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UP5 PFFH 2023-24 – Patofisiologia e farmacologia das arritmias

FISIOPATOLOGÍA DOS TRASTORNOS DA FREQUENCIA E DO RITMO


CARDÍACOS

O músculo cardíaco é único por ser capaz de gerar e conduzir rapidamente seus próprios impulsos elétricos
ou potenciais de ação. Esses potenciais de ação resultam na excitação das fibras musculares por todo o
miocárdio. Assim, a formação e a condução do impulso resultam em correntes elétricas fracas que se
espalham pelo coração. São esses impulsos que são registados com eletrocardiograma (ECG). Assim, as
arritmias são alterações no ritmo normal do coração devidos a problemas na geração ou transmissão de
impulsos elétricos neste órgão.
As alterações patológicas do ritmo cardíaco criam atividade desordenada do coração, o que interfere com o
funcionamento normal do miocárdio. Existe uma diversidade de arritmias, que podem variar entre leves, como
os ritmos anormais ocasionais, até serias anomalias que prejudicam gravemente a função do coração e que
podem provocar sérios perigos para a vida das pessoas.

Em certas áreas do coração, existem células miocárdicas especializadas que constituem o sistema de
condução do impulso. Essas células especializadas possuem a capacidade de autoexcitação que è capaz de
iniciar e conduzir os impulsos e, assim mantém a eficiência do bombeamento do coração. As células
especializadas geram impulsos, como um marcapassos natural, e o tecido de condução transmite esses
impulsos rapidamente e de forma seuqencial através de todo o coração. As células musculares cardíacas
também conseguem transmitir os impulsos, mas com uma velocidade de transmisao que é inferior à das
células do sistema de condução. Devido a essas propriedades do sistema de condução, este é o que
normalmente controla o ritmo cardíaco.
Para conhecer em que consistem as arritmias é necessário conhecer o funcionamento do sistema de
condução de impulsos no coração. As células especializadas que geram automatismo, denominadas células
marcapasos, geram potencias de acção rítmicos (regulares) em ausência de estímulos externos. Assim
coração tem duas propriedades intrínsecas:
a) O automatismo, pois consegue iniciar a sua própria atividade contráctil;
b) O ritmo, pois contrai periodicamente.
Como mostra a figura 1.1, apenas algumas células, localizadas em estruturas chamadas de nós, são capazes
de iniciar despolarizações espontaneamente. Estas células são cardiomiócitos especializados na condução
do impulso, embora também podem contrair muito fracamente em comparação com as células contráteis
cardíacas.
O nó sino-auricular ou sinusal (NSA), localizado na área de contato entre a aurícula direita e a veia cava
superior, constitui o marca-passos fisiológico, pois é a parte que gera impulsos rítmicos mais rapidamente.
Assim o impulso de cada batimento inicia no NSA, que gera os estímulos que são propagados para a aurícula,
que contrai, e também para o nó auriculoventricular (NAV).

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Figura 1.1. Sistema de excito-condução cardíaco (Adaptado de Peate I, Fundamentals of applied


pathophysiology. 2018).

O NAV está localizado na região do septo interventricular, em uma área adjacente à válvula tricúspide. Do
NAV, o impulso é transmitido para o feixe de His, que atravessa o septo interventricular e se bifurca em dois
ramos principais (esquerdo e direito). Por sua vez, o ramo esquerdo se bifurca em duas subdivisões
principais. Todos os ramos do feixe de His são seguidos pelas fibras de Purkinje, que entram em contato com
o tecido do miocárdio ventricular transmitindo o impulso e provocando a contração ventricular.
Depois que uma célula ou grupo de células dentro do coração é estimulado eletricamente, segue-se um breve
período em que essas células não podem ser novamente excitadas. Este período é conhecido como período
refratário. Pode ocorrer que, à medida que a frente da onda elétrica desce pelo sistema de condução, o
impulso eventualmente pode encontrar tecido refratário à estimulação (recentemente excitado) e,
subsequentemente, o impulso finaliza neste nível. Após, é preciso ocorrer a condução de um novo impulso,
gerado no NSA.
O NSA é uma zona ricamente irrigada e também é enervada pelo sistema nervoso autônomo. Assim, embora
o NSA gera, independentemente do sistema nervoso, os impulsos que promovem a frequência cardíaca, o
sistema nervoso autónomo pode controlar o grau do automatismo do NSA (revisar bibliografia da UP2). O
suprimento nervoso origina-se do centro cardioregulatório na medula oblonga que está situada no tronco
encefálico. Assim, os nervos do sistema simpático aumentam a frequência cardíaca e os do parassimpático
(vago) diminuem a frequência cardíaca, pois ambos inervam o coração (nós e musculo). Neste sentido, outros
fatores, como o stress, a idade, e a temperatura corporal, o balanço eletrolítico, a volemia e o oxigénio em
sangue, influenciam a frequência cardíaca através do sistema nervoso
O automatismo é uma propriedade especial das células do NSA e do NAV. O automatismo é devido a que as
células especializadas se despolarizam espontaneamente.

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As células têm um potencial de repouso, provocado pelas diferentes concentrações de iões fora e dentro das
células, o que foi garantido pela ação de transportadores de iões. As membranas celulares também possuem
canais específicos para iões Na(+), Ca(2+), K(+) ou Cl(-), os quais permitem a sua movimentação, de forma
que podem provocar mudanças no potencial de membrana, os quais se podem transformar num potencial de
ação transmembranar (PAT).

Figura 1.2. Variações do potencial de ação em dois tipos de células cardíacas.

As células do NSA não têm realmente um potencial de repouso pois o potencial de membrana varia
constantemente entre valores de aproximadamente -60mV até valores ligeiramente acima de 0mV.
Realmente ocorrem três fases diferentes nestas células (figura 1.2, parte direita), devidas a movimentos de
iões através da membrana.
- Fase 4 de despolarização espontânea - Despolarização espontânea, em que a voltagem começa a
aumentar lentamente, devido principalmente à entrada de Na(+) [I(Na)] e à entrada de Ca(2+) através
dos canais tipo T [l(Ca,T)], embora também há uma contribuição devida à diminuição da saída de K(+)
através dos canais de potássio tipo funny [I(Kf)];
- Fase 0 de despolarização rápida – quando a despolarização lenta da fase 4 atinge valores de -40mV,
são ativados os canais de Ca(2+) tipo L [l(Ca,L)] e ocorre uma despolarização rápida;
- Fase 3 de repolarização – quando na fase anterior o PAT atinge valores positivos, fecham os l(Ca,L) e
são ativados os canais de potássio dependentes de voltagem [I(K)];que permitem a saída de potássio
e o potencial de membrana volta aos valores iniciais da fase 4.
Em repouso, estas fases ocorrem e repetem-se aproximadamente cada segundo. A despolarização inicial
destas células é lenta, quando comparamos com o que ocorre em células musculares, como analisaremos
posteriormente, motivo pelo qual são denominados de potenciais lentos.

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Figura 1.3. Variações do potencial de ação em diferentes células cardíacas (adaptação de


Ganong WF. Review of Medical Physiology. McGraw-Hill, 2005).

As células musculares e de Purkinge possuem um conjunto de canais iónicos diferentes as que têm as células
do NSA, sendo que têm um potencial de repouso de aproximadamente -90mV. Quando o impulso
despolarizador das células marca-passos chega a uma célula cardíaca, esta sofre uma despolarização. Isto
também pode ocorrer se o impulso despolarizador vem de uma célula muscular vizinha. A figura 1.2 mostra,
no lado esquerdo, a variação do potencial de ação transmembranar nos cardiomiócitos ventriculares:

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- Fase 0 – Ocorre uma despolarização rápida, que envolve aumento do potencial de repouso devido à
entrada rápida de Na(+) na célula [I(Na)], o que faz com que o potencial de membrana atinja valores
positivos;
- Fase 1 – A despolarização provoca ativação de canais l(Ca,L), a inativação da corrente de sódio [I(Na)]
e a ativação de uma corrente transitória de K(+) para o exterior da célula [I(Kto)];
- Fase 2 de plateau - Devida à que o equilíbrio entre a atividade dos l(Ca,L) e a dos canais de K(+) que
provoca uma fase de plateau;
- Fase 3 – A leve repolarização da fase anterior fecha os l(Ca,L) e a saída de K(+) pelos I(K) provoca uma
maior repolarização;
- Fase 4 de descanso elétrico – Os canais de potássio fecham e ainda há trocas de Na(+) (que sai) por
K(+) (que entra) mediadas por uma ATPase-Na/K e o potencial volta a estado de repouso.

P01_A. O que é a frequência cardíaca? Qual a origem dos impulsos e as vias de condução?
P01_B. Quais os tipos de células existentes no coração que participam na ocorrência e
regulação da frequência e força de contração?
P01_C. Explique os acontecimentos que ocorrem no potencial de ação das células do NSA;
P01_D. Explique os acontecimentos que ocorrem no potencial de ação nos cardiomiócitos
ventriculares
P01_E. Explique a figura 1.3 da bibliografia

A morfologia do potencial de ação, nas diferentes células cardíacas, varia entre os dois modelos mostrados
anteriormente, existentes nas células do NSA e nas células ventriculares (Figura 1.3). Por outro lado, durante
o ciclo cardíaco, a condução do impulso faz com que a fase de despolarização seja sequencial, com uma
diferença de milissegundos. Assim, por exemplo, a despolarização das células de Purkinje começa 150ms
mais tarde do que a das células do NSA e as do ventrículo esquerdo 400ms mais tarde (Figura 1.3). A
composição temporal de todas as formas de PAT do coração dá origem ao perfil do eletrocardiograma (ECG)
(Figura 1.3).
Em realidade, as células marca-passo estão presentes no NSA, NAV e no sistema His-Purkinje. No coração
humano, a taxa normal de descarga do NSA está entre 60 e 100 batimentos por minuto (bpm) e os outros
marca-passos subsidiários descarregam em taxas mais lentas. Assim, os marca-passos subsidiários são
geralmente latentes e redefinidos pelo marca-passo dominante com a maior taxa intrínseca de descarga, ou
seja, o NSA.
Por outro lado, como referido anteriormente, o sistema nervoso autónomo influencia a formação e condução
dos estímulos, uma vez que o simpático aumenta a frequência e a condutividade, enquanto o parassimpático
os diminui.
As células do feixe de His e seus ramos, as fibras de Purkinje, assim como certas fibras auriculares com uma
organização estrutural especial, têm uma propriedade chamada condutividade, isto é, os estímulos viajam
através deles mais rapidamente que no miocárdio contrátil. Esta facilidade na condução é devida ao arranjo
particular de junções estreitas (formadas por proteínas chamadas conexões) que facilitam a transmissão de
impulsos. Assim, nas células do NSA e do NAV, as junções estreitas são escassas e dispersas, o que explica,

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em parte, o atraso na condução dos estímulos. No entanto, nas células do sistema His-Purkinje, as junções
são abundantes e distribuídas por toda a superfície celular. Finalmente, nas células auriculares e
ventriculares, as junções estreitas estão localizadas nas extremidades das células e são escassas nas
regiões laterais. Deve ser notado que o atraso na condução de estímulos no NAV permite o enchimento dos
ventrículos antes de serem excitados.

As arritmias refletem distúrbios na geração e/ou na transmissão de impulsos cardíacos e podem ser
desencadeadas por múltiplas causas. No geral, são devidos a “focos ectópicos”, que provocam a geração de
impulsos anormais, ou a “impulsos de reentrada”, que provocam uma anormal condução dos impulsos. Assim
do ponto de vista fisiopatológico, as arritmias podem ser classificadas por:
a) Distúrbios do automatismo;
b) Anomalias da condução dos estímulos;
c) A soma dos mecanismos anteriores (“a” e “b”).
As causas mais importantes destes distúrbios ou anomalias são: isquemia miocárdica, alterações físico-
químicas ao nível do coração (em particular, hipoxemia, acidose, distúrbios de K(+) e Ca(2+)), alterações
provocadas pelo sistema nervoso autónomo (SNA) e/ou pelo aumento de catecolaminas, efeitos de agentes
tóxicos (exemplo - intoxicação por digitálicos), defeitos hereditários (exemplo - síndromes de alongamento do
intervalo QT), e fenômenos autoimunes (exemplo - autoanticorpos contra alguns canais iônicos).

TRASTORNOS DO AUTOMATISMO
Como já referido, o SNA é capaz de regular ao automatismo cardíaco, de facto o sistema simpático provoca
um aumento e o parassimpático provoca uma diminuição do automatismo do sistema de geração de impulsos.
Assim, excessiva ativação simpática ou parassimpática pode causar arritmias, que normalmente consistem
em aumento ou diminuição da frequência, devido ao aumento ou diminuição do automatismo normal.
Por outro lado, em certas condições outras partes do miocárdio podem passar a gerar impulsos anormais
que começam a exercer a função de marca-passos e de controlo do ritmo cardíaco. Se esses estímulos são
gerados de forma não sincrónica ou com mais frequência do que os impulsos normais, um foco ectópico
aparece. Isto pode dar origem a depolarizações cardíacas prematuras que alteram a condução normal e que
entram em conflito com os impulsos originados pelo NSA.
Assim, os focos ectópicos são locais que originam impulsos anormais no coração (fora do NSA). Os focos
ectópicos podem ocorrer nas aurículas ou nos ventrículos. Às vezes, os focos ectópicos podem surgir como
resultado de situações não fisiológicas, como em caso de hipoxia ou de hipopotassemia.
Finalmente podem ocorrer pós-despolarizações ou pós-potenciais, que impulsos que surgem
espontaneamente durante ou após a repolarização (fases 3 e 4 do potencial de ação) (Figura 1.4). Estes
podem ser devidos a correntes de entrada de cálcio (fase 3) ou sódio (início da fase 4) anormais, podendo
ocorrer principalmente quando há alterações hidro-eletrolíticas. Os pós-potenciais são os responsáveis pela
taquicardia do tipo “torsades de pointes”, arritmia maligna que acontece devido ao prolongamento do intervalo
QT causado por medicamentos.

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Figura 1.4. Fenómenos de pós-despolarização (PDP).

Os pós-potenciais tardios aparecem após a célula ter atingido a repolarização total e são devidos ao aumento
do Ca(2+) intracelular. Uma das principais causas de pós-despolarizações tardias são os fármacos digitálicos
em doses tóxicas. Sabe-se que estes fármacos inibem a ATPase-Na/K, provocando acúmulo de Na(+) na
célula que, por sua vez, aumenta a liberação de Ca(2+) do retículo sarcoplasmático.

P01_F. Indique duas condições fisiológicas em que muda a frequência cardíaca? Explique
porque muda.
P01_G. Como pode mudar o automatismo cardíaco normal?
P01_H. Como pode ocorrer a aparição de um automatismo anormal?
P01_I. Quais as possíveis causas do aparecimento de um foco ectópico?
P01_J. Explique a figura 1.4.

PROBLEMAS NO SITEMA DE CONDUÇÃO DO IMPULSO


Normalmente, os impulsos gerados no NSA são transmitidos às diferentes zonas do coração de forma
sequencial, sendo que umas células são despolarizadas após as vizinhas, mas um impulso não pode circular
para atingir células que vêm de ser despolarizadas previamente.
Assim, os impulsos elétricos devem seguir um caminho preciso para funcionar adequadamente. Qualquer
interrupção da transmissão normal dos impulsos pode resultar em arritmia.
Em condições patológicas, os impulsos elétricos podem não ser transmitidos normalmente, aumentando a
probabilidade de arritmia.
Neste sentido, o desenvolvimento de arritmia pode ocorrer devido a:
- Redução do suprimento de sangue para o coração (circulação coronária) que pode alterar a capacidade
conduzir impulsos elétricos pelas células;
- Danificação ou destruição do tecido cardíaco, pois se uma parte do tecido cardíaco estiver danificado,
pode ser afetada a forma como os impulsos elétricos são transmitidos.
As alterações na estrutura do coração podem ser causadas por:
- Doença arterial coronária. É quando as artérias coronárias, que irrigam o músculo cardíaco, não aportam
suficiente quantidade de sangue, muitas vezes resultando em um ataque cardíaco (parte do músculo
cardíaco morre devido à falta de fluxo sanguíneo). Esta situação pode causar cicatrizes no tecido cardíaco.

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O tecido cardíaco com cicatrizes interfere com o movimento adequado dos impulsos elétricos que fazem
o coração funcionar adequadamente. Nesta situação, o coração pode bater rápido demais (taquicardia
ventricular) ou de forma irregular (fibrilação ventricular);
- Cardiomiopatia ou doença do miocárdio (músculo cardíaco) - as paredes dos ventrículos podem ser
modificadas na sua estrutura e a eficiência do bombeamento de sangue do coração é afetada;
- Doenças valvulares - se as válvulas cardíacas se afunilarem ou vazarem, o músculo cardíaco pode esticar
e engrossar e há um risco significativo de desenvolver arritmia.
As principais razões para os distúrbios na condução do impulso são os bloqueios da transmissão e os ritmos
da reentrada.

Bloqueio
No geral podem acontecer bloqueios na transmissão devido a alterações estruturais (dano ou necrose em
um local da zona de condução), podendo ocorrer:
a) Aumento absoluto do período refratário, de tal forma que a célula não é capaz de ser excitada e o
impulso não é transmitido para as células vizinhas;
b) As células adotam o tipo de resposta lenta na evolução do PAT, o que atrasa a condução do impulso;
c) A fragmentação dos estímulos, devido a uma condução não homogénea; deste modo, a dispersão faz
a transmissão inefetiva.

Reentrada ou reingresso
Durante ritmo sinusal normal, o impulso elétrico despolariza as aurículas e ventrículos sequencialmente, e
após todas as regiões terem sido ativadas, os tecidos encontram-se em período refratário absoluto, e o
referido impulso se extingue. Posteriormente, um novo impulso deve ser formado para que o processo se
repita.
Em condições patológicas, as células das aurículas ou dos ventrículos podem ser reativadas pelo mesmo
impulso após o término do período refratário, e tal reativação é denominada de reentrada ou excitação
reentrante. Estos são casos particulares de distúrbios de condução que muito frequente desencadeiam
arritmias. A reentrada significa que um estímulo circula pelo miocárdio através de um caminho anormal e
circular, e pode circular indefinidamente.
A Figura 1.5 ilustra quatro painéis nos quais um único feixe (S) de fibras cardíacas (células) é dividido em
dois ramos (L e R). Também existe um feixe celular conector (C), podendo ocorrer quatro situações
diferentes:
A) O impulso que chega por S divide-se en L y R. Parte circula para abaixo e outra parte encontra-se no
ponto C, em sentidos opostos e anulam-se. O restante impulso continua en sentido descendente por
L e R.

B) Existem dois bloqueios, um em cada ramo e o impulso não continua en sentido descendente por
nenhum dos ramos.
C) Existe um bloqueio bidirecional no ramo R e os impulsos que lá chegam não conseguem retroceder
em sentido oposto. Os outros impulsos continuam em sentido descendente.

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D) Existe um bloqueio unidirecional em R, o impulso que chega da parte superior por R e que não avança
por este ramo, mas avança por S, parte do impulso passa por C e ao ingressar em R de forma
ascendente, fá-lo em sentido contrario ao que deveria ser. Estamos perante uma situação de
“reingresso” em sentido contrário.

Figura 1.5 - Mecanismos dos bloqueios

Assim, no painel "D" e no ramo R, pode ocorrer a coexistência de um impulso inicial num sentido e um impulso
retrógrado. Essa coexistência depende da redução do período refratário e da condução lenta, de modo que
a reentrada ocorre, porque se ambos os impulsos não coexistirem ao mesmo tempo, em cujo caso se
anulariam.
O painel E mostra um exemplo de uma reentrada global entre aurículas e ventrículos que pode envolver vias
de condução acessórias (“bypass tracts") como o “Bundle of Kent” que é uma estrutura muscular que
atravessa a estrutura fibrosa aurículo-ventricular e fornece uma conexão acessória direta entre as aurículas
e os ventrículos.

P01_K. Quais as mudanças estruturais que podem provocar arritmia?


P01_L. O que é um bloqueio?
P01_M. O que é uma reentrada ou reingresso?

As arritmias são geralmente divididas, dependendo da localização, em ventriculares e supraventriculares (por


cima dos ventrículos). Também podem ser classificadas pela variação da frequência cardíaca, em taquicardia
(aumento da frequência), bradicardia (diminuição da frequência) ou fibrilação (frequência errática).

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Arritmias supraventriculares
São originadas nas aurículas ou nas vias auriculares de condução do sinal. Geralmente, são menos graves
que as ventriculares. As mais comuns e que frequentemente requerem tratamento farmacológico são a
fibrilação e flutter auriculares e as taquicardias paroxísticas supraventriculares. Outras arritmias
supraventriculares comuns que ordinariamente não requerem terapia medicamentosa incluem bradicardia e
taquicardia sinusais.

Taquicardia sinusal
Consiste no aumento do automatismo com elevação da frequência cardíaca (> 100 bpm e <150bpm), com
ondas P e PR normais (ECG). É devida a um aumento do número de estímulos provocados pelo NSA, o que
pode ser fisiológico, devido ao tônus simpático aumentado durante o exercício, ou patológico, devido à dor,
hipovolemia, isquemia ou outros distúrbios. Em geral, a taquicardia sinusal começa e termina gradualmente,
em contraste com outras taquicardias. Para o tratamento, deve-se identificar e tratar as causas primárias,
que podem ser ansiedade, exercício físico, febre, tireotoxicose, hipoxia, hipotensão arterial, pós-operatório
ou insuficiência cardíaca.

Figura 1.6 – ECG da taquicardia e bradicardia sinusal

Bradicardia sinusal
Consiste na depressão do automatismo sinusal (é inferior a 60 bpm), sendo a principal causa característica
o aumento do tônus parassimpático, que diminui a atividade do NSA. A diminuição da frequência cardíaca
pode causar um débito cardíaco diminuído, resultando em sintomas como tontura, tontura, hipotensão,
vertigem e síncope.
A bradicardia não é necessariamente problemática. Pessoas que praticam regularmente desporto podem ter
bradicardia sinusal, porque seus corações treinados podem bombear sangue suficiente em cada contração
para permitir uma baixa frequência cardíaca de repouso. A bradicardia sinusal também pode ser uma
vantagem adaptativa; por exemplo, os mergulhadores em grandes profundidades podem ter uma frequência
cardíaca de apenas 12 batidas por minuto, ajudando-as a economizar oxigênio durante longos mergulhos.

Fibrilação auricular e flutter auricular

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A fibrilação auricular é a arritmia mais frequente e é caracterizada por uma despolarização anárquica e rápida
da aurícula que originam contrações auriculares muito rápidas (superior a 400 bpm), descoordenadas e
absolutamente irregulares, com uma condução auriculoventricular variável e um pulso irregular (figura 1.7).
Os impulsos supraventriculares penetram no sistema de condução auriculoventricular em graus variáveis,
resultando em ativação irregular dos ventrículos e o pulso também irregular. O NAV não conduzirá a maioria
dos impulsos supraventriculares, fazendo com que a resposta ventricular seja consideravelmente mais lenta
do que a frequência auricular. Às vezes afirma-se que “a FA gera mais FA”, ou seja, a arritmia tende a
perpetuar-se.
Na maioria das vezes, os pacientes se queixam de taquicardia/palpitações, dor torácica, dispneia, tontura e
fadiga.
A fisiopatologia da fibrilação auricular permanece complexa, com coexistência de focos ectópicos rápidos e
tecido auricular remodelado capaz de manter arritmia por meio de circuitos de micro-reentrada (figura 1.8-A).
A causa principal da fibrilação auricular nos países ocidentais é a hipertensão arterial sistêmica.
O método de tratamento da fibrilação auricular é convertê-la em ritmo sinusal ou retardar a condução através
do NAV, diminuindo a frequência ventricular e melhorando o débito cardíaco, mesmo que o ritmo permaneça
anormal.

Figura 1.7 – ECG da fibrilação auricular e flutter auricular

Figura 1.8 - Fibrilação auricular e flutter auricular - As duas facetas da mesma anomalia do
miocárdio auricular. Parte A - Fibrilação auricular com múltiplos focos ectópicos, especialmente
ao redor das veias pulmonares e circuitos de micro-reentrada. Parte B - Flutter auricular com
circuito de macro-reentrada que gira no átrio direito.

O flutter auricular, menos frequente que a FA, é um distúrbio do ritmo semelhante a FA, mas com 250-400
bmp e com ativação auricular mais regular (figura 1.7). A fisiopatologia é caracterizada pela existência de um

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grande circuito de macro-reentrada que gira na aurícula direita, passando necessariamente pelo espaço entre
a veia cava inferior e a válvula tricúspide (figura 1.8-B).
Existem 2 complicações principais da fibrilação auricular e do flutter auricular:
- Embolias sistêmicas, em particular cerebrais, ligadas à formação de trombos na auricular esquerda. Assim,
cerca de 20% dos acidentes vasculares cerebrais em pessoas com mais de 80 anos estão relacionados
à fibrilação auricular
- Insuficiência cardíaca, que ocorre principalmente com doença cardíaca subjacente, como resultado da
diminuição do débito cardíaco por perda da sístole auricular e redução do enchimento ventricular (na
diástole) devido à taquicardia.
Normalmente o flutter é tratado com anti-trombóticos para evitar as embolias. Para tratamento das anomalias
do ritmo seria preferencial a amiodarona, mas devido aos efeitos secundários a longo prazo é usado
preferencialmente fármacos do grupo Ia e Ic, ou, se os doentes têm cardiomiopatia, do grupo II.

P01_N. Quais os tipos principais de arritmias supraventriculares com tratamento


farmacológico? Explique as diferenças.

Arritmias na junção
Uma taquicardia na junção é definida como qualquer taquicardia que envolve a junção auriculoventricular ou
o NAV no seu mecanismo causador.
As mais importantes são as taquicardias supraventriculares paroxísticas (TSP), com dois tipos principais: a
taquicardia auriculoventricular por reentrada intra-nodal (TRIN) e taquicardia auriculoventricular por via
acessória (síndrome de Wolff-Parkinson-White), na qual há uma duplicação da via de condução
auriculoventricular. permitindo a criação de um circuito de reentrada.

Taquicardia por reentrada intra-nodal (TRIN)


As TRIN são as mais frequentes afetam preferencialmente adultos de meia-idade (40-60 anos) sem
cardiopatias, predominando em mulheres (60%). A frequência ventricular pode variar de 110 a mais de 250
bpm. Pode ocorrer espontaneamente ou ser provocada por esforço, café, chá ou álcool. Os pacientes
geralmente toleram bem a crise; no entanto, seu início súbito pode precipitar falta de ar, tontura ou pulsações
no pescoço. O mecanismo dessa taquicardia é uma reentrada no NAV, possibilitada pela presença de duas
vias de condução com diferentes propriedades eletrofisiológicas (figura 1.9-A; figura 1.10-B).
Normalmente são tratadas com fármacos do grupo Ic, II III ou IV.

Taquicardias auriculoventriculares por via acessória


As taquicardias auriculoventriculares por via acessória são secundárias a uma anomalia congênita que ocorre
durante o desenvolvimento fetal, de forma que um feixe de fibras musculares permite a comunicação entre
uma aurícula e o ventrículo correspondente. Ocorrem en jovens adultos e são geralmente bem toleradas. No
entanto, são mais malignas que as TRIN, pois podem causar sincope e morte.

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Neste tipo de arritmias são gerados sinais elétricos que atingem os ventrículos muito rapidamente e os sinais
são enviados de volta para as aurículas (reentrada). Essa via pode levar em ambas as direções (anterógrada
e retrógrada), ou apenas em uma direção (figuras 1.9-B e C; figura 1.10-A).

Figura 1.9 - Taquicardias na junção: Taquicardia por reentrada intra-nodal (A); Taquicardia
retrógrada na via acessória (B); e taquicardia anterógrada na via acessória (C).

Figura 1.10 ECG da síndrome de Wolff-Parkinson-White (A) e da taquicardia por reentrada


intra-nodal (B).

Na síndrome de Wolff-Parkinson-White (SWPW), a condução viaja da aurícula para o ventrículo por duas
vias, o NAV e uma via acessória. A condução através da via acessória é mais rápida e o período refratário
nesta via é mais curto do que no NAV. O ECG geralmente mostra um intervalo PR encurtado (porque a via

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anormal conduz mais rapidamente das aurículas para os ventrículos do que o NAV), às vezes existe um
complexo QRS alargado com um movimento ascendente ou onda delta, devido à chegada do impulso em
parte do ventrículo, onde deve passar por miócitos ventriculares de condução lenta não especializados, em
vez de fibras de Purkinje especializadas.
Pode ser controlado com fármacos dos grupos Ia, Ic, II e III.

Taquicardia juncional não paroxistica


Outro ritmo é originado nos tecidos da junção é existe um ritmo acelerado que geralmente tem início e término
gradual. No entanto, pode ocorrer abruptamente se o NSA descer o número de impulsos. É observada com
maior frequência em indivíduos com doença cardíaca subjacente e também pode estar presente em pessoas
com toxicidade por drogas tipo digitálicos. Para o tratamento deve-se identificar e remover o agente causal.

P01_O. Quais os tipos principais de arritmias na junção? Explique as diferenças.

Arritmias ventriculares
As arritmias ventriculares comuns incluem extrassístoles ventriculares, a taquicardia ventricular e a fibrilação
ventricular. São arritmias que podem provocar uma ampla variedade de sintomas.
Os CPV geralmente não causam sintomas ou apenas palpitações leves. A taquicardia ventricular pode ser
uma situação de risco de vida associada a colapso hemodinâmico ou pode ser totalmente assintomática. A
fibrilação ventricular é uma emergência médica aguda que necessita de ressuscitação cardiopulmonar.

Extrassístoles ventriculares (ESV)


As ESV são contrações ventriculares prematuras quando o batimento cardíaco é iniciado pelas fibras de
Purkinje dos ventrículos e não pelo NSA. A ESV é caracterizada por um QRS largo (> 120 ms) e prematuro,
não precedido por uma onda P.
Geralmente não é motivo de alarme e não necessita de tratamento. No entanto, as ESV podem ser um sinal
de diminuição da oxigenação do músculo cardíaco, muitas vezes são benignas e podem até ser encontrados
em corações saudáveis. No entanto, em indivíduos com historial de problemas cardíacos, as ESV podem
estar na origem de arritmias mais graves.
Quando ocorre um batimento prematuro, geralmente ocorre uma breve pausa. A pessoa geralmente fica
ciente disso no batimento a seguir, que parece muito mais forte. Pode parecer uma vibração ou agitação, ou
como se seu coração tivesse perdido um batimento.

Taquicardia ventricular (TV)


A taquicardia ventricular implica a existência duma frequência cardíaca acelerada originada nos ventrículos.
Uma taquicardia ventricular (TV) é definida por mais de 3 ESV sucessivas. A TV se origina por um foco
ectópico abaixo da bifurcação do feixe de His. É uma taquicardia com mais de 120 bpm e que apresenta
períodos QRS longos. Pode estar ligado a um foco ectópico anormal ou a um fenômeno de reentrada local.
A taquicardia ventricular pode ocorrer devido a doença coronária, estenose aórtica, cardiomiopatia,
problemas eletrolíticos ou ataque cardíaco.

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Embora curtos períodos (segundos) de TV possam não resultar em problemas permanentes (tontura,
palpitações ou dor torácica), períodos mais longos são perigosos e pode resultar em fibrilação ventricular e
evoluir para paragem cardíaca.
Em caso de TV sustentada e mal tolerada, é necessária uma redução de emergência por choque elétrico
externo. Pode ser tratada por via intravenossa com fármacos do grupo Ic se os doentes não têm
cardiomiopatia, ou com fármacos do grupo III.
Para a prevenção de recidivas pode ser usado o verapamil ou diltiazem.

Torsade des Pointes


Trata-se de um tipo específico de taquicardia ventricular. O nome refere-se à polaridade do complexo QRS,
que varia de positivo para negativo e vice-versa. O ECG tem complexos QRS grandes, bizarros e
polimórficos, que variam muitas vezes entre batimentos em amplitude e direção, bem como na rotação dos
complexos ao redor da linha isoelétrica. A taxa de taquicardia é de 100 a 180, mas pode ser tão rápida quanto
200 a 300 por minuto. O ritmo é altamente instável e pode terminar em fibrilação ventricular ou reverter para
ritmo sinusal. Trata-se com sulfato de magnesio IV durante 1 a 2 minutos, correção da hipopotassemia,
marca-passos ou isoprenalina para aumentar la frequência cardíaca e corrigir la causa.

Figura 1.11 – ECG da taquicardia ventricular (A), da Torsade des pointes (B) e da fiblilação
ventricular (C).

Fibrilação ventricular (FV)


A FV é uma arritmia caracterizada por um batimento rápido e irregular nas aurículas e pela atividade elétrica
desordenada do ventrículo, sendo muito pouco volume de sangue é expelido, podendo ocorrer desmaio. É

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uma arritmia das mais graves e é fatal se não for revertida com um desfibrilador, sendo a causa comum de
paragem cardíaca.
Se ocorrer FV, é necessária atenção médica instantânea. Como anteriormente referido, muitas vezes é
precedida por uma arritmia ventricular muito rápida.
A FV pode ocorrer devido a doença coronária, cardiopatia valvular, cardiomiopatia, síndrome do QT longo ou
hemorragia intracraniana. O diagnóstico é feito por um ECG mostrando complexos QRS irregulares e
irregulares sem quaisquer ondas P claras.
Pensa-se que o mecanismo de fibrilação ventricular é a presença de múltiplos circuitos de reentrada, que se
originam, colidem, se extinguem-se e voltam a originar-se. Assim, existem diferentes impulsos iniciados ao
mesmo tempo de diferentes zonas que resultam em uma contração mais rápida, descoordenada (caótica)
que às vezes chega a 300bpm.
Trata-se com reanimação cardiopulmonar e com a prevenção de episódios posteriores com fármacos que
dependem da casuística do doente.

P01_P. Quais os tipos principais de arritmias ventriculares? Explique as diferenças.

Como as arritmias podem modificar a função do coração, órgão crucial para a circulação sanguínea, também
podem causar outros problemas cardiovasculares e gerais, principalmente se as arritmias se prolongam no
tempo.

Taquicardias
Na taquicardia intensa (> 150 bpm), a diminuição do tempo diastólico diminui o enchimento ventricular (pré-
carga) e, consequentemente, diminui o débito cardíaco. Outra consequência é o aumento da demanda
miocárdica de oxigênio, que pode causar angina, principalmente em indivíduos que também têm doença
coronária. Os estados de taquicardia crônica podem terminar em insuficiência cardíaca (Figura 1.12).

Bradicardias
Na bradicardia, o débito cardíaco e a pressão arterial diminuem, levando à perda abrupta e breve da
consciência e ao tônus postural (síncope) (Figura 1.12).

Fibrilação
A fibrilação auricular anula a contribuição das aurículas para o enchimento ventricular. En condições
fisiológicas, em ausência de patologia, esta contribuição é de 10% em repouso e aumenta para 40% em
exercício ou esforço. Assim, quando há fibrilação auricular não tem grandes consequências em repouso, mas
limita significativamente o volume de enchimento e o débito cardíaco durante o exercício. Isso pode causar
dispneia (falta de ar) e perfusão limitada no nível muscular que limitará a capacidade de se exercitar.

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Uma consequência importante da fibrilação auricular é o aumento do risco de formação de trombos nas
aurículas, os quais podem passar para a circulação pulmonar ou sistêmica e causar acidente vascular
cerebral ou embolia pulmonar.
A fibrilação ventricular conduz a uma grande diminuição do débito cardíaco que pode ser letal, portanto, o
ritmo normal deve ser restaurado para garantir a vida do indivíduo.

Figura 1.12. Consequências gerais das arritmias (adaptação de Castro del Pozo et al. Manual
de patología general Elsevier Masson,.2014)

P01_Q. Explique a figura 1.12

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FÁRMACOS ANTIARRÍTMICOS

Em um sentido teórico, os fármacos com atividade antiarrítmica (FAAr) alteram diretamente a condução de
várias maneiras:
a) Podem deprimir as propriedades automáticas das células marca-passo anormais. Pode fazer isto se
diminuir a inclinação da despolarização da fase 4 e/ou elevar o potencial limiar. Se a taxa de geração de
impulsos espontâneos dos focos anormais se tornar menor que a atividade do NSA, o ritmo cardíaco
normal é restaurado.
b) Podem alterar as características de condução das vias de um impulso de reentrada. Podem facilitar a
condução (diminuir o período refratário) na área do bloqueio unidirecional, permitindo ou fazendo
prevalecer uma via anterógrada normal. Por outro lado, um fármaco pode deprimir a condução (prolongar
o período refratário) na área do bloqueio unidirecional ou na via com condução lenta de uma via
retrógrada anormal, anulando esta via. Em ambos os casos, os fármacos reduzem a discordância e fazem
prevalecer a uniformidade nas propriedades de condução por supressão da reentrada.
c) Podem eliminar o impulso prematuro que desencadeia a reentrada;
d) Podem diminuir a velocidade de condução de uma via anormal a tal ponto que a condução é extinta;
e) Podem reverter a forma subjacente da doença cardíaca responsável pelas anormalidades de condução
que levaram à arritmia.
Os FAAr modificam a atividade elétrica do coração alterando as correntes iônicas nas células cardíacas de
forma direta ou indireta. A maioria dos fármacos antiarrítmicos atualmente disponíveis foi classificada em
quatro categorias, que são agrupadas com base nos seus efeitos sobre o potencial de ação cardíaco e,
consequentemente, sobre as propriedades eletrofisiológicas do coração. Para entender a base da
classificação e a farmacologia desses agentes, é necessária uma compreensão da eletrofisiologia cardíaca
normal.

Tabela 2-1. Resumo dos mecanismos dos fármacos antiarrítmicos. I(Na) = corrente através dos
canais de sódio; l(K) = corrente através dos canais de potássio; L(Ca,L) = corrente através dos
canais de cálcio tipo L; PAT= potencial de ação transmembranar; PRE = período refratário
efetivo; CV = velocidade de condução.
Mecanismo de ação Fármacos
Ia ▼l(Na); ▲PAT; ▲PRE; ▲intervalo QT Disopiramida
Ib ▼l(Na); ▼PAT; ▼PRE Lidocaina
Ic ▼l(Na); ▼velocidade de condução; Flecainida, Propafenona
Propranolol, esmolol, atenolol, metropolol,
II Inibidores e ativadores autónomos
digoxina, adenosina
III ▼l(K); prolongam PAT; ▲PRE Amiodarona, sotalol, vernacanant
IV ▼I(Ca,L); ▲PRE Verapamil, Diltiazem

A classificação mais empregada dos FAAr é a classificação de Vaughan-Williams. Embora esta classificação
tem grandes desvantagens, a sua facilidade de uso fez que ainda seja a mais utilizada. Uma grande falha
nesta classificação está na simplificação do efeito dos fármacos, já que a classificação depende do efeito que

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os agentes exercem sobre o tecido normal e sob condições arbitrárias. O outro problema é a sobreposição
dos efeitos de alguns dos fármacos, que faz que possam ser classificados em mais de um grupo. No entanto,
esta classificação tem sido adaptada recentemente, para incluir novos fármacos em usso ou a serem
investigados, o que será parcialmente refletido neste documento.

Figura 2-1. Efeitos dos fármacos antiarrítmicas de Classe I na duração do potencial de ação
ventricular e no ECG (Adaptado de “Basicmedical Key”. 2017).

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No geral, estes fármacos reduzem o automatismo cardíaco e diminuem a velocidade de condução.

CLASSE Ia
Estes FAAr provocam a inibição dos canais nos células das aurículas, ventrículos e das fibras de Purkinje.
Diminuem a velocidade de condução, diminuem a inclinação da fase 0 de despolarização, prolongam o
potencial de ação, aumentam o período refratário efetivo e diminuem as propriedades automáticas condução
dependente de Na(+) (Figura 2-1).
São usados para tratar taquicardias (supraventriculares ou ventriculares) devidas a reentrada ou a focos
ectópicos, o que envolve taquicardia sinusal, flutter e fibrilação auricular, e também taquicardias
supraventriculares (TRIN e SWPW). Não devem ser usados em pessoas com insuficiência cardíaca pois têm
efeito inotrópico negativo (diminuem a frequência cardíaca).

Disopiramida
A disopiramida está disponível nas formas oral e intravenosa e a sua administração diminui a excitabilidade
cardíaca. É usada no tratamento de taquicardias supraventriculares, de arritmias surgidas após
procedimentos cirúrgicos, como extrassístoles auriculares e ventriculares persistentes. Também é usado para
prevenir arritmias após enfarte.
A disopiramida provoca um efeito inotrópico negativo significativo no miocárdio ventricular, embora não tem
ação antagonista dos recetores adrenérgicos. Como resultado, o uso de disopiramida pode reduzir a força
contrátil até 42% em doses baixas e até 100% em doses mais altas, levando à insuficiência cardíaca. Deve
ser evitado em doentes com Torsade des Pointes ou prolongamento do intervalo QT.

CLASSE Ib
Estes FAAr provocam a inibição dos canais I(Na) nas células do ventrículos e das fibras de Purkinje, mas
não nas auriculares. Os fármacos da classe Ib ligam-se aos canais I(Na) e dissociam-se da ligação mais
rapidamente, motivo pelo qual têm um bom desempenho quando as células indicadas são
despolarizadas/estimuladas rapidamente, porque inibem de forma leve a fase 0, reduzem a amplitude do
potencial de ação e o período refratário. Assim, pensa-se que estes FAAr podem melhorar a condução,
eliminando a área de bloqueio unidirecional formada por células cardíacas danificadas. Os fármacos da
classe Ib não são FAAr muito potentes, têm efeitos mínimos sobre o tecido auricular, sendo usadas para
arritmias ventriculares e arritmias que ocorrem após isquemia e infarto agudo de miocárdio (Figura 2-1).

Lidocaina
A lidocaína é um anestésico local eficaz e usado clinicamente com este fim, topicamente para aliviar a coceira,
a queimação e a dor causada por inflamações da pele, e via injetável como anestésico local em odontologia
ou em pequenas cirurgias.
Ao nível cardíaco é usada por via intravenosa unicamente ao nível hospitalar para supressão de
extrassístoles ventriculares e taquicardia ventricular, especialmente depois de um infarto do miocárdio agudo.
A lidocaína é eficaz como antiarrítmico apenas quando administrada por via parenteral, sendo a via
intravenosa a mais comum. A atividade antiarrítmica não é observada após administração oral devido ao
metabolismo de primeira passagem rápido e eficiente pelo fígado.

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CLASSE 1c
Os fármacos da classe Ic inibem de forma pronunciada a fase 0 em células de Purkinje e em cardiomiócitos,
o que causa uma lentidão da condução em todo o tecido cardíaco, com um efeito mínimo na duração do
potencial de ação e no período refratário. Aumentam ligeiramente os intervalos QT e QRS (Figura 2-1).
Estes FAAr eliminam a reentrada diminuindo a condução até um ponto onde o impulso anormal é extinto e
não pode propagar-se mais. São usados para tratar taquicardias ventriculares que tendem a progredir para
fibrilação ventricular. Também são usadas para tratar arritmias refratárias a outros tratamentos. Por outro
lado, embora sejam eficazes tanto para arritmias ventriculares e supraventriculares, seu uso é limitado, devido
ao risco de provocar outras arritmias, principalmente em pessoas com doença isquémica cardíaca, pois
podem provocar morte súbita.

Tabela 2-2. Vias de administração, mecanismos e efeitos adversos (EA) dos fármacos
antiarrítmicos da classe 1. (Vent = ventricular)

FÁRMACO Via MECANISMO SNC CarVas Ar GI RESP Outros EA

Disopiramida OR, INJ ⛔I(Na) ▼FrCa ✅ Obs Anticolinérgico

Lidocaina INJ ⛔I(Na) Tont ✅

Flecainida OR, INJ ⛔I(Na) ▼FraEj Vent

Propafenona OR, INJ ⛔I(Na), Beta Tont ✅ Bra ✅ esp | Disp

Abreviaturas gerais das tabelas de efeitos adversos dos fármacos antiarrítmicos

= agonista SNC = Sist. Nervoso central CarVas = cardiovascular GI= Gastrointestinais

= Antagonista = Perturbações do sono; P = Problemas cardíacos Obs = Obstipação

OR = Via oral 😨= Cefaleia Ar = Arritmias cardíacas Na= Náuseas

INJ = Via injetável Tont = Tonturas FraEj= Fração de ejeção Vo = Vômitos

⛔ = Inibe RESP = Nível respiratório FrCa = Frequência cardíaca  = Diarreia


▼▲= Diminui, aumenta esp = Broncoespasmo Bra = Bradicardia P= prejuízo hepático

= Capacidade visual Tox = toxicidade pulmonar HipoT = Hipotensão IMU = Sist. imunológico

Disp = Dispneia HTA = Hipertensão arterial Der = Dermatite

Flecainida
A flecainida é utilizada via oral para tratar fibrilação e flutter auricular, SWPW e taquicardia ventricular grave
(IV).
O maior efeito está no sistema His-Purkinje e no miocárdio ventricular. O efeito da flecainida no miocárdio
ventricular causa diminuição da contratilidade do músculo, o que leva a uma diminuição da fração de ejeção.
O mais grave dos efeitos adversos é a tendência ocasional da flecainida para agravar as arritmias existentes
(Ex: Torsade des pointes) ou para induzir novas arritmias. Embora menos de 10% dos pacientes
experimentem esse efeito, ele pode ser fatal, pelo que é desejável iniciar a terapia a nível hospitalar. Não
deve ser usado em pacientes com doença cardíaca estrutural, como uma história de ataque cardíaco, ou
disfunção ventricular esquerda.

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Propafenona
A propafenona difere da flecainida porque tem atividade adicional como antagonista beta-adrenérgico que
pode causar bradicardia e broncospasmo.
É usada pela via oral ou intravenosa para tratar taquicardias supraventriculares (taquicardia sinusal, flutter e
fibrilação auricular, TRIN e SWPW).
Devido à sua curta semivida, requer dosagem duas ou três vezes ao dia para manter os níveis sanguíneos
estáveis.
Os efeitos colaterais atribuídos à propafenona incluem dispneia, desconforto gastrointestinal e distúrbios do
SNC, como tonturas, cefaleia e sonolência. Cerca de 20% dos pacientes interrompem o fármaco devido a
efeitos adversos.

P02_A. Expliquem o modo de ação dos fármacos antiarrítmicos dos grupos Ia, Ib e Ic (com
apoio da figura 2-1 e da tabela 2-1). Para que tipos de arritmias são usados? Quais os
principais efeitos adversos? Há contraindicações no seu uso?

Os fármacos antiarrítmicos classe II clássicos são os antagonistas beta-adrenérgicos (ABA) em células


auriculares, ventriculares, NSA e NAV. Como a estimulação destes recetores cardíacos pelo sistema
simpático provoca a apertura de canais I(Ca,L), os ABA provocam diminuição da entrada de Ca(2+) pelos
canais.
Em doses terapêuticas normais, os ABA diminuem a automaticidade induzida pelo sistema simpático devido
ao efeito no NSA e NAV. Em doses mais altas, estos fármacos também podem causar diminuição da
excitabilidade, diminuição da velocidade de condução e um período refratário efetivo prolongado, pois inibem
a fase 4 e prolongam a condução auriculoventricular (Figura 2-2). Também diminuem a demanda de oxigénio
pelo músculo cardíaco. Normalmente são usados em casos de fibrilação auricular, flutter auricular ou outro
tipo de taquicardia supraventricular. Também são usados no tratamento e na prevenção de arritmias em
pessoas que sofreram um infarto de miocárdio. O efeito dos ABA diminui a frequência das despolarizações
A Classe II foi aumentada para abranger outros fármacos com alvos noutros recetores do SNA, como os
recetores muscarínicos e recetores de adenosina.
Entre os efeitos adversos mais comuns dos ABA são elencados na tabela 2.2. O propranolol esta
contraindicado nos doentes com asma e/ou DPOC. Os ABA, não devem ser usados conjuntamente com os
bloqueadores de canais de cálcio pois podem provocar bloqueio da condução auriculoventricular.

Propranolol (também estudado no objetivo 5)


O propranolol é um ABA que é utilizado pela via oral no tratamento de flutter e fibrilação auricular, taquicardia
sinusal persistente, extrassístoles auriculares e extrassístoles ventriculares resistentes.
O propranolol também é efetivo no tratamento de arritmias ventriculares induzidas por digitálicos. Além disso,
é utilizado em muitas ocasiões em conjunto com outros agentes aumentando os efeitos benéficos, como por

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exemplo, em conjunto com nitratos para o controlo da angina (objetivo 5). Também é usado para tratar a
hipertensão.

Tabela 2-3. Vias de administração, mecanismos e efeitos adversos (EA) dos fármacos
antiarrítmicos da classe 2.

FÁRMACO Via MECANISMO SNC IMU 😨 CarVas GI Outros EA


Propranolol OR Beta Fadiga ✅ Bradi Na-Vo esp
Esmolol INJ Beta1 Fadiga ✅ ✅ HipoT Na-Vo
Metoprolol OR Beta1 Fadiga ✅ ✅ Bradi Na-Vo
Digoxina OR, INJ ⛔Na-K_ATPase Tont Der Ar♥ Na-Vo ▼
Adenosina INJ A(1) Tont ✅ Ar♥| HipoT Na esp | Disp

Figura 2-2. Efeitos dos antagonistas beta-adrenérgicos no ECG. (Osmosis, 2023)

Esmolol
O esmolol é um antagonista do recetor beta1, com duração de ação muito curta e ação rápida. É utilizado
para tratar TRIN, flutter e fibrilação auricular em emergências e em períodos pré- e pós-operatórios, e também
em alguns casos de taquicardia sinusal.

Metoprolol (também estudado nos objetivos 5 e 10)


As concentrações utilizadas, o metoprolol é um antagonista seletivo dos recetores beta1 usado para tratar
taquicardias supraventriculares, principalmente fibrilação e flutter auricular. Também para tratar hipertensão,
no tratamento e prevenção de enfarte agudo, e na profilaxia a longo prazo da angina de peito.

Digoxina (também estudado no objetivo 10)


O principal mecanismo de ação da digoxina envolve a inibição da ATPase-Na/K , principalmente no miocárdio,
resultando em um aumento do influxo de Ca(2+) e, portanto, um aumento da contração. Por este motivo é
também utilizada na insuficiência cardíaca congestiva (objetivo 10).
No entanto, o seu uso como fármaco antiarrítmico é devido aos seus efeitos parassimpáticos importantes,
particularmente no NAV, pois provoca uma diminuição da frequência cardíaca e da velocidade de condução.
De facto, a estimulação do nervo vago retarda a condução no NAV, aumentando o período refratário nos
cardiomiócitos. Sendo o NAV mais lento, isto permite que os ventrículos tenham mais tempo para encher
antes de voltar a contrair. Este efeito cronotrópico negativo é sinérgico com o efeito direto nas células de

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marca-passo cardíaco. O período refratário das aurículas e ventrículos é diminuído, enquanto aumenta no
NSA e NAV.
As alterações de ECG observadas em pessoas que tomam digoxina incluem aumento do intervalo PR (devido
à redução da condução AV) e um intervalo QT encurtado. Além disso, a onda T pode ser invertida e
acompanhada por depressão de ST.
A digoxina é principalmente usada para o tratamento de flutter e fibrilação auriculares crónicas. No entanto
tem uma janela terapêutica estreita, podendo ser tóxico provocando bloqueio aurículo ventricular.

Adenosina
A ativação de recetores de adenosina A1 no NSA provoca a depressão do automatismo gerado pelo NSA e
NAV. Os recetores A1 estão acoplados a uma G0, e quando ativados ocorre uma inibição dos I(Ca,L) e uma
ativação dos I(K) nas células dos nós, o que deprime a ação do NSA e diminui a frequência cardíaca e a
velocidade de condução. A ação da adenosina pode interromper os circuitos de reentrada envolvendo o NAV
e restaurar o ritmo sinusal normal em pacientes com taquicardias supraventriculares. Uma vez interrompido
o circuito, a taquicardia cessa e o ritmo sinusal normal é restabelecido.
A adenosina é usada em forma injetável ao nível unicamente hospitalar para tratar SWPW e TRIN. Deve ser
usado a nível hospitalar, pois pode provocar uma hipotensão grave e porque pode agravar outras patologias
cardiovasculares.
Não deve ser usada se existe síndrome QT longo ou doença pulmonar crónica obstrutiva, e também não
deve associar-se ao dipiridamol, pois este inibe a captação de adenosina, podendo potenciar o seu efeito.

P02_B. Explique os modos de ação dos diferentes fármacos antiarrítmicos do grupo II (com
apoio da figura 2-2). Para que tipos de arritmias são usados? São usados para tratar
outras patologias cardiovasculares?

Os fármacos da classe III interferem na saída de K(+) pelos I(K) durante a repolarização (fase 3 em
cardiomiócitos) e causam um prolongamento homogêneo da duração do potencial de ação nas fibras de
Purkinje e nas fibras musculares ventriculares. Isso resulta em um prolongamento do intervalo QT, do período
refratário efetivo (Figura 2-3), e provocam diminuição da frequência cardiaca. São frequentemente usados
para taquiarritmias supraventriculares e ventriculares. O efeitos adversos mais comuns a esta classe de
fármacos são referidos na tabela 2-4.

Amiodarona
A amiodarona bloqueia I(K), também bloqueia I(K) que estão em estado inativado, e tem atividade de
antagonista beta adrenérgico. Assim, prolonga a condução AV. É usado para tratar o flutter e fibrilação
auricular, SWPW, e taquicardia e fibrilação ventriculares (IV).
A amiodarona está disponível em formulações orais e intravenosas. È lipofílico (contem iodo na sua
estrutura), o que limita o seu uso devido aos efeitos adversos e ao longo tempo de semivida (ver efeitos

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adversos). É contraindicado em indivíduos com bradicardia sinusal, bloqueio auriculoventricular, torsade des
pointes, e bloqueio cardíaco de segundo ou terceiro grau que não tenham marca-passo artificial.

Sotalol
Além de inibir dos canais I(K), o sotalol é um antagonista beta-adrenérgico não seletivo.
E usado para tratra arritmias ventriculares potencialmente fatais e incapacitantes e de taquicardias
supraventriculares (flutter e fiblilação auricular).
É frequentemente usado, de forma preferencial a outros ABA, no tratamento da fibrilação ventricular se os
doentes têm cardiomiopatia subjacente. Também é usado para tratar TRIN e SWPW.
Um efeito colateral notável do sotalol é o prolongamento do intervalo QT, que pode potencialmente levar ao
desenvolvimento da arritmia “torsade de pointes” com risco para a vida.

Vernacalant
Bloqueia I(K) e I(Na) nas células auriculares, mas
não nas ventriculares. Prolonga o período
refratário auricular e diminui a velocidade de
condução do impulso, de forma que suprimem a
reentrada.
Vernacalant é usado em perfusão para provocar a
conversão rápida da fibrilação auricular de início
recente em ritmo sinusal em pacientes não
cirúrgicos com fibrilação auricular que permanece
menos de 7 dias ou em pacientes pós-cirurgia

Figura 2-3. Efeitos dos fármacos cardíaca com fibrilação auricular que permanece
antiarrítmicas de Classe III na duração do menos de 3 dias.
potencial de ação ventricular e no ECG
Casos de hipotensão grave foram observados
(Adaptado de “Basicmedical Key”. 2017).
durante e imediatamente após a infusão de
vernacalant.

Estes fármacos bloqueiam seletivamente os I(Ca,L). A entrada de Ca(2+) por estes canais é importante para
o potencial de ação normal nas células do NSA. A administração de um BCC provoca um prolongamento do
período refratário no NAV e nas aurículas, uma diminuição na condução AV e uma diminuição na
despolarização diastólica espontânea. Esses efeitos bloqueiam a condução de impulsos prematuros no NAV
e, portanto, são muito eficazes no tratamento de arritmias supraventriculares. O verapamil e o diltazem são
fármacos protótipos para esta classe, entanto que outros bloqueadores de I)Ca,L), os fármacos
dihidropiridínicos (nifedipina), são muito menos eficazes no tratamento de arritmias. Os BCC também serão
mais estudados no objetivo 5.
Os efeitos adversos, verapamilo e diltiazem são referidos na tabela 2-4. Ambos fármacos são contraindicados
em pacientes com insuficiência cardíaca congestiva.

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Tabela 2-4. Vias de administração, mecanismos e efeitos adversos (EA) dos fármacos
antiarrítmicos das classes 3 e 4 ( Pares = Parestesia).

FÁRMACO Via MECANISMO SNC CarVas GI Outros EA


Amiodarona Inj ⛔I(K), Beta1 Tremor | Pare ✅ Bradi Na Vo Tiroidismo | Tox | P
Sotalol Oral ⛔I(K), Beta1 😨 | Tont ✅ Ar Na Vo Der | esp | hipoG
Vernacalant Oral, Inj ⛔I(K), ⛔I(Na) Tont | Pares Ar | hipoT Na Vo
Verapamilo Oral, Inj ⛔I(Ca,L), 😨| Tont Ar | hipoT Na Vo Obs Edema

Diltiazem Oral, Inj ⛔I(Ca,L), 😨| Tont Ar Na Obs Edema

Verapamil e diltiazem (também estudado no objetivo 5)


O verapamil diminui a atividade do NSA e diminui a frequência cardíaca e a condução no NAV. É usado pela
via oral o como injetável para tratar:
- TRIN;
- Fibrilação/flutter auriculares se os doentes têm cardiomiopatia;
- Para a prevenção de recidivas de taquicardia ventricular.
O verapamil é também usado para tratar hipertensão e angina de peito (doença arterial coronária).
Noutros países, o diltiazem é usado no tratamento de fibrilação auricular, TRIN e taquicardia ventricular,
embora em Portugal não seja usado com este fim.

P02_C. Explique os modos de ação dos diferentes fármacos antiarrítmicos do grupo III (com
apoio da figura 2-2). Para que tipos de arritmias são usados? Quais os principais
efeitos adversos? Há contraindicações no seu uso?
P02_D. Explique os modos de ação do verapamilo e diltiazem (com apoio da figura 2-2).
Para que tipos de arritmias são usados? Há contraindicações no seu uso??

Caso 51 - O senhor Tomás tem de 55 anos e apresenta contrações do miocárdio auricular


muito rápidas, parciais, descoordenadas e irregulares. Os sintomas incluem palpitações e,
por vezes, sente fraqueza e intolerância a esforço. Foi administrado esmolol.
1. Que patologia tem o doente? Quais as causas possíveis da doença?
2.Porque foi administrada esmolol? Qual o seu mecanismo de ação?
3. Que outros fármacos podem ser usados neste tipo de doença?
4. Quais as complicações se não for tratada?

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