Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Lei 9.455/1997
Lei de Tortura
Edição 2023.1
Revisada
Atualizada
Ampliada
CS – TORTURA 2023.1 1
Olá!
O Caderno Legislação Penal Especial – Tortura possui como base as aulas do professor
Cleber Masson, do Curso G7 Jurídico. Posteriormente, complementado com as aulas do Prof.
Renato Brasileiro, também do G7 Jurídico.
Dois livros foram utilizados para complementar nosso CS de Legislação Penal Especial: a)
Legislação Criminal para Concursos (Fábio Roque, Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar),
ano 2017 e b) Legislação Criminal Comentada (Renato Brasileiro), ano 2020, ambos da Editora
Juspodivm.
Como você pode perceber, reunimos em um único material diversas fontes (aulas + doutrina
+ informativos + súmulas + lei seca + questões) tudo para otimizar o seu tempo e garantir que você
faça uma boa prova.
Por fim, como forma de complementar o seu estudo, não esqueça de fazer questões. É muito
importante! As bancas costumam repetir certos temas.
CS – TORTURA 2023.1 2
1. DIPLOMAS NORMATIVOS
Como se sabe, a DUDH foi proclamada pela Assembleia das Nações Unidas, em 10 de
dezembro de 1948.
Seu art. 5º prevê, claramente, que ninguém poderá ser submetido a tortura e a nenhuma
pena ou tratamento desumano, cruel e degradante:
A Convenção foi adotada pela Assembleia Geral da ONU em 1984 e entrou em vigor em
1987, sendo ratificada pelo Brasil em 1989.
1) 1ª Parte: diz respeito aos sujeitos ativos e passivos da tortura, sua definição e as
medidas a serem tomadas pelos Estados que a ela aderirem;
2) 2ª Parte: trata do Comitê e sua atuação, tais como membros, duração do mandato,
relatórios, posicionamentos sobre casos apresentados;
3) 3ª Parte: cuida da adesão dos Estados-partes à Convenção, bem como emendas que
possam vir a sugerir.
CS – TORTURA 2023.1 3
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
A CF, em seu art. 5º, III, prevê que ninguém será submetido a tortura e nem a tratamento
desumano e degradante. É o direito fundamental do ser humano de não ser torturado.
Além disso, o art. 5º, XLIII, considera a tortura um crime inafiançável e insuscetível de graça
e anistia. Portanto, a Lei de Tortura atende a um mandado expresso de criminalização. É um crime
equiparado a hediondo (recebe o mesmo tratamento).
Segundo o STF:
Salienta-se, ainda, que o art. 5º, XLIII é verdadeiro mandado de criminalização, o qual impõe
ao legislador, para o seu devido cumprimento, o dever de observância do princípio da
proporcionalidade como proibição de excesso e como proibição de proteção insuficiente.
O art. 233 do ECA foi o primeiro diploma infraconstitucional a tipificar o crime de tortura,
pautando-se na seguinte redação legal:
CS – TORTURA 2023.1 4
Infere-se, à vista disso, que até a revogação do dispositivo em 1997, o STF considerava o
art. 233 do ECA constitucional. Assim segue:
Obs.: a conduta típica do art. 233 do ECA migrou para a Lei de Tortura,
consagrando o princípio da continuidade normativa-típica, não
havendo, portanto, abolitio criminis.
Em matéria penal, a nova lei que redefine a conduta criminal, editada no curso
do processo, não provoca o fenômeno da abolitio criminis, ensejando,
todavia, a ultratividade da lei penal antiga mais benigna. - Embora o art.
233 da Lei nº 8.069/90 (ECA), que tipificava o crime de tortura contra
CS – TORTURA 2023.1 5
De origem norte-americana, está relacionada com o Direito Penal do inimigo e com a tortura.
Um primeiro entendimento, com base na CF, afirma que a proibição da tortura é absoluta.
Contudo, há quem defenda, seguindo o modelo de outros países, que como a proibição da
tortura é um direito fundamental, de modo que sua vedação é relativa, assim como os demais
direitos fundamentais, a exemplo do direito à vida (admite-se a legítima defesa no Brasil),
preservando-se, portanto, bens jurídicos de maior valor.
Imagine que João, por vingança, sequestra o filho de seus ex-empregadores. A polícia, após
a ligação de João solicitando o resgate, consegue localizá-lo em uma lanchonete. João nega-se a
informar o local do cativeiro, sendo irônico com o Delegado, e afirma que não irá falar a localização.
CS – TORTURA 2023.1 6
Por fim, ressalta-se que o art. 2º, item 2, da Convenção Contra a Tortura e Outros
Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, promulgada pelo Decreto 40/1991,
dispõe que: “em nenhum caso poderão invocar-se circunstâncias excepcionais tais como ameaça
ou estado de guerra, instabilidade política interna ou qualquer outra emergência pública como
justificação para a tortura”.
5. COMPETÊNCIA
Ademais, aplica-se o art. 70, caput, do CPP, a competência fixada pelo local da consumação:
Por fim, até o advento da Lei 13.491/2017, a tortura, mesmo quando praticada por militar,
não era julgada pela Justiça Militar, uma vez que não estava arrolada como crime militar.
Atualmente, a conduta praticada pelo agente, para ser crime militar com base no inciso II do art. 9º
do Código Penal Militar, pode estar prevista na legislação penal especial militar ou na legislação
penal “comum”, de modo que eventual tortura será julgada pela Justiça Militar.
6. PRESCRIÇÃO
O Estatuto de Roma (Decreto 4.388/02), em seu art. 7º, prevê que a tortura é um crime
contra a humanidade, quando cometida em ataque generalizado e sistemático, contra a população
civil, sendo imprescritível (art. 29), conforme apontado abaixo:
CS – TORTURA 2023.1 7
Salienta-se que as ações cíveis de indenização por tortura NÃO estão sujeitas à prescrição,
conforme entendimento do STF:
CS – TORTURA 2023.1 8
DOS CRIMES
CS – TORTURA 2023.1 9
AÇÃO PENAL
ELEMENTO SUBJETIVO
É o dolo.
PREVISÃO LEGAL
Estão previstas nas alíneas do art. 1º, I da Lei de Tortura, nos seguintes termos:
CS – TORTURA 2023.1 10
TORTURA
da vítima ou de terceira pessoa
OBJETIVIDADE JURÍDICA
Além disso, segundo Cleber Masson, tutelam garantias constitucionais e legais das pessoas
em geral frente aos arbítrios cometidos por funcionários públicos e por particulares.
OBJETO MATERIAL
Dito isso, nos 3 tipos de tortura do inciso I, do art. 1º, o objeto material é a pessoa física que
suporta a tortura, seja ela probatória, crime ou discriminatória.
NÚCLEO DO TIPO
O núcleo do tipo é nada mais do que o(s) verbo(s) do crime. No caso do inciso I, art. 1º, é
CONSTRANGER.
Por constranger entende-se a conduta de obrigar alguém a fazer algo contra a sua vontade,
retirando a sua liberdade de autodeterminação.
Para constranger a vítima, o agente se vale de alguns meios de execução, quais sejam:
• Violência à pessoa: emprego de força física contra a vítima, mediante lesão corporal ou
vias de fato.
Como elemento normativo do tipo penal, tem-se a provocação de sofrimento físico (corporal)
ou mental (psicológico) à pessoa. Assim, o agente constrange a vítima, mediante violência à pessoa
ou grave ameaça, causando-lhe um sofrimento físico ou mental.
CS – TORTURA 2023.1 11
Por outro lado, a ausência do sofrimento físico ou mental é causa de exclusão da tortura e,
consequentemente, de reconhecimento de delito menos grave, a exemplo da lesão corporal,
constrangimento ilegal, ameaça etc.
Por fim, ressalta-se que no crime de tortura o legislador vinculou sua ocorrência a três
finalidades (alíneas “a”, “b” e “c”), o que provoca uma limitação do alcance da lei, bem como deixa
outras hipóteses de tortura sem punição, a exemplo da pessoa que tortura por prazer ou sadismo.
SUJEITO ATIVO
Trata-se de crime comum ou geral, podendo ser praticado por qualquer pessoa. Por isso,
também é conhecida como crime jabuticaba, já que nos demais países, a tortura só pode ser
praticada por funcionário público.
Contudo, quando o delito for cometido por agente público, haverá a incidência de uma causa
de aumento da pena:
CS – TORTURA 2023.1 12
SUJEITO PASSIVO
A Lei de Tortura refere-se a “alguém”, de modo que este alguém será qualquer pessoa física.
Ademais, o sujeito passivo pode ser a pessoa contra quem se dirige a violência ou a grave
ameaça, bem como qualquer outra pessoa prejudicada pela conduta criminosa. Assim, é
CS – TORTURA 2023.1 13
ELEMENTO SUBJETIVO
É o dolo acrescido do especial fim de agir de cada uma das alíneas (finalidade específica).
Segundo Cleber Masson, há uma limitação indevida da aplicabilidade dos tipos penais
previstos na Lei 9.455/1997. Ex.: excesso de maldade e sadismo não irão incorrer no crime de
tortura.
2.7.1. Tortura-probatória
Segundo Masson, é a tortura que ainda está presente no dia a dia policial. Obviamente,
trata-se de prova ilícita, devendo ser desentranhada dos autos, segundo disposto no inciso LVI do
art. 5º da Constituição Federal:
Art. 5º, LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios
ilícitos.
Salienta-se, ainda, que o art. 1º, I, “a” da Lei de Tortura não se confunde com o art. 13, III da
Lei de Abuso de Autoridade, que possui a seguinte redação legal:
Para melhor visualização das diferenças entre os tipos penais, elaborou-se o quadro
comparativo abaixo:
CS – TORTURA 2023.1 14
Deve estar presente o especial fim de Deve estar presente o especial fim de
agir de prejudicar outrem ou beneficiar a obter informação, declaração ou
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por confissão da vítima ou de terceira
mero capricho ou satisfação pessoal. pessoa.
2.7.2. Tortura-crime
Ressalta-se que não haverá tortura quando a prática for de contravenção penal.
CS – TORTURA 2023.1 15
2.7.3. Tortura-discriminatória
Aqui, ao que parece, a lei não reclama a prática de nenhuma conduta por parte da vítima.
Contudo, segundo o doutrinador Cleber Masson, o dispositivo foi mal redigido, tendo em vista que
se exige uma ação ou omissão da vítima, em virtude da discriminação racial ou religiosa. Ex.: vítima
que deixa de entrar em determinado restaurante porque é ameaçada por conta de sua cor ou de
sua crença religiosa.
Ressalta-se que este dispositivo NÃO engloba outras formas de discriminação, tais como
ideológica e/ou política.
Por fim, quando ocorrer o crime de tortura discriminatória, estará caracterizado o concurso
com algum delito da Lei 7.716/1989, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de
cor.
CONSUMAÇÃO
CS – TORTURA 2023.1 16
MATERIALIDADE
O exame de corpo de delito, havendo vestígios, deve ser realizado. Contudo, não havendo
vestígios não é obrigatório, utiliza-se prova testemunhal, documental, a fim de suprir a ausência.
LEI 9.099/95
Aos crimes de máximo potencial ofensivo, a CF exigiu um tratamento mais severo. Por isso,
os crimes de tortura são incompatíveis com os institutos da Lei 9.099/95.
3. TORTURA-CASTIGO OU TORTURA-PUNIÇÃO
PREVISÃO LEGAL
CS – TORTURA 2023.1 17
OBJETIVIDADE JURÍDICA
Protege-se a incolumidade física e mental das pessoas sob guarda, poder ou autoridade do
agente, submetida a castigo pessoas ou caráter preventivo.
OBJETO MATERIAL
NÚCLEO DO TIPO
Por fim, destaca-se que a finalidade do agente é aplicar castigo pessoal (ação repressiva)
ou medida de caráter preventivo. Essas duas hipóteses são indicativas de correção e disciplina a
cargo de quem tem a obrigação ou o dever de vigilância, guarda ou autoridade sobre a vítima.
SUJEITO ATIVO
Trata-se de crime próprio ou especial, tendo em vista que somente pode ser autor desse
crime quem tiver a guarda da vítima ou exercer sobre ela alguma espécie de poder ou autoridade,
ainda que de forma momentânea.
CS – TORTURA 2023.1 18
Cita-se, como exemplo, o pai contra o filho; tutor contra tutelado; professor em relação ao
aluno.
SUJEITO PASSIVO
O tipo penal reclama um sujeito passivo qualificado. Por isso, a tortura castigo é considerada
um crime bipróprio, cujos sujeito ativo e sujeito passivo exigem qualidade especial.
Refere-se à pessoa que está sob guarda, poder ou autoridade exercida pelo sujeito ativo,
mesmo que de fato e em caráter momentâneo, a exemplo do filho, do interdito, do preso e do aluno.
Contudo, destaca-se que há uma exceção, podendo ser vislumbrada na hipótese em que há
submissão da vítima, pelo agente, ao seu poder de fato, não por força da questão de gênero ou do
matrimônio (ou união estável). Ex.: marido que castiga a mulher porque ela zombou do seu time de
futebol.
ELEMENTO SUBJETIVO
É o dolo, mas também se reclama um elemento subjetivo específico, qual seja, “como forma
de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo”.
CONSUMAÇÃO
CS – TORTURA 2023.1 19
O art. 136 do Código Penal prevê o crime de maus tratos. Assim segue:
Art. 136 - Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade,
guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia,
quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-
a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção
ou disciplina:
Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa.
§ 1º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
§ 2º - Se resulta a morte:
Pena - reclusão, de quatro a doze anos.
§ 3º - Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa
menor de 14 (catorze) anos.
Assim, para visualizar a distinção entre os delitos, tem-se o seguinte quadro comparativo:
CS – TORTURA 2023.1 20
Art. 1º, § 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita
a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da
prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.
Infere-se que o preso está cerceado de inúmeros direitos e, destarte, é incabível a tortura.
Perceba que o tipo penal não faz referência à violência à pessoa ou grave ameaça.
A LEP, em seu art. 3º, garante ao preso e ao internado todos os direitos que não forem
atingidos pela sentença, visto que o preso suporta a perda temporária do direito à liberdade.
OBJETIVIDADE JURÍDICA
Protege-se a incolumidade física e mental dos presos e das pessoas sujeitas a medida de
segurança.
OBJETO MATERIAL
NÚCLEO DO TIPO
Novamente, utiliza-se o verbo “submeter”. É uma figura equiparada ao caput, mas possui
autonomia em relação ao delito do caput.
CS – TORTURA 2023.1 21
Pode ser qualquer tipo de prisão, bastando que seja lícita (uma vez que a prisão ilícita
EXCLUI esse crime):
Imagine, por exemplo, que policiais façam a detenção ilegal de uma pessoa, simplesmente
em razão de seu “estereótipo criminoso” e, dentro da viatura, resolvem castigá-la com choques. Por
qual crime eles respondem? Como a prisão é ilegal, responderão pelo art. 1º, II da Lei de Tortura,
e não pelo art. 1º, § 1º. Os policiais valeram-se da autoridade de seus cargos para deter a pessoa
e castigá-la. Não houve prisão propriamente dita, e sim uma restrição ilegal da liberdade.
Frisa-se que no presente delito não há emprego de violência ou grave ameaça. A submissão
da vítima ao sofrimento físico ou mental ocorre “por intermédio da prática de ato não previsto em lei
ou não resultante de medida legal”.
Nesse liame, tem-se que ato não previsto em lei pode ser qualquer ação ou omissão
constrangedora e contrária à legislação em geral. Ex.: deixar o preso em cela escura e
extremamente fria.
Por outro lado, ato não resultante de medida legal é toda ação ou omissão abusiva, porque
desvinculada de fundamento legal. Ex.: sanção disciplinar de isolamento do preso na própria cela,
sem ato motivado do diretor do estabelecimento prisional (art. 53, inciso IV, da LEP).
SUJEITO ATIVO
1) 1ª Corrente: trata-se de crime próprio ou especial, pois o tipo penal pressupõe que tenha
o autor poder sobre a pessoa presa ou submetida a medida de segurança. A conduta
somente pode ser cometida por agente público.
CS – TORTURA 2023.1 22
ELEMENTO SUBJETIVO
CONSUMAÇÃO
TENTATIVA
CS – TORTURA 2023.1 23
Trata-se de crime de máximo potencial ofensivo, razão pela qual não se aplicam os
benefícios da Lei 9.099/95.
Art. 1º, § 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o
dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro
anos.
Imagine, por exemplo, que um Delegado de Polícia escuta que os policiais estão torturando
um preso na cela da delegacia. O Delegado possui a obrigação de evitar a ocorrência, de modo que
se não fizer nada, irá responder por tortura omissão.
Salienta-se que o tipo penal do art. 1º, § 2º funciona como norma especial em relação ao
art. 13, § 2º, do CP, já que o garantidor terá uma pena mais branda, conforme apontado abaixo:
O dever de evitação é aplicável àquele que tinha o dever de evitar, podia evitar e se omitiu.
Aqui, não há um ato de tortura propriamente dito, eis que o agente se omite quanto à
apuração de um crime de tortura já praticado.
CS – TORTURA 2023.1 24
Frisa-se que o § 2º do art. 1º da Lei de Tortura contém um equívoco, uma vez que tipifica
como crime menos grave a conduta de quem tem o dever de evitar a tortura e deixa de fazê-lo. Ora,
nos termos do art. 13, § 2º, do Código Penal, responde pelo resultado, na condição de partícipe,
aquele que deve e pode agir para evitá-lo e não o faz.
Por consequência, quando uma pessoa tortura a vítima para obter dela uma confissão, e
outra, que podia e devia evitar tal resultado, se omite, ambas respondem pelo crime de tortura do
art. 1º, I, a, da Lei 9.455/97 (que é delito mais grave), e não por este crime descrito no § 2º. Essa
solução atende ao preceito constitucional que estabelece que também responde pela tortura aquele
que, podendo evitar o resultado, deixa de fazê-lo (art. 5º, XLIII, da CF).
Dessa forma, o § 2º da Lei 9.455/97 somente será aplicável àquele que tem o dever jurídico
de apurar a conduta delituosa e não o faz. Como tal dever jurídico incumbe às autoridades policiais
e seus agentes, torna-se evidente a impossibilidade de aplicação do aumento do § 4º, I, da Lei
(crime cometido por agente público), já que isso constituiria bis in idem.
OBJETIVIDADE JURÍDICA
Protege-se a Administração da Justiça, uma vez que seus interesses não se compactuam
com o comportamento do funcionário público que não cumpre com seus deveres, ao se omitir diante
de um fato bárbaro, nada obstante tenha o dever de agir.
OBJETO MATERIAL
É a pessoa torturada.
NÚCLEO DO TIPO
O verbo é “omitir”, que significa a abstenção do agente público frente à atuação que lhe
competia em razão da sua posição funcional.
Trata-se de um crime omissivo próprio ou puro, eis que a omissão está descrita no próprio
tipo penal. Além disso, é crime acessório (de fusão ou parasitário), pois não existe de forma
isolada no mundo jurídico, depende da prática de um crime anterior. Ex.: houve um crime de tortura
e o funcionário público que tinha o dever de apurá-lo se omitiu.
Destaca-se que o dever de apurar não se confunde com o dever de instaurar procedimento
investigatório, pois o dever de apuração é mais abrangente do que o dever de simplesmente
instaurar um procedimento investigatório. É deixar de adotar as medidas para movimentar o
inquérito judicial.
CS – TORTURA 2023.1 25
SUJEITO ATIVO
É crime próprio ou especial, qualquer funcionário público que, tendo o dever jurídico de
apurar a prática da tortura, em qualquer de suas modalidades (art. 1º, inc. I, “a”, “b”, “c”, inc. II, e §
1º, da Lei 9.455/1997), queda-se inerte.
SUJEITO PASSIVO
ELEMENTO SUBJETIVO
CONSUMAÇÃO
TENTATIVA
LEI 9.099/95
CS – TORTURA 2023.1 26
6. FIGURA QUALIFICADA
Por fim, a tortura qualificada pela morte não se confunde com o homicídio qualificado pelo
emprego de tortura, em que há o animus necandi.
CS – TORTURA 2023.1 27
A pena será aumentada de um 1/6 até um 1/3 quando for praticada por agente público
(conceito está no art. 324 do CP).
Para incidir a majorante, o agente deve conhecer essa peculiar característica da vítima.
1) Fragilidade da vítima;
Aqui, tem-se a privação da liberdade como modo de execução da tortura, ou seja, utiliza-se
o sequestro para submeter a vítima a sofrimento físico ou mental.
A privação da liberdade deve ser o modo de execução da tortura para que incida essa
majorante. Quando a privação da liberdade se limita ao tempo necessário à realização da tortura,
não incide a majorante.
8. EFEITOS DA CONDENAÇÃO
CS – TORTURA 2023.1 28
Ressalta-se que não basta a perda do cargo, o agente deverá ficar impedido de realizar a
função pelo dobro do tempo da pena.
Somente após reabilitação poderá prestar novo concurso para a função. Ademais, os efeitos
da condenação só serão aplicados após o trânsito em julgado da condenação.
Por fim, salienta-se que os efeitos da condenação alcançam os crimes de tortura praticados
por policiais militares, de acordo com entendimento jurisprudencial do STF e STJ:
CS – TORTURA 2023.1 29
A Lei de Tortura, no art. 1º, § 6º, prevê que a tortura é inafiançável, repetindo a previsão
constitucional. Portanto, a tortura não admite liberdade provisória com fiança.
Diante disso, indaga-se: admite-se liberdade provisória sem fiança? Durante muitos anos,
prevaleceu o entendimento que não caberia liberdade provisória sem fiança. Atualmente, este
entendimento está superado, considerando que o legislador não pode limitar a concessão em
abstrato para determinados delitos, mesmo que sejam hediondos ou equiparados. Portanto, admite-
se liberdade provisória sem fiança.
Em razão disso, a doutrina sustenta que a concessão de liberdade provisória sem fiança
para crimes hediondos e equiparados deve ser cumulada com aplicação das medidas cautelares
diversas da prisão, sob pena de tratamento mais benéfico a um crime mais grave.
CS – TORTURA 2023.1 30
Destaca-se, todavia, que o art. 514 do CPP não se aplica aos crimes de tortura, tendo em
vista que só se aplica aos crimes funcionais típicos, conforme precedente do STJ:
A Lei 8.072/90 prevê que para os crimes hediondos, tráfico, terrorismo e tortura não será
possível a concessão de anistia, graça e indulto, nos seguintes termos:
Por outro lado, a Lei de Tortura prevê que não será possível a concessão de graça ou anistia.
1) 1ª Corrente: o indulto é cabível apenas para a tortura, tendo em vista que o § 6º é uma
norma especial e posterior à Lei de Crime Hediondos.
3) 3ª Corrente: não cabe indulto, nem mesmo para a tortura. Entende-se que graça é
gênero, do qual o indulto é espécie. Trata-se da corrente que prevalece na
jurisprudência, conforme os seguintes julgados do STF:
CS – TORTURA 2023.1 31
Pertinente destacar que a redação original da Lei de Crimes Hediondos previa o regime
integralmente fechado:
Redação Original
Art. 2º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de:
(...)
§1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em
regime fechado.
Em 1997, editou-se a Lei de Tortura que previu o regime inicialmente fechado, salvo para a
tortura omissão que poderá ser aberto ou semiaberto:
Em razão disso, a doutrina passou a sustentar que o mesmo tratamento deveria ser
dispensado aos crimes hediondos e equiparados, afirmando, ainda, que o art. 1º, § 7º da Lei de
Tortura havia revogado tacitamente o § 1º do art. 2º da Lei de Crimes Hediondos.
A jurisprudência, à época, entendeu que houve revogação, tendo inclusive sumulado o seu
entendimento nos seguintes moldes:
CS – TORTURA 2023.1 32
Art. 2º, § 1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente
em regime fechado.
§2º A progressão de regime, no caso dos condenados pelos crimes previstos
neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 da pena, se o apenado for
primário, e de 3/5, se reincidente. (Revogado pela Lei n. 13.964/19 – Pacote
Anticrime)
LEP, Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma
progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser
determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos: (Redação
dada pela Lei n. 13.964, de 2019)
V – 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela
prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
VI – 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:
a) Condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com
resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;
VII – 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na
prática de crime hediondo ou equiparado;
VIII – 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em
crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento
condicional.
De acordo com a doutrina, a própria CF impõe tratamento uniforme aos crimes hediondos e
equiparados, por isso o mesmo raciocínio deve ser aplicado ao crime de tortura. Nesse sentido, o
entendimento do STJ:
CS – TORTURA 2023.1 33
Art. 2º - O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido
cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira (princípio da
personalidade) ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira
(princípio do domicílio).
Portanto, para que o dispositivo seja aplicado é necessário que ocorra uma das 2 hipóteses
descritas: que a vítima seja brasileira ou que o autor da tortura esteja em local em que a legislação
pátria seja aplicável.
CS – TORTURA 2023.1 34