Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
NOTA DE ABERTURA
Daniel Bonhorst*
(cerca de +30 mV). Este fluxo é passivo, medida em que ao contrário da primeira é agora
devendo-se não só ao elevado gradiente químico o interior que é rico em Na + e o exterior em K + .
para este ião, que como dissemos é muito mais Segue-se a fase de repouso eléctrico ( Fase
abundante no meio extra-celular, mas também 4 ) durante a qual o potencial se mantém estável
ao gradiente eléctrico, que tende a deslocar os a níveis muito negativos, mas em que há uma
iões positivos para zonas mais negativas. Esta troca do Na + que é expulso da célula pelo K + que
fase de subida brusca do potencial de acção é regressa ao seu interior. Este processo é activo
designada por Fase 0, traduzindo a despola- e necessita de energia, fornecida pelo ATP, sen-
rização celular rápida. do levado a cabo por uma proteína designada por
Segue-se a Fase 1, em que há diminuição bomba de sódio-potássio (ATPase sódico-po-
desta positividade inicial do potencial de acção, tássica).
que se aproxima do valor zero, sendo devida
essencialmente a uma diminuição rápida da 2 - Automatismo cardíaco
condutância da membrana para o Na +; o fim desta
fase marca o começo da repolarização celular . Determinadas fibras musculares especia-
Segue-se o planalto da curva do potencial de lizadas, localizadas ao nível do sistema espe-
acção, típica das fibras musculares miocárdicas, cífico de condução, possuem uma propriedade
designado por Fase 2. Corresponde a um período designada por automatismo , isto é têm capaci-
em que há um equilíbrio entre os iões que entram dade de gerar estímulos eléctricos. Esta proprie-
(Na + , Ca ++) e os que saem da célula ( K + ). Com dade deriva das características da fase 4 do seu
efeito é nesta fase que se dá a abertura dos potencial de acção, que diferem das do miocárdio
chamados “canais lentos de cálcio”, com entrada comum. Assim, enquanto que nestas últimas o
deste ião para dentro da célula compensada pela potencial de membrana se mantém estável
activação de vários canais de K +, que se desloca durante toda a diástole, nas células automáticas
no sentido contrário. ele apresenta uma curva lentamente ascendente,
A Fase 3 corresponde à repolarização rápida , tornando-se progressivamente menos negativo.
inflectindo a curva para valores negativos do Ocorre assim uma despolarização diastólica
potencial de membrana, devido ao aumento da espontânea, até ser atingido um potencial (-65 a
condutância ao K + e à interrupção do movimento -75 mV), designado por limiar de excitação , a
do Ca ++ . O potencial de membrana atinge assim partir do qual se desencadeia a despolarização
em breve o potencial de repouso . No entanto esta rápida (Fase 0 do potencial de acção). Estas
nova situação de equilíbrio difere da inicial, na características do potencial diastólico dependem
propagado a partir das células vizinhas, enquan- supra-normalidade caracterizado por respon-
to que nas células contrácteis só este último derem a estímulos sub-limiares.
mecanismo funciona em condições normais.
A voltagem a partir da qual há possibilidade 4 - Condução cardíaca
de se induzir a resposta de uma fibra muscular
designa-se por limiar de excitação . Uma vez excitada uma determinada zona de
Todas as células cardíacas após terem sido uma célula miocárdica, ela é capaz de despo-
estimuladas demoram um certo período de tempo larizar as zonas celulares vizinhas, percorrendo
a recuperar a sua excitabilidade - período a onda de excitação toda a fibra muscular. O
refractário . Este período de inexcitabilidade to- estímulo eléctrico propaga-se em seguida às
tal ou parcial corresponde sensivelmente à células vizinhas, propriedade que se designa por
duração do potencial de acção. condutibilidade . Esta propagação deve-se a um
Distinguem-se várias fases na recuperação mecanismo puramente eléctrico, efectuando-se
da excitabilidade (Fig 3): ao longo das membranas celulares, passando de
Período refractário absoluto - as fibras man- célula para célula sem nenhum mediador
têm-se inexcitáveis, por maior que seja a intensi- químico. É influenciada entre outros factores
dade do estímulo que sobre elas seja aplicado pelas catecolaminas, acetilcolina e fármacos
Período refractário relativo - as fibras só são antiarrítmicos. A propagação do estímulo
excitáveis por estímulos de intensidade acima do eléctrico segue em geral a direcção longitudinal
limiar, determinando uma resposta caracterizada das fibras miocárdicas, cujas conexões com as
por condutibilidade reduzida. células vizinhas se situam predominantemente
Designa-se por período refractário efectivo o nos topos celulares. A condução lateral (aniso-
intervalo de tempo entre o início da inexcitabi- trópica) fibra a fibra é em condições normais
lidade e o momento em que é possível produzir mínima ou inexistente.
respostas propagadas, mediante estímulos A velocidade de condução varia conforme o
supra-limiares. Na transição para a excitabilidade tipo de células miocárdicas, dependendo da fase
normal está descrito ainda um curto período de 0 do potencial de acção. Assim, é máxima no
sistema His-Purkinge que tem a maior pendente
de despolarização rápida (atingindo 1,5 a 4 m/s)
e mínima no nódulo AV em que a despolarização
é cálcio-dependente e portanto lenta (0,05m/s).
No nódulo AV a despolarização das fibras
específicas tem características decremenciais,
isto é a sua velocidade vai diminuindo à medida
que se propaga.
Figura 4. Factores que influenciam o aumento do automatismo (expresso pela linha ponteada). A - Des-
polarização diastólica mais rápida; B - Diminuição do limiar de excitação (LE); C - Potencial diastólico (PD)
menos negativo.
Figura 6. A-D - Bloqueios AV, f«de primeiro, segundo e terceiro grau; E-G - Bloqueios sino-auriculares de
primeiro e segundo graus.
BIBLIOGRAFIA 55-87
6. Noble D. The ionic basis of the heartbeat and
of cardiac arrhythmias. In: Singh BN, Wellens
1. Aguilar JC, Civera RG, O’Callaghan AC. Elec- HJ, eds. Electropharmacological control of
trofisiología celular cardíaca. In: Civera RG, cardiac arrhythmias. New York: Futura Pu-
Cabadés A, Cosin J, eds. Automatismo y blishing Company, 1994; 3-20
conduccion cardíacos. Barcelona:Editorial 7. Rosen MR. Mechanisms for arrhythmias. Am
MCR, 1987; 15-41 J Cardiol 1988; 61: 2A-8A
2. Bigger JT. The electrical activity of the heart. 8. Slama R, Motté G. Aide-memoire de rythmo-
In: Schlant RC, Alexander RW, eds. logie. Paris: Flamarion, 1987: 16
3. Hurst’s: The heart: arteries and veins. New 9. Tamargo J, Bases fisiopatológicas de las
York: Mc Graw-Hill, 1994; 645-658 arritmias. I -. Excitabilidad, automatis-
4. Chung EK Some aspects of the anatomy, mo,conductividad y refractariedad. In Farré J,
electrophysiology and hemodynamics of the Moro C. Ed..Arritmias cardiacas: Fundamen-
heart. In Principles of Cardiac Arrhythmias. tos Y Opciones Terapêuticas. Barcelona,
Baltimore/London , Ed. Williams & Wilkins, 1992; 1-22
1983, pg 13-53 10.Waldo AL, Wit AL. Mechanisms of cardiac
5. Gadsby DC, Karagueuzian H.S. Wit AL. Nor- arrhytmias and conduction disturbances In:
mal and abnormal electric activity in cardiac Schlant RC, Alexander RW, eds. Hurst’s: The
cells. In: Mandel WJ,eds. Cardiac Arrhythmias. heart: arteries and veins. New York: Mc Graw-
Philadelphia: J.B. Lippincott Company, 1995; Hill, 1994; 659-704