Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Processo nº 113/19.5T8LGA-B.E1
Sumário
Texto Integral
I. Relatório
1. No processo especial de insolvência em que foi declarado insolvente (…), de
nacionalidade holandesa, com domicílio na Travessa da (…), Urbanização (…),
Lote 2, em Portimão, vieram os credores (…) e (…), requerer a apreensão a
favor da massa insolvente dos veículos automóveis com as matrículas (…) e (…
), registados a favor de (…), mulher do insolvente, do recheio do imóvel em
que esta exerce a atividade de exploração de alojamento local e dos depósitos
das contas bancárias em nome desta.
Alegaram, em resumo, que tais bens são bens comuns do casal, segundo o
Código Civil do estado da Mongólia, ao caso aplicável uma vez que o
casamento entre o insolvente, natural dos Países Baixos e (…), natural da
Mongólia, foi celebrado em território Mongol.
1 / 13
2. O requerimento mereceu despacho assim concluído:
« (…) determino que o Sr. Administrador proceda à apreensão do direito do
insolvente nos bens comuns do casal que deverão ser considerados todos
aqueles que foram adquiridos após a celebração do casamento, ocorrida em
10 de Janeiro de 2016.»
II- O elenco dos factos dados como provados deve ser ampliado de modo a
integrar essa factualidade.
V- Norma indevidamente aplicada: artigo 1717.º do CC. Norma que devia ter
sido aplicada: 1720.º, n.º 1, alínea b), do Código Civil.
2 / 13
4. Consagra o artigo 638.º, n.º 1, do CPC que o prazo de interposição de
recurso nos processos urgentes é de 15 dias.
10. O despacho, que decidiu a admissão do recurso sub judice, vai enfermado
de nulidade processual inominada, nos termos do artigo 195.º, n.º 1, do CPC.
13. Razão pela qual deverá este douto tribunal de recurso devolver os autos à
procedência, e baixar ao tribunal a quo para que seja decorrido o prazo para o
contraditório do recurso.
14. Nos termos do artigo 636.º, n.º 2, do CPC, deverão os autos descer à
primeira instância por razões de insuficiência e falta de elementos da matéria
de facto e para a densificação da produção de prova.
3 / 13
15. O despacho recorrido, determinou que a lei competente aplicável para
regular o regime de bens do casamento entre o Recorrente, Insolvente e a sua
mulher era a lei portuguesa, por força do artigo 53.º, n.º 2, do CC.
16. Fundou o tribunal a quo a sua decisão, porquanto não tendo os nubentes a
mesma nacionalidade e não tendo os nubentes residência habitual comum à
data do casamento, aplicar-se-ia a lei da primeira residência conjugal.
De outro ponto,
20. Sendo esta uma questão incidental ao processo de insolvência, faltam nos
autos elementos e matéria de facto indispensáveis – e decorrente produção de
prova – para se determinar qual a residência dos nubentes à data do
casamento, pelo que é impossível afastar a condição hierarquicamente mais
rica, em favor da última.
21. Tal insuficiência apenas pode ser suprida com a determinação superior da
remessa dos autos à procedência para uma densificação dos elementos
fácticos e da matéria de facto a ser provada, para a boa, cabal e costumeira
realização da justiça material.
4 / 13
24. O casamento entre ambos foi celebrado em território Mongol e sob a
forma de casamento regulado pela lei do Estado Mongol.
25. O artigo 6.1 da Lei da Família Mongol conjugado com o artigo 6.3,
consagra que se um cidadão mongol casar com um cidadão estrangeiro em
território nacional (Mongólia), este fica vinculado à lei que regula o casamento
na Mongólia (neste caso, a Lei da Família, de 11 de junho de 1999).
No outro prisma,
28. Ora, como resulta dos autos, neste caso os cônjuges estabeleceram-se em
Portugal.
Diferentemente,
32. O ordenamento jurídico dos Países Baixos, lei pessoal do recorrente, por
força da Convenção de Haia, não se considera competente para regular o
regime de bens do caso em litigância neste pleito.
5 / 13
Assim sendo,
34. Considerando que a lei dos Países Baixos não se oferece como competente
e;
Destarte,
E,
39. Nos termos do artigo 132.º do Código Civil Mongol, todas as propriedades
móveis e imóveis registadas em nome de (…) e todo o seu rendimento com
atividades profissionais após a data do casamento, 10/01/2016, são património
comum do Insolvente, aqui Recorrente.
6 / 13
Na resposta às alegações do recurso os Recorridos suscitam a
extemporaneidade do recurso e a nulidade do despacho que o admitiu;
argumentam, que o prazo de 15 dias para a interposição do recurso começou a
correr em 9/3/2021, terminou a 23/3/2021 e o recurso foi interposto a
24/3/2021 e alegam que o despacho que admitiu o recurso foi proferido antes
de decorrido o prazo para a apresentação das contra-alegações.
Tendo em conta que o objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões nele
incluídas, salvo as questões de conhecimento oficioso (artigos 635.º, n.º 4 e
608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), que nos recursos se
apreciam questões e não razões ou argumentos, que os recursos não visam
criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo
conteúdo do ato recorrido, são questões a decidir: (i) no recurso, se o
casamento do Insolvente o foi segundo o regime da separação de bens (ii) na
ampliação do objeto do recurso, se ao caso é aplicável a lei mongol.
III- Fundamentação.
1- Factos
7 / 13
Sem impugnação, a 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
2. Direito
8 / 13
O Recorrente não converge com esta solução, argumentando que à data do
casamento tinha mais de 60 anos, como consta de documentos juntos aos
autos, não impugnados e por tal razão, o casamento face à lei portuguesa, por
aplicável, considera-se contraído sob o regime da separação de bens (artigo
1720.º, n.º 1, alínea b), do CC), defendendo que a sua data de nascimento
deve ser aditada aos factos provados e, por último, indeferida a pretensão dos
credores de apreensão de bens da sua mulher.
9 / 13
ser apreendidos para a insolvência do cônjuge marido, ora Recorrente (artigo
1735.º, do Código Civil).
10 / 13
As convenções antenupciais e o regime de bens do casamento é definida por
esta norma de conflitos própria da lei portuguesa segundo três elementos de
conexão sucessivos: (i) a nacionalidade dos nubentes, caso seja a mesma; na
falta de nacionalidade comum, (ii) a residência habitual comum à data do
casamento e, faltando esta, (iii) a primeira residência conjugal.
Conclusão acertada, a nosso ver, face à lei e aos factos que se provam.
11 / 13
com o argumento que estes bens, na ausência de convenção antenupcial, são
pertença de ambos cônjuges, à luz do Código Civil Mongol, aplicável atenta a
nacionalidade dos nubentes e a celebração do casamento em território mongol
(cfr. requerimento de 5/5/2020, refª citius 7863703).
12 / 13
A norma de conflitos ao caso aplicável é, assim, a constante do artigo 53.º e
não a consagrada no artigo 25.º, ambos do Código Civil, o que basta para
afirmar a improcedência da argumentação dos Recorridos construída no
pressuposto da aplicação da lei pessoal dos cônjuges de nacionalidades
diferentes à substância e efeitos do regime de bens do casamento.
3. Custas
IV. Dispositivo.
Delibera-se, pelo exposto:
a) em julgar improcedente a ampliação do objeto do recurso;
b) em julgar procedente o recurso e, em consequência, revoga-se a decisão
recorrida e indefere-se o requerimento de apreensão de bens adquiridos e/ou
registados em nome de (…), mulher do insolvente, bem como dos proventos
por ela obtidos no exercício da sua atividade profissional.
Custas pelos Recorridos.
Évora, 17/6/2021
Francisco Matos
José Tomé de Carvalho Mário Branco Coelho
13 / 13