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Gimonet, Jean-Claude
Praticar e compreender a Pedagogia da
Alternância dos CEFFAs / Jean-Claude Gimonet ;
tradução de Thierry de Burghgrave. –
Petrópolis, RJ : Vozes, Paris : AIMFR –
Associação Internacional dos Movimentos
Familiares de Formação Rural, 2007. – (Coleção
Aidefa – Alternativas Internacionais em
Desenvolvimento, Educação)
Bibliografia.
ISBN 978-85-326-3485-6
1. Educação alternativa 2. Educação não-formal
3. Ensino – Métodos 4. Movimento dos Centros
Familiares de Formação por Alternância – CEFFAs
5. Pedagogia I. Título.
07-3900 CDD-371.04
Praticar e compreender a
Pedagogia da Alternância dos
CEFFAs
Tradução de Thierry de Burghgrave
EDITORA
VOZES
Petrópolis
Em co-edição com:
AIMFR
Associação Internacional dos Movimentos Familiares de
Formação Rural
e-mail: aimfr@m.fr.asso.fr
http://www.fondation-mfr.org./
ISBN 978-85-326-3485-6
Aviso, 11
Introdução geral, 13
Bibliografia, 161
Índice, 165
PREFÁCIO
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formação”. Parece-lhe, de fato, que, diante das evoluções que se desenham
em todas as áreas, a escola do século XXI e as profissões da formação não
poderão mais permanecer como são atualmente, e que a de “monitor(a) de
CEFFA” prefigura estas necessárias evoluções.
E é no futuro, aliás, que nos projeta a obra, sob a forma de conclusão,
pelo título “Um caminho-método para o amanhã e a era planetária”. Porque
se precisa pensar numa educação que leve em conta “o mais local” para en-
contrar nele o humo de sua formação, de suas perspectivas de vida, de ações
e de engajamentos, mas, também, uma educação que se abre sobre a globali-
dade do mundo, do planeta. Pensar uma “educação planetária”. Em outras
palavras, uma educação para estar, ao mesmo tempo, no local e no global.
Um livro de prática e de reflexão... um livro que perpassa o passado e
um futuro que se desenha, mas ainda não está escrito... para colocar em
evidência os fundamentos desta pedagogia que fez suas provas desde a sua
criação, há setenta anos, para mostrar os parâmetros permanentes através
do tempo e do espaço.
Juan Cano
Presidente da Associação
Internacional dos Movimentos
Familiares de Formação Rural – AIMFR.
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AVISO
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tos constitutivos da Pedagogia da Alternância nos CEFFAs encontram-se
dispersos em publicações diversas (livros, revistas, periódicos...) que tratam,
cada uma, de um “pedaço” do sistema sem que nenhuma delas apresente
uma globalidade coerente a seu respeito. Tendo sido, várias vezes, solicitado
em reuniões, sessões de formação e outros seminários para apresentar a coe-
rência de conjunto do sistema-alternância das MFR (Maisons Familiales Ru-
rales) em conseqüência do estado de complexidade mencionado acima, pa-
receu-me que tal iniciativa podia conter algum interesse.
Oxalá este livro possa contribuir, à sua maneira, com os atores dos
CEFFAs e, talvez, além do exemplo singular, ter alguma repercussão nos
meios preocupados com a formação e inserção destes inúmeros jovens que
só querem manifestar seu potencial e exercer um papel na sociedade.
12
INTRODUÇÃO GERAL
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der novas necessidades (outros públicos, outros setores profissionais a serem
investidos...) é preciso proceder a severas adaptações... Tanto é que, se não
se precaver, pode decorrer disto uma tendência, seja em prosseguir tranqüi-
lamente o caminho ao repetir a experiência passada, seja em tornar os funcio-
namentos ou os comportamentos por demais rígidos, seja, ainda, em mode-
lar-se e nivelar-se no contexto do momento para continuar a viver nele. O
lugar e o peso do presente, em relação ao passado e o futuro, nos funciona-
mentos institucionais, devem reter a atenção. Se as contingências do presen-
te (as regulamentações, as necessidades imediatas, os modos, as tarefas, a
economia...) invadem o espaço, as práticas e os espíritos, corre-se o risco da
normalização, da uniformização, da perda de pertinência, de originalidade,
de identidade e de criatividade. Gera-se e administra-se mais do que se cria,
porque precisa referências, disponibilidade, mas, também, visão e, mesmo,
utopia para criar. Há adaptação com os riscos de perda das referências per-
manentes, dos traços característicos da identidade.
Coloca-se, então, a questão da unidade do movimento das MFR através do
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planeta. Mas, uma unidade na diversidade . Esta unidade só pode existir se
cada MFR atende alguns traços fundamentais de uma identidade comum.
Na França, diante desta questão, a União Nacional das MFR tinha
3
enunciado, naquele tempo, “a carta de identidade” das MFR. A saber:
• finalidades: – de um lado, a educação, a formação profissional e geral
associadas e a orientação dos adolescentes, e, de outro lado, a contribui-
ção para o desenvolvimento do meio;
• um contexto de implantação e de ação: o meio rural;
• uma estrutura, ao mesmo tempo jurídica e de participação e respon-
sabilização das famílias: a associação;
• um método pedagógico: a alternância com suas implicações quanto
ao papel educativo dos pais e mestres de estágio profissionais e suas
técnicas e instrumentos pedagógicos;
• uma estrutura educativa: o internato e o pequeno grupo;
• uma equipe educativa animadora do conjunto.
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É evidente que uma carta de identidade tal é evolutiva. Mas, ao fazer
mudanças, convém interrogar-se sobre os fundamentos a serem preserva-
dos, sobre os parâmetros constantes e os evolutivos.
P. Puig fornece outro quadro que ele chama de quatro pilares do CEFFA.
A saber:
• os 2 pilares da ordem das finalidades: a formação integral e o desen-
volvimento do meio;
• os 2 pilares da ordem dos meios: a associação e a alternância.
Propõe a seguinte representação gráfica:
Formação Desenvolvimento
integral do meio
Finalidades
Projeto pessoal Socioeconômico,
humano, político...
Alternância: Associação:
Meios pais, famílias,
um método pedagógico profissionais,
instituições
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É esta alternância que este livro se propõe a examinar de maneira mais
precisa.
Para fazê-lo, propõe um desenvolvimento coerente com o seu objetivo.
De fato, a formação por alternância dos CEFFAs obedece a um processo que
parte da experiência da vida quotidiana (familiar, profissional, social) para
ir em direção à teoria, aos saberes dos programas acadêmicos, para, em se-
guida, voltar à experiência, e assim sucessivamente. Um grande psicólogo,
Jean Piaget, definiu este processo através da fórmula “praticar e compreen-
4
der” . “Praticar” significa o fazer, a ação, a experiência, enquanto “compre-
ender” quer dizer a reflexão sobre a experiência, sua superação, ou, ainda, a
passagem dos fatos às idéias, às leis, às teorias. Mas, ação e reflexão entrela-
çam-se, dando lugar a esta outra fórmula de Piaget: “Agir em pensamento” e
“Compreender em ação”.
Logo, em plena coerência, este livro se inscreve nesta lógica. De onde
seu título, mas também sua estrutura para o caminhar da ação, da imple-
mentação de atividades e de instrumentos, para uma explicitação dos pro-
cessos, das implicações da Pedagogia da Alternância, tanto do ponto de
vista das instituições quanto dos atores envolvidos.
A obra divide-se, por isto, em duas partes e oito capítulos.
A primeira parte – Praticar a Pedagogia da Alternância – analisa sua
implementação prática em quatro capítulos.
• O primeiro, intitulado “Da idéia até a elaboração de uma Pedagogia
da Alternância”, traz a gênese e o processo de elaboração deste método de
formação no seio das MFR da França. Da idéia genial do início até a sua
construção, a caminhada foi lenta e arriscada, porque, de um lado, precisa-
va inventar uma pedagogia que não existia e, de outro lado, ao se colocar
como método fugindo do existente, seus iniciadores tiveram que enfrentar
numerosos obstáculos e, muitas vezes, lutar contra tudo.
• O segundo capítulo apresenta “As atividades e os instrumentos da al-
ternância” sem os quais a Pedagogia da Alternância corre o risco de ficar
na intenção ou de ser uma fórmula vazia. Sua implementação é questão de
atitudes, de técnicas e de saber-fazer pedagógico para que tenham êxito,
mas, também, de compreensão do seu sentido e de sua razão de ser no pro-
cesso educativo e formativo.
• O terceiro capítulo trata da “Organização e gestão da formação”, ou
seja, das seqüências de alternância, dos planos de formação, mas, também,
dos planejamentos semanais (ou das sessões). A Pedagogia da Alternância,
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enquanto pedagogia da complexidade, supõe aceitar o incerto, o imprevis-
to, o aleatório que surgem da vida e de cada alternante. A desordem decor-
rente disto deve ser compensada e regulada através de organização para
construir ordem nos conhecimentos.
• Enfim, o quarto capítulo, em transição com a segunda parte, relacio-
na-se com “A animação e a gestão das relações” institucionais e de atores
que supõem a Pedagogia da Alternância. Que sejam os alternantes, os pais,
os mestres de estágio, os monitores e outros agentes educativos do CEFFA,
cada um tem papel específico a desempenhar. É na diferença e na comple-
mentaridade destes papéis e funções, nas atitudes impregnadas de educa-
ção dos jovens que se encontram as chaves do “Praticar, conseguir de outro
jeito” (“Réussir Autrement”) que prega o movimento educativo dos CEFFAs.
Disto resulta uma exigência de relações densas entre os atores.
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• O oitavo e último capítulo “Vivenciar e fazer viver a alternância” se
relaciona com a função e os papéis daqueles que animam o sistema educa-
tivo dos CEFFAs, “as monitoras e os monitores”. Eles são a alma e os ani-
madores do sistema. De suas atitudes, capacidades e competências, de sua
formação e de sua implicação dependem, por uma grande parte, a eficiên-
cia da alternância. Com certeza, mostram o exemplo de “uma nova profis-
são da formação”.
Por fim, a conclusão não hesita em situar a alternância pedagógica
para além de um método, como um sistema educativo para o amanhã na
era planetária.
Oxalá estes diferentes conteúdos, destinados a todos os atores dos
CEFFAs, possam fornecer informações, mas, também, grades de análise e
de reflexão para “praticar” e “compreender”, no dia-a-dia, a Pedagogia da
Alternância que vivenciam. Oxalá possam eles ajudar a firmar este pilar
dos CEFFAs que representa a alternância e consolidar, desta maneira, a
identidade do movimento. Talvez possam servir também de elos entre os
diversos CEFFAs a fim de “praticar e conseguir de outro jeito” (“Réussir
Autrement”) juntos.
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PRIMEIRA PARTE
Praticar a Pedagogia da Alternância
Introdução
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cação, de sua formação, acima de tudo porque é jovem. O mestre de está-
gio profissional torna-se um formador de fato. Na MFR ou no CEFFA os
“formadores” patenteados que são os “monitores” têm uma função e pa-
péis bem mais amplos que aqueles de um docente ou de um professor. E
todos estes atores são chamados a cooperar, a complementar-se nas suas
diferenças. Por isto, a eficiência da alternância é ligada à qualidade relacio-
nal existente entre eles para implementar as atividades e os instrumentos
pedagógicos específicos do método.
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1
DA IDÉIA ATÉ A ELABORAÇÃO DE UMA
PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA
21
2
lon, de Marc Sangnier , do qual tiravam ensinamentos condizentes ao seu
lugar e seus papéis de atores responsáveis pelo desenvolvimento pessoal e
do meio em que viviam. Este movimento os alimentava através de sua mili-
tância, de sua energia, de suas análises e reflexões, dos valores que prega-
va, de suas perspectivas e de suas esperanças. Sindicalistas, eram atores en-
gajados no seu meio. Estavam impregnados da preocupação pelo futuro de
seus filhos, de sua profissão, da agricultura, da vida rural.
Foi na simplicidade do quotidiano que nasceu a pedagogia da comple-
xidade que inventaram:
• Simplicidade de um problema posto em 1935, num vilarejo da Fran-
ça, para uns pais agricultores: seu filho, um adolescente, não quer ir
para a escola secundária.
• Simplicidade da questão decorrente disto: “o que propor-lhe para
continuar os estudos?”
• Simplicidade do encontro com o vigário do povoado, na beira da es-
trada, para expor este problema.
• Simplicidade da solução encontrada com outros: “criar uma escola
que não mantenha os adolescentes presos entre quatro paredes, mas
que lhes permitam aprender através dos ensinamentos da escola, com
certeza, mas também através daqueles da vida quotidiana, graças a uma
alternância de períodos entre o ambiente familial e o centro escolar”.
Tudo isto parecia bem simples. Só em aparência, porque atrás daquilo
tudo se escondem processos bem mais complexos. Mesmo assim, isto pare-
ceu evidente para estes pais inventores de uma nova fórmula. Representa-
va para eles, simplesmente, o bom senso porque eram eles mesmos pessoas
da complexidade, confrontadas diariamente com esta na relação com a
terra, com os elementos climáticos, com a vida, aquela das culturas e das
criações, na relação com o contexto local, físico, humano e cultural, econô-
mico, político... Tratava-se, para eles, de criar “uma escola da terra, pelas
pessoas da terra e para as pessoas da terra” segundo esta expressão encon-
trada no Québec.
Após a invenção, precisava construir uma pedagogia. Para os fundado-
res, o passado em questão de pedagogia se encontra no ensino tradicional.
Claro que no início este serve de referência, mas logo enxerga-se sua inapti-
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dão. Começa então um amplo movimento de pesquisa-ação, como se diz
hoje. A prática do dia-a-dia, a experimentação, as tentativas/erros cuja análi-
se, a reflexão e sempre o bom senso e a intuição permitem elaborar instru-
mentos, metodologias e princípios pedagógicos. É o tempo em que nas MFR
não existem aqueles que conhecem a Pedagogia da Alternância e os que a igno-
ram. Nenhum ensinamento se torna possível neste sentido, já que os saberes
não existem. Devem ser construídos. Deste jeito, animados por uma dinâmi-
ca criadora, todos contribuem para a elaboração das atividades, dos instru-
mentos, das organizações didáticas, dos princípios e métodos próprios das
MFR. Vive-se de cheio o processo de produção de saberes e dos valores edu-
cativos do meio de vida na sua escala real. Elabora-se assim uma pedagogia
3
da relação, do encontro, uma pedagogia da partilha . Um processo está
acontecendo, o da formação por alternância em toda a sua complexidade.
A Pedagogia da Alternância elaborou-se não através de teorias, mas,
antes, pela invenção e implementação de um instrumental pedagógico que
traduzia, nos seus atos, o sentido e os procedimentos da formação. Em ou-
tras palavras, neste processo criativo, prevaleceu a ação, a experiência, o
4
sucesso no sentido de J. Piaget , isto é, um pensamento em ação. E só é de-
pois – talvez também um pouco ao mesmo tempo – que, sempre segundo a
lógica piagetiana, opera-se a abordagem da compreensão e que uma teori-
zação pode ser levada em frente. Uma teorização, não para si mesma, mas
como processo de compreensão, ao mesmo tempo para nutrir a experiên-
cia, a ação do terreno, dar-lhes sentido. Deste jeito, para situar-se no hori-
zonte educativo, não estar só e isolado, mas em relação com os outros e, às
vezes, para municiar-se de argumentos a fim de se defender dos donos do
tradicionalismo ou dos poderes administrativos.
E, para isto, homens e movimentos trabalharam de maneira subjacen-
te. Na origem encontra-se o movimento de ação social Le Sillon, de Marc
Sangnier, e depois o pensamento de um grande filósofo personalista,
Emmanuel Mounier, a metodologia do “Ver – Julgar – Agir” deste grande
5
e bonito movimento de educação popular, a “JAC” , mas também o espíri-
to e os procedimentos da educação nova e de outros pensadores e peda-
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gogos servem como referências ou prestam sua contribuição . Encontros e
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intercâmbios aconteceram em diferentes momentos com a universidade
para aclarar-se, nutrir-se em toda complementaridade e reciprocidade e,
como em qualquer processo de formação alternada, ultrapassar a prática e
7
os saberes da experiência. Primeiro, foi o encontro de A. Duffaure , então
diretor da União Nacional das MFR da França e articulador deste processo
de criação, com universitários da Sorbonne. Em seguida veio a colaboração
8
com a Escola Prática de Estudos Superiores em Ciências Sociais de Paris e
9
enfim com a Universidade de Tours em parceria com o Centro Pedagógi-
co Nacional de Chaingy. Encontro com universitários, com certeza, mas só
com aqueles movidos por uma renovação pela pedagogia e por uma cons-
ciência, um pensamento e práticas pedagógicas e educativas complexas e
sistêmicas. Eles desempenharam o seu papel de universitários sem interfe-
rir no funcionamento institucional. Alimentaram, de seu jeito, as práticas,
permitindo fazer um passo na obtenção de maior clareza. Foi o encontro
da experiência com a ciência, como acontece também em toda formação em
alternância. Mas, neste processo de inovação e de construção, os agricul-
tores antecederam os universitários.
Uma dinâmica geral anima então toda esta caminhada criativa que só
pode resultar em movimento. Este está sendo orientado, fortalecido, até
transcendido por uma reflexão sobre a pessoa humana, alimentada pela
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corrente filosófica do personalismo de Emmanuel Mounier e, depois, por
outros filósofos, pedagogos, pesquisadores e pensadores como já foi dito
anteriormente. Um projeto global existe e traz uma visão do homem, da
sociedade, da ruralidade, do desenvolvimento. O sentido da responsabili-
dade, do poder, está presente. Vive-se num “universo cheio de sentido”.
Um gosto de liberdade e do fazer por si mesmo estimula as energias.
Sabe-se por que se cria uma MFR, porque ela existe. Essa escola nova deve
ser a da pequena região, não uma escola agrícola a mais, como as outras,
mas uma escola para formar os agricultores e contribuir para o desenvolvi-
pos, J. Dewey e a relação entre experiência e educação, C. Freinet e o texto livre ou a bi-
blioteca de trabalho, M. Montessori, mas, também, as orientações de Steiner, da Escola
Alsaciana... Depois, mais tarde, os aportes de J. Piaget, como indicado anteriormente,
C. Rogers, B. Schwartz... mas, também, P. Freire e A educação como prática da liberdade,
pelos seus métodos de alfabetização.
7. A saber, R. Cousinet, J. Robert, M. Debesse.
8. Mais especificamente, o Colégio Cooperativo e seu responsável H. Desroche.
9. Convém mencionar, neste sentido, as contribuições essenciais de G. Lerbet, G. Pineau
e P. Bachelard, Universidade de Tours.
10. MOUNIER, E. Le Personnalisme. In: Que sais-je. Paris, PUF, 1971.
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mento do país. Uma escola que seja a sua e da qual assumem a gestão e to-
das as responsabilidades, agrupando-se em associação, uma forma jurídica
que confere uma força e um poder. Uma escola para as famílias e os agricultores,
e, além disto, para homens e mulheres da região. Deste modo, aquilo que estariam
semeando ou plantando, através de um enraizamento profundo num terri-
tório, teria alguma perenidade. Surge a consciência dos múltiplos serviços
que esta “nova escola” deve oferecer e dos papéis multidirecionais e interde-
pendentes que deve desempenhar em relação aos adolescentes rurais, às fa-
mílias, à agricultura, à ruralidade e, de maneira mais ampla, em relação à
educação e à sociedade. O discurso é amplo e possui grandeza. É sistêmico,
global, portador de uma ética, de um projeto para o homem nestes períodos
de grandes transformações, até mesmo de mutação. Está virado ao futuro
para “aclarar o futuro, não em seguir as lições do passado, mas avançando
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para um futuro promissor e prometido” , pensava-se.
Em seguida, os fundadores da segunda geração encontram suas ener-
gias na dinâmica da reconstrução do pós-guerra na França e da grande os-
cilação da agricultura com a revolução verde. As MFR (CFR) que criam ins-
crevem-se, inteiramente, nesta ampla transformação da agricultura e da
ruralidade, trazendo nesta sua contribuição pela formação dos jovens e fu-
turos sujeitos. Esta vai de par, em muitos lugares, com a vulgarização agrí-
cola. É uma época de engajamento, de militantismo de pais e de agriculto-
res, fundadores das MF, mas, também, dos diretores e dos monitores des-
tas. Todos estão atrelados em comum a um amplo programa de desenvol-
vimento. Não se torna necessário incitar ao engajamento, à conduta de
ações de desenvolvimento, acontece por si mesmo. É a época em que a qua-
se totalidade dos sujeitos do movimento pertencem a uma mesma cultura,
a uma mesma família: a da agricultura e da ruralidade. Todos tendem a ob-
jetivos próximos ou similares, dirigidos para o futuro. Logo, a pedagogia,
as aulas, a formação encontram um direcionamento, adquirem sentido. A
alternância se vive quase por si mesma. Porém, esta pedagogia nova não é
evidente e precisa ser definida, iniciada, fundada.
Um processo similar existe, em seguida, nos setores do artesanato, dos
serviços, do comércio, quando as MFR extrapolam o campo da agricultura
para abrir-se às profissões do mundo rural a fim de manter sua vitalidade.
11. Segundo MORIN, E. e col. Une éducation pour l’ère planétaire. Paris: Balland, 2003.
25
Uma conquista da autonomia
12. Neste sentido, as MFR (CFR) da França têm trazido uma colaboração de primeira
ordem para o reconhecimento oficial da alternância como via de formação completa,
participando na elaboração de uma lei (Lei de 2 de agosto de 1960 sobre o ensino e a
formação profissional agrícola). Cf. em seguida, no cap. 5.
26
• autonomia na denominação, na forma de exercício, a qualificação, os
estatutos e os papéis dos “formadores” chamados monitores.
Conclusão
27
2
AS ATIVIDADES E OS INSTRUMENTOS
DA ALTERNÂNCIA
1. As finalidades
Como enunciadas na introdução, elas são de dois tipos:
• de um lado, a formação integral da pessoa, a educação e, de maneira
concomitante, a orientação e a inserção socioprofissional;
28
• de outro lado, a contribuição ao desenvolvimento do território onde está
14
sendo implantado o CEFFA .
2. Os princípios
2.1. A primazia da experiência sobre o programa
A Pedagogia da Alternância dos CEFFAs representa um caminhar per-
manente entre a vida e a escola. Sai da experiência no encontro de saberes
mais teóricos para voltar novamente à experiência, e assim sucessivamente.
Desta maneira, coloca-se para o alternante uma dupla relação:
• ao trabalho e ao mundo da produção e seus saberes, à vida social e
econômica, ambiental e cultural dos lugares onde vive, de um lado;
• a um lugar “escolar” com suas atividades, sua cultura e seus saberes,
de outro lado.
Disto decorrem três exigências:
• a experiência deve ser considerada, ao mesmo tempo, como suporte
de formação, reservatório de saberes e cadinho educativo;
• ela é o ponto de partida do processo para aprender segundo a lógica
15
do “praticar e compreender” e antecede, desta maneira, o tempo es-
colar;
• no ritmo de alternância, a duração da experiência é pelo menos igual,
até mesmo superior à duração da estadia no CEFFA.
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2.3. Um processo de alternância num ritmo em três tempos
1. O meio familiar, 2. O CEFFA 3. O meio
profissional, social
• Experiência • Formalização- • Aplicação-ação
• Observações, estruturação • Experimentação
investigações, análise • Conceitualização • (Saberes-ações)
• (Saberes experienciais) • (Saberes teóricos e
formais)
Estes três tempos constituem uma seqüência de alternância ou unidade
de formação.
30
aprender mais e melhor. De fato, o que aprende fora do CEFFA lhe confe-
re, quando volta nele, o poder de um saber que nem os monitores e nem os
outros membros possuem. Por isso, os saberes dos alternantes do grupo,
colocados em comum e partilhados, constituem um suporte essencial de
aprendizagens.
31
da para se tornar um suporte de formação e de educação. Esta é a razão de
ser do Caderno da Realidade como primeiro livro a ser construído. Um li-
vro de vida, rico em si mesmo de informações, análises e aprendizagens va-
riadas. Mas também um livro ao qual vão se articular, em seguida, os livros
acadêmicos para enriquecê-lo e construir o grande livro dos saberes a se-
rem aperfeiçoados e das aprendizagens a serem feitas no presente de um
percurso para o futuro.
1. Gênese e evolução
A implantação da alternância demonstrou imediatamente a necessi-
dade de uma atividade e de um instrumento pedagógico específicos para:
• de um lado, permitir, aos filhos e filhas de agricultores da época, a
observação e a análise direta da prática agrícola de sua roça aos pais de
colaborarem na formação de seus filhos, trazendo sua experiência e
seu saber-fazer;
• de outro lado, estabelecer um elo orgânico entre a experiência da
profissão, da vida familiar e social na qual se insere o jovem adolescen-
te e o período escolar.
A primeira resposta foi dada através de uma monografia do povoado
ou comunidade. Esta foi rapidamente abandonada porque, pelo fato de
ser por demais fora e afastada da experiência e das preocupações dos jo-
vens e de seus pais, só suscitava desinteresse. A solução foi encontrada
propondo para cada aprendiz “elaborar um estudo progressivo, deta-
lhado e preciso da célula profissional que lhe era familiar, na qual estava
atuando, aquela que começava a despertar nele alguma preocupação, ou
17
seja, a roça familiar” .
Por isso, o instrumento que juntava o conjunto das observações, análi-
ses e reflexões e estava sendo construído ao longo da formação, foi chama-
do de “caderno da exploração familiar”. Para as meninas, o processo simi-
lar para as atividades domésticas recebeu o nome de “caderno de casa”.
Em seguida, a mesma caminhada foi seguida pelas Maisons Familiales Ru-
rales (Casas Familiares Rurais) que foram abertas no setor de artesanato,
nascendo assim o “caderno da empresa”.
Hoje, a diversificação de esferas de atividades, tanto através da orienta-
ção profissional quanto por nível, modificou a unidade de espaço de alter-
17. DUFFAURE, A. & ROBERT, J. Une méthode active d’apprentissage agricole – Les cahi-
ers de l’exploitation familiale. Paris: EAM, 1955.
32
nância fora do CEFFA em todo o percurso da formação. As primeiras de-
nominações (caderno de exploração, caderno de casa, caderno de empre-
sa) perderam, em grande número de situações, seu primeiro sentido. Por
isso, hoje em dia, coloca-se muitas vezes a questão do nome do dossiê das
pesquisas, dos estudos de estágio – como muitas vezes são chamados – ela-
borados progressivamente. Qual é o documento que confere a unidade, coerência
ao conjunto dos estudos, das pesquisas, das descobertas, das reflexões e relatos de
vida de 2, 3 ou 4 anos de existência nesta fase importante da construção da pessoa?
• Alguns o denominam “dossiê dos estudos de alternância”. Isto não
faz sentido porque a alternância não poderia ser assimilada à estadia
no meio de vida extra-escolar.
• Outros o intitulam “caderno ou dossiê de estágios”. É verdade no que
diz respeito às formações profissionais aonde os jovens estão essencial-
mente em estágio nas empresas, mas fica, todavia, limitado porque o
campo profissional não é exclusivo. E, com certeza, é redutor em rela-
ção aos primeiros ciclos e para toda formação mais geral, porque a es-
tadia fora do CEFFA leva também em consideração a vida familiar, so-
cial, cultural...
• A denominação “caderno da realidade” ou “caderno de vida” ou ain-
da “caderno do meio de vida” também está sendo utilizada. É mais glo-
balizante e não deixa de ter sentido com a condição de que sejam leva-
dos em consideração os diferentes setores da vida e as atividades ine-
rentes (familiais, profissionais, sociais).
• Enfim, de maneira mais abreviada, diz-se também “o plano de estu-
do”. Não pode ser certo porque este só representa um “pedaço” de
uma atividade mais global.
Da nossa parte escolhemos a denominação “caderno da realidade” por
nos parecer a mais apropriada e também a mais comum.
33
• a formatação do estudo, ou seja, sua transcrição como também sua ilus-
tração para construir um documento personalizado de qualidade, a ser con-
siderado como a “obra-prima” agradável ao olhar e a ser conservado
cuidadosamente.
A colocação em comum constitui seu prolongamento normal bem como a
visita de estudo e as “aulas teóricas”. O Caderno da Realidade, na verdade, só
adquire todo o seu sentido para o alternante, bem como para os monitores e
os pais ou mestres de estágio, na medida em que se integra no conjunto do
processo de formação do qual é a peça mestra. Caso contrário, ele está sendo
reduzido a um simples instrumento didático.
34
versidade de públicos provoca às vezes situações multiculturais tanto pro-
fissionais quanto étnicas no meio dos grupos. As dificuldades que decor-
rem disto para a gestão pedagógica criam o risco de reduzir a preocupação
para com as singularidades culturais de cada um e de generalizar como na
escola tradicional.
A questão da escolha dos estudos como da progressão se revelam então
de primeira importância. Não é o programa em base de noções que deter-
mina estas escolhas, mas, sim, a progressão dos adolescentes ou adultos. É
nesta base que se constrói o Plano de Formação.
35
Os Cadernos da Realidade não poderiam limitar-se a estudos tecnicis-
tas, monográficos, sem vida e sem implicação do autor. Eles almejam, ao
contrário, uma abordagem personalizada de sucessivas experiências que se
traduzem através de pedaços sucessivos e progressivos de relatos de vida.
A construção do plano de estudo representa um outro tempo da atividade
do monitor. Ela consiste em dar forma ao conjunto dos elementos de estudo
extraídos junto ao grupo. A saber:
• Dar uma estrutura para facilitar as observações, as pesquisas, os inter-
câmbios e a redação do texto a ser produzido. Ela convida a escrever ou
contar situações, fatos precisos, a analisá-los, para, em seguida, estabelecer
comparações no espaço e no tempo (o passado e o futuro) antes de convi-
dar a uma reflexão pessoal sobre o tema estudado. Uma estrutura dessas é
essencial nos primeiros tempos da formação para impulsionar um proces-
so de pesquisa e de expressão. Facilita uma construção progressiva de sa-
beres. Ajuda na estruturação do pensamento. É, no mesmo tempo, segura-
dora porque oferece um quadro de trabalho. Fica claro que deve evoluir
com o tempo para ficar menos rígida quando a condução de uma pesquisa
é mais assumida.
• Traduzir o conteúdo em questionamento. O guia de pesquisa não é o ques-
tionário do monitor que enumera perguntas a serem respondidas. É pro-
duto do próprio jovem. É o instrumento que construiu com outros (os cole-
gas do grupo e o monitor) para realizar uma pesquisa. Ele traduz as ques-
tões que convém fazer a respeito do tema abordado. Por isso, trata-se:
- de um lado, de um questionamento personalizado e implicante (isto é, for-
mulado no “eu” ou “nós”);
- de outro lado, de um questionamento aberto que coloca em movimento,
em atitude de busca e desperta a curiosidade. Por isto, as questões fe-
chadas que induzem respostas “sim” ou “não” devem ser excluídas.
A passagem na prática de redação do monitor das perguntas que colo-
ca (formulação na 2ª pessoa) para as que o alternante se coloca (formulação
na 1ª pessoa) se torna muitas vezes difícil porque ela obriga a descentrar-se
para o outro, a uma mudança da relação de autoridade que se transforma
então numa autoridade pedagógica com o objetivo de tornar o outro “au-
tor de si mesmo”.
36
Trata-se menos, para o monitor, de corrigir como se faria para um dever
escolar que de conversar sobre a estadia que acaba de acontecer, de admi-
rar-se, de questionar, de formular suas observações, de propor pistas de
melhoramentos. É neste momento privilegiado que o monitor descobre as
situações de vida do jovem, que recebe saberes da prática e, conseqüente-
mente, aprende.
Torna-se ao mesmo tempo uma atividade de avaliação formativa, já que
se trata de apreciar no seu desenvolvimento e na sua forma o texto redigido
para melhorá-lo e valorizá-lo. Trata-se neste caso de uma tarefa pedagógica
de aconselhamento, de orientação, de acompanhamento.
O plano de estudo encontra seu acabamento no “Caderno da Realida-
de”, ou outra denominação, segundo a terminologia utilizada, progressi-
vamente constituído por cada alternante. Sua qualidade, conferida através
de uma paginação, ilustrações e uma composição gráfica cuidadosa, tor-
na-se fator de valorização e de reconhecimento do trabalho fornecido. O
18
futuro interesse e implicação, em grande parte, dependerão disto .
37
O caderno da realidade CEFFA
CEFFA
Estadia no meio vivencial
19. A. Duffaure, afirmando, neste sentido, que “o plano de estudo é colocar uma dose
de extraordinário no banal”.
38
• Um quarto efeito tem a ver com a expressão que se opera ao longo da
atividade tanto na sua forma oral quanto escrita e gráfica. Interrogar, dis-
cutir, debater com os pais, os mestres de estágio, depois com os monitores
e os outros membros do grupo-classe, mas também escrever, fotografar,
desenhar, ilustrar... constituem um tanto de atividades de expressão fo-
mentadas pelo plano de estudo. É o meio para contar instantes de vida,
construir narrações de vida. O documento resultante disto tudo pode en-
tão pegar a dimensão de um “livro de vida” com a condição que ele traduza
uma expressão pessoal, um envolvimento onde se acham presentes, além
dos fatos, opiniões, sentimentos, reflexões, pensamentos. Eis por que os
Planos de Estudo não podem restringir-se somente a estudos técnicos, des-
crições ou monografias por demais externos à pessoa.
• Quinto efeito: a formação geral. Seu desenvolvimento através da for-
mação tecnológica ou profissional sempre foi e fica sendo a finalidade dos
CEFFAs, obedecendo o conceito de formação associada definida em seu tem-
20
po . A formação geral, ou seja, uma formação global, não é resultado da
quantidade de noções ensinadas, mas, sim, de uma lenta construção da
pessoa, de uma maturação em suas diferentes dimensões (intelectuais, afe-
tivas, físicas, manuais, relacionais...). Não é de ordem quantitativa, mas,
sim, qualitativa, ou seja, ligada aos passos dados, às relações que se estabe-
lecem entre os diferentes campos de conhecimento, aos processos que se de-
senrolam. O plano de estudo representa a base do processo de formação ge-
ral ao permitir assentar as novas aprendizagens nos interesses da pessoa, na
experiência vivida e analisada.
Por outro lado, ele evita a dicotomia trabalho manual/trabalho intelec-
tual garantindo a manutenção de uma atividade intelectual, não por ela
em si, mas associada, integrada à atividade quotidiana de trabalho, de la-
zer, de relacionamento, ou seja, simplesmente, de vida. Ele ajuda a manter
permanentemente a relação “ação – reflexão – ação” sem a qual não existe
formação em alternância digna deste nome.
• Sexto efeito: uma preparação para a formação permanente. Trata-se
mais, com certeza, de um efeito a longo prazo, como resultado da aprendi-
21
zagem deste caminho-método que representa o “ver – julgar – agir” en-
gendrado pelo processo do Plano de Estudo.
39
É também por isto que o Plano de Estudo, longe de querer obter um es-
tudo exaustivo de um problema, sempre deve ser visto como um treina-
mento para o estudo contínuo de uma realidade que se renova sem cessar.
Trata-se, em cada instante do percurso formativo e qualquer que seja o ní-
vel do ciclo, de fazer apreender e expressar, através das atividades, os pro-
blemas que surgem, as soluções procuradas e/ou encontradas, a experiên-
cia e as práticas das pessoas e da profissão, para buscar, superando-se, no-
vas luzes. É, em outras palavras, construir uma metodologia da aprendiza-
gem e da ação que, antes de tudo, é uma questão de atitude antes de consti-
tuir um saber-fazer e um saber.
Para concluir
O Caderno da Realidade e atividades inerentes constitui a peça mestra
da Pedagogia da Alternância dos CEFFAs, porque permite efetivamente
de considerar e utilizar o espaço-tempo da vida socioprofissional como
componente real da formação. Seus efeitos formadores são múltiplos e es-
senciais para o alternante. Mas não são menos essenciais para qualquer um
dos co-formadores que o acompanham: os pais, os mestres de estágio pro-
fissionais, os monitores e os membros do grupo ao qual pertence. O ques-
tionamento que provoca é interpelador para todos e constitui uma apren-
dizagem de um olhar crítico e reflexivo sobre o quotidiano da vida. É a ra-
zão pela qual as atividades em redor do Caderno da Realidade supõem, na
gestão pedagógica, um investimento em tempo e exigem um espaço signi-
22
ficativo nos planejamentos semanais .
Fica claro que estes propósitos apresentam um ideal-tipo que rara-
mente é atingido. Todavia, é na medida em que se aproxima dele que a Pe-
dagogia da Alternância do movimento educativo dos CEFFAs se inscreve
no “Réussir Autrement” – “Conseguir, alcançar de outro modo”, que rei-
vindica e o torna diferente de outras formas de alternância em formação.
NOTAS COMPLEMENTARES
23
Por uma pedagogia da obra
“Na origem dos CEFFAs, o caderno de exploração constituía a “obra-
prima” dos alunos”. Esta frase chama atenção. Não para falar do passado
22. GIMONET, J.C. Le planning hebdomadaire. In: Le Lien des Responsables, jun./1999.
Paris: UNMFREO.
23. Comunicação do autor feita num seminário no Centro Pedagógico Nacional das
MFR da França em 2001.
40
no sentido de culto ao passado e de nostalgia, mas para voltar às fontes, à
memória das coisas e por que colocar novamente esta problemática na or-
dem do dia não é, hoje, sem sentido para falar da pedagogia dos CEFFAs e
não somente de Pedagogia da Alternância.
As pedagogias da alternância de que todo mundo fala hoje são muito
diversas. E aquela dos CEFFAs pode se afogar e se perder nesta diversida-
de aliás interessante para responder às múltiplas situações de formação e
evitar a uniformização mais banal. Ora, um dos traços de identidade da pe-
dagogia dos CEFFAs tem, justamente, a ver com esta obra-prima.
O que significam as duas palavras da expressão “obra-prima”?
• obra significa produção, trabalho de qualidade. De maneira mais ampla,
a obra é o conjunto das produções de um autor, de um criador.
• prima significa estar na frente, em primeiro lugar.
A obra-prima representa então a obra perfeita, fruto de uma criação
pessoal. É também a obra que coloca na frente.
Neste caso, sim, do ponto de vista da pedagogia dos CEFFAs, a produ-
ção literária e gráfica em forma de caderno, de dossiê, de documento, de relatório,
que é o resultado das investigações, pesquisas, discussões, confrontações e
reflexões sobre suas atividades e seus contextos de vida, pode revestir, para o
adolescente, esta dimensão de obra-prima. Ela pode, ao contrário, permanecer
sendo uma cópia banal, um mero dever escolar que, como outros, será ob-
jeto da mais banal pontuação e assim dar continuidade ao processo de es-
colarização, se não lhe der uma dimensão expressiva suficiente.
As pesquisas e os estudos realizados no período no meio socioprofissio-
nal da formação podem conduzir o adolescente a produzir e, em seguida, a
encontrar uma obra-prima, se:
1) Os materiais, a matéria, o conteúdo forem substanciais, isto é, se os
Planos de Estudo permitirem uma leitura apurada, circunstanciada, crítica
da realidade de vida através das pesquisas, das discussões e reflexões dos
adolescentes sobre momentos de vida familial, profissional, social com suas
atividades, suas dificuldades, suas satisfações, sua prática. Se permitirem
captar as dimensões culturais do ambiente onde cada um vive. Se oportuni-
zarem encontros, relações, diálogo, confrontação com os atores deste am-
biente. Mas também se propiciarem abordagens no tempo e no espaço
onde pessoas trabalham e atuam, fazem e desfazem a história, o ambiente,
os contextos de vida e sua cultura.
Só poderia haver obra-prima se houver material para ser modelado, se
os jovens estiverem capazes de descobrir o extraordinário na banalidade apa-
rente do quotidiano.
41
2) Haverá obra-prima se o escrito decorrente das pesquisas traz a di-
mensão da expressão pessoal com o envolvimento que ela supõe. Se o adoles-
cente é conduzido a narrar instantes de vida, espaços de vida, se ele, em ou-
tras palavras, desenvolve relatos de vida. O documento que decorre disto
pode então tomar a dimensão de um “livro de vida” com a condição que
seja portadora de um envolvimento onde, além dos fatos e das opiniões, es-
tejam presentes sentimentos, reflexões, pensamentos. Eis por que os Ca-
dernos da Realidade não podem ser reduzidos a meros estudos técnicos,
descrições ou monografias demasiadamente afastadas da pessoa.
3) Haverá obra-prima se um verdadeiro trabalho de elaboração se opera na
volta no CEFFA, o que significa dizer apreciação e melhoramento com a aju-
da dos monitores, colocação em comum, apresentação, ilustração levando a
um documento personalizado de qualidade, a uma obra pessoal (observa-se,
hoje, neste sentido, a utilização da informática).
4) A noção de obra-prima vai aparecer se esta atividade, com todo o sa-
ber que ela traz, for colocada na ponta do processo de formação, isto é, se der
uma direção, um sentido às atividades e aos saberes que a prolongam: os
saberes do grupo através da Colocação em Comum, os de práticos através
da visita de estudo ou a intervenção externa, os do monitor através das au-
las, os dos livros, revistas, jornais, televisão e internet através de pesquisas e
de trabalhos documentários... De fato, na concepção da Pedagogia da
Alternância dos CEFFAs, são os saberes da vida que vêm à frente dos da es-
cola. Passa-se do grande livro da vida, do grande livro da natureza para o
livro impresso. É claro que esta lógica implica uma organização pedagógi-
ca séria que se traduz através do Plano de Formação, do trabalho por te-
mas, dos planejamentos semanais, do instrumental pedagógico.
Produção e encontro da obra-prima pelo adolescente durante sua formação...
uma perspectiva que confere um sentido à pedagogia, que define um modelo
pedagógico: o da pedagogia ativa, da pedagogia da experiência, da pedago-
gia da busca, de uma pedagogia que leva a aprendizagens por produção de
saberes mais do que por consumo. É por ocasião da produção de obras-pri-
mas – em se tratando de um relatório, de um documento de pesquisa, de um
memorial de estudos... – que implica a expressão escrita em todos os seus
componentes, a expressão gráfica, a apresentação, a estética... o trabalho
bem-feito... que se constroem os saberes porque, ao conectar-se com os seus
conhecimentos, passa-se por si próprio e expressa-se novamente as informa-
ções recebidas dos outros.
Quando se faz isto tem-se o sentimento de ter trabalhado por conta
própria, e não, de maneira escolar para alguém, por uma nota ou para
42
uma escola. Interiorizou-se. Colocou-se nisto não somente seu intelecto,
mas também seu afeto, sua sensibilidade, suas angústias, sua relação implí-
cita para com os outros, seu amor-próprio. Superou-se a si próprio. Não
houve somente um trabalho, mas realizou-se uma obra e a auto-estima
bem como a autonomia aumentaram. Sente-se uma satisfação e um orgu-
lho. Não se esquece facilmente seu documento, mas, ao contrário, é gosto-
so voltar a ele, olhá-lo, manuseá-lo, mostrá-lo, partilhá-lo. O trabalho se es-
quece, mas a obra permanece e o orientador sente o mesmo orgulho. Apren-
damos a modelar a matéria, a praticar uma pedagogia da obra.
1.1. O conteúdo
O valor da Colocação em Comum depende então, em grande parte,
dos estudos realizados pelos alternantes. Seu conteúdo e sua riqueza orien-
tam e determinam o que precisa ser colocado em comum a fim de garantir
um acréscimo e um enriquecimento dos estudos pessoais. Trata-se, de fato,
de favorecer uma expressão e uma confrontação do ganho da experiência;
em seguida, chegar a sínteses, a idéias gerais e a um questionamento. É na
medida em que ela propicia a cada um de progredir que ela se torna inte-
ressante de maneira duradoura. Por isto, nem tudo deve ser colocado em
comum e para cada uma delas é preciso fazer escolhas em função daquilo
que permitirá superar os aportes de cada um, de descobrir outra coisa.
43
Uma irá insistir sobre a relação das experiências, outra sobre as compara-
ções, outra ainda sobre a análise através da busca das causas, dos motivos
ou das conseqüências, ou observando as evoluções e suas incidências, etc. A
determinação do objeto da Colocação em Comum só poderá ser feita de-
pois de ter tomado conhecimento dos Planos de Estudo.
1.2. A realização
Ela supõe procedimentos, formas de trabalho apropriadas e uma vigo-
rosa animação por parte dos monitores.
Os procedimentos de Colocação em Comum são diversos:
• Com o grupo todo, através de um trabalho de animação geral do mo-
nitor, que por perguntas e incentivos convida uns e outros a se expres-
sarem, provoca a análise, a reflexão, faz surgir um questionamento,
ajuda o processo intelectual. Esta modalidade impõe-se nos primeiros
tempos da formação para dar-lhe o sentido e a prática.
• Por pequenos grupos, que procedem como descrito acima, ou então,
que são convidados a debater sobre um determinado problema.
• Através de exposições mais firmes de alguns membros do grupo, segui-
dos de aportes complementares ou contraditórios dos outros, etc.
Os procedimentos devem ser mudados e renovados para evitar a mo-
notonia e o desinteresse, mas também para experimentar metodologias di-
ferentes e assimilá-las.
As propostas ou questionamentos formulados pelo monitor para ori-
entar a Colocação em Comum podem tomar formas mais ou menos direti-
vas: de um quadro a ser preenchido até uma pergunta mais ampla e mais
livre, passando por um questionário mais apertado. Lá onde as perguntas
são importantes devido a sua pertinência, sua clareza, sua incitação à análi-
se e à reflexão. A variedade e a progressão devem ser procuradas na difi-
culdade e para deixar cada vez mais as iniciativas com o grupo.
A tomada de notas das informações trocadas e seu reagrupamento sob
a forma de relato se impõem. O relato materializa e valoriza a Colocação
em Comum. Ele se torna um documento interessante para os alternantes,
para os monitores, mas também para os pais e/ou mestres de estágio.
Como relato, ele se limita ao conteúdo da Colocação em Comum e não
acrescenta nada. Sob a forma de um texto estruturado e construído, ele
agrupa os dados recolhidos e dá conta do processo intelectual operado
pelo grupo para ir da expressão dos fatos e de suas comparações até a sín-
tese, até as idéias gerais, aos problemas e às questões.
44
2. Compreender a Colocação em Comum
Para explorar os ganhos adquiridos através da experiência, a Coloca-
ção em Comum constitui a segunda atividade-chave da Pedagogia da Alter-
nância. Seus efeitos formativos e educativos são conseqüentes porque ela
desempenha funções maiores.
Meio vivencial
CEFFA Meio vivencial
2) Colocação
1) Plano de estudo
em comum
45
2.3. Uma função de abertura e de junção
A Colocação em Comum ajuda cada um a situar e ultrapassar seu caso
particular, a não se limitar à experiência de sua família ou de seu empreen-
dimento. Ela propicia uma abertura para outros modos de agir, outras pro-
fissões, outras experiências, outras idéias e culturas. Ela permite assim, do
ponto de vista psicológico, situar-se melhor na sua especificidade e dife-
rença, e, do ponto de vista cultural, adquirir um conhecimento mais amplo
do seu meio, das profissões, dos problemas de todo tipo, da sociedade.
46
Para o monitor, a Colocação em Comum, é, fundamentalmente, uma ativi-
dade de animação pedagógica. A saber: propor dinâmicas, orientações de
trabalho, facilitar, dinamizar, regular as trocas, fazer com que os pontos
de vista sejam mais precisos, relativizados, contenham nuances, orientar um
processo intelectual... Sua competência como animador encontra aqui uma
oportunidade de se exercer e de se desenvolver. Ela exige disponibilidade
e capacidade em receber e compreender os aportes do meio (profissional,
cultural...) para exprimir nuances, retificar, provocar a reflexão. O conheci-
mento técnico, a mesma profissão ou a proximidade cultural pode, neste
sentido, representar fatores facilitadores. Esta competência exige do mo-
nitor, através de visitas e encontros, a apreensão periódica das situações de
vida dos alternantes, para uma melhor percepção de sua experiência.
Em conclusão, negligenciar ou passar por cima da Colocação em Co-
mum significa amputar o processo de formação alternada e tirar dos alter-
nantes uma atividade fundamentalmente educativa. A responsabilidade do
CEFFA está em jogo, como também a da equipe pedagógica.
47
vo, o grupo, a formação, a duração... Preparação com os membros do gru-
po para, no mesmo tempo, despertar o interesse, avivar a curiosidade e
“municiar” para intervir, fazer perguntas, dar pontos de vista, mas também
anotar. Trata-se menos de procurar perguntas a fazer do que alongar-se
sobre o conteúdo, informando-se e discutindo, extraindo os problemas e as
questões que aparecem.
Durante a visita ou intervenção, prevalecem as atitudes: interesse, escu-
ta, atenção, respeito, mas também o questionamento e o levantamento das in-
formações essenciais que foram captadas.
Depois, significa a exploração da atividade, a fim de conservar algo sob a
forma de um documento, mas permitir, também, um amplo trabalho de
expressão nas suas diferentes áreas. As variedades das formas de aproveita-
mento são importantes para manter o interesse e, principalmente, permi-
tir aprendizagens metodológicas diversas:
• formas escritas através de relatos, relatórios, fichas técnicas, artigos
de jornal...
• formas orais através de exposições, debates...
• formas visuais através da realização de painéis e mesmo audiovisuais
sob a forma de reportagens.
CEFFA
Meio vivencial Meio vivencial
3) Visitas-intervenções
1) Plano de estudo 2) Colocação
em comum
4) Aportes teóricos
48
Constituem elas mediações para o trabalho pedagógico, como tam-
bém para o diálogo no meio de vida com os pais ou com os mestres de es-
tágio. De fato, o adolescente, uma vez interessado, sente a necessidade de
dizer para o seu entorno o que descobriu, o que aprendeu, inclusive, nas
coisas de ordem prática. Ele quer exercer o poder que lhe conferem as
aquisições feitas fora dele. E, às vezes, transforma estas descobertas em
ações e experimentações.
49
2.5. Meios para a formação geral
Enfim, por estas e outras razões, as visitas de estudo e as intervenções
são meios para a formação geral. As primeiras, particularmente, ensinam a
observar, a ver, a ler uma situação ou uma paisagem, a comparar, a anali-
sar, a apreciar, a avaliar, para, em seguida, talvez agir. A metodologia do
“ver – julgar – agir” toma aqui toda a sua dimensão. O raciocínio e o desen-
volvimento intelectual decorrem disto como também a aptidão para a for-
mação permanente.
Conclusão
Propor, num planejamento semanal, uma visita ou uma intervenção é
colocar à disposição dos alternantes situações e materiais para encontrar e
construir saber, por sua conta. É torná-los um pouco mais atores de sua for-
mação. Mas, além das aprendizagens cognitivas, prevalece a sua dimensão
educativa. A responsabilidade do CEFFA, através do Plano de Formação
que lhes garante um lugar, está engajada. Assim como a dos monitores, pelo
seu papel de animadores. Através destas atividades, através de uma pedago-
gia da ação, eles são, na verdade, ao mesmo tempo, guias, organizadores,
conselheiros, facilitadores, reguladores... educadores.
CEFFA
Meio Meio vivencial
vivencial Tempo do relatar, Tempo de respostas,
do questionamento dos esclarecimentos, Tempo do transmitir e do
Tempo da vivência (colocação em do “ensino”, dos aplicar
e do olhar sobre ela comum) saberes teóricos
24. Cf. TRANCHAND, B. Des activités et des outils pour vivre et faire vivre une al-
ternance intégrative. In: Les outils de l’alternance. Le Lien des Responsables, n. 149,
mai./1995. Paris: UNMFREO.
50
1. Conseguir e compreender o “ensino” na pedagogia da alternância
Pela palavra “aula” pode entender-se procedimentos muito diversos. A
saber: a aula coletiva do monitor, o trabalho individual ou em grupo a par-
tir de documentos, a exposição ou a conferência de um interveniente, o re-
curso às novas tecnologias da informação e da comunicação etc.
Para os alternantes, esta fase do trabalho pedagógico tem por objetivo de:
• agrupar e ordenar aquilo que já conhecem;
• descobrir noções novas, compreendê-las e assimilá-las, integrando-as
aos seus conhecimentos anteriores, ao que fazem e vivem e, conseqüen-
temente, aprendem;
• desenvolver o raciocínio, a reflexão e caminhar para mais abstração.
Mas ela se torna, essencialmente, um tempo de ação – pesquisa – formação,
isto é, de construção, de produção de saberes e não de consumo passivo de
informações.
Para os monitores-formadores, a “aula” representa um tempo de animação
durante o qual:
• ele propõe e organiza atividades;
• ele faz participar e expressar os conhecimentos existentes e as inter-
rogações;
• ele traz, explica e demonstra, quando necessário;
• ele guia na busca de informações ou conteúdos;
• ele ordena, sintetiza;
• ele orienta, regula, incentiva a caminhada, controla...
Seus papéis têm a ver, ao mesmo tempo, com a transmissão de noções,
de explicações, de conselhos metodológicos, de acompanhamento, de or-
ganização, de facilitação da expressão... isto é, de animação pedagógica.
Animar uma aula é permitir que todos e cada um do grupo aprendam.
Mas cada um tem o seu jeito de aprender e vários fatores intervêm aqui: a
motivação, a disponibilidade, as perturbações de ordem física, afetiva, re-
lacional, familiar..., a natureza das noções abordadas etc. Por isto, animar
uma aula exige estar presente para todos e para cada um. A atitude, a orga-
nização e as técnicas contribuem neste sentido.
Em regra geral, a animação de uma aula se realiza através de três tipos de
atividades:
• atividades ou tempos de participação dos membros do grupo: trocas e apor-
tes de fatos, observações, experiências, questionamento, trabalho com
documentos, exercícios...
51
• atividades ou tempos de intervenção do monitor: aportes, explicações, or-
denamentos, síntese...
• atividades ou tempos de trabalho dos alternantes: cópia das noções expli-
cadas, leitura de um texto impresso, numeração, títulos sublinhados,
destaque do essencial, idéias gerais, esquematização...
O desenrolar destes três tempos exige uma organização, porque os al-
ternantes, ainda mais porque são adolescentes, precisam de mudança, de
variedade nas suas atividades e de estrutura para construir. Além disto, sua
capacidade de concentração se encontra, muitas vezes, limitada, principal-
mente quando o conteúdo abordado é abstrato. Uma alternância equilibra-
da entre os diversos tempos cria as condições para um melhor êxito da aula.
25. Para obter informações mais amplas, recorrer à obra de Jacques Legroux: Les outils
pédagogiques de l’alternance. Paris: Mésonance/UNMFREO, 1979.
52
seqüências práticas...). É a ação e a aprendizagem do trabalho intelec-
tual que são prioritários.
Para os monitores, os Cadernos Didáticos são instrumentos concebidos
para permitir-lhes exercer sua função na Pedagogia da Alternância e seus papéis
de animação pedagógica mais do que de ensino disciplinar.
Se, nos primeiros tempos das MFR, os Cadernos Didáticos abrangiam,
essencialmente, áreas técnicas, progressivamente, foram implementadas
em todos os setores de conhecimento: científicos (biologia, física, química),
geográficos, históricos, econômicos, sociais, matemáticos, lingüísticos...
Mas, hoje, a grande diversidade de formações não permite cobrir todos os
programas.
Todavia, sua concepção é indicativa da pedagogia das “aulas” nos
CEFFAs. De fato, elas possuem uma mesma orientação e estrutura (com
adaptações próprias a cada disciplina). Seu procedimento pode se resumir
da seguinte maneira:
26
1) Base sobre o conhecido e o familiar dos alternantes através do levanta-
mento de seus conhecimentos (observações, fatos, exemplos vividos) e
suas perguntas. Para possibilitar isto, espaços em branco são previstos
para anotações.
2) Aportes de novas noções, explicações sob forma de texto impresso.
3) Resumo do essencial ou definição feita pelo estudante.
4) Exercícios de assimilação, de síntese, de relação entre a teoria e a prá-
tica...
Conclusão
A “aula” só constitui um dos tempos da formação alternada. Só é efici-
ente se for precedida por tempos e atividades que preparam os jovens a re-
cebê-la e se for seguida por outras que garantem-lhe a concretização ou a
assimilação: visitas, exercícios, transferências para a ação. As Fichas Peda-
26. Deve-se a este grande mestre da Educação nova na França, Roger Cousinet, uma sa-
lutar distinção entre o “concreto” e o “familiar”. Numa conferência, quando solicitado
a dar seu ponto de vista sobre “a pedagogia do concreto”, deu a seguinte declaração:
“Não falem de concreto, esta imbecilidade notória e incurável nos docentes, mas falem
de familiar”. O familiar é aquilo que a criança vive intimamente, aquilo que sabe, que
conhece pela sua experiência, ao mesmo tempo, pelo seu intelecto, sua afetividade,
suas atividades manuais. A experiência de laboratório é concreta, mas não tem nada de
familiar. A seguir, uma expressão veio a ser utilizada nas MFR (CFR): “o apelo ao fami-
liar”, para designar o convite a expressar os fatos e conhecimentos da vida.
53
gógicas ou Cadernos Didáticos, bem como o Caderno da Realidade e a Co-
locação em Comum, constituem um dos traços da identidade dos CEFFAs.
CEFFA
Colocação Aulas Exercícios
Meio vivencial em comum Meio vivencial
Plano de estudo
Visita de estudo
1. Exercícios bem-sucedidos
As propostas de exercícios podem ser as mais diversas, levando em
conta:
• as áreas de “saberes” visadas: saber-conhecimento, saber-fazer ou sa-
ber-ser;
• os modos de expressão solicitados: escrito, oral, manual...
• as funções ou operações intelectuais privilegiadas: memória, re-
flexão, raciocínio, organização, classificação, análise, síntese, relação,
transferência...
54
• exercícios de relações e de síntese entre duas áreas de saber diferentes,
entre disciplinas, saberes, da prática e da teoria, entre os fatos, as técni-
cas e as leis (processo indutivo) ou o inverso (processo dedutivo). Este
tipo de exercício favorece a abordagem interdisciplinar;
• exercícios de aprofundamento pelo trabalho de pesquisa documental;
• exercícios de transferência dos conhecimentos para aplicar um pro-
cesso de estudo numa outra situação ou no campo da ação prática.
O exercício representa, necessariamente, uma fase de aprendizagem, um
tempo de trabalho formativo. Para fazer isto, o êxito é a condição básica em
toda proposta de exercício. Um conjunto de condições concorre para o êxito:
• antes de tudo, não confundir o exercício com a avaliação-controle,
que não é da mesma natureza (ver adiante “As avaliações”);
• a adaptação dos exercícios às capacidades dos alternantes tanto no
conteúdo quanto na forma do enunciado;
• uma duração limitada porque esta atividade requer um forte investi-
mento;
• a proposta de uma série de cinco ou seis exercícios de naturezas dife-
rentes e com dificuldades crescentes, de maneira a permitir uns e ou-
tros de conseguir e ir seguindo o seu próprio ritmo;
• a qualidade dos enunciados em relação à sua clareza e compreensão;
• o recurso aos documentos para realizar os exercícios;
• procedimentos variados de trabalho pessoal, em dupla ou em peque-
nos grupos em função dos momentos e dos tipos de exercícios;
• a ajuda mútua, a cooperação entre os membros do grupo;
• a ajuda permanente do monitor para evitar os bloqueios, para acom-
panhar, guiar, orientar...
• a Colocação em Comum, apreciação e correção coletiva dos resultados.
A questão da correção
Qualquer exercício pede uma correção, isto é, um ajuste, uma apreciação,
às vezes uma pontuação, para que cada alternante possa situar o seu trabalho
e que o monitor se dê conta das aquisições e das lacunas de cada membro do
grupo e do seu trabalho pedagógico. Trata-se aí de um momento importante
de qualquer processo de formação, que, todavia, só apresenta interesse na
medida em que leva a uma tomada de consciência e constitui um ponto de
partida para melhorar, e não a uma conclusão.
55
A correção mais pertinente acontece durante o exercício para ajudar, ori-
entar, sugerir. Ao final de um exercício, ela pode revestir-se de várias formas,
segundo os objetivos almejados e as dinâmicas utilizadas.
Mas os exercícios não podem representar, para o monitor, um inves-
timento em tempo demasiado, até mesmo cansativo, para ler e corrigir
provas. As seguintes condições permitem uma correção eficaz num tem-
po limitado:
• Praticar métodos variados e progressivos que impliquem os alternantes:
correção coletiva, por pequenos grupos, por dupla ou sozinhos, com
uma ficha de apreciação, ou, a partir de um exemplo de resposta possí-
vel, pelo monitor...
• Não corrigir tudo de uma vez, mas adaptar a correção à natureza do
exercício: o nível e a precisão dos conhecimentos numa avaliação – con-
trole, a qualidade da síntese e a concisão para um exercício de resumo,
a natureza e o valor das relações para um exercício de síntese, a quali-
dade do raciocínio ou da demonstração em outra parte... O mesmo
vale para a forma de expressão: a apresentação de conjunto em deter-
minado momento, a estrutura do desenvolvimento num outro momen-
to ou, ainda, a gramática, o vocabulário, a pontuação etc. Importa espe-
cificar os critérios de correção em cada momento. Devem ser claros e pre-
cisos para o monitor e do conhecimento dos alternantes. Não leva a
nada tratar de tudo ao mesmo tempo. Os progressos, para qualquer
um, só podem ser progressivos.
• Dar um toque positivo e dinâmico às apreciações: os pontos positivos, os
progressos alcançados, o que fica para ser melhorado e os meios neces-
sários para isto. Importa, neste caso, de ajudar, de favorecer o êxito e não
de desanimar.
A pontuação nunca é conveniente quando se trata de trabalho formati-
vo, porque, diga-se mais uma vez, o exercício não deve ser confundido com
o controle. (A questão da pontuação será abordada mais adiante, no ponto
que trata das avaliações.)
56
da e quando tenha o sentimento de êxito, de progresso, de valorização. Em
nenhum caso, portanto, o exercício deve se tornar uma armadilha.
Os exercícios, durante ou depois da aula, constituem, essencialmente,
estes momentos de ação necessária ao processo de aprendizagem. Suas
funções são, de fato, múltiplas.
57
2.4. Desenvolver a aptidão para a transferência, ou seja, utilizar saberes ad-
quiridos em diversas situações, resolver um problema sem ter estudado di-
retamente seus dados e adaptando o que foi aprendido em outras circuns-
tâncias. Aprender a mobilizar os conhecimentos para utilizá-los em diver-
sas circunstâncias é uma meta essencial de qualquer formação, mas tam-
bém a melhor preparação para as avaliações e as provas.
Conclusão
O sentido de uma pedagogia ativa, de uma pedagogia da experiência,
existe quando o tempo do ensino se reduz ao mínimo em proveito do tem-
po do trabalho pessoal ou cooperativo dos alternantes. A aula, de fato,
deve apontar para um exercício permanente. Com certeza, é este o sentido
das Fichas Pedagógicas ou Cadernos Didáticos.
NOTAS COMPLEMENTARES
Palavras de autores
29
Célestin Freinet
Vocês pensam que suas aulas são indispensáveis. Elas lhe dão
majestade. Só a observação e a experiência são formadoras. O
resto todo é só ilusão.
O inimigo número um da regeneração da nossa escola é a sali-
va, ou seja, a explicação sem limite, a aula permanente na qual
a voz do mestre é a ferramenta maior da vida docente.
A explicação logo se torna palavrear, superando na sala o racio-
cínio e a ação... Segundo esta prática, não será a expressão que
prevalecerá em francês, mas a explicação, as aulas de gramá-
tica e de vocabulário, como se impusesse à criança que dá os
primeiros passos toda uma série de regras e proibições ante-
riores... Vou explicar primeiro como se fala ou como se anda...
Só depois você fará suas primeiras tentativas... é preciso co-
nhecer antes de tentar andar!...
30
Alain
De uma aula magistral não fica quase nada após oito dias, e,
após quinze, não fica nada mesmo. É recitando, lendo e copi-
ando que a criança memoriza enfim alguma coisa.
58
Não se aprende a desenhar olhando um professor que dese-
nha muito bem. Não se aprende piano escutando um virtuose.
Do mesmo modo, pensei muitas vezes, não se aprende a escre-
ver e a pensar escutando um homem que fala e pensa muito
bem. Precisa tentar, fazer, refazer até que a arte entre, como
se diz.
Ordinariamente, considero a classe primária como um lugar
onde o professor não trabalha muito e onde a criança trabalha
muito. Não com estas aulas que caem como chuva e que a cri-
ança escuta, os braços cruzados. Mas, as crianças lendo, escre-
vendo, calculando, desenhando, recitando, copiando e reco-
piando. O velho sistema dos monitores restaurado.
E, enfim, não há progresso para nenhum escolando no mun-
do, nem no escutar, nem no olhar, mas, somente, no que faz.
31
Roger Cousinet
Uma noção só tem valor e só vale a pena assimilá-la se pode
ser utilizada... Saber algo não significa possuir, mas utilizar.
Saber as quatro regras é bom para poder efetuar as operações
que necessita um problema novo. Não é pela recitação que o
saber está sendo mais controlado, mas pela ação, pela manei-
ra através da qual antigos ganhos adquiridos se integram num
trabalho novo e firmam.
32
John Dewey
Se a educação quiser atingir suas finalidades, de um lado em
relação à criança, de outro lado em relação à sociedade, deve
ser baseada sobre a experiência atual e vital de alguém.
59
Ou seja, segundo a representação abaixo:
Caderno da Realidade
Visita de estudos
Plano de estudo
Ações
Relatório de estágio
AVALIAÇÕES
1. A avaliação e o controle
A noção de avaliação pode levar à confusão, porque, segundo os objeti-
vos que lhe são atribuídos, seu sentido e sua prática divergem.
A avaliação formativa é aquela que acompanha uma atividade de forma-
ção. Ela ocorre durante o desenrolar da atividade ou imediatamente depois,
através do olhar dado por um terceiro: os pais, o mestre de estágio ou um tu-
tor, o monitor. Ela tem por objetivo perceber os aspectos positivos e os limi-
tes de um trabalho, proceder às retificações e melhorias, destacar pistas pa-
ra a progressão. Ela é, deste jeito, uma atividade essencialmente formativa
para a qual uma pontuação não tem interesse.
33
A avaliação-controle é aquela que almeja, no final de uma seqüência de
aprendizagem ou de uma parte do programa, verificar o nível dos conheci-
60
mentos adquiridos (de saberes-conhecimentos, de capacidades de raciocí-
nio ou de expressão, de métodos de trabalho intelectual ou do saber-fazer
prático, de aptidões relacionais etc.). Estas avaliações-controle traduzem-
se através de uma pontuação acompanhada de apreciações que, para cada
um, representam uma medida, uma referência em relação a uma norma de
aquisições acadêmicas ou de prova, mas também em relação aos membros
do grupo. Ela é válida para cada alternante, mas também para o monitor
responsável pela atividade formativa avaliada. O controle é exercido para
um e para outro, porque o nível geral das aprendizagens dá conta de uma
eficiência pedagógica.
Quando os procedimentos de formação e de qualificação implicam
um controle contínuo, avaliações-controles por área de formação ou por
disciplina vêm impondo-se no curso da formação, com o risco de uma infla-
ção dos controles certificadores, que desviam o sentido da formação e levam a
atitudes escolares.
Em formação alternada, as avaliações não deveriam limitar-se às matérias
acadêmicas. Não é tão-somente através delas que se opera a formação, no
quadro dos CEFFAs. Por isto, as avaliações devem ser colocadas nos espaços
da prática profissional, para medir, junto aos mestres de estágio ou os tuto-
res, o ganho adquirido no campo do saber-fazer e das competências. Em se-
guida, um plano de avaliação é necessário para qualquer ciclo formativo.
61
condição que desencadeia uma ação para progredir. Se não, ela permane-
ce na altura de um julgamento positivo ou negativo, até mesmo de uma
sanção dada por um terceiro.
4. A atitude do monitor
Toda avaliação constitui um ato pedagógico carregado de sentido. Ela apare-
ce, de fato, como um julgamento proferido por um “formador”. Neste ato
de formação existem todos os ingredientes da relação pedagógica e educa-
tiva. Acompanha, ajuda, projeta e dinamiza, ou então sanciona, conclui e
aniquila os esforços. A atitude manifestada, as apreciações dadas, as pala-
vras utilizadas ressoam naquele que as recebe. Através da avaliação, os pro-
tagonistas se encontram com o jogo do poder e da autoridade. O monitor
62
34
detém o poder que lhe é conferido pelo seu estatuto e uma autoridade liga-
da à sua pessoa e à sua competência. Na avaliação, é devidamente, para o
monitor, de autoridade pedagógica de que se trata, a fim de tornar a “pes-
soa se avaliando” autor de si mesmo.
34. Convém considerar a palavra “autoridade” no seu sentido etimológico, isto é, “au-
tor”, o que significa que “ter autoridade é ser autor de si” e “fazer prova de autoridade
pedagógica é tornar o outro autor de si-próprio”. Logo, é conveniente não confundir a
autoridade com o autoritarismo, que é uma manifestação pervertida da autoridade.
63
3
A ORGANIZAÇÃO E A GESTÃO DA FORMAÇÃO
64
A organização e a gestão das seqüências de alternância pelo “trabalho
temático”
Ela tem por objetivo criar uma unidade de formação para articular, dar
coerência, tanto quanto for possível, embora sempre de maneira parcial,
ao conjunto dos “materiais” formativos e educativos. O tema de estudo repre-
senta nisto tudo o elemento congregador. Dele decorrem as atividades e os
conteúdos que permitem aprofundá-lo, de tratá-lo sob ângulos diferentes:
técnicos e/ou tecnológicos, científicos e matemáticos, históricos e geográfi-
cos, econômicos e socioculturais, sem esquecer as dimensões da expressão
e da comunicação presentes em todas as atividades, mas abordadas, tam-
bém, de maneira específica.
Ou seja, representado da seguinte maneira:
Estadia do meio
Estadia no CEFFAs
Visita de estudo
Expressão e comunicação
65
Todo este conjunto forma o fundamento para aportes e aprofundamentos teóri-
cos de naturezas diversas e variadas segundo os temas tratados com um conteú-
do técnico ou tecnológico e outro mais geral (mais científicos para uns, mais
econômicos ou culturais para outros...). Deste jeito, os conteúdos do progra-
ma encontram-se abordados e associados, de maneira cruzada e interdisci-
plinar. E as possibilidades de construção de sentido pelo alternante, de rela-
ção e articulação entre os saberes e as aprendizagens, se vêem otimizadas.
Ou seja, esta outra representação gráfica:
Tema
8 9 10
7 Economia História Expressão
5 6 Matemática Geografia Comunicação
4
3 Biologia Química
1 2 Tecnol.
Visita
P.E. C.C. Agronomia
interv.
66
Uma organização pedagógica deste tipo desenvolve os conteúdos se-
gundo uma lógica horizontal, enquanto o ensino disciplinar justaposto se
desenvolve segundo uma lógica vertical.
Lógica disciplinar do ensino tradicional / Lógica temática da Pedagogia da Alternância
Lógica temática
da Pedagogia da Alternância
Cada tema encontra sua origem numa “situação de vida” dos alternan-
tes, ou seja, uma atividade, uma organização, um projeto... de ordem pro-
fissional, familial, sociocultural, pessoal. Sua programação pertence ao
Plano de Formação.
NOTAS COMPLEMENTARES
A alternância ou a pedagogia das orlas
Quem andou de manhã cedo ou bem de tardinha num dia de chuva ou
de sol forte na orla de um bosque terá ressentido a singularidade da situação
entre planície e bosque e, talvez, terá vivido e experimentado alguma ex-
periência ou emoção mais forte.
Gosto de andar na orla dos bosques, nesta “borda” de liberdade... lá
onde o melhor se colhe e sem nada perturbar, como o disse tão bem Philip-
pe Delerm. De fato, tudo se encontra na orla de um bosque porque a paisa-
gem se abre e parece respirar. Ela é um espaço a atravessar e conquistar, a
luz a receber. Toda orla, também chamada de borda, berma, limite, é uma
cerca viva, uma zona rica em variedades e um espaço habitado. E uma vida
intensa existe aí. Ela é uma fronteira e, como tal, um lugar de passagem en-
tre duas entidades. É este “entre-dois”, esta interface onde se jogam e inte-
ragem lógicas opostas. É um lugar de paradoxos que atestam da complexi-
dade, a qual demonstra riqueza. A fauna gosta deste “entre-dois” e seus
opostos: o espaço aberto e o fechado, o exterior e o interior, o descoberto e
o camuflado, a insegurança e a proteção, a luz e a sombra, o calor e o fres-
cor, a comida e a morada...
67
Toda orla é lugar de ruptura, das relações e das complexidades: com-
plexidade nos agenciamentos da natureza, complexidade na implementa-
ção dos nossos sentidos, complexidade na gestão das nossas emoções. Nes-
sa dialética dos campos e dos bosques, do fora e do dentro, do aberto e do
fechado, do aqui e do acolá, se degustam os opostos e os contrários e traba-
lham, complementarmente, nossos sentidos, nosso intelecto, nosso afetivo,
o relacional e o irracional. Na orla se estabelece uma relação com uma ou
outra entidade: atração, recusa ou preferência para uma ou outra ou acei-
tação indiferente de seus contrários, bem-estar ou medo, integração har-
moniosa do conjunto ou desequilíbrio... como acontece em outras orlas.
Porque, como diz Edgar Morin, “toda fronteira é lugar da dissociação e da
articulação... o filtro que, ao mesmo tempo, rejeita e deixa passar, aquilo
através do que são estabelecidas as correntes osmóticas e o que impede a
homogeneização”.
Mas toda orla é instável e frágil. A planície pelo agricultor e o bosque
pela sua espontaneidade lutam sem fim para recuperá-la em seu proveito.
Enfrentamento permanente na gestão da complexidade e dos paradoxos
que traz. Eterno “combate nas fronteiras...”, segundo G. Pineau.
Toda alternância reside naquilo que coloca o alternante em jogos de com-
plexidade, de passagens, de rupturas e de relações. Ele encontra e vive en-
tidades diferentes, cada uma com suas especificidades, seus saberes, seu sa-
ber-fazer e saber-ser, sua linguagem, sua cultura, seus atores, seus jogos de
influência nos quais o “eu”, numa dialética de personalização e socialização
deve situar-se, construir-se e crescer. É necessário que ele assuma as passa-
gens de um lugar, de uma entidade à outra, cada uma com suas sombras e
claridades, seu irracional e seu racional, sua espontaneidade e sua organi-
zação, sua ordem e sua desordem, seus conhecimentos informais, suas in-
formações e seus saberes formais. É preciso que ele abandone cada entida-
de por um tempo, sem, portanto, esquecê-la, para envolver-se na outra.
Precisa ele viver em permanência este paradoxo de rupturas e de rela-
ções que, sem dúvida, é fator de desenvolvimento desta atitude essencial
para o seu futuro: a adaptabilidade. É necessário que ele passe de um co-
nhecimento ao outro: da familiar e empírica da vida à acadêmica e teórica
da escola. Ele precisa garantir uma ruptura na ordem dos conhecimentos,
o que o filósofo Gaston Bachelard chamou de “ruptura epistemológica”
necessária para toda aprendizagem nova.
A pedagogia, neste caso, torna-se preponderante para facilitar as passa-
gens, ajudar cada entidade a viver numa perspectiva formativa e educativa.
Já faz bastante tempo que as MFR implementaram, neste sentido, esta pe-
dagogia das orlas.
68
Antes, pela elaboração de um dispositivo pedagógico com quatro objetivos:
• articular os tempos e os espaços da formação;
• associar a formação profissional e a formação geral;
• associar os pais e mestres de estágio ao processo de formação;
• acompanhar cada alternante nas suas aprendizagens e caminhadas.
69
Se tiver interesse pela Pedagogia da Alternância ou se atue nesta cor-
rente pedagógica, enfrente uma caminhada, de manhãzinha, na orla de
um bosque, bem à vontade, aguçando bem os sentidos e sem pensar na Pe-
dagogia da Alternância. Isto só virá depois...
70
1. Programa e Plano de Formação
Programa Plano de Formação
Quem os • Especialistas, técnicos, docentes, • Essencialmente uma equipe
define? agentes de serviços pedagógica num dado
administrativos... estabelecimento, para oferecer
• Em função de esquemas uma dada formação:
diretores nacionais. - com a colaboração dos pais,
• Para o conjunto dos mestres de estágio, profissionais;
estabelecimentos do sistema - levando em conta o ambiente
educativo nacional. socioeconômico imediato e os
• Estabelecidos para vários anos. projetos de cada um dos alunos.
O quê? • Um conjunto de noções: • Plano de ação reunindo, para
O que conteúdos, saberes... um dado grupo de formação, em
contém? - apresentado sob a forma de vista de finalidades e metas:
disciplinas justapostas; - os temas de estudo ou unidades
- para uma abordagem analítica e de formação das diversas
pré-programada; seqüências de alternância;
- dado essencialmente por - as atividades e os conteúdos de
ensinamentos ligados a horários; cada unidade de formação (Plano
- cuja aquisição é medida por de Estudo, Colocação em
controles ou avaliações Comum, disciplinas...);
quantitativos; - os períodos e as atividades de
- pouco negociável, pouco avaliação do percurso de
adaptável. formação e de orientação;
- os períodos de estágio;
- as atividades de animação da
vida no internato;
- os momentos e as atividades de
encontros com os parceiros
pais, mestres de estágio...
• Inteiramente negociável e
adaptável para atender aos
imprevistos e às evoluções.
Para quê? • Atingir um nível de • Visar uma formação integral
conhecimento garantido por um (profissional e geral associadas) e a
exame cujas provas são maturação do projeto pessoal.
estandardizadas e quantificáveis. • Facilitar a inserção social do jovem
• Obter, se for o caso, uma (o diploma sendo um dos meios).
qualificação profissional. • Adquirir os níveis de formação e
de qualificação necessários para um
emprego ou para o prosseguimento
dos estudos.
Para quem? • Os alunos dos diversos ciclos • Os “alternantes”, ou seja, atores
escolares. socioprofissionais.
• Os professores e o sistema • Monitores, pais, profissionais
escolar geral. que implementam, coletivamente,
• Pouca regulação pelos atores. o Plano de Formação.
- de onde as possibilidades de
regulações e de adaptações.
71
2. A elaboração do Plano de Formação
Em formação alternada, cinco categorias de elementos em interação
devem ser levados em conta para organizar o Plano de Formação, como
mostra a representação seguinte:
As atividades dos
alternantes dentro de
um ambiente
B
O projeto de O método
formação A As avaliações
(finalidades, objetivos) E C
O programa
D
72
grupo de pessoas pode, de maneira duradoura, constituir o comitê res-
ponsável que valida o Plano de Formação, o avalia e procede às adapta-
ções desejáveis no tempo.
2) O segundo momento da construção do Plano de Formação é aquele
da definição, para cada seqüência de alternância, dos temas portadores do
processo de formação. Em relação a isto, como dito anteriormente, é a
experiência que antecede o programa. Por isto, os temas têm sua fonte
nas atividades da vida (familial, profissional e social), levado em consi-
deração o ciclo da formação, da idade e da maturidade dos alternan-
tes. Convém, para os temas profissionais, examinar as etapas de entra-
da numa empresa, as atividades dos jovens no decorrer do ano e sua
progressão.
3) A terceira fase, que é de responsabilidade da equipe pedagógica,
consiste em distribuir as atividades pedagógicas e os conteúdos disciplinares
para tratar cada tema.
4) Uma outra etapa almeja definir e planejar os períodos de avaliação da
formação e de orientação, bem como as atividades de encontros (visitas,
reuniões) com os pais e os mestres de estágio.
Por isto, o Plano de Formação se apresenta sob a forma de um grande
quadro, como segue:
73
Exemplo simplificado de um Plano de Formação dos CEFFAs
CONHECIMENTO DA REALIDADE DISCIPLINAS DISCIPLINAS DO NÚCLEO
Conteúdos vivenciais PROFISSIONAIS COMUM
Pedagogização das alternâncias Conteúdos da parte Conteúdos da Base Nacional Comum
diversificada integrados com os integrados com os temas de pesquisa
conteúdos vivenciais e da dos Planos de Estudo
formação geral
Retorno / meio
Construções e
Agroindústria
Colocação em
Colaborações
Eixo gerador
Legislação e
Língua ext.
Tema de Pesquisa no meio socioprofissional
gestão amb.
Alternância
Agricultura
Matemática
instalações
Atividades
Português
Economia
Geografia
Visitas de
Zootecnia
Químina
externas
Biologia
História
Período
comum
Estágio
PLANO DE ESTUDO
estudo
Física
Artes
rural
1 História da minha família
2 A divisão do trabalho
3 Alimentação animal
A família e o trabalho
Retorno / meio
Construções e
Agroindústria
Colocação em
Colaborações
Eixo gerador
Legislação e
Língua ext.
Tema de Pesquisa no meio socioprofissional
gestão amb.
Alternância
Agricultura
Matemática
instalações
Atividades
Português
Economia
Geografia
Visitas de
Zootecnia
Químina
externas
Biologia
História
Período
comum
Estágio
PLANO DE ESTUDO
estudo
Física
Artes
rural
1 Realidade socioprofissional da família
2 Apresentação da idéia do projeto
3 Colocação em comum do estágio
4 Análise comercial
O meio socioprofissional e o projeto
NOTAS COMPLEMENTARES
Cantos de pássaros e Planos de Formação
Talvez conheçam Olivier Messiaen? No caso afirmativo, vocês, talvez,
já tenham ouvido obras musicais deste grande compositor, maestro con-
temporâneo – embora falecido há alguns anos – cuja música pode surpre-
ender porque é diferente e nossos ouvidos não estão acostumados aos agen-
ciamentos de notas que suas partições oferecem.
No caso contrário, tentem descobrir.
Então, talvez tenham encontrado – ou sentirão – algumas surpresas an-
tes de seus ouvidos se familiarizarem e vocês aderirem ou não. Encontro
com suas obras litúrgicas ou com seus cantos de pássaros feitos música, a
exemplo do “despertar dos pássaros”, “o catálogo dos pássaros” ou ainda
“pássaros exóticos”. De fato, O. Messiaen está sendo considerado o mais
inventivo entre os “compositores ornitológicos”. Se a primeira chave de
sua obra é religiosa, a segunda baseia-se sobre “a natureza que está infinita-
mente além de nós”, como dizia. Messiaen aproximou-se do mundo dos
pássaros: o rouxinol, a coruja, a cotovia, o tordo-músico, o pica-pau e todos
os outros, ou quase...
Estas composições “ornitológicas” não foram fruto de pura imaginação
que teria levado a um agenciamento de notas e partições puramente abs-
tratas. Ao contrário, elas encontram sua origem na realidade, na natureza
mesmo. Olivier Messiaen tem, de fato, escrupulosamente escutado, regis-
trado os cantos de pássaros nas diferentes horas do dia para, depois, tenta-
do traduzi-los, evocá-los com o máximo de fidelidade, com o material mu-
sical por ele escolhido.
Semelhante é também, para todos os “autores-compositores” de Planos
de Formação de CEFFAs, o procedimento adotado:
• primeiro olhar, ler, escutar, sentir, palpar, perceber a realidade de
vida dos alternantes;
76
• extrair disto tudo, os temas maiores, portadores de sentido em ter-
mos de atividades, ações, engajamentos e suportes para organizações
didáticas;
• colocá-los numa lógica progressiva de acordo com a capacidade de
envolvimento e de aprendizado;
• enxertar aí as noções teóricas necessárias para compreender, apren-
der, recorrer às leis, aos princípios e conceitos, abstrair, construir mais
saberes e capacidades.
Nesse caso, as “notas matemáticas” se revestem de sentido para o jo-
vem, porque consegue aparentá-las com alguns cantos ouvidos na nature-
za. O mesmo vale para as “notas biológicas ou físicas”, bem como para to-
das as outras, também.
Aí, a Pedagogia da Alternância, como na música de O. Messiaen, con-
segue escapar dos ajeitamentos clássicos contidos nas partições oficiais que,
de fato, são os programas. É o canto dos pássaros na natureza, com tudo
aquilo que nos oferecem, que prevalece. As notas, os conteúdos dos pro-
gramas, ajudam a entendê-los melhor.
Os pedagogos – os monitores – são, antes de tudo, ouvintes, depois são
aqueles que fazem os arranjos e, finalmente, os compositores. Cabe-lhes fa-
zer um trabalho de composição, a partir destas partições e orquestrações
que representam os Planos de Formação. Neste caso, talvez, a ação peda-
gógica encontre-se enriquecida pela variedade, pela complexidade, pela
fantasia, pela poesia e produza mais eficiência educativa.
Experimentem, então, escutar o canto dos pássaros. Talvez encontra-
rão nele alguma inspiração pedagógica.
77
1. O planejamento de ensino
Centrado sobre os programas, é o mais corriqueiro e mais fácil de ser
implementado. Caracteriza-se, essencialmente, através de:
• Sua centralização quase exclusiva nos conteúdos, no programa e no
docente.
• Uma justaposição das disciplinas através de um quadro-horário (ge-
ralmente por hora). Esta organização leva a um consumo de doses su-
cessivas de programa de cinco, até seis aulas de naturezas diferentes no
mesmo dia, com todas as interrogações cabíveis, quanto à sua eficiên-
cia, dado o número e a dispersão das solicitações. Esta organização, de-
terminada pelas estruturas materiais e professorais, implica uma peda-
gogia da transmissão e dos papéis de ensino. Só deixa pouco espaço
para a variedade, tão necessária ao adolescente. O quadro, geralmen-
te, é estabelecido de maneira fixa para o ano inteiro, evitando, assim,
as angústias do imprevisto, da adaptação, da criatividade. Cabe à cri-
ança, ao adolescente ou adulto, adaptar-se.
2. O planejamento de aprendizado
Ele desloca a centralização da estrutura para o “educando”, a fim de levar
em conta, até onde for possível, suas necessidades e seus ritmos biológicos.
Apresenta, então, as seguintes características:
• a consideração dos ritmos da pessoa: tempo de adaptação à classe em
início de sessão e a cada manhã, duração da concentração, fase de rela-
xamento;
• a presença de momentos suficientes para um trabalho de animação
pedagógica mais do que ensino;
• uma variedade das formas do trabalho pedagógico (coletivo, em gru-
pos, individual...) e das fontes de informação (aportes do formador,
documentos diversos, pesquisas, exposições...);
• uma busca de coerência de conjunto e de um sentido geral dados
pela articulação, a relação das disciplinas, das atividades e um reforço
dos saberes a serem construídos pelo aprendiz.
Um planejamento deste tipo é concebido para uma pedagogia de ação,
de apropriação e de construção dos saberes pelos alternantes. Exige, por
parte dos formadores, tarefas de acompanhamento, de facilitadores, de
guias e, não mais, de ensino no sentido estrito.
78
3. O planejamento de aprendizado por alternância
Apresenta características do anterior, mas aplicado à implementação de
um dispositivo pedagógico que requer a alternância integrativa dos CEFFAs.
A saber:
• articular os tempos e espaços da formação;
• associar a formação profissional e formação geral;
• permitir aos alternantes de relacionar, articular e unificar lógicas e
aprendizados de naturezas diferentes;
• acompanhar o jovem ou adulto na construção de seu projeto profis-
sional.
79
• uma organização pedagógica estruturada, para o conjunto do per-
curso, através do Plano de Formação e, para cada seqüência de alter-
nância, através do trabalho pedagógico por tema.
80
4
A ANIMAÇÃO E A GESTÃO DAS RELAÇÕES
81
atenção ao conjunto do meio de vida, com seus diferentes componentes,
porque “a educação é um todo e só vale pela unidade que sabe estabele-
cer-se entre os diferentes meios: família, escola, exterior...”, dizia o peda-
37
gogo das MFR, A. Duffaure .
Ou seja, a representação seguinte da rede relacional
Os pais O grupo
(Campo familiar)
Alternante
O mestre do estágio Os monitores
(Campo profissional) A equipe
pedagógica
Outros jovens, adultos... e educativa
(Campo social)
82
A consulta aos relatos e relatórios das Colocações em Comum, das Visi-
tas de Estudo, bem com as Fichas Pedagógicas ou Cadernos Didáticos re-
presentam, para os parceiros do meio, outras tantas maneiras de se relacio-
nar com o CEFFA.
As avaliações no meio profissional, na empresa ou na família sobre as
atividades dos jovens têm uma função de implicar os parceiros. As avalia-
ções realizadas no CEFFA podem, também, associar e implicar pais e mes-
tres de estágio.
83
mento de sua situação de vida e de seu estatuto no campo familial e/ou so-
cioprofissional.
As visitas são também, para os monitores, oportunidades de melhorar
seus conhecimentos do ambiente cultural, mas também do mundo empre-
sarial e profissional. As visitas tornam-se, neste sentido, elementos de com-
petência e de aperfeiçoamento dos monitores, para que estejam em condi-
ções de, ao mesmo tempo, captar as experiências e as linguagens, de arti-
cular seus aportes teóricos com as realidades da vida dos alternantes e pro-
por Planos de Estudo adaptados ao meio de vida dos mesmos.
84
um meio de implicação na vida global do CEFFA através de uma participa-
ção em comissões ou grupos de trabalho, manifestações diversas ou, ainda,
em tarefas materiais.
A associação ajuda os pais e os mestres de estágio no aprimoramento
de seus papéis educativos e de formação de seus filhos, dando-lhes a opor-
tunidade de se encontrar, de se informar em reuniões. A associação, neste
título, é o corolário da alternância.
1. O relacionamento familiar
Elas se situam no período pré-adolescente e adolescente do alternante
com todas as dificuldades decorrentes para uns e outros. Manter o diálogo
torna-se a condição maior para um equilíbrio relacional. Os instrumentos
da alternância, entre eles o Plano de Estudo, entram no jogo para favore-
cer a troca como demonstrado anteriormente. Mas, os acertos com os mo-
nitores quando da acolhida no CEFFA, as visitas, as reuniões, os cadernos
de alternância... representam outros meios necessários para ajudar na com-
preensão mútua. Igualmente essencial é o trabalho de informação-forma-
ção sobre adolescência e o relacionamento familiar, que pode ser garanti-
do pela formação das famílias, em reuniões específicas.
85
Sua idade e o lugar que lhe é concedido não deixam de ter influência.
Enquanto jovem, encontra-se mais numa posição de observador e execu-
tor. Depois, progressivamente, vai adquirindo um estatuto e ganhando
papéis de mais responsabilidade se o meio profissional o permite e se o
jovem se envolve. Decorrente disto vai ser a natureza das relações em ter-
mos de dependência ou de autonomia das instituições e adultos que fre-
qüenta, com todos os efeitos possíveis sobre as suas condutas, suas apren-
dizagens e evoluções.
Os setores profissionais apresentam aspectos muito variados segundo
a dimensão, a natureza da atividade, o modo de produção e de organiza-
ção. Todavia, qualquer que seja a situação, é sempre num contexto huma-
no que vai se situar o alternante. Sabe-se – e numerosas pesquisas o atestam
– que os fatores relacionais repercutem de maneira determinante sobre a
motivação e os progressos feitos. A resposta que encontra para suas neces-
sidades fundamentais (consideração, reconhecimento, segurança, expres-
são e ação, progressão e aprendizagens, êxito...) faz com que se aplique, se
invista e otimize o relacionamento, se construa. A confiança e a responsabi-
lidade que lhe são atribuídas, o êxito que representa uma vitória sobre si
mesmo e o reconhecimento pelos colegas, bem como o meio social, a toma-
da de consciência de seu destino ou posição de adulto, a utilidade social de
sua ação, mas também uma retribuição, um salário... representam manifes-
tações do lugar que está ocupando, de sua inserção na sociedade.
O ambiente na empresa, os papéis e atitudes dos “acompanhantes”
(mestres de estágio, tutores...) revestem neste caso todo o seu sentido e sua
importância. Para um jovem, a chegada num ambiente novo, principal-
mente quando vai de par com o primeiro contato com o mundo do traba-
lho, cria um choque psicoafetivo que precisa ser compensado por um clima
de segurança, de compreensão e de acolhimento como co-ator no campo
profissional. Torna-se, ainda, mais essencial no caso de jovens que não en-
contram no meio familiar as respostas às suas necessidades e pedem estru-
turas e adultos como referências.
O CEFFA exerce neste caso, mais uma vez, uma responsabilidade no
sentido de zelar por estas condições de vida: visita dos monitores, como
descrito anteriormente, para controlar, informar, regular... reuniões com
os mestres de estágio para refletir sobre suas funções, papéis e atitudes, de-
finir as etapas, precisar os processos e os instrumentos da formação por al-
ternância... O Caderno de Alternância representa, como para os pais, este
outro instrumento permanente de informação e de relação.
86
3. O relacionamento no CEFFA
O relacionamento com os formadores e no grupo é marcado pelo am-
biente geral do estabelecimento refletido por suas características, suas
condições de funcionamento, o quadro material, o jeito pedagógico e de
animação que domina. Em outras palavras, a qualidade de acolhida e de
vida, a possibilidade de ser e de agir, repercutem sobre a densidade do
relacionamento.
87
• de aprendizagens sociais na medida em que, além do grupo de for-
mação, atinge-se o grupo de vida quando existem situações de vida re-
38
sidencial .
38. Trata-se neste caso de um componente do sistema de alternância dos CEFFAs como
o cap. 6 irá desenvolver.
39. Vão ser melhor definidos no cap. 8.
40. GIMONET, J.-C. Alternance et relations humaines. Paris: Ed. Universitaires/Mésonan-
ce, 1984.
41. Foi demonstrado, em relação a isto, que o que se espera do outro tende a se confir-
mar segundo a lógica do efeito Pygmalion. Cf. ROSENTHAL, R. & JACOBSON, L.
Pygmalion à l’école. Paris: Casterman, 1971.
88
reconhecer o ser profissional e social que ele é, aprender com ele. É, em se-
guida, entrar numa relação “cara-a-cara”, ou seja, do “Eu-Tu”. É uma con-
dição essencial da relação para com os alternantes, mas também para com
os pais, os mestres de estágio e, mais globalmente, para com o meio.
5. A mediação do acompanhamento
O acompanhamento aponta para a relação educativa em geral e para a
sua complexidade. Reveste, de fato, formas muito diversas e está carregado
de ambigüidade porque se trata ao mesmo tempo de:
• torná-lo suficiente para criar um clima de segurança, mas não excessi-
vo, para permitir o ato de assumir e um processo de autonomia;
• aceitar, por parte do monitor, de desempenhar papéis múltiplos,
com aspectos parentais para uns, de modelos profissionais, de apadri-
nhamento para outros...
• ajudar com um conjunto de intervenções em função das necessidades
percebidas (amparo, questionamento, impulsão, sugestões, enfrenta-
mentos...).
89
Este papel de acompanhamento ultrapassa, na formação alternada, o
quadro da estrutura escolar, já que se estende para as relações com os ato-
res do espaço socioprofissional, cujo conhecimento se torna indispensável
para um acompanhamento personalizado.
42
Um relacionamento para acompanhar a passagem da adolescência
43
A alternância é uma pedagogia da adolescência, dizia A. Duffaure . Esta
afirmação toma todo o seu sentido, quando se examina, de um lado, quais
são os comportamentos e as necessidades do adolescente, e, de outro lado,
o que a alternância permite.
44
O que significa a adolescência nas fases da vida humana?
A adolescência corresponde com uma idade maravilhosa mas difícil da
vida. Embora isto seja verdade para todas as idades da vida, aplica-se parti-
cularmente à adolescência porque é vital para o futuro, porque a vida está
na frente, porque representa a idade de uma passagem de um estado a outro,
da criança ao adulto. Uma idade “entre-dois”, que se desprende da anterior,
toma distância desta, mas, ao mesmo tempo, depende desta e, principal-
mente, se projeta na outra. O adolescente não olha para trás, mas sim, fun-
damentalmente, para frente. A imagem da borboleta é esclarecedora: esta,
42. Este texto retoma, no essencial, o artigo de J.-C. Gimonet: Alternância, adolescên-
cia e pré-adolescência. In: Revista da Formação por Alternância – CEFFAs. Brasília/Une-
fab, 2005.
43. DUFFAURE, A. Éducation, milieu et alternance. Paris: Ed. Universitaires/UNMFREO,
1985 [Textos escolhidos e apresentados por D. Chartier].
44. Este rápido olhar psicológico sobre a adolescência é o de um europeu. Precisa
ser reavaliado, talvez, levando-se em consideração o contexto da sociedade e da vida
brasileira.
90
antes de ser borboleta, é crisálida e, antes ainda, lagarta. A borboleta será
tão bela, vigorosa e resplandecente de cores e de formas quanto a crisálida
e a lagarta o são, contanto que suas fases de vida respectivas não sejam por
demais perturbadas.
A adolescência, invenção dos tempos modernos, representa realmente
este período de passagem que cria quantidade de transtornos, de mudan-
ças que precisam ser entendidas pelos pais, adultos e educadores para po-
der acompanhá-las. E isto nem sempre é simples e fácil.
Os transtornos que acontecem nesta fase da vida são antes de tudo de
ordem física e psicológica. Devem-se ao sistema hormonal que entra em
ação, que provoca o crescimento, a ativação das funções sexuais com toda
efervescência decorrente disto. Na adolescência ganha-se em altura, em
peso, em forma, em beleza, mesmo se às vezes alguma crise de acne juvenil
pode trazer uma certa contrariedade!
A adolescência é a flor da juventude, é como um desabrochar floral.
Mas tudo ocorre um pouco às cegas, com incerteza, busca, questionamen-
to, insegurança, instabilidade. Adquire-se mais força, mas ainda não se
tem toda força esperada. O coração muda de ritmo, o sistema nervoso
nem sempre é adaptado, o que provoca uma falta de jeito, na maioria dos
casos bem involuntária. No plano intelectual também, o adolescente ga-
nha em força e se sente mais à vontade, querendo aproveitar disto. É a
idade da discussão, da contradição. Percebe o seu crescimento, se sente
como gente. Afirma-se, conquista o “eu” como também sua identidade,
aumenta sua autonomia.
Quer se desprender das tutorias, tomar distância, ser ele mesmo, viver
por sua conta. Esta evolução, assaz normal, provoca conflitos porque o
meio (familiar, entre outros) resiste. É a idade das crises, como se diz geral-
mente, e muitos adjetivos, cada qual mais negativo do que o outro, são uti-
lizados para qualificar os comportamentos.
A adolescência, com efeito, não é algo fácil de se viver. Antes de tudo
para os próprios jovens, porque se encontram na mais total ambivalência:
querem mais liberdade por parte dos pais, no tempo em que precisam de-
les no plano material, mas principalmente afetivo. Existem, ainda bem, la-
ços afetivos, de amor, sempre presentes, mesmo se eles, às vezes, querem
demonstrar o contrário. Também para os pais este período não é simples
porque não é fácil ver seus filhos crescerem, de vê-los escaparem, voar com
as próprias asas. Não é fácil porque não se tem certeza do que se pode ad-
mitir, deixar fazer e, menos ainda, sobre o que não se deve transigir. Te-
me-se em não indicar as referências desejáveis. Surge o medo de perder
91
sua autoridade, enquanto mais se deixa os filhos serem, existirem, afirma-
45
rem-se, crescerem, mais esta autoridade se amplia .
A adolescência ainda é a idade da curiosidade, da busca, da exploração
de tudo, do questionamento, do espírito de aventura, da procura de proje-
tos no plano da amizade, do amor, dos encontros humanos, sociais, pro-
fissionais, dos problemas da sociedade, do mundo. É a idade de maravi-
lhar-se, dos sonhos, do entusiasmo e do engajamento pelas grandes causas
com todos os riscos inerentes de manipulações.
A adolescência é um momento extraordinário porque tudo fervilha de
energia, de imaginação, de expressão, de criação própria do jovem, en-
quanto muitas vezes pinta-se um retrato negativo desta fase da vida, dan-
do-lhe feições sombrias, qualificando-a de período de crise. E, deveras, é
realmente isto, porque é difícil de ser vivida e que tudo não transcorre bem
para todos por causa de um passado perturbado, de um presente que não
permite equilíbrios afetivos e sociais desejáveis. Por causa, às vezes, de um
presente semeado de derrotas ou de um futuro que parece fechado, de
uma falta de esperança, de visões animadoras e portadoras de sentido. Os
fatores não faltam para que esta passagem da criança para o adulto se faça
através de carências, trazendo a submissão, o fechamento sobre si, a aliena-
ção, ou através de excessos levando à revolta, à violência ou à fuga e às con-
dutas erradas e perigosas. Nossa época é cheia disto e a situação dos ado-
lescentes é perigosa, arriscada.
A adolescência é uma evolução normal e essencial do ser humano.
Impedindo esta evolução, aí sim defronta-se com uma crise e encontra-se
uma revolução. A responsabilidade dos pais, dos adultos e de todos os edu-
cadores é inteira para acompanhar esta passagem, ao mesmo tempo em
que é envolvida a responsabilidade das instituições educativas. Qual é a do
movimento dos CEFFAs no meio de todas as outras estruturas educativas?
45. Não confundir com autoritarismo, que é uma falsa manifestação da autoridade. A
autoridade, etimologicamente, significa, de fato, “ser autor de si” e “tornar o outro au-
tor de si próprio”.
92
Ocupar um lugar – conquistar um estatuto
A alternância permite ao adolescente adentrar no espaço dos grandes,
ou seja, no mundo dos adultos. Ela lhe dá possibilidades de encontrar uma
utilidade, uma posição social, uma consideração, um reconhecimento. Em
outras palavras, ela o ajuda a construir sentido para seu presente e vislum-
brar o mesmo para o seu futuro, ou seja, ter esperança. Desta forma, a al-
ternância responde a estas necessidades de ser, de crescer, de existir, de se
projetar na frente na vida dos adultos.
Coloca-se então, com acuidade, o olhar que se lança no jovem, o lugar
que lhe é atribuído na família, no estágio profissional, no CEFFA. Já não é
mais uma criança na escola. Não é mais um aluno mas um ator socioprofis-
sional, na sua medida, mesmo se só tem 13 ou 14 anos. É alguém a conside-
rar porque cresceu, porque ocupa um lugar na sociedade, porque desem-
penha papéis úteis e reconhecidos.
Agir
O adolescente precisa, fundamentalmente, de ação porque ele está
cheio de energia e de vontade de empreender. Nisto a alternância corres-
ponde porque ela coloca em ação. É uma pedagogia da ação. Ela confere,
deste fato, um estatuto profissional que por sua vez estabelece com o traba-
lho e com a profissão uma relação, incluindo aí as exigências, os valores e
as aprendizagens correspondentes. Visto de maneira mais global, o proces-
so pedagógico baseado na alternância torna o jovem ator e não mero es-
pectador de sua formação, sujeito ativo e não um simples objeto de ensino.
Esta necessidade de ação acompanha aquela da exploração, da desco-
berta, do encontro, de viver aventuras. A alternância, no tempo em que per-
mite viver situações e experiências variadas, contempla estas necessidades.
Mesmo assim, é preciso que o meio (familiar, profissional...) e o CEFFA con-
tribuam nisto. O ritmo da alternância favorece esta necessidade de ações di-
versificadas, criando uma sucessão de seqüências de vida diferentes e de pe-
quenas aventuras sucessivas que impedem qualquer monotonia, repetição
tão odiada pelo adolescente. A sucessão das seqüências cria a dinâmica do
dia seguinte, que sem parar projeta, no futuro, ao encontro de novas aventu-
ras a serem vividas. A alternância é uma sucessão permanente de rupturas e
de relações que obrigam, a cada vez, o adolescente a reinvestir-se numa nova
situação. Deste jeito talvez consiga ela contribuir para o desenvolvimento
da adaptabilidade.
93
Ser bem-sucedido, ter êxito
Ser bem-sucedido, ou seja, ter êxito, é uma palavra-chave na educação
e em todo desenvolvimento pessoal, porque:
• Significa ser reconhecido e reconhecer-se como sendo capaz de reali-
zar algo, de empreender. É receber consideração, ser valorizado e benefici-
ar da estima dos outros. É sentir-se amado. Conseqüentemente significa
aumentar a auto-estima, a autoconfiança, fazendo crescer assim a motiva-
ção, o engajamento, multiplicando as oportunidades de ter mais êxito, de
sair-se melhor... Um processo positivo permeado de sucessos implanta-se.
Do contrário, corre-se o risco de se transformar em processo derrotista.
• Significa furar bloqueios, superar obstáculos que impedem as evo-
luções e em seguida a reconciliação consigo mesmo, com a escola, com os
formadores, os adultos. Este processo de reconciliação é uma condição
essencial para uma reinserção escolar anterior ou a acompanhar a inser-
ção profissional.
A alternância pode agir neste sentido porque oferece e diversifica os
lugares e os espaços para se testar, empreender, experimentar, manifes-
tar-se, realizar-se, dar-se bem em alguma coisa. Ela torna experiências pos-
síveis tanto no plano familiar quanto profissional ou social.
Ela permite ao adolescente exercitar-se em diferentes níveis: manual,
intelectual, afetivo, relacional... implementando e desenvolvendo então pó-
los de competências diversas, sem ser demasiadamente exclusivos.
O sucesso escolar faz parte de tudo isto. Um sucesso que numerosos jo-
vens talvez nunca experimentaram e que toma assim uma importância
maior. A organização pedagógica se torna responsável, neste caso, para
que os conteúdos e as atividades sejam interessantes, tenham sentido, per-
mitam aprender e dêem um sentimento de utilidade. Os processos de ava-
liação também adquirem uma importância maior para que o jovem possa
viver uma pedagogia do sucesso e da valorização.
94
Em primeiro lugar, em relação aos pais, deve-se vivenciar um duplo
processo de ligação-relação e de distinção-distanciamento. As relações são
ambivalentes, mas o essencial é o diálogo. A alternância pode contribuir
nisto diversificando os campos de experiência do jovem, permitindo-lhe
viver situações de trabalho. Estas constituem mediadores de discussão, su-
portes concretos para a conversa no seio da família a respeito das ativida-
des, das dificuldades, dos sucessos, do relacionamento com os colegas, do
empreendimento, etc. A mesma coisa acontece em relação às atividades do
CEFFA. Tendo vida própria, o jovem logo terá algo a dizer, a trazer para o
seu entorno e para os outros. Mas ao mesmo tempo em que relações com a
família se desenvolvem, impõe-se o distanciamento. Esta é favorecida pe-
los tempos sucessivos de vida profissional e dos tempos escolares. Entra
aqui o papel do internato que garante um distanciamento suave e uma
aprendizagem da vida coletiva.
Além da família, a alternância oferece ao adolescente possibilidade de
encontros, de diálogo com outros adultos e conseqüentemente de confron-
to das gerações entre a experiência existente e aquela a ser feita. O repasse
entre as gerações, a transmissão da memória e da cultura, a ligação entre o
passado, o presente e o futuro, ou seja, a situação no tempo como no espa-
ço representam dimensões essenciais da construção da pessoa.
Esta é favorecida pela multiplicidade de encontros. O encontro com
os outros, como modelo de identificação, é uma condição importante da
construção da identidade, da educação e da orientação. Chegar a ser gente
supõe confrontar-se com os outros e com as coisas para posicionar-se em
relação às realidades e à vida. A alternância oferece estas oportunidades de
confronto com a realidade, com suas sujeições, exigências e os esforços que
ela impõe. Ela permite a confrontação do sonho com a realidade. Estas
condições são importantes para que se elaborem os projetos e a orientação
para que cada um encontre sua bússola interna para orientar-se e não sim-
plesmente ser orientado. Por isto importa também implementar uma peda-
gogia do encontro.
Transformar-se numa pessoa exige um processo dialético de perso-
nalização e socialização (si próprio e os outros). A alternância contribui
nisto. Na estadia no meio, fora do CEFFA, o jovem aprende e se forma
por conta própria, constrói saber e conseqüentemente adquire um poder.
É o processo de personalização. Mas, ao mesmo tempo, opera-se uma so-
cialização através do trabalho com os adultos do meio profissional, pelas
atividades com outros jovens no meio social. No CEFFA, a socialização
surge graças a atividades pedagógicas cooperativas, graças ao grupo, à
vida e atividades socioeducativas. Além do grupo de formação na sala de
95
aula, o grupo de vida constitui um dado superior para a aprendizagem da
vida social e da cidadania.
A pedagogia colocada em prática, suas atividades, seus instrumentos,
bem como as atitudes dos monitores, entram em consideração para acom-
panhar este desenvolvimento. O modelo pedagógico aplicado contribui de
fato mais ou menos ao assumir da pessoa, segundo o lugar e o poder que
este lhe confere e lhe faculta tomar.
Sim, não é abusivo afirmar que a alternância é uma pedagogia da ado-
lescência, porque é uma pedagogia da complexidade. A alternância permite,
de fato, ao adolescente caminhar no coração da complexidade.
96
às realidades e limita os riscos de isolar-se em si mesma, em seus progra-
mas e com seus formadores.
Mas a associação assume, também, uma função de regulação da alternân-
cia. De fato, a alternância congrega e coloca em contato forças institucio-
nais diversas: as instituições familiares e socioprofissionais de um lado, e a
instituição educativa, o CEFFA, do outro. Estes vários conjuntos, com preo-
cupações, às vezes contraditórias, podem enfrentar-se: o educativo e o êxi-
to de seu filho para a família, o econômico e a produção-realização para o
empreendimento, a transmissão dos saberes acadêmicos e a formação/qua-
lificação de um grupo-classe para o CEFFA. Entre estes conjuntos, encon-
tra-se o alternante que caminha e vive sucessivamente em um e outro.
Cada um destes conjuntos precisa poder existir como tal, com suas ca-
racterísticas, sua identidade e objetivos próprios. Mas, ao mesmo tempo,
deve existir em relação aos outros conjuntos. Por isto, segundo o peso de
um ou de outro, o sistema de formação terá, em termos de objetivos e de
procedimentos, uma coloração particular. A alternância projeta, assim, até
mesmo amplia a relação de poderes: poder das famílias, poder do organis-
mo ou instituição de formação, poder dos meios profissionais, poder dos
formadores, poder da administração, poderes políticos ou de outras insti-
tuições... Segundo o modo de organização ou o tipo de estrutura responsá-
vel, um destes poderes pode se tornar dominante e, em seguida, um dos
parceiros pode fazer levar em conta suas preocupações ou impor suas exi-
gências. Contrapoderes, instâncias de controle e de regulação, nesse caso,
se fazem necessários para equilibrar o sistema. Os desafios da alternância
têm este preço.
Para os CEFFAs, a associação desempenha essa função. Ela agrupa as
diferentes instituições em presença e constitui assim a instância respon-
sável, de expressão, de concertação e de regulação. Ela é o instrumento
maior da ambição educativa dos CEFFAs. Enquanto entidade jurídica, ela
confere às famílias e outras pessoas interessadas e/ou envolvidas pelo pro-
jeto associativo o poder de criar e gerir um CEFFA, cuja responsabilidade
assumem no plano legal, financeiro e moral. Mas ela lhes dá também o po-
der de debater e de elaborar os projetos e orientações pedagógicos, educa-
tivos e promocionais do CEFFA em cooperação com o diretor e a equipe
educativa.
A associação é, desta maneira, para cada CEFFA, um componente di-
nâmico para ser vivido e tornar vivo. A estratégia associativa está em ques-
tão aqui. Ela se mede pelo programa de atividades e de realizações: reu-
niões, animações, comissões, manifestações... A ação do Conselho de Ad-
ministração, bem como a do diretor, é, neste sentido, essencial. Na medida
97
em que uns e outros adquiriram a dimensão do movimento e de seus valo-
res, na medida em que têm consciência das razões profundas e do alcance
dos engajamentos associativos, agem e animam a associação, numa visão
de promoção de seus membros. Mas seu acompanhamento, sua formação,
neste sentido, se reveste de grande importância.
A implicação dos pais e mestres de estágio na formação dos jovens e a
qualidade do relacionamento mantido pela equipe educativa são fatores
de participação e engajamento na vida associativa. A vitalidade de cada as-
sociação se percebe na dinâmica de participação de todos os parceiros en-
volvidos na formação e nas atividades do CEFFA.
Conclusão
98
CONCLUSÃO DA PRIMEIRA PARTE
99
SEGUNDA PARTE
Compreender a Pedagogia da Alternância
Introdução
101
diferente na área da formação, o que exige uma formação específica, mas,
também, um reconhecimento.
Numerosas referências bibliográficas são dadas ao longo das páginas,
que permitem entrar, cada vez mais, na complexidade deste método de
formação, que está longe de ter desvendado todos os seus segredos.
102
5
A ALTERNÂNCIA NO HORIZONTE EDUCATIVO
103
Os componentes de uma situação de formação
1. As pessoas em formação
Da criança na escola maternal ao adulto em formação permanente, to-
das as faixas da vida se fazem presentes nos sistemas de formação. Qual-
quer que seja a idade, é sempre um ser humano que está no centro do de-
bate, cada um com suas características próprias:
• uma identidade em esboço, em construção ou já firmada e, às vezes,
atribulada e em desequilíbrio;
• capacidades, potencialidades natas e adquiridas e sempre em via de
outras aquisições, de atualização ou de aperfeiçoamento, com especi-
ficidades e dominantes, naturezas e graus de aprendizado variáveis,
pontos fortes, talentos, lacunas...
• desejos, motivações diversas e mais ou menos fortes;
• um contexto de vida familial, social, cultural, profissional, ambiental...
• um ser em situação de aprendizagem motora, afetiva, social, cognitiva...
• com experiências próprias, passadas e presentes, nestes diversos planos;
• com um imaginário, projetos balbuciantes ou já entrevistos, até mes-
mo definidos, pelo menos provisoriamente.
• ou seja, em definitivo, uma criança, um adolescente ou um adulto
singular e situado numa trajetória de vida com um passado, uma histó-
ria e experiências de influências benéficas ou limitantes, um presente
com seus efeitos, um futuro mais ou menos portador de esperança.
Trata-se aí de componentes psicológicas de qualquer situação de forma-
ção. Coloca-se em seguida, fundamentalmente, a questão do olhar, da consi-
deração dados e percebidos por cada um: um anônimo, um indivíduo de um co-
letivo ou uma pessoa singular... Um objeto, um sujeito, um ator? Como
cada um se ressente? Como um aluno que precisa ser “criado” com todas as
relações de dependência “mestre-aluno” decorrentes ou como “alguém”
que tem nome, sobrenome, uma originalidade. A posição psicossocial que
está sendo atribuída e ressentida forma um componente importante de qual-
quer processo educativo. Trata-se aí de uma questão fundamental que per-
mite, desde já, perceber diferenças nas concepções pedagógicas.
104
2. A família e o ambiente de vida
A criança, o adolescente ou o adulto, dentro de uma estrutura de for-
mação, não está só. Vive num contexto familial, social, ambiental, cultural,
profissional... Todos os elementos deste contexto são espaços essenciais para
a construção de sua identidade, de suas aprendizagens, de seu desenvolvi-
mento. Cada um sabe que as aprendizagens mais essenciais são aquelas da
infância, desde o nascimento e mesmo antes, através de todas as impregna-
ções do meio e da cultura ambiente. Cada “educando” pertence a uma cul-
tura com sua linguagem, suas tradições, seus costumes, seus modos de pen-
sar e de ser... A escola, a atividade pedagógica, não escapa desta pertença.
Quando não é considerada surge um corte entre a vida e a escola, e cria-se
uma distância entre elas do ponto de vista cultural, com todas as conse-
qüências conhecidas como o fracasso escolar e a confusão que traz.
O grau de consideração do ambiente pelo meio escolar constitui uma se-
gunda diferenciação maior entre as correntes pedagógicas.
3. O grupo-classe
Cada um, no seio da estrutura de formação, não é, também neste caso,
um indivíduo isolado. Encontra-se num grupo com todos os jogos afetivos,
interativos, conflituais... que existem com os colegas e as colegas, aqueles
ou aquelas privilegiados pelos sentimentos amigáveis ou amorosos, aque-
les e aquelas que são escolhidos ou, mais ou menos, rejeitados... O grupo
constitui este complexo psicossocial no qual se constroem os “Eu”, os “me” e
os “se” através da dialética do “Eu” e “Nós”, do “se e dos outros”, ou seja,
pelos processos da personalização e da socialização. O grupo representa, desta
maneira, um espaço maior de construção da personalidade, do aprendiza-
do social, mas, também, cognitivo, se os saberes de uns e de outros estão
sendo partilhados e confrontados nos atos pedagógicos.
105
Cada orientação implica numa problemática específica que pode ser exa-
minada em relação:
• Às finalidades propostas, ou seja, às dimensões da pessoa que a institui-
ção procura desenvolver: cognitiva, psicomotora, afetiva, social...
• Aos campos de saber ou de cultura privilegiados.
• A seu modo de funcionamento e à sua organização administrativa, ou
seja, em outras palavras, à sua margem de manobra, a seu grau de au-
tonomia. Este representa uma condição maior para a implementação
pedagógica, para a implicação e a responsabilização dos atores. Ou
seja, nestes termos, um outro elemento de diferenciação das organiza-
ções pedagógicas.
5. Os conteúdos e os programas
O saber em jogo na situação de formação está, evidentemente, ligado
às finalidades e ao nível requerido. Existe um saber comum, programas co-
muns ao sistema educativo geral no qual cada instituição está inserida e
que proporciona um quadro geral. Todavia, juntando-se à questão da au-
tonomia, cada instituição negocia ou não o programa, tendo em vista suas
orientações:
• No desenvolvimento dado a cada conteúdo: reduzir alguns para am-
pliar outros.
• Na sua forma de distribuição, ou seja, sua organização em termos de
Plano de Formação. Importa, a este respeito, diferenciar o programa do
1
Plano de Formação . O primeiro constitui um catálogo de noções geral-
mente apresentado e distribuído sob a forma de disciplinas justapostas,
umas ao lado das outras, sem hierarquização. O segundo é a orquestra-
ção do processo de formação, ou seja, dos conteúdos e dos métodos se-
gundo uma lógica pedagógica determinada que visa pôr em relação e
associar os campos de saberes, os conteúdos tratados. Outra diferença
entre as instituições de formação.
6. Os métodos
São ligados às finalidades perseguidas pela instituição e às prioridades
que esta dá nas dimensões a serem desenvolvidas na pessoa. Por isto:
• Se a prioridade é dada aos saberes e às aprendizagens cognitivas, são,
geralmente, os métodos transmissíveis do ensino que são privilegiados. Um
1. Cf. cap. 3.
106
professor detém o saber e o transmite aos alunos. Este procedimento dire-
tivo transforma o aluno em “objeto” de ensino. Encontra-se na tradicional
triangulação “Professor – Saber – Aluno”. Às vezes, o professor é substituí-
do por uma tecnologia, mas o processo de transmissão permanece pratica-
mente o mesmo.
• Se a prioridade é dada à pessoa e se uma visão de desenvolvimento
global, de formação integral, e não somente intelectual, está sendo traba-
lhada, a concepção pedagógica tende a situar o “educando” como sujei-
to-ator de sua formação, que aprende, pesquisando e construindo. Preva-
lecem, então, os métodos ativos e de apropriação que privilegiam o processo de
produção de saberes através da pessoa, mais do que um simples consumo de
informações pela mesma.
8. Os “formadores”
Seu estatuto e seus papéis são, evidentemente, diferentes segundo as ori-
entações pedagógicas e sua denominação é fruto disto: mestre, docente,
professor aqui; educador, monitor, tutor, animador da formação... ali.
Além da denominação, embora esta já seja portadora de sentido, são os
papéis desempenhados e predominantes que importam: papéis de ensino,
de educação, de acompanhamento, de ajuda... variáveis em função das fi-
nalidades da instituição e da concepção que cada “formador” ou “educador”
se faz de sua função.
Para concluir, todos estes componentes de uma situação de formação se
encontram interdependentes e interagindo. Por isto, pode ser representa-
do da seguinte forma:
107
Representação esquemática de uma situação de formação
O grupo classe
A família
O ambiente
Os “formadores”
Estatuto e papéis
A instituição A pessoa em
O projeto formação
educativo
A organização da
classe
Os conteúdos Os planejamentos
Os programas Os métodos
As técnicas
NB. Para não tornar esta representação gráfica pesada demais, algu-
mas setas não foram colocadas. Todavia, cada pólo depende e interage
com todos os outros.
Decorre deste conjunto uma complexidade a ser gerida no seio de um
sistema que tem uma coerência em função de uma orientação educativa.
As correntes pedagógicas
108
atingir a cultura e os degraus de conhecimento sancionados pelas provas
de cada ciclo. O modelo mais elaborado, nesta matéria, é aquele estabeleci-
2
do pelos jesuítas, no século XVI, na Europa Ocidental . O desenvolvimento
da instrução obrigatória na França, no fim do século XIX, inscreveu-se nes-
ta corrente. Representa, em todos os países do mundo, o modelo habitual
dos sistemas educativos estatais e, geralmente, é defendido pelos seus cor-
pos constitutivos. Corresponde a uma organização escolar de tipo racional, bu-
3
rocrático e diretivo . Assim:
• o programa é um conjunto de disciplinas justapostas e a ensinar segun-
do a lógica própria de cada uma ao longo do ciclo de formação. O pro-
grama e a programação, então, se confundem;
• Os ensinamentos disciplinares são justapostos uns aos outros, levando a
um parcelamento dos saberes;
• O docente e o programa se confundem do mesmo modo, porque, nes-
ta lógica, o melhor docente é aquele que conhece melhor o programa,
ou seja, os conteúdos de sua disciplina. Na França, a qualificação mais
elevada neste sentido é a agregação que atesta maior qualificação num
campo de saberes. O docente, com o estatuto de professor, é, essencial-
mente, disciplinar. O trabalho em equipe pedagógica, deste modo,
não é exigido e só pouco praticado.
• Os métodos transmissivos, até mesmo ex-cathedra, mais utilizados, exi-
gem do estudante qualidades receptivas de atenção, de escuta e de abs-
tração e, além do mais, se as noções são ensinadas para elas mesmas e
sem ligação com os conhecimentos da vida. O “Mestre” ensina e o “alu-
no” segue e se adapta a ele e ao programa.
• No ensino secundário, os locais são distribuídos em classes atribuídas
aos professores. Deste modo, são os alunos que se deslocam de uma sala
para outra em função das aulas. A classe está sendo organizada em filei-
ras de mesas face ao quadro e ao docente. É bom notar que, algumas dé-
cadas atrás, um estrado reforçava a posição e o poder deste último.
• O planejamento semanal organizado, principalmente com horários
4
de aulas por disciplina, ou planejamento de ensino , permanece, geral-
2. Cf. La pédagogie des jesuites (1548-1762). In: CHATEAU, J. (org.). Les grands péda-
gogues. Paris: PUF, 1966.
3. Um autor francês, J. Houssaye, afirma neste sentido: “Para fazer bem o seu trabalho,
o docente de hoje pode contentar-se em aplicar, da maneira mais inteligente possível,
as diretrizes, cada vez mais precisas e inscrevendo-se numa organização mais e mais pu-
xada e pré-programada.”
4. Cf. cap. 3.
109
mente, o mesmo durante o ano inteiro. O emprego do tempo dos alu-
nos, sem variações, é do tipo repetitivo.
• As relações com as famílias são fracas e consistem, essencialmente, em
acertos sobre o percurso da criança e os resultados escolares, mesmo
se, às vezes, certos estabelecimentos garantem algumas reuniões infor-
mativas no início ou durante o ciclo.
• Enfim, observa-se, nesta concepção, o grupo. Como componente
educativo e de aprendizagens não é, ou muito pouco, levado em conta.
A melhor classe é aquela que apresenta um caráter de homogeneidade de
níveis e de cultura.
Esta orientação pedagógica tem seus valores, mas, também, seus gran-
des limites. Por isto, pode-se dizer que ela costuma propulsar ou expulsar.
Ela propulsa 30 a 35% da população escolar, ou seja, aquela que tem possi-
bilidade de abstração imediata e que não se encontra por demais fora do
seu meio cultural. De outro lado, ela deixa na beira da estrada um grande
número de crianças e de adolescentes, com todas as conseqüências nefastas
do fracasso escolar. Por isto, ela se torna uma pedagogia elitista.
110
cial, cultural, profissional... advindo, desta maneira, a abertura da esco-
6
la sobre a vida .
• Os métodos são, essencialmente, ativos e de apropriação, para ajudar e
conduzir a criança ou adolescente na busca e na construção do seu saber e
de suas aprendizagens. Alternam as aulas e as pesquisas documentais, a
elaboração de dossiês e as exposições, o trabalho pessoal e em grupos,
as atividades intelectuais e físicas, a concentração e a diversão... A sala
de aula parece mais uma oficina, um espaço de ação, de expressão e de
cooperação do que um ambiente fechado onde prevalecem, essencial-
mente, a escuta, o silêncio e o trabalho individual.
• Nesta lógica, o docente e o programa se adaptam ao aluno. Por isto, o
melhor “mestre” não é aquele que possui mais saber, mas aquele que é
pedagogo, bem como conselheiro, facilitador, acompanhante/tutor e
docente, quando necessário.
7
Esta corrente pedagógica é a da escola nova, da qual R. Cousinet foi um
dos iniciadores e porta-voz. Apareceu na França e na Europa no início do
século XX.
6. Decroly tinha colocado sua escola sob o slogan “A escola para a vida e pela vida”.
7. Este pedagogo colaborou, de maneira estreita, com as MFR (CFR) na fase da constru-
ção de sua pedagogia (cf. o cap. 1).
8. A etimologia da palavra “complexo” nos ensina que: a raiz latina plexus significa en-
trelaçamento. Ela engendra complexus que significa emaranhado, conexão, abraço,
aperto.
111
é mais que a soma das partes. E, ainda, que se misturem a ordem, a desor-
9
dem e a organização como em qualquer sistema vivo” .
Este é, de fato, o sentido desta corrente pedagógica que envolve e su-
pera as duas anteriores. Ela se aproxima da segunda, mas é mais ampla. De
fato, a corrente da pedagogia ativa tende colocar a criança em situações
mais favoráveis para aprender e, conseqüentemente, fabricar realidade
simplificada, adaptada à criança, entre as paredes de uma escola. A reali-
dade da vida é outra e mais ampla que a da escola. Ela exige o enfrenta-
mento das obrigações, das dificuldades, do que agrada como desagrada...
Ela pede do educando não somente uma simples observação do ambiente,
mas uma implicação de sua parte para agir onde se encontra. A realidade da
vida é e constitui toda a complexidade presente em qualquer situação de
formação, como foi dito no início deste capítulo. A saber, aquilo que cons-
trói a vida de todo ser humano, aquilo a partir do que ele vai se construin-
do, se desenvolvendo, crescendo... Ou seja, para retomar o modelo de J.J.
10
Rousseau e atualizado, hoje, por G. Pineau: si mesmo, os outros e as coisas . O
desenvolvimento da formação permanente e ao longo da vida que faz com
que não se coloque um adulto na escola, segundo o entendimento tradicio-
nal, o impulso das novas tecnologias da informação e da comunicação que
difundem, amplamente, as informações e os saberes, os progressos das
ciências da educação e outras mudanças significativas, impuseram uma ou-
tra pedagogia, necessariamente, de caráter complexo, tornando as pessoas impli-
cadas e responsáveis. A emergência da alternância amplia o desenvolvimento
desta terceira corrente pedagógica.
112
oficina, em alternância com uma formação “teórica” dada por companhei-
ros-docentes em casas de acolhimento e de vida. A alternância se vive também
através da “Volta da França” que faz o companheiro peregrinar de uma ci-
dade para outra a fim de multiplicar a descoberta de práticas e de habilidades
manuais diferentes que contribuem para acumular uma grande experiência e
conhecimento da profissão. As grandes catedrais francesas são obras dos com-
panheiros da Volta da França. Esta experiência continua até hoje.
De outro lado, nos séculos XVI e XVII, numerosas iniciativas surgem
para a instrução das crianças do povo, abandonadas e míseras, para as quais
as formas tradicionais de instrução não traziam respostas. Deste feito, mui-
tas idéias foram lançadas, formas de escola criadas para abri-la sobre a vida e a
realidade, para aproximar a formação do trabalho produtivo, ou baseá-la sobre
a observação e a implicação no ambiente natural e social.
Neste sentido, nos séculos XVII e XVIII, os irmãos das escolas cristãs ou
lassalistas levam em frente uma ação louvável para a instrução gratuita das
crianças pobres. Criam, entre outras, “a escola dominical” para jovens que,
trabalhando a semana toda, só tinham o domingo para aprender. Aí rece-
bem uma sólida instrução que pode auxiliá-los na profissão que exercem. A
teoria está, desta maneira, associada à prática. Em seguida, este ensino
prático vai se tornar uma verdadeira formação técnica no seio de estabele-
cimentos que acolhem, em pensionatos, crianças que se afastam ou são ex-
12
cluídas do ensino tradicional .
Do outro lado, é interessante observar que uma das grandes escolas
francesas, sempre atual, a escola “das pontes e estradas”, foi fundada, nos
meados do século XVIII, baseada na alternância. Os alunos engenheiros vão
aprender fora da escola, junto a mestres em arquitetura e realizando missões
e trabalhos práticos na realidade. Cada um comunica, em seguida, aos ou-
tros membros de sua promoção, os conhecimentos adquiridos. Existe, assim,
13
ao mesmo tempo, autoformação e mútuo ensinamento .
Em seguida, com a industrialização, vão nascer “as escolas industriais”
para atender, ao mesmo tempo, as demandas por instrução e por um novo
desenvolvimento. Querem ser uma resposta às necessidades vitais das cama-
das populares, através do trabalho produtivo, único capaz de tirá-los da misé-
ria. Então, a fim de preparar as crianças para o trabalho produtivo, escolas as-
sociam o ensino elementar e o trabalho manual em fábricas. Trata-se, deste
jeito, de juntar o estudo e a vida em uma só formação.
113
14
Neste mesmo tempo, numerosas outras experiências , mais ou menos
duradouras, nascem para uma verdadeira educação das crianças, mais do
que para uma mera instrução. Tem em comum associar, segundo formas va-
riáveis, a vida da criança, suas atividades de trabalho a partir de certa idade e
o ensino da escola. Algumas destas escolas, de outro lado, inscrevem-se
15
numa problemática de desenvolvimento do meio onde são implantadas .
Com a chegada da época industrial, vai aparecendo, no século XIX, “a
escola socialista do trabalho” e “a escola liberal”. A primeira busca suas
idéias em K. Marx, cuja teoria da educação é de unir a educação ao traba-
lho que, segundo ele, apresenta um imenso potencial formativo e educati-
vo e permite ao homem realizar-se, criar “um homem novo”. Não se trata
de criar, de completar uma instrução intelectual geral com atividades ma-
nuais, práticas ou com uma simples formação técnica, mas, a partir do tra-
balho, realizar “uma educação politécnica” na visão de uma produtividade
“útil” desde a infância. A implementação das teorias de K. Marx sobre a
educação foi operada por seus discípulos e, entre outros, por A.S. Maka-
renko, que cria “as colônias de trabalho”, desviadas de seus objetivos e de
suas práticas por pressões ideológicas.
Paralelamente, desenvolve-se na Europa a escola liberal que se institu-
cionaliza na França sob a III República no final do século XIX. Premissas de
alternância apontam no final deste século e na primeira metade do século
XX no que diz respeito às aprendizagens de profissões. De fato, duas grandes
orientações se apresentam, e até se opõem: uma dando prioridade à apren-
dizagem pelo trabalho prático e outra, dando uma preferência à formação
teórica. Com a industrialização e suas exigências técnicas cada vez mais for-
tes no final do século XIX, uma necessidade maior de instrução geral (ler,
escrever, contar) se impõe. Por isto, progressivamente, a escola toma cada
vez mais importância em relação à aprendizagem no terreno da prática.
Trata-se de ensinar os saberes teóricos que preparam para a profissão. O en-
sino prático só se torna uma aplicação do ensino teórico e a escola se opõe ao
tempo da aprendizagem prática. Assim, a ordem “teoria-prática” torna-se
um dos dogmas do ensino ocidental. Várias formas de escola aparecem, en-
tão, sucessivamente: escolas de aprendizes nas oficinas, escolas manuais de
aprendizagem que cedem um espaço tão importante aos conhecimentos ele-
mentares e técnicos quanto ao trabalho manual, depois, as escolas profissio-
nais, nas quais o ensino técnico ocupa o lugar principal. Mas estas últimas
114
vão se afastar, cada vez mais, do meio profissional e dar um ensino em si. Ao
lado destas escolas vai se desenvolver a aprendizagem das profissões que
concede a primazia ao saber-fazer prático no seio das empresas, com um
complemento de algumas horas de formação teórica durante a semana.
Na Europa, a Alemanha desenvolveu um forte sistema de aprendiza-
gem sempre de atualidade: o sistema dual. Associa, de maneira estreita, as
empresas e a escola para uma formação geral junto a uma formação práti-
ca. Diz respeito tanto aos primeiros níveis do ensino profissional quanto
aos níveis superiores para a formação de engenheiros. Disto resulta uma
integração profissional maior dos jovens que saem do sistema escolar.
E depois apareceram, na França, as Maisons Familiales Rurales (Casas
16
Familiares Rurais) , que representaram a fórmula mais significativa de for-
mação por alternância. Foram ignoradas durante muito tempo, até mesmo
desprezadas, até que um jornalista de um grande quotidiano francês desta-
cou a sua experiência, em abril 1968, com o título: “A Assembléia Geral das
Maisons Familiales Rurales de aprendizagem rural – Defesa em favor do en-
17
sino em alternância” . Desta maneira, a alternância saiu um pouco da sombra,
embora sem ter ganho ainda suas letras de nobreza.
Uma conversa de universitários, no mês anterior, sobre o tema “uma
outra escola”, ao denunciar as enormes carências do sistema escolar e ao
afirmar a necessidade de profundas transformações, tinha começado a
abalar o sistema. Falava-se, de fato, de um ghetto escolar e universitário, de-
sacreditado na maioria dos países industrializados (França, Estados Uni-
18
dos, Suécia...) . Na França se sucederam conversas sobre a problemática da
ligação entre a vida ativa e a formação ou entre o aparelho de produção e o aparelho
de formação. Um destes, em 1973, sobre “O ensino superior em alternância”
contribuiu para fazer avançar o conceito. Uma dupla crise – a dos sistemas
escolares e a da sociedade – acentua seu desenvolvimento. Diante de um
fracasso escolar importante, frente ao desemprego e ao grande número de
jovens chegando no mercado de trabalho depois de uma escolaridade sem
nenhuma qualificação profissional, soluções estão sendo, então, procura-
das em todos os sentidos. Seminários e colóquios, livros, revistas e artigos
da imprensa, mas, também, leis e decretos de todo tipo, estatuem sobre a
alternância, como um novo caminho para a formação, apesar das resistências
dos defensores do ensino tradicional.
115
De uma prática paralela até o reconhecimento oficial
Conclusão
116
conceito e as práticas escondem realidades muito diferentes no campo da
formação em geral, e, naquele dos CEFFAs, em particular. Às vezes, para
empregar as palavras de um dos responsáveis das MFR, há vários anos a al-
19
ternância tornou-se um estereótipo , ou seja, uma fórmula utilizada a torto
e a direito. O negócio da formação até já se apropriou dela. Isto pode levar
ao melhor, como ao pior. A alternância representa, todavia, uma coisa por
demais séria para ser desnaturada. Por isto, convém delimitar-lhe os con-
tornos, perceber-lhe os componentes para que, na variedade de suas for-
mas, sua implicação atinja, até onde seja possível, a eficiência desejada.
19. OZANAM, J. L’alternance est-elle une tarte à la crème? In: Documents UNMFREO.
Paris, 1973.
117
6
OS CONTORNOS E OS COMPONENTES DA
PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA
A alternância:
• ela representa uma solução para os trabalhadores, para
os adolescentes;
• ela é conservadora: ela enraíza;
• ela é revolucionária: ela induz a evolução;
• ela é ação de participação.
André Duffaure
118
para se livrarem de certas lógicas e terminologias em uso e a fim de não
desperdiçar os recursos da Pedagogia da Alternância.
1. Quatro finalidades
a) A orientação: A alternância aparece como um meio de orientação
profissional e de subsídio na determinação de um projeto realista de
inserção profissional. O contato e a descoberta dos meios profissionais,
o envolvimento no meio das empresas, deve ajudar na escolha mais
pensada de uma profissão.
b) A adaptação ao emprego: A alternância torna-se, neste caso, um
meio para suprir a inadequação entre a formação e o emprego. Uma
inserção profissional deve permitir uma implementação e utilização
rápida da formação técnica e teórica recebida na escola e a aquisição
das competências exigidas pela empresa.
c) A qualificação profissional: Dois modos se opõem para a formação
e qualificação profissional: a aprendizagem com o domínio da forma-
ção prática dada no seio das empresas; a formação escolar onde preva-
lece a formação teórica. Aí, entre o “todo empresa” ou o “todo escola”,
a alternância aparece como o meio apropriado para ligar os dois em
vez de confrontá-los. E, enfim, parece entender-se que uma profissão
não se aprende no quadro-negro com giz! A alternância constitui o
meio, ao mesmo tempo, para aceder a uma qualificação reconhecida
por diploma e de construir uma identidade profissional duradoura.
Estas finalidades podem ser obtidas, na França, sob formas jurídicas
diversas: formação escolar, aprendizagem e outras.
d) A formação geral: As finalidades anteriores têm estreita relação
com a inserção e o emprego dos jovens. Mas uma outra finalidade,
mais ampla, só está sendo raramente exposta: a da formação geral, da
formação global da pessoa. Trata-se, através da alternância, de trabalhar
os mesmos programas, de preparar para os mesmos exames, de permi-
tir o acesso ao prosseguimento dos mesmos estudos que através do en-
sino tradicional. As MFR defenderam, desde 1963, esta finalidade, que
até hoje defendem, preconizando o princípio da formação geral e profis-
119
sional associadas. Não se trata mais, somente, através da alternância, de
suprir carências do sistema educativo, mas sim de oferecer uma outra via
de formação, e, desta maneira, uma alternativa educativa, firmando a al-
ternância como uma pedagogia da adolescência.
120
A abordagem binária e simplista da alternância
20. Enunciei, na obra citada a seguir, a diversidade das relações de atores que podem
existir num sistema de formação em alternância. Cf. GIMONET, J.-C. Alternance et re-
lations humaines. In: Mésonance. Paris: Ed. Universitaires/UNMFREO, 1984.
121
A abordagem multidimensional e complexa da alternância
122
integral. Ela implica uma formação que visa dar oportunidade a cada
um de preparar as qualificações e diplomas necessários ao exercício de
uma profissão, à inserção profissional e social.
• Orientar significa ajudar cada um a definir-se, a encontrar o seu cami-
nho. É a razão pela qual as CFR da França adotaram, naquele tempo, a
denominação “Casa Familiar Rural de Educação e de Orientação”.
b) A segunda finalidade diz respeito ao desenvolvimento dos territórios
onde se encontram os jovens que freqüentam cada CEFFA. Esta noção
de desenvolvimento é ampla porque ela compreende de vez o econô-
mico, o meio ambiente e o humano. Se a formação é portadora desta
visão de desenvolvimento, ela toma um sentido diferente, uma outra
dimensão do que se ela se limitasse à preparação de um diploma. E,
nesta perspectiva, a formação se inscreve num contexto e é portadora
de uma dimensão de cidadania e de solidariedade tanto local quanto
planetária.
123
É bem isto, penso, o sentido da Pedagogia da Alternância dos CEFFAs.
Em saber, para citar E. Morin, “articular, distinguir sem desunir, associar
sem reduzir”.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir a vida e a esco-
la. Colocar a vida na escola e a escola na vida. Levar em conta e gerir os diferen-
tes meios de vida dos adolescentes como fontes de saber, de aprendizagens e como es-
paços educativos aglutinadores e não somente o campo da escola.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir a formação geral
e a formação profissional contrariando o uso comum e sua falta de sentido, sa-
bendo que uma formação global ou integral e ao mesmo tempo útil e perti-
nente só pode ser uma associação das duas na complexidade de suas interfe-
rências. No mundo que está se desenhando, ao invés de “produzir” sábios,
importa promover pesquisadores, pessoas com capacidade de adaptação,
detentoras de um espírito aberto e de um modo de pensar complexo, bem
como de métodos de pesquisa e de capacidades de expressão para tanto.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir os campos de sa-
beres, os da vida e os dos programas escolares e, entre estes, os campos disci-
plinares. A Pedagogia da Alternância dos CEFFAs recusa o reducionismo
no qual se fecham os programas escolares e suas disciplinas estanques, jus-
tapostas, trazendo um parcelamento dos saberes. Como se fosse tratar de
formar um miniespecialista em cada disciplina, em vez de cada uma delas,
em relação com as outras, trazer sua parte de explicação e compreensão de
um mesmo problema. Trata-se, ao contrário, de ensinar a interligar os sa-
beres, a produzi-los, contextualizando-os e unificando-os.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir, os atores do
processo de formação: os alternantes, os pais, os mestres de estágio ou tutores,
os monitores... Cada um em seu campo de ação, na sua área de competên-
cias, na sua cultura, nos seus papéis. Todos estão na obrigação de cooperar
para o êxito de uma formação contínua na descontinuidade das atividades:
cooperação na definição do referencial, no estabelecimento do Plano de
Formação, na operacionalização da formação e avaliação. Desta maneira
os monitores são chamados a trabalhar em equipe, a encontrar os pais e os
mestres de estágio, estes se conhecendo e falando entre si, os alternantes a
cooperar no meio do grupo de formação e de vida no CEFFA. A Pedagogia
da Alternância cria um mundo complexo de relações. Ela diversifica os papéis
educativos. Produz uma partilha do saber e do poder educativo. Sendo as-
sim, as pessoas em formação – “os alternantes” – detêm um poder: aquele
que lhes é conferido pela sua condição de atores socioprofissionais e sociocultu-
rais, e não de alunos que, na escola, escutam passivamente as aulas dos pro-
fessores... Aprendem e se formam durante as estadias no meio, longe dos
monitores do CEFFA. Eles são detentores de um saber que os monitores
124
não possuem. Por isso, encontram-se numa situação de autoformacão em
relação às coisas e às informações da vida e dos programas, em relação aos
atores que freqüentam. É na síntese de todos estes conjuntos em interação
que vão surgir as aprendizagens e que vai acontecendo a formação e a edu-
22
cação . A alternância implica numa situação de aprendizagem ativa, de
produção de seu saber e de sua formação. É na medida em que cada um se
torna o sujeito-ator de sua formação e cresce na autonomia que a Pedago-
gia da Alternância ganha em eficiência.
• Articular, distinguir sem desunir, associar sem reduzir os tempos de
vida do alternante. Sua vida no presente, através da sucessão dos períodos no
meio e na escola, obedecendo ritmos apropriados aos públicos, mas tam-
bém sua vida passada e futura. Cada um se encontra num trecho da vida.
No seu presente, o passado trabalha para facilitar ou, ao contrário, impe-
dir as aprendizagens na medida em que foi fonte de experiências múltiplas
e variadas, positivas ou mais negativas, e às quais se refere para dar signifi-
cado aos ensinamentos. O futuro, na medida de sua percepção e os proje-
tos que existem, dá um direcionamento, mobiliza e orienta mais ou menos
as energias e a ação. A Pedagogia da Alternância é uma pedagogia das co-
nexões; conexão com o passado, certo, mas principalmente com o futuro
e seus projetos para ajudar cada um a construir sentido e, desta maneira,
aprender. A Pedagogia da Alternância compreende-se também como uma
pedagogia do projeto.
Assim, por estas diversas razões, pode-se falar da pedagogia da com-
plexidade que será tanto mais eficiente na medida em que fará crescer a
autonomia. Esta questão da autonomia é fundamental como poder de ma-
nifestar o seu ser, seus recursos, seus talentos, de entrar em relação com os
outros. Formar-se em alternância torna autônomo porque o processo con-
vida a dominar a si próprio, a interagir, a assumir as dependências e a tra-
balhar as interdependências, mas ficando, todavia, dono de si próprio, ge-
23
rindo-se e conduzindo-se. De onde resulta a interação permanente :
Alternância Autonomia
125
Com a alternância entra-se no multidimensional, no multirreferencial.
Encontra-se numa estratégia da relação, da interação, da associação, da ar-
ticulação dos tempos, dos espaços, das unidades nas suas diferenças, suas
semelhanças e suas complementaridades. Mergulha-se na gestão das inter-
faces para relacionar lógicas contraditórias.
126
do da produção, a vida não escolar. Ela convida, então, a considerar a
experiência, ao mesmo tempo, como suporte da formação, reservató-
rio de saberes, espaço educativo e ponto de partida do processo para
aprender. É da articulação entre a experiência e o programa que resul-
tam os Planos de Formação.
d) O quarto conjunto é constituído pela rede de parceiros co-formadores
dos diferentes espaços-tempos da formação. A alternância diversifica e
multiplica os atores que atuam no processo formativo. Estes diferentes
atores estão mais ou menos em interação segundo as finalidades da
formação e a natureza dos campos de vida investidos (familiar, social,
profissional). A alternância coloca, em seguida, o problema fundamen-
tal da partilha do poder educativo segundo jogos de diferenças e de
complementaridade. A associação CEFFA representa a sua estrutura de
agrupamento, de informação, de expressão e de exercício de suas res-
ponsabilidades, mas, também, de regulação e de equilíbrio.
e) Mas a implementação do conjunto supõe um dispositivo pedagógico. A
formação em alternância requer, de fato, uma organização, atividades
e instrumentos pedagógicos específicos para articular os tempos e os
espaços, para associar e colocar em sinergia as dimensões profissionais
e gerais, para otimizar as aprendizagens. Trata-se, em outros termos,
dos subsistemas de gestão e operacional da formação.
f) A estrutura educativa, ou seja, o conjunto das condições materiais, or-
ganizacionais, mas, principalmente, psicoafetivas que garantem uma
qualidade de vida e um clima favorável às aprendizagens e à educação,
constitui um trunfo maior do sistema-alternância. De fato, a alternân-
cia obriga o adolescente ou o adulto em formação a reinvestir-se per-
manentemente, em meio de ambientes em constante transformação. A
acolhida, a atenção, a consideração tornam-se essenciais para regular
os funcionamentos.
g) Enfim, entra em cena este componente essencial que representa a equi-
pe pedagógica e educativa constituída pelos monitores e outros agentes educa-
tivos. A eles pertence animar o conjunto. O olhar histórico demonstra que
os CEFFAs nunca puderam satisfazer-se com o modelo do ensino tradi-
cional. Seu projeto, sua estrutura, a alternância colocaram logo o perfil de
um “formador” particular, chamado, em seguida, de “monitor”, que é
mais um generalista do que um especialista, alguém capaz de gerir uma
pedagogia da complexidade, de ir ao encontro de uma educação sistêmi-
ca. Seu estatuto e papéis são, deste fato, específicos.
Estes sete conjuntos de elementos constitutivos de uma formação por
alternância representam tantos subsistemas, cada um com suas caracterís-
127
24
ticas e processo . Eles se entrelaçam, se entrechocam e interagem. Por isto,
pode-se esboçar a representação gráfica seguinte:
Os monitores
Os parceiros
co-formadores A equipe educativa
Projeto e
O alternante trajeto
e sua de vida
experiência
O projeto
educativo
O dispositivo A estrutura
pedagógico educativa
NB: Para não tornar esta representação gráfica pesada demais, algumas setas não
foram colocadas. Portanto, cada pólo depende e interage com todos os outros.
Conclusão
24. Para um desenvolvimento maior destes conjuntos, cf. GIMONET, J.-C. Método peda-
gógico ou novo sistema educativo? – A experiência das Casas Familiares Rurais 2004. Brasí-
lia: Unefab [Documentos Pedagógicos].
128
25
de “uma outra escola”, o que já foi dito por B. Schwartz em 1983 ou que A.
26
Geay intitulou “a escola da alternância” . Uma outra escola em tempo in-
tegral, no dia-a-dia da vida, em vários lugares, para estudar, aprender,
continuamente, de maneira inter e transdisciplinar. Uma outra escola que
não opõe mais a teoria e a prática, porque existe prática, teoria, conceito
em todo lugar. Porque a mão e o pensamento se juntam sempre. Porque o
saber é a ação e a ação é o saber. Um outro paradigma escolar a adquirir, a
tornar vivo, mas que supõe desfazer-se do anterior que nos modelou. Evo-
lução, e até às vezes revolução, a operar nas nossas cabeças.
129
7
APRENDER NA FORMAÇÃO EM ALTERNÂNCIA
130
Aprender
131
Os fatores externos ao aprendiz ou a influência do ambiente
Duas concepções são avançadas:
28
• Uma, de natureza psicológica , afirma que a aprendizagem é uma
modificação do comportamento devido a um condicionamento: seja dos
reforços positivos através de recompensas, seja dos reforços negativos atra-
vés de punições. Desta orientação nasceram as máquinas de ensinar, em se-
guida o ensino programado, e, de maneira menos extremista, o ensino as-
sistido por computador.
• A outra, numa ótica muito diferente e de natureza sociológica, de-
monstra que as crianças, os adolescentes estão sendo submetidos a uma
aprendizagem implícita diferente segundo o meio social. Advindo daí as
influências familiares, tais como a linguagem, os códigos culturais, o nível so-
cioeconômico e, de modo mais amplo, as influências sociais próprias ao
meio, à cultura ambiente, ao tipo de estabelecimento freqüentado... As
aprendizagens decorrentes disto são, muitas vezes, contraditórias com aque-
las trazidas pelo meio escolar.
Entre estas duas concepções que, às vezes, se opõe, localiza-se a via mais
realista da interação entre os fatores internos e os fatores externos ao aprendiz. Nes-
te sentido, J. Piaget defendeu uma interação do sujeito e do seu meio. Segundo
este autor, a inteligência se constrói graças aos processos de equilíbrio das
estruturas cognitivas em resposta às solicitações e obrigações do meio. Duas
operações contribuem nisto: a assimilação e a acomodação. A saber, para a
primeira, a ação do indivíduo sobre os objetos que o cercam em função de
seus conhecimentos e aptidões, e, ao inverso, a ação do meio sobre o orga-
nismo que provoca ajustamentos ativos no sujeito. Deste modo, então, para
Piaget, a aprendizagem representa uma modificação das estruturas internas
do organismo.
As pesquisas destas últimas décadas com respeito às ciências da vida,
da autonomia, da complexidade e dos sistemas, permitiram uma compre-
ensão mais fina dos funcionamentos do cérebro e do homem, como tam-
29
bém de suas aprendizagens .
De outro lado, as pesquisas em psicologia social demonstram os efeitos
da interação dos atores implicados no processo de aprendizagem. O confron-
to com o outro se torna um poderoso motor de mudança da pessoa, na me-
132
dida em que, é claro, está sendo assumido. A influência do grupo nos pro-
cessos de aprendizagem toma, neste caso, toda a sua importância. Do mes-
mo jeito, também, é essencial a interação entre o aluno e o docente, como
30
numerosos estudos o comprovaram .
A singularidade da aprendizagem
133
sociais e a escola, nos códigos, nos processos de pensamento, nos mo-
dos de expressão utilizados.
Desta maneira, cada um está gerindo, ao seu modo, os materiais educa-
tivos e formativos que lhe propiciam os lugares onde vive e atua; cada um
realiza, segundo as modalidades que lhe são próprias, a integração dos da-
dos e informações disponíveis, e garante, de maneira global e essencial-
mente pessoal e original, as mais diversas aprendizagens.
32. O que fazia dizer um dos pais da Pedagogia Nova na França, R. Cousinet, que “o en-
sino não tem por objetivo trazer a um aluno conhecimentos que não tem, mas de acla-
rar um pouco mais os conhecimentos que ele já possui”.
33. PERRENOUD, P. Sentido do trabalho e trabalho do sentido na escola. In: Cahiers Pédago-
giques, n. 314-315. Paris.
134
blema a resolver quando tem atores, porque cada um possui sua herança cul-
tural, seus desejos, suas necessidades, suas estratégias para se mostrar, ou, ao
contrário, fazer-se esquecer e fugir. Assim vai indo a diversidade. A constru-
ção de sentido é, portanto, sempre singular.
Mas a questão do sentido colocada em relação aos aprendizes vale tan-
to quanto para os docentes. Talvez estejam mais em condições de ajudar os
alunos a encontrar o sentido de seu trabalho, que percebam o sentido de
sua ação pedagógica e educativa ou que puderam, na sua própria forma-
ção, perceber-lhe o sentido.
135
ções para sua integração, este saber pode permanecer superficial só
de curta duração;
• seja a partir de conhecimentos que a expressão escrita, oral, gestual
ou outra permite manifestar, mas sempre de modo parcial. Deste jeito,
pode-se dizer o que se sabe, mas nunca o que se conhece.
A transferência
136
c) A primazia dada à experiência que antecede o programa escolar.
Mas existe um risco, para o alternante, de não assumir todas as solicita-
ções que lhe são feitas e, até mesmo, de se perder nesta complexidade, nes-
ta amplitude e no processo pedagógico. Por isso, a questão dos processos
implementados para que se liguem e se unifiquem as aprendizagens diver-
sas e dispersas, em vista de uma formação completa, deve ser esclarecida.
De antemão, importa especificar ou lembrar a natureza e as características
das situações-suportes vividos pelo alternante, bem como aquelas dos sabe-
res e aprendizagens possíveis em cada lugar.
O espaço-tempo familiar
Os CEFFAs são instituições familiares. Eles se baseiam sobre a respon-
sabilidade plena das famílias, ao mesmo tempo, face à estrutura e à forma-
ção de seu filho. A família torna-se, assim, o lugar prioritário da vida do al-
ternante.
Cada família possui sua própria cultura, determinada pelas caracterís-
ticas étnicas, sociais, profissionais, econômicas... que destacam as diferen-
ças entre umas e outras, bem como o ambiente de vida, a comunidade, a
cultura ambiente do meio. Todavia, em cada família, prevalece, em graus
variáveis, uma lógica educativa, feita de valores, de atitudes, de papéis, mas,
também, de preocupações para com o êxito e o futuro de “seus” filhos.
É no seio da família que são realizadas as primeiras aprendizagens,
muitas vezes, essenciais da vida. Seu marco permanece forte nos planos
afetivo, cognitivo, psicomotor... É aí que o corpo, a cabeça e o coração cres-
ceram e tomaram forma. Na adolescência os processos em andamento
prosseguem, mas valendo-se dos caminhos da independência e da auto-
nomia. No seio da família, o questionamento se torna regra para deixar
de ser a criança que não quer mais ser e tornar-se o adulto que se procura.
Neste ensaio construtivista a família permanece sendo, todavia, um lugar
137
de referência, até mesmo de refúgio, um bote de salvamento quando as in-
certezas e as angústias existenciais tornam-se fortes demais. A ambivalên-
cia dos sentimentos e dos comportamentos embaraça e perturba o adoles-
cente e ainda mais os pais. Mas é nesta ambivalência, às vezes conflituosa,
que acontecem as aprendizagens que levam à construção da identidade. A
família, através dos laços afetivos e do amor, através de suas regras e de
suas referências, e, na medida em que o acolhimento e os equilíbrios sejam
suficientes, traz a sua parte de aprendizagens necessárias à busca de identida-
de. Mas, nesta matéria, nenhum programa acadêmico está previsto! E, to-
davia, as aprendizagens da escola dependem em grande parte disto.
A alternância desempenha uma função reguladora de importância. De um
lado, ela permite ao adolescente viver experiências em outros espaços e
provoca, desta maneira, um distanciamento progressivo do campo familiar.
De outro lado, a associação e o envolvimento dos pais na formação de seu
filho podem contribuir para o diálogo, para o relacionamento e para o estabele-
cimento de regras, assim como os meios de encontros e de informação pro-
piciados pelo CEFFA.
O espaço-tempo profissional
A formação alternada dos CEFFAs cede um espaço ao trabalho e à im-
plicação profissional. Estes se confundem ou são distintos do campo famili-
ar. Na sua finalidade de formação integral associam, é bom lembrar, a for-
mação profissional e a formação geral (princípio de formações associadas).
Em seguida, o alternante garante as aprendizagens profissionais que re-
quer uma qualificação e a obtenção de um diploma.
O espaço profissional é animado por uma lógica de produção-realização
de bens ou de serviços com dimensões econômicas, organizacionais, esta-
tutárias e de resultados a serem alcançados. Em seguida, torna-se um lugar
de exigências e de rigor no trabalho, nos horários, nas relações... todos eles
constitutivos de outras referências para um desenvolvimento pessoal. O
tempo profissional representa, para o adolescente, fora do CEFFA, uma
ocupação, mas, principalmente, um tempo cheio de atividades que respon-
de a necessidades essenciais desta idade: encontrar um lugar no mundo
dos adultos e, deste jeito, conquistar um estatuto e papéis, agir, conseguir,
35
ser reconhecido, crescer . Ele é, todo de uma vez, o da entrada no mundo dos
138
adultos, da relação com o trabalho e com a produção, da descoberta profissional, até
mesmo da aprendizagem de uma profissão.
Este tempo de alternância é aquele onde apreendem, se analisam e se
questionam, através da observação, a atividade prática, a troca, a expres-
são... os componentes da vida profissional nos seus aspectos técnicos, econô-
micos, sociais e humanos. É, também, o tempo em que se transferem os sa-
beres do CEFFA: saberes técnicos, tecnológicos, científicos...
Ele representa, assim, o tempo em que se adquirem competências pró-
prias de uma profissão, ou seja, aptidões para implementar conhecimen-
tos, saberes, capacidades, de maneira responsável, numa situação dada.
Seja, em outros termos, saberes de ação que resultam da articulação entre sa-
beres práticos e saberes teóricos. A aquisição de competências só pode, en-
tão, acontecer numa situação de trabalho, e, neste sentido, “a alternância é
36
produtora de competências” .
De modo mais amplo, o período profissional da alternância torna-se o
espaço-tempo no qual se adquire a prática e a cultura de uma profissão, nas
37
suas quatro dimensões .
• A dimensão material, ou seja, a relação com os objetos, com a matéria
(o ferro, o fogo, a madeira, a terra, o vivo... segundo a profissão) que
determina uma maneira de ser específica, de trabalhar, de apreender
as situações.
• A dimensão técnica, a saber, para cada profissão, saber-fazer, técni-
cas, habilidades manuais, ferramentas específicas... ou seja, em defini-
tivo, uma arte de fazer.
• A dimensão social: a profissão confere um estatuto que outorga um lu-
gar na sociedade e determina as relações para com os outros e, em se-
guida, maneiras de se comportar e modalidades relacionais.
• A dimensão simbólica, que faz surgir todo um imaginário ao redor de
uma profissão, ainda mais presente se for antiga, se tiver raízes nos
tempos longínquos. Toda cultura profissional carrega as marcas do
passado e representa sua continuidade. Para as novas profissões, esta
cultura vem sendo elaborada de maneira progressiva.
139
Disto decorre, numa profissão, se misturam, ao mesmo tempo, sabe-
res, saber-fazer e saber-ser, uma inteligência prática, uma habilidade ma-
nual e uma arte de viver. Assim, vem se esboçando a identidade profissional.
Por isso, conceber a formação em relação a uma profissão a aprender e a cons-
truir significa, de um lado, ajudar o alternante a encontrar e perenizar um em-
prego, e, de outro lado, dar a sua formação um sentido e uma dimensão que ul-
trapassam a mera preparação de um exame.
O espaço-tempo escolar
O CEFFA oferece uma lógica e uma cultura bem diferentes, as de uma
finalidade formativa e educativa para todos os membros de um grupo-classe
com uma obrigação de resultados em termos de êxito num exame e de ob-
tenção de um diploma, de qualificação e de orientação para cada um de
seus membros.
Para o alternante, ele representa “o período de escola” porque se de-
para com programas acadêmicos, ensinos, uma organização escolar com
horas de “aula” numa sala, longas horas sentado numa mesa, diante de um
quadro... com todas as representações herdadas da “escola” da infância.
Encontra, aí, outros saberes de um aspecto mais difícil, porque mais teóri-
cos e mais abstratos.
Portanto, o CEFFA, em Pedagogia da Alternância, representa bem
mais do que um lugar-escola. Ele é um espaço-tempo de encruzilhadas e de
encontros, de trocas e de confrontos, de análise e de síntese, de organiza-
ção e de regulação dos processos de alternância, mas, também, de persona-
lização e de socialização.
É o lugar onde vai acontecer o esclarecimento e a superação da prática
e da experiência, onde vão se desenrolar novas aprendizagens, produção
de saberes mais amplos para uma prática pedagógica ao mesmo tempo co-
operativa e personalista. É também o palco de uma vida social no meio de
um grupo de vida. Propicia um outro possível refúgio e outras referências,
necessárias para a construção da identidade na fase adolescente.
Sendo assim, todo alternante caminha em três espaços-tempos, ou
mais, se for considerado o meio físico e humano em que vive, e que devem
existir como tais, na sua identidade e diferenças, para serem complemen-
tares. Ou seja, representado da maneira seguinte:
140
Família
Lógica educativa
Empresa CEFFA
As aprendizagens experienciais
No quotidiano da vida, o alternante realiza aprendizagens espontâ-
neas, informais e aleatórias ao contato do meio, das situações, das pessoas...
Ao atuar, ao tentar, ao sondar, ao receber conselhos ou informações ele irá
garantir outras de maneira mais estruturada. Tudo isto constitui a expe-
riência e suas aprendizagens que sempre produz efeitos sobre a pessoa.
Mas a experiência é mais ou menos rica. Ela pode ser alienante (dependên-
cia, submissão, servilismo...). Ela é, geralmente, formadora, na medida em
que o alternante está engajado em situações reais e em todas as suas dimen-
141
sões: cognitivas, afetivas, sociais. Sua experiência se torna, então, fonte de
saberes e de aprendizagens. Ela cria uma modificação da relação consigo
mesmo, com os outros e com o mundo, porque a experiência não diz so-
mente respeito às práticas profissionais e ao saber-fazer, mas atinge a pes-
soa na sua globalidade.
Todavia, para ser formadora, a experiência deve ser também “cerca-
da”, ou seja, descrita, falada, analisada, questionada, confrontada, expli-
38
cada novamente, transformada... a fim de que possa realizar-se a transfe-
rência dos conhecimentos adquiridos numa situação dada e específica em
outras situações diferentes.
Este é o trabalho pedagógico do CEFFA que favorece a transferência e
a passagem do particular ao geral.
As aprendizagens formais
São chamadas assim porque são organizadas logicamente para atingir
os objetivos fixados pelas instâncias escolares. Visam uma aquisição de sabe-
res disciplinares que fornecem as teorias, as leis, os modelos, os métodos e as
ferramentas do trabalho intelectual. Elas têm um valor instrumental, de
compreensão das práticas e situações de vida e de formação do espírito. Elas
concorrem para a conceitualização, a abstração. Contribuem para a constru-
ção dos “saberes-ação” ou operatórios. Por isto, apresentam um caráter ge-
ral e sistemático... Mas sua eficiência pode ser relativa. De fato, elas correm o
risco de serem pouco duradouras, pouco sujeitas a novos investimentos, até
mesmo afastadas, quando permanecem corpos estranhos à experiência do
alternante, à sua prática, à sua afetividade, ao seu conhecimento.
38. Um autor americano, D.A. Kolb, explicitou as quatro etapas necessárias para que a
experiência seja formadora: 1) viver, primeiro, uma experiência concreta; 2) uma ob-
servação reflexiva; 3) uma conceitualização abstrata; 4) em seguida, uma experimenta-
ção ativa. In: Experiential learning. Henglewood Cliffs, Prentice Hall, 1984.
39. Cf. o cap. anterior.
142
garantir um processo integrativo dos saberes e aprendizagens experien-
ciais e formais, realizar a passagem, a transferência de uns para outros. Ca-
be-lhe operar rupturas e relações na ordem dos conhecimentos. Cabe-lhe,
em outras palavras, ligar a mão à cabeça, ao corpo e ao espírito.
O grande psicólogo J. Piaget, baseando-se sobre o processo natural de
40
aprendizagens do humano , enunciou a lógica “Praticar e Compreen-
41
der” . Praticar significa a ação, a experiência. Compreender quer dizer a
reflexão sobre a ação, a explicação, a conceitualização. E, como os dois de-
vem se articular, se integrar, ele acrescentou: “Praticar é compreender em
ação e compreender é praticar em pensamento”. Ou seja, representado da se-
guinte forma:
Praticar Compreender
40. Logo, dizia ele, a criança não esperou entender as leis do movimento para aprender
a andar.
41. PIAGET, J. Op. cit.
42. Estima-se que a lógica Compreender-Praticar (conseguir) corresponde bem a 30-35%
da população escolar, aquela que possui capacidades de abstração imediata, enquanto a
grande maioria, ou seja, mais de 60%, se inscreve melhor no processo Praticar (conse-
guir)-Compreender. O que explica, em parte, a elevada taxa de fracasso escolar.
43. A indução consiste em ir dos fatos ou das práticas às idéias, aos conceitos. A dedução
é o processo inverso: de uma lei, de uma idéia geral, de uma teoria vai-se deduzir uma téc-
nica, uma prática...
143
compreensão à ação bem-sucedida (conseguir com êxito). Nota-se que cer-
tos jovens privilegiam este processo.
Mas a construção de saberes de aprendizagens novas coloca para o al-
ternante o problema de um distanciamento, de um recuo em relação à ex-
periência. Esta, se não for superada, pode representar um obstáculo para
um novo conhecimento. Ele é levado a vivenciar, de forma permanente,
um paradoxo de rupturas e de relações para passar de um conhecimento a
outro: do familiar e empírico da vida ao acadêmico e teórico da escola. Em
outras palavras, operar, ao mesmo tempo, uma continuidade e uma ruptu-
44
ra na ordem dos conhecimentos . Aí reside uma questão essencial, intro-
duzida pela alternância, e todo processo formativo do tipo Ação-Pesqui-
sa-Formação, ou Prática-Teoria. A didática implementada é, neste sentido,
fundamental para gerir a interface, criar as etapas intermediárias entre as
45
aprendizagens experienciais e as formais, mais gerais e sistemáticos . Para
fazer isto, uma fase de expressão e de questionamentos abundantes se im-
põe para voltar à experiência, confrontá-la e compará-la, relativizá-la e ques-
tioná-la. Esta fase intermediária é, também, a do questionamento ou da
problematização, que iniciam e chamam aportes teóricos para um proces-
so em compreensão e generalização, para ir de encontro a mais conceitua-
lização e de abstração.
Todavia, a via integrativa não poderia parar neste estágio do processo.
Ela supõe que os ganhos e conceitos teóricos se inscrevam no campo da
ação e contribuam para uma outra leitura da realidade, para uma outra
maneira de ser e de agir, para uma transformação do meio. A didática, nes-
te caso, mais uma vez, se encontra solicitada para acompanhar o processo.
É na medida em que os conhecimentos conferem uma capacidade de agir
em novas condições, incógnitas ou imprevistas, que se constrói e cresce a
autonomia.
Conclusão
144
8
VIVENCIAR E FAZER VIVER A ALTERNÂNCIA: UMA
NOVA PROFISSÃO DA FORMAÇÃO
145
1. Do professor ao formador
Na pedagogia tradicional o “Mestre” se confunde com o conhecimen-
to. Administrativamente, o melhor mestre ou professor é aquele que possui
mais conhecimentos. O aluno, nesta lógica, deve adaptar-se a um e a outro,
caso contrário ele estagna ou é excluído.
Em oposição a esta lógica, as orientações da pedagogia nova situam em
primeiro plano a criança ou o adolescente. Aqui o programa e o mestre se
adaptam ao aluno e o acompanham no seu desenvolvimento. O professor,
neste caso, não é mais aquele que detém mais conhecimentos, mas aquele
que acompanha, guia, orienta em direção às fontes do conhecimento, aju-
da nas estruturações destes, facilita as aprendizagens, ensina quando ne-
cessário.
Se nesta lógica os papéis dos professores se diversificam, eles ainda fi-
cam limitados. De fato, toda situação educativa não se restringe a uma úni-
ca relação entre um aluno, um professor e um saber. O conhecimento não
é somente este do mestre ou da classe. O aluno não é um ser abstrato a con-
siderar em si, mas uma pessoa com um passado, uma história de vida, com
projetos, uma família, um ambiente social, profissional e cultural. A classe
não se limita a uma justaposição de indivíduos, mas constitui sobretudo um
grupo em interação com um ou vários professores ou formadores. A classe
representa um elemento de um estabelecimento, de uma escola, de uma
instituição mais ampla, com seus projetos, suas finalidades, seus métodos,
suas relações de poder... Este conjunto se situa dentro de um contexto, um
ambiente com suas características físicas, socioeconômicas e culturais.
O desenvolvimento da formação, fora dos quadros habituais do ensino
como exige a formação profissional, a formação dos adultos ou ainda ou-
tros, com a introdução da alternância, leva em consideração esse conjunto
de elementos e a considerar toda situação de formação como uma complexidade
a gerir.
Os CEFFA se situam dentro desta lógica. Eles praticam o que denomi-
namos atualmente de educação sistêmica. É neste contexto, dentro deste sis-
tema complexo, que as funções de um monitor são exercidas.
146
siderados como “alunos de uma escola” na concepção tradicional, mas
como atores socioprofissionais em formação com outros, em grupo. São porta-
dores de experiências a comunicar e de questionamentos múltiplos. Cada um
deles com processo personalizado, a partir de sua situação de alternante e de
seus projetos, a serem esclarecidos ou consolidados, mas sempre depen-
dendo de acompanhamento.
• Com as realidades da vida profissional das empresas, do mundo da pro-
dução, do trabalho, da vida social, do ambiente. Logo, sua apreensão e seu
conhecimento constituem exigências de primeira ordem para os monitores.
• Com os parceiros co-formadores de cada alternante: pais, mestres de es-
tágio, tutores... tanto por meios de informação e de ligação quanto através
de encontros periódicos no CEFFA e no meio.
• Com diferentes tipos de saber: aqueles adquiridos fora do meio escolar e
que é importante considerar e valorizar e aqueles dos programas, que im-
porta tornar acessíveis.
• Com grupos e uma vida residencial a animar. Um CEFFA, mais do que
um mero lugar de ensino, é um espaço de vida educativa com seus tempos
para refeições, seus serões e seu internato, atividades de lazer e culturais,
mas também de participação na vida material da casa. O grupo, mais que
um grupo-classe, logo representa um grupo de vida com seus efeitos de so-
cialização.
• Com a vida do CEFFA e de sua associação. Como estrutura de formação,
o CEFFA está presente num território, oferecendo-lhe sua parcela de con-
tribuição nos aspectos da educação e do desenvolvimento. Logo, deve afir-
mar seu lugar através de uma presença nas manifestações, uma participa-
ção e engajamentos na vida local. O presidente e os administradores, o di-
retor e os monitores, no seu devido lugar, garantem esta representação.
O Conselho de Administração da associação e a equipe pedagógica, nas
suas funções e responsabilidades respectivas, representam as duas instâncias
animadoras da estrutura. Seu conhecimento mútuo, sua estreita colaboração,
bem como relações de convivência, condicionam um funcionamento equili-
brado do conjunto. Logo, a função do monitor abrange a vida associativa.
147
É neste sentido que podemos falar de uma função de generalista e de
polivalência, já que caminham lado a lado, nas funções a exercer, ao mes-
mo tempo: a educação, a formação, o ensino, a animação. Função complexa,
que se enriquece pela variedade que se gera, pela criatividade que supõe,
pela impossibilidade do repetitivo. Função rica neste caso, mas difícil e que
supõe que sejam pesquisadas as condições que facilitam seu exercício: or-
ganização, hierarquia das ações, responsabilidade e cooperação dentro de
uma equipe pedagógica, reconhecimento e valorização pelo meio que o
cerca e pelas estruturas administrativas.
Vista desta maneira esta função de generalista, os papéis desempenha-
dos podem logo ser enumerados a partir de quatro direções:
• Papéis de educação com relação aos jovens quando eles se encontram
na faixa etária às vezes crítica, mas essencial da vida, que é a adolescência.
As atitudes, o olhar, a forma de autoridade entram neste momento em con-
sideração para permitir de se encontrar, de construir sua identidade, de
crescer, de conquistar a sua autonomia, de tornar-se uma pessoa.
• Papéis pedagógicos para colocar em prática as metodologias, os instru-
mentos, o saber-fazer apropriado a fim de articular os tempos e os espaços
da formação, associar e colocar em sinergia os conhecimentos profissionais
e gerais, otimizar as aprendizagens.
• Papéis de relação e de animação das estruturas com as quais trabalha:
– a associação do CEFFA à qual precisa dar vida, entreter sua vitalidade
para que ela cumpra suas funções e alcance seus objetivos;
– a rede dos parceiros co-formadores (pais, mestres de estágio...) a fim
de que eles assumam sua missão educativa e de aprendizagem;
– a vida interna do CEFFA como estrutura material e estrutura educa-
tiva;
– os diferentes grupos nas salas de aula e, mais globalmente, da vida
residencial no CEFFA.
• Papéis técnicos em termos de competências e de conhecimentos den-
tro dos campos profissionais aos quais os jovens em formação são confron-
tados. A profissão ou o conhecimento profissional compartilhados pare-
cem constituir uma mediação essencial da relação pedagógica e educativa
nas formações em alternância.
148
condições que dependem ao mesmo tempo da escolha das pessoas no mo-
mento do recrutamento, da formação inicial e contínua e das modalidades
de trabalho.
1. O perfil
Os critérios de personalidade, de maturidade são evidentemente pri-
mordiais, mas também os de conhecimento dos ambientes profissionais,
de experiência profissional a fim de perceber a situação vivida em alter-
nância pelos jovens, de estar mais perto de sua cultura. É por isso que, na
França, sempre se preferiu perfis de formação técnica, tecnológica ou de
engenheiro aos de pura formação acadêmica geral.
É claro que os níveis requisitados devem se inscrever no quadro das le-
gislações existentes. É conveniente notar as dificuldades que apresentam,
na maioria das vezes, estas legislações, pois são concebidas, quanto aos cri-
térios de acesso ao ensino, com base em modelos de pedagogia tradicional.
Decorre daí incompatibilidades flagrantes com o modelo da Pedagogia da
Alternância que não pode se contentar com professores fechados em seu
campo disciplinar e na sala de aula.
2. O trabalho em equipe
Como já dissemos, o trabalho em equipe pedagógica constitui uma ou-
tra característica institucional devido às implicações da alternância, mas
também ao projeto educativo com pretensão personalista. Colocar em prá-
tica uma pedagogia da pessoa implica numa intervenção em grupo, exige
uma ação cooperativa. Todas as pedagogias novas das quais os CEFFAs se
nutriram no tempo e que colocam o desenvolvimento da pessoa em primei-
ro plano têm uma ação de equipe. Quando é o programa de ensino e seus
conteúdos que são colocados em primeiro plano, não é preciso equipe, a
prática individual pode ser suficiente. Mas se pretendemos uma formação
global, a melhor alternativa é o coletivo.
149
de contratos com o ministério pertinente, reconhecendo a capacidade e o
direito em exercer esta profissão educativa.
4. Uma formação
Uma profissão como esta não se improvisa. Ela supõe, como para todas
as profissões, uma aprendizagem e, ao longo da prática, uma formação
contínua.
• A formação pedagógica inicial é obrigatória para uma iniciação e apren-
dizagens básicas do monitor de CEFFA. Coerente com suas finalidades,
esta formação deve ser conduzida em alternância. Na França, ela se enun-
cia através da fórmula “uma formação para e pela alternância”.
• “Para a alternância”: significa que se trata da preparação para a con-
dução das formações em alternância e, mais precisamente, no sistema edu-
cativo dos CEFFAs. O que supõe o desenvolvimento das competências par-
ticulares que o exercício das funções exige, tais como já foram citadas ante-
riormente.
• “Pela alternância”: quer dizer que a formação resulta da ação profis-
sional em serviço, no seio de uma equipe educativa de um CEFFA e de ses-
sões de formação pedagógica que pontuam periodicamente o percurso
formativo.
A formação contínua pode tomar direções diversas para ampliar o cam-
po dos conhecimentos e das competências, para adquirir novas qualifica-
ções; quer seja nos campos técnico-econômicos, científicos, das ciências
humanas, da pedagogia, do desenvolvimento...
Paralelos a um aperfeiçoamento de curta duração a partir de sessões
temáticas, existem também projetos mais constantes com pretensões pro-
mocionais e de qualificação superior que contribuem no crescimento das
46
pessoas e da própria instituição .
Assim, a formação dos monitores (inicial e contínua) não poderia ser
feita de ensinamentos e de consumo de conhecimentos abstratos fora da
realidade. Mas ela deve ser, justamente ao contrário, uma formação que
acompanha a entrada e, em seguida, a experiência da profissão, associan-
do a prática à sua teorização, a partir de processos de pesquisa-ação, de
46. Esta via foi aberta pela implementação com a Universidade de Tours de um curso
de formação universitária: o Diploma Universitário da Prática Social (Dueps). Um pro-
cesso similar foi realizado no Brasil através do mestrado Formação e Desenvolvimento
Sustentável, graças a iniciativa da SIMFR e à parceria da Universidade François Rabe-
lais de Tours (França) e da Universidade Nova de Lisboa (Portugal). Observa-se que vá-
rias universidades brasileiras contribuíram nesta formação.
150
produção de conhecimentos para alcançar maior lucidez sobre as práticas,
em complexidade e em autonomia.
47. Uma revista francesa – Actualité de la formation permanente – dedica numerosos arti-
gos e números a esta questão. A saber, por exemplo, um artigo de B. Lietard: La forma-
tion change, le formateurs aussi, n. 117, mar.-abr./1992.
151
4) A formação permanente torna-se de primeira necessidade diante ao
“desgaste” que resulta de todo trabalho de formação, mas, principal-
mente, para seguir as rápidas evoluções que acontecem em todas as
áreas (tecnológicas, cientificas, econômicas, sociais e culturais...). Neste
48
sentido, referindo-se ao autor de um relatório europeu , os quatro pó-
los seguintes parecem constituir orientações de formação permanente
a serem escolhidos em função das necessidades.
O domínio tecnológico
A experiência do
empreendimento A abertura social
A capacidade pedagógica
Conclusão
48. THERY, B. Pour une formation de formateurs adaptée au contexte économique e social. Ber-
lim: Cedefop.
152
CONCLUSÃO DA SEGUNDA PARTE
153
CONCLUSÃO GERAL
Um caminho-método para o amanhã e a era planetária
154
e promocional para os tempos vindouros, e não é presunçoso afirmar que
1
oferecem um “método-caminho” para o amanhã e para a era planetária.
Ontem, os fundadores tinham colocado as MFR fora dos trilhos conven-
cionais do ensino. Propuseram trilhar outro caminho para a formação,
para a educação dos jovens do meio rural. Um caminho sustentado por um
2
projeto para o homem, para a agricultura, para a ruralidade . Para dar sen-
tido a este projeto ambicioso necessitou-se de uma estrutura, um método
e “formadores-animadores” do projeto. Também, não contentar-se com os
programas acadêmicos impostos pela administração educativa, mas tor-
ná-los inteligíveis, colocá-los numa estrutura e numa linguagem acessí-
veis e compatíveis com os jogos e desafios da alternância. Precisou, às ve-
zes, reforçá-los, incorporando neles conteúdos que permitiam ir ao encon-
tro das metas e dos objetivos do projeto. Ainda precisava compreender o
que era, na época, os adolescentes rurais, os seus centros de interesse, seus
modos de expressão no seu ambiente de vida, bem como os de seus pais, a
fim de que possam se sentir envolvidos e que sua participação seja efetiva.
Precisava uma educação, uma formação que, longe de se restringir no cam-
po escolar, interaja com o meio ambiente e contribua, assim, com o seu de-
senvolvimento. Tratou-se, na verdade, para as MFR, não de trilhar os ca-
minhos da formação existentes, mas, sim, de abrir novos caminhos, nem
de andar pelos caminhos do passado, mas de preparar as rotas do futuro.
3
Ou seja, um caminho a ser desbravado e uma estratégia a ser construída
no dia-a-dia. É por isto que se inscreveram, embora superando-a, na mu-
dança pedagógica nova na França e de seus promotores: R. Cousinet, C.
Freinet, O. Decroly, J. Dewey, Ferriere, Claparede... é o motivo pelo qual
1. Tomamos esta expressão emprestada de Edgar Morin em Éduquer pour l’ère planétaire
(op. cit.). Que ele mesmo tomou emprestada de uma autora espanhola, Maria Zambra-
no: Notas de um método (Madri, 1989).
2. Neste sentido, um sociólogo, Pierre Idiard, escrevia, em 1980, numa análise retros-
pectiva: “Na origem, as MFR (CFR) representavam reivindicações de um meio rural
francês, que buscavam nelas a expressão de sua rejeição e de sua reação às ameaças de
aculturação e de marginalização que continha, para ele, o desenvolvimento industrial e
urbano, alimentado pelo êxodo de seus melhores elementos”. E prosseguia, mais adi-
ante: “O êxodo rural vira o ‘inimigo’. As MFR (CFR) vão se dar como primeiro objetivo
de ‘reter os melhores na terra’, para transformá-los, aí mesmo, em ‘líderes camponeses’
que salvarão a comunidade da ruína”. E ainda “as MFR (CFR) vão apostar em dois ele-
mentos políticos: estarão, resolutamente, a favor do progresso agrícola contra a rotina,
‘apóstolo’ da qualidade profissional... mas, ao mesmo tempo, permanecerão, radical-
mente, em defesa da ‘exploração familiar. In: Les Maisons Familiales Rurales. Revue
Internationale d’Action Communautaire, n. 3/43. Montreal, 1980.
3. Apraz-nos citar estas palavras do poeta espanhol Antonio Machado: “Viajante, não
há caminho, o caminho nasce de tua caminhada”.
155
elas se identificaram, em muitos aspectos, com as visões e a pedagogia de P.
4
Freire no Brasil .
Nos tempos atuais, as MFR representam plenamente uma originalida-
de no mundo educativo. Elas oferecem um “outro caminho”, como diz o
seu slogan, e fornecem uma contribuição essencial para numerosos jovens.
Aparecem, embora menos agora com a emergência da alternância, sempre
à parte, dentro do sistema educativo. Ainda são consideradas, aqui e acolá,
como “escolinhas” destinadas a pré-adolescentes ou adolescentes “pouco
dotados para o estudo” e que são, mais ou menos, rejeitados pelo sistema
escolar. É claro que elas os acolhem e lhes prestam um serviço imenso, pos-
sibilitando-os reencontrar o caminho certo do êxito e da confiança. Do
mesmo jeito, acolhem, também, aqueles que, por motivos diversos, não pu-
deram “continuar a escola”. Mas elas acolhem, do mesmo jeito, aqueles
que possuem capacidades mais abstratas e que são bem-sucedidos na es-
cola. Uns e outros encontram nelas um outro percurso de formação geral,
ao passo em que iniciam uma inserção socioprofissional, uma preparação
para alguma qualificação, garantindo, na medida do possível, o exercício
de uma profissão ou da continuidade de estudos. O método da alternância,
com certeza, contribui com isso, mas, bem mais, a dimensão humana e
educativa que presidem a sua implementação. Uma MFR, como este livro o
demonstrou, representa uma rede de co-formadores, um complexo racio-
nal, que contribuem para que os atores do sistema se relacionem entre si,
e através disto aprendam uns dos outros, como dizia, em seu tempo, I.
5
Illich . A estadia na MFR não representa somente um tempo de escola para
aprender e construir saberes, mas, também, um tempo de vida com os ou-
tros, no seio de uma estrutura educativa onde se partilham as refeições, os
lazeres, as atividades socioculturais à noite. Um tempo de vida em interna-
to onde, para ser moderno, de vida residencial, que permite aos adolescen-
tes, às vezes em descaminho, de encontrar algum porto seguro, algum lu-
gar para desabafar, algum espaço de escuta e de diálogo, algumas referên-
cias para o presente e o futuro.
Nos tempos atuais, então, as MFR oferecem uma possibilidade de
“praticar, conseguir, alcançar de outro jeito, por outro caminho” (Réussir
autrement) e, em nome disto, prestam um serviço. Todavia, elas precisam
adaptar-se às evoluções de todo tipo (públicos, programas, contextos socio-
lógicos, campos profissionais investidos...). Devem impregnar-se e adqui-
rir novas linguagens, novas abordagens, novas culturas a fim de que a prá-
156
tica da alternância permaneça uma pedagogia arraigada na realidade. Se-
não, a alternância não passa de mera palavra. Elas devem estar atentas ao
processo de desgaste e de institucionalização que está de olho em qualquer
estrutura que tem certa idade. O desenvolvimento a qualquer custo das for-
mações alternadas, a exemplo das pressões das administrações educativas,
dos programas a serem aplicados, das regras avaliativas e dos controles,
levam, insidiosamente, a processos de uniformização e de normalização.
Para salvaguardarem-se, no presente, e mais ainda, no futuro, elas preci-
sam esforçar-se em garantir “uma plenitude de sentido”.
Amanhã, a “plenitude de sentido” do movimento das MFR encon-
trar-se-á na ótica personalista e humanista de sua ação, mas inscrita na cor-
rente da educação planetária, da educação para a cidadania universal, de
6
“uma pedagogia da terra” , de uma “ecopedagogia” de que já se fala muito
no planeta, particularmente na América Latina. Presenciamos o nascimen-
to de um cidadão planetário sem ter condições ainda de medir todas as
conseqüências. Mas o processo está engajado, e as MFR terão de manter
seu espaço no seio dos sistemas educativos para relevar os desafios que
apontam...
Que tipo de homens e de mulheres exigirá o mundo de amanhã? Esta-
mos indo, se já não o é, para um mundo global, com complexidade cres-
cente que demandará espíritos abertos, em movimento, capazes de leituras
plurais e distanciadas, de abordagens amplas e sistêmicas e não somente
providos de saberes acadêmicos. Tratar-se-á de ser equipado para levar em
consideração e compreender, na medida do possível, os componentes da
vida humana, da vida do mundo, para enfrentar as incertezas e as comple-
xidades, para resistir aos redemoinhos de um mundo em movimento, para
formar-se através das novas tecnologias da informação e da comunicação,
para ter vontade e as capacidades de empreender, de criar e para viver a
formação permanente ao longo de toda a vida.
O movimento das MFR (CFR) traz, pelas suas finalidades e sua filosofia
da formação animada pelo seu método pedagógico, os germes da educa-
ção do futuro. As MFR (CFR), desde a sua criação e depois no seu desenvol-
vimento, foram adiantadas sobre o seu tempo. Elas assim permanecem e é
essencial que elas mantenham essa parte de diferença que as caracteriza.
Mas de que natureza será essa diferença? Mais do que nunca, para os tem-
pos vindouros, elas precisam manter esta linha, ficando de vigia, guardan-
do o rumo de suas finalidades personalistas, do respeito e da implicação
das famílias ao mesmo tempo em que, ajustando os objetivos e os meios, le-
157
vando em conta as evoluções e as novas necessidades que decorrem disto
tudo. Elas têm e terão que preparar os jovens para enfrentar este mundo,
complexo e difícil de viver, no qual nós já estamos mergulhados, mas que o
ficará mais ainda, dando-lhes as referências e os meios, em termos de sa-
beres, de saber-fazer e de saber-ser, para situar-se nele e o compreender.
Para permitir-lhes de fazer “a grande viagem no seu universo interior e no
universo que os envolve”. Ajudá-los, em outros termos, a estar ao mesmo
tempo no local e no global. A saber:
• Estar, atuar mais no local, aí, onde estão as raízes, para, se for possível,
viver, ganhar a vida, ser dele um ator familial, profissional, social. Repre-
senta todo o sentido, de um lado, das atividades e instrumentos pedagógi-
cos, que permitem que cada jovem descubra e conheça o meio em que vive,
e, de outro lado, do trabalho de orientação, de acompanhamento para des-
cobrir suas competências e elucidar seus projetos.
• Mas, ao mesmo tempo, pensar globalmente, a fim de, como diz G. Pi-
neau, “tomar consciência dos laços entre a vida quotidiana e o mundo na
sua amplitude e sua complexidade física e social...”, tomar consciência, em
7
outros termos, de que “o coração do quotidiano bate no ritmo do mundo” .
E seguimos o autor brasileiro M. Gadotti quando afirma que “não se pode
opor o universal e o concreto, o geral e o singular, porque o universal é, ao
8
mesmo tempo, singular” . O que convida a fazer com que a educação de-
senvolva, segundo E. Morin, as diversas dependências cidadãs: do territó-
rio, da nação, das comunidades supranacionais e da Terra. De onde a
emergência desta perspectiva de educação planetária para compreender
e estar na aventura da humanidade, “uma aventura incerta, desconhecida,
9
na busca de seu destino” .
Esta consciência e esta articulação do local e do global exigem, para fazer
isto, uma aptidão para a abordagem multidimensional dos problemas, o desen-
volvimento do pensamento complexo, ou seja, na relação das coisas, na compre-
ensão das interações e das interdependências entre os fatos, os fenômenos,
os atores, bem como a aptidão para enfrentar a incerteza, as relações hu-
manas... Neste sentido, situei nesta obra a alternância como uma pedago-
gia da complexidade.
158
Por isto, as MFR devem manter o rumo de uma formação realista, ancora-
da num terreno, mas aberta e ampla.
Estas perspectivas supõem um método, conteúdos e “agentes educati-
vos” patenteados.
• O método existe com a alternância (cf. cap. 6), suas atividades e ferra-
mentas (cf. cap. 2), sua organização e sua gestão (cf. cap. 3), suas estratégias
relacionais (cf. cap. 4) e cognitivas (cf. cap. 7), seus animadores (cf. cap. 8).
• Os conteúdos. Sua trama é dada pelos programas oficiais cuja aquisição
está sendo verificada e sancionada pelos exames. Mesmo se tentam levar,
progressivamente, em consideração as evoluções e os saberes novos, suas
orientações permanecem, na maioria das vezes, tributárias de concepções
pedagógicas ancoradas no passado e na pedagogia tradicional. Além do
que, muitas vezes, são expressos numa linguagem complicada de especialis-
ta, até pouco compreensível, para o comum dos mortais. Por isto, revisões e
reorientações do fundo e da forma vêm se impondo para que estejam em
10
adequação com os tempos vindouros e inteligíveis para os beneficiários.
Após os fundadores, os que desenvolveram as MFR tinham criado ins-
trumentos pedagógicos e concebido programas que ultrapassavam aqueles
dos programas acadêmicos impostos, a fim de atingir as finalidades e as
metas de sua ação. Hoje, existe a necessidade de fazer igual para que os
“materiais” de formação respondam às exigências que o mundo de ama-
nhã virá reivindicar. Os conteúdos e os processos pedagógicos deverão
permitir aliar, ao mesmo tempo, a experiência do terreno, a implicação em
situações de tamanho real e a abertura às ciências, ao conhecimento do
universal, à compreensão do mundo, do planeta, ao desenvolvimento, à ci-
dadania, ao pertencimento local e da terra... para que se realize “a viagem
interior e a viagem universal”, e para que se engaja a escola ao longo da
vida toda.
• Os monitores inscrever-se-ão, mais do que nunca, nas “novas profis-
sões da formação” (cf. cap. 8) a serem construídas através de formações apro-
priadas e afirmarão, no seu estatuto, os seus papéis específicos, a serem re-
conhecidos tanto pelos poderes públicos quanto pelas instâncias do ensino
e da sociedade.
159
O movimento das MFR deve colocar-se, não somente na reflexão e na
multiplicidade de análises e de idéias que acontece hoje sobre o sentido e
as modalidades da formação de amanhã, sobre o devir do planeta Terra
e as responsabilidades das instâncias educativas na matéria, mas oferecer
respostas e realizações concretas. Existe aí conteúdo para dar sentido à sua
ação, para manter sempre uma “plenitude de sentido”.
Por isso, o desenvolvimento sustentável, a cidadania terrena, o devir pla-
netário... representam extraordinários temas de formação e de educação
porque possuem dimensão, porque interessam e implicam todos os prota-
gonistas de uma MFR (os jovens em formação, as famílias, os mestres de es-
tágio profissionais, as equipes educativas, os administradores), porque aliam
o território e o planeta, porque oferecem uma perspectiva. Ora, toda esta
atividade pedagógica só se torna formadora se tiver sentido, se for dimen-
sionada, se for uma aventura a ser vivida. Uma aventura que, com certeza,
oferece referências e segurança, desenvolve raízes, apropria espaços, mas que
seja, também, aberta e ampla, que se projete no mundo e abra novos cami-
nhos. Uma aventura para “o aprendizado das coisas a partir da vida quotidi-
ana e a abertura de novos caminhos planetários, democráticos e solidários”
para que “o menor gesto da vida quotidiana provoque um alargamento do
campo da consciência responsável”, segundo M. Gadotti.
Estamos convidados, desde agora, para operar uma mudança na nossa
maneira de perceber as coisas, de enxergar o mundo, de pensar, de agir...
11
Para operar “uma reeducação do olhar, do coração e dos sentidos” . Os jo-
vens devem se preparar para tanto e precisamos, de maneira educativa,
ajudá-los para que, tanto eles quanto nós, continuemos caminhando “para
chegar lá em tempo”.
Uma grande ambição para um pequeno movimento. Pequeno pelo ta-
manho, mas grande pelos seus projetos e suas realizações.
11. GADOTTI, M. Artigo 9 da Charte pour une ecopedagogie planétaire coopérative et une
éducation du futur. In: Habiter la Terre – Ecoformation terrestre pour une conscience pla-
nétaire. Paris: L’Harmattan, 2005.
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164
Índice
Sumário, 7
Prefácio (Juan Cano), 9
Aviso, 11
Introdução geral, 13
Primeira parte – Praticar a Pedagogia da Alternância, 19
Introdução, 19
1. Da idéia até a elaboração de uma Pedagogia da Alternância, 21
Uma caminhada criativa, 21
Um universo cheio de sentido, 24
Uma conquista da autonomia, 26
Conclusão, 27
2. As atividades e os instrumentos da alternância, 28
Os fundamentos de um dispositivo pedagógico, 28
O Caderno de Vida ou Caderno da Realidade: o instrumento
básico da Pedagogia da Alternância dos CEFFAs, 31
A Colocação em Comum: a atividade-junção dos dois
espaços-tempos da formação alternada, 43
A visita de estudo ou a intervenção: o encontro e a descoberta, 47
As aulas e os Cadernos Didáticos: a caminhada pelos saberes e
conhecimentos, 50
Os exercícios: a assimilação e a construção dos saberes, 54
As avaliações: a medição dos avanços, 59
3. A organização e a gestão da formação, 64
A organização e a gestão das seqüências de alternância pelo
“trabalho temático”, 65
165
A organização e a gestão do percurso educativo pelo “plano de
formação”, 70
A organização e a gestão do trabalho pedagógico pelo
“planejamento da sessão”, 77
4. A animação e a gestão das relações, 81
Uma rede de relações, 81
A gestão das relações entre o CEFFA, as famílias e os mestres de
estágio profissionais, 82
Favorecer o relacionamento do alternante com seus diferentes
campos da vida, 85
Um relacionamento para acompanhar a passagem da
adolescência, 90
Um relacionamento para dar vida à associação, 96
Conclusão, 98
Conclusão da primeira parte, 99
Segunda parte – Compreender a Pedagogia da Alternância, 101
Introdução, 101
5. A alternância no horizonte educativo, 103
Os componentes de uma situação de formação, 104
As correntes pedagógicas, 108
A pedagogia tradicional ou corrente pedagógica centrada no
docente e no programa, 108
A pedagogia ativa ou corrente pedagógica centrada na pessoa, 110
A pedagogia centrada na realidade ou pedagogia da
complexidade, 111
A emergência da Pedagogia da Alternância, 112
Experiências de longa data, 112
De uma prática paralela até o reconhecimento oficial, 116
Conclusão, 116
6. Os contornos e os componentes da Pedagogia da Alternância, 118
Verdadeiras e falsas alternâncias para finalidades diversas, 119
A abordagem binária e simplista da alternância, 121
A abordagem multidimensional e complexa da alternância, 122
Uma pedagogia para finalidades ambiciosas, 122
Uma negação dos isolamentos, das simplificações e dos
reducionismos, 123
166
Além de um método, um sistema educativo, 126
Conclusão, 128
7. Aprender na formação em alternância, 130
Aprender, 131
Um processo complexo com múltiplos fatores de influência, 131
A singularidade da aprendizagem, 133
O sentido, o significado e o projeto, 134
A informação, o saber e o conhecimento, 135
A transferência, 136
Aprender em formação alternada ou o alternante no coração de
uma complexidade a ser vivida e gerida, 136
Um caminhar no meio de espaços-tempos formativos com
finalidades diferentes, 137
Uma variedade de aprendizagens possíveis, 141
Ligar, articular e unificar, 142
Conclusão, 144
8. Vivenciar e fazer viver a alternância: uma nova profissão da
formação, 145
Monitor de CEFFA: uma profissão a viver dentro de uma
complexidade, 145
As condições de exercício de uma profissão, 148
Em favor do reconhecimento de uma nova profissão da
formação, 151
Conclusão, 152
Conclusão da segunda parte, 153
Conclusão geral – Um caminho-método para o amanhã e a era
planetária, 154
Bibliografia, 161
167