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Antecedentes
O clero era um dos estados que mais possuía privilégios. Esse estado formava um corpo
representado por uma Assembleia periódica, dotada de administração própria - agentes gerais do
clero, câmaras diocesanas - e provido de tribunais particulares, o provisorado. O chamado
Primeiro Estado não era obrigado a pagar impostos diretos ordinários, além de não depender
materialmente nem do Estado e nem dos fiéis, uma vez que recebia o dízimo de todos os produtos
da terra. Além disso, o clero também possuía o monopólio do ensino e da assistência e participava
da censura de tudo aquilo que se imprimia legalmente.[nota 1]
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O Segundo Estado, também conhecido como a nobreza, gozava de privilégios como o porte de
espada (privilégios honoríficos), a isenção de impostos (como a talha), a isenção da obrigação da
corveia nas estradas (dias de trabalho gratuito que os servos deviam ao seu senhor) e o alojamento
de soldados. Porém, ainda era menos favorecido que o primeiro estamento, pois não formava um
corpo e deveria pagar a capacitação e o vigésimo. No entanto, aquilo que diferenciava os nobres do
Terceiro Estado é o nascimento: a verdadeira nobreza vinha do berço. Assim, era por meio do
sangue que o nobre sustentava sua superioridade inaliável sobre o plebeu ignóbil, sendo o
casamento desigual considerado uma mácula indelével.[2]
Existia também uma outra nobreza que se contrapunha a essa nobreza de espada: a chamada
nobreza de toga. O rei podia enobrecer alguns indivíduos - os seus servidores - os recompensando
por meio de um título pessoal, que após certo tempo de exercício da função tornava-se
transmissível. Essa prática surgiu por volta dos séculos XVI e XVII, em que, para obter dinheiro, o
rei passou a vender funções públicas - sobretudo as judiciais, mas também as financeiras,
militares, administrativas e municipais - e dessa forma, passou a enobrecer esses cargos ou offices
para elevar o preço. Composta em sua maioria por burgueses, a nobreza de toga durante muito
tempo foi menosprezada pelos nobres de espada. Geralmente, devido a tradição familiar, o
membros da nobreza de toga sabiam administrar e aumentar seu patrimônio, diferentemente da
nobreza de espada.[nota 2]
Quanto ao Terceiro Estado, não há especificamente uma classe de cidadãos que possa o definir. O
historiador inglês Eric Hobsbawm chama de Terceiro Estado uma “entidade fictícia destinada a
representar todos os que não eram nobres nem membros do clero”.[3] O Antigo Regime, de certa
forma, confundia no Terceiro Estado todos os plebeus, do mais rico dos burgueses ao mais
miserável dos mendigos, ou seja, 96% da nação francesa daquela época, conforme o abade
Emmanuel Joseph Sieyès.[2] Essas três ordens compunham os Estados Gerais que eram
convocados pelo Rei para se reunir em uma Assembleia quando ocorria algum problema dentro do
reino, ou quando desejava ouvir a opinião desses.
Os Estados Gerais não se reuniam desde de 1614, porém após problemas financeiros devido ao
apoio à Independência das treze colônias americanas e também aos altos gastos do reino, sob
muitos impasses entre os parlamentares sobre como e para quem deveria ser cobrado os impostos
para cobrir o déficit, em 8 de agosto de 1788 o Rei concordou em convocar os Estados Gerais para
discutir a respeito.
Jogo da Péla
Ainda assim, nesse lugar pobre, os deputados reuniram-se e iniciaram a sessão. Michelet reflete
sobre esse acontecimento de maneira sintetizada e emblemática: “E era preferível assim, a
Assembleia foi pobre, e nesse dia representou tanto mais o povo. Permaneceu em pé durante todo
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o dia, mal tendo um banco de madeira… Foi como a manjedoura para a nova religião, seu estábulo
de Belém”.[nota 4]
Então, no Jogo da Péla, os deputados juraram jamais se separarem para consolidar a nova
Constituição da França.[6]
[1]
Partido monarquiano: esse grupo representava uma classe política de centro, defendendo os
interesses que iam desde os privilegiados aos populares. Os monarquistas, influenciados pela
política do economista suíço Jacques Necker,[14] defendiam uma monarquia constitucional - ideia
também defendida por alguns moderados, entre eles o conde Mirabeau - com uma legislatura
bicameral baseada no sistema inglês, com Câmara Alta e Câmara Baixa. [nota 8] Esse grupo tinha
entre seus grandes representantes na Assembleia: o advogado Jean Joseph Mounier, Gérard de
Lally-Tollendal, o marquês de Lally-Tollendal, o visconde de Clermont-Tonnerre e Pierre-Victor
Malouet, o barão de Malouet.[15]
Medidas tomadas
Após a Queda da Bastilha, uma onda de pânico em massa atinge os campos e se espalha
rapidamente para as grandes regiões do país, o chamado "Grande Medo" (Grande Peur), ocorrido
entre os meses de julho e agosto de 1789.
Ainda em agosto, a Revolução adquire seu manifesto formal: a Declaração dos Direitos do Homem
e do Cidadão, que, dentre os seus 17 artigos, proclama o direito à igualdade perante a lei, à
liberdade, à propriedade e o direito de resistir à opressão. Com caráter liberal e iluminista, a
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Na época, a crise econômica da França gerou uma mobilização popular que instaurou pânico em
todo país, devido às reações violentas em protesto, principalmente do campesinato. Invasões de
castelos, queima de documentos senhoriais, saqueamentos e ataques a órgãos políticos, fizeram
parte do Grande Medo, o que exigiu uma manobra dos deputados para contenção da população.
" Os proprietários dos feudos, das terras senhoriais, não são senão raramente
culpados dos excessos dos quais se queixam seus vassalos. Mas seus homens de
negócios são, freqüentemente, sem piedade, e o infeliz cultivador, submisso à sobra
bárbara das leis feudais que ainda subsistem na França, geme com a opressão da
qual é vítima. Esses direitos, não podemos dissimulá-lo, são uma propriedade, e
toda propriedade é sagrada. Mas são onerosos aos povos, e todo o mundo concorda
que representam para eles um malestar continuo. "
[17]
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A gravura expõe a
continuidade dos dízimos
feudais, no qual um
Assegurados dos seus interesses, os deputados, portanto,
trabalhador rural mostra um
proclamaram a abolição do feudalismo.
saco de dinheiro para um
Entretanto, a princípio a proclamação era apenas aparente e os membro do clero que rejeita
com a mão direita, mas aceita
decretos não foram redigidos naquela noite. Datado de 5 a 11 de
com a mão esquerda. Na noite
agosto, os decretos de agosto que definiam as decisões da abolição
de 4 de agosto de 1789 esses
dos direitos feudais e outros privilégios, deixavam claro o direito
privilégios feudais são
pelo resgate feudal, provendo os pagamentos referentes as
abolidos.
indenizações pela libertação da terra. Os principais aspectos do
feudalismo foram extintos, todavia na parte econômica e jurídica
houve apenas modificações. Para os camponeses, que continuaram
as revoltas até 1793, os decretos representaram uma decepção ao endividá-los, já que a multa
rescisória sobre as propriedades recaía sobre eles.
A Constituição Civil do Clero foi a tentativa de criar uma instituição religiosa fiel à Revolução,
reformando profundamente a Igreja Católica francesa. A Carta Magna foi base para a integração da
Igreja no novo sistema político introduzido pela Revolução de 1789. O conjunto de decretos era
composto por quatro partes dedicadas aos cargos eclesiásticos, ao pagamento dos religiosos e a
outras questões práticas. As circunscrições das dioceses foram adaptadas às novas unidades
estatais dos Departamentos, cada um destes correspondendo a um bispado.[19]
No dia 26 de dezembro de 1790, o Rei Luis XVI aprovou a lei que transformou clérigos em
funcionários públicos. Bispos e padres passaram a ser eleitos pelo povo e pagos pelo Estado. As
eleições episcopais transcorriam no nível dos Departamentos, as dos padres, em nível comunal. Os
capítulos eclesiásticos foram abolidos e substituídos pelos chamados conselhos episcopais. As
ordens de Roma passavam pelo controle dos revolucionários, o que fez com que os laços entre a
sede da Igreja Católica e França se enfraquecessem.
A Constituição causou uma fratura duradoura na França, ao aprofundar o efeito da Lei sobre a
Abolição das Ordens Monásticas, de 13 de fevereiro do mesmo ano. Essa suprimira 100 mil
membros do clero não ligados a uma paróquia, ou seja, os quase três quintos da classe
considerados, na época, "não úteis". Os critérios de utilidade eram os sacramentos e o zelo das
almas, assim como serviços à educação e às obras de caridade.
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A religião tinha um grande papel como promotora da ordem moral e social, mas tal não foi
reconhecida pelos revolucionários, inspirados, afinal, no Iluminismo. O projeto anti-eclesiástico
ganhou forma ao longo da Revolução, conforme apareciam dificuldades financeiras e de
implementação do novo modelo político, quando a Igreja se apresentou como um obstáculo à
autonomia do Estado francês e uma fonte de patrimônios. A supressão do dízimo ao clero e o
confisco dos seus bens eram medidas do Estado revolucionário para saldar contas e compensar os
heróis da Revolução.[21]
Fuga do Rei
[9]
Com a Assembleia Constituinte instaurada, iniciou-se uma grande reforma liberal na França,
principal objetivo da burguesia moderada. A proposta da Constituição de 1791 era de uma
Monarquia Constitucional, moderada, conservadora não contemplava uma ampla democracia.[9]
[nota 9]
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Com a tentativa frustrada da fuga do Rei, algumas Imagem que ilustra o retorno da família real a
consequências decorreram na sequência da Revolução: Paris em 25 de junho de 1791. Autoria de
os republicanos radicalizaram a revolução. O Rei perde Jean Duplessis-Bertaux, 1791.
o direito de suas funções à lealdade do seu povo. Além
disso, aliado com uma incontrolada flutuação de preço
dos alimentos, impactando diretamente aos mais pobres, agrava-se um ambiente de guerra na
França. Com a repercussão da prisão do Rei, outras monarquias, temendo uma difusão da
revolução em outras partes da Europa, empenham-se em restaurar o antigo regime francês e a
volta do Rei ao trono.[nota 11]
Em 3 de dezembro do mesmo ano foi decretado que o Rei Luís XVI fosse julgado, sob acusação de
conspiração contra a liberdade e de atentar contra o Estado. Em 11 de dezembro iniciou-se o
julgamento, na qual Luis XVI foi responsabilizado em 35 acusações.[nota 14] O Rei foi proclamado
culpado e em 21 de janeiro de 1793 foi executado na guilhotina.[nota 15]
Dissolução da Assembleia
Depois de dois anos de atuação, a Assembleia Nacional Constituinte finalmente termina de redigir
a constituição, após inúmeras correções, adições e eliminações. Jacques Guillaume Thouret, que
era presidente da presente Assembleia, lê a versão final da Constituição para os deputados no dia 2
de Setembro de 1791, que foi aceita e será apresentada ao rei Luís XVI no dia seguinte.
Somente no dia 13 de setembro, 10 dias após a apresentação oficial da Constituição, o Rei concedeu
uma resposta ao Ministro da Justiça declarando sua aceitação, e no dia 15 de setembro a
constituição aceita foi levada de volta à Assembleia.[23] Houve algumas contestações quanto à real
vontade do rei de assinar a Constituição, além de terem surgido alguns conservadores contrários a
essa aceitação. Para evitar qualquer tipo de protesto, a Assembleia aprovou alguns artigos
proibindo indivíduos que se mostraram contrários à Constituição, de cumprirem deveres
especificados pela mesma. De qualquer maneira, o objetivo da Assembleia fora concluído com essa
aceitação por parte de Luís XVI.
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No dia 30 de setembro de 1791, Luís XVI proclama seu discurso em público, se comprometendo
com a Constituição, recebe um tributo na cidade de Paris, onde é ovacionado e assim, a Assembleia
Nacional Constituinte dá por encerrada suas atividades. Thouret declara que a missão da mesma
fora concluída, encerrando assim suas sessões:
"A Assembleia Constituinte anuncia que sua missão foi cumprida e que suas sessões
estão agora encerradas."
— Jacques Guillaume Thouret [24]
Com o fim da Assembleia Nacional, a Assembleia Legislativa veio como uma espécie de sucessora,
apesar de não possuir um elo de continuidade, pois o corpo da Assembleia Legislativa era
totalmente diferente ao da Assembleia Nacional Constituinte, devido às eleições e a
impossibilidade de reeleição dos membros.
Constituição de 1791
[1]
No período, a França enfrentava uma crise financeira grave e, apesar do seu caráter liberal, o
objetivo era preservar os interesses econômicos da burguesia e retirar poderes do clero, através do
confisco de terras da Igreja pelo Estado. [nota 16] Como forma de retribuição, promulgou-se a
“Constituição Civil do Clero” que remunerava os membros do clero como funcionários públicos,
porém desconsiderava grande parte do poder clerical. Ao final, a Igreja acabou por se tornar
oposição e ajudar o Rei na fuga em junho de 1791.[9]
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1788
8 de Agosto: O Rei concorda em convocar os Estados Gerais, que não se reuniam desde
1614.
21 de Setembro: O Parlamento de Paris recomenda que os Estados Gerais adotem os
mesmos procedimentos de 1614.[26]
1789
5 de Maio: Início das atividades dos Estados Gerais em Versalhes.
17 de Junho: O Terceiro Estado decide intitular-se Assembleia Nacional.
20 de Junho: O Rei tenta impedir a reunião da Assembleia Nacional
11 de Julho: O Rei demite seu popular ministro, Jacques Necker.
14 de Julho: Queda da Bastilha.
4 de Agosto: Foi abolido o feudalismo da França.
26 de Agosto: Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
5-6 de Outubro: “Dias de Outubro”, quando uma multidão marcha de Paris a Versalhes para
trazer a família real de volta à capital.
1790
13 de Fevereiro: Supressão das Ordens Monásticas.
12 de Julho: Constituição Civil do Clero.
14 de Julho: Festival da Federação em comemoração ao dia da Bastilha.
24 de Agosto: A Constituição Civil foi promulgada.
27 de Novembro: Decreto exige juramento de lealdade do clero.
26 de Dezembro: O Rei Luís XVI aprovou a lei que transformou clérigos em funcionários
públicos.
1791
4 de Janeiro: Os deputados do clero reunidos na Assembleia juraram a Constituição Civil.
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Notas
1. Lefèbvre, 2011, p. 43-44.
2. LEFEBVRE, 2011, p. 46-47.
3. MICHELET, 1989, p. 120.
4. MICHELET, 1989, p. 121.
5. HOBSBAWM, 1996, p. 26.
6. VOVELLE, 2012, p. 27.
7. MIGNET, 1826, p. 177.
8. VOVELLE, 2012, p. 130.
9. HOBSBAWM, 1996, p. 31.
10. HOBSBAWM, 1996, p. 32.
11. HOBSBAWM, 1996, p. 33.
12. PRICE, 2007, p. 346.
13. HOBSBAWM, 1996, p. 35.
14. PRICE, 2007, p. 337.
15. PRICE, 2007, p. 346.
16. VOLVELLE 2007, p. 27.
Referências
1. VOVELLE, Michel. A Revolução Francesa (1789-1799). Tradução de Mariano Echolor. 1. ed.
São Paulo: Editoro Unesp, 2012. ISBN 978-85-393-0263-5.
2. LEFEBVRE, Georges. 1789. O surgimento da Revolução Francesa. 2ª edição. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 2011.
3. HOBSBAWM, Eric. A era das revoluções. 39.ª edição. Rio de Janeiro/SãoPaulo: Paz e Terra,
2017.
4. SIEYÈS, Emmanuel-Joseph. Qu’est ce que le Tiers-État? Troisième édition. 1789. Disponível
em: <https://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k97743407/f181.item>. Acesso em 31 de out. de
2019.
5. SEWELL, William Hamilton. A Rhetoric of Bourgeois Revolution: The Abbé Sieyes and What is
the Third Estate?. Duke University Press, 1994.
6. MICHELET, Jules. História da Revolução Francesa: da queda da Bastilha à festa da
Federação. São Paulo: Companhia das Letras: Círculo do Livro, 1989.
7. Lefebvre, Georges (2008). O surgimento da revolução francesa. São Paulo: Paz e Terra
8. TACKETT, Timothy. Becoming a Revolutionary: The Deputies of the French National Assembly
and the Emergence of a Revolutionary Culture (1789–1790). Princeton: Princeton University
Press. 1996.
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