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Alê sempre foi um solteiro convicto.

Suas saídas chegavam, no máximo, a


três encontros. Por isso achou muito conveniente conhecer uma mulher
que compartilhava das mesmas ideias. Antes mesmo que conseguisse
deixar claro que não queria envolvimento, Gabi colocou as cartas na mesa e
poupou seus esforços. Filho único e herdeiro de uma rede imobiliária que
rende milhões, nunca escondeu sua aversão ao casamento. Por
consequência, seus pais decidiram dar um empurrãozinho: condicionar a
herança a um neto, fruto do matrimônio. Alexandre precisa casar. Quem
seria a mulher ideal para ajudá-lo a sair dessa?
Como diria Chorão (CBJr.), Gabriela Burnier "é daquelas que tu gosta na
primeira, se apaixona na segunda e perde a linha na terceira", de tal modo,
ela percebeu que quando extrapola esse limite as coisas saem dos trilhos.
Não que ela tenha problemas em sair da linha, Gabi é personificação da
liberdade, não gosta de âncoras ou pesos que a impeçam de voar... Linda,
rica e bem resolvida, por que aceitaria uma proposta de casamento?
Estava há exatos quinze minutos olhando para o teto, sabia disso porque
a mulher nua ao meu lado fazia questão de, irritantemente, me informar cada
um dos segundos em que estou calado. Como se eu não tivesse notado.

Quando meus pais me ligaram segunda-feira pela manhã, soube que


tinha algo errado. Talvez fosse o fato de o meu próprio pai ter ligado para
informar que a minha mãe havia marcado um jantar. Minha mãe não era de
mandar recados. Era objetiva e franca, nisso éramos muito parecidos. Por isso o
meu estranhamento. Preocupado, procurei-a antes do dia do jantar. Eu
precisava descartar da minha mente todas as projeções drásticas que insisti em
criar.

Acabei por encontrar minha mãe na biblioteca da casa com o seu clube
do chá. Um grupo de mulheres que se reuniam uma vez por mês para traçar
eventos beneficentes e, claro, falar dos filhos e maridos. Fui expulso do local,
pois os encontros eram de mulheres e ali não cabiam homens, mas não saí sem
antes assegurar que estava tudo bem com a sua saúde e a do meu pai.

Mesmo assim sensação de que algo ruim estava por vir permaneceu.

Hoje era o dia do tal jantar. Ansioso, encerrei as minhas atividades na


empresa mais cedo e levei ao motel minha mais nova amiga. Afinal, eu precisava
relaxar e o sexo era o melhor ansiolítico que eu conhecia.

— Acho que uma massagem pode te ajudar — a voz feminina sussurrou


em meu ouvido, na medida em que suas mãos traçavam um caminho vagaroso
pelos músculos da minha barriga até chegar na minha ereção. Ela era hábil com
as mãos. Fechei os olhos pronto para me entregar a mais uma rodada de prazer,
quando meu celular tocou.

— Deixa tocar, amor... — quando ela concluiu a frase, eu já havia


esticado o braço e alcançado o celular. Era a minha secretária.

— O senhor pediu que eu lhe informasse qualquer atitude suspeita — ela


disse assim que atendi.

— Sim...

— Desliga o celular... — a mulher pediu antes da sua boca tocar a minha


glande. Meu corpo reagiu no automático, mas a minha mente estava
completamente concentrada no meu diálogo por telefone.

— O advogado da família vai estar no jantar, depois que o senhor saiu da


empresa o mesmo se reuniu com o seu pai no escritório, ficaram por muito
tempo lá dentro. E quando o senhor Barros saiu eles se despediram com "até
daqui a pouco".

— Que merda! — esbravejei — Mais alguma coisa?

— Acho que o senhor deveria estar preparado para tudo.

— Estarei — encerrei a ligação.

Que Deus me ajude!

— Sou toda sua! — A mulher anuncia rolando para o lado de pernas


abertas.

Fiz o que ela esperava que eu fizesse e fodi forte e rápido. Nada tinha a
ver com a minha pressa em enfrentar o tal jantar.

— Meu amor, achei que não viria mais — minha mãe levantou-se para
me cumprimentar com um beijo e um abraço apertado.

— Fiquei preso no trânsito — respondi, beijando-a de volta.

Depois do motel, dirigi até a minha casa para tomar banho e me aprontar
para o jantar. Saí de lá trinta minutos antes do horário combinado, mas acabei
ficando preso no trânsito caótico no horário do rush.

— Tudo bem, filho? — foi a vez do meu pai me cumprimentar com um


tapinha nas costas. Assenti e abracei o velho.

— A que devo a honra da sua companhia, senhor Barros? Da última vez


que o advogado da família jantou conosco, meu pai me tornou sócio minoritário
da imobiliária. Na época seu pai era o advogado, estou realmente curioso —
sorri antes de apertar a mão do Rafael. O pai dele era advogado e amigo do meu
pai, mas se aposentou e passou os clientes para o filho.

— Não perderia a oportunidade de sair na coluna social ao lado do


Alexandre Fragoso — exibe um sorriso desdenhoso.

Eu e o Rafael discordávamos de muitas coisas, uma delas era o seu


incômodo em eu aparecer frequentemente em blogs e colunas de celebridades
por conta da minha vida agitada à noite. Ele argumentava que eu era uma
péssima vitrine para a imobiliária, argumento que eu rebati quando mostrei que
ele era advogado e não gerenciador de imagem, além disso a empresa vinha
crescendo desde que eu assumi a administração geral.

— Bebem alguma coisa? — meu pai indagou.


— Whisky! — pedi.

— Água com gás — Rafael tentou se mostrar profissional.

— Querido, para mim algo doce, mas com álcool — minha mãe pediu.

Fizemos o pedido do jantar enquanto tomávamos nossas bebidas.


Observei o exato momento em que a mão do meu pai enlaçou a da minha mãe
sobre a mesa e eles trocaram um olhar cúmplice, o mesmo olhar que via
enquanto crescia. Eles sempre foram amigos, companheiros, cúmplices. Era
bonito ver que a relação deles continuava a mesma com o passar dos anos.

— Alexandre, meu filho, chamamos você aqui para falarmos do nosso


testamento...

Anos atrás, logo após a morte da mãe do Marcos, minha mãe decidiu
fazer um testamento e convenceu meu pai dessa ideia. De um tempo para cá, ela
vinha comentado sobre deixar uma parte de tudo que tinha para a caridade, por
isso, certo alívio me percorreu ao ouvir esse anúncio. Como eles garantiram
mais cedo que estavam bem de saúde, esse jantar só podia significar o anúncio
oficial dessa mudança e talvez informar quais os locais exatos para aplicar o
dinheiro futuramente. Ou ainda, vincular a minha participação nas ações das
instituições. O que eu faria de bom grado.

Ajudar os outros alivia a nossa dor. Não gostava de pensar sobre perder
alguém que eu amava novamente, mas sabia que era um passo importante para
a aceitação.

Ouvi exatamente o que esperava e sorri aliviado. Passei dias sofrendo


por antecipação para isso? Minha mente já projetava formas de comemorar a
falta de notícia ruim quando pedimos a sobremesa. Foi então que as palavras
"casamento" e "filho" fizeram meu estômago revirar. Devo ter ouvido errado...
Tentei prestar atenção no que era proferido.

— É isso Alexandre, você é nosso único filho e sua mãe se preocupa


muito com você. Nós nos preocupamos, na verdade.

— Eu sei, pai. Mas acho que não entendi direito.


— Você não estava prestando atenção? Nós nos preocupamos com você
— minha mãe repetiu.

— Essa parte eu entendi, não precisam se preocupar. Faz tempo que sou
maior de idade — ergui as sobrancelhas.

— É isso que as mães fazem: se preocupam mesmo quando os seus


meninos crescem e se tornam homens e você precisa de uma mulher — minha
mãe disse, fitando-me com carinho e por mais que eu tenha todos os motivos
para querer brigar, sou incapaz de atacá-la.

— Uma mulher não me protegeria do mundo, nem se fosse a própria


mulher maravilha — rebati.

— Uma mulher não, mas a sua esposa sim. Veja o Marcos, como ele se
tornou um homem ainda melhor depois que encontrou a Fernanda...

Marcos Castro era o meu parceiro de noitada, amigo de longa data e um


advogado muito competente. Acontece que ele se apaixonou loucamente por
sua chefe, abandonou o time dos solteiros e entrou, com um enorme sorriso de
satisfação, no mundo dos casados. Não era algo que eu desejava para mim no
momento, talvez nunca desejasse.

— Isso foi um golpe de sorte. Posso citar inúmeros amigos que a vida se
tornou um inferno depois do casamento.

— E eu posso citar, além do caso do seu melhor amigo, mais outros dez
de pessoas próximas a nós que são muito felizes.

— Pai, o senhor precisa ouvir o meu lado — apelei para a sua


racionalidade masculina.

— A nossa decisão está tomada e já registrada — meu pai informou e eu


encarei o Rafael. Os olhos do advogado brilhavam, ele estava se divertindo com
a situação.

— Então é isso, eu terei que casar para ser herdeiro de vocês?

— Não somente casar, Alexandre — o advogado respondeu com um


sorriso imbecil no rosto — Seus pais condicionaram o cargo que ocupa na
empresa, bem como toda a herança a um casamento cujo fruto seja um herdeiro
legítimo.

Caralho!

Puta que pariu!

Porra!

Um a um os xingamentos apareceram em minha mente, eu estava


arquitetando uma maneira de sair daquela situação, um casamento por
conveniência não seria tão difícil de conseguir, mas um filho...

— Aqui está a sua cópia — meu pai estendeu o documento e peguei-o


apressadamente da sua mão. Deve ter uma brecha que me salve dessa enrascada.
Ali mesmo, sentado em frente aos meus pais, folheei até chegar ao ponto
principal.

"A partir da assinatura deste, fica estabelecido o prazo máximo de dois


anos para que o beneficiário Alexandre Fragoso Maia cumpra as cláusulas acima,
o não cumprimento do prazo supracitado acarretará a execução das restrições".

— Dois anos? — indaguei — Só pode ser brincadeira. Encontrar a tal


mulher dos sonhos e ter um filho em dois anos?

— Se não estabelecêssemos um prazo você poderia protelar por anos a


fio... — o advogado justificou.

— Rafael, obrigado. A reunião acabou, agora teremos uma conversa em


família — meu pai dispensou o advogado que se despediu e nos deixou a sós no
restaurante.

Permaneci com o olhar atento ao documento... Deve existir uma forma de


contestar isso... Preciso pedir ajuda ao Marcos.

— Filho, fizemos isso para seu bem.

— Mãe, não quero discutir, mas para o meu bem isso não tem nada. Não
estou falando só pela herança, mas também pelo meu trabalho. Vocês estão me
obrigando a abrir mão da única coisa que aprendi a fazer.

— Você não precisa abrir mão de nada, é só se casar — meu pai via o
caso como fácil.

— Isso é um absurdo!

— Fizemos isso porque você precisa ser feliz.

— Eu sou feliz, merda! — falei alto chamando a atenção dos presentes.

— Você sabe que precisa virar a página. Já se passaram muitos anos


desde... — minha mãe interrompeu a fala do meu pai com um toque em sua
mão.

Havia muitos anos que aquele olhar não era dirigido a mim. Aquela
expressão que fez parte dos meus dias quando tudo aconteceu. Eu odiava o que
aquele olhar significava: pena.

— Com licença — levantei da mesa, deixando os dois para trás.

Assim como eu havia deixado o meu passado.


O mundo está tentando me dizer que estou velha. E que preciso mudar
de vida. Sinto isso, ele está mandando recados insistentes. Desvio de cada um
deles, por mais difícil que seja.

Tudo começou quando Fernanda Albuquerque uma das melhores


amigas, senão a melhor, engravidou e em seguida decidiu constituir família... Foi
um golpe fatal nas minhas farras e planos de viagens loucas, como sempre
fazíamos. Tudo bem, ela está feliz, muito mais do que já foi um dia, diga-se de
passagem.

Quase ao mesmo tempo a Soraia casou com o gato manso, ex-noivo da


Thalita, cunhada da Fernanda... Confuso né? Enfim, Soraia casou (rapidamente e
sem festa nem nada) com João Pedro. Duas amigas casadas oficialmente.
Embarcando nessa onda me vem a Lú e atende aos apelos da família: vai casar
na igreja. Mesmo já convivendo com Emerson há algum tempo, fará a cerimônia
religiosa. E todas nós seremos madrinhas.
E eu as ouviria bradar: Só falta você, Gabriela Burnier! Vai rimar, eu sei.
Meu discurso pode parecer feminista, foda-se, mas eu realmente não via sentido
nisso tudo. Por que a missão de vida da mulher era casar e constituir família?
Sempre me perguntei isso, nunca achei a resposta.

Pensei nisso tudo, enquanto me olhava no espelho, observando como o


vestido azul marinho abraçava meu corpo. Estava tentando não exagerar já que
a família da Lú era tradicional, mas não pude evitar o lasco que se estendia e
revelava minha perna.

— Sabia que você não conseguiria ficar sem mostrar um pouquinho


desse corpo fenomenal! — Fernanda Albuquerque perturbou ao meu lado.

— Estou sendo discreta... E você? Como consegue já estar gostosa assim


depois de ter um filho? — ela usava um vestido longo, rosa claro, justo no
tronco.

— Minha filha já tem quase dois anos Gabi, achou mesmo que eu não
voltaria para o meu corpo?

— Voltaria, nem que para isso precisasse fazer cirurgia plástica! —


rimos.

— Eis a vantagem de ter uma conta bancária recheada — Sol disse, se


aproximando.

— Graças a mim, né? Se dependesse da administração do meu


irmãozinho mais novo, minha filha não conheceria a Disney nunca. Por falar em
irmãozinho... — voltou-se para mim com um sorriso diabólico nos lábios —
Você nunca deixou claro o que houve entre vocês, sua vadia.

— Opa, histórias sexuais da Gabi? Também quero saber! — Sol largou os


três vestidos que segurava.

— Achei que estivéssemos aqui para escolher os vestidos que usaremos


no casamento da Lú... — desviei do assunto.

— Qual é, você nunca deixou de fora nenhum detalhe sujo das suas
aventuras... — Fernanda insistiu.
— Nenhuma delas envolvia o irmão de uma das minhas amigas! — soltei.

— Ah então é sério? Você pegou o Felipe? — Soraia perguntou perplexa


e Fernanda sorriu ao estilo "te peguei".

Ergui as mãos.

— Vocês venceram, vamos escolher os vestidos e encontrar álcool, aí eu


falo tudo o que quiserem.

Experimentei mais uns dois vestidos, mas acabei optando pelo azul
mesmo, a Fernanda decidiu-se por um vinho e a Sol ficou com um amarelo
suave, pagamos tudo e saímos de uma das mais exclusivas lojas do shopping do
Rio de Janeiro. Enquanto seguíamos no carrinho básico da Fernanda — que eu
imaginei que fosse ser trocado por um menos potente e mais “família” — eu me
distraí olhando as redes sociais. Evitei ir ao lado da Fernanda e me joguei no
banco traseiro do carro, precisava beber alguma coisa antes de começar a
lembrar do sexo quente que fiz com o irmão mais novo dela.

— Não vamos para nenhum bar! — a rainha decretou.

— Oi? Nanda eu disse que quero beber!

— Sol, co-pilota, ligue para o meu amado marido e diga que não chegarei
em casa tão cedo, diga que ele e Dita cuidem da Mari porque vou ter um dia de
meninas. Depois, ligue para a Lú e informe que estou passando para pegá-la,
sem opções para ela dizer não.

— Sim, senhora... Posso ligar para o meu marido também ou você não
deixa? — As duas riram.

— Pelo menos eu não preciso ligar para ninguém! — comemorei.

A Soraia e a Lú estavam no Rio por motivos diferentes. Sol, a trabalho


para variar, mas com o marido a tiracolo e Lú para provar o vestido de noiva
que estava sendo feito por um estilista da cidade maravilhosa.

— Gabi, tá no hotel né? Preciso de um lugar em que possamos ficar à


vontade, beber e rir alto. Sinto falta disso — Fernanda suspirou.
— Estou em hotel sim, mas não no de sempre. Dessa vez pedi a
cobertura e tenho piscina por lá. Bora?

— Poderíamos ligar para o Alexandre também, ele emprestaria um lugar


reservado, mas aí ele informaria ao Marcos que daria um jeito de ficar me
enchendo... Melhor não. Por falar nisso, anda pegando o Alê ainda? — arqueou a
sobrancelha definida.

— Já vi que o foco hoje é com quem eu fodo, vocês casaram e a vidinha


deve estar enfadonha mesmo — elas me olharam com a cara feia ao mesmo
tempo em que o celular tocou em minha mão.

Fernanda invocou e o cara me liga?

— Oi Alexandre — atendi baixo, mas a Fernanda virou para me encarar


ao parar no sinal fechado.

— Gabriela... — hesitou — Te mandei uma mensagem há um tempo e


você não respondeu.

— Juro que mentalmente eu respondi, mas acabei esquecendo. Algum


problema?

— Podemos nos ver? — estranhei. Nosso acordo havia sido claro: Sexo e
nada mais. E já atingimos a quantidade de vezes combinada.

— Hum... Você lembra o que combinamos?

— Sim, não se preocupe. Por mais que eu saiba que assim que te ver meu
pau vibrará, esse não é um convite para sexo. Onde você tá?

— Agora eu não posso.

— E a noite?

— Estarei trabalhando.

— Eu vou encontrar você hoje, não importa a hora.

— O assunto deve ser sério mesmo...

— Você não faz ideia — sua voz estava fria.


— Apareça na Carpe então, aproveito e faço merchandising da boate com
a sua ilustre presença.

— Até mais tarde — desligou.

O que será que aconteceu?

— Uau, isso não é um quarto de hotel, é praticamente um apartamento!


— Lú exclamou olhando ao redor.

— Passando tanto tempo no Rio isso é o mínimo do que eu mereço —


sorri indicando a escada que dava para a parte superior da cobertura. A piscina
era grande, considerando o espaço total, duas mesas com cadeiras e guarda-sol,
seriam mais que o suficiente para nossa festinha privê.

Enquanto elas se trocavam, fui para a "mini-cozinha", que nunca é usada,


preparar Mojito e Belinni para bebermos. Não é que eu seja mestre em drinks,
tudo que bebo é preparado por outra pessoa, mas trabalhar na boate tem suas
vantagens. A Eliane e o Dhi são uma dupla maluca, divertida e competente que
comanda o bar da Carpe Vita. Primeiro o Dhi me ensinou a preparar Belinni com
suco de pêssego e espumante. Depois, em um dia de grande movimento, tive
que auxiliar a Eliane e fazer um Mojito cujos ingredientes principais são rum e
refrigerante de limão. Hoje esqueci completamente de comprar hortelã quando
paramos no supermercado, então a receita estava incompleta, mas o principal
estava presente: álcool.

Fernanda, Soraia e Lú desfilaram biquínis pequenos e bundas incríveis,


quando eu subi para deixar os drinks usando o meu, igualmente minúsculo,
conjunto vermelho.

— Selfies antes, celulares na mesa depois. Vocês quiseram um momento


de meninas, nada de ficar de amorzinho no telefone! — Decretei.
— Gabi, acho que você precisa de um marido... — Fernanda provocou
enquanto colocava o celular sobre a mesa — o meu vai ficar para tocar, tenho
uma filha pequena e preciso estar comunicável.

— Concordo com a Fernanda, só vai restar você amiga... Vai ficar para
titia? — Lú disse depois de juntar o seu celular ao da Fernanda. Sol depositou o
aparelho sem pronunciar uma única palavra. Alguém sensata nesse grupo.

— Vocês indicam casamento como se fosse a cura para todos os males,


tenho algumas teorias acerca disso.

— Somos todas ouvidos — Sol experimentou o Belinni e sorriu satisfeita.

— Começando pelo básico: vocês são ricas! Têm empregadas, dinheiro


para gastar em compras quando os maridos encherem o saco, rotina é algo
incomum... Mas pensem: e quem não tem? As mulheres precisam parar de
pregar que a felicidade está atrelada a ter um marido, casa com cerquinha
branca e filhos. — Concluí virando a minha bebida de uma só vez.

— Nesse aspecto eu concordo, não seria a mesma coisa sem a Dita —


Fernanda citou sua babá de infância e fiel escudeira atualmente — ou a babá
que contratamos algumas vezes, mas você não pode usar esse argumento: você
é podre de rica senhorita Burnier — Fernanda apontou.

— Ok, mas estou apontando o que é socialmente imposto e tido como


"destino" de toda mulher. Em segundo lugar: casamento não é garantia de
felicidade. Eu sou feliz sem ser casada, meu pai já casou quatro vezes e nada de
achar o "felizes para sempre".

— Certo... — Sol concordou — Entendo o que quer dizer, mas quando


outra pessoa te completa e te faz bem, você deseja dividir os momentos felizes
com ela. Se você conquista algo novo ou simplesmente vê alguma coisa na rua
que te faz sorrir, seu primeiro pensamento é compartilhar com essa pessoa —
enquanto ela falava, os olhos brilhavam — amor trocado se multiplica, Gabi.

— É aí que eu queria chegar. Estou falando de casamento, da instituição


social, do sacramento religioso, não de amor. Posso amar e continuar com o
estado civil de solteira, ou não!?
— Claro que pode, mas chega um momento que você quer gritar para o
mundo que o outro é seu — Lú justificou — eu morava com o Emerson e
estávamos felizes, mas agora a sensação é outra. Não sou tão romântica, mas
estou eufórica pelo momento em que serei recebida no altar pelo homem com o
qual quero passar a vida inteira.

Virei outro Mojito para aliviar o nó preso na minha garganta. Eu não


compreendia o que elas estavam dizendo, mas uma sensação estranha vinha me
acompanhando há um tempo. Essa conversa estava fazendo com que ela se
remexesse dentro de mim.

— É difícil pensar em passar a vida inteira com uma única pessoa. Vocês
sabem que eu adoro uma sacanagem e a rotina de uma vida sexual me mataria
no primeiro mês. — Sorri cinicamente.

— Minha vida sexual não é rotineira, meu amor. Tá pra nascer babaca
com pegada melhor do que o meu marido... Testei antes de casar — Fernanda
gargalhou e nós acompanhamos.

— Vadia! Deu o golpe da barriga — perturbei — concordo amiga, já disse


que seu marido é o meu sonho de consumo, se pensar em um ménage à trois eu
topo!

Todas gargalharam novamente.

— Já que você tem uma queda pelos Albuquerques, conte tudo que rolou
entre você e o meu irmãozinho.

— Tudo não dá, envolve terceiros — levantei as sobrancelhas e as


minhas três amigas me encararam de boca aberta.

— Porra, mentira! — Fernanda exclamou — Quem? Aline? — indagou


boquiaberta.

Aline era a namorada/esposa/companheira atual do Felipe e, por


coincidência do destino, uma das melhores funcionárias da empresa da família
da Fernanda.

— Não posso citar nomes. Mas eu dei uns pegas no seu irmão sim e o
novinho tem pegada — meu corpo esquentou com a lembrança — Se eu
vacilasse estaria apaixonada e sofrendo por ele estar casado.

— O Felipe é lindo e tem cara de danado, mas daí a chegar perto de fazer
Gabriela Burnier se apaixonar? Estou chocada! — Lú me encarava perplexa.

— Ser foda é genético — Fernanda se gabou — eu adoraria ter você


como cunhada, Gabi... Por que não se deixou levar?

— Não sei... Fiquei ali na beira do precipício e não me joguei, recuei e


corri para longe — disse, lembrando do que senti pelo Felipe — Era só foda, do
melhor tipo, diga-se de passagem.

— Não precisa descrever o pau dele, ok? É meu irmão — ela revirou os
olhos — E o Alexandre? — mudou de assunto — Ele é tudo de bom e parece ter
pegada também, se fosse para pensar em ménage Gabi, eu pensaria nele e não
em você, desculpa aí. — deu de ombros sorrindo.

— Acho que nunca te agradeci por ter me apresentado o Alexandre e


sim, se convencer o Marcos se joga! O cara é bom... Sabe usar a língua de uma
maneira sobre-humana! — Alexandre e Marcos eram melhores amigos e eu
conheci o Alê por intermédio da Fê e do Marcos, em uma festa de aniversário.

Fernanda se abanou, as outras riram.

— Ele te ligou no carro, eu ouvi, vocês estão saindo ainda? — Fernanda


continuou o interrogatório.

— Temos um acordo: saímos três vezes e depois cada um para um lado.

— E já cumpriram a meta? —Sol perguntou com ar de curiosidade.

— Ultrapassamos uma vez só, somos maduros e sabemos o que


queremos... Mas estranhei ele ter me ligado hoje.

— Vocês devem abalar as estruturas do prédio juntos — Lú sorriu.

— Vamos para a piscina? Chegou a vez de vocês me falarem sobre foda.


Soraia, você vai começar... o João Pedro com aquela cara de bonzinho deve fazer
um estrago!
Gargalhamos e nos jogamos na água fria. Passamos um bom tempo
juntas. Rimos, nadamos, bebemos, comemos e conversamos por algumas horas,
atualizamos o papo calcinha (fio dental).

Quando as minhas amigas se foram as palavras delas continuaram


rodando em minha mente. Nunca conseguiria atingir aquela dimensão de
entrega, eu me pertencia.
Saí do restaurante sufocado. E nem estava na forca ainda. É inacreditável
imaginar que os meus pais planejaram um casamento e um filho para mim
crendo que eu deveria receber o combo feliz e passivamente.

Porra é a minha vida!

Sei que quando me acalmar tentarei formular uma listinha das razões
que os motivaram, mas no momento eu só quero que o mundo exploda! A
sensação de sufocamento não é metafórica, puxo o ar dos meus pulmões com
força e não encontro. Minhas mãos tremem e eu sei que preciso parar e me
controlar para que as lembranças não me invadam, para que eu não regrida e
chore no meio da rua. Ou pior, para que eu não tente bater em alguém, ou jogar
o meu carro contra um poste qualquer.

Dirigir não é uma opção viável, por isso peguei o telefone e vasculhei a
longa agenda tentando saber para quem ligar. Meu esquema de transa casual é
simples, mas nesse momento não consigo me concentrar nos detalhes que ficam
ao lado do contato e acabo discando para a Rafaela. Ela atende no segundo
toque.

— Oi Alexandre.

— Me pegue na porta do Fioretto, vamos passar a noite juntos.

— Tô indo — ela desligou rapidamente.

Ao encerrar a ligação notei que a Rafaela estava na lista do "F3+ chega" e


passei os minutos seguintes tentando lembrar o motivo para que eu a tivesse
fodido mais de três vezes e não quisesse mais repetir. Ao entrar no carro da
ruiva de olhos claros, lembrei da razão: ela queria mais.

Foi fácil entender então porque ela dirigiu até seu apartamento e não
para um motel. Foda-se!

— Fiquei surpresa com a sua ligação e... — Começou assim que passamos
pela porta.

— Conversamos depois — segurei firme em seu cabelo e enfiei minha


língua em sua boca, usando a outra mão para apertar um seio sobre o vestido.

Ela correspondeu rápido, empurrou sua língua contra a minha e inclinou


o corpo para que eu tivesse melhor acesso.

Você precisa ser feliz.

O olhar de pena da minha mãe invadiu meu pensamento.

Eu sou feliz, caralho!

Não há nada que me faça mais feliz do que me perder no corpo de uma
mulher!

Com urgência andamos pela sala do apartamento, ela tentando tirar


minha camisa e eu, o seu vestido. Parei de andar quando as pernas dela
encontraram o encosto do sofá, apoiada ali ela abriu o fecho frontal do sutiã e o
jogou longe. Ela estava prestes a descer a calcinha quando eu achei onde
descontar a minha frustração, forcei as tiras do tecido até que se rasgaram. Ela
gemeu quando o tecido inutilizado escorregou até o chão.
Os seios dela eram grandes demais, redondos e com certeza siliconados.
Os mamilos longos e duros eram ideais para um beliscão, que eu dei sem pensar
duas vezes enquanto minha língua passava entre os dois e seguia até o umbigo.
A mulher afastou as pernas em expectativa e eu dei uma lambida longa em seu
púbis depilado. Ela se escancarou, mas eu mudei de posição. Sentei no chão com
as costas apoiadas no encosto do sofá e a trouxe de frente para mim.

— Coloque o pé sobre o encosto — ela o faz sem se cerimônia, deixando


apenas um dos pés no chão.

Sua boceta se abriu e ficou completamente a minha mercê. Com um dedo


toquei o líquido que pingava e espalhei por todos os lados. Ela remexeu, ansiosa
e suavemente levei a ponta do dedo para tocar o grelo.

— Alêêê... — ela ofegou, impaciente.

— O que você quer primeiro: meus lábios, minha língua, meus dedos ou
meu pau bem fundo?

— Hummm...

— Certo, você quer tudo. Vou te dar!

Usei três dedos para penetrá-la e suguei seu grelo para minha boca,
usando lábios e língua. Ela gritou alto e foi música para os meus ouvidos. Fodi
ritmicamente, fazendo meus dedos entrarem e saírem. Uma, duas, dez vezes.
Minha língua trabalhou em círculos, subiu e desceu em lambidas enquanto a
Rafaela chiava, gemia e remexia. Ela estava quase lá... sentia sua boceta apertar
meus dedos. Lambuzei o dedo do meio da minha mão livre em seu líquido e
enfiei em seu ânus, ela se contraiu e seu corpo tremeu. A mulher gozou
gritando.

Levantei e abri a calça. Coloquei um preservativo rapidamente e fiz com


que ela se inclinasse para frente. Entrei até o fundo de uma vez e me perdi em
uma simples missão: foder. Entrei e saí, saí e entrei. Perdi as contas de quantas
vezes meti. Fiquei suado. Ela gritou, gozou novamente. E eu não me sentia
pronto para parar. Entrei e saí, saí e entrei.
— Alexandre! — ela gritou e eu volto minha atenção para sua voz — eu
não aguento mais. Tá ardendo, porra. Você tomou alguma coisa?

Fiquei puto com a insinuação de que eu poderia ter tomado algum


remédio para a ereção, mas sabia que ela estava desconfortável. Não estava
satisfeito. Minha mente não estava conectada ao meu corpo.

Andei até o sofá e me sento.

— Vem cavalgar então...

Ela se posicionou e desceu sobre mim, lambendo meu pescoço e arfando


enquanto rebolava.

— Me diz o que eu tenho que fazer para você gozar, amor...

Amor.

— Comece não me chamando de amor — ela se retraiu e eu me xinguei


mentalmente — prefiro que chame de safado, Rafa.

— Ah meu safado... — ela rebolou — Quer gozar na minha boca?

Hum... a ideia é excelente.

— Chupa meu pau então, safada.

Ela sorriu e beijou minha boca antes de sair do meu colo e se ajoelhar no
chão. Tirou o preservativo como quem desembrulha um presente de natal e
lambeu os lábios para me provocar. Quando começou a lamber meu saco, soube
que ela conseguiria. Ao enfiar metade do meu pau na boca sem engasgar, o
prazer já percorria meu corpo em ondas suaves. Nada como um bom boquete
para fazer um homem esquecer o próprio nome. Ela me masturbou
rapidamente com uma das mãos, acariciando meu saco com outra e para
completar, sugava e babava. Segurei seu cabelo e afastei suas mãos, sentindo
meu sangue correr mais rápido. Fodi fundo levantando os quadris, ela arregalou
os olhos em súplica, mas eu só parei quando minha porra inundou a sua boca.
A Rafaela quis que eu passasse a noite, mas dispensei. Minha mente
ainda estava a mil e nem o sexo tinha feito com que eu relaxasse. Saí da sua casa
quase as duas horas da madrugada, ela me levou até meu carro na porta do
restaurante onde jantei com meus pais. São três e dez e ainda estou no mesmo
lugar.

Encarei meu celular e de repente eu sabia para quem ligar.

— Espero que você tenha um bom motivo para me ligar a essa hora, filho
da puta — a voz do meu amigo estava arrastada e rouca.

— Preciso de um advogado — disse simplesmente.

— Está em cana? — ele falou alto — Não se preocupe amor, é o Alê — ele
sussurrou, provavelmente havia acordado a Fernanda.

— Estou livre, pelo menos por enquanto... mas tô fodido.

— Onde você tá? — sua voz já estava totalmente desperta.

— No meu carro.

— Vem aqui pra casa e a gente conversa.

— Ok.

— Você está fodido! — Marcos constatou no escritório da sua casa,


usando um roupão rosa que suponho ser da Fernanda.

— Ainda não entendi por que você está usando roupão rosa, ser pai de
menina fez aflorar sua sensibilidade?
— Se tá te incomodando eu posso tirar — ameaçou — Vesti a primeira
coisa que estava perto e que cabia em mim, mas se seu desejo é me ver nu... —
ameaçou abrir o roupão.

— Viado, foque no meu problema.

— Se eu fosse você ia numa joelheira escolher o anel... — perturbou


rindo.

— Que sugestão excelente, não vou te pagar por esse serviço.

— Ah vai e dobrado já que não atendo clientes na madrugada — sorriu


— mas eu preciso de tempo para estudar o contrato. Pelo que vi por alto, você
não tem muitas opções, podemos tentar desvincular o filho.

— Tem noção do quanto isso é ridículo? Meus pais querem me obrigar a


ter um filho, caralho!

— Você é um canalha, tem um esquema para transar e nunca namora...


Acho que dá pra entender a dona Vilma.

— Só porque você casou não significa que todos ao seu redor devam
casar!

— Sou feliz mesmo — afirmou orgulhoso — você poderia tentar... não


digo pelo contrato. Mas namorar para variar, se permitir apaixonar por uma
gostosa!

— Porra, você tá falando igual a uma mulherzinha — levantei da cadeira


e andei pelo escritório — Não vou casar! — sentenciei — Ache uma brecha aí,
você é advogado, dê um jeito.

— Advogado não é mágico, mas sou bom no que faço e vou estudar seu
caso. Ah e só vou fazer isso porque sou seu amigo, o advogado da sua família é
outro. Só trabalho para a Albuquerque's.

— Eu sei, valeu.

— Quer ficar no quarto de hóspedes?

— Não, vou para minha casa. Valeu mesmo, volte para o lado da sua
esposa gostosa.

— Ela é gostosa mesmo, mas pare de repetir isso!

— Não vou parar.

Ele me enxotou da sua casa.

Os pesadelos da noite foram compostos por vestidos de noiva e muitos


bebês. Mas, muitos mesmo. Acho que tinha umas cem crianças chorando de uma
vez. Acordei antes do meu celular despertar e passei as primeiras horas da
manhã pensando em planos para sair dessa, caso não houvesse brecha no
contrato.

Era injusto não herdar o dinheiro que eu ajudava a multiplicar. Começar


do zero... Quando? Esperava que meus pais vivessem muito. Convencê-los a
mudar de ideia era outra opção, mas pelo olhar no jantar de ontem sabia que
eles seriam irredutíveis. Eles acreditavam que estavam fazendo o correto. Quem
seria capaz de convencer os pais de que não os mesmos sabem o que é melhor
para o próprio filho? Por fim, vinha a pior opção: ceder e acatar.

Casar! O simples verbo fazia minhas mãos suarem.

Pensei em contratar alguém para fingir ser minha esposa, mas ter um
filho com ela era impossível. Talvez, propor um acordo a alguma das minhas
fodas, deixando claro que nos separaríamos. Ter um filho com alguém que eu
conhecesse parecia menos ruim do que com uma atriz qualquer. Mas quem, em
sã consciência, aceitaria isso? Casar e engravidar. Uma lista de mulheres que
dariam o golpe da barriga por uma pensão gorda passou pela minha mente.
Talvez essa fosse a solução. Tudo devidamente registrado em um acordo pré-
nupcial.

Senti uma pontada de alívio com essa ideia. Em seguida, uma avalanche
de culpa. Colocar um filho no mundo e não o criar não é o que quero. Tampouco
casar e constituir família, mas isso precisa ser feito da maneira menos errada.
Preciso de alguém que me ajude nessa loucura, uma amiga, alguém que pense
como eu e...

De repente, olhos azuis e um sorriso malicioso surgiu na minha mente. A


primeira mulher que ditou as regras do meu próprio jogo, foi incrível e
surpreendente quando pensei em impor as regras e ela me deixou boquiaberto
ditando o mesmo objetivo.

Busco seu número na minha agenda. Encontro: Gabi F4 Repeat. O que


significa que fodemos quatro vezes, acima do número que imponho, e que ainda
posso repetir. Meu esquema é basicamente: três fodas e tchau. Uso minha
agenda para atualizar e não me perder. Ontem à noite errei feio ao ligar para
Rafaela que era "F3+ chega", significa que já atingimos a meta, ela quis mais e eu
precisava sair fora.

Você é a única que pode me tirar dessa. Pensei enquanto a ligação


chamava.

— Oi Alexandre — ela atendeu baixo.

— Gabriela... Te mandei uma mensagem há um tempo e você não


respondeu.

— Juro que mentalmente eu respondi, mas acabei esquecendo. Algum


problema?

— Podemos nos ver? — ela ficou quieta.

— Hum... Você lembra o que combinamos?

— Sim, não se preocupe. Por mais que eu saiba que assim que te ver meu
pau vibrará, esse não é um convite para sexo. Onde você tá? — fui sincero.

— Agora eu não posso.

— E a noite?

— Estarei trabalhando.
— Eu vou encontrar você hoje, não importa a hora — estava
determinado a convencê-la.

— O assunto deve ser sério mesmo...

— Você não faz ideia — disse friamente.

— Apareça na Carpe então, aproveito e faço merchandising da boate com


a sua ilustre presença.

— Até mais tarde — desliguei.

Ao entrar na Carpe Vita constatei mais uma vez que a família


Albuquerque possui o Toque de Midas, ou seja, tudo em que eles tocavam virava
ouro. A Albuquerque's é um império sem tamanho, atualmente comandado pelos
irmãos mais velhos e essa boate é simplesmente a maior e mais badalada casa
noturna da cidade do Rio de Janeiro. O proprietário é o caçula dos
Albuquerques e até onde eu sabia, Gabriela Burnier era a sua sócia. Olhei ao
redor e o ambiente inteiro vibrava. Mãos no alto seguravam copos e garrafas,
ditando o ritmo dos corpos que se remexiam ao ritmo do som. Esse lugar era a
cara dela. Pulsante. Vivo. Intenso.

Cabelos loiros muito claros se destacavam entre as pessoas próximas ao


bar. Aproximei-me do balcão e pedi ao barman um Whisky. Não fui de imediato
falar com ela, esperei que me notasse, afinal estava trabalhando. Gabriela
conversava com uma morena deslumbrante e às vezes as duas olhavam para a
banda no palco e sorriam.

Eu precisava que ela dissesse sim.

Alguns minutos se passaram até que o olhar dela encontrou o meu,


levantei o copo num brinde. Ela sorriu e pediu um minuto à morena.

— Olha só, Alexandre Fragoso na Carpe Vita, que honra! — ela disse
sorrindo.

— Faz tempo que eu queria vir, mas sabe como é, faltava tempo... — dei
de ombros.

— Ah sim, imagino. Mas agora que está aqui vamos ajudar na


propaganda. Sorria! — ordenou sacando o celular e tirando algumas fotos de
mim.

— Se queria uma foto minha no seu celular era só pedir que eu enviava...
Nu — ela gargalhou e se aproximou.

— Ah, eu pedirei — sussurrou no meu ouvido e se posicionou para tirar


uma selfie nossa — Vou publicar! — seus dedos eram ágeis no celular.

— Quem é a morena gostosa? — perguntei, olhando a mulher que sorria


para um homem distante.

— Tá precisando atualizar sua lista de fodas? — arqueou a sobrancelha


— A Evelyn é empresaria e assessora de imprensa da banda que está tocando.
Gostosa, né? Pelos olhares que deu para a pista acho que cai na sua! — piscou.

— Qualquer mulher que eu queira cai na minha — sorri.

— Você já foi mais modesto.

— Mas você me conhece bem, posso perturbá-la com uma dose de


machismo e autoconfiança — ela gargalhou.

— Certo Alê, estou curiosa para saber o que o trouxe até mim. E você me
disse que não era sexo.

— Disse antes de ver sua bunda nesse vestido. Vamos dançar? Depois a
gente vai até sua sala e...

— Fode! — Ela me interrompeu.

— Eu ia dizer conversa, mas foder é uma opção.

— Vou dispensar a dança hoje, estou curiosa. Vamos subir.

Meu pau já estava subindo e a temperatura do meu corpo também


enquanto ela andava a minha frente. Cada lado da sua bunda empinada se
movia para cima e para baixo provocando, chamando as minhas mãos: aperte-
me.

— Aqui estamos — ela abriu a porta da sua sala. Era sóbria e mediana,
acho que ela passava mais tempo no andar de baixo. Não havia muito sobre ela
no ambiente.

Passei por ela, que fechou a porta e me encarou, erguendo as


sobrancelhas interrogativamente.

— Preciso que você se case comigo! — Soltei de uma vez.

Ela arregalou os olhos como se estivesse vendo um extraterrestre. Em


seguida, estreitou-os e por fim, Gabriela gargalhou alto.
Esse era mais um sinal que o cosmo e as forças do além estavam
mandando para eu me aquietar: um pedido de casamento. Não exatamente um
pedido, a frase que eu acabei de ouvir foi "preciso que você case comigo!" e não
o tradicional "aceita se casar comigo?".

Só podia ser uma piada de mau gosto, então eu sorri. Na verdade,


gargalhei. Meus ombros chacoalharam, meus olhos estavam cheios de lágrimas
e minha barriga doía de tanto rir daquela loucura. Alguns segundos se passaram
até que eu precisei respirar, quando olhei para o Alexandre ele me encarava
com o olhar penetrante e as sobrancelhas erguidas.

— Nunca imaginei que quando eu pedisse uma mulher em casamento ela


fosse rir como se tivesse ouvido a melhor piada do mundo...

— Mas é a melhor piada — disse enquanto andava até minha mesa


enxugando as marcas das lágrimas — E isso não um pedido. Você precisa
ajoelhar, trazer flores, anel e toda aquela bobagem.
— Ah, então é isso? Posso sair, comprar tudo isso e voltar aqui — ele
disse sentando na cadeira em frente à mesa.

— Ok, acabou a piada. Diz logo o que veio fazer aqui.

— Exatamente o que acabei de fazer, te propor casamento.

Aquilo estava perdendo a graça. Quando você ouve uma piada boa pela
primeira vez, ri muito. Quando o humorista repete ou tenta explicar, acaba com
a graça. Era exatamente assim que estava acontecendo, a graça estava se
esvaindo do ambiente tão rapidamente quanto fumaça ao apagarmos um
cigarro.

— Você deve ter misturado álcool e cocaína. Apenas um baseado não o


deixaria tão louco... — ponderei em voz alta.

— Será que você pode ficar calada e me ouvir?

— Ah sim, com certeza misturou... Não é possível que tenha a ousadia de


falar merda e querer que eu ouça calada. Não fode, Alexandre!

— Se você for boazinha eu fodo... — estreitei os olhos — Por favor, me


deixa explicar.

— Vá em frente.

— Eu tenho que casar. Meus pais fizeram uma manobra jurídica para me
obrigar, se não o fizer saio do testamento e todo o dinheiro fica para instituições
de caridade — seus olhos não deixaram os meus enquanto proferia as palavras.

— É um bom destino para o dinheiro, tem muitas pessoas carentes no


mundo e...

— Vou ficar pobre, sem perspectiva, talvez até more na rua!

— Drama barato comigo não cola! Por que não os convence do contrário
ou interdita os velhos? — soltei sem querer, eu nunca faria aquilo com meus
pais — Desculpe pela interdição, descarte a ideia.

— Já tentei induzi-los a mudar de ideia: sem sucesso. Estou pensando em


alguém que queira dar o golpe da barriga em um cara rico ou em contratar uma
atriz por um tempo, uma prostituta também é uma possibilidade.

— Sou a atriz, a do golpe da barriga ou a prostituta?

— Você é a única mulher que eu conheço que é louca o suficiente para


aceitar o acordo.

— Gosto da minha liberdade — pontuei com um dedo erguido — Não


preciso do seu dinheiro — levantei mais um — E não tenho vontade de brincar
de casinha — mostrei o terceiro dedo — O que eu tenho a ganhar com essa
insanidade, Alexandre?

— Oportunidade de desfrutar da minha companhia pelos próximos 365


dias, no mínimo — ele fala como se eu tivesse ganho na loteria.

Não respondi.

— Muitas mulheres se atirariam no meu colo só por isso — sorri, sabia


que era verdade — Você continuará livre, o acordo é de fachada. Dinheiro nunca
é demais a gente vê uma quantia que te satisfaça. Posso te disponibilizar a casa
que quiser, carro com motorista e não vou te cobrar nada, Gabi. Você faz o que
quiser, quando e como desejar. Eu prometo.

— Maridos costumam quebrar promessas, começamos mal.

— Eu preciso que você aceite.

Eu o encarei. Seus olhos azuis estavam nublados. Era um apelo. Um


pedido desesperado. Nesse momento minha mente ficou em branco e uma
pontada no meu peito me fez ponderar. Por que não? Um ser humano em
desespero é capaz de fazer as maiores loucuras: matar, roubar e casar. O
Alexandre pode casar com uma louca qualquer só para cumprir os desejos dos
pais e... Por que eu deveria me importar com isso? A vida é dele, a escolha é
dele. Não vou ter qualquer relação com as consequências disso.

— Desculpe, não quero fazer isso — levantei para voltar ao trabalho.

O Alexandre também levantou e me puxou pelo braço.

— Posso tentar mais um argumento?


Os dedos dele subiram pelo meu braço de forma lenta, fazendo cócegas
na minha pele até chegar ao meu rosto. Um beijo casto foi depositado na minha
testa. No meu nariz. Em uma bochecha.

— Posso adorar seu corpo sempre que você quiser — sussurrou antes de
circular minha orelha com a ponta da língua — Sei que você adora uma pegada
forte, mas um carinho às vezes faz bem.

Meu coração disparou. Não estava preparada para o toque terno e


carinhoso. O pior de tudo era que ele sabia disso. Estava testando como me
manipular. Sua língua acariciou os meus lábios, seus dedos voltaram a alisar
meus braços. Overdose de ternura. Chega!

Meus dedos se enfiaram nos curtos fios do cabelo dele e só pararam


quando acharam onde se apoiar e puxar com força. Abri a boca e impus minha
língua sobre a dele, empurrando e rodopiando. Suguei seus lábios e engoli seu
gemido quando empurrei meus seios contra seu peito, me esfregando. O calor
se inicia nos meus pés, como se eu estivesse descalça sobre brasas. Incendeia
minhas pernas e me abraça pela cintura. Queimando, dominando e me fazendo
desejar mais.

O desejo é algo com que eu lido bem. Moldo, exploro e desfruto. É meu
melhor campo de atuação, sempre que deixo meus instintos primitivos virem à
tona, sinto-me livre. E nesse momento eu era só instinto. Minha mente
evaporando, enquanto meu corpo estava prestes a transbordar.

— Não me oponho a receber um beijo desse por dia, durante 365 dias...
— as palavras saíram quando ele beijou meu pescoço.

Minha mente voltou a funcionar. Segurei o seu pau sobre a calça e o


apertei com muita força.

— Manipulação sexual é minha especialidade, não jogue comigo Alê —


ele chia baixinho, quando eu apertei mais forte. Liberei a sua ereção e afastei
dele — A resposta é não!
Precisei adiar minha ida à Vegas por causa do casamento da Lú. Mas já
estava tudo certo, quando minha amiga embarcar para a lua de mel, eu seguirei
rumo a cidade do pecado. Por enquanto estava trabalhando. Eu, que passei anos
da minha vida apenas usufruindo e gastando, achei algo com que gostava de
trabalhar: festas! Quando aceitei a sociedade proposta pelo Felipe, tinha em
mente apenas entrar com o capital, tentar ajudar no início e vender minha parte
assim que ele estivesse financeiramente capaz de gerir tudo sozinho. Não
pretendia criar raízes no Rio de Janeiro. Não sou fã de âncoras, gosto de flutuar
livremente para onde a minha alma desejar ir.

Desde que a boate inaugurou me vejo envolvida nos eventos até o último
fio de cabelo platinado, vou para meu apartamento em São Paulo em raras
oportunidades, por isso gasto rios de dinheiro num hotel de luxo que já virou
quase a minha casa. Enquanto a sensação de liberdade prevalecer, continuarei
aqui. Um dia de cada vez. Se eu me sentir presa ao trabalho, a um espaço ou a
um ser humano: rompo as correntes e corro. Ou voo. Como teria feito depois do
sexo excitante que rolou entre mim e o casalzinho Feline, Felipe e Aline.
preparei tudo para voar para Las Vegas, mas precisei adiar por causa da Lú. Ela
casará no próximo sábado, e eu embarcarei no dia seguinte.

O que não fazemos por nossos amigos?

Casar! Meu inconsciente responde em um grito histérico. Mas eu silenciei


a lembrança e levantei para falar com o meu sócio, em sua sala. Precisava de
distração. Bati à sua porta e ele gritou um "entre" que me autorizou a seguir em
frente.

— Ora, ora... Veio vestida para matar! — ele observou cada curva do meu
corpo. Estava usando um macacão preto de tecido que possui mangas longas,
assim como as pernas. O detalhe está no decote que se estende até próximo ao
umbigo. Dei uma volta e quando o encarei ele sorri — Porra, Gabi!
— Achei que, a essa altura, você soubesse que para matar eu me dispo —
ele gargalhou e eu me sentei — Estou passando aqui para confirmar a minha
viagem, embarco domingo.

— Achei que tivesse desistido.

— Preciso me libertar dessa vidinha de proletária e gastar alguns


milhões para voltar a me sentir Gabriela Burnier.

— Sei como é — ele sabia mesmo. Se tem uma pessoa que entenda meu
modo de viver e sentir, essa pessoa era Felipe Albuquerque — Por falar em se
sentir foda, acho que não te agradeci ainda pelo presente de aniversário.

O ménage. Uma pontada atingiu novamente meu coração e eu ainda não


conseguia identificar o motivo, depois que saí daquela suíte me senti estranha.
Quando a Aline me convidou para ser parte do presente de aniversário do
Felipe, eu prontamente aceitei. E não me arrependi, foi quente e excitante o
suficiente para que eu quisesse repetir. Mas, algo mudou desde que eu vi que
depois do sexo, eles fizeram amor...

— O prazer foi literalmente meu — sorri com todo o meu sarcasmo —


Ela gostou?

— Adorou. Espero que ela me dê mais vezes esse presente — Felipe


gargalhou e eu acompanhei.

— Vou sugerir que ela tente com dois homens — ergui uma sobrancelha
e esperei a reação ciumenta. Ele pareceu ponderar.

— Acho justo... Mas não serei eu a sugerir — piscou — Carpe Vita, Gabi!

— Carpe Vita! — concordei e lembrei de um detalhe — Onde você fez sua


tatuagem, Felipe?

— Com um brother que tem um estúdio em Sampa. Tá pensando em


fazer uma igual? — ele tinha tatuado no corpo “Carpe Vita”, seu lema de vida e
nome da nossa boate — Seria ótimo para o marketing da boate... Já imagino
fotos suas usando apenas a tatuagem!
— Aí seria tatuagem de casal e não somos um — dei de ombros — Quero
fazer essa aqui — mostrei, no visor do celular, uma expressão também em latim.

— Vai ficar foda! Acho que era exatamente isso que faltava nesse seu
corpo maravilhoso. Já sabe onde vai fazer?

— estou pensando na costela, mais em cima, perto do peito.

— Preciso ver isso — gargalhei — Vou pedir pro Jhon a indicação de


algum estúdio aqui no Rio.

— Você me acompanha? — perguntei.

— Tá com medinho? — ele provocou e eu revirei os olhos.

— Já suportei picadas maiores — Felipe riu alto enquanto ligava para o


amigo tatuador.

Depois do expediente, que no nosso caso significava ao amanhecer,


seguimos para o estúdio que o amigo do meu sócio indicou. Se eu fosse um
pouco mais tímida teria lamentado a escolha do macacão para a noite anterior,
para fazer a tatuagem eu tive que ficar nua da cintura para cima, já que a peça
impedia o uso de sutiã.

Túlio, o tatuador, se comportou muito profissionalmente quando eu abri


o zíper e me despi. Munida de um cantil abastecido com Whisky, deitei de lado
na maca que ele indicou.

— Quer que eu registre o momento, Gabi? — Felipe perguntou com certa


dose de humor na voz.

— Quando tiver pronta, é provável que meus gritos não fiquem bons em
vídeo...

— Já ouvi você gritar e foi incrível — sua voz me distraiu do zumbido da


máquina que perfuraria minha pele.

— Todo mundo pergunta se vai doer? — olhei para o tatuador.

— As mulheres, em sua maioria, quando se trata da primeira tatuagem. A


costela costuma doer um pouco mais, segundo elas...— ele deu de ombros.

Os braços tatuados indicam que ele gostava de dor ou que dói muito
pouco. Virei a garrafinha de bebida e deixei o líquido queimar para amortecer a
dor que sentiria.

— Agora preciso que você não se mexa — assenti e respirei fundo,


soltando o ar quando ouvi o barulhinho assustador.

O primeiro toque é o que dói mais. Seu psicológico espera uma dor muito
forte, mas no fim das contas dá para suportar. Talvez a bebida tenha aliviado
um pouco. Mantive-me imóvel pelo máximo de tempo que pude, estava prestes
a pedir uma pausa para beber mais alguns goles quando ele desligou o barulho
infernal.

— Uau! — Felipe disse olhando para a minha pele.

— Já acabou? — perguntei surpresa.

— Foi bom pra você? — meu sócio perturbou.

Olhei no espelho grande na parede do estúdio, a pele vermelha e as


letras marcadas em tinta contrastavam com a minha pele clara.

— Tão bom quanto estar deitada em um formigueiro — disse, por fim, ao


me aproximar do Túlio para que ele isolasse a tatuagem.

— Depois de umas duas horas pode tirar o plástico. Deixe-a livre por
umas vinte e quatro horas. Depois disso use uma pomada dermo-restauradora
— assenti — Ah e evite praia e piscina por uns quinze dias.

— Certo, obrigada Túlio.

Paguei pelo trabalho e me despedi do meu sócio. Segui para o


apartamento exausta, quando deitei na minha cama a dor já estava esquecida.
Hic Et Nunc, Gabriela Burnier.
É impressionante quando uma mulher sabe jogar. E quando ela dita as
regras das quais você quer seguir? É maravilhoso. Mas quando ela usa tudo isso
no momento em que você precisa que ela caia na sua lábia é frustrante.

Propus casamento e a Gabriela recusou, tentei usar o afeto ao meu favor.


Gabi adora foder e já tínhamos nos dado bem várias vezes, por isso usei outra
tática. Mas ela virou o jogo e me transformou em perdedor quando me
respondeu “não” e me deixou plantado em sua sala.

Saí da sala logo depois dela e voltei para o bar. Pisquei para o barman
que me encarava desde que me aproximei do balcão, os meus olhos azuis
causam esse efeito hipnótico e assim, tanto quanto um cliente VIP, estou sendo
atendido em poucos minutos.

Sorri em agradecimento quando ele me serviu Whisky. Com o copo em


mãos passei a observar melhor o ambiente ao meu redor. Retribuí os olhares de
duas gêmeas idênticas que estavam mais afastadas. Sorri e pedi para que dois
drinks fossem enviados para as irmãs, em meu nome, talvez eu conseguisse sair
no lucro essa noite, afinal. Quando elas receberam as bebidas brindamos a
distância levantando os copos e naquele momento percebi a aliança na mão
direita de uma delas. Como se brotasse do chão, um homem, que presumi ser o
noivo da que usa aliança, chegou juntamente com o acompanhante da outra
gêmea. Encarei o quarteto feliz e bufei vendo minha chance de ménage ir por
água abaixo.

Não se pode ganhar todas, Alexandre. Quando calei meu pensamento o


barman me entregou um guardanapo com um número de telefone escrito às
pressas. "Gêmea má" é quem assina o bilhete. Satisfeito, salvei o número
imediatamente na minha agenda, paguei a conta e decidi que já era hora de
partir.

Caminhei em direção à saída e no meio do percurso os mesmos cabelos


loiros chamaram minha atenção, fazendo-me virar. Lá está ela conversando ao
pé do ouvido com um homem que não deve ter nem vinte e cinco anos de idade,
enquanto se moviam ao ritmo da batida eletrônica. Os olhos claros dela
encontram os meus e ela sorriu ao me notar observando. Gabriela ergueu a taça
de champanhe, brindando ao meu "não" e em seguida, beijou o cara, que de
início foi pego de surpresa, demorando a reagir, mas logo se recuperou e ambos
se eram apenas mãos e línguas.

Xeque.

Definitivamente tinha que ser ela.

A qualquer custo.

— Bom dia Alexandre — minha secretária me cumprimentou assim que


cheguei.

— Bom dia Odete, vejo que está com um brilho no olhar. Já sei... O
Manoel compareceu ontem à noite! — ela bateu no meu ombro, sorrindo sem
graça. Odete era a mais velha funcionária da empresa. Era com ela que eu ficava
quando meu pai me levava para visitar seu trabalho, tínhamos uma relação de
avó e neto.

— Você não toma jeito, menino — sorriu com as maçãs do rosto rosadas.

— Qual a minha agenda para o dia de hoje? — respondi, indo em direção


a minha sala tendo ela ao meu encalço.

— Reunião com o seu pai pela manhã, apenas.

— Eu tinha a impressão que hoje era o dia da reunião com os agentes


imobiliários... — a minha “impressão” se devia ao fato de eu não ter uma agenda
pessoal, todos os meus compromissos de trabalho eram agendados com a
Odete, ela apenas me lembrava.

— Cancelada! Seu pai pediu para cancelar todos os compromissos do dia.

— Melhor. Assim, aproveito para resolver umas coisas pessoais.

— Bom dia filho, bom dia Odete — meu pai entrou na sala com seu traje
típico, fizesse chuva ou sol ele sempre ia a empresa usando calça social e camisa
de tecido longa, nos pés os sapatos italianos pretos, seus preferidos.

— Bom dia, senhor Maia.

— Odete, peça por favor três cafés e água — ela assentiu antes de se
retirar.

Quando nos sentamos, Rafael entrou carregando a pasta em uma mão e o


celular na outra.

— Presumo que já tivemos sucesso senhor Maia. Veja só: Alexandre


Fragoso curte noite na prestigiada Carpe Vita.

— Não acho que uma boate seja um local propício para achar uma
esposa — meu pai opinou.

— A loira é uma socialite — pontuou o Barros.


— A loira tem nome e sobrenome: Gabriela Burnier — rebati.

— Família tradicional paulistana, embora os pais sejam separados. Ricos


de berço. Não parece uma aproveitadora...

— Agora anda investigando com que me relaciono? Vai gastar muito


dinheiro com isso, já adianto — sorri dando de ombros para conter uma raivosa
indignação. Quem esse cretino pensa que é para opinar sobre minhas escolhas?

— Não sabia dessa investigação, Rafael — meu pai ponderou.

— Tomei a iniciativa, peço perdão. Porém, creio que seja válido


investigar a futura senhora Fragoso Maia.

Não resisti quando ouvi o sarcasmo em sua voz. Uma coisa era os meus
pais acharem que eu preciso casar e impor esse maldito contrato. Outra
totalmente diferente, era esse advogado de merda se meter na minha vida.

— Escuta aqui seu otário...

— Alexandre! — Ignorei a recriminação da voz do meu pai e prossegui


erguendo o dedo para o advogado que me olhava receoso.

— Você é pago para cumprir ordens e não tomar iniciativas para


averiguar minha vida pessoal. Quero que interrompa qualquer investigação que
tenha começado! — Vociferei.

— Alexandre, isso não é forma de se dirigir a um amigo da família.

— Faz favor pai, esse babaca anda monitorando os meus passos.

— Tudo bem, senhor Maia. O Alexandre está nervoso com a sua atual
situação.

— E qual é minha atuação situação? — indaguei irônico.

— Um homem desesperado, capaz até de ludibriar os pais para


conseguir seu objetivo.

— Vá se foder!

— Alexandre, chega! — meu pai bradou — Rafael, queira nos dar licença
por dois segundos e iniciaremos a reunião — ele se retirou e meu pai continuou
— Percebo que você está irritado com toda a situação...

— Não pai, eu tô puto. Tem um detetive me seguindo? Isso é um


absurdo!

— Vou mandar ele suspender, mas não voltarei atrás quanto ao


testamento.

— Não imaginei que o faria.

— Sua mãe pediu para que fosse visitá-la.

— Deve ter uma lista de pretendentes... — suspirei.

— Nós te amamos.

— Eu sei. Chame o advogado, vamos trabalhar.

Dois dias se passaram e a Gabriela me ignorou completamente. Não


estava na boate, celular desligado e todas as mensagens em redes sociais foram
ignoradas com sucesso. Nenhuma ideia brilhante para convencê-la me ocorreu,
então precisei pular a opção. O Marcos ainda não tinha nenhuma novidade e
meu tempo estava correndo.

— Você é o Alexandre? — uma boca extremamente sensual e sem


nenhum batom, proferiu essas palavras. Mesmo se eu não fosse o Alexandre, me
tornaria naquele exato segundo.

Maya Soares estava parada a minha frente usando uma calça jeans justa
e uma camiseta preta com a frase Fuck off! (foda-se!) estampada, mas foram os
peitos dela que chamaram a minha atenção. Extremamente modelados pela
camiseta e, pelo que notei, sem o auxílio de um sutiã. Os bicos ouriçados
indicavam isso. Usava ainda óculos aviador e seus cabelos castanho escuros
ondulados estavam soltos e pareciam levemente bagunçados. O sorriso era
capaz de derreter/esquentar até o Polo Norte. Se eu não estivesse acostumado a
esses sorrisos, estaria de quatro agora por essa mulher. Ela tirou os óculos e
seus olhos cor de mel deslizaram sobre o meu corpo acomodado na cadeira do
restaurante. Levantei e estendi a mão, o sorriso permanecia no seu rosto como
um belo cartão de visitas

— Prazer em conhecê-la, Maya — trocamos um demorado aperto de


mão.

— Oi, Alexandre. Achei que os cariocas cumprimentassem com


beijinhos... — sorriu abertamente.

— Não seja por isso — me aproximei ainda mais e toquei nossos rostos.
O segundo beijo foi perto da boca — Devidamente apresentados, podemos nos
sentar — puxei a cadeira para que sentasse e sentei à sua frente.

— Nunca vim aqui... Bonito! — comentou enquanto admirava o ambiente


ao seu redor.

Estávamos em um restaurante aquático na Marina da Glória, o ambiente


era um imenso iate atracado aos pés do morro da Urca. Possuía o Cristo
Redentor como vista principal, só por isso o lugar era único. Mas ainda tinha o
cardápio assinado por um renomado chef, além de ambiente exclusivo apenas
para sócios. Resumindo, era quase o paraíso.

— Podemos fazer o pedido?

— Claro. Antes eu queria pedir desculpas pelas roupas — apontou para o


próprio corpo e lá estava eu olhando mais uma vez aqueles peitos — vim direto
da faculdade.

— Não se preocupe, eu decidi de última hora mesmo, mas adorei a


camisa.

Sorri e ela me acompanhou.

— Não sei como me deixaram entrar aqui, sério! Acho que os saltos
deram uma salvada no figurino "acordei e saí de casa". Se eu tivesse me
preparado causaria uma impressão melhor.
— Você está linda. Champanhe?

— Não esperava nada diferente.

O garçom se aproximou apenas com meu menear de cabeça e nos serviu


com a mais cara garrafa de champanhe da adega. Maya se deliciou ao bebericar
a bebida, ela não sorveu todo o conteúdo de uma vez, saboreou, deixou o líquido
passear na sua boca. Era sexy vê-la bebendo.

O almoço foi servido e eu pude observá-la melhor. Ela sabia todas as


regras de etiqueta, o talher certo para cada alimento, o guardanapo no colo, o
agradecimento silencioso a cada vez que o garçom executava o serviço.

— Não foi para saborear essa deliciosa lagosta que viemos aqui.

Direta! Eu havia acertado na escolha.

— Não — sorri — Eu te chamei aqui porque preciso de uma esposa.

Assentiu antes de perguntar

— Quando e qual é o evento?

— Não é um evento. É real, preciso casar no cartório.

A mulher arregalou os olhos e a taça ficou paralisada a caminho da boca.


Qual a problema das mulheres com essa parte da história? Achei que casar fosse
um sonho feminino.

— Acho que não entendi — ingeriu todo o conteúdo da taça de uma vez.

— Entendeu, Maya. Entrei em contato com a agência, vi seu perfil, sondei


suas indicações...

— Sou acompanhante — o garçom que nos servia foi pego de surpresa,


mas logo tratou de disfarçar — E isso significa que eu sou contratada para estar
ao lado de homens em eventos. Fingir que sou a noiva, namorada e até mulher
para mim é tranquilo. Mas casar, casar de verdade? Não!

— Podemos chegar em um acordo quanto a uma mesada, uma quantia


que você teria direito todo mês. Durante dois anos...
— Dois anos? É pegadinha, né?

— Podemos reduzir esse tempo um pouco... e isso pode até ser piada de
mau gosto, mas é real. Acertaremos um bônus maravilhoso quando tivermos
um filho.

— Caralho! — ela deixou escapar o palavrão mais alto do que era


adequado — Desculpe, eu não posso te ajudar.

— Maya, eu dou o que você quiser: uma casa no seu nome, carro do ano,
viagem para o exterior, qualquer coisa que você pedir. Você só vai precisar
manter a aparência...

— Eu... Eu estudo, faço faculdade de Direito. Vou a academia, tenho três


gatos...

— Nada mudará.

— Meu rosto está em diversos sites eróticos, ninguém acreditaria nesse


casamento.

— Isso é problema meu.

Ela silenciou por longos minutos, o olhar fixando o nada, estava


provavelmente pensando na proposta irrecusável que eu acabara de fazer.

— Eu tenho uma contraproposta: posso te ajudar a fingir ser sua esposa


por alguns meses. Agora sem nada registrado. Depois nos divorciamos de
mentira e fim.

— Não preciso de uma porra de faz de contas! Preciso casar, entendeu?

— Comigo não rola! Tenho uma pessoa que cuida de mim, me banca e
não preciso me algemar. Mas posso indicar umas amigas...

— Uma cópia sua? Linda, que entenda de etiquetas, seja agradável e


inteligente?

— Doutor Albieri não me clonou, sorry — sorriu e brincou fazendo


referência a novela "O Clone" que minha mãe tanto comentava.
— Estou realmente fodido! — lamentei.

— Como posso salvar seu dia? — ela lambeu os lábios, minha perna foi
tocada por seu pé que subiu em direção a minha virilha.

— Mais champanhe? — perguntei.

— Podemos pular para a sobremesa? — ergueu a sobrancelha


sugestivamente.

— A sobremesa...

— Tem banana split?!

Chamei o garçom. O pé dela pressionava meu pau. A massagem já estava


surtindo efeito e minha calça ficando apertada com a ereção.

— A maior banana split para a moça, por favor — pedi agarrando o pé


dela.

— Sim, senhor. Com licença.

— Banheiro daqui a dois minutos — ela se desvencilhou e


graciosamente saiu rebolando em direção ao banheiro.

Quem sou eu para não atender a uma ordem dessa? Já que a gostosa não
estava disponível para ser esposa, eu iria conferir se tudo que disseram dela era
real.

Minutos depois eu invadia o banheiro do iate, trancando a porta. Para


minha surpresa ela estava sentada sobre a pia de mármore, usando apenas a
camisa e calcinha de renda preta, balançava as pernas como uma menina
impaciente. Percorri o pequeno espaço entre nós e em pouco tempo nossos
lábios se tocaram, suas pernas enrolaram minha cintura. Segurei firme sua nuca
e a sua boca se abriu num gemido, aproveitei e enfiei ali a minha língua. Beijar,
está aí algo de que eu não abro mão. Para mim, o beijo é o prelúdio do prazer. E
Maya devia compactuar desse pensamento, pois seus lábios eram macios e
suculentos. E sua língua, ah sua língua era extraordinária... Suas pernas me
apertaram, me puxando para mais perto, seus olhos sedentos pelo meu toque.
Ela ergueu os braços e eu me livrei da sua camisa, seios médios firmes saltaram
em minha direção e apertei o bico com força, arrancando dela um gemido.
Quando minha mão desceu em direção a sua coxa, ela estava extremamente
molhada, meus dedos a penetraram com facilidade.

Batidas fortes na porta nos fizeram perceber que teria que ser rápido.

— Não para! — ofegou — Me come! — sussurrou — Dois minutos! — ela


gritou para quem estivesse na porta.

Rapidamente a coloquei no chão encostada na pia, vesti o preservativo e


penetrei-a por trás. Maya mordeu os lábios para abafar o grito que veio quando
comecei a fodê-la com força e rapidamente. Com a ajuda dos meus dedos, seu
gozo veio num gemido incontido, em seguida permiti que o meu viesse.

Mulheres, primeiro.
Chegou o grande dia. As flores estão por todos os lugares em que meu
olhar repousa. Os vestidos longos desfilam para tomar seus acentos. Muitos
sorrisos e cochichos. Em toda festa tem gente que está lá para dividir a alegria
da comemoração e outros que, por inveja, maldade ou mal humor, vão apenas
para observar e procurar defeitos. É o que duas mulheres fazem nesse
momento. Os dois pares de olhos não se fixam em nada específico. Dão voltas e
fazem ziguezague em busca do motivo para cochichar e quando encontraram
soube que não seria para falar mal. Notei o momento exato em que as duas o
avaliaram. Se surpreenderam com os olhos claros, cobiçaram o corpo e
voltaram ao belo rosto que eu conhecia bem. Meu par tinha chegado e vinha em
minha direção. As duas fofoqueiras ficaram boquiabertas e com certeza
querendo ser eu naquele momento.

— Isso tudo foi para estar ao meu lado no altar? — perguntei quando
Felipe se aproximou e me abraçou.
— Dizem que eu fico muito bem de terno — se gabou segurando as
lapelas — E é claro que você concorda. O que está fazendo aqui sozinha? Cadê o
restante da quadrilha do salto alto e gloss?

Esse era o apelido dado, na adolescência, ao meu grupo de amigas:


Fernanda, Soraia, Lú e eu. Aprontamos muito desde de sempre, por isso éramos
uma “quadrilha”, mas nunca deixamos o lado patricinha de fora, estávamos
sempre sobre o salto alto e munidas de batom e make.

— Vim dar uma volta e ver a decoração, mas já estou voltando. Acho que
a cerimonialista vai nos matar. Cadê a Aline?

— Foi sentar com o Gui antes que ele disparasse por aí — sorri e assenti
— Vamos lá? Estou louco pra ver a Mari.

Seguimos para a área onde o cerimonial estava organizando os


padrinhos, na lateral da igreja.

— E aí, Marcos — Felipe cumprimentou, em seguida beijou a irmã e se


abaixou para falar com a Mari — Você está linda, princesa! Quem escolheu essa
roupa nova? — ele beijou a bochecha da sobrinha.

— Papai! — Mari apontou.

— Seu pai? Eu escolho tudo e te deixo gata e você atribui todo meu
esforço ao seu pai? Vou chorar! — Fernanda fez drama — Nove meses
carregando uma criatura que idolatra o babaca do pai!

— Ela só está confirmando que eu tenho bom gosto, né amor? — a


menina esticou os braços e o pai a pegou no colo.

— Cuidado para não amassar a roupa, amorzinho. Tia Lú tem que te ver
linda!

— Essa é a quarta DR deles, entendeu porque fui dar uma volta? —


revirei os olhos e o Felipe sorriu — Cadê a Sol?

— Foi acompanhar o esposo até o banheiro — Fernanda respondeu —


Para que nenhuma dessas primas santinhas da Lú se atire sem querer sobre ele
— gargalhei ao ouvir a entonação ciumenta e o olhar ameaçador que a minha
amiga deu para o Marcos.

Alguns minutos de conversa fiada depois, o pessoal da organização nos


posicionou na porta da igreja. O primeiro casal de padrinhos eram primos da
Lú, o segundo, parentes do Emerson. Em seguida Fernanda e Marcos. Vindo logo
depois, eu e o Felipe. Quando pisei na igreja de braço dado com o meu sócio um
sentimento me atingiu em cheio. Não sei defini-lo, não chegava a ser uma
angústia ruim, mas algo dentro de mim se retorceu e eu me forcei a olhar para
frente e erguer o queixo. Desfilamos lentamente e pausamos, ao fim do
caminho, para foto.

— Tudo bem, Gabi? — Felipe sussurrou e eu assenti — Você tá meio


pálida...

— Estou ótima — sorri — acho que estou com fome.

— Também não vejo a hora de irmos para a festa — ele piscou.

Minha amiga entrou deslumbrante num vestido digno de princesa.


Branco, com saia armada e mangas rendadas. O noivo parecia não se conter de
alegria e seus olhos brilharam quando a recebeu do pai. Mais uma das tradições
que me faziam pensar... Um homem entregando uma mulher a outro homem,
como se fosse um objeto transferido entre machos alfas: toma, agora é sua!
Além da clássica frase: eu vos declaro marido e mulher! Mulher? Sempre fui
mulher, não passarei a ser quando casar.

O pensamento e a análise de todas as falas durante a cerimônia me


distraíram, quando dei por mim os noivos estavam trocando as alianças e
prometendo fidelidade. A conversa que tive com as meninas anteriormente,
sobre matrimônio e amor, ia e voltava em minha mente. Eu tentava entender o
conceito delas. Mas questionava demais cada nuance dessa prisão autoimposta.

Minha "aversão" (não é bem isso, mas vamos chamar assim por falta de
palavra melhor) ao casamento poderá ser justificada, por algum expert em
relações, pelo fato de meus pais não serem casados. Em defesa deles: eles
tentaram. Meus pais se pegaram, por muito tempo, até eu nascer. Aí eles
decidiram tentar uma coisa nova, pensando no meu bem, e decidiram morar
juntos. Conviveram pelo máximo de tempo que foi possível, mas assim que
acharam que eu não teria problemas psicológicos ocasionados pelo trauma da
separação, decidiram seguir caminhos separados. Depois disso meu pai já casou
4 vezes oficialmente, ou seja, ele acredita no casamento, né? Já a minha mãe
parece que agora encontrou o amor da vida dela (procurou bastante), está
casada com meu padrasto há quatro anos.

Tem também o fato do meu primeiro namorado ter jurado que me


amava, mas acabou ficando com a minha coleguinha da escola... E de eu ter sido
pedida em casamento por um cara que parecia ser o sonho de consumo de dez
entre dez mulheres e não ter aceitado porque não queria me prender. Eu tinha
apenas dezoito anos, quem em sã consciência teria aceitado? Não sei porque
todos esses pensamentos estão passando por minha mente agora, não precisava
justificar para ninguém o meu estado civil.

— Fomos os padrinhos mais gatos — Felipe me cutucou me


despertando dos meus devaneios, na porta da igreja.

— Discordo! — Marcos falou colado à minha amiga.

— Vamos à festa! — Fernanda anunciou animada.

— Vamos! — Falei por que senti que precisava dizer algo.

— Vou pedir para a mamãe ficar de olho no Gui. Duvido que ela se
negue. Quero curtir a festa com a Aline — Felipe sorriu abobalhado.

— Não rouba minha ideia, fedelho. Vou falar com ela agora! — Fernanda
retrucou.

— Que comecem os jogos — Marcos incitou.

— Mãe! — Os dois chamaram ao mesmo tempo e se dirigiram até dona


Marta.

— Crianças... — Marcos disse e os seguiu, com um sorriso sonhador.

Observei quando a Aline se aproximou acompanhada do filho e da Mari.


Os três estavam na mesma sintonia, sorrisos gigantescos. O Guilherme logo
soltou a mão da mãe e correu para os do "padrasto" que o aguardava de braços
abertos. O Felipe ergueu o menino do chão e o girou. O sorriso estampado em
seu rosto era o maior do que qualquer um que já tivesse presenciado. Ledo
engano, um sorriso ainda maior — mesmo que isso não fosse possível sem que
o rosto dele se partisse ao meio — surgiu quando Aline os alcançou. E assim o
belo casal se beijou com a criança ainda no colo. O retrato de uma família
perfeita.

Movo o rosto para o outro lado e me deparo com a Sol e o João Pedro
trocando carícias e cochichos. Desvio novamente o olhar e a cena seguinte se
resume em Marcos e Fernanda sorrindo de algo que a Mari falava, ambos
olhavam-se apaixonados. Lú e Emerson pousam para as fotos pós-cerimônia, o
mesmo olhar estava presente entre os dois, bem como o sorriso de felicidade.
Sinto-me sufocada. E antes que eu perceba uma lágrima solitária escapa do meu
olho.

O que está acontecendo Gabriela? Recomponha-se!

Ninguém notou quando a enxuguei e me dirigi para a festa, no meu


carro. Estavam todos envolvidos na própria felicidade.

— A madrinha mais bonita não deveria ostentar um sorriso condizente


com o título? — virei-me para me deparar com um moreno forte e alto. Ensaiei
meu melhor sorriso — Aí está, esse sorriso não deveria sair da sua boca.

— Gabriela Burnier — estendi a mão.

— Joseph Lima. E o prazer é inteiramente meu. Posso saber o motivo


para estar apreciando a vista e não a festa?

Já havia um bom tempo em que eu tinha dado uma fugida das fotos e das
famílias de comercial de margarina. A festa estava acontecendo num espaço
para eventos aberto, com muito verde e ao lado de um rio. Nesse momento, eu e
minha taça de champanhe estávamos apreciando a vista.

— Estava pensando em quanto tempo um homem levaria para abordar


uma mulher sozinha numa festa de casamento — ergui uma sobrancelha. Ele
riu.

— Touché. Demorei ou segui o padrão?

— Podemos ir direto ao ponto — diminui a distância entre nós — Você


me quer e quer saber se a recíproca é verdadeira. Ela é. O que faremos a
respeito?

Ele segurou minha cintura com delicadeza e sorriu.

— Você é direta.

— Sou! E isso deveria te deixar feliz e não surpreso.

— Ah, mas eu estou feliz. Vamos para a minha casa? — Os dedos dele se
moviam lentamente sobre o tecido do meu vestido, na altura da minha cintura.
Aproximei-me ainda mais.

— Eu prefiro ser fodida aqui mesmo — sussurrei ao pé do ouvido —


uma foda rápida, forte e que nos satisfaça.

Quando me afastei os olhos dele estavam dilatados, claro sinal de desejo.

Saí devagar do deque e voltei para o meio da festa, procurando o melhor


lugar para satisfazer o novo desejo. Joseph levou apenas dois segundos para me
acompanhar. E mais um para tomar a frente e seguir até o estacionamento. Ah, a
necessidade masculina de conduzir.

Ele seguiu para o estacionamento que estava repleto de carros. O local


era aberto já que a festa diurna seguia o estilo rústico. Quando ele parou ao lado
de um, clichê, sedam preto e destravou a porta para entrarmos, eu assumi o
controle novamente. Estávamos pensando demais. Minhas mãos tocaram o seu
abdômen e mais uma vez ele me olhou surpreso, mas no fim o sorriso nasceu.

— Gostei de você, Gabriela.


— Prove!

Ele girou fazendo com que meu corpo ficasse recostado no carro. Uma
mão firme segurou a minha coxa exposta pela fenda do vestido. Conforme os
dedos subiam, o calor aumentava. Meu corpo reagiu ao toque tão bem quanto o
fogo se espalha em um pedaço de papel. Rápido e certeiro. O sugar constante de
línguas, sempre bem-vindo, embriagou os meus sentidos. Abri o botão da calça
social e enfiei minha mão dentro da cueca. Joseph gemeu contra a minha boca
quando comecei a masturbá-lo. Levantou o meu vestido até a minha cintura e
eu usei a minha outra mão para mantê-lo ali. Libertei o pau. Ele afastou a minha
calcinha. Tirou o preservativo do bolso da calça e o vestiu rapidamente. Enlacei
sua cintura com uma perna, ele entrou na minha boceta.

— Rápido! — pedi.

Ele obedeceu, mas não era o suficiente. Usei meus dedos para
impulsionar o meu prazer, com os movimentos já conhecidos manipulei o
clitóris enquanto ele entrava e saía.

Agora a sensação crescia. O calor se concentrava no baixo ventre. Estava


quase lá. Ele apertou meus seios, uma mão em cada, com força e foi o incentivo
que meu corpo precisava para se contrair em gozo. Não demorou muito para
que ele também estremecesse.

Isso. Eu não preciso de nada mais do que isso.

A primeira coisa que eu fiz ao pisar em território americano foi enviar


uma mensagem aos meus pais informando que cheguei sã e salva. Encaminhei a
mesma mensagem para o grupo das minhas amigas, a quadrilha do salto alto e
gloss. Em seguida, ainda no aeroporto, fui até uma lojinha e comprei um novo
chip para o meu aparelho. Fiz a troca de número e guardei o chip brasileiro.
Pronto! O bip no meu celular com o novo chip indicou que eu fazia parte da rede
americana.

Cheguei Vegas e estou inteiramente ao seu dispor!

Peguei um táxi e fui para o hotel. Escolhi um lugar totalmente novo,


recém-inaugurado. Sem nostalgia. A última viagem que fiz para cá foi
acompanhada da Fernanda. Nós éramos as mais aventureiras e insaciáveis do
grupo, Sol e Lú adoravam diversão, mas sempre foram um pouco mais contidas.
Fernanda e eu, a combinação mais perfeita e perigosa que Las Vegas já viu. Duas
loiras fatais que conseguiam o homem que quisesse — inclusive uns gângsteres
da pesada. Um sorriso malicioso surgiu nos meus lábios quando lembro do que
aprontamos nos corredores de um cassino. No fundo não me conformo com a
versão da Fê casada e mãe. Perdi a minha principal parceira de crime.

Que porra! Já estou toda saudosista novamente! Repreendo-me


mentalmente. Observei a movimentação na cidade do pecado. As luzes
dançantes, as pessoas gargalhando. Vegas pulsava e era tudo que eu precisava:
pulsar.

Pago o táxi e deixo o motorista feliz com o generoso troco. Faço check-in
e subo para a minha maravilhosa suíte. Banheira de hidromassagem e celular:
vamos a caça, Gabriela.

Amo as redes sociais. Amo mais ainda a facilidade para as novas relações
que elas proporcionam. Há um aplicativo em especial que pode ser muito útil
quando se viaja. Através de um match, dois usuários com alguns interesses em
comum podem se conhecer. É como um cardápio online. Você deixa claro do
que gosta e no que se interessa, as opções aparecem e você escolhe. Se
compararmos a pedir comida, é basicamente igual. No fim, a mecânica é a
mesma de ir até um bar e azarar os caras, a diferença é que aqui você filtra o boy
antes de começar a azaração. Ou seja, já é meio caminho andado. E
convenhamos que como acabei de chegar, saber as opções enquanto relaxo é
totalmente viável.

Observei os perfis. Dei match num galego com fotos de um corpo incrível.
Conversei por algum tempo e notei que o cara tinha um humor legal, o que
resultou em já ter um encontro marcado! O nome do cara? Henry. Estava há
menos de quatro horas nessa cidade e já me sentia maravilhosamente bem.

Ah, com o pecado eu lidava bem demais.


Henry, Jack, Zack, Thulio, Jhonas e André foram as minhas adoráveis
companhias durante essa minha primeira semana relax. Cada um me ofereceu o
que tinha de melhor. Henry me levou para jantar e me fez literalmente ver
estrelas sob o gramado. Jack e Zack, dois amigos superdivertidos, me provaram
mais uma vez o que já sabia: um é bom, dois são maravilhosos. Jhonas me
deixou mal-acostumada com suas mãos mágicas, nesse momento meus pés
sentiam falta da sua massagem. André, carioca da gema (ôh, sina!) me
apresentou uma badalada boate brasileira, recém-inaugurada. O sotaque, o
charme malandro e as músicas nacionais me fizeram sentir saudades do Rio de
Janeiro.

Cedo demais para isso, Gabriela.

Para essa noite não marquei de encontrar ninguém. Estou a fim de


dançar, jogar e beber até cair. Se alguém me chamar atenção, vamos no
improviso. Por isso escolhi uma calcinha fio dental que fazia jus ao nome, pois
era uma das menores que já usei. Não coloquei sutiã pois o vestido preto era
justo e frente única. Calcei sapatos de saltos finos da mesma cor. Batom vinho,
make dourada e para arrematar decidi exibir meus novos diamantes, mais um
presente que me dei na viagem.

Duas pequenas pedras cintilam nas minhas orelhas. Um anel delicado


com uma pedra pouco maior se encontra na minha mão esquerda. Opto por não
usar a gargantilha que compõe o conjunto. Olho meu reflexo no espelho e,
modéstia à parte, estou deslumbrante. Sensual, elegante e com cara de quem
pode gastar horrores. Gargalhei ao lembrar do velho babão que tentou me
comprar, achando que eu era uma caçadora de dólar, mal sabe ele que comigo a
coisa é diferente. Se eu quiser, sou eu quem pago para ter os homens.

O carro alugado da vez é uma limousine, bem comum nas ruas de Vegas.
Afinal, costuma-se sair em grupos grandes e as pessoas gastam sem dó nesse
lugar. Há algo de libertador em deixar milhares de dólares nessa cidade, é a
única explicação que consigo achar.

A limousine trafegava sem dificuldades, estávamos indo na mão contrária


ao congestionamento. Servi-me de mais uma taça de champanhe enquanto era
tomada pelo som da Beyoncé no interior do carro.

A primeira parada é na Boast, uma boate bem movimentada, já a


conhecia de outras viagens. Meu lugar no camarote já está disponível, mas inicio
os trabalhos no bar da pista. Um shot de Tequila só para esquentar. Não
demorei a atrair amigos quando comecei a me mover ao som das batidas do DJ.
Um homem alto e loiro se aproximou e dançamos sem nos tocar, ainda assim foi
extremamente sensual. Repeti seus movimentos e ficamos muito próximos, o
clima já ficando legal, até que uma morena peituda aparece gritando em inglês
que ele é um canalha e diversos outros sinônimos. Balancei a cabeça e me
afastei da discussão do casal.

Um grupo de mulheres animadas me puxaram quando me dirigia


novamente ao bar. Assim, no meio da roda, fui até embaixo e subi no ritmo
frenético da música. Elas aplaudiram e se revezaram no centro do círculo.
Passei um bom tempo com as meninas, e com os caras que se aproximaram
para interagir. Conheço, sorrio e danço observando cada um deles, lindos e
divertidos. Cerca de dez pessoas no total... Meu corpo esquentou com a
possibilidade de terminarmos todos juntos em uma cama.

Uns cinco drinques depois, minha bexiga pediu por banheiro. Enfrentei a
longa fila para poder finalmente me sentir leve. Já em frente ao amplo espelho
retoquei o batom cor de vinho, ao meu lado uma mulher fazia o mesmo. O anel
gigante no dedo da mão direita era notável e atraiu o meu olhar. O design é um
tanto simples, mas exclusivo, naquela peça a atenção era na enorme pedra de
diamante. Por curiosidade observei que ela ostentava esmeraldas num colar e
nos brincos. As joias não combinam e juntas eram exageradas, mas a intenção
ali é mostrar para causar inveja e não expor bom gosto.

— Did you like it, my dear? (Você gostou, minha querida?) — ela
perguntou num inglês sofrível.

— Sim, são lindos! — respondi em português e a mulher sorriu


amplamente.

— Foi o meu homem que me deu! E de onde veio esses, virá muito mais
— ela piscou e falou em português.

Guardei o batom e sorri, quando ela passou por mim e caminhou em


direção a saída. Segui logo atrás e quando ela abriu a porta notei que um
homem esperava por ela do lado de fora. Ele abriu um sorriso de predador
quando a mulher se aproximou. Eu conhecia aquele sorriso... Não podia ser!

—Demorei, baby? — a mulher se enroscou nos braços do homem.

— Eu esperaria todo o tempo do mundo por você — ele respondeu rindo


e, mesmo que os meus olhos estivessem enganados, bêbados até, meus ouvidos
confirmariam: Alexandre Fragoso era o homem em questão. Eles se beijaram
rapidamente e quando se separam os olhos dele encontraram os meus —
Gabriela? — indagou surpreso — Não é possível — sorri — Que coincidência!

— Ainda estou processando a coincidência também — sorri — tudo


bem, Alexandre?
— Mundo pequeno — ele disse vindo até mim, abraçado à arvore de
natal de um milhão de dólares — chegou hoje?

Estava prestes a responder quando a mulher se manifestou.

— Não vai me apresentar, baby?

— Ah, claro. Gabriela essa é a minha noiva, Tiffany. Baby, essa é a


Gabriela uma amiga do Brasil.

Tiffany? A vadia era uma golpista clara. O nome, assim como seu inglês e
seu gosto para roupas e joias eram péssimas escolhas. Feitas para chamar
atenção e atrair os homens, eu jurava que o Alexandre fosse um pouco mais
inteligente que isso. A mão dela estava estendida em minha direção e não
restava outra alternativa além de aceitá-la e sorri. Se ele estava tão desesperado
assim para casar, boa sorte.

— Prazer, Tiffany.

— Estamos indo comemorar nosso noivado não quer ir conosco? — Ela


perguntou alto.

— Excelente ideia, baby. Vamos Gabi.

— Claro! — respondi, por fim — Estou de limousine, ia para o cassino!

— Perfeito, é para lá mesmo que estávamos indo — Alexandre sorriu.

Seguimos na minha limousine para o Sexy and Vegas um dos inúmeros


cassinos exclusivos de Las Vegas. O lugar era fabuloso. Amplo e bem decorado,
cortinas longas pretas em veludo separavam os ambientes e davam a sensação
de mistério e privacidade.

Tiffany seguiu primeiro e passou pela área comum, chegando num


espaço escuro, um verdadeiro Black out. Luzes esporádicas apareciam e
sumiam. Era como se eles nos obrigassem a usar nossos outros sentidos. Movi-
me devagar com receio de esbarrar em algo, mas não havia nada no meu
caminho. Ouvia apenas sussurros e gemidos abafados, o que me fazia presumir
que o som ecoava através de caixas de som. A sensação de estar ali era
excitante. Só notei que estagnei absorta no ambiente quando uma mão tocou
minha cintura.

— Vamos! — A voz grave do Alexandre me arrepiou.

— Para onde? — perguntei confusa.

— Sair daqui Gabi, o que pensou que seria? — senti seu hálito quente
bem próximo a minha boca. Sua mão apertou firmemente minha cintura, estava
escuro, mas ainda assim fechei os olhos preparada para o inevitável beijo.

— Baby? Baaaaaby? — Era a voz estridente da Tiffany.

Abri os olhos e imediatamente afastei a mão dele da minha cintura.

— Estamos indo Tiffy — Alexandre respondeu segurando novamente em


minha cintura e me conduzindo para fora dali.

— Luz! Até que enfim posso enxergar claramente as coisas — exclamei


assim que adentramos a sala de jogos. Alê apenas sorri enquanto sua noiva
correu em direção a roleta — Pode soltar minha cintura agora — ele obedeceu.

— Façam suas apostas! — o funcionário anunciou chamando a atenção


de todos ao redor.

Notei Tiffany curvar-se sobre a mesa para fazer sua aposta de forma
insinuosa, atraindo propositalmente a atenção dos homens para os seus
generosos seios. Seu noivo estava distraído olhando o ambiente ao redor.

Bela escolha de esposa, Alexandre.

Um garçom passava com bebidas numa bandeja, eu peguei uma taça de


champanhe e decidi dar uma volta para explorar o ambiente.

— Onde pensa que vai? — Alexandre indagou — Viemos comemorar


meu noivado.

— Comemorar noivado num cassino deve ser a última moda — sorrio


cínica.

— Desejos da noiva — ele deu de ombros — E afinal, estamos em Las


Vegas.

— Se é assim... Vamos tentar a sorte? — Apontoei na direção da mesa


onde Tiffany estava.

— Vamos lá!

Uma grande tática dos cassinos era a oferta de distrações. Isso fazia com
que os clientes gastassem mais dinheiro. A principal distração para os
apostadores era, obviamente, a bebida. Os garçons estavam sempre a postos
enchendo e trocando os copos e taças. Em algumas rodadas eu já havia ingerido
drinks o suficiente para fazer a minha cabeça começar a girar. Em compensação
estava elétrica para continuar apostando.

A roleta era o jogo que atraía mais iniciantes. E mulheres. A sedução dela
era a pura sorte. Mas como a maioria deve saber, havia truques além da
probabilidade. Assim, perdi muito mais que ganhei. Mas quem se importava? A
alegria líquida fluía em mim! Seguimos para a boate no segundo andar, rindo de
qualquer coisa.

Dançamos animadamente, os três juntos. Eu não fazia ideia da música


que estava tocando, mas me balançava freneticamente. Em dado momento eu
estava no meio dos noivos indo até o chão.

— Um brinde aos noivos! — gritei alto levantando uma garrafa de


Chandon que tomei do garçom.

— A nós! — Alê bateu o copo de Whisky na minha garrafa e Tiffany virou


seu drink num só gole.

— Mais! — Tiffany pediu e o noivo foi em direção ao bar atender seu


pedido, não sem antes beijá-la na boca.

Continuei rebolando ao lado da Tiffany até que um moreno encarou a


futura senhora Fragoso, que retribuiu o flerte descaradamente. Ela dançava e
tocava o próprio corpo comendo o outro com os olhos até que o cara se
aproximou e falou algo no seu ouvido. Tiffany gargalhou e sacou o telefone do
meio dos peitos siliconados e o entregou para que ele salvasse o seu número no
aparelho. Observei a tudo embasbacada quando o idiota do Alexandre retornou
com as bebidas, mas não a tempo de presenciar o quase chifre!

— Demorou baby... — ela disse fazendo biquinho.

Revirei os olhos e tomei o copo de Whisky do Alexandre, virando de uma


só vez, sentindo o álcool me deixar anestesiada. Alê sorriu.

— Vamos dançar! — Sentenciei rebolando na frente dele.

Daí em diante não consigo descrever o que aconteceu. Mas com toda
certeza bebemos muito mais. Provavelmente até que nos expulsaram do lugar.

Nunca mais eu vou beber na minha vida! Juro por tudo que é mais sagrado.
Ok, já jurei isso antes, mas dessa vez é sério. Vou até me ajoelhar quando eu
consegui abrir os olhos.

A ressaca era uma das coisas com as quais eu nunca me acostumaria, por
mais que fosse uma velha conhecida. A dor de cabeça que sentia naquele
momento era a junção de todas as outras que já tive na vida. A intensidade da
dor só perdia para a que sentia quando estava com cólica, esta já me levou ao
hospital. Abri os olhos apenas para fechá-los novamente, os sinos da catedral
pareciam soar nas minhas têmporas. Tentei me mover, mas não conseguia.
Voltei a abrir os olhos assustada. Não consigo me mover? Ai meu Deus!

Com muito esforço movi o pescoço e notei que estava imobilizada por
um corpo masculino. Menos mal, minha mente já estava pensando em paralisia.
Não fazia ideia de quem era o homem ao meu lado. Um braço forte estava
passado sobre o meu tronco, amassando meus peitos. Uma perna completava o
serviço de me prender à cama.

Estava enjoada e zonza. Confiava na minha capacidade de discernir para


ter usado preservativo na noite anterior. Será que foi apenas uma rapidinha? Se
bem que eu ainda estava vestida no mesmo vestido, sentia o incômodo de ter
dormido com uma calcinha fio dental... Mais tranquila, tentei mover o
braço de cima de mim, para que eu pudesse me virar e ver o rosto do meu
acompanhante da noite.

— Bom dia.

Não, essa voz não!

— Podemos tomar café aqui no quarto? Minha cabeça está doendo — ele
não se moveu.

— Você... Eu... — afastei o braço dele e consegui me sentar na cama —


Alexandre, nós transamos de novo? — Apontei para nós.

— Você não lembra? Assim você me magoa, Gabi.

— Não fode! Diz logo o que aconteceu.

Ele levou as duas mãos ao rosto e esfregou os olhos e o que eu vi ali fez
meu coração disparar. Por favor, não. Para confirmar as minhas suspeitas olhei
para a minha mão esquerda e perdi a capacidade de fala. Não é possível...

— O que significa isso? — Apontei o aro dourado extremamente grosso


no meu dedo da mão esquerda.

— Que você é oficialmente a senhora Fragoso.

Meu estômago se revirou e eu precisei correr para não vomitar ali


mesmo na cama. Ajoelhada no banheiro esvaziei todo o líquido amargo do meu
estômago e quase expeli meus órgãos internos também. Definitivamente essa
era a pior ressaca da minha vida. Até alucinações estava tendo.

O problema era que a minha alucinação entrou no banheiro e estendeu


um copo de água e um comprimido para mim. Levantei o mais dignamente
possível e lavei as mãos e a boca, para aceitar o copo e tomar o remédio.

— Tá de sacanagem comigo né? Cadê a Tiffany?

— Provavelmente tentando sair do banheiro em que você a trancou —


disse simplesmente.
— Eu o quê? — gritei e imediatamente baixei o tom — minha cabeça tá
estourando. Você me drogou?

— Que adorável o humor da minha esposa pela manhã — ele sorriu, eu


fechei a cara — não lembra mesmo? Quando saímos da boate eu e Tiff
decidimos casar imediatamente. Você se ofereceu para ser a nossa madrinha.
Na capela do Elvis, você foi ajudar a noiva a pôr o vestido temático. Só que quem
voltou de branco foi você. Com um convincente discurso para que eu não me
casasse com ela por ela ser uma "vadia aproveitadora que quase me chifrou".

Ai caralho!

— Isso não pode ter valor legal. Eu nem me lembro disso, anular vai ser
muito fácil. Nem consumamos, né? — ele ergueu uma sobrancelha sugestiva —
ok, então peço o divórcio. Ligo para o meu advogado e resolvo.

— Eu não vou aceitar o divórcio.

— Não vai o quê?

— Não vou assinar o divórcio — ele respondeu calmamente — Esse


casamento é importante para mim.

Quase senti pena do olhar do Alexandre. Ele estava totalmente


desesperado para casar, ia inclusive casar com uma clara golpista, mas não dava
para continuar com isso. Eu nem lembrava de ter cometido o maior erro da
minha vida, porra!

— Desculpa, mas eu não posso levar isso adiante. Não se preocupe, a


gente vai atrás da sua noiva e resolve.

— Acha mesmo que ela vai querer casar comigo depois do que
aconteceu? Eu troquei de noiva, Gabriela. E agora eu já tenho uma esposa.

— Não, não e não! — Repeti saindo do banheiro e andando de um lado


para o outro no quarto — Cadê o meu celular? Preciso de orientação
profissional.

— Gabriela por favor, me escuta! — continuei procurando o maldito


aparelho — Só me escuta — Alexandre impediu que eu continuasse andando, se
posicionando na minha frente — Gabi... — ele se ajoelhou — por favor me ouve.
Quando eu acabar de falar você liga para o seu advogado.

Porra. Eu fiquei paralisada novamente. Quando um homem se ajoelha


aos seus pés ou ele irá te dar um orgasmo ou está completamente desesperado.
Está claro que nesse caso é a segunda opção. Fodeu muito.

— Tudo bem, eu vou te ouvir e em seguida vou ligar para o advogado.


Nada vai me fazer mudar de opinião — afirmei e estendi a mão para ele
levantar.

Espero estar certa. Que Deus me ajude.


O Chorão, vocalista do Charlie Brown Jr., tinha razão quando cantava
"para quem tem pensamento forte o impossível é só questão de opinião". Eu tinha
conseguido o impossível. Gabriela Burnier era a minha esposa. Pelo menos por
enquanto. A mulher estava surtando e louca para transformar esse feito
histórico em um mero incidente passível de anulação imediata.

— Gabriela eu precisava casar... — tentei introduzir, mas ela me


interrompeu.

— Já tivemos essa conversa.

— Mas éramos solteiros, agora somos casados — ela bufou e levou a


mão à cabeça — vou pedir o café da manhã para que a conversa seja menos
dolorida — sorri.

— Não sei se tenho estômago para essa conversa, Alexandre.

Fingi não ouvir e liguei para a recepção, solicitando um café completo.


Comida costumava me acalmar, espero que a ela também.

— Quer tomar um banho enquanto enviam o pedido?

Apenas nesse momento ela realmente me olhou. Os límpidos olhos azuis


percorreram meu corpo, de baixo para cima, parando no meu pau que até então
estava tranquilamente relaxado. Ela esteve tão furiosa que não tinha notado que
eu estava sem roupa ao seu lado o tempo inteiro, que decepção para o meu ego.

— Mantenha nosso amigo dentro de uma cueca — ela apontou para a


ereção que começava a surgir — por mais gostoso que você seja, estou
concentrada no nosso problema. Vou tomar banho — sorri para ela — sozinha.

E assim o fez. Gabriela só saiu do banheiro quando entregaram o café.


Nesse meio tempo eu vesti apenas uma cueca, obedecendo suas ordens como
um bom marido, mas ainda deixando meu corpo exposto. Todas as armas e
distrações seriam bem-vindas na batalha.

Ela saiu do banho usando o roupão do hotel. Os cabelos já estavam


completamente secos, o rosto ainda demonstrava contrariedade. Eu a
aguardava na mesa e contava com todas as frutas, iogurte, pães, café, ovos e
bacon para me ajudar. Ela sentou de frente para mim e se serviu de iogurte. A
aliança reluzindo na sua mão esquerda chamou minha atenção mais uma vez.
Quem diria que eu pensaria novamente em ver esse anel no dedo de uma
mulher?

Mas não foi por escolha, lembro a mim mesmo. As circunstâncias me


levaram até ali. Essa seria apenas mais uma transação comercial, eu só
precisava mostrar as vantagens que fariam com que ela concordasse em passar
um tempo comigo.

Comemos em silêncio. E eu tentei ao máximo não observar enquanto ela


comia. Quando as mãos dela pousaram os talheres sobre o prato, seus olhos se
fixaram nos meus e as sobrancelhas se ergueram em questionamento.

Sempre direta, Gabriela Burnier.

— As circunstâncias mudaram, Gabriela. Você aceitou casar comigo, não


posso aceitar que volte atrás quando o que mais preciso é que sigamos em
frente. Juntos.

— Que discurso romântico — ela bocejou — Eu não me lembro de ter


aceitado casar com você. Eu estava bêbada, geralmente fazemos merda sobre o
efeito do álcool.

— E sempre precisamos lidar com as consequências no dia seguinte —


pontuei.

— Eu lidarei, é só ligar para o advogado e saber como proceder.

— Gabriela, por cinco segundos se coloque no meu lugar. Você me deu de


bom grado o que eu mais estava precisando. Imagine uma pessoa com fome, ela
não come nada há uma semana, está desesperada por qualquer migalha e lhe
oferecem um banquete. Quando essa criatura está prestes a levar o primeiro
bocado à boca, querem afastá-lo da mesa. O que essa pessoa faz?

Ela engole em seco. Está ponderando sobre a analogia.

— Eu te prometi que seria um acordo de fachada, lembra? Que você


continuaria com a liberdade que tanto preza. Nós podemos morar onde você
escolher. Carro, motorista, um batalhão de empregados à disposição... O que
você quiser, quando quiser, como desejar, Gabriela.

Os olhos dela estavam fixos em um ponto distante. Perdidos em alguma


lembrança, ou talvez considerando as minhas palavras.

— Eu posso ser um bom marido — assim que as palavras saíram eu me


arrependi. Se pudesse sugá-las de volta para a minha boca, eu o teria feito.
Primeiro porque eu não seria um marido de verdade, não queria ser, era um
acordo. Em segundo lugar era a pior coisa para se dizer para a Gabi.

Ela focou meu rosto e sorriu. Eu deveria ter saído correndo, nada de bom
poderia vir por aí.

— Tudo bem — meu cérebro demorou para decodificar o significado


dessas duas palavras.
— O que disse?

— Você precisa ver a sua cara agora — a risada dela foi sonora —
Alexandre você estava desesperado, um homem desesperado é capaz de fazer
loucuras. Inclusive casar com uma mulher com uma placa luminosa escrita
"golpista", como a Tiffany. Não estou feliz e nem satisfeita com essa situação,
errei ontem quando casei com você. Mas posso tentar prolongar esse erro por
mais um tempo, desde que deixemos as coisas claras.

Soltei todo o ar que estava preso nos meus pulmões.

— Eu tinha um contrato pré-nupcial pronto, para Tiff ontem... Mas agora


não é mais viável. Podemos estabelecer nossas regras aqui e agora.

— Não preciso do seu dinheiro e não acho justo que você tenha qualquer
direito sobre o meu. Nós casamos com qual regime de bens?

— Acha que eu te daria o golpe do baú? — perguntei surpreso.

— Nunca se sabe. Por que só as mulheres são taxadas de golpistas nesse


caso? Você pode perder tudo, só quero estar prevenida para não lhe fazer um
favor maior do que o que estou disposta.

Mulher sincera do caralho.

— Casamos com comunhão parcial de bens — informei.

— Ótimo. Apesar de também não fazer questão de nada do que possa ter
a partir de ontem — ela sorriu — podemos morar separados?

— Não seria o ideal. Precisa ficar claro para você que ninguém jamais
poderá saber que nosso casamento é um acordo. Meus pais estão de olho. O
filho da puta do advogado estava me investigando e seguindo meus passos,
inclusive.

— Ok. Mesma casa. Empregados é importante, não serei dona de casa.

— Perfeito. Teremos que estabelecer um tempo mínimo de casamento.


Não posso me divorciar de repente. Um ano, no mínimo.

Ela estremeceu.
— Trezentos e sessenta e cinco dias de prisão. Nunca mais vou beber...
Foi, de longe, a minha maior burrada.

Não contive a gargalhada.

— Você acaba com a autoestima de qualquer homem, Gabi.

— Não é nada pessoal — deu de ombros — tem só mais uma coisa


essencial para que esse acordo dê certo, Alê.

— Sou todo ouvidos.

— Sem sexo.

Oi? Ela é a última pessoa no planeta de quem eu achava ser capaz de


ouvir isso.

— Você não pode estar falando sério, Gabriela — levantei e foi a minha
vez de andar de um lado para o outro.

— Estou falando sério. Precisamos deixar claro para nossa mente e para
os nossos corpos, por mais deliciosos que sejam, que isso é um acordo. Uma
transação — ergui as sobrancelhas — Esqueça essa última palavra. Estou
fazendo um favor para você, aceitando essa loucura. Não vou foder contigo. Essa
é a condição.

Graças a Deus eu não tinha contado sobre eu precisar de um herdeiro.


Ela pularia pela janela do vigésimo andar. Sem sexo... Como eu faria para ter um
filho? Inseminação artificial? Não importa, eu precisava dizer sim. Depois eu a
convenceria do contrário. Gabriela é puramente sexual, não seria mais difícil do
que fazê-la casar.

— Que fique claro que estou sendo obrigado a concordar com isso — eu
disse, por fim.

— Bem como estou sendo obrigada a permanecer casada.

Fim de jogo.
Agora que a mulher aceitou permanecer casada, eu não correria o risco
de dar brecha para que mudasse de ideia. Voltaríamos ao Brasil no mesmo voo,
o mais rápido possível. Consultei a sua opinião e ela prontamente aceitou.
Parecia querer começar com o teatro e se livrar de mim o quanto antes.

Estávamos de ressaca e cada um envolto em seus próprios problemas.


Por isso, arrumei minha bagagem, passamos no quarto dela — que ficava no
mesmo hotel — e rapidamente nos dirigimos para o aeroporto. Tudo isso foi
feito em silêncio.

Em determinado momento Gabi saiu da sala de embarque alegando que


precisava usar o banheiro. Fiz menção de acompanhá-la, com receio que ela
decidisse fugir, mas o olhar ameaçador que recebi fez com que eu voltasse a
sentar na cadeira.

Aproveitei o tempo para responder alguns e-mails, mas não pude deixar
de notar quando uma jovem morena se aproximava. Ela usava uma calça jeans
justa que moldava seu corpo e um top branco que apertava os seios grandes.
Trazia no braço uma jaqueta de couro preta e a tiracolo uma bolsa gigante. Não
me admiraria se ela retirasse de lá uma cartola, além do próprio coelho.

— Aqui está sua bagagem de mão, senhora Lunardelli.

Ela assentiu em resposta e sentou na poltrona ao lado da minha, mas não


me olhou, voltou a atenção ao celular. Observei quando ela verificou o celular
pela terceira vez em menos de um minuto, parecia ansiosa por uma ligação.
Expirou o ar com força ante de jogar o aparelho na bolsa.

A bela morena acenou para a funcionária da companhia aérea que


passava pelo local.

— Uma taça de champanhe, por favor!


— Lamento senhora, mas não poderei atender ao seu pedido. Aceita um
suco de maçã?

— Como assim? Não posso beber uma taça de champanhe? Isso aqui é ou
não a primeira classe?

— Desculpe senhora, são ordens do senhor Moura.

— Que inferno até aqui ele tenta me controlar! — reclamou alto atraindo
a atenção dos presentes.

— Uma taça de champanhe e uma soda — pedi a funcionária que apenas


assentiu e retirou-se. Um minuto depois a bebida foi servida.

— Mais alguma coisa, senhor Fragoso?

— Obrigado — sorri tocando a mão da moça que corou.

— Eu gostaria de lhe oferecer uma taça de champanhe, mas preciso


saber se é maior de idade — a morena revirou os olhos — O revirar de olhos é
bem típico de uma adolescente!

E assim ela abriu a bolsa gigante e ergueu a carteira de motorista em


minha direção revelando a data de nascimento. Vinte anos. Passei o copo, ao
invés da taça para ela.

— Que merda é isso?

— Beba... notei que está com sede.

— Mas...

— Não precisa agradecer — pisquei para ela.

Ela sorveu o champanhe que eu havia colocado no lugar da soda que


bebi, no copo.

— Obrigada — sorriu abertamente.

— Espero que ao desembarcar eu não seja detido por oferecer bebida a


você, mas não se nega uma taça de champanhe quando uma mulher pede.
— Não se preocupe meu carrasco mora em Brasília.

— Ufa! — Sorri.

— Prazer, Bruna Moura Lunardelli — esticou a mão em minha direção.

— O prazer é todo meu, Alexandre Fragoso.

— O rei da noite carioca! — ela usou o apelido que ganhei da imprensa


carioca — Já fui a uma festa sua.

— Eu teria visto você. Sou um ótimo anfitrião.

— Talvez eu não quisesse ser vista — piscou em minha direção

— Penetra!

— Convidada extraoficial, eu prefiro. Deu alguma festa em Las Vegas? Se


eu soubesse daria um jeito de aparecer — ela olhou para as minhas mãos —
Uma festa de casamento, suponho.

Havia esquecido que estava com a aliança.

— Ah, você sabe como é... Las Vegas.

— Usando esse olhar de conquistador barato para me convencer de que


devo flertar com um homem casado?

— Conquistador barato? Assim você me ofende.

— Seus olhos são capazes de enlouquecer a mais sensata das mulheres.

— É o seu caso?

— Não! — ela riu alto — Sou a mais enlouquecida das mulheres. Por isso
me negaram champanhe.

Quando pensei em respondê-la seu embarque foi anunciado, ela


levantou-se e piscou se despedindo. Caminhou em meio as pessoas, mas no
meio do caminho, voltou-se e gritou.

— Não esqueça de colocar meu nome na lista da sua próxima festa — e


passou pelo portão de embarque.
Essa garota é louquinha. Talvez se eu a tivesse encontrado no voo de ida,
teria feito a proposta. Sexo ela não me negaria, estava mais do que claro nos
seus gestos. Como se seguisse o rastro dos meus pensamentos, a senhora
Fragoso apareceu.

— Já anunciaram nosso embarque, vamos?

— Estava apenas aguardando você. Vamos!

Rio de Janeiro, aí vamos nós.


Tudo continuará como antes, Gabi. Tudo continuará como antes.

Não é uma aliança na mão esquerda que te tornará diferente. Isso é só


mais um anel. Muito mais grosso do que a maioria que você tem, mas ainda
assim um anel.

Eu me convencia mentalmente, enquanto o piloto pedia para colocar a


poltrona na posição inicial e apertar os cintos, pois já estávamos nos
preparando para pousar. ⁠ ⁠ ⁠Quase treze horas depois finalmente estávamos
aterrissando no Rio. Dormi boa parte do trajeto e também fui ao banheiro
algumas vezes por causa da quantidade de líquidos que eu ingeri para me
recuperar da ressaca. Estava exausta.

Minha cabeça estava melhor, mas meu corpo precisava de muitas horas
de sono tranquilo. Apesar de viajar na primeira classe, voos longos sempre
acabavam comigo. Principalmente os de volta. A empolgação da ida me ajudava
a ignorar o trajeto.
Suspirei aliviada quando pisei fora do aeroporto. Havia um motorista
nos aguardando antes mesmo que eu conseguisse trocar o chip do meu
aparelho celular.

— Vamos? — Alê abriu a porta do carro para que eu entrasse e um


arrepio percorreu todo o meu corpo, como um aviso.

Era para valer. Eu ia mesmo brincar de casinha?

— Não posso! — balancei a cabeça dando um passo para trás.

O motorista já havia colocado nossa bagagem no porta-malas e tentava


disfarçar, mas estava curioso assistindo a cena.

— Gabriela, por favor entra no carro, precisamos descansar.

— A gente ainda não acertou esse detalhe. Podemos começar amanhã?


Preciso passar no hotel, arrumar as minhas coisas...

— A gente descansa hoje e amanhã eu te ajudo a arrumar tudo. Você


precisa conhecer a minha casa para decidir se gosta e se continuaremos por lá.

Respira fundo e entra no carro Gabi.

O Alexandre diminuiu o espaço entre nós e parou na minha frente.


Segurou uma das minhas mãos e acariciou meu rosto com a outra.

— Por favor, Gabi — disse baixinho — O que mais eu posso fazer para
você entrar nesse carro?

A voz dele estava mais doce e suplicante, os olhos me fitavam com


expectativa.

Droga!

— Não me toca assim... — ele afastou imediatamente as mãos. Mas o


toque quente deixou seu rastro, que se alastrou pelo meu corpo.

Por quanto tempo vou conseguir resistir ao toque desse homem? Isso eu
descobriria depois. O plano agora era: entrar no carro, me trancar em um
quarto e dormir por muitas horas. Descansada eu conseguiria pensar melhor.
Seguindo os comandos básicos do plano, sentei no banco traseiro do
carro com o Alexandre ao meu lado. Não demorou para que chegássemos numa
mansão. Amanhã eu olharia cada detalhe, no momento queria me afastar do
cheiro desse homem. Adentramos juntos no ambiente, na sala, uma mulher de
meia idade usando uma roupa bege nos aguardava com expectativa. Ele
provavelmente avisou da nossa chegada.

— Boa noite! Fizeram boa viagem? — cumprimentou-nos solícita.

— Boa noite — respondemos em uníssono.

— Carmem, essa é Gabriela Burnier... Fragoso — completou rapidamente


— Minha esposa.

— É um prazer conhecê-la, senhora Fragoso — contive o ímpeto de


revirar os olhos.

— Apenas Gabriela — sorri para a Carmem.

— Sim, senhora Gabriela.

Amanhã eu tiraria esse "senhora" da boca daquela mulher. Se íamos


conviver por um tempo, queria um pouco menos de formalismo.

— Nossos quartos estão prontos? — Alê indagou para a mulher. E pela


sua naturalidade presumo que soubesse que dormiríamos em quartos
separados. Ela apenas assentiu. — Poderia acompanhar minha esposa ao
quarto? — completou.

— Claro! A Luciana irá acompanhá-la — uma jovem mulher surgiu


imediatamente, era a deixa para eu sair dali.

Caminhei em silêncio entre os corredores, a mulher à minha frente


parou em umas das portas e a abriu revelando um imenso quarto. Sorri em
agradecimento e fechei a porta logo em seguida.

Finalmente só!

Joguei-me na cama. O quarto estava limpo e parecia ter sido preparado


para me receber. Ou talvez o Alexandre recebesse, com frequência, visitas
femininas. O branco era predominante, paredes, teto, chão e cortinas. Móveis de
um bege suave, guarda-roupas, cama com cabeceira e uma mesa. Notei ao redor,
afundando naquele colchão fofo. Guarda-roupas? Acho que vou começar minhas
exigências de esposa: quero um closet.

Contra todas as vontades, arrastei-me até a suíte, ignorando o celular


que não parava de tocar indicando a atualização de todas as mensagens e
ligações que recebi durante essa semana em Vegas. Uma chuveirada quente foi
o suficiente para quase me fazer dormir em pé sob os jatos relaxantes. Enrolada
numa toalha me joguei novamente na cama com a intenção de arrastar a mala e
procurar o que vestir. Mas não foi o que aconteceu, o sono me levou assim que
eu senti o colchão sob meu corpo cansado.

Pode beijar a noiva. Gritos e aplausos foram ouvidos em seguida, mas


nada conseguiu me distrair da boca que tomava a minha. Eu me senti dominada,
sugada de corpo e alma naquele beijo que selava o início da minha nova vida. De
repente, o padre jogou longe a batina e exibiu um macacão justo, com a calça
boca de sino. Os dedos ajeitaram um topete negro alto e ele começou a cantar. O
casamento virou um show.

Do Elvis Presley.

Meu vestido de noiva foi encurtado e ganhou brilhos. Eu sorria e dançava


ao som do rock. O padre Elvis segurou minhas mãos e me fez girar. Uma, duas,
três voltas depois senti-me tonta e enjoada. Foquei o rosto do homem que
dançava comigo e ele se transformou mais uma vez. Jogou longe a peruca, o
macacão e ficou nu. O homem era Alexandre Fragoso. Meu marido.

Acordei sentindo calor um intenso. Que sonho foi esse? Ou seria


pesadelo? Já que casar em Vegas não pode ser considerado o tipo de sonho que
eu teria. Mantive os olhos fechados por via das dúvidas.

— Acorda, querida — aquela voz... Não é possível. É só um sonho. É só


um sonho. É só um sonho. É só um sonho — Gabi...

Num gesto rápido, meu sonho se materializou ao meu lado na cama.


Usando o braço e a perna para me prender ao colchão. No segundo seguinte o
quarto foi invadido.

— Meu filho eu... Ohhhhhhhh — abri os olhos de uma vez para ver em
que circo estava metida.

Uma senhora de cabelos castanhos estava de olhos arregalados,


enquanto um senhor estreitava o olhar avaliando a cena. Carmem também
estava ali. Só então me dei conta de que estava nua na cama, com o Alexandre
tentando esconder meus peitos com o braço e meu sexo com a perna.

— Desculpe, eu tentei impedi-los, mas não consegui — Carmem deu de


ombros.

— Bom dia querida, acho que esse não é o momento mais adequado, mas
esses são os meus pais — ele riu e beijou minha nuca.

Eu não sou uma mulher tímida, mas senti meu rosto esquentar diante da
situação.

— Vamos esperar lá em baixo, amor — o senhor teve que arrastar a


mulher que saiu com um risinho no rosto.

— Que porra foi isso? — exclamei soltando o ar.

— Seus sogros! — disse sorrindo.

— Isso não tem graça. Quase enfartei de susto — ele continuava na


mesma posição — pode me soltar agora.

Rapidamente ele rolou para o lado, me liberando.

— Te espero lá em baixo. Hora de começar o nosso show — Alexandre


saiu do quarto, mas tive tempo de notar que ele usava apenas uma samba-
canção.
— Vai ser um longo dia. — Lamentei ainda com sono.

Demorei apenas cinco minutos para lavar o rosto, escovar os dentes e


entrar num vestido de alças finas. Quando desci a família estava reunida na sala
que eu nem ao menos tinha observado e gostaria muito de reparar em cada
detalhe para adiar esse encontro, mas seria estranho demais se a "esposa" não
conhecesse a sala do "marido", então andei como se soubesse onde ficava cada
dobra do tapete caro.

— Desculpem pela demora — sorri e sentei ao lado do Alexandre no sofá


branco. Os pais dele estavam bem próximos um do outro, na extremidade do
sofá em L.

— Não demorou, querida — Alexandre segurou minha mão com


familiaridade — Estava justamente começando a explicar para eles por que
estávamos no quarto de hóspedes.

— Fomos até seu quarto e a cama estava desfeita... — começou a mãe


dele.

— Chegamos ontem de viagem, estávamos exaustos e fomos para a


cama... Vocês sabem, acabamos não dormindo. Mas o filho de vocês me irritou e
eu fui para o outro quarto.

— E aí eu senti falta dela na cama e a procurei. Acabamos fazendo as


pazes e ficando por lá mesmo — ele completou muito bem a minha mentira.

— O Alexandre pode ser bem irritante quando quer — dei de ombros e a


mãe dele riu — Por sinal, meu nome é Gabriela.

— Gabriela Burnier! — o pai dele disse como se lembrasse de alguma


coisa.

— A própria. — sorri. Queria perguntar o nome deles, mas seria uma


bola super fora — Prazer em finalmente conhecê-los.

— Vamos comer? Trouxemos café completo para comemorar com você,


amor — a mãe levantou toda sorridente.

Comemorar o que? Será que ele havia avisado sobre o nosso casamento?
Sentamos à mesa que estava realmente caprichada. Digna dos melhores
restaurantes cinco estrelas. Bela comemoração. Apesar disso, não havia
empregados por perto no momento. Os pais dele estavam se servindo, peguei
algumas fatias de melão e melancia para iniciar o desjejum. Meu estômago
ainda se recuperando da ressaca.

— Café com açúcar ou adoçante? — Alexandre perguntou para me


servir.

Lá estava a primeira prova cabal que não sabíamos nada um do outro. Eu


não era viciada em cafeína, na verdade evitava ao máximo ingerir, não era
agradável ao meu paladar... Ainda mais pela manhã.

— Humm... — fingi pensar para decidir — Hoje quero suco de laranja


para diferenciar — ele abandonou o bule e me serviu o suco sob os olhares
atentos dos pais que analisavam nossa interação — Obrigada.

— Vocês se conhecem há muito tempo? — o pai perguntou.

— Sim!

— Não! — eu neguei.

Mas respondemos ao mesmo tempo. Droga, não dava para voltar atrás.

— Sim e não — ele sorriu tranquilo — Dizem que o tempo é relativo, não
é? Para mim é como se a conhecesse há anos, mas na verdade nos conhecemos
ano passado.

— Isso mesmo! — Concordei.

— E como se conheceram? — foi a vez da mãe perguntar.

— Sou uma das melhores amigas da Fernanda Albuquerque, esposa do


Marcos — o olhar da senhora brilhou de entusiasmo. — Nos encontramos
algumas vezes e de cara nos demos bem.

— Ela mencionou viagem... onde estavam, filho?

— Las Vegas, pai — imediatamente o olhar dos senhores perpassaram


da minha aliança para a do Alexandre — Pois é — Alexandre assentiu em um
recado.

— Não! Você se casou sem nós? — a senhora exclamou horrorizada.

— Mãe...

— Você é meu único filho, não podia fazer uma coisa dessas.

Comemos em silêncio por um tempo, mas nada parecia ter gosto na


minha boca. Hora de interferir, Gabi.

— Fui eu quem insisti para que nos casássemos. Estávamos


aproveitando a cidade, tudo ia bem... Ele já havia me pedido em casamento e
depois de esperar tanto tempo... Por que adiar? Era como um teste. Achei que
ele não ia querer. Achei que ele estava blefando na proposta de casamento. Mas
aqui estamos nós — apertei a mão dele, que levou a minha a boca e beijou meus
dedos.

O pai encarava Alexandre, ainda desconfiado. Já a mãe era toda olhos


sonhadores. O sorriso despontando, o coração amolecendo... Ela convenceria o
marido a baixar a guarda.

— Seja bem-vinda a família — a senhora sorriu e esticou as mãos para


segurar as minhas, depositei-as entre as suas — Sempre quis ter uma filha,
alguém que pudesse me acompanhar nas compras de bolsas e sapatos, ir ao
salão de beleza e conversar. Meu marido e meu filho não gostam dessas
atividades — enquanto ela falava animadamente, um nó se formou em minha
garganta. Ela queria uma filha. Achava que estava ganhando uma, quando na
verdade eu não passava de uma manobra para livrar o filho dela de uma
confusão.

A gente não deveria mentir assim para eles. Olhei de soslaio para
Alexandre que parecia ler os meus pensamentos, seu olhar era tristonho.
— Alexandre, você deve estar muito feliz em ver as duas mulheres da sua
vida se dando bem não é mesmo?

— Claro, pai — ele forçou um sorriso.

— Já ia esquecendo, amor — a mãe voltou-se para o filho — Seu


presente está no carro.

Presente? De casamento?

— Aposto que vai gostar — o pai falou orgulhoso.

— Foi seu pai que escolheu.

— Não precisava, já gostei da surpresa de terem vindo tomar café


conosco.

— Claro que precisava, vamos buscar lá no carro — Alê olhou para mim
como se calculasse se deveria deixar eu e sua mãe a sós. Sorri em resposta
afirmativa e eles saíram.

— E você Gabriela o que comprou para seu marido? — Indagou curiosa.

— Se eu disser a senhora que não tive tempo de comprar, acreditaria?


Seu filho não desgrudou de mim um só minuto nessa viagem e voltamos ontem.

— Entendo sim — sorriu — Mas até onze e cinquenta e nove ainda será
aniversário dele e tenho certeza que você saberá como presenteá-lo.

Aniversário!? Bela esposa.

— O Marcos vai enlouquecer quando souber que o camarote do Palestra


está reservado para a gente bebemorar! E ainda mais: na final do Paulistão —
ele estava eufórico.

— Eu disse que ele ia gostar — o pai estava orgulhoso da escolha do


presente.

— Meninos! — a mãe sorriu.

— Obrigado, pai. Obrigado mesmo!


— Agora vamos embora, os recém-casados precisam de um tempo a sós
— a senhora piscou cúmplice — Não gostávamos de ir às festas que o nosso
filho dava, mas acredito que esse ano será diferente. Acho que nos
encontraremos no fim de semana!

— Claro que sim e se precisar de ajuda nas compras, é só me ligar — ela


me abraçou com força. Por alguns segundos de surpresa, não me movi, no fim
relaxei nos braços da minha pseudosogra e retribuí o carinho. Nos despedimos e
eles se foram.

Nunca fui uma mentirosa, na verdade sempre me acusaram de sofrer de


sincericídio. Ou seja, é difícil para mim omitir o que penso sinceramente e isso já
causou alguns prejuízos nas minhas relações interpessoais. O que vou fazer
agora? Como vou transformar minha vida numa mentira?

Agora não daria mais para voltar atrás. Já havia envolvido os pais dele.
Parece que o destino estava começando a me ajudar. Não contava com a
aparição dos meus pais tão repentinamente. Mas essa foi a melhor solução para
os possíveis problemas que surgiriam durante o nosso primeiro dia de volta ao
Rio.

Mesmo exausto, não dormi bem. O receio que a Gabriela surtasse e


decidisse fugir invadia meu sono, resultando em pesadelos. Por isso, ouvi
quando a campainha tocou no andar de baixo. Peguei o celular apenas para
confirmar que era bem cedo para quem viajou por horas e não dormiu à noite:
oito da manhã. Na tela do aparelho vi duas chamadas perdidas da minha mãe e
foi então que deduzi quem eram os visitantes dessa manhã. Corri para o quarto
de hóspedes, que graças a Deus estava destrancado, e me deparei com a Gabi
nua. Deus, essa era uma bela visão. Tentei acordá-la, mas presumindo que não
teria tempo, me joguei ao seu lado e tentei esconder seu corpo com o meu
quando a porta foi aberta.
Deu tudo certo. Nora e sogros foram apresentados, tomaram café juntos
sem muitos incidentes e ao fim daquela manhã duas coisas foram riscadas das
minhas obrigações:

1. Convencer a Gabi que não dava para voltar atrás.

2. Apresentar minha esposa aos meus pais.

Acho que esse era um aniversário feliz, dadas as circunstâncias. Quando


meus pais se foram, a Gabi subiu as escadas correndo e suspirei aliviado. Já na
minha suíte, livrei-me da camiseta, bermuda e cueca. Ignorei a jacuzzi e abri um
dos chuveiros mais fortes. As gotas grossas caindo sobre a minha cabeça
traziam a sensação de estar em meio a uma chuva torrencial. Houve dias, há
muito tempo, em que as lágrimas me inundaram tanto quanto esse chuveiro. O
dia do meu aniversário me trazia lembranças que eu tentava esquecer.

Uma boa dose de shampoo foi necessária para massagear meu couro
cabeludo e desviar meus pensamentos para a Gabi nua. Pernas torneadas,
barriga seca e seios médios empinados e atrevidos, como a dona. Como homem,
sou amante das belas mulheres e ninguém em sã consciência pode negar a
beleza de Gabriela Burnier. Se vestida ela era um espetáculo, nua era de fazer
qualquer um babar.

Lembrar daqueles bicos pontudos e rosados me fazia querer morder e


sugar. Ensaboei meu peitoral e toquei a minha ereção que já surgia. Há algum
tempo eu não necessitava me tocar para me satisfazer, mas nesse momento era
o que eu precisava. Pensei em tê-la ajoelhada ali, com a boca delicada me
chupando... Me masturbei devagar sentindo meu sangue se concentrar naquele
ponto específico. Acelerei o movimento da minha mão direita quando pensei em
tê-la de quatro, me recebendo com gritos quando eu a fodesse com força. Gozei
imaginando um sexo anal apertado e lambuzado.
— Ahhhhhh — esporrei no chão enquanto a água lavava os fluídos e os
meus pensamentos.

— Nossa, até esqueci a minha lista de reclamações — segui o som da voz


e me deparei com a Gabriela recostada na parede, próximo a porta. Ela me
assistia com olhos e boca levemente entreabertos e exalava luxúria.

— Você deveria ter vindo me ajudar, ao invés de só assistir — disse


desligando o chuveiro.

— Não parecia que você precisava de ajuda... E achei que homens feitos
não batessem punheta no banho. Estou surpresa.

Gargalhei diante da afirmação e da simplicidade com que ela falava de


sexo.

— Não sou de bater punheta, Gabi. Mas considerando os últimos dias e a


sua condição de "não sexo" era o que tinha disponível no momento.

— E em que você estava pensando? — ela me encarou quando andei nu


até alcançar uma toalha.

— Em quem. Em você. No seu corpo delicioso e em tudo que eu queria


fazer com ele — secando o cabelo diminuí a distância entre nós, chegando bem
perto dela.

— Que delícia... — sussurrou. Suas mãos testaram a temperatura do meu


peito, pousando ali — Onde você me meteu, Alexandre?

— Meter, Gabi? Acho que a pergunta é onde eu gostaria de meter em


você — ela gemeu baixinho — Melhor: onde você gostaria que eu metesse?

Larguei a toalha e puxei o corpo dela para junto do meu.

— Isso não vai ser fácil... — seus dedos desceram pelos músculos do meu
abdômen — Você deveria ser menos gostoso para facilitar essa relação.

Eu sorri devagar.

— Podemos fazer isso ser simples e beneficiar a nós dois — abaixei as


alças do vestido e beijei um dos ombros nu.
— Precisamos conversar... — mordi seu ombro de leve — Ai caralho, não
consigo pensar com você sem roupa.

Ela deu um passo para trás, apanhou a toalha e a jogou sobre mim.

— Precisamos conversar! — repetiu e andou para fora da suíte.

Eu a segui tranquilamente, enrolando a toalha na minha cintura.

— Você não me disse que hoje era o seu aniversário. Sua mãe me
perguntou o que eu comprei para o meu marido! Sorte sua que eu não faço jus
às piadas sobre loiras e respondi rápido que ainda não havia tido tempo de
comprar.

— Você passa longe de ser uma loira burra, Gabi. Que horas eu deveria
ter comentado sobre a data que nasci? Você também não me disse quando é o
seu aniversário.

— Seus pais me viram nua! Você armou para que eu não tivesse como
sair dessa. Jogou sujo, Alexandre.

— Eu não sabia que eles viriam, não é um costume tomar café da manhã
comigo no dia do meu aniversário — o olhar que me lançou era de quem não
acreditava em nenhuma palavra do que eu dizia — Estou falando sério. Se eu
tivesse armado isso, teria feito de uma maneira em que dormíssemos na mesma
cama, eles quase nos pegaram em quartos separados. Não esqueça que sou o
mais interessado em convencê-los.

— Não gostei de mentir para a sua mãe — ela se jogou na minha cama,
fitando o teto — Ela acha que ganhou uma filha. Aliás, você pode me dizer o
nome deles?

— Vilma e Alex. Também não fico feliz em mentir, mas eles me


obrigaram a isso. Notei que minha mãe gostou de você, isso facilita nossa vida.

— Suas festas são dignas de matérias em colunas de celebridades, você


vai dar uma festa e não se deu o trabalho de me informar? — me acusou
novamente.
— Gabriela nós não tivemos tanto tempo para conversar. A festa está
marcada há muito tempo, nem sou eu quem estou organizando. São amigos que
vão dar uma festa na minha casa e por acaso é meu aniversário que vão
comemorar.

— Quando? Onde? Que horas?

— O fim de semana inteiro. Na minha casa de praia.

— Porra! Quantas pessoas?

— Não sei. Acho que não chega a cem — larguei a toalha e vesti uma
cueca.

Ela observou enquanto uma calça jeans escura e uma camisa azul
marinho cobriram meu corpo. Quando borrifei perfume e terminei de pentear
os cabelos, ela verbalizou:

— Vai sair?

— Já está bancando a esposa hein? — ela fechou a cara — Estou


brincando, Gabi. Vou sair para ver umas coisas, mas pode ficar à vontade. A
casa é sua.

— Ra-ra-ra que piada incrível, a casa é sua considerando nossa


separação de bens.

— Como quiser. A Carmem pode te auxiliar no que precisar — saí do


quarto antes que ela me segurasse por mais tempo.

Homens, diferentes das mulheres, não se importam tanto com o número


referente à sua idade. Portanto, completar quarenta anos não era o motivo pelo
qual fugi de casa o dia inteiro. Essa data era sempre complicada. Aliás, nem
sempre. Quando eu era criança marcava no calendário que o papai me deu, dia
após dia, contando cada um dos 365, até chegar àquele em que ficaria maior.
Mais forte. E que, claro, teria uma festa e ganharia presentes. Sempre fiz listas
de presentes. Bicicleta, Skate, bola importada, viagens... Eu só precisava ser um
bom garoto, tirar notas aceitáveis e sempre conseguia o que queria.

Anos depois passei a desejar ardentemente tal data para que pudesse
comemorar a dois. As surpresas femininas conseguem superar todas as nossas
expectativas. Eu amava o meu aniversário. Até que passei a odiar, por não ter
mais motivos para amar.

Entorno mais uma vez o copo cheio do líquido que afoga as dores:
Whisky. Não sinto mais o ardor que a bebida causava no começo. Mais da
metade da garrafa já se foi, de qualquer forma. Mas ainda não estou bêbado o
suficiente, pois noto uma mulher se aproximar da mesa em que estou sentado
sozinho, no fundo do bar anexo a uma boate movimentada. Ela para em frente à
mesa, dando-me a visão de belas cochas expostas num vestido branco colado.
Quadris largos e cintura fina, seios grandes e... Cabelos cacheados volumosos.
Conheço-a de algum lugar.

— Se ainda consegue me comer com os olhos significa que não está a


ponto de desmaiar como imaginei — ela puxou a cadeira e sentou ao meu lado.
Olhando bem, ela está mais para uma garota do que para uma mulher.

— Hum, conheço você de algum lugar... — disse, enchendo o copo mais


uma vez — O que quer, garota?

— Claro que conhece, você descobriu que sou penetra nas suas festas.
Por sinal, tô sabendo que vai rolar nesse fim de semana — ela pegou meu copo
e bebeu metade do conteúdo e depois o encarou — Puro? Dia ruim?

— A penetra... Bianca, Bárbara? Hoje é meu aniversário, posso beber o


quanto quiser. Peça um copo para você e me devolva o meu, por favor.

— Quase acertou: Bruna! E que maneira deprimente de se comemorar!


Vamos levantar dessa mesa e nos divertir, então.

— Tá me propondo sexo? Talvez essa seja uma maneira boa de se


comemorar — a garota gargalhou alto.
— Estava pensando em dançar, conversar, beber em dupla... mas sexo é
do meu interesse também. Cadê a sua esposa?

Esposa. A palavra ainda é difícil de se ouvir. Imediatamente olhei para


aliança na minha mão esquerda e lembrei da mulher que está na minha casa e
que tinha tudo para facilitar meus planos, mas não quer foder comigo. Como
vou ter um filho?

— Ficou pensativo, rei da balada? Desse jeito vou achar que seu apelido
é uma farsa.

— Tudo bem, penetra. Vamos lá — levantei rápido demais e me senti


um pouco zonzo, mas me firmei e segui em frente. Como sempre.

Andamos até o anexo onde ficava a boate. A agitação e as luzes que


piscavam o tempo inteiro me deixou um pouco mais tonto, mas a Bruna
encostou o corpo no meu para não permitir que eu oscilasse. Segurei em sua
cintura e começamos a nos movimentar em meio à multidão de corpos que se
espremia e remexia ao som do funk. Dançamos diversas músicas. A morena
tinha um rebolado enlouquecedor, ia no chão e subia fazendo o vestido subir
em cada um desses movimentos. Me encarava e sorria. Provocava se esfregando
e eu tentava acompanhar o seu ritmo. Eu precisava concordar com a letra que
estava tocando no momento: Essa novinha é terrorista, é especialista. Quando ela
bateu com a bunda no chão eu parei de dançar hipnotizado. Mostrar calcinha
naquele momento era o de menos, a garota me dava a visão de metade da sua
bunda.

Quando ela levantou e rebolou de pé, eu já estava duro. Puxei seu corpo
de costas para mim e deixei claro que ela tinha conseguido me animar. Fui
empurrando seu corpo entre os outros para que pudéssemos andar, sem nos
separar. Ela continuou dançando e se esfregando até que chegamos na saída. No
estacionamento, continuamos andando na mesma posição, mas ela com as mãos
para trás já abria o botão da minha calça jeans. Destravei a porta do fundo do
Ranger Rover e ela engatinhou de quatro, suspendendo o vestido.

Mesmo zonzo era visível que sua calcinha fio dental era minúscula e que
aquele rabo grande merecia mais atenção do que eu seria capaz de dar nesse
momento. Senti dificuldade para esticar o preservativo com rapidez, o que a fez
rir alto por estar esperando naquela posição. Apenas por isso meti sem
nenhuma preliminar. Ela gritou e me empurrou de volta.

— Gosta de uma foda rápida, Bruna? — perguntei ao segurar nos seus


ombros para ter equilíbrio. Ela gemeu — Espero que isso seja um "sim".

Ela me recebeu várias vezes, com força. Como se merecesse a punição de


ser fodida sem ao menos um beijo na boca. Eu não conseguia pensar em
consertar isso, apenas em desanuviar minha mente metendo sem pensar. Não
demorou para que eu gozasse, tanta bebida me deixou mais leve, mas a garota
precisou que eu a virasse e usasse minha boca para compensar.

— Pelo menos não me largou na mão — ela arfou depois que


estremeceu sob minha língua — Feliz aniversário, rei da balada.

É a última coisa de que me lembro.

Meu pescoço doía. Senti ao tentar mexê-lo. E meu quarto estava claro e
quente demais, podia notar sem abrir os olhos. Será que esqueci de ligar o ar-
condicionado? Abri os olhos para perceber que o ar estava ligado sim, mas não
resfriava porque o sol estava batendo no meu rosto, passando pelo vidro do
para-brisa. A chave estava na ignição.

Caralho... Dormi no carro? Por isso a dor no pescoço e, notei agora ao me


mexer, nas costas. Pelo menos estou no banco do passageiro, o que significa que
não dirigi embriagado. No banco do motorista encontrei meu celular e um
bilhete.

Se eu fosse uma golpista essa hora você estaria sem carro, sem celular e
sem dignidade alguma. Me ligue para agradecer. Quero convite pra festinha.

B. Penetra - 98803-0069

— Pelo menos não precisarei me masturbar no banho feito adolescente...


— resmunguei enquanto fechava o botão da calça que ainda estava aberto e saí
do carro com a roupa tão amarrotada quanto meu rosto.

Eram cinco da manhã quando entrei e casa, tudo estava silencioso. Passei
pela ampla sala e caminhei em direção a cozinha, minha boca estava seca,
precisava de água. Antes de chegar até lá, vi a mesa de jantar posta para duas
pessoas. Nada muito romântico, mas muito mais elaborado do que a Carmem
costuma fazer para mim sozinho. Flores na mesa, souplast e louças especiais.
Será que a Gabi ia jantar comigo?

Bebo meia garrafa de água antes de subir, passei no quarto de hóspedes,


mas a porta estava trancada. Andei até o meu próprio quarto tentando fazer o
mínimo de barulho possível. Deixei os objetos no criado-mudo e fui direto para
a minha suíte. Dessa vez é a Jacuzzi que vou usar. Uma hidromassagem é tudo
que preciso para que meus músculos doloridos relaxarem.

E é isso que faço por cerca de meia hora. Quando decido que minha cama
é o melhor lugar do mundo.
Não acredito que quarenta e oito horas com uma aliança na mão
esquerda, um aniversário e uma pseudosogra carinhosa foram suficientes para
me fazer de otária. Como não sabia como lidar com meu novo estado civil diante
dos outros, optei por passar o dia na casa do Alexandre. Com o celular
desligado, só por precaução. Assim, conhecendo e me familiarizando, andei
pelos arredores da mansão para notar que, ao contrário do que pensei, ela não
fazia parte de um condomínio fechado. Era como a casa dos pais da Fernanda
em São Paulo, imensa e com muros como um condomínio, mas só havia uma
única casa. Sem vizinhos para espiar sua vida. Além da piscina, havia um espaço
com gramado para jogar futebol society e uma sauna. Bastante espaço de lazer
para apenas uma pessoa. A casa era grande e espaçosa, o quarto do Alexandre
era o maior dos três e o único que possuía um closet. Acho que eu deveria exigir
ficar nele, sem o dono do quarto, para o bem da minha saúde mental e das
minhas novas convicções.

Passei boa parte do tempo na piscina, mas fui interrompida pela Carmem
que me serviu almoço lá mesmo. Ela insinuou, discretamente, que poderia
preparar um jantar especial para o aniversário do patrão. Não vi problemas
nisso e até me animei sugerindo o cardápio, afinal eu também ia desfrutar do
jantar. Tomei banho e me arrumei, como sempre, não era porque ia jantar em
casa que me apresentaria de qualquer forma. Pensei até num presentinho para
o Alê. Desde que eu determinasse que seria apenas dessa vez, poderíamos
finalmente ter a nossa noite de núpcias. Na verdade, eu não aguentava mais e
precisava dar para alguém. Essa tensão toda desde Vegas somada ao fato de ver
aquele homem nu mexia com meus hormônios e eu nunca fui de negar-me nada.

A cada hora que se passava, mais raiva eu sentia. Quando a Carmem


perguntou se eu queria que ela o localizasse, eu fui para o meu quarto. Sem
comer. A mulher estava sentindo pena de mim?! Só porque aceitei a sua
sugestão imbecil de jantar no aniversário do filho da puta que não deu as caras
durante todo esse tempo? Não. Ela não me conhecia. Não sabia que eu não
nutria a menor esperança de que ele fosse aparecer ou que eu entrei nessa sem
querer. Não fazia ideia de que tudo que eu mais queria era voltar no tempo e
deixá-lo casar com a golpista da Tiff. Ela achava que eu estava trancada no
quarto, talvez chorando, porque o Alexandre tinha aceitado as minhas
condições.

Ela estava errada, claro. E a lágrima que escorreu pelo meu rosto era
fruto da TPM maldita que me acompanha todo mês, da raiva de ter me metido
nessa merda e feito o primeiro papel de otária na pele de esposa. Mas esse seria
o primeiro e o último papel de trouxa.

Horas depois, ao amanhecer, ouvi alguém mexendo na maçaneta da


porta do quarto. Porta esta que tranquei. Quando os passos se afastaram,
precisei saber se eram dele ou da Carmem que trazia algo para eu comer, pela
terceira vez. Não era a Carmem, notei seguindo os passos dele. Assim que o
Alexandre entrou no próprio quarto, deixou algumas coisas no criado-mudo e
seguiu para a suíte. Entrei logo em seguida para achar um bilhete que deixava
claro que Gabriela Burnier poderia voltar a ser quem era, sem considerar o
atual estado civil. Se ele não estava com receio de demonstrar a farsa que era
esse casamento, quem era eu para temer?

Já que ele me ofereceu motorista, pegar um dos carros emprestados não


ia fazer mal algum, ia? Como o Ranger Rover estava estacionado em frente à
casa, suspeitei que fosse o preferido. A chave ainda estava na ignição, então
facilitou minha vida. Dirigi até o hotel em que morava no Rio. Preparei um drink
e liguei o som no volume máximo. Se você precisa fazer algo que não gosta
muito, álcool e música te ajudam e dão uma animada.

Eu sou
A carinha das noitadas
Curto as madrugadas
Bebendo uma gelada

Não gosto
De ter hora marcada
Pra voltar pra casa
Eu gosto de virar
As noites nas baladas

Ao som de Sem Querer da Ludmilla, arrumei algumas roupas na minha


mala grande. Mas precisei de todo o seu repertório, dois CD’s da Anitta e seis
garrafinhas de Stella Artois para arrumar quase todas as minhas roupas,
sapatos, joias, bolsas e acessórios. Liguei meu celular em seguida, para dar de
cara com várias mensagens das meninas no grupo "Quadrilha do salto alto e
gloss". Basicamente elas cobravam o meu sumiço mesmo após ter voltado ao
Brasil. Por isso, decido respondê-las antes de checar as demais mensagens.

Isso é o que eu chamo de saudades. Estou bem, viva e gostosa como


sempre ;)

Já estávamos a ponto de chamar a polícia.


Sol respondeu imediatamente.

Onde estava, Gabi?

Lú enviou ao mesmo tempo.

Lú, achei que ainda estivesse em lua de mel, se está dando tempo de
sentir a minha falta tem algo errado por aí kkkkkk

Mandei saindo pela tangente.

Tem homem na história, com certeza!

Fernanda enviou e acertou na mosca, como sempre. Ela só não fazia ideia
do tamanho da mosca.

Sempre tem ;)

Aticei a curiosidade delas.

Conta!

Diz!
Vocês vão saber já, já. Preciso terminar de arrumar umas
coisas, só apareci para que parassem de chorar. Beijos ;*

Pedi comida japonesa e passei o resto do dia no hotel, o Alexandre me


ligou duas vezes e eu não atendi. Jantei, tomei banho e me preparei para ir a
Carpe Vita, chega de me esconder do mundo. Eu precisava ser vista. E tocada, de
preferência.

Escolhi usar um macaquito vermelho, de tecido, mangas longas e frente


composta. As costas eram nuas e o cumprimento ia até o meio das minhas
coxas. Sexy, sem ser vulgar. Scarpin nude nos pés e batom da mesma cor
completaram o meu visual. O lado bom de ser promoter de uma casa noturna é
poder ter liberdade para me vestir. E sendo sócia, havia liberdade para despir
também.

Passei tudo para o carro com ajuda de um funcionário do hotel e encerrei


minha estadia, sob o olhar triste do gerente que deixaria de ganhar muito com
uma hóspede permanente como eu. Dirigi até a boate e estacionei próximo, pois
as vagas em frente a Carpe estavam todas ocupadas.

Quando atravessei as pesadas portas para o barulho interno, me senti


novamente senhora do meu destino. Cumprimentei os seguranças e fui direto
para o bar. Dhi e Eliane já estavam atendendo os clientes, mas sorriram ao me
ver.

— Olha ela, voltou toda trabalhada no red!

— Jure, libélula. Se não dissesse eu nem teria notado — Eliane revirou


os olhos.

— Isso — Dhi apontou para a amiga — é falta de pau. Por isso eu vivo
de bom humor e a nossa chefinha também, né?

— Quem gosta de pau é gay, mulher gosta de outra coisa — Eliane


rebateu.

— Estava com saudades de vocês — gargalhei — providenciem qualquer


coisa com bastante álcool, please — os dois se entreolharam, cúmplices — Que
foi? Sempre bebo e não estou a fim de voltar ao trabalho hoje, ainda estou de
folga. Por falar nisso, Felipe Albuquerque por onde anda?

— Saiu daqui do balcão há poucos instantes, deve tá circulando — Dhi


indicou fazendo um círculo no ar — Bom, já que quer um drink forte e que bate
de vez, essa é a sua pedida: abridor de pernas!

Ele me entregou o copo longo e curvado, com canudo e uma rodela de


limão. Eu gargalhei com o nome que vinha bem a calhar, apesar de eu não
precisar de bebida alguma para abrir as pernas se me desse vontade.
Experimentei e senti a bebida doce e gelada descer bem pela minha garganta,
mas a bebida era extremamente forte.

— Vodka — chutei e ele confirmou com um sorriso — boa pedida.


Obrigada!

Saí do balcão do bar para circular e observar as pessoas. Retirei a


bendita aliança e coloquei na minha bolsinha, junto do meu celular, não queria
ter que explicar nada caso me batesse com meu sócio. Esperava que o Dhi e a Eli
não tenham notado.

Um DJ que tocava com frequência na boate, agitava a noite. Ele tocava


todos os ritmos e nesse momento era um funknejo, o sertanejo com uma pegada
mais solta e remixado com as batidas do DJ, que ressoava pelo ambiente.
Metade do meu drink se foi enquanto eu me remexia aos poucos e varria a pista
com o olhar. Muitos casais, muitas mulheres bonitas e jovens e alguns homens.
Provavelmente a maioria estava pelos cantos, tomando coragem líquida para
chegar nas mulheres. Babacas.

Quando a música do Bruninho e Davi começou a tocar eu me soltei de


vez. Levantando o copo e cantando alto.

Ela é maluca, é linda e sabe que é gostosa


Que me olha, me encara
É super poderosa
Ela sabe que leva qualquer homem pra cama
E só diz que ama pra tirar onda de bacana

Solteira, sozinha
Na pista pra negócio
Tá de boa, soltinha
Não tá querendo sócio
Ela é tipo de mulher independente
Que não pede carona e nunca vai dormir carente

Mais de uma vez me identifiquei com essa música. As minhas amigas


concordavam e também gostavam da letra, até casarem, claro.

Mas quando ela arma saída


Pega o telefone e liga pra umas cinco amigas
É tudo combinado lá no esquenta
Tudo preparado, isso aí vai dar problema

Enquanto cantava e curtia a música, dançando sozinha notei um olhar


insistente sobre mim. Mulher sabe quando está sendo observada, ainda mais de
maneira tão direta. Virei para encarar de volta e o homem sorriu. Moreno, alto e
bem vestido. Bem vestido demais, usava um terno preto sobre camisa branca e
calça social combinando com o terno. Provavelmente saiu do trabalho direto
para a boate. Não me interessou de cara, por isso continuei viajando na última
parte da música.

Enquanto bebia o restante da bebida, a música mudou e o Felipe se


aproximou, me abraçando com força e me tirando do chão.

— Quase não acreditei quando te vi, achei que só voltaria semana que
vem! Não ia falar com seu sócio? — Ele se aproximou para ser ouvido.

— Voltei mais cedo, mas hoje estou de folga — mostrei o copo seco —
Por sinal, você poderia pedir ao Dhi outro desses?
— Pra você eu sirvo de garçom — ele se afastou levando meu copo e só
então eu notei que o cara que me observava segurava um celular na minha
direção.

Que porra é essa? O idiota estava tirando uma foto minha? Ele notou que
eu vi e guardou o aparelho no bolso enquanto se misturava entre as outras
pessoas. Estava prestes a segui-lo quando alguém segurou meu braço esquerdo.

— Onde vai com tanta pressa? — Quando ouvi aquela voz fechei os olhos
para não gritar de volta — Gabriela?

— Estava indo atrás de um idiota que estava tirando fotos minhas, se


você não tivesse me atrapalhado eu já estaria lá — não me virei para responder
e estiquei o pescoço tentando achar o cara.

— Um fã seu? Não me admira. Dá para olhar pra mim? — Alexandre


pediu e eu me virei.

— Tenho vários fãs, mas esse não parecia um deles. Passou um tempão
me encarando, além de estar usando terno em uma boate.

— Terno? — ele se interessou pela informação — Como era o tal cara?

— Moreno, alto, olhos escuros... Tá interessado? — ele bufou — Já pode


soltar meu braço, que mania de tocar.

Sua mão escorregou pelo meu braço até chegar na minha mão.

— Onde está sua aliança? — fingi que não ouvi — Acho que sei quem é o
cara, onde está a porcaria da aliança?

— Quem é o cara? — tentei soltar minha mão, mas ele a segurou com
força.

— Posso saber o que está acontecendo aqui? — Felipe escolheu o pior


momento para aparecer com a minha bebida — Aqui está, Gabi — ele ofereceu
a bebida para a minha mão presa e o Alexandre foi obrigada a soltá-la.

— Obrigada, Felipe. Acho que vocês já se conhecem.

— Claro, e aí Alexandre? — meu sócio estreitou os olhos avaliando o Alê.


— Tudo bem, Felipe. — respondeu sem entusiasmo — Gabriela,
podemos ir para casa agora?

— Não, não podemos. Preciso acabar a minha bebida. A noite é uma


criança e acabou de nascer — levantei o drink antes de levar o canudo até a
boca.

— Gabi... — ele advertiu e o Felipe cruzou os braços.

— Acho que perdi alguma coisa — comentou inspecionando nossa


interação.

— Com certeza perdeu, o nosso casamento — Alexandre jogou a bomba.

— Casamento? Você só pode estar zoando. Gabi?

— Felipe, nós conversamos daqui a pouco, você me dá licença? —


Praticamente implorei com o olhar e ele assentiu.

— Não vá embora sem falar comigo — disse antes de se virar e sair.

— Você pretende esconder que é minha esposa? — Alexandre me olhou


com curiosidade.

— Eu não sou sua esposa, idiota! — resmunguei enquanto andava pelo


meio das pessoas, tentando chegar ao banheiro dos clientes. Ele me seguiu de
perto — Já que veio, segure por favor — entreguei o copo e entrei no banheiro.

Porra! Porra! Porra!

Quem esse imbecil pensa que é para sair contando sobre meu estado
civil?

Seu marido, uma vozinha disse no meu ouvido.

E quem era o cara da foto? E por que o Alexandre veio atrás de mim? Eu
queria apenas aproveitar a minha noite!

Usei o banheiro e lavei as mãos, demorando mais tempo do que o


necessário para as duas atividades. Quem sabe quando eu saísse ele tivesse
cansado de esperar e ido embora? Minhas esperanças acabaram quando abri a
porta e dei de cara com ele e o meu copo, que aliás estava bem mais vazio.

— Achei ter ouvido você dizer que não beberia mais, depois de acordar
casada comigo.

— Ah, não fode. Bebo se eu quiser.

— Claro que sim, mas ainda preciso saber da sua aliança — ele ergueu
apenas uma sobrancelha e sacou o celular do bolso, mexendo até virar a tela
para mim — Era esse o cara?

Observei o contato no WhatsApp dele e era realmente a mesma pessoa.


Na foto, o moreno usava gravata e estava sério.

— Era esse mesmo — Alexandre xingou — Quem é?

— O advogado do meu pai, Rafael Barros. Você ficou com alguém?

— Isso realmente te interessa? — perguntei.

— Faz parte do jogo, Gabriela. Se ele estava atrás de você e tirando fotos
é importante que eu saiba o que ele registrou.

— Não fiquei, você chegou para atrapalhar — ele suspirou — Aliviado? É


muita cara de pau — Mas ainda está em tempo — disse passando por ele em
direção à pista.

Mais uma vez ele me segurou, só que dessa vez me encostou na parede.

— Se você precisa ficar com alguém, eu lhe faço esse favor — ele disse
antes de amassar minha boca com a dele. Sua língua tentou invadir a minha
boca, mas eu a prendi entre os dentes e apertei com força. Ele se afastou e eu o
soltei — Porra, Gabi!

— Eu não preciso de um homem que fique comigo, por favor —


empurrei-o e marchei entre as pessoas que dançavam e se espremiam.

Passei pelo Felipe que tentou me deter, mas não conseguiu, saí em
disparada para fora da boate. Ouvi passos correndo atrás de mim, andei rápido
até o carro destravando antes mesmo de me aproximar.
— Como imaginei, você saiu com meu carro — ele chegou até mim antes
que eu pudesse fechar a porta do motorista. Coloquei a chave na ignição, mas
não consegui sair antes que ele sentasse no banco do carona — Jura que ia
embora e me deixar?

Não respondi e saí cantando pneu, se ele sentia ciúmes do carro ia


morrer do coração.

— Ok, vou ficar calado até chegarmos em casa. Não arranhe meu carro
— pediu e eu senti vontade de jogar o Ranger Rover contra um poste, mas não o
fiz. Dirigi em alta velocidade até chegar naquela prisão de luxo.

— Faça alguma coisa útil, leve tudo que tiver no carro lá pra dentro —
bati a porta com o máximo de força que eu pude e o deixei lá sentado.

Subi para o meu quarto e tranquei a porta. Tirei os saltos, deixando-os de


lado e tirei os brincos e o relógio. No banheiro, alcancei os lenços
demaquilantes e comecei a remover a sombra devagar. Quando terminei, lavei
o rosto e tirei o macacão e só então ouvi as batidas na porta.

— A gente precisa conversar — ele disse depois de bater algumas vezes.

Eu estava puta e sexualmente frustrada.

— Gabriela, abre a porta — ele bateu novamente.

Tudo bem, se é o que você quer. Abri a porta usando calcinha e sutiã
pretos de renda, virei para dar a visão da minha bunda com o fio dental e andei
até minha bolsinha jogada no chão. Abaixei para pegá-la me empinando e
abrindo levemente as pernas. Quando me virei ele estava no meio do quarto me
encarando.

Vamos ver quem faz favor a quem, querido.


Vê-la abrir a porta usando apenas calcinha e sutiã me fez esquecer tudo
o que precisávamos conversar. Eu não seria capaz de dizer o meu nome
completo quando ela se abaixou. Sua bunda clara se empinou e a calcinha se
perdeu ali dentro. Eu também quis me perder ali. Ela levantou rápido demais,
me encarou e recolocou a aliança na mão esquerda.

— Você quer conversar sobre o que? Eu tinha planos para agora — ela
falou enquanto andava até a cama. Sentou, ajeitou os travesseiros na cabeceira e
se recostou com muita suavidade.

— Planos? — movimentei-me e puxei a poltrona para sentar o mais de


frente possível, considerando que estava ao lado da cama — Gabi, terei que
pedir para que seja mais discreta.

Ela me encarou com olhos estreitos e eu me preparei para discutir.

— Seja mais específico — ela pediu com tanta calma que eu estranhei.
Mas o golpe veio no gesto: suavemente ela usou os dedos de uma mão para
passear pelo pescoço, enquanto os da outra tocavam a parte superior aos seios.

— Vejamos... Se você tivesse ficado com alguém hoje, o advogado teria


visto e levado a informação aos meus pais. Como os convenceríamos como
casal?

— Hum... Se importa? — perguntou segurando o fecho frontal do sutiã.


Não respondi e ela o abriu, afastando os lados e expondo os seios que sob meu
olhar e o ar frio do quarto se arrepiaram e ficaram com os bicos duros —
Vejamos, se você não tivesse chegado para atrapalhar — ela usou os dedos para
tocar as pontas rosadas — eu teria chegado até o advogado e resolvido a
questão.

Meus olhos custaram a se mover dos seios para o rosto dela que me
encarava.

— Ah é? Você ia acabar sem roupa para argumentar? Acho que dar em


cima do Rafael não nos traria vantagem alguma. — Só de imaginar a cena eu
sentia a raiva começar a borbulhar no meu estômago.

— Você tem problemas quanto a eu ficar sem roupa? — perguntou com


um tom inocente, as mãos se posicionando de cada lado da peça minúscula —
Pena que eu não tenha problema algum.

E com isso ela se livrou da calcinha, jogando a peça em mim. Respirei


fundo absorvendo a cena. Mais uma vez a visão do corpo nu de Gabriela Burnier
me deixava louco. Se eu não soubesse que ela está apenas jogando, estaria ao
seu lado na cama realizando cada uma das minhas vontades. Mas, se eu o
fizesse, provavelmente ela me expulsaria como um cão sarnento. Por isso, era
melhor apreciar.

Meus olhos percorreram cada centímetro dela. As unhas dos pés eram
ressaltadas por um esmalte vermelho. As pernas torneadas e sem pelos
pareciam macias, apertei as mãos na poltrona para não tocá-las. A boceta estava
totalmente depilada. Gabriela não tinha um grama de gordura na barriga, seu
umbigo fundo chamava a minha língua e eu mantive a boca fechada para não
babar. Na costela direita, posicionada uns três dedos abaixo do seio, ela tinha
feito uma tatuagem. Isso era uma novidade para a qual eu não havia atentado, o
que é perdoável considerando que meus pais irromperam no quarto quando a
vi sem roupa. Quando ficamos juntos anteriormente o corpo dela era imaculado,
nenhuma tatuagem fazia parte da perfeição.

— Você fez uma tatuagem? — ela levantou o braço e virou um pouco


para que eu pudesse ler: Hic Et Nunc. As letras cursivas e arredondadas eram
femininas, do último "c" os traços se estendiam e formavam um beija flor —
Muito bonita. O que significa?

— É uma expressão em latim que significa literalmente "aqui e agora" —


ela pontuou passando os dedos pelas linhas pintadas na pele alva — Hic et nunc
é basicamente a recusa da espera, da paciência, do desvio e da frustração. É o
lema do desejo imperativo de satisfação. A minha cara, né?

— Imediatismo... Realmente é a sua cara.

— Sem dúvidas. Preciso arcar com as consequências das minhas


escolhas imediatas, mas isso não me impede de satisfazer os meus desejos. Por
isso, Alexandre não me peça para ser discreta.

Abri a boca para responder, ao mesmo tempo em que ela abriu as


pernas. Gabriela flexionou os joelhos o suficiente para se abrir e me dar a visão
do seu sexo. Ela estava excitada. A ideia de se exibir e ter o poder de me fazer
calar fazia com que sentisse tesão. Eis uma mulher que adora o poder e que
sabe usá-lo.

Ela fechou os olhos e se recostou ainda mais, ficando à vontade e me


excluindo totalmente da brincadeira. Sua mão esquerda apertou o seio com
força, fazendo-a gemer baixo. A mão direita passeou pelo seio direito e seguiu
por sua barriga bem devagar. Ela se torturava e a mim, por consequência. Seu
dedo do meio testou sua lubrificação, espalhando por toda ela. Meu pau latejava
com o show excitante ao vivo. Eu o liberei da calça e da cueca, tocando-o
devagar enquanto a assistia.

Gabi usava o polegar para fazer círculos no local onde ficava o clitóris e
bem devagar inseria o dedo do meio dentro de si. Eu acompanhava o seu ritmo
como se fosse o meu próprio pau a entrar e sair daquele lugar molhado. Ela
juntou o dedo ao lado para ajudá-la a dar prazer e acelerou os círculos,
provavelmente já desejando o orgasmo.

Eu poderia levá-la a chegar lá tão mais rápido, com a minha língua.

Um terceiro dedo passou a participar do ato, fazendo com que ela


acelerasse ainda mais, fodendo a própria boceta de forma ritmada. A outra mão
auxiliou manipulando o clitóris, enquanto ela se fodia, eu me masturbava com a
mesma intensidade. Cada vez mais rápido. Os gemidos dela eram deliciosos de
se ouvir e se misturaram ao som dos nossos dedos que trabalhavam em busca
de prazer e da nossa respiração entrecortada. Eu queria beijá-la para engolir
cada um deles. Nossos olhares se encontraram quando ela gritou gozando, eu
precisei de mais alguns movimentos e do olhar dela sobre meu pau para gozar
na minha mão.

Dividir seu espaço com alguém já não é uma tarefa fácil, piora quando o
ser é do sexo feminino. Não dá para ignorar a presença de uma mulher
dividindo o mesmo teto que você. Ainda mais quando a mulher que está a
poucos metros da sua cama é Gabriela Burnier. É irresistível de olhar a loira
andando pela casa com roupas curtas e insinuosas. É impossível não querer cair
na piscina e nadar junto com ela, desatar cada laço do seu minúsculo biquíni
branco...

Comprovadamente essa mulher me tornou um voyeur. Além da ceninha


de masturbação, agora dei para observar escondido da varanda da minha
própria casa. Já Chega, Alexandre... penso antes de entrar no escritório de casa,
mas não sem última olhada em sua direção. A que ponto cheguei? Tenho uma
mulher deslumbrante vivendo na minha casa e não posso tocar, beijar ou
transar com ela.
Vivia reprimindo os contras da minha relação com a Gabriela e focando
no único “pró” que importava: estou oficialmente casado. E isso ninguém
poderia contestar.

— Senhor Alexandre — meu nome foi chamado, precedido de duas


batidas na porta.

— Entre — respondo.

— O senhor Marcos está lá embaixo, disse que tentou ligar para o seu
celular.

Droga! O Marcos ainda não podia ver a Gabi, geraria uma confusão sem
fim com direito a visita da Fernanda e interrogatório. Ainda não tínhamos
planejado nossa história oficial. Passei rápido pela funcionária e desci as
escadas correndo.

— Velho, achei que estivesse morto! — meu amigo disse assim que
cheguei a sala de estar.

— Eu sempre soube que eu é quem merecia a sorte de ficar com a delícia


Albuquerque. Juro que não sairia da nossa cama em um dia de folga para visitar
você — antes mesmo que eu pudesse fechar a boca o Marcos já me encarava
furioso. Falar da Fernanda era seu ponto fraco, motivo suficiente para ele
esquecer de qualquer coisa e se concentrar apenas em trucidar o homem que
desejasse sua linda esposa.

— Vai tomar no cu, seu arrombado! Vim apenas porque estava


preocupado com você — levantou do sofá e andou furioso em direção a porta.
Eu o segui de perto, queria que saíssemos dali o quanto antes.

— Agradeço a sua preocupação, mas não há motivos. Passei a noite do


meu aniversário com uma morena gostosa, a mulher tinha uma bunda... — ele
parou com a mão na maçaneta da porta de entrada.

— Começou cedo a comemoração esse ano — sorriu.

— Sempre — sorri de volta — Estava mesmo pensando em você, tenho


que resolver umas coisas da festa — abri a porta e praticamente o empurrei
para fora de casa.

— Se eu não conhecesse tão bem as suas regras, ia achar que está


tentando esconder uma mulher aí dentro — Estreitou os olhos e me encarou, o
filho da puta realmente me conhecia, fiquei momentaneamente sem reação e ele
logo completou: — Preciso ver quem é a gostosa que fez você quebrar a regra
— Estiquei o braço para impedir a sua passagem.

— Velho foi a morena — fingi uma expressão de quem foi pego em


flagrante — Bebemos além da conta e agora ela está apagada no quarto de
hóspedes.

— Achei que ela estivesse na piscina, ouvi barulho vindo de lá.

Putz! Essa não é a hora de bancar o Sherlock Homes.

— É o funcionário da manutenção.

— Foi o que a Carmem disse — ele piscou.

— Falando em festa, aguardo você e a sua senhora na minha festa. —


Informei enquanto nos dirigíamos até o seu carro.

— Fernanda está ansiosa para participar da festa do Alexandre Fragoso.


— falou com desdém.

— Todas sempre estão! — Sorri — sentando no banco do carona

— Imbecil!

Gargalhei enquanto nos guiava para longe de Gabriela. A curiosidade do


Marcos foi dissipada quando engatei uma série de perguntas a respeito de
Mariana. Pai babão, ele logo me mostrou diversas fotos da filha, contou tudo
que ela havia aprendido... O cara exalava felicidade. Ser pai, casar, constituir
família tornou o meu amigo ainda mais feliz. E ele era merecedor disso, depois
de tudo que passou com a mãe. Talvez fosse essa sensação que minha mãe faz
tanta questão que eu sinta.

— Viajou legal hein? — indagou.

— Estava pensando na festa — minto — Quero saber o que os caras


estão aprontando.

— Qualquer coisa que envolva pau e boceta!

— Você esqueceu de incluir bebidas nesse combo.

— E da áurea da casa de praia Fragoso.

— Mansão! — corrigi e ele mostrou o dedo do meio — Áurea essa,


causada principalmente pelo dono da casa.

— Alê não se ilude! Se a sua casa de praia não fosse feita para
impressionar, adeus.

— Ainda se minha casa de praia ficasse na área do piscinão, meu pau


seria o suficiente para me render o status de rei da noite carioca.

— Um rei da noite carioca que daqui a pouco estará usando a pílula


mágica, quarentão. — Perturbou.

— Cara, se já fodo feito máquina, com o azulzinho então...

— Partiu Guinness Book — completou sorrindo. Esse era o nosso lema


quando o Marcos era solteiro e colava na minha, vivíamos nos desafiando:
Quantas mulheres beijaríamos numa noite, quantas daríamos numa noite, quem
participaria da maior orgia...

— Bons tempos! Hoje o máximo que você faz é contar quantos sorrisos
consegue arrancar da Mari.

— Também! — sorriu bobo — mas ainda sou garanhão. Só que agora na


minha casa.

— Deprimente, deprimente...

— Sua hora vai chegar e vou repetir essas palavras.

— Espera sentado, só espera.

Despachei meu amigo rapidamente. Eu ainda precisava ver como ficaria


a questão Gabriela mais festa. Ela teria que ir, pois eu tinha certeza que o
advogado estaria de olho.
Inventei uma desculpa deslavada para não ir sexta para a casa de praia.
Os caras já estavam todos lá, mesmo que a festa só ocorresse hoje à noite. Eu
estava tentando convencer a Gabriela que era importante ela estar lá. A festa
era o local ideal para revelar para todos de uma única vez que éramos marido e
mulher.

— Não! Eu não posso simplesmente aparecer lá e mentir para um grande


número de pessoas.

— Você já mentiu para os meus pais e eles acreditaram! — contra


argumentei.

— A situação me fez mentir. Não sou uma mentirosa nata, talvez a Tiffy
exercesse esse papel melhor.

— Você é a minha esposa — acompanhei ela revirar os olhos — basta


permanecer ao meu lado.

— Continuo sem ver a vantagem. — Ela continuou fingindo procurar


algo no seu closet. Sim, eu havia cedido o meu quarto para ela, não havia como
negar isso quando eu tinha prometido que ela teria tudo o que quisesse.

— Será uma festa repleta de gente bonita e você não precisará ficar ao
meu lado 24 horas. — ela colocou a cabeça para fora do closet e me encarou,
antes de falar:

— Não quero ser esposa troféu. Pousaremos juntos para fotos e


falaremos com no máximo dois amigos importantes para confirmar nossa farsa
e depois eu vou aproveitar a festa.

— Meus pais estão pensando em ir...

— Problema seu! Seu jogo, minhas regras. É pegar ou largar. — Encarou-


me sorridente.
— Saímos daqui a uma hora. — Avisei e virei as costas para sair dali, não
sem antes de ouvir ela gargalhar.

Maldita!
Festa! Esse era o principal motivo pelo qual eu tinha aceitado ir ao
aniversário do Alexandre. Curtir uma festa era tudo que eu precisava naquele
exato momento.

Quando desci as escadas Alexandre já me esperava lá embaixo. Ele usava


uma calça preta e uma camisa da mesma cor. Recolhi a vontade de voltar para o
meu quarto e trocar de roupa, pois eu havia escolhido um vestido de tule na
mesma cor. Quando estivéssemos lado a lado pareceríamos um casal que
combina o traje.

Eca!

Com exceção do olhar que percorreu todo meu corpo, nenhum elogio foi
emitido, tampouco a sua voz se fez ser ouvida. Seguimos silenciosos no seu
carro, apenas o som de uma rádio de música popular brasileira preenchia o
ambiente.

Hoje era meu dia de trabalhar na Carpe Vita, por isso enviei uma
mensagem com uma desculpa esfarrapada para o Felipe. Levantei a cabeça para
observar onde estávamos somente quando o carro estacionou.

— Põe o seu melhor sorriso, os fotógrafos nos esperam.

Inspirei profundamente e contei mentalmente até 10.

10 — Seu vestido está divino.

9 — Será a mulher mais desejada desse lugar.

8 — Champanhe! Procurar o garçom.

7 — Lembrar do nome dos pais do Alexandre.

6 — Cumprimentar os tais amigos, logo!

5 — Whisky!

4 — Não dá para voltar para casa!

3 — Essa aliança é enorme!

2 — Mais álcool!

1 — Faça ele sofrer!

A porta do passageiro foi gentilmente aberta pelo Alexandre e logo


flashes foram disparados em nossa direção.

— Não sabia que era uma subcelebridade — menti entredentes,


enquanto enlaçávamos nossos braços.

— Você não sabe muita coisa sobre mim — sorriu.

— O casal poderia pousar juntos para o site da Dressa? — o fotógrafo fez


o pedido. Alexandre passou o braço ao redor da minha cintura e sussurrou em
meu ouvido:

— Deixarei um garçom ao seu dispor. — Sorri abertamente dessa vez,


ele havia lido minha mente. O fotógrafo capturou esse momento e tirou mais
fotos.

— Um beijo para finalizar! — pediu e eu e Alexandre nos olhamos. Isso


não fazia parte do jogo.

— Eu e minha esposa somos discretos. Agora se nos dão licença, temos


uma festa nos aguardando

— Somos discretos? — arquei a sobrancelha.

— A discrição personificada em pessoa. Ninguém jamais terá um beijo


nosso registrado, posso garantir.

Casa de praia era eufemismo perante a mansão que surgia a nossa frente.
O local era puro luxo e atraente. Havia uma áurea boa ali. Uma sensação de que
a noite seria boa logo me invadiu e a taça de champanhe que foi servida em
poucos minutos após nossa chegada, apenas aumentou essa sensação.

— Tulio e a namorada nova da vez — Alexandre apontou discretamente


— Vamos até eles e depois você pode circular sozinha. Agora só não tira a
aliança, por favor. — Seu tom de voz estava tenso.

— Fala cara, essa é a Betânia minha namorada. — Túlio cumprimentou o


amigo animadamente.

— Prazer, Betânia. — Alexandre cumprimentou a mulher ruiva a sua


frente que, pela sua reação, parecia ter visto o deus da festa.

— O prazer é todo meu, sempre quis vir as suas festas. — A ruiva se


derreteu e contive a vontade de revirar os olhos.

— E aqui está! — Sorriu de forma sedutora.

— Ei, não sorri assim para a minha mulher ou ela vai abaixar e chupar
seu pau aqui mesmo.

— Que forma deliciosa de apresentar a sua esposa aos amigos, amor. —


Decidi interferir, antes que a mulher acatasse a sugestão do namorado. Observei
com um enorme sorriso de satisfação a mulher enrubescer e o cara ficar branco
sem reação.

— Eu não sabia... — o homem balbuciou.

— Prazer Tulio, sou a Gabriela. O Alê fala muito de você e de suas


namoradas novas.

— Amor, assim você vai constranger meu amigo. — Alexandre me


repreende sorrindo.

— Brincadeirinha, Betânia. — Sorri.

— Prazer em conhece-la, Gabriela. Desculpa a mancada não sabia que o


Alê havia casado.

— Quase ninguém sabe, não saímos muito de casa, sabe como é recém-
casados. — Sorri maliciosamente.

— Vocês nos dão licença, avistamos dois conhecidos ali. — Tulio avisou e
saiu ao lado de uma Betânia de cara feia.

— Você viu a cara dela? — indaguei sorrindo.

— Antes ou depois de você falar que ela é só mais uma? — Alexandre


também sorria — Eu... vou dar uma volta. Quer vir?

— Não, vou ficar por aqui e curtir um pouco mais do meu sossego. Tenho
certeza que a Betânia vai tratar de espalhar que a mulher do Alexandre está na
área.

Seguimos em direção oposta, caminhei ao encontro da música eletrônica


alta que se fazia ouvir da entrada, a cada passo dado eu confirmava que
Alexandre não mentira quando dissera que eu encontraria diversão e gente
bonita ali. Os homens pareciam todos terem saído de treino de crossfit, corpos
másculos e extremamente definidos, muitos exibiam a barriga tanquinho na
piscina somente de sunga branca. Uma delícia de ver e ainda mais de tocar, meu
pensamento se materializa quando uma mulher derramou o conteúdo do seu
copo sobre o abdômen de um dos homens relaxados a beira da piscina e usa a
boca para sorver cada gota do líquido que se espalhava.

Sorri e continuei circulando o ambiente, mulheres igualmente bonitas e


esculturais também estavam ali, seja descendo até o chão com o copo na mão ou
dando uns pegas nos gostosões. O local fervilhava tensão sexual. Eu confesso
que esperava uma festa mais tranquila, mas não. Aqui é o resumo onde tudo é
permitido.

Festa foda!

Substituí meu champanhe por uma bebida colorida com um teor


alcóolico maior quando cheguei a tenda eletrônica. Corpos se moviam juntos
sob o comando do Dj Alok. Mantive-me mais afastada do centro da pista, um
local onde podia dançar sem ninguém me tocar e comecei a dançar sozinha na
minha festa particular. Movi-me freneticamente, meu corpo pulsando junto a
cada ritmo da canção. Uma onda de felicidade me contagiou rapidamente e eu já
estava sorrindo e dançando junto com duas mulheres que se aproximaram.

Afasto-me da pista apenas para ir até o bar solicitar outro drink. A voz de
Anitta e Maluma substituíram as batidas eletrônicas e logo comecei a rebolar a
minha bunda, dançando a coreografia original da canção. Um homem em
específico passou a me olhar de forma predatória, seus olhos azuis percorreram
todo o meu corpo, enquanto sua boca se moveu para cima exibindo um sorriso
cafajeste.

Continuei dançando sem dar atenção ao meu espectador, rebolei


sensualmente como pedia a canção, o homem se aproxima e tentou pôr a mão
na minha cintura, mas fui mais rápida e impedi. Apontei para a aliança na minha
mão esquerda e deixo claro que estava acompanhada. Embora a música esteja
alta, ele compreendeu o contexto, mas não desistiu.

— Se você fosse minha esposa, não te deixaria sozinha nunca. — Falou


bem próximo ao meu ouvido, os lábios tocando minha pele.

Precisei manter minha sanidade, por isso fingi que a figura bem próxima
a mim era só mais um babaca da balada. E até que era, mas o babaca em questão
era extremamente bonito. Dono olhos azuis escuros, piercing no lábio inferior,
cabelos pretos levemente bagunçados e cheiroso, um cheiro que eu adoraria ter
marcado sob a minha pele.

Foco, Gabi! Reprimi o desejo que crescia em mim. Eu dei minha palavra
ao Alexandre...

— Que bom que não sou sua esposa troféu. — Respondi e dei as costas
para ele, precisava me livrar desse homem lindo.

— Até breve! — ouvi-o gritar enquanto acelerava meus passos.

— Gabriela Fragoso?! — Um homem usando terno e crachá de segurança


se aproximou de onde estava. Demorei um pouco a responder. Fragoso...

— Burnier. Gabriela Burnier Fragoso — corrigi o homem que demora


para entender o que eu quis dizer.

— Perdão, senhora Gabriela Burnier Fragoso.

— Pois não.

— O senhor Alexandre pediu que eu a localizasse, está te esperando na


sala de estar.

— Obrigada.

Sorrio e vou em direção a parte interna da casa, o segurança segue um


pouco mais afastado, atrás de mim. Adentro na sala e entendo o motivo do
segurança à minha procura. Vilma e Alex estão sentados no sofá branco ao lado
do Alexandre.

— Boa noite! — cumprimento, animada.

— Boa noite, querida — a mulher levantou e me abraçou


carinhosamente. O senhor Alex também me abraça.

— Não sabíamos que se juntaria a nós! — sorri para Alexandre — Mas,


ficamos felizes pela presença de vocês.

— Eu nunca vim as festas do Alexandre, os pais não são bem-vindos. —


Vilma responde num tom de lamento.

— As portas sempre estiveram abertas para vocês — o filho respondeu.

— Sei... E você Gabriela, onde estava?

— Vendo se tudo está ok, se os convidados estão bem servidos... O meu


lado promoter falando mais alto.
— O Alexandre havia comentando que você é sócia de uma boate... —
Alex sondou.

— Carpe Vita é o nome do espaço, sou uma das sócias junto com o Felipe
Albuquerque.

— Não foi para falar de trabalho que viemos aqui, querido. — Vilma
voltou-se para o marido.

— Boa noite — ouvi aquela voz feminina atrás de mim me fez


estremecer. Vaguei o olhar para Alexandre sentado à minha frente que parecia
tão sem reação quanto eu.

— Fernanda, Marcos que bom ver vocês. — Vilma apressou-se em


cumprimentá-los.

— O prazer é nosso em encontrar vocês aqui — Fernanda passou por


mim, sem me notar e cumprimentou o casal sentando.

— Gabi?! — seu tom era de legítima surpresa.

— Eu não ganho um abraço? O aniversariante sou eu — Alexandre


levantou e abriu os braços.

— Larga minha mulher! — Marcos brincou puxando a Fernanda e


abraçando o amigo.

— O que você faz aqui?

— Esses dois enganaram todos direitinho — Vilma sorria feliz. Fernanda


moveu o olhar entre mim e o Alexandre e seu olhar parou na minha mão, mais
precisamente na aliança. Sua boca abriu e fechou, ele havia juntado as peças.

— É Fernanda, eu consegui enlaçar sua amiga — Alexandre passou o


braço ao redor da minha cintura sorrindo.

— Como assim? — indagou diretamente para mim.

— Achou que seria a única a casar com um carioca? — provoquei.

— Achei que você seria a única a não casar! — Sempre indo direto ao
assunto.

— Pela mesma lógica, eu também achava que você não. Mas veja só, até
filha já tem.

— Aê amigo, agora tem uma loira para chamar de sua — Marcos brincou
e todos sorriram.

— Uma espetacular loira, diga-se de passagem. — Alê completou e me


lançou um olhar de desejo.

— Chegou a hora dos parabéns! Cadê o galã? — uma voz masculina


interrompeu nossa troca de olhares.

— Eu — Alê levantou a mão sorrindo.

— Vamos, viado! Preparamos um bolo especial para você — sorriu


maliciosamente.

— Não poderemos ficar não é Vilma?! — O senhor Alex parecia ter


notado o que viria a seguir.

— Ah, sim, passamos rapidamente para dar um beijo em vocês. Foi um


prazer encontrar Marcos e Fernanda, vamos marcar com todos, Gabriela?

— Claro — assenti e despedimos dos pais do Alê.

— Eu disse que nos encontraríamos novamente — o homem que veio em


busca do Alexandre era o mesmo que me abordou minutos atrás. Acompanhei
Marcos ficar tenso quando o homem se aproximou e logo segurou a mão da
Fernanda.

— Kauan, essa é minha esposa.

— Gabriela, esse é meu brother Kauan. — Alexandre se aproximou para


nos apresentar.

— Um enorme prazer em te conhecer — ele deu dois beijinhos em mim.


Apenas assenti.

— Marcos, tudo bem? — Kauan voltou-se para o Marcos.


— Beleza! — respondeu seco.

— Vamos comer o bolo do Alê, galera? — Kauan perguntou animado.

Seguimos juntos em direção à beira da piscina onde aconteceria o tal dos


parabéns. Marcos e Fernanda mais a frente conversavam entre eles. Enquanto
eu e Alexandre seguíamos de mãos dadas.

— Pode soltar minha mão, agora! — sussurrei.

— Não! Sua amiga está a poucos passos de nós e nada confiante na nossa
relação.

Quando pensei em replicar, notei que havíamos chegado.

— Parabéns, sacana! — Kauan se aproximou e puxou o amigo para subir


no palco que foi montado sobre a piscina e continha um bolo gigante. Gigante
mesmo, do tamanho perfeito para caber três mulheres dentro, em pé. Assim que
começaram a cantar os parabéns o bolo se abriu e fomos presenteados com uma
mulata de cabelos cacheados, uma ruiva tingida num nível quase cor de vinho e
uma morena de pele branca e cabelo bem preto. Todas usavam apenas lingerie,
cinta liga e salto alto. Lindas, confesso e todos os presentes concordaram com
gritos, aplausos e assobios. Alexandre ria enquanto as três se aproximavam e o
tocavam.

Eu estava curtindo os parabéns e até sorri da ideia brilhante dos amigos,


eu adoraria receber um bolo assim recheado de gogo boys... Até que me dei
conta do olhar horrorizado que a Fernanda me dirigia. Nesse momento a minha
ficha caiu: diante de todos os presentes eu era a esposa que estava sendo
insultada pelo marido cafajeste.

Só que ali ninguém sabia que eu sempre estive farta de as mulheres


serem apontadas quando traíam e os homens aplaudidos e taxados de
garanhão. A situação era a ilustração perfeita: algumas mulheres me olhavam
rindo, alguns homens o olhavam e aplaudiam. Claro, ele era o macho alfa
corajoso que aproveitava o presente dos amigos sem medo da “patroa”. O
Marcos encabeçava os curiosos que esperavam o momento em que a esposa
faria barraco... Em defesa dele, com certeza era para me segurar ao menor sinal
dado pela Fernanda. Eu precisei me segurar para não gargalhar diante de tantas
expectativas.

Quando olhei para o palco novamente, a musiquinha de parabéns puxada


pelo amigo ao microfone já estava no fim e o olhar do Alexandre estava em mim.
Agora que a sua ficha caiu? Tarde demais.

Neguei com a cabeça sorrindo e andei entre as pessoas até chegar ao


palco. Subi os degraus bem devagar para causar o maior suspense possível. Era
fácil ler os pensamentos dos presentes, se brincar, seria possível afirmar que
eles fariam apostas sobre o que eu faria diante da cena. O tal do Kauan tinha um
sorriso afetado do tipo "se fodeu amigo" quando me aproximei dele.

— Pode me emprestar, por favor? — estendi a mão para o microfone que


ele segurava que prontamente me foi cedido.

— Gabi... — Alexandre advertiu baixinho. As mulheres estavam atentas,


prontas para correr se precisasse.

— Que foi, amor? Só quero cumprimentar os nossos convidados — falei


já no microfone — E claro, agradecer a quem gentilmente disponibilizou três
novas amigas para a gente aproveitar mais tarde no nosso quarto — pisquei
para ele — Só que... O que vocês têm contra as loiras? Poderiam ter me avisado
que eu mesma usaria uma lingerie especial e estaria dentro do bolo. E como
meu esposo está completando quarenta anos, teriam que ser quatro mulheres,
certo? Mas ainda dá tempo de consertar isso.

Segurei a barra do meu vestido e o suspendi de uma só vez. Uma salva de


aplausos e gritos ensurdecedores se fez presente. Eu estava usando um
conjunto de calcinha e sutiã azul marinho, com tecido transparente.

— Agora, por favor me ajudem a cantar — eu me virei para o Alê que me


encarava com um misto de desejo e fúria — Happy birthday to you... — imitei a
voz sexy da Marilyn Monroe — Happy birthday to you... — na medida em que
quase gemia cada frase, eu me aproximava — Happy birthday Mr. Alexandre —
coloquei a mão no seu peito — Happy birthday to you — ele não piscava quando
terminei de cantar, nossas bocas separadas apenas pelo microfone.
Ele afastou o microfone e usou as duas mãos para segurar meu rosto e
me beijar. Eu não podia mordê-lo ou recuar ali na frente de todo mundo, então
abri passagem para sua língua e me perdi por alguns segundos. Ali eu lembrei
porque tinha aberto exceção e ficado mais de três vezes com ele, o homem sabia
beijar. Seus lábios sugavam os meus na medida exata, nossas línguas fizeram as
pazes no momento em que eu inclinei a cabeça para que ele aprofundasse o
contato. Estar apenas de lingerie fez com que praticamente toda a minha pele
exposta fosse friccionada contra o tecido da roupa dele e isso foi excitante
demais. Quando suas mãos desceram por minhas costas e estavam prestes a
chegar na minha bunda ele se afastou. Abri os olhos para perceber que o Marcos
segurava no ombro dele.

— Fui obrigado pela minha esposa a interromper... Mas se você não


achar que os outros verem sua esposa ser fodida é um problema, pode
continuar — deu de ombros sorrindo.

O aniversariante andou até o meio do palco e pegou meu vestido, jogou a


peça sobre mim e tomou o microfone da minha mão.

— Acabou o show — anunciou e olhou para o DJ — pode continuar a


festa.

O Marcos saiu do palco e eu o segui, estava prestes a pisar no último


degrau da pequena escada quando o Alexandre me alcançou.

— Coloque o vestido! — ordenou e eu o encarei em desafio — por favor,


você já provou seu ponto de vista, não precisa continuar desfilando sem roupa.

Não tive tempo de responder pois minha amiga se aproximou com o


marido. O Marcos puxou o Alexandre para um canto enquanto a Fernanda me
puxou para outro.

— Essa é a Gabi que eu conheço — bateu palmas — E depois desse beijo


até consigo acreditar que essa história de casamento é verdade. Mas ainda
preciso ver a certidão para ter certeza e você, senhora Fragoso, me deve muitas
explicações.

Coloquei o vestido no seu devido lugar enquanto ela falava, para que não
visse meu olhar de tédio sobre o assunto.

— Contarei cada um dos detalhes sórdidos, senhora Castro — ela riu —


Vão dormir aqui?

— Sou mãe de família, vim apenas curtir a festa, mas vou dormir em
casa. Aproveite enquanto pode, quando tiver seus filhos vai saber sobre o que
estou falando... — fiz careta — Ora, ora... se você casou não duvido de mais
nada.

— Vamos aproveitar nosso tempo livre, presida-love? Essa interação no


palco me deu algumas ideias — Marcos disse puxando a esposa pela cintura.

— Você sabe onde fica os quartos — Alê disse quando os dois se


afastavam.

— Convenci no papel de esposa? — ele sorriu.

— Não sei se tenho vontade de te foder ou de te esganar agora — eu


gargalhei.

— Esse é um dos efeitos de Gabriela Burnier.

— Fragoso — ele completou.

— Vamos aproveitar a festa!

Não esperei ele confirmar, fui em busca de álcool para me abastecer.


Depois de ficar de lingerie e me apresentar como a senhora Fragoso os
olhares sobre mim aumentaram. Recebi de cantadas mais discretas do tipo
"amanhã é meu aniversário", até convites descarados que incluíam os detalhes
em que eles eram melhores que o Alexandre. Desviei de todos educadamente,
por mais tentador que fosse comprovar as teorias. Realmente aproveitei a festa,
dancei com a Fernanda como nos velhos tempos — depois que ela voltou um
tanto descabelada do andar de cima. Sorri das piadas babacas do Marcos e bebi
bastante, tudo que uma festa deve proporcionar. Às três da manhã, minha
amiga decidiu que era hora de ir, o fato de ter gente fazendo sexo visivelmente
deve ter ajudado, além da Mari em casa, claro. Quando eu os acompanhei até o
carro senti calor, estava suada de tanto dançar. Não estava bêbada, apenas
alegre o bastante para decidir que um banho de mar me faria bem.

O fundo da casa do Alê tinha vista para o mar, mas era preciso andar um
pouco para se chegar até a praia. Estava escuro, mas a lua cheia permitia que
fosse possível enxergar meus passos e um pouco além. O vento fazia o vestido
se colar ao meu corpo, mas eu não sentia frio, pelo contrário, o mar prometia
apaziguar o fogo que queimava dentro de mim.

Não havia ninguém nas proximidades. Pelo menos, não que eu pudesse
ver. Meus saltos afundavam na areia a cada passo, o que me fazia parecer mais
bêbada que o real. Eu os tirei e larguei na areia. Segui para o mar, atendendo ao
seu chamado. Meus pés tocaram a água fria e eu parei sentindo a temperatura.

— Acho melhor tirar o vestido... — eu não me assustei ao ouvi-lo, vai


ver o mar tinha tramado esse encontro — Para não o estragar, sabe?

— Você já viu a lingerie de hoje de qualquer forma — dei de ombros,


chutando a água.

— Então acho melhor poupá-la também, só para o caso de você não


gostar de calcinhas molhadas — sua voz indicava que ele estava atrás de mim.

— Calcinhas molhadas são um bom sinal — sorri.

— Sinal melhor é nenhuma calcinha e boceta molhada.

— Acho que já molhei a minha.

— A idade está me fazendo bem, então — sorriu — Nem toquei em você


ainda.

— Ainda?

— Ainda. Você acha mesmo que estando sozinhos aqui não vamos nos
tocar?

— Se fossem outras pessoas, talvez. Mas não nós dois.

— Exatamente, não nós dois. Eu só preciso que você diga que não está
bêbada, para que amanhã não me acuse como foi com nosso casamento.

— Se você continuar falando eu vou perder o tesão — informei.

— Eu te ajudo a encontrá-lo — ele se encostou em mim e segurou minha


cintura.

Eu me virei para ficar de frente e beijar sua boca. Nossos lábios, línguas e
dentes trabalharam em uma preliminar deliciosa. Mas eu precisava de mais.
Precisava de tato. De pele. Levantei sua camisa para sentir os músculos
definidos sob os meus dedos, ele se livrou da peça atirando-a na areia. Minhas
unhas traçaram de leve o caminho do seu peito até o cós da calça. Toquei seu
pau sobre a roupa e o senti pulsar na minha mão. Sua boca deixou a minha para
beijar e morder o meu pescoço, enviando ondas de prazer pela minha coluna.

Senti suas mãos apertarem meus peitos ainda dentro do vestido e sutiã,
para em seguida descerem até a barra do vestido, se enfiando ali para alcançar a
minha bunda. Ele respirou fundo ao apertar com força as minhas nádegas.

— Gostosa... — disse ao procurar a frente da calcinha e enfiar a mão ali.

Abri as pernas para lhe dar acesso ao mesmo tempo em que minha mão
voava para dentro da sua cueca. Sua ereção firme e quente me excitou ainda
mais.

— Quero chupar você — informei assim que dois dedos entraram em


mim — Hum...

Ele moveu os dedos de forma circular e eu praticamente rebolei em sua


mão.

— E eu quero foder você. Tantas vezes que não saberei mais onde meu
pau termina e começa sua boceta.

— Então fode! — dei dois passos para trás e deitei na areia molhada —
Mas vem rápido porque eu estou a ponto de explodir.

Ele veio. E não precisamos tirar nenhuma outra peça de roupa, ele
afastou minha calcinha e estava prestes a entrar em mim quando eu o detive.

— Cadê a camisinha? — toquei na sua ereção para me certificar.

— Pode confiar em mim, eu sempre uso.

— E continuará usando, me entregue que eu mesmo coloco. Posso usar a


boca se quiser — sorri. Ele vestiu o preservativo em tempo recorde e me
penetrou com força.
Ele me fodeu ritmicamente enquanto nos beijávamos. Senti cada
centímetro seu entrar e sair, me enlouquecendo.

— Mais rápido, Alê — pedi. Ele prontamente obedeceu, levantando


minhas pernas e as apoiando nos seus ombros. A nova posição fazia com que eu
o sentisse ainda mais fundo. Cada vez mais rápido. Cada vez mais fundo.

A respiração dele estava entrecortada e combinava perfeitamente com o


ritmo dos meus gemidos. Ah, e eu gemi. Muito. E quando a familiar tensão
aumentou dentro de mim, abri os olhos para encarar os seus e mesmo sem luz
alguma eu me vi refletida ali quando gozei.
Eu tinha acabado de foder, mas não estava satisfeito. Meu pau havia
enchido a camisinha, mas se mantinha firme e forte, pronto para outra. Não só
ele... Enquanto nossas respirações ainda estavam aceleradas, a Gabriela me fez
rolar e bater as costas na areia úmida.

— Segundo round! — anunciou com meu pau ainda dentro dela.

Por pouco tempo. Ela nos desgrudou e desceu até que sua boca estivesse
na altura das minhas bolas. Esperei que sua língua quente me tocasse ali, mas
senti uma sucção que me levou a gritar. Sem pressa, Gabriela retirou o
preservativo, deu um nó e o depositou ao meu lado. O vento e a areia molhada
não eram nada perto do que a demora dela me causava.

— Já pode me chupar, Gabi.

— Homens! — Ela riu.

Por causa da sucção nas bolas, esperei que ela me chupasse com força,
estava pronto para me perder naquela boca. Mais uma vez ela não fez o que eu
esperava. Apenas a ponta da sua língua tocou a minha glande, causando um
estremecimento no meu quadril. Ela riu e colocou apenas a cabeça na boca, me
chupando como se fosse um pirulito, segurando na base como a um palito. Era
como colocar apenas o pé em uma banheira quente e convidativa, me fazia
querer entrar de vez. Levantei o quadril e entrei um pouco mais. Ela apoiou as
mãos no topo das minhas coxas, me deixando imóvel. Quando menos esperei,
ela me levou ao fundo de uma só vez.

— Caralho! — Gritei de tesão. — Isso, Gabi, me leva fundo.

Ela fodeu meu pau com a boca. Sem hesitar, nem perder o ritmo. Me
levou fundo e saiu, várias vezes, até que senti que estava muito perto de gozar.
Ela também sentiu e apertou meu saco me fazendo jorrar em sua garganta. Ela
não parou até extrair a última gota.

Meu coração batia descompassado, pós-gozo, mas ela ainda não estava
satisfeita. Gabriela ficou de pé e rapidamente se livrou das peças que restavam.

— Espero que seu pau se recupere logo, mas tenho algumas ideias
enquanto isso — com essas palavras ela se abaixou sobre minha cabeça.

Apenas o cheiro da boceta dela me fez salivar, portanto não precisei de


mais incentivo, abri seus lábios vaginais e os beijei com minha boca. Minha
língua deslizou por cada parte daquela boceta gostosa, indo e voltando. Com a
ponta, estimulei seu clitóris, fazendo com que ela rebolasse em minha boca. Ela
apoiou as mãos na areia e se esfregou em minha cara, gemendo palavrões. Meus
dedos se dividiram entre boceta e ânus, espalhando lubrificação para então
invadir, dois dedos em cada.

— Alexandre! — Ela gritou.

Não respondi, minha língua estava ocupada estimulando-a ainda mais.


Intensifiquei todos os movimentos até sentir meus dedos serem apertados e ela
gritar. Enquanto seu corpo estremecia, me posicionei atrás e a penetrei. Com ela
de quatro na areia da praia, segurei seu cabelo e fodi sua boceta. Ela
impulsionava contra mim cada vez mais forte. Minha mão puxava seu cabelo
com a mesma força com que nos chocávamos. Sem pensar, minha mão esquerda
desceu forte contra sua bunda.

— Filho da puta! — Xingou, mas não me mandou parar.

Enlouquecido de tesão, bati mais forte. Minha mão ardeu, ela gritou e eu
repeti até ela gritar meu nome.

— Alexandre!

Soltei seu cabelo e levei as duas mãos até os seus seios, que balançavam
com nosso ritmo louco. Fodemos nessa posição até cansarmos. Os joelhos dela
cederam e meu corpo desabou na areia.

— Cansou Gabi? — Perturbei. Ela rolou até ficar de barriga para cima,
em seguida abriu as pernas. — Essa é a minha esposa!

Penetrei seu corpo enquanto beijava sua boca, inicialmente devagar, mas
logo engatando nosso ritmo desenfreado. Ela puxou meu cabelo e mordeu meu
lábio, levei umas das minhas mãos até sua boceta e estimulei seu clitóris para
acelerar seu gozo. Quando seu corpo estremeceu, gozei dentro dela.

— Acho que preciso de um banho... — Anunciou me fazendo rir. —


Vamos para o mar?

— Prefiro meu chuveiro, mas ainda preciso ver como estão as coisas na
festa.

— Ah certo, o típico compromisso depois de foder alguém. Você sabe que


não precisamos disso, né?

— A sua sinceridade ainda vai me matar! — Ela riu — Mas é sério, sou o
anfitrião. Você deveria voltar comigo.

— Ah não, obrigada. O papel de esposa já foi executado com sucesso.


Entro mais tarde.

— O.K. Não demore muito.

— Você não manda em mim...

— Escolhi a mais obediente das esposas — ela me mostrou o dedo do


meio.

Quando entrei na mansão notei que de todas as minhas festas, essa era a
mais liberal. Agradeci aos céus por meu pai ter sido sensato e levado minha mãe
embora antes mesmo dos parabéns. Por todo lado havia gente se pegando.
Encostados na parede, sentados nas cadeiras, no chão. Na minha piscina havia
um casal transando, os peitos da mulher balançavam muito, o que só
confirmava que era uma foda embaixo d'água. Passei por todos eles até entrar
na mansão. Ali a coisa estava um pouco pior, ou melhor, a depender da visão.
Uma verdadeira orgia acontecia no meio da sala. Cerca de dez pessoas fodiam
entre o sofá e o tapete. Eu estava dividido entre a excitação e a preocupação
com a repercussão que isso pudesse ter... Mas foda-se, eram todos maiores de
idade e vacinados.

No meio de toda a putaria na sala, cabelos volumosos me chamaram


atenção. Penetra. O apelido fazia jus a sua atual condição: penetrada
duplamente. A maluca recebia dois paus de uma vez, notei que um deles era o
Kauan e sorri enquanto deixava o cômodo.

Algumas pessoas ainda dançavam e bebiam e foi a elas que me juntei até
me sentir tonto e decidir que minha cama era o melhor lugar do mundo.

Minha fome me despertou quando já passava das onze da manhã. Ao


meu lado, a cama estava intacta. Onde será que a Gabi dormiu? Tomei uma
ducha para lavar toda a areia que estava em meu cabelo e corpo. Desci os
degraus devagar, não estava morrendo de dor de cabeça, mas uma pequena
ressaca pairava sobre mim.

A casa estava organizada e limpa, minha equipe era realmente eficiente,


o dinheiro a mais que pagava durante festinhas desse tipo era muito bem gasto.
Pelas janelas pude ver a piscina e alguns dos convidados que continuavam na
mansão. Biquínis pequenos enfeitavam as bundas que desfilavam por todo lado.
Uma bunda em especial atraiu meu olhar. De longe parecia que ela estava...
Nua?

Atravessei todo o espaço que nos separava com passos decididos, ao me


aproximar notei que ela usava um fio dental branco quase invisível. Mas nada
de parte superior... Gabriela estava deitada de barriga para baixo, tomando sol.
A primeira toalha que encontrei, joguei sobre ela.

— Mas que porra! — Ela se virou, seus óculos escuros não me deixaram
estudar seu olhar.

— Mas que porra, digo eu. Adoro que fique nua, mas prefiro que
aconteça quando eu estiver presente.

Em resposta, ela atirou a toalha longe, expondo os seios.

— Gabriela! — repreendi — Um pouco de compostura seria pedir


demais?

— Meu Deus, que caretice! Acha mesmo que ontem, enquanto todos eles
transavam em grupo a vista de todos, houve compostura?

— Todos eles não são a minha esposa.

— Você não é o meu dono...

— Você vai continuar com esse discursinho até quando?

— Até você aprender e parar de ser idiota — rebateu — O que você está
usando?

— Sunga, você está vendo muito bem — o movimento de sua cabeça


indicava que estava me inspecionando.

— Por que você pode mostrar seu corpo e eu não? Você é meu marido,
usando sua lógica.

— Não tem nem lógica esse argumento.

— Anhan...

— Se eu vestir uma maldita camisa, você coloca o biquíni?

— Estamos começando a progredir...

Olhei ao redor, as pessoas nos observavam mesmo sem ouvir o que


estávamos falando. Para os homens, a visão daqueles seios lindos era excitante,
além disso eu era um fraco que não conseguia controlar a própria mulher. Para
as mulheres, minha esposa era uma vadia que não me respeitava. Para mim, sua
teimosia era estimulante, mas era a minha reputação que estava em jogo. Por
isso, me aproximei para saber qual era a minha melhor chance. Ela sorriu,
provavelmente achando que eu não tinha resposta. Num impulso, firmei os pés
no chão e concentrei minha força nos braços, usando minhas mãos para puxá-la
pela cintura. Com pouca dificuldade, coloquei Gabriela no meu ombro, sua
bunda empinada na altura do meu tórax.

— Me coloca no chão! — Gritou enquanto batia na minha bunda. — Isso


não tem graça, Alexandre, me coloca no chão AGORA!
Comecei a caminhar em direção a casa, os tapas na minha bunda
começando a ficar mais fortes.

— Fique quieta!

— Cretino, me larga! Isso não vai ficar assim.

As escadas foram mais difíceis. Ela beliscava meu traseiro e se debatia.


De ponta a cabeça, as pessoas não deveriam ficar tontas ou sei lá, mais fracas?
Que força tinha as mãos dessa mulher!

Quando cheguei no meu quarto, joguei-a na cama.

— Gabriela lembre que as aparências precisam ser mantidas.

— Então você decide sozinho que seremos o típico casal em que o


babaca manda e a imbecil obedece? — indagou furiosa — Daquele tipo em que
quando a mulher toma alguma decisão e o cara não concorda, ele se vale da
força para impor sua vontade? — ela gritou. — Não, não e não!

A mulher estava histérica, berrando.

— Gabi... Desculpa. Não era essa a minha intenção. — Ela levantou da


cama.

— Nunca mais banque o macho-alfa para cima de mim! Não há nada que
eu odeie mais do que me obrigarem a fazer ou deixar de fazer alguma coisa.

— Sinto muito. Respire, não vai se repetir.

— Eu entrei nessa sem querer e estou me mantendo porque você


precisa, mas se me pressionar demais eu caio fora sem olhar para trás.

— Acho que essa é a nossa primeira DR — eu disse levantando as mãos


em rendição — Já pedi desculpa.

— Me deixe sozinha.

— Gabi...

— Alexandre!
— Certo, estou indo. Podemos ir para casa hoje, se quiser.

Ela não respondeu.

Estratégia errada, Alexandre.

Joguei mal.
Eu queria matá-lo. De uma forma bem cruel. Quem sabe assim ele
nasceria menos cretino em outra encarnação. Eu faria um favor a humanidade.
Quando ele saiu do quarto meu corpo ainda tremia de fúria. Eu estava irada por
ter permitido que o Alexandre protagonizasse a cena de marido ciumento. Não
que ele tenha me dado muita alternativa, eu tentei de todas as formas me soltar
dos seus braços, mas o imbecil era forte como um touro e não me soltou nem
mesmo quando cravei minhas unhas no seu dorso. Mas isso teria troco. Ah se
teria! E seria um troco digno de Gabriela Burnier, Alexandre que me aguardasse.

Depois de um tempo absorta em meus pensamentos, lembrei do meu


celular. Eu havia deixado na cadeira de sol quando fui arrancada de lá. Joguei
uma saída de praia por cima do biquíni e desci para buscar o aparelho. Assim
que cheguei no topo da escada, ouvi gemidos vindos da sala, aliás gemidos eram
os sons que mais ecoavam naquela casa desde a noite anterior. Por isso, não
estranhei e continuei a descer em direção a saída, mas a menção ao nome do
meu cretino marido me fez recuar.
— Alexandre...

— Aqui não é o lugar ideal.

— Sua esposa é um problema? — a voz feminina indagou.

— Não, desde que eu faça parte da brincadeira — falei alto e Alexandre


se virou para mim — Eu sou a solução! — sorri abertamente ao acompanhar a
expressão dele congelar.

De onde eu estava não conseguia ver quem era a mulher, o corpo do


Alexandre escondia boa parte da figura à sua frente.

— Não pensei que fosse sair tão cedo do quarto... — ele começou.

— Ficar trancada e perder as maravilhas dessa casa? — ergui a


sobrancelha sugestivamente.

— Apresente-me a sua mulher. Afinal, que tipo de anfitrião você é? — a


mulher falou empurrando-o e surgindo com um enorme sorriso.

Sabe quando você acha que seu dia está tão ruim que não pode mais
piorar? Pois tenha certeza que ele vai piorar em níveis astronômicos. Feito uma
aberração Bruna Moura, surgiu em minha frente. Mas essa aberração sorria
abertamente e me encarava num claro desafio: Use suas melhores armas!

— Gabriela essa é a... — Alexandre hesitou.

— Bruna, a penetra presumo. Não recordo de tê-la visto ontem entre os


convidados. — Completei.

— Só por que não me viu, não significa que eu não estivesse aqui —
Bruna rebateu.

— O que só confirma que você é uma penetra. Lembro de cada pessoa


que esteve circulando por aqui.

— Obviamente depois do seu show de ontem a noite eu imagino que se


recorda mesmo.

— Então você presenciou meu show? — sorri — Meu marido merecia


uma comemoração a altura e eu, como esposa solícita, apenas cumpri meu
papel.

— Papel de exibicionista, né? — ela indagou sorrindo — Afinal que


marido quer a própria esposa de presente de aniversário, quando pode
desfrutar de um cardápio variado? — piscou para Alexandre que acompanhava
toda a cena estático.

— Você apreciou e degustou de todo o meu show não foi, amor? — fitei
longamente Alexandre.

— Claro que sim... — Respondeu sem desviar o olhar.

— Finalmente encontrei a minha penetra favorita! — uma voz masculina


quebrou nossa troca de olhares.

— Finalmente alguém que vai me dar toda a atenção que eu mereço —


ela fez beicinho para o Alê. Contive o ímpeto de revirar os olhos.

— Pô, Alê, o matrimônio acabou com a sua virilidade? — perguntou o


homem moreno — Não dar atenção a essa delícia é imperdoável.

— Eu discordo! Olha a loira gostosa que nosso amigo casou, com todo
respeito brother, mas com uma mulher como essa eu não sairia da cama. E
estaria completamente saciado. — Kauan disse fitando todo o meu corpo.

— Eu concordo com o Kauan! — respondi só para contrariar o


Alexandre.

— E eu acabo de anunciar que a festa chegou ao fim! — Alexandre


informou com cara de poucos amigos.

— Mas já!? Eu mal aproveitei a piscina. — Respondi sorrindo.

— Gabriela, nós estamos voltando para o Rio. Amanhã tenho uma


reunião importante logo pela manhã.

— Tenho certeza que o Kauan não se incomodaria de me fazer


companhia.

— De forma alguma... — Prontificou-se Kauan.


Bruna balbuciou algo incompreensível e se afastou sorrindo
acompanhada do moreno. Segui o caminho oposto, recordando do que havia me
feito sair do quarto: o celular.

— De onde você conhece a Bruna? — Alexandre perguntou vindo atrás


de mim.

— Tem certeza que quer falar sobre ela agora? — Parei e nossos corpos
quase se chocaram.

— O clima entre vocês foi tenso. Tudo isso é ciúmes, amor?

— De você? — sorri — Não viaja!

— Mas vocês não se dão bem...

— Sério? Mais previsível que isso só se ela tivesse tatuado no rosto a


informação — gargalhei.

— Não vai me contar o que é?

— Achei! — ergui o celular e voltei a atenção para o visor: seis ligações


perdidas do Felipe.

Ele não me ligava, costumava mandar mensagens. Presumi que fosse


algo sério e retornei à ligação imediatamente ignorando Alexandre que me
observava de perto.

— Aleluia! Achei que teria que procurar o seu corpo no IML — o


moleque sorriu do outro lado da linha e foi música aos meus ouvidos.

— Que fixação pelo meu corpo! — sorri.

— Seu corpo é uma das dez maravilhas do mundo!

— Ah, se a Aline te ouve...

— Ela concorda comigo! — foi a minha vez de gargalhar. Felipe sempre


fazia bem para o meu ego.

— Podemos repetir a dose... — sugeri.


— Opa! Prontamente aceito!

— Não! Dessa vez meu convite é só para sua linda mulher — joguei!
Felipe permaneceu em silêncio por alguns segundos e depois soltou:

— Filma e me manda depois! Todas as minhas punhetas serão dedicadas


a vocês. — Gargalhei mais uma vez.

— Você é deliciosamente pervertido! — pontuei cada palavra e vi o


maxilar de Alexandre trincar. Mas já? E eu nem comecei.

— E você gosta disso!

— Ah se gosto... Mas não foi para falar dos meus gostos que me ligou seis
vezes.

— Não — sorriu — Foi para pedir que assuma as pontas aqui! Tô


planejando uma viagem surpresa, quero aproveitar o feriado com a Aline.

— Estarei de volta hoje e assumirei meu posto, não se preocupe.

— A Carpe Vita sente sua falta e eu também. Aliás ainda não


conversamos sobre o seu casamento....

— Também te amo, Felipe! — encerrei a ligação sorrindo. Alexandre


olhava para o nada quando voltei a encará-lo para dizer — Vamos voltar! Felipe
precisa de mim.

Ele abriu a boca e a fechou diversas vezes e por fim optou pelo silêncio.
Entendi como um "sim" e subi para arrumar as minhas coisas.

A viagem de volta aconteceu no mais completo silêncio. Alexandre, que


havia dispensado o motorista no fim de semana, dirigia concentrado na estrada
e eu me atualizava nos grupos de WhatsApp, enquanto ouvia música pelo fone
de ouvido. O grupo da família, que silenciei por um ano, pipocava de fotos
minhas e do Alexandre juntos. Pelo visto a repercussão da festa chegou até São
Paulo. Minha mãe cobrava explicações e apresentações oficiais, enquanto meu
pai ignorava a informação.

Porra! Eu não queria envolver meus pais nisso. Muito menos apresentá-
los ao Alexandre, todavia ou eu enfrentava logo a situação ou a minha mãe
apareceria aqui com suas duas Yorkshire Terrier a tiracolo. Enviei, em
particular para ela, uma breve mensagem:

Conversamos pessoalmente na próxima semana. Bjo

E em resposta ela me encheu de áudios longos. A maioria eram sobre os


gostos do Alexandre, incluindo a sua comida preferida, além disso queria saber
se eu preferia cortinas bege ou branca para o quarto de hóspedes... Enfim, uma
série de perguntas que fez eu me arrepender de ter enviado a mensagem.
Respondi: "ocupada" e guardei o celular na bolsa.

Quando chegamos em casa, cada um foi para o seu quarto. A governanta


bateu em minha porta horas depois, para informar que o jantar estava
disponível. Agradeci e desci em seguida.

— Tudo isso é para mim? — Alexandre indagou ao me ver usando um


macacão branco com decote em V e saltos pink.

— No dia que eu quiser te impressionar aparecerei nua para jantar! —


sorri e sentei na cadeira a sua frente.

— Impressionar não sei, mas certamente me deixará duro. — A


funcionária que nos servia quase derrubou a bandeja que segurava.

— Alexandre, você precisa ter compostura! — alfinetei.

— A culpa é sua que torna um simples elogio em uma conversa erótica.


— Respondeu sorrindo.

A mesa estava farta, com certeza a intenção era agradar o meu paladar,
optei por uma salada de rúcula com frango grelhado e suco para acompanhar.
— Não vai beber o vinho? — indagou diante da minha escolha.

— Não, vou dirigir

— Onde você pen... — respirou fundo e prosseguiu — vai?

— Para a Carpe Vita.

— Já conversamos sobre discrição.

— Não conversamos, apenas você falou sobre discrição, compostura,


aparências... Já sei a ladainha de cor.

— E mesmo assim insiste em colocar nosso casamento à prova.

— Você é um hipócrita! — disse sem conseguir conter a irritação —


Cobra de mim um comportamento de esposa bela, recatada e do lar e age como
o marido galinha.

— Quantas vezes alguém já me flagrou com outra mulher além de você?

— Então essa é a questão: o flagra! — sorri — Não se preocupe farei


tudo escondido.

— Eu não disse isso! — Rosnou.

— Alexandre chega! Eu já te falei uma vez e vou repetir: eu não sou


propriedade sua. Só estou nessa com você porque vi seu desespero, mas posso
cair fora em qualquer momento sem o menor remorso. — Não esperei ele falar,
levantei rapidamente e me afastei.

— Desculpa, Gabi! — alcançou-me e tocou meu braço, vi sinceridade no


seu olhar — Sei que pareço um cão de guarda, mas ponha-se no meu lugar, se
meus pais descobrirem que tudo não passa de uma farsa, perderei tudo e a
confiança deles para sempre — puxou o ar com força

— Então faça sua parte que eu farei a minha! Temos um acordo e eu não
costumo quebrar promessas.

— Obrigado! — ele aproximou nossos rostos, a sua mão grande acariciou


delicadamente a minha face. Fechei os olhos quando seu olhar focou na minha
boca. Aguardei ansiosamente pelo toque dos seus lábios, mas ele não chegou.
Quando abri os olhos encontrei um sorriso enorme no rosto do Alexandre.

— Tenha um ótimo trabalho! —Afastou-se sem olhar para trás.

Eu queria matá-lo.
Um banho frio! Era o que eu precisava para manter o controle e não
seguir Gabriela até a Carpe Vita. E foi exatamente em busca dele que eu segui.
Subi rapidamente as escadas e obriguei as minhas pernas a caminharem
firmemente em direção ao banheiro. Rapidamente livrei-me das peças de roupa
e deixei que o jato gelado acalmasse todo o meu corpo.

Mas a minha mente não desacelerou. Uma parte minha queria ter
obrigado Gabriela a ficar em casa. Na minha cama, de preferência. A outra,
sensata, alertava que era preciso ceder para avançar. Se eu continuasse batendo
na tecla de marido ciumento ela sairia pela porta e não retornaria mais. Por que
ela tinha que ser tão teimosa? Tanto quanto é gostosa, para o meu desespero.

Muitos minutos depois, saí do banho enrolado numa toalha preta. Joguei
pela cabeça uma camisa branca e vesti uma cueca da mesma cor. Ainda no meu
quarto vagueei pelos canais de TV e não encontrei nada que prendesse a minha
atenção. Meu telefone estava num marasmo só. Amigos na noitada, e as
mulheres meio que estavam me evitando desde que anunciei o meu casamento.
Com exceção de uma: Bruna. A mesma já me enviou mensagens convidando-me
para curtir a noite com ela e as amigas. Mas, o que eu menos preciso é irritar
ainda mais a Gabriela. Por isso recuso o convite. Mas calma, é uma recusa
momentânea.

Mesmo estando completamente bêbado quando fodi a Bruna. Não


esqueci aquela bunda. Muito menos dela sendo fodida por dois na minha festa.
Ela está com toda certeza na minha lista de "F1: Repetir a Dose".

Já passava das quatro da manhã quando escutei passos firmes no


corredor e uma risada alta. Gabriela voltou para casa e eu já podia dormir em
paz.

Acordei no dia seguinte atrasado para ir ao trabalho. Custei a adormecer,


e quando finalmente dormi, sonhei com Gabriela e Bruna juntas. Dispostas
numa bandeja para o meu deleite. Um sonho quente que me fez acordar duro
feito pedra.

Depois de um banho e uma punheta, saí do quarto apressado, mas um


barulho vindo do quarto de Gabriela me fez parar. Barulho não, Gemidos!

— Ai... Isso... Bem aí... Que delícia... — a voz rouca de Gabriela ecoava
pelo corredor. Mas que porra é essa? Contive a fúria e abri a porta
vagarosamente, encontrei Gabriela deitada de bruços sobre a cama, apenas com
uma toalha sobre a sua bunda e um homem debruçado sobre ela tocando seu
corpo.

— Continua... Agora mais rápido... — Ela balbuciava gemidos de prazer


entre as frases. O moreno não tirou as mãos da sua pele exposta até ter notado a
minha presença.

— Humm. Por que parou? — Gabriela lamentou-se sentando-se na cama


expondo os peitos. Puta que pariu! Só agora ela notou a minha presença, mas
preferiu fingir que eu não estava ali.

— Nosso horário chegou ao fim. — Informou o homem.

— Aaaaaaaah! — ela lamentou novamente.

— Nos vemos na sexta? — o homem indagou sorrindo.

— Contarei os dias até lá.

— Até mais! — despediu-se e antes de passar por mim desejou bom dia.

— Não vi você entrar — Gabriela disse sorrindo.

— O que foi isso?

— Uma massagem dos deuses. As mãos dele são as mais maravilhosas


que já tocaram meu corpo. — Trinquei os dentes com raiva.

— Gabriela, o senhor Daniel pediu para avisar sobre a sua chegada! —


Carmem informou.

— Obrigada. Desço em cinco minutos. — Levantou-se e caminhou em


direção ao closet, segui seus passos. Cobriu os seios com um minúsculo top azul
e subiu uma legging preta que grudou no seu corpo feito uma segunda pele.
Voltou para o quarto e sentou na cama para calçar os tênis.

— Quem é Daniel? — indaguei quando ela passou pela porta do quarto.

— Meu Personal Trainer — respondeu sem olhar parar trás.

— Desde quando você precisa de um Personal Trainer? — observei todo


o seu corpo naquela roupa de academia.

— Devo agradecer o elogio? — indagou encarando-me e em seguida


desceu as escadas. Fui atrás.

— Bom dia Gabriela! — uma voz muito animada para as oito da manhã
interrompeu nossa troca de olhares. Voltei a atenção para o dono da voz. Uma
figura masculina morena, alta, musculosa, exibindo um sorriso de comercial de
creme dental, donos de olhos de lince que estavam direcionados para a minha
esposa.

— Bom dia Dan! — Gabriela respondeu da mesma forma animada. Dan?


— temos tempo para um café?

— Lógico que sim. Assim podemos acertar os detalhes do nosso treino.

Eles seguiram em direção a sala de jantar, deixando-me para trás.


Quando me preparei para segui-los, a sala foi invadida pelo Marcos com uma
pilha de coisas sobre os braços e, vindo logo atrás dele estava Mariana, sua filha.

— Alê, você salvou o meu dia. Agradeça a Gabriela por mim... — passou
as bolsas e brinquedos para os meus braços.

— Marcos... — meu amigo estava agitado e não me deixou concluir.

— Está tudo aqui — apontou para uma lista que mais parecia um
cronograma — Filhota, a mamãe vem te buscar mais tarde. — Beijou a filha e
saiu apressado em direção a saída.

Ficamos apenas eu e Mariana ali no meio da sala. Ela olhou para mim
com uma curiosidade infantil e disparou:

— Cadê a tia Gabi?

— Ela está tomando café. — A garota continuou a me encarar com seus


atentos olhos verdes — Vamos até ela — completei. Coloquei os itens sobre o
sofá e segui andando. Mariana não me seguiu. — O que foi?

— Mamãe disse que não podemos entrar sem ser convidado.

— Humm... Quer ir ver a Gabriela?

— Sim! — aproximou-se com passinhos apressados e segurou a minha


mão — Agora podemos ir, tio Alê.

Eu não tinha nada contra crianças. Mas, também não estava acostumado
a me relacionar com elas. Pouquíssimos amigos meus tinham filhos e os que
tinham não frequentavam a minha casa e vice-versa. Portanto, ter uma mini
versão da Fernanda e do Marcos ali segurando a minha mão e me encarando,
causava-me certo pavor. Por isso, segui o mais rápido que as suas perninhas
curtas permitiram ao encontro de Gabi

— Tia Gabi — soltou a minha mão e correu em direção a Gabriela que


levantou para pegá-la no braço e enchê-la de beijos.

— Que linda você está com essa roupa de... — Gabriela hesitou antes de
continuar. E só agora olhei para a roupa que a menina usava. Uma blusa rosa
combinava com uma saia da mesma cor e meia calça branca, nos pés uma bota
curta de couro cheia de franjas. Toda essa combinação ficaria ridícula em
qualquer pessoa, mas nela não. Era bonito de ver. Mas posso apostar que tudo
isso era coisa do Marcos, a Fernanda não deixaria a filha sair assim.

— Bailarina country! — Mariana respondeu sorrindo.

— Claro, estou por fora sobre as últimas tendências da moda. — sorriu


— Quer comer alguma coisa?

— Já comi, obrigada.

— Tem bolo de chocolate — Gabriela falou baixinho.

— Essa hora pode? — abriu a boca em exclamação.

— Será um segredo só nosso — piscou em sua direção e a ajudou a


sentar na cadeira ao seu lado.

— Gabriela, precisamos conversar — falei encarando-a.

— Já vão brigar... — Mariana soltou e fez Gabriela gargalhar.

— Não vamos brigar, amor.

— Vamos apenas conversar. — Completei.

— Mamãe também diz isso — respondeu revirando os olhos.

— Vou te servir um grande pedaço de bolo de chocolate enquanto eles


conversam, tudo bem? — Carmem aproximou-se sorrindo.

— Tem calda de chocolate? — perguntou a menina.

— Tenho certeza que na geladeira deve ter. Vamos comigo pegar? —


estendeu a mão para a menina que prontamente aceitou.

Aguardei elas sumirem de vista e disparei:

— Marcos me disse que eu deveria te agradecer. Eu só não entendi o por


quê, mas devo desconfiar que tem algo a ver com o fato da Mariana estar aqui.

— Muito esperto você! — sorriu.

— E o que eu tenho a ver com isso?

— Eu não te contei? — arqueou a sobrancelha — eu disse a Fernanda


que Mari poderia ficar aqui.

— Como assim?

— A idade te deixou burro? — perguntou e vi o tal Dan esconder um


sorriso.

— Creio que o seu tonalizante afetou a sua capacidade de elaborar frases


completas e coerentes — rebati.

— Não uso tonalizante, amor. Mas de fato, esqueci de comunicar que


você ficará de babá hoje!

— Eu tenho uma reunião.

— Tinha, eu desmarquei!

— Você o quê? — falei alto.

— Tive uma longa conversa com a sua mãe ontem à noite e conversa vai,
conversa vem. Acabei contando sobre o dilema do Marcos e da Fernanda com a
filha. Reunião de emergência e babás de folga, para completar a Mari teve febre
no dia anterior e por isso eles evitaram a escola... — Gabriela continuou
contando detalhes que envolviam diarreia, coriza, espirros, febre...

— Onde a minha reunião entra? — perguntei impaciente.

— Ah, sim! Seu pai prontamente concordou em desmarcar a reunião,


uma vez que você estaria ajudando o seu melhor amigo.
— Eu não me recordo de ter concordado em ajudar ninguém.

— Para isso serve as esposas! Eu aceitei por você.

— Você não pode sair por aí decidindo a minha vida.

— Claro que posso! O matrimônio me dá essa licença — piscou em


minha direção.

— Se você pensa que eu vou ficar aqui e cuidar... — Nesse momento


Mariana voltou e eu tive que me calar.

— Tia Gabi, você acha que minha mamãe vai ficar zangada se eu comer
dois pedaços do bolo?

— Hum... Ela não precisa saber! Então não ficará zangada — sorriu para
a menina que concordou com cabeça.

— Tio tem pra você também, não precisa fazer cara feia...

— É a minha deixa, vamos Dan! — Gabriela chamou e voltou sua atenção


para a criança com a boca lambuzada de chocolate — O tio Alê vai ficar com
você, cuida dele, tá?!

— Unrum — emitiu com a boca cheia.

— Gabriela — segurei seu braço — eu nunca cuidei de uma criança. —


Confessei baixinho.

— Vocês sobreviverão! — piscou e juntou-se ao moreno que a esperava.

O que ela tem contra os loiros? Esse era o segundo moreno que eu via
hoje. Antes que eu pudesse ir falar com ela para tentar impedir que me largasse
ali, a Mariana puxou conversa sobre bailarinas e botas.
Naquela noite saí pisando firme da casa do Alexandre. Filho da puta! Um
desprezível filho da puta, era isso que ele era. Enquanto eu dirigia a caminho
da Carpe Vita pensava em mil e duzentas formas de fazer Alexandre rastejar aos
meus pés. Uma delas era abstinência do meu corpo. Alexandre não desfrutaria
mais do meu delicioso corpo, nada de toques, beijos e principalmente nada de
sexo! Apesar de já imaginar o maldito sorriso convencido que o idiota me
mostraria, dizendo que essa minha resolução não duraria muito. Ele sabia o
quanto eu era carnal, mas isso era apenas questão de ótica, bastava desviar meu
tesão para outra pessoa. Um homem gostoso, barba por fazer, com pegada, que
beije deliciosamente bem... e moreno, definitivamente ele terá que ser moreno.
Sorri, aumentando o som do carro, juntando-me a Anitta, cantando alto até
chegar a boate.

Agora eu vou me vingar: menina má


Vou provocar, vou descer e vou instigar
Me pede beijo, desejo
Não vou beijar
Pode sonhar!
Sou uma menina má

Assim que pisei na Carpe Vita uma injeção de bem-estar percorreu o meu
corpo. Como eu sentia falta desse lugar, repleto de pessoas bonitas e animadas.
Vir todos os dias aqui durante essa semana será muito mais que objeto de
tortura para o Alexandre, será a minha liberdade condicional por algumas
horas. Consultarei a agenda da semana para aproveitar muito bem as minhas
noites aqui, afinal unir o útil ao agradável não é pecado... E se for, eu adoro
pecar!

O espaço seria aberto em cinquenta minutos, por isso aproveitei para


fazer um tour pela boate para ver se estava tudo bem. E encontrei tudo na mais
perfeita ordem: DJ à postos, funcionários nos seus lugares e seguranças atentos.
Fiz uma anotação mental para elogiar o Felipe, a casa estava organizada mesmo
na sua ausência.

Depois que a boate abriu, dei uma circulada, cumprimentei pessoas e dei
uma paradinha no bar. Diverti-me com a implicância da Eli e do Dhi, além de
experimentar as mais novas criações do barman, um drink mais saboroso que
outro. Depois, circulei mais uma vez pelo ambiente, para cumprimentar os
convidados VIPs, e segui para a minha sala.

Dediquei-me a pesquisar algumas academias na cidade, fazia parte do


meu plano contra o Alê. Nada tinha chamado minha atenção, até que lembrei de
quem poderia me ajudar nessa: a quadrilha de salto alto e gloss. Duzentas e
trinta e oito mensagens depois, tive as minhas duas primeiras ações para a
operação "Gabi dona da porra toda".

Quando contratei Daniel para ser personal trainer tinha um grande


objetivo em mente: manter meu corpo definido e despertar ciúmes no
Alexandre. O homem exalava testosterona e ainda tinha um sorriso de canto de
boca sempre que finalizava uma frase... Uma tentação!

Corpo são, mente sã, né?

Quanto ao corpo, não duvidava que o cara fosse competente para ajudar
a me tornar ainda mais gostosa, se é que era possível. Já a mente... Estava
inundada de sensações que poderiam facilmente me levar a loucura. Era
impossível não observar aqueles bíceps musculosos esticando-se na minha
frente, e estávamos apenas no alongamento. Mas aqueles braços não podiam ser
mais alongados.... O quanto aquelas mãos eram ágeis? E que pernas eram
aquelas? O homem tinha coxas torneadas e bronzeadas, evidentes numa
bermuda tactel bege. Bege acabou de se tornar a minha cor favorita.

— Fique de quatro! — ordenou.

— Hum...?!

— Eu disse que vamos começar pelo “quatro apoios", o exercício para


glúteos. Para isso você precisa ficar de quatro.

— Ah, isso... Certo — sorri e me posicionei.

— Ótimo! — posicionou-se ao meu lado — Agora você vai elevar a perna


esquerda estendida até a linha do seu quadril e depois flexioná-la, volta a
estender e abaixa. — Disse enquanto executava o movimento para que eu
aprendesse. Não comentei que já o conhecia.

Acrescente glúteos definidos aos atributos do Dan. Fiquei mais tempo


admirando sua bunda redonda do que prestando atenção às suas instruções.

— Sua vez! — informou.

Iniciei o movimento, mas me perdi no meio do caminho. A minha


atenção estava no belo exemplar parado à minha frente. Estar de quatro com
aquele homem parado a poucos centímetros de mim, tornava a minha mente
ainda mais poluída do que o de costume. Eu só conseguia pensar em sexo, e nas
inúmeras posições que poderíamos fazer juntos.
— Gabriela você precisa esticar mais a perna — aproximou-se e tocou
meu quadril, acompanhando com os dedos toda a trajetória da minha perna
estendida. Não sei como consegui completar o exercício. — Ótimo! Agora faz
três séries, descansa por um minuto e repete com a outra perna.

Extremante profissional, Daniel manteve-se durante todo o treino focado


em me auxiliar nas atividades. Em alguns momentos, quando eu não executava
a postura correta, as suas mãos tocavam meu corpo e uma chama acendia
dentro de mim. Meus hormônios estavam descontrolados.

Nossa aula durou pouco mais de uma hora. Ao fim, depois do último
exercício, me desequilibrei segurando no Daniel.

— Acabamos por hoje...

— Uma parte minha quer dizer que sim, acabou. Mas a outra quer um
exercício extra — confessei, por fim — Depende de você para que eu tome a
decisão. — Ele não se moveu, por isso tomei a iniciativa.

Colei minha boca na sua. Pego de surpresa, seus lábios demoraram


alguns segundos para responder a minha investida. Mas logo a sua língua
invadiu a minha boca, e eu dei vazão a minha sede. Quando minhas mãos
chegaram a sua camisa, no intuito de explorar cada parte daquele abdômen
definido, Daniel afastou nossos corpos.

— Isso não deveria ter acontecido — avisou desconcertado.

— Eu discordo — sorri abertamente, e vi um sorriso discreto surgir nos


lábios dele. Por isso, aproximei-me mais uma vez.

— Não — recuou — Seu marido me matará!

— Ele não precisa saber.

— Mas e se ele descobrir? O olhar homicida que ele me lançou mais


cedo...

— Você é um covarde! — rebati irritada.

— Desculpa Gabriela, mas se você precisar de um personal sabe onde me


encontrar.

— Merda! — passei as mãos pelos cabelos.

Retornei para casa excitada, agradecendo aos céus por Mariana estar lá
ou eu me atiraria no Alexandre assim que o visse. Falando na pequena, ela e o
tio provavelmente estavam se divertindo, escutei o som das risadas dos dois
vindo do escritório. Sigo para meu quarto para tomar um banho gelado.

Quando me juntei a eles já era horário do almoço. Mari e Alexandre


estavam sentados lado a lado, ele ajudava a pequena a servir-se, mas ela parecia
perdida em meio a tanta comida disposta na mesa. Batata frita, lasanha,
panqueca, frango à parmegiana... Um arsenal de bomba calórica estava ali
exposto. Salivei ao ver tanta fritura junta, há muito tempo não comia lasanha e o
cheiro do queijo gratinado era o melhor aroma que eu poderia sentir. Estiquei a
mão para me servir da lasanha, mas o Alexandre tocou-a interrompendo-me.

— Para você, mandei fazer berinjela assada com arroz integral —


apontou sorrindo para a bandeja.

— Não precisava, eu vou comer lasanha! — tentei conter a irritação que


surgia.

— Lógico que não vai! Sei como vocês mulheres preocupam-se com o
corpo e se começou a fazer exercícios é porque alguém aí não está legal —
percorreu o meu corpo com o olhar.

— Eu não estou precisando de nada e você sabe muito bem disso.

— Sei?! — ergueu a sobrancelha — Não fui eu quem contratei um


personal.

— E até onde eu sei, você não é o meu personal, tampouco nutricionista.


Portanto, não vai regular o que eu como.

— Sou seu marido, tenho todo o direito de querer o seu bem. Posso
garantir que a berinjela está tão saborosa quanto a lasanha.

— Não tá não — discordou Mari.


— Realmente Mari, não deve estar. Mas é que a tia Gabi precisa perder
peso e não pode comer panqueca, parmegiana e principalmente essa lasanha —
Alexandre levou o garfo com a lasanha até a boca e fechou os olhos enquanto
mastigava.

— Idiota! — rosnei.

— Amor, você precisa ter bons modos! Temos visita hoje — apontou
para uma Marina concentrada no seu prato.

— Amor é o cara...

— Olha a criança! — a governanta repreendeu.

Respirei fundo e tentei ignorar a presença do Alexandre, me servi de um


pedaço gigante de lasanha e optei pelo refrigerante para acompanhar. Quando
notei que ele ameaçava abrir a boca para falar, fuzilei-o com os olhos. Ele
ergueu as mãos sorrindo.

Assim que acabamos de comer a sobremesa, levei uma Mariana


sonolenta até o meu quarto. Segundo a lista do Marcos, ela sempre tirava um
cochilo após o almoço. E assim ela o fez, após conversar comigo sobre seus
desenhos favoritos. Peguei no sono logo após.

Quando acordei, Mariana não estava na cama, mas sentada no tapete do


quarto com as bonecas ao seu redor.

— Demorou para acordar, tia! — repreendeu-me do mesmo jeito que a


Fernanda faria.

— Desculpa, meu amor. — Ela sorriu.

— Quer participar do chá da tarde?

— Sim! — sentei entre as bonecas.

— Posso chamar o tio Alê?

— Acho melhor não, ele não gosta de chás.

— Aqui não tem só chá — revirou os olhos — tem sucos variados,


biscoitos finos e um bule com achocolatado.

— Que delícia!

— E o tio Alê, posso chamar ele ou não? — fitou-me longamente com


olhinhos suplicantes.

— Sim!

— Ebaaaa! — levantou e saiu do quarto correndo.

Voltou minutos depois no colo do Alexandre, ela gargalhava quando ele


fingia deixá-la cair e voltava a segurá-la.

— Ao seu dispor, princesa! — fez uma reverência após colocá-la no chão.

— Obrigada súdito — gargalhei com a resposta — agora sirva as damas


— ordenou.

— Eu pensei que era um convidado para o seu chá, princesa. —


Alexandre comentou sorrindo

— Eu não disse nada disso — discordou balançando a cabeça — Você


que deduziu.

Cacete! Olha a argumentação da menina. É uma advogada nata.

— Você só podia ser filha de quem é! — Alexandre constatou sorrindo.

— Claro né tio, eu sou filha dos meus pais. — disse impaciente como se
fosse a coisa mais óbvia do mundo.

— A versão mirim do Marcos e da Fernanda é assustadora — Alexandre


confessou só para mim.

— Você fala por que ela te transformou em lacaio ou por que te


convenceu a brincar do chá da tarde? — indago sorrindo.

— Pelos dois. Impossível dizer não quando duas pequenas esmeraldas te


encaram como se o mundo dependesse da sua resposta.

— Súdito, estamos esperando o chá! — voltou-se para Alexandre — E


você princesa Gabi, não fale com os lacaios.

— Você é adorável! — disse sorrindo.

— Eu sei que sou — a garota sorriu confiante.

— Coitado do Marcos! — Alexandre disse sorrindo.

O chá da tarde foi divertido, Mari representava o papel de princesa e


falava com as bonecas, amigas da princesa, sobre vestidos e sapatinhos. Após
um grande monólogo, ela engatou uma série de perguntas para mim e o
Alexandre. Agora estávamos sofrendo por causa da curiosidade infantil. Uma
série de porquês foi despejado em minha direção e eu respondi a todos. Até que
eles chegaram no meu casamento com o Alexandre.

— Por que não tem roupa do tio no seu guarda-roupa? Se vocês


são marido, tinha que ter roupas juntas.

— Quem te disse isso? — questionei.

— Ninguém, eu mesma vi ali — apontou para o closet — enquanto você


dormia.

— Hã... — tentei formular uma resposta, mas Alexandre foi mais rápido.

— Minhas roupas estão em outro lugar, vamos reformar o closet. —


Alexandre mentiu.

— E por que as roupas da tia Gabi estão lá se vai reformar?

— Por que ainda não tive tempo de retirá-las — respondi.

— Tio, por que você ficou com raiva quando a tia saiu com o moço?

— Por que o tio queria que a Gabriela ficasse junto dele o resto do dia —
ele respondeu me encarando. Sei!

— Ahhh... E no outro quarto... É o quarto dos bebês?

Engasguei com o chá falso.

— Ainda não estamos pensando em ter filhos — respondi recuperada do


engasgo.

— Por que?

— Porque ainda não chegou o momento — repliquei.

— Quando o momento chegar eles serão gêmeos como a mamãe e o


dindo?

— Acho que não.

— Eu quero que sejam duas meninas! Para a gente brincar e correr pela
casa toda — disse animada.

Alexandre olhou para mim e encontrou meus olhos arregalados. O


bombardeio de perguntas continuou até que o Alexandre mudou de assunto.
Falando sobre animais, ele prometeu levá-la ao zoológico, e ela ficou entretida
com a ideia.

Em determinado momento, Mariana abriu uma maleta de maquiagem e


começou a maquiar as bonecas uma a uma. Ela passou sombras com glitter nos
olhos e batom pink nos lábios.

— Agora falta você! — voltou-se para mim.

— Que tal maquiarmos o tio Alexandre? — sugeri sorrindo.

— Eu sou homem, não gosto dessas coisas!

— Não tem problema tio — discordou com a mão na cintura — O tio


Felipe deixa eu usar blush nele. Até o dindo eu já maquiei.

— Alexandre, um blush não vai ferir sua masculinidade — instiguei


sorrindo.

— Por favor, tio! — suplicou a menina, com os as mãos em prece.

Essa garota é boa!

— Tá — concordou — mas em troca eu vou maquiar a Gabriela. —


piscou em minha direção.
Maldito!

— Combinado! — ela aceitou.

— Ei, eu que deveria aceitar! — protestei.

— Não estamos abertos a negociação, tia.

—Sim, senhora — dei de ombros, sorrindo.

Eu vivi para ver Alexandre ser maquiado.

Uma grossa camada de base foi aplicada em todo o rosto dele, confesso
que foi engraçado ver a Mari lutar contra os pelos no rosto do tio. Em seguida,
pinceladas de pó foram espalhadas. Mariana fazia tudo isso concentrada e
reclamava quando ele se mexia. Traços grossos e longos foram desenhados nas
suas pálpebras, acredito que a intenção era delinear para deixar "olhinho de
gato", mas a realidade eram duas marcas grossas e pretas que davam a
impressão que ele levou um soco em cada olho.

Ela finalizou a maquiagem com um gloss rosa de glitter. Entregou um


espelhinho ao Alexandre e aguardou ansiosa por alguma resposta dele.
Alexandre permaneceu em silêncio, durante alguns segundos apenas fitando
sua imagem cômica frente ao espelho, para depois desatar a rir.

— Ficou ruim? — Mari perguntou com um semblante triste.

— Não, meu amor. Ele ficou lindo — respondi sorrindo.

— Gostou, tio?

— Sim! — sorriu mais uma vez — Estou impressionado com o quanto eu


sou bonito até assim. Mas agora é a vez da tia Gabi, estou ansioso para deixá-la
bonita.

— Ai meu Deus! — exclamei. Não havia possibilidade de fuga, por isso


aceitei meu castigo sem protestar.

As mãos do Alexandre tocaram meu rosto de forma gentil e um arrepio


percorreu o meu corpo. Cada um dos meus pelos ficou arrepiado com o toque.
Mas logo, suas mãos começaram a espalhar de forma grosseira a base por
minha pele, ele sorria enquanto fazia isso. Estava se divertindo.

Aplicou o blush, sob os comandos da Mari, assim como a sombra azul


turquesa e batom vermelho nos lábios. Quando acabou o trabalho, a garota
bateu palmas e ele me passou o espelho. O que vi refletido era o misto de
fantasma com um Drag Queen. A sombra azul que chegava até as minhas
sobrancelhas, e o batom estava além da minha boca, abrangendo a região acima
dos lábios, de modo a me deixar com boca de palhaço.

— Você está linda! — Alexandre elogiou sorrindo.

— Você também não está de se jogar fora! — devolvi sorrindo.

— Agora podemos continuar nosso chá! — Mariana anunciou satisfeita.

Estar com Mariana e na presença de um Alexandre sorridente e


desencanado foi tão bom que me fez desejar que isso se repetisse sempre. Que
eu e ele pudéssemos desfrutar desse acordo como parceiros, que nossa
convivência fosse amigável, que o Alexandre ciumento e controlador desse
lugar a um amigo para me acompanhar nas baladas. Perdida em meus
pensamentos não notei a chegada da Fernanda que pelo visto nos observava.

— Mamãe! — Mari gritou e correu em direção a mãe parada na porta.

— Como eu senti saudades de você, pequena — minha amiga ergueu a


filha enchendo-a de beijos.

— Mamãe quer tomar chá com a gente?

— Adoraria — sorriu.

— Minha doce princesa, preciso me ausentar — Alexandre fez uma


reverência e beijou a mão que Mari estendeu.

— Aguardo você na minha casa para um chá com o papai, súdito.


— Filha, não chame as pessoas de súdito! — Fernanda repreendeu.

— Será uma honra — dito isso, Alexandre afastou-se sorrindo.

— Amiga, o que foi isso? — Fernanda perguntou sorrindo após


Alexandre retirar-se do quarto.

— O quê? — Dei uma de desentendida.

— A maquiagem, o chá, vocês... Vocês permitiram que ela os usasse para


brincar!

— O tio Alê é muito legal.

— Só o tio Alê? — Fiz biquinho para Mari.

— Você também é tia. Quando posso voltar?

— Vamos marcar outro dia, amor. — Minha amiga respondeu.

— Que tal jantar? Aposto que você está morrendo de fome.

— Estou mesmo. Só tive tempo para uma salada rápida.

— Vou retirar essa maquiagem e descemos.

— Volte aqui! Quero saber como o Alexandre acabou todo maquiado


daquele jeito? — Seguiu-me banheiro adentro.

— Pergunte a sua filha.

— Vocês pareciam um casal de margarina. Quando pretendem ter filhos?


E porque a governanta informou que estavam no seu quarto e não no quarto do
casal?

— É jeito de falar... — desconversei — E agora eu sei a quem Mari puxou.


Agora fale de você, como anda o seu casamento? E o seu babaca, tá dando no
coro?

Um enorme sorriso surgiu nos seus lábios e ela começou a me falar das
suas aventuras com o seu babaca-love.
Como as mulheres retiram a maquiagem?

Puta que pariu o quanto é difícil retirar essas camadas preta dos olhos,
quanto mais esfrego, pior fica. Joguei mais uma vez água por todo o rosto e
esfreguei usando as duas mãos.

— Demaquilante! Talvez seja isso que você tanto precisa — Gabriela


invadiu o banheiro e entregou-me o produto.

— Espero que isso sirva... — Peguei o produto da sua mão e despejei


uma grande quantidade nas mãos e levei imediatamente ao rosto esfregando.

— Você acaba de tratar um produto de duzentos reais como se fosse uma


água engarrafada — protestou.

— Eu te compro mais doze desses se ele trouxer meu rosto de volta.

— Assim sendo — sorriu abertamente — Deixa eu te ajudar —


aproximou-se e com o auxílio de algodão começou a espalhar o produto
delicadamente no meu rosto. Alguns minutos depois meu rosto estava
completamente limpo.

— Por mais que a Mari seja apaixonante, nunca mais vou permitir que
ela me faça de boneca — um sorriso involuntário surgiu nos meus lábios.

— Você só permitiu por que queria se vingar de mim — ela rebateu.

— Também — concordei sorrindo.

— Pronto, tio — afastou-se sorrindo.

— Tio é sacanagem!

— Sacanagem é a sua cara...

— Sacanagem é a nossa cara — diminuí a nossa distância até ela estar


contra a parede do banheiro.

— Alexandre... — levou a mão até o meu peito para impedir que eu me


aproximasse.

Beijei lentamente toda a extensão do seu braço até chegar a sua mão.
Ergui os olhos e encontrei os seus fitando-me em expectativa. Foi o aval que eu
precisava para continuar com as minhas carícias, guiei a sua mão que estava no
meu peito ao meu pescoço e instintivamente a outra mão enlaçou o meu
pescoço.

— Isso não vai acontecer! — Desafiou-me sorrindo.

— O que não vai acontecer? — sussurrei ao seu ouvido e colei meus


lábios no seu pescoço. Ouvi ela arfar quando minhas mãos desceram até a sua
bunda puxando-a em minha direção, nossos corpos colados.

— Eu não vou para cama com você — falou ofegante enquanto minha
boca percorria o seu colo.

— O banheiro é suficiente.

— Canalha! — um sorriso escapou dos seus lábios.

— Só por hoje, Gabi — ergui o rosto para buscar a confirmação que meu
corpo tanto pedia.

— Alê... — interrompi sua fala e colei minha boca na sua. Quando nossos
lábios se tocaram uma chama incendiou todo o meu corpo. Nossas línguas
buscavam uma a outra de forma sedenta. O beijo era a representação da nossa
sintonia: Quente, molhado e ardente. Beijar Gabriela tinha um efeito
paralisante, nesse exato momento uma bomba atômica poderia atingir o Brasil
e eu não perceberia. Gabriela enlaçou as pernas na minha cintura e aproveitei a
sua entrega para conduzi-la para o meu quarto sem descolar nossas bocas.

— Caralho! — uma voz grossa fez com que Gabriela interrompesse nosso
beijo.

Caralho, digo eu!

Abri os olhos e encontrei Marcos paralisado no meio do meu quarto com


as mãos tapando os olhos da filha.

— Papai me solta! — Mari protestou.

— Que merda você faz aqui? — indaguei com a Gabriela ainda no meu
colo.

— Minha filha e minha esposa estão na sua casa, caso você tenha
esquecido — rebateu.

— Papai eu quero ver!

Com relutância pousei Gabriela no chão que prontamente passou a mão


pelo cabelo e voltou-se para Mari que agora tentava entender o que tinha
perdido.

— Queria ver a tia Gabi, meu amor?

— Tava procurando você para jantar, com o meu papai. Não achamos no
quarto, só podia tá no quarto dos bebês.

— Quarto dos bebês? — Marcos ergueu a sobrancelha sorrindo.

— Longa história — devolvi com uma expressão que não permitia


comentários. Meu amigo entendeu o recado e permaneceu calado.
— Vamos descer que estou morrendo de fome! — Gabriela completou
querendo fugir do assunto.

— Papai, fazer bebês dá fome?

Marcos arregalou os olhos e permaneceu boquiaberto com a pergunta da


filha. Gabriela e eu nos entreolhamos e trocamos um sorriso cúmplice.
Queríamos ver como o babaca do Marcos sairia dessa.

— Aconteceu alguma coisa? Vocês subiram para chamar o Alexandre


para jantar e não voltaram — Fernanda chegou salvando o marido. Ela lançou
um olhar por todos no quarto e voltou-se para o marido que permanecia sem
reação.

— Vamos jantar! — foi o que Marcos conseguiu falar antes de retirar-se


do quarto, segui logo atrás dele deixando as mulheres para trás. Ficamos na sala
de estar aguardando.

— Do caralho ter filha, né? — sorri para Marcos — bebe um Scott?

— Você não faz ideia — Marcos sorriu e aceitou a bebida — Interrompi


vocês, foi mal.

— Relaxa! A gente que esqueceu que tínhamos visitas.

— Aproveite essa fase de casalzinho. Depois que as crianças chegam o


máximo que você consegue é uma rapidinha de cinco minutos.

— Nossa, muito reconfortante saber disso — me servi de mais uma dose.


Observei Mariana e Fernanda descerem a escada, mas foi a presença de
Gabriela que chamou a minha atenção. Ela havia trocado de roupa, usava uma
calça jeans colada ao corpo e uma blusa preta decotada que revelava os seus
seios empinados, um colar de esmeralda estava depositado ali chamando a
atenção ainda mais para os seus seios.

— Mamãe disse que para os bebês crescerem saudáveis os papais


precisam estar bem alimentados, papai. — Mariana foi logo tagarelando.

— Fernanda! — Marcos repreendeu.


— Você sabe que se eu não respondesse ela iria perguntar a todos que
ela conhece, imagina só a reação da Dita ao ouvir essa pergunta — sorriu para o
marido.

— Vamos jantar! — Gabriela informou e seguimos para a mesa.

O jantar foi divertido, assim como qualquer encontro que o Marcos


estivesse, especialmente hoje ele estava ainda mais babaca, fazendo imitações
do sogro, dos cunhados e até da Fernanda que sorriu até lágrimas escaparem
dos seus olhos. Ao fim do jantar estávamos todos sorridentes e felizes. Talvez
fosse esse clima que a minha mãe queria que eu vivenciasse, sentir-me feliz
apenas por estar jogando conversa fora.

— Brother, valeu por cuidar da minha pequena — Marcos despediu-se


enquanto acomodava a filha sonolenta no carro.

— Um dia você me retribui.

— Falando em retribuição, vocês dois — Fernanda apontou para mim e


Gabriela — estão intimados para jantar comigo amanhã e não aceito um não
como resposta.

— Sim, senhora! — Gabriela sorriu — Será que rola uma carona até a
Carpe Vita?

— Claro! — Fernanda respondeu.

— Posso te levar, amor. Ou o motorista.

— Não se preocupe, a gente deixa sua esposa sã e salva. Mais uma vez
obrigado, Alê — Marcos entrou no carro acompanhado da Fernanda e Gabi que
seguia os passos da amiga, parou no meio do caminho e voltou-se para mim.

— Até mais, amor — falou apenas para satisfazer uma Fernanda que
acompanhava toda a cena.

— Está tímida por estar na frente da Fernanda? — Indaguei sorrindo


— Cadê meu beijo?

— Pode beijar, estamos sem pressa — Fernanda respondeu sorrindo.


— Maldito! — Gabriela sibilou enquanto caminhava em minha direção.
Quando estávamos frente a frente ela depositou um selinho na minha boca.

— A gente pode fazer bem melhor que isso — puxei-a para um beijo
cheio de paixão. Ela retribuiu de imediato, suas mãos percorrendo os meus
cabelos. Precisei de todo o meu autocontrole para interromper nossos beijos e
quando o fiz encontrei seus olhos sedentos por mais — Você vai precisar
retocar o batom — apontei para a mancha vermelha ao redor da sua boca.

— Filho da puta! — Afastou-se irada.

Dizem que para cada ação existe uma reação. E Gabriela conhecia
exatamente essa lei da física e sabia, como poucas mulheres, aplicá-la. Assim,
no dia seguinte quando eu acordei e desci para jantar encontrei ela e o seu
personal tomando café sorridentes e cheios de papos paralelos. Minha presença
fora completamente ignorada. O mesmo comportamento ocorreu pelos
próximos dois dias, eu descia para tomar café e a encontrava sorridente e cheia
de conversa com o tal Dan. Minha cara feia não foi o suficiente para que eles
permanecessem mudos enquanto tomavam café, pelo contrário, a maldita
insinuava-se ainda mais para o moreno a sua frente.

A gota d'água foi quando numa determinada manhã minha sala fora
transformada em academia. Gabriela estava posicionada de quatro e o seu
maldito personal estava atrás dela auxiliando o exercício.

— Chega! — Bufei irritado.

— Nada disso, ainda falta uma série — Gabriela informou, ofegante.

— Fora da minha casa! — gritei para o personal que nesse momento


estava do outro lado da sala.

— Escuta, aqui! — Gabriela levantou-se e se aproximou de onde eu


estava com o dedo em riste — A casa é tão minha quanto sua!

— Não lembro de dividir a despesa da casa com você! — Só quando as


palavras saíram da minha boca eu me arrependi.

— Nunca mais jogue na minha cara que a porra da casa é sua — rosnou.

— Desculpa...

— Cale a boca que eu não acabei — Ordenou furiosa — na próxima vez


que você pensar em expulsar alguém dessa casa, sou eu quem sairá por aquela
porta para nunca mais voltar!

— Me perdoa — passei as mãos pelos cabelos desorientado.

— Você é um filho da puta de um esnobe — continuou furiosa — estou


nessa merda por você.

— Você faz questão de me lembrar disso a cada dia!

— Por que é a mais pura verdade! Você acha mesmo que eu abriria mão
da minha vida se não fosse por pena de você?

— Eu já te agradeci...

— E poderá fazer isso a vida inteira e ainda assim não será suficiente.

— O que droga você quer que eu faça?

— Que pare de bancar o marido ciumento.

— Eu queria que fosse fingimento... — confessei.

— Não, Alexandre! — Continuou andando de um lado para o outro, só


agora notei a ausência do personal, deveria ter fugido. — Eu falei que isso não
daria certo.

— Não acabei de confessar que te amo para você agir assim — encontrei
os seus olhos arregalados — Eu apenas me sinto atraído por você e não gosto
de ver aquele homem ao seu lado.

— Pois terá que se acostumar por que se você proibir o Daniel eu


encontrarei um personal ainda mais gostoso amanhã! — Desafiou-me.

— Então tudo isso é para me irritar?

— Tudo isso é para você entender que mesmo que eu seja a droga da sua
esposa de mentirinha eu continuo livre para fazer o que eu quiser, onde e
quando quiser. Não consegue lidar com isso? Liga para o meu advogado e acerta
os detalhes do divórcio. Até lá você terá que controlar esse seu ímpeto se quiser
manter a sua farsa! — Gabriela me lançou um olhar gélido, daqueles que não
permitem contra-argumentos e afastou-se pisando firme em direção a escada,
quando estava no topo parou e informou — Você tem até o próximo fim de
semana para encontrar outra casa para morarmos, não quero ficar mais na sua
casa!

— Merda! — esbravejei arrependido por toda a situação que eu criei.

Passei o resto da manhã irritado e descontando em todos a minha frente


a minha fúria. Era óbvio que todas aquelas manhãs que a Gabriela fez questão
de esfregar na minha cara tinha sido para me irritar. E eu relevei cada dia, mas
vê-la de quatro ali parada no meio da sala com a sua bunda empinada para
outro homem que não fosse eu, despertou em mim um desejo de arrebentar a
cara daquele maldito personal.

Aquele filho da puta a tocava como se ela fosse dele. E o pior na minha
casa! A simples lembrança dessa cena fazia meu maxilar retesar...

Maldição.
Uma enxaqueca chata me atingiu desde que abri os olhos. Inicialmente,
era só aquele incomodo leve, que não fazia você querer tomar um comprimido,
mas também não te deixava em paz. Por isso, levantei para tomar café da manhã
mesmo assim. Era quinta-feira e eu não tinha aula com o personal hoje, graças a
Deus. Não que eu não quisesse vê-lo, depois de ter certeza que o Alexandre
havia se incomodado tanto quanto eu gostaria, gostei ainda mais do Dan. Mas a
luta entre meu cérebro e meu corpo me deixaria mais exausta do que
quinhentos abdominais.

— Bom dia, querida — Alexandre já começava a me provocar quando me


aproximei da mesa.

— Bom dia.

— O quê? Sem nenhuma réplica engraçadinha? — sentei na cadeira,


ficando de frente para ele — Você não está bem, o que foi?

— Dor de cabeça — limitei-me a responder.


— Por isso desceu de robe? Não que eu esteja reclamando — deu de
ombros — Precisa de alguma coisa? Já tomou remédio?

— Ela estava menor antes de olhar para você. Me deixe comer e voltar
para a cama.

— Comer e cama, duas palavras que costumam me deixar feliz vindo da


minha esposa.

Não respondi. Ele não insistiu, voltando a atenção para o seu prato. A
mesa estava repleta de frutas, pães, sucos e café. Eu adoraria ser daquelas
pessoas que com uma xícara de café fazem a dor de cabeça ir embora. Mas eu já
imaginava o que estava por vir... Além disso, não via graça no líquido preto e
quente. Servi-me de salada de frutas e concentrei meus movimentos em levar a
colher a boca e mastigar.

Notei quando ele olhou para o relógio de pulso enquanto tomava um


gole de café. O Alexandre estava usando blazer preto e camisa branca. Sem
gravata. O botão do colarinho aberto, deixando-o um pouco mais informal. Ele
me encarou enquanto eu o analisava, mas as batidas na minha cabeça
começavam a indicar que eu teria que tomar um analgésico. Não estava com
fome, acabei deixando metade da salada de frutas quando levantei. Não me
despedi, falar ia se tornar dolorido em breve. Passei na cozinha, peguei um copo
com água e subi para o meu quarto. Larguei o robe no chão, tomei um
analgésico e deitei, cobrindo minha cabeça com o travesseiro.

Não consegui dormir, tinha acordado há pouco tempo... Mantive-me


imóvel pelo máximo de tempo que pude, contando sapatos, já que carneirinhos
não eram os meus animais favoritos. Nada. A dor de cabeça não aumentou, mas
também não diminuiu e eu estava ficando com dor nas costas de ficar imóvel.

Desci para a sala de TV e me aninhei no super sofá fofo que abraçava


meu corpo. Liguei a tela enorme e passei todas as séries em alta da Netflix até
achar uma com mentiras, vida falsa, homens gostosos e pouca roupa, tipo a
minha vida.

Não sei em que momento ele chegou exatamente, mas a sua voz me
atingiu em cheio, fazendo meu coração disparar. Foi apenas de susto.

— Estudos comprovam que ver homens, que não sejam o seu marido,
quase sem roupa aumentam a dor de cabeça.

— Juro que eu riria se minha cabeça não parecesse prestes a explodir...

Ele se aproximou de onde eu estava e se abaixou para me entregar uma


xícara.

— Beba! — ordenou.

Senti o cheiro de erva-cidreira e sorri, ao me sentar no sofá.

— Os chás de flores de lavanda, erva-cidreira ou camomila podem ser


bebidos ao longo do dia, 2 a 3 xícaras, para facilitar o relaxamento e assim
diminuir a possibilidade de dores de cabeça.

Ele falava tão sério quanto um médico indicando a posologia da


medicação.

— Leu no Wikipédia? — Perguntei dando um gole no líquido morno.

— Você descobriu meu segredo — ele sorriu — fui até o escritório, mas
só pensava em você — arqueei uma das minhas sobrancelhas — eu me
preocupo, sou um bom marido.

Bufei.

— Beba o chá todo, a tarde você tomará outra xícara. Você sente dores
de cabeça com frequência ou tomou um porre?

— Papai, isso não é da sua conta — terminei o conteúdo e deitei.

O Alexandre pegou o controle remoto e sentou na extremidade do sofá,


colocando meus pés no seu colo. Ele optou por The Blacklist e eu reclamei
porque ele estava vendo a terceira temporada e eu não tinha assistido
nenhuma. A massagem que ele começou em um dos meus pés foi o suborno que
eu precisava para achar aquela a melhor série de todas.

Ele tinha mãos incríveis.


A embaixada brasileira no uso das suas atribuições outorga o efeito
de casamento civil com validade em todo o território nacional a Alexandre
Fragoso e Gabriela Burnier.

Era oficial!

A notificação de mensagem do meu advogado agora pela manhã indicava


que eu era oficialmente a senhora Fragoso. Desde que retornarmos para o
Brasil eu joguei essa informação para a última gaveta do meu cérebro, aquela
que uso para esconder as cagadas da vida, e nesse mesmo compartimento está
obviamente a maior cagada de todas: casar com o Alexandre! Sim, casar é a
maior merda que já fiz. De todos os potenciais parceiros, Alexandre era o último
na lista para marido. Talvez como amante funcionássemos juntos, afinal o sexo
entre nós era perfeito. Mas só!

Uma sensação de mal-estar dominou todo o meu corpo, uma ânsia de


vômito atingiu em cheio meu estômago e todo o meu lanche pós-treino juntou-
se a água da privada quando acabei de ler as seguintes palavras:

A pedido da requerente autoriza-se o acréscimo do sobrenome Fragoso ao


seu nome, que agora deverá ser registrado como Gabriela Fragoso Burnier.

Filho da puta!

Alexandre fez a solicitação sem me informar. Mais uma de suas


artimanhas para se manter como macho alfa, acrescentar o seu sobrenome à
esposa, pior antes do meu próprio sobrenome. Por que o inverso não foi
solicitado? Por que somente eu terei que ser a porra da senhora Fragoso?

Ainda no chão, ao lado da privada, disco para o advogado que atende ao


primeiro toque.
— Solicita retificação! — informei antes mesmo dele dizer alguma coisa.

— Bom dia, Gabriela — cumprimentou calmamente — há algum erro no


registro?

— Sim! — minha voz atinge decibéis altos — eu não solicitei a alteração


do meu nome.

— O requerimento consta a sua assinatura — respondeu no mesmo tom


sereno.

— Filho da puta! — rosnei agora de pé andando de um lado para o outro


do banheiro. Na ânsia de resolver o problema joguei para o meu advogado todas
as atribuições desse maldito casamento e não me dei ao trabalho de ler os
documentos antes de assinar. — O que mais esse casamento me custou? —
indaguei.

— Você receberá até o fim do dia uma cópia da certidão de casamento.


Todas as solicitações foram atendidas: casamento com comunhão parcial de
bens; acréscimo do sobrenome a requerente...— Alfredo hesitou e essa
hesitação nos advogados indicava que a notícia a seguir não era o que o cliente
esperava ouvir.

— Tem mais!? Não me diz que terei que andar com uma tornozeleira
eletrônica também?

— Não — sorriu — presumo serem boas notícias.

— O pedido do meu divórcio chegou em suas mãos?

— Longe disso, faço votos de que perdure por muitos anos. Mas, se isso
acontecer a senhora receberá uma indenização num montante de quinhentos
mil reais, referente a cada ano.

— Eu o quê? — gritei.

— Além da comunhão parcial de bens, o senhor Fragoso realizará o


pagamento desse valor no caso de divórcio solicitado por uma das partes; bem
como o pagamento de uma pensão que deverá ser creditada todos os meses
durante o período de casamento.

— Você deveria ter conversando comigo antes de autorizar todas essas


merdas. Afinal é para isso que eu te pago.

— Exatamente, Gabriela. Como você bem disse, você me paga para


resolver toda a parte burocrática e recusou-se a falar qualquer detalhe sobre o
casamento. Apenas cumpri as suas ordens e realizei o solicitado.

— Desculpa, Alfredo — lamentei.

— Posso ligar para o seu esposo e tentar reverter o acordo pré-nupcial.

— Não precisa... Eu mesma farei isso.

— Fico no seu aguardo. Tenha um bom dia.

— Igualmente — encerrei a ligação

Olho a minha imagem refletida naquele espelho e vejo meus olhos


vermelhos por conter as lágrimas de raiva que querem vazão. Eu não sou uma
mulher que chora! Enxugo a lágrima solitária que escapou e antes que as outras
juntem-se a ela derrubo todos os itens da bancada do banheiro, o som dos
objetos caindo representa o caos que se tornou a minha vida. Eu vivo uma
mentira. Sou fake e ainda receberei como uma prostituta de luxo!

Levantei a cabeça e o espelho me encara num desafio mudo. Arremesso o


celular contra ele e deixo que os cacos de vidro me atinjam.

— Gabriela o que houve? — Carmem surge na porta do banheiro.

— Nada! — Os poucos cacos de vidro que tocam o meu corpo não são
insuficientes para provocar qualquer ferimento na minha pele.

— A senhora poderia ter se machucado — ela segura as minhas mãos e


me retira dali — Vou ligar para o Alexandre — diz após conferir
minuciosamente que nenhuma parte do meu corpo foi ferida. Exceto o meu
orgulho.

— Não! — ordeno e ela parou onde estava, seus olhos claros me


encarando — Eu quero que solicite um táxi.
— O motorista está a sua disposição — informou.

— Claro! Vou entrar no carro e logo em seguida ele saberá para onde eu
fui — ironizei.

— De forma alguma, Gabriela — falou serenamente — Antes mesmo da


senhora, quer dizer, você — corrigiu-se após meu olhar mortal — entrar nessa
casa recebi ordens expressas para lhe atender e isso inclui atender as suas
decisões sem contestar e se você deseja que o Alexandre não saiba para onde
irá, ele não saberá. Tem a minha palavra.

— Obrigada — assinto grata — Diga ao motorista que desço em cinco


minutos.

— Caso queira usar o banheiro enquanto o seu está interditado, o último


quarto do corredor é o de hóspedes. Com licença — retirou-se e eu segui para o
banheiro indicado.

Quando retornei para o meu quarto encontrei os restos mortais do meu


celular em cima da cama, passei direto e segui para o closet. Não estava com
paciência para escolher roupa e passei pela cabeça um vestido floral longo e
desci ao encontro do motorista sentindo o peso do mundo nas minhas costas.

O senhor Assis, motorista, permaneceu todo o trajeto até a Albuquerque's


em silêncio. Eu estava furiosa e me sentindo vulnerável e nessas horas
conversar com a sua melhor amiga era o que eu mais precisava, Fernanda com
seu jeito racional me ajudaria a enxergar melhor as coisas e na pior das
hipóteses, beberia comigo enquanto falávamos mal do Alexandre.

Quando o carro adentrou a rua que levava a empresa da minha amiga


uma inquietação fez com que eu mudasse de ideia. Não era conversar que eu
queria, era brigar! Extravasar toda essa raiva que se acumulava dentro de mim,
e não havia melhor pessoa para isso que o causador dessa raiva.

— Mudança de planos, Assis — informei ao motorista — Leve-me ao


escritório do meu marido.
— A senhora tem hora marcada? — indagou a mulher na recepção após
eu informar o meu desejo de ir até a sala do Alexandre.

— Não, mas se você anunciar meu nome tenho certeza que a minha
entrada será liberada. — Informei, já impaciente.

— Senhora, o senhor Fragoso não está. De qualquer forma, me passe seu


número que estaremos entrando em contato para agendarmos uma reunião —
falou na voz tradicional de atendente de telemarketing.

— Não se preocupe, aguardarei bem aqui— apontei para o sofá na


recepção.

— Não sabemos se ele retornará hoje... — a recepcionista além de se


recusar a liberar a minha entrada, também se opunha à minha espera na
recepção. Esse deve ser um procedimento comum, considerando a fama do
Alexandre, inúmeras mulheres deveriam ir à sua procura ali, o que explicava
essa recusa.

— Ana, não é? — li no crachá dela — sei que apenas está cumprindo


ordens, mas a minha entrada será bem-vinda, afinal sou a senhora Fragoso —
dizer as últimas palavras foi torturante, mas era a única forma de ser liberada. A
mulher fitou-me longamente antes de se desculpar.

— Perdão, senhora Fragoso. Eu não te reconheci... Desculpa mais uma


vez — Ana desculpava-se, visivelmente constrangida por esse ato falho.

— Você não tinha como saber — sorri para aliviar a sua consciência —
Agora o crachá por favor — apontei para o seu monitor e em poucos segundos o
crachá de visitante estava no meu peito e a entrada fora liberada. Um rapaz
muito jovem guiou-me até a sala do Alexandre e mais uma vez uma secretária
bloqueou a minha passagem.
— Vim falar com o Alexandre, sou a esposa dele. — usei mais uma vez as
palavras que pareciam abrir portas nesse lugar.

— Muito prazer, Gabriela, sou a Odete, secretária do seu marido. — a


mulher de meia idade exibiu um enorme sorriso enquanto estendia a mão em
minha direção. Para a minha total surpresa, a secretária do Alexandre não era
nenhuma mulher jovem e atraente, eu buscava o estereotipo de uma secretária
sexy a julgar pelo seu comportamento devasso e encontrei uma mulher de meia
idade no lugar.

— O prazer é meu, Odete — tentei conter a surpresa.

— Esperava uma modelo como secretária? — Indagou sorrindo.

— Sim, confesso — sorri de volta.

— Não posso ter mais as curvas de outrora, mas sou muito eficiente —
sorriu abertamente.

— Não duvido — devolvi amigavelmente.

— A senhora aceita um café, um suco?

— Não me chame de senhora — sorri e ela assentiu— O Alexandre está


aí? — apontei para a sala a minha frente.

— Agora pela manhã sua agenda é externa. Mas a tarde ele estará de
volta, eu posso avisar que esteve à sua procura.

Observei atentamente a mulher falar buscando identificar mentira na


sua fala, mas não encontrei. De qualquer forma, eu só sairia daqui após
conversar com Alexandre.

— Eu aguardarei, acredito que ele esqueceu que combinamos de almoçar


juntos — menti.

— Eu posso tentar contatá-lo — sugeriu prontamente.

— Você pegou a minha mentira — sorri — Nós não combinamos nada,


mas eu gostaria de fazer uma surpresa.
— Claro que sim — sorriu de volta — Que tal aguardar na sala dele?

Assenti e segui para a sala a minha frente, Odete não me acompanhou e


aproveitei para explorar o ambiente. O espaço era amplo e muito bem decorado,
uma estante modulada ocupava toda a parede ao fundo da mesa de mármore.
Nela continha inúmeros livros e alguns porta-retratos expostos. Havia fotos de
família, foto dele segurando diploma e uma foto minha com ele, no dia do seu
aniversário. Por isso, a Odete me reconheceu prontamente. O filho da puta
sabia como manter as aparências. A sala era ampla e dispunha de um sofá preto
e um frigobar. Sentei na cadeira confortável e aguardei que o imbecil
aparecesse.

Uma hora depois eu já estava impaciente de tanto esperar e utilizei o


notebook a minha frente, sem nenhuma senha de segurança, para ouvir música.
A voz de Christina Aguilera preencheu a sala e eu me juntei a ela, enquanto
buscava algo para beber, no frigobar havia apenas água e suco em caixa. Decidi
ver na última gaveta da mesa e encontrei um Glenmorangie dez anos, um
Whisky importado delicioso, pelo visto Alexandre não fazia uso recorrente da
bebida já que a garrafa estava cheia. Levei-a à boca e deixei o líquido escorrer.
Logo o gosto de baunilha, laranja e pêssego explodiram na minha língua, um
gosto doce, levemente picante.

Deixei a garrafa em cima da mesa e vasculhei as gavetas, não encontrei


nada além de documentos e mais documentos sobre compra e venda de
imóveis. Uma chave ao fundo de uma das gavetas chamou a minha atenção e
como eu não tinha muito o que fazer, decidi por uma caça ao tesouro. Com a
chave em mãos levantei em busca da fechadura. Odete, já havia passado por ali
e avisado que iria almoçar, por isso tranquei a porta e comecei a minha caça.

Quando eu já estava desistindo da brincadeira infantil, um livro de


capa dourada chamou a minha atenção. Era volumoso e estava no canto da
estante. Retirei-o do lugar e voilà. Achei o que eu tanto procurava! Uma espécie
de cofre estava logo atrás. Ele tinha uma fechadura e adivinha só: a chave nas
minhas mãos se encaixou perfeitamente! No local havia uma garrafa de Whisky
ao fundo e alguns papéis que peguei para folhear. Dessa vez, não eram contratos
de imóveis, mas sim uma espécie de testamento.

Será que os seus pais estavam, ou, o próprio Alexandre estaria doente?
Curiosa, comecei a buscar respostas para as minhas perguntas e eu precisei
sentar na cadeira para não desabar.

"A fim de gozar dos bens dos seus progenitores o beneficiário Alexandre
Fragoso Maia precisará atender aos seguintes requisitos:

I- Casamento Civil com efeito legal no Brasil;

II - Possuir um filho legítimo fruto do casamento.

A partir da assinatura deste, fica estabelecido o prazo máximo de dois anos


para que Alexandre Fragoso Maia cumpra as cláusulas acima, o não cumprimento
do prazo supracitado acarretará a execução das restrições".

CARALHO!

Não duvidava que eles tivessem atrelado a herança ao casamento.


Alguém como o Alê, ou eu, não casaria sem que fosse por chantagem...
Alexandre tinha total razão em estar desesperado para casar, mas isso não lhe
dava o direito de mentir para mim. Ele não poderia omitir essa informação.
Filho? Isso estava completamente fora de cogitação.

Bebi dois terços do Whisky enquanto relia todo o documento. Parecia


uma piada de mal gosto, cada vez que lia aquelas cláusulas eu sentia vontade de
gargalhar. Com certeza, era uma piada do Alexandre. Quando eu já estava
amortecida pelo álcool e ciente de que meu adorável marido não apareceria tão
cedo, fui embora. Mas antes, deixei uma pista da minha passagem: o testamento
disposto na mesa com a minha aliança sobre ele.

Game over!
No escritório eu não conseguia me concentrar nas minhas atividades.
Minha cabeça estava longe, mais precisamente em Gabriela. Quando propus o
casamento a ela tinha certeza que havia feito a escolha certa. Gabriela não
buscava um marido, portanto não me cobraria nada. Além disso, tinha meu
corpo como moeda de troca. Éramos perfeitos na cama, Gabriela sabia como
poucas mulheres satisfazer um homem e buscar sua própria satisfação quando
e como quisesse. Só que durante nosso tempo de casados fodemos apenas uma
única vez. No dia do meu aniversário e isso já faz mais de um mês.

Eu sentia que havia voltado a minha adolescência pela quantidade de


punheta que eu batia nos últimos tempos. Era torturante vê-la, sentir seu cheiro
e não poder tocá-la, não poder fodê-la até perder os sentidos. O máximo que
consegui nos últimos dias foi uns amassos no banheiro do quarto que me deixou
ainda mais sedento por tê-la novamente.

Frustrado em todos os sentidos eu pensava em uma forma de domar


aquela mulher petulante. Talvez encontrar uma nova casa, como ela exigiu
quando expulsei o personalzinho, seja o começo. Envio mensagem com as
exigências para o aluguel de um novo imóvel para um dos corretores da
empresa e aguardo a sua resposta enquanto analiso o relatório a minha frente.

— Alexandre, uma mulher está a sua procura — minha secretária


invadiu a sala.

— Tem horário marcado? — perguntei sem levantar os olhos dos


relatórios de vendas. Era a décima vez que eu lia aqueles papéis e não conseguia
fixar a minha atenção neles.

— Não. Mas é cliente indicada por seu pai — Odete informou.

— Então marque um horário e peça que ele mesmo atenda! — respondi


num tom firme encarando-a. Não estava com paciência para receber os amigos
do meu pai, eram sempre as mesmas pessoas: ricos esnobes de meia idade em
busca de um imóvel caro para atrair atenção de parceiros mais jovens.

— Não sei o que aconteceu com o senhor hoje, mas seja lá o que tenha
ocorrido, eu não sou paga para ouvir os seus desaforos — devolveu no mesmo
tom.

— Você tem razão, Odete — passei a mão pelos cabelos — me desculpa.

— Eu sempre estou certa —sorriu presunçosa — Dispenso a mulher ou


vai recebê-la?

— Mande entrar!

— Melhora essa cara ou a cliente vai fugir — piscou para mim e saiu.
Ela tinha razão, mesmo que eu não estivesse no clima para receber ninguém,
esse era o tipo de cliente que deixava muito dinheiro no nosso escritório.

Minutos depois, escutei a porta sendo aberta vagarosamente, quando


levantei o olhar dos papéis para receber a cliente, deparo-me com os olhos que
eu vinha evitando nos últimos dias.

— Bom dia, senhor Fragoso! — Bruna falou sorrindo.


— A senhora aceita água, café? — perguntou a minha secretária que a
acompanhava.

— Talvez um champanhe para comemorarmos o negócio que será


fechado em breve — fitou-me longamente.

— Certamente água terá que servir para brindar — Odete exibiu um


sorriso forçado e retirou-se.

— Imaginei que você fosse do tipo que teria uma secretária gostosa —
lançou quando a porta foi fechada.

— Eu sou do tipo que preza pela eficiência — rebati.

— Você pode ter eficiência e gostosura ao mesmo tempo — piscou em


minha direção — Eu posso ser sua secretária, já imaginou? — ergueu os braços
e deu uma voltinha bem ali no meio da minha sala. Dessa vez Bruna não usava
roupas curtas, tampouco colada ao seu corpo torneado. Usava uma calça de
tecido branca e uma blusa de manga longa branca. Estava discreta. — Peguei do
closet da minha mãe, queria passar credibilidade, consegui? — sorriu
maliciosamente e só então reparei que estava encarando-a por todo esse tempo.

— Não abri vaga de secretária, Bruna. O que você veio fazer aqui? —
Despejei de uma vez. A garota era uma excelente foda, mas cheirava a problema.

— O mau humor é recorrente aqui? — bufou irritada — Não vai nem ao


menos me convidar para sentar?

— Estou num dia agitado — apontei para a cadeira a minha frente.

— E eu estou aqui como cliente — informou se sentando — Teve uma


noite ruim? Eu posso te ajudar a relaxar...

— Cliente? — Ergui a sobrancelha.

— Sim, o meu pai contratou o seu escritório para me ajudar a encontrar


um apartamento que seja a minha cara. O senhor Fragoso pai, garantiu que você
era a pessoa ideal para isso — sorriu abertamente.

— Você veio ao lugar acerto — sorri pela primeira vez naquele dia.
Diante da crise imobiliária qualquer cliente deveria ser tratado como
único e Bruna Moura, filha de político, estava na lista de melhores clientes. Com
certeza o deputado estaria disposto a gastar muito com a filha e o corretor
envolvido no negócio lucraria um excelente percentual, assim como a empresa.

— Sabia que eu melhoraria o seu dia — sorriu abertamente — tenho


algumas coberturas em mente.

— Ótimo! Vou chamar o corretor Maicon para se juntar a nós. Ele é o


melhor dos nossos corretores — peguei o telefone para ligar para o corretor,
mas sua mão impediu.

— Você não entendeu. Eu quero você como meu corretor.

— Eu não iria me opor a ajudar, caso pudesse. Mas sou apenas o


administrador. Os aluguéis e venda de imóveis são tratados diretamente com
nossos corretores. Posso garantir que Maicon é o melhor na área.

— Não foi isso que o seu pai garantiu ao meu — sentenciou — A escolha
pelo seu escritório dentre inúmeros foi justamente por ser o próprio dono a
dedicar total atenção para encontrar um lugar que seja o meu novo lar.

— Você fez isso de propósito, não foi? — indaguei desconfiado.

— Vamos dizer que eu juntei a fome com a vontade de comer — sorriu


maliciosamente — Vamos senhor Fragoso, prove-me que é mais que um corpo
gostoso e encontre um apartamento digno de Bruna Moura.

— Prepare o bolso — informei.

— Um cheque em branco é o suficiente?

— É um excelente começo.

— Agora vamos! — Levantou-se — Que já tenho duas coberturas em


mente e quero vê-las ainda hoje.

— Eu preciso ver se estão no nosso catálogo...

— Alexandre, você acha que eu estou brincando? Você apenas será o


intermediário no aluguel, já está tudo acertado.
— E por que precisamos ver o apartamento juntos?

— Eu quero ter certeza que conhecerei cada espaço do meu novo lar e
você certamente me ajudará com isso. — Aproximou-se de onde eu estava e
deslizou a mão pela minha camisa enquanto sua boca tocava o meu pescoço.

— Bruna... — tentei repreendê-la, mas minha voz me traiu e senti o seu


sorriso contra a minha pele. Em poucos segundos Bruna estava sentada sobre
meu colo e com a boca colada na minha, suas mãos puxando meu cabelo para si
enquanto as minhas apertavam a sua bunda.

— Alguém pode chegar... — ela trouxe razão e relutante a retirei do meu


colo.

— Precisa de mais algum motivo para me acompanhar? — Suas mãos


ágeis moveram-se em direção a minha ereção e eu impedi que isso acontecesse
ou seria capaz de fodê-la ali mesmo com a minha secretária do outro lado da
porta.

— Qual é o endereço? Vou providenciar as chaves — respondi antes da


sua boca esmagar a minha novamente.

Respirei fundo para controlar a excitação, solicitei as chaves do imóvel


ao corretor enquanto atualizava a minha lista de contatos:

Bruna Penetra "F2+CHEGA".

Ao fim do dia e com o humor revigorado retorno para o escritório, o


corretor Maicon ainda me aguardava para acertamos o aluguel da cobertura de
350 metros localizada no Recreio do Bandeirantes. Deixei todo o lucro da
transação para o corretor, por isso vi o imenso sorriso no seu rosto quando saio
da sua sala e o deixo com os documentos para finalizar a transação. O meu
pagamento foi foder a Bruna em todos os cantos das duas coberturas. A mulher
tinha fogo para incendiar o prédio inteiro e a dedicação com que tentava me
agradar me deixou em alerta. Antes mesmo de terminarmos o dia exaustos e
suados eu havia tomado a decisão de nunca mais repetir a dose com ela, não era
de bom tom manter transas casuais com um desafeto da mulher que você quer
agradar. Bruna tinha uma fixação na Gabriela, era óbvio que esse era o motivo
para me procurar, mais notório ainda era o sorriso de satisfação quando gozei
chamando o seu nome. Mas o que a Bruna não sabia era que eu estava atento a
tudo isso e se tinha alguém usando alguém, esse alguém era eu. Estar com
Bruna era mais uma satisfação carnal do que que qualquer outra coisa, fora a
melhor forma de aliviar meus desejos e dessa vez eu nem precisei ir atrás.

— Alexandre — Odete abordou-me no corredor a caminho do escritório.

— Sentiu saudades minhas? — Sorri.

— O seu celular está desligado? Passei o dia todo ligando para você.

Droga! Eu havia desligado o aparelho assim que entrei no carro com a


Bruna e esqueci de ligar.

— Descarregou — menti — o que houve de tão urgente que tentou


tanto falar comigo?

— A sua esposa esteve aqui.

— Quem? — Parei de andar.

— A Gabriela passou horas te esperando, disse que queria fazer uma


surpresa.

Porra! Eu não acertava uma com a Gabi.

— Onde ela está agora?

— Já foi embora, há cerca de duas horas.

— Vou apenas buscar os relatórios e irei para casa encontrá-la.

— Flores sempre ajudam a se desculpar — Odete sorriu — eu posso


ligar para a floricultura.
— Não se preocupe, pode ir embora. Eu mesmo farei isso — ela assentiu
e foi embora.

Quando entrei na minha sala encontrei meia garrafa de Whisky e um


objeto dourado sobre a mesa. Aproximei-me mais e reconheci a aliança da
Gabriela.

Caralho!

Os papeis abaixo da aliança fizeram meu corpo gelar. Minha esposa havia
encontrado o documento e descoberto sobre o filho que eu precisaria ter.

Foda. Duplamente foda!

Eu estava completamente fodido.


Segui pelos corredores da imobiliária em completo torpor. Nem no meu
pior pesadelo esse maldito casamento estava atrelado a procriação de um
herdeiro. Como o Alexandre pode ter sonegado de mim essa informação? Será
que ele seria capaz de usar uma camisinha furada? O filho da puta já tinha
sugerido sexo sem camisinha... Um temor percorreu todo o meu corpo ao
pensar nessas possibilidades. Sejam lá quais fossem as suas justificativas para
esconder esse detalhe, eu definitivamente não conhecia o homem com quem
dividi o teto nas últimas semanas.

Eu me sentia traída. O Alexandre havia traído a minha confiança e a


minha lealdade; e esses dois itens eram primordiais para mim. A nossa falsa
relação começou com um ato inesperado meu, que bêbada atirei-me no altar e
acabei presa em um casamento. Mas eu cumpri o compromisso que eu havia
firmado, mesmo em condições questionáveis, decidi permanecer como sua
esposa de mentirinha para ajudá-lo e porque ele precisava de mim.
Por ele, tive que mentir para as pessoas que amo. Não pude desabafar
com as minhas amigas sobre o meu falso casamento e isso provocava em mim
uma sensação ruim. Olhar na cara da Fernanda e não poder gritar que o que ela
viu na noite que foi à casa do Alexandre era uma farsa, fazia eu me sentir uma
pessoa indigna de confiança.

Alexandre apresentou-me aos seus pais como a mulher que daria os


netos tão aguardados e aos seus amigos como um belo troféu... Isso tudo era
demais para mim. Eu não sei como cheguei até aqui com tantas mentiras, mas
agora não teria volta.

Depois eu dedicaria o meu tempo para me desculpar com os envolvidos,


embora Alexandre não merecesse um pingo da minha consideração, mas sua
mãe não merecia ser enganada e precisava saber o tipo de filho que tinha.
Reuniria as minhas amigas e revelaria toda a mentira que foi esse casamento
desde o início. Isso ficaria para outra hora, por que agora eu só queria afastar-
me de tudo que remetesse ao Alexandre.

Soltei o ar com força quando pisei do lado de fora do prédio. O céu estava
azul e o sol aqueceu meu corpo gelado. Passei as mãos pelos cabelos e comecei a
sorrir quando uma forte rajada de vento bagunçou os meus fios dourados. Eu
estava livre dessa mentira!

Ignorei os chamados do motorista e segui apressada para longe dali. O


homem continuou a me seguir chamando alto o meu nome. Caralho! Não havia
sinal de nenhum táxi na avenida, como isso era possível? Estava prestes a
atravessar a rua, quando, como num passe de mágica, um Veloster prata parou a
minha frente. O vidro do motorista foi sendo baixado lentamente até fazer
surgir uma expressão sorridente.

— Aceita uma carona? — o moreno me encarou longamente.

— Senhora Gabriela! — gritou mais uma vez o motorista agora já mais


próximo de onde eu estava. Olhei para o carro prata do moreno para o
motorista e tomei a decisão que eu esperava ser a mais acertada.

— Onde devo te levar? — o homem indagou assim que sentei no banco


do carona.

— Para qualquer lugar longe daqui — sentenciei e soltei o ar quando o


homem sorriu e saiu cantando pneu.

O trajeto para o lugar mais longe do Alexandre foi preenchido por uma
ligação longa e burocrática, no viva-voz, a respeito de uma audiência que
aconteceria no dia seguinte. Muitos minutos depois a ligação foi encerrada e o
moreno voltou à atenção para mim:

— Pelo menos a minha conversa fez você relaxar — sorriu abertamente


e eu sorri de volta pela segunda vez desde que entrei nesse carro.

— Admiro a capacidade argumentativa de vocês, advogados — virei meu


corpo em sua direção.

— Com isso você quer dizer que gosta da nossa capacidade de usar as
palavras como armas? — indagou arqueando a sobrancelha.

— Também — sorri — mas em especial ao autocontrole e sagacidade


diante de um cliente histérico que, muito provavelmente, estaria em maus
lençóis sem a orientação de um bom advogado.

— Foi por isso que entrou no meu carro? — seus olhos escuros
encararam os meus por longos segundos — Está precisando dos meus serviços
para sair de maus lençóis? — o canto esquerdo da sua boca ergueu-se no fim da
frase.

— Pergunta errada — soltei o cinto de segurança e o encarei em silêncio.


Vi quando suas mãos pressionaram o volante com força e seus olhos desviaram
dos meus para o trânsito a nossa frente. — Por que me ofereceu a carona?

— Sinceramente não sei, você exala a problema! — balançou a cabeça.

— E você a solução — toquei a sua perna e no susto ele acelerou o carro,


quase batendo no carro a nossa frente. Em seguida, jogou o carro para o
acostamento e estacionou num lugar proibido. Passou as mãos pelos cabelos em
um claro sinal de hesitação e soltou junto com uma lufada de ar:
— O que você quer de mim, senhora Fragoso?

— Primeiro que você nunca mais me chame disso — segurei a ponta da


sua gravata e ele engoliu em seco.

— Como devo te chamar? — sua voz saiu rouca.

— Depende — avancei em sua direção aproximando meu corpo do seu.


Desfiz o nó da gravata e a retirei jogando-a para o alto, minhas mãos avançaram
por dentro da sua camisa social e acariciei o seu peito fazendo-o arfar alto —
Podemos começar pelo meu nome de batismo: Gabriela.

— Certo Gabriela, onde devo te deixar?

— Achei que já tivéssemos avançado duas casas — abri os primeiros


botões da sua camisa e ele segurou as minhas mãos, impedindo que eu
continuasse — Não está gostando do meu toque? — perguntei sorrindo.

— Estou e você sabe muito bem disso — afastou as minhas mãos com
relutância.

— Então por que me impediu? — Fiz cara de santinha.

— Gabriela, você sabe muito bem quem eu sou... — Levei meu dedo
indicador até a sua boca, interrompendo sua fala.

— Eu sei o que você quer que eu saiba.

— Duvido que ao menos lembre o meu nome — ergueu a sobrancelha.

— Nunca fomos apresentados, mas nunca é tarde — sorri abertamente e


montei em seu colo — Prazer, Gabriela! — inclinei o banco para trás, usando o
peso do meu corpo contra o seu, enquanto puxava a alavanca — O gato comeu a
sua língua, advogado? — sussurrei em seu ouvido.

— E-u — gaguejou — E- eu...

— Parece que alguém perdeu a capacidade argumentativa — meus


lábios tocaram o seu pescoço.

— Nunca foi tão difícil fazer o certo... — o ar saia com dificuldade dos
seus pulmões.

— Certo e errado são máximas relativas e você, como advogado, deveria


saber bem disso — suguei o seu lábio inferior e ele gemeu.

— Foda-se o Alexandre! — exclamou antes de colar a boca na minha.

Sua língua invadiu a minha boca e iniciamos uma batalha de mãos e


línguas. Suas mãos avançaram sobre meus seios, apertando-os com desejo e as
minhas trataram de abrir os botões finais da sua camisa. Quando estava prestes
a me livrar do terno, batidas fortes na janela interromperam o momento.

Assustado, o advogado que eu não recordava o nome, ergueu o corpo


abruptamente fazendo nossas cabeças se chocarem.

— Ai! — reclamei levando a mão cabeça.

— Desculpe... — tocou o local gentilmente.

As batidas continuaram firmes e eu me movi até o banco ao lado. O


homem ao meu lado tentou fechar a camisa rapidamente, colocando as casas em
botões aleatórios e o resultado foi uma camisa amassada e fechada de qualquer
jeito. Passou as mãos pelos cabelos e moveu o olhar para mim antes de abrir a
janela. Uma figura masculina alta e com cara de poucos amigos revelou-se assim
que os vidros abaixaram. O homem fardado segurava um bloco nas mãos, acho
que era um guarda de trânsito, o advogado bloqueava a minha visão.

— Algum problema? Vocês estão aqui há mais de dez minutos... — O


olhar do homem percorreu o carro até me encontrar.

— A culpa foi minha, paramos para conversar e aí...

— Já estamos de saída — o advogado me interrompeu.

— Acho melhor vocês conversarem em outro lugar — o guarda sorriu


maliciosamente para mim.

— Sem dúvida nós vamos — toquei a coxa do homem ao meu lado que
apenas assentiu em silêncio.

O guarda nos liberou com um sorriso cúmplice para o advogado, depois


que ele lhe apresentou o documento do carro e a habilitação.

— Você é terrível! — falou enquanto nos afastávamos do acostamento.

— Terrivelmente gostosa, você quis dizer né? — ele sorriu com as mãos
firmes no volante — Agora acelera esse carro que eu quero te mostrar quão
terrível posso ser.

Não precisei falar duas vezes para que ele seguisse no limite da via até
pararmos no primeiro motel que encontramos. Sorri quando ele não se ateve a
escolha do quarto. Ele poderia muito bem escolher a suíte para me
impressionar, mas estava sendo movido pela excitação e eu sabia muito que
nesse momento somente a verdade prevalecia.

Ele deixou a chave na ignição e correu até minha a porta para abri-la,
como um perfeito cavalheiro, só que com bastante pressa.

— Para quem estava hesitante... — perturbei assim que meus pés


tocaram o chão.

— A excitação sobrepõe-se a hesitação — pressionou-me contra o carro


— E você? Tem certeza da sua escolha?

— Eu só tenho uma dúvida... — pontuei e vi o receio em seu olhar surgir


— como eu devo te chamar quando me fizer gozar?

— Que péssimo momento para dizer que não sabe o nome do seu
parceiro de motel — sorriu alto — Rafael — sussurrou o seu nome no meu
ouvido.

— Devidamente apresentados, Rafael. Agora me faça gozar gritando! —


sorri antes da sua boca esmagar a minha num ardor desenfreado. Ele me ergueu
e eu envolvi minhas pernas em sua cintura, seguimos colados quarto adentro.
Sua boca apenas largou a minha quando me atirou na cama, caí sorrindo sobre
os lençóis de seda.

— Preciso descobrir o seu gosto — ele segurou a barra do meu vestido


longo e o tirou por cima, jogando na cadeira ao lado. Depois, desceu minha
calcinha pelas pernas, jogando-a longe.
O meu mais novo amigo abriu as minhas pernas e massageou a minha
boceta delicadamente antes de concentrar a atenção no meu clitóris, iniciando
uma fricção tortuosamente deliciosa. Arquei o meu corpo em direção ao seu
rosto quando a sua boca me tomou por completo. Sua língua era muito
habilidosa, entrava e saia de dentro de mim num ritmo cadenciado, prendi a sua
cabeça entre as minhas pernas e foi o incentivo que ele precisava para
aumentar o ritmo. Rafael me chupou, lambeu e fodeu com a sua língua sem
parar até me fazer estremecer e gozar somente com a sua boca. Vi um enorme
sorriso de satisfação nos seus lábios antes da sua boca tomar a minha
delicadamente.

— Chegou a minha vez de retribuir — falei ainda ofegante. Tirei toda a


sua roupa rapidamente, liberando a sua ereção evidente. Ele não era dos
maiores, mas como boa mulher sei que não adianta um super pau se não sabe
usar.

— Quer mesmo retribuir? — indagou tocando os meus seios, o toque


macio das suas mãos pressionando os bicos duros fez com que eu perdesse a
linha de raciocínio, por isso apenas assenti — monte em mim enquanto minha
boca chupa os seus peitos. Eles são incríveis, Gabriela.

— Seu desejo é uma ordem — sorri e rastejei até a cesta no criado-mudo


para pegar a camisinha. Abri o invólucro e coloquei o preservativo no seu pau
ereto delicadamente, aproveitando o momento para massageá-lo com
movimentos leves.

— Gabriela — gemeu quando intensifiquei o ritmo — Agora! — falou


com a voz entrecortada e atendi o seu pedido.

Abri as pernas e sentei no seu colo descendo de uma única vez até senti-
lo ao fundo. Encaixados, movemo-nos em sincronia. A sua boca cumpriu as suas
promessas e dedicou atenção aos meus seios, saboreando-os e sugando-os no
toque ideal. Subi e desci movida por uma sensação de bem-estar que há muito
tempo eu não sentia.

Gozei mais uma vez naquele quarto gritando alto, o Rafael se liberou logo
em seguida e caímos exaustos na cama vendo a nossa imagem ofegante no
espelho do teto. Ao ver minha tatuagem refletida, percebi que era disso que eu
sentia tanta falta: viver o Aqui e Agora! Sem pensar nas consequências.

— Pronto para o próximo round? — Perguntei indo em direção a barriga


dele.

— Nossa — sorriu e fechou os olhos em prazer absoluto quando minha


boca tocou o seu pau. Dando início a mais uma rodada de prazer — sempre!

Passamos umas duas horas fodendo loucamente. Consegui enxergar no


Rafael, que se revelou um excelente amante, o seu olhar de satisfação pessoal ao
me tocar e me beijar. Eu poderia apostar todas as minhas fichas que os seus
pensamentos estiveram no Alexandre enquanto me fazia gozar. O meu gozo fora
uma espécie de triunfo para o ele, que provavelmente achava que havia vencido
o Alexandre de alguma forma. E eu? Ah! E eu não lamentei nem por um segundo
por ter fodido com o advogado da sua família. Aquele que o vigiava para saber
se o casamento era ou não uma fraude.

Ele ainda tinha uma reunião de trabalho, por isso eram quase cinco
horas da tarde quando ele pagou a conta do motel. Saímos em carros separados,
por mais que o Rafael houvesse insistindo em me levar para casa, eu preferi que
ele chamasse um táxi. Primeiro por que eu não voltaria para a casa do
Alexandre e por ora não queria que ele soubesse disso. Segundo porque eu
ainda não sabia quais seriam os meus próximos passos, mas nutria uma única
certeza: eu aproveitaria a minha liberdade.

E foi com essa sensação fervilhando em meu corpo que decidi ir para o
aeroporto e comprar passagem no primeiro vôo para São Paulo. Desembarquei
quarenta minutos depois, peguei outro táxi e segui para um hotel. Eu não
arriscaria ir para meu apartamento e dar de cara com o Alexandre esperando-
me lá, ou no dia seguinte, seria fácil demais para ele me achar. Por isso, segui
para o Jardim Europa e solicitei a suíte presidencial. O gerente, um homem de
meia idade, recebeu-me com um enorme sorriso quando meu nome foi
anunciado na recepção.

O sobrenome Burnier, do meu pai, sempre abriu portas e contribuiu em


muito para as minhas aventuras. E é exatamente desse benefício que gozo ao
chegar à suíte. Um champanhe e uma taça de cristal esperam-me na mesa
central. Sirvo-me da bebida e sigo para o banheiro, uma banheira de
hidromassagem já está com água quente e pétalas de rosa misturada ao
sabonete líquido. Livro-me da minha roupa e entro na banheira, o líquido
quente abraça meu corpo e fecho os olhos desfrutando desse momento só meu.

Depois de relaxar por alguns minutos, lembrei que tinha quebrado meu
celular e não tinha viajado com mala, estava apenas com a roupa do corpo que,
aliás, estava no chão do banheiro. Disquei o ramal da recepção e solicitei que
providenciassem roupas, sapatos, jóias e um Iphone, indiquei algumas lojas
para que eles contatassem e levassem até a suíte. Cerca de quarenta minutos
depois o quarto foi invadido por funcionários trazendo com eles araras e mais
araras de roupas, além de uma maleta repleta de brincos, anéis, gargantilhas e
tornozeleiras.

Os funcionários retiraram-se para que eu pudesse escolher as peças que


mais me agradassem, poder e confiança de que meu sobrenome dispõe. As
marcas e grifes disputavam em vestir a elite e para isso eram capazes de
mandar todo o seu arsenal de modelos exclusivos para conquistar o cliente e é
exatamente isso que eu vejo agora. Algumas peças estão etiquetadas com um
aviso de "Cortesia para a Senhora Burnier". Além dos itens que solicitei, estão
uma maleta de maquiagem e inúmeras lingeries. Peguei o conjunto de renda
vermelho e voltei para o quarto com três vestidos em mãos, além dos itens mais
básicos. Paguei o que devia com meu cartão de crédito, por telefone e mandei
que as lojas pegassem o que restou.

Por fim, para hoje optei pelo vestido de paetê preto, um modelo com
mangas ¾ e um decote profundo nas costas. Amassei os fios de cabelos
deixando-os com um ar levemente bagunçado e passei o batom vermelho
sangue nos lábios. Gostosa! Digo para mim mesma em frente ao espelho e sigo
sorridente em busca de diversão.

Com meu novo Iphone em mãos, decido aproveitar as vantagens de estar


de volta ao lar. Uma lista de convites VIPs surgiu em poucas ligações e decido
voltar para night no mais alto nível.

Estou na Affair, o lugar que reunia o maior número de fortunas por


metro quadrado, devido aos seus frequentadores: herdeiros e magnatas. Era
uma espécie de clube onde somente sócios podiam entrar e não pense que
qualquer um pode se tornar sócio. O sistema de entrada era rigoroso, havia um
crivo, composto por sócios máster e os proprietários da boate que avaliavam os
escolhidos para fazer parte do seleto grupo.

Anualmente cada sócio dispunha de um único convite para indicar um


novo membro para submeter-se a análise e foi assim que eu me tornei sócia.
Minha amiga ruiva, Mel, filha de desembargadores, foi quem me indicou e após
submeter-me a todo o processo eu finalmente era sócia do lugar. Aproveitava
bastante, até que praticamente me mudei para o Rio.

Na fachada preta, um letreiro em ouro exibe o nome da boate. Enquanto


caminho em direção a entrada, as luzes se acendem a cada passo dado no tapete
vermelho, a sensação é quase como estar em Hollywood, não que eu já tivesse
pisado no tapete vermelho.

A minha entrada é liberada logo que confirmo a minha identidade como


sócia e as portas do paraíso são abertas. Uma hostess, que conhece todos os
meus gostos aproxima-se, uma vez sócio era criado um dossiê completo sobre
suas preferências e o resultado era um atendimento totalmente personalizado.
Antes mesmo que eu pensasse em solicitar champanhe, uma taça foi servida e a
mulher afastou-se sorrindo.

Observo um grupo de mulheres e homens descendo colados até o chão


sob o ritmo do funk. Com movimentos que simulavam o sexo, um homem alto e
com todos os músculos definidos agarrava a mulher a sua frente pela cintura e
'fodia' o seu corpo coberto por um minúsculo vestido. O ambiente cheirava a
sexo e liberdade; era como se uma alta dosagem de ocitocina, o hormônio do
prazer, tivesse sido injetada na minha corrente sanguínea. Ver todos aqueles
corpos suados e se explorando, fazia com que eu me sentisse quente e muito
excitada.

Um arrepio percorreu todo o meu corpo quando uma mão desconhecida


tocou a minha cintura puxando-me para si. Colei o meu corpo e rebolei
conforme a música, ainda encostada ao corpo desconhecido. Uma voz rouca
sussurrou em meu ouvido o hit tocado: Ôh novinha, eu quero te ver contente/
Não abandona o bonde da gente. Sorrio com a poesia erudita ao reconhecer o
dono daquela voz e me virei para confirmar o toque familiar.

— Eu poderia gozar só com sua imagem! — Ele exclamou comendo-me


com os olhos.

— Eu sou foda mesmo... — sussurrei ao seu ouvido. Deixado meus lábios


tocarem a sua pele.

— Vamos relembrar os velhos tempos? — indagou enquanto a sua mão


percorria a minha bunda.

— Com certeza, mas vou ao banheiro antes e então serei toda sua! —
pisquei antes de me sair rebolando.

— Quem é vivo sempre aparece — Mel adentrou no banheiro logo


depois de mim. Ela tornou-se a minha nova parceira do crime depois que
Fernanda trocou o Chandon pela mamadeira. Conhecemo-nos numa balada
louca há dois anos e de lá para cá, sempre que dava, estávamos aprontando
juntas. A vadia seria a minha companhia na fatídica viagem a Vegas, mas por
algum motivo que até hoje não entendi, ela recuou.

— Eu ainda não te perdoei por ter furado comigo em Vegas, sua vaca! —
A abracei sorrindo.

— Eu tenho um estoque elevado de furos com você — sorriu — Olha


onde você está? — indicou o ambiente ao redor. — E ainda por cima retornou a
night no melhor estilo: fodendo o pau de ouro.

— Pau de ouro? — sorri — E o que aconteceu com o apelido Felipe o


indomável? — indaguei, saímos enquanto saíamos do banheiro de braços
dados.

— Essa alcunha foi apagada depois que ele brochou numa orgia! —
revelou sorrindo.

— Eu passo uns meses longe e quando retorno descubro que o todo


poderoso José Felipe Martins precisa usar Viagra! — gargalhei.

Felipe que estava a alguns passos à frente no corredor escutou nossa


conversa.

— Caralho, Melzinha! Eu saio um instante e você já começa a queimar o


meu filme? — Felipe aproximou-se entregando-me um Scott.

— Eu falei apenas a verdade — Mel deu de ombros sorrindo.

— Foi uma noite atípica Gabi, você me conhece muito bem. Aliás, a sua
quadrilha de amigas me conhece muito bem — abriu um sorriso malicioso.

E imediatamente a minha mente trouxe a lembrança de uma das muitas


festas que eu e a quadrilha de salto alto e gloss fomos do Felipe, xará do meu
sócio Albuquerque. A última que fomos todas juntas foi espetacularmente foda!
O Felipe terminou a noite na sua cama rodeado de mulheres plenamente
satisfeitas. E duas, da quatros integrantes da quadrilha, estavam nessa cama.

— A sua cobertura está livre esse fim de semana? — indaguei com uma
ideia já criando forma na minha mente.

— Pra você!? Sempre!

— Seja lá o que essa mente diabólica esteja tramando, eu tô dentro! —


Mel prontificou-se.
— E o que vamos comemorar? — ele arqueou a sobrancelha— O Seu
casamento? — indagou sorrindo. O filho da puta já sabia!

— Minha despedida de casada! — soltei.

— What? Não tem nem três meses que você casou! — Mel indagou
sorrindo.

— Nunca é tarde para reparar um erro — dei de ombros.

— Opa, vamos comemorar... Quero acabar com essa fama aí que a Mel
contou, vou foder as duas hoje, topam?

— Topo, mas sem Viagra. — Mel ergueu a mão gargalhando.

— Só se for agora! — me animei.

Seguimos para a minha primeira noite de liberdade. E eu pretendia


curtir todas as que seguissem a essa, uma por vez. Hic et nunc.
Como diria Clarice Lispector: "Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda
não tem nome." Minha mãe dizia que quando eu era criança e as pessoas me
perguntavam o que eu queria ser, minha resposta era: Livre! As pessoas riam da
utopia própria da criança. Eu fui crescendo e o desejo de ser livre também. Eu
não queria limitar a minha vida aos dilemas impostos.

A vida para mim era mais do que um diploma ou uma profissão. Ela era
uma experiência efêmera, não sabemos quanto tempo temos aqui e por isso
devemos aproveitar cada momento da melhor forma que nos agradar.

Mas Gabi isso significa que podemos sair por aí fazendo o que der na
telha? SIM! Mas com algumas ressalvas: ficar longe de assassinatos, estupros,
tráfico de pessoas, chacinas, assaltos, desvio de verba da merenda e de
hospital... Todos esses crimes brutais e hediondos. E não é só para não ver o sol
nascer quadrado não, é uma questão de humanidade mesmo. Há certos limites
que o ser humano não deveria sequer cogitar, quem dirá ultrapassar. Desvio de
verbas de hospitais enquanto muita gente morre na fila do SUS? É de foder, no
péssimo sentido da palavra!

O que estou querendo dizer é que viver, para mim, é sinônimo de


liberdade. E ser livre às vezes é nadar contra a maré, andar em direção
contrária da multidão. Quem disse que, por eu ser mulher, não posso dar no
primeiro encontro? Quem determinou que fios longos sejam sinônimos de
feminilidade e fios de cabelos curtos não? Quem disse que só por que eu falo
palavrão eu sou menos feminina? Quem foi que falou que é feio mulher dar PT
numa festa? E o pior: Por que todos esses meus questionamentos fazem você
me tachar de feminista?

Talvez porque eu pregue liberdade e direitos iguais, ou porque eu


acredite e vivencie essa liberdade no meu dia a dia. Sei que, embora estejamos
no ano 2017 d.C, as mentes humanas não acompanharam essa evolução natural
do tempo, e não estou aqui querendo que ninguém siga o que eu digo. Não
tenho a mínima pretensão de ser dona da razão ou modelo para as outras
pessoas, o que eu quero é que, assim como eu entendo e aceito o fato de você
seguir o modelo: bela, recatada e do lar, você aceite quem eu sou. Que entenda
que eu sou livre de rótulos!

E se hoje eu darei uma festa de despedida de casada não é para


expressar o vazio existencial do meu ser ou para fazer ciúmes naquele que não
merece nem que eu pronuncie o seu nome, mas é para celebrar a minha
liberdade. E se tinha uma coisa que eu sabia fazer, era dar festas!

Quando acordei na cobertura do Felipe, ele e minha amiga não estavam,


mas um café da manhã me esperava. Uma funcionária prestativa e eficiente fora
designada para me auxiliar no que eu precisasse. Tomei o meu café da manhã
tardio, afinal já passava das onze horas, e comecei a dar vida a minha despedida.
Liguei e acertei com o buffet, o pertinente a comida e bebida, docinhos
personalizados e até um barman para preparar drinks, solicitei. Alice, a
funcionária, cuidou da decoração enquanto eu anunciava a minha festinha
particular.

Enviei mensagens para os convidados escolhidos a dedo, seria uma festa


para cerca de trinta pessoas, uma reunião íntima. Informo apenas o horário e
que será em São Paulo, o endereço onde aconteceria a festa, seria dado no início
da noite, queria evitar aparições surpresas. Peço a Alice que digite a lista de
convidados e leve-a até a portaria, salientando que somente os nomes na lista
deverão ser liberados sobre a apresentação de documento com foto.

Deixei por último os convites do meu grupo de amigas, a minha


quadrilha de salto alto e gloss:

Hi, girls!

Falo já, reunião...

Sol respondeu envolta na sua bolha que era o seu trabalho.

Oi gata ;)

Lú respondeu animada.

Você AINDA está viva?

Fernanda enviou junto com um emoji de uma cara furiosa.

Continuo linda, loira e gostosa!

Enviei como resposta e recebi um emoji revirando os olhos para a


mensagem. Logo após, ela passou um longo tempo “digitando”.

Liguei para você a noite toda! — emoji com cara furiosa —


Esqueceu que ontem era o nosso jantar? Nem o seu marido sabia onde
você estava! Vocês brigaram?
Fernanda escrevia interruptamente.

Terminamos!

E imediatamente uma onda de alívio percorreu o meu corpo. Como


resposta recebi uma enxurrada de emoji de carinha surpresa da Sol seguida da
mensagem:

Mas já? — carinha chorando.

Até que demorou — macaquinho tapando a boca.

Foi a mensagem da Lú e eu gargalhei alto enquanto digitava:

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk #LuVadia

Como assim? Devo procurar o Alexandre e acertá-lo no playground?

A doce Fê enviou.

kkkkkkkkkkkkkkkk

Ri alto aqui sozinha. Eu tinha esquecido como a Fê podia ser passional. E


minhas amigas as melhores de todo o universo.

Fê, não! Achei que a maternidade tivesse te deixado mais...

Sol repreendeu.
Vai lá, Fê!

Lú incentivou.

Mulherzinha?

Fê completou a mensagem da Sol.

Eu ia dizer serena!

Sol enviou.

Que serenidade o quê Sol, eu ando ainda mais ligada no 220 volts e
pronta para socar quem ferir as minhas amigas. Devo chutá-lo no saco
@Gabi?

Love You So Much Fê ❤


Seria adorável ver ele ir a lona com seu chute certeiro kkkkkk Mas
não, ele não merece que você desperdice seu tempo com ele ;)

Foi a minha resposta. Mas se um dia eu mudasse de ideia, eu já saberia


com que contar para quebrar a cara do babaca do Alexandre.

Eu queria tanto bater em alguém! Extravasar....

Fernanda enviou a mensagem seguida de um gif de um bebê chorando.

Vem extravasar aqui. Estou em Sampa e hoje a noite será a minha


despedida de casada!
Joguei a informação!

Oi?

Sol enviou.

ADORO! Kkkkkkkkkk

Lú, vadia, respondeu.

Sua vadia, por que você só me diz isso hoje? Tenho uma reunião a
noite com um cliente americano e não posso desmarcar, ele veio ao Brasil
somente para isso ;( ;( ;(

Fernanda respondeu tristemente.

Não se preocupe Fê, assim que eu retornar ao Rio saímos para


comemorar a minha liberdade ;)

Me preocupo sim =( Queria saber o que o Alexandre deixou de fazer


para que vocês terminassem? A idade tornou ele brocha?

Não contive a gargalhada. Como eu sentia falta das tiradas da Fê.


Respondi com a única coisa que me veio à cabeça:
Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

Sol repreendeu.

Fernanda!!!

Se eu bem lembro, você falou que ele sabia usar a língua como
ninguém...

Lú relembrou exatamente as minhas palavras.

A língua pode continuar ágil, mas se o pau não subir. Não adianta
muita coisa não...

Fê retrucou.

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

Acrescentei a minha risada emoji de bonequinhos chorando de rir.

Eu me contorcia no sofá, a minha boca começava a doer do tanto que eu


gargalhava.

Fê, você está impossível hoje!

Sol constatou.

Ué, trago verdades!


Ela se defendeu!

Viagra pode ser a solução!

Lú trouxe a solução para o pseudoproblema do Alexandre.

É Gabi! Dizem que a pílula azul faz milagres.

Fernanda concordou com a sugestão.

Eu vou morrer de ri literalmente, parem! Kkkkkkkkkkkkkkkkk

Sequei as lágrimas que rolavam no meu rosto, fruto das minhas risadas
histéricas.

Fernanda está digitando, apareceu no alto da tela e eu soube que minha


crise de riso não teria fim.

Medo da 'Fê escrevendo...'

Sol mandou e logo veio a resposta da Lú:

Eu não tenho medo rs

E finalmente veio a mensagem da Fê:

Eu não vou largar o Marcos no dia que ele falhar, pelo contrário vou
é ficar ainda mais satisfeita quando ele estiver sob o efeito da azulzinha.
Por que se o homem já consegue me deixar ardida em dias comuns,
imagina com um pau com o dobro da pilha.
Sol enviou inúmeros emoji com carinhas de surpresa. Lú, não ficou
apenas nos emoji:

O Marcos nunca falhou?

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk Eu vou mijar nas calças!

Anunciei o que estava bem perto de acontecer.

Amigas o papo está bom, e constrangedor também, mas o diretor de


marketing me espera. Depois volto (ou não) a depender do teor das
mensagens para ver sobre a festinha. Beijinhos.

Sol se despediu.

Fica Sol, vai ter gozo ;)

Fernanda perturbou.

kkkkkkkkkkkkkkkk #Morta

Lu respondeu.

Também amo vocês!

Foi a última resposta da Sol.

Podem mandar escrever na minha lápide: Morreu, literalmente, de


tanto rir
Enviei.

Fê, mata a minha curiosidade, o Marcos nunca falhou?

Lú insistiu.

Não! O homem está sempre duro!

Foi a resposta que recebeu.

Eu deveria ter enviado essa mensagem antes. Vocês são fodas!


Kkkkkkkkkkkkkkk

Conversar com as meninas foi a injeção de ânimo que me faltava para eu


me sentir novamente em paz comigo.

O Emerson já?

Foi a vez da Fê, saciar a sua curiosidade.

Então...

Lú respondeu e, logicamente, a Fernanda não deixou passar a enigmática


mensagem.

Começou com então, então fodeu muito kkkkkkk

Coloquei mais pilha:

Ou não (literalmente) kkkkkkkkkk


E Lú, logo tratou de justificar seu marido:

Idiotas kkkkkkkkk Duas vezes nesses anos todos, mas não foi que
ele não compareceu, o pau é que ficou meio...

Meia bomba!
Completei.

kkkkkkkkkkkkk Menos mal né?

Fê enviou.

kkkkkkkkkkkkkkk Vocês não prestam! kkkkkkkkkkkkk

A resposta da Lú, veio em forma de áudio, dessa vez.

Não coloque a culpa em nós se o pau do seu marido não fica ereto

Tadinha, Gabi kkkkkkk

Fê, mandou!

Não é assim não! Meu marido comparece sempre, mas houve uma
vez que estávamos bêbados e ele não conseguiu. Vocês sabem...

Lú justificou novamente, caindo na nossa provocação.

Mas dá para sentir prazer no meia bomba, Lú.


Foi a minha resposta.

kkkkkkkkkkkkk

Fernanda, limitou-se a responder.

Foi só uma vez gente!

Mentira – foram duas vezes – você que falou! kkkkkkk

Acusei.

Tá, duas únicas vezes kkkkkkkk

Preciso ir. Estou indo almoçar com meu marido, de pau sempre
duro, e minha filhota.

Fê, perturbou.

kkkkkkkkkkkkkkkkkk

IMBECIL! kkkkkkkk

Fê, não comenta nada com o Marcos da minha despedida, por favor.

Pedi, para evitar que ele estragasse a minha festinha.

Se está com medo do Alexandre ir até aí. É por que ainda sente
algo...

Ah Sinto! RAIVA!
kkkkkkkkkkkk Tudo bem então. Ele jamais saberá!

Obrigada ;)

Quando voltar ao Rio vai me contar tudo nos mínimos detalhes.


Inclusive se ele brochou! Fugiu da pergunta =P Por ora, divirta-se baby!

Te amo ❤

Eu vou tentar ir, mas não garanto. Hoje é aniversário da minha


sogra =(

Lu mandou e eu soube que a minha despedida não contaria com nenhum


membro da minha quadrilha.

No problema Lu =)

Divirta-se por mim, amiga ;)

Pode deixar! Vou aproveitar por todas vocês ❤

A noite chegou e a cobertura do Felipe estava completamente no clima


da minha despedida de casada. Garçons vestindo sunga preta e gravata
borboleta já circulavam entre os convidados que começam a chegar. A mesa
temática tinha um bolo em formato de espartilho e doces em formato de pênis,
seios, calcinhas e cuecas. Caminho até a mesa para ver de perto os docinhos, e
roubo um chocolate em formato de pênis da bandeja da cozinha. Sirvo-me de
Chandon antes de voltar para a sala e ocupar o meu lugar de anfitriã.

— Caralho Gabi! Você está vestida para comemorar a sua liberdade ou


receber pedidos de casamento? — José Felipe, o dono da casa, aponta para
mim. Estou usando um espartilho de renda e cinta-liga preta nos pés saltos altos
da mesma cor. Meus olhos estão delineados e uso cílios postiços para completar
o olhar fatal, meus lábios exibem um batom vinho escuro.

— Se alguém me propor em casamento, eu atiro cobertura abaixo! —


Gargalhei.

— Tenho certeza que estarão mais dispostos a tirar a sua roupa do que
a te propor casamento. Viro a cabeça para identificar o dono da voz e encontro o
Kauan, amigo do Alexandre, comendo-me com os olhos.

— Então acertei na escolha — sorri abertamente — Seja bem-vindo!

— Fiquei surpreso com o convite... É um recado direto para o


Alexandre? — indagou.

— É a minha despedida de casada, o recado por si só já foi dado! —


Rebati sorrindo.

— Touché! — sorriu de volta e eu me afastei para me jogar ao som do DJ


— presentinho de última hora do Felipe.

Alguns drinks depois, o DJ começa a tocar uma seleção de músicas da


Anitta, até mesmo quem não gosta do que ela canta se balança no ritmo. Eu
viajava cantando alto, dividida entre rebolar vestindo espartilho e não derramar
meu champanhe. Quando dou mais uma volta, paro de frente a entrada, no
momento exato em que a porta foi aberta. Um enorme sorriso surgiu nos meus
lábios quando vi quem acabava de entrar com uma garrafa de vinho em mãos.
Usando uma calça social preta e uma camisa da mesma cor, Rafael sorriu
quando encontrou os meus olhos o encarando.

— Agora sim, a diversão está completa! — Anunciei e sai rebolando em


direção ao meu mais novo amigo. Que me recebeu de braços abertos,
literalmente. Joguei-me sobre ele em um abraço apertado.

— Hum, bela recepção! — disse sorrindo enquanto me olhava dos pés a


cabeça.
— Sempre pode melhorar! — Sentenciei antes de beijá-lo.

Com apenas uma das mãos livres, ele enlaçou a minha cintura enquanto
eu assaltava a sua boca. Quando nos desgrudamos, notei o Kauan sorrindo, com
o celular nas mãos. Com toda certeza, meu ex-marido saberia, em poucos
minutos, que seu plano para enganar os pais estava consolidadamente
fracassado.
O primeiro minuto e os demais que sucederam desde que vi a aliança
posta na mesa provocaram-me um temor. Gabriela, a minha melhor chance para
cumprir esse maldito testamento, havia ido embora sem ao menos dizer adeus.

Eu até posso não conhecer muito bem a Gabriela, mas se tem algo que eu
julgo conhecer bem são as mulheres, essas não saem em retirada quando estão
com a razão. Pelo contrário, elas ficam para iniciar uma guerra e se eu não havia
encontrado a Gabriela era um bom sinal. Significava que ela voltaria para jogar
na minha cara toda a sua fúria. E aí eu esperava virar o jogo e convencê-la a ficar
mais uma vez, eu já tinha conseguido isso outras vezes. Para isso, eu precisaria
ser franco e contar a ela tudo, ou quase tudo, e isso incluía a Bruna. Sei que
parece algo arriscado, mas era a minha única chance. Dizer a verdade faria ela
confiar em mim novamente.

Disquei para o número salvo na discagem automática e caiu diretamente


na caixa postal. Enviei uma mensagem curta pedindo que ela retornasse as
minhas ligações ou ao menos respondesse as minhas mensagens e permaneci
aqui sentado no meu escritório torcendo para que ela me ligasse. Olhei mais
uma vez para a aliança deixada para trás e bebi mais uma dose de Whisky.

Gabriela reconsiderará! Me perdoará! Gabriela voltará para a minha vida!


Mentalizo e de repente a porta foi aberta e meu coração acelerou. Tem que ser
ela!

— É você? — indaguei ao constatar que não era a Gabriela e sim o Assis,


meu motorista.

— Desculpa senhor, bati na porta e como não ouvi resposta...

— Não precisa se desculpar — soltei um lamento e voltei a girar a


aliança sobre a mesa — Eu vim com o meu carro hoje, você está dispensado.

— Eu sei... — ele hesitou antes de continuar e voltei a minha atenção


novamente ao homem parado a minha frente — Eu trouxe a senhora Gabriela
aqui, mas ela saiu daqui estranha mais cedo.

— Estranha como? — indaguei preocupado. Ela havia bebido metade da


garrafa de Whisky. Será que pegou o carro e saiu dirigindo por aí? Levantei da
cadeira sobressaltado com a ideia.

— Ela parecia em choque quando me viu e se afastou sem olhar para trás
ignorando o meu chamado. Corri atrás dela, mas nada.

— Assis, seja objetivo: ela saiu dirigindo seu carro ou entrou em algum
táxi?

Enquanto eu aguardava a resposta uma sensação ruim percorreu todo o


meu corpo e a minha mente vagou para um lugar sombrio.

— Não. Entrou em um Veloster prata.

Soltei o ar com força e virei o conteúdo da garrafa direto na minha boca.


A bebida desceu esquentando o meu corpo frio. Passei as mãos pelos cabelos e
inspirei mais uma vez para controlar a minha respiração acelerada.

— Você chegou a ver quem dirigia o carro? Era um homem?


— Não senhor, quando cheguei mais próximo o carro saiu cantando
pneu.

— E você não foi atrás? Não cogitou a ideia de seguir a porra do carro?

— Não — abaixou a cabeça num lamento — O senhor mesmo disse que


eu deveria transportar a senhora Gabriela sempre que ela solicitasse,
resguardando a sua individualidade. Não julguei necessário segui-la. Aconteceu
alguma coisa? — indagou preocupado.

— Não! — minimizei a situação — Tivemos uma discussão hoje mais


cedo e ela não atende às minhas ligações.

— Isso explica a tristeza nos olhos dela...

— Ela comentou algo com você? — sondei.

— Não — negou balançando a cabeça — Ela solicitou que eu a levasse a


Albuquerque's, mas no meio do caminho mudou de ideia e decidiu vim até aqui.

— Ok Assis, está dispensado por hoje.

— Tenha uma boa noite, senhor.

Duvidava que eu sequer dormisse com tudo que havia acontecido, mas
acenei a cabeça em concordância.

Gabriela não me atendeu naquela noite e nem no dia seguinte. Já era fim
de tarde e a porra do seu telefone só dava caixa postal e ninguém sabia onde ela
estava. Tentei descobrir por intermédio do Marcos, afinal ela e Fernanda são
inseparáveis. Mas nada... Segundo meu amigo a Fernanda não só não sabia
onde Gabi estava como também estranhou o fato de não termos comparecido ao
jantar na sua casa. Eu havia esquecido completamente do jantar e pelo visto eu
não fui o único, já que Gabriela sequer ligou para a amiga para informar que não
iria. Contei ao Marcos que tivemos um pequeno desentendimento e que ela
havia saído de casa. Meu amigo sorriu e disse que sexo de reconciliação "é o que
há!", mal sabe ele que nem sexo comum temos. Pedi que me mantivesse
informado sobre qualquer aparição de Gabi e desliguei a ligação antes de discar
mais uma vez para Gabriela:

Oi, aqui é a Gabi! Deixe seu recado e decidirei se ligo ou não de volta
para você! Beijo

Eu já tinha escutado essa mensagem por tantas vezes que poderia jurar
que ela era uma (in) direta para mim.

— Dá pelo menos para ligar a porra do telefone? — Iniciei o meu diálogo


com a secretária eletrônica — Preciso saber se ao menos está viva! Retorna
essa ligação!

Encerrei a chamada e segui em passos firmes em direção ao hotel que


Gabriela ficou hospedada antes de se mudar para minha casa. A recepcionista
recusou-se a me dar qualquer informação sobre hóspedes do hotel e claro que
eu perdi a minha paciência exigindo que chamasse o gerente, afinal sou marido
dela e não qualquer um.

— O senhor deseja falar comigo? — o homem calvo indagou com uma


voz serena.

— Sim. A minha esposa está hospedada aqui e gostaria de vê-la.

— Tudo bem, senhor...

— Alexandre Fragoso — estiquei a mão e ele a apertou firmemente.

— É um prazer ter o senhor no meu hotel — os olhos do homem


brilharam, eu já havia visto aquele olhar milhares de vezes. Era só pronunciar
que era o herdeiro de uma família tradicional carioca que as pessoas me
olhavam com total atenção — Qual o nome da sua esposa? — indagou
prestativo já do outro lado do balcão. Com os dedos no teclado prontos a me dar
a informação que eu tanto necessitava.

— Gabriela Fragoso Burnier — informei e seus dedos bateram agilmente


no teclado.

— Lamento senhor Fragoso, mas a sua esposa não está aqui —


lamentou-se.

— Tente Gabriela Burnier. Às vezes ela assina como solteira...

— Força do hábito — o homem sorriu abertamente e devolvi um meio


sorriso.

— A senhora Burnier já esteve hospedada aqui, mas a sua conta foi


encerrada e não houve nenhum registro depois disso.

— O senhor tem certeza que ela não esteve aqui? Será que ela não fez
check-in com um nome falso?

— Duvido muito senhor Alexandre. Solicitamos documento com foto na


nossa recepção.

— É essa mulher aqui — insisti mostrando uma foto de Gabriela de


perfil para o gerente. Era a foto que aparecia quando ela raramente me ligava. O
homem encarou a foto por alguns segundos antes de responder sorrindo:

— Sua esposa não está aqui senhor Fragoso, posso te garantir que é
impossível ela ter passado por aqui e eu não ter notado.

— Talvez no seu horário de almoço? — insisti — Você pode perguntar


aos seus funcionários? Tivemos um desentendimento de casal e estou
arrependido, preciso me desculpar — fitei seus olhos — Por favor, me ajuda! —
supliquei.

— Tem razão... Vamos eliminar todas as possibilidades. Que horas o


senhor acha que ela deu entrada aqui? — Perguntou solícito.

— Entre a noite e madruga do dia de hoje — respondi. O gerente ergueu


a mão e um homem alto e forte aproximou-se de onde estávamos.

— Senhor Fragoso, esse é o Taylor nosso chefe de segurança — falou


para mim antes de voltar a sua atenção ao homem — Taylor, observe com
atenção a imagem e quero que informe se a mulher dessa foto deu entrada aqui
como hóspede ou acompanhante. Se preciso for, pode consultar as câmeras de
segurança. — Ampliei a imagem e estiquei o celular na direção do Taylor que
balançou a cabeça em negativa.

— Essa mulher não deu entrada aqui, senhor — disse num tom firme
que não deixava margens para dúvida.

— Tem certeza? — indaguei — Veja bem a foto novamente — insisti.

— Com todo respeito, senhor — seus olhos escuros me fitaram — Se ela


tivesse entrado aqui nos últimos dias eu saberia. A senhora Fragoso é daquelas
mulheres que deixam seu rastro por onde passa. — Encarou-me e vi verdade na
sua fala, em especial na última frase.

— Obrigado, Taylor — agradeci.

— Lamento mais uma vez não poder ajudar. — O gerente lamentou-se


mais uma vez.

— Eu que agradeço pela sua disposição.

— Estou ao seu dispor, senhor Fragoso.

Saí do hotel e disquei mais uma vez para Gabriela:

Oi, aqui é a Gabi! Deixe seu recado e decidirei se ligo ou não de volta
para você! Beijo

Caralho! Esbravejei desligando o celular e caminhando em direção ao


carro. Eu encontraria Gabriela nem que tivesse que passar a vida procurando. O
cerco estava fechando:

✔ Casa da Fernanda

Já tinha ligado para o Marcos, ainda assim apareci sem avisar hoje pela
manhã e não havia nenhum sinal da Gabriela por ali. Mari era uma boa fonte de
informação.

PS: Lembrar de enviar uma boneca para ela.

✔ Carpe Vita

Estive ontem à noite e nenhum sinal dela. Felipe Albuquerque mostrou-


se preocupado com o sumiço da amiga e os seguranças confirmaram que ela
não apareceu por lá.

✔ Apartamento em São Paulo

Consegui arrancar do Marcos o endereço do condomínio que Gabriela


morava e disquei para lá. O porteiro transferiu a ligação para o apartamento e
uma funcionária garantiu que a senhora Gabriela não esteve ali pelos últimos
dias e acrescentou que a mesma não aparecia há meses.

Onde porra você se escondeu, Gabriela?

Pensei enquanto colocava o carro em movimento, uma notificação


indicando a chegada de uma mensagem me fez parar no primeiro acostamento
a frente. Desbloqueie a tela e segui em direção a mensagem.

Um vídeo de cinquenta segundos, cinquenta míseros segundos


responsáveis por desencadear em mim uma fúria crescente e privação de
sentidos. Eu não conseguia raciocinar apenas a emoção falava alto, a raiva
crescente e o desejo mórbido de bater em alguém para aliviar a minha fúria.
Não é bater em qualquer um, é bater no maldito advogado!

Apertei o celular firme em minha mão enquanto o vídeo recomeçava


numa frequência automática, pressionei os meus dedos contra o aparelho até a
minha mão ficar vermelha e meus dedos começarem a doer.

Mais uma vez o vídeo recomeçou e a imagem passou pelas minhas


retinas, fixaram na minha memória e repercutiram numa frequência
cadenciada:

Gabriela e Rafael juntos.


Gabriela e Rafael se beijando.

O filho da puta do advogadozinho tomando como sua a Gabriela.

Gabriela e o cara que eu vou quebrar cada osso do maldito rosto, para
que ele nunca esqueça que não deve tocar no que não lhe pertence.

Gabriela...

Antes mesmo que a minha fúria tivesse dissipado, eu fretei o primeiro


jatinho que partiria para São Paulo nos próximos trinta minutos. Dirigi feito um
alucinado até o aeroporto, passei em sinais vermelhos, realizei ultrapassagens
indevidas e parei o carro na porta mais próxima ao portão de embarque. Antes
mesmo que eu saísse do carro um agente de trânsito abordou-me:

— Senhor, o carro não pode ficar aqui — apontou para a placa que
indicava: proibido estacionar e parar — Por favor, queira retirar o veículo ou
ele será guinchado.

— Cumpra o seu papel! — informei saltando do carro com pressa. O


homem demorou alguns segundos até entender que eu não iria tirar o carro
dali.

Uma infração de trânsito era o menor dos meus problemas, afastei-me


apressado entre as pessoas chocando-me contra os transeuntes. Antes da
aeronave decolar tento mais uma vez falar com a Gabriela e adivinha o que eu
escuto? Isso mesmo, a sua voz na caixa postal.

Se você tem mais de dezoito anos já deve ter assistido Papa-Léguas. O


desenho comum da década de oitenta, onde o galo corredor é caçado
constantemente pelo Coiote, um lobo selvagem; por mais que o Coiote se
esforce para capturar o Papa-Léguas ele nunca consegue alcança-lo. É um jogo
de caça e caçador, onde a caça é mais sagaz e nunca é capturada. Exatamente o
mesmo acontece entre Gabriela e eu. Quando eu acredito estar um passo à sua
frente ela vira o jogo.

Bati no endereço que o Kauan me enviou onde aconteceu a sua


despedida de casada e tudo que eu encontrei foi um homem moreno vestindo
apenas um samba canção ao abrir a porta. Apresentei-me como marido da
Gabriela e ouvi uma sonora gargalhada, precisei usar todo o meu autocontrole
para não quebrar a cara do sujeito.

— Chama a Gabriela agora! — rosnei.

— Perdeu a viagem, brother. A festa aconteceu ontem à noite — o


homem sorriu abertamente.

— Eu preciso falar com ela... — tentei apelar para o homem, mas ele
sorriu mais uma vez e eu decidi mudar a tática — Gabriela, eu não vou embora
sem falar com você! — gritei.

— Dá para não gritar? — levou a mão a cabeça — Estou com uma puta
ressaca... Mas, a festa valeu a pena — abriu um enorme sorriso.

Foi o que eu precisava para forçar a passagem entre o homem e invadir a


sua casa.

— Eu sempre soube que os cariocas eram folgados, mas você se supera!


— sorriu mais uma vez exibindo todos os seus dentes.

— Onde ela está? — indaguei furioso.

— Não faço ideia — deu de ombros — E mesmo que eu soubesse não


diria — sorriu mais uma vez. Marchei em direção ao sujeito pronto para
quebrar todos aqueles dentes que insistiam em aparecer — Calma, eu fui com a
sua cara — sorriu — Pode procurar — jogou-se no sofá — Eu aconselho
começar pelo quarto, foi o último lugar que lembro dela estar ontem à noite.

— Seu filho da puta! — disparei e uma mulher apareceu magicamente


entre nós.

— Alice, queira acompanhar o ex-marido da Gabi na sua caça a ex-esposa


— gargalhou.

— Por aqui, senhor — a mulher indicou o caminho do corredor e eu a


segui. Queria o quanto antes achar a Gabriela e sair dali antes que eu infringisse
a lei mais uma vez. Dessa vez, não seria apenas multa e pontos na carteira, eu
temia ficar detido por lesão corporal grave, pois quando eu desse o primeiro
soco nesse homem não conseguiria parar.

A funcionária guiou-me por todos os aposentos e eu observei cada canto


feito um cão farejador, nenhum sinal dela na varanda, cozinha, banheiros,
quarto de hóspedes e muito menos na suíte principal. Eu não sabia se eu
deveria comemorar por encontrar uma mulher morena dormindo sob os
lençóis brancos ou se eu ficava ainda mais puto por não ter encontrado a Gabi.
Frustrado acompanhei Alice de volta a sala.

— Nada dela, né? — o homem indagou sorrindo. Dei as costas e segui em


direção a porta ignorando o imbecil — Brother, tô com pena de você. Por isso,
vou te ajudar — completou e eu parei com metade do corpo para fora do seu
apartamento. Qualquer ajuda era bem-vinda!

— Se eu fosse você, tentava na casa de um cara com jeito de bom moço e


sorriso fácil. Acho que era Ronaldo, Reinaldo... — tentou buscar o nome na
memória — Rafael, isso Rafael. Se eu não me engano ele é carioca, talvez você já
tenha trombado com ele por aí.

Perdi meu tempo ouvindo a dica do imbecil. Afinal, essa pista eu já tinha.

Antes de embarcar solicitei a Odete que fosse pessoalmente até a casa do


Rafael com a desculpa de que precisava de uma orientação num contrato, uma
desculpa qualquer, apenas para conferir se Gabriela estava lá. Assim que pousei
aqui, eu já tinha um relatório completo: Rafael não estava em casa, mas a sua
funcionária abriu as portas para receber Odete e enquanto ela preparava um
café para a visita, minha secretária vasculhou o apartamento do Rafael e
nenhum sinal de mulher, muito menos da Gabriela por ali. Odete seguiu para o
seu escritório e o encontrou lá trabalhando. O que só significava que eles não
estavam juntos.
— Vai a merda, seu babaca! — rebati.

— Prazer te conhecer Alexandre, querendo voltar, é só aparecer —


gargalhou.

Merda!

Para onde eu vou? Pensa Alexandre! Pensa!

Saí da casa do Felipe, sim existem dois Felipes na vida da Gabriela, uma
piada de extremo mau gosto, e segui até o seu endereço fixo. Um condomínio de
luxo na capital paulista. Mas não consegui passar da portaria, o segurança não
liberou a minha entrada mesmo após eu praticamente esfregar na cara do
sujeito a minha certidão de casamento. A nossa conversa, leia-se a minha
insistência em entrar no condomínio, dificultava a entrada dos carros na
portaria, o carro que me transportava estava parado na entrada, para livrar-se
de mim o quanto antes o segurança interfonou para o apartamento da Gabriela
e a sua funcionária, a mesma que me atendeu da outra vez, repetiu que a sua
patroa não havia aparecido ali nos últimos meses.

— Para onde vamos agora, senhor? — o motorista contratado indagou.

— Continue rodando — informei e voltei a minha atenção para a minha


lista caça a Gabi:

✔ Endereço da despedida

✔ Apartamento

✔ Família (Mãe/Pai)

✔ Amigas São Paulo

Eu me preparava para ditar o endereço da casa da sua mãe, quando o


meu telefone tocou de um número desconhecido, mas com DDD do Rio de
Janeiro.

— Alô! — atendi prontamente.

— Alô, senhor Fragoso. Aqui é o gerente do hotel que o senhor esteve


hoje mais cedo em busca da sua esposa — o homem silenciou e o meu coração
acelerou. Que sejam boas notícias. — A Gabriela acabou de dar entrada no nosso
hotel, achei que o senhor gostaria de saber.

— Toca para o aeroporto — falei para o motorista.

— O senhor me ouviu? Senhor Fragoso?

— Desculpa, estava falando com o motorista. Vim até São Paulo para
encontrá-la... Enfim, eu nem sei como te agradecer — sorri pela primeira vez
desde que Gabriela sumiu da minha vida.

— Reconquistando a sua esposa seria uma ótima forma — o homem


sorriu do outro lado da linha — Vi o desespero nos seus olhos hoje mais cedo e
ficaria feliz se pudesse ajudá-lo.

— O senhor é casado? — perguntei. Pois, somente um homem que já


esteve na mesma posição que a minha compreenderia o meu desespero.

— Há mais de vinte anos e ao contrário do que as pessoas dizem


continuo um romântico incurável. E sei reconhecer quando encontro um a
minha frente.

— Eu? — indaguei incrédulo.

— Sim, o senhor. A sua devoção para se reconciliar com a sua esposa é


algo louvável. Muitos casais brigam e ficam por isso mesmo, por que ninguém
que dar o braço a torcer... Desculpa, estou te incomodando com meus devaneios
de um homem de meia idade — sorriu — Ah! Não se preocupe eu não informei
que o senhor esteve aqui a sua procura e as portas do meu hotel estão abertas
para te ajudar.

— Obrigado — encerrei a ligação e disquei para o número que me


ajudaria a salvar o meu relacionamento.

Quando pisei os pés em solo carioca eu era um misto de inquietação e


alívio. Metade de mim torcia para encontrá-la de uma vez por todas para termos
uma DR típica de casais, mas a outra metade estava agitada com a possibilidade
de a Gabi sumir mais uma vez, eu estava sem paciência para ficar brincando de
caça ao tesouro.

O gerente do hotel, o senhor Garcia, auxiliou-me a entrar no hotel sem


ter a minha presença registrada, o homem de aparência doce acreditava que eu
era um homem apaixonado e arrependido por ter brigado com a mulher amada
e por mais que eu quisesse discordar dele, eu não poderia. Eu não perderia a
chance de ficar frente a frente com a Gabriela. Ainda que isso implicasse em
mentir para alguém que me ajudou tanto, mas para compensar a minha
consciência solicitei a Odete que enviasse flores e chocolates para a escola em
que a sua esposa lecionava em nome do marido. E reservei uma mesa num dos
restaurantes mais sofisticados para que eles desfrutassem de uma boa comida,
música de qualidade e celebrassem a união.

O quarto que o Garcia me instalou ficava ao lado do que Gabriela estava.


De início eu achei arriscado, mas ele garantiu que ela havia saído e ainda não
havia retornado. Então assim que ele me deixou sozinho, fui para o banheiro e
tomei um banho rápido, eu queria o quanto antes dar início ao meu plano e para
isso eu precisava estar no quarto ao lado antes que ela retornasse.

O ambiente tinha o seu cheiro, o seu perfume característico. Era


impressionante como Gabriela conseguia marcar um lugar com apenas pouco
tempo da sua chegada. Fora assim na minha casa, cada cômodo parecia ter a sua
presença, o seu cheiro, a sua risada ecoando pelas paredes, seus olhos
iluminando tudo a sua frente e a sua boca que emitia sons capazes de
enlouquecer o mais normal dos homens. Isso sem falar, na pele macia e suas
mãos ágeis...

— Eu te perdoo Sol — ela sorriu e meu coração errou o compasso ao


ouvir a sua voz — Mas só por que você me trocou pelo seu marido gostoso e ele
te faz feliz e te proporciona orgasmos que irradiam pelos seus poros —
gargalhou e esse era o segundo som que eu mais gostava de ouvir da sua boca.
— Também, te amo! — encerrou a ligação sorrindo e ergueu os olhos
encontrando os meus.

O mundo parecia ter paralisado, pois tudo o que eu escutava eram as


batidas descompensadas do meu coração, não consegui formular uma única
frase, eu estava inerte parado a poucos metros de onde ela estava. A Gabriela
estava paralisada, o olhar que me fitava não dava nenhum indício da sua
emoção, o sorriso que sumiu nos seus lábios ao me ver foi o único sinal que
indicava que ela estava consciente da minha presença em seu quarto. Em
silêncio e sem desviar o olhar do meu, ela aproximou-se ficando poucos
centímetros do meu rosto antes de erguer a mão e acertá-lo em cheio. Um
rastro de calor percorreu a minha face.

— Oi para você também — falei e outro tapa atingiu o lado oposto do


meu rosto. E antes que eu pudesse pensar sua mão moveu-se para me acertar
mais uma vez. Segurei a mão impedindo que ela me atingisse novamente.

— Gabriela, a gente precisa conversar — ela levantou a outra mão e eu


segurei seus pulsos.

— Por favor, Gabriela — pedi no mesmo tom sereno que dei início a
nossa conversa. E suas pernas começaram a me chutar com força — Você me
deixa sem alternativas — empurrei seu corpo contra a cama ao lado, ela caiu
batendo as costas no colchão, antes que ela pudesse se erguer pressionei meu
corpo contra o seu, imobilizando-a.

— Me solta! — ordenou e vi fúria no seu olhar!

— Eu vou te soltar, quando terminarmos essa conversa.

— Eu vou gritar! — Ameaçou, debatendo-se

— Não, não vai — discordei fitando-a longamente — Se quisesse


realmente fazer isso já teria feito.

— Está duvidando de mim? — Desafiou-me.

— Não, mas se você gritar eu precisarei te calar.

— Vai me amordaçar? — sorriu amargamente — Nada mais vindo de


você me surpreende... — disse num tom triste.

— Não uso mordaças, meus meios de dominação são outros — sorri e


esperei que o brilho no seu olhar surgisse mesmo que ele significasse fúria, mas
ele não apareceu, seus olhos me encaravam como um completo estranho — Eu
precisarei te beijar caso grite e no segundo que nosso lábios se tocarem, não
responderei pelos meus atos... — fitei sua boca antes voltar a encará-la, ela
desviou o olhar.

— O que você quer? — indagou.

— Me desculpar.

— Não precisava perder o seu tempo.

— Eu te procurei feito um louco...

— Posso imaginar, eu era a sua galinha dos ovos de ouro — seus lábios
se ergueram, mas o sorriso não veio.

— Não — neguei e toquei seu rosto para que me olhasse — Você é a


minha companheira, a pessoa que aceitou ser a minha esposa para me ajudar.

— Eu não tive muitas escolhas — sorriu tristemente.

— Você teve! — seus olhos se arregalaram — Promete que vai ouvir


tudo que eu tenho a dizer e tentar entender o meu lado?

— Eu não vou prometer o que não posso cumprir. O mentiroso aqui é


você! — Jogou na minha cara.

— Eu mereço ouvir isso.

— Não, você não merece nem estar aqui olhando na minha cara. Você
mentiu para mim a respeito de um filho! Quando pretendia me contar? Ah! Já
sei, pretendia me dopar para me engravidar? — suas pupilas dilataram e sua
voz falhou — Responde, porra! — gritou.

— Eu seria incapaz de tocar numa mulher sem o consentimento dela e


você sabe muito bem disso — encarei-a profundamente — Dividimos o teto
durante um longo período para você constatar que eu nunca invadi o seu quarto
para te tocar, jamais insisti em um toque que não fosse consensual. Eu posso ter
inúmeros defeitos, mas não sou um verme — pontuei. Como ela permaneceu em
silêncio, prossegui — Você estava errada quando disse que não teve chance... —
hesitei por que sabia que isso era apenas a ponta do iceberg das merdas que eu
tinha feito contra ela — Aquela noite em Las Vegas... A Tiffany... Era a minha
última tentativa para convencê-la a casar comigo — Seu rosto exibiu uma
expressão de incredulidade e continuei — Eu sabia que você tinha embarcado,
porque um amigo me contou e eu precisava que você aceitasse. O que eu não
contava era que você assumisse o papel de noiva tão rápido, a ida a capela era
uma brincadeira, o meu casamento com a Tiffany não passaria de um teste, mas
quando vi você entrar na capela do Elvis e anunciar que a noiva havia chegado
eu não podia perder a oportunidade...

— Você me drogou? O que você colocou na minha bebida aquela noite?


— uma lágrima escapou dos seus olhos.

— Eu não sou esse tipo de homem e você sabe muito bem disso —
disparei — Eu estava tão bêbado quanto você e naquele momento eu só
consegui pensar que a mulher ideal estava me dizendo sim.... No dia seguinte
quando você acordou e exigiu a separação eu fui franco em cada palavra que te
disse, eu precisava de você, você era a única pessoa que eu confiava.

— A única imbecil a cair no seu papo desesperado... — lamentou-se.

— Não. A única pessoa que se importava comigo. Gabriela, você deixou


sua vontade de lado para me ajudar e serei eternamente grato por isso.

— Gratidão? É isso que terei de você? — indagou encarando-me.

— O que você esperava?

— Lealdade, sinceridade, companheirismo, amizade... Quando eu te disse


sim, eu fui contrária a todas as minhas ideologias e você me retribuiu como? —
outra lágrima rolou e eu levei a mão para enxugar a sua face — Eu me vi presa
na sua teia de mentiras e tudo que eu mais quero agora é sair e nunca mais
voltar.

— Eu lamento profundamente — acariciei o seu rosto delicadamente


— Por isso, estou aqui para te contar a verdade... Eu omiti o filho — ela revirou
os olhos — Porque eu sabia que você diria não. Sabia que você nem teria me
dado ouvidos se eu contasse. No fundo, eu nutro a esperança que meus pais
alterem essa cláusula.

Gabriela permaneceu em silêncio e eu continuei a minha confissão.

— Eu preciso confessar também que enquanto eu exigia fidelidade a


você e um comportamento exemplar. Eu te traí... — ela não demonstrou
surpresa até eu concluir — com a Bruna. — Seus olhos me encaravam num
misto de fúria e desprezo — Eu me envolvi com ela antes de saber que vocês se
conheciam.

— E tornou a repetir depois que descobriu que ela me odeia? — indagou


furiosa — responde!

— Sim — confessei — Mas foi apenas carnal.

— Quantas vezes? Quantas vezes enquanto eu me mantinha fiel ao nosso


acordo de aparência vocês foderam e riram da minha cara?

— Gabi...

— Quantas vezes? — exigiu.

— Duas. Uma no dia do meu aniversário... — mais uma lágrima escapou


dos seus olhos e dessa vez ela enxugou rapidamente — E a última no dia que
você esteve no meu escritório.

— Vocês devem ter se divertido muito as minhas custas.

— Gabriela, eu nunca toquei no seu nome perto dela.

— Claro! A esposa nunca vem à tona com a amante...

— Eu nunca permiti que ela falasse de você na minha frente. Por que
você é importante para mim e eu não deixaria que ninguém zombasse de você.

— Exceto você! O marido exemplar... — sorriu amargamente.

— Eu estou disposto a mudar... por você!


— E quem disse que eu estou disposta a aceitá-lo de volta?

— Você não teria me mandado um recado se não existisse essa


possibilidade de reatarmos.

— Você já sabe da minha despedida... — Exibiu um sorriso triunfante.

— A sua indireta foi recebida com sucesso, mas estou disposto a ignorar
tudo.

Ela não deixou que eu concluísse o meu pensamento pois uma crise de
riso reverberou por todo o seu corpo e o som da sua risada ecoou pelo quarto.
Seu corpo se contraía na medida em que ela gargalhava e lágrimas escaparam
mais uma vez, mas dessa vez do tanto que ela riu.

— Senti falta da sua risada — confessei e ela automaticamente fechou a


cara.

— Dá para sair de cima de mim? — Pediu.

— Eu estou bem confortável aqui — sorri e ela revirou os olhos.


Relutante afastei os nossos corpos, mas me mantive na cama, ela levantou e
sentou-se de frente para mim. Como ela estava calma e sem nenhum sinal
aparente de ataque, eu decidi pôr fim o quanto antes a essa DR: — Como eu
disse, eu estou disposto a mudar e o primeiro passo é revendo nosso acordo.
Não existirá ninguém além de você.

— Do que você está falando?

— Fidelidade! Eu me manterei fiel a você, mesmo que isso signifique que


eu viva um longo período celibatário.

— Não vejo problemas em você ser fiel. Mas, não exija nada de mim.

— É impressão minha ou estamos discutindo as cláusulas do nosso


casamento? — Ergui a sobrancelha sugestivamente e acompanhei ela revirar
os olhos.

— Eu não disse que sim!

— Mas também não disse que não — ela não rebateu e eu continuei —
Você precisa manter-se discreta então.

— Eu F.O.D.I com o seu advogado — pontuou sorrindo — nossa farsa


chegou ao fim.

— Não — falei e ela arregalou os belos olhos azuis — Você apenas


pagou na mesma moeda a minha infidelidade, é assim que vamos lidar com os
fatos.

— Você acredita mesmo no que acabou de dizer? Não fere nenhum


pouquinho o seu ego de macho alfa saber que fodi duas vezes com seu
advogado?

— Primeiramente, ele não é o meu advogado — pontuei — em segundo


lugar, você pode parar de falar que fodeu com ele? — Bufei irritado.

— Não vai me perguntar se ele é um bom amante?

— Não estou nem um pouco interessado no que viveu nos últimos dias
— menti — O próximo ponto do nosso acordo é o lugar onde vamos morar.

— Eu não vou voltar a morar na sua casa.

— Eu já providenciei dois apartamentos no mesmo prédio, assim não


levantaremos suspeitas.

— Ótimo! A distância de corpos é mais do que necessária... É o ponto


primordial para cumprimos esse acordo até o último minuto. — Pontuou.

— Mais alguma exigência antes de a aliança voltar ao lugar que nunca


deveria ter saído? — Indaguei com a joia na palma da mão.

— Sim! Quero que acrescente o meu sobrenome ao seu: Alexandre


Burnier Fragoso.

— Acho justo — sorri e segurei a sua mão para colocar a aliança.

— Eu mesma posso fazer isso — puxou a mão e levou a aliança até a


mão esquerda — Agora saia do meu quarto e só volte aqui quando for para me
avisar que o apartamento já está disponível.
Ainda me pergunto como eu cheguei até aqui. Eu realmente não consigo
entender o que se passou nesse quarto uma hora atrás. Desde que o imbecil do
Alexandre se retirou do quarto não fiz outra coisa a não ser pensar. De fato, no
atual contexto, não sei se ele é o imbecil ou eu quem sou.

Por que eu aceitei reatar o maldito casamento? Eu poderia ser livre, por
que aceitei manter esse faz de contas? Por que eu não consigo odiá-lo tanto
quanto antes de vê-lo aqui? Lágrimas furtivas escapam dos meus olhos quando
constato o inevitável: estou fodida!

Enxugo mais uma lágrima e levanto da cama. Não vou ficar aqui no
quarto pensando, irei à Carpe Vita. Ficar rodeada de pessoas felizes mudaria
meu atual estado de espírito.

Mal pisei os pés fora do quarto e encontrei Alexandre. Que porra ele
ainda fazia ali no hotel?

— Vai sair? — indagou olhando-me de cima a baixo. Estava usando uma


calça jeans justa e um cropped preto que deixa parte da minha barriga à mostra.

— Mal reatamos e você já quer controlar meus passos? — fechei a cara e


segui direto em direção ao elevador.

— Reatamos? — aproximou-se sorrindo.

— Você prefere que eu diga que acordamos novas cláusulas do nosso


contrato? — sorri cinicamente e encarei um casal que já aguardava o elevador.

— Não, eu prefiro que você jante comigo. Pensei que pudéssemos


conversar...

— Já conversamos o suficiente para um dia — entrei no elevador e ele


me seguiu.

— Vai jantar fora?

— Alexandre, não começa!

— Eu queria apenas passar uma noite ao seu lado — revirei os olhos. —


Estou tentando melhorar as coisas, Gabi.

— Tente novamente amanhã, agora eu vou sair.

No elevador, solicitei um Uber X, definitivamente eu precisava do meu


carro.

— Uber? Pelo amor de Deus, eu levo você.

— Não precisa.

— Posso chamar o Assis então.

— Dá um tempo, Alexandre! Não vou fugir.

— Você já fez isso uma vez... — jogou.

— Por que você é um filho da puta mentiroso, mas aparentemente já


reiniciamos o jogo com novas cartas na mesa, não foi?

— Certo, eu mereci essa. Tudo bem, só não queria que você gastasse com
um serviço que eu posso oferecer gratuitamente.
— Só não esquece que o dinheiro é meu e eu não tenho pena de gastá-lo.
Até depois.

Dei as costas e saí assim que o elevador abriu as portas. Alexandre


alcançou-me alguns passos depois e caminhou em silêncio ao meu lado até o
lado de fora do hotel. Não foi preciso olhá-lo para saber que seus olhos estavam
fixos em mim, mantive a minha atenção na tela do meu celular, conversando
com a minha quadrilha de salto alto e gloss sobre a minha despedida de casada.
Fernanda era a mais curiosa a respeito dos detalhes. Meu celular tocou e o
nome Rafa Advogado apareceu em destaque.

— Não vai atender? — Alexandre perguntou enquanto eu deixava o


celular chamar nas minhas mãos. — Gabi...

— Oi — Atendi um segundo antes de cair na caixa de mensagens.

— Oi, já está de volta ao Rio? Pensei que pudéssemos jantar.

— Estou sim, mas hoje não posso, tenho um compromisso agora a noite.

— Tudo bem, eu te ligo amanhã.

— Hum, certo, nos falamos. Beijo — desliguei.

Encarando a tela notei que o aplicativo indicava que o Uber estava


chegando. Graças a Deus. Antes que eu pudesse esperar, Alexandre segurou o
meu rosto com firmeza e beijou a minha boca. Inspirei fundo quando senti suas
mãos esquentarem todo o meu rosto, irradiando o calor para baixo. Quando
estava prestes a ceder e abrir a boca, a buzina do carro que viria me pegar soou
e eu me afastei bruscamente.

Quando entrei na Carpe Vita, meu corpo relaxou depois da tensão do dia.
A boate ainda não estava lotada, estava bem cedo para a night começar, por isso
segui para a minha sala no terceiro andar, mas antes mesmo de entrar, dei a
volta até o outro lado e abri a porta do meu sócio.

— Um dólar pelos seus pensamentos — disse assim que o vi olhando


para o teto.

— Porra, Gabi! Senti sua falta — verbalizou o que eu também sentia. Ele
aproximou-se de braços abertos e deixei meu corpo encaixar-se no seu, suas
mãos ao redor da minha cintura enquanto as minhas enlaçaram o seu pescoço,
inspirei profundamente e senti seu cheiro tão familiar. — Veio curtir a night? —
indagou soltando-me e eu contive o suspiro preso na garganta.

— Sim! — sorri — Estou liberada para ter o meu dia de rainha ou tenho
a noite de trabalho escravo?

— E o seu marido? Ou seria ex? — arqueou a sobrancelha — Você ainda


não me contou sobre seu casamento relâmpago, tampouco sobre uma tal
despedida de casada.

— Preciso de uma bebida — anunciei e encarei o meu sócio que me


indicava o sofá, enquanto ia até o frigobar e me trazia uma cerveja.

O moleque era naturalmente sexy, vestia uma calça jeans escura e uma
camisa polo branca e ainda assim conseguia chamar a atenção... Aline era
definitivamente uma mulher de sorte.

— Nós terminamos — disse antes de virar a bebida toda de uma vez. O


líquido gelado escorria em ondas para dentro do meu corpo.

— Gabi, eu já cometi muitas merdas na minha vida. Por isso eu sei que
no momento da raiva não queremos ver o outro por um bom tempo... Entendo
perfeitamente se vocês se reconciliarem.

— Você não entende, ninguém entenderia... Eu não entendo!

— Gabriela Burnier está apaixonada?

Quando eu levantei os olhos, ele me encarava e aquele azul quase verde


varreu a minha alma pelo avesso, decodificando os meus pensamentos antes
que eu mesma pudesse entendê-los.
— Não precisa me dizer nada. Sabe, Gabi, eu soube que estava
apaixonado pela Aline por acaso. Eu estava aqui na boate cantando uma música
e de repente parecia que a letra fazia sentido, que descrevia coisas que eu não
sabia que era possível sentir. Eu nunca tinha passado por situação semelhante,
logo não sabia dar nomes aos meus sentimentos.

— Outra cerveja — pedi e ele sorriu, parecendo-me mais maduro que o


irmãozinho caçula da minha melhor amiga.

— Você pode contar comigo se precisar conversar, até sobre a sua vida
sexual, sabe que aquele cara é velho demais, né? Ele não tem a minha disposição
— e com isso ele me fez gargalhar. — Podemos inclusive marcar outro ménage,
a Aline tem uma quedinha por você.

— Todos tem, desculpa aí, nasci assim — ele gargalhou também —


Talvez eu precise conversar depois. Obrigada, realmente você é a pessoa mais
parecida comigo que eu conheço, pode me auxiliar qualquer dia.

— Carpe Vita, Gabi.

— Sempre, Felipe.

Conversamos banalidades até que o Vinícius, nosso sócio minoritário,


veio chamá-lo, se surpreendendo por me ver ali. O Felipe desceu com ele para
ver algumas coisas referente ao bar, já eu peguei mais uma cerveja do frigobar
antes de descer para me movimentar entre as pessoas.

Música alta + gente bonita + álcool = Gabriela feliz.

Essa equação não dá erro nunca. Sorrir, dançar e beber está embutido no
meu DNA, é inato ao meu ser. Para me tirar do sério, tem que ter disposição, eu
geralmente ligo o foda-se e me afasto. Mas essa pessoa conseguia trazer nuvens
negras para o meu céu ensolarado.
Eu estava saindo do banheiro quando dei de cara com a criatura, desde
que a administração da boate tinha passado para as competentes mãos do
Vinícius, Bruna Moura não havia pisado na boate, mas algo tinha levado a infeliz
até ali e dessa vez, eu sabia, não era Felipe Albuquerque.

Bruna é sócia da Carpe Vita, trata-se de uma ex-foda do Felipe que se


apaixonou e quis bancar o sonho do ex-moleque, atual CEO fodão. Acontece que
ele estava apaixonado pela mãe da garota e quando tudo isso veio à tona, as
duas se afastaram de tudo e deixaram a boate nas mãos de um administrador
contratado, o Vinicius. Acontece que meu ex-atual-esposo escolheu justamente
aquela maldita boceta para comer! Tanta mulher por aí e o desgraçado escolhe
uma da qual eu não tenho a menor simpatia, nem para me ajudar no ménage o
Alexandre serve, puta que pariu!

— Oi, tenho um recado para o Alê, será que posso mandar por você? —
ela jogou quando passei por ela. Ignorei. — Gabriela, a idade tá deixando você
surda? — ela tentou mais uma vez chamar minha atenção.

O corredor dos banheiros nunca pareceu tão longo...

— Eu estou falando com você, vadia! — Bruna puxou meu braço me


fazendo virar.

Encarei-a, olhando nos olhos.

— Não sentiu falta do seu marido esses dias? Digamos que ele passou o
dia todo ocupado, no trabalho. — Ela sorriu maliciosamente.

Respira, Gabi. Não vale a pena nem gastar seu latim...

— Sabia que ele me ajudou a escolher a minha nova casa, Gabriela? —


arqueou a sobrancelha — Verdade seja dita, nós batizamos todos os cômodos
do meu novo lar. Ando pela casa e sinto como se o Alê ainda estivesse ali. Sinto o
cheiro dele...

— Cai fora, Bruna, não tô com muita paciência hoje — avisei dando as
costas mais uma vez.

— Você deve se sentir péssima né? — engoli em seco enquanto andava,


ela me seguindo de perto — Primeiro perdeu o Felipe para uma secretariazinha
qualquer, depois não consegue manter o pau do marido dentro das próprias
calças. Por que será que ninguém te quer, Gabi?

O meu silêncio parecia encorajá-la ainda mais.

— Eu sou mais jovem que você e isso deve doer aí dentro. Enquanto você
estava retocando o loiro para esconder os fios brancos, eu fodia com seu marido
no escritório dele, encarando a foto de vocês enquanto eu cavalgava.

A imagem se formou na minha mente e por mais que eu desejasse o


contrário, algo doeu em mim. Nunca fui ciumenta ou possessiva, mas da forma
como ela colocava as coisas, eu não sabia se sentia ódio, nojo ou tristeza.

— Ele gozou chamando o meu nome... Você sabe o quanto é difícil fazê-lo
gritar, né? Acho que eu consigo na próxima. Pede para trocar os lençóis da cama
amanhã, não quero foder no lugar onde você deitou.

Eu já estava prestes a me enfiar no meio das pessoas quando ela me


puxou novamente, dessa vez segurando nos meus cabelos.

Era muita afronta!

Quando eu me virei, usei o impulso do gesto para espalmar a cara dela.


Meus dedos arderam quando bateram ali com força, Bruna gritou, levando a
outra mão para puxar meus fios curtos. Enquanto ela se ocupava em saber se
meu cabelo era aplique, movimentei minhas pernas fazendo com que ela
desequilibrasse e caísse.

— Sua vadia de merda! — Sentei sobre a barriga dela que se debatia e


me arranhava os braços — sempre achei que não vale a pena brigar por homem
e isso não mudou — desferi outro tapa na cara dela — isso não é por ele, é por
ousar me agredir! — bati do outro lado — esse é por ser tão burra e baixa! —
bati novamente — Esse é só pro meu prazer!

— Eu vou prestar queixa contra você, sua puta! — Bruna gritou.

— Gabriela, solta ela! — O Felipe segurou no meu braço quando eu


estava prestes a bater novamente. — Não vale a pena, Gabi.
— As suas unhas de piranha vão ficar aqui nos meus braços. Vou
processar você e essa boate de quinta! Vou transformar a vida de vocês dois
num inferno, malditos!

— Tire ela daqui! — O chefe da segurança aproximou-se quando Felipe


indicou.

— Vamos Gabi, você precisa se acalmar.

— Eu estou calma, pode ter certeza disso. — Encarei-o.

— Tão calma que está mostrando esses maravilhosos seios sem notar?
— só então olhei para o meu estado, a vadia tinha conseguido quebrar as
correntes que ligavam o cropped ao meu pescoço.

— Pelo menos eles são bonitos — dei de ombros.

— Ah são sim, mas vamos evitar expô-los mais — Felipe tirou o blazer e
me passou.

— Isso ainda não acabou, Gabriela — Bruna gritou.

— Senhora, por favor — o segurança chamou mais uma vez a louca. —


Vou precisar contê-la?

— Não precisa, já estou de saída.

— Vou avisar que a entrada dela está proibida e vou conversar com a
Thalita para saber quais os trâmites para que eu possa me livrar, de uma vez
por todas, da família Moura Lunardelli. — Felipe anunciou.

No dia seguinte as mensagens pipocavam no meu celular. No grupo salto


alto e gloss, em especial. Minhas amigas printaram e mandaram alguns sites de
fofocas que mostravam notícias desde: "Barraco na Carpe Vita", passando por
"Socialite briga com filha de deputado" e chegando em "Alexandre Fragoso causa
briga de mulheres".

Confesso que a última chamada era a que me deixava pior. As mulheres


tendem a se odiar, se xingar e até se agredir por causa dos homens, não há
sororidade. Quando há uma traição, as mulheres geralmente defendem que o
homem age por instinto e que a amante é a puta, a vagabunda que fez o marido
cair em tentação e errar. Sempre discordei disso. Se o seu companheiro te traiu,
é dele que você deve cobrar, ele é quem te devia fidelidade e honestidade, não
sabemos nem se a mulher sabia que o cara era comprometido. Por que atirar
nela primeira pedra?

Mas há casos e casos, eu sei. Se a amante em questão fosse a sua amiga,


por exemplo, ela também estaria traindo a sua confiança, então pode meter a
mão nos dois, se quiser, mas dificilmente eu agrediria alguém. Por essas e
outras razões que detestei aquela manchete. Não foi por ele, foi por mim. A
Bruna me agrediu e me obrigou a revidar, a traição ali não era o motivador. Eu a
odiava por me tirar do eixo e me fazer chegar tão abaixo do meu nível.

Respondi as mensagens com emojis, sem dar maiores explicações, atendi


a ligação da minha mãe e disse que tudo não passava de fofocas e decidi me
manter fora das redes sociais por um dia. Quando eu entrei sob os jatos mornos
do chuveiro, minha pele ardeu. Minha nuca, braços e uma parte do meu colo
estavam vermelhos e, em alguns pontos, feridos, por causa das malditas unhas
grandes daquela desgraçada. Ensaboei-me devagar, puta da vida, até me sentir
um pouco melhor.

Sequei os cabelos no secador lentamente, buscando estragos, mas não


encontrei nada notável. De frente para o espelho de corpo inteiro, vesti calcinha
e sutiã pretos e apliquei pomada vagarosamente onde eu estava enxergando.
Alguém bateu na porta antes de eu terminar o processo, como não
interfonaram, supus ser o café da manhã que solicitei. Enrolei a toalha no meu
corpo para abrir a porta, para fechar assim que dei de cara com o Alexandre.

— Bom dia para você também — ele disse colocando o corpo no


caminho, me impedindo de fechar enquanto empurrava para dentro.
— Não estou de bom humor! — Avisei.

— Imagino. Só vim saber como você está.

— O que faz aqui tão cedo? E por que não te anunciaram?

— Estou hospedado aqui.

— Não fode!

— Só se você pedir — sorriu e eu quase o agredi. — Eu li umas notícias


hoje e...

— Não foi por sua causa.

— Não disse que era.

— Mas esse sorrisinho imbecil parece que acha isso. Tire o seu cavalinho
da chuva, eu tinha que ser muito burra pra sair no tapa por você.

— Ai, assim você me ofende.

— Ha-ha-ha — fingi ri sem o menor ânimo.

Voltei para frente do espelho, levantando os cabelos para tentar passar a


pomada na nuca.

— Deixe eu te ajudar com isso — pediu, ficando atrás de mim. Passei a


pomada para suas mãos, ele rapidamente espalhou o produto na minha nuca.
Bem devagar. — Desculpe por isso.

— Já disse que não foi por sua causa.

— Direta ou indiretamente foi sim e não me sinto feliz com nada disso,
só queria que soubesse.

— Por que ela? — perguntei encarando a mim mesma no espelho.

— Não foi intencional. Conheci a Bruna no aeroporto, ela me deu mole,


foi só isso. Qual o problema entre vocês duas?

— Ela é sócia da Carpe.

— Hum, Felipe Albuquerque — deduziu.


— Exatamente.

— Mas ele está casado... — começou.

— Você também — concluí.

— Certo, o que eu quis dizer é que ele está casado com outra mulher, por
que ela teria raiva de você?

— Não importa. Ela me disse pra te passar um recado...

— Não quero saber.

— Pediu para que ligasse para ela.

— Não vou ligar.

— Disse que...

— Gabriela, eu não tenho o menor interesse no que a Bruna falou. —


Falou incisivamente.

— Enjoa fácil, né? — ergui a sobrancelha — Vamos ver quem será a


próxima.

Ele virou meu corpo, fazendo-me ficar de frente e com o movimento a


minha toalha caiu.

— Eu disse que as coisas seriam diferentes e que eu me manteria fiel a


esse acordo. Não vou transar com ninguém, além de você.

— Quanta pretensão! — Bufei ao me afastar.

— Seu corpo grita pelo meu, eu posso ler isso em cada uma das suas
linhas.

— Eu sei calar meu corpo. É você quem precisa ser fiel, não eu.

Ele estreitou os olhos, mas não respondeu.

— Pode ir, obrigada pela ajuda.

— Vou providenciar nosso apartamento, em pouco tempo estaremos nos


mudando.
— Como o senhor meu marido quiser — ironizei, mas ele não respondeu.
Saiu bufando.

Um tempo depois bateram na minha porta novamente. Dessa vez era o


café e eu recebi de calcinha e sutiã.
A cara de raiva que me foi dirigida quase conseguia aplacar a raiva que
eu sentia. Se estivéssemos em um outro lugar, com certeza seriam os meus
punhos naquela carinha arrumada que responderia a sua pergunta.

— Você? Eu esperava encontrar o seu pai. — Rafael, o maldito advogado


que infernizava a minha vida, falou assim que eu sentei a cadeira a sua frente.

A primeira coisa que eu fiz, depois de saber que a Gabriela continuaria


casada comigo, foi pedir a minha secretária que marcasse uma reunião com o
Rafael. Mas não deixei claro que seria comigo, na verdade dei todos os indícios
que seria com meu pai, já que além de usar "Senhor Fragoso", marquei no
restaurante em que meu pai sempre escolhia.

— Algum problema em me ver? — Encarei-o.

— Problema algum — devolveu o olhar — Podemos ir direto ao ponto?


Tenho uma reunião com um cliente do outro lado da cidade.
— Não tenho a mínima vontade de ficar olhando para a sua cara mais do
que o necessário — a reação do imbecil me deixou com mais raiva, a sua boca
ergueu-se e um sorriso presunçoso estampou no seu rosto.

Antes que eu pudesse dar início a uma discussão a garçonete aproximou-


se para anotar os nossos pedidos. Rafael pediu apenas água com gás e eu uma
dose de Whisky, por mais que estivéssemos no meio da manhã e eu ainda
tivesse um apartamento para organizar, precisava de uma dose de álcool para
relaxar e não quebrar todos os dentes do homem a minha frente. Escolher um
local público foi mais uma das minhas tentativas de autocontrole.

— Então, por que agendou a reunião? Não foi para falar da empresa,
presumo. — Ele foi direto ao assunto.

— Realmente, é um pedido pessoal. Quero que acrescente o sobrenome


da minha esposa ao meu nome. Já separei a documentação necessária —
estendi a pasta com os papéis.

— Não compreendi muito bem... — Ele soltou após um tempo em


silêncio.

— Gabriela e eu decidimos que ambos deveríamos ter o sobrenome um


do outro. Como você sabe muito bem, ela já é a senhora Fragoso Burnier e,
agora, assim que você finalizar os trâmites, assinarei como Senhor
Fragoso Burnier. Quanto tempo você acha que demora isso? — Indaguei
sorrindo ao ver seu rosto perder a cor.

— Eu não sou o seu advogado particular! — Rebateu voltando à sua


postura prepotente.

— Verdade, eu jamais contrataria você para isso.

— Então, pergunto mais uma vez, por que estou aqui, Alexandre?

— Porque eu quero! — sorri. Ele abriu a boca para revidar, mas não lhe
dei tempo — Não esquece que, mesmo sob os meus protestos, você é o
advogado da minha família e a Gabriela agora faz parte dela.

— Até quando? — o sorriso presunçoso do tipo "sabe de nada, inocente"


me tirava do sério.

— Até quando o quê? — devolvi a pergunta fingindo não entender.

— Até quando a Gabi será parte da família Fragoso? — o apelido não me


passou despercebido — Não acha desnecessário realizar essa mudança, uma
vez que o seu casamento vai de mal a pior?

— Quem te disse isso? Os homens que mandou me espionar?

— Ninguém me contou. Presenciei com os meus olhos a Gabi dar uma


festa comemorando o fim do casamento — ele sorriu vitorioso.

— Não — rebati — minha esposa, e senhora Fragoso Burnier para você,


— pontuei — deu uma festa para amigos e, por um ato falho, acabou
convidando você para essa festa.

— Ato falho? — sorriu mais uma vez antes de continuar — sua esposa
cometeu pelo menos dois atos falhos comigo.

— Escuta aqui, seu advogado de merda... — rosnei e atraí a atenção das


pessoas ao nosso redor.

— Devo lembrá-lo que agressão pode acarretar em detenção? — sorriu


abertamente.

— Lembre-se que eu como réu primário, alcoolizado e marido traído


teria todas as condições para responder por essa agressão em liberdade — falei
calmamente — além disso, eu sempre posso arcar com a fiança, dinheiro não é
problema, como você sabe. Por isso, pense bem nos seus próximos passos.

— Isso é uma ameaça? — Indagou.

— Por enquanto nosso assunto está encerrado, Rafael. Faça o que eu


pedi! — Levantei e deixei-o na mesa — Cuidado onde pisa — avisei e saí,
deixando a conta para ele pagar.
Nos dias que se seguiram, me empenhei ao máximo para deixar pronto o
novo lugar em que Gabriela e eu moraríamos. Reuni toda uma equipe
multidisciplinar para deixar o apartamento com cara de lar, eu queria que ela se
sentisse, literalmente, em casa no novo apartamento. E para isso eu contei com
o auxílio da sua mãe, que foi muito simpática ao telefone e fez questão de me
enviar fotos do apartamento da filha em São Paulo, além de me contar vários
detalhes que a agradariam.

Escolhi um condomínio de luxo em Ipanema de frente para o mar, o


prédio continha apenas dois apartamentos por andar, um dos motivos que me
fez escolhê-lo dentre todos os outros do catálogo da imobiliária. Morando no
mesmo prédio, e sendo os únicos do andar, não levantaríamos suspeitas, já que
ela provavelmente insistiria na separação de corpos. Eu precisava me redimir e
aceitaria qualquer condição para que ela não acabasse com o nosso acordo.
Além disso, contava em ganhar de bônus um sorriso dela quando visse a vista
da varanda.

O apartamento que ela ficaria foi totalmente redecorado, seguindo a


linha do seu apartamento em São Paulo, que possui ambiente vibrante e móveis
mais despojados. Foi o que a arquiteta disse ao ver as imagens que a minha
querida sogra me enviou. A partir dessas fotos, eu pude conhecer um pouco
mais da Gabriela, para falar a verdade, além do temperamento e do sexo, eu não
conhecia a minha esposa.

Sua sala tinha apenas um sofá enorme e vermelho que contrastava com
as paredes totalmente brancas, bem como com o painel de TV, igualmente claro.
No quarto, havia uma cama King Size e a parede mais distante era
completamente revestida por um espelho, o que revelava um pouco da
personalidade dela: Gabriela era uma mulher forte, autêntica e sem falsa
modéstia, sabe que é bonita e não sente a menor vergonha disso. Tentei
reproduzir o espaço, mas evitando que ficasse parecido com uma cópia barata,
apenas a inspiração foi trazida, o ambiente ficou diferente do anterior. Seguindo
as dicas da mãe da minha esposa, providenciei um closet enorme e um banheiro
igualmente grande: com jacuzzi e penteadeira.

Havia ainda no apartamento antigo, uma espécie de escritório. Não sei se


poderia chamar o espaço de escritório, embora observasse uma escrivaninha
com cadeira reclinável, uma estante com livros e muitos porta-retratos. O lugar
estava mais para um santuário da sua própria vida e das pessoas que lhe eram
especiais, havia fotos suas mais jovem e outras dezenas de fotos com outras
pessoas, em viagens e festas. Além disso, se via Fernanda Albuquerque em
diversos momentos, com mais duas pessoas, além da Gabriela. Era um quarteto
e tanto, quatro mulheres de tirar o fôlego.

Era como se eu estivesse tendo acesso a uma Gabriela que ninguém


conhecia. A mulher moleca que guardava fotos de adolescente e as expunha sem
vergonha da garota que foi. Foi vendo o vídeo daquele cômodo, que tive uma
ideia. E decidi colocá-la em prática imediatamente.

Precisei apelar e usar a influência da Fernanda, grande aliada, para


juntar todos nessa noite. Um jatinho fora alugado por mim para que eles se
deslocassem com mais rapidez. Queria, desde já, construir boas recordações do
nosso recomeço. Reiniciar com o pé direito.

Não contei para a Gabriela que os apartamentos já estavam prontos, a


noite toda seria uma surpresa. Respirei fundo antes de bater no quarto de hotel,
ao meu lado. Mesmo morando na minha casa, mantive o quarto ao lado do dela
alugado. Nunca se sabe quando poderia precisar e ficar de olho nunca era
demais. Ela já fugiu uma vez.

— Você? — Encarou-me de cima a baixo. Vi seu olhar percorrer meu


corpo, estava vestindo uma calça de sarja preta e uma camisa de botão azul
claro, dobrada até o antebraço.

— Esperava outra pessoa? — indaguei preocupado.

— Não é da sua conta — rebateu e deu de costas deixando-me para trás.


Segui quarto adentro.

— Vim te convidar para conhecer seu novo endereço.

— Não precisava. Bastava enviar a localização por mensagem. — falou


de braços cruzados.

— Eu queria que víssemos juntos o ambiente — ela estreitou os olhos —


Quero saber se preciso modificar alguma coisa no espaço.

— E decidiu fazer isso agora a noite? Não poderia esperar para amanhã?

— Não. Assim que informaram que tudo estava pronto corri para te
avisar — menti — Estou curioso para saber se ao menos uma vez eu acertei
com você.

— Tem um closet dessa vez?

— Um enorme e uma banheira de hidromassagem na suíte — sorri —


Não quer testar a banheira? — Ergui a sobrancelha.

— Não com você! — devolveu

— Ok, eu posso apenas te observar — pisquei e ela revirou os olhos.

— Eu estava de saída... — Só nesse momento notei que ela estava usando


um vestido verde, com mangas, bem discreto, por sinal... — Mas eu remarco o
compromisso. Vamos, já estou cansada desse hotel e de ter você como
carcereiro.

— Você não faz ideia das maneiras das quais imagino te manter presa...
— joguei.

— Vai sonhando... — ela pegou a bolsa e seguimos para Ipanema.

Fizemos o trajeto em silêncio. Eu concentrado no trânsito e Gabriela no


celular em suas mãos. Quando parei o carro em frente ao condomínio, ela
ergueu os olhos para conferir onde estávamos.

— Chegamos! — anunciei — A vista durante o dia é deslumbrante.


Moraremos de frente para o mar — ela fitou-me longamente e compreendi a
expressão na sua cara — Em apartamentos separados, é óbvio.

— Vamos logo acabar com isso! — desceu do carro antes que eu pudesse
abrir a porta.

O elevador privativo parou na cobertura, as portas foram abertas e nós


seguimos para o lado dela. Inseri a chave na maçaneta e abri a porta devagar, as
luzes que estavam apagadas, se acenderam e a Gabriela ficou parada, em
choque, quando as vozes gritaram:

— SURPRESA!

Ela olhou de mim, para as pessoas à sua frente. Eles conseguiram


pendurar um cartaz escrito à mão "Chá de Casa Nova" e diversos balões em
formato de coração, na sala de estar.

— O que significa isso? — Indagou sem conter o sorriso.

— Que suas amigas resolveram comemorar o nosso recomeço —


respondi sorrindo.

— Suas vadias, vocês não me contaram nada! — Voltou-se para as


amigas e foi engolida num abraço coletivo.

Afastei-me delas e segui os homens, que se dirigiram para a varanda. O


Marcos conduzia João e Emerson que conversavam animadamente sobre
futebol.

— Chegou o sem mundial! — O Marcos perturbou assim que me viu,


fazendo referência ao meu time do coração que nunca havia conquistado o
Mundial de clubes.

— Boa noite para você também, Marcos! — sorri — Tudo bem com
vocês? O Marcos foi um bom anfitrião? — indaguei para João Pedro, marido da
Soraia, e Emerson, marido da Lú.

— Claro que fui, até servi o Whisky mais caro que encontrei — meu
amigo respondeu erguendo a garrafa.

— Como você é o mais novo do clã dos maridos da quadrilha do salto alto
e gloss, aconselho a sentar e relaxar. Porque aquelas ali quando se reúnem
esquecem completamente que existimos — Emerson disse sorrindo e estendeu-
me um copo com Whisky.

— A Fernanda estava eufórica com esse encontro, tanto que nem se


incomodou por eu ter escolhido a camisa da Lusa para usar. — Marcos
confessou sorrindo.

— A Sol então... — João Pedro, concordou — ela cancelou as reuniões de


amanhã pela manhã, porque não queria sair correndo para a Luxúria.

— Eu, como o membro mais velho do clã, devo salientar que a Sol não é
de cancelar reuniões — Emerson disse e o João Pedro confirmou com balançar
de cabeça — e para a Fernanda ter deixado o Marcos vir com camisa de time é
porque elas estavam em um nível de agitação alto pra caralho! — Marcos
gargalhou em concordância — Portanto, se preparem porque hoje é capaz de
dormirmos sozinhos, já que elas não vão se desgrudar nem para dormir —
completou gargalhando.

— Elas são tão grudadas assim? Aliás como surgiu o nome "quadrilha de
salto alto e gloss"? — Perguntei realmente curioso.

— Se elas são grudadas? — Emerson sorriu — Para você ter ideia: a


Fernanda já quebrou o nariz do ex-noivo da Sol — Marcos abriu um enorme
sorriso de orgulho da sua mulher.

— E a Sol já fingiu ser a Gabriela para ela poder fugir da casa dos pais
durante a noite — João confessou sorrindo.

— Isso são apenas os fatos que elas nos contam, por isso o termo
quadrilha, não me surpreenderia se me dissessem que já roubaram um banco.
Essas quatro juntas são capazes de tudo! — Meu amigo completou com um
sorriso.

— Eu não sei se devo ficar com medo ou orgulhoso da quadrilha... —


Soltei após virar a minha dose de Whisky. Acompanhei os caras trocarem um
olhar cúmplice e em seguida gargalharem.

Eles tinham razão, elas não se desgrudaram nenhum minuto.


Gargalhadas e frases aleatórias eram ouvidas vindo da sala e nenhum dos
homens ousou levantar para interromper a reunião das amigas. Vez ou outra eu
lançava um olhar para dentro e via Gabriela com um enorme sorriso nos lábios
gesticulando e sorrindo. Involuntariamente eu sorria junto com ela, era bom vê-
la feliz.

Muitas taças de champanhe e vinho tinto foram secadas e num


determinado momento, depois dos mais diversos assuntos, enquanto
escutávamos Marcos falar todo bobo da Mari e das suas últimas artimanhas, a
voz da Fernanda me assustou:

— Finalmente você deu uma dentro! — ela me lançou um olhar sério e


reprovador.

— Pega leve, amor — Marcos interviu, mas ela lançou para ele um olhar
cortante e como prevendo tempestade, Emerson e o João saíram de fininho.

— Eu mereço ouvir isso — falei.

— Isso e muito mais — ela completou — Gabriela é muito importante


para mim e espero que você não a faça sofrer novamente, pois você não vai
gostar de me ganhar como inimiga! — Encarou-me.

— Fernanda... — Marcos avisou.

— Eu me esforçarei para fazê-la feliz — fitei seus olhos claros e torci que
ela visse verdade no meu olhar.

— Gestos, Alexandre! Nós mulheres valorizamos muito mais os gestos


que as palavras.

— O recado foi dado, amor — Marcos interveio — o Alexandre já


entendeu muito bem o que é a quadrilha de salto alto e gloss!

— Algum problema aqui? — Gabriela indagou, encarando-me.

— Nenhum — Fernanda sorriu — Vamos comer, estou com fome! —


Segurando na mão da amiga, afastou-se como se não tivesse acabado de me
ameaçar.

— Essa foi por pouco — Marcos soltou o ar — Vamos jantar, antes que o
resto da quadrilha venha te intimar também.

O buffet que contratei para preparar o jantar acertou em cheio no


cardápio. Uma entrada leve com uma salada de rúcula e de prato principal um
salmão ao forno, batatas e arroz branco, com um bom vinho para acompanhar.

O clima permaneceu leve e divertido durante a refeição, todos


dispensaram a sobremesa para continuar bebendo o que mais lhe agradasse.
Sem garçons, aumentamos a música para curtir um momento que me parecia
familiar demais. E por dois segundos, me remeteu a outros tempos. Antes que as
lembranças viessem, fui a cozinha pegar alguns tira-gostos, em pouco tempo eu
já me sentia completamente incluso no clã dos maridos da quadrilha.

Já era fim de noite quando Fernanda e Marcos se despediram, pois, o


horário da babá de Mari estava chegando ao fim. Restando apenas Sol e João
Pedro, Emerson e Lú que logo mais estariam embarcando de volta para São
Paulo. Deixei o jatinho alugado pelo dia seguinte, para que eles decidissem o
melhor momento para voltar para casa. A Gabriela sorria mais essa noite do que
eu pude presenciar no último mês, estava estupidamente feliz e ainda mais
linda. Algo em vê-la bem, me deixou ainda mais feliz naquela noite.

A campainha tocou, já de madrugada, e a Gabriela me encarou em


expectativa, por um momento me perdi no brilho dos seus olhos azuis tão
claros.

— Casal, a campainha! — Lú interrompeu nossa troca de olhares e a


campainha soou mais uma vez.

— Você está esperando alguém? — Gabriela indagou sorrindo.


— Acredito que você vá gostar do convidado! — segurei sua mão e
seguimos até a porta. Na verdade, ela ia gostar até demais, mas era um sacrifício
válido, por um bem maior.

Eu esperava dar de cara com olhos claros, mas foram olhos castanhos e
cabelos longos, pretos e lisos que nos receberam. Era uma mulher muito bonita
e encarava a Gabriela com um sorriso.

— Não vai me convidar para entrar?

— Aline! Que surpresa, entre — Gabriela a abraçou — Alexandre, essa é


a Aline, esposa do Felipe.

— Muito prazer — trocamos dois beijos no rosto e abri espaço para ela
entrar.

— Aliás, cadê o meu querido sócio? — minha esposa perguntou.

— Saudades minhas, Gabi?

Como mágica, ele apareceu antes que eu pudesse fechar a porta.

— Sempre! — minha esposa se jogou nos braços dele, que segurava uma
garrafa, mas a amparou com o braço livre.

— Felipe — cumprimentei com um aceno.

— Alexandre, tudo bem cara? Trouxe Chandon — ele me estendeu a


garrafa e eu precisei deixá-los para guardá-la na geladeira.

— Que bom ver vocês, meu casal preferido... — consegui ouvir da


Gabriela antes de me afastar.

Convidar Felipe Albuquerque era o Xeque-mate. Qual a maneira mais


clara de mostrar para ela, que me achava um babaca-machista-ciumento, do que
chamar para o nosso recomeço uma das sua ex-fodas? Não que ela tivesse me
contado sobre isso, mas a química e intimidade entre os dois era forte demais
para que nunca tivesse rolado nada ali. Entre as minhas opções, era melhor ter
o Felipe por perto do que o Rafael, o Albuquerque mais novo ainda trouxe de
brinde a esposa. Que por sinal era uma mulher linda, do tipo que entraria na
minha agenda de fodas, antigamente.

Calma, não é que eu tenha me aposentado, mas eu tentaria cumprir


minha promessa enquanto nosso acordo estivesse de pé, fazer a Gabriela
esquecer a Bruna não era uma tarefa fácil e se tornou ainda mais difícil depois
que as duas saíram no tapa. Às vezes me pergunto como consegui transformar
minha vida nessa confusão em tão pouco tempo.

Depois de colocar a garrafa para gelar e ir ao banheiro, voltei para a sala


para encontrar Sol, João Pedro, Lú e Emerson me aguardando para se
despedirem.

— Mas já? — perguntei ao abraçar as meninas e apertar as mãos dos


rapazes.

— Acho que cheguei tarde demais para a festa — Felipe disse ao abraçar
as amigas da irmã. — Saí da Carpe o mais rápido que pude.

— E ainda atrasamos porque pegamos trânsito — a esposa completou a


justificativa.

— Ah, mas vocês não vão agora! A noite é uma criança — Gabriela
anunciou e Felipe olhou maldosamente para ela. Que cara de pau, na frente da
esposa!

— Alexandre, voltaremos a São Paulo perto da hora do almoço, tudo


bem? — Soraia perguntou.

— Vou avisar ao piloto, fiquem tranquilos. Peço para o motorista


deixarem vocês no hotel.

— Não precisa, pedimos um carro enquanto você estava lá dentro — Lú


avisou.

— Obrigada por virem, vocês são as melhores amigas do mundo! —


Gabriela abraçou as duas de uma só vez.

— Deixa só a Fernanda saber disso... — Soraia brincou. Todos


gargalharam.
— Qualquer coisa, grita — Sol disse baixinho, mas eu pude ler os seus
lábios, antes de a Gabriela assentir e fechar a porta.

No novo apartamento da minha esposa restaram apenas dois


convidados: Felipe e a esposa. Tinha tudo para que eu achasse uma droga,
principalmente os sorrisos e a intimidade entre tal homem e a minha esposa,
mas inacreditavelmente a noite deu uma virada. Em tempo recorde, nós
secamos a garrafa que o Felipe trouxe mesmo sem estar totalmente gelada. A
Gabriela estava rindo muito das histórias que o Felipe estava contando sobre as
brigas na boate.

— Eu vou fazer xixi na roupa — gargalhou, me fazendo rir junto. —


Preciso ir ao banheiro, mas nem sei onde fica — riu ainda mais.

— Eu te levo — ajudei-a a chegar a suíte e fui até o banheiro social, para


tentar me livrar da quantidade de bebida que preenchia minha bexiga. Não
estava bêbado, longe disso, mas algo diferente me esquentava. Lavei o rosto na
pia e o sequei encarando o espelho. Eu me sentia bem, alegre até. Para essa
noite acabar melhor, só estando sobre o corpo da Gabriela.

Quando voltei à sala, a atmosfera tinha mudado. A música estava


ajudando, entre a minha seleção para noite, estavam músicas sexys que eu
pretendia usar no final, quando estivesse a sós com a Gabriela. E era uma delas
que estava tocando: Earned It, do cantor The Weeknd.

A Gabriela se movia no meio da sala, como se estivesse sozinha ou se


apresentando para alguém com quem foderia. Mãos passando pelo corpo,
lentamente, olhos fechados e lábios entreabertos, sussurrando a canção. Meu
pau reagiu de imediato e ainda distante eu notei que o Felipe e a Aline assistiam
ao showzinho particular. Senti um misto de irritação e excitação. A dança não
era para mim, o que me deixou puto, mas igualmente de pau duro por ver que a
esposa do seu sócio via tudo aquilo e não parecia se incomodar.

Na verdade, ela aceitou o convite da minha esposa, que estendeu as


mãos, e se juntou a ela na dança. Olhando uma para a outra, elas sorriram alto,
com certeza sob efeito do álcool. Dançaram sem se tocar, mas ainda assim era
excitante e o espectador sortudo, mantinha os olhos vidrados nas duas.

Eu assistia a cena sem ter sido convidado, mas já imaginava as duas


juntas, sendo fodidas por mim. Será que a Gabriela toparia? Como se sentisse
que havia mais alguém, Aline ergueu o olhar e me viu espiando. Notei seu rosto
esquentar. A Aline tocou a Gabriela, fazendo-a parar e sorriu avisando que
precisava ir embora.

Aproveitei o momento para me aproximar, sem sequer olhar para o


homem que provavelmente ostentava uma ereção tão dura quanto a minha,
ninguém ficaria imune àquelas duas.

— Ainda está cedo, adoraria ter vocês aqui por mais tempo — Gabriela
disse.

— Fica para a próxima, tenho que estar com Gui daqui há poucas horas
— Aline falou numa voz rouca.

— Vamos marcar alguma coisa, sair da rotina... — minha esposa disse e


eu quase pude sentir o duplo sentido daquilo. Será?

— Porra, Gabi! — Foi o que Felipe respondeu, fazendo Aline gargalhar.

— Até a próxima — Aline se despediu.

— Até — sorri, quando os levamos até o elevador.

Quando as portas de aço se fecharam, olhei para a Gabriela que me


encarava:

— Enfim, sós.
Quando o Alexandre fechou a porta, depois que o Felipe Albuquerque
saiu, meu corpo já estava em chamas. Minha pele ardia, talvez pelo desejo
contido, talvez pela dancinha para o meu casal favorito, talvez pelo que viria a
seguir. Eu não queria pensar, tampouco diminuir a temperatura do meu corpo.

Hic et nunc.

Não esperei que o Alexandre tomasse a iniciativa, ele o faria, com toda
certeza, mas dois segundos após o "enfim sós", joguei meu corpo contra o dele.
Minha boca faminta devorou a dele, sem calma, em total desespero.

Imediatamente, ele jogou meu corpo contra a porta e impôs sua língua
em minha boca, numa batalha quente e molhada. Era difícil para eu assumir,
mas meu corpo sentia falta dele. Da mão forte que agora apertava a minha
bunda sobre o vestido, do pau maravilhoso que eu sentia contra minha barriga
e daquela boca me chupando. Ah, sim, se ser bom com oral fosse pré-requisito
para marido do ano, o meu, com certeza teria um troféu.
Minhas mãos se esgueiraram por baixo da sua camisa polo, sentindo
cada gomo do seu abdômen definido. O desespero já me dominava e eu queria
ser possuída por ele naquele segundo. O calor que emanava dele não era
diferente do meu, Alexandre também parecia ferver.

Rapidamente, levei minha mão para o botão da sua calça, abrindo e


enfiando minha mão no espaço vago. Abaixei o suficiente para libertar sua
ereção e comecei a masturbá-lo de maneira firme e rápida, mas não pude
continuar por muito tempo, com impulso ele levantou meu corpo e eu prendi
minhas pernas ao redor de sua cintura, alguns segundos e uma calcinha
afastada depois, seu pau entrou inteiro dentro de mim.

Eu gritei, puxei seu cabelo com força e mordi seu pescoço, quando saiu e
me tocou fundo novamente. Ele entrou e saiu diversas vezes, sem dó, até que se
afastou da porta e andou até o sofá, me fazendo deitar, sem sair de dentro de
mim.

Bruscamente, ele tirou meu vestido, jogando-o longe e me deixando


vestida no meu sutiã rendado verde claro. Sobre o tecido, ele me provocou com
mordidas no bico duro, sugando em seguida, deixando a peça molhada e ainda
mais aderente. Entre metidas ritmadas, sutiã babado e o som da sua respiração
acelerada, eu me perdi sem saber onde estava ou para onde queria ir.

Quando ele gemeu meu nome, sua voz me trouxe um segundo de lucidez.
O que me fez jogá-lo no chão, para trocarmos de posição. Agora, eu estava no
controle. Fiquei de pé e me livrei da calcinha ensopada e do sutiã, encarando
seus olhos claros de maneira firme. Rastejei sobre seu corpo até que minha
boceta estivesse na sua cara. Ele sorriu ao me ter aberta perto da sua boca, mas
antes que ele pudesse falar qualquer coisa, desci meu corpo sobre sua boca e
rebolei.

— Eu quero gozar na sua língua! — Senti seu sorriso através da minha


carne molhada. E fechei os olhos quando ele começou a trabalhar.

Pude comprovar, mais uma vez, que ele era ótimo naquilo. Sua língua me
fodia maravilhosamente bem. Seus lábios chupavam meu clitóris de maneira
que me prendia e me fazia querer correr, era torturante e deliciosamente
perverso. Quando ele libertou meu ponto pulsante, enfiou um dedo dentro de
mim e em conjunto com a língua, me fez gemer. Eu rebolava feito louca, me
entregando a mais primitiva forma de prazer. Quando eu gozei, gritei alto e
estremeci.

Com as minhas pernas trêmulas, ele não encontrou esforço para me


colocar deitada no chão e se encaixar novamente. Mas algo ali não estava certo,
e quando seu pau deslizou para dentro de mim eu soube o que era.

— Preservativo! — Eu gemi.

— Gabriela... — Ele pediu.

— Alexandre, não faça eu me arrepender.

— Eu gozo fora, prometo.

— Estou te dando um voto de confiança...

Ele levantou as minhas pernas, posicionando-as uma em cada ombro e


entrou fundo. Rapidamente, ele me fodeu forte e me fez delirar de prazer. Ele
achava, com uma facilidade absurda, o ponto certo dentro de mim e investia
contra ele de maneira rude. O que me faz explodir em um novo orgasmo. Gritei
um gigante "ah" para não chamar o seu nome. Ele arremeteu mais algumas
vezes antes de sair e gozar na própria barriga, cumprindo a sua promessa.

— Acho que você gostou do apartamento — constatou deitado no chão.

— Eu ainda nem analisei os cômodos — respondi enquanto aguardava


minha respiração se normalizar. — Mas gostei muito da surpresa, trazer minhas
amigas foi muito inteligente da sua parte.

— Obrigado por valorizar meu cérebro, além do meu corpo.

— É uma raridade você usá-lo, mas quando o faz, me surpreende.

— Não sei se isso pode ser considerado um elogio... — refletiu.

— A escolha é sua.
— Eu escolho te foder novamente — Ele puxou o meu tornozelo.

— Você está todo gozado, devia tomar um banho antes de pensar em


qualquer outra coisa.

— Eu não quero pensar, quero foder! — Puxou-me ainda mais, até meus
seios ficarem da altura do seu rosto — E quando eu gozar na sua boca, vai
esquecer completamente esse nojinho repentino e vai amar engolir cada gota.

Ele estava certo, exceto pelo fato de eu estar com nojo. Esperma não me
enoja, já pedi várias vezes para gozarem em várias partes do meu corpo,
inclusive na boca... O que eu estava tentando fazer, era afastar a atmosfera de
luxúria enquanto eu estava saciada, se ele tivesse ido tomar um banho, eu
voltaria a dominar meu corpo e o enxotaria do meu apartamento. Mas as
palavras sujas conseguiram me acender de novo. Eu já sentia a temperatura se
elevar antes mesmo de ele me fazer deitar sobre ele, me sujando de porra, ao
me posicionar para um 69.

Não sabia que horas eram quando meu sono resolveu cessar. Por incrível
que pareça, não acordei com uma ressaca daquelas. Estava com um pouquinho
de dor de cabeça, por causa da mistura alcoólica, mas nada exorbitante. Quando
abri os olhos, me senti em casa. O quarto, agora eu podia ver, lembrava muito o
do meu apartamento em São Paulo. Dessa vez, o Alexandre tinha marcado um
ponto. Na verdade, mais de um. Trazer minhas amigas também foi um golpe de
mestre.

Virei de lado para admirar seu corpo estendido nos lençóis macios da
minha cama. Seus olhos fechados escondiam a malícia que ali sempre estava, a
boca estava relaxada e entreaberta, quase tive vontade de colocar a língua ali. A
barba, sempre por fazer, o deixava um pouco mais mortal, sem ela o Alexandre
não pareceria real. O homem é de tirar o fôlego, feito para o pecado e já me
causou, em poucos meses, mais estresse do que qualquer outro ser do sexo
masculino em todos os anos da minha vida. Por isso, ignoro seu glorioso
abdômen, suas coxas torneadas e seu pau que descansa pesadamente e o
acordo.

— Alexandre... — chamei em tom normal. — Alexandre! — aumentei um


pouquinho o volume da minha voz, mas ele permanecia imóvel — Alexa... —
empurrei seu peito com as minhas mãos, mas ele as segurou e me puxou para si.

— Existem maneiras mais eficazes de me acordar... — Conduziu a minha


mão, guiando-a até seu pau.

— Se eu quisesse, te faria gozar sem nem acordar, mas não era o que eu
pretendia. Tá na hora de você ir — anuncio, esquivando minha mão.

— Então já acabou os privilégios das surpresas de ontem? — ergueu


uma das sobrancelhas.

— Com certeza. Eu fiquei feliz, bebi e quis te dar. Fim! Agora, levanta e
cai fora.

— Isso é tudo que eu sempre gostei de ouvir, exceto da minha esposa.


Nem um café da manhã, querida?

— A não ser que você levante e faça, querido. Que horas são? —
perguntei sentando na cama, completamente nua, o que era comum, mas o
olhar dele me lembrou da noite anterior. — Meu rosto é aqui, querido.

— Case-se com uma mulher com os peitos de Gabriela Burnier — ele


sorriu e me olhou nos olhos — Sinto muito, não cozinho, mas podemos sair pra
comer alguma coisa ou pedir. — Ele alcançou o celular — São onze e quarenta,
acho que deveríamos almoçar.

— Dormi demais — caí de costas na cama novamente — mas estou


morrendo de fome.

— Preciso retornar uma ligação — estávamos tão à vontade que aquilo


me assustou. Será que os casamentos reais são assim? — Oi mãe... Tá tudo
ótimo... A Gabriela também está bem, acabamos de acordar. Hum... Ela quer falar
com você — disse ao me estender o aparelho.

— Oi Vilma, como a senhora está?

— Gabriela, que felicidade escutar a sua voz. Não nos vimos desde o
aniversário do Alexandre, estou com saudades!

— Desculpe, precisei viajar uns dias para visitar minha mãe — menti e
fuzilei o Alexandre com o olhar, ele deu de ombros — Mas logo faremos uma
visita, não é querido?

— O Alex tem um almoço de negócios, podemos almoçar juntas hoje. Até


estranhei meu filho não estar trabalhando...

— Hum, perdemos a hora, a senhora sabe como é... Almoçar? — ergui as


sobrancelhas para o Alê, que assentiu — Claro, passamos para pegar a senhora
às 12h?

— Está ótimo, até já! — Ela desligou.

— Almoço em família, Uhu! — fingi empolgação — Mais um dia de


mentiras.

— Gabriela... — ignorei o chamado e fui tomar banho.

Ele não solicitou o motorista e estranhei. Mas, pensando bem... Não sabia
como estava a vida dele. Seguíamos em silêncio ao encontro da sua mãe
enquanto eu me perguntava onde estavam seus empregados e se ele teria
vendido ou alugado sua mansão... Com um "isso não é problema meu" desviei a
atenção para o meu celular. No grupo da quadrilha, as fotos da noite anterior
estavam bombando, salvei algumas e postei somente a que tinha nós quatro,
sob a legenda "Se ela sozinha já é um perigo, imagina com as amigas... ". Meu
sorriso estava enorme e verdadeiro nesse registro.

O aparelho bipou, anunciando a chegada de uma nova mensagem. Era o


Rafael:

Gabriela, podemos jantar hoje?

Tudo que eu não queria era estar entre dois caras numa guerra de xixi,
mas eu precisava dar um jeito nas coisas. Odiava ter que mentir, mas não tinha
como falar a verdade quando nem eu mesma sabia qual era. Por isso, enviei:

Sim, precisamos conversar...

Ele enviou no minuto seguinte:

Restaurante ou minha casa?

No meu apartamento, vou te mandar a localização. Nos vemos a


noite.

Eu queria o quanto antes resolver mais esse dilema que eu havia me


envolvido.

Até mais tarde, um beijo.

Outro.

Guardei o aparelho no mesmo instante em que Alexandre reduziu a


velocidade até parar na guarita de um condomínio de luxo. Eu não esperava
menos de alguém com uma corretora que rende milhões. A nossa entrada foi
liberada e ele estacionou em frente a uma casa com uma cerca viva, verde e alta,
mas que não escondia a mansão que se engrandecia em apenas um andar. O
muro de plantas dava um ar de "sinta-se em casa" em meio a todas aquelas
mansões deslumbrantes.

A mãe dele estava à nossa espera e se aproximou assim que nos viu
parar o carro. Mesmo assim, senti-me na obrigação de sair do carro para
recebê-la.

— Essa cerca viva é linda! — digo ao abrir a porta, mas antes que eu
pudesse continuar elogiando, ela me envolveu em um abraço carinhoso.

— Você não sabe o quanto estou feliz em vê-la novamente... — disse ao


se afastar, olhando em meus olhos.

Eu não conseguia entender como uma mãe amorosa obriga seu filho a
casar e procriar.

— Ela não iria a lugar algum, mãe — Alexandre se aproximou dando o


rosto para ela beijar. — Podemos ir? — Ela assentiu e entramos no carro.

— Eu tentei ligar para você, filha, mas não consegui.

— Hum, é... Eu precisei trocar de número, anote o novo — ditei enquanto


ela digitava no seu aparelho — pode me ligar quando precisar.

— Não é uma questão de precisar, é de querer. Você me deve umas


compras!

Esse era um território que eu dominava.

— Quando a senhora quiser.

— Eu envelheço trinta anos quando você me chama de senhora.

— Desculpe, Vilma. Quando você quiser.

— Ela faz esse drama com todo mundo, é só dizer que ela não parece ser
minha mãe que tudo fica bem! — Ele fez a mãe sorrir.

— Achei que estivesse na empresa hoje, a culpa é sua por seu pai me
deixar sozinha para almoçar?

— Deve ser da Odete — ele acusou sorrindo — não sinta ciúmes, mãe!
— Não sinto, sou uma mulher segura e sei todas as senhas do seu pai —
eu gargalhei alto — Aprenda Gabriela, manter um Fragoso na linha no começo é
difícil, mas vale a pena.

Ignorei a pontada no meu coração, ela não fazia ideia das dificuldades.

O almoço foi tranquilo, o restaurante italiano me permitiu comer Nhoque


light, com ricota e espinafre. Havia exagerado na noite anterior e, há um tempo,
estou sem treinar e meu corpo belo e maravilhoso não é mantido com altas
ingestões de calorias. O Alexandre flertou, é claro, dizendo que eu não precisava
fazer dieta, pois estava linda. E a mãe dele, babou pelo filho "apaixonado". Nossa
farsa durou até que deixássemos minha pseudosogra em casa, assim que
voltamos para o apartamento eu tratei de despachá-lo.

Olhando-me no espelho, liguei para o Daniel para convocá-lo para voltar


a ser meu personal. Ele aceitou e eu fiquei aliviada, agora que estava
devidamente instalada não precisaria discutir com o meu pseudomarido.
Lembrando do jantar, mandei a localização do apartamento para o Rafael e me
coloquei a trabalhar. Parecia que minha vida estava voltando a ser minha, afinal.

De casa, usei meu notebook para checar os e-mails e planejar as


divulgações da Carpe, liguei para o meu sócio e marquei uma reunião para
apresentar as ideias e saber o que ele tinha em mente. Quando desliguei tudo,
eram quase sete horas da noite e eu não havia sequer tomado banho, por isso
decidi que proporia ao Rafael que fôssemos a um restaurante.

Estava secando meus cabelos quando o interfone tocou, autorizei a


subida e tive tempo apenas de me vestir num roupão quando a campainha soou.
Ele me olhou dos pés à cabeça e um sorriso lento se espalhou.

— Isso é o que chamo de ser bem recebido.

— Entre — abri espaço — Estive trabalhando durante a tarde e acho


que, para não atrasar mais, deveríamos sair para jantar.

— Ou podemos esquecer o jantar e comer outra coisa — insinuou e esse


era um jogo que eu adoraria jogar, mas as cartas estavam embaralhadas na
minha mão.

— Dessa vez estou realmente com fome de comida, pode sentar —


apontei para o sofá vermelho, semelhante ao do meu Ap.

— Tenho uma coisa para você — me entregou uma pasta preta — Abra.

Eu abri e me deparei com a maldita certidão de casamento, só que dessa


vez não era só o meu nome que estava diferente, meu sobrenome estava
atrelado ao nome do Alexandre. O sorriso de um ponto marcado surgiu no meu
rosto.

— Então é verdade? — A cara de incredulidade do Rafael no meu campo


de visão fez eu conter o sorriso que insistia em marcar meus lábios — Vocês
estão juntos depois de dar uma festa para comemorar a separação? Que
brincadeira vocês estiveram fazendo comigo, Gabriela? — indagou bravo.

— Eu não brinquei com você...

— Ah, brincou — sorriu — Gostou e até gozou!

— Se é assim que essa conversa vai seguir, é melhor acabar por aqui.

— Você me confundiu com um vibrador? Que você usa para um orgasmo


e depois joga na gaveta? Sabe quanto pode me custar esse seu jogo?

— Rafael — respirei fundo e me aproximei, pronta para mentir — Foi


um momento de fraqueza, eu tinha brigado com o Alexandre e você apareceu
para me salvar no momento exato.

Ele também se aproximou e tocou meu queixo, olhando no fundo dos


meus olhos em busca de algo que eu sabia que ele veria: a mentira.

— Fico feliz que não se arrependa, mas... — ele aproximou o rosto um


pouco mais, mas as suas palavras e seus gestos foram interrompidos quando a
porta do meu apartamento se abriu bruscamente.
— Que porra está acontecendo aqui?

Agora o circo estava armado.


Estar dentro dela, definitivamente, era glorioso. Nunca houve dúvidas
quanto a nossa química sexual, cada vez que minhas mãos encontravam aquele
corpo o incêndio era certo. E nós quase colocamos fogo no novo apartamento,
batizar a sala de estar foi o ponto alto da madrugada.

Parecia que a sorte estava mesmo ao meu favor, as ligações da minha


mãe terminaram em um almoço, o que para mim significava reafirmar nossa
relação. Independente das jogadas que o Rafael pudesse armar, ter a minha mãe
ao meu lado era fundamental e esse almoço serviu para fortalecer a ideia de um
casamento feliz. Eu tinha chegado até ali e iria até o fim.

Depois da madrugada de foder e do almoço, achei que a Gabriela fosse


baixar a guarda, mas as suas defesas se ergueram assim que voltamos e ela me
expulsou do apartamento.

De volta ao mundo real, segui para a imobiliária. Passei horas evitando


os contratos que amontoavam minha mesa, teria que falar com o imbecil do
advogado quando os analisasse, por fim, depois de uma tarde improdutiva,
desci para o estacionamento em busca do meu carro. Outro veículo saiu do
estacionamento, antes do meu, tratava-se de um Veloster e ao ultrapassá-lo
identifiquei o motorista: Rafael Barros.

Acelerei e segui para a minha casa, não sem antes passa na minha antiga
casa, precisava passar para fazer alguns pagamentos aos funcionários e deixar
dinheiro para que mantivessem a casa, ainda me doía deixar a mansão, mas
precisava reconquistar a confiança da Gabriela, era melhor passar um tempo no
apartamento do que perder toda a minha herança.

Demorei cerca de uma hora para resolver as coisas na mansão, enquanto


dirigia para o apartamento meu celular tocou, era a Bruna me ligando pela
milésima vez. Deixe a ligação cair na caixa postal, mas ao parar no sinal
vermelho li a mensagem que me mandou. Não li exatamente, já que se tratava
de uma foto. Mais precisamente uma foto dela completamente nua. Bruna
estava sentada, de pernas abertas em frente a um espelho. Uma de suas mãos
seguravam o aparelho e a outra apertavam um dos seios, era uma selfie do
caralho e o meu pau não ficou imune àquilo.

Você prometeu fidelidade, Alexandre.

Apaguei a imagem e decidi convidar a Gabriela para jantar, esperava que


a noite acabasse quente como a anterior, alguma vantagem essa confusão toda
teria que ter, além de continuar podre de rico, claro. Ao sinalizar que entraria
no meu novo condomínio, o carro ali parado me chamou atenção: um Veloster
prata. Novamente.

Rapidamente, estacionei o carro e corri para o elevador. Pelo celular,


ativei o rastreamento de GPS e tive certeza que ela estava no apartamento. A
cada andar a raiva aumentava. Eu mataria aquele filho da puta.

— Que porra está acontecendo aqui? — Gabriela estava usando apenas


roupão e o imbecil estava perto demais, se eu demorasse mais dois segundos
um beijo aconteceria. Tal constatação me deixou furioso. — Tire as mãos da
minha mulher! — Avisei entrando no apartamento.
— Acho que essa não é uma escolha sua — Rafael respondeu dando mais
um passo em direção a minha esposa.

— Rafael... — Gabriela pediu.

O tom dela era de dúvida?

— Isso é uma ordem! — Puxei-o pelo blazer.

Ele se virou com o olhar imponente e me empurrou.

— Você não manda em mim, idiota! — rebateu — Gabi... Onde você quer
que eu ponha as minhas mãos?

— Ela eu não sei, mas as minhas vão para essa sua cara de pau! — Fechei
o punho direito e soquei a cara dele.

Os nós dos meus dedos doeram com o impacto, mas logo a outra dor
substituiu essa. Ele revidou, socando a minha boca.

— Faz tempo que eu quero fazer isso — ele sorriu com o olho já
diminuindo de tamanho. — Onde estávamos, Gabi? — voltou-se para minha
esposa.

Não enxerguei mais nada, era ousadia demais. Parti para cima dele,
puxando seu colarinho até que as suas costas batessem na parede, fechei a mão
esquerda mesmo sem ser canhoto e soquei a cara dele diversas vezes. O Rafael
me chutava e tentava socar meus braços, mas eu não o soltei até senti-la em
minhas costas.

— Parem com isso! — Gabriela gritou batendo nas minhas costas —


Larga ele, Alexandre!

Ela pulou sobre mim, seus braços ao redor do meu pescoço, apertando
firme.

— Vocês não vão se matar no meu apartamento, parem agora! — Gritou


alto e eu quase fiquei surdo.

Exausto, larguei o imbecil e me afastei. Ele escorregou até parar no chão.


— Você está bem? — Ela se ajoelhou perto do filho da puta.

— Está satisfeita? Era isso que você queria? Dois homens brigando por
você?

— Acho que ele bateu forte demais na sua cabeça, só pode...

— Você é uma vadiazinha que não sabe o quer! Me seduziu, mandou um


recado claro na despedida de casada e agora me atrai até a sua casa para que
seu marido nos flagre... Não sou adepto do sadomasoquismo, porra!

— Não fale assim com ela — rosnei me aproximando novamente.

— Eu não preciso de defensor! — Gabriela rebateu.

— Apaixonou Rafael? — ela sorriu — Se eu me lembro bem, você


aproveitou cada segundo da minha companhia e eu não te prometi nada, ou
prometi? — ele permaneceu imóvel — Sinto muito que tenhamos chegado
nesse ponto. Quanto a ser vadia, não ouvi você reclamar enquanto me fodia.

— Vocês dois se merecem! — Seu tom de desprezo estava afetado pela


boca que já inchava.

— Lembre-se dessa frase cada vez que olhar para a minha mulher —
avisei — Cai fora!

Ele me olhou com ódio e se dirigiu à porta. Só então eu gemi a dor que
sentia.

— Caralho, isso dói! — Sentei no sofá e fechei os olhos.

— Você é inacreditável! Precisava me dar mais uma demonstração do


seu homem das cavernas interior?

— Ele ia beijar você.

— Só se eu quisesse! — pontuou — Tá lembrado que eu não te devo


fidelidade né?

— Ele é o advogado que quer provar que o nosso casamento é uma farsa.

— Hum, quer dizer que pode ser qualquer um menos ele? — ela sabia
me irritar. Não respondi. — Seu lábio tá inchado.

— Ele estava pior.

— Ah é, machão — bufou — Vamos até o banheiro dar um jeito nisso


antes que você me irrite ao ponto de te deixar com uma lesão permanente.

— Tenho mais medo de você do que daquele imbecil — sorri e doeu para
cacete.

Andamos até o banheiro e ali, em frente a um espelho, pude ver que meu
rosto não estava nos seus melhores dias. Meu lábio estava inchado e cortado,
com um filete de sangue escorrendo até o meu queixo. A bochecha estava
vermelha e meu nariz doía por causa do impacto. Pensar que ele estava muito
pior que eu, fazia com que eu me sentisse melhor.

A Gabriela me mandou sentar sobre o vaso sanitário fechado, obedeci


observando-a abrir todas as portas dos armários em busca de algodão. Ela
molhou o algodão na pia e se aproximou, limpando meu queixo. A sutileza com
que ela me tocava, com o que parecia ser receio de se machucar, fez algo dentro
de mim se apertar. Algo que, há tempos, estava adormecido e que eu gostaria
que continuasse.

Para quebrar o momento, levei minhas mãos para a faixa que prendia
seu roupão e desfiz o nó. Afastei os lados e ela parou de me tocar.

— Você não pode estar falando sério...

— Eu não disse nada, está excitada, Gabriela?

— Não, Alexandre. Dois homens trocando socos não é algo que me excite.

— Cuidar do seu marido machucado é? — ela deu um passo para trás. —


Lembrar da noite de ontem, então? Da maneira como você levou a sua boceta
para a minha boca, de como gemeu quando eu te fodi... Abre as pernas para eu
saber se não está mesmo excitada.

Ela saiu do banheiro sem me responder, voltou com um copo d'água e


um comprimido.
— Alergia a alguma medicação, querido?

— Está tentando me matar? — perguntei e ela sorriu — Nenhuma


alergia — ela me entregou o copo e a medicação, eu ingeri — Obrigado.

Gabriela terminou de limpar o meu rosto, em silêncio, e colocou uma


pomada no meu lábio inchado.

— Pronto, acredito que isso é o melhor que eu posso fazer.

— Você sabe que não...

— O que você veio fazer aqui?

— Te convidar para jantar — ela me olhou desconfiada — Podemos


pedir comida.

— Alguma coisa com baixo teor de gorduras e quase sem calorias? — fiz
careta e senti o rosto doer — Você precisa descansar.

— Podemos ficar na cama enquanto a comida sem gosto chega... —


sugeri.

— Boa ideia — ela se afastou — você sabe onde fica o quarto de


hóspedes.

Eu disse que não tinha alergia a medicação, mas provavelmente algum


composto me causou sono. Apaguei no quarto de hóspedes e não lembro
sequer de ter chegado lá. Acordei com Gabriela me balançando, de maneira
pouco suave, e sorri ao notar, quando abri os olhos, que meu rosto estava um
pouco menos dolorido.

Meu sorriso desapareceu quando cheguei a mesa de jantar. As


embalagens de comida estavam dispostas sobre ela, mas nada ali me abriu o
apetite. Gabriela sorriu me indicando a cadeira vazia ao seu lado.
— Você está tentando me punir? — perguntei ao observá-la se servir.

— Achei que os maridos ficassem felizes quando as esposas


providenciavam o jantar...

— Mas é esperado que o jantar seja algo comestível — rebati.

— Panqueca é totalmente comestível — a tentativa de sorriso doce dela


me deixou assustado — A massa é integral, o recheio é feito com espinafre e
queijo e o molho branco completa a receita de panqueca de apenas duzentos e
vinte e sete calorias. Hum...

— Que delícia! — Ironizei — E isso aí, o que é? — Apontei para a


embalagem com o conteúdo estranho.

— Cozido marroquino com quinoa, é uma delícia: leve e vegetariano.


Experimente, não admito que você vá para sua casa com fome, querido.

Eu tive que me servir, primeiro porque tinha certeza que ela estava me
aplicando uma punição pela briga. Em segundo lugar, porque comer aquela
porcaria me daria mais tempo ali. Além disso, eu estava com fome, esperava que
isso contasse com tempero para me fazer engolir aquela coisa horrorosa.

Quando levei a primeira garfada até a boca, ela me olhava com satisfação.
Sádica! A panqueca light não era das piores, o queijo salvava a receita, por isso
comi quase metade do conteúdo da embalagem... Estava com receio do tal
cozido marroquino.

— Deixe-me servi-lo, querido. — Ela colocou uma grande porção no meu


prato.

— Pode usar essa frase com mais frequência, querida. De preferência


quando você estiver sem roupa.

— Coma!

Eu comi e a coisa não era tão horrível. Sem graça? Com certeza. Mas deu
para comer metade do que ela serviu.

— Posso saber por que eu estou bebendo água e você vinho?


— Para não cortar o efeito da medicação, eu não levei um soco na cara —
sorriu sobre a taça.

— Eu o mataria se você não atrapalhasse... E o ressuscitaria só para


matá-lo novamente.

— Isso não pode ser por minha causa. — Ela ergueu as sobrancelhas.

— Não nos gostamos... Ele é competitivo e tem inveja da minha vida.


Ferrou com aquele contrato para a minha herança e foi atrás de você para me
fazer perder tudo.

— Não foi bem assim, eu praticamente me joguei no carro do Rafael.

— Está defendendo o cara que te chamou de vadia há poucas horas?

— Não tenho problemas em ser vadia, é só mais um conceito


preconceituoso. Mais um rótulo que colocam nas mulheres que são donas da
própria boceta e fazem o que bem entendem com ela.

— Não há nada que eu goste mais, do que ouvir você dizer boceta, pau
talvez? — ela gargalhou — Sua educação foi liberal?

— Posso parecer uma boneca, mas vou um pouco além do meu corpo
gostoso e do meu cabelo loiro. Não gosto de rótulos, não suporto machismo e
gosto de fazer o que me dá vontade. Meus pais aprenderam que não adiantava
me prender, era mais eficaz me instruir.

— Gostaria de conhecê-los, principalmente a sua mãe, ela me ajudou na


elaboração desse lugar.

— É a cara dela se encantar pelos seus olhos e não, você não precisa
conhecê-los. Tudo que eu não quero é ter que mentir ainda mais para eles — ela
levantou e recolheu as embalagens, andando até a cozinha.

Eu juntei nosso pratos e talheres e me dirigi para lá também. Gabriela


ainda usava o roupão, estava inclinada jogando as sobras do nosso jantar na
lixeira quando eu me aproximei. Depositei os pratos na pia e me coloquei atrás
dela. Era impossível resistir a atração dos nossos corpos.
Ela ficou tensa no primeiro momento, provavelmente tentando colocar o
cérebro para comandar o corpo, mas relaxou quando colei meu corpo em suas
costas.

— Continuo com fome, só que de você, Gabriela — sussurrei em seu


ouvido.

Ela se inclinou, como se estivesse espreguiçando, empinando os peitos


para frente e a bunda para trás.

— Então, come! — Gemeu quando apertei os seios sobre o roupão.

Desfiz o nó da peça, deixando-a escorregar pelos braços e cair no chão.


Beijei de leve a sua nuca e ombro, levantando seu cabelo. Minhas mãos
escorregaram por suas costas, de maneira leve, sendo acompanhadas por minha
boca, que pontuava beijos por cada centímetro de pele da região. Quando
cheguei na base da coluna, ela segurou na bancada de mármore e se inclinou. Eu
sorri. Beijei de leve cada um dos lados da sua bunda empinada, passando a
língua em seguida, por toda a extensão avantajada. Ela respondeu se inclinando
ainda mais.

— Sem tortura, Alexandre! — sua voz era de comando, eu sorri e


obedientemente me ajoelhei para dar o que ela queria.

Sem pudores, Gabriela abriu as pernas e reclinou o corpo, apoiando os


cotovelos na bancada. A visão que eu tinha era privilegiada: sua boceta rosada
totalmente depilada e levemente molhada antes mesmo que eu a tocasse. Meu
pau estava explodindo, louco para se perder ali. Mas a minha atenção foi para a
sua bunda, eu não era o único que precisava ser punido.

Afastei cada um dos lados com as mãos e lambi longamente, fazendo-a


gemer baixinho. Brinquei na sua entrada com a língua e saliva, até que eu
estivesse louco e ela se remexesse rebolando. Parti para a sua boceta já
ensopada, enfiando dois dedos que foram bem recebidos, com movimentos
circulares explorei sua boceta com os dedos e seu cu com a língua.

— Quase... — ela indicou, rouca. — Só mais... — meu polegar estimulou


seu clitóris e então ela gritou — Alêêê!
Ouvir meu apelido com tanta entrega me deixou a um passo do gozo,
levantei rapidamente, baixei a calça e a cueca o suficiente para liberar meu pau
e meti dentro dela, ainda sentindo seus espasmos.

Sua boceta me recebeu e me apertou, me fazendo pirar. Segurando em


seus ombros, eu a fodi com força, chocando nossos corpos. Estoquei fundo e
forte algumas vezes antes de sair e me deixar gozar no chão da cozinha.

— Podemos repetir o jantar! — Anunciei, fazendo-a rir.

Eu poderia me acostumar com aquilo, se houvesse essa opção. Mas não


havia.
Aqui e Agora!

É o mantra que sempre repeti e até tatuei. Minha filosofia de vida,


baseada na satisfação imediata dos meus desejos, sem pesar as consequências.
Claro, não sou uma irresponsável e sempre lidei bem com as consequências das
minhas escolhas. Até esse momento...

Estava repetindo "aqui e agora" para justificar todas as vezes em que eu


e o Alexandre fodíamos. Aquela regra antiga dele, a de três fodas e um adeus, foi
para o espaço desde que me propôs casamento. Mas a minha deveria continuar,
principalmente depois de todas as coisas que a Bruna jogou na minha cara.

Eu deveria estar usufruindo do nosso novo acordo da melhor maneira


possível, ou seja, usando a minha liberdade. Atendendo aos pedidos do meu
corpo: sexo com qualquer cara que me interessasse e não com o Alexandre. No
fim das contas eu estava dando para ele tudo o que ele queria, justificando tudo
isso no meu "aqui e agora".
Ele estava me conduzindo e eu estava me deixando levar. O pior de tudo
isso, era ter consciência de todo o processo e mesmo assim tentar me enganar.
Esse meu fluxo de pensamento pode ser considerado prelúdio de uma TPM,
uma vez que pensei nisso horas antes de adormecer e minutos depois de chorar
sem nenhum motivo aparente, em meio a uma tarde comum de segunda-feira.

Acordei com uma dor absurda transpassando meus sonhos e me


arrancando deles com algo que parecia uma joelhada na barriga. Me contorci
atordoada sem saber que horas eram, mas o quarto estava escuro,
provavelmente já havia anoitecido.

Evitei me mexer por alguns minutos, tentando me adaptar a dor no pé da


barriga. Eu sempre me acabava em cólicas, mas ultimamente elas estavam
ficando cada vez piores. Alcancei o celular que repousava ao lado do meu
travesseiro e confirmei minhas suspeitas: oito da noite. Mais uma vez, mandei
mensagem para o meu sócio avisando que não estava em condições de ir a
boate hoje, isso estava acontecendo pelo menos uma vez por mês, quando essa
dor maldita quase me incapacitava.

Havia uma mensagem do Alexandre, enviada às 18h, perguntando se eu


aceitava jantar. Desde o sexo na cozinha ele vivia se convidando para jantar
aqui em casa, mas eu sempre fazia com que ele pagasse o restaurante. Como a
mensagem era de duas horas atrás, supus que não precisava responder, ele já
devia estar jantando, por isso larguei o aparelho e busquei força no além para
levantar e me arrastar até o banheiro.

Mas não consegui chegar até lá, com o quarto na penumbra me vi


prostrada diante de uma nova onda de dor. A sensação era muito mais intensa
dessa vez, era como se alguém estivesse torcendo cacos de vidro contra a minha
barriga. Perdi o ar e o equilíbrio quando tentei me segurar no criado mudo,
acabei derrubando o abajur e caindo sentada no chão.

— Ai caralho! — Gemi entre a dor da bunda no chão e na barriga.

De repente, o quarto se iluminou quase me cegando.

— O que aconteceu? — O Alexandre correu para onde eu estava e culpei


a TPM pela sensação de alívio que senti ao vê-lo.

— Estou com muita dor no pé da barriga, uma cólica infernal... —


Respondi com lágrimas nos olhos.

— Deixe-me ajudá-la, estava indo ao banheiro? — assenti e ele me pegou


no colo, respirei fundo diante da dor que quase me fazia chorar.

Ele me colocou de pé, próximo ao vaso sanitário. Eu estava usando um


short estampado folgado e uma regata branca e ele indicou com as sobrancelhas
a poça de sangue que manchava o meu short.

— Prefere que eu fique ou saia? — ele perguntou e eu quis saber se o


que eu queria importava mesmo.

Dei de ombros e ele continuou ali, observando enquanto eu me livrava


do short e da calcinha sujos e me sentava no vaso para fazer xixi. Depois de me
limpar eu precisava de um banho, mas estava sem condições de me manter em
pé.

— O que eu posso fazer por você? — perguntou visivelmente aflito.

— Mágica ajudaria — tentei sorrir. — Mas você pode me trazer um


absorvente daí do armário e uma calça de moletom do meu closet, obrigada.

Ele saiu correndo e voltou com a calça cinza, quase adivinhando que eu
adorava aquela, dois números maior que o meu. Em seguida, pegou no armário
do banheiro um pacote de absorvente comum. Eu fiz uso de dois e levantei para
lavar as mãos, pisando devagar. Quando eu as enxuguei ele me pegou
novamente no colo e me levou volta para a cama.

— Você precisa de um médico, posso chamar um para te atender.

— Preciso de um analgésico, cama e paciência. Não se preocupe,


ahhhhh... — contorci-me mais uma vez.

— Vou pegar o analgésico, mas se não melhorar vou chamar um médico.

Essa era uma das coisas que eu mais odiava em ser mulher, por que
tanto sofrimento apenas para nós? Era injusto.
Ele voltou trazendo um comprimido, água e uma bolsa com água quente.
Quase sorri com a preocupação que estampava seu rosto, mas as lágrimas
vieram com a sensação de ter o próprio Satanás dançando em meu útero. Duas
delas escaparam enquanto eu tomava o comprimido, mas as enxuguei
rapidamente e deitei com a compressa de água quente sobre o ventre.

Fiquei imóvel, de olhos apertados, tentando pensar em outra coisa, mas


nada me distraía. Nem mesmo o Alexandre sentado ao meu lado na cama.

Essa era uma das piores dores que eu já havia sentido na vida.

Consegui adormecer por algumas horas, mas fui acordada mais uma vez,
por uma mão infernal apertando-me por dentro. Tentei não me mover, mas abri
os olhos em busca de orientação no exato momento em que ele entrou no
quarto novamente. Estava sem camisa e usava apenas um moletom preto, bem
baixo, deixando à mostra o caminho para o prazer.

— Quase melhorei com a visão desse abdômen definido — perturbei.

— Que bom que já consegue fazer outra coisa além de gemer, e olhe que
eu achei que seu gemido sempre fosse me causar prazer. Como se sente?

— Como se o Diabo em pessoa estivesse me espetando com seu tridente,


só que ele colocou veneno nas hastes — gemi.

— Não conhecia esse seu lado dramático — brincou.

— Gostaria muito que fosse apenas drama. Dói pra caralho!

— É sempre assim?

— Dessa vez tá pior que qualquer outra.

— Pedi milk-shake de chocolate, achei que você merecia quebrar a dieta


e li que chocolate é bom nesses dias. — Sorri amplamente.
— Ponto para você, Fragoso. Estou com fome, mas comer me deixa
enjoada...

— Hum, vou pegar — ele se retirou e voltou com dois copos enormes
com milk-shake.

— Obrigada — agradeci sentando com cuidado e levando o canudo até


os lábios. O sorvete batido estava delicioso e me distraiu bem.

O Alexandre se acomodou ao meu lado e ligou a TV, passando pelos


canais até parar em um de esportes.

— Eu estou com dor, ainda quer me torturar?

— Quer assistir alguma coisa?

— Arqueiro Verde — sugeri — Stephen Amell é uma delícia com aquele


capuz.

— Vejo que está se recuperando bem, nada de Arqueiro Verde, vamos


assistir The Blacklist.

— Mas eu não aguento mais aquele suspense todo, li no site que o Red
vai...

— Fique quieta, Gabriela. Estou atrasado nos episódios, não me conte.

— Ok, só por que você não está sendo um completo imbecil hoje.

— Mais um elogio?

— Tudo bem, você é mais gostoso que o Oliver Queen.

— Disso eu já sabia — ele riu e quando o acompanhei, me contorci


novamente — fique quietinha, vai passar já, já.

Não passou, mas foi legal da parte dele tentar me consolar.


Precisei de mais dois comprimidos e três idas ao banheiro sendo
carregada, para poder "apagar". Dormi muitas horas dopada e por isso, quando
acordei, ainda estava desnorteada. Quando abri os olhos estava claro e meu
corpo estava envolto por meu edredom, mas eu sentia calor. Ao meu lado,
dormindo, estava um Alexandre apenas de cueca. Essa é uma visão interessante
para se ter depois da dor de um quase parto.

Mexi-me para levantar e o meu movimento fez com que ele acordasse.
Seus olhos claros se abriram devagar e se arregalaram de imediato.

— O que aconteceu? — sentou na cama — Está pior? Vamos a


emergência agora!

— Calma aí, estou melhor. Estava justamente indo ao banheiro, não


queria te acordar.

— Eu levo você.

— Estou bem, Alexandre. Posso ir sozinha, descanse, você está com


olheiras péssimas.

— Não consegui dormi, mas pelo visto você apagou.

Busquei o celular e notei que eram duas da tarde do dia seguinte.

— Não é possível que eu tenha dormido tanto.

— Melhor dormir do que chorar de dor — assenti sorrindo — Tem


certeza que está melhor?

Levantei para provar que conseguia andar e dei uma voltinha. A dor
insuportável estava controlada, apenas o desconforto da cólica comum estava
presente.

— Não se preocupe, vou tomar um banho.

Segui para o banheiro e tomei uma ducha demorada, lavando o suor do


meu corpo e dos meus cabelos. O fluxo de sangue estava intenso, fazendo a água
que passava por mim, ficar vermelha. Eu realmente agendaria uma consulta
ginecológica. Sequei os cabelos, vesti uma camiseta enorme e um short folgado e
senti meu estômago roncar.

Encontrei o Alexandre na cozinha preparando uma bandeja com frutas,


suco e torradas.

— Achei que não soubesse fazer nada na cozinha — disse sentando na


banqueta alta.

— E não sei, pedi para prepararem. Ia levar para você.

— Posso me acostumar com tanta gentileza.

— Sempre tentei ser gentil, você que me coloca para correr! — Ele deu
de ombros.

— Obrigada pela ajuda, de verdade.

— É para isso que servem os maridos, eu acho.

— Deve ser... — Concordei — Agora traga a comida!

— E deve ser para isso que servem as esposas?

— Com certeza!

— Bandeira branca?

— Estou cansada, muito cansada disso tudo.

— Podemos nos esforçar menos, o que acha? Apenas deixar a coisa fluir.
Nosso acordo tem tempo determinado, vamos tentar fazer as coisas serem
simples e aproveitar a viagem, sem pensar na chegada.

— Você quer dizer transar sempre, sair para jantar e passear?

— Tudo que nos der vontade de fazer juntos.

— Tá me pedindo em namoro? — arquei a sobrancelha sorrindo.

— Você não é a desprendida dos rótulos? — fitou-me — Quer dar nome


ao que temos?

— Tem razão — desviei os olhos — Vamos fazer valer o Hic et nunc,


então.
— Aqui e agora! Eu quero beijar você.

— Então beija — sorri.

Ele se aproximou e fez a banqueta girar, me deixando de frente para ele.


Alexandre segurou meu rosto com delicadeza e encostou nossos lábios. A
delicadeza do gesto enviou uma sensação diferente por todo o meu corpo, não
era o fogo que sempre me consumia. Abri de leve a boca e passei a língua pelos
lábios dele, numa carícia suave e lenta, sentindo a maciez da sua boca pela
primeira vez. Com um selinho, ele se afastou e colou as nossas testas.

— Vamos comer antes que você desmaie de fome.

— Sim, é provável que aconteça.

Mas ele não sabia que a causa era provavelmente outra. Era difícil até
respirar com a conclusão a que estava chegando: Gabriela Burnier, apaixonada?
Era preciso investigar isso.
Sempre vivi cercado por mulheres: minha mãe, tias, primas... Mulheres!
E sabe o que todas elas têm em comum? Elas sangram. Todo mês. E por
consequência de todo esse sangue se esvaindo dos seus corpos, são mulheres
consumidas por cólicas e náuseas, isso sem falar no humor. Cacete! Os
sentimentos delas parecem uma montanha russa, conseguem ir do amor ao
ódio e do riso ao choro em um curto intervalo de tempo.

Estou vivenciado tudo isso ao lado da Gabriela e caralho! Em menos de


vinte e quatro horas já a vi chorar, gemer, sorrir, tagarelar, calar, ceder e
mandar! Mas, lidar com essa avalanche de sentimento não é nada comparado a
vê-la se contorcer de dor. Quando a vi caída no chão do quarto pensei no que
poderia ter acontecido se eu não estivesse ali.

Por isso, eu não me culpava por ter instalado câmeras e rastreadores em


torno dela. A real intenção desses itens era auxiliar na nossa farsa de marido e
mulher, a partir deles eu saberia caso alguma visita chegasse, meus pais ou suas
amigas por exemplo, e correria para o seu apartamento.

Havia diversas câmeras escondidas, mas as que eu monitorava


diariamente eram a do corredor do andar e a do estacionamento do
condomínio. Já o rastreador nas chaves do apartamento, um dispositivo do
tamanho de uma moeda de cinquenta centavos, devidamente escondido num
chaveiro em formato de coração cravejado em cristal swarovski, era um
complemento... Vai que ela sumisse novamente? Eu precisava garantir que ela
carregasse a chave para qualquer lugar, por isso o chaveiro caro.

Foi a partir do rastreador que eu confirmei que Gabriela e Rafael


estavam juntos no apartamento e invadi para quebrar a cara daquele filho da
puta. Foi graças a minha vigilância que, do meu escritório, eu estranhei o fato
dela não sair de casa numa manhã ensolarada. Não era típico dela passar o dia
todo trancada. Por isso, passei a monitorar o seu apartamento, acionando as
câmeras da sala, mas nenhuma presença dela. Até que na do quarto, vi que ela
estava deitada na cama, encolhida, para ser mais preciso. Havia algo estranho...

Adiantei o trabalho ao máximo, de olho na Gabriela, que dormiu


praticamente toda a tarde. Segui para o seu apartamento, usando a chave cópia
para entrar. Dá para imaginar o susto que levei quando liguei a luz e encontrei-a
caída no chão do quarto? Passado o susto, tentei fazer tudo que estava ao meu
alcance para fazê-la se sentir melhor. Mas, nada parecia aplacar a dor que fazia
Gabriela gemer e deixar lágrimas escorrerem por seu rosto. Eu já estava pronto
para tomá-la nos braços e levá-la para a emergência quando ela acordou
melhor, ou mais bem-disposta, pelo menos.

Apesar de passar do horário do almoço, tomamos café em silêncio, um


silêncio imposto por ela. Algo mudou depois do nosso beijo, que aconteceu um
pouco antes de decidir que tentaríamos viver um dia de cada vez nessa nossa
relação sem nome. Talvez fossem os hormônios da TPM em ação, por isso fiquei
na minha e comi em silêncio.

— Você não tem que trabalhar? — Gabriela indagou depois de um


tempo.
— Está me expulsando? — Arqueei a sobrancelha.

— Não, é só que você já perdeu a manhã aqui hoje e...

— Eu trouxe trabalho para casa.

— Isso significa que não vai voltar para o escritório?

— Isso significa que até eu ter certeza que você está bem, eu ficarei por
perto. — Fitei seus olhos e acariciei a sua mão em cima da mesa.

— Eu estou bem! — afastou a mão rapidamente — Inclusive lembrei que


preciso resolver algumas coisas da Carpe Vita — completou antes de levantar
da banqueta.

— Bem ao ponto de sair? — toquei seu braço para que se voltasse para
mim.

— Não é uma cólica que me derruba — olhei desconfiado — Tá... A fase


"ida ao inferno" já passou — sorriu.

— Ótimo! — sorri — Vamos sair em trinta minutos — depositei um


selinho em seus lábios e me afastei antes que ela pudesse contestar.

O meu calendário informou que hoje fazia três meses que Gabriela e eu
firmamos o nosso acordo. Eu controlava o tempo no calendário. A cada mês que
passava significava que eu estava mais perto de chegar ao fim da farsa, mas
também me deixava com menos tempo de cumprir todas as cláusulas do
maldito documento. O herdeiro, fruto do casamento, rondava constantemente a
minha cabeça. Desde que ela descobriu o testamento não voltamos a tocar nesse
assunto. Em outro momento precisaríamos conversar sobre isso. Em outro
momento. Agora eu apenas queria celebrar essa data ao seu lado.

Mais de cinquenta minutos depois eu ainda a aguardava dentro do carro,


no estacionamento. Ela me expulsou do apartamento quando voltei, exatos
trinta minutos depois de deixá-la e a encontrei ainda enrolada no roupão.
Gabriela alegou que não sabia o que vestir, já que eu não disse para onde
iríamos. Quando eu respondi que qualquer roupa estava boa, ela me acusou de
agir como um marido babaca e fechou a porta na minha cara. Engoli o
"finalmente" quando ela sentou no banco ao meu lado.

— Não me olha com essa cara! — Acusou por trás dos óculos escuros.

— Que cara?

— A cara do marido impaciente que esperou a esposa por horas para


sair.

— É a quarta vez hoje que me chama de marido. Olha que eu posso me


acostumar com isso — sorri.

— Vamos antes que eu me arrependa. — Mudou de assunto.

— Sim, esposa! — respondi e ela bufou.

Gabriela voltou a atenção ao seu celular durante todo o trajeto e eu dirigi


perdido em pensamentos. Ao final desse acordo talvez eu sentisse falta da
companhia dela. Da sua risada alta e até do seu temperamento difícil. O que me
consolava era que, quando o tempo passasse, sem acordo pairando entre nós, o
sexo poderia acontecer repetidas vezes, sem neuras ou empecilhos. Nossos
corpos se buscavam e se encaixavam perfeitamente, não havia por que não
atender a esse desejo.

O toque do meu celular me retirou desses pensamentos.


Automaticamente, atendi o aparelho já sincronizado ao painel do carro. Esqueci
completamente da Gabriela ao meu lado, antes de atender sem verificar o
número.

— Alê? — uma voz feminina soou baixa em meio a um grande barulho,


fazendo Gabriela levantar os olhos do celular, atenta a conversa que iniciava.

— Ele. Quem fala? — respondi já tenso.

— Não lembra de mim?


— Ajude-me a recobrar a memória... — sorri e a Gabriela soltou o ar com
força.

— Carnaval... Angra... Carla... Marcos...

Putz! O último carnaval do Marcos solteiro foi épico. E por mais que meu
cérebro catalogasse pelo menos doze mulheres para esse evento, não ia arriscar
nenhum nome.

— Isso não te ajudou, né? — gargalhou do outro lado — Talvez uma


amiga te ajude a lembrar.

— Achei que o casamento deixaria você mais tranquilo, mas você


continua safado como sempre — agora a voz da minha prima Carla fez-se ser
ouvida.

— Que belo comentário para se fazer na frente da esposa! — sorri.

— Caralho! Foi mal, não sabia que estava com ela... E nunca imaginei que
atenderia no viva-voz ao lado da esposa.

Gabriela ficou tensa no banco ao lado.

— Relaxe! — sorri — O que você quer de mim? — Indaguei para torturar


a mulher ao meu lado, Gabriela prestava atenção a tudo com ciúmes?! Sim, com
certeza era ciúmes.

— Você, seu carro, seu dinheiro e sua casa em Angra. Não


necessariamente nessa ordem.

— Escuta aqui... — Gabriela rosnou — Eu não queria atrapalhar a


conversa dos amantes, mas eu não estou mesmo a fim de ouvir esse papo. Se
você puder retornar em uns quinze minutos, garanto que meu marido irá
atendê-la reservadamente, como deve estar acostumada! — Soltou o ar com
força.

— Escuta aqui... — minha prima devolveu no mesmo tom — Você sabe


quem eu sou?

— Estou pouco me fodendo para quem você é! — Rebateu irritada.


Minha prima soltou uma gargalhada alta e eu acompanhei. O rosto de
Gabriela foi atingindo tons de vermelho e ela ergueu os óculos para me fuzilar.

— Prazer, eu sou Carla Fragoso, prima desse mala aí do seu lado —


minha prima sorria enquanto falava — E posso dizer: Já quero ser sua amiga!
Amei você!

Gabriela levou as mãos ao rosto constrangida.

— Desculpa... — pediu visivelmente envergonhada — É que eu conheço


bem demais a fama do seu primo.

— Não precisa se desculpar — sorriu do outro lado da linha — eu tenho


certeza que você está mantendo o cabresto apertado — foi a vez de Gabriela
sorrir — Vamos marcar um jantar e aí eu te conto todos os pontos fracos dele.

— Eu aceito! — Gabriela respondeu imediatamente.

— Eu ainda estou aqui — falei sorrindo.

— Então faz algo de bom e passe meu telefone para a sua esposa. Tenho
uma festa para convidá-la. — disse Carla.

— Adoro! — Gabi respondeu.

— Quando? — Perguntei ao mesmo tempo.

— Quando o quê?

— Quando será a festa, Carla.

— Você não será convidado.

— Você pede a minha casa, o meu carro, o meu dinheiro e eu não serei
convidado? Pelo que eu lembre, você disse que precisava de mim também.

— Isso foi antes de saber de que tipo era a sua mulher.

— Anota meu número — Gabriela informou o seu telefone e a ligação


assumiu um rumo de conversa que me deixava completamente de fora.

As duas pareciam amigas de longa data, quando o assunto seguiu o


caminho de festas, Carla que morava em Miami, estava animada para conhecer a
Carpe Vita e Gabriela para apresentá-la a boate. Antes da ligação ser encerrada
dei o meu xeque-mate.

— Carla, quem era a amiga do início da ligação? — Indaguei curioso.

— Ritinha — respondeu sorrindo.

A ruivinha de bunda grande. Meu cérebro ligou o nome ao corpo.

— Manda um beijo para ela! — falei antes de encerrar a ligação e fui


atingido por um soco forte no braço — O que eu fiz? — sorri abertamente para
Gabriela que me encarava com cara de poucos amigos.

— Manda um beijo para ela? — fitou-me impaciente.

— Eu mando beijo para as minhas amigas. Isso é ciúme? — Arqueei a


sobrancelha.

— Não! — devolveu os óculos ao rosto — Isso é raiva por não ter me


apresentado a sua prima antes.

— Teremos tempo de você conhecer o resto da minha família, está bem?


— toquei a sua mão e ela afastou para me mostrar o dedo do meio.

— Sempre doce — gargalhei — Chegamos! — apontei para o píer a


nossa frente.

— Aqui? — indagou olhando ao nosso redor.

— Sim. Você não fica enjoada em andar de barco, fica? — perguntei


pensando nessa possibilidade somente agora.

— Não — balançou a cabeça — vamos andar de barco?

— Vamos almoçar no meu iate — pontuei e desci do carro para abrir a


porta do passageiro.

No iate ancorado, já estava tudo pronto para nos receber, solicitei um


almoço leve, frutas, bebidas, sobremesas e tudo que pudesse agradá-la.

— Senhor Fragoso Burnier, Senhora Burnier Fragoso muito bem-vindos!


— O piloto cumprimentou-nos quando subimos no barco.

— Já gostei de você! — Gabriela apertou a mão dele sorrindo.

Eu havia informado a equipe que nos chamasse pelos nossos


sobrenomes de casado. Eu sabia que a deixaria feliz.

— Sua cota comigo está subindo a cada dia! — Voltou-se para mim com
um enorme sorriso nos lábios.

— Ao fim de tudo meu saldo será positivo — sorri de volta.

— Douglas — chamei o piloto que comandaria o iate — Mudei de ideia,


eu mesmo irei pilotar a embarcação.

— Claro, senhor — sorriu — Então está tudo pronto para a sua saída.

— Pronta? — Voltei para Gabriela.

— Prontíssima! — Sorriu mais uma vez naquele dia e naquele momento


eu soube que tudo estava muito bem.

O iate continha quarto, cozinha e banheiro com uma pequena banheira


de hidromassagem. Já em alto-mar, enquanto eu pilotava, Gabriela curtia o sol
na proa, mais um ponto positivo ao meu favor: eu mandei providenciar peças de
banho no seu número: biquíni, canga, saída de praia eu tudo o que ela por
ventura precisasse.

Já longe da Marina da Glória e tendo apenas o mar como nossa


companhia, parei para almoçarmos. Vestindo um top preto e uma calça de praia
estampada, ela não parecia em nada com a mulher que sofreu de dor ontem.
Que bom! Almoçaríamos ali mesmo na proa, a comida leve era salmão
defumado e uma salada de folhas, bebida havia sucos e um Chandon gelado.

— O que estamos comemorando aqui? — indagou antes de levar o


champanhe aos lábios.

— Nosso casamento! — respondi e ela cuspiu o líquido.

— Porra! — limpou o líquido que escorria pelos lábios — Quanto tempo


já passou? E desde quando comemoramos algo desse tipo? — As perguntas
saíam em disparada da sua boca.

— Três meses — respondi a primeira pergunta — na verdade


completamos ontem, mas você estava mal.

— Não precisava ter vindo até aqui para isso...

— Então vai julgar que é desnecessário ter comprado presente? —


Estudei sua reação.

— Você não fez isso... — seus olhos azuis fitaram-me em expectativa e


havia algo diferente neles, estavam marejados.

— Fiz e espero que você goste — abri uma caixa de veludo preta, nela
havia uma corrente prata da linha Life Secrets da Vivara.

O conceito dessa joia era uma cápsula onde você guardaria seus
segredos, escolhi uma corrente de ouro fina, a moldura da capsula é um disco
com as palavras Love e dentro os pingentes, que representariam o que ela
carrega com ela, escolhi o pingente de sapatinho, um batom, o símbolo do
infinito e uma chave. O resultado final era um colar com os pingentes
emoldurados num círculo.

— Eu nem sei o que dizer! — falou emocionada com os olhos fixos na


joia.

— Diga apenas que acertei ao tentar captar a sua essência.

— Você acertou em cheio — confessou animada — O sapato, o batom...


Vi a quadrilha ali exposta. Amei o infinito, só não entendi a chave...

— A chave representa o controle que tem pelos seus sentimentos. Assim


como eu, você sabe como manter seu coração protegido — sorri, mas ela não.

— Obrigada pelo presente — abaixou os olhos voltando-os para a


comida.

— Deixe eu colocar em você! — Levantei com a peça em mãos para


colocar em seu pescoço.

Abri o fecho e quando meus dedos tocaram a sua pele, um arrepio


percorreu meu corpo, uma sensação estranha... Levantei seu queixo e depositei
um beijo casto nos seus lábios, mas o toque esquentou todo o meu corpo. Com
isso eu sabia lidar. Saliva, calor, beijo... Ela suspirou quando me afastei.

— Já podemos ir para casa, a minha cólica está voltando — pediu.

— Certo — caminhei em direção a cabine.

Minha cabeça era um turbilhão de pensamentos, desejos e sentimentos


que ficariam todos aqui, apenas na minha cabeça.
Duas semanas depois

Sabe quando uma pessoa faz uma sucessão de merdas para, em seguida,
passar o resto da vida tentando consertar tais cagadas? Esse era o Alexandre
desde que descobri o testamento. Não sei exatamente o que o levou a mudar,
mas desde que deixei a aliança sobre a mesa do seu escritório ele vem se
esforçando para não ser o completo imbecil de outrora.

Primeiro, ele rompeu todos os contatos com a Bruna. Pelo menos até
onde eu sabia. Depois, ele mobiliou o apartamento deixando-o com a minha
cara. Minha personalidade estava presente naqueles metros quadrados e eu
confesso que achei bacana o fato dele tentar reproduzir o meu apartamento em
São Paulo. Ainda teve o convite às minhas amigas, o fato de conseguir reunir
toda a quadrilha no novo apartamento foi o auge da sua saga para mostrar que
não é um completo imbecil. Convidar o Felipe então, acrescentou mais dez
pontos extras na sua cartela de "Nova Chance com a Gabi".
Isso sem mencionar o cuidado que teve comigo enquanto eu estive
morrendo de cólica e o almoço em comemoração ao nosso casamento. Eu nem
sequer lembrava do fatídico dia, mas foi fofo da parte dele recordar. Desde
então, estamos vivendo um dia de cada vez.

Saímos para jantar quase sempre e eu sigo para a Carpe Vita todas as
noites, para não ceder à tentação de bater na porta do meu vizinho de andar,
feito uma gata no cio. Era ainda mais difícil resistir ao som da sua risada e aos
olhos sempre convidativos. E cada vez que nossos corpos se encaixavam, eu
repetia para mim mesma que era apenas sexo, sexo de excelente qualidade. E
imediatamente lembrava das suas palavras: vamos tentar fazer as coisas serem
simples e aproveitar a viagem, sem pensar na chegada. Hic et nunc! Repetia para
mim mesma antes de adormecer em seus braços.

Dessa vez, quando acordei ele não estava do outro lado da cama. Mas
havia deixado uma mensagem no meu celular:

Passarei o dia no escritório, tenho reunião agendada até as cinco da


tarde. O que acha de irmos até um bar encontrar uns amigos após o meu
expediente?

Eu aceitaria se não tivéssemos outro compromisso para essa noite.


Alexandre ainda não sabia, mas uma das ONGs que a sua mãe era voluntária
prestaria uma homenagem a ele essa noite, ela não entrou em detalhes, pois
ficou com receio que eu contasse a ele e estregasse a surpresa. Mas durante o
evento beneficente Alexandre seria homenageado como o grande benfeitor da
noite. Vilma estava orgulhosa do filho e contou-me que ele contribui com
diversas instituições de caridade. Mais um ponto para o senhor Fragoso.

Não poderemos ir, temos um compromisso inadiável!

Enviei.
Temos?

Sua resposta chegou imediatamente.

Claro que temos! Eu comentei com você essa semana que iríamos
no evento beneficente que a sua mãe organizou.

Não tô muito a fim de ir... Trocar chope gelado por um evento


repleto de velhos não é o meu programa favorito.

Não pude deixar de sorrir, eu concordava com ele, mas eu havia


prometido a sua mãe que iríamos e não mudaria de ideia.

Deixa só a sua mãe saber disso! kkkkkkkk Podemos estender a


noite depois que sairmos de lá ;)

Perfeito!

Ah! Esqueci de dizer que o traje é Black Tie.

Mais horas enfiado em roupa social, quando tudo o que eu quero é


estar nu... Me diga algo bom dessa noite? Não vi nenhuma vantagem ainda.

A minha presença!

Mas eu poderia desfrutar da sua presença numa banheira de


hidromassagem junto ao meu corpo, minhas mãos espalhando espumas
nos seus braços, enquanto meus lábios tocam o seu pescoço...

Você sabe como animar uma noite!

Enviei já imaginando nossos corpos juntos mais uma vez.


Sabemos! Nós sabemos como animar qualquer espaço.

Anexou a mensagem uma foto do seu colo com uma ereção marcando a
calça de tecido.

O que eu tinha que fazer mesmo? Ah, lembrei... Almoçar com a Vilma e
depois passar a tarde no salão de beleza. Ela teria que perdoar o meu atraso,
porque uma chamada de vídeo do Alexandre se iniciou. Ele estava no banheiro
do escritório e um sorriso imenso nos lábios. O sorriso que indicava que iria me
levar ao orgasmo, dessa vez a distância.

O humor do Alexandre melhorou consideravelmente depois do sexo por


vídeo que fizemos. Ele não reclamou mais de ter que comparecer ao evento,
pelo contrário estava animado demais para ir e livrar-se logo desse
compromisso. Tinha planos para essa noite e os planos incluíam nossos corpos
numa banheira de um motel cinco estrelas.

Passei a tarde com a Vilma fazendo compras e no salão de beleza. A mãe


do Alexandre era uma mulher cheia de vida e carinhosa, ela me contou histórias
do filho quando criança, das viagens em família e mais uma vez externou o
quanto era feliz em ter-me como nora, do quanto ela gostava da minha
presença. Um nó se formou em minha garganta e eu não pude deixar de
confessar que eu também gostava muito dela.

Eu passei tarde me produzindo, maquiagem, cabelo e procurando um


vestido perfeito. Ainda estava de roupão, quando Alexandre chegou no meu
apartamento lindíssimo usando um terno feito sob medida para o seu corpo. O
tecido encaixava-se perfeitamente ao seu corpo definido, a calça contornava a
sua bunda e marcava as coxas grossas. Um sorriso nos seus lábios completava o
quadro de perfeição.

— Aprovado? — Deu uma voltinha exibindo-se.

— Até que o terno deixou você mais bonitinho — perturbei sorrindo.

— Mais bonitinho? — enlaçou a minha cintura e puxou-me para ele.

— O que você queria ouvir? — Perguntei fitando a sua boca.

Deus do céu! Eu tinha experiência com homens gostosos, mas esse batia
todos os recordes.

— A verdade — seus lábios tocaram o meu pescoço e um arrepio


percorreu o meu corpo — Que o seu coração perdeu o compasso quando me viu
— sussurrou ao meu ouvido e o filho da puta estava certo, meus batimentos
aceleraram — Você também pode dizer que não consegue deixar de pensar na
minha boca... — completou antes dos seus lábios tocarem os meus e sua língua
invadir a minha boca.

Ele esqueceu de dizer que eu ansiava pelo toque dos seus lábios
diariamente e ficava enlouquecida a cada vez que ele me beijava. Que o seu
beijo era tão bom quanto o seu sexo. Mas, tudo que eu consegui dizer depois
que ele afastou nossos lábios foi:

— Eu preciso acabar de me arrumar! — Suas mãos soltaram a minha


cintura e meu corpo sentiu falta do seu toque. Apressada, eu saí em direção ao
quarto e fechei a porta atrás de mim soltando um suspiro alto. Porra, Gabi!
Levei as mãos a boca para conter o suspiro.

Retornei muito tempo depois, com os meus sentimentos controlados.


Alexandre me esperava sentando ao sofá com um copo de Whisky em mãos.
Quando ele notou a minha presença um brilho de desejo ficou evidente em seu
olhar, que percorreu meu corpo repetidas vezes, fazendo-o abrir levemente a
boca.

Eu usava um elegante vestido tomara que caia, laranja, mas como a


própria vendedora disse e Vilma e eu concordamos, era injusto resumir a peça a
isso. O tecido fino grudado no busto ia ganhando volume a partir da cintura e
uma grande fenda revelava as minhas coxas à medida que eu vagarosamente
me movia em sua direção. Na orelha eu usava um par de brincos de diamantes
discretos, em formato de bolinha e no pescoço a corrente que ganhei dele. Eu de
fato amei a joia e ela era quase como a minha segunda pele.

Ciente do efeito perturbador da peça que eu usava, um sorriso de


satisfação surgiu nos meus lábios, por isso não perdi a oportunidade de
provocá-lo:

— Perguntar se precisa de um babador é desnecessário, né? — indaguei


e seus olhos não desgrudaram nenhum minuto do meu corpo.

— Você está deslumbrante! — foi o que falou alguns segundos depois e


completou fitando os meus olhos — claro que eu poderia acrescentar que a
minha vontade é de possuí-la aqui mesmo na sala, tocar cada ponto do seu
corpo que o vestido esconde, que o meu desejo é substituir o tecido grudado a
sua pele, pela minha nua e sedenta do seu sabor.

Caralho, Alexandre!

Ele havia me deixado ainda mais... Encantada com o seu elogio.

— Obrigada. Há muito tempo eu não era elogiada pelo que vestia! —


Confessei sorrindo.

— Eis uma das vantagens da maturidade, apreciar o todo. Uma mulher


completamente vestida é tão sedutora e desejável quanto uma mulher nua. O
tecido valorizando o corpo feminino não deve ser uma mera embalagem a ser
descartada, pelo contrário ele deve ser apreciado. Nenhuma mulher se produz
toda somente para que homem veja apenas o corpo sexy.

— Caralho! — verbalizei em choque pelas suas palavras e como seu


elogio esquentou algo dentro de mim — Você quer parar de me elogiar assim?
— falei desconcertada. Eu não era tímida, mas os seus elogios tinham me
deixado sem palavras.

— Eu seria um tolo caso não elogiasse você essa noite — abandonou o


copo e caminhou lentamente ao meu encontro — o tecido é tão macio quanto a
sua pele — falou a passar o braço pela minha cintura e de forma espontânea
nossos corpos se procuraram, tocando-se. — Seu cheiro é delicioso — seu nariz
tocou meu colo nu — Seus lábios vermelhos imploram pelo meu toque — disse
quando eu suspirei colada a seu corpo. Abri os lábios para recebê-lo, mas a
campainha o fez me soltar sorrindo e seguir em direção a porta. Soltei um
lamento pela interrupção.

— Senhor Alexandre, o carro já está a sua espera — Assis informou.

— Obrigado — Agradeceu e voltou-se em minha direção, eu bebia o


resto do Whisky deixado no copo. — Vamos? — Indagou oferecendo o braço.

— Sim! — repousei o copo e segurei o braço que ele oferecia. Seguimos


de braços dados até o estacionamento — Por que vamos de motorista? —
perguntei já dentro do carro.

— Embora não pareça — sorriu — é um evento com música, repleto de


bebidas e gente bonita. Vamos aproveitar a noite! — piscou em minha direção.

— Sua mãe não aprovaria essa sua definição de evento beneficente —


rebati sorrindo.

— Minha mãe não aprova muitas coisas ao meu respeito — sorriu de


volta.

— Seu casamento comigo, por exemplo? — indaguei curiosa.

Embora Vilma tivesse dito que gostava muito de mim, ela deixou escapar
que lamentava não ter comparecido ao casamento do filho, queria ter visto o
seu menino no altar...

— Não — negou com a cabeça sorrindo — se tem algo que ela aprova é
esse casamento. Ela gosta de você como se fosse realmente da família! —
Respondeu encarando-me. Desviei o olhar para não me perder ainda mais
naqueles olhos azuis e voltei-me para a janela acompanhando o trajeto em
silêncio.

Somente quando o carro estacionou em frente ao Copacabana Palace,


local onde ocorreria o evento, foi que me voltei para ele. No calor do momento
acabei esquecendo de comentar que a gravata dele não estava na cor certa do
convite.

— Falta a cor que simbolize a causa defendida, presumi que não havia
prestado atenção ao detalhe! — retirei uma gravata borboleta laranja da bolsa
de mão, que eu havia comprado naquela tarde.

— Não vou usar uma gravata borboleta vermelha — negou — Já basta


parecer um belo exemplar de pinguim.

— Não é vermelho — corrigi calmamente — é um tom de laranja.

— Isso não é laranja, Gabriela — discordou — eu conheço as cores.

— Qual a cor do meu vestido, então? — Perguntei sorrindo.

— Vermelho! Óbvio — respondeu.

— Errado — sorri triunfante — é um tom de laranja.

— Assis, qual a cor do vestido da Gabriela? — indagou contrariado ao


motorista que concordou com ele, dizendo que era vermelho — Viu só, dois
contra um. — Voltou-se para mim confiante.

— Aconteceu algo, senhores? — uma voz feminina aproximou do nosso


carro, provavelmente para pedir que descêssemos logo e parasse de atrapalhar
a chegada dos outros convidados.

— Sim — respondi — estamos com uma dúvida referente a cor do meu


vestido, a senhora poderia responder qual a cor dele, por favor?

— Claro! — a mulher sorriu diante da pergunta óbvia — é um tom de


laranja que valoriza muito a sua pele, por sinal.

— Obrigada — aquiesci para a mulher e sorri para o Alexandre — eu


sempre estou certa!

— Mesmo que esse vestido seja laranja, o que não é — revirei os olhos
diante a sua teimosia em admitir que estava errado — Eu não irei usar a gravata
dessa cor — pontuou e desceu do carro caminhando para abrir a porta para que
eu descesse também.

Havia fotógrafos posicionados na porta do hotel e fomos guiados por


uma funcionária a retirar algumas fotos para o site do evento. Pousamos juntos
para algumas fotos e entramos de braços dado no hall do Copacabana.

Uma mulher morena de cabelos cacheados, promoter do evento, nos


guiou até a enorme sala onde aconteceria o jantar beneficente. Assim que
adentramos no ambiente, bastante cheio, a mulher nos posicionou na mesa
reservada para a família Fragoso. Somente seu pai estava ali, que logo levantou
para nos cumprimentar.

— Você está muito bonita, Gabriela — o senhor Fragoso me


cumprimentou com um abraço apertado.

— O senhor também está muito elegante — disse sorrindo — Veja,


Alexandre, a gravata do seu pai é laranja! — eu não ia perder a oportunidade de
provocá-lo.

— Exatamente como deveria ser! — A sua mãe se aproximou e lançou


um olhar reprovador para o filho. Vilma usava um vestido muito elegante num
tom suave de laranja, os cabelos presos num coque elegante, evidenciavam os
brincos de rubi.

— Você está belíssima! — elogiei antes de beijar a sua face.

— A mulher mais linda dessa sala — Alexandre elogiou.

— Não tente me enrolar com seus elogios — repreendeu sem conter o


sorriso — Aqui! Essa fita deve resolver — prendeu uma fita de cetim laranja na
lapela do smoking do Alexandre.

— Agora sim! — sorri.

— Senhoras e senhores, muito boa noite — o cerimonialista anunciou e


todos nos sentamos — dentro de meia hora daremos início ao nosso evento
beneficente, agradecemos desde já a senhora Vilma Fragoso e Margarida Duarte
pela iniciativa e organização do evento — seus pais trocaram um olhar de
admiração e Alexandre os fitou com carinho.
Nossas bebidas foram servidas, enquanto uma banda tocava blues,
comemos e conversamos animadamente. Vilma e eu logo tratamos de conversar
sobre as roupas das outras mulheres, elegemos os nossos vestidos preferidos e
não podemos deixar de comentar a escolha equivocada de alguns modelos,
papo de mulherzinha.

Marta Duarte, uma das organizadoras do evento em conjunto com a


Vilma, era uma amiga de longa data da minha sogra, e logo juntou-se a nós na
mesa e completou o clube das mulheres. Animada e viúva, ela revelou que que
sairia daquela noite realizada pelo evento e com o contato de um viúvo em
mãos. Sorri diante do comentário. A mulher logo tratou de me convidar para ser
promoter do Natal Solidário, após eu contar que trabalhava na Carpe. Eu
prontamente aceitei, já com mil ideias para angariar fundos para o orfanato.
Enquanto Alexandre e o pai conversavam entre eles, nós três ríamos e
bebíamos como amigas de longa data.

— Boa noite, senhoras e senhores sejam muito bem-vindos! Daremos


início ao evento, com vocês a modelo internacional Ana Matarazzo — surgiu ao
palco sob aplausos fortes, a modelo brasileira ruiva que estampava os catálogos
de uma famosa grife de bolsas.

— Gata, né? — comentei com o Alexandre que se aproximou para


sussurrar em meu ouvido.

— Você é muito mais — sorri — Tive uma ideia: o que acha de


escaparmos dessa sala e passarmos a noite numa suíte do Copacabana?

— Tentador... — Confessei sorrindo.

— Hic et nunc, Gabi!

— Silêncio, meninos! — sua mãe nos repreendeu sorrindo e ele afastou-


se com uma piscadela em minha direção.

— Boa noite a todos — a mulher disse ao microfone — Quando o convite


foi feito, não hesitei em aceitar. É com enorme prazer que estou aqui como
mestre de cerimônia e abraçando essa causa tão importante que é a ELA.
Não sei o que ocorreu, mas naquele exato momento toda a cor sumiu da
face do Alexandre. O homem que, até um segundo atrás, sorria agora estava
estático e com uma expressão de medo estampada no rosto, suas mãos
apertavam com força o copo que segurava.

— Alexandre... — me aproximei para que apenas ele me ouvisse. Seus


olhos estavam fixos no palco — Você está bem? — Toquei sua mão que estava
gelada. Olhei para os seus pais que estavam atentos ao palco e não notaram que
algo estranho estava acontecendo com o filho.

Um calafrio fez meu corpo estremecer, o prelúdio de que algo ruim


estava para acontecer.
ELA

ELA

ELA

ELA

ELA

ELA

ELA

ELA

A palavra ecoava em minha mente e reverberava por todo o meu corpo.


A simples menção dessas três letras foram o suficiente para que a minha mente
vagasse para o passado. ELA. Significava tanta coisa para mim. ELA: a mulher de
sorriso fácil. ELA: a maldita doença.
Escuto a voz da Gabriela, mas não compreendo nenhuma palavra que ela
fala. Sinto as suas mãos tocando as minhas, mas não reajo. Apenas sinto. Sinto
todas as lembranças me atingirem em cheio feito um soco no estômago. Sinto
meu coração bater acelerado e minhas mãos tremerem. Sinto todo o sangue
sumir do meu corpo e ondas de frio percorrerem-no. Sinto minha garganta
fechar, como se uma mão estivesse me sufocando, me impedindo de respirar.
Sinto lágrimas surgirem nos meus olhos. E tudo o que eu faço é apenas sentir.
Sentir uma dor dilacerante esmagar meus sentidos e levar a minha
racionalidade com ela.

ELA

ELA

ELA

ELA

Meu corpo pedia fuga, implorava para que eu levantasse daquela cadeira
e saísse dali o mais rápido possível, entretanto as minhas pernas não
correspondiam ao comando do meu cérebro, por isso eu mantinha os olhos
fixos na mulher que falava ao microfone, numa voz mecânica e sem emoção.
Enquanto eu era um poço de sentimentos distintos.

— A Esclerose Lateral Amiotrófica, ou simplesmente ELA, é uma doença


degenerativa avassaladora caracterizada pela paralisia. Uma paralisia que
atinge não somente o paciente, mas todos ao seu redor.

—Tá tudo bem, amor! — envolvi-a num abraço forte, após ela deixar cair
das suas mãos uma taça de cristal da minha mãe e sair correndo da sala de
jantar.

— Eu não sei o que aconteceu — disse entre lágrimas — Eu perdi a força


nas mãos! De repente a taça ficou pesada demais. Estraguei o jantar! — soluçou
contra o meu peito.

— Shhh! — Afastei nossos corpos para tocar os seus lábios com os dedos —
Não vai ser uma taça quebrada que irá estragar com a nossa noite. Na verdade,
esse é mais um motivo para eu colar em você: alguém precisa consertar tudo que
você bagunça e eu farei esse esforço... — sorri e ela me acompanhou.

— Eu te amo a cada dia mais! — Admitiu sorrindo.

— Eu que te amo, minha desastrada favorita! — Sorri e beijei seus lábios


para selar mais uma vez a nossa promessa de nos amarmos a cada dia mais que o
anterior.

Em determinado momento, a voz do mestre de cerimônia cessou e um


vídeo passou a ser exibido no grande telão ao lado do palco. Paralisado. Era o
meu estado naquele exato momento, minha boca estava seca, meu coração
acelerado, minha respiração ofegante... No meu cérebro uma onda de pânico foi
instaurada, era como se placas indicando perigo estivessem ali expostas e eu
devesse levantar e correr daquele lugar, mas meu corpo não se movia, nenhum
maldito músculo obedecia aos meus comandos.

No telão, o vídeo iniciou e por mais que eu quisesse fechar os olhos e não
ver, não era o meu cérebro que estava em ação, era o meu coração que
comandava, que arrancava todos os Band-Aid’s das feridas e expunha todas as
cicatrizes que eu guardei à sete chaves.

Na sequência do vídeo, surgiu uma criança de cabelos castanhos escuros


dando seus primeiros passinhos, incentivada pela mãe:

— Yasmin meu amor, vem até a mamãe, vem! — a mulher sorria de braços
abertos. Passo a passo, a criança sorridente chegou até sua mãe.

Houve um corte temporal e em seguida vimos surgir uma linda garota


em cena, usando um vestido elegante azul, quando a sua voz ecoou pela caixa de
som, eu perdi o chão. Senti que um buraco negro havia se formado sob os meus
pés e estava me sugando para dentro dele.

A essa altura meu coração batia ainda mais descompassadamente, meus


lábios tremiam e minha visão estava turva... A menina, agora mulher, dançava
uma música romântica de corpo colado com seu par e sorria para ele, enquanto
a câmera surgia à sua frente registrando o momento.
— O que os pombinhos têm a dizer sobre o fim do Ensino Médio? — o
homem atrás da câmera perguntou.

— Que sobrevivemos! — ela respondeu sorrindo — Alexandre, olha para


o vídeo! — pediu com uma voz doce seguida de um sorriso. O garoto tímido
olhou rapidamente para a filmagem e voltou a olhá-la apaixonadamente —
Quero deixar registrado esse momento. O momento que me sinto a pessoa mais
amada do mundo, quero deixar registrado para todos que mesmo que eu
morresse amanhã, a minha vida já valeu a pena por ter você ao meu lado!

— Nem vem com esse papo! — o garoto repreendeu sorrindo — Você


prometeu que ficaríamos velhinhos juntos! Não quero envelhecer sem você ao
meu lado...

— Esqueceremos nossos nomes, mas estaremos sempre juntos! — ela


completou e o beijou delicadamente.

A imagem focou o beijo dos dois, um beijo entre dois jovens cheios de
sonhos e amor. O vídeo encerrou e uma lágrima teimosa escapou dos meus
olhos, quando reconheci as duas pessoas em cima do palco.

— A ELA levou a minha filha precocemente — Márcia, mãe da Yasmin,


falou ao microfone sendo reconfortada pelo marido, Plínio. Ambos seguravam
camisas com a foto da filha sorrindo. Eu quero que você se lembre de mim,
sorrindo! — Yasmin, não viveu o suficiente para ser veterinária, seus pés não
pisaram nos países que ela queria tanto visitar, seus braços não puderam nos
dar o último abraço — a voz da mulher estava embargada, o marido a apoiava
visivelmente emocionado, segurando sua mão — sua boca não atendeu a
súplica do seu olhar no momento da despedida, mas aqui dentro — apontou
para o próprio coração — continuamos ouvindo a sua voz sorridente, a sua
gargalhada doce e as suas constantes declarações de amor.

O casal chorou, um choro cortante, porém sem alarde, de quem já


vivenciou essa mesma situação várias vezes. De quem sentia, mesmo tantos
anos depois, a falta da filha. O choro de quem perdeu alguém que amava tão
precocemente.
As lágrimas já escorriam pelo meu rosto e, com muito esforço, consegui
mover a mão até os olhos para secá-las. Uma mão tocou a minha, mas evitei
olhá-la, pois assim como os pais no palco que já vivenciaram a situação, eu sabia
o que aquela mão significava: pena. Que talvez depois pudesse virar compaixão
e cuidado.

Meu corpo todo tremeu e eu respirava com dificuldade. Preciso sair


daqui! Preciso sair daqui! Não sei como consegui ficar de pé, trôpego me afastei
da mesa e escutei Gabriela chamar o meu nome. Saí esbarrando em mesas e
pessoas e pedi desculpas inaudíveis, me movi o mais rápido que as minhas
pernas permitiram. A voz da mulher voltou a ecoar nas caixas de som do salão.

— E é em nome dela que estamos aqui, para que possamos dar


oportunidade de vida as Yasmins espelhadas pelo Brasil — disse com a voz
emocionada — obrigada a família Fragoso pela iniciativa do evento, em especial
ao Alexandre Fragoso pela doação responsável pela criação do Instituto Yasmin
Cavalcante...

Escutei o meu nome e o mundo pareceu desabar sobre minha cabeça.


Aplausos fortes ecoaram no ambiente enquanto a sua canção favorita tocava.
Desnorteado, cruzei o restante do caminho que me libertava daquelas
lembranças. Não enxergava um palmo à minha frente, mas ouvi passos
apressados atrás de mim, não sabia para onde estava indo, apenas precisava
fugir. O elevador se abriu para uma funcionária carregando um carrinho de
limpeza sair, entrei nele esbarrando na mulher que disse algo que eu não
compreendi.

— Alexandre, espera! — Gabriela gritou e pude ver preocupação em seu


olhar. Mas era tarde... As portas do elevador se fecharam antes que ela me
alcançasse.

Segurei-me contra as paredes do elevador e acionei o botão que me


levaria até o terraço do hotel. Respirei com dificuldade e arranquei a gravata,
mas ainda era insuficiente para aplacar a sensação de falta de ar que sentia, por
isso livrei-me do terno, desabotoando os primeiros botões da camisa, numa
tentativa inútil de levar o ar aos meus pulmões.
Quando o elevador parou, indicando que cheguei ao lugar isolado, saí
cambaleando e inspirando com força o ar fresco. Gritei alto quando a dor se
tornou insuportável. Eu achei que tivesse superado. Achei que guardar à sete
chaves tudo o que vivi com Yasmin fosse o melhor a ser feito. Não lidar com os
sentimentos era o que eu fazia de melhor. Desabei no chão sem conseguir
conter a vazão de sentimentos, lágrimas feias e grossas escapavam dos meus
olhos, a sua voz ecoava no meu pensamento.

Eu quero que você se lembre de mim, sorrindo!

De olhos abertos consigo lembrar exatamente a última vez que nos


falamos e do seu sorriso. Também lembro do inferno que vivi naquela semana...
Eu lembrava do seu sorriso contagiante, mas ele não me fazia rir de volta, não
mais.

Alexandre, espera! Gabriela gritara antes de eu fugir, com os olhos


assustados, segurando o vestido erguido. Esperar para quê? Para que você
zombe da minha cara de paspalho por chorar por uma lembrança que
aconteceu há mais dezoito anos?

— O senhor não tem autorização para estar aqui! — Um homem que


presumi ser funcionário do hotel se aproximou e moveu a lanterna em minha
direção, iluminando o meu rosto. Estou sentando, no chão do terraço escondido
sob a luz do luar, chorando feito uma criança imbecil que caiu e machucou o
joelho — O senhor precisa de ajuda? — perguntou alguns segundos depois.

— Eu já estou de saída. — Respondi com dificuldade.

— Ok, mas o senhor não pode demorar aqui... — disse mais uma vez
antes de se afastar. Deixando-me na completa escuridão.

A figura da Yasmin surgiu mais uma vez à minha frente, não aquela que
os vídeos mostraram, mas a Yasmin que só eu conhecia, a que sorria das minhas
piadas bobas, a que matava aula para nos encontrarmos escondidos. Mas logo
cheguei até a Yasmin que utilizava apenas o olhar para se comunicar...

Caralho Alexandre! Me repreendi quando notei o desespero se


aproximando, o soluço preso na garganta escapou e ecoou alto na escuridão,
abracei as minhas pernas enquanto todo o meu corpo tremia. Meu pensamento
estava repleto de imagens nossas. Puxei meus cabelos com força, queria
substituir a dor emocional pela física. É isso, vou sair e beber, arranjar confusão
com alguém e socá-lo até que eu não sinta as minhas mãos.

— Alexandre... — Gabriela encontrou-me — Eu sei que você está aqui!

— Vai embora! — Gritei de volta.

— Seus pais estão preocupados! — Ela usou o celular para iluminar o


ambiente — Eu estou preocupada...

— Não preciso da preocupação de vocês — enxuguei as lágrimas — O


Assis, está lá embaixo vá para casa, eu chego depois — menti.

Seguindo a minha voz, ela me achou jogado no chão, notei seu semblante
vacilar, a pena se instaurando ali.

— Eu não vou embora sem saber se está bem — sua voz estava serena.

— Eu não estou nos meus melhores dias, mas está tudo sob controle —
menti mais uma vez. Eu era muito bom em esconder meus sentimentos.

— Eu posso ajudar com alguma coisa? — Abaixou-se até ficar a minha


altura, para olhar diretamente nos meus olhos.

— Sim, indo embora! — Informei e abaixei a cabeça para que não


percebesse as lágrimas que rolavam sem autorização.

— Eu não vou embora te deixando assim... — Sua mão tentou enxugar as


minhas lágrimas, mas eu afastei de forma rude.

— Eu não preciso da sua pena! — Gritei furioso.

— Não estou aqui por pena. Estou porque me preocupo com você! Eu...

— Vá embora, Gabriela! — Ordenei.

— Você é um imbecil! — Rebateu, ficando de pé — Eu estou aqui


querendo te ajudar, dizendo que me preocupo com você e tudo que você faz é
gritar comigo! Descontar em mim as suas frustrações... — Seus olhos
marejaram.

— Apenas vá embora! — pedi mais calmo — É o melhor para nós dois


nesse momento.

— É? — A sua voz vacilou — Seus pais disseram o mesmo. Pediram que


eu te desse um tempo. O que está acontecendo, porra? — Gritou e uma lágrima
escapou dos seus olhos — Eu me sinto no meio de um segredinho sujo de
família...

— Ela não é a porra de um segredinho sujo! — Levantei e dei dois passos


até alcançá-la — Nunca mais ouse chamá-la dessa forma... — Segurei seu braço
com força — Ouviu? — Rosnei furioso.

— Você vai me machucar, seu babaca! — Chutou as minhas pernas, mas


minha mão permaneceu apertando o seu braço.

— Repete que ouviu, porra! — Gritei e ela estremeceu de raiva, enquanto


continuava se debatendo para se soltar.

— Solte-a, agora! — Alguém acendeu uma lâmpada e o ambiente se


iluminou. Olhei para trás e vi um funcionário da segurança segurando uma
arma em punho.

— Não! — Gabriela gritou quando o homem apontou a arma em nossa


direção — Ele é meu marido, está tudo bem — voltou-se para o homem e depois
para mim — Alexandre, me solta por favor! — pediu com lágrimas nos olhos.
Soltei seu braço, mas ela não se afastou, o homem continuava com a arma
voltada em minha direção, se aproximando lentamente.

— Senhora, por favor afaste-se dele! — Ele pediu com os olhos fixos em
mim.

— Abaixe essa arma! — Ela implorou aflita — Estávamos numa


discussão acalorada, mas já passou...

— O que está acontecendo aqui?

Mais dois homens surgiram, usando o mesmo uniforme da empresa de


segurança.

— O homem aí estava agredindo a mulher — o segurança armado


informa.

— Ele não estava me agredindo... — Gabriela falou aflita e os dois


homens me encararam com fúria.

— Gabriela, afaste-se de mim. — Pedi e esperei que apenas dessa vez ela
me obedecesse sem contestar.

Estava com medo de o segurança com a arma em punho fazer alguma


merda, como puxar o gatilho, e a bala destinada a mim acabasse atingindo-a,
não precisava de mais lembranças ruins.

— Eu não vou me afastar de você quando uma arma está apontada em


sua direção. — Ela fitou-me em total desespero.

— Ele não fará nada! — Fitei seus olhos azuis e esperei que ela
acreditasse nas minhas palavras — Apenas caminhe lentamente para longe. Vai
ficar tudo bem...

O meu diálogo com Gabriela me distraiu e não percebi quando um dos


homens se afastou e conseguiu me surpreender aplicando uma gravata em meu
pescoço. Ela afastou-se assustada e eu reagi contra o homem que me apertava,
usando os cotovelos para atingir o seu estômago. Ele me soltou urrando de dor.
Aproveitei a sua dor e parti para cima, puxando-o pela camisa. Eu havia
encontrado uma oportunidade para descontar a minha raiva.

— Reage! — Instiguei o homem caído.

— Alexandre! — Gabriela gritou e tentou se aproximar, mas foi contida


pelo homem que segurava a arma. O outro segurança, alto e com cara de
poucos amigos, tentou me deter, mas eu resisti e acabei atingindo o nariz do
mais baixinho, levei um murro na barriga em resposta. Estava me sentindo num
ringue, o que me faltava em desvantagem numérica, sobrava em raiva
acumulada.

— Para Alexandre! — Gabriela gritou mais uma vez e eu continuei


batendo e apanhando feito um moleque numa briga de rua.

O segurança alto puxou da cintura uma arma de choque e ameaçou


utilizá-la caso eu não aquietasse. Não seria nada mal levar um choque e apagar
em seguida. Inconsciente não sentiria mais nada.

— Mais uma gracinha e você só vai acordar no hospital! — O homem


ameaçou novamente. Eu dou mais um passo em sua direção e sou repreendido
por Gabriela que conseguiu se soltar dos braços do segurança com uma
mordida em seu braço.

— Sai da minha frente! — Exigi quando ela parou a minha frente.

— Que merda aconteceu com você? — Sua voz saiu trêmula — Pense
nos seus pais lá embaixo... Pense em mim, eu estou assustada! — Implorou e vi
o pavor instaurado no seu olhar.

— Eles já me viram em situação pior... Agora vai embora, você não


precisa passar por isso.

— Não! — Protestou e em seguida senti uma pancada forte atingindo a


minha cabeça, poucos segundos depois, cambaleei e cair aos seus pés.

A última coisa que vi antes de apagar foram os seus olhos azuis fitando-
me em desespero.
Em um minuto estava tentando trazer racionalidade a um Alexandre
descontrolado e no instante seguinte estou com ele aos meus pés, desmaiado.
Ainda que eu vivesse cem anos, jamais esquecerei a noite de hoje.

— Que porra vocês fizeram? — Gritei para os três patetas parados.

— Ele ficará bem... — Começou a explicar o homem mais alto — foi


apenas uma coronhada.

Enquanto eu tentava convencer Alexandre a ficar calmo, o imbecil


atingiu a sua cabeça com o cabo da arma. Toquei a cabeça do Alexandre e não
encontrei sangue, mas também não enxergava com clareza nessa luz fraca,
meus dedos não estavam sujos, então deveria ser mais um sinal que não havia
sangue. Na parte de trás da sua cabeça existia apenas um galo começando a
surgir.

— Façam alguma coisa! — Esbravejei para os três seguranças que


continuavam inertes — Me ajudem a levá-lo para um quarto.
Com dificuldade eles carregaram o Alexandre como se fosse um saco de
batata, seria demais que eles tivessem cuidado com homem que até pouco
tempo estava brigando com eles feito um leão enjaulado.

— A senhora não pagou pelo quarto... — o mais baixinho deles informou,


ignorei sua fala enquanto voltava a tatear a cabeça dura do Alexandre: nenhum
sinal aparente de ferimento ocasionado pela queda ou pancada. Ainda assim,
vou chamar um médico para vê-lo!

— É o procedimento padrão, senhora... — o homem pigarreou.

— Procedimento padrão? — indaguei furiosa e o homem encolheu-se —


É procedimento padrão espancar as pessoas nesse hotel?

— Não espancamos ninguém — o homem mais alto, que devia ser o


chefe de segurança, tomou a frente dos outros — ele estava agredindo a
senhora quando chegamos... Além do fato de ter atacado um dos nossos
funcionários. Qualquer advogado dirá que foi legítima defesa! Temos
testemunhas — indicou com a cabeça para o segurança de olho inchado.

— Ótimo que vocês tenham advogados, pois precisarão deles! — Não me


intimidei com a sua ameaça — Ele não estava me atacando e nada disso teria
acontecido se vocês não tivessem agido de forma deliberada. Já prevejo
estampado nos jornais que a segurança do hotel mais famoso do Rio de Janeiro
agrediu o homenageado do evento beneficente.

— Ele é o Alexandre Fragoso? — indagou com os olhos arregalados,


consciente da burrada que havia feito — Chame o médico do hotel, agora! —
Ordenou para os seus subordinados.

— Lamento mais uma vez pelo ocorrido... — iniciou as desculpas — Eu


não quis agredir o seu marido.

— Mas agrediu! — rebati — Agora faça algo certo pelo menos uma vez
nessa noite e encontre Vilma e Alex Fragoso e comunique-os que o filho deles
está bem.

— Mais alguma coisa, senhora? — Indagou solícito.


— Whisky, quero uma garrafa de Whisky!

— Claro, senhora Fragoso e desculpe mais uma vez pelo seu marido.

O homem afastou-se e me deixou a sós com Alexandre completamente


inconsciente. Não consigo conter as lágrimas o vendo esparramado na cama,
seu rosto apresentava ferimentos em diversos pontos: os olhos estavam
inchados, a boca apresentava um corte no lábio inferior e do nariz escorria um
filete de sangue. Com dificuldade ergui a sua cabeça e coloquei dois travesseiros
embaixo dela.

Retirei seus sapatos, abri sua camisa social em busca de algum outro
ferimento escondido pelas peças de roupa, quando vou fazer o mesmo com a
sua calça um homem carregando uma maleta irrompe pela porta.

— Sou o doutor Cardoso — apresentou-se e seguiu para o outro lado da


cama com o estetoscópio em mãos — os sinais vitais dele estão ok — revelou
um tempo depois de aferir a sua pressão e checar olhos e o galo da cabeça, soltei
o ar com força. Não me dei conta que tinha prendido o ar enquanto ele o
examinava.

— A senhora sabe dizer se ele ingeriu álcool ou fez uso de


entorpecentes?

— Ele bebeu Whisky.

— Ok — respondeu com os olhos voltados para o celular — Ambulância,


quarto 248.

Meu corpo gelou quando escutei a palavra ambulância. Não estava tudo
bem? Antes que eu conseguisse verbalizar uma pergunta ele voltou-se para
mim:

— Seu marido está bem — tranquilizou-me — Iremos até o hospital para


realizarmos uma ressonância e descartar qualquer lesão, não houve corte na
cabeça o que é um bom sinal... — Assinto e duas lágrimas escorrem do meu
rosto. — Está tudo bem! — O médico tentava me acalmar.

Os enfermeiros chegaram e colocaram Alexandre na maca. Ele


continuava inconsciente, mas o médico disse que estava tudo bem, então... Está
tudo bem! Repito para mim mesma enquanto sigo-os para a ambulância. No hall
do hotel, encontrei Vilma sendo amparada pelo marido quando reconheceu o
filho desacordado na maca.

— O que eu houve com ele? — Perguntou apavorada.

— Está tudo bem! — Repeti a frase do médico, mas não sei se consigo
tranquiliza-la, pois minha voz estava embargada pelo choro que lutava para
conter. Ela soltou-se dos braços do marido e foi até a maca.

— Meu amor, me perdoa — Suplicou enquanto segurava as mãos do


filho — Eu não fazia ideia de que ele reagiria assim, eu não fiz por mal —
Voltou-se para mim chorando descontroladamente.

— Não se culpe — Juntei a minha mão a sua — Ele vai ficar bem.

— Eu não imaginei que ele ficaria assim. Não tanto tempo depois...—
Beijou a mão do filho antes dos enfermeiros guiar a maca até a ambulância.

Um pequeno grupo de pessoas curiosas já se formavam para ver o que


estava acontecendo, muitas com o celular em mãos para registrar a desgraça
alheia, os seguranças afastaram todos impedindo o registro.

— Qual de vocês irá acompanha-lo? — O médico perguntou.

— Eu! — Respondi de imediato e voltei os olhos para Vilma para saber


se ela concordava.

— Tem certeza minha filha? — Fitou-me com carinho.

— Tenho! — enxuguei as lágrimas — Nos encontramos no hospital.

— Certo, iremos logo atrás de vocês — Alex tocou o braço da esposa que
assentiu. Antes de se afastar ela abraçou-me, um abraço apertado e
aconchegante, a gota d'água para que as lágrimas molhassem o meu rosto.

— Vamos? — o médico chamou mais uma vez. Afastei-me de Vilma e


entrei na ambulância que seguiu apressadamente para o hospital particular
mais próximo.
Fiquei na recepção preenchendo uma série de papeis enquanto
Alexandre era submetido a exames médicos. Cerca de uma hora depois não
havia nenhuma resposta, eu andava de um lado para o outro da recepção
acompanhada pelos olhares aflitos dos seus pais.

— Finalmente! — Soltei, quando o Doutor Cardoso apareceu.

— Ele acordou! — O médico informou, Vilma e o marido se abraçaram


sorrindo e chorando ao mesmo tempo — Os exames não indicaram nenhuma
lesão...

— Então podemos ir para casa? — Indaguei mais tranquila.

— Não. — respondeu calmo — O paciente acordou desorientado,


gritando frases incoerentes. Aplicamos um sedativo para que tivesse uma noite
tranquila.

— Podemos vê-lo? — Vilma indagou.

— Claro! — O médico indicou o corredor que nos levaria até o


Alexandre. Vilma e Alex levantaram-se rapidamente do banco.

— Você não vem, Gabriela? — ela voltou-se para mim.

— Eu vou pegar um café — menti — Chego depois.

— Certo — sorriu e saiu abraçada ao marido.

— Doutor, ele está realmente bem? — perguntei quando os pais do


Alexandre desapareceram no corredor — Ele passou muito tempo
desacordado...

— Ele está bem. Pode ficar tranquila — o homem de meia idade sorriu—
É um procedimento natural, ficar em observação depois de um longo tempo
desmaiado. E a senhora sente-se bem? — voltou-se para mim — Necessita de
algum medicamento para relaxar?

— Você tem algo que me faça esquecer toda a noite de hoje? — Soltei
junto uma lufada de ar.

— Não — sorriu — Mas, tenho um medicamento que ajudará a passar


por essa situação de forma mais serena...

Sedativos! Eu não quero ficar dopada para lidar com tudo isso. Eu não
quero não sentir. Eu quero entender o que está acontecendo... Quem é Yasmin?
Por que o Alexandre surtou daquela forma?

— Acredito que uma boa noite de sono será o suficiente.

— Quer ver com seus próprios olhos que seu marido está bem? Vamos!
— Indicou o caminho e eu respirei fundo antes de entrar no quarto branco.

Alexandre estava deitado na cama, sendo monitorado por uma


infinidade de fios, seu rosto estava ainda mais inchado, mas ainda assim ele
continuava bonito. Sua mãe estava sentada na poltrona ao seu lado, acariciando
a sua mão. Permaneci de pé próxima a porta sem entender muito bem qual era
o meu papel ali.

— Ele está bem, Gabriela — seu pai rompeu o silêncio.

Duas lágrimas escaparam do meu rosto e eu me apressei em secá-las.


Aproximei-me lentamente do Alexandre e toquei a sua mão.

— Você me deu um baita susto! — Confessei baixinho.

— Ele está bem, filha... — Sua mãe tentou me consolar.

Eu estava me comportando como uma mulher sem controle das próprias


emoções. Essa não era eu...

— Acho bom mesmo, pois assim que ele acordar, vou socá-lo para que
nunca mais faça isso comigo! — Forcei um sorriso.

— Não tem necessidade de ficarmos todos aqui — a voz do Alex chamou


nossa atenção — Acho melhor as duas irem para casa e tentarem relaxar. Eu
ficarei aqui com ele.
— Nada disso —Vilma discordou — eu que ficarei aqui.

— Não — neguei com cabeça — a semana foi exaustiva para você, Vilma,
cuidar dos preparativos do evento e a enxurrada de emoções hoje. Eu estou
bem e ficarei com ele — ela tentou protestar — qualquer coisa eu te ligo
imediatamente.

— Não vou mentir, os últimos dias foram extremamente cansativos. Mas


eu não posso deixar meu menino aqui.

Sorri com o modo que se referiu ao filho, um homem de mais de um


metro e oitenta era apenas um menino para a mãe.

— Eu cuidarei bem do seu menino — respondi ainda sorrindo.

— Sei disso, mas...

— Mas nada amor — o marido interveio — você precisa descansar, a


Gabriela passará a noite com ele, amanhã logo cedo voltaremos para cá.

— Ele tem razão. O médico disse que ele passará a noite toda dormindo,
não há porque ficar aqui.

— E você, meu bem? — fitou-me com carinho — Você parece tão


cansada...

Eu deveria mesmo parecer exausta depois de tantos acontecimentos


numa única noite.

— Vamos tomar um chá comigo e eu irei embora mais tranquila. —


Decidiu por mim.

Seguimos para a lanchonete do hospital, Vilma solicitou chá para ela e


chocolate quente para mim. Bebericamos nossas bebidas em silêncio, o líquido
quente esquentou aos poucos o meu corpo.

— A Yasmin era uma garota cheia de vida — A mãe dele começou a falar
após muito tempo em silêncio — Foi um grande choque para todos nós quando
foi diagnosticada com ELA.

Uma dor fina atingiu o meu peito. Yasmin era a garota do vídeo do
evento...

— Eles se conheceram na aula de inglês, bem novinhos, foi paixão à


primeira vista. Era tão bonito vê-los juntos — sorriu enquanto relembrava —
Sempre sorridentes e cúmplices.

Por isso, Alexandre reagira de forma descontrolada quando me referi a ela


como um segredinho sujo. As coisas começavam a fazer sentido...

— Alexandre, deve ter contado quando eles resolveram transformar


nossa casa num abrigo de animais... — Continuou perdida em lembranças —
Saio para o mercado e quando retorno havia doze gatos e seis cachorros na
minha área de serviço — sorriu — ela era apaixonada por bichos e meu filho,
enlouquecido por ela, atendia aos seus pedidos.

Tenho vontade de gritar: não, ele não me contou absolutamente nada! Não
sei nada sobre seu filho! Mas opto pelo silêncio, sei que o Alexandre nunca me
contará o que aconteceu e eu preciso saber mais para preencher todas as
lacunas em aberto.

— Eles estavam programando a primeira viagem juntos a Paris, quando


Yasmin começou a apresentar os sintomas iniciais da doença — seus olhos são
duas poças de lágrimas — uma ida ao médico e muitos exames depois o
diagnóstico os atingiu em cheio. Meu filho morreu junto com ela naquele ano,
meu doce menino transformou-se num arruaceiro, um garoto agressivo e
intempestivo.

Sinto minha garganta se fechando, perante o esforço que faço para não
chorar, mas o inevitável acontece, lágrimas escapam sem que eu tenha controle,
tento enxugá-las antes que ela perceba, mas é tarde. Pois, ela acaricia a minha
mão e me lança um olhar de afeto.

— Obrigada por despertar no Alexandre o amor que ele tanto tentara


esconder durante esses anos.

Mais lágrimas juntam-se as anteriores. Estávamos enganando a todos,


mas principalmente estávamos nos enganando. Alexandre não me amava e
agora eu duvidava que um dia fosse capaz de amar alguém como amou a
Yasmin. Os braços dela se estenderam ao redor do meu corpo e me apertaram
num abraço de mãe, choramos juntas, ali abraçadas.

Dois chás e um chocolate quente depois, seus pais foram embora. Não
voltei para o quarto, permaneci no corredor respondendo as inúmeras
mensagens a respeito do estado de saúde do Alexandre. A notícia havia se
espalhado rapidamente depois que a ambulância chegou no hotel. Ponho o meu
lado promoter a frente e redijo uma nota oficial informando que Alexandre
Fragoso Burnier apresentou um pequeno mal-estar, mas passa bem.

Menos um problema para os seus pais.

— Senhora, seu marido está te chamando... — Uma enfermeira


aproximou-se de onde estou. Ergui a saia do vestido longo e segui apressada em
direção ao quarto.

— Yasmin... Yasmin... Meu amor... — Alexandre chamava ainda


dormindo.

Suas palavras foram um soco no meu estômago. O que faltava para me


levar à lona. Nunca perdi o controle das emoções, mas agora, ouvindo Alexandre
chamar inconsciente por outra mulher, não consegui mais conter o choro preso
na garganta.

O desconforto em meu peito só confirmou todas as suspeitas que eu


tentava enterrar: eu estava apaixonada. Apaixonada por um homem
eternamente apaixonado por outra mulher.
Estou perdidamente apaixonado. Constato quando abro os olhos e
encontro os seus fitando-me com um sorriso nos lábios. Quando isso aconteceu?
Será que foi quando a sua amiga nos apresentou depois da aula ou quando ela
confessou que o Rio de Janeiro era o seu lugar favorito, mesmo querendo viajar
o mundo inteiro?

Deve ter sido quando as nossas bocas experimentaram uma a outra pela
primeira vez. Ou ainda quando o som da sua risada aqueceu o meu coração.

Puta merda!

Estou completamente apaixonado e assustado. Não assustado por temer


que o sentimento não será correspondido, mas sim por estar com medo da
intensidade do turbilhão de sentimentos presentes nesse momento.

Meu coração está acelerado no mesmo ritmo dos meus pensamentos. Diz
alguma coisa! Diz alguma coisa! Meu cérebro grita. Ela não vai saber que você a
ama se você não disser!
— Bom dia, dorminhoco — ela rompe o silêncio.

— Eu te amo! — As palavras saem rápidas e roucas. Pergunto-me se ela


as compreendeu, pois ela não reagiu! Ela não diz “eu também” de volta ou
esboça qualquer reação. Sua resposta vem, minutos depois, numa risada alta e
meu coração perde o compasso ao mesmo tempo que meu corpo aquece com o
som da sua risada.

— Eu digo que eu te amo e você ri? — indago sorrindo de volta.

— Você esperou estar numa cama de hospital usando essa camisola que
deixa a sua bunda exposta para dizer isso? — Arqueia a sobrancelha sorrindo
— Eu não quero esse eu te amo dito sob efeito de medicamentos. — Negou com
a cabeça e eu gelei — Você terá que encontrar uma oportunidade melhor de
dizê-lo, quem sabe: Paris, Dubai, Veneza? — sorriu e eu soltei o ar que prendia
assustado.

— Vem cá! — peço com a mão para que ela se aproxime da cama e ela
caminha a passos lentos em minha direção, parando ao lado da cama, toco seu
rosto antes de prosseguir — Eu terei oportunidade de repetir esse eu te amo
diversas vezes e em todos esses lugares que você mencionou. Mas agora deixe-
me confessar os meus sentimentos — uma lágrima solitária escapou dos seus
olhos e eu enxuguei-a delicadamente — eu não sei dizer o exato momento que
eu me apaixonei por você, nem se foi pelos seus belos olhos ou pelos seus
peitos...

— Que linda forma de declarar o seu amor! — Socou o meu braço de


brincadeira.

— Sério — sorri de volta — Não sei se amo mais seus peitos, olhos ou
bunda! É um páreo duro — ela atingiu o outro braço e soltei um gemido de dor.
O local estava imobilizado por uma tipoia.

— Desculpa! — pediu arrependida de ter me batido naquele braço.

— Definitivamente não é o seu jeito doce de reagir aos meus


sentimentos — sorri alto e ela revirou os olhos.
— Eu apenas sei que te amo — cocei a cabeça, como era difícil traduzir
em palavras os sentimentos — Isso já é o suficiente, né? — indaguei sorrindo.

— É um começo — sorriu de volta — Eu também não sei por que te amo!


Não sei por que fui me apaixonar por um mulherengo assumido — revirou os
olhos.

— Com você ao meu lado eu não preciso de mais ninguém!

— Acho bom! — sorriu — Acho muito bom!

— Quer ser minha para o resto da vida? — meu pedido a pega


desprevenida que apenas reage abrindo a boca e fechando por diversas vezes
seguidas, incapaz de proferir uma única palavra. — Quer ser a mãe dos meus
filhos, a minha companheira e amante? Quer comemorar todos os meus
aniversários ao meu lado e ser o melhor presente que a vida poderia me dar?

Sua resposta não veio com palavras, mas sim num beijo doce e sedento,
daqueles que dissipam todas as dúvidas e preenchem todas as lacunas. A dor
que eu sentia do seu corpo sobre o meu braço imobilizado era diminuída por
seus beijos, lágrimas escorriam da sua face e molhavam o meu rosto.

— Eu te amo, Alexandre!

— Eu que te amo, Yasmin. — Confessei antes de beijar a sua boca mais


uma vez e selar com um beijo nosso amor.

Acordei desnorteado. O coração acelerado e a respiração ofegante. Tudo


não passou de um sonho. Mas por que eu sintia o gosto do seu beijo? Por que
posso fechar os olhos e sentir que ela acabou de passar por aqui?

Talvez, se eu deitar e fechar os olhos, ela volte para mim... Volte para a
sua família e nos alegre com a sua risada... A quem eu estou querendo enganar?
Minha cabeça e meu corpo doem como se eu estivesse de ressaca. Mas o que
sinto, não deixa de ser uma ressaca, pelo menos não alcoólica.

Estou numa cama de hospital com fios monitorando o meu coração, no


braço direito está sendo administrado uma medicação por via endovenosa, o
que significa que uma agulha impede a minha movimentação.
Meus olhos percorrem o ambiente e notei a Gabriela dormindo encolhida
no sofá-cama, seus cabelos loiros espalhados pelo assento pareciam um quadro
emoldurando seu belo rosto. Uma súbita vontade de tocá-los e me aconchegar
ao seu lado surgiu dentro de mim.

Mas tudo o que eu realmente precisava era sair dali o quanto antes.
Livrei-me dos fios contra o meu peito com facilidade, o mesmo não aconteceu
com a agulha e reprimi o grito de dor quando a mesma saiu do meu corpo.
Levantei-me para vestir uma roupa e sair dali o quanto antes, mas cambaleei e
esbarrei na cama na tentativa de me segurar e não cair. O barulho acordou
Gabriela que, sobressaltada, correu em minha direção.

— Está tudo bem! — Falei segurando-me na cama.

— Onde você acha que vai? — Ajudou-me a sentar.

— Eu quero ir para casa — respondi sem fitá-la.

— O médico ficou de passar agora pela manhã — informou — Quer que


eu te acompanhe até o banheiro? O Assis trouxe roupas...

— OK — Fechei os olhos ao sentir a minha cabeça doer.

— Você foi acertado por um dos seguranças, lembra?

Se eu lembro?

Recordo de todo o horror que foi a noite anterior. Da arma apontada


para ela, do imbecil do segurança segurando-a e de ser atingido na cabeça e cair
aos seus pés. Só não recordava de como fui parar no hospital. Antes que eu
pudesse responder, uma enfermeira acompanhada de uma funcionária, entrou
no quarto empurrando um carrinho com o café da manhã.

— Bom dia — a enfermeira voltou-se para mim — Sente-se melhor,


Alexandre? — indagou e eu assenti com a cabeça. — Ótimo, vou retirar a
medicação endovenosa e você tomará analgésicos... — olhou para meu braço e
constatou que eu já tinha o feito — Pelo visto, temos alguém com muita pressa
de ir para casa — a mulher constatou.
— Quando terei alta? — perguntei.

— O médico já está a caminho. — Limitou-se a responder.

— Tenha uma boa refeição. — As mulheres saíram deixando-nos a sós


novamente.

— Você precisa comer... — Gabriela acomodou uma bandeja com sopa


entre as minhas pernas. Comi em silêncio toda a sopa e depois engoli os
analgésicos que ali estavam.

— Eu te machuquei ontem?

— Não — ela negou — você apenas me assustou ontem à noite...

— Tem certeza que eu não te feri, mesmo sem querer?

Quando as lembranças da noite anterior vieram, me vi aflito com essa


possibilidade. Recordo-me de agarrá-la pelos braços com força. Eu não me
perdoarei se, mesmo que de forma não intencional, eu tiver machucado uma
mulher.

— Não machucou e você mesmo pode conferir se olhar para mim —


pediu e pela primeira naquele dia olhei diretamente em seus olhos, que estavam
inchados e vermelhos, como se tivesse chorado durante toda a noite — Está
tudo bem, Alexandre! — Forçou um sorriso.

— Não, não está — discordei — eu poderia ter machucado você, estava


descontrolado.

— Mas não o fez! — Negou veementemente — Se você fez mal a alguém


ontem foi a você mesmo. Eu fiquei desesperada com aquela arma apontada em
sua direção. Você tem noção do quão imbecil você foi ontem à noite? — indagou
irritada.

— Gabriela, quero que se sinta à vontade para ligar para o seu advogado
e pedir o divórcio.

Ela me olhou boquiaberta e demorou alguns segundos para responder.

— Por que tenho a impressão que está fugindo de mim? — perguntou


sentando a minha frente na cama.

— Não estou fugindo, — menti — mas não quero que continue presa a
mim depois de tudo que aconteceu ontem.

— Alexandre, eu... — hesitou — Sua mãe me contou...

— Claro! Agora você sabe o segredinho sujo da minha família — ironizei,


lembrando das suas palavras.

— Desculpa, eu nunca iria me referir a ela dessa forma se soubesse que...

— Que morreu com apenas dezoito anos?

— Não — prosseguiu — se eu soubesse que você a amava. Eu não fazia


ideia que aquela moça tivesse sido a sua namorada...

— E não tinha mesmo por que saber, a minha relação com a Yasmin
é minha — apontei para meu peito — Não vou dividir com você nada além do
que minha mãe já contou.

Levantei da cama e peguei uma muda de roupa na poltrona ao lado.


Segui para o banheiro, eu precisava sair dali o quanto antes. Eu precisava ficar
só com os meus pensamentos. Não queria dividir essa parte da minha vida com
ninguém, em especial com a Gabriela.

— Sua mãe não fez por mal — falou do outro lado da porta — Ela
presumiu que eu sabia, já que sou sua esposa. — Completou e esperou alguma
resposta minha que não veio, por isso continuou — Ela era muito importante
para você, eu sei disso e...

Abri a porta e a encontrei de braços cruzados contra o corpo, seus olhos


azuis fitava-me em expectativa.

— Sabe? — arquei a sobrancelha — Você já amou alguém o suficiente


para desejar dar a sua própria vida em troca da vida dessa pessoa? Já viveu uma
relação de verdade com alguém do sexo oposto, que não seja apenas carnal?
Alguma vez na sua vida você fez planos de passar a vida inteira com a mesma
pessoa? — Disparei de uma única vez todas as perguntas sem desviar os meus
olhos dos seus — Pelo seu silêncio, presumo que não — sorri amargamente. —
Então não me dê a porra da sua opinião a respeito da importância dela na
minha vida, você é incapaz de compreender, Gabriela, completamente incapaz.

Despejo as palavras sobre uma Gabriela inerte e afasto-me. Sigo para


longe desse turbilhão de dor, sentimentos e emoções.
Em choque!

Estou completamente em choque depois de ouvir tudo aquilo da boca do


Alexandre. Não sei se o que me afeta tanto sãos as suas palavras duras ou a
minha inércia perante seus ataques. Em qualquer outro momento, ou com
qualquer outra pessoa, eu já teria rebatido as acusações, mas com ele tudo o
que eu fiz foi ficar calada. Paralisada enquanto ele me atingia de uma forma
dolorosa. Talvez, o motivo da inércia seja saber que aquilo era verdade. Eu
sempre estive em primeiro lugar na minha vida. Nunca sequer cogitaria sobre
dar a minha vida por outra pessoa, me doar ao ponto de não me pertencer...

Até vê-lo caído aos meus pés. Desacordado. Ali, o mundo mudou de
perspectiva e eu me vi preocupada, desesperada até. E se ele não acordasse? O
que seria de mim sem o homem que conseguiu arrancar o meu chão e organizar
a minha desordem?

Eu seria Gabriela Burnier, claro. E ao constatar que ele estava bem ao


ponto de me ferir, era tudo que eu precisava ser.

O médico surgiu no quarto algum tempo depois, eu ainda estava parada


de pé sendo golpeada com as palavras, para ver o Alexandre sair. Como o
paciente não estava mais ali, assinei um termo de responsabilidade por ele ir
embora antes da autorização médica, já que eu ainda era a droga da sua esposa.
Segui para o meu apartamento levando comigo a carteira e celular do
Alexandre, na pressa de livrar-se de mim ele deixou para trás seus itens
pessoais.

Ele estava no apartamento ao lado. Eu sabia disso graças ao Assis, que


me ligou para informar que assim que o patrão saiu do hospital, pediu que ele o
levasse até lá. Assis foi sucinto ao me passar essas informações, provavelmente
queria apenas me tranquilizar, acrescentou ainda que a senhora Vilma e o
senhor Alex já sabiam do paradeiro do filho. Um problema a menos para eu me
preocupar.

Cansada emocionalmente e por ter dormido mal na noite anterior,


apaguei assim que deitei na minha cama.

Estou vestida de noiva novamente. Entro na igreja lotada e a cada passo


em direção ao altar, reconheço o rosto das minhas amigas, amigos e familiares.
Mas não consigo ver o noivo.

A marcha nupcial ecoa por toda a igreja e se une as batidas do meu


coração, em um ritmo perfeito. Mas a cada passo que eu dou, o altar fica mais
longe. Aumento o ritmo dos passos e escuto o cochichar das pessoas, estou
quase correndo no tapete vermelho. Quero chegar logo ao lado dele, quero
olhar nos seus olhos e saber que está tudo bem. Já estou perto o suficiente para
ver o altar, mas ele não está ali, não o vejo em lugar nenhum.

— Onde está o Alexandre? — indaguei para Vilma.


— Gabi, meu amor... — tocou minha mão antes de continuar a falar numa
voz tomada pela tristeza — ele pediu para te entregar isso. — Estendeu-me um
papel dobrado. Segurei o papel com as mãos trêmulas e meus olhos não
acreditaram nas palavras ali escrita:

Gabriela, não posso casar com uma mulher que não amo. Espero
que compreenda a minha decisão. Adeus.

Amasso o papel e jogo-o no chão antes de sair em disparada para fora da


igreja, corro o mais rápido que as minhas pernas permitem. A limousine que me
trouxe até aqui me espera em frente à igreja. Movo a mão para abrir a porta,
mas ela é aberta antes e encontro o Alexandre vestindo um elegante terno. Ele
sorri para mim e em meio às lágrimas, sorrio de volta, no fundo eu sabia que ela
não me abandonaria, não depois de tudo que vivemos.

— Finalmente você chegou, amor! — disse sorrindo abertamente.

— Querida, você pode me dar licença, meu noivo me espera! — uma voz
feminina surge atrás de mim e eu não preciso virar para reconhecer a dona da
voz.

— Você não recebeu meu recado, Gabriela? — Alexandre indaga antes da


mulher empurrar-me para entrar no carro.

— Acho que a idade além de te deixar surda, te deixou cega — Bruna


gargalha e senta ao lado do Alexandre, esmagando a sua boca num beijo
demorado. — Por mais que eu adore ver você sofrendo, nós temos um
casamento para ir, o nosso né amor? — indagou sorrindo para um Alexandre
que a olhava em adoração.

— Adeus Gabi! — ele se despediu e o carro se afastou, me deixando ali


para trás com minhas lágrimas.

Caralho! Acordei sobressaltada com esse sonho... Ou deveria chamar de


pesadelo? Estou suada, mesmo com o ar condicionado no máximo. Levei as
mãos aos cabelos e inspirei fundo para controlar a respiração acelerada.

Que porra foi essa?

Ouvi passos do lado de fora do meu quarto, o que significava que eu não
estava sozinha. Talvez o Alexandre tenha vindo para pegar seus pertences e
conversar... Levantei-me rapidamente e segui em direção ao barulho, mas não o
encontrei na cozinha... Era a Carmem quem estava ali.

— O que você faz aqui? Como entrou? — indaguei.

— Tenho uma chave-cópia — respondeu sorrindo.

— Que horas são?

— Dezoito e trinta! — Informou após consultar o seu relógio de pulso.

— Cacete! Eu dormi por mais de oito horas seguidas e ainda me sinto


cansada... — me espreguicei.

— É natural depois de tudo que aconteceu... — desviou o olhar do meu e


voltou-se para o micro-ondas — Providenciei uma refeição leve e saborosa
como você gosta — apontou para a salada de rúcula acompanhada de frango
grelhado. Meu estômago roncou lembrando-me que não ingeri nada desde o
chocolate quente.

— Obrigada — agradeci sentando na banqueta em frente ao prato — O


que sabe sobre Yasmin? — Indaguei antes de levar o garfo a boca.

— Talvez menos que você. Trabalho a seis anos para o Alexandre —


fitou-me e vi verdade em seu olhar — Só ouvi o nome dessa mulher uma única
vez durante uma discussão familiar.

— Humm... — Emiti perdida em pensamentos. Yasmin com certeza era o


motivo real para o testamento dos pais do Alexandre. Eu até compreendia,
diante do que já vivenciei, o porquê seus pais impuseram um contrato
obrigando-o a casar.

— Gabriela, seu telefone está tocando — Carmem retirou-me dos seus


pensamentos — Aqui o aparelho.
— Obrigada — olhei o visor e vi que era ligação do "Marcos da Fê" —
Aconteceu algo com a Fernanda? — atendi a ligação com essa pergunta.

— Não — sorriu e voltei a respirar normalmente — Estamos em São


Paulo na casa dos meus queridos sogros. Eu liguei para saber do Alê, estou
ligando para ele e não atende.

— Ele está bem.

— Não minta para mim, Gabi... — Seu tom baixo indicou que ele ligava
escondido em algum dos cômodos da mansão — Acabei de receber por
mensagem a nota que você publicou sobre o mal-estar do Alexandre. O que
aconteceu de fato? O quarentão enfartou?

— Não! — fui enfática — Seu amigo teve uma queda de pressão e


achamos melhor levá-lo para o hospital — menti.

— E por que o viado não atende as minhas ligações?

— Está sob efeito de medicamentos, passou o dia dormindo. — Menti


mais uma vez.

— Eu só volto para o Rio na segunda pela manhã, mas posso antecipar a


minha volta se ele estiver precisando de mim...

— Não se preocupe, ele está bem! Curta o resto da sua folga ao lado da
sua esposa gata e deixe que eu cuido do quarentão aqui.

— Tá certo — sorriu — Qualquer coisa me liga, tá?

— Pode deixar que ligo sim. Beijo. — Encerrei a ligação e encarei o prato
a minha frente. Havia perdido a vontade de comer.

— Não vai comer? — Carmem perguntou quando levantei.

— Perdi a fome, vou tomar um banho — passei por ela e segui para o
quarto.

Um banho rápido depois, encontrei Carmem segurando uma bandeja


com um prato coberto, ela estava quase saindo do apartamento.
— É para o Alexandre? — ela assentiu — Deixa que eu levo! Tenho que
devolver o celular dele e a carteira — peguei a bandeja da sua mão. Era a
desculpa perfeita para eu ver como Alexandre estava.

— A chave-cópia está no seu chaveiro. — Informou como se adivinhasse


meus pensamentos.

Abri a porta do apartamento dele e lá dentro tudo estava silencioso e


escuro. Escuridão total, na verdade. E silêncio absoluto. Chegava a ser
assustador. Acendi as lâmpadas e chamei pelo seu nome. Não ouvi nenhuma
resposta e caminhei em direção ao quarto, ignorando totalmente a sua falta de
decoração.

— Alexandre, sou eu Gabriela! Trouxe comida que a Carmem


providenciou. — Eu falava para a porta e não obtinha nenhuma resposta, levei a
mão a maçaneta, mas ela estava trancada — O Marcos ligou... Está preocupado
com você...

Nenhuma resposta.

— Vou deixar a comida na cozinha. Ah... O celular e a carteira que você


acabou deixando para trás também.

Eu estava, literalmente, falando com uma porta. Por isso decidi dar fim
ao monólogo e parar de bancar a idiota compreensiva.

— Eu estou indo para o meu apartamento, se precisar de alguma coisa


me ligue! — me despeço da porta com desgosto e volto para casa.

Dispensei a Carmem com um agradecimento por tudo que fez no dia e


me joguei no sofá. Toda vez que eu piscava, os nomes Alexandre e Yasmin
surgiam em néon pink. A sequência de imagem que o vídeo no evento mostrou,
não saía da minha cabeça... Isso não podia continuar.

Por isso, enviei uma mensagem para Dan, meu personal trainer, e
perguntei se poderíamos antecipar a nossa aula. Ele trabalhava numa academia
que funcionava vinte e quatro horas e por sorte, hoje era seu dia de plantão lá.
Corri para vestir uma roupa apropriada e saí em tempo recorde.
— Senhora Fragoso, quer dizer Gabriela — Assis se corrigiu
imediatamente — Vai sair? — indagou quando me viu caminhando em direção
ao estacionamento.

— Sim, estou indo malhar.

— Eu levo você!

— Não precisa, vou com meu carro. Já não é hora de você ir para casa?

— Não se preocupe, eu estou aqui para garantir qualquer coisa que o


senhor Alexandre precisar.

— Certo... Você tem certeza que ele ainda está lá dentro? Será que não
saiu sem você perceber? Pergunto por que eu fui até o seu apartamento, bati na
porta do seu quarto, mas nenhum sinal de resposta dele.

— Ele não saiu desde que chegou aqui. De qualquer forma estarei aqui
de vigia.... E já avisei a portaria para nos comunicar caso ele passe por lá.

— Certo... Qualquer coisa você me liga.

Dirigi até a academia com o único intuito de liberar a endorfina no meu


organismo, não queria voltar para casa e pensar. Fiz trinta minutos de esteira,
incontáveis abdominais, supino e uma aula experimental de zumba.
Experimental e particular já que não tinha quase ninguém surtando aquele
horário na academia. Depois que eu estava suada e exausta, decidi que era uma
boa hora para chegar em casa e cair na cama.

Assim que estacionei meu carro, encontrei Assis conversando com o


porteiro, o pobre homem estivera o dia todo ali vigiando o patrão e precisava
descansar. Por isso, ordenei que fosse para casa ou ao menos subisse para
dormir no quarto de hóspedes, mesmo sob muito protesto ele cedeu e decidiu ir
para a sua casa descansar. Reforcei o pedido ao porteiro que me ligasse
imediatamente caso Alexandre saísse do prédio.

Abri a porta e estranhei o escuro. Não lembrava de ter apagado a luz


antes de sair... Ao acender, quase caí para trás.
— Porra! — Gritei levando a mão ao peito.

— Não tive intenção de te assustar — Alexandre se desculpou numa voz


pausada, levemente embriagado.

Ele estava sentando no meu sofá segurando um copo de Whisky. Usava


calça e camisa de tecido na cor preta. Mas, não era a escolha sombria da roupa
que mais chamou a minha atenção e sim o uso de óculos de sol a essa hora. Ele
realmente não estava bem.

— Você poderia ao menos ter ligado à luz ...

— Tem medo de escuro, Gabriela? — indagou sorrindo.

— Não é medo. Apenas não gosto de andar sem saber onde estou
pisando.

— Boa resposta para camuflar o medo do escuro — apontou para mim


sorrindo mais uma vez.

Mas não era um sorriso franco. Sua expressão não acompanhava o


curvar dos seus lábios, seu queixo e mãos estavam rígidos. Embora ele
aparentasse estar relaxado, seu corpo indicava completamente o contrário. O
que eu via a minha frente era um homem querendo fingir que nada aconteceu.

— Agora temos academia na Carpe Vita? — largou o copo sobre o sofá e


apontou em minha direção, eu usava uma legging pink e um top branco.

— Não estava na boate.

— Hum... Eu vim te convidar para almoçar.

— É quase meia-noite.

— Amanhã.

— Claro — concordei — Mas só se conversamos hoje.

— Não temos nada para conversar — se esquivou.

— Você sabe que temos.


— Eu conheço um restaurante marítimo. Tenho certeza que irá adorar
— sua voz era mecânica, sem emoção — Eu andei pensando... Nós poderíamos
tirar o resto da semana de folga e sair no meu iate por aí. — Completou e
levantou-se do sofá, indicando que tinha acabado de fazer o que o levou até ali.
Os óculos na sua face impediam-me de fitar os seus olhos e constatar que ele
estava tão perdido em pensamentos quanto eu.

— Onde você vai, Alexandre? — indaguei quando ele caminhou até a


porta.

— Trabalhar, oras — deu de ombros.

— Há essa hora? — Questionei.

— Deus ajuda quem cedo madruga! Não é o que diz o ditado?

Forcei um sorriso. Ele não estava bem, não podia estar. Não sou
psicóloga e estou bem longe disso, mas em menos de vinte e quatro horas eu o
vi surtar, chorar, brigar, se trancar do mundo e agora ignorar tudo isso e fingir
que nada aconteceu.

Não, eu não podia conviver com isso. Não depois de ser atingida por um
trem desgovernado. Não depois de ser revirada do avesso e exposta. Mas eu não
sabia o que fazer, tampouco o que dizer e por isso apenas olhei para a porta
depois que ele saiu.

A imagem do dia que nos conhecemos invadiu a minha mente e eu fiz o


que achava ser a melhor coisa, mandei uma mensagem:

Marcos, o Alexandre precisa de você.

Desliguei o aparelho, tomei mais um banho e me perdi nos lençóis da


minha cama.

Amanhã eu retomaria as rédeas da minha vida.


Saí do apartamento da Gabriela e segui para o estacionamento. No carro,
sintonizei numa rádio qualquer e clássicos da música popular brasileira
preencheram o silêncio, minutos depois. Dei a partida e segui em direção a
imobiliária.

Dessa vez, optei pelo caminho mais longo, peguei o trecho da orla e
deixei que a brisa do mar entrasse pela janela aberta. Dirigi em modo
automático até o escritório. Sou apenas um corpo executando funções. Se
alguém me abordasse e perguntasse o meu nome completo, eu seria incapaz de
responder. Estou completamente adormecido, o efeito de horas e horas
mergulhado na mais completa escuridão e tendo como companhia uma garrafa
de Whisky, me deixou pronto para recomeçar.

Eu era bom nisso. Em recomeços. Eu vivia recomeçando na minha vida.


Eu fazia valer a máxima do ditado "quando a vida te der um limão, faça uma
caipirinha". Por isso, vida que segue. Irei enfiar minha cara no trabalho e
continuar de onde eu parei com a Gabriela, funcionávamos bem juntos, a nossa
trégua estava sendo um bom período depois de tantas turbulências que
passamos. Um almoço em alto mar deixaria nós dois novamente na mesma
frequência e, consequentemente, na mesma cama.

No rádio, me perco na letra da música que fala sobre esperança, fé,


sonhos... Tudo que eu acreditei veementemente na minha vida. A vida é tão
mais simples quando você é jovem. Não sou uma pessoa nostálgica, pelo
contrário, guardei meu passado durante muitos anos à sete chaves, pois lá é o
lugar dele: no passado. Eu apenas acredito que quando você tem vinte anos a
menos, você sonha mais! Sonha com o beijo da mulher dos seus sonhos, sonha
acordado ao lado de amigos, falando sobre viagens épicas e inimagináveis que
nunca acontecerão. Sonha que dali a vinte anos será uma pessoa realizada, que
todos os seus anseios terão se dirimido. E ninguém ousa dizer que não.
Ninguém diz a um jovem que pare de sonhar. A vida é complacente com você
nessa idade. Nutrir esperanças e sonhos é o que faz o jovem acordar todos os
dias e viver. Acreditar que até os sonhos mais íntimos poderão ser realizados,
afinal você é jovem! Tem um mundo pela frente.

Eu era esse jovem. Um jovem repleto de sonhos. Escrever um livro,


plantar uma árvore, ter um filho, construir uma casa na árvore, acordar cedo
para preparar café da manhã, falar inúmeras bobagens só para ouvir o som da
sua risada todos os dias, passar o domingo no parque, percorrer o mundo com
uma mochila nas costas e a sua mão enlaçada a minha... Esse e tantos outros
sonhos bobos estavam na minha lista de desejos. Desde que ela estivesse ao
meu lado, eu estaria feliz. Não importava se comendo macarrão com salsicha no
almoço de domingo ou a luz de velas por que esquecemos de pagar a conta de
luz. Se ela estivesse ao meu lado e feliz, tudo valeria a pena.

O tempo passou e com ele os meus sonhos. Substituí escrever o livro, por
escrever o meu número de fodas na minha agenda. Se um dia eu quisesse, talvez
até pudesse escrever uma crônica sobre as melhores fodas da minha vida.
Troquei a salsicha no almoço por refeições caras e saborosas, tendo como
sobremesa mais uma mulher que viraria mais um número, horas depois. Luz de
velas? Só se fosse algum fetiche sexual de uma das minhas parceiras. Isso se a
foda valesse a pena, caso contrário, eu discaria um novo número e vida que
segue. Desde que, ao fim da noite, eu terminasse dentro de uma mulher e ela
estivesse gozado gritando o meu nome o dia teria valido a pena.

Em resumo, o que fiz foi trocar meus sonhos por objetivos. Com o passar
dos anos os sonhos passaram a não fazer parte da minha vida, não significa que
eu deixei de almejar as coisas. Meus anseios agora eram palpáveis: realizar uma
festa memorável de aniversário, trocar de carro, comprar um iate, conseguir
levar a ruiva para a minha cama. Eu agora desejava coisas possíveis de
acontecer.

Por isso, quando propus a Gabriela que passássemos um tempo longe de


tudo, não era um sonho que eu nutria. Eu nunca sonhara em largar a boa vida
que construí para curtir férias fora de hora. Era apenas um propósito, uma
desculpa racional que encontrei para fugir do meu passado.

Desliguei o rádio, pois a essa canção me fez pensar e eu não quero


pensar. Quero agir! Quero ser o Alexandre de três dias atrás, o homem seguro
de si e que, por ironia do destino, estava casado com uma loira espetacular. Uma
mulher que aquecia minha cama e era habilidosa com a boca. Se todos os meus
planos dessem certo, eu passaria as próximas horas fodendo a Gabriela até
apagarmos exaustos.

Assim que desço do carro em frente à imobiliária, um dos seguranças


que fazem a ronda noturna se aproxima de onde estou. A luz da lanterna atinge
os meus olhos e levo as mãos para protegê-los dessa claridade inesperada. Meu
rosto está fodido, meus lábios estão cortados e ao redor dos meus olhos
olheiras escuras competem com o roxo dos socos que recebi. Tudo isso indicava
o inferno que passei nesses últimos dias.

Foi por esse motivo, que quando fui conversar com a Gabriela eu usava
óculos, sem me importar que a noite os usasse, foi a ideia imbecil que eu tive
para esconder boa parte do estrago e evitar que ela me olhasse com pena. Mas,
não adiantou. Por mais que ela tivesse disfarçado, seus belos olhos azuis
fitavam-me apreensivos. Por isso, os abandonei assim que entrei no carro, pois
o quanto antes as pessoas olhassem como eu já estava fodido, evitariam se
dirigir a mim com falsas felicitações de melhoras. A essa altura eu tinha certeza
que o meu incidente no Copacabana já havia virado notícia.

— Sou eu, Alexandre Fragoso — informei antes que o forte homem me


atacasse. Eu não estava em condições de reagir.

— Perdão, senhor Fragoso. Eu não te reconheci... — O segurança


cumprimentou-me desorientado. Deveria estar estranhado a minha presença
ali.

— Sem problemas! — dei de ombros.

— O senhor precisa de alguma coisa? — o homem perguntou solícito.

— Não — neguei e caminhei em direção a entrada do escritório seguido


pelo homem.

Tudo estava fechado, o que era óbvio para o horário, mas foi somente em
frente à porta fechada que eu me dei conta que não tinha comigo a chave
principal do escritório. Eu carregava junto ao meu chaveiro, a chave cópia da
minha sala, do meu apartamento e do da Gabriela, das minhas casas, mas não da
empresa. Sempre que eu chegava aqui o lugar já estava aberto e em pleno
movimento.

— Quer dizer... — me voltei para o homem — Preciso que libere a minha


entrada.

— Claro! — o homem usou a própria chave, digitou a senha e em poucos


segundos eu estava dentro da minha empresa.

— Deseja algo mais, senhor Fragoso? — indagou. Neguei com um aceno


de cabeça e afastei-me em direção a minha sala.

A cada passo que eu dava as luzes acendiam devido ao sensor de


movimento. Quando cheguei a porta da minha sala, tudo atrás de mim era
escuridão.

Antes de me inteirar do trabalho acumulado, fui até o bar e servi-me de


Scott, a bebida desceu esquentando tudo pela frente, era o que eu precisava
para sentir-me acordado. Desliguei o celular e joguei-o em cima dos papéis
enquanto eu escolhia algo para preencher o silêncio, optei por um rock pauleira,
elevei o volume até o máximo. A voz gutural e os acordes enérgicos das
guitarras não permitiam que eu pensasse com clareza. Agora sim, estava tudo
bem...

Bebi mais uma dose e comecei a analisar a planilha à minha frente. Os


meus olhos veem gráficos e mais gráficos, mas o meu cérebro não acompanha o
que os meus olhos veem. Não consigo decodificar o que vejo, pois o meu cérebro
parou de funcionar. E por mais que eu não queira pensar nela, flashes e mais
flashes de tudo o que vivemos surgem sem que eu consiga evitar.

Eu quero que você se lembre de mim sorrindo...

Era fim de tarde, e o vento do outono tocava seus cabelos ondulados que se
moviam feitos ondas no mar. Com um enorme sorriso no rosto e de mãos dadas,
caminhávamos juntos. Estávamos voltando da escola em silêncio, apenas gozando
um da companhia do outro. A nossa conexão era tão forte que não necessitava de
sons para que pudéssemos nos comunicar. Uma troca de olhares, um aperto de
mão, um menear de cabeça eram mais que suficientes para que
compreendêssemos um ao outro.

Éramos como hieróglifos, um segredo para quem estava do lado de fora,


somente nós conseguíamos definir e traduzir nosso amor. Um amor que possuía
uma linguagem própria, ora repleto de sons e cores, ora silencioso e
monocromático.

O ensino médio estava chegando ao fim e com ele tantas incertezas do que
seríamos, que profissão seguir, que curso prestar no vestibular. Yasmin sempre
soube o que queria ser, a sua vocação estava estampada no seu rosto e gravada no
seu coração. Ela seria veterinária, seus olhos brilhavam quando falava do seu
sonho de construir um canil para receber os animais abandonados. Também
falava repetidas vezes que faria cirurgias de graça nos animaizinhos das pessoas
mais necessitadas. Era idealista e eu achava isso tão bonito, queria ser um terço
do que ela era para ser digno de estar ao seu lado.
Eu costumava brincar que me apaixonei pelos seus peitos, mas a verdade
era que eu me apaixonei pelo seu sorriso, pelo brilho no seu olhar quando queria
algo, pela sua determinação em correr atrás dos sonhos. Eu amava Yasmin por
completo, amava o coração gigante que ela tinha, um coração que amava todos
sem distinção, um coração do tamanho do mundo. Um coração que batia
descompassadamente a cada vez que me beijava e que me fazia o homem mais
feliz do mundo, por ser alvo do seu amor.

— Amor, para! — Yasmin paralisou e fiquei em estado de alerta. Estava


tão perdido nos meus pensamentos que esqueci o mundo a nossa volta. Suas mãos
soltaram as minhas e ela correu em direção a lata de lixo na calçada.

— O que houve? — indaguei chegando perto.

— Eu ouvi um gemido fraco, deve ter algum filhote aqui! — sua voz estava
apreensiva, mas ela não pensou duas vezes em agir, levou as mãos até os sacos de
lixo e ergueu um saco grande preto. Dessa vez, os gemidos se intensificaram e
quando eu a ajudei a abrir o saco havia quatro filhotes magricelos de gatos
abandonados. Eles tremiam e deixavam escapar um miado fraco. Um pedido de
socorro.

— Precisamos levar para casa e cuidar deles. — Seus olhos me fitaram


marejados, as lágrimas rolando pela sua face. Nesse momento eu odiei o filho da
puta que fez isso com os filhotes, pois além de ferirem animais indefesos, estava
ferindo a mulher que eu amava. E eu não suportava vê-la sofrendo.

— Vamos levar para a minha casa, lá tem mais espaço — falei decidido.
Depois eu me resolveria com a minha mãe, o atual apartamento que Yasmin
morava não permitia mais que três animais por recinto, e lá já estavam seis
filhotes vira-latas que aguardavam um lar definitivo.

— Obrigada, amor! — Acariciou a minha mão entre lágrimas.

— Vamos antes que eu desista e deixe esses gatos aqui — seus olhos me
encararam em espanto — Ué, eles serão acariciados por suas mãos pelas
próximas horas, não consigo conter o ciúme — dei de ombros.

— Seu bobo! — sorriu e aproximou o rosto do meu — Eu irei incluir você


na minha lista de carícias.

— Acho bom! — sorri antes de colar minha boca a sua.

— Agora vamos, que temos filhotes para salvar. — Sorriu abertamente e


como não podia ser diferente, eu sorri de volta e tratei de agir. Retirei meus livros
do bornal e depositei com cuidados os filhotes ali dentro. Seguimos para minha
casa e lá passamos as próximas horas cuidando dos gatinhos.

Quando deixei Yasmin na sua casa, ao fim da noite, e me preparava para


voltar para a minha, sabia que escutaria a maior bronca da minha mãe, pois
agora tínhamos no nosso quintal, ao total, doze gatos e seis cachorros. Mas sabe o
que era mais engraçado? Eu iria escutar tudo com um maldito sorriso nos lábios.
Sorriso esse que Yasmin colocou quando disse que eu era o seu super-herói
favorito, o AlêPet, o salvador de animais. Não sei se o sorriso que permanece até
agora nos meus lábios é porque o nome era ruim para caralho, ou por que ela
disse que eu era o seu salvador. Seja lá qual fosse o real motivo eu estava feliz,
muito feliz.

Merda! Estou pensando novamente.

Empurrei o notebook e tudo o mais que estava na minha mesa com força.
Malditos pensamentos que surgiam feito avalanche. Era doloroso demais
reviver cada lembrança. Mesmo as mais felizes. Em segundos elas se tornavam
tristes, pois todo mundo sabia que a nossa história não havia tido o final feliz
que merecíamos.

Hic et nunc.

Eu precisava voltar a viver o “aqui e agora”. Pela minha sanidade, era


preciso enterrar tudo isso mais uma vez e continuar existindo. E quem melhor
do que a Gabriela para me ajudar?

Levantei, perdido em emoções e pensamentos, em busca do cheiro e do


gosto que me faria adormecer exausto. Dirigi em alta velocidade contando os
segundos para chegar no apartamento dela, mas precisei reduzir a velocidade
ao avistar as luzes vermelhas e azuis que indicavam uma blitz próxima. Estava
há poucos quilômetros de casa, mas precisei obedecer as instruções do policial
e estacionar. Um homem loiro e meio careca aproximou-se do meu carro.

Merda! Que não seja blitz da lei seca, que não seja. Mentalizo enquanto
vejo o homem se aproximar.

— Boa noite, documento do carro e habilitação, por favor — solicitou


com uma expressão monótona.

— Boa noite — estendi os documentos solicitados.

Após realizar as verificações dos documentos, o homem me devolveu e


quando estava prestes a me dispensar, outro colega de farda aproximou-se.
Esse era moreno, alto e, ao contrário do seu parceiro, tinha cara de poucos
amigos. Eles trocaram algumas palavras e o primeiro que me abordou voltou-se
para mim.

— Desça do carro, senhor — pediu e hesitei.

Uma coisa é não parecer embriagado sentado e calado, outra é ficar de


pé em frente a um policial.

— Tá surdo? — o segundo policial indagou com cara de poucos amigos.

Contive o filho da puta preso na garganta e saí do carro com movimentos


calculados, se tudo desse certo eles não perceberiam que ingeri algumas doses
nessas últimas horas. Os homens fizeram uma revista no carro e eu me matinha
em pé do lado de fora do carro, apoiei meu corpo contra o veículo de uma forma
despretensiosa, mas só para garantir que eu não acabaria cambaleando.

— O senhor ingeriu álcool nas últimas horas? — o homem moreno, o


sargento Galvão, inqueriu.

— Não. — Menti.

— Cabo Souza — dirigiu-se ao homem ao seu lado — Traga o bafômetro.

— Não há necessidade disso... Estou há dez minutos da minha casa! —


resolvi interferir.

— E por isso eu devo te deixar ir? — ironizou — Vocês, filhinhos de


papai, acham que a vida é uma grande festa onde vocês avançam sinais, matam
jovens indefesos e pagam tudo ao final com um cartão de crédito ilimitado.
Alguém precisa ensinar a vocês o que é limite!

— Eu estou sendo vítima de preconceito social só por que porto um


carro importado e uso boas roupas? — indaguei aproximando-me do policial. A
merda não foi questionar a autoridade e sim cambalear enquanto fazia isso.

— Está? — arqueou a sobrancelha — Vamos fazer o teste do bafômetro e


sanar essa questão. Se o senhor tiver sido vítima de preconceito, eu mesmo te
aconselharei a buscar a procuradoria e me denunciar. Mas se você for pego no
teste, que eu sei que vai — exibiu um sorriso vencedor — você passará a noite
numa delegacia.

— O senhor deverá assoprar nesse canudinho com força, exalando todo


o ar no aparelho. — O homem colocou o aparelho à minha frente.

E eu fiz a coisa mais lógica a se fazer. Recusei. Já havia assistido diversas


séries policiais, para saber que não devemos produzir provas contra nós.

— Eu me recuso! — verbalizei contrariado. E vi um enorme sorriso de


satisfação surgir no rosto do sargento.

— Por recusa ao teste do bafômetro, o senhor está sendo autuado por


presunção legal de embriaguez. — Informou com o peito inflado de orgulho.

— O que isso significa?

— Que o senhor está detido e precisará de um advogado!

— Cabo Souza, conduza-o até a viatura. — O homem aproximou e


ordenou que eu colocasse as mãos para trás. Eu ia ser algemado?

— Eu não estou em possível situação de fuga, as algemas são


desnecessárias! — protestei.

— Você anda assistindo muitas séries. Aqui quem manda sou eu e você
será algemado — o próprio sargento aproximou-se e segurou com força as
minhas mãos levando-as para trás do meu corpo, em seguida prendeu as
algemas ali. — Deseja mais alguma coisa? — permaneci em silêncio — Até que
você não é burro! — debochou e se afastou, me deixando para trás com o cabo
Souza que me guiava para a viatura.

— Eu tenho uma dúvida....

— O senhor ligará para o seu advogado na delegacia — Limitou-se a


responder.

— Não é isso... Se por ventura eu mandasse o sargento com a sua viatura


para o quinto dos infernos, seria desacato a autoridade?

— Seria uma enorme burrice — cabo Souza respondeu e vi, mesmo por
um breve segundo, um curvar de lábios. Ele também desejava mandar o seu
chefe para o mesmo lugar.

Na viatura, eu torcia para que o Marcos não estivesse na cama com a sua
esposa gostosa e que atendesse a minha ligação ou eu passaria a madrugada
atrás das grades.
Não sabia, de fato, se alguém conseguiu entrar em contato com o
Marcos. Depois que passei o seu contato, não obtive nenhuma resposta.
Também não sei precisar por quanto tempo estou aqui, estou sem relógio e sem
celular. Numa saleta andando de um lado para o outro, sem nenhuma
informação.

Quando tive a certeza de que eu ficaria ali por infinitas horas, um policial
surgiu para dizer que a minha fiança havia sido paga. Respirei aliviado e segui
para outra sala, onde assinei uma série de folhas que não me dei o trabalho de
ler atentamente. Li o suficiente para saber que estava sendo liberado sob fiança
e responderia o processo em liberdade.

Meus pertences foram devolvidos a mim, sem muita animação das


pessoas que ali trabalhavam. Encontrei Marcos na sala de espera da delegacia,
meu amigo estava em pé, com as mãos no bolso e não ostentava os ternos
habituais.
— Demorou bastante! — Deixei escapar e não gostei do olhar que o
Marcos me direcionou. No lugar do enorme sorriso frequente em seu rosto e da
expressão amigável estava uma carranca — Eu não estou liberado? — indaguei
receoso.

— A menos que tenha cometido outro delito no caminho até aqui, está
pronto para ir para casa.

— Te devo uma! — dei dois tapinhas em suas costas e ele me envolveu


num abraço apertado. Por mais que eu jamais confessasse, precisava daquele
abraço, por isso retribuí o gesto.

— Você me deve mais que uma, mas por ora fico feliz que esteja bem —
soltou-me e lá estava o sorriso característico do Marcos de volta.

— Onde está o meu carro?

— Seu carro foi apreendido e amanhã você poderá recuperá-lo.


Falaremos sobre isso depois. Tenho certeza que prefere ir para casa e desfrutar
a companhia da sua esposa, certo? — Ergueu a sobrancelha. Ou o filho da puta
sabia que meu casamento era uma farsa ou estava apenas jogando verde.

— Você me dá uma carona, então? — indaguei para ganhar tempo. Mas,


não muito, pois dentro do carro o Marcos continuou falando.

— Quando a Gabriela me enviou uma mensagem dizendo que você


precisava de mim eu não imaginei que fosse para te tirar da cadeia!

— Tecnicamente eu não estava na cadeia — dei de ombros — Gabriela te


enviou uma mensagem? Quando?

Ela não sabia que fui detido, ou sabia?

— Poucas horas antes de você ser detido, talvez estivesse pressentindo


que faria besteira — desviou os olhos do trânsito e me fitou — Há essa altura da
vida dirigir embriagado, Alê? — me recriminou.

— Foi um ato falho... — me limitei a responder.

— Eu não preciso te dizer que esse ato falho poderia terminar em uma
tragédia.

— Eu sei, Marcos. E pode acreditar que já me sinto um merda só por essa


possibilidade. — Confessei irritado comigo mesmo.

— O que está acontecendo, cara? Eu não engoli bem a história que você
passou o dia anterior dormindo sob efeito de medicamentos e não estou
acreditando que o seu ato falho seja apenas um lapso.

— A Fernanda sabe que você está dirigindo o Audi dela? — mudei de


assunto. Fernanda tinha verdadeira adoração pelo seu carro.

— Se você quer saber se ela sabe que abri mãos dos últimos dias de
nossas férias por você? Sim, ela sabe! — rebateu sorrindo — E adivinhe só? Ela
te mandou um recado: ela espera que não seja nada envolvendo a Gabi ou ela
mesma estará aqui em poucas horas e você não gostaria de encontrá-la.

— Agora que deu o recado, pode avisar a sua digníssima esposa que não
é nada envolvendo a Gabi... Pelo menos não diretamente — ele me encarou —
não me olhe dessa forma!

— De que forma? — deu de ombros sorrindo.

— Dessa forma que parece querer arrancar informações minhas!

— Ah, mas eu quero! Eu não deixei a minha esposa e filha para trás para
me contentar com as suas meias palavras.

— Você sabe como ser chato!

— Estou apenas devolvendo o favor que me fez. Quando bateu na minha


porta e jogou na minha cara o meu passado...

— Eu nunca deveria ter feito aquilo... Quer dizer, eu realmente


acreditava que você deveria perdoar o seu pai. Mas eu não tinha o direito de
desenterrar o seu passado. Eu sinto muito pela dor que te causei.

— Eu nunca te disse isso, mas sou grato a você por ter insistido que eu
fizesse as pazes com meu pai. — Sua resposta me surpreendeu.

— Como você pode ser grato depois de todo o caos emocional que aquele
reencontro com o seu pai causou? — indaguei surpreso.

Hoje a relação deles era amistosa, mas na época eu sei o quanto eu


magoei o Marcos quando insisti para que ele fosse ao encontro do seu pai. Seu
pai havia dado entrado em uma emergência após uma parada cardíaca e eu
praticamente empurrei Marcos até o hospital para fazer as pazes com ele.

Eu também tinha as minhas dores e reservas ao passado, mas fora por


isso mesmo que insisti que ele perdoasse o pai, que fizesse isso ainda em vida.
Pois, depois de morto não haveria lágrimas que trouxessem o seu pai de volta,
não haveria súplicas e preces fervorosas que lhe concedessem um único minuto
ao lado da pessoa amada.

— Esse caos emocional que você se refere foi o alicerce para o pai que eu
sou hoje! Se hoje eu amo tanto a minha filha e faço o possível e impossível para
vê-la sorrindo, é por tudo o que eu passei — seus olhos brilhavam quando ele
falava da Mariana — Após o reencontro com o meu pai naquele hospital eu dei
um novo significado a minha dor, eu transformei todo aquele sofrimento em
aprendizagem...

— Eu não sou tão superior assim — confessei tristemente — Não


alcancei esse estágio em transformar dor em sabedoria.

Mais uma vez pensei em Yasmin. Como em meio a todo o sofrimento que
ela passou, eu poderia lembrar dos momentos felizes?

— E você acha que eu sou? — sorriu — Tem dedo da Fernanda


Albuquerque nisso — seus olhos marejaram ao falar da esposa — Compartilhar
com ela todo o sofrimento que passei ao lado da minha mãe foi catártico. Não
apenas pelo simples fato de desabafar, de desenterrar um passado e trazer à
tona todas as dores e mágoas escondidas, mas sim porque a mulher que eu
amava, após ouvir todas as minhas dores não me julgou ou me repreendeu —
uma lágrima rolou pela sua face e ele não fez nada, deixou mais outras seguirem
o mesmo curso — Ela apenas me amou e continuaria me amando mesmo que eu
optasse por não perdoar o meu pai.

Marcos parou o carro num lugar seguro e voltou-se para mim os olhos
cheios de lágrimas:

— Eu levei mais de dez anos para perdoar o meu pai e hoje, vendo o
amor que a Mari nutre por ele e a devoção que ele tem pela neta, sei que fiz a
escolha certa — mais duas lágrimas rolaram pelo seu rosto enquanto ele sorria
— Sou feliz por ter dado essa oportunidade a todos nós. Feliz por ter feito as
pazes com o meu passado. E isso tem dedo seu — apontou para mim — se hoje
eu sou um homem completo é porque você foi meu amigo, o cara que escavou o
meu passado e me deu a oportunidade de recomeçar... Eu não sei o que está
acontecendo com você, mas saiba que pode contar comigo! Eu te devo essa —
sorriu entre lágrimas.

— Caralho! — enxuguei uma lágrima teimosa que escapou — você


deveria largar a advocacia e ser palestrante emocional! — brinquei para aliviar
o clima. E consegui, pois o Marcos gargalhou alto.

— Isso significa que consegui acesso ao seu coração?

— Que papo maricas! — sorri — A paternidade te deixou afeminado.

— Nada disso — negou sorrindo — a paternidade me mostrou que não


há problema nenhum em ser frágil. Fica a dica, Alê! — Piscou em minha direção
sorrindo.

— Será que podemos parar em algum lugar para conversar?

A revelação do Marcos realmente mexeu com as minhas emoções. Se ele


havia conseguido fazer as pazes com o passado talvez eu pudesse, pelo menos,
conversar sobre isso com ele.

— A minha casa está liberada, Fernanda e Mari ainda estão em São


Paulo, é a minha chance de beber o Whisky caro da Fernanda, ela sempre disse
que era para uma ocasião especial e tem ocasião mais que especial que é essa?
— sorriu e eu sorri de volta — Quero saber todos os seus segredos mais
obscuros.

— Depois não vai querer me socar quando eu disser que toparia


um ménage com a sua esposa! — dei de ombros e Marcos deixou o carro morrer
— Cadê aquele papo de não julgar? — sorri.

— Sério que você sonha em foder a minha esposa? — indagou


visivelmente atordoado.

— Quem não sonha? Ela é gostosa, já posso até imaginar ela e a Gabi
juntas... Duas loiras na minha cama.

— Você tá de sacanagem, né?

— Você precisava ver a sua cara! — gargalhei — Mas, falando sério


agora: Fernanda entraria facilmente na minha lista de fodas. Se um dia tiver um
fetiche de assistir sua esposa dando para outro, eu te faço esse favor
na brodagem — pisquei em sua direção.

— Não! — Rosnou. — Não tenho nenhum fetiche em dividir a Fernanda


com ninguém. — Rebateu bastante irritado só com a possibilidade.

— Mudando de ideia... — dei de ombros.

— Tomar no cu, Alexandre! — esbravejou — Eu querendo te ajudar e


você vem com esse papo de comer a mãe da minha filha. Não sei se conseguirei
te ajudar depois disso! — disparou irritado.

— Ah, agora vai! — Sorri — Terá até que me ouvir falar que já sonhei
com a sua irmã.

— Seu filho da puta! — vociferou.

— Estou te confessando meus segredos mais obscuros — perturbei


sorrindo.

— Tem mais alguém da minha família por quem você nutre algum
fetiche? — encarou-me — Por que se você disser que é pela Dita eu já atiro você
aqui mesmo na rua.

Gargalhei alto.

— Eu ia dizer que era pela sua sogra, a senhora Albuquerque ainda dá no


coro! — completei sorrindo.
— Imbecil!

Na residência dos Castro e Albuquerque desfrutávamos do Whisky caro


da Fernanda em frente à piscina. Marcos havia descongelando algumas coisas e
preparou uns petiscos. Ficamos em um silêncio confortável enquanto
comíamos, eu não estava com fome, apenas estava ganhando tempo, buscando
coragem para confessar.

— Eu já amei alguém da mesma forma que você ama a Fernanda —


soltei de uma vez e a minha confissão o pegou de surpresa. Ele estava relaxado
na cadeira e endireitou a postura em atenção — É difícil de acreditar, eu sei... —
sorri. — Nos conhecemos durante um cursinho de inglês e foi amor à primeira
vista... Quer dizer eu a amei assim que pus os olhos nela, mas Yasmin me
ignorou por alguns dias — sorri com a lembrança — eu tinha uma péssima fama
de pegador. Depois de um tempo Yasmin acabou confessando que também se
apaixonou por mim de cara, só demorou a deixar rolar para eu ter certeza do
que queria, pois ela já sabia o que sentia por mim: queria ser a minha
namorada!

Eu não precisava fechar os olhos para lembrar que foi ela quem me
pediu em namoro. Yasmin teve a audácia de dizer que estava sendo benevolente
comigo ao me tomar como namorado. Disse que me ensinaria a ser um bom
amante e eu lembro que gargalhei por alguns minutos até o som da sua risada
juntar-se a minha. Nosso primeiro contato romântico fora uma gargalhada.
Quando os sons das nossas risadas tornaram um só, descobrimos que
funcionaríamos juntos.

Como me mantive calado por muito tempo perdido em lembranças,


Marcos interviu, sorrindo.

— Como a Yasmin era? — Meu amigo indagou.


— Ela era bem-humorada, sempre com um sorriso no rosto e contando
piadas. Vocês seriam bons amigos... — Marcos sorriu em concordância e eu
prossegui — Tinha um sorriso contagiante daqueles que contaminavam
qualquer ambiente que chegasse. Yasmin era doce, mas determinada, dona de
um coração do tamanho do mundo. Vivia querendo ajudar as pessoas e os
animais. Daria para montar um canil com todos os filhotes abandonados que ela
levava para casa. Ela também era terrivelmente desastrada... Vivia esbarrando
nas pessoas e derrubando objetos — completei algum tempo depois.

Essa lembrança era triste, pois fora o primeiro sintoma da ELA e


ninguém ao seu lado percebeu, achávamos que era normal, que ela era
estabanada como a sua mãe vivia repetindo.

— O que aconteceu? — indago preocupado quando a encontro caída no


chão do banheiro da minha casa — Você se machucou?

— Eu simplesmente caí e não consigo levantar... — falou com os olhos


cheios de lágrimas.

— Calma, amor — envolvi seu corpo num abraço apertado — Está tudo
bem, você apenas se desequilibrou por conta da labirintite.

Há uns dois meses, após desmaiar durante a aula de educação física,


Yasmin fora levada a emergência e os médicos disseram que ela estava com
labirintite e passou a tomar remédios diários. Mas parecia que o tratamento não
estava surtindo efeito, pois os desmaios e quedas tornaram-se ainda mais
frequentes.

— Alê, eu não desequilibrei — seus braços me abraçaram forte — eu caí


feito um saco de batatas. E se você não tivesse chegado aqui eu estaria até agora
nesse chão gelado. Pois minhas pernas estão sem força... — completou num soluço
cortante.

— Está tudo bem agora! — levantei seu corpo com cuidado e saí do
banheiro carregando-a nos meus braços.

— O que houve, meu filho? — minha mãe surgiu quando eu estava no


corredor. Seus olhos fitaram Yasmin e as duas conversaram só com o olhar.
Era impressão minha ou olhos da minha mãe estavam marejados?

— A Yasmin ficou tonta e se desequilibrou no banheiro. Mas está tudo


bem...

— Entendo, mas ligarei para o médico da nossa família para que possa vir
avaliá-la.

Concordei e segui para o meu quarto, sentei na cama com ela em meu colo.

— Vai ficar tudo bem... — acariciei seu rosto, uma ruga de preocupação
estava ali em destaque.

Yasmin sempre fora desastrada, mas de um tempo para cá isso estava cada
vez mais frequente, era comum ela deixar a caneta cair durante a aula, derrubar
copos e talheres nas refeições, até a sua mastigação estava mais lenta. O otorrino
que a atendeu disse que era por conta da labirintite e que os remédios
amenizariam os sintomas...

— Boa tarde — o médico invadiu nosso quarto acompanhado de perto


pela minha mãe. Estranhei o fato do médico não se aproximar para examiná-la,
ele apenas ficou ali parado em frente à minha cama nos fitando com tristeza. —
Alexandre, estou aqui para te ajudar a entender o que está acontecendo com a
Yasmin... — Ele completou minutos depois.

— A Yasmin precisa que você seja forte! — Minha mãe disse com a voz
embargada, deixando uma lágrima escapar.

— O que está acontecendo aqui? — Indaguei sem entender.

— Você prefere que eu conte? — O médico indagou para Yasmin que


negou com lágrimas nos olhos.

— Eu quero que você me escute até o fim, tudo bem? — Forçou um


sorriso e um temor percorreu meu corpo. Eu não entendia a reação do médico e
todo aquele suspense estava me matando. Não deveria ser apenas uma
labirintite...

Será que os desmaios e náuseas significava que ela estava esperando um


filho? Se fosse, não havia motivo para tudo isso. Claro que um filho agora, não era
o ideal, mas não havia motivo para isso, filho era amor multiplicado.

— Senta aqui, amor — indicou o espaço na cama ao seu lado — Eu


preciso te contar algo, mas eu quero que você prometa que não vai fugir.

— Você está grávida? — Arqueei a sobrancelha.

— Não — sorriu tristemente — a vida me surpreendeu de outra forma e


teremos que lidar com essa surpresa — seus olhos permaneceram fixos nos meus e
meu coração perdeu o compasso — Isso significa que a nossa viagem a Paris que
aconteceria ao fim do mês não acontecerá...

— Podemos remarcar quando tudo se organizar.

— Não se organizará e está tudo bem, acredite! — Uma lágrima rolou pela
sua face.

— O que está acontecendo? — interroguei atordoado e olhei para a minha


mãe que observava tudo com lágrimas deslizando pelo rosto — Doutor, o que a
Yasmin tem? — o médico apenas balançou a cabeça.

— Você foi o capítulo mais feliz da minha vida — ela tocou meu rosto —
eu fui muito feliz ao seu lado.

— Amor...

— Só me escuta — levou os dedos aos meus lábios me silenciando — eu


quero que vá a Paris no fim do mês e passe pelas cidades vizinhas, quero que siga
o mochilão que planejamos. Frequente os pubs ingleses e vá ao teatro em Portugal
para rir das piadas de portugueses — lágrimas molhavam o seu rosto enquanto
ela falava com um sorriso nos lábios.

— São nossos planos. Eu não vou a nenhum lugar sem você! — discordei
temeroso com o rumo dessa conversa — Esqueceremos nossos nomes e estaremos
juntos, velhinhos — relembrei a nossa jura de amor.

— Está na hora de readaptar essa frase: nos lembraremos um do outro


com felicidade.
— Você está terminando comigo? — uma lágrima escapou dos meus
olhos — Não me ama mais?

— Não estamos terminando... Eu estou dizendo tudo isso porque te amo.


Eu quero que você seja feliz, quero que você ame a vida com a mesma intensidade
que me amou...

— Alguém pode me dizer que porra está acontecendo? — Gritei. Eu estava


me sentindo num filme onde todos sabem o roteiro e eu não, não sei ondes eles
querem chegar, apenas estou apreensivo com o rumo dessa conversa.

— Eu estou doente. — Yasmin disse fracamente.

— E o que estamos esperando para ir ao hospital e iniciar o


tratamento? — levantei da cama num pulo — Dr. Cortez com certeza está a par
dos tratamentos mais modernos — olhei para o médico que baixou os
olhos — Mãe a senhora não se incomodaria de pagar, não é? — Caminhei até
minha mãe e ela me olhou com pena. Que porra estava acontecendo?

— Eu menti quando falei que era labirintite — Yasmin revelou — Me


desculpa...

— Por que você mentiria para mim? — indaguei triste.

— Por que eu estou com uma doença incurável e não sabia como te contar.

— Você não... — neguei com um nó preso na garganta — Diz para mim


que isso é uma brincadeira de mau gosto, amor... — supliquei.

— Me desculpa, mas não é... — Um soluço escapou dos lábios da Yasmin e


ela abraçou o próprio corpo.

— Alexandre... O nome da doença da Yasmin é ELA, esclerose múltipla


lateral amiotrófica, uma doença neurodegenerativa progressiva e fatal,
caracterizada pela degeneração dos neurônios motores, as células do sistema
nervoso central que controlam os movimentos voluntários dos músculos.
Infelizmente no caso da Yasmin, também houve um comprometimento dos órgãos
vitais, um caso raro na medicina... — o médico falou visivelmente consternado
com a situação — Não há nada que possamos fazer....
— E o que isso quer dizer?

— Que eu falharei na minha promessa de passar os aniversários ao seu


lado — Yasmin respondeu e sua voz falhou — mas nem por isso trate de rejeitá-
los, celebre a sua vida.

— Há quanto tempo você sabe disso? — Perguntei com um nó na


garganta.

— Desde o tal diagnóstico da labirintite que estamos investigando... Mas a


confirmação veio pouco mais de um mês atrás.

— E por que não me contou? Eu poderia ter ajudado.

— Você me ajudou, mais do que imagina. Foi o mês mais feliz da minha
vida — sorriu — seu amor é a minha força para aceitar tudo que está
acontecendo.

— Eu não posso perder você para uma maldita doença! — esbravejei —


Eu não posso viver sem você!

— E quem criará o meu abrigo? — um sorriso estampou seu rosto — Eu


conto com o meu super-herói para concretizar as minhas ideias.

— Deve haver algum tratamento... Deve haver! — Levei as mãos até os


cabelos em um total estado de desespero.

— O tratamento agora é me amar enquanto estou aqui!

— Meu filho... — Minha mãe aproximou-se de mim e eu recuei.

— Eu não quero ouvir nada que não seja uma solução para esse problema
— gritei — eu não vou suportar ver a Yasmin partir sem poder fazer nada. E você
sabia e não me disse nada? — Acusei minha mãe de omitir a informação.

— Soube há pouco tempo... Ela estava desesperada e sofrendo porque não


sabia como contar para você. Eu insisti que contasse, mas hoje com essa queda no
banheiro, vi a chance de facilitar as coisas para ela.

— Obrigada Vilma — Yasmin agradeceu — Alê, só me ame. Permaneça


ao meu lado segurando a minha mão, esse é o melhor tratamento que eu poderia
receber...

— Eu... Eu... — a verdade me atingiu em cheio e eu me senti, pela primeira


vez, sem ar. — Não posso... — saí em disparada do quarto com as lágrimas
turvando a minha visão.

— Yasmin morreu semanas antes de completar dezenove anos... Sem


conseguir realizar os seus sonhos. Quando ela morreu, eu morri junto. Meus
próprios sonhos se atrofiaram.

— Eu sei bem o que é o vazio da dor de perder alguém que ama. — Disse
Marcos com a voz embargada.

— Mas você não abandonou a sua mãe em nenhum


momento — discordei entre lágrimas — eu fui um canalha quando não
permaneci ao seu lado na noite em que ela morreu, porque doía demais vê-la
atrofiada numa cama de hospital...

— Você era jovem... Estava assustado.

— E ela? — gritei — Ela tinha dezoito anos e passou por tudo isso com
um maldito sorriso nos lábios. Quando suas pernas pararam de se mover, ela
passou a usar a cadeira de rodas elétrica e dizia que tinha ganhado pernas mais
ágeis. Quando as suas mãos não sustentavam mais um alfinete, ela precisou das
mãos dos outros para realizar as suas atividades, mas falava que estava se
sentindo uma rainha com todos os servos ao seu redor. Marcos, ela sorria em
meio a toda as merdas que a vida estava lhe impondo — fitei o Marcos que
também chorava.

Eu já não conseguia conter o choro a essa altura, uma cortina de


lágrimas, para ser mais exato, rolava pelo meu rosto. Meus lábios tremiam. Era
como seu eu fosse o garoto de tantos anos atrás, o garoto assustado com essa
avalanche de acontecimentos. Mas agora que eu tinha começado a falar eu
precisa pôr tudo para fora, dividir com o Marcos, porque mesmo após tantos
anos a simples lembrança da Yasmin me causava tanta dor.

— Um dia antes da traqueostomia ela fez questão de reunir nossas


famílias para um jantar. O procedimento que aconteceria no dia seguinte era
para ajudá-la a respirar melhor, já que o ar estava chegando com dificuldade
aos seus pulmões... E o aparelho que a ajudaria a respirar melhor, afetaria a sua
fala. Havia uma alta possibilidade que Yasmin deixasse de se comunicar.
Lembro perfeitamente desse dia. Após o jantar, ele pediu que eu a
acompanhasse até o jardim...

— Não é tão ruim estar nessa cadeira quanto você pensa... — disse com a
voz baixa e enrolada, a cada dia ela estava mais debilitada. Mas o sorriso no rosto
permanecia. Eu estava a alguns passos longe dela observando a lua, ou qualquer
coisa que não fosse ela naquela cadeira. — Eu ainda estou aqui! — Disparou e
voltei minha atenção para ela.

— O que você quer que eu diga? Quer que eu sorria abobalhado em meio a
toda essa merda que a minha vida virou? Eu não consigo! — Soltei irritado.

— Não... Eu quero que você grite, esbraveje, chore, desabafe... Apenas não
se feche nesse mundinho aí — lágrimas molharam o seu rosto.

— Desculpa... — ajoelhei ao seu lado — Eu estou puto com a vida!

— Eu quem deveria estar — tentou fazer graça — Agora mesmo eu


queria enxugar as suas lágrimas, mas minhas mãos são inúteis...

— Eu trocaria de lugar com você! — confessei — E não estou dizendo isso


da boca para fora, estou falando por que se houvesse uma possibilidade eu faria
isso. Você merece viver, merece mais que eu!

— Seu bobo — sorriu entre lágrimas— Você é um bom homem e merece


um mundo repleto de coisas boas!

— Eu não imagino o mundo sem você — lágrimas grossas e feias


molharam o meu rosto — eu não sei se estou pronto para dormir sem ouvir o som
da sua voz. Eu estou com tanto medo de te perder, que tenho medo de dormir e
acordar com a notícia... — Não concluí, pois um soluço cortante preencheu o
ambiente, meu corpo tremia enquanto eu soluçava.

— Me abrace! — ela pediu e eu a envolvi num abraço apertado — Eu não


posso dizer que não tema, porque a verdade é que eu estou morrendo. Mas eu não
quero que você morra junto comigo — abracei ela mais forte, quem sabe assim a
vida me levasse junto dela quando chegasse a sua hora? — Quando a minha hora
chegar, viaje! Vá para o Caribe e curta o mar e o sol! Sorria para as mulheres, pois
elas certamente estarão sorrindo para você — sorriu.

— Eu nunca amarei ninguém como amo você...

— Não faça isso — balançou a cabeça — você não pode enterrar o seu
coração... Ele é grande demais para escondê-lo do mundo! Sorria, frequente festas,
faça amigos, conheça outras mulheres e sabores... Só não se feche para o amor! —
Uma crise de tosse impediu que ela prosseguisse.

— Você está cansada... Vamos beber água — fiz menção de levantar, mas
ela me impediu com um simples olhar.

— Você vai encontrar uma mulher que te amará apesar da sua teimosa, e
quando ela te entregar o seu coração, ame! Ame essa mulher com o mesmo fervor
que sempre me amou. E não tenha medo de entregar o seu coração a ela. Não
tenha medo de amar porque eu parti...

— Você será única mulher que eu amarei!

— Não — suplicou — não me faça voltar à noite para puxar o seu pé! —
sorriu. — Quer mostrar ao mundo que me amou? — assenti — Então, lembre-se
de mim sorrindo! Esqueça todas essas lembranças tristes e lembre do som da
minha risada, de todos os momentos felizes que vivemos juntos. Essa é a maior
prova de amor que você poderia me dar.

— Como eu posso esquecer tudo isso?

— Não é simplesmente esquecer, é viver... A nossa história de amor será


um capítulo da sua vida, preencha os outros capítulos com outros amores, com
outros sorrisos. Você não estará negando o seu amor por mim, quando voltar a
amar novamente. Eu ficarei feliz lá no meu camarote particular vendo que você
encontrou alguém para andar de mãos dadas com você... E no momento que
encontrar a mulher da sua vida sorria, e lembre-se que eu estarei sorrindo onde
eu estiver... Eu te amo, Alexandre! — nossas bocas se colaram em meio a lágrimas
e mais lágrimas.
— Esse jantar foi a última vez que ouvi a voz da Yasmin e mesmo tendo
conversado por horas e horas, parecia que eu não tinha dito tudo para ela.
Faltava dizer algo... Talvez eu devesse ter dito que amava mais vezes.

— Ela sabia... — Marcos assentiu.

— Depois foram questões de dias... Ela contraiu uma pneumonia e nunca


mais se recuperou. Na noite em que ela morreu, nossos amigos do curso de
inglês foram até o hospital se despedir. Levamos balões e cartazes. Os médicos
já haviam dito que era questão de horas... Uma cacofonia de sons e risadas
preenchiam o ambiente e Yasmin que apenas se comunicava com o olhar
parecia feliz em ter todos ali reunidos. Uma a uma as pessoas foram se
despedindo, com lágrimas nos olhos, pois sabia que o fim estava chegando. Eu
fui o último... — a essa altura eu já chorava feito um completo imbecil, contando
tudo para o Marcos — Eu não sabia o que dizer para alguém que iria morrer em
algumas horas. Eu não sabia como agir e fiz a coisa mais estúpida que eu podia
fazer, Marcos. Olhei para ela e disse que eu não podia ficar ali enquanto ela
morria. Ela me fitou longamente e eu praticamente li ali o seu "lembre-se de mim
sorrindo".

Meu corpo todo tremeu quando acabei de falar, minha boca estava seca e
meus olhos jorravam as lágrimas acumuladas por todos esses anos. Marcos não
disse nada, apenas permaneceu ao meu lado enquanto eu chorava perdido em
arrependimentos.

— Não duvide do seu amor por ela, você a amou com todo o seu coração
e foi recíproco.... Eu sou a prova viva do que é ser seu amigo e ser amado por
você! Eu te amo seu cabeça dura. — Marcos falou após um longo silêncio.

Ele chorou comigo, compartilhando o meu sofrimento. Agora eu


entendia o que ele disse sobre dividir a dor. Ele também já sofrera e ainda assim
sorria. Nunca se deixou abater por nada. Construiu uma família linda e estava a
cada dia mais feliz.

— Eu também te amo, Marcos!

— Fico feliz saber que está tentando superar o seu passado. A Gabi é
uma mulher especial...

— Ela é sim! — concordei porque era verdade. Ela aceitou embarcar


comigo nessa mentira por motivos que até hoje eu não sabia. E mesmo após
todas as minhas mancadas ela permaneceu ao meu lado — Mas o casamento é
uma farsa! — soltei e senti um alívio. Eu não gostava de mentir, e mentir para
um amigo então...

— Essa é a hora que eu digo que não estou surpreso? — Marcos sorria.

— Você já sabia?

— Eu desconfiava. Era muita coincidência você me procurar


desesperado com o testamento e aparecer casado logo depois.... Se fosse
qualquer outra mulher, eu acharia que era golpe. Mas não a Gabi. Nesse
contexto, se alguém tivesse de dar o golpe, seria você. — Sorriu.

— Talvez eu tenha dado mesmo o golpe nela. — Sorri.

— Por que ela? Por que a Gabriela?

— Porque somos iguais! Ela não sonhava em casar, eu também não.


Gabriela não tentaria roubar o meu dinheiro. E o mais importante:
funcionávamos bem na cama.

— Essa é justificativa que você acredita ou que ela te contou?

— Não é a mesma coisa? — Perguntei confuso.

— Ninguém aceita embarcar numa farsa dessa sem um motivo


coerente... Talvez ela goste de você.

— Talvez ela goste apenas do meu pau.

— Gabi não é mulher que se prende a alguém apenas por um pau! —


Discordou — Se fosse isso ela teria ficado com o Felipe Albuquerque que era
pegador, mais jovem e talvez mais rico... — Insinuou.

Não sei por que, mas a menção ao Felipe me incomodou. Eu sabia do


passado dele com a Gabi, mas não que ela gostasse dele a esse ponto.
Será que Gabriela esperava que ele a pedisse em casamento? E quando ele
casou com outra ela me tomou como prêmio de consolação?

— Pergunte os motivos de não ter ficado com tão bom partido a ela,
Marcos! — Respondi irritado.

— E você, o que sente por ela?

— Sei lá! Gratidão, desejo... Funcionamos bem juntos.

— Por que a irritação? Está irritado com o fato de não saber dar nome
aos seus sentimentos ou com a imagem de Felipe e Gabi como um casal?

— Pelo dois! — Rosnei.

— Interessante...

— O que é interessante? — Perguntei irritado

— Se você não sente nada por ela e ela não sente nada por você, por que
ainda estão juntos?

— O testamento, você esqueceu?

— Você acha mesmo que a sua mãe vai levar isso a sério? E mesmo que
leve, você não é um homem que abriria mão da sua vida por um testamento.
Para mim isso é uma desculpa.

— O quer que eu faça? — Indaguei furioso — Que abra mão de tudo


que conquistei trabalhando?

— Que libere a Gabi desse acordo! Se você está com ela somente pelo
testamento, você não merece que ela continue ao seu lado. Gabriela não merece
um homem que esteja ao lado dela por interesse, ela merece ser amada e se
você não consegue fazer isso... — deu de ombros — Se não consegue mais
colocar alguém acima dos seus interesses pessoais, liberte-a para encontrar
alguém que faça isso. Deixe ela viver a vida sem o peso da sua mentira, deixe
que conheça outros homens. Algum que a ame perdidamente com palavras,
gestos e toques...

Por que todo esse papo do Marcos estava me irritando tanto? Por que eu
queria mandar ele calar a boca e gritar que o único homem que estaria na vida da
Gabi era eu?

— Consegui? — Indagou sorrindo.

— Conseguiu o quê?

— Projetar na sua mente o que vai acontecer se você não assumir que
ama a Gabriela?

— Não é amor. E mesmo que fosse... — ponderei — E se ela não me


amar? Quer dizer, ela não pode me amar depois de tanta merda que eu fiz,
pode?

— Eis a definição do amor: perdoar as falhas e amar os defeitos! Vai ficar


apenas me olhando com essa cara de bobo? Vai deixar uma mulher escapar da
sua vida por que está com medo?

— Não estou com medo de nada, babaca.

— Se a Fernanda quisesse um ménage, eu escolheria a Gabi... — olhei feio


para ele — Viu como é bom?

— Babaca!

Nós gargalhamos. E bebemos. Amanhecemos em frente à piscina depois


de secar toda a garrafa.
Não consegui dormir direito depois que o Alexandre saiu. Era como se a
escuridão que encontrei ao chegar, tivesse ficado mesmo quando as luzes foram
acesas. Algo não estava certo. Sim, desde que começamos estava errado. Mas eu
estava pressentindo que a maré estava prestes a virar aquela noite, assim como
eu, que me revirava na cama sem sono.

Meus pensamentos iam e viam em ondas fortes: Alexandre. Yasmin.


Morte. Amor eterno. Eu havia me metido em uma confusão sem tamanho, sem
ter a mínima vontade de estar nela. Mas não havia como voltar atrás, era um
beco sem saída. Se eu nunca me privei de atender aos desejos do meu corpo,
como conseguiria negar esse sentimento que já começava a me sufocar, louco
por liberdade?

O pior de tudo isso era não saber o que fazer. A situação além de nova,
era um completo caos. E eu nunca fui de arrumar as coisas, bagunçar era o meu
lema.
Enrolei o máximo que pude antes de levantar. Gastei quarenta minutos
atualizando as redes sociais da Carpe Vita e mais vinte observando as minhas,
até que, por fim, resolvi tomar banho. Por lá, também demorei bastante: lavei e
hidratei meus cabelos, fiz depilação, apliquei óleo corporal e escovei os meus
fios loiros. Fiz tudo isso com a música tocando no último volume... Claro, nada
romântico, muito funk e hip hop me distraíram. Mas o relógio estava realmente
de mal comigo, pois não era nem onze da manhã.

Lembrando do tal almoço que o Alexandre comentou, determinei que ele


seria decisivo: ou ele lidaria com essa situação ou eu pularia fora. Sem acordos.
Sem contratos. Sem mentiras. Cansei disso tudo!

Para enfrentá-lo, escolhi usar um cropped preto, justo e transpassado


que contrastou com a saia longa, branca e com uma fenda enorme que revelaria
minha perna quando andasse. A maquiagem estava leve, a sandália escolhida foi
uma plataforma confortável e como acessório, coloquei o colar que ele havia me
dado no nosso aniversário. O resultado foi uma Gabriela sexy, mas sem grande
apelo visual.

Às treze horas, depois de checar o celular diversas vezes, achei que ele
não viria e estava pronta para ligar o foda-se! Dez minutos depois, peguei a
bolsa pronta para sair sozinha, mas dei de cara com ele ao abrir a porta.

O Alexandre estava parado, prestes a bater nela, segurando um buquê de


rosas vermelhas. Passamos cerca de três segundos estáticos, sem reação. Esses
três segundos foram suficientes para acender o fogaréu em mim, aquele que
estava adormecido embaixo de muita palha seca. Quando uma fagulha encontra
palha seca, o resultado é incendiário.

Movemo-nos ao mesmo tempo, eu para fora e ele para dentro do


apartamento, nos chocando com força, de frente. As flores caíram aos nossos
pés, esquecidas, quando o desejo rompeu todas as barreiras que nos segurava.

Não sei se foi a minha boca ou a dele que iniciou o beijo, devorando
lábios e língua, sorvendo saliva e engolindo gemidos. A porta foi fechada de
qualquer jeito. Minha bolsa acabou jogada no chão. E as minhas mãos seguiram
rumo ao cinto da calça dele, abrindo e procurando o caminho da felicidade,
enquanto as dele não conseguiam decidir que parte minha tocar primeiro.

Por fim, nossas bocas se largaram e seguiram outros caminhos. A dele se


dedicou a beijar o meu pescoço, a barba arranhando a minha pele e causando
um incêndio de sensações em mim. Meu cropped foi baixado bruscamente,
fazendo meus seios saltarem e meus braços ficarem presos no tecido justo. Ele
puxou meu cabelo, fazendo com que eu me empinasse e sugou como um bebê
faminto. Gritei quando ele mordeu o outro, antes de sugar forte. Alexandre se
afastou para suspender a minha saia longa e eu aproveitei o momento para
livrar meus braços, jogando a pequena blusa no chão.

Minha calcinha deslizou pelas minhas pernas com facilidade, e


rapidamente fiz com que a calça e a cueca dele descessem até se enroscarem em
seus sapatos. Inclinei-me e toquei no encosto do sofá, dando acesso ao meu
corpo. Ele não demorou, um segundo depois estava posicionado atrás de mim,
fazendo seu pau entrar na minha boceta molhada.

Como eu senti falta disso. Do seu tamanho. Da sua força... Do sexo com ele.

Segurando os meus seios, ele entrou e saiu rapidamente, respirando


fundo e controlando o seu prazer, enquanto buscava o meu. Meu corpo estava
sensível e com saudades de uma boa foda, por isso não resisti muito tempo e
gozei gritando. Algumas estocadas depois, ele gritou também, saindo de dentro
de mim.

— Acho que não precisava das flores, no fim das contas... — Ele estava
ofegante. E parcialmente nu. Gostoso demais!

— Prefiro joias — brinquei, procurando as flores com o olhar — Mas


obrigada, eram lindas.

Peguei as peças de roupas, que deu tempo de tirar, para vestir, mas ele
me impediu.

— Acho que não vamos almoçar agora... — Puxou-me pela cintura.

— Estou com fome, você demorou... — Respondi enquanto ele beijava


meu pescoço.

— Estava decidindo que flores trazer — riu — se eu soubesse teria vindo


mais cedo.

— Precisamos conversar!

— Sim e nós vamos, deixe eu acabar de foder você que faremos isso.

Parecia um bom plano para mim.

Era difícil distinguir se o que molhava meu rosto eram lágrimas ou a


água que caía do chuveiro sobre nós. Depois de outra rodada de sexo quente e
rápido na sala, decidimos que não adiantaria sair para almoçar e por isso ele
ligou para pedir comida, eu tentava organizar a sala, junto as flores espalhadas
pelo chão. Enquanto o almoço não chegava, fomos tomar banho e foi no
banheiro que ele decidiu me deixar a par de tudo o que aconteceu entre ele e a
Yasmin.

A medida que ensaboava meu corpo, ele me contou como e onde se


conheceram... Ouvir aquilo me fez imaginar o jovem e lindo casal planejando o
futuro de amor eterno. De costas para ele, com as suas mãos massageando meu
couro cabeludo e fazendo espuma, escutei o quanto ela foi forte e o quanto ele
ficou devastado com a perda. Cada detalhe se unia e formava um todo, de dor e
sofrimento, em minha mente. Meu coração apertou e lamentou pela jovem que
perdeu a vida, mas doeu ainda mais pelo homem que essa perda gerou. Chorei
em silêncio, deixando que a água lavasse tudo aquilo e torcendo para que
purgasse também os meus sentimentos.

Quando ele me guiou para fora dos jatos d'água, evitei o contato visual,
mas a sua mão levantou o meu queixo e ele pode enxergar a minha alma através
dos meus olhos vermelhos.
— Desculpe, eu não queria te fazer chorar.

— Caiu shampoo nos meus olhos... — menti e desviei dele, saindo do


box. — Por que decidiu me contar?

— O Marcos me disse algumas coisas...

— Então ele veio. — Sorri, com a confirmação que eu tinha tomado a


decisão certa.

— Graças a você e me tirou de uma encrenca, mas eu conto os detalhes


depois de comer — o interfone tocou, naquele exato momento — Bem na hora!

Ele saiu do banheiro para atender e eu desabei ali, fechando a porta para
que meu choro não fosse ouvido.

Eu me recompus rapidamente, talvez devesse pensar em ser atriz, e


segui em direção a cozinha. O Alexandre usava apenas a calça social enquanto
mexia no celular, de pé próximo à mesa.

— Acho que não estou mais com fome de comida! — Disse ao me


aproximar e tocar sua barriga definida.

— Podemos dar um jeito nisso — ele segurou os lados do meu roupão —


Por que será que nós nunca fazemos isso na cama?

— Quem tem fome, tem pressa — minha resposta o fez gargalhar e esse
era um som raro de se ouvir.

— Gabi... — ele me encarou e o simples apelido em sua boca, me causava


estranhamento.

— Você não costuma me chamar de Gabi...

— Te incomoda? — Ergueu uma sobrancelha.


— Não, só estranhei.

— Eu tenho uma pergunta para te fazer. Ela é a real razão para eu ter me
atrasado. A ordem das ações mudou, o sexo era para ser depois e...

— Que pergunta? — fui direto ao ponto.

— Quer casar comigo? — disse de uma só vez.

Quando ele me fez essa proposta pela primeira vez, em um dia que agora
parece tão distante, eu gargalhei porque parecia piada. Dessa vez, porém, eu
tenho vontade de gritar de raiva. Mas me mantenho estática, mais uma vez
naquele dia.

— Você sempre reage diferente do que eu penso...

— Alexandre, você não pode estar falando sério.

Ele levou a mão ao bolso da calça e retirou dali uma caixinha de veludo
preta. Mas eu não permiti que ele abrisse.

— Não! — Sentenciei.

— Certo, você abre... — Ele estendeu a maldita caixa.

— Não, eu não quero casar com você — discordei — na verdade, depois


de tudo o que já passamos, eu acho que a única chance que temos é nos
separando.

— Gabi...

— Eu preciso de um tempo, Alê.

— Meu apelido também não soa bem, principalmente precedido de tais


palavras.

— Eu me perdi em você. E você não consegue nem se achar, quanto mais


a mim.

Ele não respondeu.

Eu não disse mais nada.


A comida esfriou, intocada.
Talvez eu soubesse que aquela seria uma "foda de despedida". Por isso,
foi tão desesperada. Com roupas, quase sem preliminares, no meio da sala.
Quente. Ótima. Intensa.

Relembrar cada sensação que senti enquanto o pau dele me fodia, não é
a melhor maneira de pôr uma pedra em cima desse assunto. Era difícil imaginar
onde eu acharia um pedregulho tão grande, na verdade.

De qualquer maneira, me recuso a ficar chorando pelo leite derramado.


O ideal é encher o copo de álcool, ao invés de leite. Se bem que encontrar
alguém que forneça leitinho quente também é uma boa opção...

Com isso em mente, passo algumas horas me arrumando para sair.


Invisto no look transparência para ser o oposto de como eu desejaria estar:
escondida. Short preto, de couro, curto e com cintura alta compõe, juntamente
com um body preto totalmente transparente, o meu visual. Para minha nudez
superior não impactar diretamente, coloco um blazer também preto, que chega
até a altura do short e fica aberto, revelando meu corpo sem mostrar os bicos
dos seios. Pelo menos não de maneira direta, mas poderia ser usado no
momento certo. Batom vermelho, cabelo esvoaçante e olhos marcados me
deixam pronta para arrasar.

Eu deveria ter ido para outro lugar, mas acabei estacionando em frente
a Carpe Vita. Talvez a familiaridade estivesse me atraindo, mas no final das
contas o que eu precisava estava ali: música, bebidas e homens gostosos. Antes
de descer, um detalhe dourado chamou minha atenção. Retirei a aliança, joguei
no porta-copo do carro e saí batendo a porta.

Cumprimentei os seguranças ao entrar e minha primeira parada,


obviamente, foi o bar. A boate tinha acabado de abrir as portas, portanto não
estava cheia. A Eliane estava preparando um drink e sorriu para mim, enquanto
o Dhi veio pessoalmente me cumprimentar.

— Boa noite, diva! Pelo look hoje é mais cliente do que dona — apontou
para o meu corpo.

— Mais não, totalmente cliente.

— Vamos começar com o que?

— Vodka!

— Uhu! — comemorou — Tá querendo esquecer o boy.

— Tô querendo esquecer meu nome, amor.

— Três shots então — ele posicionou o copinho e encheu com Vodka.


Virei de uma só vez. Ele encheu novamente e eu bebi rapidamente, sem dar
tempo de sentir a queimação. O terceiro copo desceu mais suave, quase na
medida certa.

— Vai precisar de glicose, chefinha? — Eliane se juntou a nós.

— Deixe a diva dá P.T. — Dhi vibrou — Tô louco pra ver...

— Eli, se eu desmaiar pode me dar um banho... — Sugeri.

— Agora a potcha pira de vez! — Dhi gargalhou.


— Pode deixar que eu mesma te sirvo então, vou caprichar no boa noite
Cinderela! — Eli piscou.

Gargalhei alto e perturbei com os dois enquanto decidia quem seria a


minha vítima da noite.

Algumas horas (e doses) depois, estou me acabando na pista de dança. A


boate estava completamente lotada e o ritmo da noite era comandado por um
DJ. Muito pop e músicas atuais faziam os clientes gritarem, pularem e dançarem.
Quando começou uma sequência de músicas da Anitta, cantei alto e fui até o
chão, definitivamente a playlist da minha vida ideal era cantada por essa
mulher. Uma rodinha se abriu para mim e as pessoas me davam espaço para
que eu pudesse rebolar a minha bunda.

Chega, fecha o closet na maldade


Que hoje eu vou pegar você
Hoje eu vou pegar você
Hoje eu vou pegar

Vem que eu já tô cheia de vontade


De fazer acontecer
Hoje eu vou te enlouquecer

Quando voltei ao bar, para me reabastecer com álcool, praticamente


tropecei em uma pessoa, me jogando em seus braços. Mãos firmes seguraram a
minha cintura e me impediram de cair.

— Olha só, mais uma coincidência ou você sempre vem até mim? —
Rafael sorriu.
— Coincidência pura! — Encontrá-lo ali me lembrou de toda a merda
que eu estava tentando afogar em bebida e dança — Preciso ir.

— Quanta pressa... Lembro que você gosta que as coisas aconteçam bem
devagar — as mãos dele deslizaram em direção a minha bunda.

— Se você descer mais um milímetro, não vai conseguir andar! — Ele


imediatamente levantou as mãos, se rendendo. — Bem melhor.

— Você não é do tipo que se faz de difícil, senhora Fragoso — incitou.

— Sou uma puta seletiva — rebati — e meu maior erro foi não ter
notado o tipo de imbecil que você seria.

— Desculpe — disse, por fim — meu problema nunca foi com você. Eu
nunca deveria ter usado seu momento de fraqueza para atingir o Alexandre.

— Está desculpado, mas minha cota de idiota do dia já saturou. Podemos


conversar depois?

— Claro — sorriu — eu realmente te acho uma mulher incrível.

— Todos acham, querido — dei as costas e o deixei ali, com um


sorrisinho ridículo.

Esse esbarrão só serviu para me lembrar que eu ainda sabia meu nome,
logo, precisava beber até esquecê-lo.

— Whisky sem gelo — pedi assim que o Dhi me viu — Duplo. — Virei o
copo e voltei para a pista.

Estava no bar mais uma vez, em busca de uma caipirinha, quando fui
abordada por ele.

— Não acha que já chega de álcool? — Felipe indagou.


— Por um segundo, achei que tivesse viajado no tempo e fosse meu pai
reclamando.

— A sócia da boate não pode dar perda total na frente de todo mundo,
lembra?

— Não fode, Felipe! — a palavra e a lembrança de como era com ele fez
meu corpo esquentar — Aliás, fode sim. Com força!

— Porra, Gabi!

— Uma das melhores frases que eu adoro arrancar de você — me


aproximei — Mas prefiro arrancar a sua roupa... Com a boca. — Sussurrei já
colada ao seu corpo

— Gabi, vamos subir! — A sua resposta foi música aos meus ouvidos.

Como nos velhos tempos...

Seguimos em silêncio e finalmente havia alguma coisa que ocupava a


minha mente: sexo! Imagens diversas (e meio borradas) de todas as vezes em
que eu e o novinho Albuquerque fodemos. Se tinha alguém que me faria
esquecer meu nome em meio a um orgasmo, esse alguém era o meu sócio.

Quando chegamos à sala dele, Felipe trancou a porta e eu me joguei em


seus braços, agarrando seu pescoço e envolvendo sua cintura com as minhas
pernas. Mas ele não me beijou, na verdade virou o rosto quando minha boca foi
em direção a sua. Felipe sentou no sofá, ainda comigo em seu colo e fechou os
olhos.

— Porra, Gabi! — soltou o ar com força — Eu ainda tenho pau.

— Exatamente por isso eu o quero dentro de mim — rebolei ali,


tentando fazer seu membro ganhar vida. E consegui — Parece que você também
quer.

— Quero, mas não posso!

— Quando você estava puto porque pegou a Olga na cama com outro, me
fodeu bem aqui, dizendo que precisava de mim. É a minha vez, Felipe. Eu
preciso de você.

Ele me abraçou e eu achei que cederia, mas seu abraço foi forte e
contínuo, do tipo que é feito para acalentar. Com meu rosto apoiado em seus
ombros, suspirei e me deixei chorar.

— Qual é o problema, Gabi?

— Eu me perdi e quero me achar! — disse entre soluços — E você não


quer me ajudar...

— Gabi, você sabe que não seria nenhum sacrifício foder você, mas essa
não é a solução. Converse comigo, o que houve? Problemas com o seu marido?

— Tudo isso não passa de uma mentira deslavada! — funguei — Ele não
é meu marido. Quer dizer, é, mas não de verdade.

Ele me desencostou e segurou o meu rosto.

— Comece pelo começo.

— O Alexandre me pediu para casar com ele apenas para não perder a
fortuna, eu casei sem querer, bêbada em Las Vegas.

— O filho da puta te forçou a casar?

— É, mais ou menos, foi armação... No fim das constas eu permaneci


porque sou burra.

— Você passa longe da burrice, Gabi.

— Ele pegou a sua Bruna.

— Minha Bruna? Só tenho uma mulher e o nome dela não é esse.

— Hahaha — forcei uma risada — Que engraçado!

— Está com raiva por isso? — Sondou — Mas não era só um acordo?

— O problema não é essa safada, até foi... Mas tem coisa pior: a Yasmin.

— Porra, depois diziam que eu era o mulherengo que não prestava —


resmungou.
— A Yasmin é o amor da vida dele, mas morreu há muitos anos e eu não
posso competir com uma defunta!

Ele me olhou surpreso e demorou alguns segundos até falar.

— Você está apaixonada...

— E me odeio por isso — esbravejei — e odeio ainda mais o Alexandre


por não retribuir... E o pior é que não posso odiar minha rival porque ela está
morta!

— Caralho! Fodeu muito... Não sou uma das meninas da quadrilha e não
sei o que te dizer agora... Mas pelo pouco que vivi do amor, aprendi que ele é
complicado. Porém, vale a pena. Minha história com a Aline era meio torta, mas
hoje é o maior motivo da minha felicidade.

— Isso não está me ajudando! — As lágrimas insistiam em molhar meu


rosto.

— O que eu quero dizer é que você deveria conversar com ele


francamente. Confessar como se sente.

— Vocês homens são burros demais! Eu já tentei Felipe... Mas acima de


tudo eu me amo e não posso, depois de descobrir o que é estar apaixonada,
permanecer ao lado de um homem que ama outra mulher. É injusto comigo. Eu
nunca me perdoaria...

Saí do seu colo e sentei no sofá, deixando todas as lágrimas que eu


suspendi o dia todo virem à tona. Xinguei Deus e o mundo, usando cada
palavrão do meu vasto repertório e falei até me exaurir.

— Os últimos meses têm sido intensos para você, por que não tira férias
de tudo? — Sugeriu.

— Quero ir para casa, estou começando a ficar enjoada...

— Eu levo você.

— Amo você, moleque! — Beijei seu rosto com carinho.

— Também amo você, Gabi. E da próxima vez que me pedir para foder
você, me dá tempo para incluir a Aline que tá tudo certo! — Piscou.

— Combinado! — Sorri.

Parecia que esse dia tinha durado quarenta e oito horas, eu estava
exausta. Dirigindo o meu carro, Felipe me conduziu até o apartamento que o
imbecil decorou para mim. Estar ali me fez lembrar que esse nunca seria o meu
lar... Por enquanto teria que servir. Me arrastei até o quarto e assim que
encostei na cama, apaguei.

Acabei embarcando para São Paulo no dia seguinte. Tirei todas as


minhas coisas pessoais daquele apartamento e guardei comigo a chave para
mandar alguém devolver depois. Em Sampa, fui para o meu apartamento e a
familiaridade com o do Rio chegou a me incomodar. Era incrível como detalhes
poderiam fazer o lugar que você ama estar, em um lugar non grato.

A primeira pessoa que visitei foi a minha mãe, conversamos por algumas
horas e quando ela perguntou pelo Alexandre eu simplesmente disse que
estávamos nos separando. Meias verdades eram melhores, nesse caso. Meu
padrasto e ela queriam que eu ficasse na casa deles por uns dias, mas eu não
achava uma boa. Passar a ideia de coitadinha nunca foi a minha praia e receber
conselhos amorosos baseados em supostos problemas (que eu sei que ela
tentaria justificar) muito menos. Por esse motivo, passei o dia junto a eles e fui
embora depois do jantar.

Aproveitando o ensejo e o clima familiar, liguei para o meu pai e disse


que o visitaria nos próximos dias... Ao contrário da doçura que era o meu
padrasto, meu pai tinha casado com uma ninfeta histérica. Para essa visita, eu
precisava me preparar. Por fim, antes de dormir, deitada na minha confortável
cama, decidi mandar mensagem para as minhas amigas. Lú e Sol moravam em
São Paulo, seria legal encontrá-las.
Passando só pra avisar que estou na terra da garoa. Alguém
disponível?

Demorou alguns minutos, tempo em que respondi outras mensagens,


para que alguém desse sinal de vida. Lú, foi a primeira a responder:

Quando? Amanhã estou disponível.

Estava pensando em uma balada hoje kkkkk Mentira, já tô na cama.


Amanhã está ótimo.

Respondi .

Você está em SP e já está na cama? Tá doente?

Fê indagou desconfiada. Ela realmente me conhecia.

Passei o dia na casa da minha mãe. Esses encontros familiares


sugam a minha energia rsrsrs

A resposta delas vieram em forma de gargalhada.

Tô em SP ainda. Venham pra mansão amanhã. Podemos almoçar e


colocar o papo em dia ;)

Fê nos convidou e Lú prontamente aceitou.

Por mim, perfeito.

Deixe vê se Soraia está viva. Mas por mim tá fechado.


Foi a minha resposta.

Quase duas horas depois a Sol respondeu dizendo que daria um jeito de
almoçar conosco. Adormeci mais feliz. Nada como um dia após o outro com um
boa noite de sono entre eles.
Eu me perdi em você. E você não consegue nem se achar, quanto mais a
mim.

As suas palavras ainda ecoavam em minha mente e eu não sabia o que


dizer. Por um lado, não deixava de ser verdade, eu ainda estava confuso com
tudo que vinha acontecendo nos últimos dias. Por outro, algo havia mudado
depois da minha conversa com o Marcos. Era inegável que existia uma conexão
entre Gabriela e eu. A tensão sexual era latente, mas também havia
cumplicidade, companheirismo... A nossa trégua indicava isso, estar na sua
companhia era agradável, passar horas assistindo séries ao seu lado tinha sido
algo prazeroso.

Enquanto a comida que pedi esfriava, assim como o clima entre nós dois,
eu buscava palavras para responder. Mas não antes de o meu telefone tocar. Foi
uma chamada urgente do meu escritório e eu precisei correr para lá. Entre as
urgências da imobiliária e a minha falta de foco, me perdi em pensamentos.
Eu não sabia que passo dar, mas um após o outro, me vi em frente à
porta do apartamento dela, e não do meu que ficava ao lado. Bati algumas vezes
e não obtive resposta, pensei em usar a chave que eu tinha, mas como não sabia
o que dizer, achei melhor voltar para o meu. Lá, me segurei ao máximo para não
espiá-la. Talvez fosse espaço realmente que ela precisava.

Por horas, eu enrolei para não verificar as câmeras instaladas no


apartamento do lado, mas quando finalmente cedi, não a vi em parte alguma.
Ela poderia estar no banheiro ou em algum ponto cego, tinha vários no Ap., mas
não por tanto tempo. Peguei meu celular, no mínimo, umas quarenta vezes e
cheguei a discar apenas três, mas não fiz a bendita ligação, eu estava receoso de
que meu próximo passo a afugentasse mais uma vez. Horas depois, quando ela
chegou em casa trôpega e desabou na cama, eu soube que teria que esperar o
dia seguinte.

Consegui dormir, e de alguma forma, acordei um pouco mais tarde do


que o convencional. Mesmo assim, preparei o café da manhã. Nada tão
extraordinário, considerando que sempre tive empregadas e que a Gabriela era
cheia de regras de alimentação. No final das contas havia frutas, torrada e um
suco de caixa na bandeja, já era um começo.

Não ousei bater, usei a minha chave e resolvi levar o café até a sua cama,
mas para minha surpresa ela não estava lá. Uma sensação repentina de perda
me atingiu e por alguns segundos o pânico se instalou. A antiga sensação de
sufocamento e taquicardia me atingiu, precisei respirar fundo e contar
inúmeras vezes até dez para me acalmar. Foi apenas a surpresa. O susto por não
encontrá-la, só isso... O medo de que tudo se repetisse foi mais forte do que
qualquer outro sentimento.

Ela está bem, Alexandre. Repeti para mim mesmo durante várias horas,
até que uma foto postada no Facebook me provou isso. Ela estava realmente
bem. Havia estado com a mãe, era o que a rede social dizia. Passado o pânico,
um misto de frustração e raiva me tomou: ela viajou e não me disse nada?
Tínhamos muito para conversar, aquele xeque-mate não podia ser a decisão
final dela.

Mas, e se fosse?

O que eu faria se ela nunca mais voltasse? O nosso acordo não tinha a
menor validade se ela não quisesse, eu nunca obrigaria mulher alguma a fazer
algo contra a sua vontade. Talvez o destino estivesse apenas deixando claro o
que eu sempre soube: eu deveria ficar só. A minha chance havia passado. No fim
das contas eu vivi bem durante todos esses anos. Não me relacionei porque não
quis. O meu esquema de foda sempre funcionou de maneira perfeita, ninguém
se feria, cada um sabia quais eram as regras do jogo.

Esse pensamento me trouxe uma onda de alívio, as coisas poderiam ser


como sempre foram. Casamentos acabavam, meus pais teriam que entender que
eu tentei e não deu certo. Com isso em mente, esvaziei a minha mente. Passei
anos fazendo isso, jogando os sentimentos e lembranças em uma gaveta vazia e
deixando meu corpo, mais precisamente meu pau, comandar a minha vida.

Por duas noites eu tentei trazer meu velho eu de volta. Na primeira, a


gaveta estava cheia de mais e não permitiu que eu a trancasse. Saí para uma
boate qualquer, mas imagem da Gabriela era nítida naquele ambiente. Eu a
imaginava flertando e dançando com outros homens, como já tinha visto
inúmeras vezes, mas dessa vez algo mais ardia de raiva com o pensamento.
Tentei forçar a gaveta, empurrando álcool. Estava sem carro, por isso bebi sem
me preocupar. Acabei a noite enjoado no meu banheiro.

Na noite seguinte, depois de me enfiar no trabalho mesmo com ressaca,


decidi tentar mais uma vez. O sexo sempre foi o meu companheiro e o meu pau
não me decepcionava. Até aquela noite.

Usei a agenda do meu celular para decidir quem seria a escolhida, prestei
atenção apenas nas mulheres que continham "F1" ao lado do nome, ou seja,
havíamos fodido apenas uma vez e não havia risco de ser alguma das
desesperadas que tentavam me convencer a quebrar o acordo.

Tereza chegou ao meu apartamento toda empolgada, louca de saudades


e querendo conversar, mas eu queria outra coisa. Parti para cima dela e beijei
sua boca, passando as minhas mãos pelo seu corpo. Mas, ao tocá-la, fui sentindo
a diferença entre o corpo dela e o da minha esposa. Seus seios não eram tão
firmes e sua bunda era menor que a dela... Só o fato de estar pensando nisso, era
um péssimo sinal. A mulher tirou a minha camisa, eu tirei o vestido dela, mas
quando ela buscou a minha ereção, não encontrou. Eu fiquei frustrado e isso só
piorou quando ela tentou me convencer a receber um boquete, eu tinha perdido
totalmente o clima. Dispensei a garota, me desculpando e me joguei no sofá.

O que você fez comigo, Gabriela?

Eu estava concentrado analisando os documentos que envolviam a


compra de um novo empreendimento, uma casa em um condomínio de luxo que
um jogador de futebol com dívidas na receita federal gostaria de se desfazer,
quando a minha sala foi invadida. Em outros tempos, se uma loira linda
daquelas estivesse a minha procura, eu ficaria excitado e feliz. Mas não aquela
loira.

— Que porra você acha que está fazendo? — Ela gritou.

— Oi, Fernanda, pode entrar...

— Sem gracinhas, Alexandre. Nem o Marcos ousaria fazer piadas se


soubesse o meu nível de raiva nesse momento — ela marchou até estar de
frente a minha mesa.
— Estou trabalhando.

— O quê?

— Você perguntou o que eu estava fazendo... — Expliquei calmamente,


para não contrariar ainda mais a fera.

— Por que está trabalhando quando deveria estar lambendo o chão em


que a minha amiga pisa?

— Hum, o Marcos não atualizou você? — Ergui uma sobrancelha.

— Sobre toda a idiotice do acordo? Não, a própria Gabi fez isso. Ainda
não decidi se devo quebrar o seu nariz ou te dar um beijo por toda essa
situação.

— Prefiro o beijo — eu disse, fazendo-a estreitar os olhos — era


brincadeira. Se ela te contou tudo, deve ter contado que me dispensou há uns
três dias.

— E daí?

— Ela não me quer... Tentei fazer o certo e a pedi em casamento, mas ela
recusou mais uma vez.

— Tão bonito, mas tão burro... — sorriu — Se bem que isso é um mal da
sua espécie. Meu querido, tá fazendo errado, faz de novo.

Apenas encarei-a, não era fácil acompanhar as ideias de Fernanda


Albuquerque.

— Ela está apaixonada e assustada, o que não é comum para a minha


amiga. — Prosseguiu — Descobrir que ama o cara com quem casou e que ele
ama, perdoe-me, a ex-noiva defunta não é tão simples, convenhamos.

— Está perdoada. Eu estava tentando dar o tempo que ela pediu...

— Só se lembre que a fila anda e que ela é uma mulher linda, de espírito
livre... Dependendo de quanto tempo você der, pode ser tarde demais.

— Não sei o que fazer, Fernanda!


— Eu estava certa — ela sorriu — você também está apaixonado.

— Parece que você e seu marido dividem a mesma opinião, então — dei
de ombros — no fim das contas, eu realmente estou — admiti pela primeira vez,
principalmente para mim.

— Esse é o primeiro passo. Você está no caminho certo e saberá


exatamente o que fazer.

— Meu amigo tem sorte em tê-la.

— Eu sei e o melhor, ele também sabe — ela gargalhou — não posso


dizer que sei pelo que você passou, mas posso afirmar com toda certeza do
mundo, que abrir a guarda e deixar o sentimento fluir vale a pena. Amar vale a
pena. Não é sempre doloroso...

— Obrigado — fui até ela e dei-lhe um abraço forte — de verdade,


obrigado por ter vindo aqui.

— Quero que a Gabi seja feliz e realmente acho que você pode fazer isso.
Mas sempre posso quebrar a sua cara, caso faça minha amiga sofrer — ela me
encarou.

— O Marcos já me disse que sua mão é pesada...

— Mentira, ele nunca admitiria isso! — Gargalhei — Preciso ir! Se cuida.


E dá um aumento para a sua secretária, foi uma das mais difíceis de persuadi.
Fernanda saiu como um foguete pela porta e eu segui o mesmo caminho,
só que em direção à mesa da Odete.

— Algum problema, Alexandre? — Minha secretária perguntou.

— Soube que você merece um aumento — falei sorrindo — e de uns dias


de folga — soltei e ela estreitou os olhos.

— O quanto a belíssima loira é responsável por esse ataque repentino de


bom humor? — Arqueou a sobrancelha.

— Cem por cento! — confessei sorrindo

— Se eu soubesse que a Fernanda Albuquerque fosse me render um


aumento, eu nem teria feito ela parar aqui — sorriu. — Minha folga começa
hoje, presumo.

— Talvez... Mas da próxima vez que ela aparecer por aqui, deixa o
segurança em alerta, ela ameaçou me bater!

— Bem que você anda merecendo uns tapas...

— Odete, não esquece que eu sou seu chefe! — Repreendi, sorrindo

— Você acabou de me dar folga — deu de ombros — Logo, não estou


mais na condição de funcionária.

— Tem razão! — sorri — Mas antes será que você pode me fazer um
grande favor? — ela assentiu sorrindo — Preciso de uma passagem para São
Paulo.

— Mais alguma coisa?

— Hum... — hesitei e sentei na cadeira à sua frente. Talvez ouvir a


opinião de uma mulher experiente me ajudasse — O que vocês, mulheres,
esperam que o homem que pisou na bola faça para reconquistá-las? — Odete
me encarou por alguns segundos antes de falar.

— Esse homem é você? — Arqueou a sobrancelha.

— Digamos que é um amigo...

— Claro, um amigo... — sorriu — Primeiro seu amigo deve admitir seus


sentimentos, ser honesto. Começar pedindo desculpas pelo erro. — Eu
acompanhava tudo atentamente — Feito isso, ele deve rastejar aos pés dessa
mulher, atender todas as suas vontades, no popular lamber o chão que ela pisa...
— Sorri pela semelhança com as palavras de Fernanda.

— Ele deve comprar flores e chocolates?

— Para início de conversa sim... Mas, o mais importante não é o objeto


em si, a mulher precisa ver nos olhos do seu amigo que ele está sendo sincero
quanto aos seus sentimentos.

— Mais alguma coisa?


— Tenho certeza que um par de brincos combinando com uma
gargantilha de topázio azul, combinarão perfeitamente com os olhos da
Gabriela.

— Mas você disse que o presente não era importante — sorri.

— Não é, mas ela merece as joias, por aturar você! — Deu uma
piscadela.

— Deseje-me sorte! — sorri mais uma vez naquele dia.

— Não mesmo — sorriu — eu estou torcendo para que ela faça você
rastejar.

— Você deveria ficar ao meu lado.

— Nada disso. Eu sou do time das mulheres, se você está tão


desesperado assim para conseguir o perdão da Gabriela, é porque aprontou e
merece sofrer um pouquinho. — Sorriu — Agora vá atrás das joias, pois elas são
difíceis de encontrar.

— Será que você não poderia ver isso por mim?

— Não! Você mesmo precisa as escolher, se não o presente não tem o


menor valor. A Gabriela precisa saber que você mesmo comprou pensando nela
— assenti em concordância.

— Obrigado, Odete!

— Estarei aqui torcendo para que a Gabriela o faça sofrer mais um


pouquinho.

— Deus, tenha piedade da minha alma! — Resmunguei e ela gargalhou.

No fim das contas, por causa de um problema para pousar em São Paulo,
só consegui chegar na madrugada. Eu aguardava no seu quarto, sentado na
poltrona ao lado da cama. Gabriela dormia serena. Seus traços perfeitos e
delicados compunham o retrato de uma bela mulher, mas era quando estava
acordada que ela hipnotizava.

Não somente pelo corpo escultural, que já cansei de dizer que o quanto é
fantástico, a mulher tinha um par de seios e uma generosa bunda. Bunda capaz
de fazer você assinar um papel em branco só quando ela andava rebolando a
sua frente. A mesma que me fez brochar apenas com a lembrança de que não
era ela ali, se esfregando em mim.

Além disso, a Gabi exalava energia viva. Ela emanava força,


determinação, desejo, ardor. E era isso que eu admirava nela.

Como eu não enxerguei essas coisas todas antes?

— Sempre foi você! — O som da minha voz preencheu o quarto e


Gabriela gritou ao acordar assustada.

— Mas que porra! — soltou um tempo depois, ao constatar a minha


presença ali. — Você não deveria acordar as pessoas assim.

— Eu precisava falar com você.

— E não poderia fazer isso quando eu estivesse acordada? — Arqueou a


sobrancelha — de preferência tocando a campainha para anunciar a sua
presença?

— Tem razão — cocei a cabeça — mas eu trouxe café da manhã —


apontei para a bandeja

— Até São Paulo? — indagou desconfiada — Não estou com fome... Não
vou nem perguntar como você conseguiu entrar aqui...

— Então podemos pular para a conversa que me trouxe até aqui.

— Alexandre, eu não quero ouvir... — Sua voz falhou.

— Mas eu preciso falar!

— Procure um terapeuta! — Rebateu ficando de pé, estava usando uma


camisa enorme branca, que chegava até as coxas. — Ele é a pessoa indicada
para ouvir você.

Saiu pisando firme em direção ao banheiro. Alguns passos depois a


alcancei e invadi o banheiro, ela fazia xixi, recostado na pia, completei:

— Eu não preciso da droga de um terapeuta para confessar que estou


apaixonado por você! — Disse irritado. Os olhos de Gabriela se arregalaram em
clara surpresa.

Eles pareciam dois faróis apontando a direção que eu deveria seguir. Sua
boca abriu e fechou por diversas vezes, parecia que ela havia perdido a
capacidade de falar. No que pareceu uma eternidade depois, ela pareceu
acordar do estado de torpor e se mexeu. Livrou-se das peças de roupa e entrou
no boxe.

— Ok, eu vou esperar você acordar!

— Eu falava sério quando disse que precisava de um tempo, não precisa


dizer o que acha que eu quero ouvir — disse quando a água escorreu pelos fios
loiros.

— Eu também falava sério quando disse que sempre foi você! De um


jeito que eu não sei explicar, quando me vi diante do testamento foi o seu nome
que eu pensei no primeiro momento. E alguns meses depois, estou constatando
que estou apaixonado por você. E você também está apaixonada por mim... E eu
não aceito o seu pedido de tempo. Não quando tudo parece estar finalmente se
organizando.

— Se organizando para quem? — Sorriu tristemente, me encarando


através do vidro molhado.

— Para nós!

— Alexandre, eu não posso mais ser o objeto que você desfruta de bons
momentos e evita nos minutos seguintes... — Fiz menção de falar, mas ela me
impediu com o olhar — Hoje você acordou e decidiu que está apaixonado por
mim. Amanhã você está andando na rua, encontra a Bruna e transam. E foda-se
a Gabriela!
— Não vai haver Bruna! — invadi o boxe e toquei seu rosto
delicadamente — Nem Yasmin se é o que você está pensando... A Yasmin foi a
primeira mulher que amei na minha vida e eu achei que não sentiria mais nada
dessa forma até te conhecer...

— Eu não nasci para ser prêmio de consolação.

— Quem disse que é isso que você é para mim?

— Suas ações, Alexandre. — Encarei-a sem entender — Você acha que


gosta de mim porque fui a única a embarcar na loucura que foi esse casamento
de mentira. Mas eu estou caindo fora! Eu não posso pedir que me ame, mas
posso impedir que me magoe.

— O que eu preciso dizer para você entender de uma vez por todas que
você é importante para mim?

— Mais ações que palavras é um começo.

— Isso significa que...

— Conte a verdade ao seus pais e peça a anulação do casamento.

— Isso é ilógico, Gabriela.

— Eu perdi a minha capacidade lógica quando me apaixonei por você e


olhe onde estou.

Tomei a sua boca num beijo urgente e lascivo. A água, mais uma vez,
banhava um momento decisivo. Livrei-me da camisa que, ensopada, grudava na
minha pele. Sem desgrudar da minha boca, ela fez com que o resto das roupas
caíssem num baque surdo no chão molhado.

Meu corpo reagiu a ela de imediato, se arrepiando a cada toque úmido.


Beijei seu pescoço afastando-a dos jatos mornos, ela correspondeu colocando
uma das pernas ao redor da minha cintura. Ergui seu corpo, apoiando-o contra
a parede e invadi sua boceta que estava tão molhada quanto toda aquela
situação.

— Não se afaste de mim — pedi enquanto tomava o que sempre me


pertenceu — sou incapaz de viver sem você — ela me calou com um beijo
quente, puxando meu cabelo, como se me punisse pelo pedido.

Quando afastei nossas bocas, enxerguei através dos seus olhos todo o
desejo que ela sentia, mas também havia temor.

— Vamos fazer do seu jeito — arremeti mais uma vez — vai dar tudo
certo! — prometi, indo fundo dentro dela.

Quando ela gozou, gritou tão alto que impulsionou o meu próprio gozo,
antes que eu pudesse controlar. Quando encostamos nossas testas úmidas, eu
me senti muito bem, como não me sentia há anos.
Era impossível manter a coerência quando Alexandre estava próximo.
Era ainda mais impossível manter-me indiferente quando ele tocava a minha
pele com as suas mãos firmes e grandes. Sempre fui movida ao toque, mas o
dele em especial, me causava um frenesi a mais. Era quase inebriante quando a
sua boca tomava a minha com a fome e o desejo, que meu corpo desejava. Era
cada vez mais delirante quando nossos corpos se encaixavam.

Tudo isso pode explicar o motivo para o meu coração errar o compasso
quando ele falou que estava apaixonado. E eu acreditei. Embora não viesse a
confessar, acreditei por tantos motivos, mas o principal deles era simples: eu
queria acreditar que era verdade. Queria realmente acreditar que ele
correspondia aos meus sentimentos.

Merda! Sei que estou parecendo uma imbecil apaixonada e isso me


deixava puta da vida. Saio do boxe apressada, deixando-o para trás, depois da
nossa foda molhada.
— O que eu fiz de errado dessa vez? — A voz grave do Alexandre
preencheu o quarto e eu o ignorei fingindo estar concentrada em busca de uma
roupa no closet. Escutei seus passos aproximando-se de onde estou e meu
coração acelerou com a sua proximidade — No que você está pensando,
Gabriela? Divide comigo... — pediu num tom que assemelhava a uma súplica. E
meu corpo me traiu ao não conseguir ignorá-lo por mais tempo.

— Nas minhas amigas... — Digo, enquanto passo uma camiseta branca


pela cabeça, para depois vestir um short jeans rasgado, e não deixa de ser
verdade.

A quadrilha de salto alto e gloss foi meu bálsamo quando cheguei em São
Paulo completamente desnorteada. Em meio a risadas e lágrimas, sol, piscina e
um almoço delicioso na mansão dos Albuquerques, elas chamaram a minha
atenção para alguns detalhes.

Segundo elas, o que eu sentia não era apenas raiva ou frustração por não
estar sendo correspondida pelo Alexandre, mas algo bem mais profundo. Eu
admiti a minha paixão, mas elas diagnosticaram amor. Me assustei inicialmente,
mas contra fatos não havia argumentos. Sim, era amor! O tal sentimento intenso
do qual eu jurava estar imune. Nunca sonhei em casar, ter filhos ou constituir
família, pelo contrário, sempre fui contrária a esses ideais impostos pela
sociedade.

Todavia, algo mudou dentro de mim. Ainda continuava acreditando que


para ser feliz você precisa primeiro se amar e que a felicidade não estava
atrelada a outrem. Mas ter uma amostra grátis, ainda que confusa, disso me fez
querer mais.

Eu nunca quis dar meu coração de bandeja para ninguém e odiava essa
sensação de vulnerabilidade e impotência que o amor trazia. Juro que tentei não
deixar que isso acontecesse, mas em um dia qualquer que não sei precisar,
deixei de compartilhar apenas meu corpo e acabei entregando meu coração a
um homem que não sabia como retribuir.

— Humm... — hesitou — Suas amigas devem me odiar.


— Com toda a certeza do mundo! — Concordei, sorrindo.

— Fernanda já deixou isso claro... — coçou a cabeça.

— Não estou surpresa... — Era bem típico da Fernanda assumir nossas


dores e partir para o combate. Foi assim quando o noivo da Sol rompeu o
relacionamento, o que resultou em um nariz quebrado. — Mas, se ela te
procurou, você deveria ao menos ter um hematoma visível. — Arqueei a
sobrancelha sorrindo.

— Eu estava usando armadura. — Sorriu.

— Foi por causa dela que você veio?

— Se eu disser que as palavras dela não ajudaram a entender o que sinto


por você, estaria mentindo — Alexandre aproximou-se lentamente de onde
estava e eu recuei dois passos até minhas costas tocarem o armário atrás de
mim.

Ele parou, como se entendesse que eu precisava daquele pequeno espaço


físico. Meu ex-atual-pseudo-marido usava apenas uma toalha preta enrolada na
cintura e gotas de água escorriam por seu cabelo curto, seguindo uma trilha até
seu abdômen definido.

— Mas a grande verdade é que estou aqui porque eu quero você! —


completou um tempo depois e acrescentou — Eu não sei o que fazer para que
você acredite em mim, mas estou disposto a rastejar se assim você desejar —
fitou-me longamente.

Permaneci em silêncio por alguns segundos, enquanto meu corpo, se


acostumava com a sensação provocada por suas palavras.

— Vamos tomar café — disse passando por ele apressada em direção a


cozinha, escutei seus passos vindo atrás de mim, parei e quase nos chocamos —
Você precisa vestir uma roupa! — percorri seu peito nu e quase me perdi mais
uma vez naquele belo corpo.

— Algum problema com o meu corpo? — Ergueu a sobrancelha sorrindo.


— Todos! — rebati — Não consigo pensar direito com você assim —
Admiti frustrada.

— Talvez pensar não seja a melhor solução para nós — tocou meu rosto
delicadamente — só por hoje, poderíamos apenas viver sem pensar em nada —
seus lábios tocaram o meu pescoço e eu arfei com o toque — Apenas eu e você...

Eu estava quase me deixando envolver pelas suas palavras e seu toque


carinhoso quando o toque do interfone soou alto e insistente. De início,
ignoramos e permanecemos colados, sua boca provocando meus lábios num
toque deliberadamente lento, minhas mãos enlaçadas em seu pescoço.

— Alê... — arfei quando ele mordiscou meu lábio inferior...

— Eu e você... — sussurrou.

Eu estava inebriada com todas as emoções, não importava se o interfone


continuasse chamando insistentemente, nem se a esse barulho incomodo agora,
fosse somado a campainha estridente do meu apartamento. Era fácil esquecer a
vida lá fora quando Alexandre me beijava, ele sabia usar a língua como poucos,
mas os toques insistentes da campainha e interfone me incomodaram. Eu
estava pouco me fodendo para quem estivesse do outro lado, mas bateram com
tanta força contra a porta que era impossível continuar ignorando a insistência.

— Acho melhor ver a porta... — gemi de frustração. — Mas, que porra! —


As batidas aliadas ao toque da campainha estavam soavam cada vez mais alta.

— Você está esperando visita? — indagou.

— Não! — neguei — E mesmo que eu estivesse, nenhum desconhecido


pode subir sem a minha autorização. Se bem que você invadiu meu
apartamento — balancei a cabeça — Enfim, vou ver quem é! — Seja lá quem
fosse do outro lado, eu dispensaria imediatamente.

— Pai? — Indaguei num tom agudo quando o vi parado do outro lado


seguido da sua ninfeta.

— Desde quando eu preciso de autorização para visitar minha filha? —


bufou irritado e quando seus olhos notaram o Alexandre parado de toalha na
minha sala, eu tive certeza de que se meu pai tivesse uma arma naquele
momento, atiraria.

— Eu não sei do que você está falando...

— O seu marido ordenou que ninguém entrasse sem a prévia


autorização dele! — rosnou — Esse é o tal ex-marido? — apontou para o
Alexandre.

— Você fez isso? — arregalei os olhos — Você invade meu apartamento


e ainda por cima sai dando ordens? — indaguei irritada.

— Calma — disse num tom sereno — Eu meio que deixei claro que não
deveríamos ser incomodados... Não contava que seu pai fosse aparecer aqui.

— Ele invadiu o seu apartamento? — meu pai indagou alto — Vamos


ligar para a polícia! — disse com o celular em mãos pronto para discar.

— Não! — discordei pegando o celular dele — está tudo bem, pai. —


Busquei tranquilizá-lo e ele me olhou descrente — E você — apontei para o
Alexandre — Depois falaremos sobre esse seu comportamento.

— Essa cena parece com as do meu núcleo da novela, uma família


tipicamente brasileira repleta de discussões acaloradas! — A atual esposa do
meu pai sorriu abertamente um sorriso digno de comercial de creme dental —
Prazer, sou a Dafne Figueiredo, atriz e madrasta da Gabriela! — estendeu a mão
para Alexandre.

— Alexandre Fragoso, empresário e companheiro da Gabi — aceitou a


mão estendida e com o movimento a sua toalha quase caiu.

— Será que não dá para você vestir uma roupa ou você costuma andar
de toalha por aí? — Meu pai indagou, irritado.

— Na minha casa, costumo andar nu! — rebateu sorrindo.

— Eu também, né amor? — Dafne indagou trocando um olhar com o meu


pai e eu não contive o revirar de olhos — É libertador andar como viemos ao
mundo...
— Agora que todos já puderam contemplar o belo exemplar de homem
que você é, será que você poderia vestir uma roupa? — Bufei irritada.

— Pedindo assim com jeitinho... — sorriu — Se vocês me dão licença,


vou me vestir.

— Vá e volte logo, temos muito o que conversar — meu pai avisou antes
de o Alexandre se afastar. Dito isso sentou-se no sofá acompanhado da mulher e
eu permaneci de pé.

— O que vocês fazem aqui? — fui direta ao assunto, pois queria o quanto
antes terminar esse drama familiar.

— Querida, você estava deprimida e seu pai preocupado, então...

— Eu não estava deprimida! — rebati.

— Claro que estava — meu pai discordou — ninguém permanece imune


ao fim de um relacionamento, nem mesmo um Burnier.

— Quem te contou? — Eu ainda não havia dito ao meu pai o motivo que
me fizera retornar a São Paulo. O olhar que me lançou significava que a minha
mãe já havia passado o relatório — Era óbvio que minha mãe ligaria!

— Ela não fez por mal. Estava preocupada com você...

— Por isso estamos aqui, querida — Dafne tocou a minha mão — para
dizer que nos sensibilizamos com a sua dor.

— E, óbvio, garantir que um bom advogado auxilie nesse processo de


divórcio. — Meu pai, assim como eu, era objetivo.

— Amor... — Dafne repreendeu — Agora não é hora de falarmos sobre


divórcio, você não vê que eles estão se acertando?

— Estão? — Ele arqueou a sobrancelha

— Estamos tentando... — dei de ombros.

— Eu sabia! — Dafne bateu palmas animada — Eu sabia que uma hora o


seu final feliz ia chegar!
— Eu sou o seu final feliz, amor? — Alexandre perguntou, passando o
braço ao redor do meu corpo e puxando-me para si.

— Ele é, Gabi? — Meu pai nos fitou longamente.

— Eu nunca gostei de contos de fadas! — Dei de ombros novamente.

— Te faltava um príncipe encantado — Alexandre, nada modesto,


pontuou.

— Você é, o meu príncipe? Porque está mais para sapo! — Afastei seu
braço.

— O sapo sempre vira príncipe no fim da história. — Rebateu sorrindo.

— Não fode, Alexandre! — rebati e ele gargalhou alto — Qual a graça?

— A sua escolha de palavras, querida! — Sorriu maliciosamente.

— Imbecil!

— Típico casal de novela das sete! — Dafne citou com as suas referências
televisivas.

— Que inferno de dia! — joguei-me no sofá levando as mãos ao rosto.


Queria poder me teletransportar para um lugar longe de madrastas e maridos
imbecis.

— Amor, acho que a Gabi e o seu marido querem ficar sozinhos!

— Até que enfim, você falou algo concreto — soltei.

— Já estamos de saída, mas antes... — sempre tinha um “mas” — Você


ama a minha filha? — meu pai foi direto ao ponto e permaneci com a mão no
rosto para evitar ainda mais constrangimento.

O silêncio imperou na sala por alguns segundos, como em cena de novela


na qual a verdade será revelada e todos permanecem emudecidos até alguém
romper o silêncio. E esse alguém fui eu.
— Não é da conta de ninguém! — Levantei do sofá e marchei em direção
a porta — Já passei da idade para o senhor se preocupar com quem eu me
relaciono, agora pelo amor que o senhor jura ter por mim pai, vai embora! —
supliquei.

— Não sem antes eu responder à pergunta do seu pai — Alexandre


finalmente abriu a boca.

— Alexandre, por favor...

— Quando vi a Gabriela pela primeira vez, ela estava acompanhada da


Fernanda, foi numa boate... A primeira vez que nossos olhos se encontraram eu
soube que Gabriela era daquelas mulheres que você jamais consegue esquecer
— eu precisei me recostar na porta, pois minhas pernas fraquejaram. Mas, que
porra, Gabi! — ela é uma energia pulsante daquelas que chegam e irradiam
qualquer lugar, por mais sombrio que seja. Ela trouxe alegria aos meus dias,
sorrisos a minha vida e uma sensação que eu acreditava nunca mais sentir. Se
isso é amor... — coçou a cabeça sorrindo, seus olhos estavam marejados ou
seriam os meus? — Eu não sei dizer. Só sei que eu quero estar do lado da sua
filha, compartilhar da sua risada e da sua presença pelo tempo que ela permitir.

— Acredite nesse homem experiente — meu pai sorri contente — isso é


amor! Faça a minha filha a mulher mais feliz desse mundo. Ela não merece
menos que isso. — Tocou o ombro do Alexandre.

— Será a minha missão de vida — Alexandre respondeu encarando-me.

— Gostei dele — meu pai me abraçou apertado e sussurrou ao meu


ouvido — faça ele rastejar aos seus pés, honre o sobrenome da família.

— Te amo! — Beijei seu rosto.

— Seu marido seria um perfeito mocinho de novela! — Dafne abraçou-


me.

— Eu sei... — concordei sorrindo.

Quando fechei a porta atrás de mim, suspirei. Eu havia sobrevivido.


— Vamos comer na rua! — Alexandre anunciou sorrindo.

E meu coração bateu em disparada. Será um longo dia...

Depois da visita surpresa do meu pai e toda aquela conversa, eu poderia


garantir que havia perdido a fome, mas mesmo assim concordei com o
Alexandre. Quanto menos permanecêssemos apenas nós dois, menos teríamos
que discutir sobre essa nossa relação. Por alguns segundos, o Alexandre sumiu.
Quando retornou da rua, solicitou um Uber Black e não informou para onde
iriamos, também não perguntei. Estava atordoada com tanta coisa acontecendo:
a sua vinda para cá, a declaração que me amava... Tudo ainda estava sendo
digerido aqui dentro.

Somente quando o carro parou foi que eu despertei dos devaneios. Olhei
para o lado e vi que estávamos numa área verde, um parque para ser mais
precisa, o parque Villa-Lobos. Localizado no bairro de Alto dos Pinheiros, na
região Oeste da Capital. Ele era considerado uma das melhores opções de lazer
ao ar livre da cidade, o reduto paulista para sentar na grama e fazer um
piquenique ou ainda praticar atividades físicas.

O parque, que abrange uma extensa área de Mata Atlântica, possui


ciclovia, quadras, campos de futebol, playground e bosque com espécies de Mata
Atlântica. A área de lazer inclui ainda aparelhos para ginástica, pista de cooper e
contava até com um anfiteatro aberto com capacidade para receber setecentos e
cinquenta pessoas.

— Você sabe que isso é um parque, não sabe? — Voltei-me para


Alexandre. Ele havia dito que sairíamos para comer.

— Sei — sorriu — vamos fazer um piquenique. Vem! — Estendeu-me a


mão animado. Como dizer não para toda aquela animação?

— Está bem... — Concordei aceitando a sua mão.


Seguimos lado a lado em busca de um lugar ideal, palavras dele, para
estender a toalha xadrez. Não sei onde ele encontrou tudo aquilo, mas
Alexandre desceu do carro, com uma cesta de piquenique recheada de comida,
além da bendita toalha.

— Aqui, está ótimo! — Anunciou parando em frente a uma grande


árvore que fornecia sombra. Ele estendeu a toalha sobre a grama, depois abriu a
cesta e começou a retirar suco em caixa, água, uma pequena garrafa térmica,
croissant, muffins, maçã, pera e mais uma infinidade de comida que dava para
alimentar um batalhão. Eu estava sentada próxima a ele observando-o arrumar
com afinco as coisas. — O que é divertido? — indagou ao levantar os olhos e me
ver sorrindo.

— Por onde começar... —sorri — Você vestido assim para um


piquenique — apontei para a bermuda de sarja e a camisa de botão cinza... — E
nós aqui, num piquenique.

— A roupa era a menos formal que eu tinha na mala — sorriu — E o


piquenique foi a forma que eu encontrei de ficar mais um tempo ao seu lado. —
Sua mão acariciou a minha delicadamente — Tem suco e água de coco, mas
trouxe café também, caso queira se render a cafeína — sorriu e eu sorri de volta
por ele se lembrar que não sou adepta ao café — também comprei pão light e
geleia de framboesa, sua mãe disse que você gostava!

— Ela é uma linguaruda! — Sorri enquanto me servia com o pão.

— Foi ela que me ajudou a entrar no seu apartamento — confessou


sorrindo — não briga com ela, ela fez isso porque te ama.

— Ela é um coração mole, isso sim — sorri — aposto que quando viu
esses seus belos olhos, logo tratou de ajudar.

— Se eu disser que não foram pelos meus olhos que ela se derreteu... —
Arqueou a sobrancelha sorrindo.

— Idiota! — soquei seu braço sorrindo.

— Você tem uma mão pesada! — levou a mão ao local atingido.


— Miga Fê me ensinou direitinho.

— Pobre, Marcos... — ele disse e eu gargalhei.

Passamos o tempo seguinte comendo, tudo estava tão delicioso, que a


fome que eu julgava ter desaparecido, ressurgiu. Alexandre também comia em
silêncio. Um silêncio confortável, o ambiente ajudava nisso, ouvíamos sons de
pássaros e o som da fonte que jorrava água.

— A última vez que estive aqui eu devia ter seis anos... — falei deitada
sobre meu braço observando o céu azul, algo raro na cidade da garoa — Meus
pais me traziam aqui para andar de bicicleta.

— Isso não é uma indireta para que andemos de bicicleta, né? —


Alexandre virou-se em minha direção — A última vez que andei de bicicleta eu
tinha, pelos menos, uns vinte anos a menos.

— Esqueci que eu casei com um tiozinho... — Gargalhei.

— Um tiozinho muito gato e foda na cama!

— E modesto! — completei sorrindo.

— Já que estamos falando de idade... — sentou — Achou antiquada a


minha ideia do piquenique?

— Eu nunca fiz um piquenique... — Confessei.

— Isso não me surpreende — sorriu.

— Eu nunca tive um relacionamento sério duradouro, então todos esses


programas de casal de margarina, eu deixei de fazer — dei de ombros.

— Fico feliz de ter a honra de te guiar por esse mundo de cafonices


românticas que é o relacionamento amoroso — sorriu — já vai se preparando,
pois vamos andar de pedalinho na Lagoa Rodrigo de Freitas, vamos pegar um
cineminha num sábado à tarde, sair para jantar com outros casais... Fernanda e
Marcos podem ser os primeiros para te ambientar nesse mundo. — Ele falava
tudo com um enorme sorriso no rosto.

— Você esqueceu de um programa importante de casal.


— Qual?

— Motel! — pontuei — Casais frequentam motéis.

— Quem disse que eu esqueci? — passou as pernas entre meu corpo e


fitou a minha boca — Eu estava tentando ser romântico....

— Encontre o meio termo! O cafajeste fofo é um ótimo começo, não me


venha com flores e declarações melosas, pois eu não sou a amiga Sol que vomita
arco-íris — ele gargalhou alto.

— Ok senhora Fragoso Burnier, serei o marido que leva café na cama e


fode no boxe do banheiro, está bom para você?

— Estamos melhorando... Para melhorar ainda mais, você deve pular


para a parte que me fode no banheiro.

— Seu pedido é uma ordem! — depositou um selinho nos meus lábios —


Dessa vez vamos começar na cama? Já reparou que nós nunca fizemos sexo lá?
Sou um homem sarado e tudo mais, mas não tenho mais vinte anos —
perturbou.

— Vou ter que reclamar meu direito de consumidora no PROCON,


comprei um marido avariado!

— Ah é? — ergueu a sobrancelha — Eu vou te judiar ao ponto de não


consegui andar direito pelos próximos dias.

— Eu conto com isso, tio! — pisquei e minha boca foi esmagada pela sua.
Alexandre provou da minha boca com desejo e urgência, quando ele se afastou
eu respirava ofegante.

— Levanta que o tio tem uma lição imoral para te dar!

Sorri alto enquanto ele jogava tudo dentro da cesta de piquenique.


Alguém estava com pressa de me dar uma liçãozinha e eu, como aluna aplicada,
aguardava ansiosamente que a aula tivesse início.
O clima de flerte do piquenique durou pouco tempo. Namorar feito dois
adolescentes tinha sido bom, mas foder com o Alexandre estava no topo das
melhores tarefas. Aquela história de transar na cama foi esquecida assim que
pisamos no meu apartamento, ainda em São Paulo. Nossos corpos se buscaram
com a urgência de sempre e nos rendemos a paixão ainda na sala. Mais tarde,
logo depois de ele se lembrar de me entregar os presentes sugeridos por sua
secretária, repetimos a dose no sofá e em seguida, no banheiro. Quando
deitamos na cama estávamos exaustos, ela ficaria para outro dia.

No dia seguinte, precisamos voltar para a vida real. Eu havia partido para
São Paulo para espairecer, fugir de todo o caos que Alexandre Fragoso e sua
bagagem representava, mas a avalanche me perseguiu e aqui estou: submersa
nele. Não adiantava adiar a volta, as coisas eram como eram. E, além disso, ele
precisava trabalhar. Uma ligação do meu pseudo-ex-sogro nos colocou em um
voo para o Rio de Janeiro.

No aeroporto, o Assis nos recebeu. Por mais que tentasse se conter, o


pequeno sorriso e o olhar demonstravam contentamento em nos ver juntos.
Quando entramos no carro, a pergunta que pairava em minha mente, foi
proferida pelo motorista:

— Para onde vamos, senhor?

Não tínhamos discutido nada a respeito, na verdade, além de namorar,


não tínhamos conversado sobre a nossa relação. O Alexandre me olhou em
expectativa, mas não me perguntou nada.

— Para casa. — Respondeu como se não tivéssemos nos mudado


nenhuma vez desde o casamento.

Ao meu lado, no banco de trás, ele segurou minha mão e me encarou


sorrindo.

— Nós vamos conversar sobre isso mais tarde. Mas acredito que a casa
seja o melhor lugar, não quero que a gente fique em apartamentos separados
hoje.

— Não tem nada meu lá...

— Pode andar nua pela casa, eu não ligo! — Sussurrou no meu ouvido.

— Os empregados vão adorar — anunciei e ele me encarou seriamente.

— Acabei de lembrar que você trouxe uma mala de São Paulo — revirei
os olhos — mantenha-se vestida quando outros olhos, que não sejam os meus,
estiverem sobre você.

— Tiozinho careta — rebati e ele mordeu meu dedo — Agora lambe!

Ele lambeu e meu corpo esquentou rapidamente.

— Comporte-se, o Assis não vai testemunhar nada — sorriu largando a


minha mão.
— Lar, doce lar! — Ele disse assim que adentramos a mansão.

— Que bom tê-los de volta — Carmem nos cumprimentou — preparei


um lanche leve, como você gosta, enquanto o almoço está sendo providenciado.

— Obrigada, Carmem — lavei as mãos e sentei no banco alto junto a


bancada de mármore.

— Vou subir e colocar um terno. Preciso ir a empresa, mas nos vemos no


almoço? — ele perguntou em expectativa, eu assenti e ele subiu correndo.

Comi a salada de frutas enquanto tentava, rapidamente, reorganizar


minha vida e ocupar meu dia. A agenda do meu celular mostrava que eu
precisava confirmar uma consulta com o dermatologista, para o dia seguinte.
Quando liguei para o consultório a auxiliar informou que uma paciente tinha
acabado de desmarcar, havia um horário vago. Prontamente, fui encaixada na
vaga e minha consulta aconteceria em quarenta minutos. Aproveitei a deixa e
liguei para a academia que a Fernanda frequentava na cidade, para confirmar o
início das aulas de boxe. Quando o Alexandre desceu usando calça e terno cinza,
com gravata preta, eu já estava de pé, pronta para sair.

— Vai ficar na piscina enquanto eu volto? — perguntou, sorrindo.

— Vou sair.

— Onde pensa que vai? — ele me puxou para perto, encostando nossos
corpos.

— Eu tenho dermato e aula de boxe depois.

— Conseguiu encher a sua agenda em menos de cinco minutos?

— Para manter essa pele maravilhosa, é preciso ter cuidados, sabia? —


sorri — Foi sorte conseguir adiantar, o cara é o dermatologista! Demorei para
conseguir uma consulta.
— O dermatologista? — estreitou os olhos — Acho que vou com você,
então.

— Você não tinha que trabalhar?

— Te deixo lá, vejo o cara e sigo para a imobiliária.

— Se você quer apenas vê-lo, não se preocupe eu te envio uma foto —


sorri abertamente e notei sua expressão mudar. Ele estava ficando
irritado? Consegui ver nos seus olhos a batalha interna entre o homem que
queria me atacar com perguntas e o homem que tentava se manter sereno. Num
ato raro de inteligência, ele optou por controlar a raiva. — Podemos almoçar
quando eu voltar.

— Tudo bem, almoçamos juntos — ele deu um selinho em minha boca e


saiu para trabalhar.

A consulta com o gatologista foi muito boa. Diferente da maioria, que mal
nos examinava, ele solicitou que eu ficasse de biquíni para avaliar toda a minha
pele. Conversamos bastante, tirei algumas dúvidas e saí de lá com uma lista de
cremes hidratantes para quase todas as áreas do corpo, bem como um
fortalecedor para as minhas unhas. De lá, segui para a academia. Troquei-me no
banheiro e caminhei animada até o segundo andar. Fui recebida por um monte
de músculos e o sorriso aberto do instrutor indicado pela minha amiga.
Quando cheguei em São Paulo, triste e confusa, a Fernanda me arrastou para a
academia para que eu pudesse liberar endorfina e aliviar o estresse, além de
obviamente queimar calorias em uma aula experimental de boxe. Gostei tanto
da experiência que decidi que aquele seria o meu esporte.

A Fê sempre encheu o saco de todas nós da quadrilha para que


praticássemos aulas de boxe, muay thai, Krav Maga, ou qualquer outra atividade
física que envolvesse socos e pontapés. Ela dizia que além de sermos mulheres
de personalidade forte, precisávamos saber nos defender de qualquer babaca
engraçadinho. Na época, ela gostava tanto que até usava camisetas temáticas,
uma delas, a que mais usava era pink, e a frase ficou em minha mente: Nocaute e
adeus estresse!

Agora eu compreendia perfeitamente o fascínio dela por esse esporte,


pois além de socos e esquivas, as aulas de boxe eram bastante aeróbicas e
envolviam pular corda, correr, fazer flexão de braço, abdominais e muito mais.
Além de melhorar o condicionamento físico, a postura e a fortalecer
musculatura lombar, afinava a cintura e definia pernas, braços e abdômen!
Tudo isso com uma única atividade física. Encontrei o caminho para o
céu fitness e agora não teria mais volta.

Saí da sala de treino pingando de tanto suar, e o melhor: com a mente


relaxada. A Fê ficaria orgulhosa quando eu contasse a minha evolução: mil e
duzentos calorias a menos e um soco cada vez mais forte!

— Cuidado por onde anda! — Uma voz masculina reagiu quando


esbarrei em um corpo sólido.

— Desculpa — ergui os olhos e encontrei uma figura conhecida — Você!


— dissemos ao mesmo tempo.

— Quanto tempo, Gabi! — Vinicius me envolveu num abraço apertado e


eu fiquei sem saber como retribuir, afinal tínhamos um pacto de não tratá-lo
bem depois de tudo que fez com a Sol. Ele era o ex-noivo da Soraia: canalha,
lindo, gostoso, com uma boca carnuda e...

— Desde quando você faz boxe? — Apontou para as luvas pink,


presentes da Fê.

— Desde que a Fê me levou para uma aula experimental e eu soquei o


saco de areia até meus pulsos doerem.

— Buscando alternativas para gastar a energia reprimida? — arqueou a


sobrancelha sorrindo.

— Não! — pontuei encarando-o — Para isso eu uso sexo — Vinicius


gargalhou com a minha resposta.

— Eu havia esquecido o quanto você era espirituosa.

— E eu quase esqueci de como você parece um dicionário ambulante.


Lembra do seu apelido? — indaguei sorrindo.

— Sério que você não esqueceu isso?

— Jamais, seu Ptolomeu — fiz menção ao personagem sabichão da


escolinha do professor Raimundo. Esse era o apelido que a turma costumava
zoar o Vinicius, ele era um mauricinho de cabelos lisos penteados perfeitamente
com gel e roupas caras engomadas.

— Eu não sei como sobrevivi aos anos de bullying — sorriu — Vamos


tomar um suco para relembrar a nossa velha amizade?

— Por que não? — dou de ombros e seguimos para a lanchonete da


academia. Enquanto aguardávamos o nosso pedido, Vinicius foi direto ao
assunto que levou ao convite.

— Como anda a quadrilha de salto alto e gloss? — tentou não mostrar


tanto interesse.

— A Sol bloqueou você, não foi? — sorri quando ele concordou com um
aceno — Ela está radiante! Exalando felicidade pelos poros, na verdade. Casou
com um homem digno dela — alfinetei.

— Nossa, que empolgação, Gabi — sorriu — Fico feliz... Ela ainda mora
em São Paulo?

— Hum... Sabia que eu aprendi a proferir um jab perfeito? E adivinha só


quem me ensinou?

— Fernanda — soltou num lamento — Lembro dela a cada vez que faço
uma rinoplastia — Vinicius havia se tornado um cirurgião plástico competente,
fora do país.

— Ela vai amar saber disso! — Gargalhei.

— Aproveita e avisa a Sol que me encontrou.


— Ah, mas é claro que eu vou avisar. Faço questão de contar para ela o
quanto você continua babaca. Também faço questão de transmitir a toda
quadrilha o quanto você está arrependido da merda que fez ao deixá-la.

— Você é cruel!

— Não — discordei sorrindo — sou apenas má, cruel é a Fernanda que


quebrou o seu nariz.

— Fato! — sorriu abertamente, concordando.

— Ora, ora, Gabriela Burnier... Quanto tempo! — ouvir meu nome fez
com que eu me virasse para encarar a mulher que se dirigia a mim.

— Eu preciso ir trabalhar — Vinicius pagou os sucos e se despediu,


dando um toque para o meu celular para confirmar se o meu número
continuava igual. Não era o mesmo e eu sorri quando ele se despediu
cabisbaixo. Eu realmente não sentia pena, ele havia feito minha amiga sofrer e
agora era tarde demais para tentar reconquistá-la.

— Eu conheço você? — perguntei para a mulher.

— Não, pessoalmente. Mas tenho um convite a fazer para


a promoter responsável pela Carpe Vita.

— Concorrência? — sorri, já levantando para ir embora.

— Na verdade meu conceito é outro, mas pelo que conheço de você, faz o
seu estilo. Minha empresa não é anunciada nas redes abertas, é mais privada e
para um público selecionado. Acredito que o seu marido também irá gostar.

Encarei a mulher tentando entender qual era a dela. Parecia me


conhecer além do que as minhas redes sociais mostravam e essa conversa com
certeza tinha teor sexual. E a menção ao Alexandre era um claro indício disso.

— Vá direto ao assunto! — disse, por fim.

— Apresente esse convite na portaria se estiver a fim de uma noite


inesquecível.

— Quais são as regras? — perguntei antes que pudesse me controlar. Ela


abriu um sorriso imenso, como se soubesse que havia conseguido o que queria.

— Temos diversos espaços. Ambientes específicos para quem curte


orgias, dominação e outros fetiches. O ambiente mais leve é para apresentações,
em que o público pode se apresentar ou apenas prestigiar o que a casa tem a
oferecer. Mas o nosso diferencial é o Black out.

— Queda de energia? — fui no sentido literal da palavra.

— Escuridão total. Incentivar os outros sentidos, principalmente o tato.


Garantia de anonimato e excitação sem julgamentos. Conhecer o conteúdo do
livro, sem julgar a capa.

A ideia era incrível, mas eu não verbalizaria isso ainda. Eu precisava


conhecer esse lugar e imaginar o Alexandre lá comigo me fazia esquentar ainda
mais. Só não sabia se conseguiria convencê-lo, principalmente em relação
ao Black out. Um passo de cada vez.

Enquanto devaneava, não vi a mulher ir embora. Ela simplesmente


sumiu deixando o tal convite. Confesso que todo o mistério só aumentava minha
libido e eu não via a hora de estar nesse lugar.

Acabei demorando mais do que previa, quando estava no Uber, voltando


para casa notei quatro ligações perdidas do Alexandre. Mesmo que não tenha
sido a minha intenção fazê-lo esperar, foi bom fazê-lo sentir na pele como era
ruim esperar por alguém. Minha mente voou diretamente para aquela cena do
dia do seu aniversário, na primeira semana do nosso casamento, na qual eu
gelei feito uma idiota esperando-o para jantar.

Quando cheguei em casa passava de uma e meia da tarde, encontrei-o


diante de uma mesa posta, com direito a champanhe, balde de gelo e um
Alexandre impaciente. Logo dissipei a sensação de vingança e, me desculpando
pelo atraso, apreciei o almoço tardio em sua companhia. Um enorme sorriso
estampou seu rosto quando eu comecei a comer com vontade. Sorri de volta,
olhando-o enquanto me servia champanhe. Era bom saber que ambos
estávamos tentando fazer dar certo, tínhamos evitado uma discussão.

— Ainda vai voltar para a empresa? — perguntei enquanto pousava


meus talheres.

— Tenho algumas coisas para ver lá sim, saudades?

— Vamos sair à noite!

— Isso é um convite? Claro. Jantar fora? Teatro? Cinema?

— Aposto que os seus programas com o Marcos eram mais


interessantes...

— Está me acusando de ser entediante?

— Não, tiozinho.

— É a terceira vez em menos de vinte e quatro horas que me chama de


tio. Devo ficar preocupado? — indagou sorrindo.

— Não — sorri — você sabe que dá de dez a zero em muito novinho por
aí.

— Repete.

— O quê? — indaguei, sem entender.

— O elogio. Estou com o celular em mãos para gravar um ato raro de


elogio...

— Tiozinho gostoso — perturbei. — Recebi o convite para ir a um lugar


diferente e quero saber se você vai comigo.

— Diferente quanto?

— Envolve pessoas nuas.

— Não!

— Alexandre...
— Não!

— Não estou pedindo permissão...

— Não!

— Eu vou com ou sem você! — Ele me encarou. — Quero que você vá


comigo, mas se ficar sonhando que manda em mim, se achar, por um momento,
que pode me proibir de fazer qualquer coisa, eu...

— Então é assim que vai ser? Vai me ameaçar toda vez que eu não fizer o
que você quer?

— E você vai mandar em mim sempre que eu não ceder as suas


vontades?

— Gabi... Você está me pedindo para deixá-la foder com outras pessoas e
não consigo imaginar outra pessoa tocando em você.

— Alê, nem conversamos sobre o que aconteceria. Você não me


deixou abrir a boca e já foi tirando conclusões. Além disso, há muita gente que
se excita sendo vouyer... Deixe de ser homem das cavernas e converse comigo!

— Você estava falando sério quando disse que iria sem mim?

— Você sabe que sim.

— Eu vou! — concordou contrariado — Mas não vou desgrudar de você.

— Abra a sua mente... Deixe o seu corpo responder aos estímulos, se der
vontade, a gente segue.

— Se põe no meu lugar... Vai gostar de me ver com outra mulher?

— O problema é justamente pensar. Hic et nunc.

— Você está fugindo da minha resposta.

— Vá para o trabalho, vou aguardar ansiosa pela sua volta. A noite


promete!

— Gabi...
— Tchau, Alê — beijei sua boca com vontade e corri para o meu antigo
quarto, evitando pensar em cenas que envolvessem o pau do Alexandre e outra
mulher.

Passava das dez da noite quando chegamos à Spicy. Esse era o nome que
estava gravado no cartão que a misteriosa mulher tinha me entregado na
academia, desde que li o nome que significava “picante”, “apimentado” escrito
em letras cursivas no cartão preto, era como se realmente eu sentisse algo
arder. Em aço inoxidável, também em letras cursivas, a palavra estava fria e
imóvel sobre as portas duplas, de madeira pesada, que impedia a nossa entrada.
Antes que eu pudesse bater ou tocar a campainha disponível, as portas se
abriram devagar, em uma declaração óbvia de que éramos bem-vindos.
Alexandre apertou a minha mão enquanto dávamos os primeiros passos para a
recepção do lugar.

A cada passo que eu dava, a excitação aumentava. Apresentei o convite


na recepção e prontamente fomos conduzidos para o primeiro ambiente. A
atmosfera mudou completamente quando adentramos ao que parecia ser um
bar comum, mas as luzes baixas, os garçons apenas de cueca e gravata, bem
como as garçonetes de lingerie e saltos, indicavam que não era um simples bar.
Havia vários postes de pole dance espalhados pelo ambiente, com a clara
intenção de que qualquer pessoa poderia ser protagonista.

Alexandre me conduziu até um sofá preto de couro, no canto. Havia uma


mesa redonda e vermelha em frente a ele, para apoiar bebidas. Ou uma mulher
de pernas abertas, já que o pé era feito de aço e fixado no chão. Sentei-me já
empolgada, olhando ao redor. Quando os nossos olhares se cruzaram, notei que
ele precisaria de um incentivo para relaxar.

Toquei o seu rosto, passando os dedos da minha mão direita por sua
barba rala. Deixei a minha língua sair da minha boca e lambi seus lábios
fechados.

— Relaxa... — suguei seu lábio superior.

Ele segurou minha cabeça e aprofundou o beijo, sua língua indo fundo
em minha boca, ditando o ritmo. Querendo mostrar quem estava no controle...
Ah, homens. Facilmente manipuláveis. Minha mão desceu até o seu colo e
constatou sua ereção que já dava sinal de vida, cheguei até o botão da sua calça,
mas ele segurou meu pulso quando ouviu um gemido que não pertencia a mim.

Bem ao nosso lado, uma mulher nua estava ajoelhada entre as pernas de
um homem, pagando boquete. Era dele que vinham os gemidos.

— Estava prestes a fazer o mesmo, mas você me impediu... — dei de


ombros fazendo-o olhar para mim.

— Não é como se eu nunca estivesse estado em um lugar com pessoas


transando... Só que não com a minha mulher!

— Se os maridos e esposas escutassem seus próprios desejos e os dos


seus companheiros, mais casamentos durariam, ou pelo menos, o número de
fiéis.

— Tanto faz... Já cumpri a minha promessa. Podemos ir transar em casa


agora?

— Ah, não. Eu nem comecei e eu bem sei que você está de pau duro —
sussurrei e lambi a orelha dele.

— Tudo bem, preciso de um Whisky. Ah, eu estou com a habilitação


suspensa.

— Droga, serei a babá de várias rodadas. Pelo menos ficarei com seus
carros — sorri, fazendo sinal para que o garçom super gostoso viesse nos
atender.

— Prefiro a garçonete! — Ouvi-o reclamar.

— Um Whisky puro e um coquetel de frutas sem álcool, por favor — pedi


para o garçom que sorriu antes de se afastar. — Prefere a garçonete, é? Por que
ela está com menos roupa que eu? — perguntei ficando de pé e apontando para
o meu vestido curto preto de bandagem.

— Não ouse...

— Oi? Não ouvi o que disse — fui me afastando dele e me aproximando


do pole dance mais próximo de nós.

Ele me encarou, estreitando os olhos, quando eu segurei na barra de


ferro fria com as duas mãos. Movimentei as mãos para cima e para baixo, como
se masturbasse um pau gigante e abri a boca, para provocá-lo. Segurando no
mastro, desci até o chão, abrindo as pernas. O vestido colado subiu e ele não via
minha calcinha porque o poste estava entre as minhas pernas. Eu havia
participado de uma aula experimental de pole dance, portanto seria suficiente
para provocar.

Girei algumas vezes, de maneira provocante e, em seguida, prendi uma


perna e me inclinei para trás, esticando os braços e me mantendo firme por
alguns segundos. Meu showzinho havia atraído a atenção de alguns clientes,
homens e mulheres. Uns olhavam discretamente, outros claramente pretendiam
me convidar para alguma festinha particular. Eu já estava quente, excitada e
louca para sentir mãos sobre mim... Fiquei de pé, abri as pernas e desci até a
base do poste, fazendo minha bunda ficar para cima, já sem o vestido, que havia
subido de vez. O ar-condicionado frio arrepiou minha pele suada, mas logo um
tapa ali esquentou tudo.

Até que demorou.


Estava para nascer alguém que conseguisse extrair os meus extremos
tão bem quanto ela. Em segundos ela me levava do êxtase ao chão. Da irritação
ao prazer e, principalmente, o contrário disso.

Gabriela Burnier, por sorte Fragoso, me tirou do sério com frequência ao


longo da nossa conturbada relação. Mais do que qualquer outra mulher, ela
invocava meu lado mais possessivo e irracional. O que só fazia despertar o seu
lado mais liberal, além de trazer à tona sua feminista interior. E quando ela saia
para a batalha, era difícil domar o meu homem das cavernas.

Foi querendo evitar mais uma dessas batalhas, que me obriguei a


acompanhá-la em uma casa de sexo. Imagino que vários homens gostariam de
ter uma mulher tão liberal quanto a minha, mas a coisa muda de figura quando
você imagina que será real. Que outras mãos tocarão seu corpo com o meu
consentimento, outra boca sugará os bicos rosados e duros dos seus seios, outro
pau se enfiará entre as suas pernas... Não, não suportaria ver isso. Agora dava
para entender o motivo pelo qual o Marcos se irritava tanto quando eu
mencionava um ménage com a Fernanda, lembraria de nunca mais torturar o
meu amigo dessa maneira.

Mantive-me tenso durante o trajeto até o sofá de couro preto, sem me


ater aos detalhes do ambiente. Estava nítido apenas que a pouca iluminação
dava a sensação de sexo iminente e se eu estivesse sozinho, com certeza
apreciaria muito receber um boquete de uma desconhecida imediatamente. Mas
esse pensamento só me levou a crer que a Gabriela poderia fazer isso com
qualquer um ali, o que elevou minha raiva em alguns graus.

Ela deve ter sentido a mudança na minha postura ou a minha cara não
estava das melhores, porque veio toda mansa me dar um beijo que quase me fez
esquecer de tudo. Quase, porque um gemido masculino me trouxe de volta a
realidade. Ao nosso lado, uma morena de lingerie estava entre as pernas de um
careca barrigudo.

Para tentar me relaxar ela chamou um garçom, imbecil e previsível, que


usava apenas cueca preta e gravata borboleta, pensei alto que preferia a
garçonete, mas parece que meu pensamento foi alto demais, pois ela ouviu e
decidiu dar o troco.

Em um maldito poste de pole dance.

Puta sacanagem. Meu pau respondeu quase instantaneamente, ficando


tão duro quando o mastro que ela usava para me provocar. Me olhando nos
olhos, subindo, descendo e rebolando, ela me torturava e me deixava louco.
Fiquei vidrado assistindo a cena, analisando cada detalhe daquele corpo
perfeito que se remexia e me provocava ondas de calor e excitação, até que em
sua última abaixada o vestido subiu de vez revelando uma calcinha fio dental
preta e muitos outros espectadores atentos e loucos pela minha mulher.

Minha!

Fui de encontro a ela, vendo de perto sua vulnerabilidade com a bunda


arrebitada. Sem pensar, ergui a mão e bati com força, transmitindo no gesto
todo o misto do desejo e frustração que eu sentia. Inclinei-me sobre ela, até
chegar em seu cabelo, encostando meu pau em sua bunda. Segurando os fios
loiros, fiz com que ficasse de pé, colada a mim. Ela se esfregou, safada, deixando
claro que havia calculado cada passo. Mordi sua nuca e lambi em seguida,
aliviando a pressão dos meus dentes.

Eu poderia fodê-la ali, de pé, encostada no poste. Seria rápido e firme,


minhas bolas bateriam em seu corpo, porque eu iria bem fundo. Era exatamente
o que ela queria, mais ainda, estava nítido que ela gostaria que mais alguém,
qualquer um daqueles que assistiam, participasse. Mas a minha raiva e a certeza
da manipulação ainda me deixavam com resquícios de lucidez, por isso tiraria o
holofote daquele corpo gostoso.

Com uma mão segurando firme em seu cabelo, usei a outra para tapar
totalmente sua boceta quente. Sobre a calcinha, usei minha mão grande como
um tapa sexo, mas dei o que ela queria deslizando meu dedo médio para dentro.
Escorregadia, ela me recebeu abrindo as pernas. Sem soltá-la, trouxe seu corpo
de volta para as luzes amenas, inclinando-a sobre a mesinha onde estavam
nossas intocadas bebidas. Livre-me rapidamente de todas as minhas roupas,
atraindo o olhar feminino e provocando o desinteresse masculino, afastei a sua
calcinha e invadi sua boceta por trás.

Firme.

Sem dó.

Até o fundo.

Fazendo-a se inclinar e gritar, surpresa.

Gabriela segurou firme na borda da mesinha redonda e eu segurei ainda


mais firme nos seus peitos, por cima do vestido. Apertei e fodi, fodi e apertei.
Pelo máximo de tempo que eu pude, buscando dentro dela vários ângulos,
rebolando e buscando o ponto que a faria estremecer. Ela aguentou firme,
retardando o orgasmo ao máximo, os dedos das mãos estavam brancos de tanto
apertar a mesa quando finalmente senti sua boceta me apertar, permitindo que
eu me soltasse, mordendo seu ombro, algumas estocadas depois.

Saí de dentro dela, ainda semiereto. Gabriela se virou e ao me ver


completamente nu, estreitou os olhos.

— O que foi? Só fiz o que você queria.

— Quase... Faltou incluir pessoas.

— Podemos resolver isso logo, logo. Já viu quantas mulheres estão


olhando para cá nesse momento?

Ela olhou em volta e me encarou.

— Boa jogada, tio.

— Vamos continuar? — perguntei tocando meu pau devagar. Gabriela


pensou um pouco, me olhando.

— Vou deixar passar hoje. Mas, tenho uma sugestão de um casal para
uma brincadeirinha interessante. Vista-se, vamos para casa!

— Tem certeza? Aquela ruiva ali já acenou duas vezes...

— Vista-se antes que eu decida achar um homem gostoso para você me


dividir! — Bufei e juntei as minhas roupas.

— Sobre esse tal casal que ronda sua mente impura, vamos conversar
calmamente sobre isso...

Ela gargalhou e flertou com o garçom enquanto pedia a conta.

Assim que chegamos em casa, subimos para o nosso quarto. Aquele com
o closet, que já foi meu, já foi dela e em acordo mudo firmado agora com o olhar,
seria nosso. Notei que ela estava desconfortável, mas não sabia exatamente com
o quê.

Acho que dividir espaço estava sendo mais difícil para ela do que para
mim, afinal. Quando entramos no quarto, depositei carteira e celular no criado
mudo e me joguei na cama, observando-a. Gabriela largou a bolsa na poltrona e
fugiu para o closet, saindo de lá com o que provavelmente seria a camisola que
me mataria do coração em três segundos.

— Onde vai? — Perguntei quando ela passou pela frente da cama sem
me olhar.

— Tomar banho.

— Gabi... — ela parou. — Vem cá.

— Vai ser um banho rápido... — dei um salto da cama e parei na frente


dela.

— Me beija — pedi chegando perto.

— Você está pedindo? — ela riu.

— Estou precisando ser mais persuasivo...

Conquistei sua boca devagar, usando a língua para acariciar os lábios que
se abriram rapidamente. A calmaria que tentei transmitir lembrou-me da
primeira vez em que a pedi em casamento. Ali, eu acreditava que manipular sua
emoção faria com que ela cedesse.

Aqui e agora eu pretendia apenas fazê-la sentir-se confortável em estar


comigo além da foda firme. Eu desejava mostrar, ao invés de falar, o quanto os
meus sentimentos e desejos para com ela tinham evoluído. Queria mostrar que
adoro ser o homem que transa de pé no box do banheiro, mas que poderia
proporcionar-lhe também orgasmos intensos com um papai e mamãe na cama.

Ela retribuiu o beijo, abrindo a boca. Sugando, explorando e tentando


drenar a minha calma. Toquei seu corpo de maneira firme, porém lenta,
passando as mãos pela sua bunda, fazendo-a empinar o corpo, impondo os seios
contra mim. Fiz pressão e levantei o seu corpo, ela passou as pernas ao meu
redor, facilitando minha caminhada até a cama. As roupas que ela segurava
ficaram pelo chão.

Deitei-a com gentileza e me livrei da minha camisa polo. Os olhos dela


brilhavam, encarando os meus e eu senti vontade de sorrir. Ela segurou a barra
do vestido curto, pronta para tirá-lo, mas eu faria questão de desembrulhar o
meu presente loiro.

— Deixa que eu faço isso — empurrei o vestido colado pelo seu corpo,
retirando pela cabeça.

Ela estava sem sutiã, os bicos já duros pedindo atenção. Lambi devagar,
usando a ponta da língua para arrodear a aréola e percorrer a distância entre os
dois. Repeti o gesto lento e Gabriela segurou minha cabeça, empurrando o peito
na minha boca. Suguei ritmicamente, intercalando com o passar de dentes para
atender sua vontade.

— Mais forte! — Ordenou.

— Calma... — Pedi.

Percorri o vale entre os seios e desci a língua até o umbigo, beijando ali,
propositadamente devagar. Gabriela abriu as pernas e elevou o quadril, mas
usei o braço para impedir os seus movimentos.

A calcinha preta que ela usava era mínima, com tiras finas que pediam
para serem destruídas com os dentes, mas tirei-a devagar. Sempre fui fã de
bocetas. Era impossível contar quantas vezes eu as chupei ao longo da minha
vida, são incontáveis, ainda mais se considerarmos o meu sistema de fodas.
Todas me agradavam, independente de depilação ou cor, eu sempre amei o
gosto que ficava na minha língua depois de uma boa chupada. Com a Gabriela
não era diferente, sua boceta me agradava tanto que me enchia a boca d'água
apenas com o cheiro. Totalmente depilada e quase sempre molhada para mim.

Abri espaço ali com os dedos e lambi com a ponta da língua. Ela respirou
fundo. Com o meu dedo indicador espalhei seu líquido por toda boceta, até a
entrada do seu cuzinho. Ela estava impaciente, mas eu não tinha a menor
pressa. Aproveitaria cada segundo de adoração. Suguei seu gosto quando enfiei
minha língua dentro dela e posso dizer que me apaixonei um pouco mais
quando ela gemeu meu nome.

Eu a queria tanto que as palavras ficavam sufocadas em minha garganta,


formando um nó que me impedia de respirar. Respirei fundo quando me afastei,
usando os dedos para preencher o vazio entre suas pernas. Ela pingava.

Abri a minha calça, abaixei a cueca e senti o meu pau mais duro do que
mais cedo na boate. Substituí meus dedos por ele, entrando devagar. Centímetro
por centímetro. A consciência de que estava fazendo amor pela primeira vez
com a minha esposa acelerou meu coração. Quando entrei inteiro, parei de me
mover, sentindo os sentimentos aflorarem. Era uma delícia tê-la quente
embaixo de mim, mas a sensação de sufocamento persistia. Meu coração estava
disparado e eu precisei beijá-la em busca do seu ar. Ela me beijou devagar,
como se oxigênio demais pudesse me matar ali mesmo.

Aos poucos, eu me mexi, saindo e entrando... Explorando uma nova


maneira de tê-la. Gabriela ficou quieta, de pernas abertas, recebendo os meus
gestos com pequenos gemidos em minha boca. Quando minhas mãos buscaram
seus seios e a minha boca, o seu pescoço, senti uma lágrima tocar minha
bochecha. Os olhos dela que sempre foram de um azul incrível, eram mais que
uma piscina, eram a representação do próprio oceano e se derramava
lentamente. Enxuguei as lágrimas com beijos e aumentei a intensidade das
estocadas, o que fez com que ela erguesse o quadril para me encontrar diversas
vezes. O barulho da nossa respiração preenchia o quarto e logo os gemidos
passaram a fazer parte da sinfonia.

A Gabriela me beijou mais firmemente, segurando minha nuca e eu levei


minha mão direita até o seu clitóris, estimulando devagar enquanto fazíamos
amor. Demoramos muito mais do que em qualquer outra vez, mas ela não
tentou acelerar o meu ritmo, nem mudar de posição. Nos beijamos, nos tocamos
e nos conectamos de uma maneira intensa e extremamente sensual. Quando ela
atingiu o orgasmo foi avassalador, mas não houve sons. Ela estremeceu e me
apertou, sem alarde e eu ainda pude amá-la por mais tempo antes de me liberar
dentro dela.
Os dias passavam devagar quando estava no escritório e eu contava cada
segundo para chegar em casa. Quem diria, eu me tornei um homem de família!
As coisas estavam indo bem, um dia de cada vez, entre Gabriela e eu.

Algumas coisas ainda me deixavam bastante irritados, como o Daniel, o


babaca personal que ela ainda via uma vez por semana na nossa casa. Eu tinha
quase certeza que era apenas para me irritar, já que ela estava firme e forte
fazendo aulas de boxe.

O trabalho dela também não era dos melhores, pois fazia com que ela
passasse as noites ocupadas ao invés de estar na cama comigo. Em resumo, os
finais de semana eram os melhores dias... E isso tudo se deu em menos de um
mês. Como as coisas podiam ser tão intensas em tão pouco tempo? Conosco era
assim desde o primeiro momento.

Eu estava almoçando com meu pai e um cliente, por insistência do velho,


mas meu pensamento estava na loira que eu havia deixado dormindo nua na
minha cama. Ela havia chegado tarde em casa, mas me acordou com um
boquete espetacular. Deixei-a descansando e desativei o despertador que estava
programado para acordá-la uma hora depois, para a aula de boxe. Ela merecia o
descanso, aproveitei e pedi para que a Carmem preparasse um café reforçado
para ela como um pedido de desculpas antecipado por alterar a sua agenda.

Gabriela não era o tipo submissa de mulher, todo mundo sabia, por isso
achava exagerados alguns dos meus cuidados. Por isso mesmo eu agradeci aos
céus ela nunca ter desconfiado das câmeras no apartamento, quando estávamos
morando em quartos separados, tampouco o rastreador no chaveiro da casa...
Duvido que ela fosse entender meus motivos naquela época. Não vou negar que
se pudesse saberia cada passo que ela dá, mas isso seria o mesmo que prender
um pássaro em uma gaiola pequena. Eu estava tentando aprender a lidar com
todas as novidades que incluía amá-la como ela é.
Meu celular tocou no meio do almoço e por mais que o olhar irritado do
meu pai tentasse impedir, eu atendi a ligação da Carmem.

— Algum problema? — disse, levantando da mesa.

— Sim, senhor. Sua esposa não estava se sentindo bem e...

— Onde ela está?

— Acabamos de chegar no hospital.

— Mande o endereço, o Assis está aqui, chego o mais rápido possível —


voltei à mesa para dar satisfação — Preciso ir, é uma emergência.

— Algum problema? — Meu pai me olhou preocupado.

— A minha esposa está no hospital, mas não deve ser nada demais. Ela
estava bem quando saí de casa.

— Me dê notícias assim que chegar lá — assenti e me despedi do cliente.


A Carmem enviou o endereço e eu entrei no carro, passando as instruções para
o Assis. Meu coração já estava acelerado, minhas mãos suavam e o desespero
tentava se instaurar em mim.

Ela está bem, Alexandre.

Ela está bem.


Acordei como se minha barriga estivesse sendo acertada por uma
infinidade de socos, na mesma intensidade dos socos que eu desfiro na minha
aula de boxe. Não pode ser real. Encolhi-me na cama grande, ainda de olhos
fechados, tentando enganar meu inconsciente, persuadi-lo para que me
mantenha sonhando e essas sucessivas dores sejam fruto de um terrível
pesadelo. Grito baixo quando uma dor me atinge ainda mais forte, o suficiente
para me obrigar a abrir os olhos e abraçar as minhas próprias pernas, me
mostrando quão real esse inferno era.

Como era possível uma pessoa adormecer após chegar a um orgasmo


magnífico, proporcionado pelo homem que ama e acordar com a sensação de
estar sendo dilacerada por dentro? Não sei como, só sei que a dor que eu sentia
era real e torturante.

Mexi-me para tentar alcançar o celular no criado-mudo e vi a poça de


sangue manchando o lençol branco. Meu ciclo menstrual sempre fora
desregulado, mas de uns meses para cá ele simplesmente seguia seu próprio
ritmo e cada vez mais aparecia junto com náuseas e fortes dores nas costas.
Além da sensação constante de ter o próprio Satanás, com o fogo do inferno no
tridente, me cutucando.

Respirei fundo e tentei levantar, lutando contra as fortes pontadas na


minha barriga, segui para o banheiro para me livrar das peças de roupa sujas de
sangue. Um banho seria o ideal, mas eu me sentia fraca demais para
permanecer de pé por mais tempo que o necessário.

Deixei-me cair sentada no vaso e deslizei as peças sujas para o chão.


Fazer xixi fazia tudo se revirar ainda mais. Demorei um tempo ali sem conseguir
levantar tentando imaginar quantos passos eu teria que dar para estar de volta
na cama.

— Senhora Gabriela? — A voz de Carmem soou como música aos meus


ouvidos. Desnorteada acabei vindo até o banheiro sem pegar uma roupa e sair
daqui de toalha com certeza deixaria um rio vermelho por todo o meu trajeto.

— Estou no banheiro — gritei o mais alto que pude, o que não era muito
naquele momento.

— Aconteceu alguma coisa? — sua voz estava mais perto da porta agora
— Vim deixar os ternos do Alexandre no closet e encontrei a cama desforrada
e...

— Eu menstruei... — limitei-me a dizer, pois até respirar incomodava.

— Precisa de ajuda?

— Preciso de roupa limpa e de alguns absorventes.

— Só um instante.

A Carmem voltou, minutos depois, com uma calcinha branca de algodão,


uma camiseta e uma calça de moletom preta gigante. Usei dois absorventes
externos, desprezando o OB e vesti a roupa com dificuldade, mesmo com a
ajuda dela, era como se estivessem fazendo acupuntura interna com espetos
enferrujados. A Carmem me ajudou a chegar até a cama que já estava com os
lençóis trocados, a cada passo que eu dava, a cama parecia estar mais distante. E
eu podia jurar que a temperatura havia caído no ambiente, mas o ar-
condicionado marcava a mesma temperatura que usávamos diariamente.

— Você é um anjo! — agradeci quando finalmente me recostei nos


travesseiros.

— Vou providenciar um chá de boldo e aqui está o analgésico — ela


estendeu um copo e um comprimido em minha direção.

Duas lágrimas furtivas escorreram pelo meu rosto e eu logo tratei de


escondê-las, passando a mão no rosto. Malditos hormônios da TPM! Foi a última
coisa que eu pensei antes de fechar os olhos.

Não consegui dormir de fato e nem rolar para lá e para cá, como faria se
estivesse com insônia. Cada vez que o sono tentava me embalar, a dor no
abdômen me trazia de volta para a realidade. Não comi nada do que a Carmem
me trouxe, mas ela me obrigou a tomar um suco mais cedo.

Quando não conseguia mais fingir que estava sem sede, abri os olhos e
tentei alcançar o copo do criado-mudo. Mas ele foi colocado em minhas mãos de
imediato, a Carmem continuava no quarto.

— Obrigada — agradeci e voltei a deitar, encolhendo-me de dor. Mas o


movimento me fez sentir o sangue entre as minhas coxas, ultrapassando as
barreiras dos absorventes. Talvez o Alexandre tivesse razão: eu precisava de
um médico. Eu deveria ter marcado consulta com o ginecologista logo depois
que passei mal no mês anterior.

Afastei os lençóis sujos novamente, a Carmem se aproximou para me


ajudar, eu estava prestes a me trocar de novo, mas assim que os meus pés
tocaram o tapete, uma nova onda de dor me atingiu em cheio. Senti o mundo
girar enquanto meu interior era esmagado, ouvi meu nome, mas não deu tempo
de responder. Desabei no chão.

A claridade e o típico cheiro de éter indicavam que eu não estava no meu


quarto. Pelo menos eu não sentia mais tanta dor. Sentia-me sonolenta, meus
olhos não conseguiam se manter abertos por muito tempo, por isso me deixo
levar pela escuridão algumas vezes. Quando voltei a abri-los fitei uma figura alta
e sexy olhando-me atentamente, inconscientemente meus lábios curvaram-se
num meio sorriso.

— Soube que precisava de um médico... — Alexandre aproximou-se de


onde eu estava. Mais de perto notei que o sorriso nos seus lábios não condizia
com a sua expressão preocupada.

— Já tomaram a sua frente — sorri — um moreno já aplicou uma injeção


bem aqui... — Apontei para a minha bunda.

Tentei fazer graça, mas ele não sorriu. Abraçou-me forte e, como se para
certificar de que eu estava bem, ergueu meu rosto e examinou.

— Tive tanto medo... — Levei meus dedos aos seus lábios, silenciando.

— Vaso ruim não quebra tão fácil — sorri — eu estou bem.

— Se estivesse bem não estaria no hospital...

— Não estou tão mal, não é desta vez que ficará viúvo.

— Droga e eu já havia mandado separar o meu elegante terno preto...

— Idiota! — Bati fracamente no seu braço.

— Eu também te amo — ele beijou o topo da minha cabeça — vou avisar


aos nossos pais que você está bem.

— Você ligou para os meus pais? Não deveria! — Repreendi.


— Gabriela, você não teve uma simples queda de pressão. A médica de
plantão disse que você deu entrada com uma menorragia. Você sabe o que
significa? — neguei com a cabeça — Segundo a médica é o aumento
desproporcional do fluxo menstrual, três vezes maior que o fluxo normal.

— Tá, acho que entendi, mas...

— Não, não entendeu. Você permaneceu desacordada do trajeto da


nossa casa até o hospital, já foi submetida a inúmeros exames e ainda não
recebemos o resultado. Você acha mesmo que sabe de alguma coisa? — ele
despejou todas as perguntas e inspirou fundo para controlar as emoções.

— Alê — ele ergueu o rosto, os olhos marejados. Depois de tudo que ele
me contou sobre a Yasmin era natural que ele estivesse sofrendo com o receio
de algo pudesse me acontecer. — Olha para mim — segurei sua mão — eu sinto
muito por ter te preocupado...

— Porra, Gabriela! Você acha mesmo que é uma mera preocupação? —


disse com a voz embargada — Eu pensei que, mais uma vez na minha vida,
perderia a mulher que eu amo — tenho certeza que o meu coração parou e,
segundos depois, voltou a bater em um ritmo forte e descompassado.

E todo esse sentimento se intensificou quando seus lábios tocaram os


meus, nos beijamos em desespero, como se precisássemos da certeza de que
estaríamos ali para sempre. Não sei se as lágrimas que molharam o meu rosto
eram minhas ou as dele, mas sei que entre nosso beijo tinha saliva, lágrimas e
muito amor.

— E a gente achando que ela ainda necessitava dos nossos cuidados... —


A voz bem-humorada de uma mulher morena usando jaleco branco sobre um
vestido azul, interrompeu o nosso beijo.

— Com um homão desse eu também dispensaria cuidados médicos,


doutora! — Completou a mulher de meia idade, fitando Alê longamente.
Fazendo com que todos sorrissem.

— São os resultados do exame? — ele apontou para os papéis nas mãos


da médica.
— Alguns, mas antes vamos ver como Gabriela se sente.

A médica me examinou e me fez diversas perguntas, pedindo inclusive


que eu relatasse em detalhes o meu período menstrual. Descrevi todos os
detalhes sobre a cólica infernal que sempre me acompanhou e incluí os novos
sintomas: diarreia, náuseas, vômitos, dores nas costas, pernas e tudo o mais. A
ginecologista de plantão, doutora Lourdes, ouviu atentamente os meus relatos
enquanto o Alê acariciava a minha mão, ele estava mais tenso do que eu com
todo o interrogatório.

— Vamos diminuir a medicação para ver como você reage.

— Ela não vai receber alta hoje? E o resultado dos exames? — Alexandre
indagou preocupado.

— Como já mencionei, a Gabriela deu entrada na urgência desmaiada e


com um fluxo incomum para o ciclo menstrual. O quadro já está regularizado,
mas, mesmo assim vamos mantê-la em observação por hoje. Fique tranquilo
que amanhã cedo sua esposa estará em casa. Com licença. — A médica
despediu-se, deixando a enfermeira que estava retirando o equipo com o soro
do meu braço.

— Prontinho Gabriela! — colocou um Band-Aid no lugar que estava a


agulha. — Não vai ser hoje que levará a galega para casa, gatão — voltou-se
para o Alexandre, sorrindo.

— Minha cama ficará grande demais sem ela... — deu uma piscadela para
a senhora.

— Ah se eu pudesse... — Ela disse e nós dois gargalhamos. — Qualquer


coisa pode apertar esse botão que aparecerei em poucos minutos — apontou
para o botão ao lado da cama — Ainda que não sinta dor, pode apertar para eu
poder vislumbrar mais um pouco do seu homem! — sussurrou ao meu ouvido.

— Pode deixar... — tentei ler seu nome no crachá.

— Iasmin — completou.

— Hum, obrigada Iasmin — toquei a mão dela tomada por uma súbita
emoção, troquei olhares com Alexandre que sorria.

— Vocês formam um belo casal! Cuide muito bem da sua esposa, ela é
uma mulher especial — fitou Alexandre sorrindo.

— Eu sei!

Ela se despediu e nos deixou ali estáticos por causa da coincidência de


nomes. Trocamos um sorriso cúmplice e permanecemos em um silêncio
confortável até o quarto do hospital ser invadido pelos nossos pais. Flores e um
falatório sem fim preencheram o ambiente. Os pais do Alexandre eram os mais
contidos, eles trouxeram chocolates suíços.

Eu observava meus pais conversarem acaloradamente sobre qual era o


melhor lugar para eu ficar depois que saísse do hospital, toda vez que eles
discutiam por algo relacionado a mim, me provocava dor de cabeça. Que bom
que eu já estava medicada. Apesar de tudo, era bom saber que eu continuava
sendo a menininha deles.

— Alexandre, você pode nos ajudar aqui — meu pai chamou.

— Isso mesmo, Alexandre — minha mãe também se voltou para ele —


eu estava tentando dizer a esse cabeça dura que a minha casa em São Paulo é o
melhor lugar para Gabriela ficar, temos um quarto amplo para recebê-los e
vários funcionários dispostos a atendê-los prontamente.

— A minha casa tem tudo isso e a Dafne para completar. Gabriela teria
alguém da sua idade para conversar...

Não! Ele não disse isso!

Minha mãe não nutria mais nenhum sentimento pelo meu pai, havia se
casado novamente e estava verdadeiramente feliz, todavia não suportava o fato
de o meu pai viver alfinetando-a sobre Dafne ser mais jovem. Jovem o suficiente
para ser filha dele, por sinal! Até para mim, no início, foi difícil aceitar que
minha madrasta tinha idade para ser minha irmã mais nova. Aquela história
terminava com a minha mãe narrando todos os casamentos fracassados dele.

— Escuta aqui seu papa-anjo... — Minha mãe vociferou.


Se a Dafne estivesse aqui ela diria que tudo isso era cena do núcleo pobre
da novela que ela trabalhava.

— Calma! — Alexandre intermediou — Eu tenho certeza que ele não


quis dizer...

— Ah... Eu quis sim!

— Pai! — repreendi.

— Ok — deu de ombros — eu não tive intenção de te ofender, mas eu


realmente acho que a Dafne seria uma boa companhia.

— Melhor que a própria mãe? — indagou ofendida — Você prefere a


Dafne a mim, Gabi? — fitou-me longamente.

— Que pergunta mais boba mãe — respondi — Nesse momento eu


prefiro meu quarto, minha cama, o sossego da minha casa...

— Se você prefere ir com o seu pai, tudo bem! — disse ressentida.

— Tenho certeza que Gabriela adoraria passar uma noite na casa de cada
um — neguei balançando a cabeça veementemente e Alexandre me olhou feio
— Mas, o lugar dela nesse momento é ao meu lado. A filha de vocês agora é
minha responsabilidade, eu cuidarei dela e garantirei que nada lhe falte.

— E se eles precisarem, tem a nossa casa aqui no Rio. Tomaremos conta


da filha de vocês — minha sogra disse e minha mãe sorriu.

— Tem certeza, filha? — meu pai indagou encarando-me.

— Amo vocês, mas ficarei melhor se eu estiver ao lado do Alexandre.

— Ai meu Deus, fico tão feliz que tenham feito as pazes. Minha filhinha
finalmente encontrou o amor — Minha mãe me abraçou com lágrimas nos
olhos.

— Mãe — repreendi sorrindo — meus sogros vão achar que eu estava


caçando marido.

— Não, não vão! — meu pai negou sorrindo — É notável que você não é
dessas! — Gargalhei.

— Andou tendo consultoria vocabular com a Dafne? — perturbei.

— Eu sou antenado, meu bem. — respondeu, sorrindo. — Já que você


trocou seu velho pai pelo seu marido velho — meu pai alfinetou — Eu vou voltar
para São Paulo vou acompanhar Dafne em um evento promocional.

— Obrigada, pai! — Ele veio até mim e eu o beijei.

— Cuida dela! — deu dois tapinhas nas costas de Alê — Precisa de


carona? — meu pai perguntou para a minha mãe.

— Você pode me deixar no Copacabana? Eu ficarei mais alguns dias no


Rio.

— Nada disso — Alexandre recusou — a senhora ficará em nossa casa,


temos um quarto de hóspedes.

— Não se preocupe querido, a reserva já está feita. Além do mais, sogra


boa é sogra que mora longe. Não quero estragar a excelente impressão que você
tem de mim.

— Que modesta! — rebati sorrindo.

— As portas da nossa casa estão abertas para vocês — Alexandre sorriu.

— Qualquer coisa me liga que pego um jatinho e chego aqui rápido! —


Meu pai recomendou.

— Meu telefone ficará ligado vinte e quatro horas, qualquer coisa é só


mandar um zap! — foi a vez da minha mãe se despedir.

— Ficamos felizes que esteja bem, mas vamos deixá-la descansar. —


Minha sogra despediu-se.

— Qualquer coisa é só ligar, filho — Alex disse, Alexandre assentiu.

— Não se preocupem e obrigada pela visita — agradeci.

— Visitaremos você em casa ainda essa semana.


— Vou pedir para Carmem fazer um almoço especial — sorri e todos eles
se foram.

— Mais um minuto na companhia dos meus pais e eu fingiria um


desmaio! — soltei quando Alexandre fechou a porta do quarto.

— Eles estavam preocupados.

— Eu notei — bocejei — estou com sono...

— Normal, você tomou muito analgésico. Descanse! — Ajeitou os


travesseiros atrás de mim.

— O Assis ainda está te esperando?

— Não, vou passar a noite aqui.

— Não precisa... — olhou-me de uma forma que não cabia argumentos.


— Vai ficar todo moído por dormir nesse sofá.

— Nada que uma noite de sono na nossa cama não resolva.

— Depois não reclame de dores nas costas — dei de ombros.

— Ah, vou reclamar... — sorriu — E ainda farei com que você beije toda a
extensão das minhas costas como um pedido de desculpas, além de várias
massagens.

— Farei com o maior prazer, tiozinho sacana!

— Você não deveria ser sexy vestindo essa roupa de hospital — puxou o
lençol até o meu peito, cobrindo-me toda — Assim está bem melhor!

— Eu não ganho um beijo de boa noite, tio? — fiz biquinho.

— Você já sabe que não vai para o céu? — indagou a poucos centímetros
da minha boca.

— Eu adoro o calor do verão, vou gostar do inferno — respondi antes da


sua boca esmagar a minha num beijo quente.
— Gabi você está se sentindo bem? — Alexandre perguntou, mas eu não
sabia o que responder.

Senti um pouco de dor a noite e precisei ser medicada novamente. Já


estava claro e a doutora Lourdes estava prestes a encerrar seu plantão, mas
solicitou minha presença em seu consultório, para me dar alta, eu presumia. E
assim o faria, mas antes ela me falou sobre os exames e deu o diagnóstico:
endometriose.

A médica tinha acabado de informar que eu tinha uma doença


ocasionada pelo crescimento do endométrio, revestimento interno do útero,
fora da cavidade endometrial. Ela geralmente é caracterizada por quadros de
dor intensa durante o período menstrual, o que explicava as minhas severas
cólicas.

Nada me assustou ou despertou a minha atenção até ela proferir a


palavra infertilidade. A doutora Lourdes explicava, em um tom didático, que um
terço das mulheres com endometriose tinham dificuldade para engravidar. Isso
ocorria pois, para que ocorra à gestação, o óvulo deveria ser liberado do ovário,
percorrer toda a tuba uterina, ser fertilizado por um espermatozoide e se
implantar na cavidade uterina, aonde se desenvolveria durante toda a gravidez.
Esse era o ciclo comum, mas mulheres com endometriose isso não funcionava
dessa forma já que o endométrio podia obstruir a tuba uterina e impedir o
encontro do óvulo com o espermatozoide, impedindo assim a fertilização.

— Gabriela, você não precisa ficar preocupada — a médica continuou —


como eu já falei, vamos realizar novos exames e a depender do resultado,
encaminharei você a um especialista em reprodução humana. A tecnologia
avançou bastante, tenho certeza que encontraremos um meio de vocês terem
um herdeiro. — Ela sorriu para me tranquilizar e o Alexandre acariciou a minha
mão, mas aquilo tudo parecia irreal.
Diferente da maioria das meninas, eu não fazia as bonecas de bebê,
nunca nutri a necessidade de cuidar de outra pessoa. Usava as minhas bonecas
para brincar de modelo, professora, advogada, entre outras profissões, mas não
me referia a elas como se fossem minhas filhas. A maternidade é um ato de
entrega total, doação do corpo e da alma para outro ser que dependeria
totalmente de você. Nunca achei que isso fosse para mim, assim como o
casamento. Mas, olha onde estava: casada com um homem que dependia de um
herdeiro legítimo para efetivar tal casamento.

Senti um aperto no peito, juntamente com um nó na garganta que


resultaram nos olhos ardendo... Pisquei rapidamente, para evitar que as
lágrimas viessem

— Já posso ir? — perguntei já ficando de pé.

— Claro, aqui estão as receitas e o meu cartão, caso queira continuar


comigo... — não ouvi o restante, pois saí em disparada do consultório. O
Alexandre juntou-se a mim segundos depois e me entregou a bolsa que acabei
deixando para trás.

Concentrei-me em vasculhar a bolsa e encontrar meus óculos


escuros Prada. Santa Carmem, que pensa em tudo! Agradeci mentalmente
enquanto seguíamos para o carro. O Assis já nos esperava e exibiu um sorriso
de contentamento ao me ver bem. Sorri de volta e sentei, aguardando que o
carro fosse posto em movimento.

Paramos na farmácia mais próxima e o Alexandre desceu para comprar


os medicamentos prescritos. Permaneci no carro perdida em meus
pensamentos. Recordava com exatidão das palavras do testamento:

A fim de gozar dos bens dos seus progenitores o beneficiário Alexandre


Fragoso Maia precisará atender aos seguintes requisitos:

I- Casamento Civil com efeito legal no Brasil;

II - Possuir um filho legítimo fruto do casamento.

A parte do filho legítimo aparecia em destaque néon, piscando em minha


mente. Eu sabia da existência do testamento. Alexandre também sabia que eu
sabia dessa existência. Ambos compreendíamos que era algo inevitável de
acontecer, cedo ou tarde, mas nunca sentamos para falar abertamente sobre
isso. Era um assunto que pairava no ar, em algum momento decidiríamos que
era a hora de executar essa cláusula.

Um terço das mulheres com endometriose tem dificuldade em engravidar.

E se eu fizesse parte desse número? E se mesmo com os tratamentos eu


não conseguisse engravidar? E se a ausência de um filho fizesse Alexandre rever
sua escolha? E se ele decidisse encontrar outra mulher para ter o seu herdeiro?
Lágrimas rolaram pelo meu rosto e logo tratei de contê-las quando o vi se
aproximar do carro com a bolsa de medicamentos em mãos.

— Gabi... — chamou-me fracamente e eu fingi dormir para não ter que


lidar com ele agora. Ele aproximou o corpo do meu e passou um braço sobre
meu corpo pousei a cabeça no seu colo e deixei que o sono realmente chegasse,
recostada ao seu peito.

Acabei adormecendo de verdade durante o trajeto. A claridade me


despertou assim que o Alexandre desceu do carro comigo em seus braços.

— Eu posso andar! — falei e seus braços fortes não me soltaram.

— Eu sei disso, mas faço questão de te carregar — marchou porta


adentro — Carmem peça para providenciarem um café da manhã reforçado.

— Alê, me coloca no chão — pedi e ele mais uma vez, que ignorou os
meus pedidos, subindo degrau por degrau como se carregasse uma folha de
papel.

— Eu deveria ter feito isso quando você entrou aqui pela primeira vez —
chutou a porta do nosso quarto — que tipo de marido eu seria se não
carregasse a minha esposa no colo? — arqueou a sobrancelha sorrindo e como
eu não reagi, me colocou na cama delicadamente e sentou ao meu lado.

— Não está se sentindo bem? Podemos voltar para a emergência agora!


— disse afoito.
— Eu estou bem. Quero apenas descansar um pouco... — deitei para o
lado oposto do dele e deixei os óculos ao lado.

— Qualquer coisa só chamar — ele depositou um beijo no topo da minha


cabeça e se afastou. Somente quando escutei a porta sendo fechada, me permitir
chorar.

Chorei porque a possibilidade de perder o Alexandre, mais uma vez,


pairava no ar.

Apaguei depois de tanto chorar, provavelmente estava com olheiras


terríveis, mas não deu tempo de ir conferi, o Alexandre estava sentado na
poltrona à minha frente, fitando-me atentamente.

— Acordou dorminhoca? — sorriu.

— E estou com fome... — sentei na cama.

— Imaginei, não tomou o café reforçado que pedi. Mas providenciei um


cardápio variado... — aproximou-se da cama com uma bandeja em mãos.

Ou eu realmente estava com fome ou meu cérebro em parceria com o


meu estômago concordaram que comer era a melhor maneira de evitar o
Alexandre, pois me concentrei apenas em devorar quase todos os itens da
bandeja.

— Você realmente estava com fome — disse sorrindo e eu concordei


balançando a cabeça. — Gabriela... — Sua voz saiu grave e um arrepio percorreu
meu corpo em expectativa pelo que sairia da sua boca — Eu já te pedi em
casamento duas vezes e você negou. Um terceiro pedido negado abalaria
fortemente o meu ego. Por isso, eu vou dizer apenas os motivos pelos quais
quero que a aliança volte para a sua mão! — olhei para minha mão esquerda só
para confirmar que ela não estava ali.
— Eu não tirei a... — Não consegui concluir pois ele me silenciou com um
beijo de tirar o fôlego.

— Eu sei que não foi você — disse ofegante — suas joias foram retiradas
para que você realizasse os exames. Será que ao menos eu posso concluir o meu
pedido?! — Concordei com um aceno de cabeça — Eu quero que essa aliança
volte para o seu dedo não porque eu quero que todos saibam que você é casada,
mas porque eu quero que ela seja a confirmação que fez a escolha certa e que
sempre que a veja, se lembre disso.

Era como se Alexandre soubesse que eu precisava ouvir aquilo, que eu


precisava me sentir segura.

— O que eu quero dizer é que desejo que você seja minha. E estou
disposto a esperar o tempo que você precisar para que sinta que as minhas
palavras não são da boca para fora. Por isso, aqui estão nossas alianças —
depositou nas minhas mãos — caberá apenas a você o destino delas.

Encarei os anéis dourados e em seguida, me perdi no seu olhar vidrado.

— Está disposto a abrir mãos dessas argolas?

— Sim.

— E aquele papo de que sociedade vê como sólido o uso das alianças no


matrimônio e blábláblá?

— Não vou dizer que isso me deixa feliz — coçou a cabeça sorrindo —
Eu me sentiria mais confortável se você a usasse, afinal você trabalha num lugar
repleto de homens e a aliança os deixariam a dois metros de distância.

— Não é uma aliança que irá impedir que eu seja cantada, você já deve
ter fodido trocentas mulheres com aliança no dedo...

— Não vou negar — soltou num lamento — Ainda não me habituei a


isso.

— A ter casado com uma mulher gostosa ou a ser menos possessivo?

— Eu, possessivo?
— Anhan — sorri — mas se está disposto a abrir mão da aliança o que
quer em troca? — arquei a sobrancelha — Já sei: que eu use uma gargantilha
com o seu nome!

— Uma tatuagem com o meu nome aí nos peitos já seria o suficiente —


olhei feio para ele que suspirou derrotado.

— Tá, talvez a inicial do meu nome no seu pulso envolto por um


coração?

— Imbecil!

— O que foi? Eu apenas quero que todos saibam que você é minha!

— Não é uma aliança que ditará isso...

— Tem razão.

— Eu sempre tenho! — sorri convencida.

— Sim, excelentíssima senhora da razão — fez uma falsa reverência —já


que não posso marcar seu corpo com nada representativo, eu quero ser o
primeiro a saber quando tomar a sua decisão. Eu quero me perder nesses olhos
azuis quando você fizer a sua escolha. Enquanto isso senhora Burnier Fragoso,
deixe-me continuar provando porque eu sou a sua melhor opção.

Seus lábios tocaram os meus apaixonadamente, o toque carinhoso era


algo ainda recente para mim, por isso permiti que ele me beijasse com calma,
como se estivesse saboreando cada parte da minha boca. O beijo era tão gentil e
apaixonado que eu tive certeza que morreria com overdose de carinho. Mas, era
exatamente o que precisava naquele momento. A boca do homem que eu amo
colada a minha. A cada investida sua, uma barreira se rompia e sem que eu me
dessa conta, proferi as palavras nunca ditas a um homem.

— Te amo! — minhas palavras saíram suaves e os olhos dele brilharam


quando encararam os meus.

— Eu que te amo — ele sorriu — te amo muito.

O meu coração estava sendo entregue em uma bandeja, e por incrível


que pareça, pouco importava o que viria pela frente. Desde que ele estivesse ao
meu lado tudo ficaria bem.
Quatro semanas se passaram desde que Gabriela deu entrada no
hospital. Quatro longas semanas que envolveram exames, consultas e um
turbilhão de sentimentos. Foram dias longos que me tiraram o sono, noites em
que eu não conseguia dormir pois ficava ali atento a cada gesto da Gabi. Noites
em que eu temi que tudo voltasse a acontecer, que eu vivenciasse toda a dor...

Os dias passaram e Gabriela dissipava meus medos com a sua risada alta
e seu jeito prático de ver a vida. Lado a lado percorremos o caminho de
incertezas, que incluíram exames, diagnósticos, risos, choros, inseguranças,
certezas.

O Hit et nunc que ela tatuara na pele tornou-se o nosso lema, vivíamos o
aqui e o agora e desde que estivéssemos juntos poderíamos enfrentar qualquer
empecilho que a vida nos apresentasse.

— Senhor Fragoso, posso dar continuidade? — o coordenador financeiro


perguntou e num ato inconsciente assenti que sim. Estamos numa reunião de
planejamento estratégico para aquisição de novos imóveis, pelo menos era o
que dizia a planilha a minha frente. Desde que entrei na sala de reunião não
conseguia me concentrar em nada do que foi dito. Meus pensamentos e sentidos
ficaram todos na minha casa, mais especificamente na minha mulher.

Gabriela tinha o poder de ocupar todos os meus pensamentos. Se ligava


o som do carro para me distrair, a história da música cinco da minha playlist me
remetia a ela; se passava em frente a uma floricultura imediatamente parava
para comprar rosas vermelhas e já sorria ao imaginar a sua reação ao me ver
voltando para casa com as flores a tiracolo. Ela sempre diz num tom esnobe que
prefere joias a flores, mas assim que viro as costas, sorri abobalhada para o
buquê. Ou ainda, como era o caso atual, quando eu deveria estar concentrado
numa reunião com os corretores da imobiliária e tudo que eu conseguia pensar
era que eu queria voltar para nossa cama e passar o dia inteiro ao lado dela.
Estou completamente dominado pela Gabriela Burnier e por incrível que pareça
isso não é tão assustador assim.

Agora entendia completamente o Marcos e a sua idolatria pela Fernanda,


a forma como ele falava da sua esposa com paixão e orgulho... Eu iria até o fim
do mundo para fazer Gabriela feliz.

— A idade te deixou surdo? — É o que diz o papel que Odete empurrou


em minha direção. Não consigo conter o sorriso ao perceber que mais uma vez
naquela manhã eu me perdi na Gabriela.

— É bem pior... — respondi.

— Eu sabia que o amor deixava os homens tolos, mas improdutivos... —


devolveu o papel. Ergo os olhos do papel e ela dá de ombros sorrindo.

— Ainda sou seu chefe! — sibilo e ela sorri.

O homem de terno continua falando sobre projeções e a queda sofrida


pelo mercado imobiliário causada pela crise financeira e política que assolou o
país no tom típico de um economista, pregando cautela na aquisição de novos
imóveis. Embora a nossa imobiliária não tenha sido afetada de forma drástica,
como aconteceu com outros empresários, reconheço a importância de pesar os
prós e contras na aquisição de novos imóveis. A economia do país voltou a
progredir em passos lentos, por isso não podemos tapar o sol com a peneira,
como diria meu pai, e fingir que nada está acontecendo.

— Agora que a áurea tipicamente pessimista do financeiro pairou sobre


nós — Soares, o nosso corretor imobiliário mais antigo e coordenador da
equipe, brincou — vamos a parte boa, ao futuro promissor do país.

Soares tinha, como poucos ali presentes, a capacidade de atrair a


atenção, no auge dos seus sessenta anos ele transmitia bom humor e
serenidade, por isso se destacava, ainda tanto anos depois, no mercado. Tinha
um olhar sagaz e a paciência necessária para aguardar o fruto amadurecer...

— A configuração da família vem se modificando ao longo do tempo —


prosseguiu — se antes as famílias eram compostas pelos laços sanguíneos,
agora família dá-se pela junção de pessoas que se amam — eu e todos ali
ouvíamos atentamente — um grupo de amigos. A avó e a neta. Apenas a mãe e
os filhos. Ou a sobrinha e a tia... Ainda, a mulher com seu gato, cachorro e o seu
papagaio, juntos, sob o mesmo teto, formam uma família. “Mas, o que isso tem a
ver com imóveis Soares? Acho que está na hora de você se aposentar!” vocês
devem estar pensando. Bem, se antes as famílias buscavam abrigo dentro de
apartamentos, atrás de muros e grades, agora eles querem liberdade. Querem
ter uma área para receber os amigos, querem um quintal para criar o labrador,
um espaço verde para plantar suas mudinhas, uma quadra para jogar uma
pelada no fim de semana, querem uma casa com uma árvore para construir a
casa da princesa da filha...

Soares continuou falando no seu tom sereno sobre os anseios dessas


novas famílias e o papel do corretor imobiliário nesse novo cenário. E eu
poderia continuar ali sentado ouvindo-o falar por horas a fio, aprender com a
sua visão de mundo. Mas, o que eu já ouvi até agora fora o suficiente para tomar
uma decisão que eu já vinha adiando por tanto tempo.

— Aconteceu alguma coisa? — Odete perguntou quando me levantei


com o celular em mãos.
— Pessoal — chamo a atenção de todos — eu precisarei me ausentar do
restante da reunião, para refazer a minha fala depois do discurso primoroso do
Soares — brinco e todos sorriem — o bastão está com você — dou dois
tapinhas nas costas de Soares e saio apressado da sala.

— Por isso esse temporal hoje pela manhã — minha mãe disse assim que
me viu e caminhou em minha direção, para me abraçar. Saí da reunião direto
para a casa dos meus pais — Meu filho vir me visitar espontaneamente é um
verdadeiro milagre.

— A senhora anda muito carente... — sorri e beijei seu rosto. — Pai! —


aceno para ele sentado no sofá lendo a coluna de esportes. Havia tirado o dia de
folga, principalmente quando soube que a reunião do dia era sobre
planejamento estratégico.

— Você não deveria estar numa reunião? — Meu pai franziu o cenho.

— Deveria...

— Mas, não está! — minha mãe olhou feio para meu pai — Nosso filho
está aqui seja lá qual for o motivo. Não quero ouvir nem mais uma palavra sobre
trabalho — assentimos sorrindo — Vou pedir para preparar nhoque que eu sei
que você gosta... — disse animada — Liga para a Gabriela e pede que venha
almoçar conosco.

— Mãe... — toquei seu braço

— Eu conheço esse tom — sua postura enrijeceu — Aconteceu algo com


a Gabriela? O resultado dos exames...

— Calma — pedi e ela respirou fundo — Gabriela já iniciou o tratamento


da endometriose e está tudo bem.

— Ela não vai poder ter filhos, não é? — Meu pai foi direto ao assunto.
— Não se preocupe — minha mãe disse com seu jeito doce — Há
inúmeras crianças aguardando por uma família que as ame.

Ela e meu pai trocaram olhares cúmplices e com essa simples troca de
olhares compreenderam a situação: o herdeiro exigido no testamento.

— Ainda não sabemos — informei e os dois me olharam em expectativa


— Eu não lembro os termos técnicos, mas pelo pouco que entendi não houve
comprometimento do ovário — expliquei — O que indica que ela pode
engravidar. Mas somente uma consulta com o especialista em reprodução irá
garantir. A consulta está agendada para daqui a quinze dias.

— Vai dá tudo certo, meu amor — minha mãe acariciou a minha mão.

— Eu sei — sorrio — É por isso que estou aqui. No caminho do escritório


até aqui, pensei em várias maneiras de contar a verdade.

— Que verdade? — meu pai perguntou.

— Vamos sentar? — apontei o sofá e minha mãe sentou ao lado do meu


pai. — Meu casamento com a Gabriela não seguiu o procedimento normal... —
eles me olharam sem compreender — Não nos casamos porque nos amávamos,
casamos por que era conveniente para mim ter uma esposa — vi a
compreensão surgir no olhar deles e continuei para pôr fim de uma só vez nessa
história — eu havia ensaiado começar com as desculpas, mas eu não aguentava
mais esconder isso de vocês, eu sinto muito! — Completei e esperei a reação
dos meus pais, que não reagem, apenas me olham em expectativa.

— Você a ama? — minha mãe rompeu o silêncio.

— Mais do que eu pensei que fosse possível — confessei.

— Eu fico muito feliz em ouvir isso — ela sorriu — Gabriela é uma


mulher incrível!

— Você não vai dizer nada, pai? O quanto está decepcionado...

— Por que você resolveu contar toda a verdade agora? — perguntou.

— Porque o que eu construí com a Gabriela é mais importante que o


testamento. E ainda que não possamos ter um filho, seremos uma família, pois
ela é a mulher que eu amo e desde que esteja ao meu lado nada importa.

— Está abrindo mão da herança? — meu pai indagou.

— Se esse for o preço para viver com a Gabriela, sim! — respondi


convicto da minha escolha.

— Você conta ou eu conto? — Minha mãe voltou-se para o meu pai.

— Pedimos anulação do documento quando você embarcou para Las


Vegas — a informação me pegou de surpresa.

— O Rafael continuou te investigando e...

— Aquele filho da puta! — rosnei.

— ... E foi por meio dele que soubemos que você embarcou para Las
Vegas acompanhado de um tipo escandaloso — A Tiffany, a mulher que
contratei. — Não podíamos permitir que você casasse com aquela moça.

— Por isso naquele mesmo fim de semana solicitamos a anulação do


testamento. Quando você retornou acompanhado da Gabriela o testamento não
tinha mais nenhum efeito... — meu pai completou sorrindo.

— Por que não me contaram antes?

— Quando aparecemos no dia do seu aniversário estávamos dispostos a


contar, mas assim que vimos a Gabriela e a troca de olhares entre vocês
percebemos que havia mais que uma farsa ali. Havia um sentimento que
nenhum do dois ainda havia se dado conta.

— E por isso sua mãe resolveu que deveríamos permanecer em silêncio.


Ela não parava de dizer que a intuição de mãe dizia que Gabriela era a mulher
que conseguiria ter acesso ao seu coração.

— E eu estava certa — disse confiante — Gabriela conseguiu com seu


sorriso fácil e toda a sua audácia trazer luz para a sua vida.

— Eu... Eu não sei o que dizer.


— Diga que nos perdoa por ter imposto o testamento! — minha mãe
falou com os olhos marejados.

— Eu jamais pensei que poderia dizer isso, mas obrigado! O testamento


foi o que eu precisava para sair da minha zona de conforto, foi graças a ele que
Gabriela entrou definitivamente na minha vida e não sei se sem ele e toda a
pressão eu teria conseguido casar com ela. — Sorri.

— Ela definitivamente é uma mulher incrível — minha mãe sorriu —


Sabe como colocar um Fragoso na linha!

— Amo vocês! — falei fitando-me meus pais.

— Nós que amamos você! — minha mãe falou antes de me abraçar e logo
meu corpo foi envolto por outro braço. Meu pai juntou-se a nós e formamos um
só abraço. O abraço de reconciliação e amor.

— Eu já estava prestes a apertar a campainha! — reconheci a dona


daquela voz e quando me virei para encará-la, encontrei Bruna vestida para
uma batalha. Ela caminhou em minha direção usando um vestido com um
decote que revelava o vale dos seus seios e expunha as suas coxas enquanto
caminhava.

Definitivamente hoje era o dia de resolver todas as questões do meu


passado. Eu só não contava encontrar a Bruna na frente da minha casa.

— O que você faz aqui?

— Oi para você também! — sorriu e se aproximou de onde eu estava,


recuo.

— Bruna aqui não é o melhor lugar para conversarmos.

— Eu te liguei diversas vezes — eu havia bloqueado o número — e sua


secretária não autorizou a minha entrada no seu escritório. Por isso resolvi
visitá-lo na sua casa. Não vai me convidar para entrar?

— Não! Não temos nada para conversar.

— Ah temos... — sorriu — Meu apartamento sente a sua falta.

— Bruna... — hesitei — Eu amo a Gabriela — fui direto ao ponto.

— Minha boceta sente falta do seu pau grande — segurou a minha


gravata e eu recuei até minhas costas se chocarem contra o carro estacionado.

— Isso não será mais possível...

— Vai negar que o que houve entre nós foi quente e gostoso? — suas
mãos tocaram meu peito — Podemos repetir tudo isso e no fim da noite você
pode voltar para a sua esposa e dormi de conchinha. Eu não ligo! — lambeu
minha boca.

— Mas eu ligo. — Afastei-a delicadamente — Eu quero estar todas as


noites ao lado da minha esposa, seja apenas para dormi de conchinha ou para
fazermos amor por toda noite.

— Que lindo! — ironizou — Então não há o menor problema em me


convidar para um suco. Tenho certeza que a sua doce esposa ficará feliz em me
receber no lar feliz de vocês — disse e caminhou em direção a porta.

— Qual o seu problema, garota? — segurei firme em seu braço.

— Agora eu sou uma garota? — arqueou a sobrancelha — Eu não era


uma garota quando me comeu no seu carro ou ainda quando me fodeu por
horas a fio no meu apartamento.

— Bruna... Estou tentando ser educado — quando ela ergueu os olhos


para me encarar vi um misto de confusão neles.

— Eu não vim até aqui para ouvir você dizer que ama a Gabriela, muito
menos para que me dissesse que sou um problema. Vim aqui por que eu quero
você! E ao contrário do que você disse, eu não sou uma menina que chora no
quarto a noite quando quer algo, eu sou mulher para ir atrás do que eu quero.

— Não — neguei sem soltar seu braço — você não passa de uma menina
mimada que sempre teve tudo que quis em suas mãos, incapaz de aceitar “não”
como resposta.

— Dispenso a sua análise errônea sobre a minha vida — rebateu


sorrindo — Agora me solta antes que eu grite e sua esposinha nos encontre aqui
juntinhos na grama da casa de vocês.

Como num passe de mágica, a porta se abriu e Gabriela surgiu


acompanhada de um cachorro. Desde quando tínhamos um cachorro? Não tive
tempo para perguntar, pois Bruna logo tratou de provocar.

— Olha ela! — Bruna disse sorrindo e eu soltei o seu braço, frustrado.

— Cai fora! — Ordenei.

— Eu estava aqui falando com o seu marido — deu dois passos em


direção a Gabi e o cachorro rosnou.

— Acho melhor continuar aí! — Gabi sorriu — ou meu cachorro colocará


você para correr.

— Um vira-lata? — Bruna ironizou — Tenho certeza que cão que ladra


não morde — deu mais dois passos e dessa vez os rosnados do cachorro soaram
mais alto, o cão estava em alerta, pronto para atacá-la.

— Chega Bruna, vai embora! — pedi.

— Ah, mas eu não vou mesmo! — ela aproximou-se ainda mais de onde
Gabriela estava e o cachorro avançou sobre ela rosnando aos seus pés. Bruna
recuou e com isso, um dos seus saltos ficaram presos na grama, resultando em
uma queda de bunda no chão. A queda no gramado acionou o sistema de
irrigação e em poucos segundos ela estava molhada pelos jatos d'água.

— Chega! — segurei o cachorro pela coleira para que não avançasse


sobre a presa ali jogada no chão.

— Aqui — Gabriela estendeu a mão para que ela levantasse. As duas


trocaram olhares e Bruna afastou a mão da Gabi com um safanão, levantando-se
rapidamente — eu tentei ser gentil — Gabi deu de ombros sorrindo.
— Eu não preciso da sua gentileza! — Bruna rosnou.

— Adeus, Bruna — falei e segui Gabriela que adentrou a casa


acompanhada do cachorro saltitante.

— Gostei de você! — Gabi disse sorrindo para o cachorro que balançava


o rabo feliz.

— Desde quando temos um cachorro?

— Desde que ele coloca vadias oferecidas para longe do seu caminho —
sorriu.

— Eu não esperava encontrá-la aqui.

— Esperava encontrá-la em outro lugar? — ela ergueu a sobrancelha.

— Está com ciúmes? — provoquei e ela me olhou feio — Eu só tenho


olhos para você.

— Espero que o seu pau também!

— Ele só funciona com você...

— Anhan... — me aproximei e tomei a sua boca com desejo, meus lábios


sugaram os dela ao ponto de arrancar um suspiro da sua boca e quando nossas
línguas se encontraram, elas dissiparam todas as dúvidas. Suas pernas
envolveram a minha cintura e eu a ergui encostando-a contra a porta de
madeira.

— Alê... — ela sussurrou quando afastei as nossas bocas para tomar seu
pescoço, usei as mãos levantar o vestido fino que vestia e a toquei sob a calcinha
de renda pequena. Num ato rápido abri os botões da minha calça e deixei que
ela escorregasse até os meus pés, afastei a sua calcinha e a penetrei de uma só
vez.

— Eu contei a verdade para meus pais — falei enquanto a invadia —


falei que você é mais importante que qualquer testamento e o quanto a amava
— duas lágrimas rolaram pelo seu rosto. — Hit et nunc — arremeti mais uma
vez — Eu te amo Gabriela Burnier! — declarei indo fundo dentro dela.
— Eu te amo, Alexandre Fragoso! — falou sorrindo antes de envolver
minha boca num beijo doce. — E você tem sorte em não ter nenhum empregado
vendo essa cena aqui!

— Você me faz esquecer que o mundo existe.

— Fico feliz em não ser a única que sente isso — ela riu.

Beijei sua boca e meti fundo várias vezes. Gozamos juntos gritando alto
um o nome do outro. Ali, dentro dela, eu era o homem mais feliz do universo.

Horas mais tarde, na nossa cama, após eu ter mostrado mais uma vez
quem era a dona e proprietária do meu corpo, Gabriela contou-me sobre o
cachorro misterioso. Ela estava indo para a academia quando o viu embaixo de
um ponto de ônibus, tentando se proteger da forte chuva que caía. Na mesma
hora, ela confessou, teve vontade de parar o carro e tirar o cachorro dali, mas o
sinal abriu e ela seguiu para a academia com a imagem do cachorro em sua
mente. Prometera a si mesma que se em seu retorno ele ainda estivesse ali, o
resgataria.

— Quando eu retornei ele estava lá no mesmo lugar como se estivesse


esperando por mim — sorriu — eu só abri a porta do carona e assobiei e ele
veio correndo.

— Eu também não perderia a oportunidade de entrar no carro de uma


loira gostosa — sorri.

— Eu sempre soube que você era um cachorro — perturbou.

— E o que vamos fazer com ele?

— Com o Floquinho? — ponderou.

— Floquinho? — arqueei a sobrancelha sorrindo.


— Alê, quando ele entrou no carro estava todo sujo de lama. Imagina a
surpresa quando o vi saí da sala do pet shop todo branquinho. Daí o nome será
floquinho! A veterinária disse que ele precisa retornar lá para um check-up, mas
eu precisava vim correndo te mostrar. Você gostou dele? — perguntou animada
de uma maneira que eu nunca tinha presenciado.

— Desconfio que o seu amor pelo Floquinho aumentou depois da cena


de outrora... — sorri.

— Floquinho é o meu novo amor — sorriu abertamente — você terá que


dormi no sofá pois ele agora será o dono do lado esquerdo da cama.

— Estou perdendo para um cachorro?

— Ok — soltou o ar — Eu posso amar dois cachorros ao mesmo tempo


— sorriu antes de enroscar-se nos meus braços.

— O que você está aprontando? — Perguntei enquanto acariciava seus


cabelos. Gabriela olhava fixamente para o teto como se sua mente estivesse
longe.

— Na hora certa você saberá — sorriu e depositou um selinho nos meus


lábios — enquanto isso tiozinho, faça valer a sua rara folga do trabalho!

Ela não precisou pedir duas vezes e lá estava eu, duro e pronto para
aproveitar todo o momento ao seu lado.
Hic et Nunc!

Observei, mais uma vez, os traços que compõem a minha tatuagem no


espelho gigante do quarto enquanto aplicava creme hidratante pelo meu corpo,
a fragrância das notas cítricas me fazia pensar em tudo que me aconteceu nos
últimos meses. Passei por mais altos e baixos do que ao longo de toda a minha
vida. E eu não me referia exatamente ao fato improvável de eu estar casada e
planejando ter filhos, mas sim de toda a carga emocional que eu vivenciei em
decorrência desse fato.

Era engraçado pensar que, ao contrário dos casamentos "normais", que


iniciam no céu e acabam, na maior parte dos casos, no inferno o meu seguiu um
script próprio. Digno de novela, como diria minha jovem madrasta. Eu fui do
inferno ao céu: brigas, traições, confissões, lágrimas, sexo, gargalhadas, jantares
inesquecíveis, declarações de amor e uma calmaria que me faz temer por uma
tempestade inesperada.
Essa tempestade nunca chegou ou talvez ela tenha chegado e não causou
tanto estrago, pois estávamos juntos. Cafona para caralho, eu sei, mas era real.
Estar com Alexandre me trouxe a calmaria que eu temia sentir. Acreditava
veementemente que a vida só era verdadeiramente vivida com altas doses de
risco e luxúria. E estou aprendendo ao lado do meu marido experiente que não
há mal em curtir a noite jantando em casa, dormir de conchinha, assistir séries
durante o final de semana e enviar mensagens apaixonadas ao longo do dia.

Alexandre estava me provando que o casamento era mais do que um


contrato entre duas pessoas, era uma escolha voluntária que as pessoas fazem
em prol da felicidade mútua. E isso não tinha nada a ver com o lance de se
tornar um só ou de monogamia, mas se tratava de companheirismo e lealdade,
da vontade de compartilhar cada minuto do seu dia, tanto as alegrias quanto as
dúvidas e tristezas.

Receber o diagnóstico de endometriose tinha me feito pensar muito no


que eu realmente queria da minha vida. Enquanto os exames e consultas
ocorriam, eu pensava em como me sentiria se não pudesse ser mãe. Durante
esse tempo, o Alexandre me apoiou de maneira incondicional e nunca me
cobrou nada. Quando descobrimos quais eram as chances reais de engravidar,
decidimos que deixaríamos as coisas fluírem. O que no nosso caso era bem fácil:
foder sempre que pudéssemos, mas sem nenhuma pressão. Sempre fomos fogo.

— Eu deveria ter me juntado a você no banho — a sua voz grave fez meu
coração disparar. Continuei onde estava, de costas para ele, e espalhei mais
creme pelas minhas pernas. Seu olhar capturou atentamente cada gesto meu e
percorreu o caminho das minhas mãos.

— Pena que perdeu a chance — levei a mão aos seus lábios para fechar a
sua boca aberta. Alexandre foi rápido e segurou-a, sugando meus dedos —
Porra Alê! — repreendi sorrindo.

— O que foi? — Respondeu envolvendo a minha cintura nua.

— Eu te chamei diversas vezes para se juntar a mim no banho, mas você


preferiu ficar de conversinha com o Dan.
Sim, o Dan, tornou-se personal trainner do casal. Meu sagaz marido
entendeu, de uma vez por todas, que eu não deixaria de ter um personal gato, só
por causa dos ciúmes dele e preferiu juntar-se ao “inimigo”.

— Estava sendo um bom aluno — sorriu — Preciso estar à altura da


minha deliciosa esposa — sua mão apertou firme a minha bunda.

— Como se você precisasse disso... — levei as mãos até a barra da sua


camisa suada e deslizei os dedos pelo seu abdômen definido.

— Gabriela... — ele sussurrou quando minhas unhas percorreram o


caminho até o cós da sua calça.

— O que foi? — segurei a camisa para puxá-la para cima, mas as suas
mãos seguram as minhas — deixe-me conferir o quanto as aulas do Dan
surtiram efeito — sorri maliciosamente e tentei erguer a camisa, mas as suas
mãos me impediram mais uma vez — qual é o problema? — ergui a sobrancelha
sem entender o motivo pelo qual ele não me deixava despi-lo.

— Você está nua e eu não aguento esperar mais — sua boca esmagou a
minha em mais um dos seus beijos urgentes e molhados.

Quando a sua língua duelou com a minha, gemi contra a sua boca. Rogava
a Nossa Senhora Padroeira dos Casamentos para que nosso desejo nunca fosse
satisfeito e que continuássemos nos querendo até estarmos velhinhos.

— Eu poderia passar a vida inteira venerando você e ainda não seria o


suficiente. Por mais que eu tente, não consigo traduzir o quanto você é deliciosa,
amor — ele diz isso com a voz sussurrada bem ao pé do meu ouvido e... adeus,
controle!

Minha boca suga a dele e disputamos entre saliva e mãos, quem comanda
o beijo. Se toda esposa tivesse como marido um expert em usar a língua o
aumento de orgasmos femininos causaria um terremoto em escala global, disso
eu não poderia reclamar. A boca dele me deixava completamente entregue
desde a primeira vez em que esteve na minha boceta. Como se adivinhasse
meus pensamentos, ele guiou-me sem interromper o nosso beijo, em direção a
parede do quarto. Agachou-se ficando entre as minhas pernas:
— Pronta para receber uma lição oral? — seu sorriso é sacana.

— Manda ver, tiozinho! — Senti o seu sorriso contra a minha pele


quente, e ele realmente mandou ver — Alê... — gemi quando ele sugou meu
clitóris com maestria.

Olhei para baixo e encontrei seus olhos atentos aos meus, havia um
brilho intenso naquele olhar que me dominava e sabia que faltava bem pouco
para me fazer estremecer. Segurei firme em seus ombros para não cair quando
ele alternou entre chupar, lamber e me foder com a língua. Estremeci e gritei
alto quando gozei contra a sua boca.

Enquanto meu corpo ainda tremia, Alexandre me pegou no colou e me


deitou delicadamente na nossa cama. Seus lábios tocaram os meus, dessa vez
em um beijo delicado e calmo, fazendo-me sentir meu gosto na sua boca, o que
não ajudava a aquietar o calor latente dentro de mim. Todavia, eu não era a
única quente ali, o pau duro aprisionado no short de malhar pressionava a
minha barriga, me deixando louca de vontade de tê-lo em minha boca. Mais uma
vez, tentei livrá-lo da roupa, mas rápido feito uma flecha ele abaixou a bermuda
e se posicionou entre as minhas pernas.

— Eu te amo tanto! — ele sentenciou mordendo a minha orelha, quando


tocou lá no fundo.

— Eu que te amo... — Enlacei nossas mãos quando ele se afastou para


entrar novamente. Ele acelerou o ritmo das estocadas e pouco tempo depois
chamávamos o nome um do outro, em busca do prazer que se aproximava de
maneira feroz. Meu corpo inteiro vibrou, fazendo-o se derramar em mim.

O Alexandre rolou para o lado, levando meu corpo junto ao seu.


Permanecemos abraçados. Nossos corações batendo descompassados, nossas
respirações ofegantes e nossas mãos entrelaçadas.

Na cama nos tornávamos um só ser, fundidos e conscientes do prazer


que éramos capazes de compartilhar. No que dependesse de mim, seria assim
para sempre.
Acabamos adormecendo por alguns minutos, ele ainda suado do treino e
eu precisando de um novo banho por causa do sexo compartilhado. Meu celular
tocou alto para me lembrar que eu não deveria estar em plena luz do dia nos
braços do meu delicioso marido, pois tinha uma surpresa para realizar.

— Deixa tocar... — Alexandre falou me prendendo contra o colchão.

— Preciso atender — tentei me desvencilhar das suas pernas.

— Por que? Vamos passar o dia aqui hoje — beijou meu pescoço.

— Tentador, mas temos um compromisso inadiável.

— Temos e eu não sei? Remarca — sua boca traçou o caminho até os


meus seios.

— Não dá, temos visitas.

— Mentindo para o seu mar... — Ele nem precisou concluir.

— Gabi, você tem cinco minutos para sair desse quarto — a voz do Felipe
se fez ouvir.

— O que ele faz aqui? — Alexandre puxou o edredom até o meu peito —
Não ouse entrar nesse quarto, seu moleque!

— Se ele não fizer, eu invado!

— Marcos? Que porra aconteceu para vocês estarem na minha casa? —


Alexandre indagou já de pé, vestiu a cueca boxe rapidamente, e praticamente
correu em direção a porta para impedir que nosso quarto fosse invadido.

— Diz para mim que vocês estão vestidos, pois temos duas crianças aqui
fora!

— E o que vocês fazem com duas crianças a essa hora na minha casa? —
Alexandre colocou a cabeça para fora.

— Pergunte a sua deliciosa esposa...

— Obrigada pelo deliciosa, Marcos! — gritei.

— Vai se foder, Marcos! — Alê bateu a porta na cara do amigo.

— Por nada, gata — ele respondeu entre risos.

— Gabi, agora você tem menos de três minutos para mover essa bunda
gostosa para o lado de fora.

— Eu vou matá-lo! — Alexandre rosnou e eu pulei da cama para impedir


que ele cumprisse a ameaça.

— Felipe, não fode! — repreendi sorrindo.

— Olha que eu... — Mesmo do outro lado da porta eu poderia ver o


sorriso pervertido do Felipe.

— Cale a boca! — Alê e eu dissemos ao mesmo tempo.

— Estamos esperando o casal lá embaixo — Marcos anunciou.

— Esperem sentados — Alexandre respondeu mal-humorado.

— Temos todo o tempo do mundo... — Marcos respondeu.

— Se eu fosse você não demoraria tanto. Deixamos a Mari e o Gui lá


embaixo com tinta guache... — Felipe informou.

— E talvez eles achem que o Range Rover do tio Alê precise de mais cor...
— Marcos completou.

— Filhos da puta! — Alexandre rosnou e eu me juntei a gargalhada alta


do Marcos.

— Desculpa, amor.... — Toquei seu peito e ele soltou o ar com força.

— O que eles fazem aqui?

— Eles vieram para nos acompanhar a um lugar especial...


— Que lugar é esse, Gabriela? — franziu a testa, preocupado.

— Confia em mim — pisquei em sua direção.

— Se não houvesse duas crianças lá embaixo eu imaginaria coisas


pervertidas vindas desse seu sorriso diabólico — eu gargalhei.

— Sempre podemos pedi para a Carmem cuidar das crianças... — joguei


para ver a sua reação.

— Você não está falando sério, está?

— Nunca se sabe... — dei de ombros sorrindo — Agora vamos tomar


banho antes que aqueles dois incitem as crianças a customizarem o seu carro.

— Vá na frente! Eu vou garantir que eles não toquem no meu carro.

— Estou sendo trocada por um carro? — fingi estar ofendida.

— Nunca se sabe — repetiu a minha resposta.

— Tomara que a Mari tenha sujado os bancos de couro e que o


Guilherme tenha furado o pneu! — falei e saí rebolando em direção ao banheiro.

Depois que saí do banho, enquanto vestia um short jeans e uma camiseta
justa, o Alexandre retornou aliviado por constatar que tudo não passara de uma
brincadeira de amigos, os carros estavam intactos e por isso, ele seguiu para o
banho e eu desci para receber nossos convidados.

— Ora, ora como vai senhora Fragoso? — Marcos levantou do sofá para
me abraçar. Dessa vez ele não usava o traje social do escritório, estava vestindo
uma camiseta branca e uma bermuda de sarja azul marinho, nos pés,
confortáveis tênis.

— Estou muito bem, senhor Albuquerque — sorri — Como vai a rainha


Albuquerque?

— Comandando seu império — ele respondeu sorrindo.

— O senhor Albuquerque legítimo sou eu! — Felipe discordou de braços


abertos. O novinho Albuquerque usava uma bermuda jeans e uma camisa azul
da cor dos seus olhos.

— Fernando Albuquerque discordaria disso — abracei demoradamente


meu amigo.

— Sou o mais gato da família, pelo menos... — Exibiu um sorriso


prepotente.

— O menos humilde, com toda certeza — Marcos rebateu.

— Cadê a Aline?

— Auxiliando a rainha! — Felipe respondeu. — Sábado de balanços na


empresa, aí já viu...

— Tia Gabi! — Mari correu em minha direção acompanhada do


Floquinho e sendo seguida pelo Guilherme que parou ao lado do Felipe.

— Oi, amor! — ergui a garotinha do chão, beijando seu rosto.

— O Floquinho pode passar uns dias na minha casa? Eu estou


apaixonada por ele! — falou animada.

— Se a Fernanda concordar... — sorri

— Papai, por favor — a menina juntou as mãozinhas em súplica —


convence a mamãe.

— O que você me pede sorrindo que eu não faço chorando?

— O pônei — ela deu de ombros — Eu pedi um pônei no Natal e ainda


não chegou. — Fez biquinho.

— Vou reclamar com o Papai Noel! — o pai babão respondeu.

— Não — Mari discordou — Você vai plocessá-lo! — completou e todos


nós gargalhamos.

— Eu não ganho um beijo, Guilherme? — Agachei para ficar na altura


dele que deu passos tímidos e aproximou-se para me beijar carinhosamente na
face. Repeti o gesto e ele caminhou feliz em direção ao Felipe.
— Tio Alê! — Mari interceptou o Alexandre que se aproximava
desconfiado. Seguindo as minhas recomendações, ele usava camiseta e
bermuda, estava adequado para o nosso passeio. — Sabia que a tia Gabi vai
deixar eu levar o Floquinho para minha casa e que meu pai vai plocessá o papai
Noel? — Ela falou sem tomar fôlego.

— Sério?

— Sim! E quando eu crescer mais, eu serei uma advogada e o Gui será


um médico de dentes como o primeiro papai dele né, Gui? — Ela voltou-se para
Guilherme.

— Sim — ele concordou — E também serei administrador e tocarei


violão igual o papai Felipe — meu sócio olhou orgulhoso para o menino.

— Você sabia que o Gui tem dois papais, tio Alê? — Mari continuou
tagarelando — Você tem dois papais, tio? Eu não conheço mais ninguém que
tenha dois papais.

— Meu amigo Dudu, também tem dois papais! — Gui completou.

— Papai, eu posso ter outro papai? — Mari voltou-se para Marcos.

— De jeito nenhum! — ele discordou e ela o encarou sem entender a


reação do pai.

— Talvez a mamãe queira um outro papai Mari, pergunte a ela — Felipe


perturbou.

— Me dá o celular que eu vou ligar pra ela — esticou a mão para o pai
que fuzilava o Felipe.

— Depois você liga para a mamãe — resolvi intermediar e pôr fim


aquela conversa — agora temos que ir a um lugar bem mágico!

— Onde fica esse lugar? — Guilherme perguntou, curioso.

— Lá tem piscina? — Mari indagou — Por que se tiver papai não trouxe
meu biquíni.

— Eu não vou contar nada — sorri — Vou deixar que vocês descubram
lá! Prontos?

— Sim! — as crianças gritaram em coro.

Seguimos cada qual para seu carro e não demorou muito para que
Alexandre me bombardeasse com perguntas para onde iríamos. Limitei-me a
responder que era surpresa e falei para aproveitar a paisagem. Por fora, eu
exalava tranquilidade, mas por dentro eu era um turbilhão de emoções. Não
sabia como ele reagiria a minha surpresa, e agora, minutos antes de chegar ao
local, meu cérebro travava uma disputa com o meu coração para saber se estava
tomando a decisão correta.

O fato é que desde que eu resgatei Floquinho na rua, parei para pensar
na situação dos animais abandonados na rua. Não é que eu nunca tivesse
pensado antes, sempre me comovi quando via nos noticiários relatos de maus
tratos ou abandono de animais, mas algo mudou dentro de mim desde que
Floquinho entrou na minha vida. Ele trouxe o real sentido de lar para nossa
casa. Sempre que eu retornava da Carpe Vita pela madrugada, ele estava
fielmente me esperando na sala de estar.

Era a minha companhia quando o Alexandre estava trabalhando e minha


sombra a cada passo que eu dava na mansão. E com o Alê não era diferente, ele
sorria mais desde que Floquinho surgiu, adorava levá-lo para correr no
calçadão de Copacabana e repreendia com um sorriso quando o cachorro
pulava na piscina para se refrescar.

Desde o dia do resgate uma ideia martelava constantemente a minha


mente: ajudar os animais abandonados. Porém, eu não queria apenas destinar
dinheiro para uma instituição, queria fazer algo mais, pôr a mão na massa... Não
só por mim, mas pelo Alê. Eu sabia o quanto construir um abrigo era importante
para ele e a Yasmin. E foi pensando nisso que entrei em contato com um abrigo
que estava prestes a encerrar suas atividades devido à falta de estrutura para
receber mais animais e me coloquei a disposição para ajudá-los. Visitei o lugar,
um casarão localizado na zona norte do Rio, que atualmente abrigava
quatrocentos e cinquenta gatos e trezentos e oitenta cachorros e me coloquei a
par dos problemas da instituição.
Saí da primeira reunião com a cabeça fervilhando de ideias e encontrei
nos Albuquerques o auxílio para executar minhas ideias. Minha amiga
Fernanda, representando a Albuquerque's foi responsável por organizar a
administração do abrigo, e com a ajuda do irmão, Fernando, elaborar uma
campanha de marketing. O objetivo principal era atrair contribuintes mensais
para o lugar e para isso era preciso divulgar o abrigo e mostrar que era uma
instituição séria. Já o Felipe, implantou na Carpe Vita, um evento em que o
ingresso para o acesso a casa noturna era feito através da doação de ração.

Usei ainda a influência do meu sogro para contratar empresas de


construção civil para melhorar a estrutura do local e propiciar um ambiente
mais acolhedor para os animais. E o resultado desse trabalho conjunto foi um
abrigo repaginado e com uma nova identidade social: Amigos da Yasmin. Essa
foi a forma que eu encontrei de homenagear a mulher que o amou tanto e que
tinha sido o primeiro amor do homem que eu amo. Eu só esperava que ele
lidasse bem com a surpresa.

— Antes de descermos do carro... Eu preciso que você me prometa uma


coisa — desliguei o carro e encarei o Alexandre.

— O que houve? — indagou, sem entender.

— Promete para mim que não vai fugir.

— Gabriela, o que está acontecendo?

— Só promete... — Pedi, segurando a sua mão.

— Eu não irei a nenhum lugar sem você! — Ele acariciou minha mão e eu
enxerguei verdade em seu olhar.

— Eu te amo — declarei e ele sorriu.

Assim que descemos do carro, Alexandre começou a ter noção do lugar


que estávamos. O muro da frente, antes chapiscado por cimento, agora era
coberto por porcelanato e letras douradas formam o nome Amigos da Yasmin.
Parados junto a entrada estavam os seus pais, Marcos juntamente com o Felipe
e as crianças, os pais da Yasmin e os voluntários do abrigo, todos vestindo a
nova camiseta com o nome do espaço. Alexandre, que segurava a minha mão,
apertou-a com força e eu temi o que estaria por vir, temi que ele se perdesse
mais uma vez em lembranças dolorosas e tristes.

Antes de dar outro passo para frente, ele me encarou e fez meu coração
disparar.

— Você é foda — demorei alguns segundos para absorver a informação


— Você é foda, mulher! — repetiu sorrindo.

— Acho que chegou nossa hora de vestir a camisa — Mari e Gui


aproximaram-se com as camisas em mãos, eu as pego.

— Não precisava ter feito nada disso... — sua voz falhou.

— Não mesmo, mas eu quis fazer. Por nós — minha voz também falhou
— foi a forma que encontrei de demonstrar o quanto eu amo cada parte de
quem você é... O seu passado e o homem que se tornou — uma lágrima escapou
dos meus olhos e ele a enxugou delicadamente.

— Se não tivéssemos olhares atentos sobre nós eu choraria junto a você,


mas tenho que manter a minha masculinidade — ele sorriu enxugando uma
lágrima solitária.

— Meu bobo machista — depositei um selinho nos seus lábios — Vem!


— segurei a sua mão — Quero te apresentar cada parte desse lugar, temos um
centro cirúrgico... — segui animada em direção a entrada.

Não sei quem era mais criança ali, se a Mari e o Gui que estavam com
olhos vidrados em tantos cachorros e gatos, ou o Felipe e o Marcos que se
divertiam enquanto alimentam os filhotes. O Alex e o pai da Yasmin conversam
animadamente em um lado oposto, enquanto Vilma e a mãe da Yasmin ajudam a
alimentar os filhotes de gato.

Alexandre era o mais entusiasmado ali, conversava animadamente com


os voluntários enquanto eu observava tudo, afastada. E sem que eu tivesse
controle, lágrimas de felicidade escaparam dos meus olhos. Estava feliz em ver
o Alexandre sorrindo e animado com o abrigo e ainda mais em saber a
dimensão daquilo tudo, do quanto era importante para ele estar diante da
realização de um dos últimos pedidos da Yasmin.

— Gabriela? — Uma voz feminina me retirou do meu torpor e eu logo


tratei de enxugar as lágrimas — Posso dar uma palavrinha com você?

— Claro! — assenti e caminhamos para embaixo de uma árvore de


tronco grande, sentando no banco ali disposto.

— Quando Vilma me ligou contando sobre o abrigo eu tive uma vontade


imediata de te conhecer pessoalmente... Eu queria agradecer em nome da minha
família por essa ideia, mais do que isso, eu queria agradecer como mãe por
preservar a memória da minha filha.

— Não há pelo que agradecer — neguei com a cabeça — fiz isso de


coração.

— Eu sei — ela sorriu — e é por isso mesmo que eu estou aqui, para
dizer que estou imensamente feliz em saber que o Alexandre abriu seu coração
para o amor e encontrou em você seu porto seguro — um nó se formou na
minha garganta e eu pisquei diversas vezes para não chorar — eu tenho um
presente de casamento para você em nome da Yasmin, ela escreveu assim que
soube da doença... — a mulher me estendeu um envelope amarelado pelo
tempo. — Ela queria que a eleita do Alexandre recebesse esse bilhete, eu achei
que morreria e não entregaria a ninguém — ela sorriu e me juntei a sua risada.

— Aconteceu algo, amor? — Alexandre aproximou-se.

— Não — neguei segurando firme o envelope.

— Estava dizendo o quanto a sua esposa é uma mulher incrível — ela


disse antes de se afastar.

— Você está se sentindo bem? — Alê indagou, preocupado.

— A Yasmin deixou isso — apontei para o envelope e vi o


reconhecimento surgir nos seus olhos enquanto ele percorria a letra cursiva —
Quer ler junto comigo? — meu pedido saiu fraco e a sua resposta veio em um
abraço, ele passou as mãos sobre meus ombros e eu me senti protegida.
Abri o envelope com as mãos trêmulas e meu coração parou, e voltou a
bater com toda intensidade quando li a primeira linha:

Espero que nesse momento o seu sorriso seja maior que o meu. Sorria
abertamente e grite para os quatros cantos o quanto você é uma mulher de
sorte. Sabe por que eu sei disso? Porque eu sorrio a cada vez que lembro da
sorte que foi ter o Alexandre em minha vida.

Você adquiriu um imóvel valiosíssimo, o coração do Alê. E como boa


inquilina você deve manter o imóvel em bom estado. Para isso, comece
jogando tudo que não serve mais, limpe as estantes empoeiradas,
desengavete tudo que não o faça sorrir... Alexandre tem um sorriso lindo, e
por teimosa, ele não presenteia o mundo com esse sorriso boa parte do
tempo. Agora que já limpou o imóvel, comece a organizar a bagunça da
mudança, tenha paciência Alexandre às vezes tem um temperamento difícil,
mas em grande parte do tempo é um homem de um coração gigante, um
bom amigo, um bom filho e um exímio namorado. Agora que você entrou na
casa, não pense em abandoná-la. Não desista da casa, só por que ela possui
algumas rachaduras, faça pequenos consertos, confie em mim, valerá a
pena.

Agora é a hora de redecorar! Traga cor, a casa ficou muito tempo


fechada e precisa de luz. Aumente o som e cante alto para espantar o
silencio da solidão. Substitua as fotos dos porta-retratos, encha-os de
momentos felizes. Sorria sempre e principalmente quando não tiver
vontade. O riso é um excelente restaurador de rachaduras.

Estamos quase na reta final, o imóvel já foi limpo, redecorado, e


agora precisa ser desfrutado. Compartilhe com os amigos esse momento e
ao fim da noite quando estiver perdida em seus pensamentos sorria, pois
você fez desse coração o seu lar.

Eu já não conseguia conter as lágrimas que caiam nublando a minha


visão e molhando o papel.

Alexandre, se ela for tão incrível quanto eu acho que será, você está
lendo isso. Eu estou muito feliz em saber que você se permitiu ser morada
novamente. Estou mais feliz ainda em saber que você encontrou alguém que
te ama na mesma intensidade que você ama! Imagino que tenha demorado
um pouquinho para se deixar levar — um pouquinho? Ele já é quase um vovô
— disse alto fazendo o meu marido sorrir — mas você conseguiu conquistar a
moça. Por falar nela, que sorte a dela ter você! Tirando os seus ciúmes
bobos, as suas inquietudes e as cagadas costumeiras, você é um excelente
partido no fim das contas.

— Leu isso amor? Eu sou um excelente marido! — ele pontuou sorrindo.

Mas se ela tem sorte, imagina você? Se ela aturou todo o combo que é
amar um Fragoso e permaneceu ao seu lado é por que ela é fantástica. Nada
menos que isso. Por isso, trate-a muito bem, seja companheiro, leal, gentil,
doce, amigo, amante, confidente... Seja o melhor para ela.

Cara senhora Fragoso sejam felizes e que os dias de vocês sejam


repletos de sorrisos.

Com amor, Yasmin.

Finalizei a leitura aos prantos e fui consolada pelo Alexandre que me


mantinha aninhada em seus braços. Permanecemos em silêncio abraçados um
ao outro.

— Eu gostaria de ter conhecido a Yasmin... — disse, um tempo depois.

— Ela era incrível... Assim como você é — beijou minha testa — Eu não
namoro menos que isso — ele fez graça para aliviar o clima.

— Eu tenho um presente para você — afastei-me do seu abraço para


pegar a minha bolsa, lá havia duas caixas, retirei apenas a caixinha vermelha.
— Além disso tudo aqui? Saiba que você é o meu melhor presente.

— Isso é cafona! — sorri.

— O amor é cafona — deu de ombros, sorrindo.

— Você me disse que quando eu estivesse certa dos meus sentimentos,


eu deveria confessar e permitir que as nossas alianças voltassem para o lugar
de onde nunca deveriam ter saído. Eu não sei o que o futuro nos espera, mas
quero estar ao seu lado pelo maior tempo possível. Por isso, mandei elaborar
um novo acordo, cheio de cláusulas novas — deslizei a aliança no seu dedo —
Eu te amo, senhor Burnier.

— A eternidade será pouco para te amar, senhora Fragoso — ele colocou


a aliança no meu dedo — eu também tenho um presente, ia te dar como se deve,
mas... — ele levantou a camisa e eu quase caí para trás com o que vi. —— Diz
alguma coisa Gabi!

— Você é louco! — foi o que eu consegui dizer ao passar os dedos sobre


a tinta preta, ainda cicatrizando em sua pele. Na lateral do corpo, do lado oposto
ao da minha tatuagem, mas quase na mesma altura e posição ele tatuou a frase:

Enquanto houver vida, serei seu.

E logo abaixo dela, em algarismos romanos a data do nosso casamento


em Las Vegas.

— Completamente louco por você! — ele sorriu — Ao ponto de fazer


minha primeira tatuagem depois de quarenta anos de vida. Doeu pra cacete! —
gargalhei — Desde que você entrou, de maneira definitiva, na minha vida não
houve um só dia que eu não pensasse em você. Você está eternizada na minha
pele e no meu coração.

— A tatuagem é covardia, vou ter que escrever seu nome na minha testa
para retribuir isso!
— Vai ficar lindo... — ele analisou minha testa.

— Nem sonhe, era piada! Mas sabe que minha mente está pensando em
maneiras bem safadas de retribuir isso.

— Muitas maneiras?

— Todas — aproximei-me para sussurrar em seu ouvido. — Pode me


comer de todas as maneiras que quiser.

— Porra, sabe que vou te deixar sem sentar direito amanhã, não sabe?

— Espero que sim!

— Já fizemos tudo que tínhamos para fazer aqui. Vamos para casa!

— Hum, temos que almoçar com todo mundo... Acalma esse pau —
pisquei.

— Vou fodê-la em todos os lugares que puder imaginar só por causa da


espera.

— Estou começando a achar que vou querer experimentar todas as


sobremesas...

— Gabi... — avisou, mas eu já estava de pé, pronta para me juntar aos


outros.

— Vamos logo, tiozinho.

Ele cumpriu o que prometeu e me fodeu de todas as maneiras que pôde,


incansavelmente. Acordei sentindo as minhas pernas doerem e eu realmente
mal podia sentar, mas a sensação de ter sido invadida de maneira tão gostosa
me fazia querer de novo e de novo.

Sexo anal não era problema para mim, mas não era algo que eu fazia com
frequência justamente porque, mesmo com todo o prazer, causava certo
desconforto. Eu havia provocado tanto o meu marido, que ele me comeu sem
dó, de quatro no chão do nosso quarto. E eu adorei cada segundo.

— Mantenha suas mãos longe de mim, seu ogro — disse assim que saí do
banheiro.

— Se você ainda está andando, não fiz direito — mostrei o dedo do meio
para ele. — Tá tão ruim assim? — ele sentou preocupado.

— Só estou dolorida, é só me fazer massagem e manter o seu pau longe


de mim por algumas horas que ficarei bem.

— Vou pegar um comprimido para você...

— Hum, acho melhor não tomar nenhuma medicação sem prescrição


médica.

— É só um relaxante muscular.

— Mesmo assim... Eu ia te dar mais um presente ontem, mas imaginei


que se eu te dissesse, você não cumpriria o que prometeu e íamos ficar apenas
no "papai e mamãe".

— Nada do que me dissesse faria com que eu te desejasse menos, amor.

Andei até a minha bolsa que estava sobre a poltrona e retirei dela a
segunda caixa de presente. Entreguei ao Alê, que permanecia sentado na cama,
e mantive-me de pé, ansiosa.

— Outro presente? Estou me saindo realmente bem como marido! — ele


abriu a caixa comprida, preta e me olhou confuso — um charuto?

— Os Burnier costumam comemorar com um charuto a chegada de um


novo membro.

— Isso quer dizer que... — ele gaguejou — É o que estou pensando? —


indagou com um sorriso aberto.

— Se você for o homem inteligente que eu acho que é, está pensando que
o nosso acordo agora tem uma cláusula vitalícia.
— Você está grávida?

— Sim! — ele olhou para minha barriga, ainda negativa.

— Eu vou ser pai? Vamos ter uma criança correndo pela sala? Será que
eu serei um bom pai? Será que saberei educar uma criança? — enquanto ele
pirava, eu continuava de pé, esperando ele absorver a notícia que havia me
tirado do eixo um dia atrás.

As dúvidas também pairavam sobre sim, eu não sabia se saberia ser mãe,
não tinha a menor ideia de como seria gerar uma vida...

— Será que você vai me abraçar ou já serei trocada pelo bebê? — sorri.
Ele levantou da cama em um pulo e me abraçou forte, girando comigo em seu
colo. — Estou com medo — admiti.

— Hic et nunc! — ele disse ao depositar meu corpo com carinho na cama.
— Estarei ao lado de vocês dois em cada segundo da minha vida. Me esforçarei
para ser o melhor pai e marido do mundo e se ainda não bastar, vou me
reinventar por vocês.

— Eu amo você e tudo que é capaz de me fazer sentir e viver. Obrigada


por ter me escolhido para fazer parte do sfeu acordo — sorri, acariciando seu
rosto.

— Você foi a minha melhor escolha. Enquanto houver vida, serei seu —
ele repetiu a frase que eternizou em sua pele.

— Não há vida sem você, Alexandre.

A vida não vem com um manual. Até existem alguns roteiros


estabelecidos, mas cabe a nós decidir se seremos apenas atores ou também
autores da nossa existência. Viver o "aqui e agora" e deixar que a vida nos guie,
às vezes é necessário.

Minha história é um belo exemplo disso, começou com um mero acordo,


que eu nem lembrava de ter aceitado, e se transformou em algo que ultrapassou
as linhas do papel, transcendeu a materialidade e alcançou a minha alma.
O amor se multiplicava e agora crescia dentro de mim.
Meu marido nunca vai deixar de ser possessivo. Morro de pena da
pobre Antonella e dos seus namorados que sofrerão bastante com o tiozinho
careta. Quando nossa filha começar a namorar, provavelmente o Alexandre
estará mais para vôzinho do que para tiozinho. Sorrio com esse pensamento.

— O que é tão engraçado, esposa? — ele perguntou ao chegar em casa,


depois de uma segunda-feira normal de trabalho.

Eu estava no chão da sala, junto com a nossa filha de dois anos. O chão
estava repleto de brinquedos e a Tv estava ligada passando um desses musicais
chatos pra caralho que toda mãe precisa suportar por causa dos filhos.

— Estava pensando no tamanho da gaiola de ouro que você vai construir


para tentar prender a Tonton — respondi quando ele já havia tirado o sapato e
se jogado sobre o tapete, atraindo toda a atenção da garota de olhos claros.

— Nem me fale, eu sofro todos os dias pensando em quais artimanhas


você usará para me persuadir a deixar nossa bebê livre — gargalhei.
— Vou mesmo. Lembrando que ela não será um bebê para sempre e os
gatinhos vão cair aos pés dela com esses olhos!

— Assim como caiam aos seus?

— Ainda caem, meu amor. A diferença é que sou bem servida em casa —
ele gargalhou alto.

— Se essa frase fosse minha, era machismo.

— Por isso não a repita — dei de ombros. — Por falar nisso, não esqueci
que você está me enrolando desde a minha gravidez...

— Não sei do que você está falando — ele se faz de desentendido e se


vira para fazer cócegas em Antonella que se contorce rindo.

— Vamos para a Carpe hoje? — tentei outro método — Vou como cliente,
hoje é segunda. É bem mais tranquilo.

Ele me encarou sabendo exatamente o que estava nas entrelinhas. Desde


que fomos a Spicy, a boate extremamente quente e eu dei a deixa para que de
vez em quando incluíssemos outras pessoas no nosso sexo, já havíamos
conversado algumas vezes. Durante a minha gravidez ele pediu para que eu
esquecesse tal desejo e assim o fiz. Depois veio o resguardo. As noites
amamentando. E várias outras coisas de casal com filhos que nos impedia de ter
uma noite inteira apenas para nós dois. Cheguei a conversar com a Fernanda
para saber quando isso melhorava, eu sentia saudades de quando minha única
preocupação era sobre posições sexuais. Minha amiga não havia me
tranquilizado nem um pouco, afinal filho é para sempre e mesmo quando
estivessem maiores, correriam para nossa cama com medo da chuva ou do
bicho-papão embaixo da cama. Mas é claro que existiam as babás para quando
precisássemos sair em uma noite de casal. E era exatamente o que eu faria
hoje a noite.

— Hoje? — ele ergueu uma das sobrancelhas.

— Hoje — confirmei já empolgada.

A Antonella saiu do colo do pai e se jogou no meu, rindo e chamando


“mamãe”, dispersando meus pensamentos pecaminosos por alguns segundos.

Antes de tomar banho e me preparar para sair, liguei para o meu sócio e
sugeri que ele convidasse a esposa para ir a boate. Avisei que eu levaria o
Alexandre e que poderíamos estender a noite. Ele ficou surpreso e animado,
afirmando que avisaria a Aline assim que eu desligasse. Eu desliguei e antes que
ele tivesse tempo de discar para ela, digitei rapidamente no WhatsApp:

Amiga, é hoje! ;)

O clima na Carpe Vita dia de segunda era tranquilo. Tínhamos mantido


esse dia temático. Por isso mesmo era o dia ideal para que eu e o Felipe nos
ausentássemos mais cedo, deixando o Vinícius na direção. Enquanto estávamos
lá, eu e a Aline tomamos um drink leve, enquanto o Alê bebericava Whisky e
conversávamos tranquilamente sobre todos os assuntos. Às 22h, chamei o
Felipe para que ele passasse as pendências para o Vinícius, afinal no dia
seguinte a Aline e o Alexandre trabalhariam cedo.

Seguimos cada casal em um carro, eu dirigi até um motel luxuoso na


zona sul, solicitando um quarto para quatro pessoas. Aquele lugar tinha quartos
para sexo em grupos maiores que nosso quarteto, mas optei pelo combo básico:
cama grande, espelhos, bar e banheira. Afinal, era a primeira vez em que
estaríamos juntos nesse número. Quando a coisa se repetisse, coisa que eu
esperava, percorreríamos os ambientes temáticos.

Estacionei o carro na garagem privativa, meu sócio parou bem ao meu


lado. Segurando o Alexandre pela mão, entramos no quarto enorme.

— Vai precisar de uma bebida forte, Aline? — perguntei ao andar até o


pequeno bar no canto.

— Não, meu desejo é suficiente para embriagar a nós todos.


— Talvez eu precise de uma bebida — Alexandre disse ao encarar o
Felipe.

— Não farei nada que você não queira — meu sócio respondeu com um
sorriso cínico.

— Mantenha-se longe de mim — rosnou Alê.

— Teremos que estabelecer regras, Gabi? — Aline me olhou apreensiva


enquanto eu entregava um copo de Whisky ao Alexandre.

— A única regra é essa: não passe vontade. Somos adultos, estamos aqui
porque queremos e nos respeitamos. O que acontecer aqui, fica entre nós.

— Ouviu Alexandre? Relaxe cara, até parece que é a primeira vez que faz
sexo em grupo — Felipe disse virando o copo que eu acabava de lhe entregar.
Pelo visto ele não estava tão relaxado quando gostaria.

— Dividindo a minha mulher é mesmo — bufou.

— Essa parte também é nova para mim, pelo menos dividi-la com um
homem — ele me deu um sorriso cúmplice, com certeza lembrando
do ménage que fizemos em seu aniversário.

A simples lembrança da transa fez meu corpo acordar. E, nesse contexto,


a maneira mais simples de fazer os homens deixarem de pensar era agir “em
dupla”. Aline me encarou, como se pudesse ler os meus pensamentos, e sorriu,
cúmplice. Em silêncio, ela levantou da poltrona que havia sentado e andamos
até a cama grande, no meio do quarto. O silêncio pairou sobre a suíte. Eu podia
sentir a tensão crescer como se fôssemos nos enfrentar, mas o melhor de tudo
era que a tensão não partia da Aline. A mudança nela era notável. Ao contrário
da primeira vez em que estivemos nessa situação, ela exalava confiança e
controle. Ela tomou a iniciativa de despir a sua blusa pink, revelando um sutiã
de mesma cor. A peça com certeza tinha sido escolhida “a dedo” para a ocasião,
assemelhava-se a um cropped, era todo trabalhando em renda rosa e o bojo
fazia seus seios ficarem lindos, emoldurados em uma pintura que enchia os
olhos de quem via.
Eu usava um vestido preto, curto e rodado, que facilmente passei pelos
meus ombros e teatralmente joguei em cima do Alexandre, que não piscava
esperando nossos passos seguintes. Minha lingerie era preta, o sutiã meia taça e
sem alças sustentava os meus seios firmes. Já minha calcinha, minúscula e fio-
dental, não cobria nada e essa era exatamente a intenção de quem escolhia tal
peça.

Sorrimos antes de os nossos lábios se tocar, mas bastou encostá-los para


que a graça sumisse. Ela tomou a minha língua com sofreguidão, sorvendo-a
como se fosse a última gota de água do deserto. Minhas mãos foram para os
seus cabelos, correspondendo ao beijo profundamente, e as mãos dela
imediatamente baixaram meu sutiã. Apressadamente enfiou um bico duro na
boca, chupando fundo. Joguei a cabeça para trás dando vazão ao prazer que me
percorreu. Abri o fecho do seu sutiã pronta para retribuir o gesto, mas ela me
impediu, seguindo para o outro seio.

— Tudo bem, fique à vontade — sorri abrindo os braços, ao me deitar na


cama.

A língua da Aline rodopiou em meu seio e seguiu lambendo cada


centímetro de pele até a minha barrida. Beijou meu umbigo e seguiu até o cós
da minha calcinha preta. Ela não tirou a peça, beijou por cima do tecido já
molhado, para em seguida, afastar o suficiente para levar seu dedo a me tocar.

— Não sou muito paciente, Aline... — avisei e ouvi a risadinha dos dois
homens que me conheciam na cama.

— Vai precisar ser, Gabi. Não me negue o prazer de redescobrir o seu


corpo.

Quando eu pensei em responder, meu próprio gemido me calou. Ela


havia sugado meu clitóris enquanto me penetrava com dois dedos. Os gestos
foram repetidos até o meu coração acelerar, mas era cedo demais para gozar.

Fiz com que trocássemos de posição, deixando-a deitada com as costas


na cama.

— Temos sorte, nossos homens sabem chupar, mas tem coisas que só
uma mulher sabe sobre a outra — sussurrei em seu ouvido — eles não
precisam saber que somos melhores nisso — ela riu enquanto eu me
posicionava.

Livre-a da calcinha, deixando-a totalmente nua. Os cabelos escuros e


lisos contrastando com os lençóis brancos. Ela afastou as pernas, mas eu as
empurrei ainda mais, escancarando-as. Comecei devagar, provocando-a,
lambendo áreas totalmente desprezíveis ao redor da boceta. Aline se remexeu,
indicando que não era tão paciente quanto gostaria que eu fosse poucos
segundos atrás. Molhei toda a sua boceta com saliva antes de afastar os lábios e
enfiar apenas um dedo meu, com cuidado por causa das minhas unhas longas.
Um segundo dedo se juntou ao primeiro e iniciei um vai-e-vem torturante. A
ponta da minha língua trabalhou de um lado para o outro sobre o clitóris duro.
Eu a ouvi gemer como se estivesse sofrendo e isso fez surgir um sorriso em
minha boca.

O prazer podia ser agonizantemente prazeroso.

Mas eu não podia torturá-la para sempre. Por isso, meu xeque-mate veio
na inversão, minha grande e quente língua passou a fodê-la enquanto meu
polegar massageava, em círculos impiedosos, o centro do prazer. Ela se retorceu
tentando fugir, mas meu golpe fatal durou tempo o suficiente para fazê-la gritar
e estremecer sob a minha boca. Rolando para o lado em seguida, tentando se
recuperar do orgasmo.

— Filha da puta — e com essas três palavras, ditas pelo meu tão
centrado marido, sabia que ele estava exatamente onde eu precisava que ele
estivesse: nas minhas mãos. Pronto para aceitar qualquer coisa que eu
propusesse.

— Eu quero os dois — olhei do Alexandre para o Felipe. — Agora!

O meu sócio estava apenas de cueca quando eu proferi a frase, já o meu


marido estava vestido, mas estava se masturbando enquanto me via foder com
outra mulher. Puxei o Alê para cama e, com um beijo de língua, abri os botões de
sua camisa social. A calça nem precisava sair, o pau dele já estava de fora.
Deitei-o na cama e montei em seu corpo, posicionando seu pau na minha
boceta. Escorreguei sobre ele sentindo cada centímetro me penetrar. A cama
não se moveu quando o Felipe subiu, mas eu pude sentir sua presença antes
mesmo de sentir seus dedos percorrerem as minhas costas, parando na minha
bunda. Isso ficaria para depois, minha maior fantasia era ter o pau dos dois
dentro de mim e isso eu não deixaria de fazer por nada nesse mundo.

— Na boceta, Felipe — pedi baixinho no seu ouvido antes de me


posicionar.

Inclinei-me totalmente, quase deitando sobre o Alexandre, calando um


possível protesto com um beijo de tirar o fôlego. As mãos do meu marido
seguraram firme em meus seios, apertando em uma deliciosa punição enquanto
eu sentia uma das mãos do Felipe segurar minha bunda. A outra tentava
encaixar seu pau em minha boceta já ocupada.

Eu sentia minha expansão, milímetro a milímetro, enquanto ele entrava.


Felipe foi até o máximo, fazendo-me plena e louca. Ambos ficaram quietos,
aguardando eu me acostumar, mas era exatamente o contrário do que o meu
corpo pedia. Fui eu quem me movi, fazendo ambos saírem quase pela metade e
gemi com a sensação de perda. Eles entenderam o recado e me foderam de uma
vez. O Alê, embaixo de mim, mexia furiosamente seu quadril contra o meu,
apertando meus peitos. O Felipe segurou minha bunda com as duas mãos e fez o
que de melhor sabia: meter. Eu gritei alto ao ser tocada no fundo. Meu cabelo foi
puxado e eu praticamente tinha esquecido que éramos quatro, quando a Aline
segurou firme em minhas mexas loiras enquanto enfiava a língua na minha boca
e disputava, com a outra mão, o domínio sobre um dos meus seios.

A posição era uma delícia. A sensação de poder, então? Esplêndida. Mas


ainda não era assim que eu gozaria. Curti ao máximo até sentir que estava
sendo egoísta, aproveitando dos três sozinha. Olhei para o Felipe que sorriu ao
entender que bastava e saiu de dentro de mim, livrando-se da camisinha ao
puxar sua esposa para ficar de quatro.

— Vamos livrá-lo do restante das roupas, tio? — sussurrei na boca


do Alê, fazendo-o sorrir.
— Não gozou, né? Está fadada a esperar pelo toque do tiozinho, amor?

— O melhor do jantar é a sobremesa, não? — falei tirando sua calça junto


com a cueca. — Quero meu leite condensado — sorri maldosa, ao tocar seu
pau.

— Acha mesmo que eu vou gozar tão fácil? Minha esposa me disse que
sexo em grupo é sobre compartilhar. Vamos participar daquela festinha ali... —
indicou a Aline sendo fodida de quatro.

— Tudo bem... Não vai me deixar com ciúmes — dei de ombros.

A Aline assentiu quando ele fez menção de tocá-la e o meu


marido apalpou-lhe os seios, deitando na cama em seguida, para conseguir
sugá-los. A Aline abaixou um pouco o quadril, claramente desejando a boca dele
ali. Alexandre não se fez de rogado, escorregou seu corpo por baixo dela até
estar com a cara na altura da sua boceta. Eu não via, mas sabia exatamente
como ele faria: sugaria o clitóris como se sorvesse pequenas doses de uma
bebida cara. A Aline gemeu alto quando assim ele o fez e o Felipe a fodeu ainda
mais rápido, gemendo baixinho.

A cena realmente não me causou desconforto, o cheiro do prazer


preenchia o quarto, juntamente com os gemidos de cada um de nós. O sexo era
uma das mil maneiras de manifestações do amor e compartilhar amor nunca
poderia ser visto como algo errado, sujo ou imoral. Quanto a infidelidade e
traição há muito o que se discutir. Não critico quem ache que o que estamos
fazendo aqui seja infidelidade, uma vez que o “fazer sexo com pessoas
diferentes de seus cônjuges” seja a uma das definições para a palavra, mas
acredito que onde o respeito impera, não há traição. O que estava acontecendo
ali não envolvia deslealdade, tampouco enganação. Cada um sabia exatamente o
que estava fazendo, era um acordo de vontades e não havia mentiras. Não tinha
nenhum tipo de relação com qualquer um de nós quatro sermos livres para
foder com quem quisermos... Porque não era essa nossa intenção. E se fosse?
Ninguém, além dos envolvidos, teria nada com isso.

Sempre disse que o prazer me movia e que eu conseguia lidar muito bem
com ele, isso não mudou. E o que eu testemunhava agora entre o Alexandre, a
Aline e o Felipe me causava uma indescritível sensação. E ela só se intensificou
quando o meu marido me puxou para deitar ao lado da Aline, de costas na cama.
Os meninos ficaram de pé, no chão, entre as nossas pernas e como se tivessem
ensaiado nos penetraram ao mesmo tempo. Fechei os olhos ao sentir o pau
do Alê ir até o fundo. Meu marido segurou as minhas pernas, fazendo com que
elas ficassem em seus ombros, do jeito que sabia que eu adorava. E me fodeu.
Com força. Sem pena. E eu gritei com a intensidade dos golpes. Abri os olhos ao
ouvir os gritos da Aline, posicionada de lado, enquanto o Felipe socava dentro
dela em ritmo intenso.

Nossos olhares se encontraram e trocamos um sorriso cúmplice, nós


conseguimos uma das melhores fodas das nossas vidas. E tínhamos os melhores
e mais gatos maridos do mundo, sem a menor sombra de dúvida.

Repetimos a rodada, ora trocando os casais, ora interagindo nós quatro.


Passava das duas da manhã quando pagamos a conta e nos despedimos. Quando
chegamos em casa, fomos direto ao quarto da Antonella ver se estava tudo bem.
Nossa filha dormia tranquilamente. Ativamos a babá eletrônica e seguimos para
o nosso quarto.

Estava quase adormecendo na cama, quando tudo passou na minha


mente como trailer de filme. Hoje eu entendia completamente o que as minhas
amigas diziam sobre o amor. Desejava dividir com o Alê qualquer novidade
sobre o meu trabalho ou uma série nova. Sentia meu coração transbordar
quando ele chegava do trabalho e ia brincar com a nossa filha. Minha vida tinha
um sentido diferente desde o nascimento da Antonella. Com ela descobri que
era possível doar o meu corpo, a minha alma e todo o meu afeto. Aprendi a me
abrir, mas isso não me deixou vulnerável, ao contrário, fiquei anda mais forte.

Eu passei a agradecer o porre que tomei em Las Vegas e resultou em um


casamento arranjado. Não lamento os lugares para onde eu poderia ter ido se
as coisas fossem diferentes, estou onde gostaria de estar.

— Eu te amo, Alê — digo baixinho, para as sombras do quarto, sem a


intenção de acordá-lo.
— Enquanto houver vida serei seu, Gabi — ele respondeu, ainda estava
acordado.

Deitei sobre seu peito. Ele beijou o meu cabelo.

— Obrigada por se permitir hoje, foi incrível.

— Hic et nunc — ele recitou o lema tatuado em minha pele. — Obrigado


por não desistir de mim.

— Você vale a pena... Onde mais eu acharia um homem com tanta


experiência? Não frequento asilos! — joguei e ele riu.

— No auge dos meus quarenta e dois anos, depois de uma noite de sexo
em grupo, vou fazer você engolir essa gracinha.

— Ah vai? Usando a bengala? — gargalhei quando ele prendeu meu


corpo embaixo do seu.

— Com certeza, vou usar minha bengala muitas e muitas vezes...

— Estou contando com isso.

Esse era o meu final feliz.

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