparação. Preparação com o “visitado” ou o “inter-
veniente” para situar o contexto e as circunstâncias da atividade: o objeti-

47
vo, o grupo, a formação, a duração... Preparação com os membros do gru-
po para, no mesmo tempo, despertar o interesse, avivar a curiosidade e
“municiar” para intervir, fazer perguntas, dar pontos de vista, mas também
anotar. Trata-se menos de procurar perguntas a fazer do que alongar-se
sobre o conteúdo, informando-se e discutindo, extraindo os problemas e as
questões que aparecem.
Durante a visita ou intervenção, prevalecem as atitudes: interesse, escu-
ta, atenção, respeito, mas também o questionamento e o levantamento das in-
formações essenciais que foram captadas.
Depois, significa a exploração da atividade, a fim de conservar algo sob a
forma de um documento, mas permitir, também, um amplo trabalho de
expressão nas suas diferentes áreas. As variedades das formas de aproveita-
mento são importantes para manter o interesse e, principalmente, permi-
tir aprendizagens metodológicas diversas:
• formas escritas através de relatos, relatórios, fichas técnicas, artigos
de jornal...
• formas orais através de exposições, debates...
• formas visuais através da realização de painéis e mesmo audiovisuais
sob a forma de reportagens.

2. Compreender as razões de ser das visitas de estudo e/ou intervenções


A Pedagogia da Alternância extrapola os quadros e os muros da “esco-
la” e de suas práticas habituais. Neste sentido, estas atividades justificam-se
plenamente. De fato, elas assumem uma diversidade de papéis:

2.1. Papéis específicos e complementares das outras atividades pedagógicas


para ilustrar, concretizar, fomentar encontros como descrito anteriormen-
te. Elas também contribuem, deste jeito, com o reforço do sentido do pro-
cesso de formação.
Ou seja, representado da maneira seguinte:

CEFFA
Meio vivencial Meio vivencial
3) Visitas-intervenções
1) Plano de estudo 2) Colocação
em comum

4) Aportes teóricos

48
Constituem elas mediações para o trabalho pedagógico, como tam-
bém para o diálogo no meio de vida com os pais ou com os mestres de es-
tágio. De fato, o adolescente, uma vez interessado, sente a necessidade de
dizer para o seu entorno o que descobriu, o que aprendeu, inclusive, nas
coisas de ordem prática. Ele quer exercer o poder que lhe conferem as
aquisições feitas fora dele. E, às vezes, transforma estas descobertas em
ações e experimentações.

2.2. Papéis relativos ao funcionamento do grupo


De um lado, elas dão um equilíbrio à vida de internato. Os alternantes,
de fato, não são alunos acostumados a ficarem sentados a semana inteira
nos bancos de uma escola. Por isto, a visita permite, através de uma saída,
um corte, uma diversão, um ar diferente. De outro lado, cada uma destas
atividades constitui, para o grupo, uma experiência comum, à qual cada um
pode referir-se para trocar idéias. A referência comum torna-se uma das con-
dições da comunicação no seio de um grupo, para que cada um não fique
bloqueado em sua experiência pessoal. Isto é particularmente sensível na
Pedagogia da Alternância porque cada um volta para o CEFFA com uma
experiência forte.

2.3. Papéis de descobertas e de encontros humanos, particularmente impor-


tantes para os adolescentes em busca de modelos de identificação para
construir-se. Mas também para a orientação, porque precisa encontrar-se
para orientar-se. Por estes motivos, convém uma prática na adolescência, uma
pedagogia do encontro.

2.4. Papéis de expressão e de aprendizagens metodológicas


É através de atividades reais, vivendo a situação, que se desenvolve a
expressão. Como para o Plano de Estudo ou a Colocação em Comum, a ex-
pressão está presente nestas diferentes áreas, mas a visita, bem como a in-
tervenção, coloca em jogo, particularmente, o aspecto oral. Elas represen-
tam, de fato, antes de tudo, atividades de relações sociais com todas as ati-
tudes e as aptidões que implicam para comunicar: vencer a angústia no to-
mar a palavra, o esforço de elocução, de estruturação, a escuta compreensi-
va... Mas também aprendizagens da tomada de anotações, para depois, no
final do relato, do relatório ou da síntese e outras expressões gráficas ou vi-
suais. A visita de estudo representa, com o Plano de Estudo, um extraordi-
nário suporte de expressão, nas suas diferentes dimensões: psicológicas,
culturais, estruturais, metodológicas e lingüísticas.

49
2.5. Meios para a formação geral
Enfim, por estas e outras razões, as visitas de estudo e as intervenções
são meios para a formação geral. As primeiras, particularmente, ensinam a
observar, a ver, a ler uma situação ou uma paisagem, a comparar, a anali-
sar, a apreciar, a avaliar, para, em seguida, talvez agir. A metodologia do
“ver – julgar – agir” toma aqui toda a sua dimensão. O raciocínio e o desen-
volvimento intelectual decorrem disto como também a aptidão para a for-
mação permanente.

Conclusão
Propor, num planejamento semanal, uma visita ou uma intervenção é
colocar à disposição dos alternantes situações e materiais para encontrar e
construir saber, por sua conta. É torná-los um pouco mais atores de sua for-
mação. Mas, além das aprendizagens cognitivas, prevalece a sua dimensão
educativa. A responsabilidade do CEFFA, através do Plano de Formação
que lhes garante um lugar, está engajada. Assim como a dos monitores, pelo
seu papel de animadores. Através destas atividades, através de uma pedago-
gia da ação, eles são, na verdade, ao mesmo tempo, guias, organizadores,
conselheiros, facilitadores, reguladores... educadores.

As aulas e os Cadernos Didáticos: a caminhada pelos saberes e


conhecimentos

No processo de formação alternada, passado o tempo do vivido e do


olhar sobre ele, como também do relatar e do questionamento, é chegado o
24
tempo das respostas, dos esclarecimentos e dos aprofundamentos . É a hora
das “aulas”, segundo a linguagem comum, isto é, o tempo dos “ensinamen-
tos”, do acesso aos conteúdos acadêmicos dos programas ou referenciais.

CEFFA
Meio Meio vivencial
vivencial Tempo do relatar, Tempo de respostas,
do questionamento dos esclarecimentos, Tempo do transmitir e do
Tempo da vivência (colocação em do “ensino”, dos aplicar
e do olhar sobre ela comum) saberes teóricos

24. Cf. TRANCHAND, B. Des activités et des outils pour vivre et faire vivre une al-
ternance intégrative. In: Les outils de l’alternance. Le Lien des Responsables, n. 149,
mai./1995. Paris: UNMFREO.

50
1. Conseguir e compreender o “ensino” na pedagogia da alternância
Pela palavra “aula” pode entender-se procedimentos muito diversos. A
saber: a aula coletiva do monitor, o trabalho individual ou em grupo a par-
tir de documentos, a exposição ou a conferência de um interveniente, o re-
curso às novas tecnologias da informação e da comunicação etc.
Para os alternantes, esta fase do trabalho pedagógico tem por objetivo de:
• agrupar e ordenar aquilo que já conhecem;
• descobrir noções novas, compreendê-las e assimilá-las, integrando-as
aos seus conhecimentos anteriores, ao que fazem e vivem e, conseqüen-
temente, aprendem;
• desenvolver o raciocínio, a reflexão e caminhar para mais abstração.
Mas ela se torna, essencialmente, um tempo de ação – pesquisa – formação,
isto é, de construção, de produção de saberes e não de consumo passivo de
informações.
Para os monitores-formadores, a “aula” representa um tempo de animação
durante o qual:
• ele propõe e organiza atividades;
• ele faz participar e expressar os conhecimentos existentes e as inter-
rogações;
• ele traz, explica e demonstra, quando necessário;
• ele guia na busca de informações ou conteúdos;
• ele ordena, sintetiza;
• ele orienta, regula, incentiva a caminhada, controla...
Seus papéis têm a ver, ao mesmo tempo, com a transmissão de noções,
de explicações, de conselhos metodológicos, de acompanhamento, de or-
ganização, de facilitação da expressão... isto é, de animação pedagógica.
Animar uma aula é permitir que todos e cada um do grupo aprendam.
Mas cada um tem o seu jeito de aprender e vários fatores intervêm aqui: a
motivação, a disponibilidade, as perturbações de ordem física, afetiva, re-
lacional, familiar..., a natureza das noções abordadas etc. Por isto, animar
uma aula exige estar presente para todos e para cada um. A atitude, a orga-
nização e as técnicas contribuem neste sentido.
Em regra geral, a animação de uma aula se realiza através de três tipos de
atividades:
• atividades ou tempos de participação dos membros do grupo: trocas e apor-
tes de fatos, observações, experiências, questionamento, trabalho com
documentos, exercícios...

51
• atividades ou tempos de intervenção do monitor: aportes, explicações, or-
denamentos, síntese...
• atividades ou tempos de trabalho dos alternantes: cópia das noções expli-
cadas, leitura de um texto impresso, numeração, títulos sublinhados,
destaque do essencial, idéias gerais, esquematização...
O desenrolar destes três tempos exige uma organização, porque os al-
ternantes, ainda mais porque são adolescentes, precisam de mudança, de
variedade nas suas atividades e de estrutura para construir. Além disto, sua
capacidade de concentração se encontra, muitas vezes, limitada, principal-
mente quando o conteúdo abordado é abstrato. Uma alternância equilibra-
da entre os diversos tempos cria as condições para um melhor êxito da aula.

2. A experiência singular dos cadernos didáticos


Nos primórdios das MFR, na França, constatou-se que as práticas do
ensino tradicional e a concepção dos manuais escolares estavam inadequa-
das para a Pedagogia da Alternância. Por ocasião de uma viagem de estudo
dos primeiros responsáveis das MFR na Suécia, descobriu-se, com um agri-
cultor, uma concepção de livros, verdadeiros instrumentos de trabalho pes-
soal para alunos que seguiam cursos por correspondência. Eles podiam con-
signar seus conhecimentos, anotar, sublinhar, colorir, destacar o essencial,
resumir, redigir perguntas... Este exemplo deu origem, após algumas ten-
tativas, às “Fichas Pedagógicas” ou “Cadernos Didáticos” que continuam,
25
até hoje e em grande quantidade, a serem elaborados .
Estes instrumentos pedagógicos, específicos da Pedagogia da Alternân-
cia dos CEFFAs, querem responder, para os alternantes, aos objetivos se-
guintes:
• Garantir a relação entre as noções teóricas e os saberes da experiência
ou realidades da vida.
• Favorecer a formação associada, incluindo, além dos conteúdos técni-
cos, conteúdos gerais (científicos, geográficos, históricos, econômicos...
segundo os temas de estudo).
• Ser um instrumento de trabalho para que os jovens sejam atores de sua
formação e “aprendam a aprender”. O acento está sendo colocado no
método e o Caderno Didático é concebido, em seguida, como um gran-
de exercício (anotar exemplos práticos, fatos, observações e perguntas,
sublinhar, numerar, extrair as idéias gerais, as definições, deduzir con-

25. Para obter informações mais amplas, recorrer à obra de Jacques Legroux: Les outils
pédagogiques de l’alternance. Paris: Mésonance/UNMFREO, 1979.

52
seqüências práticas...). É a ação e a aprendizagem do trabalho intelec-
tual que são prioritários.
Para os monitores, os Cadernos Didáticos são instrumentos concebidos
para permitir-lhes exercer sua função na Pedagogia da Alternância e seus papéis
de animação pedagógica mais do que de ensino disciplinar.
Se, nos primeiros tempos das MFR, os Cadernos Didáticos abrangiam,
essencialmente, áreas técnicas, progressivamente, foram implementadas
em todos os setores de conhecimento: científicos (biologia, física, química),
geográficos, históricos, econômicos, sociais, matemáticos, lingüísticos...
Mas, hoje, a grande diversidade de formações não permite cobrir todos os
programas.
Todavia, sua concepção é indicativa da pedagogia das “aulas” nos
CEFFAs. De fato, elas possuem uma mesma orientação e estrutura (com
adaptações próprias a cada disciplina). Seu procedimento pode se resumir
da seguinte maneira:
26
1) Base sobre o conhecido e o familiar dos alternantes através do levanta-
mento de seus conhecimentos (observações, fatos, exemplos vividos) e
suas perguntas. Para possibilitar isto, espaços em branco são previstos
para anotações.
2) Aportes de novas noções, explicações sob forma de texto impresso.
3) Resumo do essencial ou definição feita pelo estudante.
4) Exercícios de assimilação, de síntese, de relação entre a teoria e a prá-
tica...

Conclusão
A “aula” só constitui um dos tempos da formação alternada. Só é efici-
ente se for precedida por tempos e atividades que preparam os jovens a re-
cebê-la e se for seguida por outras que garantem-lhe a concretização ou a
assimilação: visitas, exercícios, transferências para a ação. As Fichas Peda-

26. Deve-se a este grande mestre da Educação nova na França, Roger Cousinet, uma sa-
lutar distinção entre o “concreto” e o “familiar”. Numa conferência, quando solicitado
a dar seu ponto de vista sobre “a pedagogia do concreto”, deu a seguinte declaração:
“Não falem de concreto, esta imbecilidade notória e incurável nos docentes, mas falem
de familiar”. O familiar é aquilo que a criança vive intimamente, aquilo que sabe, que
conhece pela sua experiência, ao mesmo tempo, pelo seu intelecto, sua afetividade,
suas atividades manuais. A experiência de laboratório é concreta, mas não tem nada de
familiar. A seguir, uma expressão veio a ser utilizada nas MFR (CFR): “o apelo ao fami-
liar”, para designar o convite a expressar os fatos e conhecimentos da vida.

53
gógicas ou Cadernos Didáticos, bem como o Caderno da Realidade e a Co-
locação em Comum, constituem um dos traços da identidade dos CEFFAs.

Os exercícios: a assimilação e a construção dos saberes

Os exercícios são as seqüências normais e impostas de qualquer aula


para permitir a aprendizagem das noções abordadas. Estas precisam ser
retomadas, trabalhadas, esmiuçadas, conectadas com conhecimentos exis-
tentes e com outros saberes para integrar-se à pessoa, para serem compre-
endidas e aprendidas.
Ou seja, representado da maneira seguinte:

CEFFA
Colocação Aulas Exercícios
Meio vivencial em comum Meio vivencial
Plano de estudo

Visita de estudo

1. Exercícios bem-sucedidos
As propostas de exercícios podem ser as mais diversas, levando em
conta:
• as áreas de “saberes” visadas: saber-conhecimento, saber-fazer ou sa-
ber-ser;
• os modos de expressão solicitados: escrito, oral, manual...
• as funções ou operações intelectuais privilegiadas: memória, re-
flexão, raciocínio, organização, classificação, análise, síntese, relação,
transferência...

Por isto, os exercícios são de naturezas muito variadas:


• exercícios de memória, com interesse limitado, a não ser para os moni-
tores que podem controlar se o seu ensino tem alguma eficiência;
• exercícios de classificação ou ordenação para buscar e/ou estabelecer
um plano, extrair as idéias essenciais;
• exercícios de comparação para estabelecer as relações, as semelhan-
ças, as diferenças entre duas entidades, duas técnicas, vários projetos...
• exercícios de recapitulação para resumir, destacar as idéias gerais,
dar uma definição;

54
• exercícios de relações e de síntese entre duas áreas de saber diferentes,
entre disciplinas, saberes, da prática e da teoria, entre os fatos, as técni-
cas e as leis (processo indutivo) ou o inverso (processo dedutivo). Este
tipo de exercício favorece a abordagem interdisciplinar;
• exercícios de aprofundamento pelo trabalho de pesquisa documental;
• exercícios de transferência dos conhecimentos para aplicar um pro-
cesso de estudo numa outra situação ou no campo da ação prática.
O exercício representa, necessariamente, uma fase de aprendizagem, um
tempo de trabalho formativo. Para fazer isto, o êxito é a condição básica em
toda proposta de exercício. Um conjunto de condições concorre para o êxito:
• antes de tudo, não confundir o exercício com a avaliação-controle,
que não é da mesma natureza (ver adiante “As avaliações”);
• a adaptação dos exercícios às capacidades dos alternantes tanto no
conteúdo quanto na forma do enunciado;
• uma duração limitada porque esta atividade requer um forte investi-
mento;
• a proposta de uma série de cinco ou seis exercícios de naturezas dife-
rentes e com dificuldades crescentes, de maneira a permitir uns e ou-
tros de conseguir e ir seguindo o seu próprio ritmo;
• a qualidade dos enunciados em relação à sua clareza e compreensão;
• o recurso aos documentos para realizar os exercícios;
• procedimentos variados de trabalho pessoal, em dupla ou em peque-
nos grupos em função dos momentos e dos tipos de exercícios;
• a ajuda mútua, a cooperação entre os membros do grupo;
• a ajuda permanente do monitor para evitar os bloqueios, para acom-
panhar, guiar, orientar...
• a Colocação em Comum, apreciação e correção coletiva dos resultados.

A questão da correção
Qualquer exercício pede uma correção, isto é, um ajuste, uma apreciação,
às vezes uma pontuação, para que cada alternante possa situar o seu trabalho
e que o monitor se dê conta das aquisições e das lacunas de cada membro do
grupo e do seu trabalho pedagógico. Trata-se aí de um momento importante
de qualquer processo de formação, que, todavia, só apresenta interesse na
medida em que leva a uma tomada de consciência e constitui um ponto de
partida para melhorar, e não a uma conclusão.

55
A correção mais pertinente acontece durante o exercício para ajudar, ori-
entar, sugerir. Ao final de um exercício, ela pode revestir-se de várias formas,
segundo os objetivos almejados e as dinâmicas utilizadas.
Mas os exercícios não podem representar, para o monitor, um inves-
timento em tempo demasiado, até mesmo cansativo, para ler e corrigir
provas. As seguintes condições permitem uma correção eficaz num tem-
po limitado:
• Praticar métodos variados e progressivos que impliquem os alternantes:
correção coletiva, por pequenos grupos, por dupla ou sozinhos, com
uma ficha de apreciação, ou, a partir de um exemplo de resposta possí-
vel, pelo monitor...
• Não corrigir tudo de uma vez, mas adaptar a correção à natureza do
exercício: o nível e a precisão dos conhecimentos numa avaliação – con-
trole, a qualidade da síntese e a concisão para um exercício de resumo,
a natureza e o valor das relações para um exercício de síntese, a quali-
dade do raciocínio ou da demonstração em outra parte... O mesmo
vale para a forma de expressão: a apresentação de conjunto em deter-
minado momento, a estrutura do desenvolvimento num outro momen-
to ou, ainda, a gramática, o vocabulário, a pontuação etc. Importa espe-
cificar os critérios de correção em cada momento. Devem ser claros e pre-
cisos para o monitor e do conhecimento dos alternantes. Não leva a
nada tratar de tudo ao mesmo tempo. Os progressos, para qualquer
um, só podem ser progressivos.
• Dar um toque positivo e dinâmico às apreciações: os pontos positivos, os
progressos alcançados, o que fica para ser melhorado e os meios neces-
sários para isto. Importa, neste caso, de ajudar, de favorecer o êxito e não
de desanimar.
A pontuação nunca é conveniente quando se trata de trabalho formati-
vo, porque, diga-se mais uma vez, o exercício não deve ser confundido com
o controle. (A questão da pontuação será abordada mais adiante, no ponto
que trata das avaliações.)

2. Compreender as funções e os valores dos exercícios


Uma aprendizagem não consiste em armazenar passivamente noções,
informações, partes de um programa. A aprendizagem é um processo que
envolve a pessoa e supõe, naturalmente, a sua atuação. Mas esta só se torna
possível se determinados procedimentos pedagógicos a permitem, se a
“aula” apresenta interesse. Este último está sendo reforçado quando o con-
teúdo for acessível, contenha sentido para o alternante, que ele compreen-

56
da e quando tenha o sentimento de êxito, de progresso, de valorização. Em
nenhum caso, portanto, o exercício deve se tornar uma armadilha.
Os exercícios, durante ou depois da aula, constituem, essencialmente,
estes momentos de ação necessária ao processo de aprendizagem. Suas
funções são, de fato, múltiplas.

2.1. Ajudar na construção do saber


27
O saber e, mais ainda, o conhecimento , resultam de uma experiên-
cia pessoal que permite apropriar-se, fazer suas as noções ou informações
apreendidas, de assimilá-las, de integrá-las. Para isto, os exercícios são meios
privilegiados. Eles permitem estabelecer um contato mais profundo e pes-
soal com as noções abordadas, tomando o tempo de ligar, de associar com
aquilo que já foi adquirido. O exercício incita a retomar as noções da aula e
a recompor um texto a partir da questão colocada e leva, de fato, a “refazer
sua própria aula”. Constitui, deste jeito, um trabalho de personalização. Por
isto, uma aula sem exercício corre risco de ser uma simples transmissão de
28
informações, que se apagam, em grande parte , ou das quais só subsistem
impressões muitas vezes ligadas à personalidade do docente.

2.2. Permitir a aprendizagem de um método de trabalho intelectual


“Todo saber é um gênero perecível”, dizia um autor, e o fica cada vez
mais. Por isto, aprender a aprender torna-se essencial no momento presente
de qualquer formação, mas, principalmente, para o futuro de cada alternan-
te. Exercer-se é aprender a manejar ferramentas de informação: buscar, se-
lecionar, escolher, ler, analisar, compreender, classificar, religar, sintetizar,
organizar-se... Outro trabalho de personalização.

2.3. Contribuir com o desenvolvimento da expressão pessoal


O que foi dito anteriormente já o vem demonstrando, mas, além disto,
qualquer exercício exige a prática da oralidade e/ou da escrita, do gráfico,
até mesmo das capacidades manuais e corporais: escolher e desenvolver
um conteúdo, compor e estruturar um texto ou um discurso, dar-lhe for-
ma, apresentá-lo...

27. Recorrer ao cap. 7 para a diferenciação entre “Informação, saber, conhecimento”.


28. Cf. a diferenciação feita por C. Rogers entre ensinar e aprender em Liberté pour ap-
prendre. Paris: Dunod, 1972.

57
2.4. Desenvolver a aptidão para a transferência, ou seja, utilizar saberes ad-
quiridos em diversas situações, resolver um problema sem ter estudado di-
retamente seus dados e adaptando o que foi aprendido em outras circuns-
tâncias. Aprender a mobilizar os conhecimentos para utilizá-los em diver-
sas circunstâncias é uma meta essencial de qualquer formação, mas tam-
bém a melhor preparação para as avaliações e as provas.

Conclusão
O sentido de uma pedagogia ativa, de uma pedagogia da experiência,
existe quando o tempo do ensino se reduz ao mínimo em proveito do tem-
po do trabalho pessoal ou cooperativo dos alternantes. A aula, de fato,
deve apontar para um exercício permanente. Com certeza, é este o sentido
das Fichas Pedagógicas ou Cadernos Didáticos.

NOTAS COMPLEMENTARES
Palavras de autores

29
Célestin Freinet
Vocês pensam que suas aulas são indispensáveis. Elas lhe dão
majestade. Só a observação e a experiência são formadoras. O
resto todo é só ilusão.
O inimigo número um da regeneração da nossa escola é a sali-
va, ou seja, a explicação sem limite, a aula permanente na qual
a voz do mestre é a ferramenta maior da vida docente.
A explicação logo se torna palavrear, superando na sala o racio-
cínio e a ação... Segundo esta prática, não será a expressão que
prevalecerá em francês, mas a explicação, as aulas de gramá-
tica e de vocabulário, como se impusesse à criança que dá os
primeiros passos toda uma série de regras e proibições ante-
riores... Vou explicar primeiro como se fala ou como se anda...
Só depois você fará suas primeiras tentativas... é preciso co-
nhecer antes de tentar andar!...

30
Alain
De uma aula magistral não fica quase nada após oito dias, e,
após quinze, não fica nada mesmo. É recitando, lendo e copi-
ando que a criança memoriza enfim alguma coisa.

29. As técnicas Freinet da escola moderna. Paris: A. Colin, 1968.


30. Propósitos sobre a Educação. Paris: PUF, 1961.

58
Não se aprende a desenhar olhando um professor que dese-
nha muito bem. Não se aprende piano escutando um virtuose.
Do mesmo modo, pensei muitas vezes, não se aprende a escre-
ver e a pensar escutando um homem que fala e pensa muito
bem. Precisa tentar, fazer, refazer até que a arte entre, como
se diz.
Ordinariamente, considero a classe primária como um lugar
onde o professor não trabalha muito e onde a criança trabalha
muito. Não com estas aulas que caem como chuva e que a cri-
ança escuta, os braços cruzados. Mas, as crianças lendo, escre-
vendo, calculando, desenhando, recitando, copiando e reco-
piando. O velho sistema dos monitores restaurado.
E, enfim, não há progresso para nenhum escolando no mun-
do, nem no escutar, nem no olhar, mas, somente, no que faz.

31
Roger Cousinet
Uma noção só tem valor e só vale a pena assimilá-la se pode
ser utilizada... Saber algo não significa possuir, mas utilizar.
Saber as quatro regras é bom para poder efetuar as operações
que necessita um problema novo. Não é pela recitação que o
saber está sendo mais controlado, mas pela ação, pela manei-
ra através da qual antigos ganhos adquiridos se integram num
trabalho novo e firmam.

32
John Dewey
Se a educação quiser atingir suas finalidades, de um lado em
relação à criança, de outro lado em relação à sociedade, deve
ser baseada sobre a experiência atual e vital de alguém.

As avaliações: a medição dos avanços

A avaliação, no sentido da apreciação, da correção e da melhoria re-


presenta um componente de qualquer atividade de formação, seja de um
Plano de Estudo, de um relatório de estágio, de um relato de visita, de um
exercício, de uma exposição...

31. Um método de trabalho livre em grupo. Paris: Du Cerf, 1949.


32. Experiência e Educação. Paris: Bourrelier, 1947.

59
Ou seja, segundo a representação abaixo:

Colocação Aulas Exercício


em comum

Caderno da Realidade
Visita de estudos
Plano de estudo
Ações
Relatório de estágio

AVALIAÇÕES

A avaliação faz parte de qualquer processo de aprendizagem. Deste


modo, ela é um componente de qualquer Plano de Formação. Ela é uma ati-
vidade pedagógica de grande importância para o alternante e para o moni-
tor. Para este último, ela representa uma atividade delicada pelos efeitos que
pode produzir: dinamizar e propulsar ou aniquilar e expulsar. Por isto, de-
senvolver com sucesso e compreender as avaliações, tanto do ponto de vista
do alternante quanto do monitor, supõe perceber-lhe o sentido e os objeti-
vos e adotar as atitudes apropriadas para que se tornem pedagógicas e educativas.

1. A avaliação e o controle
A noção de avaliação pode levar à confusão, porque, segundo os objeti-
vos que lhe são atribuídos, seu sentido e sua prática divergem.
A avaliação formativa é aquela que acompanha uma atividade de forma-
ção. Ela ocorre durante o desenrolar da atividade ou imediatamente depois,
através do olhar dado por um terceiro: os pais, o mestre de estágio ou um tu-
tor, o monitor. Ela tem por objetivo perceber os aspectos positivos e os limi-
tes de um trabalho, proceder às retificações e melhorias, destacar pistas pa-
ra a progressão. Ela é, deste jeito, uma atividade essencialmente formativa
para a qual uma pontuação não tem interesse.
33
A avaliação-controle é aquela que almeja, no final de uma seqüência de
aprendizagem ou de uma parte do programa, verificar o nível dos conheci-

33. Também chamada de “avaliação somativa”.

60
mentos adquiridos (de saberes-conhecimentos, de capacidades de raciocí-
nio ou de expressão, de métodos de trabalho intelectual ou do saber-fazer
prático, de aptidões relacionais etc.). Estas avaliações-controle traduzem-
se através de uma pontuação acompanhada de apreciações que, para cada
um, representam uma medida, uma referência em relação a uma norma de
aquisições acadêmicas ou de prova, mas também em relação aos membros
do grupo. Ela é válida para cada alternante, mas também para o monitor
responsável pela atividade formativa avaliada. O controle é exercido para
um e para outro, porque o nível geral das aprendizagens dá conta de uma
eficiência pedagógica.
Quando os procedimentos de formação e de qualificação implicam
um controle contínuo, avaliações-controles por área de formação ou por
disciplina vêm impondo-se no curso da formação, com o risco de uma infla-
ção dos controles certificadores, que desviam o sentido da formação e levam a
atitudes escolares.
Em formação alternada, as avaliações não deveriam limitar-se às matérias
acadêmicas. Não é tão-somente através delas que se opera a formação, no
quadro dos CEFFAs. Por isto, as avaliações devem ser colocadas nos espaços
da prática profissional, para medir, junto aos mestres de estágio ou os tuto-
res, o ganho adquirido no campo do saber-fazer e das competências. Em se-
guida, um plano de avaliação é necessário para qualquer ciclo formativo.

2. A avaliação, um exercício e uma medida


Para o estudante, realizar uma avaliação significa tanto exercer-se do
que medir-se.
A avaliação é um exercício. Neste sentido, ela desempenha as funções
apresentadas anteriormente no que diz respeito aos exercícios.
Como qualquer exercício, uma avaliação permite construir e fortificar
os saberes. Ela obriga a trabalhar por sua conta para responder uma per-
gunta ou solucionar um problema. Para isto, o “sujeito em avaliação” mo-
biliza e enuncia as informações apropriadas, junta-as com outras, as articu-
la, as sintetiza, as organiza, as estrutura e as desenvolve por escrito ou oral-
mente. Por estas operações estrutura seu pensamento, expressa-se, assimi-
la, integra, aprende.
A avaliação é uma medida. Ela possibilita detectar os conhecimentos ad-
quiridos e progressos, como também falhas e necessidades manifestadas
pela pontuação (ou outra cotação) e apreciações que constituem referên-
cias. Mas a avaliação só apresenta interesse na medida em que leva a uma
tomada de consciência pessoal, ou seja, a uma auto-avaliação. É com esta

61
condição que desencadeia uma ação para progredir. Se não, ela permane-
ce na altura de um julgamento positivo ou negativo, até mesmo de uma
sanção dada por um terceiro.

3. A delicada questão da pontuação


A pontuação é o índice pelo qual se mede e classifica-se um trabalho
em relação a uma norma. Mas seus efeitos formativos só existem se ela for
acompanhada de anotações que garantam sua compreensão, fazendo apa-
recer o que é positivo, os progressos realizados e o que resta a ser melhora-
do, numa perspectiva positiva e dinâmica.
Se a nota tem utilidade, tanto para o estudante quanto para o formador,
como referência, e para os pais, como meio de informação, ela deve, todavia,
ser utilizada com moderação e conveniência. O eventual excesso leva a com-
portamentos escolares contrários ao objetivo de responsabilização e implica-
ção do aprendiz. Além disto, toda nota é ambígua se os critérios adotados
não forem claros e firmes. De fato, o que a nota em si encobre e o que signifi-
ca: a medida dos conhecimentos adquiridos, a tomada em consideração dos
progressos, a qualidade de apresentação da cópia...? Por isto é importante
explicitar e divulgar os critérios de pontuação a cada instante.
Qualquer pontuação torna-se também muito subjetiva e comenta-se
que “a parte de quem dá a nota é tão importante quanto a do trabalho ava-
liado” porque intervêm aqui a representação que ele se faz do avaliado
(pontuado), seu nível de exigências, o quadro de referência, tais como o ní-
vel geral do grupo, o ambiente da classe...
Grades baseadas em critérios permitem atenuar um pouco estes incon-
venientes, mas só em parte, porque a pessoa do avaliador e sua subjetivida-
de são sempre presentes. Por isto, consciente da grande relatividade de
todo sistema de pontuação, é conveniente utilizá-lo com moderação e não
recorrer a ele de maneira sistemática.

4. A atitude do monitor
Toda avaliação constitui um ato pedagógico carregado de sentido. Ela apare-
ce, de fato, como um julgamento proferido por um “formador”. Neste ato
de formação existem todos os ingredientes da relação pedagógica e educa-
tiva. Acompanha, ajuda, projeta e dinamiza, ou então sanciona, conclui e
aniquila os esforços. A atitude manifestada, as apreciações dadas, as pala-
vras utilizadas ressoam naquele que as recebe. Através da avaliação, os pro-
tagonistas se encontram com o jogo do poder e da autoridade. O monitor

62
34
detém o poder que lhe é conferido pelo seu estatuto e uma autoridade liga-
da à sua pessoa e à sua competência. Na avaliação, é devidamente, para o
monitor, de autoridade pedagógica de que se trata, a fim de tornar a “pes-
soa se avaliando” autor de si mesmo.

34. Convém considerar a palavra “autoridade” no seu sentido etimológico, isto é, “au-
tor”, o que significa que “ter autoridade é ser autor de si” e “fazer prova de autoridade
pedagógica é tornar o outro autor de si-próprio”. Logo, é conveniente não confundir a
autoridade com o autoritarismo, que é uma manifestação pervertida da autoridade.

63
3
A ORGANIZAÇÃO E A GESTÃO DA FORMAÇÃO

Ordem, desordem, programa e estratégia.


A noção de programa se opõe àquela de estratégia.
O programa é uma seqüência de ações predeterminadas. A
estratégia permite, a partir de uma decisão inicial,
vislumbrar um certo número de cenários para a ação e que
poderão modificar-se em função dos acasos ou das
informações novas.
A ordem, é tudo que é repetição, invariância, e
enquadrado na dependência de uma lei.
A desordem, é tudo que é irregularidade, deviações em
relação a uma dada estrutura, acaso, imprevisibilidade.
Num universo de ordem pura, não teria nenhuma
inovação, criação, evolução. Do mesmo modo, na pura
desordem porque não teria nenhum elemento de
estabilidade para fundar aí uma organização.
A ordem e a desordem se acrescem uma à outra no seio de
uma organização que se complexifica.
Edgar Morin

As atividades e os instrumentos da alternância são diversos, como o ca-


pítulo anterior demonstrou. Cada um, obedecendo a especificidade de
suas funções, deve inserir-se num processo pedagógico para, de um lado,
articular os dois espaços-tempo da alternância e, de outro lado, permitir
uma progressão nas aprendizagens. Por isto, impõe-se uma organização e
uma gestão consciente de todos estes instrumentos para que a alternância
na formação possa ganhar em eficiência. A ordem utilizada para apresen-
tar, anteriormente, as atividades e os instrumentos já traduz a sua organi-
zação e sua gestão pedagógica. Mas torna-se necessário clareá-las, tanto no
que diz respeito às seqüências de alternância quanto ao conjunto do per-
curso de formação e os planejamentos das sessões escolares.

64
A organização e a gestão das seqüências de alternância pelo “trabalho
temático”

Ela tem por objetivo criar uma unidade de formação para articular, dar
coerência, tanto quanto for possível, embora sempre de maneira parcial,
ao conjunto dos “materiais” formativos e educativos. O tema de estudo repre-
senta nisto tudo o elemento congregador. Dele decorrem as atividades e os
conteúdos que permitem aprofundá-lo, de tratá-lo sob ângulos diferentes:
técnicos e/ou tecnológicos, científicos e matemáticos, históricos e geográfi-
cos, econômicos e socioculturais, sem esquecer as dimensões da expressão
e da comunicação presentes em todas as atividades, mas abordadas, tam-
bém, de maneira específica.
Ou seja, representado da seguinte maneira:

Estadia do meio
Estadia no CEFFAs

Aprofundamentos técnicos e/ou


Atividades – Experiências tecnológicos
familiares, profissionais, Colocação em
sociais comum

Visita de estudo

Confrontos Esclarecimentos científicos


(ciências biológicas e físicas)
Plano de estudo
Tratamentos matemáticos
Questionamentos
Aportes geográficos e históricos
Relatório de estágio
Abordagens econômicas e socioculturais

Expressão e comunicação

O Plano de Estudo é a atividade de base para desencadear o processo for-


mativo na experiência e coleta de dados do terreno. A Colocação em Comum
representa a atividade de junção entre os dois espaços-tempos do processo
de formação. Dela emerge um questionamento que constitui o ponto de par-
tida para pesquisas e aprofundamentos. A visita de estudo e/ou a intervenção ex-
terna de um prático trazem um outro exemplo de prática profissional, de or-
ganização ou de outro aspecto. Elas constituem, sobretudo, para o grupo,
uma referência comum sobre o qual os aportes teóricos podem se basear.

65
Todo este conjunto forma o fundamento para aportes e aprofundamentos teóri-
cos de naturezas diversas e variadas segundo os temas tratados com um conteú-
do técnico ou tecnológico e outro mais geral (mais científicos para uns, mais
econômicos ou culturais para outros...). Deste jeito, os conteúdos do progra-
ma encontram-se abordados e associados, de maneira cruzada e interdisci-
plinar. E as possibilidades de construção de sentido pelo alternante, de rela-
ção e articulação entre os saberes e as aprendizagens, se vêem otimizadas.
Ou seja, esta outra representação gráfica:

Tema

8 9 10
7 Economia História Expressão
5 6 Matemática Geografia Comunicação
4
3 Biologia Química
1 2 Tecnol.
Visita
P.E. C.C. Agronomia
interv.

N.B.: Este exemplo de organização temática pode relacionar-se com


um tema de produção agrícola, o que justifica os conteúdos técnicos, agro-
nômicos, de ciências biológicas e químicas. A expressão e a comunicação
percorrem todas as atividades de formação. Cada uma delas representa
um suporte para sua implementação e seu desenvolvimento. Todavia, im-
põe-se um tempo específico para estruturar, organizar, adquirir noções e
instrumentos metodológicos, lingüísticos, culturais...
Colocado desta maneira, o processo de aprendizagem inscreve-se na
35
lógica piagetiana do “experimentar e compreender” . Na medida do pos-
sível, cada atividade ou disciplina (matéria) puxa outra para que os conhe-
36
cimentos se esclareçam e se ultrapassem progressivamente .

35. Cf. anteriormente na “Introdução” e no cap. 7 “Aprender na formação em alter-


nância”.
36. O pedagogo R. Cousinet tinha escrito, neste sentido, que “o ensino não tem por ob-
jetivo trazer para um aluno conhecimentos que não tem, mas de aclarar, cada vez mais,
os conhecimentos que já tem”.

66
Uma organização pedagógica deste tipo desenvolve os conteúdos se-
gundo uma lógica horizontal, enquanto o ensino disciplinar justaposto se
desenvolve segundo uma lógica vertical.
Lógica disciplinar do ensino tradicional / Lógica temática da Pedagogia da Alternância

Lógica disciplinar do ensino tradicional

Lógica temática
da Pedagogia da Alternância

Cada tema encontra sua origem numa “situação de vida” dos alternan-
tes, ou seja, uma atividade, uma organização, um projeto... de ordem pro-
fissional, familial, sociocultural, pessoal. Sua programação pertence ao
Plano de Formação.

NOTAS COMPLEMENTARES
A alternância ou a pedagogia das orlas
Quem andou de manhã cedo ou bem de tardinha num dia de chuva ou
de sol forte na orla de um bosque terá ressentido a singularidade da situação
entre planície e bosque e, talvez, terá vivido e experimentado alguma ex-
periência ou emoção mais forte.
Gosto de andar na orla dos bosques, nesta “borda” de liberdade... lá
onde o melhor se colhe e sem nada perturbar, como o disse tão bem Philip-
pe Delerm. De fato, tudo se encontra na orla de um bosque porque a paisa-
gem se abre e parece respirar. Ela é um espaço a atravessar e conquistar, a
luz a receber. Toda orla, também chamada de borda, berma, limite, é uma
cerca viva, uma zona rica em variedades e um espaço habitado. E uma vida
intensa existe aí. Ela é uma fronteira e, como tal, um lugar de passagem en-
tre duas entidades. É este “entre-dois”, esta interface onde se jogam e inte-
ragem lógicas opostas. É um lugar de paradoxos que atestam da complexi-
dade, a qual demonstra riqueza. A fauna gosta deste “entre-dois” e seus
opostos: o espaço aberto e o fechado, o exterior e o interior, o descoberto e
o camuflado, a insegurança e a proteção, a luz e a sombra, o calor e o fres-
cor, a comida e a morada...

67
Toda orla é lugar de ruptura, das relações e das complexidades: com-
plexidade nos agenciamentos da natureza, complexidade na implementa-
ção dos nossos sentidos, complexidade na gestão das nossas emoções. Nes-
sa dialética dos campos e dos bosques, do fora e do dentro, do aberto e do
fechado, do aqui e do acolá, se degustam os opostos e os contrários e traba-
lham, complementarmente, nossos sentidos, nosso intelecto, nosso afetivo,
o relacional e o irracional. Na orla se estabelece uma relação com uma ou
outra entidade: atração, recusa ou preferência para uma ou outra ou acei-
tação indiferente de seus contrários, bem-estar ou medo, integração har-
moniosa do conjunto ou desequilíbrio... como acontece em outras orlas.
Porque, como diz Edgar Morin, “toda fronteira é lugar da dissociação e da
articulação... o filtro que, ao mesmo tempo, rejeita e deixa passar, aquilo
através do que são estabelecidas as correntes osmóticas e o que impede a
homogeneização”.
Mas toda orla é instável e frágil. A planície pelo agricultor e o bosque
pela sua espontaneidade lutam sem fim para recuperá-la em seu proveito.
Enfrentamento permanente na gestão da complexidade e dos paradoxos
que traz. Eterno “combate nas fronteiras...”, segundo G. Pineau.
Toda alternância reside naquilo que coloca o alternante em jogos de com-
plexidade, de passagens, de rupturas e de relações. Ele encontra e vive en-
tidades diferentes, cada uma com suas especificidades, seus saberes, seu sa-
ber-fazer e saber-ser, sua linguagem, sua cultura, seus atores, seus jogos de
influência nos quais o “eu”, numa dialética de personalização e socialização
deve situar-se, construir-se e crescer. É necessário que ele assuma as passa-
gens de um lugar, de uma entidade à outra, cada uma com suas sombras e
claridades, seu irracional e seu racional, sua espontaneidade e sua organi-
zação, sua ordem e sua desordem, seus conhecimentos informais, suas in-
formações e seus saberes formais. É preciso que ele abandone cada entida-
de por um tempo, sem, portanto, esquecê-la, para envolver-se na outra.
Precisa ele viver em permanência este paradoxo de rupturas e de rela-
ções que, sem dúvida, é fator de desenvolvimento desta atitude essencial
para o seu futuro: a adaptabilidade. É necessário que ele passe de um co-
nhecimento ao outro: da familiar e empírica da vida à acadêmica e teórica
da escola. Ele precisa garantir uma ruptura na ordem dos conhecimentos,
o que o filósofo Gaston Bachelard chamou de “ruptura epistemológica”
necessária para toda aprendizagem nova.
A pedagogia, neste caso, torna-se preponderante para facilitar as passa-
gens, ajudar cada entidade a viver numa perspectiva formativa e educativa.
Já faz bastante tempo que as MFR implementaram, neste sentido, esta pe-
dagogia das orlas.

68
Antes, pela elaboração de um dispositivo pedagógico com quatro objetivos:
• articular os tempos e os espaços da formação;
• associar a formação profissional e a formação geral;
• associar os pais e mestres de estágio ao processo de formação;
• acompanhar cada alternante nas suas aprendizagens e caminhadas.

Um conjunto de atividades e de instrumentos colabora nisto:


• o Plano de Estudo – instrumento-chefe da pedagogia dos CEFFAs –
como meio de exploração, de expressão e de formalização dos compo-
nentes de uma das entidades de formação;
• a Colocação em Comum como atividade de junção, orla das duas entida-
des formadoras;
• a Visita de Estudo como abertura para outras entidades e orlas;
• as Fichas Pedagógicas ou Cadernos Didáticos como acompanhamento
da passagem de um campo de conhecimento para outro, como instru-
mento de gestão das orlas cognitivas.

Enfim, a organização pedagógica contribui nisto, através do:


• trabalho temático que garante a gestão das passagens entre as ativida-
des e as matérias para ir das mais familiares e significativas às mais lon-
gínquas e abstratas, para romper com a divisão disciplinar e, assim,
contribuir para a construção do sentido e dos saberes;
• Plano de Formação que constitui a orquestração de conjunto da obra
formadora para gerir as múltiplas orlas, rupturas e relações no tempo
e no espaço nos quais se encontra o alternante, no coração da comple-
xidade da alternância.
Mas todo este dispositivo só tem sentido se for animado por um espírito,
uma atitude que se preocupa com o acompanhamento das passagens e das
orlas, facilitando-as. Esta é a função do monitor. Ele se torna um passador de or-
las, um passador de fronteiras. Os obstáculos são muitos, os caminhos de cumes
perigosos e o alternante pode perder o caminho e se perder. A aventura –
porque qualquer formação só vale pela aventura a ser vivida – para ser positiva
necessita guias, acompanhadores, balizadores, passadores. O estatuto e os
papéis do monitor entram em cena neste momento. São bastante diferentes
do docente acadêmico e colocam, para seu exercício, algumas condições e
exigências da ordem do perfil, da profissão e da formação para esta, de na-
tureza inicial e contínua.

69
Se tiver interesse pela Pedagogia da Alternância ou se atue nesta cor-
rente pedagógica, enfrente uma caminhada, de manhãzinha, na orla de
um bosque, bem à vontade, aguçando bem os sentidos e sem pensar na Pe-
dagogia da Alternância. Isto só virá depois...

A organização e a gestão do percurso educativo pelo “plano de


formação”

O Plano de Formação representa a orquestração do conjunto dos compo-


nentes do dispositivo pedagógico. Ele garante a implementação organizada da
alternância. Agencia e estrutura o percurso formativo. Ele lhe confere um
eixo diretor, uma coluna vertebral, uma progressão, uma coerência. Torna
o visível inteligível para todos os parceiros, ou seja, a equipe, os jovens, as
famílias, os mestres de estágio.
Ele integra, dá coerência às finalidades do projeto educativo, enuncia
os objetivos e as etapas, articula os tempos, as atividades e os conteúdos do
campo socioprofissional com aqueles do programa. Em outros termos, pode-
se defini-lo como “o plano de vôo” do percurso formativo e educativo.
A formação alternada supõe “dois programas” de formação: o da vida
e o da escola. O primeiro oferece conteúdos informais e experienciais, e o
segundo conteúdos formais e acadêmicos. Cada um desses “programas”
possui sua própria lógica. O Plano de Formação tem como objetivo reunir,
numa terceira lógica, as duas lógicas complementares, mas, muitas vezes,
contraditórias, que são a da vida e a dos programas escolares.
Por isto, o programa acadêmico e o Plano de Formação não são da
mesma natureza. O segundo supera amplamente o programa como orga-
nização dos constituintes, dos ingredientes múltiplos, diversos, multifor-
mes da formação (finalidades, objetivos, conteúdos, métodos, instrumen-
tos, espaços, tempos, atores, avaliações...).
O Plano de Formação integra o programa. Mas a diferença entre si não é
sempre nítida na prática. De onde o quadro seguinte, para especificá-los,
comparativamente, a partir das seguintes questões: Quem? O quê? Por quê?
Para quem?

70
1. Programa e Plano de Formação
Programa Plano de Formação
Quem os • Especialistas, técnicos, docentes, • Essencialmente uma equipe
define? agentes de serviços pedagógica num dado
administrativos... estabelecimento, para oferecer
• Em função de esquemas uma dada formação:
diretores nacionais. - com a colaboração dos pais,
• Para o conjunto dos mestres de estágio, profissionais;
estabelecimentos do sistema - levando em conta o ambiente
educativo nacional. socioeconômico imediato e os
• Estabelecidos para vários anos. projetos de cada um dos alunos.
O quê? • Um conjunto de noções: • Plano de ação reunindo, para
O que conteúdos, saberes... um dado grupo de formação, em
contém? - apresentado sob a forma de vista de finalidades e metas:
disciplinas justapostas; - os temas de estudo ou unidades
- para uma abordagem analítica e de formação das diversas
pré-programada; seqüências de alternância;
- dado essencialmente por - as atividades e os conteúdos de
ensinamentos ligados a horários; cada unidade de formação (Plano
- cuja aquisição é medida por de Estudo, Colocação em
controles ou avaliações Comum, disciplinas...);
quantitativos; - os períodos e as atividades de
- pouco negociável, pouco avaliação do percurso de
adaptável. formação e de orientação;
- os períodos de estágio;
- as atividades de animação da
vida no internato;
- os momentos e as atividades de
encontros com os parceiros
pais, mestres de estágio...
• Inteiramente negociável e
adaptável para atender aos
imprevistos e às evoluções.
Para quê? • Atingir um nível de • Visar uma formação integral
conhecimento garantido por um (profissional e geral associadas) e a
exame cujas provas são maturação do projeto pessoal.
estandardizadas e quantificáveis. • Facilitar a inserção social do jovem
• Obter, se for o caso, uma (o diploma sendo um dos meios).
qualificação profissional. • Adquirir os níveis de formação e
de qualificação necessários para um
emprego ou para o prosseguimento
dos estudos.
Para quem? • Os alunos dos diversos ciclos • Os “alternantes”, ou seja, atores
escolares. socioprofissionais.
• Os professores e o sistema • Monitores, pais, profissionais
escolar geral. que implementam, coletivamente,
• Pouca regulação pelos atores. o Plano de Formação.
- de onde as possibilidades de
regulações e de adaptações.

71
2. A elaboração do Plano de Formação
Em formação alternada, cinco categorias de elementos em interação
devem ser levados em conta para organizar o Plano de Formação, como
mostra a representação seguinte:

As atividades dos
alternantes dentro de
um ambiente
B

O projeto de O método
formação A As avaliações
(finalidades, objetivos) E C

O programa
D

Significado dos diferentes pólos:


A representa as finalidades e os objetivos do projeto de formação que conferem
o sentido, a unidade do percurso educativo.
B diz respeito à vivência, à situação dos jovens, suas atividades e, em grande parte,
sua motivação. São envolvidos, também, os parceiros familiais e profissionais.
C tem a ver com o método, a organização, os temas de estudo.
D reporta ao conteúdo dos programas do ciclo de formação.
E indica as avaliações e os controles que constituem momentos de articulação e de
regulação, tanto para os alternantes quanto para a equipe pedagógica e do baliza-
mento do percurso.

O eixo vertical representa os materiais de formação, dos saberes. Ele


representa, também, o eixo das oposições das lógicas. O eixo horizontal re-
presenta os elementos organizadores.

A elaboração do Plano de Formação é de responsabilidade pedagógica do dire-


tor do CEFFA, segundo as etapas seguintes:
1) Antes de tudo, a definição do projeto de formação, ou seja, as finalidades,
os objetivos, as grandes etapas e o sentido geral do percurso de forma-
ção. Ela supõe um trabalho de cooperação entre representantes dos vá-
rios parceiros da formação e dos administradores da associação. Este

72
grupo de pessoas pode, de maneira duradoura, constituir o comitê res-
ponsável que valida o Plano de Formação, o avalia e procede às adapta-
ções desejáveis no tempo.
2) O segundo momento da construção do Plano de Formação é aquele
da definição, para cada seqüência de alternância, dos temas portadores do
processo de formação. Em relação a isto, como dito anteriormente, é a
experiência que antecede o programa. Por isto, os temas têm sua fonte
nas atividades da vida (familial, profissional e social), levado em consi-
deração o ciclo da formação, da idade e da maturidade dos alternan-
tes. Convém, para os temas profissionais, examinar as etapas de entra-
da numa empresa, as atividades dos jovens no decorrer do ano e sua
progressão.
3) A terceira fase, que é de responsabilidade da equipe pedagógica,
consiste em distribuir as atividades pedagógicas e os conteúdos disciplinares
para tratar cada tema.
4) Uma outra etapa almeja definir e planejar os períodos de avaliação da
formação e de orientação, bem como as atividades de encontros (visitas,
reuniões) com os pais e os mestres de estágio.
Por isto, o Plano de Formação se apresenta sob a forma de um grande
quadro, como segue:

73
Exemplo simplificado de um Plano de Formação dos CEFFAs
CONHECIMENTO DA REALIDADE DISCIPLINAS DISCIPLINAS DO NÚCLEO
Conteúdos vivenciais PROFISSIONAIS COMUM
Pedagogização das alternâncias Conteúdos da parte Conteúdos da Base Nacional Comum
diversificada integrados com os integrados com os temas de pesquisa
conteúdos vivenciais e da dos Planos de Estudo
formação geral

Retorno / meio

Construções e

Agroindústria
Colocação em

Colaborações
Eixo gerador

Legislação e

Língua ext.
Tema de Pesquisa no meio socioprofissional

gestão amb.
Alternância

Agricultura

Matemática
instalações
Atividades

Português
Economia

Geografia
Visitas de

Zootecnia

Químina
externas

Biologia
História
Período

comum

Estágio
PLANO DE ESTUDO

estudo

Física

Artes
rural
1 História da minha família
2 A divisão do trabalho
3 Alimentação animal
A família e o trabalho

4 A propriedade e sua organização


5 Manejo o solo e restos culturais
6 Agricultura orgânica
7 Manutenção e condução do pomar
1º 8 Preparar o solo
9 Seleção de sementes
10 Adubação e plantio
11 Manejo de pragas e doenças
12 Tratos culturais
13 Colheita e armazenagem
1 Alimentação e saúde humana
Os fatores e meios de produção

2 Água e sua conservação


3 O clima na região
4 O meio ambiente
5 As terras
6 A mão-de-obra familiar
2º 7 Capital na propriedade
8 O crédito rural
9 Indústrias rurais
10 O mercado
11 Legislações rurais
12 Associativismo e cooperativismo
13 Órgão de assistência ao campo
Exemplo simplificado de um Plano de Formação dos CEFFAs
CONHECIMENTO DA REALIDADE DISCIPLINAS DISCIPLINAS DO NÚCLEO
Conteúdos vivenciais PROFISSIONAIS COMUM
Pedagogização das alternâncias Conteúdos da parte Conteúdos da Base Nacional Comum
diversificada integrados com os integrados com os temas de pesquisa
conteúdos vivenciais e da dos Planos de Estudo
formação geral

Retorno / meio

Construções e

Agroindústria
Colocação em

Colaborações
Eixo gerador

Legislação e

Língua ext.
Tema de Pesquisa no meio socioprofissional

gestão amb.
Alternância

Agricultura

Matemática
instalações
Atividades

Português
Economia

Geografia
Visitas de

Zootecnia

Químina
externas

Biologia
História
Período

comum

Estágio
PLANO DE ESTUDO

estudo

Física

Artes
rural
1 Realidade socioprofissional da família
2 Apresentação da idéia do projeto
3 Colocação em comum do estágio
4 Análise comercial
O meio socioprofissional e o projeto

Produto, serviços, mercado, viabilidade


5 Estudo técnico
Equipamentos, instalações, legislação
3o e produção – Impacto econômico,
social e ambiental
6 Estudo econômico/financeiro
Orçamento, crédito,
Investimento e rentabilidade
7 Planejamento – Cronograma das atividades
8 Indicadores de resultado e viabilidade –
Conclusões
9 Elaboração do projeto
10 Digitação do projeto
11 Preparação para apresentação
12 Apresentação final
13 Formatura
- O exemplo apresentado não é um modelo a ser seguido igualmente em todas as unidades. Cada CEFFA segue uma mesma metodolo-
gia, mas os temas de pesquisa, ou seja, os Planos de Estudo, são selecionados a partir de um estudo da realidade local, com base em di-
agnósticos participativos.
- O Plano de Formação de cada CEFFA segue esta proposta de transversalização de conteúdos da formação geral e profissional de for-
ma integrada com os conteúdos, os saberes da realidade, numa perspectiva de inter e transdisciplinaridade.
Em definitivo
Um Plano de Formação é uma ampla arrumação coerente da formação da
educação e da orientação do alternante. Ele traduz o processo complexo, sistêmi-
co e construtivista da formação alternada. Ele se destaca, assim, das organi-
zações escolares costumeiras. Ele organiza e permite a gestão das operações
pedagógicas. Ele representa um plano-quadro que não é fixo e que se recons-
trói permanentemente. Afixado como grande quadro na sala dos monitores e/
ou na sala do grupo de alternantes em questão, visualiza e baliza o percurso.

NOTAS COMPLEMENTARES
Cantos de pássaros e Planos de Formação
Talvez conheçam Olivier Messiaen? No caso afirmativo, vocês, talvez,
já tenham ouvido obras musicais deste grande compositor, maestro con-
temporâneo – embora falecido há alguns anos – cuja música pode surpre-
ender porque é diferente e nossos ouvidos não estão acostumados aos agen-
ciamentos de notas que suas partições oferecem.
No caso contrário, tentem descobrir.
Então, talvez tenham encontrado – ou sentirão – algumas surpresas an-
tes de seus ouvidos se familiarizarem e vocês aderirem ou não. Encontro
com suas obras litúrgicas ou com seus cantos de pássaros feitos música, a
exemplo do “despertar dos pássaros”, “o catálogo dos pássaros” ou ainda
“pássaros exóticos”. De fato, O. Messiaen está sendo considerado o mais
inventivo entre os “compositores ornitológicos”. Se a primeira chave de
sua obra é religiosa, a segunda baseia-se sobre “a natureza que está infinita-
mente além de nós”, como dizia. Messiaen aproximou-se do mundo dos
pássaros: o rouxinol, a coruja, a cotovia, o tordo-músico, o pica-pau e todos
os outros, ou quase...
Estas composições “ornitológicas” não foram fruto de pura imaginação
que teria levado a um agenciamento de notas e partições puramente abs-
tratas. Ao contrário, elas encontram sua origem na realidade, na natureza
mesmo. Olivier Messiaen tem, de fato, escrupulosamente escutado, regis-
trado os cantos de pássaros nas diferentes horas do dia para, depois, tenta-
do traduzi-los, evocá-los com o máximo de fidelidade, com o material mu-
sical por ele escolhido.
Semelhante é também, para todos os “autores-compositores” de Planos
de Formação de CEFFAs, o procedimento adotado:
• primeiro olhar, ler, escutar, sentir, palpar, perceber a realidade de
vida dos alternantes;

76
• extrair disto tudo, os temas maiores, portadores de sentido em ter-
mos de atividades, ações, engajamentos e suportes para organizações
didáticas;
• colocá-los numa lógica progressiva de acordo com a capacidade de
envolvimento e de aprendizado;
• enxertar aí as noções teóricas necessárias para compreender, apren-
der, recorrer às leis, aos princípios e conceitos, abstrair, construir mais
saberes e capacidades.
Nesse caso, as “notas matemáticas” se revestem de sentido para o jo-
vem, porque consegue aparentá-las com alguns cantos ouvidos na nature-
za. O mesmo vale para as “notas biológicas ou físicas”, bem como para to-
das as outras, também.
Aí, a Pedagogia da Alternância, como na música de O. Messiaen, con-
segue escapar dos ajeitamentos clássicos contidos nas partições oficiais que,
de fato, são os programas. É o canto dos pássaros na natureza, com tudo
aquilo que nos oferecem, que prevalece. As notas, os conteúdos dos pro-
gramas, ajudam a entendê-los melhor.
Os pedagogos – os monitores – são, antes de tudo, ouvintes, depois são
aqueles que fazem os arranjos e, finalmente, os compositores. Cabe-lhes fa-
zer um trabalho de composição, a partir destas partições e orquestrações
que representam os Planos de Formação. Neste caso, talvez, a ação peda-
gógica encontre-se enriquecida pela variedade, pela complexidade, pela
fantasia, pela poesia e produza mais eficiência educativa.
Experimentem, então, escutar o canto dos pássaros. Talvez encontra-
rão nele alguma inspiração pedagógica.

A organização e a gestão do trabalho pedagógico pelo “planejamento


da sessão”

Um planejamento de atividades da sessão reflete um modelo pedagó-


gico. Ele revela o grau de coerência entre as finalidades, os objetivos e os
procedimentos implementados. Constitui um instrumento pedagógico
maior como organização de atividades e de conteúdos num espaço e um
tempo, tanto para os alternantes quanto para os monitores.
Um planejamento de sessão forma um componente de um sistema pe-
dagógico. Por isto, tendo como referencial os diferentes modelos ou cor-
rentes pedagógicos, pode citar-se três tipos de planejamento.

77
1. O planejamento de ensino
Centrado sobre os programas, é o mais corriqueiro e mais fácil de ser
implementado. Caracteriza-se, essencialmente, através de:
• Sua centralização quase exclusiva nos conteúdos, no programa e no
docente.
• Uma justaposição das disciplinas através de um quadro-horário (ge-
ralmente por hora). Esta organização leva a um consumo de doses su-
cessivas de programa de cinco, até seis aulas de naturezas diferentes no
mesmo dia, com todas as interrogações cabíveis, quanto à sua eficiên-
cia, dado o número e a dispersão das solicitações. Esta organização, de-
terminada pelas estruturas materiais e professorais, implica uma peda-
gogia da transmissão e dos papéis de ensino. Só deixa pouco espaço
para a variedade, tão necessária ao adolescente. O quadro, geralmen-
te, é estabelecido de maneira fixa para o ano inteiro, evitando, assim,
as angústias do imprevisto, da adaptação, da criatividade. Cabe à cri-
ança, ao adolescente ou adulto, adaptar-se.

2. O planejamento de aprendizado
Ele desloca a centralização da estrutura para o “educando”, a fim de levar
em conta, até onde for possível, suas necessidades e seus ritmos biológicos.
Apresenta, então, as seguintes características:
• a consideração dos ritmos da pessoa: tempo de adaptação à classe em
início de sessão e a cada manhã, duração da concentração, fase de rela-
xamento;
• a presença de momentos suficientes para um trabalho de animação
pedagógica mais do que ensino;
• uma variedade das formas do trabalho pedagógico (coletivo, em gru-
pos, individual...) e das fontes de informação (aportes do formador,
documentos diversos, pesquisas, exposições...);
• uma busca de coerência de conjunto e de um sentido geral dados
pela articulação, a relação das disciplinas, das atividades e um reforço
dos saberes a serem construídos pelo aprendiz.
Um planejamento deste tipo é concebido para uma pedagogia de ação,
de apropriação e de construção dos saberes pelos alternantes. Exige, por
parte dos formadores, tarefas de acompanhamento, de facilitadores, de
guias e, não mais, de ensino no sentido estrito.

78
3. O planejamento de aprendizado por alternância
Apresenta características do anterior, mas aplicado à implementação de
um dispositivo pedagógico que requer a alternância integrativa dos CEFFAs.
A saber:
• articular os tempos e espaços da formação;
• associar a formação profissional e formação geral;
• permitir aos alternantes de relacionar, articular e unificar lógicas e
aprendizados de naturezas diferentes;
• acompanhar o jovem ou adulto na construção de seu projeto profis-
sional.

Por isto, ao espírito e às características do planejamento anterior, acres-


centam-se:
• tempos, no início da sessão, para permitir aos alternantes de “voltar”
ao CEFFA, de operar a passagem de um tipo de atividade para outro e,
no final da sessão, para “deixar” o CEFFA;
• atividades de junção que são, no início da sessão, a apreciação e a va-
lorização dos Planos de Estudo ou relatórios de estágio e a Colocação
em Comum; no final da sessão, a preparação do Plano de Estudo ou de
outras atividades de estágio;
• uma distribuição dos conteúdos para que os saberes profissionais
possam caminhar até os saberes gerais;
• momentos de “rupturas escolares” durante a sessão, para permitir a
estes jovens atores socioprofissionais de esticar as pernas e relaxar o es-
pírito e ao grupo de viver uma experiência comum: visita de estudo,
trabalhos de oficina ou de laboratório, atividades esportivas e outras
saídas...
• unidades de tempo suficientes (2, 3 ou 4 horas) para um verdadeiro
trabalho de formação que, é bom lembrar, não é de natureza quantita-
tiva, mas qualitativa, ou seja, de relações, de articulações, de progres-
sões, de sínteses sucessivas, de reforço potencial.

Um planejamento assim supõe algumas condições elementares:


• um trabalho de equipe por opção de formação, ou seja, um núcleo
permanente e não uma sucessão de professores por disciplina;
• um estatuto e papéis de monitores tais quais são concebidos pelo mo-
vimento dos CEFFAs;

79
• uma organização pedagógica estruturada, para o conjunto do per-
curso, através do Plano de Formação e, para cada seqüência de alter-
nância, através do trabalho pedagógico por tema.

Em suma, o planejamento é o instrumento de gestão de uma sessão, a partir


de um duplo ponto de vista:
• Primeiro, para as pessoas em formação: é em função delas que é elabora-
do, a fim de otimizar seu processo formativo, de tornar eficientes e
qualitativas as horas disponíveis numa sessão. Representa, neste senti-
do, um instrumento pedagógico de primeira ordem e seu estabeleci-
mento torna-se, para o responsável de fazê-lo, uma atividade potenci-
almente pedagógica.
• Para os monitores, o planejamento da sessão representa o instrumento
de uma organização coerente, construtiva e eficiente das atividades a
serem conduzidas e dos papéis a desempenhar no contexto pedagógi-
co institucional. É um instrumento de gestão do tempo.
É na medida em que uma coerência, uma unidade – e não divisões – se
estabelece entre “formados e formandos” que podem acontecer reci-
procidades e que, talvez, uns e outros possam achar-se e crescer no
dia-a-dia da formação. Por isto, o planejamento da sessão deve ser con-
siderado um instrumento de gestão conjunta de formação dos alter-
nantes e dos monitores.

80
4
A ANIMAÇÃO E A GESTÃO DAS RELAÇÕES

A educação é um todo e só vale pela unidade que sabe


estabelecer-se entre os diversos meios: família, escola,
exterior...
André Duffaure

Criar estruturas que põem os homens em relação uns com


os outros, e permitem, através disto, a cada um de se
definir, aprendendo e contribuindo com a aprendizagem do
outro.
Ivan Illich

Introduzir a alternância para a formação significa diversificar os espa-


ços e os tempos para aprender, se formar, se orientar. É substituir uma pe-
dagogia plana por uma outra no espaço e no tempo. É ingressar na com-
plexidade e na educação sistêmica.
Com a alternância, não entram mais em jogo os únicos saberes dos livros
e do docente na escola, mas aparecem os da vida familial, social e profissio-
nal, segundo as dimensões da experiência levadas em conta. Não se encon-
tra mais na clássica triangulação ensino-saber-aluno no seio da classe, mas
de uma multidão de relações sociais cruzadas entre uma diversidade de ins-
tituições e de atores co-formadores, no entroncamento das quais se encon-
tram os alternantes. Encontra-se numa pedagogia da partilha, da coopera-
ção, da parceria. Por isto, da natureza e da qualidade das relações depende o
efeito formação da alternância e, além disto, a dinâmica associativa e seus
efeitos sobre a promoção de seus membros.

Uma rede de relações

A alternância cria um sistema relacional amplo e denso, constituído de


pequenas ilhas relacionais no seio das quais os contatos humanos se multi-
plicam. O alternante torna-se o ator privilegiado de tudo isto. A rede é
mais ou menos complexa na medida dos campos de vida investidos para a
formação. Se só o setor profissional está sendo considerado, encontra-se
num sistema de formação mais simples, mas menos rico que se considerar
a vida global do jovem, o dia-a-dia feito de momentos familiares, profissio-
nais e sociais. Uma visão educativa e de formação geral convida a prestar

81
atenção ao conjunto do meio de vida, com seus diferentes componentes,
porque “a educação é um todo e só vale pela unidade que sabe estabele-
cer-se entre os diferentes meios: família, escola, exterior...”, dizia o peda-
37
gogo das MFR, A. Duffaure .
Ou seja, a representação seguinte da rede relacional

Meio vivencial do alternante


CEFFA

Os pais O grupo
(Campo familiar)
Alternante
O mestre do estágio Os monitores
(Campo profissional) A equipe
pedagógica
Outros jovens, adultos... e educativa
(Campo social)

Em seguida, a gestão das relações e das comunicações entre todos estes


componentes supõe uma diversidade de meios e uma atenção constante da
equipe pedagógica e dos administradores do CEFFA.

A gestão das relações entre o CEFFA, as famílias e os mestres de


estágio profissionais

Modalidades muito diversas, mais ou menos informais ou sistematiza-


das e mais ou menos integradas no processo de formação e na vida do
CEFFA estão sendo implementadas no dia-a-dia.
1. Atividades de formação, dentro da estratégia mesmo da alternân-
cia, implicam os pais e/ou os mestres de estágio e criam relações com eles.
Em primeiro, encontra-se o Plano de Estudo, como meio efetivo de partici-
pação na formação e de relação entre os dois espaços-tempos da alternân-
cia. É através dele que se decifram as atividades da vida quotidiana, seus sa-
beres, seus problemas e seus questionamentos. É através dele que se esta-
belece a discussão e que se transmitem e se confrontam os saberes da expe-
riência.

37. DUFFAURE, A. Les Maisons Familiales préparent le monde rural de demain.


Qu’attendent les adolescents d’aujourd’hui? In: Documents UNMFREO. Paris.

82
A consulta aos relatos e relatórios das Colocações em Comum, das Visi-
tas de Estudo, bem com as Fichas Pedagógicas ou Cadernos Didáticos re-
presentam, para os parceiros do meio, outras tantas maneiras de se relacio-
nar com o CEFFA.
As avaliações no meio profissional, na empresa ou na família sobre as
atividades dos jovens têm uma função de implicar os parceiros. As avalia-
ções realizadas no CEFFA podem, também, associar e implicar pais e mes-
tres de estágio.

2. Os instrumentos de ligação e de informação, tais como os Cadernos


de Alternância ou Caderno das Atividades de Formação, segundo as deno-
minações, as cartas de informação, a caderneta da utilização do tempo ou
outros... impõe-se para que se tenha uma ligação e uma informação recípro-
cas entre os diferentes parceiros. Estes meios de comunicação ultrapassam o
caráter formal de uma simples caderneta de correspondência para se tornar
verdadeiros instrumentos pedagógicos, destinados a utilizar, de melhor for-
ma possível, a interação dos diferentes períodos da alternância.

3. A acolhida no CEFFA. A vinda dos pais no CEFFA, para levar ou


buscar seus filhos, representa uma oportunidade de contato e de troca de
informações com os monitores. Por isto, tornam-se muito sensíveis à quali-
dade da acolhida: presença e disponibilidade dos monitores na chegada ou
na saída dos jovens, convivência... Em decorrência a tudo isto, aumenta a
confiança, a vontade de se expressar, de participar e de se envolver.

4. As visitas dos monitores no meio familiar e/ou profissional. A visi-


ta representa, para o monitor, o momento no qual, com os pais e/ou o mes-
tre de estágio e o alternante, se encontra, se fala, se informa mutuamente,
se esclarece e se regula, se aconselha, se descobre, se interessa para sua si-
tuação... Ela é um tempo indispensável na função do monitor para conhe-
cer a situação familiar e/ou profissional dos jovens, para perceber seu qua-
dro de vida e de trabalho, bem como suas aptidões, sua adaptação e a perti-
nência de sua orientação.
Para cada alternante ela desempenha uma função psicorrelacional de
primeira linha. De fato, a visita de um monitor representa para ele, se exis-
te encontro e diálogo, o momento onde recepciona, no seu ambiente,
aquele que, no CEFFA, é o monitor responsável por ele. Por isto, ela se tor-
na uma manifestação de interesse por ele, de consideração e de reconheci-

83
mento de sua situação de vida e de seu estatuto no campo familial e/ou so-
cioprofissional.
As visitas são também, para os monitores, oportunidades de melhorar
seus conhecimentos do ambiente cultural, mas também do mundo empre-
sarial e profissional. As visitas tornam-se, neste sentido, elementos de com-
petência e de aperfeiçoamento dos monitores, para que estejam em condi-
ções de, ao mesmo tempo, captar as experiências e as linguagens, de arti-
cular seus aportes teóricos com as realidades da vida dos alternantes e pro-
por Planos de Estudo adaptados ao meio de vida dos mesmos.

5. As reuniões no CEFFA. Esta modalidade relacional representa um


outro degrau no nível de consulta e de envolvimento dos parceiros porque
é de natureza coletiva e porque ela pede um deslocamento até o CEFFA
onde acontece a reunião. Em número de 2 ou 3 por ano para cada gru-
po-classe, elas desempenham funções indispensáveis na Pedagogia da Alter-
nância: descoberto do próprio CEFFA, relacionamento entre os vários par-
ceiros, informações a respeito das atividades e os Planos de Formação, dos
papéis respectivos de cada um, das avaliações-balanços, acertos e ajustes,
mas também debate sobre o tema educativo ou da sociedade...
As reuniões ajudam aos pais e/ou mestres de estágio a aprimorar seus
papéis educativos e de formação. Uns e outros, muitas vezes, ficam perdi-
dos diante dos comportamentos de adolescentes e do que a Pedagogia da
Alternância espera deles. Necessitam de comunidades humanas mais am-
plas do que elas próprias para que o quadro familial possa funcionar, para
que se possam partilhar as preocupações. O encontro com outros pais e
com os monitores, em grupo, a troca de experiências e de pontos de vista, a
informação, a busca comum de soluções, ajudam a se tranqüilizar e ganhar
segurança, a se liberar, a compreender melhor o adolescente e definir suas
atitudes, a participar melhor de sua formação. As reuniões de pais e de
mestres de estágio, bem como as assembléias gerais e outros eventos da as-
sociação podem desempenhar o papel de comunidades intermediárias
para todas as famílias, mas mais particularmente para aquelas que se en-
contram isoladas e fazer assim do CEFFA “uma escola dos pais”.

6. O fato associativo como meio para relacionamento e engajamento.


Na Pedagogia da Alternância vai-se ao encontro do ideal de funcionamen-
to quando os parceiros não são meros utilizadores ou consumidores de
uma estrutura de formação, mas quando são envolvidos, ativos e responsá-
veis da estrutura e do processo de formação. Eis por que a associação repre-
senta, para os CEFFAs, a estrutura indissociável da alternância. Ela se torna

84
um meio de implicação na vida global do CEFFA através de uma participa-
ção em comissões ou grupos de trabalho, manifestações diversas ou, ainda,
em tarefas materiais.
A associação ajuda os pais e os mestres de estágio no aprimoramento
de seus papéis educativos e de formação de seus filhos, dando-lhes a opor-
tunidade de se encontrar, de se informar em reuniões. A associação, neste
título, é o corolário da alternância.

Favorecer o relacionamento do alternante com seus diferentes campos


da vida

Como o demonstra o esquema no início deste capítulo, o alternante


está no coração do processo relacional e suas relações são múltiplas: rela-
ções com os pais e os membros da família, relações no setor profissional
com o mestre de estágio, os empregados da empresa ou do serviço e os cli-
entes, relações no setor social com outros jovens e outros adultos, relações
no CEFFA com os membros de seu grupo de formação, com cada monitor
e membro da equipe educativa, com o diretor e outros membros da estru-
tura... Para cada um a possibilidade relacional é ampla. E um ou outro rela-
cionamento pode se tornar preponderante e influir de maneira positiva ou
negativa sobre os demais e sobre o desenvolvimento de cada um. Por isto é
da responsabilidade do CEFFA ajudar a manter o equilíbrio das relações.

1. O relacionamento familiar
Elas se situam no período pré-adolescente e adolescente do alternante
com todas as dificuldades decorrentes para uns e outros. Manter o diálogo
torna-se a condição maior para um equilíbrio relacional. Os instrumentos
da alternância, entre eles o Plano de Estudo, entram no jogo para favore-
cer a troca como demonstrado anteriormente. Mas, os acertos com os mo-
nitores quando da acolhida no CEFFA, as visitas, as reuniões, os cadernos
de alternância... representam outros meios necessários para ajudar na com-
preensão mútua. Igualmente essencial é o trabalho de informação-forma-
ção sobre adolescência e o relacionamento familiar, que pode ser garanti-
do pela formação das famílias, em reuniões específicas.

2. O relacionamento no campo profissional


A natureza e a densidade das relações dependem ao mesmo tempo do
jovem e do meio profissional.

85
Sua idade e o lugar que lhe é concedido não deixam de ter influência.
Enquanto jovem, encontra-se mais numa posição de observador e execu-
tor. Depois, progressivamente, vai adquirindo um estatuto e ganhando
papéis de mais responsabilidade se o meio profissional o permite e se o
jovem se envolve. Decorrente disto vai ser a natureza das relações em ter-
mos de dependência ou de autonomia das instituições e adultos que fre-
qüenta, com todos os efeitos possíveis sobre as suas condutas, suas apren-
dizagens e evoluções.
Os setores profissionais apresentam aspectos muito variados segundo
a dimensão, a natureza da atividade, o modo de produção e de organiza-
ção. Todavia, qualquer que seja a situação, é sempre num contexto huma-
no que vai se situar o alternante. Sabe-se – e numerosas pesquisas o atestam
– que os fatores relacionais repercutem de maneira determinante sobre a
motivação e os progressos feitos. A resposta que encontra para suas neces-
sidades fundamentais (consideração, reconhecimento, segurança, expres-
são e ação, progressão e aprendizagens, êxito...) faz com que se aplique, se
invista e otimize o relacionamento, se construa. A confiança e a responsabi-
lidade que lhe são atribuídas, o êxito que representa uma vitória sobre si
mesmo e o reconhecimento pelos colegas, bem como o meio social, a toma-
da de consciência de seu destino ou posição de adulto, a utilidade social de
sua ação, mas também uma retribuição, um salário... representam manifes-
tações do lugar que está ocupando, de sua inserção na sociedade.
O ambiente na empresa, os papéis e atitudes dos “acompanhantes”
(mestres de estágio, tutores...) revestem neste caso todo o seu sentido e sua
importância. Para um jovem, a chegada num ambiente novo, principal-
mente quando vai de par com o primeiro contato com o mundo do traba-
lho, cria um choque psicoafetivo que precisa ser compensado por um clima
de segurança, de compreensão e de acolhimento como co-ator no campo
profissional. Torna-se, ainda, mais essencial no caso de jovens que não en-
contram no meio familiar as respostas às suas necessidades e pedem estru-
turas e adultos como referências.
O CEFFA exerce neste caso, mais uma vez, uma responsabilidade no
sentido de zelar por estas condições de vida: visita dos monitores, como
descrito anteriormente, para controlar, informar, regular... reuniões com
os mestres de estágio para refletir sobre suas funções, papéis e atitudes, de-
finir as etapas, precisar os processos e os instrumentos da formação por al-
ternância... O Caderno de Alternância representa, como para os pais, este
outro instrumento permanente de informação e de relação.

86
3. O relacionamento no CEFFA
O relacionamento com os formadores e no grupo é marcado pelo am-
biente geral do estabelecimento refletido por suas características, suas
condições de funcionamento, o quadro material, o jeito pedagógico e de
animação que domina. Em outras palavras, a qualidade de acolhida e de
vida, a possibilidade de ser e de agir, repercutem sobre a densidade do
relacionamento.

3.1. O relacionamento no grupo de formação


Um grupo de alternantes, além das características gerais de qualquer
grupo de adolescentes (jogo de influências, atribuição de papéis, conflitos,
afinidades etc.), constitui um amontoado específico de experiências diver-
sas e, conseqüentemente, de conhecimentos e de saberes. A cada encontro
do grupo de formação cada alternante volta com uma vivência específica
devido ao contexto de sua ação, mas, também, devido aos seus objetivos
pessoais. Nenhum deles pode ser considerado como um aluno que volta
para a escola, mas um ator socioprofissional que adquiriu uma autonomia
e o poder de um saber e de competências que nem os colegas nem os moni-
tores possuem. Este encontro de diferenças – com a condição que seja per-
mitida e explorada – constitui um espaço de formação cheio de informa-
ções, de comparações, de opostos, de discussões de problemas permitindo
a cada um de situar-se em relação a seus campos de vida familiar, profissio-
nal e social, mas, também, de posicionar-se no grupo. Por isto, ir além da
simples justaposição de experiências exige o acesso a uma comunidade su-
ficiente de objetivos, de experiência, de linguagem, de cultura grupal..., a
fim de evitar o fechamento de cada um sobre sua própria experiência e a
falta de comunicação entre os membros, mas favorecer o pertencimento a
um grupo. Os procedimentos pedagógicos implementados, os níveis esta-
belecidos pelos monitores, em outras palavras, a organização pedagógica
são, por causa disto, de primeira importância. O encontro das experiên-
cias, a cooperação e a informação decorrentes constituem mediações rela-
cionais essenciais entre os membros do grupo.
Em resumo, o grupo assume uma tripla função:
• didática e de aprendizado pelo ensino mútuo que permite;
• afetivo como pólo do calor humano, local de segurança, tão neces-
sários para regular os efeitos ansiógenos das passagens repetidas de
um lugar para outro, mas também para compensar as eventuais faltas
afetivas;

87
• de aprendizagens sociais na medida em que, além do grupo de for-
mação, atinge-se o grupo de vida quando existem situações de vida re-
38
sidencial .

3.2. O relacionamento com os formadores


Fica claro que os processos relacionais são induzidos pelas representa-
ções que uns se fazem dos outros e as condutas que disto resultam. Para
um, a lembrança da experiência escolar passada e, para outro, a concepção
que se faz de sua função. Fica evidente que com a alternância não se encon-
tra mais numa relação mestre-aluno, porque um alternante não é mais um
aluno no sentido tradicional da palavra, mas um ator socioprofissional,
como dito anteriormente. Em seguida, os formadores são levados a terem
um relacionamento de paridade. A apresentação das atividades e dos ins-
39
trumentos da alternância demonstrou que seus papéis são mais de anima-
ção pedagógica e de acompanhamento do que de ensino com as conse-
qüências que resultam disto em relação à natureza das relações.
Um estudo sobre estas questões me levou a destacar mediações da relação
40
dos formadores com os alternantes . A saber:
1. A mediação de uma consideração valorizadora
Sabemos que as distorções que introduzimos na percepção dos outros
alteram as relações. Por isto, o olhar positivo ou negativo que se tem, bem
41
como a espera em relação ao outro , não ficam sem ter influência. A consi-
deração, o reconhecimento como “pessoa singular” que cada um ressente,
são condições para que se estabelecessem relações entre as pessoas e não
somente funcionais (interestatutárias).

2. A mediação da cultura e da profissão partilhadas


Poder conversar com o alternante sobre o seu ambiente sociocultural
e/ou de seu trabalho, captar suas nuances, compreendê-las, trocar idéias a
respeito de experiências, significa colocar-se no seu terreno, considerá-lo,

38. Trata-se neste caso de um componente do sistema de alternância dos CEFFAs como
o cap. 6 irá desenvolver.
39. Vão ser melhor definidos no cap. 8.
40. GIMONET, J.-C. Alternance et relations humaines. Paris: Ed. Universitaires/Mésonan-
ce, 1984.
41. Foi demonstrado, em relação a isto, que o que se espera do outro tende a se confir-
mar segundo a lógica do efeito Pygmalion. Cf. ROSENTHAL, R. & JACOBSON, L.
Pygmalion à l’école. Paris: Casterman, 1971.

88
reconhecer o ser profissional e social que ele é, aprender com ele. É, em se-
guida, entrar numa relação “cara-a-cara”, ou seja, do “Eu-Tu”. É uma con-
dição essencial da relação para com os alternantes, mas também para com
os pais, os mestres de estágio e, mais globalmente, para com o meio.

3. A mediação do saber partilhado e da organização didática


Ela vem em corolário do que antecede. A alternância é uma pedagogia
de partilha do saber entre seus diferentes atores. A organização e a gestão
das atividades didáticas contribuem assim mais ou menos nesta partilha e
para o encontro ao redor da cultura e das profissões em preparo dos alter-
nantes. A abordagem global de problemas a resolver, de projetos a cons-
truir, leva a relações mais amenas que as atividades que atualizam lembran-
ças escolares dolorosas.

4. A mediação do projeto do alternante


Qualquer formação, enquanto conquista pessoal que cada um perse-
gue, está, naturalmente, direcionada para um futuro e, desta forma, ampa-
rada por um projeto próximo ou mais afastado, preciso ou difuso. A eluci-
dação do projeto, neste período de transição que é a adolescência, constitui
um terreno permanente de encontro entre o monitor e o alternante. Ele
serve de suporte para um diálogo de qualidade entre uns e outros. Por isto,
ajudar na precisão do projeto, na sua afirmação e definição através de ajus-
tes progressivos entre a personalidade do jovem e a realidade do mundo
exterior, para caminhar dos “projetinhos” até ao “PROJETO” mais cons-
truído e demorado, constitui uma exigência forte da equipe educativa do
CEFFA. A alternância é uma pedagogia do projeto.

5. A mediação do acompanhamento
O acompanhamento aponta para a relação educativa em geral e para a
sua complexidade. Reveste, de fato, formas muito diversas e está carregado
de ambigüidade porque se trata ao mesmo tempo de:
• torná-lo suficiente para criar um clima de segurança, mas não excessi-
vo, para permitir o ato de assumir e um processo de autonomia;
• aceitar, por parte do monitor, de desempenhar papéis múltiplos,
com aspectos parentais para uns, de modelos profissionais, de apadri-
nhamento para outros...
• ajudar com um conjunto de intervenções em função das necessidades
percebidas (amparo, questionamento, impulsão, sugestões, enfrenta-
mentos...).

89
Este papel de acompanhamento ultrapassa, na formação alternada, o
quadro da estrutura escolar, já que se estende para as relações com os ato-
res do espaço socioprofissional, cujo conhecimento se torna indispensável
para um acompanhamento personalizado.

6. A mediação da equipe pedagógica


Do fato da complexidade a viver e a gerir, a Pedagogia da Alternância
supõe um trabalho de equipe como os capítulos anteriores o demonstra-
ram. Pelo fato de pedir aos monitores um forte investimento didático, rela-
cional, afetivo, intelectual e físico, a equipe se impõe como espaço de inte-
rações, de cooperação, de construção em comum, mas, também, de ampa-
ro e de regulação. Como grupo, é submetido a todas as exigências de sua
dinâmica e seus funcionamentos não ficam sem efeitos, em toda reciproci-
dade, sobre os grupos de alternantes.

42
Um relacionamento para acompanhar a passagem da adolescência
43
A alternância é uma pedagogia da adolescência, dizia A. Duffaure . Esta
afirmação toma todo o seu sentido, quando se examina, de um lado, quais
são os comportamentos e as necessidades do adolescente, e, de outro lado,
o que a alternância permite.

44
O que significa a adolescência nas fases da vida humana?
A adolescência corresponde com uma idade maravilhosa mas difícil da
vida. Embora isto seja verdade para todas as idades da vida, aplica-se parti-
cularmente à adolescência porque é vital para o futuro, porque a vida está
na frente, porque representa a idade de uma passagem de um estado a outro,
da criança ao adulto. Uma idade “entre-dois”, que se desprende da anterior,
toma distância desta, mas, ao mesmo tempo, depende desta e, principal-
mente, se projeta na outra. O adolescente não olha para trás, mas sim, fun-
damentalmente, para frente. A imagem da borboleta é esclarecedora: esta,

42. Este texto retoma, no essencial, o artigo de J.-C. Gimonet: Alternância, adolescên-
cia e pré-adolescência. In: Revista da Formação por Alternância – CEFFAs. Brasília/Une-
fab, 2005.
43. DUFFAURE, A. Éducation, milieu et alternance. Paris: Ed. Universitaires/UNMFREO,
1985 [Textos escolhidos e apresentados por D. Chartier].
44. Este rápido olhar psicológico sobre a adolescência é o de um europeu. Precisa
ser reavaliado, talvez, levando-se em consideração o contexto da sociedade e da vida
brasileira.

90
antes de ser borboleta, é crisálida e, antes ainda, lagarta. A borboleta será
tão bela, vigorosa e resplandecente de cores e de formas quanto a crisálida
e a lagarta o são, contanto que suas fases de vida respectivas não sejam por
demais perturbadas.
A adolescência, invenção dos tempos modernos, representa realmente
este período de passagem que cria quantidade de transtornos, de mudan-
ças que precisam ser entendidas pelos pais, adultos e educadores para po-
der acompanhá-las. E isto nem sempre é simples e fácil.
Os transtornos que acontecem nesta fase da vida são antes de tudo de
ordem física e psicológica. Devem-se ao sistema hormonal que entra em
ação, que provoca o crescimento, a ativação das funções sexuais com toda
efervescência decorrente disto. Na adolescência ganha-se em altura, em
peso, em forma, em beleza, mesmo se às vezes alguma crise de acne juvenil
pode trazer uma certa contrariedade!
A adolescência é a flor da juventude, é como um desabrochar floral.
Mas tudo ocorre um pouco às cegas, com incerteza, busca, questionamen-
to, insegurança, instabilidade. Adquire-se mais força, mas ainda não se
tem toda força esperada. O coração muda de ritmo, o sistema nervoso
nem sempre é adaptado, o que provoca uma falta de jeito, na maioria dos
casos bem involuntária. No plano intelectual também, o adolescente ga-
nha em força e se sente mais à vontade, querendo aproveitar disto. É a
idade da discussão, da contradição. Percebe o seu crescimento, se sente
como gente. Afirma-se, conquista o “eu” como também sua identidade,
aumenta sua autonomia.
Quer se desprender das tutorias, tomar distância, ser ele mesmo, viver
por sua conta. Esta evolução, assaz normal, provoca conflitos porque o
meio (familiar, entre outros) resiste. É a idade das crises, como se diz geral-
mente, e muitos adjetivos, cada qual mais negativo do que o outro, são uti-
lizados para qualificar os comportamentos.
A adolescência, com efeito, não é algo fácil de se viver. Antes de tudo
para os próprios jovens, porque se encontram na mais total ambivalência:
querem mais liberdade por parte dos pais, no tempo em que precisam de-
les no plano material, mas principalmente afetivo. Existem, ainda bem, la-
ços afetivos, de amor, sempre presentes, mesmo se eles, às vezes, querem
demonstrar o contrário. Também para os pais este período não é simples
porque não é fácil ver seus filhos crescerem, de vê-los escaparem, voar com
as próprias asas. Não é fácil porque não se tem certeza do que se pode ad-
mitir, deixar fazer e, menos ainda, sobre o que não se deve transigir. Te-
me-se em não indicar as referências desejáveis. Surge o medo de perder

91
sua autoridade, enquanto mais se deixa os filhos serem, existirem, afirma-
45
rem-se, crescerem, mais esta autoridade se amplia .
A adolescência ainda é a idade da curiosidade, da busca, da exploração
de tudo, do questionamento, do espírito de aventura, da procura de proje-
tos no plano da amizade, do amor, dos encontros humanos, sociais, pro-
fissionais, dos problemas da sociedade, do mundo. É a idade de maravi-
lhar-se, dos sonhos, do entusiasmo e do engajamento pelas grandes causas
com todos os riscos inerentes de manipulações.
A adolescência é um momento extraordinário porque tudo fervilha de
energia, de imaginação, de expressão, de criação própria do jovem, en-
quanto muitas vezes pinta-se um retrato negativo desta fase da vida, dan-
do-lhe feições sombrias, qualificando-a de período de crise. E, deveras, é
realmente isto, porque é difícil de ser vivida e que tudo não transcorre bem
para todos por causa de um passado perturbado, de um presente que não
permite equilíbrios afetivos e sociais desejáveis. Por causa, às vezes, de um
presente semeado de derrotas ou de um futuro que parece fechado, de
uma falta de esperança, de visões animadoras e portadoras de sentido. Os
fatores não faltam para que esta passagem da criança para o adulto se faça
através de carências, trazendo a submissão, o fechamento sobre si, a aliena-
ção, ou através de excessos levando à revolta, à violência ou à fuga e às con-
dutas erradas e perigosas. Nossa época é cheia disto e a situação dos ado-
lescentes é perigosa, arriscada.
A adolescência é uma evolução normal e essencial do ser humano.
Impedindo esta evolução, aí sim defronta-se com uma crise e encontra-se
uma revolução. A responsabilidade dos pais, dos adultos e de todos os edu-
cadores é inteira para acompanhar esta passagem, ao mesmo tempo em
que é envolvida a responsabilidade das instituições educativas. Qual é a do
movimento dos CEFFAs no meio de todas as outras estruturas educativas?

Qual é a resposta oferecida pela alternância?


A alternância pode ser considerada como uma modalidade de educa-
ção e de formação, uma pedagogia para a adolescência porque responde às
necessidades essenciais desta idade, porque favorece condições de passa-
gem. A saber: ter um lugar e conquistar um estatuto, agir, ser bem-sucedi-
do e ser reconhecido e amado, crescer.

45. Não confundir com autoritarismo, que é uma falsa manifestação da autoridade. A
autoridade, etimologicamente, significa, de fato, “ser autor de si” e “tornar o outro au-
tor de si próprio”.

92
Ocupar um lugar – conquistar um estatuto
A alternância permite ao adolescente adentrar no espaço dos grandes,
ou seja, no mundo dos adultos. Ela lhe dá possibilidades de encontrar uma
utilidade, uma posição social, uma consideração, um reconhecimento. Em
outras palavras, ela o ajuda a construir sentido para seu presente e vislum-
brar o mesmo para o seu futuro, ou seja, ter esperança. Desta forma, a al-
ternância responde a estas necessidades de ser, de crescer, de existir, de se
projetar na frente na vida dos adultos.
Coloca-se então, com acuidade, o olhar que se lança no jovem, o lugar
que lhe é atribuído na família, no estágio profissional, no CEFFA. Já não é
mais uma criança na escola. Não é mais um aluno mas um ator socioprofis-
sional, na sua medida, mesmo se só tem 13 ou 14 anos. É alguém a conside-
rar porque cresceu, porque ocupa um lugar na sociedade, porque desem-
penha papéis úteis e reconhecidos.

Agir
O adolescente precisa, fundamentalmente, de ação porque ele está
cheio de energia e de vontade de empreender. Nisto a alternância corres-
ponde porque ela coloca em ação. É uma pedagogia da ação. Ela confere,
deste fato, um estatuto profissional que por sua vez estabelece com o traba-
lho e com a profissão uma relação, incluindo aí as exigências, os valores e
as aprendizagens correspondentes. Visto de maneira mais global, o proces-
so pedagógico baseado na alternância torna o jovem ator e não mero es-
pectador de sua formação, sujeito ativo e não um simples objeto de ensino.
Esta necessidade de ação acompanha aquela da exploração, da desco-
berta, do encontro, de viver aventuras. A alternância, no tempo em que per-
mite viver situações e experiências variadas, contempla estas necessidades.
Mesmo assim, é preciso que o meio (familiar, profissional...) e o CEFFA con-
tribuam nisto. O ritmo da alternância favorece esta necessidade de ações di-
versificadas, criando uma sucessão de seqüências de vida diferentes e de pe-
quenas aventuras sucessivas que impedem qualquer monotonia, repetição
tão odiada pelo adolescente. A sucessão das seqüências cria a dinâmica do
dia seguinte, que sem parar projeta, no futuro, ao encontro de novas aventu-
ras a serem vividas. A alternância é uma sucessão permanente de rupturas e
de relações que obrigam, a cada vez, o adolescente a reinvestir-se numa nova
situação. Deste jeito talvez consiga ela contribuir para o desenvolvimento
da adaptabilidade.

93
Ser bem-sucedido, ter êxito
Ser bem-sucedido, ou seja, ter êxito, é uma palavra-chave na educação
e em todo desenvolvimento pessoal, porque:
• Significa ser reconhecido e reconhecer-se como sendo capaz de reali-
zar algo, de empreender. É receber consideração, ser valorizado e benefici-
ar da estima dos outros. É sentir-se amado. Conseqüentemente significa
aumentar a auto-estima, a autoconfiança, fazendo crescer assim a motiva-
ção, o engajamento, multiplicando as oportunidades de ter mais êxito, de
sair-se melhor... Um processo positivo permeado de sucessos implanta-se.
Do contrário, corre-se o risco de se transformar em processo derrotista.
• Significa furar bloqueios, superar obstáculos que impedem as evo-
luções e em seguida a reconciliação consigo mesmo, com a escola, com os
formadores, os adultos. Este processo de reconciliação é uma condição
essencial para uma reinserção escolar anterior ou a acompanhar a inser-
ção profissional.
A alternância pode agir neste sentido porque oferece e diversifica os
lugares e os espaços para se testar, empreender, experimentar, manifes-
tar-se, realizar-se, dar-se bem em alguma coisa. Ela torna experiências pos-
síveis tanto no plano familiar quanto profissional ou social.
Ela permite ao adolescente exercitar-se em diferentes níveis: manual,
intelectual, afetivo, relacional... implementando e desenvolvendo então pó-
los de competências diversas, sem ser demasiadamente exclusivos.
O sucesso escolar faz parte de tudo isto. Um sucesso que numerosos jo-
vens talvez nunca experimentaram e que toma assim uma importância
maior. A organização pedagógica se torna responsável, neste caso, para
que os conteúdos e as atividades sejam interessantes, tenham sentido, per-
mitam aprender e dêem um sentimento de utilidade. Os processos de ava-
liação também adquirem uma importância maior para que o jovem possa
viver uma pedagogia do sucesso e da valorização.

Crescer – Ser gente


A adolescência, como já foi dito, corresponde a esta fase da vida na
qual a identidade se afirma e se constrói, na qual a pessoa, que já existe em
cada um, acredita, cresce e se desenvolve em todos os planos.
A alternância pode ser facilitadora deste desenvolvimento pessoal pro-
vocando processos de relações e de distanciamentos, de encontros e de en-
frentamentos com os outros e com as realidades, em outras palavras, de per-
sonalização e de socialização.

94
Em primeiro lugar, em relação aos pais, deve-se vivenciar um duplo
processo de ligação-relação e de distinção-distanciamento. As relações são
ambivalentes, mas o essencial é o diálogo. A alternância pode contribuir
nisto diversificando os campos de experiência do jovem, permitindo-lhe
viver situações de trabalho. Estas constituem mediadores de discussão, su-
portes concretos para a conversa no seio da família a respeito das ativida-
des, das dificuldades, dos sucessos, do relacionamento com os colegas, do
empreendimento, etc. A mesma coisa acontece em relação às atividades do
CEFFA. Tendo vida própria, o jovem logo terá algo a dizer, a trazer para o
seu entorno e para os outros. Mas ao mesmo tempo em que relações com a
família se desenvolvem, impõe-se o distanciamento. Esta é favorecida pe-
los tempos sucessivos de vida profissional e dos tempos escolares. Entra
aqui o papel do internato que garante um distanciamento suave e uma
aprendizagem da vida coletiva.
Além da família, a alternância oferece ao adolescente possibilidade de
encontros, de diálogo com outros adultos e conseqüentemente de confron-
to das gerações entre a experiência existente e aquela a ser feita. O repasse
entre as gerações, a transmissão da memória e da cultura, a ligação entre o
passado, o presente e o futuro, ou seja, a situação no tempo como no espa-
ço representam dimensões essenciais da construção da pessoa.
Esta é favorecida pela multiplicidade de encontros. O encontro com
os outros, como modelo de identificação, é uma condição importante da
construção da identidade, da educação e da orientação. Chegar a ser gente
supõe confrontar-se com os outros e com as coisas para posicionar-se em
relação às realidades e à vida. A alternância oferece estas oportunidades de
confronto com a realidade, com suas sujeições, exigências e os esforços que
ela impõe. Ela permite a confrontação do sonho com a realidade. Estas
condições são importantes para que se elaborem os projetos e a orientação
para que cada um encontre sua bússola interna para orientar-se e não sim-
plesmente ser orientado. Por isto importa também implementar uma peda-
gogia do encontro.
Transformar-se numa pessoa exige um processo dialético de perso-
nalização e socialização (si próprio e os outros). A alternância contribui
nisto. Na estadia no meio, fora do CEFFA, o jovem aprende e se forma
por conta própria, constrói saber e conseqüentemente adquire um poder.
É o processo de personalização. Mas, ao mesmo tempo, opera-se uma so-
cialização através do trabalho com os adultos do meio profissional, pelas
atividades com outros jovens no meio social. No CEFFA, a socialização
surge graças a atividades pedagógicas cooperativas, graças ao grupo, à
vida e atividades socioeducativas. Além do grupo de formação na sala de

95
aula, o grupo de vida constitui um dado superior para a aprendizagem da
vida social e da cidadania.
A pedagogia colocada em prática, suas atividades, seus instrumentos,
bem como as atitudes dos monitores, entram em consideração para acom-
panhar este desenvolvimento. O modelo pedagógico aplicado contribui de
fato mais ou menos ao assumir da pessoa, segundo o lugar e o poder que
este lhe confere e lhe faculta tomar.
Sim, não é abusivo afirmar que a alternância é uma pedagogia da ado-
lescência, porque é uma pedagogia da complexidade. A alternância permite,
de fato, ao adolescente caminhar no coração da complexidade.

Um relacionamento para dar vida à associação

Hoje, como ontem e amanhã, dois fundamentos prevalecem na cria-


ção, desenvolvimento e funcionamento dos CEFFAs: a alternância e a associ-
ação. A alternância define o conceito de formação e sua metodologia peda-
gógica, enquanto a associação dá a cada CEFFA sua base, tanto no que diz
respeito a suas finalidades quanto em seus contornos jurídicos. Porque,
sendo corolários uma da outra, a alternância e a associação diferenciam os
CEFFAs das outras estruturas educativas e lhes conferem sua dinâmica
como movimento de educação popular mais do que como instituição escolar.
Como espaço de liberdade e de poder, a associação é um lugar de palavras,
de expressão e, às vezes, de revelação de si. Ela pode, então, desempenhar
uma função de emancipação, de responsabilização e de engajamento de
seus membros. Neste título, ela representa um espaço de promoção das pessoas e
46
um instrumento de participação na ação social e no desenvolvimento local .
Ela é uma força viva de um território. Pela sua estrutura de estabelecimen-
to, mas, também, pelos seus membros repartidos geograficamente, ela in-
tegra o CEFFA num território e participa de sua vida. Ela percebe suas evo-
luções e suas demandas, participa dos debates, apresenta e faz valer suas
orientações, educativas ou outras. Ela permanece assim diretamente ligada

46. “A associação é a expressão superior da democracia”. Ela é, ao mesmo tempo, efeito


e causa da liberdade e da democracia. “A associação é o lugar de expressão da liberda-
de, o lugar onde se busca encontrar um complemento para sua própria pessoa e reali-
zar um projeto social... Ela tem um papel a desempenhar, não somente para assumir
seu próprio papel de desenvolvimento da vida local e pessoal, mas, também, para po-
der realizar seu papel de contribuição e de participação na vida pública. Em outros ter-
mos, a associação é o quadro insubstituível da participação. Ela contribui para a parti-
lha do poder, desenvolvendo o poder de cada um, sua capacidade de cidadão”, segun-
do B. Lory, “L’association, base du développement des personnes et des milieux” (Do-
cuments UNMFREO, n. 104, 1976. Paris, apud GIMONET, J.-C., 2001).

96
às realidades e limita os riscos de isolar-se em si mesma, em seus progra-
mas e com seus formadores.
Mas a associação assume, também, uma função de regulação da alternân-
cia. De fato, a alternância congrega e coloca em contato forças institucio-
nais diversas: as instituições familiares e socioprofissionais de um lado, e a
instituição educativa, o CEFFA, do outro. Estes vários conjuntos, com preo-
cupações, às vezes contraditórias, podem enfrentar-se: o educativo e o êxi-
to de seu filho para a família, o econômico e a produção-realização para o
empreendimento, a transmissão dos saberes acadêmicos e a formação/qua-
lificação de um grupo-classe para o CEFFA. Entre estes conjuntos, encon-
tra-se o alternante que caminha e vive sucessivamente em um e outro.
Cada um destes conjuntos precisa poder existir como tal, com suas ca-
racterísticas, sua identidade e objetivos próprios. Mas, ao mesmo tempo,
deve existir em relação aos outros conjuntos. Por isto, segundo o peso de
um ou de outro, o sistema de formação terá, em termos de objetivos e de
procedimentos, uma coloração particular. A alternância projeta, assim, até
mesmo amplia a relação de poderes: poder das famílias, poder do organis-
mo ou instituição de formação, poder dos meios profissionais, poder dos
formadores, poder da administração, poderes políticos ou de outras insti-
tuições... Segundo o modo de organização ou o tipo de estrutura responsá-
vel, um destes poderes pode se tornar dominante e, em seguida, um dos
parceiros pode fazer levar em conta suas preocupações ou impor suas exi-
gências. Contrapoderes, instâncias de controle e de regulação, nesse caso,
se fazem necessários para equilibrar o sistema. Os desafios da alternância
têm este preço.
Para os CEFFAs, a associação desempenha essa função. Ela agrupa as
diferentes instituições em presença e constitui assim a instância respon-
sável, de expressão, de concertação e de regulação. Ela é o instrumento
maior da ambição educativa dos CEFFAs. Enquanto entidade jurídica, ela
confere às famílias e outras pessoas interessadas e/ou envolvidas pelo pro-
jeto associativo o poder de criar e gerir um CEFFA, cuja responsabilidade
assumem no plano legal, financeiro e moral. Mas ela lhes dá também o po-
der de debater e de elaborar os projetos e orientações pedagógicos, educa-
tivos e promocionais do CEFFA em cooperação com o diretor e a equipe
educativa.
A associação é, desta maneira, para cada CEFFA, um componente di-
nâmico para ser vivido e tornar vivo. A estratégia associativa está em ques-
tão aqui. Ela se mede pelo programa de atividades e de realizações: reu-
niões, animações, comissões, manifestações... A ação do Conselho de Ad-
ministração, bem como a do diretor, é, neste sentido, essencial. Na medida

97
em que uns e outros adquiriram a dimensão do movimento e de seus valo-
res, na medida em que têm consciência das razões profundas e do alcance
dos engajamentos associativos, agem e animam a associação, numa visão
de promoção de seus membros. Mas seu acompanhamento, sua formação,
neste sentido, se reveste de grande importância.
A implicação dos pais e mestres de estágio na formação dos jovens e a
qualidade do relacionamento mantido pela equipe educativa são fatores
de participação e engajamento na vida associativa. A vitalidade de cada as-
sociação se percebe na dinâmica de participação de todos os parceiros en-
volvidos na formação e nas atividades do CEFFA.

Conclusão

Os CEFFAs devem seu êxito à diversidade de atores que implicam, à


valorização que lhes proporcionam, à densidade dos elos que sua estrutura
e seu funcionamento estabelecem entre eles. Estes atores representam to-
dos os recursos humanos que cada um ambiciona promover. Mas o êxito
depende também do fato que, além das ações e promoções individuais, é a
ação do grupo, a ação em equipe que prevalece. Os CEFFAs são, de fato,
algo de grupos e equipes: o grupo dos pais e dos alternantes de cada pro-
moção, a equipe de administradores e a pedagógica. A qualidade do traba-
lho de cada uma destas estruturas sociais reflete sobre o êxito de seus mem-
bros e sobre os outros. Ela representa, para os jovens, um exemplo de tra-
balho em comum que, além dos discursos, torna-se um ato educativo por-
tador de sentido.

98
CONCLUSÃO DA PRIMEIRA PARTE

Conseguir êxito na Pedagogia da Alternância supõe desfazer-se de es-


quemas clássicos do ensino para dar vida a um sistema pedagógico novo. Novo
porque derruba os muros da escola para utilizar os saberes e os suportes de
aprendizagem da vida. Novo porque o alternante não é mais um aluno na
escola que consome passivamente saberes de um programa, mas um ator
socioprofissional que constrói sua formação. Novo porque os pais, bem
como os mestres de estágio, tornam-se parceiros co-formadores. Novo
porque o dispositivo pedagógico compreende uma variedade de ativida-
des e de instrumentos apropriados ao processo de alternância. Novo por-
que o CEFFA não é somente um espaço de ensino mas uma estrutura de
vida educativa. Novo porque os monitores não são docentes tradicionais,
mas animadores de formação, generalistas, mais do que especialistas disci-
plinares, na escuta dos saberes do meio vivencial e dos alternantes como
daqueles dos programas acadêmicos. Novo, ainda, porque a vida do CEFFA,
suas orientações e sua política de formação se colocam sob a responsabili-
dade da associação dos pais, dos responsáveis profissionais e de outras pes-
soas interessadas pelo projeto do CEFFA. Novo, enfim, porque a ambição
reside, através da educação dos adolescentes, em contribuir com as evolu-
ções e desenvolvimentos dos territórios.
Inscrever-se nesta novidade não é fácil. É preciso ter vontade, energia,
com certeza, mas, também, modéstia e uma armadura metodológica com
suas ferramentas e sua organização. É necessário, também, melhor do que
estruturas burocráticas em demasia, relações densas entre os atores para
que possa viver o novo sistema engendrado pela Pedagogia da Alternância.
Precisa, ainda, não ficar preso na sua prática quotidiana, mas ir ao encon-
tro da compreensão de sua complexidade.

99
SEGUNDA PARTE
Compreender a Pedagogia da Alternância

Compreender é conseguir dominar em pensamento as


situações até resolver os problemas que elas colocam...
Jean Piaget

Introdução

A primeira parte deste livro, dedicada mais à implementação da Peda-


gogia da Alternância, contém, é evidente, elementos de sua compreensão.
Não poderia ser diferente, já que o êxito e a compreensão vão lado a lado e
importa “ser bem-sucedido em pensamento e compreender em ação”. To-
davia, esta segunda parte propõe ir mais além na compreensão, através de
alguns elementos de generalização e conceitualização.
Trata-se, antes de mais nada, de situar o lugar da alternância no ho-
rizonte educativo, demonstrando sua especificidade nas correntes da
pedagogia.
Em seguida, num outro capítulo, convém delinear-lhe os contornos e
os componentes, porque a alternância, em pedagogia, tornou-se uma recei-
ta qualquer, utilizada, às vezes, a torto e a direito, quando não é para ven-
der formação. Como já dizia um autor há muitos anos: “A alternância: con-
ceito de sorte ou sorte de um conceito?”
O texto desenvolvido a seguir aborda a delicada questão das aprendi-
zagens. De fato, a formação alternada, ao possibilitar uma caminhada no
coração da complexidade, representa, talvez, mais do que a escola tradicio-
nal enclausurada nos seus muros, uma via de aprendizagens multifuncio-
nais, ou seja, de formação integral da pessoa.
A abordagem da compreensão ficaria imperfeita se não fosse examina-
da a função dos animadores-formadores da Pedagogia da Alternância, ou
seja, as monitoras e os monitores. Eles são os agentes principais do sistema
de formação, com um estatuto e papéis específicos. Exercem uma profissão

101
diferente na área da formação, o que exige uma formação específica, mas,
também, um reconhecimento.
Numerosas referências bibliográficas são dadas ao longo das páginas,
que permitem entrar, cada vez mais, na complexidade deste método de
formação, que está longe de ter desvendado todos os seus segredos.

102
5
A ALTERNÂNCIA NO HORIZONTE EDUCATIVO

Os muros e as portas das escolas não podem mais


representar meios para uma separação e mesmo para um
isolamento. Se a função dos muros é de proteger, a das
portas consiste essencialmente em evitar-lhes os excessos,
sendo ela abertura e não fechamento. A soleira deve ser
passada; tanto para que o jovem saia e que o mundo
penetre, areje e renove uma atmosfera que pode se tornar
muito rapidamente confinada. O papel da instituição
educativa, ao contrário de limitar o encontro e a
informação, é, sim, de facilitá-la, organizando-a e
valorizando-a.
André Duffaure

Vocês acham suas aulas indispensáveis. Elas lhes conferem


majestade. Só a observação e a experiência são formadoras.
Todo o resto é só ilusão.
Célestin Freinet

O pensamento educativo e as concepções de ensino traçaram cami-


nhos os mais diversos desde a noite dos tempos. Escolas, instituições, siste-
mas, correntes se delinearam, nasceram de século em século e perduraram
mais ou menos. Uns se basearam sobre a ordem, a organização, a prescri-
ção e os papéis dos mais velhos sobre as gerações mais novas, e outras sobre
uma maior liberdade e responsabilidade daqueles que se formam. Os con-
frontos foram permanentes entre os detentores destas concepções opostas.
Perduram ainda, mesmo se hoje – com o surgimento das Ciências da Edu-
cação, o desenrolar da formação ao longo da vida, as novas técnicas da in-
formação e da comunicação e outras evoluções tecnológicas – uma mescla
se opera entre as diferentes tendências. A alternância, ao penetrar as práti-
cas pedagógicas e educativas, contribui, sem dúvida, há algum tempo, para
mexer nas idéias e estruturas vigentes. Por isto mesmo é interessante e útil
examinar sua situação no campo atual da formação.
Para fazer isto é conveniente passar em revista as diferentes correntes a
partir de uma grade de leitura de toda situação educativa.

103
Os componentes de uma situação de formação

Qualquer situação de formação é fruto de um conjunto de elementos ou


componentes em interação. Constitui um sistema cada vez diferente segun-
do o “estatuto” (finalidades, conteúdo, importância, posição...) dado a cada
elemento e segundo o agenciamento de uns e de outros.

1. As pessoas em formação
Da criança na escola maternal ao adulto em formação permanente, to-
das as faixas da vida se fazem presentes nos sistemas de formação. Qual-
quer que seja a idade, é sempre um ser humano que está no centro do de-
bate, cada um com suas características próprias:
• uma identidade em esboço, em construção ou já firmada e, às vezes,
atribulada e em desequilíbrio;
• capacidades, potencialidades natas e adquiridas e sempre em via de
outras aquisições, de atualização ou de aperfeiçoamento, com especi-
ficidades e dominantes, naturezas e graus de aprendizado variáveis,
pontos fortes, talentos, lacunas...
• desejos, motivações diversas e mais ou menos fortes;
• um contexto de vida familial, social, cultural, profissional, ambiental...
• um ser em situação de aprendizagem motora, afetiva, social, cognitiva...
• com experiências próprias, passadas e presentes, nestes diversos planos;
• com um imaginário, projetos balbuciantes ou já entrevistos, até mes-
mo definidos, pelo menos provisoriamente.
• ou seja, em definitivo, uma criança, um adolescente ou um adulto
singular e situado numa trajetória de vida com um passado, uma histó-
ria e experiências de influências benéficas ou limitantes, um presente
com seus efeitos, um futuro mais ou menos portador de esperança.
Trata-se aí de componentes psicológicas de qualquer situação de forma-
ção. Coloca-se em seguida, fundamentalmente, a questão do olhar, da consi-
deração dados e percebidos por cada um: um anônimo, um indivíduo de um co-
letivo ou uma pessoa singular... Um objeto, um sujeito, um ator? Como
cada um se ressente? Como um aluno que precisa ser “criado” com todas as
relações de dependência “mestre-aluno” decorrentes ou como “alguém”
que tem nome, sobrenome, uma originalidade. A posição psicossocial que
está sendo atribuída e ressentida forma um componente importante de qual-
quer processo educativo. Trata-se aí de uma questão fundamental que per-
mite, desde já, perceber diferenças nas concepções pedagógicas.

104
2. A família e o ambiente de vida
A criança, o adolescente ou o adulto, dentro de uma estrutura de for-
mação, não está só. Vive num contexto familial, social, ambiental, cultural,
profissional... Todos os elementos deste contexto são espaços essenciais para
a construção de sua identidade, de suas aprendizagens, de seu desenvolvi-
mento. Cada um sabe que as aprendizagens mais essenciais são aquelas da
infância, desde o nascimento e mesmo antes, através de todas as impregna-
ções do meio e da cultura ambiente. Cada “educando” pertence a uma cul-
tura com sua linguagem, suas tradições, seus costumes, seus modos de pen-
sar e de ser... A escola, a atividade pedagógica, não escapa desta pertença.
Quando não é considerada surge um corte entre a vida e a escola, e cria-se
uma distância entre elas do ponto de vista cultural, com todas as conse-
qüências conhecidas como o fracasso escolar e a confusão que traz.
O grau de consideração do ambiente pelo meio escolar constitui uma se-
gunda diferenciação maior entre as correntes pedagógicas.

3. O grupo-classe
Cada um, no seio da estrutura de formação, não é, também neste caso,
um indivíduo isolado. Encontra-se num grupo com todos os jogos afetivos,
interativos, conflituais... que existem com os colegas e as colegas, aqueles
ou aquelas privilegiados pelos sentimentos amigáveis ou amorosos, aque-
les e aquelas que são escolhidos ou, mais ou menos, rejeitados... O grupo
constitui este complexo psicossocial no qual se constroem os “Eu”, os “me” e
os “se” através da dialética do “Eu” e “Nós”, do “se e dos outros”, ou seja,
pelos processos da personalização e da socialização. O grupo representa, desta
maneira, um espaço maior de construção da personalidade, do aprendiza-
do social, mas, também, cognitivo, se os saberes de uns e de outros estão
sendo partilhados e confrontados nos atos pedagógicos.

4. A instituição e seu projeto


A organização ou instituição mestra-de-obra de uma formação lhe dá
sentido através de um projeto educativo subjacente. Mesmo sem semelhanças
entre si, grandes categorias podem ser delineadas, considerando as finali-
dades perseguidas. Desta maneira, podem-se distinguir três grandes ori-
entações:
• a formação geral (ou ensino, instrução) em diferentes níveis: mater-
nal, primário, secundário e superior;
• a formação profissional em diversos patamares;
• a formação contínua, com níveis e formas variáveis, para adultos, ao
longo da vida.

105
Cada orientação implica numa problemática específica que pode ser exa-
minada em relação:
• Às finalidades propostas, ou seja, às dimensões da pessoa que a institui-
ção procura desenvolver: cognitiva, psicomotora, afetiva, social...
• Aos campos de saber ou de cultura privilegiados.
• A seu modo de funcionamento e à sua organização administrativa, ou
seja, em outras palavras, à sua margem de manobra, a seu grau de au-
tonomia. Este representa uma condição maior para a implementação
pedagógica, para a implicação e a responsabilização dos atores. Ou
seja, nestes termos, um outro elemento de diferenciação das organiza-
ções pedagógicas.

5. Os conteúdos e os programas
O saber em jogo na situação de formação está, evidentemente, ligado
às finalidades e ao nível requerido. Existe um saber comum, programas co-
muns ao sistema educativo geral no qual cada instituição está inserida e
que proporciona um quadro geral. Todavia, juntando-se à questão da au-
tonomia, cada instituição negocia ou não o programa, tendo em vista suas
orientações:
• No desenvolvimento dado a cada conteúdo: reduzir alguns para am-
pliar outros.
• Na sua forma de distribuição, ou seja, sua organização em termos de
Plano de Formação. Importa, a este respeito, diferenciar o programa do
1
Plano de Formação . O primeiro constitui um catálogo de noções geral-
mente apresentado e distribuído sob a forma de disciplinas justapostas,
umas ao lado das outras, sem hierarquização. O segundo é a orquestra-
ção do processo de formação, ou seja, dos conteúdos e dos métodos se-
gundo uma lógica pedagógica determinada que visa pôr em relação e
associar os campos de saberes, os conteúdos tratados. Outra diferença
entre as instituições de formação.

6. Os métodos
São ligados às finalidades perseguidas pela instituição e às prioridades
que esta dá nas dimensões a serem desenvolvidas na pessoa. Por isto:
• Se a prioridade é dada aos saberes e às aprendizagens cognitivas, são,
geralmente, os métodos transmissíveis do ensino que são privilegiados. Um

1. Cf. cap. 3.

106
professor detém o saber e o transmite aos alunos. Este procedimento dire-
tivo transforma o aluno em “objeto” de ensino. Encontra-se na tradicional
triangulação “Professor – Saber – Aluno”. Às vezes, o professor é substituí-
do por uma tecnologia, mas o processo de transmissão permanece pratica-
mente o mesmo.
• Se a prioridade é dada à pessoa e se uma visão de desenvolvimento
global, de formação integral, e não somente intelectual, está sendo traba-
lhada, a concepção pedagógica tende a situar o “educando” como sujei-
to-ator de sua formação, que aprende, pesquisando e construindo. Preva-
lecem, então, os métodos ativos e de apropriação que privilegiam o processo de
produção de saberes através da pessoa, mais do que um simples consumo de
informações pela mesma.

7. A organização da sala e os planejamentos


Evidentemente, são ligados aos métodos implementados. Os métodos
transmissíveis requerem uma organização clássica da sala de aula, por filas,
em frente do docente. Ao contrário, os métodos ativos e participativos exigem
uma disposição que facilita a troca, a comunicação, as interações, o trabalho
em grupo (organização por grupinhos, círculos, e outras...).
Do mesmo modo, a concepção dos planejamentos não pode ser idênti-
ca. No primeiro caso, os planejamentos de ensino são divididos em faixas-ho-
rários correspondendo às disciplinas. No outro caso, prevalecem planeja-
mentos de aprendizado, organizados em faixas de tempo maior para criar uni-
dades de aprendizagens e de animação pedagógica, com uma variedade de ativi-
dades. Os planejamentos deste tipo preocupam-se também com os ritmos
biológicos da criança ao longo do dia, até mesmo da semana.

8. Os “formadores”
Seu estatuto e seus papéis são, evidentemente, diferentes segundo as ori-
entações pedagógicas e sua denominação é fruto disto: mestre, docente,
professor aqui; educador, monitor, tutor, animador da formação... ali.
Além da denominação, embora esta já seja portadora de sentido, são os
papéis desempenhados e predominantes que importam: papéis de ensino,
de educação, de acompanhamento, de ajuda... variáveis em função das fi-
nalidades da instituição e da concepção que cada “formador” ou “educador”
se faz de sua função.
Para concluir, todos estes componentes de uma situação de formação se
encontram interdependentes e interagindo. Por isto, pode ser representa-
do da seguinte forma:

107
Representação esquemática de uma situação de formação

O grupo classe

A família
O ambiente
Os “formadores”
Estatuto e papéis

A instituição A pessoa em
O projeto formação
educativo

A organização da
classe
Os conteúdos Os planejamentos
Os programas Os métodos
As técnicas

NB. Para não tornar esta representação gráfica pesada demais, algu-
mas setas não foram colocadas. Todavia, cada pólo depende e interage
com todos os outros.
Decorre deste conjunto uma complexidade a ser gerida no seio de um
sistema que tem uma coerência em função de uma orientação educativa.

As correntes pedagógicas

A análise das estruturas de formação deixa transparecer três grandes


tendências ou três grandes correntes nos funcionamentos pedagógicos e
institucionais. A saber:
• a corrente da pedagogia tradicional centralizada no programa e no
docente;
• a corrente da pedagogia ativa centralizada na pessoa em formação;
• a corrente da pedagogia centralizada na realidade que pode também
ser chamada de corrente da pedagogia da complexidade e na qual se
situe a Pedagogia da Alternância.
Estas várias correntes pedagógicas se cruzam com concepções de apren-
dizagem tais como vão ser desenvolvidas em seguida.

A pedagogia tradicional ou corrente pedagógica centrada no docente e no


programa

É a mais presente no tempo e no espaço. Caracteriza-se pela primazia


dada ao programa, e, conseqüentemente, aos saberes a serem ensinados para

108
atingir a cultura e os degraus de conhecimento sancionados pelas provas
de cada ciclo. O modelo mais elaborado, nesta matéria, é aquele estabeleci-
2
do pelos jesuítas, no século XVI, na Europa Ocidental . O desenvolvimento
da instrução obrigatória na França, no fim do século XIX, inscreveu-se nes-
ta corrente. Representa, em todos os países do mundo, o modelo habitual
dos sistemas educativos estatais e, geralmente, é defendido pelos seus cor-
pos constitutivos. Corresponde a uma organização escolar de tipo racional, bu-
3
rocrático e diretivo . Assim:
• o programa é um conjunto de disciplinas justapostas e a ensinar segun-
do a lógica própria de cada uma ao longo do ciclo de formação. O pro-
grama e a programação, então, se confundem;
• Os ensinamentos disciplinares são justapostos uns aos outros, levando a
um parcelamento dos saberes;
• O docente e o programa se confundem do mesmo modo, porque, nes-
ta lógica, o melhor docente é aquele que conhece melhor o programa,
ou seja, os conteúdos de sua disciplina. Na França, a qualificação mais
elevada neste sentido é a agregação que atesta maior qualificação num
campo de saberes. O docente, com o estatuto de professor, é, essencial-
mente, disciplinar. O trabalho em equipe pedagógica, deste modo,
não é exigido e só pouco praticado.
• Os métodos transmissivos, até mesmo ex-cathedra, mais utilizados, exi-
gem do estudante qualidades receptivas de atenção, de escuta e de abs-
tração e, além do mais, se as noções são ensinadas para elas mesmas e
sem ligação com os conhecimentos da vida. O “Mestre” ensina e o “alu-
no” segue e se adapta a ele e ao programa.
• No ensino secundário, os locais são distribuídos em classes atribuídas
aos professores. Deste modo, são os alunos que se deslocam de uma sala
para outra em função das aulas. A classe está sendo organizada em filei-
ras de mesas face ao quadro e ao docente. É bom notar que, algumas dé-
cadas atrás, um estrado reforçava a posição e o poder deste último.
• O planejamento semanal organizado, principalmente com horários
4
de aulas por disciplina, ou planejamento de ensino , permanece, geral-

2. Cf. La pédagogie des jesuites (1548-1762). In: CHATEAU, J. (org.). Les grands péda-
gogues. Paris: PUF, 1966.
3. Um autor francês, J. Houssaye, afirma neste sentido: “Para fazer bem o seu trabalho,
o docente de hoje pode contentar-se em aplicar, da maneira mais inteligente possível,
as diretrizes, cada vez mais precisas e inscrevendo-se numa organização mais e mais pu-
xada e pré-programada.”
4. Cf. cap. 3.

109
mente, o mesmo durante o ano inteiro. O emprego do tempo dos alu-
nos, sem variações, é do tipo repetitivo.
• As relações com as famílias são fracas e consistem, essencialmente, em
acertos sobre o percurso da criança e os resultados escolares, mesmo
se, às vezes, certos estabelecimentos garantem algumas reuniões infor-
mativas no início ou durante o ciclo.
• Enfim, observa-se, nesta concepção, o grupo. Como componente
educativo e de aprendizagens não é, ou muito pouco, levado em conta.
A melhor classe é aquela que apresenta um caráter de homogeneidade de
níveis e de cultura.
Esta orientação pedagógica tem seus valores, mas, também, seus gran-
des limites. Por isto, pode-se dizer que ela costuma propulsar ou expulsar.
Ela propulsa 30 a 35% da população escolar, ou seja, aquela que tem possi-
bilidade de abstração imediata e que não se encontra por demais fora do
seu meio cultural. De outro lado, ela deixa na beira da estrada um grande
número de crianças e de adolescentes, com todas as conseqüências nefastas
do fracasso escolar. Por isto, ela se torna uma pedagogia elitista.

A pedagogia ativa ou corrente pedagógica centrada na pessoa

Ela vai à contracorrente da anterior e inversa à lógica, colocando pri-


meiro a criança ou o adolescente que aprende, se forma e se educa. Por isto, se dis-
se, a seu respeito, que se tratava de uma “revolução copernicana”, ou seja,
uma mudança radical operada nas mentalidades por uma concepção nova.
Esta orientação pedagógica acentua a autonomia da criança e sua especifi-
cidade em relação ao adulto.
• O projeto educativo considera o “educando” na globalidade de seu ser,
seus ritmos biológicos, seu percurso de vida e se prende ao desenvolvi-
mento do conjunto de suas capacidades. Está se tornando “um sujeito”.
O trabalho pedagógico e educativo mexe, então, todo de vez, nas di-
mensões intelectuais, cognitivas, psicomotoras, afetivas, sociais...
• O programa inscreve-se, em seguida, num Plano de Formação con-
cebido segundo lógicas e procedimentos próprios ao tipo de pedago-
5
gia implementada . Os materiais de formação encontram-se na escola
(nos livros, documentos, atividades vivenciadas na sala...), mas, tam-
bém, na vida da criança no seio da família, de seu ambiente físico, so-

5. Cf. as pedagogias de Decroly, Cousinet, Freinet, Montessori, Steiner, Neill... na Eu-


ropa, de Dewey na América do Norte, de Paulo Freire no Brasil.

110
cial, cultural, profissional... advindo, desta maneira, a abertura da esco-
6
la sobre a vida .
• Os métodos são, essencialmente, ativos e de apropriação, para ajudar e
conduzir a criança ou adolescente na busca e na construção do seu saber e
de suas aprendizagens. Alternam as aulas e as pesquisas documentais, a
elaboração de dossiês e as exposições, o trabalho pessoal e em grupos,
as atividades intelectuais e físicas, a concentração e a diversão... A sala
de aula parece mais uma oficina, um espaço de ação, de expressão e de
cooperação do que um ambiente fechado onde prevalecem, essencial-
mente, a escuta, o silêncio e o trabalho individual.
• Nesta lógica, o docente e o programa se adaptam ao aluno. Por isto, o
melhor “mestre” não é aquele que possui mais saber, mas aquele que é
pedagogo, bem como conselheiro, facilitador, acompanhante/tutor e
docente, quando necessário.
7
Esta corrente pedagógica é a da escola nova, da qual R. Cousinet foi um
dos iniciadores e porta-voz. Apareceu na França e na Europa no início do
século XX.

A pedagogia centrada na realidade ou pedagogia da complexidade

A palavra “realidade” foi utilizada para situar esta terceira corrente da


pedagogia que considera todos os componentes da vida da pessoa e da instituição
escolar como cadinho de formação e de educação. Todavia, esta noção de “reali-
dade” não está totalmente adequada porque a realidade não é visível. Só se
percebe de modo parcial, insuficiente ou errônea. Além disto, a realidade é
uma representação que cada um se faz do real e não se reveste da mesma
significação ou valor de uma pessoa para outra. Por isto, convém conside-
rar a palavra “realidade” no sentido da complexidade, como E. Morin a defi-
8
niu. A saber: “...um tecido de constituintes heterogêneos inseparavelmen-
te associados (como numa tapeçaria). O mundo é um tecido de aconteci-
mentos, de ações, de interações, retroações, determinações, acasos, incer-
tezas e contradições... Supõe articular, distinguir sem separar, associar sem
reduzir. Coloca o paradoxo do um e do múltiplo, mas, também, que o todo

6. Decroly tinha colocado sua escola sob o slogan “A escola para a vida e pela vida”.
7. Este pedagogo colaborou, de maneira estreita, com as MFR (CFR) na fase da constru-
ção de sua pedagogia (cf. o cap. 1).
8. A etimologia da palavra “complexo” nos ensina que: a raiz latina plexus significa en-
trelaçamento. Ela engendra complexus que significa emaranhado, conexão, abraço,
aperto.

111
é mais que a soma das partes. E, ainda, que se misturem a ordem, a desor-
9
dem e a organização como em qualquer sistema vivo” .
Este é, de fato, o sentido desta corrente pedagógica que envolve e su-
pera as duas anteriores. Ela se aproxima da segunda, mas é mais ampla. De
fato, a corrente da pedagogia ativa tende colocar a criança em situações
mais favoráveis para aprender e, conseqüentemente, fabricar realidade
simplificada, adaptada à criança, entre as paredes de uma escola. A reali-
dade da vida é outra e mais ampla que a da escola. Ela exige o enfrenta-
mento das obrigações, das dificuldades, do que agrada como desagrada...
Ela pede do educando não somente uma simples observação do ambiente,
mas uma implicação de sua parte para agir onde se encontra. A realidade da
vida é e constitui toda a complexidade presente em qualquer situação de
formação, como foi dito no início deste capítulo. A saber, aquilo que cons-
trói a vida de todo ser humano, aquilo a partir do que ele vai se construin-
do, se desenvolvendo, crescendo... Ou seja, para retomar o modelo de J.J.
10
Rousseau e atualizado, hoje, por G. Pineau: si mesmo, os outros e as coisas . O
desenvolvimento da formação permanente e ao longo da vida que faz com
que não se coloque um adulto na escola, segundo o entendimento tradicio-
nal, o impulso das novas tecnologias da informação e da comunicação que
difundem, amplamente, as informações e os saberes, os progressos das
ciências da educação e outras mudanças significativas, impuseram uma ou-
tra pedagogia, necessariamente, de caráter complexo, tornando as pessoas impli-
cadas e responsáveis. A emergência da alternância amplia o desenvolvimento
desta terceira corrente pedagógica.

A emergência da Pedagogia da Alternância


11
Experiências de longa data

A alternância não é de ontem. A aprendizagem das profissões aconte-


ceu durante muito tempo por imitação e transmissão direta no terreno da
prática. Sem dúvida, alguns processos de alternância entre a teoria e a prá-
tica existiram em tempos mais recuados, mas é na Idade Média que um de-
les aparece, na França, com o compagnonnage – ou seja, um tipo de associa-
ção que visa a instrução profissional e a ajuda mútua, uma corporação. O
aprendiz-companheiro se forma através da prática num canteiro ou numa

9. MORIN, E. Introduction à la pensée complexe. Paris: ESF, 1990.


10. PINEAU, G. Temporalidades na formação. São Paulo: Triom, 2004, p. 156.
11. Cf. BOURGEON, G. Sociopédagogie de l’alternance. In: Mésonance, n. 2, 1979. •
MAURECOURT & GEAY, A. L’école de l’alternance: alternance-développements. Paris:
L’Harmattan, 1998.

112
oficina, em alternância com uma formação “teórica” dada por companhei-
ros-docentes em casas de acolhimento e de vida. A alternância se vive também
através da “Volta da França” que faz o companheiro peregrinar de uma ci-
dade para outra a fim de multiplicar a descoberta de práticas e de habilidades
manuais diferentes que contribuem para acumular uma grande experiência e
conhecimento da profissão. As grandes catedrais francesas são obras dos com-
panheiros da Volta da França. Esta experiência continua até hoje.
De outro lado, nos séculos XVI e XVII, numerosas iniciativas surgem
para a instrução das crianças do povo, abandonadas e míseras, para as quais
as formas tradicionais de instrução não traziam respostas. Deste feito, mui-
tas idéias foram lançadas, formas de escola criadas para abri-la sobre a vida e a
realidade, para aproximar a formação do trabalho produtivo, ou baseá-la sobre
a observação e a implicação no ambiente natural e social.
Neste sentido, nos séculos XVII e XVIII, os irmãos das escolas cristãs ou
lassalistas levam em frente uma ação louvável para a instrução gratuita das
crianças pobres. Criam, entre outras, “a escola dominical” para jovens que,
trabalhando a semana toda, só tinham o domingo para aprender. Aí rece-
bem uma sólida instrução que pode auxiliá-los na profissão que exercem. A
teoria está, desta maneira, associada à prática. Em seguida, este ensino
prático vai se tornar uma verdadeira formação técnica no seio de estabele-
cimentos que acolhem, em pensionatos, crianças que se afastam ou são ex-
12
cluídas do ensino tradicional .
Do outro lado, é interessante observar que uma das grandes escolas
francesas, sempre atual, a escola “das pontes e estradas”, foi fundada, nos
meados do século XVIII, baseada na alternância. Os alunos engenheiros vão
aprender fora da escola, junto a mestres em arquitetura e realizando missões
e trabalhos práticos na realidade. Cada um comunica, em seguida, aos ou-
tros membros de sua promoção, os conhecimentos adquiridos. Existe, assim,
13
ao mesmo tempo, autoformação e mútuo ensinamento .
Em seguida, com a industrialização, vão nascer “as escolas industriais”
para atender, ao mesmo tempo, as demandas por instrução e por um novo
desenvolvimento. Querem ser uma resposta às necessidades vitais das cama-
das populares, através do trabalho produtivo, único capaz de tirá-los da misé-
ria. Então, a fim de preparar as crianças para o trabalho produtivo, escolas as-
sociam o ensino elementar e o trabalho manual em fábricas. Trata-se, deste
jeito, de juntar o estudo e a vida em uma só formação.

12. Estas escolas são obra de João Batista de La Salle.


13. Cf. MICHEL, J. A l’école des ponts et chaussées: stages et alternance – Expérience
d’hier et d’aujourd’hui. In: Éducation et alternance. Paris: Edilig, 1982.

113
14
Neste mesmo tempo, numerosas outras experiências , mais ou menos
duradouras, nascem para uma verdadeira educação das crianças, mais do
que para uma mera instrução. Tem em comum associar, segundo formas va-
riáveis, a vida da criança, suas atividades de trabalho a partir de certa idade e
o ensino da escola. Algumas destas escolas, de outro lado, inscrevem-se
15
numa problemática de desenvolvimento do meio onde são implantadas .
Com a chegada da época industrial, vai aparecendo, no século XIX, “a
escola socialista do trabalho” e “a escola liberal”. A primeira busca suas
idéias em K. Marx, cuja teoria da educação é de unir a educação ao traba-
lho que, segundo ele, apresenta um imenso potencial formativo e educati-
vo e permite ao homem realizar-se, criar “um homem novo”. Não se trata
de criar, de completar uma instrução intelectual geral com atividades ma-
nuais, práticas ou com uma simples formação técnica, mas, a partir do tra-
balho, realizar “uma educação politécnica” na visão de uma produtividade
“útil” desde a infância. A implementação das teorias de K. Marx sobre a
educação foi operada por seus discípulos e, entre outros, por A.S. Maka-
renko, que cria “as colônias de trabalho”, desviadas de seus objetivos e de
suas práticas por pressões ideológicas.
Paralelamente, desenvolve-se na Europa a escola liberal que se institu-
cionaliza na França sob a III República no final do século XIX. Premissas de
alternância apontam no final deste século e na primeira metade do século
XX no que diz respeito às aprendizagens de profissões. De fato, duas grandes
orientações se apresentam, e até se opõem: uma dando prioridade à apren-
dizagem pelo trabalho prático e outra, dando uma preferência à formação
teórica. Com a industrialização e suas exigências técnicas cada vez mais for-
tes no final do século XIX, uma necessidade maior de instrução geral (ler,
escrever, contar) se impõe. Por isto, progressivamente, a escola toma cada
vez mais importância em relação à aprendizagem no terreno da prática.
Trata-se de ensinar os saberes teóricos que preparam para a profissão. O en-
sino prático só se torna uma aplicação do ensino teórico e a escola se opõe ao
tempo da aprendizagem prática. Assim, a ordem “teoria-prática” torna-se
um dos dogmas do ensino ocidental. Várias formas de escola aparecem, en-
tão, sucessivamente: escolas de aprendizes nas oficinas, escolas manuais de
aprendizagem que cedem um espaço tão importante aos conhecimentos ele-
mentares e técnicos quanto ao trabalho manual, depois, as escolas profissio-
nais, nas quais o ensino técnico ocupa o lugar principal. Mas estas últimas

14. Nota-se a ação de R. Owen na Inglaterra, a de Pestalozzi, o chamado pai da pedago-


gia moderna e o precursor da Educação Nova na Suíça, de J.F. Oberlin, na França.
15. Observa-se, no final do século XVIII e início do século XIX, as experiências de H.
Pestalozzi na Suíça e na França e aquelas de Oberlin na França.

114
vão se afastar, cada vez mais, do meio profissional e dar um ensino em si. Ao
lado destas escolas vai se desenvolver a aprendizagem das profissões que
concede a primazia ao saber-fazer prático no seio das empresas, com um
complemento de algumas horas de formação teórica durante a semana.
Na Europa, a Alemanha desenvolveu um forte sistema de aprendiza-
gem sempre de atualidade: o sistema dual. Associa, de maneira estreita, as
empresas e a escola para uma formação geral junto a uma formação práti-
ca. Diz respeito tanto aos primeiros níveis do ensino profissional quanto
aos níveis superiores para a formação de engenheiros. Disto resulta uma
integração profissional maior dos jovens que saem do sistema escolar.
E depois apareceram, na França, as Maisons Familiales Rurales (Casas
16
Familiares Rurais) , que representaram a fórmula mais significativa de for-
mação por alternância. Foram ignoradas durante muito tempo, até mesmo
desprezadas, até que um jornalista de um grande quotidiano francês desta-
cou a sua experiência, em abril 1968, com o título: “A Assembléia Geral das
Maisons Familiales Rurales de aprendizagem rural – Defesa em favor do en-
17
sino em alternância” . Desta maneira, a alternância saiu um pouco da sombra,
embora sem ter ganho ainda suas letras de nobreza.
Uma conversa de universitários, no mês anterior, sobre o tema “uma
outra escola”, ao denunciar as enormes carências do sistema escolar e ao
afirmar a necessidade de profundas transformações, tinha começado a
abalar o sistema. Falava-se, de fato, de um ghetto escolar e universitário, de-
sacreditado na maioria dos países industrializados (França, Estados Uni-
18
dos, Suécia...) . Na França se sucederam conversas sobre a problemática da
ligação entre a vida ativa e a formação ou entre o aparelho de produção e o aparelho
de formação. Um destes, em 1973, sobre “O ensino superior em alternância”
contribuiu para fazer avançar o conceito. Uma dupla crise – a dos sistemas
escolares e a da sociedade – acentua seu desenvolvimento. Diante de um
fracasso escolar importante, frente ao desemprego e ao grande número de
jovens chegando no mercado de trabalho depois de uma escolaridade sem
nenhuma qualificação profissional, soluções estão sendo, então, procura-
das em todos os sentidos. Seminários e colóquios, livros, revistas e artigos
da imprensa, mas, também, leis e decretos de todo tipo, estatuem sobre a
alternância, como um novo caminho para a formação, apesar das resistências
dos defensores do ensino tradicional.

16. Cf. o cap. seguinte.


17. Jornal Le Monde, 27/04/1968. Paris.
18. Cf. COOMBS. La crise mondiale de l’éducation. Paris: PUF, 1968.

115
De uma prática paralela até o reconhecimento oficial

Se práticas de alternância mais ou menos aproximadas existiram, sem


que o conceito pedagógico seja enunciado como tal, a não ser pelas MFR,
que a adotaram, de maneira explícita, como um de seus fundamentos, pre-
cisa esperar o último terço do século XX para que um reconhecimento ofi-
cial pelo Estado francês surja.
• O primeiro é manifestado por uma lei sobre o ensino agrícola – lei de
2 de agosto de 1960 – que, no seu artigo 2, diz que “a formação poderá ser
dada de maneira contínua ou obedecendo um ritmo apropriado”. Este
“ritmo apropriado” quer dizer, mesmo, a alternância de estadias entre a
escola e uma empresa agrícola. O decreto de aplicação desta lei especifica:
“O ensino agrícola deve, pela associação íntima das formações gerais e pro-
fissionais, permitir aos seus alunos atingir um nível de cultura geral com-
parável àquele das outras categorias socioprofissionais. Não se trata de jus-
tapor receitas profissionais com uma formação geral, mas obrigar o aluno a
juntar, nas suas reflexões, os conhecimentos e a profissão, em vista de abrir
seu espírito e de torná-lo capaz de adquirir, continuamente, novos conhe-
cimentos e de adaptar-se, permanentemente, a situações mutantes”. Este
primeiro reconhecimento chega vinte e cinco anos depois da idéia ter sido
lançada e a fórmula praticada pelas MFR. Mesmo assim, o texto de lei ain-
da recusa pronunciar, de maneira explícita, a palavra “alternância”.
• Depois, em 1971, uma lei relativa à formação profissional permite o de-
senvolvimento da alternância no setor da aprendizagem. Ao mesmo tem-
po, várias experiências se desenham no ensino superior.
• Mas precisa esperar 1984, para que uma lei sobre as formações em al-
ternância apareça para, enfim, responder à inadequação da formação
profissional como causa maior do desemprego dos jovens. Cria-se, até,
em 1985, um exame no fim do ensino secundário (médio), chamado bac-
calauréat profissional, muito ligado à empresa no que concerne a condu-
ção da formação.
Depois, em 1987, uma nova lei faz da aprendizagem uma verdadeira opção de
formação alternada, aberta a todos os ciclos de formação secundária e superi-
or a exemplo do que se pratica no sistema dual.

Conclusão

A alternância ocupa, hoje, uma posição mais conhecida no horizonte


educativo. Tornou-se incontornável para a formação e a educação no con-
texto dos tempos presentes e, principalmente, do futuro. Mas a palavra, o

116
conceito e as práticas escondem realidades muito diferentes no campo da
formação em geral, e, naquele dos CEFFAs, em particular. Às vezes, para
empregar as palavras de um dos responsáveis das MFR, há vários anos a al-
19
ternância tornou-se um estereótipo , ou seja, uma fórmula utilizada a torto
e a direito. O negócio da formação até já se apropriou dela. Isto pode levar
ao melhor, como ao pior. A alternância representa, todavia, uma coisa por
demais séria para ser desnaturada. Por isto, convém delimitar-lhe os con-
tornos, perceber-lhe os componentes para que, na variedade de suas for-
mas, sua implicação atinja, até onde seja possível, a eficiência desejada.

19. OZANAM, J. L’alternance est-elle une tarte à la crème? In: Documents UNMFREO.
Paris, 1973.

117
6
OS CONTORNOS E OS COMPONENTES DA
PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA

A alternância:
• ela representa uma solução para os trabalhadores, para
os adolescentes;
• ela é conservadora: ela enraíza;
• ela é revolucionária: ela induz a evolução;
• ela é ação de participação.
André Duffaure

A alternância emergiu bastante no campo de formação neste fim de sé-


culo XX. O ceticismo parece ceder espaço ao entusiasmo e, de boa ou de
má vontade, numerosos organismos de formação se reclamam da fórmula
e a propõem como novo procedimento de formação para diversas finalida-
des. Todavia, a alternância ainda está longe de encontrar seu lugar certo
no campo educativo. Talvez porque as velhas divisões entre aqueles que
têm por missão repassar o saber acadêmico e os que o põem em prática ain-
da não desapareceram. Porque a escola, neste início do terceiro milênio,
permanece fechada sobre si mesma, muitas vezes cortada da vida. Porque
os baluartes da cultura cuidam, assim dizem, de não se deixarem corrom-
per pelas lógicas produtivas das empresas. Talvez, também, porque a com-
plexidade de sua implementação e as perturbações que pode provocar me-
tem medo e que o temor da mudança se torna um freio potente. Porque,
para muitos, ela supõe uma “revolução copernicana” das mentalidades
num quadro e concepções paradas. E, por isto, fica incompreendida para
muitos. Talvez, ainda, porque para os donos da ordem administrativa o
domínio controlado das estruturas se tornaria mais aleatório e difícil. De
fato, a alternância não pode existir com autenticidade sem as margens ne-
cessárias de liberdade e de responsabilidade, ou seja, de autonomia, a das
instituições e a dos atores.
Mas, afinal de contas, o que é a Pedagogia da Alternância? Quais são
seus contornos? Quais são seus componentes e como se organizam no seio
de um sistema? Da abordagem binária da alternância para uma aborda-
gem complexa, mudanças de mentalidades devem ocorrer nos formadores

118
para se livrarem de certas lógicas e terminologias em uso e a fim de não
desperdiçar os recursos da Pedagogia da Alternância.

Verdadeiras e falsas alternâncias para finalidades diversas

Na busca de soluções para responder às necessidades de jovens à pro-


cura de orientação e de inserção socioprofissional, às vezes até em “desca-
minho”, a alternância surge como um recurso. Mas qual? Para que finalida-
de e segundo que estratégia?

1. Quatro finalidades
a) A orientação: A alternância aparece como um meio de orientação
profissional e de subsídio na determinação de um projeto realista de
inserção profissional. O contato e a descoberta dos meios profissionais,
o envolvimento no meio das empresas, deve ajudar na escolha mais
pensada de uma profissão.
b) A adaptação ao emprego: A alternância torna-se, neste caso, um
meio para suprir a inadequação entre a formação e o emprego. Uma
inserção profissional deve permitir uma implementação e utilização
rápida da formação técnica e teórica recebida na escola e a aquisição
das competências exigidas pela empresa.
c) A qualificação profissional: Dois modos se opõem para a formação
e qualificação profissional: a aprendizagem com o domínio da forma-
ção prática dada no seio das empresas; a formação escolar onde preva-
lece a formação teórica. Aí, entre o “todo empresa” ou o “todo escola”,
a alternância aparece como o meio apropriado para ligar os dois em
vez de confrontá-los. E, enfim, parece entender-se que uma profissão
não se aprende no quadro-negro com giz! A alternância constitui o
meio, ao mesmo tempo, para aceder a uma qualificação reconhecida
por diploma e de construir uma identidade profissional duradoura.
Estas finalidades podem ser obtidas, na França, sob formas jurídicas
diversas: formação escolar, aprendizagem e outras.
d) A formação geral: As finalidades anteriores têm estreita relação
com a inserção e o emprego dos jovens. Mas uma outra finalidade,
mais ampla, só está sendo raramente exposta: a da formação geral, da
formação global da pessoa. Trata-se, através da alternância, de trabalhar
os mesmos programas, de preparar para os mesmos exames, de permi-
tir o acesso ao prosseguimento dos mesmos estudos que através do en-
sino tradicional. As MFR defenderam, desde 1963, esta finalidade, que
até hoje defendem, preconizando o princípio da formação geral e profis-

119
sional associadas. Não se trata mais, somente, através da alternância, de
suprir carências do sistema educativo, mas sim de oferecer uma outra via
de formação, e, desta maneira, uma alternativa educativa, firmando a al-
ternância como uma pedagogia da adolescência.

2. Três tipos de alternância pedagógica


Não basta uma formação de tipo escolar ter alguma relação com uma
área profissional para ser qualificada como alternada. Convém não con-
fundir a formação por alternância e a formação em tempo parcial! É verda-
de que a confusão é fácil e alegremente estabelecida. Não basta mandar
alunos no mundo da produção através de alguns estágios, ou, até mesmo,
de fazer suceder-se tempos de trabalho prático e tempos de escola, sem ne-
nhuma relação entre si, para que exista uma formação alternada. Encon-
tram-se verdadeiras e falsas alternâncias. Numerosas tipologias foram esta-
belecidas neste sentido. Sob abordagens e terminologias diferentes, elas
evidenciam três grandes tipos de alternância pedagógica. A saber:
a) A falsa alternância, também denominada de alternância justaposta,
que coloca períodos em empresa no curso de formação, ou faz com que
se sucedam tempos de trabalho prático e tempos de estudo, sem ne-
nhuma ligação manifesta entre si.
b) A alternância aproximativa, cuja organização didática associa os
dois tempos da formação num único conjunto coerente. Todavia, tra-
ta-se mais de uma soma de atividades profissionais e de estudo que de
uma verdadeira interação entre os dois. Além disso, os alternantes per-
manecem em situação de observação da realidade sem ter os meios de
agir sobre a mesma.
c) A alternância real, também chamada de alternância integrativa. Esta
não se limita a uma sucessão dos tempos de formação teórica e prática,
mas realiza uma estreita conexão e interação entre os dois, além de um
trabalho reflexivo sobre a experiência. Este tipo de alternância privile-
gia o projeto pessoal e coloca o formando como ator envolvido em seu
meio.
Convém, todavia, diferenciar a alternância do ponto de vista da instituição
e da pessoa. De fato, a implementação de uma alternância real por um orga-
nismo de formação não garante uma alternância integrativa para cada for-
mando. É cada formando que alterna e não a instituição e as aprendiza-
gens de cada um, as relações, conexões e integrações que supõe e que de-
pendem dele mesmo: suas implicações, suas motivações, seu projeto que
dão sentido, coerência, unidade e continuidade ao percurso formativo.

120
A abordagem binária e simplista da alternância

A alternância é facilmente apresentada, de maneira reducionista, co-


mo uma relação entre duas entidades: a empresa e a escola, a prática e a
teoria, a ação e a reflexão, a vida e a escola... para citar só estes binômios
mais utilizados, porque vários outros podem ser citados.
É verdade que a alternância supõe duas entidades a serem vividas su-
cessivamente, cada uma com suas especificidades. Mas, segundo as finali-
dades, uma ou outra entidade está sendo privilegiada. Se a finalidade pro-
fissional for primeira, única, ou quase, a empresa está sendo considerada
como espaço-tempo de alternância e a relação trabalho-escola ou práti-
ca-teoria é enunciada como definição da alternância. Se, ao contrário, pre-
valece a (re)inserção social, é mais o ambiente de vida, o meio, que servirá
de ponto de apoio. E se a instituição educativa opta pela formação global
do adolescente por alternância, como é o caso nos CEFFAs, é, então, toda a
sua vida quotidiana que deve ser considerada. A saber, a vida no seio de sua
família, a vida e a prática profissional no seu empreendimento ou numa
empresa externa, a vida social no seio da comunidade ou do povoado, mas
também todo o ambiente físico e humano em que está convivendo. Presen-
cia-se, neste caso, uma alternância entre a vida quotidiana de um adoles-
cente com seu contexto, suas atividades, que constituem “seu” meio de vida
e um outro que é o meio de vida escolar no CEFFA. A abordagem, neste
caso, é menos binária e, segundo os componentes da situação de formação
considerados, representa-se a alternância como uma relação:
• Seja entre as instituições: família, empresa, comunidade, escola.
20
• Seja entre os atores: pais, alternantes, formadores, mestres de estágio .
• Seja, ainda, entre a natureza dos saberes e aprendizagens trabalha-
dos: empíricos, familiares, práticos, experienciais, teóricos, abstratos,
conceituais.
• Seja entre os processos: ação-reflexão, pesquisa-ação-formação, ou
ainda problematização, conceitualização...
E, talvez, ainda, outra coisa, porque, pela alternância, tudo isto é um
jogo, e é sob o ângulo da complexidade que convém abordá-lo.

20. Enunciei, na obra citada a seguir, a diversidade das relações de atores que podem
existir num sistema de formação em alternância. Cf. GIMONET, J.-C. Alternance et re-
lations humaines. In: Mésonance. Paris: Ed. Universitaires/UNMFREO, 1984.

121
A abordagem multidimensional e complexa da alternância

A Pedagogia da Alternância pretende viver e gerir a complexidade


como espaço educativo, canteiro de formação e de desenvolvimento, fonte
de saberes e de conhecimentos. Trata-se, para a formação, educação, ori-
entação de um jovem e, de maneira concomitante, para o desenvolvimento
local, de trabalhar com todos os componentes da vida quotidiana, ou seja, a
21
complexidade, tal como foi definida por E. Morin . Então, abordar a for-
mação sob o ângulo da complexidade – e como poderia ser de outro jeito?
– significa tentar jogar, como num grande órgão barroco, numa diversidade
de teclados, de teclas e de pedais ao mesmo tempo. De fato, a Pedagogia
da Alternância é uma pedagogia da complexidade, porque:
• ela quer contemplar finalidades ambiciosas;
• ela nega os isolamentos, as simplificações e os reducionismos;
• ela é uma pedagogia da relação, da interface; eu falei anteriormente
de uma pedagogia das orlas;
• ela tece elos e relações humanas, ela implica uma cooperação, uma
parceria;
• ela permite viver aprendizagens em continuidade (experienciais e
científico-prático e teórico-profissionais e gerais...).

Uma pedagogia para finalidades ambiciosas

Os CEFFAs, ao recusar o “todo escola” ou o “todo terreno ou empresa”


como únicos espaços de formação, compreenderam que o ser humano, na
sua complexidade, só pode desenvolver-se na complexidade que constitui
sua vida e seus diferentes componentes em interação (física, familiar, so-
cial, profissional, cultural, espiritual, escolar...). Desta maneira, os CEFFAs
vêm afirmando que não poderia haver desenvolvimento de uma pessoa
fora ou em oposição ao seu meio vivencial.

Eles então enunciam duas finalidades em interação:


a) A da educação, da formação e da orientação dos adolescentes a fim de
permiti-los a uma inserção social, profissional e, além disso, cultural.
• Educar e formar significa o desenvolvimento global da pessoa, em to-
das as suas dimensões (intelectuais, físicas, afetivas, sociais, relacionais,
culturais, espirituais...), aquilo que vocês costumam chamar de formação

21. MORIN, E. Introduction à la pensée complexe. Paris: ESF, 1990.

122
integral. Ela implica uma formação que visa dar oportunidade a cada
um de preparar as qualificações e diplomas necessários ao exercício de
uma profissão, à inserção profissional e social.
• Orientar significa ajudar cada um a definir-se, a encontrar o seu cami-
nho. É a razão pela qual as CFR da França adotaram, naquele tempo, a
denominação “Casa Familiar Rural de Educação e de Orientação”.
b) A segunda finalidade diz respeito ao desenvolvimento dos territórios
onde se encontram os jovens que freqüentam cada CEFFA. Esta noção
de desenvolvimento é ampla porque ela compreende de vez o econô-
mico, o meio ambiente e o humano. Se a formação é portadora desta
visão de desenvolvimento, ela toma um sentido diferente, uma outra
dimensão do que se ela se limitasse à preparação de um diploma. E,
nesta perspectiva, a formação se inscreve num contexto e é portadora
de uma dimensão de cidadania e de solidariedade tanto local quanto
planetária.

Uma negação dos isolamentos, das simplificações e dos reducionismos

A alternância em formação só faz transpor todas as alternâncias que


existem na realidade e que se vivenciam no quotidiano: entre a noite e o
dia, a sombra e a luz, o trabalho e o descanso, a chuva e o sol, o frio e o ca-
lor, o inverno e o verão, a ação e a reflexão, a idéia e a prática... obedecen-
do ritmos às vezes muito curtos, às vezes muito longos... É nesta perma-
nência de alternâncias, é nesta complexidade do quotidiano, seus para-
doxos de rupturas e de relações com suas interfaces, que vivenciamos um
processo contínuo de desenvolvimento, muitas vezes à nossa revelia.
Uma formação não poderia então resumir-se na ingestão de doses maci-
ças de saberes disciplinares compartimentados, uns atrás dos outros. Não,
a alternância coloca o postulado que se aprende em cada espaço ou lu-
gar, a cada instante mas que se aprende de maneira diferente e coisas di-
ferentes aonde nos encontramos em cada momento de nossa existência. É
evidente e tão simples. Em aparência só! De fato, se de toda experiência re-
sulta um aprendizado, uma formação, esta não é necessariamente fator de
desenvolvimento pessoal e pode, ao contrário, ser alienante.
Com a alternância então convém pensar de maneira globalizada, em
interação, em continuidade e rupturas, em provisório e incerteza. Convém
sair do pensamento linear, da relação binária, da justaposição das coisas,
do ser humano objeto. Trata-se, ao contrário, de juntar, reunir. Trata-se
mais ainda de atuar com sujeitos em permanente busca de autonomia e de
desenvolvimento.

123
É bem isto, penso, o sentido da Pedagogia da Alternância dos CEFFAs.
Em saber, para citar E. Morin, “articular, distinguir sem desunir, associar
sem reduzir”.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir a vida e a esco-
la. Colocar a vida na escola e a escola na vida. Levar em conta e gerir os diferen-
tes meios de vida dos adolescentes como fontes de saber, de aprendizagens e como es-
paços educativos aglutinadores e não somente o campo da escola.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir a formação geral
e a formação profissional contrariando o uso comum e sua falta de sentido, sa-
bendo que uma formação global ou integral e ao mesmo tempo útil e perti-
nente só pode ser uma associação das duas na complexidade de suas interfe-
rências. No mundo que está se desenhando, ao invés de “produzir” sábios,
importa promover pesquisadores, pessoas com capacidade de adaptação,
detentoras de um espírito aberto e de um modo de pensar complexo, bem
como de métodos de pesquisa e de capacidades de expressão para tanto.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir os campos de sa-
beres, os da vida e os dos programas escolares e, entre estes, os campos disci-
plinares. A Pedagogia da Alternância dos CEFFAs recusa o reducionismo
no qual se fecham os programas escolares e suas disciplinas estanques, jus-
tapostas, trazendo um parcelamento dos saberes. Como se fosse tratar de
formar um miniespecialista em cada disciplina, em vez de cada uma delas,
em relação com as outras, trazer sua parte de explicação e compreensão de
um mesmo problema. Trata-se, ao contrário, de ensinar a interligar os sa-
beres, a produzi-los, contextualizando-os e unificando-os.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir, os atores do
processo de formação: os alternantes, os pais, os mestres de estágio ou tutores,
os monitores... Cada um em seu campo de ação, na sua área de competên-
cias, na sua cultura, nos seus papéis. Todos estão na obrigação de cooperar
para o êxito de uma formação contínua na descontinuidade das atividades:
cooperação na definição do referencial, no estabelecimento do Plano de
Formação, na operacionalização da formação e avaliação. Desta maneira
os monitores são chamados a trabalhar em equipe, a encontrar os pais e os
mestres de estágio, estes se conhecendo e falando entre si, os alternantes a
cooperar no meio do grupo de formação e de vida no CEFFA. A Pedagogia
da Alternância cria um mundo complexo de relações. Ela diversifica os papéis
educativos. Produz uma partilha do saber e do poder educativo. Sendo as-
sim, as pessoas em formação – “os alternantes” – detêm um poder: aquele
que lhes é conferido pela sua condição de atores socioprofissionais e sociocultu-
rais, e não de alunos que, na escola, escutam passivamente as aulas dos pro-
fessores... Aprendem e se formam durante as estadias no meio, longe dos
monitores do CEFFA. Eles são detentores de um saber que os monitores

124
não possuem. Por isso, encontram-se numa situação de autoformacão em
relação às coisas e às informações da vida e dos programas, em relação aos
atores que freqüentam. É na síntese de todos estes conjuntos em interação
que vão surgir as aprendizagens e que vai acontecendo a formação e a edu-
22
cação . A alternância implica numa situação de aprendizagem ativa, de
produção de seu saber e de sua formação. É na medida em que cada um se
torna o sujeito-ator de sua formação e cresce na autonomia que a Pedago-
gia da Alternância ganha em eficiência.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir os tempos de
vida do alternante. Sua vida no presente, através da sucessão dos períodos no
meio e na escola, obedecendo ritmos apropriados aos públicos, mas tam-
bém sua vida passada e futura. Cada um se encontra num trecho da vida.
No seu presente, o passado trabalha para facilitar ou, ao contrário, impe-
dir as aprendizagens na medida em que foi fonte de experiências múltiplas
e variadas, positivas ou mais negativas, e às quais se refere para dar signifi-
cado aos ensinamentos. O futuro, na medida de sua percepção e os proje-
tos que existem, dá um direcionamento, mobiliza e orienta mais ou menos
as energias e a ação. A Pedagogia da Alternância é uma pedagogia das co-
nexões; conexão com o passado, certo, mas principalmente com o futuro
e seus projetos para ajudar cada um a construir sentido e, desta maneira,
aprender. A Pedagogia da Alternância compreende-se também como uma
pedagogia do projeto.
Assim, por estas diversas razões, pode-se falar da pedagogia da com-
plexidade que será tanto mais eficiente na medida em que fará crescer a
autonomia. Esta questão da autonomia é fundamental como poder de ma-
nifestar o seu ser, seus recursos, seus talentos, de entrar em relação com os
outros. Formar-se em alternância torna autônomo porque o processo con-
vida a dominar a si próprio, a interagir, a assumir as dependências e a tra-
balhar as interdependências, mas ficando, todavia, dono de si próprio, ge-
23
rindo-se e conduzindo-se. De onde resulta a interação permanente :
Alternância Autonomia

22. Cf. PINEAU, G. La formation expérientielle en auto/éco/co-formation. In: Éduca-


tion Permanente, n. 100/101, dez./1999.
23. As relações de toda pessoa com o seu meio estabelecem-se obedecendo quatro
modalidades: a disjunção, a independência, a dependência e a autonomia. A predo-
minância de uma ou de outra trará condutas diferentes no alternante (ver em segui-
da no cap. 7).

125
Com a alternância entra-se no multidimensional, no multirreferencial.
Encontra-se numa estratégia da relação, da interação, da associação, da ar-
ticulação dos tempos, dos espaços, das unidades nas suas diferenças, suas
semelhanças e suas complementaridades. Mergulha-se na gestão das inter-
faces para relacionar lógicas contraditórias.

Além de um método, um sistema educativo

Decifrar a complexidade que representa a formação alternada exige


destacar as invariáveis, ou seja, o que é comum em todas as situações e de or-
ganizá-las seguindo um modelo que se aparenta com a abordagem sistêmi-
ca. Trata-se de levar em conta os diversos elementos ou componentes que
intervêm na formação alternada, suas interdependências, suas interações,
inter-relações e os fluxos de energia que circulam entre eles, mas também as
divisões hierárquicas que aparecem, as conduções que vêm acontecendo, as
evoluções e os ajustes que se criam seguindo uma dinâmica permanente no
espaço e no tempo. Convém identificar estes componentes ou subsistemas, o
que caracteriza cada um e suas interferências no seio do sistema-alternância
próprio de cada CEFFA que o gera, mas também e principalmente de cada
“alternante” que o vivencia.
Os elementos constitutivos deste sistema-alternância, suas interações e
a complexidade que engendram se declinam como segue:
a) Os atores-chave do sistema, que se encontram no centro da aventu-
ra educativa: as pessoas em formação, adolescentes ou adultas. Não
poderia defini-los pela palavra “aluno” porque o seu estatuto é dife-
rente e se reporta demais ao sistema escolar do qual grande número
quis afastar-se. São atores socioprofissionais estudando, se formando,
se educando em alternância, fazendo surgir a palavra “alternante”
para designá-los.
b) Em segundo situe-se o projeto educativo que trata das ações de forma-
ção e da implementação da alternância, atribuindo-lhes sentido, tanto
do ponto de vista de cada alternante quanto da instituição. As finalida-
des visadas, as metas e os objetivos perseguidos, os valores subjacentes
determinam o funcionamento da alternância, sua orientação e suas mo-
dalidades. Trata-se aqui, em outros termos, do subsistema de pilotagem.
c) O terceiro “invariante” a ser considerado consiste na experiência de
cada alternante e do grupo-classe, ao mesmo tempo como ponto de
partida e de chegada do processo educativo. A introdução da alternân-
cia em formação coloca a relação com a experiência, o trabalho, o mun-

126
do da produção, a vida não escolar. Ela convida, então, a considerar a
experiência, ao mesmo tempo, como suporte da formação, reservató-
rio de saberes, espaço educativo e ponto de partida do processo para
aprender. É da articulação entre a experiência e o programa que resul-
tam os Planos de Formação.
d) O quarto conjunto é constituído pela rede de parceiros co-formadores
dos diferentes espaços-tempos da formação. A alternância diversifica e
multiplica os atores que atuam no processo formativo. Estes diferentes
atores estão mais ou menos em interação segundo as finalidades da
formação e a natureza dos campos de vida investidos (familiar, social,
profissional). A alternância coloca, em seguida, o problema fundamen-
tal da partilha do poder educativo segundo jogos de diferenças e de
complementaridade. A associação CEFFA representa a sua estrutura de
agrupamento, de informação, de expressão e de exercício de suas res-
ponsabilidades, mas, também, de regulação e de equilíbrio.
e) Mas a implementação do conjunto supõe um dispositivo pedagógico. A
formação em alternância requer, de fato, uma organização, atividades
e instrumentos pedagógicos específicos para articular os tempos e os
espaços, para associar e colocar em sinergia as dimensões profissionais
e gerais, para otimizar as aprendizagens. Trata-se, em outros termos,
dos subsistemas de gestão e operacional da formação.
f) A estrutura educativa, ou seja, o conjunto das condições materiais, or-
ganizacionais, mas, principalmente, psicoafetivas que garantem uma
qualidade de vida e um clima favorável às aprendizagens e à educação,
constitui um trunfo maior do sistema-alternância. De fato, a alternân-
cia obriga o adolescente ou o adulto em formação a reinvestir-se per-
manentemente, em meio de ambientes em constante transformação. A
acolhida, a atenção, a consideração tornam-se essenciais para regular
os funcionamentos.
g) Enfim, entra em cena este componente essencial que representa a equi-
pe pedagógica e educativa constituída pelos monitores e outros agentes educa-
tivos. A eles pertence animar o conjunto. O olhar histórico demonstra que
os CEFFAs nunca puderam satisfazer-se com o modelo do ensino tradi-
cional. Seu projeto, sua estrutura, a alternância colocaram logo o perfil de
um “formador” particular, chamado, em seguida, de “monitor”, que é
mais um generalista do que um especialista, alguém capaz de gerir uma
pedagogia da complexidade, de ir ao encontro de uma educação sistêmi-
ca. Seu estatuto e papéis são, deste fato, específicos.
Estes sete conjuntos de elementos constitutivos de uma formação por
alternância representam tantos subsistemas, cada um com suas caracterís-

127
24
ticas e processo . Eles se entrelaçam, se entrechocam e interagem. Por isto,
pode-se esboçar a representação gráfica seguinte:

Os monitores
Os parceiros
co-formadores A equipe educativa

Projeto e
O alternante trajeto
e sua de vida
experiência
O projeto
educativo

O dispositivo A estrutura
pedagógico educativa

NB: Para não tornar esta representação gráfica pesada demais, algumas setas não
foram colocadas. Portanto, cada pólo depende e interage com todos os outros.

Conclusão

Nosso reflexo habitual, segundo nossas representações e modaliza-


ções, é de pensar separadamente a formação da escola e a da empresa.
Nesta última coloca-se a prática, o saber-fazer, a habilidade manual, as
competências profissionais que o exercício de uma profissão supõe e, na
primeira, saberes teóricos representados pelo programa, um ensino para
transmiti-los e reservado aos “mestres”, que detêm o saber, segundo os es-
quemas que nos deixou a escola da nossa infância. E, depois, tem a família
que é o lugar do afetivo, do educativo, mas que, na nossa cabeça, como
também nos disse a escola, não é o do saber acadêmico. E ainda têm o am-
biente físico, os bosques, as cercas-vivas, os caminhos, os rios ou o mar, os
morros e as montanhas... o ambiente humano, cultural e todas as suas im-
pregnações e socializações... Dois, três, quatro, cinco espaços de formação,
de escolas e mais até, que interagem, às vezes se chocam, se contrariam, se
somam, se opõem em vez de se unir. E, todavia, elas nos permitem apren-
der, elas nos constroem. Com a alternância tenta-se juntar, alcançar, unifi-
car, embora sempre muito parcialmente, tudo isto. Trata-se, efetivamente,

24. Para um desenvolvimento maior destes conjuntos, cf. GIMONET, J.-C. Método peda-
gógico ou novo sistema educativo? – A experiência das Casas Familiares Rurais 2004. Brasí-
lia: Unefab [Documentos Pedagógicos].

128
25
de “uma outra escola”, o que já foi dito por B. Schwartz em 1983 ou que A.
26
Geay intitulou “a escola da alternância” . Uma outra escola em tempo in-
tegral, no dia-a-dia da vida, em vários lugares, para estudar, aprender,
continuamente, de maneira inter e transdisciplinar. Uma outra escola que
não opõe mais a teoria e a prática, porque existe prática, teoria, conceito
em todo lugar. Porque a mão e o pensamento se juntam sempre. Porque o
saber é a ação e a ação é o saber. Um outro paradigma escolar a adquirir, a
tornar vivo, mas que supõe desfazer-se do anterior que nos modelou. Evo-
lução, e até às vezes revolução, a operar nas nossas cabeças.

25. SCHWARTZ, B. Paris: Flammarion, 1977.


26. GEAY, A. Op. cit.

129
7
APRENDER NA FORMAÇÃO EM ALTERNÂNCIA

No fundo, a alternância não traz para a escola um aluno


que vem se submeter, mas um jovem que vem contar e
interrogar. Somente aí vem a aula.
André Duffaure

Todo conhecimento opera através de seleções de dados


significativos e rejeições de dados não significativos: separa
(distingue ou separa) e une (associa, identifica);
hierarquiza (o principal, o secundário) e centraliza (em
função de um núcleo de noções mestras).
Edgar Morin

Viajante, não há caminho, o caminho se faz caminhando.


Antonio Machado

Cada um de nós aprende desde o nascimento, e mesmo antes, no seio


materno. Cada um aprendeu por imitações, por ações e ensinamentos, por
exercícios e repetições, por leituras e escritos, por discursos e confrontos,
por debates, reflexões e outras operações nesta relação de si para com os
outros e as coisas. Aprendemos nas diversas escolas, liceus ou outros cen-
tros de formação que temos freqüentado durante mais ou menos tempo.
Mas também aprendemos muito na vida de cada dia, e, muitas vezes, sem
saber. E se temos consciência de certas aprendizagens, muitas passam des-
percebidas, mas reaparecem e se atualizam, todavia, num dado momento,
numa circunstância particular.
Este é realmente o sentido das aprendizagens em alternância, já que o
“alternante” se encontra na vida, sob suas diversas formas, suas diversas
áreas e momentos. Mas, um certo número de questionamentos aparece em
relação aos processos de construção dos conhecimentos e de todas as
aprendizagens que surgem de modo dispersado. Esclarecer esta questão é
o objetivo deste capítulo. Um primeiro exposto traz algumas noções gerais
sobre a aprendizagem e um segundo examina as especificidades em alter-
nância integrativa.

130
Aprender

Aprender é um processo complexo e que se encontra, às vezes, demasi-


adamente simplificado, ao ponto de confundir o ensino e a aprendizagem.
E é um lugar comum afirmar que tudo o que for ensinado está longe de ser
aprendido, já que os fatores que intervêm no ato de aprender são tão nu-
merosos.

Um processo complexo com múltiplos fatores de influência

Na medida em que colocam o acento sobre os fatores internos ou ex-


ternos ao aprendiz, ou sobre a interação entre uns e outros, as teorias e as
concepções divergem quanto ao processo de aprendizagem.

Os fatores internos ao aprendiz


A versão mais radical enuncia uma hereditariedade da inteligência.
Para os adeptos desta concepção as aptidões intelectuais dos indivíduos são
essencialmente determinadas por fatores genéticos. Ou, ainda, para uma
outra concepção, menos extrema, existem, para a aquisição da linguagem,
27
entre outros, disposições universais natas .
Uma segunda abordagem diz respeito às diferenças existentes entre os
indivíduos: seu sexo, sua estrutura mental, suas representações, sua percep-
ção e seu modo de aprender... trazendo a implementação, segundo as teo-
rias enunciadas, seja de um ensino diferenciado, seja de métodos e de ins-
trumentos de desenvolvimento intelectual, a fim de instaurar ou de restau-
rar no indivíduo um melhor emprego de suas capacidades.
Uma terceira consideração destaca a autonomia. É representada pela
corrente da escola nova que insiste na autonomia e na especificidade da
criança que o docente deve auxiliar na construção de si mesmo, fornecen-
do-lhe os meios para agir, observar e experimentar. Os trabalhos contem-
porâneos sobre a autoformação e o autodidatismo destacam as capacida-
des da pessoa em apropriar-se dos saberes e cultivar-se.

27. Cf. Chomsky.

131
Os fatores externos ao aprendiz ou a influência do ambiente
Duas concepções são avançadas:
28
• Uma, de natureza psicológica , afirma que a aprendizagem é uma
modificação do comportamento devido a um condicionamento: seja dos
reforços positivos através de recompensas, seja dos reforços negativos atra-
vés de punições. Desta orientação nasceram as máquinas de ensinar, em se-
guida o ensino programado, e, de maneira menos extremista, o ensino as-
sistido por computador.
• A outra, numa ótica muito diferente e de natureza sociológica, de-
monstra que as crianças, os adolescentes estão sendo submetidos a uma
aprendizagem implícita diferente segundo o meio social. Advindo daí as
influências familiares, tais como a linguagem, os códigos culturais, o nível so-
cioeconômico e, de modo mais amplo, as influências sociais próprias ao
meio, à cultura ambiente, ao tipo de estabelecimento freqüentado... As
aprendizagens decorrentes disto são, muitas vezes, contraditórias com aque-
las trazidas pelo meio escolar.
Entre estas duas concepções que, às vezes, se opõe, localiza-se a via mais
realista da interação entre os fatores internos e os fatores externos ao aprendiz. Nes-
te sentido, J. Piaget defendeu uma interação do sujeito e do seu meio. Segundo
este autor, a inteligência se constrói graças aos processos de equilíbrio das
estruturas cognitivas em resposta às solicitações e obrigações do meio. Duas
operações contribuem nisto: a assimilação e a acomodação. A saber, para a
primeira, a ação do indivíduo sobre os objetos que o cercam em função de
seus conhecimentos e aptidões, e, ao inverso, a ação do meio sobre o orga-
nismo que provoca ajustamentos ativos no sujeito. Deste modo, então, para
Piaget, a aprendizagem representa uma modificação das estruturas internas
do organismo.
As pesquisas destas últimas décadas com respeito às ciências da vida,
da autonomia, da complexidade e dos sistemas, permitiram uma compre-
ensão mais fina dos funcionamentos do cérebro e do homem, como tam-
29
bém de suas aprendizagens .
De outro lado, as pesquisas em psicologia social demonstram os efeitos
da interação dos atores implicados no processo de aprendizagem. O confron-
to com o outro se torna um poderoso motor de mudança da pessoa, na me-

28. Chamou-se a esta corrente de escola behaviorista ou comportamentalista.


29. Não seria o caso retomá-las neste livro, mas, para dispor de uma abordagem inte-
ressante e com abundantes referências das teorias na matéria, poder-se-á voltar para a
obra citada de A. Geay. Ver, também, LERBET, G. Les nouvelles sciences de l’éducation. Pa-
ris: Nathan, 1995.

132
dida em que, é claro, está sendo assumido. A influência do grupo nos pro-
cessos de aprendizagem toma, neste caso, toda a sua importância. Do mes-
mo jeito, também, é essencial a interação entre o aluno e o docente, como
30
numerosos estudos o comprovaram .

A singularidade da aprendizagem

Não têm dois aprendizes que aprendem as mesmas coisas, da mesma


maneira, com a mesma velocidade, com os mesmos interesses e os mesmos
31
objetivos . Qualquer aprendizagem é singular e, conseqüentemente, “um
negócio particular”. Assim, nunca se ensina nada a ninguém. Só se pode aju-
dar alguém a aprender, a facilitar suas aprendizagens. Estas dependem de
cada sujeito, na totalidade de seu ser, situado num contexto e num momento
do seu trajeto de vida. O que significa que:
• O aprendiz funciona como um todo, ou seja, aprende com tudo que é no
momento em que aprende. Em outras palavras, estão colocados em
jogo, ao mesmo tempo, os planos neurofisiológicos, intelectuais e afeti-
vos, mecanismos conscientes e inconscientes, bem como as representa-
ções que ditam as condutas. Daí, esta unidade “corpo-espírito” segun-
do o pensamento personalista do filósofo E. Mounier, também formu-
lada por C. Rogers, para quem “a aprendizagem mais eficaz é aquela
onde a pessoa se engaja toda inteira numa aprendizagem dela própria
para ela própria”.
• O aprendiz funciona em determinado momento de seu desenvolvimento. Por
isto deve ser considerado em continuidade, ou seja, ao mesmo tempo
impregnado e determinado pela sua história, situado num estágio de
desenvolvimento mental e orientado mais ou menos intensamente por
projetos mobilizadores das energias e dos níveis de aspirações. Só tem
aquisições e aprendizagens possíveis, em função das necessidades e in-
teresses que existem num dado momento e que a estrutura mental per-
mite integrar.
• O aprendiz funciona inserido num contexto físico e humano que modelou
e está modelando as maneiras de fazer, de ver, de dizer e de ser. Daí, a
questão da relação, das distorções ou convergências entre as origens

30. Lembrar-se-á a pesquisa de R. Rosenthal e L. Jacobson que, segundo o “efeito


Pygmalion”, coloca em evidência a influência do prejulgado do docente sobre o êxito
dos alunos. In: Pygmalion à l’école. Paris: Casterman, 1971.
31. Cf. o postulado de R. Burns: Methods for individualizing. In: Educational Technolo-
gie, 1971, II.

133
sociais e a escola, nos códigos, nos processos de pensamento, nos mo-
dos de expressão utilizados.
Desta maneira, cada um está gerindo, ao seu modo, os materiais educa-
tivos e formativos que lhe propiciam os lugares onde vive e atua; cada um
realiza, segundo as modalidades que lhe são próprias, a integração dos da-
dos e informações disponíveis, e garante, de maneira global e essencial-
mente pessoal e original, as mais diversas aprendizagens.

O sentido, o significado e o projeto

A aprendizagem é um processo de mudança, uma construção e não


uma colocação, uma acumulação, uma soma ou uma superposição de no-
ções. Aprender é estar construindo conhecimentos, capacidades novas, e,
mais globalmente, se construir a si próprio. Aprender significa encontrar
uma resposta às necessidades, às vontades, aos desejos, à curiosidade, à
identidade... do momento. Aprender é ligar, conectar com o existente, su-
32
perando “saberes adquiridos” já presentes . É entrever uma utilidade em
vista de objetivos, de “saberes em movimento progressivo”. Em outros ter-
mos, uma aprendizagem está sendo otimizada quando houver um antes e
um depois (um montante e uma jusante). Uma experiência anterior em
termo de encontro(s), de ação(ações), de conhecimento(s), constitui um
canteiro para toda nova informação ou dado que encontra, assim, um sig-
nificado. Um projeto, um objetivo lhes confere um rumo. Significação e dire-
ção permitem encontrar ou construir sentido. Ora, a aprendizagem só existe
quando o aprendiz lhe confere um sentido. Mas, na realidade, quanta au-
sência de sentido não é detectada nos ensinamentos pelos alunos? Mas, diz
Ph. Perrenoud, “o sentido se constrói, não é dado com antecipação; está
sendo construído a partir de uma cultura, de um conjunto de valores e de
representações próprias a cada um, está sendo construído em situação con-
33
creta, numa interação e uma relação” . Por isto, o trabalho da busca do senti-
do, enquanto, de um lado, relação com o familiar e com a experiência, e, de ou-
tro lado, elucidação e elaboração de um projeto, representa uma constante, uma
busca de todos os instantes para qualquer docente ou formador.
Aí, ainda, existem tantos sentidos diferentes, de sentidos construídos ou
encontrados para um saber, uma tarefa, um projeto, um exercício, um pro-

32. O que fazia dizer um dos pais da Pedagogia Nova na França, R. Cousinet, que “o en-
sino não tem por objetivo trazer a um aluno conhecimentos que não tem, mas de acla-
rar um pouco mais os conhecimentos que ele já possui”.
33. PERRENOUD, P. Sentido do trabalho e trabalho do sentido na escola. In: Cahiers Pédago-
giques, n. 314-315. Paris.

134
blema a resolver quando tem atores, porque cada um possui sua herança cul-
tural, seus desejos, suas necessidades, suas estratégias para se mostrar, ou, ao
contrário, fazer-se esquecer e fugir. Assim vai indo a diversidade. A constru-
ção de sentido é, portanto, sempre singular.
Mas a questão do sentido colocada em relação aos aprendizes vale tan-
to quanto para os docentes. Talvez estejam mais em condições de ajudar os
alunos a encontrar o sentido de seu trabalho, que percebam o sentido de
sua ação pedagógica e educativa ou que puderam, na sua própria forma-
ção, perceber-lhe o sentido.

A informação, o saber e o conhecimento

Estas três palavras ou conceitos, muitas vezes confundidos na lingua-


34
gem pedagógica, podem ser diferenciados .
• O conhecimento é da ordem da pessoa, do sujeito aprendiz. De nature-
za qualitativa, resulta de uma construção pessoal que coloca em jogo a
totalidade da pessoa, numa experiência singular. Por isto, o conheci-
mento é incomunicável e, conseqüentemente, não transmissível. Dele
só podem ser comunicados elementos parciais, um saber que decorre
dele e que se torna informação para outros.
• A informação é um dado exterior da pessoa. De ordem quantitativa,
ela se encontra nos livros, revistas, jornais, nas “aulas” do docente... O
ensino não é outra coisa senão uma transmissão de informações, sendo
que algumas estão sendo captadas de maneira diferente segundo os
alunos, em função do sentido que fazem, de uma luz trazida por uma
prática, por uma experiência. Elas, então, integram-se a eles e aumen-
tam seus conhecimentos e seu saber. Para os outros, são perdidas. Dis-
to decorre uma disparidade enorme entre aquilo que é ensinado numa
classe e o que está sendo aprendido por cada um de seus membros.
• O saber está entre os dois. É, ao mesmo tempo, informação integrada e
conhecimento objetivado. É produzido pelo sujeito na sua relação com o
mundo e com os outros. É uma produção pessoal, uma construção que resul-
ta de uma ação (escrever, dizer, exercer, aplicar...) associando informação ex-
terna e conhecimento interno. A construção do saber pode, então, se realizar:
• seja a partir de informações que estão sendo memorizadas por exer-
cícios, repetições e outras operações. Mas, se não encontrar as condi-

34. Para um aprofundamento destes conceitos pode-se retomar a obra de J. Legroux,


que os explicitou, precisamente, no quadro de uma tese de doutorado em Ciências da
Educação: De l’information à la connaissance. Paris: L’Harmattan, 1981.

135
ções para sua integração, este saber pode permanecer superficial só
de curta duração;
• seja a partir de conhecimentos que a expressão escrita, oral, gestual
ou outra permite manifestar, mas sempre de modo parcial. Deste jeito,
pode-se dizer o que se sabe, mas nunca o que se conhece.

Dando conta destes dois processos na construção do saber, pode-se di-


ferenciar:
• a formação por consumo de informações e de saberes alheios, muito
utilizada nas pedagogias transmissivas e cuja “aquisição” é auferida
através de avaliações que somam;
• e a formação por produção de saberes que resultam da articulação
dos conhecimentos e das informações, graças a métodos ativos e apro-
priados.

A transferência

A aprendizagem encontra-se estreitamente ligada à transferência, ou


seja, à aptidão em utilizar aquisições, saberes em situações diversas. Não
por simples aplicação do “já conhecido”, mas por adaptação, transforma-
ção, construção nova a partir de ganhos anteriores. Qualquer aprendizado
somente se torna efetivo na medida em que produz, ao mesmo tempo, uma
mudança no sujeito e um acréscimo de suas capacidades de adaptação. A
Pedagogia da Alternância implica, em permanência, uma dupla transfe-
rência: saberes empíricos e experiências da vida para os saberes teóricos
dos programas escolares e reciprocamente.

Aprender em formação alternada ou o alternante no coração de uma


complexidade a ser vivida e gerida

A aprendizagem em alternância apresenta uma especificidade porque


se torna complexo por, pelo menos, três fatores:
a) A diversidade das situações – suportes de aprendizagens vividas pelo
alternante. Desta maneira, suas possibilidades e tipos de experiências
são diversificados e multiplicados, bem como as informações, os sabe-
res e os conhecimentos que encontra, utiliza e produz.
b) A amplitude das possíveis aprendizagens supera as únicas aprendiza-
gens acadêmicas da escola, já que se pretende a formação integral da pes-
soa segundo um princípio de formação profissional e geral associadas.

136
c) A primazia dada à experiência que antecede o programa escolar.
Mas existe um risco, para o alternante, de não assumir todas as solicita-
ções que lhe são feitas e, até mesmo, de se perder nesta complexidade, nes-
ta amplitude e no processo pedagógico. Por isso, a questão dos processos
implementados para que se liguem e se unifiquem as aprendizagens diver-
sas e dispersas, em vista de uma formação completa, deve ser esclarecida.
De antemão, importa especificar ou lembrar a natureza e as características
das situações-suportes vividos pelo alternante, bem como aquelas dos sabe-
res e aprendizagens possíveis em cada lugar.

Um caminhar no meio de espaços-tempos formativos com finalidades diferentes

O alternante caminha sucessivamente e de maneira ritmada em cam-


pos culturais (familiar, profissional e escolar) que possuem suas especifici-
dades e sua lógica própria em termos de finalidades, objetivos, referentes,
conhecimentos, saberes, modos de pensar e de agir, de linguagem, de cul-
tura ambiente... Se cada um lhe oferece seus “materiais” e sua parte de
aprendizagens, ele precisa, todavia, adaptar-se às lógicas e culturas dife-
rentes e, muitas vezes, contraditórias.

O espaço-tempo familiar
Os CEFFAs são instituições familiares. Eles se baseiam sobre a respon-
sabilidade plena das famílias, ao mesmo tempo, face à estrutura e à forma-
ção de seu filho. A família torna-se, assim, o lugar prioritário da vida do al-
ternante.
Cada família possui sua própria cultura, determinada pelas caracterís-
ticas étnicas, sociais, profissionais, econômicas... que destacam as diferen-
ças entre umas e outras, bem como o ambiente de vida, a comunidade, a
cultura ambiente do meio. Todavia, em cada família, prevalece, em graus
variáveis, uma lógica educativa, feita de valores, de atitudes, de papéis, mas,
também, de preocupações para com o êxito e o futuro de “seus” filhos.
É no seio da família que são realizadas as primeiras aprendizagens,
muitas vezes, essenciais da vida. Seu marco permanece forte nos planos
afetivo, cognitivo, psicomotor... É aí que o corpo, a cabeça e o coração cres-
ceram e tomaram forma. Na adolescência os processos em andamento
prosseguem, mas valendo-se dos caminhos da independência e da auto-
nomia. No seio da família, o questionamento se torna regra para deixar
de ser a criança que não quer mais ser e tornar-se o adulto que se procura.
Neste ensaio construtivista a família permanece sendo, todavia, um lugar

137
de referência, até mesmo de refúgio, um bote de salvamento quando as in-
certezas e as angústias existenciais tornam-se fortes demais. A ambivalên-
cia dos sentimentos e dos comportamentos embaraça e perturba o adoles-
cente e ainda mais os pais. Mas é nesta ambivalência, às vezes conflituosa,
que acontecem as aprendizagens que levam à construção da identidade. A
família, através dos laços afetivos e do amor, através de suas regras e de
suas referências, e, na medida em que o acolhimento e os equilíbrios sejam
suficientes, traz a sua parte de aprendizagens necessárias à busca de identida-
de. Mas, nesta matéria, nenhum programa acadêmico está previsto! E, to-
davia, as aprendizagens da escola dependem em grande parte disto.
A alternância desempenha uma função reguladora de importância. De um
lado, ela permite ao adolescente viver experiências em outros espaços e
provoca, desta maneira, um distanciamento progressivo do campo familiar.
De outro lado, a associação e o envolvimento dos pais na formação de seu
filho podem contribuir para o diálogo, para o relacionamento e para o estabele-
cimento de regras, assim como os meios de encontros e de informação pro-
piciados pelo CEFFA.

O espaço-tempo profissional
A formação alternada dos CEFFAs cede um espaço ao trabalho e à im-
plicação profissional. Estes se confundem ou são distintos do campo famili-
ar. Na sua finalidade de formação integral associam, é bom lembrar, a for-
mação profissional e a formação geral (princípio de formações associadas).
Em seguida, o alternante garante as aprendizagens profissionais que re-
quer uma qualificação e a obtenção de um diploma.
O espaço profissional é animado por uma lógica de produção-realização
de bens ou de serviços com dimensões econômicas, organizacionais, esta-
tutárias e de resultados a serem alcançados. Em seguida, torna-se um lugar
de exigências e de rigor no trabalho, nos horários, nas relações... todos eles
constitutivos de outras referências para um desenvolvimento pessoal. O
tempo profissional representa, para o adolescente, fora do CEFFA, uma
ocupação, mas, principalmente, um tempo cheio de atividades que respon-
de a necessidades essenciais desta idade: encontrar um lugar no mundo
dos adultos e, deste jeito, conquistar um estatuto e papéis, agir, conseguir,
35
ser reconhecido, crescer . Ele é, todo de uma vez, o da entrada no mundo dos

35. Cf. no cap. 4: “Um relacionamento para acompanhar a passagem da adolescência”.

138
adultos, da relação com o trabalho e com a produção, da descoberta profissional, até
mesmo da aprendizagem de uma profissão.
Este tempo de alternância é aquele onde apreendem, se analisam e se
questionam, através da observação, a atividade prática, a troca, a expres-
são... os componentes da vida profissional nos seus aspectos técnicos, econô-
micos, sociais e humanos. É, também, o tempo em que se transferem os sa-
beres do CEFFA: saberes técnicos, tecnológicos, científicos...
Ele representa, assim, o tempo em que se adquirem competências pró-
prias de uma profissão, ou seja, aptidões para implementar conhecimen-
tos, saberes, capacidades, de maneira responsável, numa situação dada.
Seja, em outros termos, saberes de ação que resultam da articulação entre sa-
beres práticos e saberes teóricos. A aquisição de competências só pode, en-
tão, acontecer numa situação de trabalho, e, neste sentido, “a alternância é
36
produtora de competências” .
De modo mais amplo, o período profissional da alternância torna-se o
espaço-tempo no qual se adquire a prática e a cultura de uma profissão, nas
37
suas quatro dimensões .
• A dimensão material, ou seja, a relação com os objetos, com a matéria
(o ferro, o fogo, a madeira, a terra, o vivo... segundo a profissão) que
determina uma maneira de ser específica, de trabalhar, de apreender
as situações.
• A dimensão técnica, a saber, para cada profissão, saber-fazer, técni-
cas, habilidades manuais, ferramentas específicas... ou seja, em defini-
tivo, uma arte de fazer.
• A dimensão social: a profissão confere um estatuto que outorga um lu-
gar na sociedade e determina as relações para com os outros e, em se-
guida, maneiras de se comportar e modalidades relacionais.
• A dimensão simbólica, que faz surgir todo um imaginário ao redor de
uma profissão, ainda mais presente se for antiga, se tiver raízes nos
tempos longínquos. Toda cultura profissional carrega as marcas do
passado e representa sua continuidade. Para as novas profissões, esta
cultura vem sendo elaborada de maneira progressiva.

36. Cf. GEAY, A. Op. cit.


37. Cf. DENOYEL, N. Lê biais du gars – Travail manuel e culture de l’artisan. Paris: Ed.
Universitaires/UNMFREO, 1990.

139
Disto decorre, numa profissão, se misturam, ao mesmo tempo, sabe-
res, saber-fazer e saber-ser, uma inteligência prática, uma habilidade ma-
nual e uma arte de viver. Assim, vem se esboçando a identidade profissional.
Por isso, conceber a formação em relação a uma profissão a aprender e a cons-
truir significa, de um lado, ajudar o alternante a encontrar e perenizar um em-
prego, e, de outro lado, dar a sua formação um sentido e uma dimensão que ul-
trapassam a mera preparação de um exame.

O espaço-tempo escolar
O CEFFA oferece uma lógica e uma cultura bem diferentes, as de uma
finalidade formativa e educativa para todos os membros de um grupo-classe
com uma obrigação de resultados em termos de êxito num exame e de ob-
tenção de um diploma, de qualificação e de orientação para cada um de
seus membros.
Para o alternante, ele representa “o período de escola” porque se de-
para com programas acadêmicos, ensinos, uma organização escolar com
horas de “aula” numa sala, longas horas sentado numa mesa, diante de um
quadro... com todas as representações herdadas da “escola” da infância.
Encontra, aí, outros saberes de um aspecto mais difícil, porque mais teóri-
cos e mais abstratos.
Portanto, o CEFFA, em Pedagogia da Alternância, representa bem
mais do que um lugar-escola. Ele é um espaço-tempo de encruzilhadas e de
encontros, de trocas e de confrontos, de análise e de síntese, de organiza-
ção e de regulação dos processos de alternância, mas, também, de persona-
lização e de socialização.
É o lugar onde vai acontecer o esclarecimento e a superação da prática
e da experiência, onde vão se desenrolar novas aprendizagens, produção
de saberes mais amplos para uma prática pedagógica ao mesmo tempo co-
operativa e personalista. É também o palco de uma vida social no meio de
um grupo de vida. Propicia um outro possível refúgio e outras referências,
necessárias para a construção da identidade na fase adolescente.
Sendo assim, todo alternante caminha em três espaços-tempos, ou
mais, se for considerado o meio físico e humano em que vive, e que devem
existir como tais, na sua identidade e diferenças, para serem complemen-
tares. Ou seja, representado da maneira seguinte:

140
Família
Lógica educativa

Ambiente físico e humano

Lógica produtiva Alternante


Lógica formativa

Empresa CEFFA

Estes três espaços constituem uma ampla complexidade na qual o al-


ternante deve encontrar e traçar seus caminhos na amplitude das possíveis
aprendizagens. A empreitada é difícil e exige uma regulação permanente
para evitar que um deles seja privilegiado e supere os outros, para operar as
passagens de um para o outro, não se dispersar e não ficar bambo, mas en-
contrar sentido, coerência, e, através de tudo isto, unificar-se e construir-se.
Este processo é salutar, mas ambicioso e exigente.

Uma variedade de aprendizagens possíveis

Várias naturezas de aprendizagens decorrem da diversidade das situa-


ções vividas pelo alternante. Umas são frutos dos tempos de vida e das ati-
vidades na família, no meio profissional e social. Outras resultam de ativi-
dades mais dirigidas em situação escolar, entre outras, e, para algumas,
também, no meio profissional.

As aprendizagens experienciais
No quotidiano da vida, o alternante realiza aprendizagens espontâ-
neas, informais e aleatórias ao contato do meio, das situações, das pessoas...
Ao atuar, ao tentar, ao sondar, ao receber conselhos ou informações ele irá
garantir outras de maneira mais estruturada. Tudo isto constitui a expe-
riência e suas aprendizagens que sempre produz efeitos sobre a pessoa.
Mas a experiência é mais ou menos rica. Ela pode ser alienante (dependên-
cia, submissão, servilismo...). Ela é, geralmente, formadora, na medida em
que o alternante está engajado em situações reais e em todas as suas dimen-

141
sões: cognitivas, afetivas, sociais. Sua experiência se torna, então, fonte de
saberes e de aprendizagens. Ela cria uma modificação da relação consigo
mesmo, com os outros e com o mundo, porque a experiência não diz so-
mente respeito às práticas profissionais e ao saber-fazer, mas atinge a pes-
soa na sua globalidade.
Todavia, para ser formadora, a experiência deve ser também “cerca-
da”, ou seja, descrita, falada, analisada, questionada, confrontada, expli-
38
cada novamente, transformada... a fim de que possa realizar-se a transfe-
rência dos conhecimentos adquiridos numa situação dada e específica em
outras situações diferentes.
Este é o trabalho pedagógico do CEFFA que favorece a transferência e
a passagem do particular ao geral.

As aprendizagens formais
São chamadas assim porque são organizadas logicamente para atingir
os objetivos fixados pelas instâncias escolares. Visam uma aquisição de sabe-
res disciplinares que fornecem as teorias, as leis, os modelos, os métodos e as
ferramentas do trabalho intelectual. Elas têm um valor instrumental, de
compreensão das práticas e situações de vida e de formação do espírito. Elas
concorrem para a conceitualização, a abstração. Contribuem para a constru-
ção dos “saberes-ação” ou operatórios. Por isto, apresentam um caráter ge-
ral e sistemático... Mas sua eficiência pode ser relativa. De fato, elas correm o
risco de serem pouco duradouras, pouco sujeitas a novos investimentos, até
mesmo afastadas, quando permanecem corpos estranhos à experiência do
alternante, à sua prática, à sua afetividade, ao seu conhecimento.

Ligar, articular e unificar


39
A alternância, como pedagogia da complexidade , supõe, como diz E.
Morin, “articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir”. Ligar, ar-
ticular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir os campos de saberes,
os campos disciplinares, as naturezas de aprendizagens. Trata-se, aí, de
uma problemática geral de qualquer formação, mas que está sendo coloca-
da com acuidade pela alternância. Para que haja formação o alternante deve

38. Um autor americano, D.A. Kolb, explicitou as quatro etapas necessárias para que a
experiência seja formadora: 1) viver, primeiro, uma experiência concreta; 2) uma ob-
servação reflexiva; 3) uma conceitualização abstrata; 4) em seguida, uma experimenta-
ção ativa. In: Experiential learning. Henglewood Cliffs, Prentice Hall, 1984.
39. Cf. o cap. anterior.

142
garantir um processo integrativo dos saberes e aprendizagens experien-
ciais e formais, realizar a passagem, a transferência de uns para outros. Ca-
be-lhe operar rupturas e relações na ordem dos conhecimentos. Cabe-lhe,
em outras palavras, ligar a mão à cabeça, ao corpo e ao espírito.
O grande psicólogo J. Piaget, baseando-se sobre o processo natural de
40
aprendizagens do humano , enunciou a lógica “Praticar e Compreen-
41
der” . Praticar significa a ação, a experiência. Compreender quer dizer a
reflexão sobre a ação, a explicação, a conceitualização. E, como os dois de-
vem se articular, se integrar, ele acrescentou: “Praticar é compreender em
ação e compreender é praticar em pensamento”. Ou seja, representado da se-
guinte forma:

Praticar Compreender

Compreender em ação Praticar em pensamento

Todo o processo de aprendizagem em alternância se encontra nesta


fórmula. A lógica dos CEFFAs é aquela que vai do conseguir (a prática, a
experiência, o familiar) à compreensão (a teoria, a conceitualização), por-
que corresponde à lógica de aprendizagem da grande maioria dos alter-
nantes. Ela inverte a lógica da escola que coloca a compreensão, ou seja, a
42
abstração, antes da experiência . Por isto, com a alternância, em regra ge-
ral, os fatos antecedem as idéias e o processo é mais indutivo que deduti-
43
vo . Todavia, se este processo está sendo privilegiado, não seria possível
torná-lo exclusivo, porque toda formação exige caminhar das idéias aos fa-
tos e de saber proceder por dedução, isto é, utilizar o caminho que vai da

40. Logo, dizia ele, a criança não esperou entender as leis do movimento para aprender
a andar.
41. PIAGET, J. Op. cit.
42. Estima-se que a lógica Compreender-Praticar (conseguir) corresponde bem a 30-35%
da população escolar, aquela que possui capacidades de abstração imediata, enquanto a
grande maioria, ou seja, mais de 60%, se inscreve melhor no processo Praticar (conse-
guir)-Compreender. O que explica, em parte, a elevada taxa de fracasso escolar.
43. A indução consiste em ir dos fatos ou das práticas às idéias, aos conceitos. A dedução
é o processo inverso: de uma lei, de uma idéia geral, de uma teoria vai-se deduzir uma téc-
nica, uma prática...

143
compreensão à ação bem-sucedida (conseguir com êxito). Nota-se que cer-
tos jovens privilegiam este processo.
Mas a construção de saberes de aprendizagens novas coloca para o al-
ternante o problema de um distanciamento, de um recuo em relação à ex-
periência. Esta, se não for superada, pode representar um obstáculo para
um novo conhecimento. Ele é levado a vivenciar, de forma permanente,
um paradoxo de rupturas e de relações para passar de um conhecimento a
outro: do familiar e empírico da vida ao acadêmico e teórico da escola. Em
outras palavras, operar, ao mesmo tempo, uma continuidade e uma ruptu-
44
ra na ordem dos conhecimentos . Aí reside uma questão essencial, intro-
duzida pela alternância, e todo processo formativo do tipo Ação-Pesqui-
sa-Formação, ou Prática-Teoria. A didática implementada é, neste sentido,
fundamental para gerir a interface, criar as etapas intermediárias entre as
45
aprendizagens experienciais e as formais, mais gerais e sistemáticos . Para
fazer isto, uma fase de expressão e de questionamentos abundantes se im-
põe para voltar à experiência, confrontá-la e compará-la, relativizá-la e ques-
tioná-la. Esta fase intermediária é, também, a do questionamento ou da
problematização, que iniciam e chamam aportes teóricos para um proces-
so em compreensão e generalização, para ir de encontro a mais conceitua-
lização e de abstração.
Todavia, a via integrativa não poderia parar neste estágio do processo.
Ela supõe que os ganhos e conceitos teóricos se inscrevam no campo da
ação e contribuam para uma outra leitura da realidade, para uma outra
maneira de ser e de agir, para uma transformação do meio. A didática, nes-
te caso, mais uma vez, se encontra solicitada para acompanhar o processo.
É na medida em que os conhecimentos conferem uma capacidade de agir
em novas condições, incógnitas ou imprevistas, que se constrói e cresce a
autonomia.

Conclusão

Concebida deste jeito, a Pedagogia da Alternância se torna um proces-


so de cunho científico, que produz um aprendizado de uma cultura cientí-
fica, de uma cultura “continuada”, e não fixada no tempo escolar, isto é,
em outras palavras, um aprendizado da educação permanente.

44. O que G. Bachelard e outros chamaram de ruptura epistemológica.


45. Tenho, neste sentido, situado a alternância como uma pedagogia das orlas, cf. cap. 3.

144
8
VIVENCIAR E FAZER VIVER A ALTERNÂNCIA: UMA
NOVA PROFISSÃO DA FORMAÇÃO

Uma nova profissão se perfila... uma profissão recheada de


aventuras diárias, de atenção às pessoas e aos recursos que
se pode mobilizar, uma profissão em que o domínio de sua
disciplina articula-se com o conhecimento que se pode ter
de seus alunos, uma profissão na qual a paixão de
aprender se torna fonte contínua de exaltação... Mas, tudo
fica por fazer ou quase...
Philippe Meirieu

Caminhamos construindo uma caminhada que acontece


entre divagação e resultado, muitas vezes incerto e
inesperado, de nossas estratégias. A incerteza nos
acompanha e a esperança nos estimula.
Edgar Morin

Se a alternância operou uma transformação da concepção da escola,


ela implica que os formadores tenham um estatuto e papéis diferentes dos
docentes tradicionais. E, todavia, exigências administrativas continuam im-
pondo ao CEFFA professores disciplinares como se tivesse só uma e única
via para aprender. Os capítulos anteriores tentaram demonstrar o contrá-
rio. A alternância e o novo modo de “escola” que engendra levam, então, à
emergência de uma nova profissão da formação.
Os monitores de CEFFAs representam os princípios, senão exemplos,
desta nova profissão. Por isto, este capítulo propõe-se examinar as caracte-
rísticas e os papéis desempenhados, a fim de tirar as conseqüências quanto
ao recrutamento dos monitores, à sua preparação para a profissão e as con-
dições do seu exercício.

Monitor de CEFFA: uma profissão a viver dentro de uma


complexidade

Os monitores formam um componente essencial do sistema de forma-


ção alternada. É sobre eles que se apóia, no dia-a-dia, o funcionamento pe-
dagógico, educativo e material do CEFFA.

145
1. Do professor ao formador
Na pedagogia tradicional o “Mestre” se confunde com o conhecimen-
to. Administrativamente, o melhor mestre ou professor é aquele que possui
mais conhecimentos. O aluno, nesta lógica, deve adaptar-se a um e a outro,
caso contrário ele estagna ou é excluído.
Em oposição a esta lógica, as orientações da pedagogia nova situam em
primeiro plano a criança ou o adolescente. Aqui o programa e o mestre se
adaptam ao aluno e o acompanham no seu desenvolvimento. O professor,
neste caso, não é mais aquele que detém mais conhecimentos, mas aquele
que acompanha, guia, orienta em direção às fontes do conhecimento, aju-
da nas estruturações destes, facilita as aprendizagens, ensina quando ne-
cessário.
Se nesta lógica os papéis dos professores se diversificam, eles ainda fi-
cam limitados. De fato, toda situação educativa não se restringe a uma úni-
ca relação entre um aluno, um professor e um saber. O conhecimento não
é somente este do mestre ou da classe. O aluno não é um ser abstrato a con-
siderar em si, mas uma pessoa com um passado, uma história de vida, com
projetos, uma família, um ambiente social, profissional e cultural. A classe
não se limita a uma justaposição de indivíduos, mas constitui sobretudo um
grupo em interação com um ou vários professores ou formadores. A classe
representa um elemento de um estabelecimento, de uma escola, de uma
instituição mais ampla, com seus projetos, suas finalidades, seus métodos,
suas relações de poder... Este conjunto se situa dentro de um contexto, um
ambiente com suas características físicas, socioeconômicas e culturais.
O desenvolvimento da formação, fora dos quadros habituais do ensino
como exige a formação profissional, a formação dos adultos ou ainda ou-
tros, com a introdução da alternância, leva em consideração esse conjunto
de elementos e a considerar toda situação de formação como uma complexidade
a gerir.
Os CEFFA se situam dentro desta lógica. Eles praticam o que denomi-
namos atualmente de educação sistêmica. É neste contexto, dentro deste sis-
tema complexo, que as funções de um monitor são exercidas.

2. O monitor: um ator da complexidade


Enfrentar e gerir a complexidade educativa supõe, para o monitor, as-
sumir uma diversidade de encontros e de confrontos:
• Com adolescentes ou adultos que constituem o primeiro componente do
sistema. Trata-se de adolescentes ou de jovens adultos, em busca, caminhan-
do, às vezes enfrentando dificuldades devidas à fase atual de vida ou ao pas-
sado, ou ainda ao contexto socioeconômico e cultural. Não devem ser con-

146
siderados como “alunos de uma escola” na concepção tradicional, mas
como atores socioprofissionais em formação com outros, em grupo. São porta-
dores de experiências a comunicar e de questionamentos múltiplos. Cada um
deles com processo personalizado, a partir de sua situação de alternante e de
seus projetos, a serem esclarecidos ou consolidados, mas sempre depen-
dendo de acompanhamento.
• Com as realidades da vida profissional das empresas, do mundo da pro-
dução, do trabalho, da vida social, do ambiente. Logo, sua apreensão e seu
conhecimento constituem exigências de primeira ordem para os monitores.
• Com os parceiros co-formadores de cada alternante: pais, mestres de es-
tágio, tutores... tanto por meios de informação e de ligação quanto através
de encontros periódicos no CEFFA e no meio.
• Com diferentes tipos de saber: aqueles adquiridos fora do meio escolar e
que é importante considerar e valorizar e aqueles dos programas, que im-
porta tornar acessíveis.
• Com grupos e uma vida residencial a animar. Um CEFFA, mais do que
um mero lugar de ensino, é um espaço de vida educativa com seus tempos
para refeições, seus serões e seu internato, atividades de lazer e culturais,
mas também de participação na vida material da casa. O grupo, mais que
um grupo-classe, logo representa um grupo de vida com seus efeitos de so-
cialização.
• Com a vida do CEFFA e de sua associação. Como estrutura de formação,
o CEFFA está presente num território, oferecendo-lhe sua parcela de con-
tribuição nos aspectos da educação e do desenvolvimento. Logo, deve afir-
mar seu lugar através de uma presença nas manifestações, uma participa-
ção e engajamentos na vida local. O presidente e os administradores, o di-
retor e os monitores, no seu devido lugar, garantem esta representação.
O Conselho de Administração da associação e a equipe pedagógica, nas
suas funções e responsabilidades respectivas, representam as duas instâncias
animadoras da estrutura. Seu conhecimento mútuo, sua estreita colaboração,
bem como relações de convivência, condicionam um funcionamento equili-
brado do conjunto. Logo, a função do monitor abrange a vida associativa.

3. Uma função de generalista


Desta forma, o monitor se encontra na interseção dentro de conjuntos va-
riados. Ele não pode ser um professor centrado em sua disciplina. Ele passa a
ser, pela própria estrutura e o projeto educativo, um agente de relação e de
comunicação entre diferentes instâncias do sistema. Ele tem uma função me-
diadora com relação à pessoa alternante, com ela mesma, com o saber, com o
outro, com o grupo, com os adultos de seu meio.

147
É neste sentido que podemos falar de uma função de generalista e de
polivalência, já que caminham lado a lado, nas funções a exercer, ao mes-
mo tempo: a educação, a formação, o ensino, a animação. Função complexa,
que se enriquece pela variedade que se gera, pela criatividade que supõe,
pela impossibilidade do repetitivo. Função rica neste caso, mas difícil e que
supõe que sejam pesquisadas as condições que facilitam seu exercício: or-
ganização, hierarquia das ações, responsabilidade e cooperação dentro de
uma equipe pedagógica, reconhecimento e valorização pelo meio que o
cerca e pelas estruturas administrativas.
Vista desta maneira esta função de generalista, os papéis desempenha-
dos podem logo ser enumerados a partir de quatro direções:
• Papéis de educação com relação aos jovens quando eles se encontram
na faixa etária às vezes crítica, mas essencial da vida, que é a adolescência.
As atitudes, o olhar, a forma de autoridade entram neste momento em con-
sideração para permitir de se encontrar, de construir sua identidade, de
crescer, de conquistar a sua autonomia, de tornar-se uma pessoa.
• Papéis pedagógicos para colocar em prática as metodologias, os instru-
mentos, o saber-fazer apropriado a fim de articular os tempos e os espaços
da formação, associar e colocar em sinergia os conhecimentos profissionais
e gerais, otimizar as aprendizagens.
• Papéis de relação e de animação das estruturas com as quais trabalha:
– a associação do CEFFA à qual precisa dar vida, entreter sua vitalidade
para que ela cumpra suas funções e alcance seus objetivos;
– a rede dos parceiros co-formadores (pais, mestres de estágio...) a fim
de que eles assumam sua missão educativa e de aprendizagem;
– a vida interna do CEFFA como estrutura material e estrutura educa-
tiva;
– os diferentes grupos nas salas de aula e, mais globalmente, da vida
residencial no CEFFA.
• Papéis técnicos em termos de competências e de conhecimentos den-
tro dos campos profissionais aos quais os jovens em formação são confron-
tados. A profissão ou o conhecimento profissional compartilhados pare-
cem constituir uma mediação essencial da relação pedagógica e educativa
nas formações em alternância.

As condições de exercício de uma profissão

Pela sua dimensão global, a função de monitor de CEFFA, se é rica,


não deixa de ser, todavia, complexa e difícil. Logo, o seu exercício requer

148
condições que dependem ao mesmo tempo da escolha das pessoas no mo-
mento do recrutamento, da formação inicial e contínua e das modalidades
de trabalho.

1. O perfil
Os critérios de personalidade, de maturidade são evidentemente pri-
mordiais, mas também os de conhecimento dos ambientes profissionais,
de experiência profissional a fim de perceber a situação vivida em alter-
nância pelos jovens, de estar mais perto de sua cultura. É por isso que, na
França, sempre se preferiu perfis de formação técnica, tecnológica ou de
engenheiro aos de pura formação acadêmica geral.
É claro que os níveis requisitados devem se inscrever no quadro das le-
gislações existentes. É conveniente notar as dificuldades que apresentam,
na maioria das vezes, estas legislações, pois são concebidas, quanto aos cri-
térios de acesso ao ensino, com base em modelos de pedagogia tradicional.
Decorre daí incompatibilidades flagrantes com o modelo da Pedagogia da
Alternância que não pode se contentar com professores fechados em seu
campo disciplinar e na sala de aula.

2. O trabalho em equipe
Como já dissemos, o trabalho em equipe pedagógica constitui uma ou-
tra característica institucional devido às implicações da alternância, mas
também ao projeto educativo com pretensão personalista. Colocar em prá-
tica uma pedagogia da pessoa implica numa intervenção em grupo, exige
uma ação cooperativa. Todas as pedagogias novas das quais os CEFFAs se
nutriram no tempo e que colocam o desenvolvimento da pessoa em primei-
ro plano têm uma ação de equipe. Quando é o programa de ensino e seus
conteúdos que são colocados em primeiro plano, não é preciso equipe, a
prática individual pode ser suficiente. Mas se pretendemos uma formação
global, a melhor alternativa é o coletivo.

3. Mais que uma função: uma profissão


Diante das exigências da função pedagógica e educativa, os monitores
precisam de um quadro de trabalho seguro e estável para exercer sua profis-
são de maneira duradoura. Este quadro é dado pela dimensão da “profis-
são” que é atribuída à monitoria. Para ser feito, ele deve ser qualificado, or-
ganizado e, é claro, reconhecido e considerado. Por exemplo, na França, os
órgãos institucionais e sindicais trabalharam para construir esta profissão
pela elaboração de uma convenção coletiva, pela negociação e a assinatura

149
de contratos com o ministério pertinente, reconhecendo a capacidade e o
direito em exercer esta profissão educativa.

4. Uma formação
Uma profissão como esta não se improvisa. Ela supõe, como para todas
as profissões, uma aprendizagem e, ao longo da prática, uma formação
contínua.
• A formação pedagógica inicial é obrigatória para uma iniciação e apren-
dizagens básicas do monitor de CEFFA. Coerente com suas finalidades,
esta formação deve ser conduzida em alternância. Na França, ela se enun-
cia através da fórmula “uma formação para e pela alternância”.
• “Para a alternância”: significa que se trata da preparação para a con-
dução das formações em alternância e, mais precisamente, no sistema edu-
cativo dos CEFFAs. O que supõe o desenvolvimento das competências par-
ticulares que o exercício das funções exige, tais como já foram citadas ante-
riormente.
• “Pela alternância”: quer dizer que a formação resulta da ação profis-
sional em serviço, no seio de uma equipe educativa de um CEFFA e de ses-
sões de formação pedagógica que pontuam periodicamente o percurso
formativo.
A formação contínua pode tomar direções diversas para ampliar o cam-
po dos conhecimentos e das competências, para adquirir novas qualifica-
ções; quer seja nos campos técnico-econômicos, científicos, das ciências
humanas, da pedagogia, do desenvolvimento...
Paralelos a um aperfeiçoamento de curta duração a partir de sessões
temáticas, existem também projetos mais constantes com pretensões pro-
mocionais e de qualificação superior que contribuem no crescimento das
46
pessoas e da própria instituição .
Assim, a formação dos monitores (inicial e contínua) não poderia ser
feita de ensinamentos e de consumo de conhecimentos abstratos fora da
realidade. Mas ela deve ser, justamente ao contrário, uma formação que
acompanha a entrada e, em seguida, a experiência da profissão, associan-
do a prática à sua teorização, a partir de processos de pesquisa-ação, de

46. Esta via foi aberta pela implementação com a Universidade de Tours de um curso
de formação universitária: o Diploma Universitário da Prática Social (Dueps). Um pro-
cesso similar foi realizado no Brasil através do mestrado Formação e Desenvolvimento
Sustentável, graças a iniciativa da SIMFR e à parceria da Universidade François Rabe-
lais de Tours (França) e da Universidade Nova de Lisboa (Portugal). Observa-se que vá-
rias universidades brasileiras contribuíram nesta formação.

150
produção de conhecimentos para alcançar maior lucidez sobre as práticas,
em complexidade e em autonomia.

Em favor do reconhecimento de uma nova profissão da formação

A profissão de monitor de CEFFA encontra-se bem longe, nas suas ca-


racterísticas e seus papéis, daquela do docente tradicional. Esta nova pro-
fissão da formação não é, hoje, própria aos monitores dos CEFFAs, mas es-
tende-se, cada vez mais, no campo da formação profissional dos jovens e da
formação contínua dos adultos. Embora permaneçam, ainda, por demais
dominados pelos modelos escolares, os estatutos e os papéis dos agentes da
47
formação evoluem bastante . Logo, a articulação crescente do dispositivo
de formação com o sistema de produção, as novas tecnologias da informa-
ção e da comunicação como novos conceitos científicos provocam, nos for-
madores, mudanças fundamentais e exigem competências complexas que
vão além daquelas tradicionalmente exigidas dos docentes. A saber, um
alargamento das tarefas e das funções e, em conseqüência, uma evolução
rumo à polivalência mais do que à especialização, ao trabalho em equipe,
ao desenvolvimento de parcerias com empresas para uma gestão participa-
tiva dos recursos humanos e das tutorias. Por isto, fala-se, em relação aos
novos formadores, de “perfil em mutação” e de um outro profissionalismo. Para
isto, as análises realizadas evidenciam as seguintes orientações:
1) Antes de tudo, considerar qualquer formação como um sistema situ-
ado num determinado meio e constituído de elementos em interações
que o ultrapassa e o aclara. O que supõe uma rede de funções comple-
mentares para implementá-lo.
2) Um recrutamento de formadores que possuem uma experiência
pessoal do mundo e da produção ou do trabalho profissional.
3) Uma preparação dos formadores através de formações apropriadas,
em ruptura com a concepção tradicional da formação de docentes por
cursos acadêmicos dominados pelas disciplinas. Novas estratégias e
metodologias precisam ser implementadas para diversificar os pólos
de competências, através de conteúdos amplos e variados, procedi-
mentos de alternância entre tempos de ações pedagógicas reais e dias
de formação formal. A utilização do “Projeto” é o meio de personalizar
e de autonomizar as aprendizagens e os percursos da formação.

47. Uma revista francesa – Actualité de la formation permanente – dedica numerosos arti-
gos e números a esta questão. A saber, por exemplo, um artigo de B. Lietard: La forma-
tion change, le formateurs aussi, n. 117, mar.-abr./1992.

151
4) A formação permanente torna-se de primeira necessidade diante ao
“desgaste” que resulta de todo trabalho de formação, mas, principal-
mente, para seguir as rápidas evoluções que acontecem em todas as
áreas (tecnológicas, cientificas, econômicas, sociais e culturais...). Neste
48
sentido, referindo-se ao autor de um relatório europeu , os quatro pó-
los seguintes parecem constituir orientações de formação permanente
a serem escolhidos em função das necessidades.
O domínio tecnológico

A experiência do
empreendimento A abertura social

A capacidade pedagógica

5) Uma outra recomendação essencial diz respeito ao reconhecimento


destas novas profissões. Ele passa pela certificação das competências
profissionais exigidas, atestada por um certificado homologado e reconhecido
oficialmente, da mesma maneira que acontece para as profissões tradi-
cionais do ensino.

Conclusão

A alternância obriga a efetuar a passagem do ensino à animação peda-


gógica e institucional. Ela leva a ida do estatuto de docente ao estatuto de
“Formador-Monitor”, ou, pelo menos, a clarear e diferenciar as funções e
os papéis no seio de uma equipe educativa, porque a alternância obriga ao
trabalho de equipe. Talvez estejamos, com o desenvolvimento da formação
de adultos e seu corolário, a alternância, saindo da escola do século XX,
como o sugeria, há mais de 20 anos, E. Morin. Podemos nos alegrar com
isto, mas tais mudanças, até mesmo reconversões, introduzem uma dupla
perspectiva: a de profundas transformações institucionais e a da própria
formação inicial e permanente daqueles mesmos que terão, como missão, a
formação dos outros.

48. THERY, B. Pour une formation de formateurs adaptée au contexte économique e social. Ber-
lim: Cedefop.

152
CONCLUSÃO DA SEGUNDA PARTE

Acertar com a Pedagogia da Alternância supõe ter algum conhecimen-


to – e cada vez mais – dos seus componentes, dos seus recursos e seus pro-
cessos que ela gera. Mas a sua compreensão supõe, antes de tudo, distan-
ciar-se dos modelos tradicionais e habituais da pedagogia e da formação
que nos impregnam. Ela exige que saiamos das concepções fechadas, line-
ares e simplificadoras, que deixemos o pensamento racionalista para en-
trar no pensamento complexo. Ela implica aceitarmos o desmantelamen-
to dos espaços e dos tempos para abrir-se a sua pluralidade e a sua hetero-
geneidade. Ela convida a levar em conta e gerir o movimento permanen-
te, a dinâmica do amanhã, nos quais a alternância nos envolve e, em se-
guida, aceitar as incertezas, os riscos, as contradições e os paradoxos, a
confrontação da ordem com as desordens e todos os jogos da complexi-
dade, a implementar e gerir estratégias mais do que programas estabele-
cidos. Ela convida a colocar-se numa perspectiva de construção e de for-
mação permanentes.
Mas compreender a Pedagogia da Alternância significa, também, per-
ceber, além dos procedimentos acionados e dos jogos institucionais, que é
o “alternante” – e ele só – que está no centro da complexidade, que cons-
trói, aprende, se forma, se educa, cresce do seu jeito obedecendo os proces-
sos permanentes de auto-organização, de autoconstrução, de autonomiza-
ção progressiva. É perceber, em seguida, que os monitores têm como mis-
são de propor os instrumentos e as atitudes apropriados para facilitar a or-
questração de todos os componentes de formação e de educação ao alcance
de cada alternante.
Compreender a Pedagogia da Alternância supõe, em muitos casos,
uma pequena (ou uma grande) revolução das mentalidades e dos espíritos.
Mas a alternância é bem mais complexa do que se disse dela aqui e está
longe de ter desvendado todos os seus segredos. É por isso que ela contém
promessas para o futuro.

153
CONCLUSÃO GERAL
Um caminho-método para o amanhã e a era planetária

Os focos de mudança de era revelar-se-ão, não tenha


dúvida, múltiplos, inesperados, disseminados em toda a
superfície da Terra. Que o saiba ou não, que ela o queira
ou não, a humanidade entrou na sua fase de
mundialização e a civilização vindoura, se é que deve
haver uma, só pode ser planetária. Resta-nos saber o que
será mais atraente: a universalização do sistema atual,
para o maior proveito de alguns, ou o impulso dos
moradores da Terra para colocar em comum suas
diferenças culturais.
Jacques Robin

Só um pensamento global e multidimensional, só um


pensamento questionador podem captar o que é e o que se
faz, ao mesmo tempo em que se abre para o futuro.
Kostas Axelos

...qualquer pedagogia pensada fora disto coloca, hoje, um


problema de contextualização. A responsabilidade dos
sistemas de formação e dos educadores está comprometida...
Moacir Gadotti

De ontem, de hoje e de amanhã, o movimento mundial dos CEFFAs se ins-


creve no tempo como conceito de formação. Esta perenidade deve-se, ao
mesmo tempo, à pertinência de suas finalidades, de sua estrutura de fun-
cionamento e de seu método pedagógico fundado sobre a alternância, tais
como este livro tentou situar. Se atingir esta dimensão no espaço e no tem-
po, é porque seus projetos educativos, de desenvolvimento das pessoas e
dos meios foram – e são – adequados às necessidades das famílias e dos
adolescentes do mundo rural, mas também urbano, e porque, de outro
lado, sua tríplice estrutura: associativa, educativa e pedagógica, implica
seus atores, os responsabiliza, lhes confere poder. Por isto, tanto quanto
em seu período inicial, as MFR têm de prosseguir na sua missão educativa

154
e promocional para os tempos vindouros, e não é presunçoso afirmar que
1
oferecem um “método-caminho” para o amanhã e para a era planetária.
Ontem, os fundadores tinham colocado as MFR fora dos trilhos conven-
cionais do ensino. Propuseram trilhar outro caminho para a formação,
para a educação dos jovens do meio rural. Um caminho sustentado por um
2
projeto para o homem, para a agricultura, para a ruralidade . Para dar sen-
tido a este projeto ambicioso necessitou-se de uma estrutura, um método
e “formadores-animadores” do projeto. Também, não contentar-se com os
programas acadêmicos impostos pela administração educativa, mas tor-
ná-los inteligíveis, colocá-los numa estrutura e numa linguagem acessí-
veis e compatíveis com os jogos e desafios da alternância. Precisou, às ve-
zes, reforçá-los, incorporando neles conteúdos que permitiam ir ao encon-
tro das metas e dos objetivos do projeto. Ainda precisava compreender o
que era, na época, os adolescentes rurais, os seus centros de interesse, seus
modos de expressão no seu ambiente de vida, bem como os de seus pais, a
fim de que possam se sentir envolvidos e que sua participação seja efetiva.
Precisava uma educação, uma formação que, longe de se restringir no cam-
po escolar, interaja com o meio ambiente e contribua, assim, com o seu de-
senvolvimento. Tratou-se, na verdade, para as MFR, não de trilhar os ca-
minhos da formação existentes, mas, sim, de abrir novos caminhos, nem
de andar pelos caminhos do passado, mas de preparar as rotas do futuro.
3
Ou seja, um caminho a ser desbravado e uma estratégia a ser construída
no dia-a-dia. É por isto que se inscreveram, embora superando-a, na mu-
dança pedagógica nova na França e de seus promotores: R. Cousinet, C.
Freinet, O. Decroly, J. Dewey, Ferriere, Claparede... é o motivo pelo qual

1. Tomamos esta expressão emprestada de Edgar Morin em Éduquer pour l’ère planétaire
(op. cit.). Que ele mesmo tomou emprestada de uma autora espanhola, Maria Zambra-
no: Notas de um método (Madri, 1989).
2. Neste sentido, um sociólogo, Pierre Idiard, escrevia, em 1980, numa análise retros-
pectiva: “Na origem, as MFR (CFR) representavam reivindicações de um meio rural
francês, que buscavam nelas a expressão de sua rejeição e de sua reação às ameaças de
aculturação e de marginalização que continha, para ele, o desenvolvimento industrial e
urbano, alimentado pelo êxodo de seus melhores elementos”. E prosseguia, mais adi-
ante: “O êxodo rural vira o ‘inimigo’. As MFR (CFR) vão se dar como primeiro objetivo
de ‘reter os melhores na terra’, para transformá-los, aí mesmo, em ‘líderes camponeses’
que salvarão a comunidade da ruína”. E ainda “as MFR (CFR) vão apostar em dois ele-
mentos políticos: estarão, resolutamente, a favor do progresso agrícola contra a rotina,
‘apóstolo’ da qualidade profissional... mas, ao mesmo tempo, permanecerão, radical-
mente, em defesa da ‘exploração familiar. In: Les Maisons Familiales Rurales. Revue
Internationale d’Action Communautaire, n. 3/43. Montreal, 1980.
3. Apraz-nos citar estas palavras do poeta espanhol Antonio Machado: “Viajante, não
há caminho, o caminho nasce de tua caminhada”.

155
elas se identificaram, em muitos aspectos, com as visões e a pedagogia de P.
4
Freire no Brasil .
Nos tempos atuais, as MFR representam plenamente uma originalida-
de no mundo educativo. Elas oferecem um “outro caminho”, como diz o
seu slogan, e fornecem uma contribuição essencial para numerosos jovens.
Aparecem, embora menos agora com a emergência da alternância, sempre
à parte, dentro do sistema educativo. Ainda são consideradas, aqui e acolá,
como “escolinhas” destinadas a pré-adolescentes ou adolescentes “pouco
dotados para o estudo” e que são, mais ou menos, rejeitados pelo sistema
escolar. É claro que elas os acolhem e lhes prestam um serviço imenso, pos-
sibilitando-os reencontrar o caminho certo do êxito e da confiança. Do
mesmo jeito, acolhem, também, aqueles que, por motivos diversos, não pu-
deram “continuar a escola”. Mas elas acolhem, do mesmo jeito, aqueles
que possuem capacidades mais abstratas e que são bem-sucedidos na es-
cola. Uns e outros encontram nelas um outro percurso de formação geral,
ao passo em que iniciam uma inserção socioprofissional, uma preparação
para alguma qualificação, garantindo, na medida do possível, o exercício
de uma profissão ou da continuidade de estudos. O método da alternância,
com certeza, contribui com isso, mas, bem mais, a dimensão humana e
educativa que presidem a sua implementação. Uma MFR, como este livro o
demonstrou, representa uma rede de co-formadores, um complexo racio-
nal, que contribuem para que os atores do sistema se relacionem entre si,
e através disto aprendam uns dos outros, como dizia, em seu tempo, I.
5
Illich . A estadia na MFR não representa somente um tempo de escola para
aprender e construir saberes, mas, também, um tempo de vida com os ou-
tros, no seio de uma estrutura educativa onde se partilham as refeições, os
lazeres, as atividades socioculturais à noite. Um tempo de vida em interna-
to onde, para ser moderno, de vida residencial, que permite aos adolescen-
tes, às vezes em descaminho, de encontrar algum porto seguro, algum lu-
gar para desabafar, algum espaço de escuta e de diálogo, algumas referên-
cias para o presente e o futuro.
Nos tempos atuais, então, as MFR oferecem uma possibilidade de
“praticar, conseguir, alcançar de outro jeito, por outro caminho” (Réussir
autrement) e, em nome disto, prestam um serviço. Todavia, elas precisam
adaptar-se às evoluções de todo tipo (públicos, programas, contextos socio-
lógicos, campos profissionais investidos...). Devem impregnar-se e adqui-
rir novas linguagens, novas abordagens, novas culturas a fim de que a prá-

4. FREIRE, P. L’éducation, pratique de la liberte. Paris: Du Cerf, 1975.


5. ILLICH, I. La convivialité. Paris: Seuil, 1973.

156
tica da alternância permaneça uma pedagogia arraigada na realidade. Se-
não, a alternância não passa de mera palavra. Elas devem estar atentas ao
processo de desgaste e de institucionalização que está de olho em qualquer
estrutura que tem certa idade. O desenvolvimento a qualquer custo das for-
mações alternadas, a exemplo das pressões das administrações educativas,
dos programas a serem aplicados, das regras avaliativas e dos controles,
levam, insidiosamente, a processos de uniformização e de normalização.
Para salvaguardarem-se, no presente, e mais ainda, no futuro, elas preci-
sam esforçar-se em garantir “uma plenitude de sentido”.
Amanhã, a “plenitude de sentido” do movimento das MFR encon-
trar-se-á na ótica personalista e humanista de sua ação, mas inscrita na cor-
rente da educação planetária, da educação para a cidadania universal, de
6
“uma pedagogia da terra” , de uma “ecopedagogia” de que já se fala muito
no planeta, particularmente na América Latina. Presenciamos o nascimen-
to de um cidadão planetário sem ter condições ainda de medir todas as
conseqüências. Mas o processo está engajado, e as MFR terão de manter
seu espaço no seio dos sistemas educativos para relevar os desafios que
apontam...
Que tipo de homens e de mulheres exigirá o mundo de amanhã? Esta-
mos indo, se já não o é, para um mundo global, com complexidade cres-
cente que demandará espíritos abertos, em movimento, capazes de leituras
plurais e distanciadas, de abordagens amplas e sistêmicas e não somente
providos de saberes acadêmicos. Tratar-se-á de ser equipado para levar em
consideração e compreender, na medida do possível, os componentes da
vida humana, da vida do mundo, para enfrentar as incertezas e as comple-
xidades, para resistir aos redemoinhos de um mundo em movimento, para
formar-se através das novas tecnologias da informação e da comunicação,
para ter vontade e as capacidades de empreender, de criar e para viver a
formação permanente ao longo de toda a vida.
O movimento das MFR (CFR) traz, pelas suas finalidades e sua filosofia
da formação animada pelo seu método pedagógico, os germes da educa-
ção do futuro. As MFR (CFR), desde a sua criação e depois no seu desenvol-
vimento, foram adiantadas sobre o seu tempo. Elas assim permanecem e é
essencial que elas mantenham essa parte de diferença que as caracteriza.
Mas de que natureza será essa diferença? Mais do que nunca, para os tem-
pos vindouros, elas precisam manter esta linha, ficando de vigia, guardan-
do o rumo de suas finalidades personalistas, do respeito e da implicação
das famílias ao mesmo tempo em que, ajustando os objetivos e os meios, le-

6. GADOTTI, M. Pedagogia da Terra. São Paulo: [s.e.], 2000.

157
vando em conta as evoluções e as novas necessidades que decorrem disto
tudo. Elas têm e terão que preparar os jovens para enfrentar este mundo,
complexo e difícil de viver, no qual nós já estamos mergulhados, mas que o
ficará mais ainda, dando-lhes as referências e os meios, em termos de sa-
beres, de saber-fazer e de saber-ser, para situar-se nele e o compreender.
Para permitir-lhes de fazer “a grande viagem no seu universo interior e no
universo que os envolve”. Ajudá-los, em outros termos, a estar ao mesmo
tempo no local e no global. A saber:
• Estar, atuar mais no local, aí, onde estão as raízes, para, se for possível,
viver, ganhar a vida, ser dele um ator familial, profissional, social. Repre-
senta todo o sentido, de um lado, das atividades e instrumentos pedagógi-
cos, que permitem que cada jovem descubra e conheça o meio em que vive,
e, de outro lado, do trabalho de orientação, de acompanhamento para des-
cobrir suas competências e elucidar seus projetos.
• Mas, ao mesmo tempo, pensar globalmente, a fim de, como diz G. Pi-
neau, “tomar consciência dos laços entre a vida quotidiana e o mundo na
sua amplitude e sua complexidade física e social...”, tomar consciência, em
7
outros termos, de que “o coração do quotidiano bate no ritmo do mundo” .
E seguimos o autor brasileiro M. Gadotti quando afirma que “não se pode
opor o universal e o concreto, o geral e o singular, porque o universal é, ao
8
mesmo tempo, singular” . O que convida a fazer com que a educação de-
senvolva, segundo E. Morin, as diversas dependências cidadãs: do territó-
rio, da nação, das comunidades supranacionais e da Terra. De onde a
emergência desta perspectiva de educação planetária para compreender
e estar na aventura da humanidade, “uma aventura incerta, desconhecida,
9
na busca de seu destino” .
Esta consciência e esta articulação do local e do global exigem, para fazer
isto, uma aptidão para a abordagem multidimensional dos problemas, o desen-
volvimento do pensamento complexo, ou seja, na relação das coisas, na compre-
ensão das interações e das interdependências entre os fatos, os fenômenos,
os atores, bem como a aptidão para enfrentar a incerteza, as relações hu-
manas... Neste sentido, situei nesta obra a alternância como uma pedago-
gia da complexidade.

7. PINEAU, G. (coord.). Habiter la Terre – Ecoformation terrestre pour une conscience


planétaire. Paris: L’Harmattan, 2005.
8. GADOTTI, M. Charte pour une écopédagogie planétaire coopérative et une éducati-
on du futur. In: Habiter la Terre – Ecoformation terrestre pour une conscience planéta-
ire. Paris: L’Harmattan, 2005.
9. MORIN, E. Op. cit.

158
Por isto, as MFR devem manter o rumo de uma formação realista, ancora-
da num terreno, mas aberta e ampla.
Estas perspectivas supõem um método, conteúdos e “agentes educati-
vos” patenteados.
• O método existe com a alternância (cf. cap. 6), suas atividades e ferra-
mentas (cf. cap. 2), sua organização e sua gestão (cf. cap. 3), suas estratégias
relacionais (cf. cap. 4) e cognitivas (cf. cap. 7), seus animadores (cf. cap. 8).
• Os conteúdos. Sua trama é dada pelos programas oficiais cuja aquisição
está sendo verificada e sancionada pelos exames. Mesmo se tentam levar,
progressivamente, em consideração as evoluções e os saberes novos, suas
orientações permanecem, na maioria das vezes, tributárias de concepções
pedagógicas ancoradas no passado e na pedagogia tradicional. Além do
que, muitas vezes, são expressos numa linguagem complicada de especialis-
ta, até pouco compreensível, para o comum dos mortais. Por isto, revisões e
reorientações do fundo e da forma vêm se impondo para que estejam em
10
adequação com os tempos vindouros e inteligíveis para os beneficiários.
Após os fundadores, os que desenvolveram as MFR tinham criado ins-
trumentos pedagógicos e concebido programas que ultrapassavam aqueles
dos programas acadêmicos impostos, a fim de atingir as finalidades e as
metas de sua ação. Hoje, existe a necessidade de fazer igual para que os
“materiais” de formação respondam às exigências que o mundo de ama-
nhã virá reivindicar. Os conteúdos e os processos pedagógicos deverão
permitir aliar, ao mesmo tempo, a experiência do terreno, a implicação em
situações de tamanho real e a abertura às ciências, ao conhecimento do
universal, à compreensão do mundo, do planeta, ao desenvolvimento, à ci-
dadania, ao pertencimento local e da terra... para que se realize “a viagem
interior e a viagem universal”, e para que se engaja a escola ao longo da
vida toda.
• Os monitores inscrever-se-ão, mais do que nunca, nas “novas profis-
sões da formação” (cf. cap. 8) a serem construídas através de formações apro-
priadas e afirmarão, no seu estatuto, os seus papéis específicos, a serem re-
conhecidos tanto pelos poderes públicos quanto pelas instâncias do ensino
e da sociedade.

10. Respondendo, neste sentido, a um pedido da Unesco, E. Morin enunciou, junto a


outros, “Os sete saberes para a Educação do futuro” (op. cit.). Eles vão da tomada de
consciência e do saber apreender a complexidade e a incerteza à ética do gênero hu-
mano, passando pelos princípios de um conhecimento pertinente, os ensinamentos da
condição humana e da identidade terráquea, as chaves da compreensão entre os ho-
mens e do enfrentamento das incertezas, aquelas da história, bem como aquelas da
construção do mundo futuro.

159
O movimento das MFR deve colocar-se, não somente na reflexão e na
multiplicidade de análises e de idéias que acontece hoje sobre o sentido e
as modalidades da formação de amanhã, sobre o devir do planeta Terra
e as responsabilidades das instâncias educativas na matéria, mas oferecer
respostas e realizações concretas. Existe aí conteúdo para dar sentido à sua
ação, para manter sempre uma “plenitude de sentido”.
Por isso, o desenvolvimento sustentável, a cidadania terrena, o devir pla-
netário... representam extraordinários temas de formação e de educação
porque possuem dimensão, porque interessam e implicam todos os prota-
gonistas de uma MFR (os jovens em formação, as famílias, os mestres de es-
tágio profissionais, as equipes educativas, os administradores), porque aliam
o território e o planeta, porque oferecem uma perspectiva. Ora, toda esta
atividade pedagógica só se torna formadora se tiver sentido, se for dimen-
sionada, se for uma aventura a ser vivida. Uma aventura que, com certeza,
oferece referências e segurança, desenvolve raízes, apropria espaços, mas que
seja, também, aberta e ampla, que se projete no mundo e abra novos cami-
nhos. Uma aventura para “o aprendizado das coisas a partir da vida quotidi-
ana e a abertura de novos caminhos planetários, democráticos e solidários”
para que “o menor gesto da vida quotidiana provoque um alargamento do
campo da consciência responsável”, segundo M. Gadotti.
Estamos convidados, desde agora, para operar uma mudança na nossa
maneira de perceber as coisas, de enxergar o mundo, de pensar, de agir...
11
Para operar “uma reeducação do olhar, do coração e dos sentidos” . Os jo-
vens devem se preparar para tanto e precisamos, de maneira educativa,
ajudá-los para que, tanto eles quanto nós, continuemos caminhando “para
chegar lá em tempo”.
Uma grande ambição para um pequeno movimento. Pequeno pelo ta-
manho, mas grande pelos seus projetos e suas realizações.

11. GADOTTI, M. Artigo 9 da Charte pour une ecopedagogie planétaire coopérative et une
éducation du futur. In: Habiter la Terre – Ecoformation terrestre pour une conscience pla-
nétaire. Paris: L’Harmattan, 2005.

160
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164
Índice

Sumário, 7
Prefácio (Juan Cano), 9
Aviso, 11
Introdução geral, 13
Primeira parte – Praticar a Pedagogia da Alternância, 19
Introdução, 19
1. Da idéia até a elaboração de uma Pedagogia da Alternância, 21
Uma caminhada criativa, 21
Um universo cheio de sentido, 24
Uma conquista da autonomia, 26
Conclusão, 27
2. As atividades e os instrumentos da alternância, 28
Os fundamentos de um dispositivo pedagógico, 28
O Caderno de Vida ou Caderno da Realidade: o instrumento
básico da Pedagogia da Alternância dos CEFFAs, 31
A Colocação em Comum: a atividade-junção dos dois
espaços-tempos da formação alternada, 43
A visita de estudo ou a intervenção: o encontro e a descoberta, 47
As aulas e os Cadernos Didáticos: a caminhada pelos saberes e
conhecimentos, 50
Os exercícios: a assimilação e a construção dos saberes, 54
As avaliações: a medição dos avanços, 59
3. A organização e a gestão da formação, 64
A organização e a gestão das seqüências de alternância pelo
“trabalho temático”, 65

165
A organização e a gestão do percurso educativo pelo “plano de
formação”, 70
A organização e a gestão do trabalho pedagógico pelo
“planejamento da sessão”, 77
4. A animação e a gestão das relações, 81
Uma rede de relações, 81
A gestão das relações entre o CEFFA, as famílias e os mestres de
estágio profissionais, 82
Favorecer o relacionamento do alternante com seus diferentes
campos da vida, 85
Um relacionamento para acompanhar a passagem da
adolescência, 90
Um relacionamento para dar vida à associação, 96
Conclusão, 98
Conclusão da primeira parte, 99
Segunda parte – Compreender a Pedagogia da Alternância, 101
Introdução, 101
5. A alternância no horizonte educativo, 103
Os componentes de uma situação de formação, 104
As correntes pedagógicas, 108
A pedagogia tradicional ou corrente pedagógica centrada no
docente e no programa, 108
A pedagogia ativa ou corrente pedagógica centrada na pessoa, 110
A pedagogia centrada na realidade ou pedagogia da
complexidade, 111
A emergência da Pedagogia da Alternância, 112
Experiências de longa data, 112
De uma prática paralela até o reconhecimento oficial, 116
Conclusão, 116
6. Os contornos e os componentes da Pedagogia da Alternância, 118
Verdadeiras e falsas alternâncias para finalidades diversas, 119
A abordagem binária e simplista da alternância, 121
A abordagem multidimensional e complexa da alternância, 122
Uma pedagogia para finalidades ambiciosas, 122
Uma negação dos isolamentos, das simplificações e dos
reducionismos, 123

166
Além de um método, um sistema educativo, 126
Conclusão, 128
7. Aprender na formação em alternância, 130
Aprender, 131
Um processo complexo com múltiplos fatores de influência, 131
A singularidade da aprendizagem, 133
O sentido, o significado e o projeto, 134
A informação, o saber e o conhecimento, 135
A transferência, 136
Aprender em formação alternada ou o alternante no coração de
uma complexidade a ser vivida e gerida, 136
Um caminhar no meio de espaços-tempos formativos com
finalidades diferentes, 137
Uma variedade de aprendizagens possíveis, 141
Ligar, articular e unificar, 142
Conclusão, 144
8. Vivenciar e fazer viver a alternância: uma nova profissão da
formação, 145
Monitor de CEFFA: uma profissão a viver dentro de uma
complexidade, 145
As condições de exercício de uma profissão, 148
Em favor do reconhecimento de uma nova profissão da
formação, 151
Conclusão, 152
Conclusão da segunda parte, 153
Conclusão geral – Um caminho-método para o amanhã e a era
planetária, 154
Bibliografia, 161

167

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