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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

LPO
Nº 70061840419 (N° CNJ: 0376604-31.2014.8.21.7000)
2014/CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO


ESPECIFICADO. DIREITO À SAÚDE.
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PELO
ESTADO. BACLOFEN, OXIBUTINA E
GABAPENTINA. SUBSTITUIÇÃO DOS FÁRMACOS.
IMPOSSIBILIDADE. CUSTAS PROCESSUAIS.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TRATAMENTO
FORA DO DOMICÍLIO.
-Falta de interesse recursal. Apelo do Município
não conhecido.
Consoante o art. 499 do Código de Processo Civil,
apenas a parte vencida na decisão prolatada
poderá recorrer.
O autor teve o pedido de fornecimento de
medicamentos julgado procedente, condenação
imposta somente ao Estado. Desta forma, não
houve sucumbência em relação ao Município, de
modo que não possui legitimidade para recorrer
deste ponto.
Apelo do Município não conhecido.
-AÇÃO 025/1.10.0002678-4-
APELO DO ESTADO
Com base nos artigos 6º e 196 da Constituição
Federal, é crível admitir que é dever do Estado
(lato sensu) prestar atendimento de saúde, quando
configurados os vetores da adequação do
medicamento, tratamento ou cirurgia e da carência
de recursos financeiros de quem postula.
No caso concreto, o autor, por meio de relatórios
médicos, atestado e receituários, comprovou a
necessidade da utilização dos fármacos em
questão. Igualmente ficou demonstrado nos autos
que a parte autora enquadra-se na condição de
necessitada, não possuindo condições financeiras
de arcar com os gastos necessários ao tratamento.
Precedentes desta Corte.
-Manutenção Do Valor Da Verba Honorária.-
Verba honorária mantida levando-se em
consideração os critérios do art. 20, § 4º, do CPC.
- Custas Processuais.
Com a declaração de inconstitucionalidade da Lei
Estadual nº 13.471/2010 pelo Órgão Especial deste
Tribunal de Justiça, no julgamento da ADI nº
70038755864 e da Arguição de
Inconstitucionalidade nº 70041334053, não mais
subsiste a isenção do Estado ao pagamento das
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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
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LPO
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custas, emolumentos e despesas, salvo as


atinentes às despesas com condução de Oficial de
Justiça.
- Reexame Necessário -
Nas hipóteses de sentença condenatória ilíquida
proferida contra a União, o Estado, o Distrito
Federal, o Município e as respectivas autarquias e
fundações de direito público interno, é obrigatório
o reexame necessário contemplado pelo artigo
475, § 2º, do Código de Processo Civil.
- Prequestionamento -
O julgador não está obrigado a rebater todos os
argumentos, tampouco mencionar todos os
dispositivos constitucionais e legais elencados
pelo recorrente, bastando declinar os motivos que
fundamentam a decisão.
-AÇÃO 025/1.11.0000866-4-
APELO DO AUTOR
A parte autora ingressou com a presente ação
contra o Estado do Rio Grande do Sul e o
Município de Santana do Livramento, postulando
que os réus forneçam para o demandante e o seu
acompanhante as passagens de ida e volta de
Santana do Livramento até o Rio de Janeiro, todas
as vezes que for instado ao Hospital Sarah
Kubischek a comparecer, até o fim do seu
tratamento, bem como uma ajuda de custo por
viagem no valor de R$ 1.780,00.
Na hipótese, além de se tratar de uma reavaliação,
e não de um tratamento, o serviço é oferecido pela
Secretaria Estadual de Saúde, conforme
evidenciado nos autos, através do programa de
assistência ao deficiente físico, não restando
evidenciado no caso concreto a
imprescindibilidade do acompanhamento médico
na Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação,
localizado no Rio de Janeiro.
Precedente desta Corte.
APELO DO MUNICÍPIO NÃO CONHECIDO.
APELO DO ESTADO PARCIALMENTE PROVIDO.
APELO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO.
SENTENÇA MANTIDA, QUANTO AO RESTANTE,
EM REEXAME NECESSÁRIO.

APELAÇÃO CÍVEL TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

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Nº 70061840419 (N° CNJ: 0376604- COMARCA DE SANTANA DO


31.2014.8.21.7000) LIVRAMENTO

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL APELANTE

PAULO RENATO BOTTARO LORETO APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara
Cível do Tribunal de Justiça do Estado à unanimidade, em não conhecer do
apelo do Município, dar parcial provimento ao apelo do Estado, negar
provimento ao apelo da parte autora e manter a sentença, quanto ao
restante, em reexame necessário.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes
Senhores DES. NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO (PRESIDENTE
E REVISOR) E DES.ª MATILDE CHABAR MAIA.
Porto Alegre, 30 de abril de 2015.

DES. LEONEL PIRES OHLWEILER,


Relator.

RELATÓRIO
DES. LEONEL PIRES OHLWEILER (RELATOR)

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PAULO RENATO BOTTARO LORETO ajuizou ação em face


do ESTADO DO RIO GRANDE, postulando o fornecimento dos
medicamentos Oxibutinina e Baclofen.

PAULO RENATO BOTTARO LORETO ajuizou ação em face


do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e do MUNICÍPIO DE SANTANA DO
LIVRAMENTO, postulando o fornecimento, para o demandante e um
acompanhante, de passagens de ida e volta de Santana do Livramento até o
Rio de Janeiro, todas as vezes que for instado ao Hospital Sarah
comparecer, até o fim do seu tratamento, bem como uma ajuda de custo por
viagem no valor de R$ 1.780,00, sob pena de multa diária e bloqueio de
valor em caso de descumprimento.

O magistrado de 1º grau decidiu as demandas nos seguintes


termos:

“Ante o exposto, mantenho a tutela antecipada


concedida nos autos da ação tombada sob nº
025/1.10.0002678-4 e:
- JULGO PROCEDENTE o pedido aforado por PAULO
RENATO BOTTARO LORETO em face do ESTADO
DO RIO GRANDE DO SUL, julgando extinto o feito,
com resolução de mérito, forte no art. 269, I, do CPC,
a fim de condenar o requerido ao fornecimento dos
medicamentos BACLOFENO e CLORIDRATO DE
OXIBUTININA, necessários à recuperação e
manutenção da saúde do autor, conforme prescrição
médica.
Condeno o demandado ao pagamento de honorários
advocatícios equivalente a R$ 500,00 (quinhentos
reais), corrigidos pelo IGP-M a partir do ajuizamento
da ação e acrescidos de juros legais de 1% ao mês,
contados da citação. Considerei, para tanto, os
parâmetros do art. 20, §4º, do CPC.
Custas processuais, nos termos da Lei 13.471/2010.
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Considerando os valores apresentados nos


orçamentos acostados autos, tenho que dispensado o
reexame necessário, na forma do artigo 475, §2º, do
CPC.
- IMPROCEDENTE os pedidos aforados por PAULO
RENATO BOTTARO LORETO em face do MUNICÍPIO
DE SANT'ANA DO LIVRAMENTO e do ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL, nos autos da ação nº
025/1.11.0000866-4, julgando extinto o feito, sem
resolução de mérito, forte no art. 269, I, do CPC.
Condeno o autor ao pagamento das custas
processuais e honorários advocatícios, os quais vão
fixados em R$ 300,00 (trezentos reais) para cada um
dos procuradores das rés, corrigidos pelo IGP-M a
contar do ajuizamento da ação e acrescidos de juros
legais de 1% (um por cento) ao mês, contados da
citação. Ressalto que fica suspensa a exigibilidade de
tais cominações em vista da gratuidade da justiça que
ora concedo. Fica determinada a compensação
honorária.”.

O Município, em razões recursais (fls. 167/171 dos autos nº


025/1.11.0000866-4) sustenta que os medicamentos pleiteados não são de
sua responsabilidade, pois não constam em seu rol de competências. Afirma
que, tratando-se de medicamento de alta complexidade, cabe ao Estado
arcar com os custos da demanda. Requer a isenção do pagamento da verba
honorária. Pugna pelo provimento do recurso.

Em seu apelo (fls. 269/273 dos autos nº 025/1.10.0002678-4),


o Estado sustenta a possibilidade de substituição do medicamento Baclofeno
por fármaco ofertado pelo SUS (Toxina Botulínica), assentado em parecer
da Secretaria Estadual de Saúde. Afirma que não apresentará recurso de
apelação em relação ao fármaco Cloridrato de Oxibutinina. Requer a
redução dos honorários advocatícios, bem como a isenção do pagamento
das custas processuais. Prequestiona dispositivos legais e constitucionais
invocados. Pugna pelo provimento do recurso.
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Por sua vez, a parte autora apela (fls. 158/162 dos autos nº
025/1.11.0000866-4) alegando que, apesar de existirem locais no Estado
que possam realizar o tratamento, os hospitais Sarah Kubischek são
referências para todo o Brasil. Afirma que não possui condições financeiras
de custear o tratamento, já que não pode trabalhar e vive apenas de uma
pensão do INSS. Sustenta que há necessidade de seguir o tratamento na
mesma instituição onde o começou, não sendo conveniente a sua
interrupção. Requer o provimento da apelação.

Foram apresentadas as contrarrazões às fls. 279/280, 173v,


164/166, respectivamente.

Subiram os autos, e, neste grau, o Ministério Público, por meio


dos pareceres lançados pela Procuradora de Justiça Marta Leiria Leal
Pacheco, manifestou-se pelo parcial provimento do apelo do Estado (fls.
293/296v), pelo não conhecimento do apelo do Município e pelo
desprovimento do apelo da parte autora (fls. 190/193).

Os autos vieram conclusos.

É o relatório.

VOTOS
DES. LEONEL PIRES OHLWEILER (RELATOR)

I – PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE.

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Os recursos são tempestivos e estão dispensados de preparo


em virtude de lei e em razão da concessão do benefício da AJG. Não está
presente, todavia, um dos pressupostos subjetivos de admissibilidade, qual
seja, a legitimação do Município para recorrer em relação à condenação
acerca do fornecimento de medicamentos.

De acordo com o art. 499 do Código de Processo Civil, apenas


a parte vencida na decisão prolatada poderá recorrer:

Art. 499. O recurso pode ser interposto pela parte


vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério
Público.

O autor teve o pedido de fornecimento de medicamentos


julgado procedente, condenação imposta somente ao Estado. Desta forma,
não houve sucumbência em relação ao Município, de modo que não possui
legitimidade para recorrer deste ponto.

A esse respeito, já decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande


do Sul:
APELAÇÃO CÍVEL. ARRENDAMENTO MERCANTIL.
AÇÃO REVISIONAL 01. DA EXTENSÃO DO EFEITO
DEVOLUTIVO DETERMINADA PELA EXTENSÃO DA
IMPUGNAÇÃO. - Cumpre destacar, evitando futura
alegação de omissão do julgado, que o apelo não
devolveu a esta Corte toda a matéria submetida ao
julgamento do Juízo a quo. - O exame do recurso,
assim, está limitado à matéria impugnada. Magistério
de José Carlos Barbos Moreira e Nelson Nery Junior.
Precedente do Superior Tribunal de Justiça. 02.
AUSÊNCIA DE LEGITIMAÇÃO RECURSAL. -
Relativamente a compensação e repetição do
indébito, o apelante não tem interesse recursal,
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visto que não sucumbiu. (Apelação Cível Nº


70004669081, Décima Terceira Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio de
Oliveira Canosa, Julgado em 13/04/2004)

Neste mesmo sentido é o parecer do Ministério Público:


Inexiste qualquer interesse do Município em recorrer
da sentença proferida nos autos dos processos
conexos n.º 025/1.11.0000866-4 e 025/1.10.0002678-
4. Isso porque o Município apenas foi parte na
demanda em que se pleiteia o custeio das despesas
de viagem para o Rio de Janeiro, cujo pedido restou
julgado improcedente.
Portanto, além das razões recursais serem
absolutamente desassociadas dos fundamentos da
sentença, não foi sucumbente na demanda, ausente,
portanto, o interesse recursal.
Conforme Nelson Nery Júnior1 sobre o pressuposto de
admissibilidade do interesse em recorrer:
“Consubstancia-se na necessidade que tem o
recorrente de obter a anulação ou reforma da decisão
que lhe foi desfavorável. É preciso, portanto, que
tenha sucumbido, entendida a sucumbência aqui como
a não obtenção, pelo recorrente, de tudo o que poderia
ter obtido do processo.”
Assim, de não ser conhecido o apelo do Município.

Sendo assim, ausente um dos pressupostos de admissibilidade


do presente recurso, não conheço do recurso do Município.

Quanto aos demais recursos, presentes os demais


pressupostos de admissibilidade, conheço das apelações.

II – MÉRITO.

1
“Código de Processo Civil Comentado”. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p.
705.
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PROCESSO Nº 025/1.10.0002678-4.

APELO DO ESTADO

O Direito à Saúde como Direito Fundamental

A questão posta em debate não é nova no âmbito desta 3ª


Câmara Cível, pois envolve as difíceis escolhas envolvendo o direito social
fundamental à saúde (artigos 6º e 196 da Constituição Federal), e o alcance
normativo de sua materialização, considerando alguns óbices que surgem
nos casos concretos. O artigo 6º disciplina que:

“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho,


a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social,
a proteção à maternidade e à infância, a assistência
aos desamparados, na forma desta Constituição.”

Já o artigo 196 refere:

“A saúde é direito de todos e dever do Estado,


garantido mediante políticas sociais e econômicas que
visem a redução do risco de doença e de outros
agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e
serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Também a Constituição Estadual, no seu artigo 241, prevê que:


A saúde é direito de todos e dever do Estado e do Município, através de sua
promoção, proteção e recuperação.

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Desta forma, como leciona Mariana Filchtiner Figueiredo:

“...o direito à saúde deve abarcar a fruição de toda


uma gama de facilidades, bens, serviços e condições,
necessários para que a pessoa alcance e mantenha o
mais alto nível possível de saúde, compreendendo
dois elementos: ‘o direito à conservação do capital de
saúde, herdado por um lado, e o direito de acesso aos
serviços públicos de saúde adequados em caso de
dano a esse capital, por outro.”2

Segundo Ingo Wolfgang Sarlet3, bastaria uma leitura dos


dispositivos da Constituição Federal, em especial do artigo 196, para se
perceber o seguinte:

“...que nos encontramos, em verdade, no que diz com


a forma de positivação, tanto em face de uma norma
definidora de direito (direito à saúde como direito
subjetivo, de todos, portanto de titularidade universal),
quanto diante de normas de cunho impositivo de
deveres e tarefas, pois o art. 196 enuncia que a saúde
é direito de todos e dever do Estado, além de impor
aos poderes públicos uma série de tarefas nesta seara
(como a de promover políticas sociais e econômicas
que visem à redução do risco de doença e de outras
agravos, além de estabelecer o acesso universal e
igualitário às ações e prestações nesta esfera.”

Ao analisar a questão sob a ótica de um direito positivo, José


Afonso da Silva4 cita Gomes Canotilho e Vital Moreira, os quais entendem
que a natureza positiva significa o direito às medidas e prestações estaduais
visando a prevenção das doenças e o tratamento delas...
2
Direito Fundamental à Saúde. Parâmetros para sua eficácia e efetividade. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2007, p. 84.
3
Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2012, p. 577.
4
Curso de Direito Constitucional Positivo. 36ª ed. 2013, p. 311.
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Com base nos dispositivos supracitados, em especial o artigo


196 da Constituição Federal, é crível admitir que é dever do Estado (lato
sensu) prestar atendimento de saúde, quando configurados os vetores da
adequação do medicamento, tratamento ou cirurgia e da carência de
recursos financeiros de quem postula. O conceito de saúde, nestes casos, é
amplo, assim considerado desde o atendimento médico, hospitalar e
cirúrgico, até o fornecimento de medicamentos ou similares, sendo
indispensável, no entanto, que sejam necessários à manutenção ou
recuperação da saúde e da vida.

A importância de garantir-se o direito à saúde, via fornecimento


de medicamentos, encontra respaldo na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal, estando pacificado o entendimento de que o preceito do artigo 196
da Constituição Federal assegura aos necessitados o fornecimento, pelo
Estado, dos medicamentos indispensáveis ao restabelecimento da saúde
(ARE 650359 AgR/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, j. em
07.02.2012).

No julgamento de Agravo Regimental no Recurso


Extraordinário nº 607381/SC, a Primeira Turma do STF, em voto da lavra do
Ministro Luiz Fux, datado de 31.05.2011, consignou que:

“A ultima ratio do art. 196 da CF é garantir a


efetividade ao direito fundamental à saúde, de forma a
orientar os gestores públicos na implementação de
medidas que facilitem o acesso a quem necessite da
tutela estatal à prestação aos serviços médico-
hospitalares e fornecimento de medicamentos, além
de políticas públicas para prevenção de doenças,
principalmente quando se verificar ser, o tutelado,
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pessoa hipossuficiente, que não possui meios


financeiros para custear o tratamento.
...
O direito à saúde é prerrogativa constitucional
indisponível, e quem procura a tutela estatal para
receber medicamentos está, via de regra, padecendo
de algum mal, que, dependendo do caso, poderá levar
à diminuição da qualidade de vida ou até mesmo ao
óbito do requerente.
Por isso, face a gravidade que representa para quem
necessita do amparo do poder público para o
fornecimento de remédios, a questão deve ser
sopesada com espírito de solidariedade, de forma a
ser evitado o uso de medidas protelatórias, sem
amparo em razões legítimas, aguardando, quem sabe,
a ocorrência do pior, tornando desnecessário o
fornecimento dos medicamentos pleiteados.”

Além disso, no âmbito estadual, não se pode descurar das


disposições da Lei nº 9.908/93, segundo a qual cabe ao Estado fornecer
medicamentos excepcionais para pessoas carentes. In verbis:

“Art. 1º. O Estado deve fornecer, de forma gratuita,


medicamentos excepcionais para pessoas que não
puderem prover as despesas com os referidos
medicamentos, sem privarem-se dos recursos
indispensáveis ao próprio sustento e de sua família.

Parágrafo Único. Consideram-se medicamentos


excepcionais aqueles que devem ser usados com
freqüência e de forma permanente, sendo
indispensável à vida do paciente.”

“Art. 2º - O beneficiário deverá comprovar a


necessidade do uso de medicamentos excepcionais
mediante atestado médico.

Lista do SUS

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O direito à saúde mantém-se íntegro mesmo que o


medicamento não conste em lista do SUS. A este respeito, cumpre referir
que é desnecessária a previsão em lista de medicamentos específica da
Administração, uma vez que, nos termos das decisões desta 3ª Câmara
Cível, os “atos normativos não se sobrepõem à norma constitucional”
(Agravo de Instrumento nº 70052385408, Terceira Câmara Cível, Relator:
Eduardo Delgado, j. em 11/12/2012).

Neste mesmo sentido são os seguintes precedentes desta


Corte:

DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO.


FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO A PESSOA
CARENTE E PORTADORA DE HETEROZIGOTA
PARA A MUTAÇÃO DO FATOR V DE LEIDEN.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES
PÚBLICOS. TUTELA CONCEDIDA CONTRA O
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL E O MUNÍCÍPIO
DE PASSO FUNDO. RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA. ALEGAÇÃO DE LIMITAÇÃO DA
RESPONSABILIDADE DOS ENTES PÚBLICOS EM
RAZÃO DE LISTAS ADMINISTRATIVAS QUE VAI
REJEITADA. 1. Ilegitimidade passiva suscitada pelo
agravante que vai afastada, uma vez que é
responsável solidário pelo custeio de tratamento
médico à pessoa carente de recursos e portadora de
Heterozigota para a mutação do fator V de Leiden.
Superdireito à saúde que deve prevalecer sobre os
princípios orçamentários e financeiros esgrimidos na
defesa pelo ente público. Ausência de afronta aos
princípios da independência e autonomia dos Poderes.
2. Dever dos entes públicos de atendimento à
saúde que não se limita ao disposto em listas
administrativas. Regra disposta no artigo 196 da CF-
88 que prevalece. Precedentes do eg. Superior
Tribunal de Justiça. 3. O bloqueio de valores para
assegurar a aquisição de medicamentos encontra
amparo na legislação vigente (art. 461, § 5º, do CPC).
Medida excepcional que se justifica quando em risco
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os superdireitos tutelados pela própria Carta Política e


Social da República. Manutenção da decisão proferida
na origem, para a hipótese de recalcitrância do ente
público. Fundamento na jurisprudência consolidada no
âmbito deste colegiado, bem como nos eg. Superior
Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal.
AGRAVO DE INSTRUMENTO CUJO SEGUIMENTO
VAI NEGADO POR SUA IMPROCEDÊNCIA. (Agravo
de Instrumento Nº 70053709374, Terceira Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson
Antônio Monteiro Pacheco, Julgado em 09/04/2013)
(grifei)

CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE.


FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DE TODOS OS
ENTES DA FEDERAÇÃO. ARTIGOS 6º, 23, II E 196,
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IRRELEVÂNCIA DE O
MEDICAMENTO NÃO ESTAR PREVISTO NA LISTA
DO SUS OU ESPECIFICAMENTE NA LISTA
CORRESPONDENTE AO ENTE DEMANDADO.
PRECEDENTES. De acordo com firme orientação do
Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de
Justiça, o direito à saúde é dever do Estado, lato
sensu considerado, a ser garantido modo indistinto por
todos os entes da federação - União, Estados, Distrito
Federal e Municípios -, forte nos artigos 6º, 23, II e 196
da Constituição Federal, independentemente da
previsão do medicamento pleiteado nas listas do
SUS ou especificamente na lista correspondente
ao ente demandado. INSUFICIÊNCIA DE VERBA
ORÇAMENTÁRIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO.
PREVALÊNCIA DO DIREITO À SAÚDE. A alegada
insuficiência de verba orçamentária, a par de ceder
ante a prevalência do direito à saúde, não restou
comprovada nos autos. PRINCÍPIO DA RESERVA DO
POSSÍVEL. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTE DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. É inegável a
preponderância do direito à saúde, assegurado pela
Constituição Federal, frente ao princípio da reserva do
possível, cuja aplicação, tem sido relativizada pelo
Supremo Tribunal Federal, em situações como a dos
autos. (Embargos Infringentes Nº 70043510320,
Décimo Primeiro Grupo Cível, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Armínio José Abreu Lima da Rosa,
Julgado em 19/08/2011) (grifei)

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O Direito à Saúde e a Eficácia dos Medicamentos

A garantia do direito fundamental à saúde não impõe ao Estado


o fornecimento indiscriminado de todo e qualquer tipo de medicamento
solicitado.

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar em


data de 14.02.2012 o AgRg no RMS 34545/MG, Relator o Min. Benedito
Gonçalves, fez a seguinte referência ao entendimento do STF: “O Supremo
Tribunal Federal, após realização de audiência pública sobre a matéria, no
julgamento da SL N. 47/PE, ponderou que o reconhecimento do direito a
determinados medicamentos dá-se caso a caso, conforme as peculiaridades
fático-probatórias.”

No que importa, é assente o entendimento desta Corte no


sentido de que o parecer genérico apresentado pela Secretaria da Saúde do
Estado não pode preponderar sobre a presunção de necessidade do uso da
medicação que decorre do conteúdo dos atestados, exames e prescrições
do médico que assiste o paciente. A propósito do tema, refiro o julgamento
da Apelação e Reexame Necessário nº 70052857802, pela Vigésima
Segunda Câmara Cível, Relator o ilustre Dr. Eduardo Kraemer, j. em
08/04/2013.

A Câmara já se manifestou a respeito, nos termos do seguinte


precedente:

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2014/CÍVEL

DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO.


FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. PESSOA
CARENTE DE RECURSOS FINANCEIROS E COM
DIAGNÓSTICO DE DOENÇA PULMONAR
OBSTRUTIVA CRÔNICA - DPOC.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES
PÚBLICOS. ALEGAÇÃO DE LIMITAÇÃO DA
RESPONSABILIDADE EM RAZÃO DE LISTAS
ADMINISTRATIVAS QUE VAI REJEITADA.
CONDENAÇÃO DO ESTADO AO PAGAMENTO DE
CUSTAS QUE VAI AFASTADA. SERVENTIA
ESTATIZADA. DESPESAS MANTIDAS.
CONDENAÇÃO DO ENTE PÚBLICO MUNICIPAL AO
PAGAMENTO DE HONORÁRIOS EM FAVOR DO
FADEP. MANUTENÇÃO. 1. Preliminar de ilegitimidade
passiva rejeitada diante da solidariedade existente
entre os entes públicos no atendimento à saúde
pública, tal como prevista no artigo 196 e seguintes da
CF-88. Dever dos entes públicos de atendimento à
saúde que não se limita ao disposto em listas
administrativas. Regra disposta no artigo 196 da CF-
88 que prevalece. Precedentes do eg. Superior
Tribunal de Justiça. 2. Mérito: Na hipótese, o autor,
pessoa carente de recursos financeiros, com
diagnóstico de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica -
DPOC necessita de tratamento à sua saúde. Dever de
custeio pelos entes públicos, uma vez que
implementados os requisitos postos na legislação de
regência. Superdireito à saúde que deve prevalecer
sobre os princípios orçamentários e financeiros
esgrimidos na defesa pelo ente público. Ausência de
afronta aos princípios da independência e autonomia
dos Poderes. Responsabilidade solidária de todos os
entes gestores do SUS em nível nacional, regional e
municipal. Pretensão que pode ser deduzida contra
qualquer deles. Fontes de custeio e questões
orçamentárias e fiscais que não devem embaraçar o
direito à vida e saúde. 3. Da eficácia da medicação: A
pretensão do Estado de prevalência do laudo
médico emitido pela Secretaria da Saúde que
parcialmente indica o tratamento do autor com o
fármaco Seretide, concluindo pela indicação do
fármaco Salmeterol não merece acolhida. O laudo
se trata de estudo médico possível, mas que não é
específico para o caso do autor como é o laudo
emitido pelo médico particular que o atendeu e
levou em consideração as peculiaridades de seu
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estado de saúde. 4. Custas processuais: Isenção do


Estado ao pagamento das custas à serventia
estatizada em razão da regra disposta no item 2 do
Ofício-Circular nº 595/07 - CGJ. Por outro lado, são
devidas pela fazenda estadual as despesas
processuais consoante o provimento liminar concedido
na ADI nº 70038755864, em 04NOV10, já confirmado
no julgamento realizado em 29AGO11, conforme o
previsto na alínea "c" do artigo 6º da Lei-RS nº
8.121/85, de acordo com o Ofício-Circular nº 595/07
da Corregedoria-Geral de Justiça, que excepcionou,
no item "3", a regra de isenção. 5. Honorários
advocatícios ao FADEP: A condenação do Município
de São Borja ao pagamento de honorários
advocatícios em favor do FADEP vai mantida, pois não
se estabelece a confusão com o órgão público
estadual. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DO
MUNICÍPIO DE SÃO BORJA IMPROVIDA.
APELAÇÃO DO ESTADO PARCIALMENTE
PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70029712205, Terceira
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Nelson Antônio Monteiro Pacheco, Julgado em
11/10/2012) (grifei)

Atribui-se, assim, uma maior preponderância à prova realizada


pelo paciente consistente em atestado firmado pelo profissional que lhe
assiste. A prova em contrário, isto é, da absoluta ineficácia do tratamento
proposto, cabe ao réu realizar, à luz do previsto no art. 333, inc. II, do CPC.

A Situação Concreta dos Autos

A parte autora ingressou com a presente ação contra o Estado


do Rio Grande do Sul, postulando o fornecimento dos medicamentos
Baclofen 10mg e Oxibutina (Retemic 5mg), com posterior inclusão do
fármaco Gabapentina 300mg, necessário ao tratamento de “traumatismo
raque medular com fratura de T8 com deslocamento e síndrome de

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transecção medular com paraplegia de membros inferiores, nível sensitivo


motor T8, T9 e perda do controle esfincterian, frankio A – CID S 22”.

No caso concreto, o autora, por meio de relatórios médicos (fls.


13 e 14), atestado (fl. 15) e receituários (fls. 16 e 17), comprovou a
necessidade da utilização dos fármacos em questão. Igualmente ficou
demonstrado nos autos que a parte autora enquadra-se na condição de
necessitada, não possuindo condições financeiras de arcar com os gastos
necessários ao tratamento (fls. 11 e 12).

Considerada a condição de saúde da parte autora e o conteúdo


dos relatórios médicos, é dever do Estado assegurar-lhe o tratamento
necessário, fornecendo-lhe os medicamentos postulados.

Relativamente ao fornecimento dos medicamentos postulados


pela parte autora, os seguintes precedentes deste Tribunal de Justiça:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO
ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTO. GABAPENTINA. ARTIGO 196 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. DIREITO À
SAÚDE. IDOSO. LAUDO MÉDICO. SUPORTE
PROBATÓRIO. 1. A Constituição Federal, em seu art.
196, assegura que "A saúde é direito de todos e dever
do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e
de outros agravos e ao acesso universal e igualitário
às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação". 2. Laudo médico que expressamente
refere a necessidade de utilização da medicação
prescrita, afastando a possibilidade de substituição
dos fármacos indicados (fl. 62), fundamentadamente.
3. O fornecimento de medicação gratuita à pessoa
idosa decorre de sua condição jurídica especial, não
se submetendo à concessão apenas de medicamentos
excepcionais. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação
Cível Nº 70059228262, Quarta Câmara Cível, Tribunal
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de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado


em 24/06/2014)

APELAÇÃO CÍVEL E AGRAVO RETIDO. REEXAME


NECESSÁRIO. SAÚDE PÚBLICA. REFLUXO
GASTROESOFÁGICO, DEFICIÊNCIA NUTRICIONAL
NÃO ESPECIFICADA E TRANSTORNOS NÃO
DIAGNOSTICADO DO APARELHO URINÁRIO (CID S
K 21, E 63.9 E N 39.9). FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTOS. COMPLEXO VITAMINA A+,
PANTOPRAZOL, SIMECO PLUS E CLORIDRATO DE
OXIBUTINA. DIREITO DE TODOS E DEVER DO
ESTADO - ART. 196, CF. CERCEAMENTO DE
DEFESA POR INDEFERIMENTO DE INTIMAÇÃO DO
MÉDICO DA AUTORA. INOCORRÊNCIA.
LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO. OBRIGAÇÃO
SOLIDÁRIA ENTRE A UNIÃO, ESTADOS E
MUNICÍPIOS. SUBSTITUIÇÃO DOS
MEDICAMENTOS. IMPOSSIBILIDADE.
NECESSIDADE DOS MEDICAMENTOS
COMPROVADA. 1) É dado ao juiz da causa,
analisando a inicial da ação, indeferir as provas que
entender desnecessárias, quando a causa versar
apenas matéria de direito, como no caso. Há nos
autos atestados e receituário médico idôneo à
demonstração da necessidade de uso contínuo dos
medicamentos pleiteados na inicial. Todos eles
demonstrando o estado clínico da apelada, e
receituários que prescrevem o tratamento que se
ajusta à patologia do mesmo. 2) A sentença está
sujeita a reexame necessário, em razão de a
condenação não possuir valor certo, por determinar
que o fornecimento dos medicamentos ocorra
enquanto presente a necessidade da autora. A
hipótese é uma exceção à regra prevista no art. 475,
§2º, do CPC, como vem decidindo o Superior Tribunal
de Justiça, em nova orientação jurisprudencial no que
se refere a sentenças ilíquidas. 3) O Estado do Rio
Grande do Sul é parte legítima para figurar no pólo
passivo em demanda em que alguém pleiteia o
fornecimento de medicamento, uma vez que há
obrigação solidária entre a União, Estados e
Municípios. 4) Os serviços de saúde são de relevância
pública e de responsabilidade do Poder Público.
Necessidade de preservar-se o bem jurídico maior que
está em jogo: a própria vida. Aplicação dos arts. 5º, §

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1º; 6º e 196 da CF. É direito do cidadão exigir e dever


do Estado fornecer medicamentos indispensáveis à
sobrevivência, quando o cidadão não puder prover o
sustento próprio sem privações. Presença do interesse
em agir pela urgência da medida pleiteada. 5)
Impossibilidade de substituição do fármaco, pois a
solução do problema passa pela análise do
profissional da área da saúde que receitou o
medicamento. É ele quem tem os conhecimentos
técnicos e adequados para poder alterar ou não o
medicamento receitado. 6) Restou comprovada a
necessidade da parte autora na obtenção das
medicações postuladas para o tratamento das
moléstias que lhe acometem, conforme atestado
firmado por médico devidamente inscrito no
CREMERS. AGRAVO RETIDO E APELO
DESPROVIDOS. SENTENÇA CONFIRMADA EM
REEXAME NECESSÁRIO. UNÂNIME. (Apelação
Cível Nº 70049951411, Vigésima Primeira Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco
José Moesch, Julgado em 03/10/2012)

APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO


CONHECIDO DE OFÍCIO. DIREITO PÚBLICO NÃO
ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTOS: BACLOFEN 10MG,
PARACETAMOL 750MG, NATURETT, OMEPRAZOL,
RIVOTRIL 0,5MG. FORNECIMENTO DE EXAMES
MÉDICOS: ELETRONEUROMIOGRAFIA MMSS E
RESSONÂNCIA MAGNÉTICA DA COLUNA
CERVICAL. ENFERMIDADE: ARACNOIDITE
ADESIVA. RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO. O
Município é responsável pelo fornecimento de exames
médicos e de medicamento, independentemente de
quais sejam estes, tendo em vista que o art. 23 da CF
prevê como competência comum da União, Estado,
Distrito Federal e Município, cuidar da saúde.
URGÊNCIA. Atestada a necessidade da realização do
tratamento (usado de medicação e realização de
exames), não é justificativa para que o Estado não o
forneça a ausência de prova da urgência, pois o direito
à saúde é garantia constitucional. CHAMAMENTO AO
PROCESSO. Ajuizada a ação em face de um dos
entes federativos é desnecessário o chamamento ao
processo dos demais. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
No caso, considerando que o interesse protegido é a

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saúde, é possível a antecipação de tutela, mesmo que


a requerida seja a Fazenda Pública.
PREQUESTIONAMENTO. Desnecessária a análise de
todos os dispositivos legais indicados para fins de
prequestionamento, estando fundamentada a decisão,
com apreciação das questões relevantes ao deslinde
da controvérsia. REEXAME NECESSÁRIO. Há
conhecer de ofício do reexame necessário, tendo em
vista que a condenação é ilíquida e se enquadra na
previsão do art. 475, I, do Código de Processo Civil,
estando sujeita ao duplo grau de jurisdição, visto que
se trata de medicação de uso contínuo. O direito à
vida e à saúde é garantia expressa na Constituição
Federal. A assistência à saúde é direito público
subjetivo, independentemente de contribuição. Todos
têm direito subjetivo à saúde, podendo exigi-lo do
Município, visto que a saúde é direito do cidadão e
dever dos Poderes Públicos e da sociedade. APELO
DESPROVIDO E SENTENÇA CONFIRMADA EM
REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO DE OFÍCIO.
(Apelação Cível Nº 70033300476, Primeira Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge
Maraschin dos Santos, Julgado em 19/05/2010)

A tese arguida pelo Estado acerca da existência de alternativa


com os mesmos efeitos terapêuticos no âmbito do SUS, não merece
acolhimento. Nesta hipótese, o laudo do profissional médico que atendeu a
parte autora é o que deve ser levado em consideração, até porque emitido
em conformidade com o estado de saúde daquela.

Manutenção da verba honorária-

A sentença fixou a verba honorária em R$ 500,00 (quinhentos


reais), pleiteando o Estado a sua redução.

O Estado foi condenado a uma obrigação de fazer (fornecer


medicamento), devendo a fixação dos honorários advocatícios obedecer a

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regra do § 4º do artigo 20. Ao comentar o texto da lei processual, Celso


Agrícola Barbi refere:
“...manda que seja atendido o grau de zelo
profissional, o lugar de prestação do serviço, a
natureza e importância da causa, o trabalho realizado
pelo advogado e o tempo exigido para o serviço.
Apesar de não estar expressamente previsto na lei, é
natural que seja considerada também a qualificação
profissional do advogado. O item relativo ao lugar da
prestação de serviço tem em vista o maior dispêndio
de tempo e os incômodos com viagens, quando o
advogado não residir na comarca. Não devem ser
considerados aí os gastos de viagem, porque estas
são incluídas nas despesas judiciais, na formão §2º,
como vimos. O item referente à natureza e importância
da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o
tempo exigido para o seu serviço, é o mais importante
dos três. Na sua apuração, o juiz deve analisar as
dificuldades nas questões de fato e de direito que a
causa apresentar, o volume de atividade probatória
desenvolvida pelo advogado(...)”5

No presente caso, levando-se em consideração os referidos


critérios, tenho que os honorários devem ser mantidos, pois estão em
consonância com o valor fixado pelo eminente Des. Nelson Antônio Monteiro
Pacheco na Apelação Cível nº 70053213567. Neste mesmo sentido, refiro o
julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça do AgRg no REsp 1297946/RS,
através da Segunda Turma, Relator o Ministro Castro Meira, datado de
15.03.2012, o qual negou provimento ao agravo regimental, mantendo a
fixação de honorários ao FADEP em R$ 500,00.

Custas Processuais

5
Comentários ao Código de Processo civil, Vol. I, p.191.
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No caso, deve ser observado que, com a declaração de


inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 13.471/2010 pelo Órgão Especial
deste Tribunal de Justiça, no julgamento da ADI nº 70038755864 e da
Arguição de Inconstitucionalidade nº 70041334053, não mais subsiste a
isenção do Estado ao pagamento das custas, emolumentos e despesas,
salvo as atinentes às despesas com condução de Oficial de Justiça.

Na ADI nº 70038755864, de relatoria do Desembargador Arno


Werlang, foi declarada a inconstitucionalidade do art. 11 da Lei n° 8.121/85,
com a redação que lhe deu a Lei n° 13.471/10: “na parte em que isenta as
pessoas jurídicas de direito público do pagamento das despesas judiciais,
exceto as despesas com condução aos oficiais de justiça, em relação ao
Estado, que vêm realizando tais pagamentos por imposição de outro
preceito legal”.

No Incidente de Inconstitucionalidade nº 70041334053, foi


reconhecida a inconstitucionalidade formal da Lei nº 13.471/10, por afronta
ao disposto nos artigos 98, § 2º, e 99, “caput”, da Constituição Federal, nos
seguintes termos:
INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI
ESTADUAL Nº 13.471/2010. CUSTAS, DESPESAS
PROCESSUAIS E EMOLUMENTOS. ISENÇÃO DE
PAGAMENTO PELAS PESSOAS JURÍDICAS DE
DIREITO PÚBLICO. MATÉRIA RELATIVA ÀS
DESPESAS PROCESSUAIS JÁ APRECIADA PELO
ÓRGÃO ESPECIAL, VIA CONTROLE
CONCENTRADO. CUSTAS E EMOLUMENTOS.
POSSIBILIDADE DE ENFRENTAMENTO DA
MATÉRIA EM SEDE DE CONTROLE DIFUSO.
ESPÉCIE TRIBUTÁRIA DE TAXA. EXISTÊNCIA DE
VÍCIO FORMAL. INICIATIVA EXCLUSIVA DO PODER
JUDICIÁRIO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº
45/2004. ART. 98, § 2º, E ART. 99 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Versando a discussão
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sobre a constitucionalidade da Lei Estadual nº


13.471/2010, que dispensou as pessoas jurídicas de
direito público do pagamento das custas, despesas
processuais e emolumentos, questão - no tocante às
despesas processuais - já apreciada por este Órgão
Especial em ação direta de inconstitucionalidade, resta
prejudicado, em parte, o presente feito. Incidente
suscitado em data anterior ao julgamento da Adin nº
70038755864. Art. 481, parágrafo único, do CPC.
Precedentes. 2. Tendo em vista a nova realidade
constitucional, com a consagração da autonomia
financeira do Poder Judiciário na Constituição Federal
de 1988, através da Emenda Constitucional nº
45/2004, direcionadas as receitas de custas e
emolumentos integral e exclusivamente para o custeio
dos serviços judiciários (art. 98, § 2º, da Constituição
Federal), a Lei Estadual nº 13.471/2010 contém
insuperável vício de inconstitucionalidade ante a
usurpação, pelo Poder Executivo, da reserva de
iniciativa exclusiva do Poder Judiciário. 3. Proclamada,
incidenter tantum, a inconstitucionalidade formal da Lei
Estadual nº 13.471, de 23/06/2010, com apoio no art.
97 da CF. INCIDENTE DE
INCONSTITUCIONALIDADE PARCIALMENTE
CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, JULGADO
PROCEDENTE, EM VOTAÇÃO MAJORITÁRIA.
(Incidente de Inconstitucionalidade Nº 70041334053,
Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Isabel Dias Almeida, Julgado em 04/06/2012)

Portanto, tratando-se de cartório estatizado, o Estado deverá


arcar com as custas, emolumentos e despesas, salvo aquelas decorrentes
de condução de Oficial de Justiça.

Neste sentido decisões desta Terceira Câmara Cível:


APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. TERÇO
DE FÉRIAS. MAGISTÉRIO ESTADUAL.
PAGAMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS PELO
ESTADO. 1. Diante da declaração de
inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 13.471/2010
(Incidente de Inconstitucionalidade nº 70041334053 e

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Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 70038755864)


não mais prevalece a isenção do Estado ao
pagamento das custas, dos emolumentos e das
despesas judiciais, à exceção das relativas à
condução do Oficial de Justiça. 2. Honorários
advocatícios reduzidos para 5% das parcelas vencidas
até a data da prolação da sentença. DERAM PARCIAL
PROVIMENTO À APELAÇÃO. (Apelação Cível Nº
70051611325, Terceira Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado
em 25/04/2013)

SERVIDOR PÚBLICO. AGENTE PENITENCIÁRIO.


PROMOÇÃO DE CLASSE. EFEITOS RETROATIVOS.
CUSTAS PROCESSUAIS. Não pode haver a isenção
do Estado ao pagamento das custas, pois a serventia
por onde tramitou o feito é estatizada e os
vencimentos de seus servidores, bem como o material
que é empregado são custeados pelo Poder Judiciário.
A atual realidade constitucional, com a consagração
da autonomia financeira do Poder Judiciário na
Constituição Federal de 1988, através da EC nº
45/2004, direcionadas as receitas de custas e
emolumentos integral e exclusivamente para o custeio
dos serviços judiciários (art. 98, § 2º, da Constituição
Federal), não pode ser ignorada pelo intérprete
qualificado pelo dever de prestar a jurisdição. Foi por
isso, que o colendo Órgão Especial do Tribunal de
Justiça proclamou a inconstitucionalidade da Lei-RS nº
13.471/2010, na medida em que ela contém
insuperável vício ante a usurpação, pelo Poder
Executivo, da reserva de iniciativa exclusiva do Poder
Judiciário. Isso foi feito no Incidente de
Inconstitucionalidade nº 70041334053 e deve ser
observado pelas Câmaras separadas. APELAÇÃO
IMPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70029718475,
Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Nelson Antônio Monteiro Pacheco, Julgado
em 25/10/2012)

Portanto, vai parcialmente provido o apelo do Estado apenas


para isentá-lo do pagamento das despesas de condução de Oficial de
Justiça.

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Prequestionamento

Registro que o julgador não está obrigado a rebater todos os


argumentos, tampouco mencionar todos os dispositivos constitucionais e
legais elencados pelo recorrente, bastando declinar os motivos que
fundamentam o decisum.

Desde já, considero prequestionados os dispositivos


constitucionais e legais invocados pelo apelante.

PROCESSO Nº 025/1.11.0000866-4

APELO DO AUTOR

A parte autora ingressou com a presente ação contra o Estado


do Rio Grande do Sul e o Município de Santana do Livramento, postulando
que os réus forneçam para o demandante e o seu acompanhante as
passagens de ida e volta de Santana do Livramento até o Rio de Janeiro,
todas as vezes que for instado ao Hospital Sarah Kubischek a comparecer,
até o fim do seu tratamento, bem como uma ajuda de custo por viagem no
valor de R$ 1.780,00.

O autor comprovou através de relatórios médicos (fls. 13 e 14)


ter sofrido lesão medular traumática por acidente automobilístico (CID G
82.1) e bexiga e intestino neurogênicos (CID N 31.9 e CID K 59.2,
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respectivamente). Igualmente ficou demonstrado nos autos que a parte


autora enquadra-se na condição de necessitada, não possuindo condições
financeiras de arcar com os gastos necessários ao tratamento, sendo,
inclusive, representada pela Defensoria Pública.

Todavia, adoto o entendimento proferido no parecer da ilustre


procuradora Marta Leiria Leal Pacheco, no sentido de que “é importante
esclarecer, considerando as informações contidas nos autos, especialmente
os relatórios de acompanhamento da Rede Sarah de fls. 74/75 e fls.
117/118, que a razão de ser da viagem é que o paciente, ora recorrente,
seja submetido à reavaliação de seu quadro clínico, e não a um verdadeiro
tratamento, pois este deverá ser realizado em ‘unidade de reabilitação para
pacientes portadores de lesão medular’, ou seja, em qualquer instituição que
reúna condições de acolhê-lo”.

Partindo desse pressuposto, além de se tratar de uma


reavaliação, e não de um tratamento, o serviço é oferecido pela Secretaria
Estadual de Saúde, conforme evidenciado nos autos (fl. 42), através do
programa de assistência ao deficiente físico, não restando evidenciado no
caso concreto a imprescindibilidade do acompanhamento médico na Rede
Sarah de Hospitais de Reabilitação, localizado no Rio de Janeiro.

A Defensoria Pública, no próprio recurso de apelação,


reconhece a existência do tratamento dentro do Estado (fl. 161), sustentando
a tese de que o autor necessita de tratamento nos Hospitais Sarah
Kubischek, por se tratar de uma rede de excelência e referência para todo o
Brasil.

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Por oportuno, e corroborando o entendimento do parecer do


Ministério Público, reporto-me às doutas considerações do Des. Araken de
Assis, que enfrentou idêntica controvérsia nos autos da Apelação Cível nº
700150118026, cujo excerto ora transcrevo:

No caso em tela, pretende o autor que o Estado do Rio


Grande do Sul e o Município de Catuípe custeiem
transporte aéreo, para si e acompanhante, além de
traslados com ambulância, para que possa realizar
consulta no Hospital Sara Kubsticheck, em Brasília,
reconhecidamente centro de excelência no tratamento
de pessoas portadoras de paralisia.

Ocorre que o autor não se desincumbiu do ônus de


provar que a consulta é indispensável à sua
sobrevivência, tampouco, em nenhum momento,
comprovou perigo de vida iminente a justificar que se
imponha a realização de tal consulta, mas, sim, a
intenção de obter consulta em centro de excelência.
Ora, outorgar-lhe tal benefício seria, no mínimo, injusto
com as demais pessoas que se encontram na mesma
situação.

Estimo que ninguém tenha o direito ao melhor


tratamento para suas mazelas, mas ao tratamento
possível.

A ementa do julgado é a que segue:

CONSTITUCIONAL. DIREITO À VIDA. PACIENTE


TETRAPLÉGICO. CUSTEIO DE PASSAGENS
AÉREAS PARA CONSULTA NO HOSPITAL SARA
KUBSTICHECK. INADMISSIBILIDADE. 1. Para acudir
à via jurisdicional, é desnecessário provocar ou
esgotar a instância administrativa, pois o interesse de
agir em juízo é imanente à iniciativa de qualquer
interessado no ato da demanda. Preliminar rejeitada.
2. Legitima-se o Município de Catuípe, passiva mente,
6
Apelação e Reexame Necessário Nº 70015011802, Quarta Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Araken de Assis, Julgado em 21/06/2006)
28
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

LPO
Nº 70061840419 (N° CNJ: 0376604-31.2014.8.21.7000)
2014/CÍVEL

em demanda em que alguém pleiteia prestações


positivas na área da saúde. Preliminar rejeitada. 3. O
art. 196 da CF/88 não assegura tratamento de
excelência, mas o tratamento possível. Nesta
contingência, releva-se inadmissível condenar o
Estado do Rio Grande do Sul e o Município de Catuípe
a custearem o transporte aéreo de paciente
tetraplégico e de seu genitor para realização de
consulta no Hospital Sara Kubsticheck, em Brasília,
reconhecidamente centro de excelência no tratamento
de pacientes nas condições do autor. 4. APELAÇÕES
PROVIDAS. (Apelação e Reexame Necessário Nº
70015011802, Quarta Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Araken de Assis, Julgado em
21/06/2006)

Portanto, diante de tais fundamentos, não merece provimento o


apelo do autor.

III – DISPOSITIVO

Ante o exposto, NÃO CONHECO do apelo do Município, DOU


PARCIAL PROVIMENTO à apelação do Estado para isentá-lo do
pagamento das despesas de condução de Oficial de Justiça e NEGO
PROVIMENTO ao apelo do autor. MANTENHO a sentença, quanto ao
restante, em reexame necessário.

DES. NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO (PRESIDENTE E


REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
DES.ª MATILDE CHABAR MAIA - De acordo com o(a) Relator(a).

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

LPO
Nº 70061840419 (N° CNJ: 0376604-31.2014.8.21.7000)
2014/CÍVEL

DES. NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO - Presidente - Apelação


Cível nº 70061840419, Comarca de Santana do Livramento: "NÃO
CONHERAM DO APELO DO MUNICÍPIO, DERAM PARCIAL
PROVIMENTO AO APELO DO ESTADO, NEGARAM PROVIMENTO AO
APELO DA PARTE AUTORA E MANTIVERAM A SENTENÇA, QUANTO AO
RESTANTE, EM REEXAME NECESSÁRIO."

Julgador(a) de 1º Grau:

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