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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

@ (PROCESSO ELETRÔNICO)
CRLC
Nº 70074220856 (Nº CNJ: 0186200-18.2017.8.21.7000)
2017/CÍVEL

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO


TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C
MEDIDA CAUTELAR FISCAL. LIMINAR.
Restando preenchidos os pressupostos dos artigos 1º e
3º da Lei 8.397/92 quanto à constituição dos créditos
tributários, bem como evidenciada a verossimilhança da
formação de grupo econômico de fato, que lança mão de
práticas de esvaziamento e blindagem patrimonial por meio
de fraudes ao ICMS (art. 2º, incisos V, alíneas “a” e “b”, e
IX, da Lei 8.397/92), entendo preenchidos os requisitos para
o deferimento da cautelar fiscal como determinado na
origem.
Caso dos autos em que a autonomia patrimonial dos
empreendimentos do grupo culmina, em tese, em blindagem
patrimonial, na medida em que as lojas de varejo realizaram
operação de venda de mercadoria que eram usualmente
pagas com cartões em favor da pessoa jurídica do grupo que
supostamente administrava créditos, mas que, ao que se tem
perfunctoriamente, acumulava tal faturamento, frustrando a
cobrança do ICMS declarado e impago pelas demais
componentes do grupo.
RECURSO DESPROVIDO.

AGRAVO DE INSTRUMENTO PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Nº 70074220856 (Nº CNJ: 0186200- COMARCA DE SANTA MARIA


18.2017.8.21.7000)

B.E.C.A.E.E. AGRAVANTE
..
B.A.C.E. AGRAVANTE
..
P.S.B. AGRAVANTE
..
P.N.B. AGRAVANTE
..
B.C.C.L. AGRAVANTE
..
P.S.B.C.L. AGRAVANTE
..
M.R.S.B. AGRAVANTE
..
E.R.G.S. AGRAVADO
..

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

@ (PROCESSO ELETRÔNICO)
CRLC
Nº 70074220856 (Nº CNJ: 0186200-18.2017.8.21.7000)
2017/CÍVEL

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores
DES. IRINEU MARIANI (PRESIDENTE) E DES. NEWTON LUÍS MEDEIROS
FABRÍCIO.
Porto Alegre, 22 de novembro de 2017.

DES. CARLOS ROBERTO LOFEGO CANÍBAL,


Relator.

RELATÓRIO
DES. CARLOS ROBERTO LOFEGO CANÍBAL (RELATOR)
Trata-se de agravo de instrumento interposto por BRANDT ESPORTE
COMERCIO DE ARTIGOS ESPORTIVOS EIRELI E OUTROS contra o ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL, tendo em vista a decisão que deferiu a indisponibilidade de bens e
o aresto dos recebíveis de cartão de crédito dos recorrentes, proferida nos autos da ação
declaratória de responsabilidade c/c cautelar fiscal n° 9002615-68.2017.8.21.0027.
Inconformados, recorrem os autores. Referem que a indisponibilidade dos
bens é medida drástica que viola o princípio da dignidade da pessoa humana, não podendo
ser estendida às pessoas físicas como foi feito, considerando que a responsabilidade pessoal
é exceção e depende de dilação probatória.
Sustentam que não há prova nos autos que comprovem a ação fraudulenta
por meio do dolo, conluio ou ato ilegal que vise ao não pagamento do ICMS, ou mesmo de
grupo econômico com fins ilegais a ensejar a consequente responsabilidade solidária, além

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Nº 70074220856 (Nº CNJ: 0186200-18.2017.8.21.7000)
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da ausência de elementos que indiquem abuso da personalidade jurídica a viabilizar a


desconsideração desta e a responsabilização pessoal dos sócios. Colaciona julgados.
Advogam a ausência de responsabilidade solidária pela simples
caracterização de grupo econômico, discorrendo sobre a diferença entre interesse econômico
e interesse jurídico para tal aferição.
Afirmam que estão ausentes os requisitos que prestam para configurar a
desconsideração da personalidade jurídica, previsto no art. 50, do Código Civil, bem como,
afirmam que não há sonegação de imposto, pois todo o imposto devido foi declarado.
Pede pela reforma da decisão que deferiu a tutela provisória, para que sejam
integralmente desconstituídas todas as medidas deferidas liminarmente, relacionadas à
indisponibilidade dos bens/patrimônio, ativos financeiros e demais receitas dos agravantes,
vez que a manutenção dos atos causará aos agravantes e a terceiros danos imensuráveis e
irreparáveis, em afronta ao princípio da livre iniciativa, da dignidade da pessoa humana e
demais normas infraconstitucionais.
Requer, ainda, o prequestionamento dos artigos e legislações relacionados
(art. 50 e 167 do Código Civil, 124, I, do Código Tributário Nacional e arts. 1º, III, 5º XIII,
146, III, “d” e 170, parágrafo único), todos da Constituição Federal.
Houve resposta por parte do Estado (fls. 767 a 781 dos autos eletrônicos).
O órgão do Ministério Público opina pelo conhecimento e desprovimento do
recurso (fls. 786 a 790 dos autos eletrônicos).
É o relatório.

VOTOS
DES. CARLOS ROBERTO LOFEGO CANÍBAL (RELATOR)
Conheço do recurso, porquanto preenchidos os pressupostos de
admissibilidade.
Eminentes colegas, como adiantado quando do recebimento do agravo,
penso ser o caso de manutenção da decisão de origem, pelos fundamentos que passo a expor:

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2017/CÍVEL

1. Da caracterização, a priori, de grupo econômico de fato com


responsabilidade tributária solidária e/ou hipótese de responsabilidade por abuso de
personalidade jurídica.
Veja-se a situação, como trazida, evidencia em tese a prática de fraude ao
fisco Estadual por meio de grupo econômico de fato.
Isto porque as empresas são constituídas por sócios de núcleo familiar
comum, com a exploração do mesmo nicho de mercado e com usual prática de operações
entre elas, recebimento de mercadoria em um mesmo local, rateio de serviços de marketing e
uso de uma mesma identidade comercial. “BRANDT SPORT”, ou seja, envidam “esforços
para a realização dos respectivos objetos, com participar de atividades ou empreendimentos
comuns”, caracterizando grupo econômico (art. 265 da Lei 6.404/76) e não foi negado pelos
agravantes.
Por outro lado, há indicativos de blindagem e confusão patrimonial, como
o suposto desvio de recebíveis de cartão de crédito das empresas que possuem dívida
consolidada vultosa em face da suposta administradora (tal elemento consiste no cotejo de
operações mercantis realizadas, e.g., pela BRA COMERCIO DE CALCADOS LTDA, que
emite determinada nota fiscal de venda, mas realiza a operação do cartão de crédito em favor
da BRANDT ADMINISTRADORA DE CREDITO EIRELI).
Aliás, a situação referida (operação praticada por uma das empresas e
recebimento do valor do negócio por outra) permite vislumbrar abuso de forma da BRANDT
ADMINISTRADORA DE CREDITO EIRELI (art. 50 do CC e art. 135, inciso III do CTN),
que, em vez de simplesmente administrar crédito, o acumula sob a roupagem de
personalidade jurídica autônoma, inviabilizando, por exemplo, o encontro de ativo em nome
das empresas devedoras do grupo perante o Estado.
Outrossim, a verificação dessa situação inclusive desvela o interesse
jurídico comum nas operações que constituem o fato gerador do ICMS, a culminar
solidariedade tributária (art. 124, inciso I do CTN).
Pertinente também o destaque da existência de verdadeira remessa de
mercadorias entre as empresas, que formalmente foram qualificadas como compra e venda
entre elas, mas por valores irrisórios (R$ 1,00), confirmando a prática simulada de negócios.

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Destes fatos, constata-se, em juízo perfunctório, a efetiva caracterização de


um grupo econômico de fato, à luz das premissas dispostas nos capítulos XX e XXI da Lei
6.404/741, em especial pela previsão dos artigos 265 e 266 da referida legislação 2, que, por
meio de um planejamento tributário ilegal (evasão fiscal), perpetrado, ao que se tem, por
meio de fraude, enseja, a priori, hipótese de responsabilidade tributária solidária entre as
empresas integrantes do grupo, na forma do art. 124, inciso I, do CTN, e até mesmo de
possibilidade de responsabilização dos sócios, na forma do art. 135, inciso III do CTN.
2. Da presença dos requisitos para a cautelar fiscal.
Banda outra, para o deferimento da cautelar fiscal, devem estar presentes os
requisitos dos artigos 1º, 2º e 3º da Lei 8.397/92.
No caso, os créditos pelos quais respondem as empresas estão, em princípio,
efetivamente constituídos (preenchimento do disposto nos arts. 1º e 3º da Lei 8.397/92),
constituindo um montante global de R$ 11.790.208,62 (BRANDT ESPORTE COMERCIO
DE ARTIGOS ESPORTIVOS EIRELI - R$ 6.668.007,56; BRA COMERCIO DE
CALCADOS LTDA. - 1.481.545,92; e PATRICIA SANTANA BRANDT E CIA LTDA. -
3.640,655,14)
Por outro lado, tem-se que o devedor foi “notificado pela Fazenda Pública
para que procedesse ao recolhimento do crédito fiscal” e “deixou de pagá-los”, bem como,
nos termos da blindagem patrimonial antes delineada, pôs “seus bens em nome de
terceiros”, de maneira que caracterizada a hipótese do art. 2º, inciso V, alíneas “a” e “b”, da
Lei 8.397/92.

1
Os referidos capítulos dispões, respectivamente, sobre as Sociedades Coligadas,
Controladoras e Controladas e Grupo de Sociedades, que, embora não caracterizados
formalmente no caso, são as figuras legais mais aproximadas da realidade fática explicitada
e posta em análise no presente caso.
2
“Art. 265. A sociedade controladora e suas controladas podem constituir, nos termos deste
Capítulo, grupo de sociedades, mediante convenção pela qual se obriguem a combinar
recursos ou esforços para a realização dos respectivos objetos, ou a participar de atividades
ou empreendimentos comuns.
§ 1º A sociedade controladora, ou de comando do grupo, deve ser brasileira, e exercer,
direta ou indiretamente, e de modo permanente, o controle das sociedades filiadas, como
titular de direitos de sócio ou acionista, ou mediante acordo com outros sócios ou acionistas.
§ 2º A participação recíproca das sociedades do grupo obedecerá ao disposto no artigo 244.
Art. 266. As relações entre as sociedades, a estrutura administrativa do grupo e a
coordenação ou subordinação dos administradores das sociedades filiadas serão
estabelecidas na convenção do grupo, mas cada sociedade conservará personalidade e
patrimônios distintos.”
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Ainda quanto ao preenchimento das hipóteses do art. 2º do diploma legal da


cautelar fiscal, é possível verificar que o esvaziamento patrimonial caracterizou “ato que
dificulta ou impede a satisfação do crédito”, na forma do inciso IX do precitado dispositivo.
Portanto, preenchidos os requisitos para a decretação.
Dessa forma, o desprovimento do recurso é imperativo categórico que se
impõe.
ISSO POSTO, nego provimento ao recurso.
É o voto.

DES. NEWTON LUÍS MEDEIROS FABRÍCIO - De acordo com o(a) Relator(a).


DES. IRINEU MARIANI (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. IRINEU MARIANI - Presidente - Agravo de Instrumento nº 70074220856, Comarca


de Santa Maria: "À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO."

Julgador(a) de 1º Grau:

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