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Copyright©2021

Cindy Emy
Capa: Dri K. K. Design
Revisão: Wânia Araújo
Betagem: Bhetys Oliveira
Diagramação: Cindy Emy
Ilustrações: Depositphotos
A ESPOSA DO MEU AMIGO
Cindy Emy
Todos os direitos reservados.
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reprodução total ou parcial da obra sem
autorização da autora, exceto pequenos
trechos utilizados em resenhas e em
divulgações. A obra está registrada junto
à Avctoris, serviço de proteção dos
direitos autorais.
Esta é uma obra de ficção.
Personagens, nomes, acontecimentos e
lugares se baseiam no imaginário da
autora. As ações, diálogos e decisões
dos personagens são ficção, sem
qualquer relação com o factual. E
quaisquer semelhanças com situações e
fatos da realidade são mera
coincidência.
A violação dos direitos
autorais é crime estabelecido pela lei nº
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do
código penal.
Texto revisado segundo o novo
Acordo Ortográfico da Língua
Portuguesa.
Esta obra é indicada para
maiores de 18 anos por conter cenas
de sexo.
Alerta! Contém algumas cenas
com abusos psicológicos.
2021
Brasil
À minha família que faz de
mim uma forteza.
As canções do Spotify que

tocam nas playlists de Safira e Eric e

embalam seus dramas e alegrias,

tristezas e quenturas.

Clique aqui
Sinopse
Nota da Autora
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Epílogo
Agradecimentos
Autora
Outras Obras
Safira é uma mulher linda, mas
a sua beleza nunca lhe trouxe sucesso ou

alegrias. Ao contrário, para ela, é uma

maldição. Casada com Edgard, a quem


conhece desde a adolescência, eles
aparentemente formam um casal
perfeito. Mas nem tudo é o que parece

ser.

Ela se submete aos fetiches de

Edgard, que é um cuckold.

E nem imaginava que ele fosse

transformar aqueles desejos exagerados

num jogo de poder sobre o seu corpo e

suas vontades. De pedidos eventuais,


Edgard passou a tê-la como um troféu,
em que seu maior prazer é rifá-la e
assistir de perto como ela é desejada
por outro homem. Essa obsessão a

escraviza e a destrói aos poucos.

Mas tudo começa a mudar

quando Safira se aproxima de um dos

amigos do marido, Eric Rossi, que se

encanta por ela.

Eric é um engenheiro de
software e um pintor de quadros em
franca ascensão, que direciona toda a
sua sensibilidade às suas telas. Por fora,
ele parece um rochedo intransponível,

em que esconde uma decepção do


passado. Por dentro, mantém o coração

blindado.

Ele se sente perturbado ao se

aproximar de Safira, que lhe é oferecida

pelo marido. Não é só a beleza dela e a


situação excêntrica que o incomoda, mas
o grito de socorro que só ele vê
estampado no rosto da linda mulher.

Ela, por sua vez, acaba


depositando nos olhos inquietantes de

Eric o único fio de esperança de que

possa ser salva dos instintos sádicos de

Edgard.

O tempo urge. O jogo erótico

com a esposa do amigo se aproxima e


uma aposta foi lançada...
O desejo não entende as
barreiras das convenções sociais.
As relações liberais e a adoção
de fetiches por casais são saudáveis
desde que seja uma decisão de todos os
envolvidos.
Se o poder de decisão de um
deles for comprometido, os
consentimentos já não são resultados de
vontades, mas de pressões.
Essa história não julga as
decisões dos casais que se respeitam e
são livres e saudáveis em suas escolhas,
mesmo que sejam opções fora da
caixinha das convenções sociais.

Cindy Emy
Austin, Texas

Uma rajada de vento úmido e

frio entra pela janela entreaberta, o que


anuncia o fim do outono e me causa um

calafrio estranho. Vou até ela e a fecho,

depois de observar que o campo de

bluebonnet[1] , entre a nossa casa e a

vizinha, começa a perder a coloração


tão intensamente azulada de suas flores.

Toco a gola alta de minha blusa

lilás, e um amargor comprime a


garganta. Ajeito as mangas compridas e

agradeço pelo clima em Austin[2] estar


esfriando.

Eu me sinto quebrada, uma

borboleta de asas doentes que nunca


consegue sair do casulo, que jamais

sentiu o frescor de um voo numa manhã

de verão, que sequer conhece um raio de

sol. Pareço eternamente presa e

sufocada.

Afasto-me da janela, na
tentativa de me livrar dos pensamentos,
e acaricio o tecido sedoso da minha saia
azul royal. Retorno à cômoda e me sento
na cadeira. Sem coragem de fitar o meu

reflexo no espelho, observo minhas


mãos, de dedos longos e finos, com as

unhas pintadas de rosa chá. Fazer as

minhas unhas é o meu passatempo

predileto.

Tomo um pequeno susto com o


barulho da maçaneta girando.
— Sah, o pessoal está aí fora,

venha — diz Edgard ao passar a metade


do seu corpo pela porta, com um sorriso

cativante estampado no rosto.

Meu marido não é um homem

bonito, mas sempre foi charmoso e

enigmático. Antes do acidente, era um

homem vivaz e esguio. Atualmente, Ed

está um pouco acima do peso e ostenta


uma barba bem aparada e cabelos
castanho-escuros.

— Estou indo, amor. Só vou

terminar de me arrumar.

— Não tem mais o que arrumar,

você está linda. Sempre muito linda —

ele elogia, me sorri e pisca.

Edgard então vem até mim e

acaricia os meus cabelos escuros,

ondulados nas pontas e de comprimento


um pouco abaixo dos ombros. Em
seguida, toca o meu queixo e inclina o
rosto na minha direção.

— Hoje conhecerá os
candidatos a se tornarem nosso

brinquedinho. Você poderá escolher,

meu amor... — ele murmura.

— Não, não quero escolher

nada — digo nervosamente. — Eu, eu

quero... parar — gaguejo ao expressar a


minha vontade.
O semblante de Edgard se fecha

e recai sobre mim um olhar de censura.

— Safira, não quero ficar triste.


E sei que você também não quer me ver

triste... — Essas palavras pesam no

peito. A tristeza de Edgard pode ser

devastadora. — Sabe bem como é

importante para mim. Te assistir sendo

feliz me faz feliz em dobro — ele


acrescenta.
— Mas, mas eu... — Iria

argumentar, porém de nada adianta


insistir na mesma tecla e repetir que

aquilo não me faz feliz, aliás, nunca fez.


Aquilo só me deprime e destrói. Só que

Edgard não entende.

— Apresse-se, Kim está aí e já

perguntou por você.

— Está bem, só mais um minuto


— digo, vencida.
Edgard meneia a cabeça. Sai e

fecha a porta.

Finalmente, crio coragem e me


encaro no espelho. Meus olhos azuis

estão marejados e já perderam a

vivacidade de outros tempos. Meus pais

me deram o nome de Safira por causa

deles, pois contam que, quando nasci,

pareciam duas safiras brilhantes e


preciosas. Para eles, foi o presságio da
chegada de uma mulher linda, forte e
determinada.

Assim, como você pode


concluir, só restaram mesmo esse azul

esmaecido no meu rosto e uma beleza

que só me trouxe decepções, porque

nunca fui forte, muito menos

determinada. Juro, até tentei.

Sempre fui muito elogiada por


minha aparência; pelo meu rosto de
traços harmônicos, o corpo longilíneo e
cheio de curvas, seios firmes e de
tamanho médio.

Mas eu me odeio.

Detesto tudo que essa boa

aparência me trouxe e ainda provoca.

São 24 anos prisioneira nessa

embalagem atrativa e carregando o

horror em mim. Vivo enjaulada e uma


amargura parece ter estabelecido
moradia entre o meu estômago e a
garganta.

Talvez, claro, talvez. Nunca


esqueça que pode ser uma

possibilidade. Acredito, no entanto, que

se chamasse menos atenção, não teria

me tornado o que sou. Submissa,

escrava e explorada.

Você pode pensar: Safira, você


é livre. Não, eu não sou. Minhas asas
estão quebradas, meu espírito vive
encurralado. Contento-me com a prisão,
e a minha mente já não consegue reagir

como a de uma pessoa normal. Nem sei


se sou mais normal.

Eu era...

Era uma adolescente cheia de

garotos apaixonados e eu os esnobava

com frequência. Dona de um nariz em


pé, achava que o mundo girava ao meu
redor. Tinha algumas amigas, mas muitas
meninas me detestavam por concentrar
em mim a atenção e o desejo dos garotos

do colégio.

Sou a filha do meio de uma

família de três mulheres. Meus pais

sempre lutaram bastante para que

pudéssemos estudar nas melhores

escolas, frequentar o balé e nos


formarmos em inglês. Minhas irmãs
aproveitaram essas oportunidades.
Agatha, minha irmã mais velha, se
tornou uma médica, e Esmeralda, a mais

nova, é uma engenheira que trabalha

como treinee[3] numa indústria química.

Já eu tinha o Edgard.

Na verdade, vou ser justa,

concluí o curso de Pedagogia com muita

dificuldade, ao conciliá-lo com a

carreira de modelo, que exigia uma


magreza quase doentia e muitas viagens.

Pensar que hoje estou tão magra

quanto os padrões da moda, mas não é


fruto da minha vaidade, e sim do meu

sofrimento.

Edgard e eu nos conhecemos

quando entrei no Ensino Médio, num

grande colégio de classe média alta em

Salvador. Eu fazia o primeiro ano; e ele,


o terceiro. Logo fizemos amizade e, em
seguida, engatamos um namoro.

Explodiu entre nós uma paixão

avassaladora, dessas que cortam o ar e


nos fazem acreditar que não há no

mundo nada além do que a outra pessoa.

Fomos contaminados por esses arroubos

da adolescência.

Assim, enquanto ele era

aprovado na faculdade de Ciências da


Computação, em São Paulo, eu aceitava
me casar. Claro que inicialmente a
decisão foi escondida de meus pais.

Na verdade, eu tinha todos os


rapazes interessados em mim e isso

alimentava o meu ego, mas não a alma.

Os mais bonitos, os mais malhados e os

mais ricos. Mas preferi o mais

inteligente, Edgard Freire Klein, pois o

achava esperto o suficiente para nunca


deixar o amor entre nós morrer.
Contudo, mais uma vez, estava

enganada.

Enxugo as lágrimas, passo um


suave batom rosa nos lábios e me

preparo para enfrentar as pessoas.

Trata-se de amigos de Edgard.

Alguns são casais que já conheço de

outros eventos sociais, como Kimberly e

George Rodrigues: ela é americana, e


ele tem ascendência mexicana. Também
estão Tabata e Henry Smith, ela trabalha
como gerente comercial na mesma firma
que Edgard.

Os outros, já os vi em algum

encontro, mas não fui apresentada.

Edgard me falou a respeito de alguns

homens que ele havia sondado sobre

embarcar em suas fantasias. Disse que

deseja que eu os observe, vamos dizer,


com mais afinco.
É a primeira vez que Edgard

expõe o seu fetiche diante de pessoas


conhecidas e do seu convívio. Alertei-o

sobre os riscos, mas ele não me deu


ouvidos. Enfim, o que noto é que esse

fetiche tem evoluído e se tornado mais

elaborado, enquanto eu morro aos

poucos.

Inspiro fundo e, insegura, saio


finalmente do quarto, desço a escada,
atravesso a sala em direção à área
externa.

Estampo um sorriso nos lábios,


como uma grande atriz, e entro em cena.

Na verdade, saio para a área gourmet

de nossa casa, onde está instalada a

churrasqueira, e havíamos disposto as

mesas para os convidados.

Cumprimento primeiro as
pessoas mais próximas. Dirijo-me a
Tabata e Kim, que me abraça. Ela tenta
ser minha amiga, mas eu não permito
que nos aproximemos muito. Prefiro o

meu mundo isolado e em que mantenho


as fantasias de meu marido em segredo.

Edgard passa a mão na minha

cintura, como se fossemos o casal mais

feliz do mundo, e me conduz a outra

mesa. Falo com o chefe dele, Anthony


Wilson. Um homem de trinta e poucos
anos, de intensos olhos verdes, barba
por fazer, rosto anguloso e corpo
aparentemente bem torneado. Ele

trabalhava no Brasil e foi quem


convidou Edgard para assumir uma vaga

na sede da STW Tecnologia, aqui em

Austin.

Sorrio, extremamente

envergonhada, e estendo a minha mão,


tentando conter o nervosismo. Em uma
fração de segundos, percebo o olhar do
homem varrer o meu corpo de forma
cobiçadora, o que só piora o meu

emocional.

— Como vai, senhor Wilson?

— digo, tentando disfarçar.

— Edgard fala muito de você,

senhora Klein. — O homem estampa um

sorriso bonito nos lábios. — Só elogios.

Algo quente percorre minha


coluna. Tenho certeza de que fico
vermelha como uma pimenta.

— Meu marido nem sempre é


conveniente — deixo escapar, meio

insegura.

Mal fecho os lábios e sinto os

dedos de Edgard em minha cintura se

transformarem num discreto beliscão.

Na mesma mesa ao lado de


Anthony, meus olhos se encontram com
os de Eric Rossi, um brasileiro de porte
alto, que é engenheiro de software na
STW Tecnologia. Não sei o porquê, mas

tenho a impressão de que o conheço de


algum lugar.

Sua íris de azeviche[4] e

intensamente imponente logo faz com

que desvie o meu olhar. O rosto bem


barbeado e com traços fortes parece um

rochedo intransponível. Os cabelos


castanho-claros são mantidos num corte
moderno e curto.

Tenho a impressão de que a


intensidade de sua feição me faz corar.

— Senhora Klein! — Ele

inclina levemente a face e franze o

cenho de modo econômico.

Eric fita os meus olhos como se

me devastasse inteira. Miro o chão e


passo uma mecha de cabelo atrás da
orelha. Retribuo com duas palavras
quase inaudíveis e um sorriso contrito
nos lábios, enquanto o coração bate um

pouco mais apressado.

Com uma leve pressão nas

minhas costas, Edgard me faz seguir em

direção à churrasqueira. Lá está um

convidado de porte atraente, dono de

cabelos loiro-escuros. Meu marido dá


um tapinha no ombro dele,
demonstrando a sua empatia. Em
seguida, cumprimento John Hill, também
funcionário da STW, que está assando

brisket[5], linguiças e costelas de porco.

John me observa de um jeito

desconfiado com seus grandes olhos

azuis, e sinto vergonha de mim pelas

coisas que talvez passem em sua cabeça.


Suponho que os homens

desacompanhados, na altura do
campeonato, saibam o que faço para
agradar a Edgard.

— Como vai? — digo de forma


contida.

Ele meio que sai de um transe.

Limpa a mão na toalha antes de estendê-

la a mim. Contraio os músculos dos

lábios em sinal de simpatia e

rapidamente retribuo o cumprimento. Em


seguida, desvio o olhar, fixando-o nas
linguiças, e pergunto-lhe se precisa de
algo a mais na tarefa de assar as carnes.
Prontamente, o homem nega.

Retorno para a mesa de Kim e

Tabata, numa tentativa de fugir da

situação e esquecer os olhares

cobiçadores desses homens. Então eu as

convido para me ajudar a trazer os

molhos e a salada de batatas que havia


preparado com antecedência. Assim,
tento me isolar do que acontece ao meu
redor.
Ela é linda. Cada gesto e

movimento tem uma cadência tão

harmônica que é um afago aos sentidos.

Os olhos são de um azul tão profundo e


melancólico que tocam as almas mais
sensíveis. E o sorriso, embora

fascinante e com potencial de se tornar

iluminado, deixa escapar certo ar

tristonho e sombrio.

Não consigo parar de observar

Safira.

Uma mulher em que o sorriso é

um grito de socorro.

Quer dizer, penso eu...

É que, observando-a melhor


nesse churrasco, não percebo o ar de
mulher predadora, dominante, que está
feliz com as aventuras eróticas em que é

rifada pelo marido. Esperava que a


esposa de Edgard tivesse um jeito

seguro, típico de mulheres fortes, dessas

que sabem o que querem e desafiam os


padrões em nome do próprio prazer.

Mas o que vejo é uma flor


maltratada. Uma mulher tímida, que
pode estar sendo persuadida a participar

dessas transgressões.

Você não sabe, cara. Pare. Ah!


O que você tem a ver com a vida da

esposa de um amigo do trabalho?

De repente, freio o ritmo dos

meus pensamentos enquanto a vejo

sorrir por educação para a esposa de

Rodrigues, Kimberly.

Henry Smith dedilha no violão


Thinking Out Load, do Ed Sheeran, e

arranha a canção em sua voz sem


potência. Alguns param para escutar e
acompanhar o marido da Tabata.

Enfim, Edgard é meu camarada

das horas extenuantes no

desenvolvimento de softwares nos

projetos da STW. Esporadicamente, em

geral às sextas-feiras, costumamos sair


para tomar drinques e escutar música ao
vivo, em algum pub ou bar na Sixth

Avenue[6] . Também gostamos de comer

em algum food truck[7] e conversar


sobre o trabalho.

Quando ele chegou a Austin,

costumava levá-lo à ponte da Congress

Avenue[8] , para admirar uma das vistas

mais bonitas da capital do Texas, com os

caiaques atravessando o rio Colorado, e


assistir à encantadora revoada de
morcegos.

Ele falava pouco da esposa,

raramente comentava sobre fatos


corriqueiros do cotidiano da sua vida.

Quer dizer, até os últimos meses, quando

passou a me sondar. De repente, tornou-

se curioso sobre as minhas peripécias

sexuais. Dei corda, pois desde

Samantha, estou solteiro e me tornei um


pegador sem compromisso.
O meu amigo me surpreendeu

com a sua proposta, numa noite em que


bebíamos e beliscávamos nachos.

— Você não acha Safira

gostosa? — ele indagou logo após tomar

um grande gole do seu destilado.

— Ah, eu, é... — gaguejei,

surpreso com a questão. — Nossa, Ed,

sua esposa é linda, mas nunca pensei


nesses termos.
— Poderia pensar, aliás, pode

pensar — ele disse de maneira


penetrante, como se me autorizasse a

algo.

A princípio, imaginei que a

culpa fosse do excesso de álcool que já

havíamos ingerido. Mas, naquela noite,

Edgard me deu carona até o apartamento

onde moro.

— Não me importaria que você


tivesse um envolvimento físico com

Safira. Ela é uma mulher bonita,


desejada por muitos homens e sei que
ela desperta instintos.

— Acho que bebemos demais,

mano, e falamos muita merda —

respondi e fiz menção de abrir a porta

do carro, mas ele segurou no meu

antebraço com firmeza.

— Não é a bebida, amigo,


estou sóbrio. É uma proposta.

É uma proposta...

Aquilo ficou martelando na

minha cabeça.

Nunca imaginei concretizar

qualquer devaneio louco, como ir para

cama com a mulher de um amigo meu.

Sempre fui ético nesse sentido, apesar

de não ser imune aos encantos


femininos. Pinto telas nas horas vagas e
a beleza permeia as minhas percepções,

mas não a ponto de extrapolar do mundo


da fantasia para a realidade.

O filho da puta do Edgard

aguçou os meus instintos, e aquela ideia

desgraçada me deixou curioso.

Já tinha visto Safira em

algumas ocasiões, mas nunca

conversamos, apenas trocamos


cumprimentos rápidos. Na última delas,
antes de ser convidado para essa

confraternização, ela foi buscar Edgard


no escritório num fim de tarde de

sábado. Lembro-me do seu ar


despojado, de tênis, short e camiseta.

Sabe aquelas mulheres com ar

de artista de cinema? Foi a impressão

que tive de Safira, dona de um jeito de

mulher inatingível, mas que poderia ser


minha, quer dizer, ao menos uma vez.
Aliás, ela se adequaria melhor

posando para mim. Adoraria transpor


numa tela os seus traços, que beiram à

perfeição, retratar por meio da luz e


sombra os detalhes do seu rosto, de sua

pele amendoada e encontrar o tom certo

de azul capaz de reproduzir o encanto da

sua íris.

— Está viajando, cara? — John


me dá um tapinha no ombro.
Meus pensamentos se dissipam,

e eu retorno para esse churrasco


entediante.

— Estava pensando na esposa

do Edgard, fiquei um pouco

impressionado com o jeito dela. — Dou

um gole na cerveja, que ainda está

gelada e desce amarga pela garganta.

— Ela é uma mulher bonita,


mas como muitas outras que balançam as
saias por aí. — John senta-se ao meu

lado, começa a cortar uma porção da


carne no seu prato e a comer os

pedaços. — Sabe o que mais me

impressiona?

— Hum... — Franzo o cenho

em indagação.

— Como um cara tem tesão em

ser corno? Nunca vi isso em toda a


minha vida.
Bufo.

— Não seja grosseiro, man. É

um fetiche, se os dois estão de acordo,


precisamos respeitar. Mas uma coisa

chama a minha atenção nisso tudo. —

John para de comer e me encara. —

Achei Safira tímida e insegura demais

pra quem aceita essas fantasias.

Ele gargalha.

— Não acredito que está com


pena da mulher do Edgard? Só você

mesmo. É o único homem na face da


terra, cara, capaz de dizer isso. — O

meu amigo ri e eu apenas o encaro,


sério. Então, John retoma o prumo, seu

riso desaparece e ele continua: — Não


há pureza entre os dois. E eu serei o

primeiro a fazer essa anjinha chupar o


meu pau. O que podemos fazer se ele
gosta de socializar a esposa?
Quase faço uma careta em

desagrado. John é um casca grossa.

Gosto bastante de sexo, e


pensar na esposa do meu amigo entre

minhas pernas não é desagradável,

porém a estranheza da situação é

perturbadora.

— Ele também não deveria ter

nos feito essa proposta para sermos, o


que mesmo... — tento me recordar do
termo — touro, esse é o nome como é

chamada a terceira pessoa da relação.


Enfim, mesmo que nada role, haverá

sempre algo esquisito entre nós e

Edgard.

— Discordo, é melhor que ele

faça sacanagem desse nível com pessoas

que conhece do que com estranhos. E, se

Edgard se sente feliz levando chifres,


quem somos nós para criticá-lo? Eu vou
ser o touro dele com muito prazer. Ele

só não pode me tocar, no mais, estou


dentro. Quer dizer, dentro da proposta e

em cima da mulher dele.

Sorrio levemente do jeito

toupeira do John e balanço a cabeça.

— Só acho que ele está

colocando a carreira em risco —

comento e, discretamente, meus olhos


voltam a serpentear por Safira, dou mais
um gole na cerveja.

— Atitudes e consequências.

Edgard vai ter que assumir as dele, caso


dê algum problema. Mas sinceramente

não acho que haverá encrenca. Tanto eu

como você queremos discrição... —

John olha com profundidade para mim.

Em seu ensandecimento,

Edgard pensa que não sei que ele propôs


a John o mesmo que a mim. Ele nem
desconfia que John desabafou comigo há

alguns dias.

— Não sei se a proposta de


Edgard foi feita só para mim e você.

Desconfio que Anthony também saiba —

revelo a minha suposição e inclino o

meu queixo em direção ao gerente de

projeto da nossa unidade. Nesse

momento, ele faz o seu melhor, chama


atenção para si mesmo, enquanto conta
piadas que os convidados riem para não

o constranger.

— Ah, Eric, você pensa


demais, cara, demais. Vamos deixar

rolar. Não é de nossa conta para quem

mais Edgard anda se expondo.

Miro Safira e não consigo vê-la

apenas como um pedaço da carne.

Recordo-me do passado, quando éramos


inconsequentes demais, e Edgard...
John me dá um tapa no ombro,

quase me fazendo derrubar a cerveja.


Franzo a testa e o miro em advertência,

porém ele está entretido e bêbado


demais para se dar conta.

— Olha, cara, está vendo a

dancinha do Rodrigues? — John

comenta, apontando para o colega, que

se balança ao som das baladas do


Henry, com o seu chapéu de caubói
texano, o que faz o passado se dissipar

da minha mente. — Quando fica bêbado,


Rodrigues solta a velha mexicana que

mora dentro dele. — Meu amigo imitou

o colega.

Gargalho.

— Não é só ele que tem uma

mexicana escondida no corpo... — digo

e o observo, já leve e solto por causa do


álcool.
Algum tempo depois, levanto-

me, vou à mesa onde a comida está


disposta e me sirvo de uma batata

recheada, o que me faz salivar. Nesse


momento, Safira repõe molhos e uma

nova porção de salada.

— A batata recheada está com

uma aparência ótima — digo, puxando

conversa, e provo a comida. — E uma


delícia! — elogio. — Está de parabéns,
Safira.

— Ah, que bom que gostou,

mas não fui eu quem fez, foi a Kim quem


trouxe.

Não sei por que, mas me senti

envergonhado. Contudo, nada deixo

transparecer e a encaro. Muito rápido,

ela desvia o olhar.

— A casa de vocês é muito boa


— tento manter um diálogo.
— Alugamos desde que

chegamos aqui — ela responde quase


como um sussurro, e seus olhos se

prendem ao chão. — Licença — ela fala


e sai.

Fico ainda mais encabulado

tanto com a beleza dessa mulher, como

por não acreditar que ela concorde com

a proposta do marido. Não a percebo


empolgada nas presenças masculinas.
Olho para atrás e Safira segue

em passos firmes para o interior da sua


residência, andando suavemente como

se deslizasse pelo mundo.

Retorno à mesa e o churrasco

continua com muita carne e bebida.

Quando alguns estão mais altos

em teor etílico; e outros, cansados, ainda

penso na esposa do meu amigo.


Discretamente acompanho os seus gestos
econômicos e seus sorrisos necessários.

Quando a tarde começa a cair e

o clima esfria um pouco mais para os


padrões da região, começamos a nos

despedir para irmos embora. Apenas

aceno para Safira, sem coragem de me

aproximar.

Então, na saída, Anthony se

coloca entre John e mim, dá tapinhas nos


nossos ombros e nos conduz para
próximo dele.

— Olha a cara do corno do

Edgard. Ele sabe da aposta — cochicha


Anthony, olhando para Edgard, que, ao

lado de Safira, conversa com os outros

casais.

Fico confuso com o comentário.

Em seguida, compreendo que ele

também sabe sobre a proposta de


Edgard.
— Tony, como soube disso? —

questiono-o.

— Nós conversamos enquanto


você estava com a cabeça nas nuvens e

os olhos na esposa do nosso amigo —

John informa aos risos e com o rosto

vermelho como camarão.

Balanço a cabeça em

desacordo.

— Mas a que aposta se


referem? — pergunto encabulado.

— De quem vai foder Safira

primeiro dentre nós três. Quem


conseguir a proeza, leva três mil

dólares, pagos pelos perdedores.

Eu me afasto chocado.

— Quero crer que diz isso por

estar quase se arrastando de bêbado —

rosno.

Os dois gargalham.
— Já vi que não está no páreo

— rebate Tony.

Estreito o olhar, impressionado


com a dimensão que a situação tomou. A

bela esposa de Edgard está na berlinda

dessa disputa ardilosa, uma aposta sobre

uma proposta indecente. E, por outro

lado, posso parecer patético, mas não

consigo enxergá-la como uma femme


fatale.
Não consigo imaginar no que

isso vai dar...

Três homens, uma linda mulher,


uma aposta e um marido cafajeste.
Domingo

Você deve estar pensando que

sou meio desmiolada, eu sei. É que


ontem fiquei muito nervosa. Tenho

dificuldades de lidar com pessoas.

Sofro com isso. Quando estou na


presença de alguém estranho, meu rosto
formiga de apreensão e a garganta

parece que vai travar a qualquer


instante.

A verdade é que morro de

medo de que as pessoas descubram


sobre as coisas difíceis que acontecem
entre mim e Edgard. Então, você não faz
ideia de como foi o churrasco de ontem
para mim.

Doeu tolerar aqueles homens

me observando com olhares acusatórios

do tipo: devassa, safada, puta. Foi

difícil me controlar para não sair

correndo e me trancar no meu quarto.

Mas, se fizesse isso, teria que lidar com


consequências piores do que as que
suportei após todos saírem.

Kim e Tabata me ajudaram com

a louça antes de partirem, então, ocupei-


me em colocar as cadeiras para dentro

da garagem e recolher o lixo. Em certo

momento, Edgard, que havia bebido

além do costume, aproximou-se e passou

o braço ao redor da minha cintura.

— O que achou de Tony, Eric e


John? — ele perguntou e me deu um
beijo no pescoço. — Dão bons touros,
não?

— Nem observei direito... —


respondi com desdém e me agachei para

apanhar um guardanapo no chão. Quando

me ergui, me deparei com o seu

semblante transformado.

Edgard tomou o saco de lixo da

minha mão.

— Pode deixar isso para


depois... — O tom de voz perdeu o ar
descolado e ganhou um peso austero.

Engoli em seco com medo.

Ele beijou a minha testa e me

conduziu para o interior da casa. Meu

coração disparou de tensão.

— Ah, Safira, nosso amor está

acima de tudo, nosso amor é para

sempre. Se lembra do pacto que


fizemos?
Ele parou entre a sala e a

bancada da cozinha e me encarou.


Receosa, entrelacei os dedos diante do

peito e balancei a cabeça confirmando.

Quando éramos adolescentes,

furamos nossos dedos, esprememos

gotas de sangue e as unimos. Quase

como uma oração, juramos sermos um

do outro e nos amarmos para toda vida.

— E o meu maior prazer é te


ver feliz — Edgard suspendeu o meu
queixo e me enlaçou — e te assistir
sendo fodida, desejada, endeusada por

um homem que nunca poderá ter o que


tenho de você: o seu coração, a sua

mente e alma — ele sussurrou em meu

ouvido. — Quero esses sujeitos se

arrastando por você.

Estremeci.

Inspirei fundo em busca de


coragem e dei dois passos para trás, até
minhas costas baterem na bancada.

— Mas não quero aqueles


homens. Não quero nenhum. Eu quero ter

paz, Edgard — berrei, trêmula. — Não,

não quero, isso está me deixando doente.

Ele segurou o meu braço direito

com força e avançou como um animal

em fúria.

— Sabe bem que só consigo de


forma plena assim! E isso é algo normal,
vários casais praticam. Conhecemos
alguns deles nas casas de swing que

frequentamos — ele berrou.

Pisquei, tentando afastar as

lágrimas.

— É normal quando os dois

querem. Você agora quer me forçar... —

acusei.

— Está me acusando de ser


abusivo? Não acredito, Safira! Nosso
amor e sexo sempre estiveram acima
disso — indagou aborrecido.

Então ele segurou o meu

antebraço, virou-o nas minhas costas e o

tensionou, causando-me dor.

— Isso que é ser abusivo —

acrescentou, ríspido, antes de me soltar.

Gritei. Ele foi até a bandeja


sobre a bancada e a derrubou no chão,
enfurecido, fazendo espatifar a louça
que estava sobre ela.

Senti medo. Mas, diante da


tormenta de Edgard, decidi prosseguir.

— O que fazemos não é

cuckold[9] , que é uma decisão do casal.

Eu... eu não aceito e você não respeita a

minha vontade — finalmente disse,

mesmo entre lágrimas e com a voz

trêmula.
Edgard empurrou uma das

banquetas, que desabou no chão.


Assustada, não tive coragem de fitá-lo,

nem de me mover. Apenas respirava.

Em seguida, ele aproximou-se

de mim e me encarou, estreitando o

olhar.

— Amor, eu fiquei assim por

causa de você. — A voz dele saiu


aveludada e calma, o que me perturbava
ainda mais. — Era toda exibida,
adorava andar rebolando para chamar a
atenção dos caras.

— Não, não, eu não era assim

— reafirmei mais para mim mesma, pois

sabia que Edgard não prestava atenção

no que eu dizia.

— Até que resolvi atender ao

seu desejo e sabe bem o que aconteceu...


— ele alegou de modo rude.
— Não traga esse passado, o

que aconteceu antes está enterrado. Não


sou mais aquela garota e as

consequências do que aconteceu, eu... eu


não tenho culpa — argumentei entre

soluços, levando as mãos ao rosto e

desabando no chão.

Depois desse desentendimento,

Edgard foi dormir. Já eu fui para sala e


chorei bastante. Rememorei o passado e
a culpa que recai sobre mim. Quando me
acalmei, subi para o quarto e adormeci.

No fundo, eu me sinto
terrivelmente culpada pelo que

aconteceu a Edgard no passado, mesmo

que ele narre os fatos como se fosse uma

vítima e a situação não tenha se

desenrolado assim. De todo modo, se eu

não estivesse em sua vida, nada do que


ocorreu naquela noite quente de verão
teria se sucedido.

Suspiro, absorta por meus

pensamentos, e retorno para o agora.

Preparo o almoço enquanto ele

assiste às infindáveis partidas de futebol

pelo mundo, em canais de esporte. Após

a nossa discussão de ontem, não

tocamos mais no assunto sobre os seus

amigos.

Edgard amanheceu inspirado.


Até me levou café da manhã na cama e
me encheu de afagos. Amo esse jeito
dele, o seu lado A, a parte boa e

encantadora. Quem o conhece assim


nunca imaginaria o quanto ele pode se

tornar devastador e cruel. Isso só eu sei,

só eu conheço esse seu lado B.

Reservo o frango, após

temperá-lo. Através do vidro da janela,


avisto o dia bonito e inspirador lá fora.
— Ed... — chamo-o por seu

apelido, mas ele continua com os olhos


fixados na tela. — Edgard!! — Aumento

um pouco o tom.

— Hum!!

— Vamos andar um pouco lá

fora e aproveitar esse clima ameno? —

sugiro.

— Ah, não estou a fim. Estou


aqui assistindo a uma partida
importante.

— Se importa que eu vá só?

— É claro que não. — Ele se

levanta, vem até a nossa cozinha e pega

uma maçã na fruteira. — Vá, aproveite

esse fim de manhã, você merece. Ponho

o frango para assar, não se preocupe.

Quero que pense sobre nossos

brinquedinhos. Arranjei vários


interessantes para nós.
Bufo indignada.

Retiro o avental e o arremesso

sobre a bancada.

— Eu não quero mais esses

jogos, fetiches, fantasias ou sei lá o

quê... — digo num fiapo de voz. —

Nossa relação está em crise, não

percebe?

— Não pode me tirar a única


coisa que restou — ele ladra e retorna
para o sofá, se jogando nele. — Você
não me ama mais, Safira. Está fazendo
pouco de mim, de tudo que construímos

e de nossa relação. Quer me ver triste,


não é? Quer me levar ao meu limite

emocional diariamente — ele acusa de

modo severo.

Nada digo.

Com lágrimas umedecendo


meus olhos, subo as escadas e vou ao
closet do nosso quarto. Calço um tênis,
pego óculos e um casaco de malha fina,
que visto e puxo as mangas acima dos

cotovelos. Ajeito a calça legging e a


regata. Toco a área machucada do meu

braço, causada por Edgard ontem à

noite.

Sinto uma vontade insuportável

de desaparecer.

Desço, atravesso a sala, calada,


e sigo para a saída.

Um vento reconfortante envolve

o meu corpo, como um afago às minhas


dores e lamentos. Tento controlar as

lágrimas, mas elas escorregam

silenciosas e calmas pelas minhas

bochechas.

A minha irmã Esmeralda é a

única pessoa que desconfia da


personalidade de Edgard. Esme
presenciou uma de nossas brigas,
quando veio passar alguns dias de férias
comigo. Ela me incentivou a pedir o

divórcio, porque viu Edgard falar


comigo de forma grosseira.

— Essa relação é tóxica, não

vê, Safira? É perigoso continuar num

casamento desse tipo. Está sendo

oprimida e desrespeitada — Esme


argumentou, sem desconfiar da
profundidade do buraco em que estou
enfiada.

Menti para minha irmã, que é


cerca de dois anos mais nova que eu, e

garanti que aquele episódio tinha sido

um caso isolado. Eu a fiz jurar que nada

comentaria com os nossos pais. Sempre

que nos falamos, Esme pergunta como

estão as coisas entre mim e Edgard.


Prefiro continuar a mentir a revelar os
motivos de nossas desavenças.

É que vou para cama com

estranhos para agradá-lo.

Sim, é isso mesmo que faço.

Talvez você já saiba. Tenho dificuldade

de lidar com a minha realidade e aceitar

que meu marido se excita loucamente

quando me assiste mantendo relações

sexuais com outro homem. Eu me


envergonho por essa situação e sinto
repulsa de mim.

Inspiro profundamente.

Caminho pelo condomínio de

ruas vazias e arborizadas. Gosto disso,

me manter distante das pessoas me

agrada.

No início, aceitei os fetiches

dele porque eu era mais volúvel e essas

aventuras aconteciam esporadicamente,


uma ou duas vezes ao ano. Com o passar
do tempo, Edgard foi aumentando a
frequência com que me pedia para
aceitar outro homem na minha cama.

Fomos algumas vezes a casas

de swing, mas Edgard não se sentia

satisfeito e nem conseguia se envolver

com outra parceira, como pode

acontecer nesses lugares. Ele, então,

chamou garotos de programa umas duas


vezes. Mas também se dizia insatisfeito.
— Esse homem aceita por

dinheiro, eu quero alguém que esteja na


nossa intimidade por loucura e por

desejo — ele tentou me explicar.

Então passamos a sair à noite e,

algumas vezes, íamos a clubes à caça de

encontros furtivos. Nessas ocasiões,

para suportar, eu me embriagava. Aliás,

embriago-me quantas vezes for preciso


me deitar com um estranho. Na última
vez, bebi tanto que apaguei na pista de
dança de um desses clubes de show ao
vivo e acordei no hospital.

Por um bom tempo, Edgard

parou de me assediar para que topasse

essas aventuras. Mas agora Edgard

retornou a insistir nessa fantasia, muito

mais audacioso e ousado. Ele colocou

na cabeça que quer me ver transando


com seus colegas de trabalho.
Só de pensar nisso, tenho a

impressão de que vou enlouquecer.

Sinto nojo dos homens com


quem me sujeitei a transar, tenho asco de

mim. Após esses encontros, esfrego

tanto a minha pele como se assim

pudesse me livrar das lembranças

carimbadas na minha alma. Essas visões

terríveis me atormentam. Adoraria


apagá-las da memória, rasgar da minha
vida e me livrar para sempre.

Ao revelar essa situação, sei

que algumas pessoas perguntariam: por


que não se separa de Edgard? Na

verdade, sou culpada por ele ser assim.

Depois de um incidente...

— Safira, Safira... — Escuto

uma voz masculina me chamar e escapo

dos pensamentos para a realidade diante


de mim.
Olho para o lado e lá está um

dos amigos de Edgard que esteve no


churrasco. Ele atravessa a rua em minha

direção.

Meu coração dispara.

Rápido, limpo as lágrimas das

bochechas e ajeito os óculos de sol no

rosto. Não faço ideia do que ele quer

comigo. Nem me agrada interagir com


amigos de Edgard que possam conhecer
nossos fetiches insanos, muito menos
com Eric, dono de um olhar que me
causa um certo incômodo, uma

estranheza esquisita quando se encontra


com o meu.
Eric aproxima-se com um

sorriso nos lábios. Dou dois passos para


trás, temerosa das intenções desse
homem cujas feições me lembram uma

muralha intransponível, dono de olhos

escuros e intensos.

— Olá, tudo bem? — ele

cumprimenta, expondo um sorriso

intenso, de dentes perfeitos.

Apenas movimento o rosto de

modo afirmativo e estampo um riso

forçado. Em paradoxo ao semblante, o


seu jeito de me olhar é suave. Meu
coração palpita e parece que vai sair

pela boca, minhas mãos transpiram e as


esfrego na calça.

— Um casal de amigos meu é

quase seu vizinho — ele diz com um tom

empolgado.

Vestido de bermuda e camiseta,

Eric tem um ar jovial e leve. Enquanto

ele gesticula, noto o dorso de sua mão


sujo de tinta azul.
— Ah, que coincidência! —

falo, tentando controlar o meu


nervosismo.

— E Edgard?

— Não quis vir, preferiu ficar

em casa assistindo ao futebol.

— Ah, é verdade. Ele é

apaixonado pelo campeonato europeu,

eu sei, ele me falou.

Fico imaginando o que mais o


desgraçado do Edgard contou para ele,
para o meu desespero.

— Espero que a bagunça que


deixamos em sua casa não tenha lhe

dado tanto trabalho para arrumar. Na

verdade, saímos bêbados e ajudamos

menos do que deveríamos, mas o

churrasco foi maravilhoso.

— Ah, já está tudo em ordem.


Que bom que gostaram.
— Eric... — uma mulher de

meia idade o chama, o que alivia minha


tensão. Ele sinaliza que já está indo.

— Venha conhecer Thomas e

Rose Hoover. Eles são adoráveis e vão

gostar de você. — Eric sorri com

simpatia e pousa a sua mão em meu

cotovelo.

Esse contato aquece a minha


pele e desperta uma sensação agoniante
de que devo fugir imediatamente. Num

movimento brusco, puxo o braço e não


consigo disfarçar a minha agonia.

— Desculpe, Safira, não quis

assustá-la. — Eric ergue as palmas das

suas mãos diante de si, visivelmente

constrangido. — É mania de brasileiro

que já morou no Nordeste, sou caloroso.

Eu me envergonho de minha
reação grosseira, mas não dá para dizer
a ele que não gosto de ser tocada.

— Tudo bem — Se tivesse um

buraco aqui, queria cair em queda livre.


— Me desculpe também... Eu, eu não

sabia que tinha morado no Nordeste.

— Não se lembra de mim? —

ele pergunta de forma corriqueira, o que

faz correr um gelo na minha coluna, sem

razão.

— Morou em Salvador? —
arrisco.

— Sim, por três anos.

Estudamos no mesmo colégio, só que eu


era da turma vespertina. Eu te vi

algumas vezes.

Então, a impressão que tenho

de que o conheço de algum lugar é da

adolescência! Resolvo segui-lo e

atravessamos a rua vagarosamente.

— Não me recordo de você,


mas ali eram muitas turmas.

— É verdade, fui do 1º ano H.

— Ele ri.

— Eu era da turma B.

— Eu era mais adiantado que

você. Fui contemporâneo do Edgard,

mas não éramos próximos na época.

— Entendo. Ele só estudava...


— digo.
Fico intrigada. Será que Eric

soube do que havia acontecido há cinco


anos? Foi a partir daquele episódio que
Edgard começou a se perder de si

mesmo, e eu, como não fui forte o

suficiente, fui tragada a reboque.

Eric me apresenta ao casal de

amigos e eles me tratam com muita

simpatia. Mas não consigo me sentir


confortável. Tenho a impressão de que
meu rosto está em brasa. Eles me
convidam para me sentar, mas alego que
tenho que ir para casa.

— Eric, lhe chamei porque

estou muito animada! Acabei de receber

uma mensagem de Adam River, o seu

marchand[10]. A sua tela O reino das

sombras foi comprada — ela comunica,


de modo esfuziante. A senhora Rose é

uma típica americana, roliça com os


cabelos curtos entre o loiro e o grisalho.

Eric lança o punho ao ar em

comemoração.

Estreito o olhar, encabulada.

Eric é um artista?

— Que notícia maravilhosa,

Rose! — ele diz.

— Parabéns, meu rapaz —


acrescenta o senhor Hoover, que é meio

calvo e possui um bigode abundante e


grisalho.

— River reclamou que você

não responde às suas mensagens. Mas


fico aqui imaginando, quando você
estrear na Hugos Gallery vai ser um

sucesso — continua a senhora Hoover,

que parece ser meio tagarela.

Ele sorri e franze o cenho.

— Tomara! — Eric comenta um


pouco envergonhado.
— É muito talentoso, Eric —

elogia a senhora Hoover que, em


sequência, olha para mim. — Quer um

chá? — oferece.

— Não, obrigada. — A atenção

deles se volta para mim.

— Claro que não vai querer

chá, ela estava se exercitando — ralha

Thomas, meio rabugento. — Aceita um


suco? Uma água?
— Não... — respondo,

constrangida.

— Então, venha conhecer essa


outra maravilha, que é a tela a óleo que

Eric está concluindo — convida a

senhora Hoover.

Estreito o olhar em direção a

ele, que apenas arqueia as sobrancelhas

e comprime os lábios. Rose caminha


para a sala de jantar, um ambiente
conjugado e de largas janelas, que estão
abertas.

— Quando Eric te viu passar,


tirou o avental e saiu correndo. São

amigos há muito tempo?

Minha face formiga.

— Não, não. Na verdade, ele é

amigo do meu marido — respondo.

— Olhe! — Rose aponta para a

tela que está fixada num cavalete, ao


lado de uma bancada cheia de tintas e
pincéis.

— É linda! — admiro.

Da tela se desfralda um campo

de bluebonnet entre casas, sob um dia

ensolarado e de poucas nuvens. Os raios

solares, representados de forma sutil por

caracóis, se fundem em harmonia ao

resto da paisagem.

— Nessa tela, tento escapar da


influência impressionista[11] — ele conta

e se aproxima do cavalete. — Estou


aprimorando meus conhecimentos com a
Rose, minha instrutora.

Nós nos encaramos, mas a sua

íris escura me derrota, e eu desvio o

meu rosto em direção a Rose, que me

sorri de modo cândido.

— Prefiro dizer coach. Eric é

um artista completo e terá bastante


sucesso — elogia Rose. — Não é lindo

esse quadro? — ela indaga outra vez,


sem conseguir esconder a empolgação.

— Bondade sua, Rose — ele

comenta, encabulado com o elogio.

— Muito, realmente... Eric é

muito talentoso. — Dessa vez, exponho

um largo sorriso sincero e volto a mirá-

lo. — Nunca imaginei que, além de


engenheiro de software, fosse pintor.
— Confesso que costumo me

emocionar diante de um quadro e do


poder de seus muitos significados.
Enfim, ele está ali estático e em silêncio

diante das tantas emoções que me

provoca. — Eric expõe o que pensa

sobre a pintura, com um olhar perdido

para os janelões da residência de Rose,


demonstrando uma sensibilidade que

não fazia ideia que ele possuísse. — A


engenharia de software é outra paixão.

— Uau! — acabo soltando e me

envergonho dessa reação. — Como vai


ser o nome da tela? — pergunto para

disfarçar.

— Não tem nome ainda. — Ele

me esboça um sorriso de canto de boca

e volta a me fitar.

Dessa vez, não desvio os meus


olhos de Eric. Então, me recordo do
fetiche de Edgard, que é provável que
ele saiba.

— Podemos fazer uma votação


entre os seguidores do ateliê. O que

acha? — sugere Rose a ele, alheia ao

clima esquisito desses breves instantes.

— Bom, está de parabéns, Eric,

mas preciso ir — digo num repente e

vou saindo do ambiente.

Despeço-me do Thomas e da
Rose, que me entrega um cartão do seu

ateliê, onde consta as redes sociais e


seus contatos.

— Por favor, me siga nas redes

e me ajude a convencer Eric de que ele

é um grande artista — pede Rose com

simpatia.

Apenas sorrio em

concordância, mas a minha vontade é


sair correndo dali.
Eric insiste em me acompanhar.

Digo que não é necessário, alego que


estava me exercitando, mas ele segue ao

meu lado assim mesmo.

Sinto-me incomodada, pois não

consigo esquecer que ele deve ter

ciência sobre as fantasias do meu

marido, e só Deus sabe o quanto me

envergonho.

— São três quarteirões —


ressalto com o intuito de que ele desista.

— Não se preocupe, não vou

até a sua casa — ele assegura, num jeito


despreocupado, caminhando ao meu
lado. — De forma nenhuma, faria ou

forçaria algo que não deseje, Safira.

De repente, as palavras de Eric

afogueiam o meu rosto.

— E por que... por que insiste


em retornar caminhando ao meu lado?
— questiono, após reunir todas as
minhas forças e confrontá-lo.

— É que quero te dizer algo.

Meu coração bate forte e

parece querer sair pela boca. Se for uma

cantada ou uma piada baixa, sou capaz

de explodir. Eric para e se agacha.

— Safira — ele me chama.

Sou tentada a aproveitar a

oportunidade e sair correndo, fugir


desse homem, como também de tudo que
sou. Entretanto, desisto e retorno até ele,
que me estende alguns pequenos ramos
com florezinhas azuis, mas eu não as
pego.

— Tome, elas me lembram os

seus olhos.

Estremeço, tensa.

— O que está tentando? —


pergunto, aflita, com a voz embargada.
— Relaxe, Safira, está tensa.

Não há motivo para isso. — Ele


comprime um lábio no outro e se
formam duas pequenas covinhas nas

laterais da boca. — Quero te dizer que


não é obrigada a nada. Me desculpe,

mas sou um sujeito observador e senti

necessidade de te falar isso... Você é

livre para escolher os seus caminhos,

ninguém ou quaisquer circunstâncias


podem te obrigar a fazer o que não
deseja. Você é livre, Safira, como os

campos de bluebonnet que existem por

todo o Texas.

Ele aproxima os dois ramos

com florezinhas de mim e, finalmente, as

pego.

— Eu... eu não sei o que quer

dizer — digo, com olhos pregados entre


as flores e o chão.
— Sabe. Mas, assim, está tudo

bem... se precisar de algum tipo de


ajuda, pode me procurar.

Apenas balanço a cabeça de

maneira afirmativa e não tenho coragem

de encará-lo.

— Obrigada — finalmente

respondo com um fio de voz.

Dou meia-volta e sigo solitária


o meu caminho de volta à minha prisão,
às grades invisíveis que me trancafiam

em um mundo pequeno e pobre, em uma


vida submissa e sem cores, em que o
prazer se transformou numa tortura, e eu
permito que meu marido atue como o

meu carrasco.

Eric é a primeira pessoa que

percebe que sou uma prisioneira e se

solidariza por isso. Só que, ao invés de


me sentir reconfortada, quero morrer por
isso. Não gostaria de estar me sentindo
assim, mas não tenho controle sobre
essa percepção.

Acho que, se fosse possível,

nunca mais na vida queria vê-lo outra

vez.

Passei o resto do domingo com

as palavras de Eric reverberando em


meu cérebro: Você é livre, Safira, como
os campos de bluebonnet que existem
por todo o Texas.

Ele tem razão. Tecnicamente eu


sou livre, mas não consigo dar um grito

de independência. Tenho a impressão de

que vou me afogar num oceano de

sentimentos: culpa, medo e insegurança.

Enfim, as piores amarras são aquelas

que acorrentam a alma e escravizam o


coração. E são essas que carrego em
mim.

Outra vez pego o livro que

estou lendo e o abro. Acaricio as


pequeninhas pétalas azuis de um dos

ramos de bluebonnet que Eric me deu e

depositei ali. Uma parte de mim viaja


para perto dele, de suas covinhas

discretas, sorriso cativante e olhos

castanho-escuros, que brilham de um

jeito diferente.
Eric não é como os outros. Não

me observa com cobiça, apesar de ser


dono de um olhar forte e intenso. E o
mais esquisito, ele nem me conhece
direito e retirou o véu do que acontece

comigo, não sei como isso aconteceu.

Edgard nem pode sonhar.

Como conseguirei encará-lo

outra vez?

Edgard entra no quarto, e meu


coração dá um salto. Fecho rápido o

livro, escondendo os pequenos ramos.


Se ele encontrar as bluebonnet, vai me
torturar psicologicamente para descobrir
por que guardo as flores.

Edgard só admite que eu tenha

referenciais emocionais de coisas

ligadas a nós dois, ou de momentos em

que ele tenha feito parte.

— O que tem, Safira? Parece


que viu um fantasma — ele comenta.

— Não é nada, Ed. Só me

assustei mesmo — disfarço e me sinto


péssima, como se o estivesse traindo,
devido ao foco dos meus pensamentos

em Eric.

Ele estreita o olhar e segue

para o banheiro.

Talvez você deva estar


estranhando essa situação, visto que
Edgard me pressiona a ir para cama com

outro homem. Mas, na cabeça dele, são


situações independentes.

Edgard se sente envaidecido

por outros me desejarem e eu estar

vinculada a ele. Nunca consegui

compreender direito esse processo.

Desse modo, ele não admite que me

aproxime de homens que não seja com


finalidade de realizar os jogos sexuais,
em que ele está sempre presente.

Dentro de sua fantasia, transo,

fora dela, nem tenho amigos. De todas as


formas, ele tenta se manter senhor de
minhas emoções e, para isso, é

controlador ao extremo. Não foi à toa

que parei de trabalhar assim que nos

casamos, há três anos.

De início, fui permissiva, mas


as fantasias de Edgard já me destruíram
demais, só que não tenho forças para dar

um basta. Nem sei o que fazer de minha


própria existência. Não faço ideia do
que sou e nem do que me tornei.

Eu me perdi de mim.

Minha tormenta começou após

aquela terrível noite de verão, em

Itaparica. Se não tivesse bebido

excessivamente e ido dançar com


Gustavo, nada daquilo teria acontecido.
Edgard não teria se engraçado por

Luana, a namorada de Gustavo, e não


teria ocorrido a troca de casais que
resultou naquela tragédia.

Se isso não tivesse acontecido,

talvez Edgard não se tornasse tão

dependente de nós dois, talvez não

houvesse esse trauma nele...


Quinta-feira

A ridícula aposta sobre quem

levaria Safira para a cama primeiro,


com a supervisão e presença do marido

dela, segue a todo vapor. Anthony

Wilson e John Hill puxam o saco de


Edgard deslavadamente e riem dele
pelas costas.

Edgard não tem ideia de que

eles só planejam tirar proveito de

Safira. Eu me coloco como aquele que

põe gosto ruim. Não me agrada ver


aquela mulher linda e frágil à mercê das
piadas grosseiras e do descaso do seu
marido. Meu coração comprime diante
dessa situação. Sim, sou um sujeito um

pouco sensível, e a angústia que vi


estampada no rosto dela me incomoda.

Há quatro anos, rompi com

Samantha e meu coração ficou em

frangalhos. Foi no primeiro ano em que

vim para cá, quando ela preferiu


continuar no Brasil. Então, ela se
apaixonou por outro e eu fui o último a
saber. Nada justificou a sua falta de
coragem de me contar a verdade sobre

os seus sentimentos. Por fim, a iniciativa


de acabar o relacionamento foi minha.

Samantha queria meu perdão e

retomar a relação. Rompi mesmo a

amando. Sofri muito. Como doeu o fato

de pessoas conhecidas e amigas


saberem que ela estava com outro, um
sujeito casado, enquanto eu continuava
firme com minhas declarações à
distância, inclusive, em redes sociais.

Também por isso não me

agrada o comportamento de John e Tony

pelas costas de Edgard.

Por outro lado, não sou amigo

de Safira. Então, não sei como posso

ajudá-la, sem contar que ela se mostrou


arredia. Só que não consigo esquecer o
seu olhar, que parece suplicar ajuda em
silêncio.

Mas confesso que me sinto


atraído por Safira. Reconheço que isso é

péssimo, porém algo mexe em minhas

entranhas ao fitá-la. Ao me recordar

dela, eu a imagino na cama com suas

lingeries minúsculas, o que eriça meu

pau, ao tempo que a mente me condena.

Ontem, numa rápida parada


para o café, Anthony e John
cochichavam sobre o assunto. Como
estávamos a sós na copa, tentei ponderar

a situação e acho que tive um pouco de


êxito, ao menos com Tony.

— Não acham que aqui é um

lugar impróprio para conversar sobre

Safira e Edgard? — indaguei baixinho,

depois sorvi um pequeno gole do café


fumegante.
— Deixe de paranoia, Eric,

nem parece que é brasileiro. — Por


segundos, Tony se balançou, como se

estivesse sambando desengonçadamente.


— Não somos casados e nem estamos

oferecendo nossas parceiras — ele

argumentou de modo sério.

— Mas precisamos respeitar o

cara e os fetiches dele, como também a


esposa, que não age como se
concordasse com tudo isso.

— Agora Eric deu para se

colocar no lugar de Safira... — John


ralhou. — Afinal, ela lhe disse com

todas as letras que está sendo forçada?

— Ninguém me disse nada, dá

para notar. Só acho que deveríamos

considerar essa proposta de Edgard

como um devaneio e o ignorar. Vamos


seguir as nossas vidas.
— Vocês, brasileiros, são

esquisitos. — John riu. — Essa história


de Edgard se adequa ao lema dessa

cidade, mantenha Austin estranha[12]

— zombou ele. — Vão preparando as

mil e quinhentas pratas cada um, porque

quem vai foder Safira sou eu.

Ignorei a brincadeira pesada.


Fitei Anthony, que apenas comprimiu os

lábios.
— Alimentar isso não fica bem

para você, Anthony Wilson, que é nosso


chefe — disse a Tony. — Pense que, se

Safira fizer qualquer denúncia de abuso,


estamos todos no olho da rua e nunca

mais encontraremos uma vaga decente

em todo Silicon Hills[13] .

Anthony contraiu a testa, e seu


semblante se tornou sério.

— Reconheço que nisso você


tem razão, Eric — assegurou, ele de
maneira pensativa.

— Ela não prejudicaria Edgard


— John cochichou, sem que eu ou Tony

déssemos importância.

Então, nós retornamos para as

nossas estações de trabalho e, ao menos

diante de mim, eles não tocaram mais no

assunto.

Enfim, comecei a ter aversão a


Edgard.

A atitude dele não é a de um

homem sério, mesmo que eu compreenda


que casais possam optar por uma vida

sexual fora da caixinha e que, nesse

roteiro de aventuras, tudo é possível,

desde que seja uma decisão consensual

de ambos.

Contudo, se eu fosse casado,


nunca exporia a minha mulher a uma
situação surreal dessas, oferecendo-a
aos colegas de trabalho, como se fosse
um objeto qualquer, e muito

provavelmente contra a vontade dela.


Não sei o que move Safira, mas não

parece que é o desejo ou o prazer.

Sinto-me mal por ela. Desde

que a encontrei no domingo passado,

tive certeza de que ela é uma mulher que


carrega no peito questões emocionais
mal resolvidas.

Tive pena.

E tesão também! O gênio ruim

acaba de cochichar no meu ouvido.

Na verdade, pena e vontade de

protegê-la. O jeito que ela se desviava

do meu olhar e o pavor estampado em

suas feições, quando toquei o seu braço,

me cortaram o coração.

Não compreendo como uma


mulher como ela, que teve boa instrução,
se entrega a uma situação dessas! Não
entendo como as pessoas ao seu redor

não percebem que ela grita por socorro


em seu silêncio. Seus olhos suplicam,

seus gestos comedidos denunciam a sua

insegurança e receios, e a voz é

carregada por um temor cortante.

Cá entre nós, eu não consigo


parar de pensar nela desde o encontro
diante da casa dos Hoover. Eu me
impressionei com a sua beleza
anteriormente, mas ali eu a vi como um

cristal frágil, uma flor de pétalas


sensíveis.

Não alimento pretensões,

embora quisesse conduzi-la a algum

lugar seguro. Aliás, meu parceiro de

sala, Edgard, está sentado a poucos


metros de mim. Um sujeito que agora me
parece excêntrico e sem empatia.

Após essa proposta sobre

Safira, não consigo vê-lo mais como o


mesmo cara com quem criei uma

cumplicidade profissional desde que

começamos a trabalhar aqui. A

admiração pelo sujeito inteligente e

dono de um grau de concentração

estupendo caiu por terra.

— Anda calado demais, Eric


— ele comenta um tempo depois.

Nós dividimos uma sala, mas

trabalhamos com equipes diferentes. Eu


com o foco na engenharia; ele, na

funcionalidade das linhas de comando.

— Impressionado com certa

pessoa... — respondo como uma

indireta, mas não fui objetivo o

suficiente a ponto de Edgard se dar


conta de que falo dele.
— Tony falou contigo?

— Sobre?

— Ele nos convidou para um

fim de semana no rancho do primo dele,

em San Saba. O convite foi feito a todos

que foram ao churrasco, quer dizer,

quase todos.

— Ele não me falou nada,

talvez queira me deixar fora —


respondo, encabulado.
Pensei que minha conversa

tivesse surtido algum efeito.

— Lá, vamos ver o que rola —


ele acrescenta e me observa de um jeito

peculiar —, veremos como vai se dar o

lance da proposta. Minha mulher é muito

exigente, então, tudo depende dela. Vou

estar muito perto, vou permanecer muito

próximo.

Meu estômago embrulha e a


mandíbula trava. Tenho vontade de me
levantar da cadeira e acertar um soco
bem no meio do nariz de Edgard. Mas

apenas respiro fundo.

— Não acha que está se

expondo demais ao rifar a sua esposa?

— indago.

— Gosto de adrenalina. Eu e

Safira amamos aventuras perigosas e


esses jogos.
— Engraçado, Edgard, sua

esposa não tem jeito de quem gosta


dessas fantasias eróticas.

A feição dele muda e seu rosto

se embrutece.

— Do que a minha mulher gosta

ou não, quem cuida sou eu.

— Não acha que coloca em

risco a sua carreira?

— Eric, não quero me gabar,


mas, se perder esse emprego, terei outro
num piscar de olhos, em qualquer lugar
do mundo. Quem precisa se preocupar

com essa oportunidade na STW é você.


— Edgard me observa com olhos cruéis.

— Ainda não sei como conseguiu essa

vaga, ainda mais que só pensa em suas

pinturas.

— Eu me dedico muito e passei


por um exaustivo processo seletivo.
Estou aqui por mérito — rebato de
forma incisiva e volto a me concentrar
no meu trabalho.

Edgard, filho da puta.

Não passa de um sujeito

egocêntrico e insuportável. Só que,

infelizmente, ele tem razão, é quase um

gênio, e emprego nunca seria problema

para um profissional como ele.

— Só que se esquece de um
detalhe. No mundo atual, em que nossas
vidas são públicas devido às redes
sociais, uma reputação destruída é sinal

de fracasso em muitas áreas,


principalmente, profissional. — Tento

ser cirúrgico em minha colocação. —

Sou estou tentando abrir os seus olhos.

Edgard me observa com o

aspecto embrutecido e apenas levanta os


ombros.
Respiro devagar para me

acalmar.

As minhas paixões sempre


foram o trabalho com tecnologia e os

meus quadros. Sou observador e as

emoções e ideias às vezes fervilham. Ao

longo da vida, canalizo essa energia nas

tintas óleo e acrílica, entre os meus

pincéis e nas telas de linho ou algodão.


Aprendi com a minha mãe, que é artista
plástica.

Quase dois anos depois de me

formar, aos 24 anos, vim fazer uma pós-


graduação na University of Texas e

trouxe o sonho tanto de crescer na área

de tecnologia, como de tentar

oportunidades para as minhas telas.

Então, fui ficando aqui, em Austin.

Cheguei com o visto de


estudante. Ainda assim, consegui alguns
trabalhos aleatórios que fazia de casa.
Até que passei no exaustivo processo de
seleção da STW Tecnologia e obtive o

visto de trabalho. Foi aqui que


reencontrei Edgard. Atualmente, estou a

poucos passos de conseguir o green

card[14] .

Ao tempo que trabalhava na


área de tecnologia, comecei a expor os

meus quadros em espaços minúsculos e


conheci os Hoover. Enfim, hoje, com 30
anos, começo a colher os resultados dos
meus esforços. Ainda há muito a ser

alcançado, mas isso não dá espaço para


Edgard desdenhar dessa forma.

Bom, não quero me focar nele.

Estou muito ansioso com algo

que está acontecendo na minha vida

artística, que pode significar uma grande


virada. Vendi um quadro por um valor
bem razoável e, em duas semanas, terei
dez telas expostas numa galeria de Nova
York.

Quando me dou conta, já é

noite. Na mesa próxima, Edgard arruma

a sua mochila para ir embora e me fita,

desconfiado.

— Cara, me desculpe pelo que


disse mais cedo. Não deveria ter sido
rude contigo — ele expõe de modo
calmo, com olhos estreitados.

— Tudo bem. — Diante de seu


tom sincero, sinto uma ponta de culpa

pelos pensamentos ruins que alimento

sobre ele.

— Quer carona?

— Não, obrigado. Vim de carro

— respondo e começo a finalizar os


programas do meu notebook.
É que, duas a três vezes por

semana, faço uma corrida de casa até a


academia aqui perto e, após o

expediente, retorno para casa de ônibus.

— Te espero para descermos

juntos — decide Edgard.

Arrumo minhas coisas e saímos

da sala. Atravessamos as baias e

corredores da STW num silêncio meio


incômodo. Descemos o elevador do
Barton Creek Plaza, conversando sobre
a previsão do tempo, há uma chance de
um temporal atingir a região no fim de

semana. Passamos pelo saguão, rumo à


saída de acesso ao amplo

estacionamento arborizado.

— Ed! — De repente, Safira

surge em nossa frente.

Ela fita o marido, mas


sorrateiramente seus olhos focam nos
meus, e meu coração dá um salto brusco.

— O que faz aqui, Sah? —

pergunta Edgard, um pouco assustado.

— Eu, eu... estava no shopping,

no Brodie Oaks, e resolvi fazer uma

surpresa, quando me disse que ainda

estava no escritório — responde, um

pouco embaraçada, e depois se volta

para mim. — Como vai, Eric? — ela me


cumprimenta e estende a mão com
simpatia.

Retribuo o gesto e sinto a

palma macia de Safira e seus dedos


longos e frágeis pousando sobre o dorso

da minha mão. Sorrio e pisco

discretamente para ela, que usa um

vestido sóbrio, mas que revela suas

longas pernas de panturrilhas delineadas

e o quadril sedutor, que dá seguimento à


cintura fina e convidativa a carícias.
Tenho dificuldade de desviar o olhar.

— Não me disse que iria ao

shopping! — Edgard comenta.

— Contei, sim, disse que iria

sair à tarde. — Safira está visivelmente

inquieta.

Vamos caminhando lentamente.

— Ah! A novidade é que vamos


passar o fim de semana num rancho, há

quase duas horas daqui, no condado de


San Saba. Vai adorar, vamos passear de
caiaque e ir a uma queda d´água. Por lá,
passam dois rios: o San Saba, que se

encontra com o Colorado — informa


Edgard.

Pelo canto do olho, presto

atenção à reação dela.

— Ma... mas... — ela balbucia

e é atropelada pela fala do marido.

— Irão todos que estiveram no


churrasco lá em casa.

— Está bem — ela responde,

convencida.

Ia dizer que nem fui convidado,

mas Edgard parte na frente, em passos

largos, e ela volta a me observar.

— Escute o seu coração, Safira

— sussurro, sem pensar, e a fito.

Arrependo-me. E, ao mesmo tempo,


gostaria de gritar: não se deixe dominar
assim, Safira! Edgard não é o seu dono.

Mesmo com a pouca luz,

devido ao horário, vejo os músculos da


face se contraírem como se fosse dizer

algo.

— Safira! — Edgard a chama,

já diante do veículo deles.

— Tchau, Eric. — Ela observa

o chão. — Obrigada pela força, mas


meu coração é um pouco bandido — ela
diz, quase sem voz.

Nós nos entreolhamos

rapidamente e de maneira intensa. A sua


colocação sobre o coração me pareceu

meio dúbia.

— Tchau, Safira — digo e

aceno quando ela segue rumo ao carro

de Edgard.

De algum modo esquisito, o


meu peito comprime.
Sábado

Passamos por trechos de duas

autoestradas e avistamos algumas


pequenas cidades em paisagens tão

planas que meus olhos se perdem na

quase infinitude do horizonte. Minha


visão também alcança terras
avermelhadas, com árvores e plantações

espaçadas, alternando-se por outros

cenários acinzentados, de terras em tons

claros, de aspecto mais seco e com


arbustos sem folhagens.

O clima quente e úmido


perdura por quase o ano inteiro nessa
região. É metade do dia e o calor não
alivia, apesar do céu nublado. Quando

saímos de Austin, o céu aberto nos


acompanhou por pouco tempo, e nuvens

pesadas começaram a se acumular no

céu.

Agora estamos passando pela

cidadezinha de San Saba, considerada a

capital da noz-pecan[15]. Deixamos para


trás um moinho de água, que me faz
lembrar de uma roda-gigante. Observo,
curiosa, da janela do carro. Tudo que

queria era parar, tirar uma foto e fazer


uma postagem na minha rede social de

poucos seguidores, porém não quero

pedir isso a Edgard.

Encanto-me com os sobrados

geminados[16], nos tons terrosos e com

construções em acabamentos em pedra.


Edgard reduz a velocidade, porque
também se interessa pela pequena
cidade, e abaixa o volume de sua

playlist.

— Bonitinho aqui, né?

— Ah, Ed, eu amei,

poderíamos parar um pouco.

Ele bufa.

— Sah, não viemos aqui

turistar e essas cidadezinhas texanas


são todas iguais. Quero logo chegar a
esse rancho. Todos já estão lá, só nós
que saímos tarde. — Ele faz um muxoxo.

— Se você não tivesse tido aquela crise


e me desestabilizado, teríamos acordado

mais cedo. — Ele me fita com um olhar

pesado e depois voltar a prestar atenção

na direção. — Amanhã, quando

voltarmos, paramos um pouco e tiramos

algumas fotos. Combinado?


Balanço a cabeça de modo

afirmativo.

A última construção que me


chama atenção é o imponente tribunal de

San Saba e suas inscrições: “From the

people to the people”, ou seja, do povo

para o povo. Não se pode dizer que

todas as cidadezinhas são iguais.

Percebo só alguns traços


semelhantes, como o de que os texanos
gostam de demonstrar orgulho por seu
Estado. É comum encontrarmos
residências e comércios com a bandeira

do Texas e, às vezes, a texana e a


americana, hasteadas em suas entradas.

Edgard aumenta o volume de

sua playlist de novo. Aliás, durante o

trajeto, ele a manteve nas alturas e sei

que foi para evitar conversamos.


Tivemos uma discussão complicada
ontem à noite.

Eu me entrego às recordações

difíceis.

— Estou excitado, Sah, com a

expectativa de ser cortejada por vários

homens. Não faz ideia de como me sinto

— ele confessou.

— Ed, não consigo entender

essa fissura, que só aumenta. Mas eu


cansei disso — desabafei, nervosa,
sustentando o corpo com as mãos sobre
a mesa, assim que servi o jantar. — Me
causa angústia imaginar estranhos me

tocando.

— Eles não são estranhos, e

você poderá escolher qual peça do jogo

será nosso primeiro brinquedinho!

Levei a mão à cabeça. Pensei

em Eric, no seu olhar dirigido a mim.

— Ed, nós... nós estamos


doentes, não vê? Precisamos rever a
nossa relação. Não podemos basear a
nossa vida sexual na presença de uma

terceira pessoa.

Edgard se levantou zangado,

ignorando o prato de filé e batatas

assadas que servi para nós. Mas

continuei:

— Onde preciso desenhar pra


você entender que não sinto mais prazer
nisso? — gritei e saí da cozinha.

— Não te entendo, Safira! —

ele quase vociferou. — Sempre gostou


de ser desejada, de ser bajulada e de ser

cantada pelos homens — acusou. —

Sabe bem que eu não era assim, foi

você, com essa sua necessidade de

chamar a atenção, que me despertou

para esse mundo. E agora você não


gosta mais, só porque eu me realizo
dessa forma?

Nada lhe respondi. Dei-lhe as

costas e subi as escadas. Entrei no


quarto e me joguei na cama. Ele veio no

meu encalço.

— Safira, o que está

acontecendo com você?

Virei-me para ele.

— Como ainda não percebeu?

Podemos prosseguir o nosso casamento


de outra forma, Ed?

Edgard expirou de modo

pesaroso.

— Safira, eu preciso disso! Por

favor, por favor... — Ele mudou o tom e

implorou. — Eu te amo, você é a minha

vida, faço tudo por nós. Eu só te peço

isso. — A voz de Edgard saía calma e

carregada de emoção.

Naquele momento, fiquei aflita,


e aquela velha vontade de não existir
voltou a me perturbar. A culpa me
devastava. Edgard se sentou na cama,

ergueu o meu torso delicadamente e me


envolveu em seus braços, consolando o

meu choro.

— Me dê esses momentos, Sah.

Todo casal precisa de um bom sexo pra

viver e, para mim, só existe prazer


completo dessa forma — ele alegou.
— Precisamos da ajuda de um

profissional, Ed. Não somos um casal


normal, não fazemos sexo da maneira

apropriada... — constatei, com o rosto


enterrado em sua camisa. — Eu receio

não conseguir...

— Ah, cuidarei de você, não

vou te deixar beber tanto. E fazemos,

sim, sexo de maneira apropriada.

— Mas eu não sinto prazer


transando com um estranho na sua frente.
Não sou a mulher que você pensa que
sou — repeti, pela enésima vez. — Eu

finjo, represento como se fosse uma


atriz.

— Sou eu que vou te dar o seu

prazer, Sah. Só eu sei te dar o gozo mais

gostoso. — Ele costumava repetir

aquilo. — Veja bem, os candidatos a


nosso touro estão loucos de vontade de
te encher de prazer. Eles vão tentar,
você até vai gozar, mas os seus melhores
orgasmos são comigo. Não faz ideia da

satisfação que tenho ao ver esses


homens tentando ser pra você o que só

eu consigo... — Edgard me beijou

ardorosamente.

Rapidamente, ele tirou a minha

blusa e logo a sua língua tomava os


meus seios. Só os céus sabem como
tenho sensibilidade nos meus mamilos, e
Edgard conhece bastante do meu corpo.
Então, eu me entreguei ao meu marido e

à sua língua, que fizeram os meus


mamilos parecerem duas pedrinhas de

tão duros e eriçados.

Segurei a sua cabeça e fui

controlando o tempo em que ele ficava

nos meus seios. Quando meu sexo já


palpitava, clamando por carícias,
pressionei a sua cabeça para que
descesse. Obedientemente, Edgard
suspendeu a minha saia, desceu a

calcinha e fez um sexo oral barulhento e


voraz, atendendo aos seus pedidos.

Mais uma vez, Ed me venceu.

Após o sexo, fiquei sem argumento e me

deixei conduzir para essa loucura de

transar com outro homem.

A verdade é que Edgard me


manipula de um jeito que nunca consigo
o que quero. Às vezes, ele impõe os
seus desejos falando grosso; outras

vezes, se torna um garoto frágil e


submisso e me ganha no sexo oral, ao

permanecer horas me estimulando até

que eu tenha vários orgasmos. Ainda há

os momentos em que ele me chantageia,

ao me fazer recordar do que aconteceu

na casa de praia.
Há momentos que tenho a

impressão de que estou prestes a


desmoronar.

Enfim, ando pensando bastante

em Eric, em sua doçura, no olhar

acolhedor e jeito de quem sabe o que

acontece com a minha alma. Penso nele

mais que o adequado para uma mulher

casada e problemática como eu.

Nas minhas fantasias, Eric


passou a dar nome e rosto ao homem
com quem sonho acordada. Só de
reconhecer isso, meu rosto queima de

vergonha. Mas você sabe, muitas


mulheres, inclusive casadas, sonham

acordadas com um homem imaginário.

Eu sou só mais uma delas.

Confesso, se não fossem esses

escapes mentais, não sei se suportaria a


minha vida. Estou errada, tenho ciência
de que preciso encontrar uma forma de
não ser mais refém de Edgard. Mas olho
para os quatro cantos e não sei como.

Na quinta-feira, fui ao

escritório só para poder ver Eric. Agi

de forma impulsiva, sabia que não iria

poder conversar com ele. Mas precisava

sentir outra vez o calor de seu olhar

sobre mim, só para ter certeza de que


ele é real e não apenas fruto da minha
imaginação.

Ali tive certeza de que ele

carrega algum tipo de consideração pela


pessoa que sou, e não pelo que carrego

entre as pernas. “Escute o seu coração”,

ele falou. E, como uma imbecil, eu

respondi que meu coração era um

bandido, quase nunca era escutado.

Imagine se eu fizesse tudo o que os meus


sentimentos desejassem! Ia ser uma
loucura, Eric.

Olho para a estrada, em direção

ao rancho, e meus olhos se deparam com


um lindo campo de bluebonnet.

Só não estou mais desesperada

porque sei que vou encontrar Eric hoje.

Posso escolhê-lo, se Edgard

cumprir com a palavra de me deixar

decidir. Assim, poderia sentir o seu


corpo em mim, o peso do seu olhar, a
densidade de seus toques, conheceria o
seu cheiro e o teria impregnado em mim.
Com ele, certamente não esfregaria a

minha pele após o ato, como já fiz outras


vezes.

Penso, um pouco empolgada,

mas logo entristeço.

Não, concluo que não poderia

escolher Eric, porque isso destruiria os


meus sonhos, e eu preciso de sonhos e
ilusões para sobreviver. Receio tomar
pavor dele para o resto da vida.

Porém, posso tentar conversar


com ele. Quem sabe, poderemos falar

sobre os seus quadros e seu amor à

pintura? Sim, esse é um assunto que

posso iniciar sem que me sinta

constrangida. Só de pensar num

hipotético diálogo com Eric, meu


coração bate um pouco diferente e a
garganta contrai.

No entanto, não compreendo

como ele pode ser um pretendente a


touro, se parece observar a minha alma

pela janela. Não consigo associar o

Eric artista, que me dirigiu palavras tão

carregadas de solidariedade, com a

imagem de um homem que deseje ir para

cama comigo só para foder a esposa do


amigo.
Não, ele não faz esse tipo. Não

quero pensar que Eric tenha dito que sou


livre como os campos de bluebonnet,

numa tentativa de ganhar a minha


confiança e obter algum favor sexual.

Pergunto-me sobre o que um

homem pensaria de uma mulher que se

sujeita ao que eu faço.

Poderia me considerar de
maneira positiva uma mulher de espírito
livre, dona de si e de sua sexualidade,
como dizem os moderninhos; ou, de
forma machista e conservadora, me

acusaria de ser uma safada e vagabunda,


uma mulher sem valor.

No fundo, não tenho lugar nesse

mundo cheio de rótulos, pois não sou

nem uma coisa e nem outra. Sou apenas

uma mulher atormentada e solitária.

Tento afastar esses


pensamentos. Afinal, não sei o que farei
essa noite.

Algum tempo depois, chegamos


ao rancho do primo de Anthony Wilson.

Trata-se de uma área rural bem cuidada,

com lindas nogueiras ao redor.

Passamos pelo pórtico de entrada com

as inscrições “Tierra do Oro Ranch”[17],


em seguida surge um curral amplo com

alguns bovinos com longos chifres e isso


me impressiona, pois nunca vi do tipo
no Brasil.

Adentramos mais no terreno e


avistamos uma imponente casa com

paredes de pedra, avarandada e com um

pequeno lago diante dela. Edgard vai

reduzindo a velocidade e algumas

pessoas saem da casa para nos

recepcionar.

— Ah! Todos estão aí... —


Edgard constata com entusiasmo.

Observo, ansiosa, mas só vejo

Anthony, John e um casal desconhecido,


sem nenhum sinal de Eric.

— Eu não vejo o Eric... —

deixo escapulir entre os lábios. — Nem

Tabata e Henry, nem Kimberly e

Rodrigues — completo em seguida.

— Nem Eric, nem os outros


virão, Tony não os convidou — Edgard
revela, ao parar o carro e desligar o
motor.

Essas palavras são como


pontapés desferidos na boca do meu

estômago. Paraliso, sem conseguir

digerir.

— Safira!! — chama Edgard e

o observo, petrificada. — Vai ficar

parada aí dentro? Desça, amor.

— Disse que todos do


churrasco viriam — cobro e me sinto um
pedaço de carne prestes a ser jogado
aos leopardos.

Um trovão explode no céu

cinzento e pesado. Assusto-me.

— Somos hóspedes, e não

anfitriões. Tony decidiu assim de última

hora.

Fecho os olhos e saio do carro,


ainda assustada.
Logo Anthony se adianta e

estende a mão.

— Como vai, Safira?

Eu retribuo a saudação, e ele

pega a minha mão e a leva aos lábios.

Meu estômago embrulha.

— Bem e você, senhor Wilson?

— respondo.

— Por favor, Anthony ou Tony,

como preferir. — Ele estreita o olhar,


usando um charme que me causa repulsa.

Em seguida é a vez de John,

com seus olhos azuis repulsivos.

— Senhora Klein, como vai?

Acho que mais uma vez vou caprichar

num churrasco para nós — John diz e

pisca. Retribuo com um sorriso amarelo

e falso.

— Ah, a sua especialidade é


carne vermelha, senhor Hill? Prefiro as
carnes brancas, é uma pena — comento
falsamente.

— Tenho certeza de que vai


apreciar a costela de porco que estou

preparando — continua ele, mais

contido.

Edgard os cumprimenta como

se fossem os melhores amigos do

mundo. Anthony me apresenta ao seu


primo, Jonas Wilson, e sua esposa,
Guadalupe, que formam um casal de
meia-idade.

— Mas que linda!! Muy muy


[18]
guapa — elogia Guadalupe, de

maneira calorosa, e eu sorrio, tentando

demonstrar contentamento. — Pode me

chamar de Lupe — ela, que tem

ascendência mexicana, continua.

— Sim, nosso amigo Edgard é

um homem de sorte — comenta John, e


percebo seus olhos percorrerem meu
jeans skinny, a regata branca e o casaco
amarrado na cintura: um look nada sexy.

Não consigo prestar atenção em

nada do que dizem, de tão decepcionada

que estou. Finalmente, Edgard

acompanha os homens e segue para

interior da casa.

— Temos uma edícula, venha.


Os rapazes vão ficar na casa principal,
mas fazemos questão de que você e seu
marido tenham uma estadia confortável e
privada.

Um gelo sobe pela coluna.

Deve ter sido um pedido de Anthony ao

primo, para que fiquemos distantes.

Apanho minha pequena maleta

de viagem de rodinhas e a mochila de

Edgard. Então, Lupe e eu seguimos


andando e conversando trivialidades.
Passamos pela lateral esquerda da casa
maior e logo avisto uma pequena
construção parecida com uma cabana,

bem mais recuada.

Após andarmos uns duzentos

metros por um caminho de placas de

cimento, chegamos até a pequena

varanda. Lupe abre a porta e me convida

a entrar. Há uma minúscula sala e


cozinha conjugadas e uma porta de
acesso ao quarto, para onde seguidos.
Ao entrar, finalmente descanso a
bagagem no chão. Trata-se de uma suíte

com uma cama em dossel, torneada em


madeira escura, duas mesinhas com

abajures com as cúpulas creme, que

estão dispostas em cada lado.

Meus sentidos estão realmente

voltados para o aperto no peito e o


amargor na garganta.
— Coloque suas roupas aqui.

— Lupe indica um armário embutido, de


duas portas, no mesmo tom do restante

dos móveis.

Apanho a bagagem e as levo até

o armário. Agradeço a Lupe pela

gentileza e as guardo.

— Parece que vai ter temporal,

não viemos num bom dia. — Tento puxar


algum assunto, enquanto vou até a
janela, e sinto a pressão do vento, que
passa pelas frestas e uiva.

— Não se preocupe, amanhã


teremos um belo dia.

Saímos do quarto, apanho a

chave e retornamos para casa principal,

na qual a mulher faz questão de me

apresentar os cômodos. É uma

construção dos anos 1960, que foi


reformada e conta com três quartos no
andar superior. Já no inferior, estão uma
ampla sala de estar e uma sala de jantar
com oito lugares, quase conjugada à

cozinha. Os móveis são rústicos; e a


decoração, típica da região dos caubóis

texanos.

Conversamos sobre

amenidades, enquanto sou consumida

por meu cérebro. Duas coisas me


incomodam: a ausência de Eric e a
maneira como reagi ao descobrir que ele
não viria.

Lupe, então, me conduz ao


varandão coberto, no fundo da

construção, onde há uma churrasqueira,

e logo avisto Edgard, que sorri, de

maneira animada, com Anthony e John,

além do senhor Wilson, enquanto eles

comem e bebem. Reviro os olhos.

— Venha, venha almoçar —


convida Lupe.

— Ah, preciso ir ao toalete

primeiro e já encontro vocês.

Lupe me indica o banheiro

social, no andar inferior. Vou a passos

largos até ele e me tranco. Fito a

torneira e logo lavo as minhas mãos e o

meu rosto, esfregando-os bastante, até

despertar dor na minha pele. Quando me


sinto satisfeita, miro o espelho e vejo
minha dor latejar sobre a pele
avermelhada.

— Como pode ser tão idiota,


Safira?! Achou que tinha encontrado um

aliado ou que Eric fosse te tirar dessa

situação, sua tonta? — digo para mim

mesma, bem baixinho, e meus olhos

umedecem. — Ele não é o homem dos

seus sonhos.

Na verdade, Eric só me dirigiu


algumas palavras, e minha mente
traiçoeira o transformou em meu
salvador.

A única pessoa que pode te

salvar é você mesma, Safira. Dê um

pontapé no traseiro de Edgard, volte

para o Brasil e tudo estará resolvido!

Um ínfimo pedaço da minha

mente e coração quer que abandone


Edgard. Só que a maior parte de mim
não tem forças para lidar com a culpa.
Eu o machuquei e é irreversível.

Por outro lado, um buraco se


forma no meu peito, porque não verei
Eric. E o pior de tudo é que terei de
enfrentar um homem entre minhas pernas
hoje à noite.
O dia ensolarado e os campos

floridos provocam calma e paz aos


sentidos, que são percepções diferentes
das que carrego no peito. É que concluí

o quadro das casas brancas, no meio de


uma paisagem arborizada e tomada por
bluebonnet, que fiz dentro do meu

projeto com Rose Hoover.

Olho para ele e só consigo me

recordar de Safira e do dia em que ela

viu essa pintura. Quero batizar o quadro

de Sapphirus, que significa safira em


latim, mas acho óbvio demais e receio
que associem à esposa de Edgard.

A tela sob o cavalete está no

processo de secagem enquanto preparo


o tecido para o meu novo trabalho.

Passo um substrato com a finalidade de

proteger as fibras do linho cru, preso na

estrutura de madeira. Diante desse

vazio, do branco que vai surgindo sobre

o tecido, tenho ânsia de fazê-la explodir


numa profusão de cores, expressões e
sensações que possam reportar como
estou me sentindo nesse exato instante.

Enquanto trabalho, a dúvida me


devora.

No fim do expediente de ontem,

fui comer algo num food truck com o

pessoal do trabalho. No final, acabei

batendo um papo mais sério com

Edgard, que me contextualizou sobre os


jogos sexuais que gosta de jogar com a
esposa.

— Você é meu amigo, Eric.

Não quero que existam rusgas entre nós,


como aquele mal-estar que aconteceu

ontem. Quero que fique bem claro,

Safira gosta desses fetiches. É uma

forma de ela se soltar mais, porque a

minha mulher é muito tímida. Estou

longe de ser um abusador.

Arqueei as sobrancelhas.
Apanhei um taco e devorei, enquanto me

mexia inquieto, numa das cadeiras das


mesas dispostas ao redor do espaço do
food truck.

— Não é de minha conta as

motivações de vocês sobre esses jogos

eróticos, mas temo que essa questão, que

diz respeito à sua intimidade, se espalhe

pelos corredores e grupos de mensagens


da STW — disse.
— Não sou um vilão, Eric. A

alma humana é muito vasta para que nós


nos enquadremos em rótulos. Aliás, o

mundo está ficando chato pra caralho,

cheio de bolhas que parecem carimbar


em nossa testa o que somos e quem

somos — ele argumentou. — Não acha?

— Não tenho uma visão

preconceituosa ou limitada, Ed. Não


pense isso de mim — respondi. — Mas
penso que esse jogo tem que ser jogado
por ambos. Por outro lado, eu me sinto
um pouco estranho com essa

possibilidade de conhecer algo tão


íntimo de vocês.

Edgard gargalhou.

— Confio em vocês. Além de

que Safira e eu curtimos esses jogos há

muito tempo. — Ele bebeu um gole da


cerveja e me encarou. — Sou apenas um
sujeito com gostos diferentes,

principalmente no que se refere ao sexo.


É que sinto um tesão desmedido em

saber que tenho algo que é cobiçado. Eu


tenho Safira e a trago na palma da mão.

Saber que ela é desejada por outros

machos e vê-la com eles me conduz a

lugares... Enfim, entendeu, Eric?

Eu me incomodei com a
afirmação de que a tem na palma da
mão. Sou dominador na hora do sexo,
ainda assim procuro os consentimentos.
E, fora de quatro paredes, prezo pelo

respeito sempre. Mas, diante das


certezas de Edgard, eu me senti um

completo idiota por ter me melindrado

por Safira.

— Nunca imaginaria que

Safira... — comecei a falar e, em


seguida, me calei, sob o olhar atento de
Edgard. — Realmente, ela parece ser
tímida e surpreende ao ser adepta desses
jogos — concluí com dificuldade.

Afinal, quem era eu para

confrontar o marido de Safira e afirmar

que ela parecia estar sendo forçada? O

que iria argumentar? Que os olhos dela

são um pedido de socorro? Que vejo

súplica no semblante dela?

Mesmo se caísse nessa


armadilha idiota, teria que revelar essa

mínima cumplicidade de olhares e frases


curtas trocadas que há entre nós. No

fundo, nem existe explicação racional


que justifique essa minha intuição ou que

prove esse meu ponto de vista de que

ela é forçada. Seria capaz de Edgard

imaginar coisas a meu respeito e de

Safira também.

Além do que, a verdade é que


desconheço a realidade do casal. E a
própria Safira me assegurou que o seu
coração é bandido, ou seja, traiçoeiro.

Talvez nem tudo seja o que parece.


Muito provavelmente eu sou um

completo tolo.

— Vou te explicar, eu não me

sinto humilhado em ver a minha mulher

fazendo sexo com outro — esclareceu


Edgard. — Pra mim, é algo
extremamente erótico. É uma espécie de
traição controlada, sob o meu
consentimento, porque estou presente e

eu escolho os parceiros que ela vai ter.


Sei que é meio louco para o cara que

não curte, mas só estamos fora da

caixinha nesse quesito. No mais, somos

um casal normal, que se ama, briga e

quer continuar juntos.

Suspiro.
Aquelas explicações de Edgard

me parecem plausíveis. Minhas dúvidas


sobre Safira se assentam na mente, mas

meu coração se nega a esquecer seu

jeito frágil e olhos entristecidos. Só que


a confluência dos fatos, tanto pelo

argumento de Edgard, como pela última

frase dela dita a mim, indica que as

minhas percepções estão erradas.

Safira deve compactuar com os


desejos do marido e essa deve ser a
forma de eles serem felizes. Não sou
amigo dela, nem ela me pediu ajuda.

Ainda assim, me sinto culpado por estar


aqui pintando e saber que ela está

jogada no covil de predadores sexuais,

como Anthony e John, com total apoio

do seu marido.

Termino de aplicar o produto


na nova tela, limpo a mão no pano e sigo
para a janela. Tiro a máscara e respiro o
ar que entra numa rajada de vento. Olho
o céu cinzento e pesado que se formou

sobre Austin. Recebi algumas


mensagens de texto de alerta de

temporal. É que uma tempestade tropical

vem do Caribe. Fecho a janela.

O estúdio em que moro está

uma bagunça. É um pequeno apartamento


de 40 metros quadrados, com uma sala,
que transformei em ateliê, cozinha e
quarto integrados. Preciso limpá-lo
enquanto as telas secam, mas não é bem

isso que os instintos mandam que eu


faça.

Hoje pela manhã, Tony me

ligou.

— Bom dia, cara, John e eu

estamos na estrada em direção a San


Saba.
— Ah, boa viagem pra vocês

— disse.

— Cara, não queria te deixar


de fora, mas você está mais para um

cagão estraga-prazeres. Não entendi

muito a sua posição. Pense! Edgard está

oferecendo a mulher porque confia em

nós. O que podemos fazer a respeito,

senão a vontade dele? — Escutei aquilo


e revirei os olhos com essa visão de
macho comedor.

— Acho que Edgard é um

colega de trabalho e talvez não


devêssemos lhe dar ouvidos — repeti.

Mesmo pelo telefone, percebi

Anthony bufar.

— Bom, fizemos uma aposta,

você está dentro, e ela está valendo. Vou

te enviar a localização do rancho, mas


só apareça se for para disputar Safira.
Se for para ficar nessa conversa mole de

que Edgard está doido, nem pegue


estrada. De todo modo, vindo ou não,
terá que pagar a aposta.

Suspirei fundo.

— Está certo, cara.

— Vai perder mil e quinhentos

dólares sem ao menos tentar? Outra

coisa, falei com Edgard, ele está com as


suas faculdades mentais em ordem.
Apenas quer realizar a fantasia, e a

esposa dele também gosta dessa putaria.


Ele foi duro e claro em certo aspecto...

Tony parou um pouco, como se

estivesse recordando de algo e

continuou:

— Após uma noite, devemos

esquecer Safira e essa história. Não tem

segunda vez pra ninguém. Ele disse que


confia muito em nós, por isso nos
envolveu. Edgard está muito consciente

do que quer. Mas, se perder a aposta,


não fique triste, você terá a sua vez —

Tony zombou no final. — Porque hoje


ela é minha.

Escutei uma algazarra e

gargalhadas, era John que gritava:

— Nada disso, irmão. Quem

vai ganhar essa aposta sou eu.

Em seguida nos despedimos, e


ele me enviou a localização.

Tentei ocupar a mente

concluindo a tela, mas meu cérebro dava


voltas e parava no mesmo lugar: em

Safira.

Não gostaria de disputá-la, nem

de levá-la para cama diante de seu

marido. Porém, não sou santo. É claro

que aquela mulher linda mexe com os


meus desejos. E a oferta de Edgard, com
a proposta, me provoca, se penso só

com o meu lado predador. Ainda mais


após tê-lo escutado, pois criou uma zona

de segurança com relação a essa


aventura.

A tentação é imensa, mesmo

que o jeito dela e a sua insegurança

perturbem os meus instintos. Não vou

negar que, se não a tivesse encontrado


diante da casa dos Hoover, tão
vulnerável, muito provavelmente já
estaria no rancho, neste exato momento.

Confesso que aqueles parcos


momentos mexeram comigo de alguma

forma. Sou um homem e não um banana-

otário. Vi as curvas de Safira

desenhadas primorosamente naquela

calça apertada, em que derraparia com

muita facilidade. Consegui disfarçar,


mas também babei por seus seios
redondos e firmes sob a blusa, onde o
seu vale aparecia parcialmente, e eu
poderia mergulhar a minha língua e me

afogar de tesão.

Só de me recordar do nosso

encontro no condomínio, alguém começa

a se movimentar dentro da minha cueca.

Safira vem permeando as minhas

fantasias eróticas, e tem sido muito bom.

Se ela me escolher e eu ganhar


essa aposta cretina, poderia tirar essa

dúvida da cabeça sobre ela ser coagida


ou gostar mesmo desses jogos eróticos.

Tudo é possível... e eu não

posso ficar sentado no sofá, absorvido

pelos pensamentos.

Então, tomo uma decisão

intempestiva. Comprimo os lábios.

Apanho o celular e vejo o relógio, são


15 horas. Vem chuva forte por aí, mas...
Abro o aplicativo de

mensagens e vejo a localização do


rancho.
Há cerca de duas horas,

começou a cair uma chuva fina, e assim


foram por água abaixo as programações
dos passeios no rio e na queda d’água,

além dos planos para montar a cavalo.


Para compensar, o senhor Wilson nos
colocou em seu jipe tracionado e nos

levou para conhecer o rancho, onde cria

gado, cavalos e cultiva nogueiras, que é

tradição na região.

Quando retorno do passeio,

vejo um novo carro estacionado diante


da casa. Fico apreensiva. Só pode ser
Eric!

Entro na casa com o coração

palpitando de ansiedade. Mas, ao entrar


na sala, Lupe me apresenta a duas

moças, Lucy e Helga, que acabaram de

chegar. Elas são amigas de Anthony,

estão na faixa dos 20 anos, Lucy é uma

ruivinha com sardas nas bochechas, já

Helga é a típica americana de coxas


grossas.
Sinto-me como um balão

furado, que vai murchando aos poucos.


Interajo com Lupe e as garotas, que

contam serem universitárias, vivem em


Austin e conheceram Anthony na balada,

há algum tempo.

O senhor Wilson e Lupe são

bastante hospitaleiros, mas a simpatia

do casal e as conversas esfuziantes das


moças não me animam. Nesse meio
tempo, Lupe explica que, no fim da
tarde, ela e o marido vão para um
rancho vizinho participar de rodadas de

carteado e só retornam no fim do


domingo.

Logo entristeço, pois sinto a

pressão pelo que se dará à noite.

Procuro permanecer junto às mulheres,

no intuito de evitar aproximações dos


rapazes. Esses se mostram educados e
rondam a mim e às garotas, como felinos
diante de presas. Perguntam se quero
algo e me oferecem bebida.

Edgard observa esses

movimentos com olhos de águia. Sei que

isso faz parte de seu processo insano de

satisfação. Anthony e John tanto me

lançam olhares carregados de lascívia,

como também o bajulam, ao tempo que


me deprimo a cada segundo que se
passa.

Nesse momento, estamos no

fundo da casa, num varandão onde há


uma churrasqueira e que dá para um

descampado. Na lateral esquerda, mais

ao longe, também é possível acessar a

edícula. Não consigo olhar na direção

dos rapazes, se divertindo numa partida

de carteado.

— Safira, quando pretende ter


filhos? — pergunta Lupe, fazendo-me

acordar. Comemos tira-gosto e


bebericamos um destilado.

— É muito cedo — respondo e

apanho uma porção de tomates verdes

fritos.

A verdade é que eu e Edgard

não podemos ter um filho. E agradeço a

Deus por isso.

— Jonas e eu não queríamos ter


filhos no início também, depois fiquei

grávida do Peter, que agora mora em


Austin e estuda engenharia na University

of Texas — conta Lupe. — Hoje não sei


se a nossa vida teria graça caso não

tivéssemos tido o nosso Peter.

Sorrio com sinceridade, devido

ao jeito amoroso com que Lupe se refere

ao filho. Lucy e Helga se entusiasmam, e


Lupe mostra a foto de Peter no celular,
que é um rapaz bonito, e assim as
garotas dão rumo à conversa. Provo
mais um gole da bebida, que desce

queimando, e continuo a conversar.

Pouco tempo depois, Lupe e o

senhor Wilson se despedem e deixam a

sua casa para nós nos divertirmos, o que

me deixa mais desolada.

— Fique à vontade. Deixei o


jantar preparado no fogão. Adorei te
conhecer, Safira — Lupe diz e me dá um
abraço apertado ao nos despedirmos.

Após acompanhar o senhor


Wilson e Lupe até a picape e vê-los

partir, retorno para o fundo da casa e

permaneço ali, diante dessa chuva de

fim de tarde, como se fosse minhas

próprias lágrimas. Uma rodada do jogo

de baralho é finalizada e o barulho das


cadeiras no piso aumentam a minha
ansiedade.

Edgard vem até mim.

— Sah... — Ele se senta ao

meu lado e eu apenas o observo com um

olhar indagativo. — Sabe bem por que

viemos aqui — cochicha, ao tempo que

John e Anthony se aproximam, puxam

cadeiras e se abeiram de nós.

— Viemos passar um fim de


semana agradável com amigos —
retruco no mesmo tom baixo.

Após se acomodarem, John

puxa conversa e pergunta sobre a minha


família, enquanto não larga o copo de

bebida.

— Estão bem, só sinto muitas

saudades — respondo de modo

econômico.

— Safira tem duas belas irmãs


— conta Edgard, o que me desagrada.
Receio que os pensamentos

deles recaiam também sobre as minhas


irmãs. É que, em geral, a mulher
brasileira é vista de forma objetificada,

como se estivéssemos sempre

disponíveis para o sexo. Essa visão só

faz piorar a minha situação diante desses

homens.

Helga me faz algumas perguntas


bestas sobre o Brasil, e eu lhe respondo
prontamente. John conta que sua família
vive na Filadélfia e que ele mora em
Austin há cinco anos, por causa do

trabalho. Já foi noivo, mas o


relacionamento não vingou. Ele gosta de

praticar rafting[19] e de se exercitar.


Aos 32 anos, é um homem bonito, de

compleição forte e um jeito meio rude,


que cruza as longas pernas de forma

sedutora e máscula.
Nessa conversa, Anthony

também revela um pouco de si. Tem 34


anos, é divorciado, sem filhos e diz

amar o Brasil, onde já trabalhou por


certo período. Dono de expressivos

olhos verdes, ele possui um jeito


genuíno de homem poderoso e de

argumentos convincentes, que agradaria

a muitas mulheres.

Ainda assim, não consigo ter


empatia, mesmo diante da simpatia
deles, e também me incomoda o excesso
de animação das garotas. Lucy quase

não pisca em direção a John. Suponho


que os rapazes desejem que nós nos

sintamos mais à vontade, só que minha

respiração continua curta; e o coração,

sobressaltado.

Realmente, queria poder fitar


os olhos de Eric, que são uma incógnita,
o seu sorriso perfeito e amplo, além de
poder sentir o seu jeito de se fazer
presente. Só de me recordar da

frustração de não o ter encontrado, meu


coração aperta.

Helga e Lucy nos convidam

para novas rodadas de baralho.

Aproveito para dar uma desculpa e fugir

dali.

— Obrigada, meninas, mas


estou com um pouco de dor de cabeça,

vou aproveitar e me deitar um pouco —


despisto, sorrindo.

Fito o horizonte cinzento.

Edgard se levanta atrás de mim e

envolve a minha cintura. Os quatro vão

para a mesa de jogos.

— Vamos ser objetivos. Com

qual deles quer brincar hoje? — ele


sussurra em meu ouvido. — São homens
bonitos, educados e estão loucos por

você, completamente alucinados. Eles


me prometeram que vão se esforçar

muito para te dar uma noite cheia de


luxúria... — Edgard beija a minha nuca

de modo sensual e arrasta os seus lábios

até atrás de minha orelha, causando-me

ondas de arrepios involuntários.

— Escolho nenhum, Ed —
respondo de modo incisivo.
Antes que ele proteste, afasto-

me em passos largos, tentando disfarçar


o efeito do álcool, e rumo à edícula.

Edgard me segue. Os pingos da chuva

fina caem gelados sobre a minha pele,


fazendo-me tremer. Mas sigo firme. No

meio do caminho, ele me alcança e me

gira para o encarar.

— Não é hora de fazer tipo —


ele fala entre os dentes. — Esses são os
melhores touros que conseguimos. São
homens com poder, bem-posicionados
profissionalmente e estão loucos por

você.

Num ato impensado, eu o

empurro.

— Que porra é essa, Safira?!

— ele reclama. — O que está

acontecendo contigo? Pensei que estava


tudo bem. Ontem você cedeu e aceitou
vir.

— Nada, só estou sendo eu —

admito com dificuldade. — Desculpe.

Ele passa a mão no rosto.

— Sabe bem dos meus

sentimentos, sabe o tanto que te amo. Só

espero que aja de modo coerente, está

bem?

— Ama? Você me ama? Quero

ter certeza de que escuto isso! —


Balanço minha cabeça em negação, já
um pouco afetada pelo álcool. — Que
merda de amor é esse?

Lágrimas se misturam com os

pingos de chuva. Voltamos a caminhar

em passadas largas. Logo alcançamos a

varanda da pequena cabana e sacudo os

meus braços molhados.

— Estamos nos destruindo,


Sah. Estamos em crise.
Abro a porta e, em seguida,

volto-me para Edgard.

— Não, você tem me destruído


— alego, trêmula, com o coração

comprimido pelo medo. — Abri mão de

minha carreira... me... me forcei a gostar

de sua promiscuidade — acuso, com

dificuldade. — Ma-machuquei a minha

alma, banalizei o meu corpo. Tudo por


você, tudo porque nossa vida gira em
torno de você e suas vontades —
concluo num jorro e caio em prantos.

— Como é que é? Minha


promiscuidade? Mas nunca fomos

promíscuos. Fazemos jogos. Sempre

gostou de seduzir homens, Sah. Adorava

fazer isso na minha cara. Só não sei o

que lhe deu nos últimos tempos — ele

fala com brutalidade, depois me abraça


e procura meus lábios.
— Eu era uma adolescente

idiota! Amadureci, não percebe? —


Afasto-me dele.

— Eu te amo, nunca duvide.

Sou um homem morto sem você... — ele

diz e chora, ou finge que chora, nem sei

mais, nesse caos úmido, escorregadio e

tenebroso de nossa passionalidade.

Após Edgard se acalmar e sair


da cabana, tomo uma ducha, visto um

pijama. Assim, o efeito do álcool que


consumi mais cedo se dissipa de uma

vez.

A noite chega como um

assombro. A minha barriga revira e temo

o que está porvir.

Escuto a maçaneta virar, e

Edgard entra no quarto.

— Como está, Sah? Se sente


melhor?

Edgard está com uma bandeja

na mão e põe sobre a cômoda.

— Estou melhor, sim.

— Trouxe sanduíches e um

suco. Precisa comer algo.

Em seguida, ele vai até o

armário e mexe em nossa bagagem.

— Olha o que escolhi para


você! — Ele põe sobre mim um vestido
de cetim na cor vinho com detalhes em

renda. Não me mexo. — Vista e se


prepare, por favor. Essa cor faz um

contraste lindo com os seus olhos e

combina com o esmalte de suas belas


mãos.

— Daqui a pouco.

Ele se senta na cama, envolve-


me num abraço, aproxima o seu rosto do
meu ouvido e sussurra:

— Eu quero te ver hoje sendo

fodida. Quero e preciso.

Puxo o vestido e o abraço. A

culpa. Sempre ela que me convence a

ceder. Aquela noite de verão mudou

para sempre a minha vida e a de Edgard.

— Te quero linda. Coma algo,

para não passar mal. Vou preparar uma


bebidinha com muito amor pra você
tomar e, assim, estará finalmente pronta.

— Ele beija a minha testa. — Qual


touro prefere?

Suspiro. Levanto o tronco,

afastando-me um pouco de Edgard, e fito

o seu olho.

— Eric, eu quero Eric.

— Mas... — Edgard para por

alguns segundos, como se estivesse


pensando. — Por que Eric?
— Porque acho que ele vai me

foder melhor — respondo com olhos


desafiadores, dentro do jogo de Edgard.

— Se ele não chegar a tempo,

vou escolher eu o touro da noite!

Assinto e me levanto da cama,

na expectativa de que ainda há chance

de Eric aparecer.
Finalmente atravessei o pórtico

Tierra do Oro Ranch, da propriedade


pertencente ao primo de Tony, após
enfrentar uma viagem difícil em meio à

forte chuva no fim da tarde. Por duas


vezes, parei devido às condições
péssimas de visibilidade, o que atrasou

bastante a viagem.

Em alguns momentos, imaginei

que não conseguiria chegar.

Mas a minha dúvida diante da

situação de Safira empurrou-me a vir.


De uma vez por todas, preciso assisti-
lhe, com meus próprios olhos, participar

desse jogo erótico. Só assim poderei


virar a página dessa minha recente

obsessão, que surgiu desde que Edgard


fez aquela proposta.

Muitos me chamariam de louco

por me arriscar numa autoestrada do

Texas só por causa de um certo par de

olhos azuis, que me parece gritar em


apelo.
— Essa noite, Safira é minha!

Nunca estive tão dentro dessa aposta —


sussurro assim que estaciono o carro.

Ainda chove um pouco e alguns

trovões explodem no céu. Tony vem até

mim, segurando um grande guarda-

chuva. Desligo o carro, apanho a minha

mochila e a sacola com os vinhos e

destilados que trouxe e desço.

— Acaba de provar que é um


completo louco, Eric — reclama Tony.

— Deveria ter vindo pela manhã quando


te liguei.

— Não estou disposto a

desperdiçar mil e quinhentos dólares

sem usufruir nada — respondo.

Vamos para dentro de casa.

Apesar da proteção, acabo me

molhando. Deparo-me com John já


combalido pela bebida e vermelho como
um camarão. Encontro Helga e Lucy. Eu

já tive um rolo com Helga, uma loirinha


de cabelos ralos e sorriso fácil.

— Só assim para te

reencontrar! — Ela vem até mim e me

abraça de forma afetuosa. Lucy, uma

ruiva de curvas charmosas, também me

cumprimenta e apanha a sacola com as

bebidas de minhas mãos.

Anthony me indica um dos


quartos e também onde há toalhas

limpas. Subo as escadas da charmosa


casa texana. Tomo um banho e me

preparo, já pensando em estar agradável


e interessante para a esposa do meu

amigo. Estou ansioso para vê-la.

Preciso confessar que a

proposta de Edgard e a aposta dos

amigos viraram a minha cabeça pelo


avesso e só consigo pensar nessa louca
possibilidade diante de mim. No
primeiro momento, achei-a absurda. Em
seguida, saí na defensiva de Safira,

porque associei o seu jeito tímido a uma


forma de renegar a oferta do marido.

Na estrada vindo para cá,

refleti que esse meu comportamento só

existiu porque não quis admitir que

fiquei tentado pela proposta. Coloquei a


ética na minha frente e achei que Safira
estivesse sendo exposta pelo marido.
Mas quem sou eu para questionar?

A verdade é que não quis


entregar os pontos de que eu quero ser o

escolhido, que gostaria de tê-la entre os

meus braços, nem que seja por uma

noite.

Quando desço de volta à sala,

encontro Edgard, mas não vejo Safira.


Vou até a cozinha e preparo um pequeno
sanduíche com uma suculenta fatia de

carne para forrar um pouco o estômago.


Conversamos um pouco enquanto

preparamos os aperitivos da noite.

Anthony liga o som e estimula

Lucy e Helga a se arrumarem. É como se

esse fosse o sinal do que estaria prestes

a acontecer. Sirvo-me de uma dose de

um dos vinhos que trouxe e olho o


horizonte, a chuva dá uma trégua.
Da cozinha, seguimos para o

varandão no fundo da casa. Ansiedade é


algo que me define. Puxo uma cadeira na

mesa e me sento ao lado de Anthony e

John.

— Então, Edgard, e a aposta?

— indaga Tony.

O sorriso dele para Tony

parece sombreado por um prazer


estranho. Fico apreensivo, pois não sei
se Safira sabe que estou aqui.

— Estou tão ansioso quanto

vocês, mas é meu jogo e minhas regras.


— Ele arqueia as sobrancelhas.

— Correto, Ed, deixou isso

claro para nós — pontua Tony.

— Há dois pilares que

norteiam as minhas aventuras. Um deles

é a discrição e a segurança, convidei


vocês, pois confio. O outro pilar é o
respeito. Safira é a mulher que mais

respeito e considero na face da Terra e


quero que a respeitem também. Aliás, eu

já tinha tocado nesse assunto com vocês,

Anthony e John, só não tinha falado com


Eric. — Ele me fita.

— Nunca viria se não

encarasse isso como um momento de

troca respeitoso — expresso de modo


sério.
Então, Edgard pousa os olhos

em John.

— Por isso, amigo, você está


fora. Está bêbado demais para Safira.

Acho que não entendeu o espírito da

coisa — disse ele, de modo sério.

— Pô, irmão, como assim? —

John demonstra insatisfação.

— Isso não é algazarra, cara.


Acha mesmo que sujo e cheirando a
álcool eu iria permitir que tocasse na

minha esposa? Não é assim que as


coisas funcionam — Edgard se impõe e

se levanta. — Vá tomar um banho e


curtir com as garotas que vocês

trouxeram — aconselha. — Essa noite,

você já está fora do páreo.

— Tudo bem, vou tomar banho

e vou ficar novinho. — John se levanta


cambaleante.
— Mesmo que se recupere,

perdeu a vez hoje — acrescenta Edgard


para John, que faz sinal de legal

enquanto segue em direção à escadaria.

Logo penso, um a menos nessa

disputa.

— Com quem ela interagir, será

o escolhido. Quem ficar de fora do jogo,

respeite o nosso espaço. Mais adiante,


terá a sua chance se ela topar — adverte
ele. — Lembrem-se, isso aqui não é um

negócio do Silicon Hills, nem é


safadeza. Isso aqui é intuição, são

possibilidades e ida a extremos sem


banalização. É uma porta que se fecha e

outra que se abre. Se trata apenas de ir

além das convenções sociais. Vive-se e

se esquece depois.

Então, Edgard se levanta e diz


que vai buscá-la.
No fundo, acho que tenho

chances. Aquele encontro diante da casa


dos Hoover nos aproximou.

— Tony, caso seja você o

escolhido, seja gentil — peço.

Ele sorri de lado.

— É claro, eu sempre quis algo

assim, extrapolar limites estipulados

pela sociedade, mas, cara, estou nervoso


— ele confessa. — Nunca passei por
uma aventura dessas!

Sorrio aliviado.

— Também estou bem tenso e

ansioso — revelo a minha fraqueza. —

Mas confesse que embebedou John para

que ele ficasse fora do jogo, pensando

que a aposta estava ganha — pilherio.

Tony gargalha, em seguida, ele

me chama para escolhermos a playlist e


também arrumarmos os aperitivos e as
bebidas. Afastamos as mesinhas e

cadeiras do centro da sala e eis que


surge uma pequena pista de dança.

Helga e Lucy descem lindas,

em vestidos grudados nos seus corpos

sedutores, e vão para o karaokê. O

tempo passa e nada de Edgard aparecer

com Safira.

Finalmente, quando Lucy já


desiste de cantar e o ambiente é
invadido pela música Diamonds, do

Sam Smith, Edgard entra na sala


segurando a mão de Safira.

Meu coração dispara.


Com sandália de salto, Safira

chega imponente dentro de um sedutor


vestido vinho de alças finas, que
desenha as suas curvas e nem disfarça

os mamilos entumecidos, livres do sutiã,


enquanto uma fenda poderosa revela a

sua coxa.

Nossos olhos se cruzam como

peças que se encaixam com perfeição.

Nesta fração de segundos, é

como se o tempo tivesse parado só para

nós nos admirarmos. Sem disfarçar, ela


me encara de modo enigmático, mas, em
seguida, desvia o olhar. Impactado,

continuo a observá-la ao tempo que,


lentamente, levo a taça aos lábios e

sorvo um generoso gole de vinho.

— Uma deusa — sussurro bem

baixinho.

Safira parece outra mulher:

exuberante, dona de si, com um

semblante superior e empoderado. O


rosto frágil cede espaço a uma feição
vigorosa e firme, adornada por uma
maquiagem que a valoriza.

Tony também ficou sem ação.

O que me afeta não é só a

beleza dela, mas as intenções do casal.

Pode parecer idiota, mas sou um

marmanjo acostumado com a

depravação da noite, só que o peso da

proposta de Edgard parece agir de


forma esquisita sobre mim.
John aparece com o aspecto

mais digno e puxa Lucy para dançar.

Tony aproxima-se de Safira e


Edgard. Mas ela lhe dá as costas

enquanto se serve de uísque e belisca

um aperitivo. Em seguida, aproxima-se

de Helga, e elas conversam de forma

empolgada.

Edgard deixa de lado o jeito de


cão de guarda e a segue feito um
cachorrinho de estimação. Oferece um

petisco, sorri para ela, como se


buscasse a sua aprovação. Em pouco

tempo, Safira finaliza a sua dose e


entrega o copo para que ele reponha a

bebida.

Então, ao acompanhar a cena,

começo a entender o jogo deles.

Suponho que Edgard seja um


dominador na vida, mas um submisso
sexual, no sentido de ser um bajulador

que gosta de ser pisado. A humilhação


em ser corno deve funcionar como um

gatilho de prazer. Já Safira é uma


submissa na vida e uma dominadora

para Edgard.

Céus! Nem desconfiei. É como

se eles mudassem de lugar na dinâmica

da relação.

Expiro, um pouco aliviado.


Entendo de uma vez por todas que Safira

não é forçada a nada. Imagino que a


terceira pessoa traz novos ares para ela

e desperta nele as sensações que lhe dão


maior estímulo.

Beberico lentamente o meu

vinho, sem deixar de fitá-los.

Se eu entrar nessa matemática

do casal, vou bagunçar os números, pois


estou mais para um dominador. Minha
maior realização sempre esteve junto às

mulheres com aspecto frágil, que gostam


de que eu determine os caminhos na hora

do sexo. Mas nunca fiz disso uma regra


e me relaciono de todas as formas,

embora as que me deixam no poder de

comando são as que mais me satisfazem.

Não foi à toa que me deixei

encantar por Safira, eu gosto de mulher


com ar de que precisa ser protegida,
como ela demonstra no seu dia a dia.
Porém, do ponto de vista sexual, quando
entrou aqui para escolher e conquistar,

ela parece ser uma predadora. Assim,


disputaríamos o poder de comando.

Seduzido e hipnotizado,

devagar, vou rondando-a.

Toca Save your tears, do The

Weeknds, e Safira começa a se balançar


com o copo na mão já reabastecido. Ela
olha para mim, sorri e pisca o olho.

Aproximo-me. Tony também se coloca


quase ao meu lado. Mas ela rodopia e se

coloca diante de Helga, toma um grande


gole da bebida e entrega o copo a

Edgard, que a pajeia com um jeito

servil.

Com delicadeza, Safira conduz

Helga para o centro da pequena pista de


dança e elas começam a se movimentar
de um jeito sexy, uma diante da outra,
bem próximas, mas sem se tocar. Os
quadris delas vão de um lado ao outro e

rebolam de uma maneira sensual, o que


aumenta a minha tensão e interesse

erótico pela cena que se desenrola

diante de mim.

Já no ritmo da música seguinte,

elas testam os meus níveis de


testosterona em movimentos lentos e
sexies. Em certo instante, Safira enlaça
Helga e beija a sua nuca, cheirando-a de
modo provocativo. Depois passa as

pontas dos dedos no pescoço e ombro e


desce pelo vale, entre os seios de Helga,

que, por sua vez, tenta lhe roubar um

beijo. Mas Safira escorrega para o seu

lado e encara a mim e a Tony.

Nessa altura, ambas já atraíram


os olhos de todos para si. Safira conduz
Helga para mais próximo de nós,
cochicha algo no ouvido dela. Meu pau
já lateja, cheio de brutalidade dentro da

minha calça.

Então, elas voltam a dançar

bem rente. Os corpos de Safira e Helga

se roçam enquanto balançam como

serpentes. Dou mais um passo e fico

bem perto delas. Tony me segue, Edgard


só observa a cena mais afastado,
consumindo a sua própria bebida.

Safira me hipnotiza. Se eu não

for o escolhido, vou ficar fodidamente


frustrado.

Ousadamente, elas ensaiam um

beijo. Suas línguas se tocam e, com a

ponta da sua, Safira circula os lábios de

Helga. Expiro, já morto de tesão. No

ritmo da música, elas rodopiam e Safira


aponta o dedo para mim.
Meu coração soca mais que as

batidas eletrônicas da música. Tony me


dá uma cotovelada nada discreta, mas

estou tão ensimesmado com o que

acontece que apenas o fito e levanto


levemente o ombro. Edgard se aproxima

por trás e sussurra no meu ouvido:

— Nada de beijo na boca!

Tenho vontade de rir dele,


apenas devolvo um olhar sério, sem
nada dizer, enquanto Safira continua a

jorrar sua sensualidade através da


dança. Não sei mais onde termina o lado

dominador dele e começa a sua parte

puppy[20].

— É claro que vou beijar na

boca, porra! Vou beijar muito na boca da

sua mulher e você vai ficar olhando,


porque é assim que gosta — arrisco, de

forma incisiva.
Vou até Safira, envolvo a sua

frágil cintura e começo a acompanhá-la


em sua dança. Pelo canto do olho,

percebo Edgard nos observar. Então,

entendo que entrei no jogo. Desisto da


dança e, gentilmente, trago-a para cima

do meu pau e a faço sentir que estamos

sedentos por ela. Então, Safira me fita, e

eu encaro os seus olhos de pupilas muito

dilatadas, que quase encobrem o azul de


sua íris. Estranho.

— Não vejo a hora, não vejo a

hora... — ela sussurra em meu ouvido e


logo esqueço o seu olhar.

— Eu... — Eu tenho tanto a

dizer. Gostaria de explicar que vim

porque uma parte de mim queria

protegê-la enquanto a outra passou a

desejá-la como um alucinado. —


Contudo, me dou conta de que isso não
cairia bem, pois Safira não precisa de

proteção. A percepção de que Edgard a


obrigava foi um engano meu. — Quero

te ter, Safira. Eu quero você — murmuro


apenas.

— Venha, vamos pegar mais

uma bebida. — Ela segura a minha mão

e me conduz até as garrafas, passa por

Edgard e o ignora, como se ele não


estivesse ali.
A música continua a todo

vapor. Fito Tony, que pisca para mim, já


John faz um sinal escroto, como se

dissesse “manda ver”. Edgard o encara

em desaprovação. Em seguida, vejo-o

sair para o fundo da casa.

Safira enche um copo de uísque

de um modo meio louco e leva o copo

aos lábios de um jeito ansioso, mas o


seguro e tiro de sua mão.
— Ei, calma. Não beba assim,

senão vai apagar. — Quando a encaro,


noto nuances de um aspecto

atormentado, o que me deixa um pouco

inseguro. — É isso mesmo que quer,


Safira? — De repente, essa dúvida volta

a transpassar a minha mente. — Quer

continuar esse jogo? — Seguro os seus

ombros e a faço me encarar, olho no

olho.
Safira fecha os olhos e suspira

profundamente.

— É claro que quero — ela


responde, num rompante, se aproxima de

mim e segura o meu pau. Assusto-me,

surpreso.

Safira mantém a mão ali e o

comprime. Logo o meu sexo começa a

enrijecer, mas, sem graça, retiro a mão


dela e a entrelaço entre os meus dedos.
Observo as suas mãos entre as minhas,
os belos dedos longos.

— Relutei bastante em vir —


confesso. — Tive receio de que

estivesse sendo forçada por Edgard.

Mas, quando te vi entrar aqui hoje, tudo

foi para o devido lugar na minha cabeça,

entendi que se trata d fetiche e não julgo

vocês.

Safira gargalha diante da minha


sinceridade, levanta nossas mãos unidas
até a altura dos seus seios e as observa.

— Todos dizem que não


julgam, Eric. Mas, depois, se julgam ou

não, não sei. — Ela ergue os ombros e

seus olhos estão vermelhos e vidrados.

— Está bem? Não exagerou na

bebida? — indago, pois, se ela estiver

muito alcoolizada, é claro que não quero


continuar.
— Será que não vê? Estou

ótima. — Safira abre os braços


teatralmente. — Nunca estive tão bem e
ansiosa... por você, Eric. — Um riso

estampa o seu rosto.

O seu jeito de falar parece

esquisito. Sutilmente, ela oscila entre

picos de euforia. Safira pega a minha

mão, coloca na sua cintura e me traz


para junto do seu corpo. Nesse
momento, Edgard entra e murmura para
nós:

— A cabana está pronta. Vou


dar um tempo para vocês se entrosarem.

Mas não esqueçam, a chave está comigo,

é impossível trancar as portas. — Ele a

balança em suas mãos.

Safira o fita com desprezo, dá

dois grandes goles no destilado que eu


havia retirado de sua mão, faz uma
careta e sai, me puxando para o lado de
fora.
Não sei quem é mais infantil:

eu, por ser incapaz de falar a verdade e


lhe dizer que esses jogos me destroem
lentamente; ou Eric, que pareceu

acreditar piamente em minha


performance há pouco. Quem sabe, essa
seja apenas uma desculpa esfarrapada

dele para limpar a sua barra e não

bancar o escroto.

Pare agora, Safira. Eric não

tem culpa de sua insanidade.

Sim, eu fui convincente. Se Eric


desconfiou de que havia algo errado
com relação a mim e ao jogo erótico, fui

capaz de convencê-lo de que faço com


gosto. Essa é uma meia-verdade. No

passado, eu gostava das minhas


loucuras; hoje, não mais.

Meus pensamentos me sabotam,

parecem tumbleweeds[21] , aquelas

plantas que rolam de um lado a outro


pelas ruas e paisagens dos filmes de

faroeste.
A minha mente não consegue se

focar em nada. Bebi demais? Não sei,


mas acho que estou um pouco bêbada. A

única certeza que tenho é a de meu

coração estar bem quentinho pelo que


Eric me disse: tive receio de que

estivesse sendo forçada por Edgard.

— Safira, por que me

escolheu? — Eric pergunta e me traz


para o agora.
O vento cortante atravessa a

noite e me arrepia inteira, enquanto me


foco em pisar nas placas de concreto

que conduzem à edícula e me equilibrar

no salto, de maneira decente, sem dar


pista de que estou afetada pelo álcool.

Aperto a mão de Eric.

— Porque criamos uma

cumplicidade mínima — confesso com


sinceridade, e meu coração parece que
vai sair pela boca.

Recordo do momento em que

entrei na casa e me deparei com os


olhos de Eric vidrados em mim. Foi a

melhor surpresa. Afinal, falei para

Edgard que preferia Eric porque ele não

estava no rancho. No fundo, eu o queria,

mas também não queria.

Balanço a cabeça, pois a minha


mente começa a viajar outra vez.
— Sim, criamos — ele

concorda, assim que entramos na


pequena e charmosa varanda da edícula.

Eric me puxa e me abraça, prendendo os

meus braços atrás de mim. — É uma


mulher linda e sedutora, Safira, e faz

esse jogo muito bem. Seu marido disse

que não a beijasse, mas não é bem isso

que vai acontecer nesse exato momento.

Ele enfia alguns dedos na minha


nuca e rouba um beijo exigente. Abro os
lábios e lhe entrego a minha língua, os
meus desejos e, secretamente, o meu

coração. Com a outra mão pressionando


as costas, Eric dá um ritmo enérgico aos

seus lábios vorazes.

Como há muito tempo não

acontece, eu me sinto entregue e

envolvida. Meu peito comprime e bate


acelerado, meu corpo amolece, e não sei
mais o que é real e o que são devaneios,
o que sei é que estou rendida à sua
língua, que invade cada recanto de mim

e faz cada músculo do meu corpo se


animar.

Eric se afasta aos poucos de

meus lábios. Nossos olhos se encontram,

enquanto ele mantém meu rosto próximo

ao dele, ao segurar a minha cabeça entre


as suas mãos grandes e vigorosas. Ele
varre os meus olhos de um lado a outro
e entreabre os lábios de forma
provocativa. Espero outro beijo, mas ele

me solta, interrompendo esse instante


mágico, e entra.

— Uau. Edgard é mesmo um

sujeito detalhista — ele comenta ao

observar o ambiente mantido à meia-luz,

com uma garrafa de uísque, gelo e


aperitivos dispostos na mesinha de
centro. Uma música ecoa do quarto e
torna a atmosfera ainda mais
aconchegante.

— Vamos dizer que ele

consegue o que quer — respondo

nervosamente. Desenlaço-me de Eric,

inclino-me, apanho um copo e avanço

para o balde de gelo.

— Ei... — Ele me enlaça pelas


costas e se inclina sobre mim, desce a
mão pelos meus braços e alcança as

minhas mãos. O forte calor e o roçar de


seu corpo sobre o meu me causam uma

leve tremedeira. — Acho que já


bebemos o suficiente — ele sussurra,

com a sua voz máscula, no meu ouvido.

Juntos, elevamos nossos

troncos, e volto a estar diante de Eric.

— Tem certeza de que quer ir


para cama comigo sob os olhos do seu
marido? — ele indaga.

Suspiro e reúno as minhas

forças, enquanto o meu ventre se contrai.

— Não fui convincente o

suficiente? — indago e puxo o cinto de

sua calça.

Já fui para cama com outros

homens para agradar a Edgard. E por

nada perderia essa chance com Eric, já


que ele vai deixar o posto de homem dos
meus sonhos.

— Bom, se é assim, quem

manda no jogo sou eu. — Ele afasta a


minha mão de sua calça e desce

bruscamente a alça de meu vestido,

deixando os meus seios à mostra, com

os bicos duros feito pedra, devido ao

frio e à minha excitação diante da cena.

Dou um leve suspiro e contraio


sutilmente o cenho e as bochechas, ao
tempo que a música Watermelon Sugar,

do Harry Styles, invade o ambiente. Eric


toca os meus mamilos rijos e os estimula

com as pontas de seus dedos, enquanto

me encara e acompanha as minhas


reações.

— Está bom? — ele pergunta.

Apenas balanço a cabeça de modo

afirmativo, ao passo que vou ficando


ainda mais molhada.
Eric me conduz para a porta do

quarto, depois retorna e se serve de uma


dose da bebida.

— Pra dois? — indago.

Ele apenas sorri e entramos no

quarto. Bem próximo da cama, ele me

envolve nos seus braços. Após sorver

um gole do uísque, leva o copo aos meus

lábios. De propósito, deixo parte do


líquido escorrer pelos cantos da boca.
— Assim, você me enlouquece!

— ele fala baixinho, com a voz


carregada de desejo.

Então Eric põe o copo na

cabeceira, me envolve em seus longos e

fortes braços e me beija ainda mais

exigente, com sua língua sibilando sobre

a minha de um jeito voraz. Agarra a

minha bunda, em seguida, enfia a mão


por baixo do meu vestido e, quando
encontra a minha umidade, ele dá um
passo para trás.

— Está sem calcinha, safada...


— O olhar estreito parece sedento de

desejo. — Tire a roupa. — A ordem soa

um pouco bruta.

Seus olhos são inquisidores e

invasivos, o que me desconcerta um

pouco. Mas sigo a sua vontade.

Minha cabeça fervilha, desço o


zíper lateral e termino de desvelar os

meus seios, no mesmo momento que ele


retira a sua camisa e a joga no chão,

mostrando-me o seu peitoral forte,


braços musculosos e tatuados. Por

segundos, meio que paraliso diante da

visão desse homem tirando a roupa para

mim.

Em seguida, ele desabotoa a


calça e a retira, apanha algo no bolso e
põe na mesa de cabeceira, só depois
percebo que são preservativos e o seu
celular. Meu sexo pulsa de desejo, estou

mais que pronta para Eric.

Então, deixo o vestido

escorregar por minha pele e desnudar a

minha boceta depilada, com apenas um

caminho de pelos, mantidos bem rente.

Os olhos dele se fixam aí, enquanto vejo


o volume roliço se destacar de sua
boxer preta.

Eric me envolve e me puxa com

ele, ao tempo que se senta na cama,


ergue minha perna e a põe flexionada

sobre o colchão. Agilmente, ele se

inclina, passa o ombro embaixo da

perna flexionada e abocanha o meu sexo,

enquanto me segura de forma veemente

para que não caia.

Gemo. Acaricio e enfio os


dedos entre os seus cabelos curtos. Sinto

a sua respiração em meu ventre. Ele faz


o meu clitóris de seu bombom. Me

lambe. Me chupa. E eu vou à loucura

com o contato de sua língua grande,

quente e úmida, tão diferente do que

estou acostumada. Deliro como uma


cadela no cio.

Eric se detém e me fita, com o


seu rosto impregnado de minha umidade.
— Que delícia, Safira!

Faíscas de desejo parecem sair

de nós. Ele beija a parte interna da


minha coxa, o que me causa profundos

arrepios. Em seguida, nós nos viramos

sobre a cama. Eric retira a sua boxer, e

eu quase surto com o seu pau imponente,

grosso e comprido, como um torpedo,

que palpita para mim.

Sem mais delongas, ele coloca


um preservativo e não esconde a sua

ansiedade. Abre bem as minhas pernas,


segura o meu tornozelo e beija o peito

do meu pé, ainda enfiado na sandália de


tiras pretas.

— Gostosa demais! —

murmura.

Ele começa a me penetrar

devagar e segura o meu rosto para que


não desvie dos olhos dele. Então, passa
com suavidade o dedo indicador nos

meus lábios e o introduz na minha boca,


à medida que se enfia no meu canal.

Gememos juntos, ao tempo que chupo e


lambo o seu dedo.

Não consigo parar de gemer.

Assim que me penetra por

completo, Eric se movimenta com mais

vigor e solto gritinhos para me


acostumar com o seu membro. Então, ele
me abraça e me beija com ferocidade, à
medida que me fode com veemência.

Eric transmite uma sensação de


masculinidade rude e forte, embora ele

seja um doce de homem. Nossos

gemidos se misturam com beijo, saliva e

desejo. E minha cabeça, ainda afetada

pelo álcool, não para quieta.

— Se fosse minha, não te


dividiria com ninguém — ele confessa,
o que me surpreende. De imediato, não

sei explicar o que essas palavras


significam para mim.

Mas logo me esqueço delas, ao

perceber que já estamos sendo

observados por Edgard, que entrou no

quarto como uma hiena, à espera dos

restos dos felinos do topo da cadeia, um

faminto que gosta das sobras do que não


pode ser, fazer ou sentir.
— Me foda com força — peço

no ouvido de Eric, que se afasta devagar


e só então se dá conta da presença de

Edgard nos observando em silêncio,

parecendo um desses gatos de rua,

ladrão de comida.

— Não vou gozar agora — ele

sussurra no meu ouvido e diminui o

ritmo das estocadas.

Então, ele tira o seu pau e se


desfaz da camisinha. Recosta-se na

cabeceira, dá uma olhadela em Edgard e


se fixa em mim, ainda sem ação.

— Venha aqui e ofereça esses

teus peitos pra mim — ele manda.

Obediente, ajoelho-me e o

monto. Seguro os meus seios e os

ofereço, esfregando-os na cara de Eric,

que logo abocanha possessivamente um


dos meus mamilos e o suga com
voracidade, arrancando-me gemidos.

Em seguida, ele muda para o outro seio


e o suga com intensidade, ao tempo que

seu dedo ágil desliza por entre as


minhas coxas úmidas. De maneira

atrevida, explora o meu clitóris. Eu só

sei gemer.

Mesmo sob efeitos das tantas

bebidas, o que sempre anula ou retarda


o meu clímax, estou prestes a gozar. Mas
Eric para, desliza para dentro de minhas
pernas e me encaixa em sua boca, o que
é eletrizante. Ele enfia avidamente a sua

língua entre os meus lábios internos e


vai subindo até chegar o meu clitóris.

Bastam duas lambidas quentes

e vigorosas para eu explodir e gemer

sem pudor, o que deve infernizar a

cabeça de Edgard, mas não ligo. Neste


exato momento, só me interesso pelas
ondas de prazer, que se espalham e me
fazem tremer.

Desmonto de Eric, e ele me fita


com ar de quem está satisfeito.

— Gozou gostoso? — ele

pergunta bem baixinho.

Balanço a cabeça afirmando.

Então, ele enfia os dedos entre os meus

cabelos e me prende aos seus lábios.


Provo o meu sabor num beijo devasso e
carregado de posse. Ele chupa minha

língua com força, como se fosse capaz


de me sugar inteira para dentro dele.

Edgard limpa a garganta, mas é

solenemente ignorado por mim e Eric.

Nós finalmente nos afastamos quando os

lábios formigam.

— Agora me chupe, Safira —

ele ordena sobre os meus lábios, e sinto


o seu hálito quente e gostoso.
Escorrego por seu peitoral e o

toco, sentindo os seus músculos na


palma da minha mão. Eric é incrível.
Seu pênis duro é um convite aos meus

lábios. Salivo. Eu o toco e Eric fecha os

olhos. Acaricio as suas bolas quentes e

mergulho a boca em sua glande grossa e

poderosa, que pulsa na minha língua.

Em seguida, lambo o seu


prepúcio rosado e o sinto estremecer.
Transito a minha língua carregada de
luxúria e de desejo por toda a extensão
de seu membro roliço e comprido, com

veias sobressaltadas pelo tesão. Eu o


chupo e lambo com tanto desejo e

vontade, que pequenos barulhinhos saem

de minha garganta.

Eric geme e parece se esquecer

dos olhos de lince de Edgard sobre nós.

Em certo instante, Eric segura a


minha cabeça, fazendo-me parar.

— Pare, caso contrário vou

gozar na sua boca! — ele diz.

Essa ideia me excita, mas

somos estranhos um ao outro.

Ele vai até a cabeceira e

apanha outra camisinha, enquanto

Edgard começa a se movimentar, o que

significa que algo o está incomodando.


Imagino que Eric tenha criado uma
defesa mental para ignorar a presença de

Edgard no quarto, pois há homens que


não conseguem seguir em frente como

ele, que está conduzindo o jogo tão


seguro de si.

Abre o invólucro, retira o látex

e prepara o seu pau outra vez para me

penetrar, ao tempo que Edgard

aproxima-se ainda mais da cama. Subo


nele para evitar que o meu marido me
toque, mas Eric muda de posição, vem
para atrás de mim e pressiona levemente
as minhas costas para que me incline.

— Fique de quatro, delícia! —

ele manda.

Atendo a sua demanda e

empino o traseiro. Eric dá um sonoro

tapa e sinto a carne balançar.

Gentilmente, toca com dois dedos a


minha fenda, como se checasse se estou
preparada, antes de se enfiar em mim e
me penetrar bem fundo.

Gememos juntos.

Seus movimentos são lentos,

mas com certa ânsia. Geme, aperta a

minha bunda, enquanto estico o lençol,

numa mistura de satisfação e desespero,

pois sinto que nunca mais provarei de

seus lábios.

Eric se curva, enquanto me


penetra alucinadamente, toca os meus
seios e também me estimula.

— É maravilhosa, Safira! —
ele sussurra entre gemidos abafados até

que atinge o seu orgasmo.

Ele guincha o seu prazer entre

urros abafados, como se os estivesse

moderando.

Quando tudo acaba, desabo,


envergonhada. Todo o peso dessa
devassidão cai sobre as minhas costas,

como dedos acusadores do quanto sou


uma pervertida.

Respiro fundo e me controlo,

pois ainda tenho que encarar Edgard.

Desenterro o rosto do lençol e vejo Eric

se levantar da cama e pegar a sua boxer

jogada no chão. Edgard faz sinal com a

mão de que acabou na direção dele,


enquanto busco a colcha e me cubro.
Observo Eric vestir a sua

calça. Paraliso, encantada com as curvas


e a virilidade que exala por cada poro.

Como um cara, que é sensível e até pinta

telas, pode ser tão charmosamente


másculo? Suspiro. Ele apanha a camisa

no chão, põe o celular no bolso, pega o

par de sapatos e me encara.

— Está tudo bem com você,


Safira? — pergunta com suavidade.
— Sim, estou bem. — Balanço

a cabeça, confirmando.

Ele comprime os lábios e


franze o nariz rapidamente, como se

quisesse dizer algo e escolhesse as

palavras.

— Boa noite pra vocês — ele

deseja e sai do quarto, fechando a porta.

O meu sonho acabou e uma


forte dor parte meu coração me dezenas
de pedaços.

Edgard se joga na cama e me

abraça.

— Preciso de um banho

primeiro — digo e tento me afastar.

— Está bem.

Levanto-me da cama de má

vontade, pois agora tenho que atender às


exigências de Edgard e pisar em ovos

para que ele não desconfie que estou


afetada emocionalmente por Eric.

— Antes de ir, me diga o que

mais gostou em Eric.

Fecho os olhos e me viro para

ele.

— O pênis.
Fecho a porta do quarto e xingo

mentalmente até a última geração de


Edgard. Minha cabeça é uma bagunça.
Jogo-me no sofá, calço os sapatos e

visto a camisa. Levanto-me e sigo em


direção à saída. Paro. Preciso respirar e
me acalmar para encarar as sondagens

de Anthony e John.

Observo ao redor, sigo até o

frigobar e me sirvo de água. Sorvo todo

o ar dos pulmões e o prendo por alguns

segundos. Depois solto lentamente e


bebo grandes goles do líquido.
Safira é a mulher mais linda

com quem já estive e a mais gostosa


também. Na verdade, essas percepções

são porque tivemos uma química forte.

Fiquei encantado. Só que ela é de outro,


de um filho da puta. E eles levam uma

vida movimentada, muito além de um

sexo cotidiano de um casalzinho jovem.

Eles ultrapassaram as portas do

convencional e foram viver as suas


fantasias.

Eu não passo de uma peça do

tabuleiro de seus jogos. E acabei de ser


descartado. Saio extremamente

perturbado.

Quando vim para cá,

desconfiava que era forçada pelo

marido, mas Safira demonstrou gostar

dos jogos sexuais da mesma maneira que


Edgard, que nos devorou quando
estávamos na cama, com olhares

cobiçadores, o que faz parte do seu


modo excêntrico de ter prazer. Eu me

esforcei para bloqueá-lo da mente, pois

tive receio de brochar por causa da


presença desse desgraçado.

Suspiro outra vez e me sinto

mais calmo.

Ponho o copo na pia. Ao lado,


vejo um pequeno pilão de macerar
ervas, com um resto de pó branco que

foi triturado. Estranho. Será que um


deles toma remédios com álcool? Ou

será metanfetamina[22]?

Passo o dedo, cheiro e não

identifico o que é. Olho para o lado,

apanho um guardanapo de papel, reúno o

restinho do pó, faço um pequeno bolo e


ponho no bolso.

Em poucos passos, saio dessa


edícula e tento deixar para trás toda a

sandice que acabo de viver. Mas será


difícil apagar da mente os olhos frágeis

de Safira sobre mim, o seu corpo se


movimentando em busca de prazer e a

umidade quente de seu sexo. Ainda sinto

o seu gosto na minha boca e a presença

do seu cheiro por minhas narinas.

Quando retorno para casa, não


encontro ninguém. Apanho uma garrafa
qualquer e despejo a bebida num copo
que encontro pelos cantos bagunçados
da sala de estar dos Wilsons. Sento-me

no sofá, pego o celular e começo a fuçar


as redes sociais. Procuro o perfil de

Edgard. Do dele, encontro o de Safira.

É um perfil econômico, com

poucas fotos e mensagens. Ao menos, eu

a tenho ali, diante de mim. Amplio uma


foto do seu rosto, deixando apenas os
seus olhos hipnóticos, como se me
observassem.

Dou um grande gole do


destilado.

Fui um maricas, idiota. Sorrio.

Mas disse a ela o que queria. Afirmei

que, se ela fosse minha, nunca a

dividiria com ninguém. É verdade.

Gargalho, solitário. Safira deve ter me


achado um imbecil. Dona de um espírito
livre, nunca que iria se contentar em
ficar apenas com um único homem.

Mas... em compensação, ela


demonstrou ter sentido bastante prazer

comigo. Expiro, aliviado. Ao menos,

servi para isso.

Bebo outro grande gole e me

deito no sofá. Coloco a garrafa no chão

ao meu lado. A única certeza que tenho é


a de que devo deletar essa noite de
minhas lembranças e esquecer Safira.

— Eric, Eric. — Escuto alguém me

chamar ao longe.

Tento me virar, mas meus

músculos doem e faço uma careta

involuntária. Só assim me dou conta de

que não estou na cama box do meu

apartamento, em Austin.

— Nem assim, fica feio —


Helga pilheria, quase como uma
cantada.

Semicerro os olhos para


controlar a claridade.

— Acorde para me ajudar, meu

bem. — Ela me encara dentro de um

minúsculo short, que deixa as suas

pernas grossas bem diante de minha

cara.

Levanto o tronco com


dificuldade, bastante dolorido por ter
adormecido no sofá.

— Tome, acabei de passar. —


Helga me estende uma caneca fumegante

de café.

— Obrigado. — Sento-me e

apanho a caneca. O primeiro gole

queima a minha língua. Sinto as carnes

um pouco trêmulas, não sou acostumado


a extrapolar na bebida e exagerei, após
sair da edícula.

— Pensei que íamos terminar a

noite juntos — ela diz em seu jeito


direto.

Já fiquei com Helga várias

vezes e a levei para dormir comigo em

casa em algumas ocasiões, mas não há

química entre nós para um envolvimento

maior que esse.

— Dessa vez não rolou. —


Levanto-me e sigo para as escadarias.

— Vou tomar uma ducha e desço


novinho em folha para te ajudar com
essa bagunça aqui — prometo.

Helga já deu a entender que

podemos ser mais que ficantes. Ela é

uma moça linda e inteligente, mas ainda

está muito ligada à vida baladeira, e eu

sou um sujeito esquisito. Gosto de ter


meu espaço e de ficar em casa pintando
em muitos fins de semana.

Subo, tomo uma ducha e reúno

as minhas coisas, guardo o bolinho de


papel que peguei na edícula, num bolso

da mochila, e desço com ela. Planejo

ajudar a arrumar a casa e, em seguida,

retornar para Austin.

Após o banho, me sinto

revigorado. Para meu alívio, encontro


Tony, Lucy e John, que sorri de forma
maliciosa para mim, mas nada comenta.

Deixo a mochila no sofá e sigo para


ajudar com a louça da cozinha junto com
as garotas.

Em seguida, aparece Edgard,

que prepara uma refeição.

— Bom dia! — ele

cumprimenta e nós respondemos.

— Cadê Safira? — pergunta


Lucy.
— Ah, está com uma terrível

dor de cabeça — ele responde.

— Nossa! Ontem ela estava


com dor de cabeça de tarde e foi se

deitar. Aparece na festa como uma

femme fatale e depois volta a ter dor de

cabeça? — aponta Helga.

— Isso acontece, cara Helga —

responde Edgard com um tom duro.


Então, ele se vira e me observa. —
Como está, Eric?

Não sei por que motivação

desgraçada esse cumprimento me deixa


sem graça.

— Estou ótimo — respondo de

um jeito neutro.

Então, Edgard segue para

edícula com a bandeja na mão para

Safira.

— Ajudar a arrumar a bagunça,


a princesa não ajuda — reclama Helga.

— Ah! Agora desdenha? Não

tinha gostado dela? Ao menos dançaram


bem animadas — provoca Lucy.

Helga faz uma careta e Tony

gargalha ao escutar a conversa.

Parece que ele ficou de mãos

vazias na noite passada ou se consolou

com Helga. Apostou bastante em ser o


escolhido por Safira; caso não rolasse,
pretendia ficar com Lucy. Só que essa

está num clima pós-noite-quente com


John, considerando-se as conversinhas

de pé de ouvido e os risinhos nessa

manhã. Já Helga nunca foi uma opção


para ele.

— Nunca foi ciumenta, Helga.

Eric foi devolvido novinho em folha —

Tony pilheria, vem até mim e me dá um


leve tapinha nas costas.
Apenas estreito o olhar e franzo

o cenho, sem achar graça de sua


tentativa de fazer uma piada. Volto a

enxugar a louça, e Tony ajuda a guardá-

la.

— Como foi? — ele pergunta

assim que todos se entretêm em suas

tarefas.

— Foi ótimo — digo de modo


evasivo.
— Me diga uma coisa, Edgard

foi pra cama com vocês? — Os olhos


curiosos dele parecem querer saltar de

suas órbitas.

— Claro que não, cara. Não foi

o combinado. Ele só fica olhando, quase

nem pisca, entretido, mas confesso que

prestei pouca atenção nele — acabo

deixando escapar.

— Que bizarro!
Atravesso o olho para ele em

protesto.

— Bizarro agora! Mas você


ficou bem puto por não ter sido o

escolhido.

— Terei a minha chance —

esnoba Tony.

Confesso que isso é algo que

me incomoda um pouquinho, mas logo


tento afastar a ideia da cabeça. Nada
comento.

— Mas ela é impressionante.

Aquela performance com Helga me


deixou de pau duro — ele continua. —

Me conte, como ela é na cama? É uma

fúria devoradora?

Não, essa não é a

denominação adequada para Safira!

Mas guardo essas impressões para mim.

— Não vou comentar essas


coisas, Tony. Combinamos respeitá-la.

— Pisco e vou buscar mais louça no


escorredor.

Ao terminarmos as tarefas,

combino partir do rancho Tierra do Oro

em comboio ao mesmo tempo que Helga

e Lucy. Anthony e John vão sair mais

tarde, com Edgard e Safira.

Particularmente, não quero


encontrá-la. Ao menos por hoje, pois
tudo ainda está muito quente e

fervilhando dentro de mim. Preciso


apagar esse incêndio, que tomou a minha

mente, desde a noite passada. E não


gostaria de correr o risco de demonstrar

algo na presença deles.

Antes de sair, chamo John para

um papo mais reservado no lado de fora

da casa. Quero esclarecer algo que me


intriga.
— John, você, que entende

mais dessas paradas, sabe o que é esse


pó? — Apanho o bolinho de papel da

mochila, abro com cuidado e lhe

estendo.

— Tenho lá cara de traficante?

— ele brinca, apanha o material e o

observa.

— Cara, mas achei isso na


cozinha da edícula, foi triturado num
pequeno pilão — explico.

— Deu pra ser Sherlock

Holmes em cima do nosso amigo que


gosta de ser corno?

— Peço que não comente com

ninguém que te mostrei isso.

— Relaxe, cara... Sabe que

Tony está meio puto comigo?

Gargalho.
— Pegou a garota que ele

estava de olho.

— Pois é, ele mirava em dois


alvos, Safira e Lucy. Acabou de mãos

vazias. — John passa o pó entre os

dedos, cheira e depois põe na ponta da

língua. — Cara, quanto a isso, não faço

a menor ideia. Não é cocaína, pode ser

metanfetamina... Deixe isso comigo, que


vou descobrir — ele garante e depois
me encara.

— Está certo.

— Só não entendo o seu

interesse nisso. Se eles usam drogas,

não é de nossa conta.

— Cara, se eles usam

livremente, precisam triturar?

John arqueia as sobrancelhas.

— Depende do que seja esse


pó. E triturado pode dar um efeito mais
rápido — conclui meu amigo.

— Talvez.

— Mas me conte, como foi a

noite com Edgard em cima de vocês?

Sorrio.

— Ele cumpriu com o que

havia combinado.

— Que esquisito!! Você gostou?


— Dela, sim. Da situação, não.

— A Lucy é muito legal

também. Outra coisa, como Edgard me


tirou do jogo, não vou pagar essa aposta.

Gargalho.

— Por mim, não me deve nada.

Mas, se fosse o Tony a ganhar essa

aposta, estaria com sérios problemas.

Antes que ele faça mais

perguntas, despeço-me e aviso às


garotas que estou partindo. Elas dizem
que me seguirão em 15 minutos.

Guio devagar e admiro a


paisagem. Ontem quando vim, estava tão
ansioso que não percebi a beleza do

rancho. Paro e tiro algumas fotos com o

celular. Tento esquecer Safira e seus

olhos extremamente dilatados da última

noite. Tento esquecer sua pele e tudo que

me remeta a essa viagem e aventura.


Minha cabeça parece que vai

explodir. Sinto como se usasse um

grande capacete latejante. Após tomar

um café com um sanduíche de queijo,

que Edgard foi buscar, me senti mais


forte. Então arrumamos as nossas coisas

e deixamos o quarto em ordem para


partir.

As paredes da minha vagina


estão doloridas devido às estocadas

veementes de Eric. Também fiz sexo


com Edgard. É assim que funciona o

jogo dele. Só que o meu marido não tem


o vigor de Eric, nem o pênis imponente,
muito menos o corpo firme e másculo.

Sei que essa revelação causa

impacto.

Mas é dessa forma que se dá a


realização de Edgard. Ele me vê com
outro e, em seguida, nós mantemos

relações. Durante esse ato, ele pergunta


coisas sobre o sexo que mantive com o
touro. É terrível, mas é assim.

Quando aceito outro homem, a

nossa vida sexual fica mais ativa,

enquanto estiver vivo dentro dele o

repertório de sensações que o movem ao

me ver fazendo sexo com o nosso


brinquedo.
Suspiro, cansada. Todas as

vezes que topo participar desse jogo,


bebo demais e fico péssima no dia

seguinte.

Neste momento, estamos

prestes a entrar na casa principal do

rancho.

Meu coração bate acelerado. É

que meu ânimo só se mantém firme


porque estou ansiosa para rever Eric.
Sei que ele deve me julgar mal,

considerando o meu comportamento de


ontem à noite. Ainda assim, gostaria de

vê-lo mais uma vez e me despedir dessa


quentura no coração que preciso

esquecer.

Meu coração está entre as

minhas mãos quando entro na sala. Mas

me deparo apenas com os olhares


inquietantes de Tony e John. Observo ao
redor e nada de Eric. Não posso
perguntar diretamente por ele. Uma

decepção se alastra por meu corpo e


reprime o peito.

— Cadê o restante do pessoal?

— pergunta Edgard.

— Já pegaram a estrada há

mais de uma hora — informa Tony. —

Vamos?

Acho que a tristeza está


estampada na minha face. Sinto o rosto
formigar e a garganta querer fechar.

— Tony, por favor, me dê o


contato de Lupe, quero agradecê-la pela

hospitalidade — peço, abatida.

— Sim, vou mandar o número

dela pra Edgard.

Comprimo os lábios em

concordância, tomada por uma tristeza


sem fim.
Eric não quis me ver, acho que

nunca mais vai me encarar da mesma


forma que fez diante da casa dos

Hoover. Ontem à noite, eu encarnei um


personagem, mas ele deve pensar que

sou aquela mulher, que gosto de ter a

minha cama povoada por homens, ele

deve me imaginar como uma mulher

horrível, devassa e promíscua.

Lágrimas brotam nos olhos,


mas discretamente eu os limpo e ponho
os óculos de sol enquanto caminhamos
para nossos carros.

Eu não consigo esquecer os

seus beijos, o seu membro ávido dentro

de mim, a sua pegada firme envolvendo

o meu corpo e me desejando de uma

forma que nunca senti antes na minha

vida.
Quase duas semanas depois

Os dias mais frios deixam os

campos de bluebonnet menos floridos.


Ainda assim, os cachos das florezinhas

azuis ainda resistem à chegada do

inverno, que começa em poucas


semanas. Sou uma metáfora dessas
flores. Travo uma guerra interna para me

manter aparentemente firme, embora


desabe por dentro.

Todas as vezes que cedo aos

caprichos de Edgard, posteriormente,


enfrento dias tristes e depressivos. Só
que dessa vez o motivo da minha
angústia não foi o ato em si, mas a dor
que comprime o peito.

Acho que me apaixonei por

Eric desde o dia que ele me entregou os

dois ramos de bluebonnet. Daquele dia

em diante, ele passou a povoar os meus

pensamentos de maneira romântica, o

que é um capricho muito maior do que o


aceitável e possível para uma mulher
como eu.

Na noite em que o escolhi, foi a

primeira chance de aproximação. Pensei


em optar por Tony, porém seria uma

traição aos meus sentimentos e desejos.

Resolvi apostar em Eric, mas me

comportei como uma vaca vadia, me

insinuando na pista de dança. Em

instantes como aquele, nunca sei se


estou bêbada ou louca demais. Mas
também precisava cumprir o roteiro
para Edgard.

Nesse script, não cabe a mim o


papel de mocinha frágil. Ali é o único

momento do meu casamento em que

posso ser fodona. Eu tive a chance de

sussurrar para Eric que participo dos

jogos sexuais de Edgard na força do

ódio, mas acabei incorporando o papel


de mulher fatal. Quis aproveitar o
momento e ser dele.

Levo a mão ao rosto e aos

cabelos como se fosse possível arrumar


a minha confusão mental.

É claro que Eric nunca mais vai

me olhar do mesmo jeito. Ele foi

cuidadoso comigo, pediu meu

consentimento para aquele encontro

erótico. Foi macho e viril sem ser


grosseiro. Ainda me disse a coisa mais
fofa que eu nunca pensei em escutar: se
fosse minha, não te dividiria com
ninguém.

— Eu não consigo parar de

pensar em você — murmuro para mim

mesma, mas gostaria de berrar para o

mundo, bem nos ouvidos de Edgard.

Assim que retornei de San

Saba, tentei esquecer a nossa noite


tórrida. Ao me exercitar pelas manhãs,
comecei a evitar o caminho que passa
diante da casa dos Hoover. Mas essa
decisão não durou três dias.

Então voltei a incluir o

percurso no meu roteiro de caminhada e

passar diante da residência do simpático

casal. O meu subconsciente insano

sempre me alimentava de esperanças de

que Eric fosse surgir e me chamar para


conversar. Só que isso é um devaneio,
pois ele estava no trabalho.

Nem faz ideia de como passei

os últimos sábados e os domingos.


Nesses dias, a razão e o coração me

davam a certeza de que o encontraria,

mas não foi isso que aconteceu. Então

voltava frustrada de minhas caminhadas,

como se bigornas tivessem sido

arremessadas sobre a minha cabeça.

Essa semana não foi diferente.


Estou agoniada, me sinto como um
pássaro abatido, que se arrasta com as
asas quebradas. E não é por Edgard.

Quando realizo o seu fetiche

cuckolding[23] , por um tempo, Ed me

trata como se eu fosse uma rainha.

Afinal, ele ganha um novo roteiro

erótico na sua mente. Além de me


assistir fazendo sexo, ele faz perguntas

e, quanto mais respostas humilhantes eu


lhe dou, em termos sexuais, mais tesão
ele sente. Sei que é bem louco, mas é
assim que funciona a cabeça dele.

Estou mal por Eric. Queria vê-

lo. Gostaria de ter forças suficientes de

lhe falar a verdade, contar que aquilo

tudo foi uma encenação de minhas

loucuras com Edgard, mas que eu gostei

demais de ter feito sexo com ele.

Só de pensar nisso, coro.


Hoje é sexta-feira e estou um

pouco perturbada devido a essas


questões. Um amargor parece querer

cortar a minha garganta. É que estou


indo fazer uma visita à senhora Hoover.

Quem sabe, ela me dê alguma notícia de

Eric. É a minha única esperança de

contato.

Atravesso o seu jardim.


Trêmula, afinal sou uma frouxa, aperto a
campainha. Toco duas vezes. Então
percebo que a porta está sendo
destravada.

A senhora Rose Hoover me

lança um olhar de estranhamento. Meu

rosto fervilha.

— Bom dia, senhora Hoover...

— cumprimento.

Ela parece não me reconhecer


de imediato. Então, nervosamente, tiro o
boné e o óculos, apreensiva.

— Ah! Não tinha lhe

reconhecido, Safira. Como vai?

Uma sensação de alívio se

espalha por mim e me faz relaxar um

pouco.

— Estou bem. Estava fazendo a

minha caminhada, então... resolvi passar

para dar um “oi” — digo com


dificuldade.
— Entre... — ela convida, com

um extenso sorriso nos lábios. — Fez


muito bem em vir.

— Como vai o senhor Hoover?

— Ele está bem. Foi resolver

algumas coisas na cidade, só retorna no

fim do dia.

O condomínio em que moramos

fica nos subúrbios de Austin, do lado


oeste da cidade. Às vezes, alguns
moradores costumam se referir assim
sobre ir ao centro comercial.

Estou tensa, pois, normalmente,


não interajo com vizinhos. Não sei o que

dizer ou como me comportar.

— Estou terminando de

preparar uma refeição. Vamos à cozinha.

Aceita um suco ou um café?

— Não quero atrapalhar,


senhora Hoover.
— Rose, me chame de Rose...

— Sorrimos, cúmplices, uma para outra,


o que faz dissipar um pouco a minha

tensão.

Sento-me diante da bancada.

Rose olha a panela e abaixa o fogo.

— Está bem, Rose... —

respondo. — Então, como vão os

quadros?

Ela me sorri enquanto pega uma


jarra na geladeira.

— Levo muito tempo para

concluir uma tela. Na verdade, descobri


que sou uma excelente instrutora e

incentivadora, mas uma artista não tão

boa.

— E tem visto o Eric? —

pergunto e tenho a impressão de que meu

rosto está em brasa.

— Sim, nos encontramos uma


vez na semana. No sábado passado, ele
veio. E amanhã também estará aqui. Ele
está começando uma tela linda,

inspirada em ranchos texanos. Na


verdade, eu oriento o Eric e a Natasha,

eles são meus pupilos. Estou tão

animada com a exposição de Eric na

galeria em Nova York. As suas pinturas

possuem alma, são inspiradoras e

únicas...
Escuto o que Rose continua

dizendo, mas não processo direito as


informações enquanto ela me serve um

copo de suco. Eric esteve perto, muito


perto e não quis me ver...

— Sempre orienta Eric na sala

com as janelas abertas? — interrompo a

fala de Rose, mergulhada nos meus

dilemas que se opõem à realidade e às


minhas expectativas. E a minha
esperança era a de que ele me visse pela
janela ao passar idiotamente pela porta
dos Hoover.

— Não... vem aqui que vou te

mostrar o meu ateliê, fica no fundo.

Afinal, você também pinta?

— Não.

Eu a sigo, e Rose me mostra o

seu ateliê no quintal da casa, que é uma


construção independente. Rose continua
a me contar sobre a sua vida. Ela e
Thomas, o seu marido, são professores
universitários aposentados. Mas eu só

consigo pensar em Eric e me sinto um


pouco frustrada, pois sei que, se ele

quisesse me dar apenas um “oi”, daria

um jeito.

Decerto, não quer me ver nem

pitada de ouro e essa perspectiva da


realidade esfrangalha o meu coração.
Mais um dia passa como um

furacão. Concluo uma etapa de um

projeto da STW e a entrego para Edgard


fazê-la funcionar. Essas duas semanas

foram corridas. Ele agiu de modo

normal comigo e não tocou no assunto

sobre o que vivemos no rancho em San

Saba. Agradeci aos céus por isso. Mas


não consigo afastar da mente aqueles
olhos azuis entristecidos.

É claro que não deixo de o

considerar um filho da puta por


compartilhar a própria esposa com um

colega de trabalho. Mas é da vontade

dela também, não tenho dúvidas. Nem

ninguém teria, diante do jeito dela.

Safira se transforma...

Talvez eles tenham me julgado


esquisito por ter ido embora do rancho
sem me despedir, mas foi o que
considerei melhor e menos
constrangedor para nós todos.

Suspiro.

A verdade é que não consigo

afastar aquela noite da minha mente, nem

as curvas de Safira deslizando na palma

da mão, muito menos o seu sabor, que

parece ainda estar na ponta da minha


língua, ou ainda o cheiro, impregnado
nas minhas narinas. Contudo, tenho
trabalhado pesado para alcançar o
objetivo de apagar aquele sexo da minha

cabeça.

Enfim, sei que é questão de

tempo e logo mais não me recordarei

dessa loucura. Afinal, sou um sujeito

resignado, esqueci Samantha, de quem

me separei ainda gostando, por minha


decisão.
Procuro me ocupar a maior

parte do tempo. Quando não é pelo


exaustivo trabalho na STW, estou

envolvido com minhas telas,


organizando-as e catalogando-as

meticulosamente para exposição, visto

que três delas estão vindo da casa dos

meus pais, no Brasil, o que demanda

alguns gastos extras.

Estou muito excitado por essa


chance de estar numa galeria nova-
iorquina. Essa será a oportunidade de
mostrar a minha arte num ambiente bem

mais profissionalizado. Assim, meu


trabalho se aproxima do topo. Arrisco

dizer que Nova York é a maior vitrine

para um artista.

Já participei de algumas

exposições em Austin, Dallas e Huston,


cidades daqui do Texas. Foi numa delas
que conheci a Rose Hoover, que tem me
ajudado tanto a aprimorar as minhas
técnicas, como na divulgação do meu

trabalho. Também foi através dela que


conheci o marchand Adam River, que

vem me ajudando a ganhar mais

visibilidade e negociou um quadro meu

por uma excelente quantia.

Enfim, tudo são possibilidades,


e eu me apego a elas como as tábuas que
me mantêm flutuando e lúcido nesse
mundo louco em que vivo. Sobretudo,
após a tórrida noite com Safira, sob o

olhar cobiçador de seu próprio marido.

A discrição de Edgard não foi a

mesma seguida por Anthony.

Saímos na sexta-feira passada,

após o expediente, e Tony pressionou

Edgard por sua vez com Safira.

— Fizemos a aposta, mas você


disse que teríamos a nossa vez... —
comentou Tony sem sutilezas.

— Não é bem assim que


funciona. — Edgard o encarou

seriamente. — Em geral, há um tempo

entre um envolvimento e outro. Tem que

estar no meu tempo e no de Safira

também.

Assim não houve espaço para


novos comentários sobre esse tema.
Tocamos no assunto da aposta vencida
por mim, mas preferi não receber a
grana. Considerei que seria escroto de

minha parte.

Afasto as recordações.

Finalmente, expediente

encerrado em mais uma sexta-feira.

Fecho o meu perfil. Edgard está

na sala de Tony. Apanho a minha


mochila e aceno para eles pelo vidro,
Tony faz sinal para que entre. Além de
Edgard, estão lá John e Emily, uma de
nossas tantas colegas de trabalho.

— Estamos combinando sair.

Lucy e Helga também vão. E Emily está

convidada também — comenta Tony.

Ela me observa por baixo de

seus óculos, que estão na ponta de seu

nariz.

— Divirtam-se! Estou cheia


desses lugares em Austin — ela diz e sai
da sala.

— O que pretendem fazer? —


pergunto.

— Ouvir um jazz ou um blues.

Algo mais relaxante, o que acham? —

sugere Edgard.

Tony concorda.

— Podemos ir para o Parker.

O que acham? — propõe John.


— Amo o Parker, costumo ir lá

— incentivo. — Mas não sei se vou, só


tenho esses dois fins de semana para a

exposição e preciso preparar tudo —


alego e depois repenso. — Talvez

apareça; se for, envio mensagem pra

vocês.

— Vão todos que estiveram no

rancho — informa Edgard.

— Vou pensar... — respondo e


saio da sala.

— Eric! — John me chama e

vem atrás de mim. Vamos caminhando


em direção ao elevador. — Sabe aquela

parada que me deu em San Saba?

— Tinha até me esquecido

disso! — O que é verdade. Estava tão

envolvido em minhas tarefas e na

tentativa de isolar aquela noite da mente


que me esqueci por completo de que
pedi a John que descobrisse o que era
aquele pó branco.

— Bem, sei o que não é. Não é

meta[24] . — Paro e estreito o olhar,

curioso. — Parece remédio, algum tipo

de antipsicótico, que administrado com

álcool, deixa a pessoa meio louquinha.

De todo modo, é uma merda de droga.


Comprada na farmácia ou na mão de

traficante não tem diferença; se a pessoa


quer viajar, consegue através dela.

— Nossa! — Fico um pouco

incomodado, mas não deixo


transparecer, pois essa não é uma

questão que é da minha conta. — Eles

são adultos, cada um na sua. Mas me

chamou atenção o fato de estar triturado.

John gargalha.

— Com certeza, é para


aumentar o efeito. — Estreito o olhar,
encabulado. — Esqueça isso, mano, não
fique com cara de touro de um cuckold
— zomba John.

Apenas sorrio, agradeço a ele e

saímos do prédio.

Busco o carro no

estacionamento e sigo para casa.

Eu me enganei bastante com

relação a Edgard e Safira. O uso de


algo, sendo lícito ou não, justifica o
comportamento dela mais atrevido e
com as pupilas extremamente dilatadas,
tudo efeito sabe-se lá de quê.

Balanço a cabeça, em negação.

Não deveria ter entrado nessa

história e nem ter participado dessa

aposta, pois as minhas energias agora

deveriam estar voltadas para o meu

trabalho e a exposição. Só que as


minhas memórias estão presas naquele
quarto, em San Saba.
— Ed, não sei se eu deveria ir.

Você mesmo disse que a história com


Eric só rolaria uma única vez... e... não
queria encontrá-lo diante das mesmas

pessoas, ao menos por agora —


acrescento, aterrorizada com a
perspectiva de encará-lo, como também

os outros que estiveram no rancho em

San Saba.

Posso parecer incoerente, mas

quero encontrar Eric num terreno neutro,

como na casa de Rose, e não diante de


Edgard e seus amigos, que sabem sobre
tudo que fiz. Pretendo me explicar para
Eric, o que seria impossível com Edgard
me rondando.

— Sabe que gostei muito do

que vi entre você e ele. Também me

agradou o jeito com que Eric se

comporta. É reservado e não faz

perguntas invasivas sobre nós. Parece

não nos achar devassos. Está mais


focado na carreira dele de artista, ainda
mais agora, que vai expor numa galeria
famosa de Nova York.

Estou sentada na cadeira diante


do espelho da cômoda, e Edgard anda

ao meu redor, passando a ponta do dedo

em meu rosto e entre os cabelos.

Embora seja um costume dele, esse

movimento sempre me deixa tensa e um

pouco temerosa.

— Estive pensando,
deveríamos mudar a nossa regra e

repetir. — Quando o escuto, um fogo


corrói as entranhas. — Percebe que eu

estava certo em procurar touros do


nosso meio? — Ele me encara.

— Não acha mais arriscado?

— indago, preocupada. — Nunca

fizemos assim.

Meu peito pula mais que folião


atrás do trio-elétrico. Não posso
machucar o meu coração dessa forma,

ao me entregar fisicamente a um cara


que se encaixou na minha mente como o

homem dos meus sonhos. Além disso,


ele me desperta emoções e sensações as

quais não são correspondidas.

— Não há riscos, Safira, ao

contrário, temos mais segurança com

Eric e, quem sabe, com Tony também.

— Mas...
— Mas nada. — Edgard então

segura o meu rosto de modo firme e


inclina o seu para ficar bem próximo ao
meu, assustando-me. — O único risco

que existe é você se interessar

romanticamente por algum deles.

Tenho a impressão de que meu

coração para e depois volta a bater.

— É claro que não! — Nego


com veemência, empurro a mão de
Edgard e me ergo. — Eu não quero ser

promíscua e estar passando de mão em


mão de homens que você costuma

marcar para sair e quer que eu te


acompanhe. — Abro os braços,

aborrecida.

— Calma, amor! Isso não vai

acontecer. Só vai aceitar quem você

quiser e quando quiser.

— É o que diz sempre! —


reclamo.

Edgard me abraça e beija a

minha orelha e pescoço, mas meu corpo


não reage mais como antes.

— Eu te amo, Sah! Termine de

se arrumar que a gente vai se divertir

hoje.

Respiro fundo.

— Quer uma bebidinha para

alegrar? Vou preparar pra você.


— Não, não quero.

Ele sai e eu volto a me sentar

diante do espelho. Passo um batom


vermelho, arrumo os cabelos soltos com

as mãos trêmulas de tanta ansiedade por

causa de Eric. Opto por um vestido

básico, um tubinho azul meia-noite com

mangas três quartos, e calço sandálias

de salto médio. Confiro o espelho mais


uma vez, pego um casaquinho cropped
combinando e saio.

A noite está um pouco mais fria

com a aproximação do fim do outono.


Aqui, em Austin, o inverno não costuma

ser intenso. Encontro Edgard no pé da

escada, me esperando com um copo na

mão.

— Uma bebidinha preparada

com muito amor — ele oferece. Pego o


copo de uísque e o cheiro não me
agrada. — Tome, amor. Não pode é

beber muito, mas uma só dose não faz


mal algum.

Finjo tomar um pequeno gole,

mas logo devolvo o copo.

— Não sei por que, em algumas

ocasiões, insiste tanto para que eu beba!

Não quero passar vergonha. Ainda mais

que vou encarar Helga, Lucy, John e


Anthony. Agi de maneira muito libertina
com Helga. Estava louca, nem sei o que
me deu.

Edgard sorri.

— Apenas foi você mesma, a

Safira depravada e gostosa que conheci

e por quem me apaixonei.

— Não fale assim, Ed. Até

parece que era ninfomaníaca. Mas, na

verdade, a gente misturava tudo, não é?


Bebidas e drogas, e eu sempre ficava
muito doida. Graças a Deus, paramos.

— Tome mais — ele insiste e

leva o copo aos meus lábios.

— Não quero. — Afasto a sua

mão e sigo para a porta.

Edgard coloca o copo na

mesinha abaixo da escada e me segue.

Saímos do condomínio, que


fica numa área arborizada e cheia de

belas casas espaçadas. Em poucos


minutos, trafegamos pela Congress
Avenue, uma grande avenida com seis
faixas de trânsito. Passamos pela ponte

sobre o lago Lady Bird, que nos leva ao

Capitólio do Texas, no coração de


Downtown.

Em poucos minutos, chegamos

a Sixth Avenue. Edgard estaciona e

vamos andando em direção ao Parker,


um clube com música ao vivo de blues e
jazz. À medida que nos aproximamos,
minha respiração acelera e as mãos
transpiram.

Entramos na recepção e Edgard

compra nossos tíquetes de acesso. Deixo

o meu casaco na chapelaria do hall de

entrada.

Observo ao redor, entre as

dezenas de mesas redondas em madeira


escura, dispostas de modo espaçado,
algumas delas ocupadas. A iluminação

azulada nas laterais contrasta com o


palco e alguns pontos de luz

avermelhados, o que causa uma


sensação confortável.

Avisto Anthony fazendo um

sinal e mostro a Edgard. Meu coração

deprime um pouco, porque não vejo

Eric. Entendo que ele não queira mais


me ver. Racionalmente, sei que é isso
que acontece, mas os meus sentimentos
não compreendem.

Ao me aproximar, bate uma


imensa vergonha misturada com

insegurança, contudo tento não deixar

isso visível. Cumprimento a todos na

mesa e me sinto aliviada com a

demonstração de simpatia das pessoas.

Eu me sento ao lado de Helga.


Em algum momento, quero me desculpar,
caso ela tenha me considerado invasiva
em San Saba.

Mas, assim que tem


oportunidade, Helga segura a minha mão

e cochicha em meu ouvido:

— Será que vamos

protagonizar um novo show hoje? — Ela

me fita e sorri.

— Acho que eu estava muito


louca, bebi demais no rancho. Se fiz
algo que te incomodou, me desculpe —

respondo, tensa. Minha garganta está


seca, as mãos transpiram e eu as esfrego

no vestido.

— A única coisa que me

incomodou foi você ter ficado com o

meu crush! — Meu coração gela. —

Poderia ter me chamado, poderíamos ter

realizado essa fantasia juntas...

Apenas dou um sorriso amarelo


para Helga. Acho que, se tivesse um

buraco, eu derreteria e escorregaria para


dentro dele. Nunca me imaginei numa

orgia assim. Sempre fui levada a


reboque de Edgard e aceitava um

parceiro, mesmo no swing. Esse

comportamento nunca foi normalizado

para mim, como as pessoas imaginam.

— Por falar nele, olha quem


está chegando! — Helga aponta para
Eric, que nos procura entre as mesas.

Nesse mesmo instante, Tony

fica de pé e toma a minha mão.

— Por favor, Safira, vamos

dançar essa música? — ele pede.

Paraliso. Fito Edgard, que

apenas sorri. Sinto uma terrível vontade

de chorar, porque vem aquela velha

sensação de que não passo de um


pedaço de carne. Mas apenas respiro
fundo e também me levanto, seguindo-o.

Toca um blues[25] suave quando

chegamos à pista quase vazia. Anthony

enlaça a minha cintura. De tão tensa,

acabo pisando em seu pé com o meu

salto.

— Desculpe!

Ele contorce o rosto de dor e

também tenta disfarçar.


— Tudo bem, Safira. Acontece.

Reviro os olhos. Estou dura que

nem uma vara.

— Relaxe! Eu não mordo.

Deixe que eu te conduzo.

Nada respondo e dou alguns

suaves passos no ritmo da bela canção.

Mas meus olhos estão presos em Eric.

Acompanho-o chegar à mesa, enquanto


dou meus passos nos braços de Tony.
Eric cumprimenta a todos e recebe um

abraço caloroso de Helga, o que me


aborrece mais do que deveria. Pouco
depois, John e Lucy vêm dançar.

— É tímida assim sempre? —

Tony tenta puxar conversa.

Eu o encaro.

— Sou... na verdade, sou muito

tímida a maior parte do tempo —


respondo, de má vontade. — Mas, por
favor, não faça qualquer insinuação pelo

que aconteceu no rancho. Não tenha essa


audácia! — advirto.

Não sei onde arranjei forças

para demarcar o território dessa forma.

Talvez seja o desespero para escapar

dessa dança.

— Não ia dizer nada, calma.

Eu... eu só estava tentando iniciar uma


conversa. — Acabo de deixá-lo
visivelmente sem graça.

— Não quis parecer

grosseira... É, vamos nos sentar? Já


estamos em outra música...
Concentro esforços para me

afastar do circuito que envolve Safira e


Edgard, mas a fissura nela enfraquece as
minhas defesas e me faz recuar desse

propósito.

Sai da STW decidido a não


aceitar o convite dos amigos. Mas assim

que cheguei em casa e avistei a tela que

comecei esboçar em segredo, tomei um

banho e vim. Pesou também as

mensagens de Rose relatando a visita de

Safira.

Sua amiga Safira apareceu


hoje aqui. Ela é um doce, não é?

Perguntou por você, Eric. Queria saber


dos seus quadros, onde trabalhamos e

até a levei ao ateliê, escreveu Rose.

Essa visita à casa dos Hoover

me atiçou. Ficou claro que ela tem

interesse em conversar comigo. É como

se ela procurasse uma ponte que a

ligasse a mim, diferente do que eu tinha


previsto. Imaginava que ela quisesse
distância dos homens que lhe serviam de
touros, conforme Edgard havia avisado.

Mas, assim que entro no


Parker, clube que frequento há um bom

par de anos, vejo-a dançando nos braços

de Tony. As minhas expectativas caem

por terra. Entendo que é um aviso de que

o baile segue o seu curso para Safira e

Edgard. Afinal, haverá uma nova


conquista em breve.
Confesso que sinto ciúmes. Em

seguida, vem aquela sensação de que


sou um tremendo otário.

Peço um uísque duplo. Vim sem

carro, decidido a beber.

Distraio-me conversando com

Helga e Edgard até que Safira retorna à

mesa com Tony. Eu os cumprimento com

acenos.

Tenho a impressão de que todos


podem perceber as faíscas que

explodem de meus olhos em direção a


ela, que mexe comigo de uma forma que

não consigo criar barreiras. Disfarço


bem e retorno a minha atenção a Helga,

que se insinua para mim.

A garçonete serve a minha

bebida e logo sorvo um grande gole, que

parece queimar a garganta e aliviar a


ansiedade.
— Pensei que fosse me ligar

depois de San Saba. Afinal, a sua ficante


do rancho parece que é um ponto final,

não? Ou estou enganada? — Helga

indaga de maneira insinuante.

— Não faço ideia —

desconverso.

Fito Safira e nossos olhares se

encontram, mas logo ela os desvia de


mim. Se fosse ser sincero com Helga,
responderia que esse sinal se parece

com uma grande interrogação enquanto


gostaria que fosse um ponto de

seguimento.

— Soube que ele gosta de

olhar... — Helga comenta e fita

discretamente Edgard.

— Quem te falou isso tem a

língua muito solta — cochicho em seu


ouvido. — Esqueça isso — completo,
num tom mais sério. — Vamos dançar...

— Seguro a mão de Helga e a conduzo


para a pequena pista de dança enquanto

segue o show de blues.

Pouco tempo depois, Edgard e

Safira também dançam bem próximo.

Eles conversam, ou melhor, eles

parecem discutir. Quando a conversa

deles se aquieta, meus olhos e os de


Safira se cruzam, e eu sinto como se ela
suplicasse algo de mim.

Tenho a nítida impressão de

que vou pirar, caso não converse com


ela sobre tudo que aconteceu no rancho

e sobre o que realmente pensa sobre as

suas aventuras eróticas.

Desisto da dança e sigo com

Helga de volta à mesa. Aparece outro

casal do escritório, George Rodrigues e


sua esposa Kimberly, que trouxe uma
prima, uma tal de Ellen. Logo Edgard e

Safira retornam. Conversamos animados


entre assuntos de rotina da vida e do

trabalho, como também escuto algumas

piadas típicas de americanos, dessas

que nós nos esforçamos para achar


graça.

Ao ser perguntado sobre a

exposição, explano sobre como será


essa oportunidade, numa galeria de
Manhattan. Conto que vou pegar uma
licença não-remunerada de cinco dias
para cumprir a agenda do lançamento.

— Essa pode ser uma grande

oportunidade de me estabelecer no

restrito mercado de artes — explico.

— Pretende se mudar para

Nova York? — pergunta Kimberly.

— Não ainda. Pretendo cumprir


o contrato com STW e terminar o
módulo do projeto em que trabalho lá.

— Terminando o meu curso,

vou para Nova York contigo! — pilheria


Helga, como se fosse uma piada. Apenas

sorrio para ela e sorvo mais um pouco

da bebida, já de outra rodada.

— Não se anime, Helga, Eric

sempre foge de compromissos amorosos

— zomba Tony e o fito, aborrecido. Eles


sabem que, desde Samantha, não
apresento ninguém como namorada.

Pouco depois, começa a tocar

uma canção da minha playlist,


Tennessee Whiskey, do Chris Stapleton.

Respiro fundo e me estico para tocar a

mão de Safira.

— Agora é nossa vez de dançar

um pouco — digo com os olhos fixados

nos dela.

Contudo, o semblante assustado


e inseguro de Safira quase me faz perder

o chão. Mas nada demonstro e avanço


em minha investida. Levanto-me e

arqueio as sobrancelhas na direção de

Edgard. Não escuto, mas ele a estimula


a ir.

Ela se levanta e sai de seu

lugar. Vou até ela, sem me importar com

os olhares sobre nós. Suavemente, toco


as suas costas e a conduzo para a pista
onde alguns casais dançam.

Travo-a nos meus braços num

só movimento, conduzindo-a no ritmo


lento. Tenho tanto a falar, mas o meu

desejo também bate níveis altos, e minha

cueca começa a se expandir

rapidamente, numa mistura de excitação

e ansiedade.

Aspiro o seu perfume e tudo


que eu quero é afundar em seus cabelos
e pressioná-la contra a minha ereção.

Respiro fundo para controlar os

meus instintos criminosos. Meu objetivo


não é dançar, nem a seduzir. Assim que

nos afastamos mais do raio de visão da

mesa, eu a fito, ansioso.

— Safira...

— Eric... — ela pronuncia

quase ao mesmo tempo que eu, sem


esconder a sua inquietação.
— Tenho tanto pra te falar, pra

perguntar... — digo com os meus olhos


firmes em sua pupila.

— Eu também, Eric... Eu, eu...

estou... na verdade, vivo muito confusa

com o que me acontece. Mas, por favor,

não pensa mal de mim por aquela noite

no rancho... eu, eu estava... — Os olhos

dela marejam, o que os deixa ainda mais


belos e abissais.
— Safira, pare. Não penso

nada de você. Quer dizer, não penso


nada mal sobre você. Preste atenção! —

Minha mão cheia de desejos serpenteia

as suas costas e pousa em sua nuca,


debaixo de seus cabelos. — Eu penso é

em você! Não me esqueci daquela noite,

não por sacanagem, mas por você. —

Estou prestes a beijá-la, mas me

controlo. — Eu quero você de novo,


longe dos olhos de seu marido.

Não aguento e a faço sentir a

minha ereção inchada dentro das calças.


Ela me empurra levemente, mas eu a

mantenho entre meus braços.

— É igual aos outros — ela

acusa, com semblante confuso.

— Não, nunca... Não sai dos

meus pensamentos, Safira. — Ela olha


para o chão. — Ouça, eu vou dizer que
vou embora, mas não vou. Em 20

minutos depois que eu sair, me encontre


no banheiro feminino.

— Mas...

— Vamos pra mesa, antes que

eu faça uma besteira aqui.

Saímos na pista e, parte do

caminho, seguro a sua mão como se

fôssemos um casal. Quando nos


aproximamos da mesa, eu a solto. Não
sei que loucura me tomou, mas nunca

quis algo como quero essa mulher, não


consigo mais me enganar.

Sei que ela é casada, que eles

são escorregadios em seu

relacionamento. Além disso, ela me

envia sinais trocados. Às vezes, imagino

que ela está sendo pressionada por

Edgard, em outros momentos, penso que


Safira gosta de seduzir e colecionar
conquistas.

De todo modo, preciso tê-la

outra vez, como touro, ou não. É insano.


Mas é um impulso quase incontrolável.

Como conheço alguns garçons,

vou ver o que arrumo com algumas notas

de dólares na mão.
Minha garganta parece se

fechar e meu coração bate


descompassado. Já não sei se é de medo
ou alegria, pois esses sentimentos se

misturam em mim, provocando


sensações que há séculos não

experimentava.

Pego o copo e sorvo um grande

gole da margarita, o drinque parece

relaxar os músculos da garganta.

Como prometeu, Eric se

despede e sai. Olho o relógio e são 23


horas. Ao vê-lo se afastar, Helga o
segue e uma frustração tremenda me

toma. Será que ela vai descobrir que na


verdade Eric não vai embora do clube?

Sinto um ódio gratuito do

oferecimento dela para Eric e, ao

mesmo tempo, inveja, pois Helga pode

tê-lo caso ele a deseje, ela é livre.

Quanto a mim, estou dentro de uma

relação cheia de emaranhados


emocionais que me sufocam.
Observo Edgard e não sei se

terei coragem de ir ao banheiro no


horário combinado. Se eu for, o que Eric

vai pensar de mim? E se Edgard

descobrir? O peito comprime, a barriga


revira. Uma tempestade de dúvidas

atravessa a minha mente.

Passam-se apenas cinco

minutos, e Helga retorna com um sorriso


estampado no rosto. Então tento me
entreter com a conversa, enquanto os
ponteiros do meu relógio de pulso
parecem carregar pesos, tamanha a

demora de se moverem.

— Está gostando da noite? —

Edgard resolve me dar atenção, para o

meu desespero.

— Muito — respondo,

econômica.

— O que Tony e Edgard


falaram pra você enquanto dançavam?

— ele indaga bem baixinho no meu


ouvido.

Suspiro, cansada. Neste tom,

ele quer saber se fui cortejada, admirada

ou elogiada, pois isso enche o ego dele.

— Nada de importante... —

minto e beberico mais do drinque.

Ele acaricia a minha mão e a


leva os lábios, beijando-a. Observo as
pessoas conversarem animadas. Não
consigo ser como elas e nem ser feliz.

— Quero que fiquem


louquinhos... — ele cochicha outra vez.

Sorrio, forçada, para ele e

observo discretamente o relógio pela

centésima vez. Constato que falta menos

de dois minutos para o horário

combinado.

— Vou ao toalete — digo


baixinho para Edgard.

— Chame a Kim ou uma das

meninas... — Puta que pariu!, praguejo


mentalmente. — Estou indisposta,

prefiro ir só... — argumento, com o

coração na mão, carregado de medo de

uma das garotas perguntar para onde

estou indo e se oferecer para me

acompanhar. Mulheres sempre gostam


de irem juntas ao banheiro.
Discretamente me levanto,

controlando o meu tremor. Evito olhar


para qualquer pessoa da mesa. Eu me

afasto e parece que o peso do mundo


segue comigo, como também os olhos

das pessoas que deixo para trás.

Atravesso o bar. Tenho a

impressão de que é possível aos

frequentadores anônimos perceberem


que estou fazendo algo errado. Sigo pelo
lado oposto de onde estava, passo pelo
bar, de cabeça baixa, e sigo para a
lateral do palco que dá acesso aos

banheiros.

Só agora me pergunto como

Eric irá entrar no banheiro feminino sem

chamar atenção, visto que as baias dos

sanitários são apertadas e ele é um cara

grande. Meu peito treme mais que motor


de carro velho assim que me aproximo
da entrada. Olho para a direita, onde as
mulheres saem aos risos por entre as

portas saloon[26] do banheiro e não


avisto Eric.

De repente, um braço forte

envolve a minha cintura e me puxa para

a esquerda.

— Calma, sou eu — ele

murmura no meu ouvido e me conduz

rápido para uma sala escura e apertada,


que mais parece um pequeno escritório.

— Eric, eu... — Sou silenciada

por seus lábios exigentes, que exploram


a minha boca com urgência, enquanto

fecha a porta atrás de nós, deixando o

ambiente apenas com uma luz

avermelhada e fraca, que vem de um

abajur sobre uma escrivaninha.

Os seus lábios úmidos e a


língua gulosa, que quase ocupa minha
boca inteira, atiçam o meu corpo e me

deixam molhada e sedenta. Pressiono


uma coxa na outra. Eu o aperto com

força, na certeza de que é real e que

estou outra vez nos braços dele,

enquanto sinto o seu pênis duro, como


um torpedo, se esfregar em mim.

Um tesão alucinado se espalha

por mim. Eric enfia a mão embaixo do


meu vestido e delicadamente afasta a
calcinha. Assim, ele sente nas pontas
dos seus dedos a calamidade de meus
desejos molhados e pulsantes, entre os

pequenos lábios e o clitóris.

Ele geme sobre a minha boca,

mas não se afasta. Ergue o meu corpo e

me leva até a mesa, onde me coloca

sentada. Objetos caem no chão e não nos

importamos. Então ele desabotoa a sua


calça e rapidamente o seu pau está livre.
Levanto o vestido só o

suficiente para ele se encaixar melhor e


abro as minhas pernas sem que ele peça,

já bem oferecida. Eric deixa meus

lábios, e sua respiração é carregada e


ofegante. Pega um preservativo na

carteira, abre o invólucro e o coloca no

pênis. Ele me fita e afasta gentilmente a

calcinha. Então me penetra, inclinando o

meu corpo para trás, enquanto beija e


mordisca o meu pescoço.

A sua glande grossa atravessa o

meu canal e busca refúgio no topo de


minha intimidade. Mordo os meus

lábios, inebriada. Depois do primeiro

reconhecimento desse caminho, Eric se

movimenta vorazmente enquanto eu me

perco em urros de prazer.

Ele mordisca os seios por cima


do vestido, que não tive tempo de retirar
devido a nossa urgência insana, ao

tempo que estimula o meu clitóris.


Contraio os músculos da vagina,

apertando e relaxando ao redor do seu

pau, como se meu canal fosse capaz de


mastigá-lo.

— Ah! Safira, que delícia! —

ele geme. Assim, sei que ele sente os

meus estímulos para satisfazê-lo.

Não me demoro e gozo em


abundância nessa sala escura e apertada.

Espasmos tomam o meu corpo e me


contorço sobre o espaço minúsculo da

mesa. Gemo alto. Cravo as minhas unhas


nos braços dele e o arranho.

Em seguida, Eric não me deixa

respirar e me conduz a virar de bruços

sobre a mesa. Assim, ele levanta o

vestido até desnudar a minha bunda e me


dá um tapa.
— Quero te foder toda... — ele

diz sedento.

Poderia ficar assustada, mas


tudo que sinto é satisfação e vontade de

dizer: “siga em frente e faça o que

quiser comigo”. Mas mordo a língua e

me contenho.

Ele amassa as partes da minha

bunda. Em seguida, com o pênis, tateia a


minha entrada. Então me penetra
devagar e vai bem fundo. Juntos,
soltamos um gemido uníssono.

— Eu não paro de pensar em


você e nem de desejar estar dentro de

você... — ele confessa com a voz

carregada de deleite, enquanto entra e

sai lentamente de dentro de mim, como

se saboreasse cada centímetro da minha

intimidade.

— Nem eu, Eric. Sonho


contigo. Você nem faz ideia... — revelo,

num murmúrio. Só que ele não é capaz


de dimensionar que meus pensamentos

ultrapassam as fronteiras dos desejos


eróticos e permeiam o cotidiano

romântico, que é como o quero, em meus

devaneios pueris.

Aos poucos, ele vai

aumentando a intensidade dos


movimentos dentro de mim, até ganhar
um ritmo frenético e eu ter a impressão
de que vou rasgar ao meio sobre essa
mesa estreita de fundo de bar.

Seguro na extremidade da

madeira e gemo como uma doida,

enquanto ele me cavalga e tensiona o

meu cabelo para trás até nossos rostos

se encontrarem. Então, ele goza e ruge

no meu ouvido, provocando novos


espasmos no meu corpo.
Após a explosão de prazer,

Eric me vira, se livra do preservativo e


me abraça. Eu me encaixo em seu

peitoral de um jeito perfeito e fico ali

sentindo o seu perfume e escutando a sua


respiração e o coração acelerado. À

medida que vamos nos acalmando, me

preocupo com o tempo que passei ali.

Bem nítida, aparece a imagem de

Edgard enfurecido comigo.


— Desculpe por essa...

grosseria — ele pontua. — Pretendia


conversar, mas não consegui me segurar.

Estou confusa e nem sei o que

dizer, então lhe ofereço os meus lábios.

Trocamos um beijo mais suave, só que

não menos excitante. Pouco tempo

depois, devagar, vou finalizando o beijo

sem que ele proteste.

— Eric... eu... eu não sou a


mulher que você imagina que sou —
finalmente digo.

— Não te julgo, Safira.


Entendo as escolhas não-

convencionais... Também não quero que

me julgue pela minha urgência de agora.

Por favor, não se sinta usada por mim,

pelo que acabou de acontecer... São os

nossos desejos apenas. — Ele segura a


minha cabeça e me encara na penumbra.
— Morro de tesão em você. Virou a
minha cabeça...

Nessa hora, alguém bate na


porta. Meu coração para.

— Edgard! — consigo

pronunciar com a garganta quase

fechada.

— Calma, não é ele... — Eric

tenta me acalmar, enquanto fecha a sua


braguilha.
Ele entreabre a porta só o

suficiente para conversar com alguém.


Fico no lado oposto a ele e não consigo

escutar nada. Quando conclui a

conversa, ele fecha a porta e me fita.

— Edgard veio até a entrada do

toalete à sua procura, precisa ir para ele

não desconfiar.

Ajeito o meu vestido


nervosamente, com a tensão alçando
picos estratosféricos. E, sim, eu me sinto

usada, parece que o que importa é


apenas o que carrego entre as minhas

pernas.

Eric vem até mim e me beija.

Nossas línguas se roçam e parecem

gritar que ainda não é suficiente e que

precisam de mais de nós dois. Mas logo

nos afastamos.

— Vou te enviar mensagem


pelas redes sociais e podemos marcar
uma conversa — ele propõe.

— Não, não faça isso — digo,


temerosa. — Eu... eu tenho quase certeza

de que Edgard monitora as minhas redes

e mensagens. Aliás, o meu celular como

um todo.

— Cretino! — ele pragueja e

pensa por alguns segundos. — Amanhã


pela manhã, vou na casa da Rose.
Suspiro nervosamente.

— Passo lá — asseguro e lhe

sorrio.

Eric volta a envolver a minha

cintura e me beija suavemente, o que é

um bálsamo à minha tensão. Penso em

Edgard e em sua fúria e logo me

desvencilho de Eric.

Abro a porta para sair. Mas,


atrás de mim, ele me segura.
— Espere — Eric murmura e

consulta o seu celular.

Pelo pequeno vão aberto da


porta, avisto Edgard passar outra vez

diante do acesso ao banheiro. Gelo e

gotas de suor aglomeram na testa. Meu

coração está prestes a ter um colapso.

Então um garçom vai até ele e conversa

algo. Pouco depois, Edgard sai de lá e


parece retornar à mesa.
Desesperada, puxo a porta para

sair, mas Eric a segura.

— Calma, está tudo sob


controle. Tem alguém de olho em Edgard

e na mesa pra mim. — Ele beija a minha

cabeça e volta a consultar o seu celular.

— Agora... vá para o banheiro,

lave o rosto e se acalme. Só retorne para

a mesa quando se sentir segura. Diga


que passou mal.
— Está bem — respondo,

ansiosa.

— Eu amei o que aconteceu


agora há pouco! — Nossos olhos se

encontram e nos vemos com mais

nitidez, graças a um pouco mais de

luminosidade que passa para o vão.

Comprimo os lábios, esboçando um riso

curto.

— Eu também — respondo e
parto.

Como Eric recomenda, vou

direto ao banheiro. Faço a minha higiene


e lavo o meu rosto, trêmula. Então

retoco suavemente a maquiagem, ainda

com o coração a mil pelo que acabo de

viver.

Enquanto retorno, me foco para

transparecer segurança. Observo o


relógio e se passaram exatamente quinze
minutos, o que foi tempo suficiente para

eu sair da Via Láctea e retornar, também


tempo suficiente para infringir a

principal regra do meu relacionamento

com Edgard: nunca o trair com outro

homem distante do seu olhar ou de sua


aprovação.

Eu me aproximo da mesa com

as pernas bambas de tanto nervoso,


como também pelos meus gozos.
Edgard, quando me vê, se levanta e vem
na minha direção.

— O que houve? — indaga com


os olhos dilatados.

— Tive um desconforto

intestinal! — rebato, tentando imprimir

segurança.

— Devia ter avisado. Te enviei

várias mensagens! Não sei pra que tem


celular — ele reclama, rabugento, mas
não me importo.

Estou nas nuvens, culpada, mas

feliz.

Saí pela cozinha do clube de

música. Tenho camaradagem com alguns

garçons e um dos gerentes. Peguei um


carro por aplicativo e retornei para o

apartamento. Poderia beber mais e


apagar, mas prefiro gastar essa energia
na minha nova tela.

Coloco o cavalete diante da

televisão e, na tela, abro uma das


imagens de Safira em uma de suas redes

sociais. Todos os dias trabalho um

pouquinho nela. Não sou bom em

reproduzir imagens, mas estou quase

obcecado por Safira.

Não tenho orgulho pelo que


aconteceu.
Eu me esquivei da razão e não

controlei o meu desejo. E também traí a


amizade de Edgard. E o pior de tudo é a

certeza de que continuarei a ser desleal

a ele, caso Safira também queira.

É tudo muito insano, mas não

quero deixar de viver isso nem por um

segundo. Ainda que essa situação seja

uma grande prova de fogo para mim,


afinal, eu rompi com Samantha porque
ela viveu algo parecido com um sujeito
casado.

Repito a história. Dessa vez, no


lugar dela. Mas não foi proposital. É a

esteira do destino e nada podemos fazer

para freá-la.
Sábado

A ansiedade consome metade

de mim. A outra parte é devorada pelo


medo. Acordei cedo, peguei o carro e

fui fazer compras. Retornei, arrumei os

itens e adiantei o almoço. E agora já


passam das 9 horas.

Sou uma mulher que teme o

novo, essa é a verdade. Em 25 anos de

vida, nove deles foram ao lado de

Edgard. Assim, permiti que raízes

crescessem ao meu redor e me fixassem


ao lado dele. E não sei me libertar.
Temo. Sinto culpa.

Não construí a minha própria

vida e vivi na sombra do meu marido.


Não existe isso hoje em dia. Toda

mulher procura o seu espaço. Mas eu me

rendi ao drama e às pressões de Edgard,

como também à sua possessividade

doentia, que é moldada pelo jeito

esquisito com que encara o nosso


relacionamento.
Mas não posso culpá-lo apenas.

Talvez ele esteja doente, talvez eu


também esteja. O que percebo agora é

que nossas verdades absolutas sempre


foram tóxicas e nos conduziram para

uma relação pesada e triste, que se

desmanchou. Só que ele não se deu

conta de que falimos como casal.

Nesse momento, termino de


tomar uma ducha rápida, ponho uma
legging com camiseta e calço o tênis
para caminhada.

Tenho ciência do quão errado é


o que estou fazendo. Só que Eric me

eclipsou e sua luz tem me feito perceber

nuances as quais não enxergava antes. E

o mais importante, é que me sinto viva.

Mesmo que seja só uma

aventura, que ele me queira apenas por


sexo, estou me permitindo viver essas
emoções, coisa que não experimentava
desde que me apaixonei por Edgard, aos
15 anos.

O sexo com Eric no escritório

do clube foi bastante excitante. Não

consigo esquecer a cena e nem o

torpedão dele, que deixou a minha

intimidade um pouco dolorida.

Apesar de todo esse


entusiasmo, sinto medo. É como se
houvesse dentro de mim uma balança
daquelas do símbolo da justiça. De um
lado da bandeja está Eric, o desejo, a

aventura, o pulsar do meu corpo, como


há muito não sentia; do outro lado da

balança, está Edgard, a nossa história,

as promessas, a cumplicidade e os

juramentos.

Só que neste exato momento a


bandeja pende para o lado que faz o meu
corpo vibrar. Mesmo tomada pela culpa,
eu me preparo para sair. Prendo o
cabelo num rabo-de-cavalo, aplico

protetor solar e pego um casaco. Vou até


Edgard, que ainda está deitado.

— Ed! Edgard... — chamo-o.

— Hum...

— Vou caminhar — aviso e vou

saindo do quarto.

— Safira! — Ele aperta os


olhos e sustenta o tronco nos antebraços.
— Está tarde... Use a esteira que
comprei e fica jogada lá embaixo.

Meu rosto queima.

— Não... não está tarde. O

inverno está chegando e o clima está

bem tranquilo — respondo.

— É teimosa!

Deixo-o reclamar e desço as

escadas. Rumo para a saída. Esse


encontro me inquieta. Não sei se posso
ou devo me abrir para Eric. É provável
que ele só me veja como uma aventura.

Mas, só de pensar nisso, o meu coração


tão cheio de esperanças comprime no

peito.

Dou passadas largas e firmes

em direção à casa dos Hoover.

Caia na real, Safira! Não crie


expectativas. O que acha que Eric ou
qualquer homem pensaria de uma mulher
que é oferecida pelo marido para uma
aventura de uma noite? Acha mesmo que

ele vai acreditar que você sofre ao se


submeter aos caprichos de seu marido?

Respiro fundo. Eric não vai

acreditar! Afinal, eu estava muito doida

quando o escolhi no rancho, além de

dançar e beijar Helga de modo erótico e


provocativo na frente de todo mundo. Eu
queria... chamar a atenção dele. Como é
difícil admitir isso!

Por outro lado, até eu, se


assistisse à cena que protagonizei na

frente de todos, nunca acreditaria que

não fosse uma mulher de alma libertina.

Não sei o que me dá quando vou brincar

com um touro, sempre estou louca. É

que, de tão ansiosa, bebo demais e


perco os freios sobre o que faço.
Aproximo-me da casa dos

Hoover e minhas reflexões derretem


diante da ansiedade e da expectativa de

reencontrar Eric.

Safira é uma aventura perigosa,

que me faz agir da forma que repudiei

quando estive do outro lado, no papel do

enganado. Mas a minha situação é ainda


mais terrível, afinal sou amigo do traído.
Porém, pondero a meu favor

que Edgard deveria ter mensurado os


riscos de isso acontecer quando

resolveu se aventurar em seus fetiches.


Ao abrir a relação para uma terceira

pessoa, ele deixa as portas escancaradas

para que outros desejos surjam. É muita

presunção dele considerar que está no

controle de tudo.

— O que acha de lançar mais


sombra nessa área aqui? Talvez
provoque um contraste visual
interessante, não acha? — sugere Rose.

Balanço a cabeça, em negação.

— Quero que essa tela seja

luminosa e cause uma sensação de bem-

estar em quem a observa. Só vou manter

essa pequena zona um pouco sombria.

— Aponto.

— Isso reflete o seu espírito,


Eric. — Rose sorri. — Só se atente que
todo dia ensolarado tem a sua própria
noite sombria.

Rose franze o cenho e

comprime os lábios. Então verifica a

notificação que acaba de chegar ao seu

celular, guardado no bolso do avental.

— É do Tom. Ela acabou de

chegar. Fique aí, vou na sala recebê-la.


— Rose olha ao redor do seu ateliê. —
Só não quebrem nada — adverte, num
tom de zombaria antes de sair.

Eu contei para ela sobre Safira,


só não revelei acerca do fetiche de

Edgard, porque não é um assunto que me

diz respeito. E não sei se a cabeça dela

conseguiria digerir direito esse assunto

de cuckolding. Para disfarçar, falei que

Safira está com a relação em crise.

Tiro o avental de pintura e


confiro a minha roupa. Logo me
arrependo de não ter me arrumado com
peças mais novas que a bermuda cargo

batida e a camiseta branca e velha.


Inquieto, me sento numa das cadeiras do

ateliê.

Escuto passos lá fora e uma

inquietação toma o meu peito.

Ela empurra a porta.

— Oi... — diz um pouco


envergonhada.

Paraliso por alguns segundos

diante de sua imagem. Não compreendo


como uma mulher com semblante tão

puro e dona de uma beleza tão sublime

pode se envolver em situações tão

excêntricas ao lado do marido.

— Oi... — respondo.

Recupero o prumo e me levanto


enquanto ela entra timidamente.
Aproximo-me e a encaro, sem dizer uma
única palavra. Seguro a sua mão e
continuo a fitá-la. Safira fica vermelha

como um tomate, então sorrimos um para


o outro.

Eu a abraço apertado. Parto em

busca de seus lábios, numa ânsia mais

forte do que sou capaz de controlar. Só

encontro um pouco de sossego quando


enterro a minha língua em sua boca e
tenho a dela sobre a minha, entre fluxos,
refluxos e chupões. Mas logo os lábios
macios e a boca gostosa e quente de

Safira se tornam um convite à luxúria da


carne.

Afrouxo o abraço. Procuro os

seus seios e os amasso, passo o dorso

dos dedos sobre os bicos duros e a sinto

suspirar. Contudo, Safira afasta as


minhas mãos e interrompe o beijo e as
carícias.

— Precisamos conversar... —

ela fala, com o rosto afogueado. Sorrio,


achando-a linda.

— Desculpe — digo com

calma. — Por onde começamos?

Indico-lhe uma cadeira para

que se sente.

— Eu... eu não sei — ela

responde ao se acomodar.
Sento-me diante dela e

descanso os cotovelos sobre as coxas


para que a encare de igual para igual.

Safira está visivelmente inquieta e tensa.


De repente, também me agito. Afinal, já

fizemos sexo duas vezes, mas nunca

conversamos à vontade.

— Seu quadro novo? — Ela

aponta para a tela.

— Sim, inspirado naquela


paisagem da saída do rancho.

— Ah! Vai ser lindo! A

paisagem realmente é encantadora. E


amei San Saba e o rancho.

Pego o celular, procuro rápido

na galeria de imagem e lhe mostro a

minha selfie diante do moinho de água.

— Me lembro desse moinho.

Quis parar, mas Edgard alegou que as


cidadezinhas do Texas são todas iguais
— ela diz, sem esconder a sua
insatisfação.

— Que pena! Como está


Edgard? — pergunto e me sinto um

tremendo filho da puta fura-olho.

— Ainda está na cama — ela

responde, constrangida.

— Não fique assim, não se

sinta culpada por nós. Aconteceu.


Quando vocês abriram a relação para o
jogo erótico, havia esse risco.

Ela enche os pulmões de ar e

observa as suas unhas pintadas de rosa,


parecendo escolher as palavras de

maneira meticulosa.

— Não sou... não sou uma

mulher leviana como pareci no rancho.

— Não penso isso de você. É

uma mulher linda, Safira. Encantadora e


muito sedutora. — Seguro as suas mãos,
que estão tensas. — Não temos que nos
envergonhar da forte atração que existe
entre nós. Somos adultos conscientes e

saberemos lidar com isso até onde for


possível. Quando eu estiver

atrapalhando a sua vida, paramos.

Os seus lábios se curvam

levemente para baixo. Seus olhos azuis

parecem gélidos e ela afasta as suas


mãos das minhas. Assusto-me.
O que falei de errado?

— Está certo. O problema é

justamente esse. Os meus riscos são


imensos. Ed é um cara muito possessivo

e ciumento. Isso pode parecer estranho,

mas as aventuras para viver os fetiches

são restritas exclusivamente ao sexo,

que acontece numa frequência do tipo

duas ou três vezes ao ano. — Safira fica


visivelmente nervosa e seus olhos
marejam. — Jurei para ele, jurei que
nunca o trairia. Eu cumpro os meus
juramentos. E olha o que estou fazendo?

— A vida não é uma ciência

exata em que se pode prever os

resultados. Há muitas variantes que

estão longe...

— Eu quero parar, Eric.

Desculpe, nem podemos parar o que não


existe. Aconteceu, foi ótimo, mas não
quero continuar me enganando e me
iludindo — ela me interrompe. Lágrimas
descem do seu rosto.

De repente, aquelas palavras

parecem socos no meu estômago, fico

atônito, sem entender a sua reação, como

também os meus sentimentos. Tento

abraçá-la, mas ela me repele e fica de

pé.

— Não, Safira, espere. —


Invisto num novo abraço e, dessa vez,
ela o aceita. Eu a puxo gentilmente para
o meu peito. — Não disse que seria

fácil.

Beijo o topo de sua cabeça.

Depois nós nos afastamos um pouco e

sorvo as suas lágrimas com suaves

beijos. Em seguida, movo os meus

lábios para os seus, mas Safira dá


passos para trás.
— Assim fica mais difícil. Ao

menos, para mim. — Ela dá mais um


passo para trás. — Na verdade, vim

aqui dizer que devemos esquecer isso


tudo. É muita loucura pra minha cabeça.

Avanço em sua direção.

— Não é verdade. O que eu

sinto, você sente...

— Tchau, Eric.

Vou até ela, a alcanço antes que


abra a porta e seguro a sua mão.

— Só me responda algo que me

atormenta, Safira — Ela me encara com


os músculos do rosto tensos e trêmulos.

— Quando te vi no churrasco em sua

casa, tanto pela forma de agir como pelo

seu semblante, me pareceu que você

gritava por socorro. Eu passei a

acreditar que Edgard te rifava a nós


contra a sua vontade. Mas trocamos
algumas palavras na saída da STW e
você me disse que tinha um coração
bandido, o que me deixou em dúvidas,

depois veio os acontecimentos no


rancho. Enfim, a pergunta é: você faz

sexo com outro homem na frente do seu

marido por prazer?

Safira ri e chora, balançando a

cabeça em negação.

— Você deve ter a sua resposta.


Não precisa sair da minha boca.

Ela abre a porta.

— Espere, Safira, eu não sei

qual é a resposta.

Ela me fita outra vez, mais

lágrimas vertem de seu rosto. Então ela

me dá as costas e se vai. E eu fico com o

coração destruído, sem saber o que fiz

de errado, e deprimido por esse


desfecho diferente do que tinha
imaginado.

— Porra! — praguejo com os

punhos fechados.
Domingo

Quantas vezes você se

considerou preparada para enfrentar


certa situação, mas, quando os fatos se

desenrolam, descobriu que não estava

pronta? Foi isso que aconteceu comigo


diante de Eric.

Assim que ele veio com o seu

papo moderninho de que, quando ele

estiver atrapalhando a minha vida, nos

afastaremos, entendi que essa será a

desculpa usada logo que ele se cansar


de mim. Frustrei as expectativas e ali
compreendi o grande risco que corro.
Eric só quer encontros furtivos. E eu não
estou preparada para enfrentar Edgard

se tudo der errado.

Pensa o que, Safira? Que Eric

iria te propor um namoro? Fui uma tola,

mesmo. Meus sonhos românticos

sabotaram esse rolo com Eric e me

deixaram um caminhão de frustração nas


costas.
Retornei para casa, destruída.

Subi para o quarto e me joguei na cama


aos prantos.

— O que tem, Sah? — Edgard

veio atrás de mim, preocupado.

— Não aguento mais essa vida!

— desabafei, machucada. — Não quero

viver pra cuidar da casa, ter o cartão de

crédito controlado por você e não ter a


minha própria renda.
Desiludida, descontei nos

problemas que nunca tenho coragem de


enfrentar.

— Safira, o que eu fiz para

você estar assim? Você pode comprar o

que quiser, Sah, desde que caiba no

nosso orçamento. Faço tudo pra que

tenha conforto! — argumentou Ed.

De bruços, sustentei o corpo no


antebraço e o encarei.
— Quero uma vida que seja

minha, Ed, e não a sua. Quero trabalhar,


ter uma carreira como as minhas irmãs.

Você é muito controlador! Estou tão


cansada de ficar debaixo de seu

calcanhar.

— Que absurdo! Ajo para te

proteger. Só quero o melhor pra você.

Fala que não quer a minha vida, mas a


minha vida é você, Sah. As suas irmãs
não tiveram um amor como o nosso.

Gargalhei, mesmo em pranto.

— Graças a Deus, elas não têm

um amor como o nosso. Porque elas não

são atiradas nos braços de estranhos

para que eles as fodam, como eu sou!

Minha garganta quis travar a

minha fala. A mente ordenava: pare!

Mas eu não me deixei vencer.

— Não misture as coisas! —


ele berrou, perdendo a paciência
comigo. — Pensei que tinha gostado de
Eric.

Quando Edgard disse isso, eu

me senti a pior mulher do mundo.

Sentei-me na cama, limpei o rosto. Ao

menos, esse rolo com Eric serviu para

me injetar alguma coragem nessa vida.

— Vou procurar um emprego na


segunda-feira. E você não vai me
perseguir por isso.

Edgard se sentou ao meu lado e

pôs a mão no meu queixo, erguendo-o.

— Vai precisar de autorização

para trabalhar ou quer ser deportada? —

argumentou, com uma pontada de ódio

na voz.

— Que exagero! Não seria

deportada, sabe bem disso. Mas até que


essa ideia seria maravilhosa! — exaltei,
enfrentando-o, cínica. — Vou correr
atrás da autorização para arranjar um
trabalho.

Edgard se levantou e deu um

soco na parede, o que me fez tremer.

— Se recomponha, Safira, não

sou seu saco de pancadas em suas crises

de TPM — ele gritou.

— Estou sofrendo, Ed. Eu não


quero mais viver dessa forma e não vou
viver.

Ele saiu do quarto, enfurecido,

batendo a porta. Respirei fundo, peguei


o romance em que deixei os dois

pequeninos ramos de bluebonnet dados

por Eric e os acariciei.

Enfim, ontem passei o resto do

dia remoendo a nossa conversa, após

toda a discussão com Edgard.

No fundo, o que eu queria com


ele era algo impossível. Gostaria de
poder fazer coisas comuns ao seu lado e
assim irmos nos conhecendo melhor.

Queria ir ao cinema, jantar juntos em


algum restaurante, fazer um piquenique e

andar de barco. Mas tudo isso é ilusão.

A culpa não é de Eric, afinal, sou uma

mulher casada.

Dentro dessas minhas


circunstâncias, o melhor é me afastar
dele, mas está doendo bastante.

Conversei com as minhas irmãs

e os meus pais, que pedem que eu vá


passar alguns dias no Brasil. Prometi

pensar no assunto. Contei a Agatha

sobre a crise com Edgard e minha

vontade de trabalhar, o que ela apoiou

incondicionalmente.

— Sah, caso decida se separar


de Edgard, nós vamos te dar muita força.
Eu tenho as minhas economias e posso te
ajudar financeiramente até você se
equilibrar, pra não depender em nada

dele — ofereceu-se Agatha, que é


médica. — Não precisa dele e nem

ficará desamparada.

— Ah, Tatá, assim você parte o

meu coração. Obrigada, meu amor. Mas

não é fácil. Sinto muita culpa... — disse


entre lágrimas.
— Pare com isso. Não teve

culpa pelo que aconteceu na Ilha de


Itaparica. Eles são os grandes

responsáveis. — Minha irmã sabe o que


ocorreu, só desconhece as motivações,

que omiti. Mas, diferente de Edgard, ela

acredita em mim, mesmo não me

recordando bem daquela noite...

Respiro fundo e deixo o ar sair


lentamente dos pulmões.
Despertei com mais disposição

nesse domingo, apesar da ressaca


emocional que enfrentei ontem.

Estou decidida a arranjar um

trabalho e sair dessa vida modus século

passado.

Arrumo o meu currículo. Quem

sabe, encontro uma oportunidade no

comércio.

— Sah, temos visita — Edgard


avisa ao entrar no escritório, um
cômodo minúsculo anexo à sala.

— Quem?

— Eric...

De imediato, não sei se escutei

direito. Depois, o nome reverbera na

minha mente, Eric... Eric...

Meus músculos travam. Um


bolo se forma na garganta e não consigo

disfarçar.
— O que ele está fazendo aqui?

— pergunto, quase num cochicho, com


os olhos esbugalhados.

— Veio trazer um quadro que

tinha me prometido algum tempo atrás

— Ed responde baixinho.

Ele deve ter inventado isso

para me ver. Não, Safira, pare de criar

esperanças idiotas.

— Daqui a pouco vou lá.


— Okay.

Edgard sai. Tento me recompor,

mas meu coração tamborila sem parar.


Nem sei mais o que está diante de mim

na tela. Fecho o arquivo. Pego o celular,

ligo a câmera, arrumo os cabelos com os

dedos. Desligo. Observo a minha roupa:

uma bermuda jeans batida e uma blusa

de moletom velhinha e branca.

Com o coração saltitante, crio


coragem e abro a porta. Eric está
sentado conversando com Ed, mas,
quando me vê, fica de pé.

— Olá, Eric... — cumprimento

com os olhos pregados no chão. Tenho

medo de me trair e deixar algo

transparecer para Edgard.

— Olá, Safira... — A voz dele

é um agrado aos meus ouvidos.

— Sah, veja o presente que ele


nos trouxe — Edgard me chama.

Vou até ele, que ergue a tela de

umas 30 polegadas, com moldura branca


e leve. Os desenhos são vibrantes,

mesclando o azul, o amarelo, o rosa chá

e detalhes em vermelho. Entre as linhas,

descubro gatos fofinhos, celulares em

varais, flores e luas como foices.

— É impactante, meio surreal.


Não sabia que pintava nesse estilo. —
Escolho as palavras, para que Ed não
desconfie de que conheço outro trabalho
de Eric.

— Trabalho em duas linhas.

Uma delas são as reconstruções

conceituais de paisagens — Eric

explica, igualmente cuidadoso. — A

outra linha é essa aqui. São como vitrais

vibrantes, praticamente sem


profundidade. É um trabalho em que
flerto tanto com o surrealismo[27] como

com a pop art[28].

— Parabéns, obrigada! Mas

não vai levá-lo pra a sua exposição? —


indago e seguro a tela só para não ter

que encará-los.

— Esse não, já vou levar uma

pintura parecida — ele informa.

— Vamos colocar onde? —


Fito Edgard e observo a nossa
decoração quase sem quadros. Vou até a
parede diante das duas poltronas. —

Acho que ficará bem aqui.

— Sim, isso. Vou buscar a

furadeira — avisa Edgard.

Coloco a tela no chão, escorada

na poltrona.

— Quer um café? — pergunto a


Eric, e Edgard some em direção à
garagem.

— Quero saber como você está

— ele sussurra e só entendo por que leio


os seus lábios.

Um fogo faz minhas entranhas

queimarem de medo.

— Estou bem, obrigada — falo

da mesma forma que ele.

Meu coração sobressalta com a

porta lateral que bate.


— Quero te ver, preciso te ver

— ele balbucia rápido.

Não há tempo de responder,


porque Edgard retorna com o kit da

furadeira.

— Vou buscar um café — digo,

nervosa, e sigo para a cozinha.

— Prefere café forte ou fraco?

— pergunto alto, enquanto mexo nas


cápsulas.
— Forte, por favor, sem açúcar

— Eric responde, num tom mais elevado


também.

Ponho o refil na cafeteira

expresso e a ligo, enquanto eles

começam a furar a parede para afixar o

quadro. Preparo um café para Edgard

também, ponho ambos na bandeja,

controlo o meu nervoso e sigo para a


sala.
Após colocar a bandeja na

mesinha, sirvo o café de Eric e Edgard


pega o dele. Os meus olhos e os de Eric

se encontram e parecem sair faíscas.


Tremo. Para o meu desespero, escuto o

barulhinho da colher se chocando na

louça, enquanto inclino para o entregar.

São as minhas mãos incontrolavelmente

trêmulas.

Eric me salva. Segura a minha


mão e o pires, estabilizando a xícara.
Habilmente, ele puxa uma conversa com
Edgard, que nada vê, pois estou de

costas para ele.

— Sah, olhe o quadro na

parede — alerta Ed, quando me viro

para sair.

— Ficou incrível — digo e

saio.

Sigo para a cozinha, começo a


lavar duas xícaras sujas na pia. Hoje
vamos pedir comida fora e não tenho o
que fazer, mas procuro algo pra não ter

que ficar no mesmo ambiente que Eric e


Edgard, que liga a tevê e coloca no

canal de futebol.

— Sah! Eric já está de saída —

diz Edgard, algum tempo depois.

Fecho os olhos, recobro as


minhas forças e vou até eles.
— Obrigada mesmo pelo

quadro! — agradeço mais uma vez.

— Não tem por que agradecer,


vocês merecem — ele responde e não se

furta de me olhar no fundo dos olhos.

Ele se vai, mesmo depois de

Edgard convidá-lo para assistir a mais

partidas de futebol.
Três dias depois

Penso tanto em Safira que já

perdi a noção do perigo. O desejo é tão


forte que ofusca até a ansiedade pela

proximidade da minha exposição,

mesmo sendo esse um evento muito


significativo para a minha carreira
artística. Só que a única forma de voltar

a manter o foco é tê-la de novo, matando


essa fome.

Ansioso, olho o relógio na tela

da minha estação de trabalho, no


escritório da STW. Provavelmente, Rose
já entregou o presente que comprei para
Safira.

Como Edgard deve ter


implantado um sistema espião no seu

celular, porque ela me confidenciou

desconfiar sobre a segurança do seu

aparelho, resolvi dar um jeitinho para

melhorar a nossa comunicação.

Comprei um celular
descartável, desses modelos pequenos e
discretos, gravei o meu número, tirei
qualquer aviso sonoro e embalei numa
caixa de presente, junto a um cartão em

que escrevi:

“Safira,

Agora poderemos conversar

com segurança. Me ligue assim que

puder, meu número já está gravado

no aparelho. Fique tranquila, os


alarmes foram retirados. Não use
na rede wi-fi de sua casa, ele já
tem pacote de dados, não se
preocupe com isso. Guarde num

lugar seguro e só utilize quando


estiver protegida. Preciso muito

falar contigo.

Saudade,

Eric”

No bilhete, desenhei algumas


bluebonnet diante do olhar dela
enquanto refletia se deveria enviar a
mensagem com a palavra “saudade”,
mas acabei deixando dessa forma

mesmo. Na verdade, a palavra justa não


é saudade e, sim, tesão, desejo, vontade,

fome, sede, querer, ânsia, excitação...

Um estado de necessidades que bloqueia

a razão.

Observo Edgard interagindo


com outro analista e, por incrível que
pareça, não me sinto tão culpado,
embora tenha ciência de que ajo
erroneamente. Só que não quero mais

racionalizar, caso contrário, eu piro. E,


infelizmente, foi ele que me arrastou

para isso quando rifou a sua mulher.

Sei que preciso ter cuidado,

coisa que não tive quando fui bater à sua

porta no domingo. Havia prometido a


Edgard um quadro, há quase um ano, e
nunca trouxe para o trabalho para lhe
entregar. Então usei isso como desculpa.

— Estava separando o material


da exposição com uma amiga minha, que

mora aqui perto, então encontrei a sua

tela, a prometida. — Tentei parecer

engraçado quando toquei na campainha

de sua casa.

Bom, tenho a impressão de que


ele não desconfiou de que minhas
intenções eram ver a esposa dele.

“Em 15 minutos, reunião na

minha sala”. A mensagem de Anthony


pisca na minha tela, trazendo-me de

volta para a realidade.

Concentre-se, Eric.

Pouco tempo depois, o celular

vibra numa chamada, vejo na tela o

número que dei a Safira. Atendo.

— Um minuto — digo e saio da


sala em direção à uma das varandas do
prédio. Fecho a porta atrás de mim,
engolfado de ansiedade. — Oi... tudo

bem?

— Oi... você é doido? — ela

pergunta.

— Sou... louco, mas com

responsabilidade.

— Tenho medo disso tudo.

— Também tenho... — O vento


frio bate em meu rosto. Do décimo
andar, fito a intensidade do verde diante
de mim, entre as construções. No

horizonte, surge o rio Colorado. — Só


digo algo, Safira, mergulhe... Mergulhe

sem medo porque estou debaixo dessa

água te esperando.

— Sou... sou um pouco

complicada. Mas penso demais no que


aconteceu entre nós. Isso tem me feito
perceber algumas coisas em mim... —
Ela para, como se refletisse. — Não sei
mais de nada, estou confusa.

— Me sinto da mesma forma

que você. — Observo o relógio. —

Podíamos conversar melhor

pessoalmente. Pode me encontrar às 17

horas?

— Tenho que estar em casa


quando Edgard chegar.
— Vou dar um jeito de sair

mais cedo, ele precisará ficar até mais


tarde hoje. Envio o endereço pra você.

Ah! Outra coisa, desative a localização


de seu celular. Me refiro ao outro

aparelho e não a esse. E só converse

comigo nesse se o outro estiver

desligado e guardado. Não esqueça, está

bem?

— Está certo.
Assim, evita que Edgard possa

rastrear por onde Safira anda, como


também gravá-la através de algum

sistema espião. Ele deve ficar até


concluir uma demanda urgente de outra

gerência. Trabalhamos em parceria, mas

cada um tem uma função diferente. Eu

construo estruturas e ele as faz

funcionar, grosso modo, é mais ou

menos assim.
Chego em casa dez minutos

antes do combinado e tomo uma ducha


rápida. Agradeço aos céus pela

faxineira ter colocado o apartamento em


ordem. Mas não tive tempo de relaxar,

logo o interfone toca e vejo a imagem de

Safira na portaria.

Pego a roupa que joguei no

chão e coloco no balde de roupa suja do


banheiro. Cubro o novo quadro que
estou fazendo, pois não quero que
ninguém o veja. E a campainha toca.
Fito o meu reflexo no grande espelho na

lateral da cama. Estou apenas de cueca


boxer marinho.

Ajeito os cabelos com as

pontas dos dedos e abro a porta, já meio

excitado. Os olhos de Safira me varrem

e parecem chocados pela minha falta de


roupa. Meu pau, que já se animava,
murcha.

— Desculpe por te receber

assim... entre — digo e lhe dou


passagem.

— Oi... — Constrangida, Safira

parece segurar a alça de sua bolsa com

força. Está linda, dentro de uma

minissaia marinho, botas de cano longo

pretas, camiseta branca e cardigan


colorido.
— Cheguei há pouco. Você veio

um pouco mais cedo — argumento, sem


graça, e fecho a porta, mas não estou

disposto a vestir nada. Ao contrário,


quero tirar a roupa dela.

Safira olha ao redor do meu

apartamento, que mais parece um

loft[29] .

Há um sofá de dois lugares e

uma poltrona na entrada, onde também


está uma longa bancada fixada na
parede. Nela, ficam o meu material de
pintura e trabalho. Acima dela, está a

televisão. No lado esquerdo, fica a


bancada da cozinha e, no direito, a

minha big cama box e a porta de acesso

ao banheiro.

— É aconchegante — ela diz.

Dou alguns passos em sua


direção e a arrebato nos meus braços.
— Disse que iríamos conversar

— ela me faz recordar.

— E vamos... — asseguro,
antes de lhe roubar um beijo e ela me

entregar os seus lábios.

Ao mesmo tempo, sou tomado

por uma sensação de alívio e de desejo,

que vai crescendo e se espalhando por

cada poro, tomando os músculos e


encantando a alma. Afasto os lábios em
dificuldade, embora tenha vontade de a
engolir inteira até chegar ao centro de
mim. Rapidamente, retiro-lhe o casaco e

a camiseta enquanto ela solta a bolsa e


se livra de sua saia.

Afasto-me um pouco só para

fitá-la, de lingerie preta e botas. Sonhei

demais com essa cena. É linda e tesuda.

Meu pau já palpita de tão duro. Coloco-


a sentada no pequeno sofá e me ajoelho
entre as suas pernas.

— Vou te provar, Safi. Você

permite? — indago, enquanto,


gentilmente, retiro o seu sutiã, liberando

os seus mamilos rosados, que me

desafiam.

— Sim, sim...

Então dou uma lambida num

dos mamilos e ela arqueia o corpo,


demonstrando muita sensibilidade. Eu o
abocanho e estimulo o outro com as
pontas dos dedos, dando pequenos
apertões. Ela geme, o que já me

enlouquece. Dedico-me a chupar, lamber


e os acariciar enquanto ela se contorce.

Sinto os bicos duros como pedras, o que

me enche de mais vontade de fazê-los

roçar na minha língua.

— Você gosta assim? —


pergunto de forma suave.
— Muito, amo demais... — ela

responde, quase num miado, tomada


pelo prazer e entregue.

Quando a percebo pressionar

uma coxa na outra, desço os lábios por

sua barriga. Excitada, Safira contrai o

abdômen, já prevendo o que vou fazer.

Escancaro ainda mais as suas pernas,

dou uma suave mordida sobre a calcinha


e passo o indicador por sua entrada, que
está encharcada.

Retiro a calcinha e me levanto

só para admirar a cena. Safira está


largada no sofá, calçada apenas com as

suas botas e com as pernas bem abertas

para mim. Os seus olhos são uma

mistura de súplica e desejo para que eu

a chupe.

Volto a me agachar e roubo o


seu clitóris. Mantenho-o bem
molhadinho, já inchado e duro, entre os
meus lábios e sob o controle da minha
língua. Assim, arranco profundos

suspiros e gemidos dela, que enfia os


dedos entre os meus cabelos e se abre

ainda mais para mim, suspendendo as

pernas abertas, como se fosse uma

borboleta.

Com a ponta da língua, escrevo


o meu desejo por entre os seus lábios
íntimos e clitóris. Espirais, infinitos e
círculos. Eu lhe arranco prazeres dos
mais intensos, nessa linguagem

primitiva, que aproxima os que


verdadeiramente se desejam. Safira

geme e dá alguns esticões nos meus

cabelos; suspira e movimenta os seus

quadris.

— Que delícia! — ela externa,


absorta no seu deleite.
Dedicado, sugo a sua

intimidade, enterro o meu rosto, aspiro o


cheiro excitante da sua fenda, saboreio a

sua umidade. Até que ela avisa:

— Vou gozar... estou gozando,

Eric!

Intensifico um pouco mais os

meus movimentos até que suas mãos

seguram a minha cabeça, fazendo-me


parar.
— Por favor, pare...

Obedeço e me levanto,

sentando-me ao seu lado. Sorrimos um


para o outro e ela se ajeita na poltrona,

um pouco acanhada. Ergo sua perna e

retiro-lhe a bota, uma de cada vez.

— Gozou gostoso? — pergunto,

enquanto a trago para cima de mim e a

faço montar em mim.

— Muito gostoso. Você foi


fantástico — ela elogia baixinho.

— Sério? Adoro o seu sabor...

— Sério... — Ela vem até mim

e me oferece os seus lábios. E eu os

tomo, guloso, sedento de fortes

vontades.

Nós nos beijamos intensamente

por algum tempo. Então, Safira começa

a rebolar sobre mim. Seus quadris se


alternam entre movimentos de vai e vem
e circulares. Nossos lábios se afastam
enquanto desço a mão por sua silhueta.

Ela beija e acaricia o meu


peitoral e vai descendo. Sinto os seus

lábios percorrerem o meu abdômen e eu

o contraio, apreensivo. Então resolvo

pará-la. Abraço-a, concentro minhas

forças e me levanto com ela no colo, que

passa as pernas por minha cintura.

— Vamos fazer do meu jeito —


digo.

Levo-a até a beira da cama e a

ponho sentada. Em seguida, ao retirar a


minha boxer, o meu pau pula para frente.

Não faço o tipo de homem que se

envaidece por causa de um pênis, mas

tenho certo orgulho do meu, que sempre

provoca feições de desejo ou assombro

nas mulheres, como a que vejo


estampado no rosto de Safira.
— Gostou dele?

— Muito... — ela fala e suas

bochechas ficam vermelhas. Seus olhos


são um oceano de labaredas que me

atiçam.

Solto um risinho enquanto

trabalho nele na frente dela. Acaricio

todo o comprimento, no intuito de

manter a ereção firme.

— É seu nesse momento. O que


quer fazer com ele?

Em resposta, Safira põe o meu

pau em sua boca, como se fosse capaz


de devorá-lo. Suga e lambe de forma

deliciosa, enquanto acaricia as minhas

bolas. Sua língua habilmente percorre a

minha glande inchada, que lateja de

desejo. Ela se dedica tão bem à tarefa

de me dar prazer que sinto a sua


garganta, o que me enlouquece. Com as
mãos, acaricia a parte do meu pau que
fica de fora de seus lábios.

Aliso os seus cabelos e rosto.


Ela me fita. E essa é uma grande visão,

merecedora de uma pintura que eternize

todo o prazer desse momento e as

sensações que me causam. Gemo alto,

por ela e para ela.

Então ela passa a beijar e


lamber todo comprimento do meu pau,
enquanto massageia a extremidade com
a sua palma macia. Nossas umidades se
misturam e Safi emite barulhinhos que

me levam ao delírio. Quando o clímax


se aproxima, eu a interrompo. Pego um

preservativo e o coloco.

Peço que se deite e ela me

atende. Gentilmente, afasto os seus

joelhos e me apoio ao seu redor. Volto a


lamber a sua boceta só para atiçá-la. Em
seguida, seguro no meu pau, uma rocha
de tão excitado, e esfrego no clitóris e
lábios enquanto nossos olhos estão

pregados um no outro, o que me provoca


sensações fortes e intensas que nem sei

explicar.

Após explorá-la, eu a penetro

lentamente. Nesse instante, eu a sinto

minha. É um sentimento estranho e novo


em mim. Só que essa perspectiva me
alucina ao tempo que a vejo se retorcer
por meu pau. Ela morde os lábios,
aperta os meus braços e costas e se

mexe embaixo de mim, em busca de seu


prazer.

— Me enlouquece, Safira.

Aumento o ritmo das estocadas

e esse frenesi me alucina. O som de

nossos corpos se chocando me consome


totalmente. Afogo meus lábios nos dela.
Enfio a minha língua em sua boca e o
meu pau em sua fenda. Mas logo me
rendo ao prazer que pressiona as minhas

entranhas em busca de passagem.

— Eu vou gozar, Safi...

— Eu também vou gozar bem

gostoso, meu amor, pra você.

Essas palavras despertam em

mim um furacão de prazer alucinante.


Explodo num gozo selvagem. Urro.
Espasmos de prazer se espalham pelo
meu corpo, os músculos se contraem
fortemente e relaxam aos poucos.

— Puta que pariu! Que

delícia! — digo quase involuntariamente

e ela sorri.

Abraço-a bem apertado. Aos

poucos, nossas respirações vão se

acalmando. Saio de dentro dela, retiro o


preservativo e ponho na mesinha. Mas
não consigo me afastar do seu cheiro e
de sua energia. É como se, em breves
segundos, nossos corpos pertencessem

um ao outro.

Dou-lhe beijinhos nos lábios.

— A pergunta clássica... foi

bom pra você? — pilherio.

— O que acha? Me diga você.

Acha que gostei? — ela me provoca.

— Bom, a meu favor digo que


senti seus gozos. Mas quero escutar de
seus lábios.

— Amei demais. Eu me sinto


uma adolescente. Só que não dá mais

para viver perigosamente como

adolescente, já estou com 25 anos.

— Mas não dá para fazer de

conta que não existe uma forte atração

entre nós — contraponho. Mudo de


posição. Fico de lado e a mantenho
colada em mim.

Safira suspira e beija o meu

pescoço.

— Estou correndo riscos aqui.

E não concordo com traição e mentiras.

Apesar disso, vou precisar mentir hoje.

— Safira se afasta, se senta na cama e

cruza os braços sobre os seios de modo

desproposital. — Tenho dificuldades de


lidar com as pessoas, principalmente
com Edgard. Ele acaba conseguindo
tudo de mim.

— Só deve fazer o que deseja.

Seus olhos se perdem. Os

músculos dos lábios se movimentam,

como se ela fosse dizer algo, e ainda

não escolheu as palavras certas.

— Preciso confessar que... —

ela me fita de um jeito sério e


visivelmente emocionada — ele
consegue de mim os meus aceites pra os
jogos eróticos... você percebeu, Eric.
Ninguém nunca tinha notado. Não aceito

aquilo de bom grado.

Chocado, eu também me sento

na cama.

— Mas...

— Mas como eu agi daquela

forma no rancho? Assim, toda vez que


vou me envolver com outro homem eu
bebo bastante — ela explica.

— Edgard é um filho da puta

de um abusivo manipulador! — berro e


me levanto da cama, atônito. Eu poderia

ter evitado, se não tivesse me deixado

levar pelos meus próprios interesses

eróticos na situação. — Como permite,

Safira? E nós dois? Você me aceitou por

que ele quis? — pergunto de modo


incisivo.
— Não, Eric, te aceitei porque

eu pude escolher. Nós tivemos uma certa


troca de olhares e houve aquele encontro

na casa de Rose. Para uma mulher como


eu, isso foi muito significativo. Então,

como eu tinha que escolher, eu quis

você, mesmo não sabendo que estava no

rancho.

Incomodada, ela puxa um


lençol sobre o seu corpo, mas eu
continuo nu. Só quero escutá-la.

Estou possesso e com raiva de

Edgard, mas também de mim por não ter


seguido os meus instintos, que me

apontavam que ela era forçada por ele.

Os músculos do rosto de Safira

tensionam. Visivelmente, ela está se

esforçando bastante para não desabar

diante de mim.

Então ela me conta que os


pedidos de Edgard para que ela aceite
outro homem na cama se intensificaram
nos últimos dois anos. Esporadicamente,

eles visitavam uma casa de swing,


quando ele se satisfazia em sua fantasia

de corno. Depois, pagou alguns homens

de agências de sexo seguro.

Ela me conta como funciona

esse processo.

— Me ver tendo relações com


outro homem deixa Edgard mais ativo
sexualmente. — Lágrimas marejam os
seus olhos ao revelar esse detalhe. —

Ele pergunta sobre essa relação, se tive


prazer, se gostei. Então eu tenho que

humilhá-lo. — Ela começa a chorar. —

Eu invento muita coisa para que ele se

sinta satisfeito e me deixe em paz.

Safira flexiona as pernas e


enterra o seu rosto sobre os joelhos.
Horrorizado, vou até ela e a

abraço. Safira soluça. Nada deixo


transparecer, mas meu estômago

embrulha diante disso tudo. Ficamos em


silêncio por algum tempo enquanto a

encho de carinhos e afagos.

— Deve estar com repulsa de

mim, não é? Deve me ter como uma

mulher vulgar. Nem sei como consegui


contar essas coisas — ela acrescenta,
cheia de sentimentos. — Acho que
estava atravessado na garganta todos
esses anos.

— Não, querida, não sinto isso

— afirmo, mas, na verdade, eu sinto

pena dela. — Só me conte algo, como

uma mulher linda e esclarecida como

você se submete a isso? — Nossos

olhos se encontram. — É por amor a


ele? — Faço essa pergunta sem querer
muito escutar a resposta.

— Pelo amor que tínhamos no

passado, pelos juramentos que fizemos e


por culpa...

— Culpa? Pelo quê? Você o

ama ainda?

Safira se afasta de mim e me

encara.

— Amor? Acha mesmo que

seria capaz de amar alguém e estar aqui


fazendo tudo isso contigo? Faz uma
imagem errada de mim.

— Não, Safi, não é isso. Mas


eu gostaria de saber o que te faz ceder

dessa forma a ele. Se não é amor, o que

é?

Safira se afasta de mim contra a

minha vontade. Enrola-se no lençol e se

levanta.

— Será que não vê, Eric? Sou


uma mulher fraca, fracassada. Nem
todas as garotas são fortes como é
preciso ser.

— Não diga isso... — Levanto-

me também.

— Vou embora.

— Não, não vá. Aquele

mequetrefe do Edgard ainda não saiu do

escritório. Não vá embora como fez


domingo e me deixou louco sem
resposta e sem você.

Safira vai até as suas roupas,

espalhadas pelo chão, e as recolhe.

— Posso usar o banheiro? —

ela pergunta com os olhos vidrados.


Não sei como tive coragem de

revelar a Eric mais detalhes sobre os


fetiches que envolvem a mim e Edgard.
Essa situação vivia represada

em mim. Nunca contei nada às minhas


irmãs. Nem por sonho, quero que meus

pais saibam, afinal, fiquei sem falar com


eles quando decidi ir morar com Edgard

em São Paulo e me casar, pois todos

foram contra essa minha união. Eu me

tornei uma ovelha desgarrada ao lado de

Edgard e cheguei a acreditar que só

existia ele na minha vida.


Fui uma idiota, sou uma

imbecil.

Levanto-me da cama, decidida


a ir embora, pois tenho certeza de que

nunca mais Eric vai querer olhar na

minha cara. Pego a minha roupa jogada

pelo chão e pergunto se posso usar o

banheiro.

— Pode... — ele responde e se


aproxima, retirando a saia e camiseta da
minha mão.

— Ma... — tento protestar,

porém Eric cobre os meus lábios com os


seus, o que quebra minha frágil

resistência. Aceito os beijos e me

entrego aos seus abraços, deixando o

lençol escorrer pelo corpo.

O que será de mim, meu

Deus?!

Quanto mais fico em seus


braços, mais me perco e ao mesmo
tempo me encontro, como também
aumenta a minha vontade de viver. Eu

me apaixonei por Eric. Mas eu sinto que


ele só me encara como uma aventura, um

bom sexo por causa da forte atração que

sente.

Eu o desejo demais para

resistir.

Baixo as minhas defesas,


derrubo cercas e permito que ele possua
os meus lábios. A sua língua possessiva
explora cada canto da minha boca, com

uma urgência tão grande que até parece


que sou uma terra a ser conquistada e

ocupada, e ele é um comandante de

legiões. Seus beijos me completam de

uma forma que, ouso dizer, nunca senti

antes.

As mãos de Eric transitam pelo


meu corpo com veemência e a sua
respiração se intensifica ao tempo que
tateia a minha pele e desce as palmas até

apalpar a minha bunda. Então ele me


ergue, passo as pernas ao redor de sua

cintura e ele me leva ao banheiro,

passando-me com delicadeza por entre a

porta.

— Vamos tomar um banho


juntos, o que acha? — ele me põe de
volta ao chão.

Penso em meu cabelo, em

chegar em casa e encontrar Edgard.


Apesar desse medo querer se expandir,

eu o bloqueio.

— Está bem...

Eric vai até o box e abre o

chuveiro, ajustando a temperatura.

— Vem, Safi, veja se a água

está boa pra você.


— É tão cavalheiro que fico

boba. — Ele apenas sorri e me estende a


mão. — Mas, então, ninguém nunca me

chamou de “Safi”. — Sorrio para ele,


encantada com o momento que estou

vivendo, e entro no box.

— Você tem poderes hipnóticos

sobre mim — diz e me puxa para ele. —

Ainda bem que só eu te chamo assim. —


Eric fecha os olhos e me beija, levando-
me para debaixo da ducha de água
quente.

Em pouco tempo, sinto o seu


pênis duro pressionando as minhas

coxas. Novamente, Eric ergue o meu

corpo. De forma instintiva, envolvo as

minhas pernas ao redor de sua cintura e

agora o seu membro duro toca o meu

traseiro.

Ele me apoia contra a parede e


reclamo do revestimento frio. Nossos
lábios se afastam e Eric sorri de modo
irresistível para mim.

— Está frio, mas vou te deixar

quente. Você usa anticoncepcional com

Edgard e preservativos em encontros

cuckolding? Eu sempre uso

preservativos — ele me indaga, quase

num sussurro.

Essa pergunta me encabula, mas


não quero me deixar afetar neste exato
momento. Apenas balanço a cabeça de
modo afirmativo.

— Então podemos fazer um

pouquinho sem camisinha?

Volto a balançar a cabeça, já

excitada com essa ideia.

Logo sinto o pênis dele, como

se estivesse me rasgando ao meio.


Apoio-me numa barra da toalha dentro
do box.

É a primeira vez que as peles

dos nossos sexos se friccionam. É tão


maravilhoso! A cada forte estocada sinto

as suas bolas encostando em minha

bunda.

— Que delícia, Safi! Como é

gostosa!

O som dos nossos corpos se


chocando em meio à água me atiça ainda
mais. Fecho os olhos, agarro-me em
seus ombros e me entrego ao frenesi que
percorre o abdômen e pressiona o sexo

à medida que os movimentos de entrar e


sair se tornam mais ostensivos. Só que

me lembro de algo: eu não uso

anticoncepcional, Edgard não pode ter

filhos.

— Pare, Eric, por favor. Eu não


uso pílula.
Aos poucos, ele diminui as

estocadas e meus pés tocam o chão outra


vez. A sua mandíbula contrai e sou

invadida por seus olhos escuros como


uma noite, o que aumenta a sensação de

que fiz uma merda.

— Vocês planejam ter filhos?

— ele pergunta e me puxa para baixo do

chuveiro.

— Não, Edgard não pode ter


filhos — revelo, constrangida.

Eric apenas contrai o cenho,

apanha o sabonete e se coloca atrás de


mim. Ensaboa a mão e começa a me

banhar, deslizando a sua palma pelas

minhas curvas. Mordo os lábios e fecho

os olhos, entregue, quando ele pousa as

mãos sobre os meus seios e os bicos

endurecem com o estímulo. Vou aos


céus.
A sua ereção bate firme,

pressionando as nádegas, ao tempo que


uma de suas mãos desce para minha

vagina e a outra permanece no meu seio.


Ele acaricia o meu clitóris e explora os

lábios íntimos.

— Quente até debaixo d’água

— ele sussurra, com a voz rouca em meu

ouvido, e começa a beijá-lo e a


mordiscar o lóbulo.
Viro-me e o encaro.

Eric me puxa para debaixo da

ducha para retirar o sabão. Em seguida,


afasta-me e se agacha. Põe o meu pé

direito sobre a sua perna, beija a parte

interna da minha coxa úmida e a

acaricia, o que já me deixa ansiosa.

Logo os seus lábios quentes se detêm na

minha boceta. Então ele passa a beijar a


minha intimidade como se ela fosse a
minha boca. Tremo, enlouquecida.

Sua língua se refestela em meu

clitóris, circula-o e o estimula. Quando


está inchado, ele passa a sugar a minha

carne íntima. Arquejo. Movimento os

meus quadris em busca do prazer e

seguro o seu rosto. A visão de Eric entre

minhas pernas, como se estivesse me

devorando, atiça os meus sentidos.


Gemo alto, sedenta.
Não demoro e atinjo o clímax.

Minhas pernas se abrem ainda mais, a


carne treme e espasmos se espalham

pelos meus músculos. Urro. Deliro.

— Muito gostoso, Eric... —

digo, enquanto ele fica de pé, e eu

procuro me recompor de meu pequeno

escândalo de prazer.

— Eu já falei que seu gosto é


uma delícia? — ele pergunta com um
risinho e me abraça. Nós nos beijamos e
logo quero retribuir a carícia.

— Hum... agora é minha vez de


te dar banho e descobrir sobre o seu

sabor — provoco, procurando me

manter firme, apesar de minhas pernas

trêmulas.

Eric suspira.

— Então venha, Safi, e me


mostre o que imagina fazer comigo.
Pego o sabonete e passo por

seu corpo. Apresso-me, pois, quero ter


logo o seu torpedo na minha mão, que já

está quase a ponto de tiro.

Assim, acaricio toda a sua

extremidade roliça e poderosa e arranco

gemidos dos seus lábios. Afasto-me

mais dos jatos de água, agacho-me e o

ponho na minha boca. Esforço-me para


lhe oferecer o melhor trabalho enquanto
sugo a sua glande suculenta. A pulsação
dele em minha cavidade bucal me causa
certo furor.

Céus, Eric é incrível!

— Tesuda! — ele diz

roucamente. — Vou foder a tua boca...

— Ela é sua... — afirmo,

enlouquecida.

Eric me levanta, desliga o

chuveiro e saímos do box. Envolvendo-


me numa toalha, ele me põe sentada
sobre a tampa do vaso. Em seguida,
aproximo os meus lábios de sua glande

avermelhada e pulsante e a introduzo em


minha boca. Eric estremece.

Então tomo o seu pênis com os

lábios e mãos, como uma esfomeada.

Acaricio os seus testículos e vejo o

deleite estampado no seu rosto, tenso e


trêmulo de prazer. Ele começa a mover
os quadris, se encaixando na minha
boca, ao tempo que segura a minha
cabeça, o que me deixa mais à vontade

para trabalhar nele.

Fito-o com olhos pidões e lhe

arranco mais gemidos.

— É a visão mais linda do

mundo — confessa, num murmúrio, enfia

a mão na toalha e me desnuda.

Ele apalpa os meus seios e eu


sinto as paredes da minha vagina
ansiarem por ele. Seu rosto se contorce
e sua respiração ofegante se intensifica.

Então Eric toma o seu membro e o


masturba por alguns segundos. Em

seguida, jatos quentes e fortes de seu

gozo se espalham sobre os meus

mamilos, colo e barriga enquanto ele

emite os seus urros de prazer.

Enquanto retoma o fôlego, ele


me beija e me ergue com uma urgência
estranha.

— Eu não sei mais o que fazer


com todo esse tesão. — Ele sorri com

um riso maravilhoso nos lábios. Ele é

um cara lindo. — Vou sair para ter

privacidade, tome seu banho, que vou

preparar algo para jantarmos.

— Preciso ir. Tenho que estar


em casa antes de Edgard chegar, meus
cabelos estão encharcados.

— Fique tranquila, hoje é um

dos dias que ele vai sair do escritório


em torno das 20 horas. Mas vou checar

se ele está lá na STW para te dar mais

tranquilidade. — Ele aponta para uma

das gavetas da peça da pia. — Tem um

secador aí, não é muito potente, mas

servirá.

— Obrigada.
Eric sai e eu vou fazer a minha

higiene e tomar outra rápida ducha.


Edgard e nossos problemas parecem

estar a anos luz de distância de mim.


Enxugo bem os cabelos e os seco com o

secador. Assim que termino, saio do

banheiro enrolada na toalha e avisto

Eric cozinhando. Quando me vê, ele

abre o sorriso mais lindo do universo.

— Venha, estou preparando


uma massa e um molho bem especial
para nós — ele diz.

Pego a bolsa e verifico o meu


celular para saber se tem mensagens de

Edgard. Encontro só uma em que ele

avisa que vai chegar mais tarde.

Respondo apenas com um “Okay”.

Guardo o aparelho na bolsa e me

aproximo da bancada.

Eric me serve uma taça de


vinho para acompanhá-lo.

— Ao prazer... — ele brinda.

— A esses momentos — falo

com o coração na mão. Brindamos.

Tomo o primeiro gole. — O cheiro está

ótimo. — Aponto para a frigideira.

Eric sorri.

— É uma receita louca que


costumo fazer e dá certo, de molho

branco e cogumelos. Espero te


impressionar. — Ele pisca.

Gargalho.

Ele cozinha com leveza e

encanto. Eu demonstro empolgação e o

admiro. Eric é fantástico. Lindo, bom de

cama, intenso e sincero. É tudo que um

dia sonhei ter. Porém, está disponível

para mim só se a finalidade for sexo.

— Edgard está lá, na STW,


portanto, relaxe — ele avisa, ao
explicar que tem um aplicativo que
mostra as estações de trabalho ligadas
na firma e que a dele é uma delas.

— Ele enviou mensagem —

respondo, constrangida.

— Não vou conseguir sair do

escritório mais cedo que ele com

frequência — Eric fala enquanto escorre

a massa.

Gelo. Entendo que ele está


colocando barreiras entre nós.

— Eric, eu... Às vezes, tenho

tanta dificuldade de me expressar! —


Dou um grande gole na bebida. — Não

sou feliz com Edgard, mas não quero

que pense que estou transferindo

qualquer tipo de esperanças ou

responsabilidade para você.

Enrubesço. Mordo a língua.


Acho que acabei de falar besteira,
afinal, não é verdade o que acabei de
afirmar. Eu tenho esperanças de viver
um amor com Eric, mas não tenho

coragem de revelar os meus sentimentos.

Ele me encara, sério.

— Não penso isso, Safira.

Sinceramente, não consigo entender a

sua relação com Edgard, mas quem sou

para me intrometer? Compreendo que


isso só diz respeito a você e ele. — Ele
se expressa com certa indiferença ao
tempo que sua atenção está na frigideira,
onde prepara o molho. — Se há algo que

não devo fazer, é pensar sobre você e


ele.

— Compreendo... — Sinto-me

insegura, mas avanço. — Me anulei por

muitos anos e quero retomar a minha

vida. Estou procurando um trabalho —


confidencio. — Edgard nunca quis que
eu trabalhasse.

— Que bom, Safi! É importante

trabalhar, ter sua própria grana, cuidar


você mesma de sua vida — ele comenta,

num tom distante.

Envergonho-me de não ser

assim, por não ter lutado por meu

espaço. Sei que, se tivesse sido mais

forte, hoje seria uma mulher ativa, mas


Edgard sempre me cercou de tudo, em
termos materiais, e me sufocou de
exigências, as quais aceitei.

— Eu fiz Pedagogia, mas nunca


exerci. Fui modelo fotográfico e parei

por que...

— Porque Edgard não queria...

— ele completa, interrompendo-me.

Debruça-se sobre a bancada e me

encara.

— Como sabe? — Nossos


olhos se encontram e meu rosto formiga.

— Não é difícil deduzir. — Ele

me lança um olhar enviesado, comprime


os lábios e volta a atenção para o fogão.

— Quer que te sirva?

Balanço a cabeça, de modo

afirmativo.

— Só um pouco, por favor.

Ele indaga se a quantidade do

espaguete é suficiente e depois repete a


pergunta sobre o molho. Em seguida,
coloca uma peça do seu jogo americano
diante de mim e o prato fumegante, com

um cheiro maravilhoso.

— Obrigada...

Espero que ele se sirva e,

então, dou a primeira garfada. O sabor

forte faz a minha língua salivar.

— Está ótimo, parabéns, Eric


— elogio, tentando romper o clima
modorrento que, de repente, se abate
sobre nós.

Ele saboreia o seu prato com o


semblante fechado, demonstrando ser um

pouco ranzinza.

— Não gostaria de falar de

Edgard quando estivesse contigo. — Em

seguida, mexe o garfo entre a massa,

como se pensasse para falar algo.

— Está bem.
— Aliás, a única coisa que

tenho curiosidade é escutar a sua


explicação sobre o que te faz ceder aos

caprichos dele, se não gosta de fazer,


como me assegurou — Eric expõe,

enquanto seus olhos estão pregados no

espaguete. — Eu não consigo

compreender como é capaz de fazer

sexo com um homem para agradar outro,

se não está a fim disso. — O seu timbre


de voz estéril não me permite decifrar as

suas emoções.

Um bolo se forma no meu


estômago. Pego um guardanapo, levo

aos lábios e limpo a garganta. Sinto-me

um pouco nervosa.

— Desculpe, Safira, você não

tem que me explicar nada — ele emenda

antes que eu fale alguma coisa.

— Eu quero falar... eu preciso


falar... — De súbito, meus olhos
marejam. — Fiz pactos com Edgard
quando éramos jovens, o que parece não

fazer sentido agora, na vida adulta. —


Engulo e minha garganta parece fechar

num grande amargor. — Mas isso criou

tentáculos me ligando a ele, além de que

as minhas decisões do passado

potencializam esses elos.

Assim, conto a Eric sobre o


meu casamento com Edgard. Meus pais
proibiram. Quando completei 18 anos,
fugi para São Paulo, onde Edgard já

cursava faculdade. Rompi com os meus


pais, mas continuei a estudar. Com a

grana curta, Edgard aceitou que eu

modelasse e fiz várias campanhas

publicitárias.

Quando voltei a falar com os


meus pais, eles disseram que, se eu
estivesse arrependida, deveria voltar
para casa. Então, para ser do contra,
Edgard e eu nos casamos no civil e

mandamos a foto da certidão de


casamento para os nossos familiares.

Eric escuta e balança a cabeça,

de forma negativa.

— Enfim, quando fizemos as

pazes com os meus pais, voltei a


Salvador para uma visita com Edgard
em férias. Aproveitamos e participamos
de uma confraternização com os amigos
na ilha... — Quando digo isso, Eric

repousa seus talheres no prato para me


escutar. — Enfim, já tínhamos feito uma

troca de casal em São Paulo. Com isso

de ser modelo, me tornei cobiçada e

isso me envaideceu de algum modo. Na

ilha, repetimos, mas bebemos demais e

deu uma grande merda.


Paro de falar e me levanto. Não

consigo mais comer. Lágrimas descem


do meu rosto.

— Soube o que aconteceu nessa

festa — ele revela. Eu o encaro,

atordoada. — Venha, se sente e jante.

Não tem por que ficar assim.

— O que sabe sobre o que

aconteceu?

— Sei que Gustavo e Edgard


brigaram por ciúmes, e Edgard foi
ferido com certa gravidade. Foi a
conversa que rolou depois em grupos de

amigos.

— Gustavo nos ameaçou com

uma faca. Na confusão, Edgard foi

esfaqueado.

— Eu sei... — Ele arqueia a

sobrancelha. — Soube também que


Gustavo gritava, alegando que não tinha
feito nada, mas acabou sendo levado à
delegacia.

— Não foi Gustavo quem


machucou Edgard, fui eu... — confesso e

caio no choro. Enterro o rosto entre as

mãos. — Fui eu... na confusão, eu que

estava com a faca na mão e não sei

como isso aconteceu.

Eric vem até mim e me abraça


apertado. Escondo-me no seu peito e o
aperto contra meu corpo.

Explico a Eric que essa foi a

segunda vez que fizemos troca de casal.


Só que Gustavo começou a ter ciúmes

de Luana. Estávamos muito bêbados e

loucos. Então Gustavo foi até onde os

dois estavam e chamou Ed de

aproveitador. Eles começaram a brigar e

Edgard o empurrou.

Gustavo puxou Luana, e eles se


foram. Edgard e eu continuamos na praia
bebendo. Pouco depois, ele retornou
munido com uma faca, muito nervoso.

Ed o chamou para conversar, mas os


ânimos foram piorando. Ele empurrou

Edgard. Desesperada, eu me meti na

confusão.

Após levar um soco de Edgard

no revide do empurrão, Gustavo perdeu


o equilíbrio e soltou a faca, então, eu a
peguei e o ameacei, pedi que parasse.
Gustavo veio até mim e tentou tirá-la de
minha mão. Caímos na areia. Edgard

tentou me ajudar. Na confusão, a faca


acabou por atingi-lo, o que mais tarde

descobrimos que o deixou estéril.

— Nossa! — diz Eric.

— Só que eu não apunhalei

ninguém. Eu não sei o que aconteceu —


continuei a explicar, entre lágrimas. —
Na verdade, não me recordo. Aquilo
tudo foi um borrão na minha mente. Mas,
a partir daí, Edgard passou a jogar na

minha cara que eu tentei tirar a sua vida


e que nunca poderá ser pai. Ele teve os

testículos perfurados, foi tratado numa

emergência; depois que se recuperou,

ele não procurou outro médico. Só um

ano depois, descobrimos as

consequências.
— Você não teve culpa, Safira,

foi um acidente — Eric me consola.

— Sou uma tragédia. Só fiz


besteiras quando jovem — resmungo.

Eric permanece em silêncio por

longos minutos, com o seu rosto próximo

ao meu.

— Parece meio clichê dizer

isso, mas todo ato resulta em


consequência — ele afirma e acaricia os
meus cabelos.

Quando me acalmo, nós nos

afastamos. Volto a me sentar na banqueta


diante do jantar e não consigo comer

nada. Eric pega o seu prato, volta a

comer e continua ao meu lado.

— Deveria ter escutado os

meus pais e as minhas irmãs. Mas eu só

enxergava Edgard na minha frente, como


se fosse o único ponto de chegada —
pondero.

— Era muito jovem para

decidir onde estava seu ponto de


chegada. A vida está em mutação

constante. Você não é mais aquela garota

e nem Edgard é o mesmo sujeito do

passado.

— Não me julgue, por favor —

peço.

— Não julgo, Safi. Vou falar


outro clichê... A nossa felicidade não
está na mão do outro, mas em nossas
mãos. É preciso se tornar

individualmente feliz para que se possa


ser feliz ao lado de alguém, portanto,

nada de transferir responsabilidades...

— ele pontua sabiamente.

— Tem razão. É que eu fiz tanta

doideira. Às vezes, fico muito surtada.

Ele arqueia as sobrancelhas.


— Tento te entender, Safi...

Mas não precisa se embebedar ou até se


drogar para curtir a vida. Eu mesmo

tenho alma de artista, mas não bebo


muito e nem curto drogas. Meu único

vício é a minha arte e, agora, você.

Eu o fito de maneira

interrogativa. Não entendi por que ele

fez essa referência a drogas, mas meu


coração se aqueceu ao escutar sobre o
seu vício em mim.
Sábado

— Sabe que quero a sua

felicidade, até me sinto um pouco sua


mãe. Também gosto de Safira, é uma

mulher doce, agradável e linda. Mas

esse affair[30] de vocês é muito

perigoso. Não está medindo as

consequências de se relacionar com uma


mulher casada — advertiu Rose.

Então revelei à minha amiga

sobre o fetiche de Edgard. Fiquei em


dúvida se deveria contar ou não, afinal,

o problema não era meu. Mas, com


cuidado, resolvi contar para que ela
entendesse melhor a situação, afinal,
confio demais em Rose. Apesar das

minhas precauções, não teve jeito, Rose


ficou horrorizada.

— Continua sendo arriscado.

Abra os seus olhos, ainda mais agora

que tudo começa a dar certo na sua

carreira artística — ela repetiu seu


argumento antes de sair.
Rose e Tom foram fazer uma

visita a um casal de amigos e deixaram a


sua casa livre para que me encontrasse

com Safira.

Estou na sala, onde aproveito a

iluminação natural dos últimos dias do

outono e trabalho numa pintura. Porém,

não consigo me concentrar em nada.

Penso demais em Safira e estou


agoniado porque não consegui vê-la
desde o nosso encontro em minha casa.

Combinamos nos ver hoje,

aqui, na casa dos Hoover. Sei que não é


correto expor Tom e Rose a essa

situação, também não quero parecer

abusivo com o casal de amigos, mas

fiquei sem saída. Edgard acompanha

cada passo de Safira, e não posso me

ausentar da STW quando ela está livre.

Enfim, me sinto sufocado com


essa situação. Também não me agrada
dividir uma mulher com outro, só que
não posso pedir que ela deixe Edgard.

Nosso envolvimento é algo do presente,


do agora, sem outras perspectivas. Foi

assim com todas que me envolvi após

Samantha e não seria diferente com Safi.

Quer dizer, é o que me forço a acreditar.

Safira trouxe um frescor à


minha vida. Só em fitá-la, algo mexe no
peito e não consigo parar de desejar
estar ao seu lado. Tenho medo disso,
receio que tenha me apaixonado. Não

estou preparado para amar uma mulher


que pertence a um amigo, com quem ela

possui laços fortes.

— Eric... — Safira atravessa

os jardins apressadamente, vestida com

a sua roupa de caminhada.

Deixo o material de pintura de


lado, corro para a porta e a abro.

Ela avança com o semblante

preocupado. Abro os braços e a recebo


no meu peito.

— Safi, eu não aguentava mais

de saudades — digo sem conseguir

disfarçar as minhas emoções.

— Eric, Eric... estava morta de

saudades também.

Fecho a porta e nos beijamos


intensamente, numa urgência
arrebatadora de trazê-la para dentro de
mim, de ter a sua língua e também a sua

alma bem próximo à minha. Deslizo por


sua boca, como se demarcasse uma

posse, e, ao mesmo tempo, atendesse às

demandas mais profundas do meu

coração.

Quando os lábios formigam,


nós nos afastamos e a encho de
pequenos beijos.

— Edgard está tomando banho,

colocou na cabeça que vamos fazer

compras na SoCo[31]. Só vim matar a

saudade e preciso retornar.

Meu coração aperta, sufocado.

Seguro a sua cabeça entre as minhas

mãos.

— Não tenho o direito de te


pedir nada, mas até quando vai continuar
nessa relação, se você já me disse que
quer ter a sua vida, quer trabalhar e não
gosta das aventuras propostas por

Edgard? — questiono, embora saiba que


esse não é um terreno que me diz

respeito.

Safira segura em minhas mãos e

seus olhos dilatam devido à minha

indagação.

— Eu... eu... fiz uma entrevista


de emprego hoje, numa loja. Mas não sei
se vai dar certo.

— Se precisar de ajuda para


recomeçar a sua vida, pode contar

comigo, Safi. Independentemente do que

resulte nós dois.

Não consigo compreender as

suas emoções diante de seus olhos

inquietantes e sua face avermelhada. Ela


enterra seu rosto no meu peito e o beija.
— Obrigada, meu amor... —

Ela deixa escapar e parece se


envergonhar.

— Amor? — Tento fitar o seu

rosto, mas ela continua alojada no meu

peitoral. — É pra mim mesmo essa

palavra ou você se confundiu? —

murmuro.

— É pra você...

Meu coração se aquece e eu me


sinto feliz.

— Que lindo, Safi... eu te quero

tanto, minha querida, meu amor —


retribuo a declaração, encantado. — Por

isso, saiba que posso te ajudar no que

for necessário, inclusive,

financeiramente. Tenho minhas reservas,

tanto dos ganhos da STW quanto dos

quadros que vendo. — Eu a encaro. —


Posso te apoiar independentemente de
qualquer coisa, mas não posso te pedir
nada. Quem tem que agir é você.

— Eu ... vou agir. Aos poucos,


vou conversar com ele. Minhas irmãs

também me apoiam e querem que eu

volte para o Brasil.

— Ah! Tem muitas opções —

comento.

Compreendo aqui que posso me


machucar nesta história com Safira.
Então tudo que posso fazer é me
oferecer para ajudar e viver os
momentos, desde que seja em segurança

para ela. Isso entristece um pouco o


coração.

— Agora preciso retornar —

avisa. Ela se desvencilha de mim e

segue para a porta.

— Safi, na próxima quinta-feira


à noite estarei embarcando para Nova
York, vou passar cinco dias lá e
emendar com o Natal.

O semblante dela se entristece.

— Vamos demorar para nos

ver, então...

— Quer ir comigo? —

proponho. — Diga que vai para casa de

sua irmã, combine com ela e vá comigo

para Nova York. Te ajudo a planejar


tudo para que não haja furos.
Safi une as mãos diante do

rosto e encobre os lábios e o nariz.

— Eric, eu detesto mentiras. E


tenho que contar pequenas mentiras. Mas

um negócio dessa envergadura, não

tenho estrutura.

— Pense com carinho, não

decida agora. É uma oportunidade de

termos uma convivência e de nos


conhecermos melhor.
Vou até ela e lhe arrebato os

lábios. É com o que posso me contentar,


com os beijos roubados.

Mas meu coração aperta de

ciúmes. Daqui a pouco, Safira estará

com Edgard, passeando por aí, como os

muitos casais dessa cidade, e eu estarei

de volta à minha solidão e às pinturas.

A proposta de Eric não sai dos


meus pensamentos, como o nosso rápido
encontro na casa dos Hoover. Também
não consigo esquecer o incrível

encontro na casa dele. E aquece o meu


coração me recordar de sua voz me

chamando de “amor”. Essas memórias

me acompanham para onde vou,

independentemente do que eu esteja

fazendo.

Eric foi a melhor coisa que


aconteceu na minha vida, embora nossos
poucos encontros tenham se resumido a
atender à atração que cultivamos um

pelo outro. Mesmo assim, não sei como


vou começar a me libertar de Edgard,

que a cada olhar ou comentário me

causa medo de que desconfie do que

faço às escondidas.

— Anda tão apegada às suas


caminhadas que até parece que está
gorda, Safira — ele observou, enquanto
dirigia em direção à SoCo.

— Caminho pela minha saúde.


E estou cansada de viver trancada em

casa. Quer que eu fique louca? — Eu o

mirei, de modo sério.

— Não, Sah, longe disso.

Quero é te fazer feliz. — Edgard se

calou por alguns instantes. — E como


está a sua busca por emprego?
— Não tenho experiência, mas

fui chamada para algumas entrevistas.


Deveria ter começado a procurar antes,

porque as contratações para o Natal já


aconteceram. Mas tenho as minhas

chances...

— Vai se acabar de trabalhar

para ganhar ninharia? — ele desdenhou

de mim.

— Não importa quanto ganhe, é


fruto do meu esforço — contemporizei.
— E salários aqui não são mixaria, não
fale dessa forma.

Ele balançou a cabeça, em

negação.

Preciso ser meticulosamente

cuidadosa, pois Edgard é muito sagaz e

inteligente. Por outro lado, me sinto

bastante culpada por causa dessa minha


paixão e envolvimento com Eric. Não
gosto de fazer ninguém de tolo. E me
sinto a mulher mais leviana do universo
diante da ingenuidade de Edgard em

relação ao que faço.

Passamos um dia que

consideraria maravilhoso há um mês,

mas hoje foi extremamente entediante.

Fui consumida pelos pensamentos em

Eric e sobre a proposta que ele me fez


de ir para Nova York. Um aperto
esquisito comprime o meu estômago só
de pensar nessa ideia. Seria um grande
risco mentir para viajar e poder passar

alguns dias ao lado dele.

Passei a tarde mentalmente

arquitetando uma boa mentira. Poderia

combinar com as minhas irmãs,

Esmeralda e Agatha, de que me

encontraria com elas em Miami, ou na


própria Nova York. Há pouco mais de
um ano, fiz isso. Peguei um voo para Los
Angeles, na Califórnia, e fiquei alguns
dias na companhia de Esme, passeando

pela cidade. Edgard não gostou muito,


mas fui assim mesmo.

Em muitos níveis, essa seria

uma mentira muito mais grave. Além do

que, imagino que Eric possa me julgar.

Afinal, como ele vai confiar em mim se


minto para o cara com quem estou junto
desde a adolescência? Caso também
considere a forma como nos
envolvemos, a minha situação se torna

ainda mais complexa.

Apesar disso tudo, estou

inclinada a tentar viajar para encontrá-

lo, nem que seja uma única noite.

Segunda-feira, pretendo ligar para as

minhas irmãs. Só não sei ainda como


vou abordar o assunto, tipo:
Preciso de uma desculpa pra

encontrar o meu amante. Então você


pode dizer que vem para Miami? Não,

não... Isso soa muito ruim. Enfim, passei


o dia com os meus miolos que pareciam

cozinhar numa panela de pressão.

Pensarei melhor em como vou

introduzir a questão.

Edgard e eu fizemos compras.

Ed insistiu para que eu


escolhesse novas roupas. Algumas ele
mesmo que sugeriu, como também me
fez comprar lingeries novas. Eu parecia

um robô.

— Essa branca, você vai

colocar hoje pra mim — ele sugeriu e

meu estômago embrulhou na hora. —

Será a minha anjinha do pecado.

Desde esse instante, fiquei


ainda mais apreensiva, porque sei que
ele vai querer fazer sexo à noite.
Quando Edgard me procura, sinto que
estou traindo Eric. Tento fugir, invento

desculpas. Contudo, receio que o fato de


me fechar para ele lhe desperte

desconfianças. Então, acabo me

entregando.

Almoçamos, falamos do

passado, ele expôs os planos de


viajarmos para a República Dominicana
nas férias e me falou do seu trabalho.

— Acho que vou ser

promovido a uma nova gerência — ele


comentou. — Estou sendo testado em

demandas cruciais delegadas a mim pela

diretoria.

— Que ótimo, Ed. Quero muito

que você cresça.

Finalmente, acabamos de
retornar, após um dia exaustivo na rua.
Ao entrarmos em casa, Edgard

se joga no sofá e liga a tevê. Corro para


o quarto para tomar banho e poder

enviar mensagens para o meu amor.


Deixo a sacola de compras no closet e

vou até a minha gaveta de lingerie. Pego

o sutiã que retirei o bojo e coloquei o

celular que Eric me deu. Levo-o para o

banheiro. Tranco-me.

Tomo uma ducha e me enxugo,


ansiosa. Sento-me na tampa do vaso e
digito: “Você não sai dos meus
pensamentos um minuto sequer”.

De repente, resolvo ousar.

Nunca fiz isso.

Flexiono uma perna sobre a

tampa e tiro algumas fotos com o rosto

inclinado e olhos fechados. Analiso o

resultado e gosto particularmente de uma


em que aparecem parte do meu rosto, um
seio com o mamilo coberto e o sutil
caminho de pelos de minha depilação.
Anexo a foto e escrevo: “Olha a minha

saudade”.

Sorrio. Meu coração bate mais

acelerado, pois ele visualiza.

Não demora e recebo a foto

dele com a mão sobre o short,

pressionando o pênis. Embaixo, a


legenda: “Nós também sentimos a sua
falta”. Mais atrevida, tiro outro retrato
diante do espelho do banheiro,
encobrindo o rosto com o aparelho.

Encaminho: “Queria estar contigo”. Eric


visualiza e envia a foto do seu torpedão,

duro como aço.

Enrubesço.

“Acaba de me deixar

vermelhinha com o seu torpedão”,


escrevo, revelando o apelido que dei ao
seu pênis, só que em vez de mandar uma
imagem do meu rosto, tiro uma explícita
de minhas partes íntimas, com dois

dedos tentando esconder o clitóris.

Os músculos da minha vagina

reagem. O que começou com uma

brincadeira, atiça os meus sentidos e

desejos. Nunca imaginei que fosse sentir

tanto tesão por uma pessoa como o tenho


por Eric.
Quando começo a ficar ansiosa

por sua resposta, recebo um vídeo em


que Eric se toca para mim e fala:

— É todo seu, Safi. Olha ele

chorando de saudades. — Ele, então,

pressiona o seu pau e a umidade escorre

pela glande, que mais parece um

morango suculento e grande.

Uma quentura se espalha.


Minha carne íntima se contorce em
desejo. Digito: “Adoraria lamber
tudinho”, envio.

Por alguns instantes, uma


nuvem de vergonha paira sobre mim e

me sinto vulgar por estar agindo desse

jeito. Contudo, faço com tanta paixão,

que logo uma força interior afasta esse

pensamento e me impulsiona a continuar.

Posiciono o celular em cima na


bancada da pia, de uma forma que corte
o meu rosto, e fico diante da câmera.
Mergulho dois dedos nos lábios,
deixando-os encharcados, e os desço até

a minha intimidade. Fecho os olhos e


afasto da mente que estou filmando, para

que eu consiga relaxar.

Imagino que Eric está ali, com

a sua língua poderosa e hábil, levando-

me aos céus. Sou capaz de imaginar


cada movimento dos seus lábios, que
avançam e transitam pelas minhas carnes
e clitóris em busca dos meus melhores
gemidos.

Movimento os quadris enquanto

os meus dedos exploram toda a extensão

da minha pele lisa e úmida, provocando

correntes elétricas. Com a mão livre,

estimulo o meu mamilo mais sensível.

Não demora, o clímax se aproxima. Eu o


libero entre gemidos baixinhos, para
Eric.

Quando tenho a última

contração, escuto o bater da porta e dou


um pulo assustada, em direção ao

celular, desligando a gravação. O

coração bate destemperado.

— Sah, você está bem? —

pergunta Edgard, inocentemente.

— Estou sim, daqui a pouco


saio. — Receio que ele seja capaz de
escutar meus batimentos cardíacos,
tamanho o meu choque.

— Não sei pra que trancar a


porta — ele reclama, mas sai.

Fecho os olhos e me encosto na

parede.

Confiro as mensagens. Eric fez

o mesmo que eu, se masturbou para mim.

Só que o clima acabou e

preciso sair do banheiro antes que


Edgard retorne. Ainda assim, dou uma
conferida no vídeo que gravei, só para
ter certeza de que a minha cabeça está

cortada da gravação. Então, eu o envio


junto com a mensagem: “Meu sonho era

não precisar me esconder. Não posso

conversar mais. Bons sonhos, meu

amor”.

Apesar do corpo leve devido


ao momento picante, eu me sinto
deprimida.

Faço a minha higiene. Visto um

pijama comprido de estampa de patinhas


de cachorro. Escondo o celular no sutiã.

Amanhã precisarei carregar a bateria,

pois quase a esgotei hoje. E saio do

banheiro em direção ao closet.

Quase solto um grito ao

encontrar Edgard sentado no pufe do


closet.
— Quer me matar do coração!!

— alego e, nervosamente, guardo o sutiã


no fundo da gaveta. Rezo para que ele

não preste atenção e não me faça


perguntas.

— Anda muito aérea, Sah, a

cabeça está nas nuvens. Será que isso

tudo é só a vontade de arranjar um

emprego? — Edgard me conhece


bastante.
Sou tomada por um sentimento

de culpa. Não posso enganar Edgard


por muito tempo.

— Eu... tenho algo pra te falar.

Vamos descer para sala... — Uno as

mãos diante do meu rosto e,

instintivamente, sopro-as, como se fosse

possível aquecê-las, pois já estão frias

devido ao nervoso que me abate.

Mas Edgard me detém e me


abraça.

— Não quero conversar, quero

namorar — argumenta. — Colocou a


lingerie que compramos?

— Não, Ed... eu não quero

fazer sexo — digo com dificuldade.

Ele franze o cenho e beija o

meu pescoço.

— Como assim, não? Sabe que

é de mim que você precisa, porque nós


fazemos amor, e não sexo. — Ele cobre
o meu seio com a mão e tenta me beijar,
mas o rejeito, afastando-me.

— O que é isso? — ele indaga

de modo austero.

— Não quero!

Dou alguns passos para trás,

sem conseguir disfarçar a minha

apreensão.

— Faço tudo por você, Sah!


Trabalho só focando em nós dois, para
lhe dar uma vida de conforto e luxos,
pra lhe dar sossego.

— Eu não quero que me dê

nada... — berro, interrompendo-o. Passo

por ele, entre lágrimas. Desço as

escadas e vou para sala.

— É muito ingrata, Safira! Me

tirou tudo e fez de mim o homem que sou


hoje — ele vocifera enquanto vem atrás
de mim.

Sento-me no sofá e uma forte

dor quer me partir ao meio.

— Eu não aguento mais a culpa.

Não aguento mais a nossa situação —

rebato, mas ele parece que não me

escuta.

— Sou um homem que vive pra

você, pra te realizar, pra te endeusar.


Tudo que sou hoje é resultado do nosso
passado — ele berra.

Tensa, balanço as pernas sem

parar. Minha garganta parece fechar,


num amargor sem fim.

— Não tive culpa, não te feri

aquela noite! — argumento pela enésima

vez. — Cinco anos se passaram e até

hoje não entendo como aquilo

aconteceu.

Não consigo colocar na minha


cabeça como Edgard se feriu. Talvez o
meu peso junto com o de Gustavo...

— Eu poderia ter morrido,


poderia ter ficado brocha e fiquei

estéril.

— Foi o peso de nossos

corpos, eu não me recordo.

Edgard balança a cabeça em

negação. Não sei por que ainda


argumento.
— Nunca poderei ter uma

família, você é minha única família.

— Não me torture assim!

— Você se oferecia para os

caras, gostava de seduzir, de se sentir

desejada. E olha o que aconteceu?

— Não suporto mais isso! —

grito, ensandecida. — Eu não era assim!

Corro para as escadas, vou

para o quarto de hóspedes, bato a porta


e a tranco.
Terça-feira

Amo as minhas irmãs

igualmente. Esmeralda sempre me


apoiou em minhas aventuras. Já Agatha é

a pé no chão e aquela que resolve as

tretas e confusões. Até hoje, para


nenhuma delas, tive coragem de revelar
sobre as pressões que Edgard me faz

para viver as fantasias eróticas. Imagine

como me sinto bloqueada para contar


que me apaixonei por outro homem?

Mas preciso começar a


enfrentar os meus problemas.
Ligo para Esme.

Conversamos bastante. Então,

resolvo perguntar sobre o Natal e assim


sondar o que meus pais e minhas irmãs

farão, antes de expor que gostaria de

fazer uma viagem às escondidas e usar o

nome dela ou da Tatá como desculpas.

— Sah, você não desconfia de

nada? — ela indaga e me deixa inquieta.

— De quê?
— Achou mesmo que todo

mundo ia te ignorar no Natal? Ah! Não


consigo esconder as coisas.

Fico apreensiva.

— Não me esconda nada. O

que está acontecendo? — pergunto,

preocupada com os meus pais.

— Nós desembarcaremos em

Austin no dia 22, vamos passar o Natal


contigo. — Quando escuto isso, eu me
sinto sugada para um buraco. — Nossos
pais queriam que fosse surpresa, mas
como sei que não vive no mar de rosas

com Edgard, acho bom saber antes.

— Obrigada por avisar, Esme.

Vou preparar a casa.

— Não se preocupe, fizemos

reservas num hotel, porque tanto eu

como a Tatá vamos com nossos


namorados. Após o Natal, pretendemos
ir para Dallas e, depois, seguiremos
para Nova York, onde vamos passar o
Ano Novo.

— Que maravilha!

Conversamos mais um pouco,

nos despedimos e encerro a ligação com

uma ponta de frustração pressionando o

peito. Recordo-me do Natal passado

quando Edgard e eu fomos para o Brasil


e nos dividimos entre nossas famílias.
Não sou mais aquela Safira de

antes, que tapeava os defeitos dele, ou


fingia que não os via. Pior ainda, eu me

machucava para agradá-lo, pois sempre


agia como se estivesse em dívida com

ele.

A paixão proibida por Eric me

faz enxergar certas coisas que a minha

mãe, Celeste Maria, repetia milhares de


vezes e eu achava implicância:
— Sua relação com Edgard não

é amor, é uma obsessão infantil. Vocês


superdimensionam os sentimentos só

porque as famílias são contra esse


casamento, por serem jovens demais —

ela havia me dito.

Não só meus pais se

posicionaram contra o nosso casamento,

como também os pais dele. Enfim, só


agora, que sou uma adulta e volto a me
apaixonar ferozmente, compreendo os
meus pais.

Ainda tenho remorso por ter


permanecido dois anos distante deles.

Tudo por conta dessa santificação da

minha relação com Edgard. Fui

orgulhosa e fraca. Dói muito perceber

que fui tão tola. Mas preciso me

reagrupar e ter forças para seguir


adiante.
Sinto-me no pé de uma

montanha. Há duas opções: esperar a


vida passar e admirar a montanha, a sua

beleza e imponência, enquanto imagino


o quão suave deve ser o vento lá em

cima; ou enfrentar as dificuldades para

escalá-la e poder sentir eu mesma o

vento bater na minha cara. Por mais

difícil que seja, quero alcançar o topo.

Necessito me fortalecer. E quem sabe


um dia conquistar o espaço que tanto

negligenciei.

Vou até a janela e fito os


campos de bluebonnet. Em poucos dias,

chega o inverno, que costuma ser ameno

no Texas em comparação a outros

Estados americanos. Já me acostumei

com as temperaturas daqui. Cruzo os

braços e um vento frio entra pela janela,


então, fecho-a.
Apesar dos planos, estou triste.

Provavelmente, só encontrarei

o meu amor quando ele retornar de sua


exposição em Nova York. Terei esse

meio tempo para arrumar a minha vida e

conseguir falar para Edgard, em claro e

bom tom, que quero me separar.

Crio coragem e envio

mensagem para Eric, que alimentou


alguma esperança de que eu conseguisse
ir para Nova York.

— Seria muito bom se

conseguíssemos dormir juntos e namorar


sem preocupações — ele argumentou

ontem.

Não lhe dei esperanças de que

iria conseguir mentir para fazer essa

viagem. Na verdade, um lado de mim

amaria ir, mas outro se aliviou por eu


não precisar preparar essa enganação
gigantesca para encontrá-lo em Nova
York.

Espero o momento em que ele


sai da STW para o almoço e escrevo

uma mensagem:

“Oi, Eric, tudo bem, meu amor?

Olha, é impossível viajar, pois a minha

família está vindo em poucos dias. De

todo modo, quero que saiba que não


gosto de mentir”.
Ele visualiza e demora um

pouco digitando:

“Safi, tudo bem com relação a


NY. Mas, se não tolera mentiras, a

maior delas está no centro da sua vida.

Precisa rever as verdades e as mentiras

do seu coração e alma”.

Chocada, faço uma ligação para

ele, que atende após a terceira chamada.

— Eric, que resposta foi essa?


Está muito chateado por que eu não
consegui articular a viagem? —
pergunto.

— Não é isso... — ele

responde, em seu tom manso. — Só

acho que precisa repensar a sua vida

sobre essa ótica de verdades e

mentiras. Talvez viva uma mentira.

Quem sou eu para julgar... Bom, eu


mesmo sou um sujeito que só segue a
verdade do meu coração e sob as
rédeas da razão. Com relação à
viagem, tudo bem. De todo modo, não

conseguiria te dar atenção o tempo


inteiro, pois vou estar muito focado na

galeria.

Eu o escuto suspirar.

— Vou tomar uma atitude, Eric.

Estou me fortalecendo... — digo com um


aperto na garganta. — Mas não vou
prometer, vou fazer e ter a atitude
necessária. Vou pedir o divórcio, mas
não quero falar disso agora, nem por

telefone. Acho que poderemos nos


encontrar rapidamente amanhã no fim do

seu expediente.

— Está bem, Safi. Faça isso

por você, se realmente é o que quer. Eu

acho que você quer isso. Afinal, é o que


demonstra pra mim. Quanto a nós, vou
ver o que consigo fazer pra lhe dar uns
amassos por mais tempo do que algo
“rapidinho” — ele diz em tom de

brincadeira. — Bom, fico feliz pelo que


pensa sobre a sua vida... Mais tarde

conversamos, agora preciso comer

alguma coisa e retornar.

Nós nos despedimos e meu

coração comprime ainda mais, como se


estivesse dentro de uma caixa de
fósforos.

Hoje à noite, tentarei tocar no

assunto com Edgard. Se a conversa fluir,


vou pedir a separação.

Ele e eu passamos o domingo

sem nos falar. Ontem à noite, na hora do

jantar, tentei tocar no assunto, mas ele

deu outro rumo à conversa.

Com isso tudo, só percebo o


quão egoísta Ed se tornou. Alega que faz
tudo por mim, porém o que se torna cada
vez mais claro para mim é que faz tudo
por ele mesmo, para manter os seus

caprichos e realizar as suas vontades.

Se fosse o contrário e Edgard

se apaixonasse por outra, não pensaria

duas vezes para me largar. Numa altura

dessas, já estaria longe. Mas eu estou

aqui, presa, pressionada pelas longas


raízes de nosso relacionamento
esquisito. Preciso ser um machado
amolado para romper essas amarras.

Envio relatórios para Anthony.

Uno as mãos diante de mim e

observo a mesa vazia, que é ocupada

por Edgard. Receio que Safira decida

se separar apenas por causa de nosso


envolvimento. Gostaria que ela fizesse
isso por amor a ela mesma e por essa

união não lhe trazer mais felicidade.

Pelo nosso curto tempo de


envolvimento, é muito complicado eu

ser o pivô desse rompimento. No

entanto, é preciso considerar que essa

nossa paixão já nasceu assim, dentro

dessa tensão provocada pelo próprio

Edgard.

No fundo, não pretendo lhe


fazer promessas. Apesar disso, estou
cada dia mais envolvido e encantado.

Não gostaria de vê-la sofrer.


Então, penso bastante em cada passo,

embora nem sempre possa me segurar.

Ela é muito sensível e já sofre o

suficiente com as pressões do marido,

não precisa de um amante que faça a

mesma coisa.

Esse triângulo amoroso me


incomoda, afronta os meus princípios e
me joga num campo de batalhas.

Julguei tanto Samantha e estou


fazendo o papel dela, envolvido até o

último fio de cabelo com uma mulher

casada. Essa não é uma situação fácil.

Na verdade, é muito deprimente desejar

uma mulher e saber que ela dorme todas

as noites com outro homem.

Se eu pudesse escolher, não


nutriria esse desejo por Safira e nem
alimentaria os sentimentos que carrego
no peito. Sei que estou apaixonado por

ela. Porém, não consigo admitir isso.


Pode parecer infantil, só que não quero

dar o braço a torcer ao meu coração.

Levanto-me e sigo para a sala

de Tony.

Entro e me sento na cadeira


diante de sua mesa. Converso sobre os
relatórios que enviei para ele e aviso
que antecipei as minhas férias. Assim,
amanhã poderei me encontrar com

Safira, durante o dia.

— Tudo bem, Eric. Mas

percebo que não está tão focado como

antes. Espero que isso mude após a

exposição.

— Prometo que sim, nem que


renegociemos o meu contrato e eu
diminua as horas de trabalho.

Anthony arqueia as

sobrancelhas.

— Sei que vendeu um quadro

por mais de 20 mil dólares, mas é algo

incerto apostar somente nisso. Bom,

gostaria que continuasse aqui, conosco.

Já devo perder Edgard para a gerência

de implantação, não queria ficar sem


você. — Ele mexe em algo no seu
computador e me encara.

Respiro aliviado. Embora

tivesse uma boa amizade com Edgard,


espero que ele cresça ainda mais em

outra gerência. Pelo menos, não terei de

encará-lo todos os dias, como um aviso

do quão traíra sou eu.

— Que bom que Edgard está

crescendo — comento.

— Mas eu quero falar de você,


cara, anda muito esquisito. Jura que é a
exposição mesmo? Porque você já
participou de outras e nunca ficou

visivelmente aéreo.

Suspiro.

— Essa é a mais importante.

Mas estou passando por uma certa

situação.

— Se quiser desabafar...

— Obrigado, cara. — Levanto-


me.

— É mulher?

Balanço a cabeça de modo

afirmativo.

— Uau! Que bom, cara... Por

falar nelas, já estou me articulando com

Edgard para rolar a minha vez, antes que

ele saia do setor e acabe se afastando de

nós. — Anthony sorri, sagaz.

Um fogo me toma os intestinos


e me revira por dentro. Não tenho
estrutura para aguentar isso.

— Tony... — Tento controlar a


minha respiração. Passo a mão no rosto

e luto pela razão. — Deixe Safira em

paz. Edgard embarca nessa viagem

sozinho, entendeu? — Dilato o olhar em

sua direção.

— O que deu em você, cara?

— É isso que escutou. Esqueça


essa mulher! — digo, bravo. Em
seguida, saio.

A vontade é pegar Edgard pelo


colarinho e lhe dar um murro na cara

nesse exato momento. Por sorte minha,

ele está trabalhando em outro setor. Não

será fácil voltar a encará-lo. Terei de

exercitar toda a minha calma.

Retorno à minha mesa e tenho


dificuldade de me concentrar.
Enterro o rosto entre as mãos

enquanto sou consumido pelos ciúmes.


Esse é um sentimento o qual detesto.
Dia seguinte

Elegante em seu casaco de frio

terracota, Safira caminha em passos


largos, em direção ao meu carro,

estacionado na rua tangencial a que ela

mora com o mequetrefe do marido. Bem


próximo, ela olha para trás, como que
por precaução, e abre a porta do carro.

— Ei! — ela diz com um

sorriso deslumbrante no rosto.

Mas a resposta ao seu

cumprimento é um abraço de urso ao


tempo que roubo os seus lábios para
mim e exijo a sua língua submissa à
minha. Damos um beijo demorado e nos
abraçamos apertado por alguns minutos.

Tenho dificuldade de me afastar de sua


boca.

— Ei, Safi... Está linda! —

elogio. — Aliás, é linda!

Tímida, ela enrubesce.

— Obrigada, meu amor. Você


também é bonito e elegante. Nem sei
como está nessa comigo. — Ela enterra
a cabeça no meu ombro e acaricia o meu
rosto, com a barba um pouco crescida.

Pego a palma de sua mão e a

beijo.

— Estou porque quero —

respondo. — Assumo todas as

consequências disso. Só não gosto de

ficar longe de você, mas aceito as


circunstâncias de bom grado. — Pego a
sua bela mão e passo de novo no meu
rosto. — Farei a barba hoje à noite...

— Gosto assim... Aliás, tudo


em você me agrada demais.

Sorrimos um para o outro.

— Nem acredito que teremos o

dia só nosso! — exalto.

— Nem dormi direito de tão


excitada... — ela confessa. — Vamos

fazer o que hoje? Estou ansiosa para


descobrir o que planeja.

Quando a avisei de que não iria

trabalhar hoje, não revelei quais eram os


meus planos e apenas comentei que

imaginava fazer algo diferente.

— Se fosse atender aos meus

desejos, te levaria de imediato para o

meu apartamento. Mas não sei quando

teremos outra oportunidade dessas,


então vamos fazer um piquenique no
lago Travis[32], o que acha?

Ela sorri, mas logo os seus

lábios se comprimem, preocupados.

— Eu... não preparei nada...


você devia...

— Êpa, calma. — Eu a

interrompo e aponto para o banco de

trás, onde preparei uma cesta com

lanches e coloquei tudo que imaginei


que fossemos precisar.
Então Safi acaricia o meu rosto.

— Parece um sonho... — ela

sussurra feliz sobre os meus lábios e me


beija de maneira intensa.

— Calma, Safi, assim vou

desistir do passeio.

Gargalhamos.

Pego o caminho para o lago,


que está a 32 quilômetros a oeste de

Austin, enquanto conto para ela que


costumava ir lá sozinho para rabiscar
alguns desenhos.

Conversamos empolgados. Ela


me conta sobre a sua família e irmãs e

eu lhe digo que não me lembro delas,

mesmo que tenhamos estudado no

mesmo colégio. Revelo ainda que

possuo apenas um irmão mais novo, o

Daniel, que mora com os meus pais em


São Paulo. Passamos o caminho nos
recordando das pessoas da época do
colégio. Ao final, descobrimos que
quase não tínhamos amigos próximos em

comum.

Fito o seu perfil e me recordo

que a tinha como uma mulher inatingível

quando a via, em algumas ocasiões,

pelos corredores do colégio, como

também quando a reencontrei casada


com Edgard. Então, Safira voltou a falar
dele.

— Tentei conversar com

Edgard, mas não consegui. Ele chegou


tarde e com dor de cabeça.

Franzo o cenho. Não queria

falar nada, mas acabo dando a minha

opinião:

— Não gostaria de gastar o

nosso precioso tempo falando de


Edgard. Mas, se fosse você, arrumava
minhas coisas e saía de casa. Como não
sou, torço para que tome a melhor
atitude — digo, sem conseguir controlar

o meu lado ranzinza.

Safira me observa com olhos

arregalados e, em seguida, morde os

lábios.

Ficamos em silêncio por algum

tempo. Arrependo-me de ter parecido


rude em minha colocação. Mas a
insistência de trazer Edgard para os
parcos momentos entre nós é algo que
me faz questionar se ela deseja mesmo

se separar dele, ou se quer apenas viver


esse affair comigo. É também por esse

motivo que sufoco o que sinto por ela.

— Desculpe por ter falado

assim — digo e seguro a sua mão.

— Te entendo, Eric. Mas é


você quem não entende a escravidão
emocional que vivi todos esses anos.
Não é como descartar uma roupa que
não nos serve mais.

— Sei disso. Vou compreender

— murmuro. — Eu fui praticamente

noivo de uma moça, a Samantha... —

confidencio a Safira sobre esse amor e

como decidi não perdoar uma traição

dela.

— Não foi orgulho ferido?


Poderia tê-la perdoado — ela pontua.

— Poderia, sim. Mas como

voltaria a confiar nela, se eu já estava


tocando a minha vida aqui e ela seguia a

carreira dela no Brasil? Pode ter uma

ponta de orgulho na minha decisão, mas

foi necessária e nunca me arrependi. Ao

contrário, fiquei aliviado ao perceber

que, o que eu desejo de uma mulher, ela


não estava disposta a me dar.
Nós nos olhamos intensamente.

— Voltando a mim, quero que

saiba que o que mais desejo é essa


separação. Não faz ideia de como sonho

com isso, mas preciso conversar com

Edgard, ele precisa me entender — ela

argumenta baixinho.

— Só não quero que tome uma

atitude por causa de mim. — Ela me fita


de um jeito vulnerável. — Desejo que se
separe por você, para que isso te traga
felicidade.

— Entendo — ela responde


baixinho. Pego a sua mão e a beijo.

Algum tempo depois, chegamos

a uma enseada tranquila, bem próximo a

um píer. Uma bela vegetação nos rodeia.

Aliás, Austin é uma cidade muito verde

e os seus subúrbios e arredores também


nos proporcionam esse contato com a
natureza. Ao longe, avistamos as
colinas, o que é um afago aos sentidos.

Admiramos a paisagem ao sair


do carro. Um vento frio bate em nossos

rostos.

— Hoje está um pouco frio —

comento.

— Gosto do clima daqui...

Pego a cesta que preparei e

também meu casaco. A área está bem


vazia, o que é ótimo para nós. Safira
sugere que fiquemos embaixo de um
conjunto de três árvores, mas sugiro

darmos um passeio de barco primeiro.

Vou até o barqueiro e acerto o

passeio. Ponho a cesta dentro do barco,

visto o meu colete salva-vidas e ajudo

Safira a colocar o seu, certificando-me

de que está bem travado. Entramos na


embarcação para umas seis pessoas,
mas só tem nós de passageiros.

Converso um pouco com o

piloto. Em seguida, nós nos sentamos ao


fundo. Trago-a para perto de mim e

beijo o topo da sua cabeça. No

horizonte, o céu escuro e o frio têm

efeito contrário e aquecem o meu

coração só por causa da presença de

Safira.

— Isso aqui fervilha no verão


— comento. — Mas agora parece
reservado a nós.

— Estou muito feliz, Eric,


muito... Não me lembro da última vez

que me senti assim — ela confessa

enquanto tira alguns fios de cabelo, que

escorregaram do rabo-de-cavalo.

Toco o seu queixo e o ergo

gentilmente, então, me dou conta de que


o olhar de Safira provoca efeitos bem
mais profundos do que imaginava.
Suavemente, encosto os meus lábios nos
dela e me concentro na maciez e

suavidade desse contato. O sentimento


bate forte no peito.

Enquanto comprimo Safira

contra mim, tento sufocar o meu

coração. Morro de tesão por ela, mas

nesse momento estou anos-luz de


distância do sexo. Queria mesmo era
guardá-la num lugar seguro, protegê-la e
a fazer muito feliz. Meu peito comprime
e aperta. Como queria essa mulher para

mim!

— Se pudesse, eu te guardava

num potinho especial e mantinha bem

junto do meu coração — sussurro.

— Ah! Que lindo... — Safi

beija o meu pescoço e acaricia o meu


peitoral. — Se eu pudesse, eternizava
esse momento numa fotografia especial
capaz de congelar não só a nossa
imagem, mas as sensações e

sentimentos.

— Infelizmente desconheço a

tecnologia para realizar o seu desejo por

completo — digo enquanto retiro o meu

celular do casado e o posiciono para

uma selfie —, mas, parte dele, eu posso.

Ela sorri. Eu também. E,


pronto, temos a nossa primeira foto
juntos.

— Fique tranquila, a foto está


segura comigo. Sou um sujeito sério. —

Nós nos entreolhamos de uma forma

intensa.

— Confio em você, Eric. Mas

precisamos manter esses nossos

encontros em segredo até me separar.

— Serão os nossos segredos


picantes... — digo e arranco um risinho
cúmplice de seus lábios.

Trocamos uma série de beijos


apaixonados, conversamos e admiramos

a paisagem costeira do lago.

Escorregamos entre as águas azuis, de

vários tons, o que depende da incidência

da luz e da profundidade do lago.

Passamos por formações rochosas,


avistamos cavernas, prainhas e florestas.
Após o passeio, estendemos

uma toalha embaixo de uma árvore,


comemos os sanduíches de queijo e

bebemos suco. Voltamos a nos beijar, e


meu pau começa a doer de tanto ficar

duro.

— Acho que devemos ir... —

Interrompo o beijo e nos entreolhamos,

deitados na toalha.

— Mas já? Deve ter pouco


mais de uma hora que chegamos.

Pego delicadamente a mão dela

e a pouso sobre o meu pau.

— Preciso de você, Safi... —

Ela sorri e massageia o meu pau.

Apenas olho para o céu e sinto

esse fogo do desejo se formar em

minhas entranhas como um furacão.

Abro a porta, já tirando o meu


casaco. Minha temperatura parece de um
verão brasileiro, tamanha as labaredas
que me corroem. Afinal, durante o

caminho de volta, Safira me provocou


com os seus toques eróticos em meu pau,

sobretudo quando colocou a mão dentro

de minhas calças afrouxadas por ela

enquanto guiava.

Tive vontade de parar o carro e


a foder sem piedade, mas é atentado ao
pudor. Se fôssemos pegos, seríamos
presos e, quem sabe, deportados num
piscar de olhos. Além do que, estaria

expondo-a demais. Eu me controlei ao


máximo.

Mas, nesse momento, não

consigo mais colocar freios.

Ajudo-a a se livrar de suas

roupas quase sem parar de beijá-la. Tiro


a sua blusa, e logo se sobressai a sua
pele lisa e um pouco amendoada dentro
da lingerie branca e rendada. Só que não
consigo admirá-la como deveria, porque

o desejo submete os meus sentidos e


tudo que quero é devorá-la.

Nossas respirações estão

entrecortadas e uma forte energia se

concentra na base do meu abdômen.

Num só movimento, abaixo uma taça do


sutiã e quase engulo o seu mamilo,
fazendo com que Safira arqueje de
prazer. Enquanto chupo o peito, sinto o
bico duro roçar a minha língua. Toco a

sua fenda molhada e já enlouqueço.

— Não gostaria de ser

grosseiro, mas não consigo me conter.

Me desculpe... — digo após largar o seu

peito e a erguer no colo.

— Nunca se desculpe por me


subjugar. Eu gosto.
O que ela diz eclipsa por

definitivo os meus sentidos. Coloco-a no


meu ombro, de bunda para cima, e lhe

tasco uma mordida enquanto chegamos


na cama. Sinto-me o próprio homem das

cavernas. Ponho-a em pé sobre o

colchão, desço a sua calcinha de vez e a

retiro.

— Eu amo esse seu cheiro —


confesso, quase rouco de desejo, após
esfregar a calcinha em minha cara, o que
me enlouquece.

Safira me fita com um


semblante sedento. Parece ainda mais

entregue após assistir à minha cena com

a sua calcinha.

— Sou sua, Eric. Faça comigo

o que quiser, amo ser sua.

Nunca me senti tão dono da


situação e predador. Arranco a minha
cueca ao tempo que ela se livra do sutiã,
deita-se na cama e abre as pernas para
mim. Safira me fita de um jeito submisso

e ingênuo, que mexe comigo de um modo


perigoso. Avanço para cima da cama.

Coloco-me sobre ela, como um animal

ao reconhecer a sua presa indefesa.

— Não diga que é minha

porque eu vou te reivindicar. —


Escancaro ainda mais as suas pernas, e
meu pau tateia a sua entrada,
escorregando em sua umidade.

— O que mais quero é seguir as


suas ordens.

Abafo as suas palavras com um

beijo voraz enquanto a penetro alguns

centímetros, para que ela se acostume

com o meu pau. Sustento o meu corpo

com um antebraço e, com o outro, agarro


a sua bunda. Em seguida, num único
movimento, meto completamente dentro
dela, que arqueja sobre a minha boca.

Eu a beijo em desespero, numa


fúria cortante. E a fodo com força.

— Diga de novo que é minha

— peço, entre fortes estocadas.

— Sim... sim... eu digo. Faço o

que quiser, Eric, porque sou sua, só sua

— ela sussurra, entre gemidos a cada


estocada. — Meu corpo é seu. Minha
boceta é sua... Meu coração também é
seu.

Volto a exigir a sua língua,


numa sede que não pode ser saciada.

Giramos na cama feito animais no cio,

grudados, colados, numa foda intensa,

enquanto sinto a cabeça do meu pau

abrir a caverna apertada de Safira e

avançar por seus anéis e músculos que


me oferecem o deleite.
Logo sou tomado por uma

vontade louca de gozar.

— Não pode gozar dentro de


mim — ela avisa, mas a ignoro.

— Diga de novo que é minha...

— peço numa ânsia voraz e dominadora.

— Eu sou sua, Eric.

Quando uma explosão começa a


se apossar do meu pau, eu o retiro de

dentro dela, o masturbo e jorro a minha


porra sobre a sua barriga e seios.
Espasmos se espalham e grito
indecentemente. Os músculos das pernas

tremem.

— Porra, Safi, que gozada

gostosa! — berro com a respiração

ofegante. — Melhor que isso só no dia

que puder gozar dentro de você sem

camisinha.

Em seguida, eu me envergonho
da minha falta de pudor e de meu desejo
comprometedor. Afinal, não somos tão
íntimos para isso.

Mas ela me sorri lindamente.

— Adoro assim, mas é

perigoso.

— Me desculpe! — Vou até ela

e beijo suavemente os seus lábios. —

Vou limpar isso aqui.

Levanto-me e pego uma toalha


no armário. Retorno, sento-me na cama.

— Deixa-me limpar essa

gostosura linda, toda melada de mim. —


Arranco mais sorrisos de seus lábios.

— Sou muito feliz quando estou

contigo, Eric. Esses momentos são

maravilhosos.

— Concordo, são fantásticos. E

podem ser melhores, só dependem de


nós — falo e me arrependo. Para
disfarçar, vou até a cozinha e pego água.
— Quer água? Suco?

— Não, obrigada.

Não devemos fazer planos,

afinal, nunca sabemos quando será o

próximo encontro. Safira se levanta e

vai até o banheiro. Levo um copo com

água e ponho do seu lado da cabeceira

enquanto a espero retornar.

Ela sai e se mostra


envergonhada para caminhar nua diante
de mim. Cobre os seios com um braço e
a vulva com a outra.

— Está com vergonha de mim?

Nossa! — zombo e ponho as mãos no

rosto, quando as retiro, ela já está ao

meu lado e puxa o lençol para se cobrir.

— Está animado para viajar

amanhã para Nova York? — ela


pergunta com o ar alegre e arruma os
travesseiros nas costas, provavelmente,
para disfarçar a sua timidez.

— Muito entusiasmado, mas


não quero falar disso.

Vou até ela e me deito no seu

peito. Escuto o seu coração bater e,

santo Deus, como queria que fosse meu.

Como a queria para mim!

— Sobre o que quer falar? —


ela pergunta.
Viro-me na cama e a puxo para

cima de mim.

— Sobre o aqui e a agora. —


Toco a sua bunda macia e deliciosa e a

apalpo com vontade. — Sobre o nosso

prazer... Afinal, quando vai dar isso aqui

pra mim? — Dou uma beliscada em suas

nádegas.

Safira sorri e enterra o rosto no


meu peito.
— É tudo sobre sexo? — ela

comenta, num tom sério.

— Não, mas é muito precoce


fazermos planos se ainda está com o seu

marido.

— Mais cedo, disse que

gostaria que me separasse por mim e

não por causa do nosso envolvimento.

Agora alega que não quer falar sobre


nós porque ainda estou com Edgard. —
Ela sai de cima de mim e se aloja ao
meu lado.

— Safi, o melhor é deixar


correr. Não quero me machucar e nem

quero te ferir. Vamos ser cuidadosos.

— Está bem...

Ela me fita com os seus olhos

marejados, demonstrando um pouco de

ressentimento. Essa é a mesma forma de


me olhar que conquistou o meu coração,
que é bastante comovente. Fico
desconcertado e me sinto um ogro.

Aproximo-me e a abraço. Meu


peito aperta. Tenho muito sentimento por

ela, mas não sei lidar direito com ele.

Só que não dá para esconder mais isso.

— Te quero tanto, Safi, e não é

só por desejo. — Afasto-me um pouco.

Passo duas mechas de cabelo atrás de


sua orelha. — Não é só por seu corpo,
isso é só consequência, porque me
apaixonei por você.

Esse sentimento represado no


peito engolfa a alma e pressiona a

garganta, não consigo mais deter as

palavras. Só não derramo lágrimas

porque sou um sujeito forte. Mas estou

emocionalmente tocado por ela e por

esse intenso amor.

Safira pisca e duas solitárias


lágrimas se formam nos cantos de seus
olhos. Ela se ajoelha diante de mim e
toca o meu rosto. O lençol escorrega e

desnuda o seu corpo.

— É real? — ela pergunta.

— Amo você, Safi. Como

chamar o que sinto senão de amor? —

revelo o que não consigo mais esconder.

— Ah! Eric. Eu te amo tanto


que não faz ideia. — A voz dela sai
embargada. — Desde o dia que me
abordou diante da casa de Rose, eu não
consegui mais parar de pensar em você,

em fantasiar que seria o meu amor.

— Ah! Safi. Temos tanto a

viver — digo e a abraço. — Está tudo

bem. Vai ficar tudo bem — consolo-a.

— Amo você, meu amor. Não tem por

que chorar.

— É de felicidade, alegria.
— Minha princesa linda!

Eu a encho de pequenos beijos

até nos entregarmos a um bem profundo,


carregado de nossas verdades. Esse

sentimento que brota no peito já vem

intenso e forte, mas cheio de desafios a

serem enfrentados.

Tentei abafar esse amor por

Safira com todas as minhas forças.


Contudo, estava sendo injusto com ela
ao escondê-lo. Quem sabe revelar que
estou aqui para ela além do sexo lhe dê
forças para mudar o que é necessário em

sua vida. Mas, talvez não.

Ao amá-la, sinto-me na beira

de um abismo. Corro o risco de ela não

conseguir largar Edgard e eu cair

fodido, no fundo cheio de tristeza e

decepção. De todo modo, vale a pena,


até porque não escolhi esse amor.
Simplesmente aconteceu.

Nossos beijos se tornam mais

intensos e começamos a nos amar. Dessa


vez, sem a urgência de mais cedo, com

leveza, afeto e muito desejo.


A felicidade não cabia em

minha vida, marcada por uma amargura


cortante que costumeiramente insistia em
travar a minha garganta. Mas a leveza do

que sinto nesse momento me faz parecer


um balão a vagar pelos céus num voo
errante e seguro, o que ofusca os meus

temores e medos enraizados na alma.

Não consigo recordar de outro

momento em que provei essa sensação

de uma maneira tão impetuosa, como um

vento morno que bate em meu rosto e


provoca a sensação de plenitude e
satisfação. Observo Eric e me perco no
seu sorrisão, no seu jeito cuidadoso de
agir e em sua voz firme. E o melhor de

tudo é que ele me ama.

Eric me ama!

Parece que estou num sonho. E,

se tivesse coragem, saía rebolando por

aí, na dancinha da felicidade. Só falta

resolver a minha vida com Edgard e me


tornar livre para viver essa nova
história.

Enfim, fizemos amor pela

segunda vez, de forma afetuosa e sem


pressa. Em seguida, tomamos banho.

Usei um robe longo e de manga

comprida, perolado, que trouxe na minha

bolsa. Eric ligou a calefação para

continuar desfilando na minha frente o

seu físico trabalhado, dentro de uma


cueca boxer branca, e as suas tatuagens
no peitoral e no braço direito.

— É para combinar contigo! —

ele disse na hora que escolheu a única


peça que usa.

Preparamos uma refeição juntos

e, nesse instante, estamos sentados na

bancada da cozinha terminando de

devorar o risoto de frango acompanhado

de um vinho. Afinal, estávamos


famintos.
— Tem um assunto que quero

tocar contigo e procurava o momento


certo... — Eric começa.

— Do que se trata? — pergunto

entre uma garfada e outra.

— Já te disse que não curto

drogas.

— Sim... — Tomo um gole do

vinho.

— Também não bebo muito.


Canalizo a minha energia para a pintura.

— Vai me mostrar a sua nova

tela que está coberta? — questiono. —


É a mesma que vi na casa de Rose?

— Não, essa é outra. Vou

mostrar quando estiver pronta. É

surpresa. — Ele limpa a garganta. —

Mas, voltando ao assunto, o que costuma

usar?

— Hã... Como assim? O que


uso? Não entendi. — Não entendo aonde

ele quer chegar, nem o clima esquisito


que paira entre nós.

— Safira, aquele dia no rancho,

você estava alterada. Vi suas pupilas

dilatadas enquanto me seduzia de um

jeito mais atrevido, diferente do que

você é normalmente. Então, não se sinta

constrangida em confessar isso para


mim, eu percebi.
Pensei que Eric tinha

compreendido o que aconteceu naquela


noite.

— Estava bêbada. Além disso,

você me disse que não ia me julgar por

aquele dia, pelo beijo que dei em Helga

e pela forma com que dançamos.

— Não estou julgando. Só

estou dizendo que festas como aquela e


noitadas como a do rancho são um ponto
fora da curva em minha vida. O que

quero dizer é que não costumo


frequentar esses lugares.

De repente, um frio comprime o

coração, pois sinto que ele não aceita o

meu passado devasso ao lado de

Edgard.

— Já entendi. Você é um cara

caseiro, eu também sou. Ou será que


você não aceita meu passado e as
fantasias que vivi para agradar a
Edgard?

Eric põe o garfo sobre o prato e


demonstra estar incomodado.

— Não, Safi, não tem relação

com o que viveu no passado. Vou

reformular a pergunta. Qual combinação

de álcool e drogas já usou? — ele

questiona e me encara, sério.

Suspiro. Também paro de


comer.

— Não sei por que insiste

nesse assunto. Não me drogo, Eric. —


Um bolo se forma na garganta. — Não

imaginava que fosse tão careta, mas até

aquele episódio na ilha, da facada que,

sem querer, dei em Ed, ou não sei se dei,

pois eu era um pouco irresponsável e

estava meio louca... — confesso de má


vontade, porque me faz mal recordar
daquele episódio. — Enfim, esse dia foi
a última vez que usei drogas
estimulantes. Já usei também maconha e
ecstasy. Depois do que aconteceu, eu

parei. Aquele verão foi um divisor de

águas na minha vida e na de Edgard. E

nem quero falar mais disso.

Murcho. Levanto-me da

banqueta e o encaro. Eric silencia,


pensativo.
— O que isso tem a ver? Jura

que nunca esteve em festas que rolaram


drogas? — questiono-o, atrevida e com

a apreensão batendo níveis altíssimos.

— Já estive em algumas delas.

— Ele apoia os cotovelos na bancada e

esfrega as mãos no rosto por alguns

instantes. Em seguida, volta a me

observar. — Sinceramente, pensava que


você usava algum tipo de remédio ou
metanfetamina com álcool para
conseguir realizar os caprichos de
Edgard. Imaginei que isso fosse uma

escolha sua e uma forma de suportar a


situação.

Estreito o olhar e uno as

sobrancelhas.

— Não! Nunca fiz isso.

Remédio com álcool? Meta? — Balanço


a cabeça em negação, indignada com o
que Eric pensa ao meu respeito.

— Edgard é um filho da puta!

— ele se exalta. — Ele te droga para


que realize as fantasias dele. Se ele não

faz isso sempre, ao menos fez em San

Saba — acusa.

— O quê? — Não consigo

compreender de imediato a extensão

dessa acusação e o peso do problema


que Eric revela.
Paraliso. Meu peito aperta.

Estou chocada. Nunca imaginaria que


Edgard fosse capaz disso.

— Quando saí do quarto da

edícula naquela noite, fui tomar água na

cozinha e encontrei sobre a pia um

pequeno pilão, dentro dele tinha um

resto de uma substância triturada.

Estranhei, então, peguei um pouco pra


tentar descobrir o que era. Alguém me
disse que só pode ser algum tipo de
antipsicótico. Misturado ao álcool, você
deve ter tido picos de euforia, imagino.

— Mas... — Meus olhos se

dilatam e nem consigo piscar,

atormentada. — Não é possível.

Meu estômago embrulha. Toco

o meu abdômen e uma dor emocional

cortante parece me socar. Faltam-me


forças até para chorar.
— Safi... — Eric vem até mim

com urgência e me abraça. — Calma,


meu amor. Está tudo bem. Isso não vai
mais acontecer se não quiser. Agora

você já sabe.

Então, desato a chorar. Uma

tempestade de lembranças se alastra em

minha mente. Agora entendo por que me

alterava toda vez que ia me envolver


com outro cara enquanto achava que
estava bêbada. Na verdade, estava
drogada. Compreendo por que passei
mal e caí num clube, indo parar no

hospital. Aos soluços, conto tudo isso a


Eric, que me consola e me dá apoio.

Não consigo mais comer. Ele

me leva até o sofá e nos sentamos

abraçados. Eu me sinto uma completa

idiota, sendo manipulada por Edgard


todos esses anos.
— Como não percebi? —

questiono a mim mesma, quando vou me


acalmando.

— Porque é uma mulher

sensível e que depositava muita

confiança nele, no seu marido. Não sinta

vergonha disso, Safi. Quem tem que se

envergonhar é Edgard. Ele quem traiu a

sua confiança. Você entregou sua vida a


ele, que não lhe correspondeu com
respeito, como você merecia.

— Deve estar chocado por eu

ser tão idiota — presumo.

Eric segura o meu rosto e beija

suavemente os meus lábios.

— Não, não estou.

— Me sinto tão fragilizada,

pequena e insignificante.

— Não é nada disso, Safira. É


uma mulher linda e muito sensível.
Aliás, não deve confundir sensibilidade
com fraqueza. Não cometa esse erro.

Um vazio enorme se prolifera

no peito. Eu me enganei sendo tão

passional em minha vida. E o pior é que

continuo do mesmo jeito.

— Preciso de você, Eric. —

Um vazio parece corroer as minhas


entranhas. Levanto-me do sofá, ainda
muito decepcionada com o que descobri.

— Estou aqui, minha linda. —

Eric me envolve em seus braços pelas


minhas costas e toco os seus antebraços

másculos, o que me faz sentir protegida.

— Então, me beije, por favor

— peço e me viro para ele.

Eric toma a minha boca de

modo apaixonado. Assim, faço de seus


lábios o meu refúgio, o lugar onde quero
estar e me preservar das dores que me

cercam. Em seus lábios, também me


abasteço de forças para enfrentar a
minha realidade difícil e romper com as
amarras que me sufocam.

Preciso muito dele e do seu

afeto.

Logo seus beijos se tornam

exigentes e suas mãos invadem o meu


robe, desamarrando-o e fazendo-o
deslizar pelo meu corpo.

Eric olha a minha nudez.

— Venha... — Ele me estende a

mão. — Vai ficar tudo bem, Safi.

Eu lhe dou a minha mão, o meu

coração e a minha fé. Assim, vamos

para a cama.

Na lateral dela, abraço-o e


ofereço os meus lábios outra vez. O

beijo começa suave e, aos poucos,


torna-se intenso. Afago o seu pau, que
vai endurecendo na minha mão. Enfio a
mão por dentro da cueca e tenho a carne
fina e macia na minha palma. Deslizo
devagar, dando suaves apertões por todo

o comprimento e me atenho à sua glande

grossa, que mais parece um super


morango.

Eric geme sobre os meus


lábios.
Sento-me na lateral da cama,

retiro a sua cueca e seu pau salta ereto.


Eu o abocanho com vontade. Seguro a
base com as mãos e o lambo como um

sorvete suculento. À medida que avanço


nessa tarefa, a sua umidade jorra, o que

me excita ainda mais, então, saboreio-a

com mais vontade.

Ele enfia as mãos entre os meus


cabelos e contorce o rosto de prazer. Em
seguida, puxa-me e me beija
intensamente, conduzindo-me a deitar na
cama.

— Quer que eu te foda de

novo? — ele indaga assim que se afasta

de minha boca.

— Sim, quero que faça amor

comigo até não aguentarmos mais —

respondo.

— Ah, diabinha! Não sabe o


que está pedindo.

O que mais desejo é esquecer o

mundo nos braços de Eric, que suga o


meu seio. Solto um grunhido ao sentir
um aperto na vagina. Ele já descobriu

que tenho muita sensibilidade nos

mamilos e os estimula bastante, o que

me enlouquece.

Vorazmente, ele vai descendo


os lábios e me dando mordidas pelo
caminho até chegar à boceta. Aí, ele se

dedica a me lamber em cada cantinho de


carne lisa e sensível. É a melhor língua
que já tive entre as minhas pernas.

Com tanto estímulo, chego ao

clímax outra vez e sinto a minha

umidade aumentar, enquanto grito

ferozmente, num prazer intenso que

alivia a dor da alma. Eric suga do meu


prazer.
Em seguida, ele põe a minha

perna direita sobre o seu ombro,


mantendo-me um pouco inclinada.
Flexiona a sua perna direita, com o pé

apoiado na cama. Demonstrando que


ainda está faminto, ele enterra o seu

membro em mim, numa penetração

profunda. Gemo e fecho os olhos,

entregue ao novo momento.

Sinto o seu membro por inteiro,


com a sua fabulosa glande, além do
comprimento e calibre poderosos.

Pouco depois, ele retira o seu pau e


observa a minha boceta, enquanto
profere algumas obscenidades, o que cai

nos meus ouvidos como um estímulo

erótico, excitando-me ainda mais.

— Linda e gostosa! Como pode

ser tudo isso, Safira? Como pode me


olhar com essa cara de santa e me
oferecer algo tão safado, como essa sua
bocetinha?! — ele provoca e me penetra
forte.

Respondo com grunhidos de

prazer.

Ele alterna as penetrações

profundas com a fricção do seu membro

no meu clitóris, que escorrega sobre a

minha umidade de forma deliciosa. Em


pouco tempo, estou excitada outra vez.
Ele também apalpa os meus seios e dá
tapas na minha bunda.

Depois de se refestelar bastante


de mim, ele baixa a minha perna e põe a

camisinha no seu pênis, deita-se sobre

mim e gira o corpo para que fique em

cima dele.

— É a coisa mais deliciosa da

face da terra. Seja minha, Safi. Seja


minha — ele quase implora, numa
mistura de desejo e sentimentos que me
emociona.

— Já sou sua — murmuro e


monto nele.

Rebolo em movimentos

circulares sobre o seu pau. Ele geme.

— Eu te quero só pra mim,

linda — ele enfatiza a palavra “só”.

Meu coração para e volta a bater mais


forte, numa mistura de prazer e ternura.
— Serei só sua — prometo num

murmúrio.

Então, Eric volta a comandar os


nossos movimentos, ao travar o meu

quadril, e conduz meus lábios aos dele.

Após algumas estocadas rápidas, que me

fazem gemer sem parar, mudamos de

posição de novo. Dessa vez, ficamos de

lado. E ele me faz desaparecer num forte


abraço.
— Te quero muito, Safi.

Ele me domina por cima de

mim e me cavalga com urgência, a sua


glande grossa e inchada faz a minha
vagina enlouquecer. Assim, eu o sinto

explodir num longo gozo, enquanto a sua

língua invade a minha boca, demarca

território e se apossa de mim.

Enquanto as nossas respirações


se acalmam, se dissemina no meu peito
uma sensação de pertencimento tão

intensa que a minha vida longe de Eric e


desse apartamento parece algo distante.
Quando chego em casa, Edgard

está sentado no sofá com uma cara de


leão enjaulado. Já sabia disso, pois não
atendi às suas ligações. Não me importa

o que ele vai dizer sobre essa minha


saída, nada mais vindo dele me importa.
E tudo que quero é colocar um ponto

final e definitivo em nossa história.

— Onde estava, Safira? Te

liguei várias vezes e você nem me

atendeu, nem respondeu às minhas

mensagens. Sem contar que desligou o


GPS do seu celular. Quer me
enlouquecer? Já estava prestes a chamar
a polícia — ele reclama assim que entro
na sala.

— Não é pra tanto. Precisamos

conversar — digo. Sem encará-lo,

atravesso a sala e subo as escadas em

direção ao quarto.

Edgard me segue. Meu coração

dispara. Estou com muita raiva dele por


sua traição em me drogar. Refletindo
melhor, concluo que faz isso desde que

comecei a recusar o sexo com uma


terceira pessoa. Também tenho raiva de

mim por nunca ter desconfiado de nada,


ao longo desses quatro anos.

Sou mesmo uma tola. Mas meus

dias de idiota estão contados porque vou

virar esse jogo.

— Tenho o direito de saber


onde você estava — ele diz num tom
firme.

Já na porta do closet, viro-me

para ele e o encaro. Os batimentos


cardíacos estão prestes a parar.

— E eu tenho o direito de não

querer contar — respondo.

Nem sei de onde vem tanta

coragem.

— Está muito diferente, Sah.

Vou preparar algo pra você comer e


teremos essa conversa séria — ele diz e
sai do quarto.

A respiração se intensifica, mas


procuro me controlar.

Tomo uma ducha rápida e sinto

as paredes da vagina arderem de tanto

sexo que fiz com Eric. Foram quatro

vezes e quase o deixei morto. Sorrio ao

me lembrar de seu semblante cansado.


Ainda o ajudei a arrumar a sua mala,
pois amanhã cedinho ele embarca para
Nova York.

Foi difícil me despedir e sair


do seu apartamento, deixando para trás

as emoções, o afeto, as carícias e a

intensidade de nossas relações. Foram

dezenas de beijos até o final, foram

muitos toques até o derradeiro. Meu

coração mais parece uma fogueira,


totalmente incendiado por esse amor.
Apesar de nossas labaredas,

Eric também pode ser uma geleira quase


intransponível. Digo isso porque, em

alguns instantes, ele é um pouco duro.

Confesso que fiquei

incomodada quando ele me aconselhou a

me separar de Edgard por mim e não por

ele. Tenho ciência de que ele não está

errado, mas a visão que ele tem da


minha dependência de Edgard me
envergonha. Não gostaria que ele
pensasse que planejo trocar Edgard por
ele. Não é isso. Eu quero mesmo é ser

protagonista da minha história.

— Tenha cuidado ao conversar

com Edgard, por favor. Temo que ele

faça algo contra você. É melhor

conversar com ele quando eu retornar,

porque poderei te dar um suporte — ele


pediu. — Meu coração está apertado
com essa situação.

— Não se preocupe. Edgard é

grosseiro, mas não é um criminoso.

— Qualquer coisa, chame a

polícia e saia de casa.

— Está bem.

— Quero transferir uma grana

pra você, Safi, para caso tenha alguma


emergência, então preciso de sua conta.
— Não é necessário, Eric.

Tenho um cartão de crédito com um bom


limite — disse, com o orgulho um pouco
machucado por não ter a minha própria

renda.

Mas vou reverter essa situação.

Amanhã vou em mais uma

entrevista de emprego. É num antiquário

e a dona precisa de uma pessoa urgente.


Rogo aos céus que eu consiga essa vaga,
pois, assim, poderei sair da casa de

Edgard sem precisar pedir dinheiro


emprestado a ninguém e nem usar o
dinheiro de Ed.

Pretendo começar a pagar as

minhas contas. Não importa onde vá

morar. Preciso começar a correr atrás de

minha independência e fazer novas

amizades. Estou ansiosa por esse


recomeço.
Visto um pijama comprido e

desço para cozinha. O peito afunda, e a


garganta parece me cortar de tão

amarga.

— Fiz um sanduíche de queijo

pra você. Se sente aí que já levo — ele

fala.

Nervosamente, puxo uma

cadeira e me sento. Quase nunca, ele me


serve.
— Ed, precisamos ter uma

conversa definitiva. — Junto as mãos


diante dos meus lábios. Em seguida, uno
as mãos como se fosse possível

controlar o meu nervoso.

— Mas para isso, primeiro,

olhando nos meus olhos, precisa me

dizer onde estava — ele diz e se senta

na minha tangencial, colocando um


pratinho com o sanduíche e um copo de
suco diante de mim.

— Obrigada! — agradeço.

A forma que Edgard age me

intimida, mas não posso recuar. Fixo o

olhar no pão e procuro respirar com

calma para controlar a tensão do

momento.

— Ed, nossa relação não vem

bem há um bom tempo... então...

— Sei que ela não vem bem.


Mas é fase. Todo relacionamento longo
é cheio de fases. E estou disposto a
suportar esse seu momento ruim, porque
eu continuo o mesmo. — Ele me encara
e, por uma fração de segundos, tenho a

impressão de que ele sabe de Eric. —

Coma, Sah. Essa fase ruim vai passar,

meu amor. — Ele segura a minha mão, e

eu a puxo de maneira arredia. — O que


foi?
— Ed, precisa me deixar falar.

Há vários dias estou querendo ter essa


conversa e você ou me corta, ou nunca

está disposto a dialogar.

Tensa, pego o sanduíche e dou

uma pequena mordida.

— É por causa dos fetiches? —

ele questiona.

— Também. — Coloco o pão


de volta no prato. — Percebi que põe
algo na minha bebida quando vou me

relacionar com algum touro. Por isso


que passei mal e fui para o hospital há
seis meses, por esse motivo fico muito
louca e sempre acho que a culpa é minha

e que tenho problemas com a bebida.

Os olhos de Edgard dilatam,

demonstrando que ele não esperava essa

abordagem.

— De onde tirou essa ideia


estapafúrdia? — Ele arqueia uma
sobrancelha e me encara.

— Ando pensando bastante no


passado e liguei os pontos — minto. —

Não tem outra justificativa para o que

sinto. Não é a bebida que me faz agir

como uma prostituta. Algo me empurra,

percebo. — Expiro com força e me

esforço para demonstrar segurança. — E


você sabe bem disso. Pode não admitir,
mas tenha ciência de que eu sei.

Os seus lábios se curvam para

baixo e ele meneia a cabeça.

— Está procurando desculpas

para justificar seu gosto por ter homens

aos seus pés. — Ele aponta para centro

de sua própria mão. — Ou procura me

distrair para que eu não pergunte mais

onde você estava. — O seu aspecto


sisudo me dá a sensação de nadar e não
sair do lugar.

Céus! Como é difícil conversar

com Edgard!

São muitos anos juntos, numa

existência alienada, afastada da minha

família e sem amigos. Ele era tudo que

eu tinha até me envolver com Eric, até o

nosso mundo esquisito desmoronar, e eu

enxergar a realidade: vivia refugiada,


tudo para agradar um amor que não batia
mais no peito.

Porém, mesmo com essa

realidade desvelada diante de mim,


tenho dificuldade de avançar com a
minha agenda, em que o objetivo é

terminar com Edgard. Desde que decidi

me separar, sabia que não seria fácil.

Ainda assim, estou completamente

travada, mas não me deixo vencer.

Respiro fundo e continuo:


— Sabe da verdade, Edgard,

não tente me manipular como fez ao


longo dos últimos 10 anos.

— Não te manipulo, Safira —

ele berra. E estremeço. — O que faço é

por nós, para que eu e você não caiamos

na rotina, para que nossos instintos e

caprichos sejam atendidos. Me culpa

porque gosto de te ver com outro, mas


esquece que quem me apresentou a esse
mundo foi você. — Ele aponta o dedo
para mim, bate violentamente na mesa, o
que faz o prato correr.

Então, ele se levanta, nervoso e

com o semblante sisudo.

— Ed, eu quero me separar —

digo em alto e bom tom e me sinto

aliviada por conseguir proferir essas

palavras.

Os seus olhos esbugalham por


alguns instantes. Em seguida, ele
gargalha.

— Sah, isso não vai acontecer,


sabe bem. Entendo que esteja de cabeça

virada e não sei qual o motivo — ele

rebate com mais calma.

— Tivemos uma história que

foi bonita até determinado tempo. Mas

nós nos perdemos, Ed... Não quero mais


continuar — argumento, mantendo o
controle.

Edgard leva as mãos à cabeça.

— Não acredito que estou

escutando isso, Safira. Estou prestes a

ter uma promoção, preciso me focar no

trabalho e você faz o quê? É uma

insensível. Só pensa em você e em seus

caprichos. — Edgard olha o relógio. —

São quase 22 horas e você chega tarde,


não diz onde estava e pede a separação?
— ele acusa.

Ansiosa, minha respiração se

intensifica e os batimentos cardíacos


disparam.

Edgard vai até o escorredor,

apanha dois pratos e os atira no chão,

soltando um grande berro de dor.

Tremo.

— Calma! Conversamos depois

então. — Tento acalmá-lo.


Ele escora na parede e vai

deslizando até o chão. Flexiona os


joelhos e começa a chorar alto. Mesmo
magoada com Edgard por ter descoberto

que ele me drogava às escondidas, meu


coração aperta e me sinto uma monstra.

Afinal, eu o traio com o seu amigo, o

que me causa a sensação de que sou a

pior mulher do mundo, sobretudo,

quando me recordo que passei o dia


transando com Eric.

Vou até Ed, ajoelho-me ao seu

lado e o abraço.

— Não me deixe, por favor,

Sah. Sabe que vivemos um para o outro.

Não sou perfeito, eu sei. Mas ninguém é.

Temos a nossa história, somos um casal

sólido, nós nos amamos, temos empatia

e nos respeitamos — diz entre lágrimas.

Seu pranto me comove. Ele me


abraça apertado. Logo sou tomada por

uma sensação de repulsa sufocante, mas


nada deixo transparecer.

— Não fique assim, Ed. Se

acalme... Eu não deveria ter tocado

nesse assunto hoje. — Também choro.

Choro pela nossa história que

chega a esse triste fim, por esse

desamor. Minhas lágrimas são também


por mim, que tanto acreditei em nós e
num amor idealizado, que permaneci

cega para o que Edgard se tornou por


tantos anos.

— Sah, seja lá o que esteja

acontecendo, vai passar e eu vou

entender esse seu momento. Está tudo

bem entre nós. — Ele segura os meus

braços. — Jura que não vai mais tocar

nesse assunto?

— Eu... é... — gaguejo, mas em


seguida recupero o prumo. — Por favor,

Ed, não vamos por esse caminho.


Precisamos conversar racionalmente.
Não dá mais pra mim.

— Sah, vou considerar que

você está tendo um surto, que está fora

de si. — Ele tenta conduzir a situação ao

seu modo.

— Ah! Conversaremos melhor


no fim de semana, porque não quero
atrapalhar o seu desempenho no

trabalho. — Mantenho a minha posição


e me sinto uma cobra traiçoeira.

Nós nos acalmamos. Então ele

fica de pé e também me ergo.

— Vou me deitar, você não

vem? — ele pergunta.

— Mais tarde, vou arrumar a

cozinha e limpar essa sujeira.

Edgard assente e me envolve


em seus braços.

— Desculpe por ter quebrado a

louça.

— Tudo bem.

Em seguida, ele segura a minha

cabeça e tenta beijar os meus lábios.

Empurro-o e consigo me desvencilhar.

— Não estou bem — alego,


com o coração acelerado e temeroso.
— Terá o tempo que for

necessário — ele promete e sai.

Só relaxo quando escuto os


seus passos subindo as escadas. Apoio a

mão próximo à pia e fito a minha

aliança. Eu a tiro em meus encontros

com Eric por não querer afrontá-lo e, ao

mesmo tempo, não ser desrespeitosa

com Ed.

Levo as mãos à cabeça. Sinto


que sou tudo que abomino, uma mulher
leviana e mentirosa.

Pego a vassoura e a pá de lixo


e começo a varrer o chão. Pareço esses

cacos destroçados, sem ter mais

remendo. Estou quebrada em milhares

de pedaços e, às vezes, me dá a

impressão de que não adianta juntar as

partes, pois nunca estarei inteira. Tenho


a esperança de que o amor de Eric seja
a cola mágica capaz de unir os meus
pedacinhos, mas tenho medo de ser
apenas uma ilusão.

Suspiro.

Não, Safira, você está errada

em se comparar a esse lixo. Você fez

isso nos últimos anos e sua vida não

saiu do lugar.

Pego os cacos e jogo na lixeira.

Respiro de forma revigorante.


Definitivamente, não sou como

esses cacos. Estou inteira e preparada


para uma nova jornada. Não careço de

remendos, só necessito de uma


oportunidade. Preciso pensar e agir

diferente do que fiz até esse ponto da


minha existência, caso contrário, não

deixo de ser esse barco furado que, se

não afunda, também não navega.

E só eu poderei me dar uma


nova chance.

Subo e vou direto para o quarto

de hóspedes. Por enquanto, será o meu


quarto até sair dessa casa. Retiro a

aliança e a fito por algum tempo. Nunca

mais a colocarei de volta no meu dedo.

Então, deixo-a sobre a mesa de

cabeceira.

Necessito disso, de decisões. É


justamente através delas que vou
transformar a minha vida. Eric é apenas

a compensação e não o motivo de lutar


por novos ajustes no meu modo de
viver.
Sábado

É uma satisfação à alma e um

conforto aos olhos mirar os corredores


brancos da sinuosa galeria e suas

paredes alvas tomadas por minhas

pinturas, estrategicamente posicionadas.


Cada detalhe ganha destaque através da
iluminação que foi planejada para
valorizar cada obra.

Nunca imaginei que essa minha

paixão pela pintura me levasse tão

longe. Só para ter certeza de que não era


sonho, antes da abertura da exposição,
na quinta-feira à noite, eu me certifiquei
da assinatura em cada quadro, no
elegante e requintado ambiente, e estava

lá: Eric Rossi.

Sinto-me um sujeito

privilegiado tanto pelo contrato de

trabalho na STW Tecnologia, como pela

ascensão da carreira artística. Contudo,

a minha alegria só seria completa se


tivesse ao meu lado a mulher que
desejo, Safira. Fito a tela Sapphirus, a
única que não coloquei à venda, e me
recordo do olhar e sorriso da mulher por

quem me apaixonei.

Ela ainda não sabe que batizei

o quadro que concluí quando a conheci

com o seu nome em latim. Não contei

para não parecer piegas. Ainda sou um

sujeito que tenho dificuldades de lidar


com sentimentos. Para mim, é mais fácil
manifestar o que sinto através da arte do
que em palavras. Mesmo assim, a
paixão por Safira já me despertou

diversas ideias. Algumas fiz esboços e


outras carrego na mente.

A exposição na Hugos Gallery,

em Manhattan, está sendo um sucesso.

Recebi encomendas de novas telas, e a

maioria das que coloquei à venda foi


vendida ou está recebendo proposta. O
marchand Adam River já me comunicou
sobre as avançadas negociações para
levar a exposição para uma badalada

galeria de Miami.

A sorte é que já tenho outras

telas prontas, que estão guardadas de

maneira adequada no ateliê dos Hoover.

Desse modo, poderei atender à demanda

de ir expor numa nova galeria sem dor


de cabeça.
— Também planejo levar as

suas telas para Los Angeles. Depois


disso, vamos nos planejar para Paris e

Londres. Só que os novos trabalhos


precisam focar nesse mesmo estilo que

trouxe para cá. Seu trabalho tem alma,

Eric, e é inovador — disse Adam,

ontem, quando saímos da galeria e

fomos jantar num refinado restaurante de

Manhattan. Adam deve ter uns quarenta


e poucos anos, usa o cabelo alinhado e

curto e um bigode bem-feito, o que lhe


confere um ar de machão, embora se

relacione com homens.

— Obrigado!

— Eric Rossi, não se engane, o

estilo que vai te colocar no topo é essa

mistura da pop art, com traços

surrealistas. Essa concepção simbiótica


entre a natureza e a tecnologia, traduzida
em imagens feitas à mão, é o caminho do
mapa da mina. Precisa fazer novas
leituras disso — ele acrescentou.

— Ah, Adam, não ignore as

paisagens suaves e, às vezes,

psicodélicas que Eric produz —

argumentou Rose, que, junto com o

marido, resolveu de última hora aceitar

o meu convite, o que foi ótimo para


mim, pois ela tem me dado bastante
suporte.

Expliquei a Adam que desejo

comercializar algumas imagens digitais


também, que, há alguns meses, registrei

como NFT[33], o que pode me render

mais algum dinheiro, visto que algumas

acabam sendo comercializadas por uma

pequena fortuna.

Enfim, os dias são puxados e

não estou acostumado ao frio


novaiorquino desse período, sem contar
as ruas apinhadas de gente devido ao
grande fluxo de turistas e à proximidade

do Natal. Durante o dia, Safira e eu


trocamos mensagens calorosas e cheias

de saudades, mas a noite sempre penso

em como seria fantástico e divertido se

ela estivesse ao meu lado.

Bom, hoje tive uma surpresa ao


chegar à galeria, no fim da manhã.
Encontrei Helga, que me

esperava na entrada do saguão. Ela


disse que veio passar as festas natalinas

com familiares, então, resolveu me


visitar. Tiramos fotos juntos ao lado dos

quadros e fizemos um lanche no início

da tarde.

— Foi muito bacana você ter

aparecido aqui... — disse enquanto


comíamos num fastfood próximo à
galeria.

— Como não prestigiar o meu

amigo tão querido, que é um sucesso.


Sei bem que a Hugos não é para

qualquer artista. Vi que a maioria dos

seus quadros está com o selo de

vendido. Não é o mesmo que os murais

e street art[34] de Austin.

Gargalhei.

— Nunca fiz murais, mas a arte


de rua é tão importante quanto a de
galeria. Cada uma tem o seu valor —
contemporizei.

— É muito ágil, Eric, com os

pincéis, o lápis, a caneta, o mouse e o

teclado. — Helga se aproximou de mim.

— Com as mãos de forma geral, faz

uma arte tão quente e deliciosa, que já

tive o prazer de conhecer... — ela falou


de modo dúbio, o que me desconcertou.
— E hoje quero muito deixar você
exercitar a sua arte em mim. Juro que
também vou me esforçar pra

acompanhar o seu ritmo. — Então Helga


executa um movimento erótico com o

canudo de sua bebida, fazendo-o entrar e

sair de dentro de sua boca, numa

simulação de sexo oral.

Fico impactado, o que mexe


com algo dentro da minha calça. Mas já
tenho problemas demais para arranjar
mais um. Se não houvesse Safi, é claro
que foderia Helga a noite inteira. Só que

estou envolvido até a alma com Safira,


mesmo que tenhamos pouco tempo

juntos. Já Helga é uma carta que quero

fora do baralho.

— Continua encantadora e

direta, não é, Helga? — disse e lhe


sorri. — Mas não estou disponível. —
Pisquei.

— Nossa! Que grosseiro!

— Não fui grosseiro, Helga. Só

fui sincero.

— Como assim não está

disponível? Quem é a felizarda que

fisgou o seu coração? — Ela mimetizou

como se estivesse procurando por

alguém.

Apenas sorri.
— Estou disponível caso

precise de uma modelo — ela se


insinuou.

É que certa vez fiz vários

desenhos dela nua, em giz de carvão, e a

presenteei.

— Viu meu trabalho, não

costumo desenhar pessoas. — Eu me

levantei da mesa. — Vamos.

Retornamos para a galeria e


conversamos sobre o filho de oito anos
do seu primo, que faz desenhos
incríveis. Ela me mostrou as fotos do

garotinho, Peter, que tem uma conta


numa rede social só para postar os

desenhos, feitos a mão e também

digitais.

Atendi visitantes e tirei dúvidas

de compradores. Também dei entrevistas


para alguns jornais da região e para
duas blogueiras especialistas em artes,
além de ter feito fotos para compor
essas publicações.

Enfim, o dia foi exaustivo. Já

são 18 horas, quando a galeria encerra

suas atividades. Pego o meu sobretudo,

o cachecol e as luvas e me visto.

Helga continua na galeria.

Cansados, Rose e Thomas já voltaram


para o hotel, e Adam vai sair com um
grupo de amigos. Ele até me convidou,
mas declinei.

É que combinei trocar


mensagens com Safira, já que ela está

dormindo no quarto de hóspedes, o que

lhe dá mais alguma liberdade. Também

não quero que ela saiba que Helga está

aqui, para não imaginar coisas. Sei bem

como é a mente criativa de uma mulher.

Embora não tenhamos falado de


fidelidade, ou sequer tratamos sobre o
assunto “compromisso”, prefiro ser
coerente aos meus sentimentos. No

fundo, espero o desenrolar de sua


situação com Edgard para decidirmos

nossos rumos. Eu a quero muito, é difícil

admitir, mas sou muito louco por ela e

não gostaria de perdê-la.

Por outro lado, é impossível


pensar em planos com ela casada e
deixei isso claro. Mas estou bastante
contente por ela já ter pedido a
separação a Edgard. O processo pode

ser difícil e demorado, principalmente,


por ela ser uma mulher delicada e

sensível, enquanto Edgard abusou de sua

bondade. O que mais quero é a ver livre

e feliz para que possa ser ela de verdade

e, se for ao meu lado, melhor ainda.

— Eric! — Helga me chama


logo que me despeço do galerista[35],
Hugo Campbell, e de sua equipe do lado
de fora da galeria.

Ela conversa com um rapaz de

trinta e poucos anos, forte e roliço.

Desconfiado, vou até eles. O frio está

cortante e quero logo retornar ao hotel,

situado a poucas quadras daqui.

— Eric, quero te apresentar ao

meu primo, Kevin. Ele é o pai de Peter.


Cumprimento o rapaz, que

elogia o meu trabalho. Explica que


deixou o serviço mais cedo só para vir à

galeria e conhecer as minhas telas.


Agradeço e esfrego uma mão na outra

para aquecê-las, mesmo de luvas. Kevin

também menciona o seu filho, que

considera um pequeno gênio, e me

convida para ir à sua casa, jantar.

— Agradeço, obrigado. Mas


tive um dia puxado e estou indo para o
hotel.

— Ah! Por favor, insisto. Vai


deixar Peter muito feliz. Comemos algo

e em menos de duas horas te trago de

volta — argumenta Kevin, que olha o

relógio. — Em torno das 21 horas, mais

precisamente. É que o sonho de Peter é

conhecer um artista famoso.

— Não sou famoso. — Sorrio.


— Quem expõe na Hugos é,

sim — Kevin contrapõe com simpatia.


— Seria inspirador para o meu filho e

esclarecedor para a minha esposa, que


pensa que o mercado de artes é coisa de

vagabundo, de maricas, ou coisa de

gente sem perspectivas. Helga me disse

que você até tem outra profissão

importante! É que eu passo nessas

galerias aqui de Manhattan e fico


imaginando um dia meu filho expondo

nelas, que nem você, Eric.

— Por favor, Eric, vamos. É


bem pertinho, no Bronx — insiste Helga.

Reviro os olhos.

— Não exagere, Helga,

estamos um pouco distante — respondo.

— Não tem nada perto em


Nova York. Estou de carro, levo e te

trago. Juro!
Suspiro.

— Está bem! — acabo

concordando.

Que mal haveria? Afinal, é

melhor estar com a família do primo

dela do que ter Helga na porta do meu

quarto se insinuando para mim.

Ando com eles em direção ao

prédio onde o carro de Kevin está


estacionado. Ele trabalha numa empresa
do mercado financeiro que fica nas
imediações e precisou ir ao serviço
neste sábado. Assim, trouxe Helga, que

está hospedada na sua casa.

Tanto Kevin quanto Helga

conversam pelos cotovelos. Durante o

percurso, ele me põe a par de sua vida e

da esposa, Anna. Pede dicas de como

deve conduzir a educação do filho com a


finalidade de que ele se desenvolva
artisticamente, fala de suas frustrações e
sonhos.

Vamos conversando enquanto


me encanto pelas paisagens

cosmopolitas de Nova York, seus

prédios antigos, que parecem saídos das

séries policiais. Em outros trechos,

surgem as construções mais modernas. É

uma cidade barulhenta e intensa, tão


distinta da calma e quente Austin.
Envio mensagem para Safira.

Amor, vou jantar com algumas

pessoas e, por volta das 22 horas,

estarei livre. Se puder me esperar, vou

adorar. Ah! Mande um áudio baixinho

para mim, só para poder ouvir a sua

voz. Saudades.

Recebo a mensagem de Eric no


celular que ele me deu.

Já estava ansiosa, mas não

queria lhe enviar novas mensagens


porque já havia encaminhado outras

mais cedo e não gostaria que ele me

visse como uma chata.

Então envio o áudio:

“Eric, meu amor, estou morta

de saudades. Mas tenho uma novidade


pra te contar. Consegui um emprego de
vendedora em um antiquário. Passei a
tarde em treinamento e começo na
segunda. Estou muito feliz! Amo você”,

contei, animada.

Espero algum tempo, mas ele

não visualiza. Então escondo o aparelho

embaixo do colchão do quarto de

hóspedes.

Edgard trabalhou nesse sábado.

Até acredito que ele tenha ido


para o escritório com a finalidade de
evitar uma nova conversa comigo.
Afinal, desde o dia em que lhe

comuniquei que queria a separação e


passamos a dormir separados, ele diz o

que quer, mas esquiva-se de me escutar.

— Precisa sair do nosso quarto

e agir como se fôssemos inimigos? —

ele pontuou na sexta-feira, após chegar


do escritório.
— Ed, parece que não

compreendeu o que eu disse. Quero o


divórcio — avisei.

Ele levou as mãos à cabeça,

como se eu tivesse acabado de falar uma

grande asneira.

— Mas não se esqueça de tudo

que me causou. Nunca poderei ter uma

família completa, porque não posso ter


filhos.
— Não aguento mais isso. Foi

um acidente o que aconteceu, não


aguento mais a forma que coloca essa

situação. Poderá adotar, Edgard —


rebati. Os músculos do meu rosto

tremiam, mas consegui imprimir a minha

indignação no tom de voz.

— Podemos adotar... Quem

sabe um filho não te deixe mais feliz e te


faça esquecer essas besteiras de
separação?

— Nosso problema não se

resolverá com uma criança — falei.

— Quem sabe se engravidar de

um dos touros? Já pensei nisso algumas

vezes. Assim, podemos superar de vez o

problema daquela facada e você não

será privada de engravidar.

Um ódio se apossou de minhas


vísceras. Fechei os olhos, porém não
consegui me controlar totalmente.

— Nunca, isso nunca vai

acontecer. — Eu o fitei, carregada de


raiva. — Tenho muito nojo disso tudo!

— berrei.

— Calma, Sah. Desculpe, só

estou fazendo conjecturas. — Em

seguida, ele me deu as costas e saiu do

quarto.

Fiquei atormentada com essa


ideia estapafúrdia de engravidar de um
qualquer. A mente de Edgard não tem
limites.

Não consigo compreender

como não enxerguei que Edgard era uma

pessoa egoísta e diabólica. Ao recordar-

me do passado, só agora consigo

perceber o tanto de atitudes que ele

tomou pensando exclusivamente em si


mesmo, embora me dissesse que fazia
por nós. E, dessa forma, fui me
anulando.

Teve um tempo que até concluí


que o amor era assim mesmo, requeria

sacrifícios. Sim, hoje tenho ciência de

que o amor requer doses de sacrifícios,

mas não da maneira visceral com que

assenti a tudo que vinha de Edgard.

Envergonho-me por isso. E não pretendo


perder mais tempo nessa vida medíocre
que levei nos últimos anos, quando me
dobrava aos seus caprichos.

Mas preciso ter calma.

De todo modo, ele absorveu

bem a ideia do divórcio. Preciso ser

esperta, não quero enfurecê-lo, então,

estou disposta a engolir os seus últimos

absurdos.

Enfim, meus pais e minhas


irmãs, com os seus respectivos
namorados, aterrissam amanhã em
Austin. Precisarei dar atenção a eles, até
porque começo a trabalhar na segunda-

feira e estou muito ansiosa por essa


chance.

Edgard se mostrou contente

com a chegada de meus familiares.

Apesar de terem sido contra o nosso

casamento, minha família aceita e


respeita. Com muita civilidade, Edgard
e eles se tratam bem.

Enfim, Ed passou no

supermercado e comprou os itens para


amanhã fazermos um churrasco para

eles.

Amo a minha família, mas é o

amor por Eric e o trabalho de vendedora

num antiquário apertado de SoCo que

tem enchido o peito de esperanças.

Observo o relógio outra vez,


ansiosa para chegar o horário para
conversar com o meu amor.

Sou mesmo uma pessoa


complicada. É que, de repente, tudo se

tornou tão fácil e sofri tanto ao longo

dos anos!

Vou até a janela e olho através

do vidro o céu pesado, que não permite

que veja as estrelas. Mas agora sei que


algumas delas brilham por mim.
Sorrio, contente.
O domingo está sendo agitado.

Edgard fez questão de ir

comigo buscar minha família no


aeroporto, hoje bem cedo. No caminho,

ele tentou se reaproximar.

— Não conte nada sobre a


crise no nosso casamento, por favor.

Não é o momento de levar preocupações

aos seus pais. Eles vieram a passeio e

querem se divertir — pediu Edgard

enquanto guiava.

— Ed, pretendo contar ao


menos às minhas irmãs — disse sem
conseguir ser tão segura quanto gostaria.
— Eu... preciso do suporte da minha
família.

Não sei explicar, mas tem algo

em Edgard que me intimida.

— Safira, você tem a mim. —

Ele me fitou em silêncio por algum

tempo. — Reconheço que falhei contigo

em muitos momentos. Fui rude e


impaciente. Mas estou disposto a rever
o meu comportamento.

— Não é essa a questão. — Eu

me senti imprensada na parede. — Ed,


você nunca deu importância aos meus

sentimentos. Me drogava e me

pressionava para aceitar os encontros

cuckolding[36] — disse com um amargor

cortando a garganta. — Ao me fazer usar


drogas, você foi longe demais. Eu

poderia ter morrido, como naquela vez


que passei mal no clube.

— Chega, Safira! — ele me

interrompeu, num tom ríspido. — Não


tem provas. Não me acuse dessa forma,

nem sei de onde tirou isso contra mim.

Não vê? Quer me responsabilizar por

algo, e a sua cabeça cria coisas que eu

não fiz! — Ed retomou o tom calmo.

— Me recordo bem de suas


insistências para tomar o drinque
“preparado com muito amor”. Sempre
usava esses termos, eu que fui idiota
demais por não ter percebido antes.

Acreditava muito em você.

— Está sendo muito injusta

comigo, mas tudo bem. — Então ele

tentou segurar a minha mão, mas a puxei.

— Olha o que está fazendo! Quer ficar

afastada de mim, fique. — Fez um


muxoxo.
Ele se calou e depois puxou

uma conversa sobre o trânsito.

E o pior, não sei como ele


reagirá quando descobrir que planejo

sair de casa. Temo que ele me denuncie

ao serviço de imigração, pois o meu

visto nos Estados Unidos é de

acompanhante e está atrelado ao dele,

que é de trabalho. Então, não quero


irritá-lo demais, para que ele não queira
se vingar através dessa questão do visto.

Enfim, foi uma felicidade rever

a minha família.

Afinal, completa exatamente um

ano que não os encontrava.

Conversamos bastante e contei sobre o

meu trabalho. Todos comemoraram.

Meu pai, Marcos Antônio, está

cada vez mais careca e barrigudo, no


alto de seus quase sessenta anos. Já
dona Celeste Maria, a minha mãe, que
vive se cuidando, tem uma aparência
bastante jovial para os seus cinquenta e

poucos anos. Donos de três lojas, eles


também me atualizaram sobre os

negócios.

— Se estivesse no Brasil,

poderia nos ajudar a gerenciar as lojas

— comentou meu pai de forma aleatória.


— Afinal, sempre gostou de moda e
poderia tocar a de roupas. Além de que,
suas irmãs seguiram outras áreas, e eu e
sua mãe estamos envelhecendo.

Se não fosse Eric, seria muito

bom retornar para casa, mesmo que

fosse um pouco humilhante voltar a

depender de meus pais, porém não sou

orgulhosa a esse ponto. Mas só

retornaria em último caso. Gostaria de


continuar aqui, bem perto de Eric.
Agatha e Esme vieram

respectivamente com seus namorados,


Heitor e Fred, rapazes simpáticos e

educados da mesma faixa de idade


delas. Minhas irmãs e eu temos um

biótipo parecido, estatura mediana e

cabelos lisos e escuros. Esme tem lindos

olhos verdes e os de Agatha são quase

mel.

Elas já me sondaram acerca da


minha situação com Edgard. Então,
revelei sobre a separação.

— Faz certo, Sah. Sempre senti


que vocês não combinavam —

cochichou Tatá enquanto preparávamos

um arroz e uma salada de batatas, mais

cedo.

— E ele está aceitando de boa?

— perguntou Esme e confirmei que sim.


— Porque, Sah, aquele escândalo que
ele deu contigo quando eu estive aqui
me chocou. E, desde então, me preocupo
demais contigo.

Enfim, combinamos conversar

em outro momento, pois a toda hora ele

se aproximava, como também os meus

pais.

Neste instante, eles bebem

destilados enquanto fazemos um


churrasco texano.
Edgard age como se nada

estivesse acontecendo enquanto mexe


em seu celular. Neste momento, termino

a última leva de costelas e brisket e


todos comem satisfeitos.

— Sah, venha cá — ele me

chama. Então vou até Edgard.

— Aquele Eric é um safado

mesmo! Olha, ele está pegando a Helga.


Levou ela para Nova York. — Ele vira a
tela na minha direção. E fico chocada
com as imagens dos dois abraçados. Ela
com a cabeça deitada no peito dele,

dentro da galeria. Edgard passa a


imagem, e eles aparecem sorridentes

junto a uma família. — É a família dela,

que é de Nova York.

De repente, minhas pernas

enfraquecem, o peito aperta e um bolo


se forma na garganta. Para disfarçar,
sento-me ao lado de Edgard, emudecida,
enquanto retomo o prumo.

— Essas fotos são do perfil


dele? — pergunto, aérea, quase

gaguejando.

— Claro que não. É do dela.

Eric não assume ninguém. Helga é doida

por ele. Na verdade, eles têm uma

história. Mas acho que ele a levou para


NY apenas para se divertir.
Continuo impactada.

Eric falou comigo ontem à

noite, muito rapidamente, e hoje ainda


não consegui ver o celular.

Edgard continua rindo,

entretido com as fotos de Helga. Em

seguida, minimiza a tela do aplicativo e

navega num portal de notícias.

— Eric Rossi está famoso.


Veja, está nas páginas de cultura do New
York Daily News[37]. — Observo a foto
de Eric, lindo, diante de um dos seus
quadros. — Ele também apareceu em

outro jornal. Agora é que vai pegar

todas. Daqui a pouco estará cheio de

atrizes famosas se oferecendo pra ele.

— Edgard gargalha. — É capaz de ele

se mudar para lá e sair da STW.

Em breve, Eric se tornará

famoso e não terá espaço em sua vida


para mim. E Helga? Ele não me contou
sobre ela. Será que ele a levou mesmo?
Será que Eric não é o que imagino? Se

tivesse um buraco aos meus pés,


gostaria de desaparecer através dele.

— Ele é um predador, agora

famoso, então, ninguém mais segura o

cara. Sabe, ele sempre conquista por

sexo e gosta de ver todas aos seus pés


— Ed conta, entretido. — A pobre
Helga continua se arrastando por ele. —
Ed desvia os olhos da tela do celular e
me encara. — Não sei por que escolheu

Eric, lá em San Saba. Isso ainda é uma


incógnita pra mim — Edgard sussurra.

— Não quero falar disso —

digo, possessa de ciúmes.

O rosto formiga.

— Mas, também, que diferença


faria? — Edgard levanta os ombros. —
Afinal, Eric, Tony e John fizeram uma
aposta sobre quem te levaria pra cama
primeiro. Eric ganhou e embolsou uma

bolada.

Escuto isso, atônita. É como se

fosse uma segunda apunhalada no peito.

Não sei o que dizer e como agir. O

coração deprime num aperto forte.

Agradeço por estar sentada.

— Não... não acredito nisso —


balbucio.

— Não estou mentindo.

Pergunte a eles você mesma, se tiver


coragem.

— Que nojo! — Tento segurar,

mas minhas lágrimas me vencem e

marejam os olhos. — Permitiu que eu

fosse rifada numa aposta e não fez nada?

Como me expôs desse jeito? — Meu


tom sobe um pouco.
Minha mãe me fita. Edgard me

abraça. Não tenho forças para repeli-lo.

— Tem razão, Sah. Estou muito


arrependido de ter te colocado nessa

situação. Me perdoe, meu amor. A culpa

foi minha. Eu que pensei que fosse

seguro pra nós.

Então, desvencilho-me de seus

braços. É como se tudo ao redor


estivesse eclipsado e só existissem eu e
a minha dor. Levanto-me, peço licença
sem prestar atenção aos semblantes de
meus familiares e vou para o banheiro.

Fecho a porta atrás de mim e desabo.

Não haveria motivo para

Edgard inventar aquelas histórias. É

verdade. A foto está lá, Eric com Helga.

E a aposta? Não poderia ter nada tão

sujo. Soluço. Uma forte dor transpassa o


peito. Sei que preciso tirar essa história
a limpo.

Vou até a pia, abro a torneira e

jogo água fria no rosto. Coloco sabão


nas mãos e as esfrego vigorosamente.

Nunca mais tinha feito isso. E essa dor

causa algum alívio ao sofrer maior no

peito.

Escuto alguém na porta.

— Sah! — É a minha mãe. —


O que você tem?
Procuro me restabelecer.

— Estou bem, só um momento

— respondo alto, tentando manter neutro


o tom de voz.

— Amor, abra a porta, por

favor. — O tom de Edgard me causa

repulsa.

Tento me recompor.

Respiro fundo e vou soltando o

ar com calma.
Não é o fim do mundo. Eric não

me deve fidelidade. Nunca conversamos


sobre esse assunto, afinal, ainda vivo

com Edgard e não posso querer dele


algo que não lhe dou. Ainda assim, ele

poderia ter me dito sobre o seu

envolvimento com Helga, da mesma

maneira que me contou sobre Samantha.

Enxugo o rosto e respiro fundo.

Mas o pior de tudo foi essa


aposta. Como Edgard pôde ter ido tão
longe? Como Eric se prestou a isso? Ele
poderia ter me confidenciado, aberto o

coração da mesma maneira que me abri,


quando confiei a ele os meus segredos.

Fui sincera e ele não conseguiu agir da

mesma forma. Sinto-me traída.

Ele se aproximou de mim por

causa de dinheiro. Céus! Não poderia


ter sido pior. Aqueles três homens
fazendo chacota de mim, rindo e se
divertindo em cima do meu sofrimento.
E o pior, dei um show para eles.

Fito a minha imagem no

espelho.

— Nunca mais vou me prestar a

isso! Eu juro. Nunca mais ninguém me

fará de otária! — prometo com o

coração tomado de decepção.

Enxugo o meu rosto.


Eric não foi verdadeiro como

imaginava que ele fosse. Meu coração


sangra. Estou farta de ser enganada e

ludibriada. Não tem justificativa para


essa aposta.

Saio e afirmo que tive um mal-

estar.

Terminamos o almoço, arrumo

a cozinha com a ajuda de minhas irmãs e


minha mãe, e finjo não estar destruída.
Edgard me ronda a todo momento,
indagando se estou bem. A verdade é
que ele temeu que eu tivesse uma crise

bem na frente da minha família, contasse


os nossos podres e, assim, a sua

máscara caísse de vez.

Até pensei em fazer isso, mas

desisti. Estou cansada do papel de

vítima e de frágil. Apesar da dor, que


parece uma cratera no meio do peito,
pretendo agir de forma racional. Não
sou mais uma adolescente que meus pais
tinham responsabilidade, nem sou mais

uma jovem idiota que se deixou enganar


pelos caminhos falsos do amor.

Eu me forço a não surtar.

No fim da tarde, a minha

família retorna para o hotel em

Downtown. Como eles alugaram uma


SUV de sete lugares, não precisamos
levá-los.

— Excelente primeiro dia de

trabalho, minha filha! — deseja a minha


mãe. — Nos encontramos depois. —

Combino passar no hotel, após a minha

jornada de trabalho, que será de seis

horas por dia.

Mais cedo, minha mãe ainda

insistiu para saber o que tenho, mas


consegui disfarçar.
Após a saída deles, Edgard

tenta se aproximar, mas estou com tanto


ódio dele que não consigo olhar na sua

cara.

— Sah, vamos conversar — ele

insiste.

— Não me dirija a palavra!

Estou com muita raiva de você — berro

e subo as escadas. Ele vem atrás de


mim.
— Estou arrependido. Não

deveria ter procurado touros para


nossas fantasias entre colegas de

trabalho.

— Compactuou tanto com eles

que permitiu que eu escolhesse entre os

seus colegas. O meu ato de escolher foi

o que fez surgir e moveu essa aposta.

Você é grotesco!

— O que posso fazer para te


demonstrar o meu arrependimento?

— Ficar bem longe de mim

para sempre! — grito.

Entro no quarto e tento bater a

porta, mas ele a segura.

— Essa sua raiva vai passar...

— Se você não desaparecer da

minha frente, vou atrás da minha família


e conto tudo. Ou pior, chamo a polícia!

— interrompo-o e o ameaço,
entredentes.

— Você não está bem. Acho

que precisa de um psiquiatra — ele


argumenta.

— Quem sempre precisou de

um é você. Saia daqui! — vocifero,

ensandecida.

Ele então sai. Bato a porta,

trancando-a.

Jogo-me na cama. E finalmente


posso chorar. Soluço, sem me importar
se meu pranto é intenso demais.

A cabeça lateja. São muito


machucados que pulsam no peito.

Gostaria de desaparecer, porém isso não

é possível e necessito enfrentar a

situação.

Como se não bastasse ter que

lidar com as podridões de Edgard, ainda


tem esse sofrer, que mais parece um
monte de agulhas alfinetando o coração
por causa do que descobri sobre Eric.

Será que ele resolveu convidar


Helga para ir para Nova York por que

eu não pude ir? Será que o seu interesse

em mim se restringe a sexo?

Eric gosta muito de sexo, é o

que pauta os nossos encontros. Não foi

só Edgard que disse que ele não assume


ninguém. Lembro-me bem de um
comentário que Tony fez no Parker,
quando Helga se ofereceu justamente
para ir para Nova York com ele, caso se

mudasse.

Que raiva de mim! Como não

notei que ali, naquele comentário,

estavam todos os indícios de que Eric e

Helga tinham alguma coisa? Estava tão

envolvida que não me dei conta.

Preciso tirar essa história a


limpo. Ao menos, preciso tentar.

Meu corpo se move como se eu

fosse uma jamanta. Ainda assim, consigo


me levantar e apanhar o celular que Eric

me deu, embaixo do colchão.

Quando abro o aplicativo de

mensagens, há diversas delas que

aqueceriam meu coração num momento

normal, mas não me causam o mesmo


efeito agora. Ele diz que está com
saudades, conta como está feliz e me
envia os links das matérias publicadas
sobre o seu trabalho.

Ignoro e digito: Eric, Helga

está aí com você?

Ele não está online. Então,

aperto o aparelho no peito à espera de

uma resposta. Sobe um frio na coluna e

imagino-o escrever: “você não quis vir,


eu a chamei”. Que outra resposta ele
daria?

Retorno ao aplicativo de

mensagem, decidida a apagar a pergunta.


Mas Eric já visualizou a mensagem e

está digitando a sua resposta. Meu

coração dispara. E logo a mensagem

dele estoura na tela:

Ela está na cidade e veio

visitar a exposição. Por que essa


pergunta abrupta, sem antes falarmos
de nós?

Eu: Deveria ter me contado que

já namorou Helga.

Ele: Nunca namorei Helga.

Nos encontramos algumas vezes,

apenas, bem antes de nós dois. Não vi

necessidade de te falar.

Nenhuma resposta pode

esclarecer e arrancar essa agonia do


meu peito.
Eu: Naquele dia no Parker, ela

tinha se oferecido para ir morar contigo


em Nova York. Helga também me disse

que adoraria ter dividido você comigo


em San Saba. Fui idiota e não percebi o

clima.

Ele: Não há clima, Safi. Tire

isso da sua cabeça. Helga é muito

jovem e meio doidinha, desconsidere.

Eu: Apostou com Tony e John


quem me levaria para a cama primeiro,
não foi? Por que também não me contou
sobre isso?

Ele: Safi, é melhor

conversarmos pessoalmente. Isso tudo,

da aposta e sobre Helga, foi Edgard

que te contou, não foi? Fique atenta,

pois desconfio que ele descobriu sobre

nós dois e está jogando. Está mantendo


o seu celular desligado aí dentro do
quarto? E esse aparelho está fora da
rede da sua casa?

Eu: Edgard não descobriu nada.


Caso isso tivesse acontecido, ele

explodiria comigo. Continuo seguindo à

risca os cuidados.

Ele: Não vai me dar parabéns

pelo sucesso da exposição? Ou dizer

que está com saudades de mim?

Eu: Vi sua foto com Helga,


abraçados, e com a família dela
também... Estou muito confusa.

Ele: Precisa confiar em mim,


Safi. Olha, não sou do tipo que bajula e

sei que está acostumada com isso. Mas

saiba que nada tenho com Helga, que é

apenas uma amiga. E, com relação à

aposta, foi um grande erro e fui

tragado por essa história por Edgard.


Quase não ia a San Saba, decidi de
última hora e não foi pela aposta, foi
por você. Não sofra por isso. Amanhã a
gente se fala. Saiba que minha

consciência está tranquila Beijos.

Eric demonstra ter se zangado

com as minhas perguntas. Estou

mergulhada num mar de conflitos. Não

sei o que pensar e em quem acreditar.

Sei que não vou conseguir


dormir e tenho que acordar cedo para o
meu primeiro dia de trabalho. Mas não
consigo relaxar e nem me focar em nada.
Pareço um caldeirão fervilhante. A cada

instante, um dos problemas borbulha na


minha mente. E não sei mais aonde vou

parar.
Segunda-feira

“Excelente primeiro dia de

trabalho, meu amor. Confie mais em


você, em todos os aspectos da vida,

inclusive, sobre nós. Meus pensamentos

e coração estão contigo. Saudades,


Eric”.

Digito e envio para Safira.

Atravesso o saguão do hotel e

entro no restaurante, onde é servido o

café da manhã. Sirvo-me de ovos

mexidos, bacon, croissant e pão. Pego


uma panqueca feita na hora e sigo para a
mesa em que estão Rose e Tom.

— Bom dia! — Sento-me.

— Excelente dia a Eric Rossi,

o mais novo pupilo do mundo da arte,

revelado pela Hugos Gallery —

cumprimenta-me Rose, muito feliz, ao

proferir o trecho de uma das reportagens

publicadas a meu respeito, na imprensa

novaiorquina.

Sorrio.
Uma simpática garçonete se

aproxima e me serve uma generosa


xícara de café fumegante.

Rose teve um papel

fundamental nesse reconhecimento ao

meu trabalho. Foi ela quem me abriu os

canais e me apresentou ao marchand,

Adam River. Rose também me ajudou a

compreender que meu trabalho não se


encerra quando concluo uma tela. Com
ela, reciclei-me e aprendi bastante sobre
o mercado americano de arte. E o
melhor de tudo é a amizade que

desenvolvemos.

Inclusive, vamos passar o Natal

juntos na big apple[38]. Esse é o meu

presente para ela e Tom, essa estadia

estendida com todas as despesas pagas.


Eles merecem. Mas queria também que

Safira estivesse ao meu lado. Estaria


completo se fosse possível tê-la aqui.

— Não parece feliz, meu rapaz

— nota Tom.

— Não dormi tão bem... —

Tento disfarçar.

Eu me aborreci pela forma

como Safira me abordou sobre Helga e,

ao mesmo tempo, fiquei ressentido por

não estar ao seu lado e poder conversar


sobre a aposta. Se não toquei nesse
assunto antes, foi para preservá-la de
mais essa dor. Com relação à Helga, não
tive nada com ela e nem vou ter. Como

lhe disse, é apenas uma amiga que tem


uma família muito bacana.

— Algo envolvendo Safira...

— arrisca Rose.

Apenas balanço a cabeça

confirmando.

— Nós, homens, sempre somos


vistos como os vilões dos
relacionamentos. As mulheres não
acreditam quando sofremos, quando

somos fiéis e sinceros. Por isso, muitos


logo optam por serem infiéis e cretinos,

porque vão levar fama mesmo... —

comenta Tom.

— Tom, deixe de falar

bobagem — zomba Rose. — Quem te


escutar vai pensar que aprontava muito.
Devo desconfiar que me enrolou demais,
Tom?

— Ah, minha Rose, claro que


não. Mas você desconfiava de mim sem

motivos.

— É claro que não fazia isso

— ela rebate.

— Ah! Fazia, sim.

Sorrio da pequena discussão do

casal enquanto como os ovos com


bacon. Eles brigam com humor.

Pouco pois, quando a pequena

divergência entre eles se apazigua, Rose


me fita.

— Eric, está perdidamente

apaixonado! Não adianta me enganar,

mas precisa permitir que Safira aja, atue

em sua própria vida. Sabe, me desculpa

a sinceridade, mas você está pronto para


viver esse amor, ela ainda não. Então,
dê-lhe tempo e espaço pra que ela fique
pronta pra você.

Rose tem razão. Comprimo os


lábios. Mas será que um dia ela ficaria

pronta para mim? Tenho dúvidas.

— Só o tempo, Rose. Mas eu

não a pressiono — respondo e mergulho

no silêncio.

No fundo, tenho vontade de


pegar o celular e digitar a seguinte
mensagem: “Safi, deixe tudo pra trás.
Pegue o primeiro voo para NY e venha
ser minha. Vou tomar conta de você, vou

te respeitar e te amar...”.

Mas não posso fazer isso.

Talvez ainda não esteja pronto para as

consequências e responsabilidades de

uma atitude dessas. Safira impregna o ar

que eu respiro, porém, a nossa história


começou há pouco mais de um mês,
mesmo que tenha a impressão de que já
dura um ano. Contando com San Saba,
tivemos apenas quatro encontros em que

pudemos nos amar.

Enfim, nem a matemática nos é

favorável.

Concluo o café e digito para

ela: “Amor, após o seu trabalho,

encontre um momento pra que possamos


falar no telefone. Teu Eric”.
Safira,

Acabo de sair do meu primeiro

dia de trabalho com a impressão de que


não vou ficar por muito tempo no

antiquário. A senhora Sally, a

proprietária do negócio, é um pouco

ranzinza. Além dela e de seu filho, Bill,

que depositou seus olhos comilões sobre

mim, trabalha lá, no turno oposto ao


meu, a Doris, que não demonstrou
simpatia. Parece que estou roubando
algo dela.

Cheguei cedo, com o coração


carregado de esperanças de que, ao

menos, o trabalho fosse fluir bem. Mas

saí como se bigornas estivessem sobre

os meus ombros.

Pela manhã, Edgard pareceu um

lorde. Fez questão de acordar mais cedo


para me levar ao antiquário. Mas, para
ele, faço questão de parecer uma mulher
das cavernas. Saí de casa sem dar um
bom dia sequer e nem dei espaço para

que insistisse em me dar carona. Preferi


andar mais de quinze minutos e seguir

para o ponto de ônibus.

Nesse momento, caminho quase

me arrastando em direção ao hotel em

que meus pais estão hospedados. Estou


no limite, com o coração menor do que
se estivesse numa caixa de fósforo.

Estou amargurada por tudo que

Edgard deixou escapar sobre a aposta e


Helga.

Mas os pensamentos só têm

lugar para Eric. Nessa manhã, respondi

às mensagens dele, aproveitei e o

parabenizei por seu sucesso, coisa que

não tinha feito ontem. Ele também me


pediu que conseguisse um momento para
nos falarmos, mas ainda não resolvi
fazer uma ligação para ele. Receio
acabarmos discutindo.

Refleti bastante e cheguei à

conclusão que meu envolvimento com

Eric é pautado no sexo. Temo que só eu

tenha amor no coração. Ele se declarou

a mim, eu sei, mas acho que foi movido

pela força do momento, pela minha


entrega e devido à forte atração que
existe entre nós. Edgard falou que Eric é
conhecido por não assumir ninguém,
Tony também disse algo parecido.

Não posso sair de uma situação

tão delicada e conturbada, como é o meu

casamento com Edgard, para enfrentar

um mar de incertezas. Amo Eric, esse

sentimento bate forte no peito. Por outro

lado, não posso cobrar o mesmo dele.


Talvez quando essa paixão passar, ele
não me queira mais. Afinal, sou
complicada, e ele terá um futuro
brilhante.

Eric é um homem sedutor e

lindo, com fama e dinheiro, se tornará

irresistível. E, diante de todas as minhas

dores e sofreres, não estou preparada

nem para rejeição, nem para voltar a ser

manipulada como fui por Edgard.

Além de que, saber que ele


ganhou dinheiro numa aposta por ter me
levado para cama é como se fosse uma
facada atravessada na garganta. Não

engulo, não aceito. Mesmo sendo


Edgard o grande responsável por isso.

Nem sei por que ele deixou escapar essa

história. Talvez queira tanto me agradar

que acabou metendo os pés pelas mãos.

Entro no saguão do hotel, vou à


recepção e peço que avise que já estou
aqui. Pouco depois, a recepcionista
pede para que eu suba. Agradeço e sigo
para o elevador. Não entendo por que

pediram que subisse, pois tínhamos


combinado sair.

Pego o celular, digito uma

mensagem para Eric e a envio: “Vou

encontrar com os meus pais. Mais tarde

nos falamos. Beijos”.

Suspiro e sigo em direção à


porta da suíte. Encontro Esme e Agatha
no quarto de minha mãe. Abraço-as.

— Onde estão meu pai e os


rapazes? — pergunto.

— Foram passear — Esme

responde.

— Não quiseram ir? —

questiono.

— Já conhecemos Austin,

minha filha. — Minha mãe me abraça


também e se acomoda numa das cadeiras
da mesa de quatro lugares, batendo a
mão no assento ao seu lado. — Se sente

aqui, Safira. O que não conhecemos bem


é a sua história.

Meu coração dispara. Suponho

que Esme e Tatá contaram a ela sobre a

minha separação. Acomodo-me ao lado

de minha mãe, e minhas irmãs


acomodam-se em cadeiras diante de nós.
— Maninha, você precisa se

abrir sobre os seus problemas. Estamos


aqui para te ajudar e te dar suporte.

Aliás, sempre estivemos. — Agatha


começa a falar. — É óbvio que esconde

coisas. Suas respostas são evasivas

demais, as decisões de Edgard são

sempre unilaterais, e ele comanda a sua

vida como se fosse dele. Percebemos

que não estava bem ontem quando se


trancou no banheiro e, por fim, sabemos

o tanto que ele te culpa por algo do


passado.

Meu rosto queima de vergonha.

— Não é justo, trabalham o ano

inteiro, vêm se divertir e terminam por

se envolverem nos meus problemas.

Mas fiquem tranquilas, está tudo sob

controle. Vou me separar de Edgard.


Pretendo sair de casa após o Ano Novo
— digo.

— Minha filha, não somos

estranhos, somos a sua família. Esqueça


o passado, porque eu já me esqueci da

garota rebelde que você foi um dia. Você

não é mais aquela garota, você mudou,

como eu também não sou mais aquela

mãe controladora e intransigente —

argumenta a minha mãe.

A emoção pressiona a face e


me controlo para não desabar.

— Já sabemos que Edgard não

é flor que se cheire, mas precisa se abrir


e nos contar o que ele te fez. Por favor,

não se esconda desse jeito — pede

Esme, emocionada. — Nós juntas

podemos muito. Não está só.

— É o desgaste. Começamos

novos, Edgard mudou, e eu tenho culpa.

— Pare de proteger Edgard,


você não teve culpa do episódio da ilha,
sabe disso. Eles que fizeram a confusão,
que chegaram às vias de fatos. Olha, a

forma como você age é típica de


mulheres vítimas de maridos

abusadores. Sou ginecologista e vejo

isso no meu cotidiano. Edgard já te

bateu, Safira? — pergunta Agatha de

modo incisivo.

— Não... — respondo, sem


controlar as lágrimas. Enterro as mãos
entre os cabelos e não consigo mais
segurar.

— Se abra, minha filha! —

Minha mãe toca a minha mão e a

acaricia, encorajando-me a me abrir. —

Vá em frente...

— Não queria ter que falar. É

algo tão meu, tão forte que nem sei por


onde começar. — Fungo, pego um lenço
na bolsa e limpo as lágrimas. —
Precisam me escutar sem preconceitos e
julgamentos.

Então começo a rememorar

sobre o período em que fui para São

Paulo para viver com Edgard, quando

nos casamos e comecei a trabalhar como

modelo. Éramos muito jovens e

vivíamos momentos loucos. Passamos a


frequentar festas, abusar do álcool e,
algumas vezes, usávamos drogas
recreativas. Era muito assediada pelos
homens, recebia propostas, inclusive,

havia quem quisesse pagar para me ter.

— Mas eu não estava à venda,

e sim aberta a aventuras. Querendo

experimentar coisas, incendiava a

cabeça de Edgard de ideias que

culminou na nossa primeira troca de


casal, numa festa requintada e liberal —
revelo. Minhas irmãs se entreolham. A
mão de minha mãe treme um pouco e
seus lábios se movimentam levemente,

como se fosse dizer algo, porém,


desiste.

— Naquele dia, numa casa de

luxo, estávamos numa grande suíte.

Edgard logo se livrou da sua parceira e

veio me observar nas mãos de um


homem mais velho. Aquilo mexeu com a
sua cabeça... Quero dizer, ele gostou
muito — gaguejo, morta de vergonha. —
A partir desse dia, essa fixação em me

ver tendo relações sexuais com outro


homem se tornou o centro de sua

realização.

— Esse é um fetiche que tem

crescido ultimamente. Mas um casal

extrapolar as convenções é aceitável,


desde que seja uma escolha de ambos —
pontua Agatha. — Isso aconteceu com
vocês?

— No início, sim. Na segunda


tentativa, aconteceu o episódio da

facada. Na época, não contei a verdade

completa pra vocês — admito,

envergonhada. — Edgard e o outro

rapaz não brigaram por ciúmes de mim.

Na verdade, eles brigaram porque


Gustavo teve ciúmes da namorada dele
com Edgard. Enfim, o resto vocês
sabem. Bebi, usei comprimidos de
ecstasy e fiquei doida. Me meti na

confusão da briga entre Gustavo e


Edgard, com a faca na mão, e ele foi

atingido...

Então, aos poucos, reconto as

minhas aventuras com Edgard a partir

desse episódio. Explanei que comecei a


mudar. Parei com a bebida e com as
drogas recreativas. Também não
aceitava as trocas de casais de bom
grado. `

— A partir daí, em quase todos

os aspectos, inclusive no que se refere

ao fetiche, à medida que eu murchava,

Edgard evoluía... Logo ele passou a não

querer mais ser ativo e fazer a troca de

casal. A fantasia dele se solidificou em


sua necessidade de me assistir com
outro e, depois, esgotar o assunto me
fazendo milhares de perguntas. Ele se
tornou um adepto do cuckold, que é

como se chama esse fetiche.

— Misericórdia — minha mãe

deixou escapar.

— Conheço várias mulheres

que iriam amar ter um marido assim! —

pontua Esme, zombeteira.

— Esme! — exclama Agatha,


repreendendo-a só pelo tom.

Uma parte de mim deseja que

pare de me expor para as pessoas que


amo, contudo outra parte precisa colocar

tudo para fora, num grande vômito.

Assim, conto como fui me tornando cada

vez mais isolada, triste e insegura e

tomei verdadeiro pavor dos encontros

com “os touros”, ou “os nossos


brinquedos”, como Edgard gosta de se
referir ao homem.

As mulheres da minha família

se horrorizam pela minha situação.


Minha mãe, que é mais conservadora,

não consegue disfarçar o espanto, e seus

olhos inquietantes me destroem em culpa

e vergonha. As minhas irmãs lhe deram

gosto, tornaram-se mulheres

independentes, como os meus pais


sempre quiseram que fôssemos.
— Se protege direitinho, Sah?

— indaga Agatha.

— Sim. A casa de swing que


frequentávamos é dessas que é preciso

apresentar exames recentes. Quando

chamava homens de programas, Edgard

utilizava uma agência segura. E usei

preservativo em todas as ocasiões —

respondo. — Uma vez rolou com um


cara que conheci num clube, mas não
teve muita intimidade. E a última vez...
— Meu coração aperta por Eric.

Então mudo de assunto. Explico


que os encontros com os touros não

eram rotina, porque eu teria surtado.

Conto também sobre as suspeitas, ou

melhor, a descoberta de que Edgard me

drogava ao oferecer uma “bebidinha

preparada com amor”.

Neste momento, não consigo


encará-las, tamanha a minha vergonha.
Limpo o rosto outra vez, pois os olhos
estavam empapados de lágrimas, e

assoo o nariz. Suspiro, em silêncio, com


os olhos pregados em meus dedos.

— Edgard foi pior do que

imaginei — reconhece Esme. — E, olha,

eu o vi dando um escândalo com Sah,

por ciúmes. Eu o vi pressioná-la na


parede.
— Você não está enxergando

como é doentia a sua relação com


Edgard. E que, sozinha, não vai

conseguir se desvencilhar dele —


assinala Agatha. — Me desculpe, não

estou dizendo que o fetiche é nocivo, o

que quero dizer é que a forma com que

ele te domina e manipula não é saudável

e pode resultar em situações bem sérias.

— Não é só isso — digo com a


voz embargada. — Eu me apaixonei
pelo último homem com quem mantive
relações na frente de Edgard, que é seu

amigo, colega de trabalho.

— Nossa! Como assim, Safira?

— Minha mãe leva a mão à boca,

incrédula. Esme arregala os olhos, e

Tatá me fita impassível.

— Nós nos encontramos


escondido, estamos tendo um affair, um
caso. Ele não concorda com o que
Edgard faz e pensava que eu gostava
desses jogos eróticos. Mas estou

ressentida, porque descobri que ele é o


vencedor de uma sórdida aposta que

Edgard promoveu entre três amigos para

saber quem me levaria pra cama

primeiro — revelo com um fiapo de

voz.

— Esse homem também não


serve, deve ser moleque e vagabundo
que nem Edgard — pragueja a minha
mãe.

— Não... — tento negar. — Ele

é um cara bom e...

— Não está em condição de

saber quem presta ou não, Sah — Esme

interrompe.

— Vou me separar de Ed. Vou


procurar um lugar para ficar, um
quartinho desses de estudantes, e
retomar a minha vida.

Minha mãe balança a cabeça


em negação.

— Não pari uma filha para

passar por tanta humilhação e se sujeitar

a esses caprichos de gente louca! Você

tem mãe, tem família. Acha mesmo que

vou pegar um voo de volta para o Brasil


e te deixar aqui? Não, não vou... —
protesta minha mãe.

— Sah, vamos voltar para o

Brasil com a gente — propõe Tatá. —


Lá, você se trata, se recupera. Precisa

de um acompanhamento psicológico, no

mínimo. Poderá trabalhar com os nossos

pais, ganhar o seu dinheiro, estudar,

viajar, conhecer gente nova, fazer

amizades. Uma das coisas que notei:


você não tem amigos aqui.
— Não, eu não posso ir... —

alego, consciente de que elas estão


certas, porque agi pelo coração a vida

inteira e só quebrei a cara.

— Gostaria que saísse da casa

de Edgard hoje. Tenho medo de que esse

tarado doido faça alguma coisa contigo

— minha mãe argumenta.

Tatá e Esme concordam com


ela. Nem tenho forças para rebater,
porque elas estão com razão.

— Nem vou contar ao seu pai

sobre essas coisas de fetiches, porque


ele não tem cabeça para entender e é

capaz de querer dar uns sopapos em

Edgard e a situação piorar. Chegando ao

Brasil, a primeira providência é dar

entrada no pedido de divórcio — minha

mãe diz.

— Mas conte pra gente agora


como é o seu amor. Como é o nome
dele? — Esme pergunta, curiosa, e pisca
para Agatha.

— Eric Rossi, ele também é um

artista plástico e está expondo em Nova

York — digo e explode um sorriso nos

meus lábios.

Então, conto a elas sobre ele,

sobre o quão lindo é o seu coração.


Revelo o quanto me sinto bem ao seu
lado e que tenho ciência de que é muito
cedo para planejar algo, mas que ele me
passa segurança e se preocupa comigo.

Eric é o sol que surge no

horizonte após anos de tormenta.

Eric é a água que se esbalda

para todos os lados, numa calmaria

infinita.
Da janela, fito o Empire State e

seus imponentes 102 andares, bem no


coração de Manhattan. Beberico o vinho
caro que abri nesta noite fria e solitária.

Era para estar me sentindo no topo do


mundo. Afinal, vendi todas as telas na
minha primeira grande exposição por

cifras inacreditáveis, se alguém tivesse

me contado há dois meses. Deixei Adam

River entusiasmado e Hugo Campbell

abriu a porta da Hugos Gallery para

uma nova temporada no ano que vem.

Tenho que tomar decisões


importantes. Entre elas, a de abandonar
a carreira de engenheiro de software e
me mudar para uma casa onde tenha um

espaço adequado e seguro para produzir


e armazenar novos quadros. Embora

tenha produzido telas ao longo dos anos

e muitas estão guardadas, não darei

conta das demandas, tanto por

encomendas, como para outras

exposições, se permanecer em tempo


integral na STW Tecnologia.

Mesmo diante de tantos

acontecimentos maravilhosos e dessa


ascensão profissional, só consigo pensar

em Safira. Amo essa mulher mais do que

deveria e a desejo mais do que meu

corpo suporta essa paixão. Nunca me

imaginei ilhado por um fogo que parece

mar em calmaria, mas são labaredas que


me fulminam só com um sorriso nos
lábios.

Conversamos mais cedo e estou

contente por sua decisão. Sua família a


convenceu a sair da casa de Edgard de

imediato. E, por enquanto, irá se

hospedar no hotel com os pais. Neste

exato momento, ela deve estar

conversando com Edgard.

Também esclarecemos pontos


sobre Helga. Expliquei direitinho
porque fui jantar na casa do primo dela.

E também a convidei para se hospedar


comigo.

Recordo-me de nossa conversa.

— Pode ficar no meu

apartamento o tempo que quiser, na

verdade, vou achar ótimo — falei para

ela.

Naquele instante, senti uma


avalanche de ansiedade e contentamento
pressionar os sentidos, com essa

possibilidade de Safi estar ao meu lado


diariamente. Sei que é precoce, mal nos

conhecemos, mas o meu coração está


completamente cego para as convenções

que a vida nos imprime. O desejo não

obedece a calendários. Rendo-me.

— Está tudo sob controle. —

No entanto, a resposta evasiva de Safi


me deu a impressão de que ela está se
fechando para mim.

— Estou muito contente com a

sua decisão. Será melhor para nós dois


nos encontrarmos e bem mais saudável

pra a sua vida — comentei e ela me

respondeu de forma monossilábica.

Sinto que há algo errado com

ela. Talvez seja impressão minha.

Provavelmente, ela não deva estar


confortável para conversar com Edgard.
Mesmo com o apoio da família, ela terá

de enfrentar o sujeito que a manipulou e


a subjugou por longos dez anos.

Quem pensa que é, Eric Rossi?

Não é o centro das atenções da

vida dela.

Saboreio mais do vinho e

observo o celular, ansioso por encontrar

qualquer notícia de Safira, mas a


mensagem nova é de Helga. “Quer vir
jantar conosco amanhã?”, ela convida.

Fecho o aplicativo. Não sei o

que responder. Adorei a família dela e o


seu primo, mas tenho receio de que ela

confunda as coisas.

Esse é o dia mais intenso de

toda a minha existência. A cabeça


parece uma tempestade de raios e
trovões, com os pensamentos mais
díspares. No trajeto para casa, na

companhia de minha mãe e de Agatha,

tive pena de Edgard e me considerei

cruel demais para deixá-lo na

antevéspera do Natal. Sei que vou

machucá-lo demais. Só que ele já me


magoou bastante também.

Quando entro em casa, constato


que ele não havia chegado. Então vou
para o closet e começo a reunir as
minhas roupas. De repente, sinto-me

mal. É que não tenho nada. Nessa casa,


não há um botão que tenha sido
comprado com meu esforço. É tudo fruto

do trabalho de Edgard.

Sinto-me até mal em pegar as

roupas! Desabafo com Agatha e minha

mãe sobre isso. Então resolvo levar


apenas o essencial. Numa mala maior,
coloco as roupas que mais gosto. Ensaco
alguns pares de sapatos e os guardo.

Numa mochila, guardo alguns livros, as


maquiagens e itens de higiene.

— Não leve muita coisa, só o

básico para esses próximos dias. É

melhor deixar todo esse passado pra trás

— minha mãe aconselha. — Sempre

ensinei a vocês a terem seu próprio


dinheiro. Criei minhas três meninas para
serem mulheres livres e independentes.
Não sei por que nunca gostou de me

escutar e fazia tudo ao contrário do que


orientava.

Reviro os olhos. Minha mãe é

um pouco autoritária e tivemos sérios

embates na adolescência.

— Mãe, por favor, não remoa o

passado. É capaz de Safira nem querer


voltar conosco se ficar olhando sempre
para o retrovisor. Essas coisas

acontecem — pondera Tatá. — Ainda


bem que foi agora. Sah só tem 25 anos, e
o futuro dela será brilhante.

Será que terei coragem de

partir e deixar os meus sentimentos para

trás?

Tenho Eric no meu peito e o

amo loucamente, mas não sei se devo


dar ouvidos ao coração. Fiz isso uma
vez e foi algo destrutivo para a minha

vida. Diante disso tudo, penso que não


sirvo para o amor, porque não sei lidar
com esse sentimento, pois entrego a
minha vida sem pestanejar. Se fiz isso

com Edgard por um amor adolescente, o

que eu não seria capaz de fazer por

Eric? Balanço a cabeça em negação.

— Realmente, não sei se devo


voltar para o Brasil. Não quero ser um
estorvo nas costas de ninguém —
argumento com o coração apertado.

— Pare com isso! Não é


estorvo, Sah. Desculpe. Estou muito

revoltada com o que te aconteceu. —

Minha mãe vem até mim e me abraça. —

Será uma felicidade te ter de volta. Só

quero que seja feliz e amada como

merece.

O barulho no piso inferior nos


chama atenção. Meu coração dispara.
Minha garganta seca em angústia.

— Chegou o marido que gosta


de ser corno! — minha mãe desdenha.

— Mãe! — Tatá e eu falamos

quase em uníssono.

— Já falei que isso acontece. O

cuckold é um dos fetiches que mais

cresce no Brasil — explica Tatá.

Escuto passos na escada e


minhas carnes tremem. Pego a mochila,
fecho a mala e a puxo em direção ao
quarto. Então a porta se abre e os nossos
olhos se encontram. Edgard se espanta.

— O que é isso? — ele indaga.

Então Agatha e minha mãe saem

do closet.

— Vou embora, Ed — falo num

fio de voz.

— É alguma brincadeira? —
Ele as fita. — O que vocês enfiaram na
cabeça de Safira? — indaga com
brutalidade.

— Nada, Ed — respondo.

— Viemos dar suporte a Sah.

— Agatha me observa. — Estamos na

sala — informa, segura a minha mala e

começa a sair com ela.

— Eu não criei filha para ser


oferecida a outros homens como se fosse
cachorro sem dono — minha mãe berra
e pega a minha mochila.

Estremeço, pois tinha pedido a


elas que nada comentassem com Edgard,

afinal, o fetiche é algo muito íntimo e

nosso.

— Assim não, mãe — eu a

repreendo, mas ela parece soltar fogo

pelas narinas.

— Conversem com civilidade


— aconselha Tatá.

Elas saem do quarto enquanto

Edgard, com aspecto enfurecido, passa a


mão na barba. Ele fecha a porta e
avança em minha direção com o dedo

em riste.

— Você me traiu de todas as

formas! — ele vocifera.

Sobressalto-me e engulo em
seco.
— Ed... eu te disse que... que

queria a separação — gaguejo.

— Você me expôs pra sua


família de uma forma covarde! Como

uma criancinha que tem um doce tomado

pelo amiguinho. E, ao invés de se

resolver sozinha, vai chorar para a

mamãe. — Ele se aproxima mais de

mim, em fúria.

Recuo.
— Fique longe de mim!

— Me tirou o direito de ter uma

família e destruiu a minha vida, Safira.


Fez isso no passado e repete agora! —
ele argumenta rudemente e praticamente

põe o dedo na minha cara.

— Pare, Edgard, não adianta

me culpar assim. Você nunca gostou de

criança! — berro. — Há muito tempo eu


já dava sinais de que não estava feliz. E
você me ignorou.

— Te ignorei? Não sabia que

era tão cínica! Arrasto água em peneira


por você! Nunca precisou trabalhar,
veste roupas boas e caras, te dei tudo do

bom e do melhor. E o que você faz? Me

responda — ele exige, quase em cima de

mim.

Escapulo dessa proximidade,


trêmula, sem conseguir dizer uma única
palavra. Ele apanha o espelho de

maquiagem na cômoda e arremessa no


chão. Estremeço.

— Como fui tão idiota! Pensa

que não sei? Você me trai com Eric —

ele ruge. — Passaram a se encontrar às

escondidas, embaixo do meu nariz.

Meu coração parece parar, e a

minha respiração deprime. Não sei o


que dizer, o que responder. Não tinha me
preparado para isso, não esperava que
Edgard descobrisse.

— O que tem a dizer sobre as


suas mentiras e traições?

Fecho os olhos, seguro a gola

do meu pulôver. Meu rosto queima e a

garganta dói de tão amarga.

— Eu... eu me apaixonei —

consigo dizer e imagino que Edgard vá


me dar uma bofetada.
Mas ele gargalha de maneira

debochada.

— Apaixonada! Por Eric


Rossi? — Ele arqueia as sobrancelhas,

incrédulo. — É por causa dele que está

me deixando? — ele questiona, mais

calmo.

— Não, Ed. É que não aguento

mais essa vida e as suas cobranças para


aceitar os outros homens. Percebi o
quanto me manipulava. Você me drogava

sem meu consentimento! Tem ideia do


quão sério é isso? Você não me respeita!

— Prove que te drogava! Não

sei de onde tirou essa ideia... Comigo,

sua escrota, você podia ter outros

homens e, ainda assim, me apunhalou

pelas costas com um amigo meu! E ainda

tem a cara de pau de me dizer que está


apaixonada! Você é uma sem-vergonha!
Uma cretina!

— Pare, por favor! — peço, em

prantos. — Me desculpe! Aconteceu...

—Aliás, sabe qual é o meu

consolo? É que Eric não vai te querer,

ele só te usa. Sem fama, seria assim.

Imagina agora que ele está montado na

grana? É claro que não vai te querer! —

Ele me fita com desprezo, e seu


semblante é de repulsa. — Se enxergue,
Safira! Você só tem a casca, um tipo de

beleza que aqui, nos Estados Unidos,


tem uma em cada esquina. Ele não vai
querer ao lado dele uma mulher burra,

limitada e fraca, que a única

preocupação é o que vai fazer para o


jantar.

Essas palavras funcionam como

punhais sendo enterrados no meu peito.


A dor é imensurável.
Edgard vem até mim. Sem

forças para reagir, ele aperta as minhas


bochechas, travando a minha boca.
Tremo, comprimo os punhos cerrados no

peito, como se assim estivesse me


protegendo de tanto sofrer e

humilhações.

— É uma mulher cansativa e

repulsiva, que não fez nada da sua


própria vida. Eric ama a ex-noiva, que é
uma mulher independente, linda e de
futuro promissor. Mas, como você é

burra, Safira, só vai perceber isso tarde


e ninguém vai te querer, nem eu!

De repente, um ódio se espalha

por minhas entranhas, sobe do abdômen,

alastra-se no peito e se espalha por

minha cabeça e membros. Mesmo com

os olhos embaçados de lágrimas, travo a


mandíbula e me desvencilho de Edgard,
distanciando-me do seu raio de ação.

— Não passa de um filho da

puta abusador, que me explorou por


longos anos — esbravejo, tomada de
uma raiva crescente. — Quando

precisou de dinheiro, virei modelo;

quando precisou de quem cuidasse de

suas roupas e comida, virei sua

empregada. Sem contar que também me


fez de puta e saiu me oferecendo por aí.
Aliás, precisa de uma promoção e

estava me empurrando para Anthony.

Você é um vagabundo sem caráter!

— Me respeite! — ele exige.

— Deveria era fazer um

exposed[39] de você nas redes sociais.

Eu não tenho nada a perder, mas e você?

E ainda marcar os diretores e o CEO da

STW — ameaço. — Provas não me

faltam de que me oferecia aos


funcionários da empresa.

Tenho a impressão de que meus

olhos brilham e estão dilatados o


suficiente para que minhas palavras
tenham credibilidade, pois blefo. Não

tenho prova alguma.

— Não se atreva! — ele fala

entredentes.

O ódio só se alastra pelos meus


sentidos e ofusca a razão.
— Você foi a pior coisa que

aconteceu, Edgard. Roubou 10 anos da


minha vida! E está tentando surrupiar a
minha sanidade mental. Quem é fraco é

você! Tão fraco que nunca se sentiu

homem suficiente. Tinha que pedir a

outro pra fazer o seu trabalho! — berro.

— Como ousa!

Edgard avança para cima de


mim e ergue a mão. Num impulso,
esquivo-me, apanho o abajur na mesinha

de cabeceira e lhe acerto à cabeça. Uma,


duas vezes. A lâmpada estraçalha e a
cúpula se solta. Na terceira tacada, ele
protege a cabeça, mas acerto o seu nariz,

que sangra. Ele solta um forte urro de

dor.

Grito, ensandecida. Edgard me

dá um tapa no braço, mas consigo me


manter firme, com a estrutura de metal
do abajur nas mãos. Em revide, acerto o
seu braço em minha fúria insana.

— Você é insignificante —
berro como uma louca. Além da ira,

sinto uma forte sensação libertadora. —

Um homem pobre de alma, vazio... feio

por dentro e por fora! Você é

desprezível, Edgard — afirmo,

entredentes.

— Sua escrota!
Ele avança para cima de mim e

tenta imobilizar o meu braço. Uma força


descomunal me toma e luto para me
desvencilhar. Edgard tropeça na mesinha

de cabeceira e caímos sobre a cama.


Aproveito e o mordo. Ele grita e estica

o meu cabelo.

— O que é isso?!! — Agatha

entra no quarto, seguida por minha mãe,


mas as ignoro. — Parem agora! Não é
assim que se resolvem as coisas.

Juntas, elas seguram os meus

braços e me afastam dele. Pareço uma


onça apartada do inimigo. Ofego e nem
pisco de tanta raiva. Aos poucos, a

minha consciência retorna. Edgard arfa e

me olha com uma um ódio cortante.

Então, presto atenção à imagem

dele com o rosto sujo de sangue. Eu me


choco com o que fui capaz de fazer.
— Mas não pense que vai ficar

assim, não. Vai me pagar caro — ele


ameaça, apalpa o rosto e fita a mão

suja.

— Os dois estão errados —

sentencia a minha mãe. — Não se

resolvem as coisas assim. Devem se

respeitar, pelo amor de Deus!

— Sua filha me traiu. Sua filha


arranjou um amante, dona Celeste.
— Ah! Isso não, né, Edgard.

Você mesmo a estimulou a isso. A culpa


disso tudo é sua — minha mãe fala com

austeridade.

— Precisa ir à emergência... —

sugere Tatá.

— Vou me cuidar... —

Desolado, Edgard observa um lado e

outro do quarto, como se estivesse se


sentindo perdido.
— Vamos, Sah! — chama

Agatha, que em seguida fita Edgard. —


Falamos no telefone depois.

Não consigo desviar o olhar de

Edgard. Não acredito que pude amar um

homem tão mesquinho como ele.

— Safira... — Edgard me

chama e me viro para ele. — Leve o

quadro do seu amante. Se ficar aqui, vou


jogar no lixo, deve valer alguma coisa.
Ao menos, não sai com as mãos
abanando.

— Desgraçado! — expresso,
entredentes.

— Não sei como minha filha te

aturou por tantos anos. Se colocarmos

um advogado, terá que pagar a ela uma

polpuda pensão — minha mãe fala com

altivez. — Mas fique tranquilo, não


faremos isso, porque ela não precisa de
suas migalhas.

Minha mãe lhe vira o rosto e

finalmente descemos as escadas.


Arrasto-me de tanto que as pernas

tremem.

— Devia ter batido mais nesse

nojento! — minha mãe comenta.

— Vamos ter calma, gente —

pede Agatha.

Quando passamos pela sala,


fito o quadro de Eric e o tiro da parede.
Nisso Edgard tem razão, o quadro é
meu, afinal, o melhor que ele me
proporcionou nesses anos todos foi a

oportunidade de conhecer Eric, que se

tornou o meu amor, abriu meus olhos e,

mesmo sem querer, foi a força de que

precisei para mudar o rumo da minha


vida.
Natal

Diante da situação de Safira,

fiquei preocupado, então, antecipei o


meu retorno para Austin. Contudo, não

consegui voo ontem, o que só aumentou

a minha angústia. Os Hoover


continuaram em Nova York
aproveitando o passeio. Só

desembarquei no início da noite, após as

quase cinco horas de voo. Peguei meu

carro no estacionamento do aeroporto e,


neste momento, me dirijo para o hotel
onde ela está hospedada.
Um friozinho percorre a coluna,

afinal, ela está entre os seus familiares.


Não quero apenas buscá-la e a levar

para passar a noite comigo, ainda mais


depois do que a sua mãe e irmãs

descobriram sobre a relação conturbada

que ela vivia com Edgard. Faço questão

de cumprimentá-los e transmitir o

mínimo de segurança.

Fiquei chocado quando soube


que eles chegaram às vias de fato. Mas
me aliviou saber que ela levou a melhor
e lhe quebrou o nariz. Parece engraçado,

mas é preocupante. Alguém com as


inseguranças e medos de Safira ter

explodido e tido um ataque de fúria

significa que algo muito grave a

conduziu a essa condição e isso provoca

traumas.

Ela não me contou em detalhes,


mas suponho que Edgard lhe tenha feito
muitas ofensas, visto que o desgraçado
sabia sobre o nosso caso, apesar dos

cuidados que tivemos.

Estaciono na vaga para

visitantes e, ansioso, sigo em busca de

Safira. É muito cedo para planejar algo,

mas não quero que ela se sinta

desamparada. Quando a família dela


partir, ela terá a mim.
Pego o celular e envio uma

mensagem: “Estou aqui”.

Desço do carro e checo se


estou bem dentro do suéter de lã cinza e

o grosso casado terracota. Entro no

saguão e sigo até recepção. Pergunto

pela família Barros Menezes. A

recepcionista me informa que posso

seguir até o lounge bar do hotel e me


aponta a direção.
Sinto-me um pouco nervoso.

Assim que entro no bar de móveis em


tons madeira e iluminação acobreada, no

meio de uma mesa cheia, avisto Safira.


Derreto-me diante do seu olhar

iluminado e brilhante. Ela me sorri

lindamente, levanta-se, deslumbrante

numa calça jeans clara e suéter de lã

lavanda, e vem ao meu encontro.

— Oi! — digo sem conseguir


controlar o meu sorriso. — Feliz Natal,
Safi!

— Oi... Feliz Natal, Eric.

Abraço-a discretamente, tenho

vontade de lhe tascar um beijo, mas não

posso. Conservador, o pai dela não sabe

que estamos envolvidos, como também

desconhece o real motivo da sua

separação de Edgard.

— Estou morto de saudades,


meu amor — sussurro no seu ouvido.

— Eu também. — Logo, ela se

afasta de mim e pisca com um ar um


pouco entristecido, o que me acende um

alerta.

— Venha... — ela me chama,

segura meu braço com suavidade e me

conduz até a mesa.

— Gente, esse aqui é Eric


Rossi, meu... amigo... — ela diz com
dificuldade.

Bom, se fosse o pai dela, já

saberia que não era apenas amigo por


causa do seu titubear.

— Boa noite! Feliz Natal a

todos! — desejo e eles me devolvem as

felicitações.

— Meu pai, Marcos Antônio —

Safi diz. Cumprimento-o com um aperto


de mão enquanto ele estreita o olhar e
me fita com um aspecto sisudo.

Safira me apresenta à sua mãe,

dona Celeste Maria, e depois à Agatha,


sua irmã, e ao namorado dela, Heitor.

Também cumprimento Esmeralda, que

pisca com simpatia para mim, e o seu

namorado, Fred.

Eles me convidam para me

sentar um pouco. Acomodo-me numa


cadeira ao lado de Safira e na tangencial
de seu pai. Educado, Seu Antônio
oferece uma bebida, mas peço apenas
um drinque sem álcool.

Safira conta a eles que sou

artista plástico, que acabei de retornar

de uma exposição em Manhattan e cita

os jornais que noticiaram a minha

estreia no circuito novaiorquino. A

partir daí, eles fazem algumas perguntas


e, então, engatamos uma conversa.
Discretamente, por baixo da

mesa, longe dos olhos de todos, toco a


mão de Safira e a comprimo contra a

minha, acariciando os seus nódulos.


Temerosa, em pouco tempo ela a retira

do meu alcance.

As irmãs de Safira são ótimas.

Esme, como ela me pediu que a

chamasse, é descontraída e risonha,


enquanto Agatha é mais séria, porém
muito simpática.

Até que em certo momento da

conversa o seu Antônio faz uma pergunta


quase fatal:

— Onde você conheceu Safira?

— ele questiona.

De repente, um silêncio se

abate na mesa.

— Através de Edgard —

respondo, sem delongas, e comprimo a


mão de Safira.

Seu Antônio quase faz uma

careta.

— Vamos pedir mais um

petisco. O que prefere? Bruschetta[40] ,

Buffalo Wings[41] ou canapés quentes?

— oferece dona Celeste, como uma

forma de desviar do assunto.

— Agradeço, mas precisamos


ir. — Observo Safi. — Vamos? —
pergunto num tom baixo para ela.

Muito constrangida, ela balança


a cabeça de modo afirmativo.

Nós nos levantamos. Chamo o

garçom para acertar o meu consumo,

mas Seu Antônio e dona Celeste não

permitem. Agradeço a gentileza.

Despeço-me de todos e saímos. Esme


nos acompanha até o saguão.
— Sah, você precisa voltar até

as 9 horas para papai não desconfiar —


avisa Esme.

Arqueio as sobrancelhas, em

estranhamento.

— Separei uma roupa, vou

direto para o trabalho, logo cedo. Então,

por favor, explique a papai — responde

Safira, que me fita. — Preciso ir ao


quarto buscar a minha bolsa.
Ela pega o cartão de acesso

com Esme e sobe. Então sua irmã me


explica que, como o hotel está cheio,

Safira foi instalada no seu quarto, que


tem uma cama adicional. Ela também me

conta que, nos próximos dias, eles vão

fazer uma viagem de carro a Dallas e

Houston e depois embarcam para Nova

York.

— Sah é que não sabe direito o


que fazer. Meus pais querem que ela vá
para Nova York conosco passar o Ano
Novo. Mas ela prefere o novo emprego

dela. — Esme dilata o olhar para mim.

Esme parece ter me contado

isso de forma proposital. Talvez queira

ajudar a irmã.

— Eu... não sabia desses

planos. — Limpo a garganta. Meu rosto


formiga, mas sigo em frente no que tenho
a dizer: — Safi me disse que contou a
vocês sobre nós. Assim, pode parecer
precoce, mas... preciso deixar claro que

eu amo Safira — confesso os meus


sentimentos, um pouco envergonhado,

mas considero necessário externá-los

para alguém da sua família.

— Ah! Que lindeza! O amor

não olha o calendário! — ela brinca,


jeitosa.
— Sabe, já pensei justamente

isso. — Tento disfarçar o impacto que


externar os meus sentimentos causa em

mim.

Em seguida, Safira aparece

elegante em seu casaco de frio, com

luvas e gorro. É incrível como, mesmo

com peças básicas, ela parece uma

mulher tão fina.

Nós nos despedimos de Esme,


que me pede para cuidar bem de Sah.
Quando saio do hotel, seguro a sua mão,
suspendo parte da luva e a levo aos

meus lábios.

— Não vejo a hora de te ter...

— confesso.

Safi sorri e estremece devido

ao frio, então, enlaço-a.

— Precisamos conversar, Eric.

— Sei disso. Tenho muito a te


dizer. Mas só não sei qual será a ordem
dos acontecimentos, se conversamos ou
se...

Insinuo safadamente e me calo.

Nós nos entreolhamos e sorrimos um

para o outro, como se acordássemos

algo só através de nossas expressões.

Ao chegar ao carro, destravo as

portas e abro a do carona para ela.

— Eu... eu temo que nosso


envolvimento seja só sexo. E...

Abraço-a.

— Tire isso da cabeça, sou

apaixonado por você — declaro-me.

E, antes que entre no veículo,

tomo os seus lábios de forma ardente.

Aperto-a tanto que receio que possa

machucá-la, então, alivio a pressão, mas

a mantenho colada em mim, como se


fosse possível trazê-la para dentro do
meu peito e nos tornarmos um só
coração. Mas ela reclama e afasta os
seus lábios dos meus.

— Aperte devagar, amor,

porque estou dolorida da briga de

Edgard — ela avisa.

— Perdão...

Eu a encho de beijinhos. Mas

voltamos a afogar a nossa saudade entre


os nossos lábios. Minhas mãos vagam
pelas costas de Safira, acariciam a nuca
e cabeça, passam por entre o quadril e
cintura, loucas para descerem até as

suas nádegas.

Movimento os lábios de um

lado a outro ansiosamente. Minha língua

se apossa da dela e dita o ritmo,

carregada de saudades. Meu coração

bate descompassado e não aguento de


desejo. Discretamente, faço-a sentir a
minha ereção, que palpita dentro das
minhas calças por ela.

Aos poucos, nós nos afastamos.

— Vamos entrar no carro, está

muito frio... — ela diz e conserta o seu

gorro.

— Desculpe.

Safi entra, fecho a sua porta e


vou tomar o meu lugar no banco do

motorista. Ligo o carro e controlo o


aquecedor para que trabalhe mais
rápido. Vou guiando devagar e checo a
temperatura da cidade.

— Está frio mesmo, quase 45

graus Fahrenheit[42], cerca de 7 graus

Celsius.

— Sim, gostosinho para ficar

em casa, mas para não se beijar na rua.

Rimos.
— Tem razão. — Acaricio a

sua mão e volto a levá-la aos meus


lábios.

Admiramos um pouco a

iluminação de Natal de Austin.

Avistamos a grande árvore natalina

instalada diante do Capitólio e as

dezenas de árvores, prédios e casas

cobertas por luzes coloridas.

— Está estranha, Safi —


indago, um pouco desconfiado. — Não
sentiu a minha falta?

Ela sorri de modo cativante, o


que me tranquiliza.

— Passei por muita coisa na

última semana, mas saber sobre a aposta

foi algo que me machucou

profundamente — ela fala devagar e

baixinho. — Devia ter me contado,


Eric... Sei que o grande responsável por
tudo isso é Edgard. Confesso que saber
que cheguei ao ponto de ser rifada me
levou ao fundo do poço. Me senti

humilhada e objetificada. E me dói


muito saber que você recebeu dinheiro

por ter ido pra cama comigo — ela

desabafa com a voz embargada.

— Edgard distorceu as coisas

ao te contar. Não aceitei receber grana


alguma. Houve uma aposta e fui
envolvido nela, mas, após San Saba, me
neguei até a conversar sobre o assunto
— Nossos olhos se encontram. De

algum modo, ela parece aliviada. —


Tony e John sabem que não recebi

nenhum centavo... Me perdoe, mas optei

por omitir porque você já enfrentava um

processo difícil, quis te poupar de mais

esse sofrimento.

— Está bem... — Ela apanha


um lencinho e limpa as lágrimas.

Ao parar no sinal, puxo-a para

perto de mim e beijo a sua testa e olhos.


Como queria poder salvá-la de seus

sofrimentos. Se fosse possível,

transferiria as suas dores para mim, só

para resguardá-la.

— Agora tem uma vida nova e

linda te esperando, meu amor. E quero


estar ao seu lado da melhor forma —
falo de minhas vontades, e ela apenas
balança a cabeça.

O sinal abre e mudamos de


assunto. Conversamos aleatoriamente

até chegarmos em casa.

Tenho dificuldades de lidar

com sentimentos. Mas, em Nova York,

prometi a mim mesmo que iria deixá-los

claros para Safira, no intuito de que se


sentisse segura.
Descemos do carro, pego a

minha mala e a mochila, e entramos no


elevador do prédio. Ponho minhas

coisas no chão e a abraço. Seguro o seu


rosto, e o meu peito se aquece.

— Estou perdidamente

apaixonado, Safi — confesso. — Quero

ter um relacionamento contigo, ser

alguém na sua vida, caso você permita.


Acho que está na hora de conversarmos
sobre isso. Não existe mais nada entre
nós para nos separar.

— Te amo muito, Eric, tanto


que chega a doer, mas... — ela também

se declara e interrompe a sua fala. Um

intenso sorriso brota em seu rosto,

contudo, uma sombra tristonha parece

pairar sobre o seu rosto.

Ignoro essa percepção e tomo


os seus lábios, com o coração carregado
de paixão e saudades. Logo o elevador
para no meu andar.

Abro o apartamento e entramos,


de imediato, ligo o aquecimento. Deixo

a mala num canto, retiro o casaco e o

penduro. Pego algo na minha mochila

enquanto ela retira o casaco e pendura

no cabideiro da entrada. Envolvo-a nos

meus braços com o pequeno embrulho


nas mãos.
— Feliz Natal de novo! —

Encosto minha testa na dela e ponho o


presente entre nós. — Espero que goste

— sussurro.

O seu semblante de surpresa me

encanta.

— Ah! Não precisava! Não

pude comprar nada pra você. — Suas

bochechas ficam vermelhinhas. E, de


repente, seus olhos marejam. —
Obrigada!

— Abra, meu amor.

Safi é uma das pessoas mais

sensíveis que já conheci. Aperta o meu

coração saber de tudo que já passou.

Com delicadeza, ela abre o

embrulho e levanta a tampa da caixa. A

sua atenção se prende ao conteúdo.

— Ai, meu Deus, que lindo! —

Ela leva uma das mãos ao rosto. —


Estou muito envergonhada.

— Não fique. Deixe te ajudar a

colocar. — Pego o cordão de ouro


branco com uma gota em safira e prendo

no seu pescoço, enquanto ela admira o

par de brincos combinando, da mesma

pedra. — Meu primeiro presente tinha

que ser em safiras.

— Amei demais, mas deve ter


sido caro, não precisava. Nem sei se
devo aceitar.

Viro-a para mim.

— É de coração, Safi. É claro

que deve aceitar. Não paro de pensar em

nós um segundo sequer. Quis muito te ter

ao meu lado em Nova York e

compartilhar contigo as minhas

conquistas.

— Ah! Eric, sofri bastante por


esses dias. Temi que não me quisesse
mais. Aliás, ainda imagino que isso
possa acontecer quando você encontrar
outra mulher menos complicada, mais

independente e sem um passado como o


meu, que mais parece um filme de terror.

Estou muito confusa, eu...

— Nenhuma mulher me

interessa, Safi. É só você... só tem você

no meu coração e na minha vida. Te


amo, meu amor — declaro-me. Dessa
vez, sem ficar escolhendo as palavras
exatas para expressar os meus
sentimentos, sem me importar de expor o

que grita no meu peito.

Rapidamente, pego a caixa do

seu presente com os brincos, coloco na

mesinha e a beijo com voracidade.

Nossas línguas se roçam de modo

intenso e cheio de desejo, como se


ativassem uma energia pulsante, que se
espalha por cada músculo e ligamentos
de meu corpo. Tenho a impressão de que
um fogo primitivo e invisível circula

pelas minhas veias, fazendo surgir um


circuito intermitente de vontades e

luxúria.

Avançamos em direção à cama,

sem nos desgrudarmos, enquanto

também vamos tirando algumas peças de


nossas roupas. Safira abre o meu cinto,
em seguida, tateia a minha calça. Ao
chegarmos ao pé da cama, rapidamente
nos livramos das roupas.

Tomo o seu mamilo

vorazmente, porém tudo que quero é

estar dentro dela. Mas logo ela se

desvencilha e se senta na cama.

— Desde que te vi, fiquei com

vontade de fazer isso — ela confessa e


assalta meu pau, duro como um torpedo,
como ela o apelidou.

Minhas pernas tremem de

prazer enquanto a danadinha introduz da


glande até o prepúcio na sua boca e dita

o ritmo, num movimento de entra e sai

que me leva à loucura, enquanto

massageia o seu comprimento.

Ansioso, eu a deito, escancaro

as suas pernas e a chupo, num beijo


ousado, arrancando-lhe suspiros. Pouco
depois, Safira se libera de mim, vira-se
na cama e fica de quatro, empinando o
seu traseiro delicioso e me oferecendo.

A verdade é que estamos ávidos para


dar prazer um ao outro.

— É a minha safadinha! —

Dou-lhe um tapa, o que faz a sua carne

tremer.

— Quero você, Eric. Te quero


inteiro dentro de mim... sem
delicadezas... — Quando ela pede isso,
enlouqueço.

— Assim você me mata —


respondo, sôfrego de desejo, e a

obedeço.

Ponho meu pau, rijo como uma

rocha, em sua entrada. Circulo-o por

seus lábios íntimos, conferindo a sua

umidade abundante. Em uma fração de


segundos, penetro-a forte, o que a faz
urrar e tensionar o lençol. Então eu a
cavalgo com força e a sinto apertada e
molhada, massageando o meu pau a cada

estocada. Deliro.

Pressiono a sua coluna para que

desça o tronco. Escuto os sons de nossos

corpos se chocando e os gemidos de

Safira, que se contorce, o que são

combustíveis para o meu prazer. Em


seguida, inclino-me sobre ela e lhe dou
leves mordicadas nas costas. Diminuo o
ritmo.

— Gostosa! — digo e estoco


bem fundo, ela geme.

Já não aguento controlar o meu

desejo e a viro para ficar diante de mim.

— Quero gozar dentro de você,

amor — murmuro.

— Está bem, menstruei

enquanto esteve fora. E comecei a pílula


— ela explica com dificuldade.

Labaredas se intensificam em

minhas entranhas, ampliando o meu


desejo.

— Céus — respondo e a beijo

vorazmente.

Penetro-a e não consigo mais

controlar o ritmo dos movimentos, da

mente e do coração. Quero essa mulher


para mim! E o que tenho é pouco. Quero
tudo. De repente, a força dos
sentimentos e pensamentos me joga
numa bolha insana de desvario.

Cada estocada é uma tentativa

de aplacar uma sede que nunca é

saciada, uma fome impossível de ser

alimentada. Jamais precisei tanto de

alguém como sinto essa vontade

inexplicável de estar ao lado dessa


mulher e a ter em meus braços.
— Te amo, Safira. Eu te amo

loucamente. Por favor, seja minha, seja


minha... — digo, dominado por uma

febre intensa.

Explodo num gozo forte que

jorra dentro dela, que a preenche inteira

de mim, e sou tomado por um prazer

arrebatador que me leva aos céus, à lua

e a outros planetas. Grito, berro e xingo,


num maremoto de paixão, fogo e
loucura.

Quando a onda passa, uma

calmaria devastadora me toma, como


também a vergonha. Ao lado dela, enfio

o rosto no travesseiro e gargalho.

— Foi forte... — ela comenta.

E eu a abraço.

— Muito... Nem me falou sobre

o anticoncepcional.

— Quis fazer essa surpresa! —


ela justifica.

— Mas assim, eu acho que

mereço uma resposta, mesmo não tendo


sido feita do modo apropriado.

— Precisamos conversar, Eric.

Safira se deita no meu peito.

— Sei... gostaria que ficasse

comigo aqui... Na verdade, precisarei


me mudar. Então você poderia me ajudar

a encontrar uma casa pra nós dois, para


nós morarmos. Preciso de uma
espaçosa, para montar o meu ateliê e
guardar as minhas telas que ficam na

casa de Rose...

— Eric... — Safira me

interrompe e ergue o tronco para me

fitar. — Eu... eu... vou voltar para o

Brasil — ela diz com a voz esganiçada e

com os olhos marejados.

Minha respiração para e o


coração aperta tão forte que dói, diante
dessa informação. De imediato, fico sem
ação. As palavras me fogem da boca. De

repente, o mar de certezas por onde


navegava me deixa à deriva no meio do

oceano.
Talvez tenha agido de forma

errada ao revelar a Eric sobre essa


intenção de voltar ao Brasil, logo após
nos amarmos com tanto ardor, quando

ele se entregou apaixonadamente a mim.

Mas precisava externar essa


questão e não conseguia, desde que o vi

entrar tão lindo e elegante no bar do

hotel. Estava decidida a voltar com a

minha família e começar uma vida que

eu pudesse chamar de minha, porém me

senti confusa assim que nossos olhos se


cruzaram e Eric me abraçou.
Por outro lado, não posso

confiar de novo no meu coração cego e


atender às suas demandas. Se

dependesse só dos meus sentimentos,

aceitaria a sua proposta de vir morar


com ele e me instalaria na sua casa.

Contudo, não posso errar outra vez e

nem me perder da minha essência, como

aconteceu nos últimos anos. Na verdade,

preciso descobrir quem eu sou.


Só que eu o amo como nunca

amei outro homem. O que senti por


Edgard foi um arroubo de juventude,

acrescido de rebeldia. Já o que aquece o


meu coração atualmente é uma paixão

adulta e avassaladora. Justo por esse


motivo preciso me curar e me amar ao

invés de me entregar aos sentimentos.


Pelo que sinto por Eric, muito fácil me

tornaria uma escrava desse amor e,


posteriormente, dele.

Expus todas essas questões

para Eric, expliquei a minha


necessidade de me desintoxicar da

doença que foi Edgard e de me tornar

uma pessoa saudável emocionalmente.

— Algum tempo atrás, você

mesmo me disse que a nossa felicidade

não pode ser dada por ninguém, que


precisamos ser felizes por nós mesmos e
só assim poderemos ser felizes com o

outro. Então, preciso encontrar o meu


caminho, porque ainda estou muito
adoecida — argumento.

— Não sou Edgard, quero que

compreenda isso. E não nego a grande

dose de frustração que se abate sobre

mim, não vou fingir, pois eu não

esperava por isso. Mas não sou o tipo


de homem que adula ou exige nada.
Somos livres. A única algema que
gostaria que fosse o nosso elo seria
forjada pelo amor, pelo sentimento.

Eric se levanta, aborrecido.

— Amo você e não tenho

dúvidas sobre os meus sentimentos.

Mas, entenda, esse sentimento também

me aterroriza diante das minhas

fragilidades.

Ele suspira e não disfarça a sua


zanga.

— Me ama mesmo e vai

embora? — Ele balança a cabeça em


negação. Em seguida, segue para o

banheiro.

Na altura do campeonato, já

estou melindrada o suficiente para me

arrepender de ter exposto isso hoje.

Pareci uma pessoa insensível, ou que


não o ama o suficiente.
Ah! Só Deus sabe o quanto te

amo, Eric.

No entanto, meus traumas são


extensos. As acusações de Edgard me

causaram um estrago maior do que

queria admitir. Os apontamentos de que

sou vazia, limitada e que nada construí

dilaceram o que me restou de

autoestima. Tenho medo de acabar me


tornando uma espécie de réptil
rastejando por aí por Eric.

Estou muito confusa.

Saio da cama, visto a minha

calcinha e o sutiã, também ponho o

suéter. Pouco depois, Eric sai do quarto

usando o roupão.

— Acho melhor voltar pra o

hotel — digo, insegura enquanto retiro o

colar que ele me deu. Trêmula, coloco


na caixinha, junto com os brincos.
— Tudo bem — ele responde

com frieza.

Uma amargura corta a garganta.


Como posso estar me machucando desse

jeito? Lágrimas voltam a abundar o meu

rosto. Passo junto a ele e vou ao

banheiro. Faço a minha higiene.

Nervosa, lavo o rosto. Meu peito parece

transpassado por uma bala de canhão.

Saio do banheiro e ele está


mexendo no seu celular.

— Estou pedindo uma pizza —

ele avisa. — Se quiser esperar...

Pego a caixinha de presentes e

me aproximo dele, que abre um grande

bloco de papel, pega um giz de carvão e

começa a desenhar, rapidamente faz

traços que, de início, não fazem sentido.

— É falta de educação, mas


não posso ficar com essas joias —
alego. Ele para e me encara.

— Comprei pra você, são suas.

Mas se não as quiser, pode deixar aí,


sobre a mesinha — ele responde e volta

a sua atenção ao desenho.

Não imaginava que ele poderia

ser tão ranzinza. Não consigo conter o

choro que volta a me transbordar.

— Estou sofrendo muito, Eric.


Amo você e não sei o que fazer — digo
com a voz entrecortada. — Eu te amo,

mas preciso me curar e ter uma vida


decente, preciso ser respeitada.

Ele para o seu desenho e me

fita. Na verdade, seus olhos varrem as

minhas pernas desnudas.

— Eu te entendo, só não

compreendo por que vai nos sacrificar

retornando ao Brasil. Não faz sentido


para mim.
Meus olhos se prendem no

chão.

— Quero trabalhar e ter meu


dinheiro. Não sei se vai dar certo o

emprego no antiquário e não posso

depender dos meus pais e irmãs para me

sustentar aqui. Além do que, meu visto é

de acompanhante de Edgard, com a

separação, não sei como fico. Lá, posso


trabalhar nos negócios da família e,
enfim, teria mais apoio — respondo.

Nem o fito. Com o coração em

pedaços, vou pegar a minha calça, que


ficou jogada sobre o sofá.

— Quando se quer, se dá um

jeito. — Eric rebate. — Estou

conseguindo o visto permanente, o

Green Card. Deve sair na primeira

semana após o ano novo. Posso ver na


agência como resolvemos a sua
situação. Caso necessário, podemos

acionar um advogado... Enfim, você se


diminui demais, Safira. É uma linda

mulher, fala inglês bem e, se procurar

com calma, consegue uma boa

colocação. Poderia trabalhar em lojas

de roupas femininas, mas poderia ver

em escolas também, já que estudou


Pedagogia. Posso falar com algumas
pessoas a respeito.
— Obrigada... — digo, num

fiapo de voz, diante do tom frio e


distante de Eric. — Esqueci de pegar o

quadro para te devolver — acrescento


tentando engatar outra conversa. Já tinha

lhe contado sobre o que Edgard disse

acerca da tela.

— Não quero, é seu...

— Não vou ter nem onde


guardar. É melhor... — Minha voz corta.
Fungo.

Começo a vestir a calça, com o

peito apertado e dolorido.

Eric para de desenhar e me

observa.

— Vamos terminar assim? —

ele me indaga.

— Eu não quero terminar...

Vou até ele e abraço os seus


ombros. Eric resiste a mim. Beijo o seu
rosto e o bajulo.

— Te amo, meu menino


ranzinza. Não vai se despedir de mim?

— eu o provoco, arrependida de ter dito

que ia embora.

Eric me encara, sério.

— Não sou do tipo que corre

atrás. Quer se despedir de mim com um


beijo e um abraço? Não tenho isso pra te
dar. — As suas palavras me machucam.

Mas ele segura firme o meu antebraço,


vira-se e cochicha no meu ouvido: —
Tenho outra coisa pra você, quero te

foder de novo, porque amo uma mulher

submissa, que balança o traseiro para


mim...

Um desejo se agita em minhas

entranhas. Sorrio. Eric me puxa para o


seu colo. Enfia a mão por baixo do
suéter e cobre um dos meus seios com a
sua mão grande.

Ele não diz exatamente em


palavras, mas é bem claro para mim que

gosta de sexo rude. Quase nunca me

deixa ditar as regras na hora de nossas

relações e, quanto mais forte eu aguento,

mais prazer ele sente.

Sinceramente, amo me sentir


dominada. Da mesma maneira, agrada-
me bastante ter essa sensação de que

pertenço a alguém, no sentido erótico.


Em contrapartida, na normalidade do dia
a dia, Eric me trata com afeto e respeito.

Isso sempre foi o inverso na minha vida.

Edgard nunca teve sexy appeal e sempre

deixou um vácuo na nossa vida sexual,

ainda mais que me empurrava para


outros homens, enquanto era grosseiro,
manipulador e possessivo no cotidiano.
— Me desculpe, não sou essa

chata, mas estou emocionalmente


instável nesses tempos. — Enterro o
rosto em seu pescoço. Minhas narinas
são invadidas por seu cheiro másculo e

delicioso, que me provoca uma sensação

mista de conforto e segurança.

— É compreensível, Safi. Mas

pense que isso também me causa


insegurança.
Eric beija suavemente os meus

lábios. Sou invadida pela percepção


gostosa que sua boca macia provoca em
mim. Aos poucos, a leveza do beijo

cede espaço para o serpentear mais


intenso de nossas línguas, como também

dos movimentos de nossos rostos se

encaixando.

Em pouco tempo, livro-me das


minhas roupas, ficando apenas de
lingerie, e me aninho entre as suas
pernas. Enquanto ele está sentado em

sua cadeira de escritório, ofereço-lhe


um sexo oral barulhento e intenso. O que
mais quero é lhe encher de prazer e

sensações inesquecíveis.

— Venha pra cama, amor — ele

chama pouco depois.

Ergo-me e sigo com ele até


ficarmos diante da cama. Eric me abraça
e acaricia o meu rosto.

— Preciso te dizer uma coisa...

Desde que te vi no churrasco na sua


casa, eu me encantei por você. A
verdade é que fui pra San Saba porque

era você, não faria isso se fosse outra

mulher. Eu te desejei desde o início e

não foi só sexo. Demorei para admitir

isso pra mim mesmo e agora confesso

pra você...
— Nem sei se mereço tanta

alegria! — Controlo-me para não


chorar. — Me desculpe por meu papelão

há pouco.

— Acho que nós dois

merecemos, Safi. Apesar de morrer de

tesão em você desde sempre, quero te

dar mais que isso nessa cama. Quero

que seja prazer e também emoção, que


seja gozo, mas também um amor sublime
e puro... Você me conquistou, por favor,
vamos cuidar bem desse amor. — Ele

me dá um beijinho e eu me derreto
inteira. — Vamos viver esse sentimento,
como se entrássemos num barco. Vamos

ver aonde ele vai nos levar. Vez ou

outra, ajustaremos as velas para que não

nos percamos no caminho e não

machuquemos um ao outro.

— Ah! Eric... que lindo! Estou


muito emocionada. Preciso confessar
que sempre fui uma mulher solitária e

sonhadora. Desde aquele dia, diante da


casa dos Hoover, que tive a sensação de
que você viu minha alma pela janela.

Então, passei a sonhar contigo e

fantasiar que você... — engasgo em

busca de coragem e controlando a

emoção para não desabar — que você é

o homem da minha vida.


Eric sorri, contente.

Emocionada, duas lágrimas se formam


nos cantos dos meus olhos. Com
delicadeza, ele as limpa com a ponta de
seus dedos. Nossos olhos parecem dois

ímãs a nos atrair de modo irrefreável.


Só que, a partir desse instante, não

temos mais que temer o que venha

resultar dessa nossa paixão.

Nós nos beijamos sem ânsia e


com muito afeto. As palavras de Eric me
preenchem inteira e me cobrem de uma

paz e de uma certeza de que tanto


carecia. São como um bálsamo sobre as
minhas feridas. Comprimo a pele de

suas costas nas minhas mãos e o sinto

inteiro, em sua envergadura máscula,

grande, larga, como também em seu belo

coração.

Não sei o que fazer da minha


vida!

Nossos corpos parecem

formados da mesma substância que foi


separada em algum momento da
existência e que só querem permanecer

unidos. Não paramos de nos beijar

quando nos deitamos e voltamos a nos

entregar um ao outro.

Cobrindo-me de beijos, ele se


dedica aos meus mamilos por algum
tempo. Em seguida, abre delicadamente

as minhas coxas e beija o meu sexo.


Massageia os lábios íntimos e se fixa no
clitóris. Gemo, movo os quadris e

chamo o nome de Eric, entregue ao


deleite, pedindo-lhe que não pare.

Quando atinjo o clímax, Eric

volta para os meus lábios.

— Preciso de você na minha


vida, Safi... — ele afirma num
murmúrio. — Olhe como você me deixa

só com os seus cheiros. — Ele aponta


para o seu pênis ereto.

Então ele volta a me cobrir com

a sua boca. Assim, posso sentir o meu

próprio gosto em seus lábios. Eric passa

o seu braço por baixo do meu pescoço e

me mantém próximo a ele, ao encaixar-

se entre as minhas pernas.

Ao me penetrar, ele emite sons


de deleite que mais parecem uma música

a acalentar os meus ouvidos. Contraio a


pélvis e me movimento para aumentar o
nosso prazer e contato. Ele me ama com
ternura. O vai e vem profundo entre as

minhas pernas mais parece tecer

conexões e costurar vínculos que nos

tornam um só.

Desperto zonza de sono, com o


som do despertado do celular que havia

programado e deixado na mesa de


cabeceira. As pálpebras pesadas
demoram a me obedecer. Eric e eu
passamos a madrugada fazendo amor e,

praticamente, não dormimos. Pego o

aparelho e desligo. Olho para o lado e

não o vejo.

— Ei, amor, bom dia! — ele


chama. Forço as pálpebras e encontro
Eric pleno e lindo na sua cozinha.

— Bom dia, amor! — respondo

e me arrasto para fora da cama, pelada.

Corro para o banheiro. Uso o

vaso, prendo os cabelos e vou direto

para a ducha. Dou alguns gritinhos com

a água morna, mas logo ela chega a uma

temperatura agradável.

Sou a mulher mais feliz do


mundo.
Tivemos uma noite

maravilhosa, linda e apaixonante. Não


posso voltar para o Brasil e deixá-lo
para trás, bastou uma noite para ter

plena certeza disso. Completaram dois

meses desde que nos encontramos diante

da casa dos Hoover após o churrasco,

porém vivemos instantes tão fortes que


nos ligam como se já estivéssemos

próximos por bem mais tempo.


Não tenho estrutura para me

afastar de Eric. Refleti melhor e percebi


que preciso me recuperar de tudo que
passei, cuidar de minha própria vida e
também vivenciar esse amor. Eric

também me ajudou a chegar a essa

conclusão.

Passamos a noite abraçados,

sem nos desgrudar um segundo sequer.

— Vamos morar juntos por dois


meses. Depois, avaliamos o que é

melhor para nós. Se continuamos


debaixo do mesmo teto, ou se moramos
separados. Esse é o tempo que você se
estabelece no seu trabalho — ele

sugeriu.

— Não queria depender de

você. Não é por você, é devido à minha

história. Não quero repetir os mesmos


erros — argumentei.
— Isso não vai acontecer... Pra

mim também será um desafio. Nunca


morei com nenhuma mulher. Será a
minha primeira experiência. Confesso

que sou um sujeito metódico e gasto o


meu tempo livre inteiro nas minhas

pinturas. E vou precisar ampliar esse

processo, por causa de compromisso

que firmei.

— Não sei se isso seria um


problema pra mim. Mas é melhor mesmo
experimentarmos...

— Obrigada pela chance, amor


— ele pronunciou de uma forma tão

doce que meu coração aqueceu de

imediato. E, só de me recordar, desperta

sensações no peito e no meu corpo.

Enfim, após essa conversa,

fizemos amor outra vez. Eric é um


homem muito viril e intenso. Ele age de
um jeito mais rude quando faz sexo e é

muito amável e carinhoso quando


fazemos amor. Para mim, os dois jeitos
estão em pé de igualdade.

Termino o banho, enxugo-me e

saio de toalha. Ele já está pronto. Pego a

roupa que trouxe na bolsa e visto

rapidamente. Ele me abraça por trás e

beija a minha nuca.

— Amei nossa primeira noite...


Viro-me para ele e devolvo o

abraço.

— Estou muito feliz, Eric —


digo e vamos tomar o nosso café da

manhã.
Deixei Safira no antiquário e

vim para a STW Tecnologia. Saio do


elevador no andar que trabalho.
Cumprimento as pessoas e sigo para

minha sala. Estou preparado para


encontrar Edgard, o que será
constrangedor para nós dois. Mas não

sou eu quem tem que ter vergonha. É ele.

Pois maltratou e explorou a ex-esposa.

Preciso organizar a minha vida

na empresa. Pretendo concluir o contrato

de trabalho que tenho firmado e me


dedicar aos quadros. Sei dos riscos, mas
só o que vendi em Nova York é dinheiro
suficiente para me manter por dois anos,
sem produzir nada. Então, preciso

enfrentar esse novo futuro profissional e


amoroso também.

Sinto-me feliz e leve. Só após

me acertar com Safira, finalmente, tive a

sensação de estar no topo do Empire

State[43] . Sei que a nossa relação irá

passar por muitas provações. Não me


iludo de que será um mar de rosas.
Mesmo apaixonados, podemos não dar
certo, porque a vida é diferente do

sonho.

Safira é a minha inspiração, em

quem penso quando tenho uma tela em

branco diante de mim. Quero tentar uma

vida a dois com ela e vou me esforçar

para fazer funcionar. A nossa química é


a mais forte que já experimentei, sem
contar que tenho fortes sentimentos e
sinto que sou correspondido, o que é
importante para mim diante das

decepções que já passei.

No primeiro momento, confesso

que fiquei meio encabulado com o fato

de ela ter desejado voltar para o Brasil.

No entanto, compreendo os argumentos

dela. Safi foi muito machucada. Enfim,


teremos dois meses juntos para nos
conhecermos melhor, convivendo
embaixo do mesmo teto. Depois,
reavaliaremos a nossa relação.

Enfim, ainda não me deparei

com Edgard.

Passo na sala, deixo as minhas

coisas e vou falar com Tony. Estou em

dívida com ele, afinal, eu o tratei

rudemente, antes das férias, por causa de


Safira. Pelo vidro, confiro que ele está
só, então, entro.

— Ó, céus! Diante de mim o

mais novo famosinho da nata artística


novaiorquina. — Tony fala com um tom

de deboche e me estende a mão. —

Como está, cara?

— Bem. E as coisas por aqui?

Acho que lhe devo explicações — digo

e cumprimento, em seguida, sento-me na


cadeira diante de sua mesa.
— Até esqueci. Fique

tranquilo.

— Safira e eu estamos juntos


— conto.

— Mas... quê! — Os olhos de

Tony dilatam, fixados em mim. Após a

surpresa, ele solta um risinho. — E

Edgard, cara?

— Ela o abandonou.

— Puta que pariu. Você é o


verdadeiro destruidor de lares... — ele
fala em tom jocoso. Fecho a cara,
insatisfeito. — Desculpe... mas e aquela

viagem toda de Edgard com o fetiche?

— Ele a forçava, como sempre

desconfiei.

— Ele a forçava? Tudo bem,

vocês estão juntos, mas em San Saba ela

não pareceu forçada, me desculpe.

— Para oprimir uma pessoa e


manipulá-la a fazer algo não é

necessário colocar uma faca no pescoço,


ou agredi-la fisicamente. Enfim, naquela

noite descobri que ele a drogava.

— Ô, merda, que história

assombrosa. — Tony parece chocado.

— Não tenho nada com isso, mas não

acha muito precoce você a assumir?

Eles tinham uma vida muito subterrânea


e fora dos padrões, cara. Pode estar
entrando numa fria.

— Isso não me assusta. Confio

em mim.

É uma meia-verdade. Sim, o

passado dela me incomoda um pouco.

Às vezes, o ciúme faz um pequeno

estrago em mim, não que seja do tipo

que dê escândalos, mas quando algo me

incomoda, eu me fecho num momento


obscuro e triste. Tento lidar com esses
sentimentos ruins da melhor forma
possível para que não me contamine.

— Me preocupo com a sua


relação com Edgard aqui dentro. Mas

me alivia saber que ele está mudando de

setor.

Então converso com Anthony

sobre a minha situação na STW. Assim,

marcamos de nos reunir com CEO da


empresa para definir os meus rumos.
Discutimos a possibilidade de trabalhar
em home office.

Após acertarmos outros


detalhes do projeto em que trabalho,

levanto-me para sair da sala.

— Eric! — ele chama quando

estou na porta. — Tem perigo de Safira

expor a vida que levava com Edgard e

respigar em nós e na empresa? Pergunto


por causa de San Saba.
— Eu avisei sobre isso! Mas

não acho que possa ocorrer.

Retorno à sala, pensando que


enfrentarei meses complicados até o fim

do contrato. Também preciso me mudar

urgente para um lugar mais espaçoso,

tanto para melhorar o meu trabalho nas

telas, como por Safira. Também

precisarei iniciar a preparação da


próxima exposição, que vai acontecer
em alguma data após o inverno.

Deparo-me com Edgard

limpando a sua mesa. Ele está com o


nariz machucado e um galo na testa,

além do aspecto péssimo. Nós nos

olhamos como dois animais que se

estranham, diferente da camaradagem

que tínhamos quando éramos realmente

amigos.

— Bom dia! — falo, mas ele


não responde.

Sento-me na minha cadeira,

abro o notebook e o ligo, sem conseguir


relaxar.

— Não pense que me enganou

tendo um caso com a minha mulher.

Nada respondo. Paro o que

estou fazendo, pouso o cotovelo sobre a

mesa e o indicador próximo ao lábio e o


observo.
— Pensa que é esperto, mas

não é, Eric. Não foi difícil descobrir por


onde Safira andava, sei das idas ao seu
apartamento, do passeio de barco pelo

lago Travis. Sabe por que não fiz nada?

Porque não me importei com o caso de

vocês.

Fico com uma pulga atrás da

orelha. Esse filho da puta ainda a


espiona.
— Podemos conversar, mas não

é legal que seja aqui — argumento.

— Sabe por que não me


importei? Porque tínhamos combinado

de ela engravidar de um touro. Não

posso ter filhos. Então, imaginei que

alguém como você poderia fazer um pra

mim.

Uma raiva cortante me toma.


Tenho vontade de me levantar, lhe dar
um soco no meio do nariz e acabar logo

com a sua cara. Mas me controlo. Mexo-


me na cadeira e procuro controlar a

respiração.

— Não acredito nisso! —

vomito. — Nunca engravidaria uma

mulher assim — digo entredentes e

cerro os punhos.

Depois me recordo de todos os


vacilos que tenho dado com Safira,
transando sem proteção. Merda!

— Está muito enganado com

Safira. Ela não vai ficar com você, ela


não se acostuma com relações

convencionais. Talvez acabe como eu,

Eric... trocado. — Apesar do tom

brando, o olhar de ódio de Edgard

parece uma arma direcionada a mim.

— Isso não vai acontecer —


garanto, já com as carnes trêmulas.
— Diga a Safira que ela

precisa retirar as suas coisas de casa.


Ela me bloqueou no telefone e não

consigo interagir para resolver as

pendências sobre a separação. Não sei o


motivo disso, de me bloquear, se ela

depende de mim para manter o visto e o

seu seguro saúde, sem contar que eu a

mantenho.

— Nem pense em fazer


chantagem, Edgard. E o seguro saúde,
passe os dados para mim que eu assumo.
Mas fique ligado que qualquer advogado

pode deixar a sua situação bem menos


confortável. Mas esse é um assunto que

vocês dois precisam decidir, não tenho

que interferir — constato com um

incômodo esquisito no peito.

Ele sorri debochado.

— Vai assumir Safira? Prepare


o bolso, pois ela é uma mulher cara...

Ah! Me esqueci... soube que você está


montado na grana, deve ser por isso que

ela está se aventurando tanto — ele


insinua que Safira está comigo por

dinheiro e depois me encara. — Não é a

primeira vez que ela faz isso e depois

volta para mim. Sinceramente, não me

importo.

Um ódio corrói as minhas


entranhas.

— Não seja mentiroso, Edgard

— rebato. — Mas me conte uma coisa,


não é a primeira vez que ela arrebenta

com a sua cara, ou é? — pergunto com

cinismo. O desgraçado se enfeza, ergue

a caixa com as suas tralhas e sai.

Bato o punho na mesa com

força, muito puto com Edgard. Passo a


mão no rosto, aborrecido. Não será fácil
esse início de relação com Safira, com a

sombra desse canalha pairando sobre


nós e destilando veneno.

Preciso me focar no meu

trabalho, caso contrário, vou surtar.

Trabalhei no antiquário nos

dois turnos, porque Doris está de


recesso e só retorna após o Ano Novo,
mas quase não houve movimento. Passei
o dia sob o olhar de peixe morto de Bill,

o filho da proprietária, um rapaz roliço

de uns 30 anos.

Quando saí, no fim de tarde frio

de Austin, segui para o hotel com a

finalidade de conversar com a minha

família. Por sorte, Agatha e minha mãe

estavam lá, e os outros ainda não tinham


retornado de uma viagem a uma
cidadezinha próxima.

Fiquei nervosa e foi difícil

falar para elas que iria permanecer em


Austin. Ambas insistiram que deveria

retornar. Contei sobre o combinado com

Eric de ficarmos juntos por dois meses

e, em seguida, reavaliarmos se valeria a

pena continuar sob o mesmo teto.

Em certo ponto, a conversa


ficou um pouco tensa.
— Nesse meio tempo, posso

encontrar um lugar barato para ficar ou


arrumar alguém para dividir um

apartamento — argumentei.

— Eric é um homem bem

afeiçoado, bonito, inteligente, brilhante,

enfim, parece ser tudo que uma mãe

desejaria para uma filha. Mas, Sah, ele

te conheceu realizando as fantasias


devassas de Edgard. Você não conhece a
natureza dele. Acha mesmo que na
primeira briga ele vai te respeitar? —
minha mãe contrapôs.

— Gostaria que você voltasse

conosco. Seria mais fácil te ajudar,

estou sendo sincera. Amor é algo tão

relativo, Safira. Não consigo entender

como se apega tanto, eu não consigo —

opinou Tatá.

— É porque você nunca se


apaixonou — respondi.

— E você se apaixona demais

— minha mãe rebateu. — Tenho muito


medo, Sah. Como podemos nos sentir

seguras com relação a esse rapaz, se

escondeu os horrores que passou com

Edgard? Poderia ter se poupado se não

fosse orgulhosa e tivesse nos procurado

antes.

Mesmo aborrecida com os


argumentos delas, eu as compreendi.

— Não me apaixono demais,

que exagero de vocês. Tive uma longa


história que começou quando era uma

garota e agora vivo um amor adulto.

Mas entendo os medos de vocês e

assumo que fui orgulhosa. Na verdade,

não enxergava direito o que eu estava

passando, as violências a que fui


submetida. Quando se fala de
violências, só pensamos em agressões
físicas, mas agora entendi que não é
assim.

— Sabe aquela sua conta

digital que depositei o dinheiro pra você

comprar os smartphones que te

encomendei ano passado? Vou colocar

uma grana nela pra você ir se virando —

disse Tatá. — Não é muito porque sabe


como é o dólar em relação ao real.
Meus olhos se encheram de

lágrimas.

— Não posso aceitar —


aleguei.

— Não tem não querer, é

presente — Agatha afirmou.

— Seu pai e eu também vamos

mandar uma quantia para você. Afinal,

saiu de casa aos 18 anos e não


contribuímos mais em nada com a sua
vida. Então, fazemos questão de te
ajudar.

— Mãe, só nos primeiros


meses.

— Só jure, diante do que há de

mais sagrado nesse mundo, que nunca

mais vai nos esconder nada! — pediu a

minha mãe.

Chorei demais. Abracei-as,


agradeci e prometi pagar tudo quando
pudesse. Também, como dona Celeste

Maria pediu, jurei que nunca mais iria


me afastar delas e nem esconder

problemas.

Enfim, esperei meu pai retornar

e me despedi de todos, que embarcam

amanhã para Nova York. Meu pai

começou a questionar sobre a minha

decisão, mas minha mãe disse que eles


conversariam com calma.
Então Eric veio me buscar e me

disse que tinha novidades para mim.


Após guardar a minha mala, que estava

no hotel, no bagageiro, entramos no

carro. Ele, então, colocou no meu colo

uma caixa de chocolates finos.

— Assim me acostuma mal —

afirmei.

— Será? Hum, quero começar


bem — ele disse, um extenso sorriso no
rosto. Eric estava lindo dentro de suas

roupas de frio. — Saiba que aposto


muito em nós e quero dar certo contigo.

— Preciso te fazer uma

pergunta meio boba, não que duvide de

você. — Franzi a testa e ele deu

prosseguimento: — Está tomando a

pílula mesmo?

— Claro — Peguei a cartela na


bolsa e mostrei os dias tomados.
Expliquei que foi Agatha que foi na

farmácia comigo e escolheu um


adequado para mim até ir ao

ginecologista.

Trocamos beijinhos e viemos

para o seu apartamento. Após tomarmos

um banho bem quente juntos e

namorarmos no chuveiro, fiz um risoto

para nós.

Nesse momento, Eric me


mostra virtualmente algumas casas para
alugar.

— Não queria que saísse daqui


por mim.

— Não, amor, é que preciso de

espaço para me dedicar às minhas telas.

Estou ansioso para ter um espaço só

para a minha arte e ter mais conforto

para te curtir bastante. — Ele pisca para


mim.
Vimos algumas casas no mesmo

condomínio em que eu morava, mas logo


descartamos. Então selecionamos três

para visitarmos antes do Ano Novo.

— Safi, tem uma coisa que

precisamos resolver. — Nós nos

levantamos e fomos para o sofá. —

Edgard ainda te monitora e só pode ser

através de algum sistema espião no seu


celular, que envia dados de localização,
mesmo desligado.

Escutar isso faz um frio

percorrer a coluna. Suspiro. Pego o


celular e o entrego a Eric. Desbloqueio

e o deixo trabalhar nele.

— Queria nunca mais na vida

falar com Edgard — afirmo com um

grande pesar no peito. Eric já tinha me

contado sobre a conversa que eles


tiveram e o recado que ele me mandou.
— Sugiro que fale com ele por

telefone mesmo. Acho que deveria


acertar as pendências como as suas

coisas que estão na casa dele, questões

burocráticas como contas em banco e


como se dará essa questão do divórcio e

tal. — Ele para e me fita. — Quero

muito que se divorcie logo. Depois

precisa esquecê-lo, Safi. Receio que ele

ainda faça algo contra você.


— Não. Conheço Edgard há

muitos anos, ele não é vingativo.

— Incrível que ainda tenha


Edgard em boa conta. Ele é perigoso. E

o jeito manso com que ele está agindo é

ainda mais preocupante. — Eric me fita,

sério. — Precisarei reinstalar o sistema.

Tem um aplicativo espião aqui bem

sofisticado, que nunca vi do tipo,


funciona mesmo com comandos do
celular desligados.

— Tenho os contatos salvos,

pode reinstalar. Partindo de Edgard, não


é novidade — respondo. — Em hipótese

nenhuma estou o protegendo, afinal, nem

nos separamos numa boa. Mas ele não

contava que minha família e você me

apoiassem.

Ele põe o celular de lado,


reinstalando o sistema, e me puxa num
abraço apertado.

— Não quero controlar a sua

vida, mas gostaria que não se


encontrasse pessoalmente com Edgard,

porque me preocupo com a sua

segurança. — Eric dá um beijo no meu

pescoço. — Seria bom também que

trocasse de trabalho, porque ele conhece

o endereço do antiquário e você mesmo


disse que o filho da dona lhe olha
atravessado. — Ele volta a depositar
beijinhos na minha nuca. — Amo o seu

cheiro, Safi. Me dá tesão e também uma


sensação de conforto e aconchego.

— Ah! Que lindo, meu amor.

— Então, você vai me dar o seu

currículo, e eu vou encaminhar para

umas pessoas conhecidas.

— Ainda espero outras


respostas para entrevistas. Não se
preocupe, também quero sair de lá, mas

devo ficar ao menos até a Doris


retornar.

— Queria te pedir outra coisa...

— Eric menciona.

— O quê? — pergunto, diante

de sua pausa, enquanto ele passa dois

dedos no meu rosto, num semblante de

admiração que me provoca uma


quenturinha no peito.
— Prometi que quero que a

gente dê certo. Mas sou um sujeito com


algumas manias, principalmente, nos
momentos em que entro numa ebulição

criativa. Quando estou nesses processos,

eu me isolo e me torno um homem das

cavernas. Sou chato. Então, nesses

instantes, somos só eu e a tela, as tintas

e os pincéis

Sorrio.
— Está bem.

— E só vai poder ver os meus

trabalhos quando me sentir confortável


— ele expõe, um pouco constrangido.

— Entendi, Eric. Nesses

instantes, a sua melhor companhia é a

solidão. Compreendo essas suas

demandas. Juro que vou respeitar e só

verei os quadros que me convidar para


apreciar.
Rio. Ele fica completamente

sem jeito, um homem grandão, que se


envergonha por manifestar as suas

próprias rabugices.

— Queria também te pedir

outra coisa. — Ele beija a minha

bochecha e acaricia os meus cabelos. —

Gostaria que posasse para mim, que

fosse minha modelo — ele pede.

— Eu?
— Sim, de corpo inteiro. Não

se preocupe, nunca te exporia a


constrangimentos. Ao contrário, quero

só eternizar essa nossa paixão.

Arregalo os olhos. Ele me

enche de beijinhos.

— Não modelo há muitos anos.

O que pretende? — indago.

— Estou com uma ideia na


cabeça. — Ele se levanta e me conduz
até o cavalete coberto, junto aos seus

materiais. — Você é a minha principal


fonte de inspiração, Safi. Penso numa

nova tela, e só vem você na minha


mente. A sua imagem martela na minha

cabeça desde nosso encontro em San

Saba.

— Sério?

Então, ele levanta o pano e me


assusto. Levo as mãos aos lábios. A
imagem do quadro sou eu. Quer dizer, o

meu rosto dentro de um contexto surreal,


meus cabelos são longos cacho de

bluebonnet.

Silencio por alguns segundos.

A pintura ainda não está

concluída, mas o desenho é de uma

beleza extrema.

— Você é minha inspiração, é


minha musa.
— Que lindo, Eric.

— Quero você inteira, na minha

cama, na minha mão, no meu coração,


diante de mim no dia a dia e na minha

mente criativa.

Eu me emociono, mas ali deu

uma pontada de receio de que eu seja

apenas um insight criativo dele. Porém,

nada digo, quero viver intensamente


essa história.
Eric beija o meu lábio

suavemente e encosta sua testa na minha,


enquanto acaricia os meus cabelos.

— Você me enfeitiçou, Safi, de

uma maneira maravilhosa.

Nós nos beijamos

profundamente. Em pouco tempo,

estamos na cama.

— Faça devagar, por favor,


estou assada — confesso em seu ouvido,
e ele demonstra gostar pelo que escuta.

— Será bem devagar, Safi... —

ele promete e fazemos um amor cheio de


carinho e entrega.
Dois meses depois

Pareço ter saído de um pesadelo e


entrado num sonho. É assim que defino
as mudanças em minha vida. Só que, nos
mais ternos devaneios, às vezes

tropeçamos em algum obstáculo. Bom,


nesse exato momento, estou indo

encontrar a pedra pontuda no meu

caminho, que é Edgard, num café de uma

rua esquisita nos arredores da SoCo.

Estou levando os papéis para dar

entrada no divórcio.

Mas não é sobre Edgard que


gostaria de compartilhar.

Estou louca para contar sobre

Eric e eu. Mudamos para uma casa


ampla, arejada, com lareira, piscina,

churrasqueira e uma edícula, que ele

transformou em ateliê com espaços para

pintura e armazenamento dos seus

quadros que ficavam na casa dos

Hoover.

Eric não mediu esforços para


mobiliar a casa e deixá-la confortável,
aconchegante e moderna.

— Já era pra ter me mudado há


mais tempo. Passei a morar naquele

apartamento assim que arranjei o meu

primeiro trabalho, mas sou um sujeito

acomodado e fui ficando, mesmo sem

um espaço adequado para pintar — ele

tentou justificar o seu empenho para


montar a casa, tentando deixar nas
entrelinhas que essa iniciativa não tinha

relação com a minha chegada à sua


vida.

Compreendo e aceito o seu

jeito, mas meu coração aperta um pouco,

pois sou muito apaixonada por ele. Eric

não é muito de externar os seus

sentimentos, ele diz que me ama vez ou

outra. Também não conversamos sobre o


futuro. No máximo, fazemos algum
combinado para a semana seguinte.

Porém, hoje à noite bateremos

um papo sobre nós, pois essa semana


completamos os dois meses do

combinado para reavaliarmos a nossa

relação. Enfim, apesar desses freios que

ele parece se impor, a nossa relação é

muito boa. Ele se empenha bastante para

que eu me sinta feliz e satisfeita.


Paparica-me e me ronda com mimos,
flores e chocolates.

Metódico, Eric tem passado a

maior parte do tempo trabalhando em


novos quadros, ou no projeto da STW.

Acorda bem cedo, exercita-se ao menos

três vezes na semana, e começa sua

jornada produtiva, ou vai para a STW,

ou fica em casa. Mas, em geral, depois

das 20 horas, a sua atenção é só minha.

É um homem apaixonante.
Diferente de Edgard, ele não

me vê como a responsável pelas tarefas


domésticas, divide o serviço comigo e,

a cada dez dias, chama a faxineira que já


trabalhava com ele anteriormente.

Vivemos em lua de mel e fazemos amor

quase todos os dias. Em algumas

ocasiões, eram duas vezes ao dia, pela

manhã e à noite. Como fiquei dolorida

demais, em algumas ocasiões, trocamos


a penetração por carícias íntimas com as

mãos e lábios.

Acho que nunca fui tão feliz.


Não fazia ideia do quanto também é

importante ter um homem que se satisfaz

e é feliz conosco, bem livre do mundo

de fantasias e fetiches em que vivia

mergulhada.

Às vezes, poso para ele apenas


envolta com um lençol cobrindo os meus
seios e intimidade, como aconteceu

ontem à noite. Em geral, Eric faz alguns


esboços, mas o seu trabalho nunca vai

adiante, pois ele acaba interrompendo


para ficar perto de mim.

— Ainda não sou capaz de

resistir a você nua e em pose sensual

sem que queira te tocar e cheirar — ele

mencionou em sua última tentativa de me


desenhar enquanto eu estava deitada na
chaise longue[44] , o sofá longo que se
assemelha a um divã.

Naquele momento, sem

dizermos uma única palavra, ele

abandonou o material na mesa,

aproximou-se devagar e levantou o

lençol o suficiente para revelar apenas a

minha vulva. Ajoelhou-se e me ofereceu


sexo oral, deslizando a sua língua

deliciosamente pelas minhas carnes


sensíveis. Também enfiou o nariz e

esfregou o rosto com vigor.

Só de me recordar, dispara uma


corrente elétrica por minha coluna.

Mas não parou por aí. Ele se

livrou de sua bermuda e me tomou de

forma selvagem, chamando-me de alguns

nomes impublicáveis. É que falar

pornografia o deixa mais excitado. Mas


não é sempre dessa forma. Há momentos
em que Eric prefere o silêncio, os

toques suaves e os beijos demorados.

— Estar dentro de você é a


melhor parte do dia — confessou. É

verdade, independentemente se nos

amamos de forma mais calma, ou

selvagem, ele sempre me deseja.

Eric parece ter uma

testosterona acima da média, porque


nunca vi um homem com tanta
disposição para o sexo como ele. Caso

dependesse só de sua vontade, não


teríamos falhado um dia sequer nesses

dois meses juntos. Mas nem sempre é


possível. Às vezes estou cansada

demais.

Enfim, a outra boa notícia é que

estou nos últimos dias no antiquário.

Consegui um emprego numa elegante


loja de lingerie, num shopping não muito
longe da casa de Eric, e começo na

próxima semana.

O único aspecto complicado


tem sido lidar com as pendências que

ficaram entre mim e Edgard. Desde o

dia em que brigamos, não o encontro

pessoalmente. Logo depois do Ano

Novo, eu o desbloqueei no celular e

trocamos algumas mensagens ríspidas,


pois ele se negava a assinar os papéis
para dar entrada no nosso divórcio.

Com o passar do tempo, ele

parece que foi aceitando a nova


realidade. Mês passado, por exemplo,

na companhia de Rose Hoover,

finalmente fui à antiga casa e busquei as

minhas roupas. Não as queria mais. Só

que ele insistiu. Eric também queria que

não as pegasse, mas não criou


empecilho quando decidi ir lá. Ele só
pediu que fosse na companhia da Rose,

o que também me deixou mais segura.

Combinei com Edgard o dia e


acertamos que ele não ia aparecer lá, o

que foi cumprido. Entrar naquela casa

me causou uma sensação esquisita. Nem

parecia que foi o meu lar por tanto

tempo. A casa em si era bonita e

confortável, mas os terrores que vivi ali


me fizeram não ter bons sentimentos com
relação ao local.

Neste momento, acabo de entrar

no café. Logo avisto Edgard numa mesa


mais recuada. Retiro o casaco e ando em

sua direção. Hoje sinto por ele uma

mistura de raiva e pena. Fomos muito

amigos e próximos num tempo que hoje

me parece longe, distante e triste, pois

foi numa cumplicidade doentia que


acabei me perdendo de mim.
— Boa tarde, Edgard —

cumprimento, seca.

Por alguns segundos, ele


paralisa, com os olhos fixos em mim.

— O... olá, Safira. — Ele meio

que se engasga e aponta uma cadeira

diante dele para que me sente.

Acomodo-me no assento e, de

imediato, abro a bolsa, retiro os papéis


e lhe entrego.
— Precisamos acertar o

divórcio aqui e dar entrada no


consulado para ele ser homologado no

Brasil — explico algo de que ele já tem


ciência, só por tensão mesmo.

Ele pega os papéis.

— Quer um café?

— Não, obrigada — respondo.

— Ah! Não vamos ficar assim,

como se fôssemos estranhos ou inimigos


— ele fala de modo amável e pede um
café para mim, do jeito que eu gosto,
descafeinado e sem açúcar.

— Não dá pra sermos amigos,

não é? Fica difícil depois que descobri

que me dopava, que colocou um sistema

de espionagem no meu celular e me rifou

numa aposta aos próprios amigos. O que

mais pretendia fazer? Cobrar por mim


como um cafetão? — indago, zangada.
— Não vamos entrar nesse

mérito. Eu errei, Sah. Errei feio e


pesado contigo e me arrependo muito

por isso. Estou pagando caro. Sei


também que só reconhecer não adianta.

Conduzi mal o nosso casamento, mas —

ele pontua, ergue levemente o dedo

indicador e arqueia as sobrancelhas —,

reconheça que você também não foi


legal comigo ao se envolver com Eric.
Na verdade, nem você e nem ele, que

era meu amigo.

— Não vim aqui discutir isso.


O combinado foi só colher a sua

assinatura pra o advogado dar

prosseguimento aos trâmites. Mas, já

que tocou no assunto, vou lhe confessar

algo. — Fito-o nos olhos, sem temê-lo.

— Não senti que te traía, porque você


sempre quis que eu fizesse sexo com
outro homem. Quis tanto, Edgard, que

acabei me apaixonando por um deles —


acuso de forma firme, e ele desvia o

olhar.

Não me recordo da última vez

que me dirigi a Edgard dessa forma, em

pé de igualdade. Sempre me considerei

inferior, submissa. Fui tão condicionada

a me sentir menos que ele por causa do


episódio na ilha, que não percebia a
falta de uma explicação lógica e

racional para isso. Era só sentimento de


culpa sobre algo que aconteceu num

milésimo de segundo, e eu não tenho


uma memória coerente do que

verdadeiramente aconteceu.

— Nunca poderei ter um filho,

Sah, tudo por causa do...

— Pare agora, Edgard. Passei


anos da minha vida me culpando por
isso. E você não deixou de ser estéril

por causa dessa culpa. — Sou firme,


mas meus olhos marejam.

— Desculpe. Não fui bom pra

você, mas isso mexe comigo. — Ele

pousa a sua mão sobre a minha, o que

me atormenta. Mas espero a garçonete

servir o meu café, então, retiro a minha

mão.

— Estávamos drogados, essa é


a verdade. Tomei pílulas de ecstasy, que

você me deu com álcool, naquela noite


na ilha.

— Não sou o vilão. Você

gostava de ficar louca.

— No fim da adolescência,

sim. Hoje sou outra pessoa, tenho pavor

disso. Aliás, há muitos anos sou outra

pessoa, Edgard. E você também mudou.


Aquele casal do passado não existe
mais. Assim é a vida. Há casais que

mudam e se adaptam juntos, unidos.


Outros se perdem no compasso das

transformações que o tempo nos exige.

Tomo um gole do café.

— Está do mesmo jeito careta

de Eric — ele desdenha. — Está feliz,

Sah?

— Estou...

Ele pega os papéis outra vez e


lê. Apanho uma caneta na minha bolsa e
estendo para ele.

— Esse documento é só para o


advogado iniciar o processo, ele

precisará de sua assinatura digital

depois — informo.

— Sei como é. Vou assinar isso

com o coração destruído. — Ele

finalmente assina o papel. — Não sente


falta de nós?
— Edgard, não comece, por

favor. Não tenho dúvidas.

Ele me devolve os papéis e a


caneta. Ponho-os no envelope e coloco

na minha bolsa.

— Obrigada, Edgard. — Dou-

lhe um meio riso e me levanto.

Ele também se levanta, faz um

sinal para a garçonete e me acompanha


até a saída.
— Tudo que queria era uma

segunda chance contigo, Sah.

— Não torne isso mais difícil


— digo.

— Ao menos me dê um abraço

— ele pede e avança para cima de mim.

Tento me desvencilhar, mas, por alguns

segundos, fico dentro de seus braços,

que só me dão repulsa.

— Então, amigos, Sah?


Dou um sorriso amarelo.

— Ainda nos veremos até a

conclusão do divórcio.

— Quer carona? — ele

pergunta quando já tinha lhe dado as

costas.

— Não, obrigada. — Apresso

o passo até desaparecer na primeira


esquina com o coração tamborilando

apressado.
Beberico um vinho enquanto

observo Safira concluir o nosso jantar.

O aroma faz o meu estômago revirar.


Admiro-a com um encanto ainda maior

do que quando a fitei pela primeira vez.

Safira é minha pedra preciosa, que

embeleza a minha vida, enchendo-a de

um mágico encanto e graça. Está linda,

num vestido lilás floral que se assenta às


suas curvas como uma luva.

Hoje Safira não aceitou a minha

ajuda para nada. Apenas me preparei


para ela. Tomei um banho, vesti uma

roupa mais nova e me perfumei.

Sempre tive receio da vida a

dois, porque gosto de ter o meu espaço e

vivenciar a minha solidão criativa.


Reconheço que às vezes sou rabugento,
mas Safi encara as minhas manias com
um riso no rosto. Além de respeitar

esses momentos, ela os compreende.


Além de todas as suas qualidades, nossa

química é tão forte que não consigo mais


me ver sem ela.

A verdade é quero tudo com

ela, ao seu tempo, é claro. Mas amo essa

mulher de uma forma tão intensa que até


me assombra. Desejo protegê-la e a

resguardar, mas não posso cair no erro


de seu ex-marido, que a sufocou. Ela

precisa viver e trilhar o seu próprio


caminho, sentir-se plena e realizada por

si mesma. E esse é o meu desafio,


colocar freios em meus impulsos e a

manter salva sem a reprimir.

— Hoje também é um dia

especial, porque finalmente Edgard


assinou os papéis do divórcio — ela diz

de modo causal.
De repente, um frio percorre a

medula.

— Como assim? Não me falou


nada. Ele foi no seu trabalho? —

pergunto, encabulado.

— Não, quando saí do

antiquário, fui encontrá-lo num café —

ela confessa um pouco constrangida.

Deposito a taça na bancada


com mais força que deveria, e o vidro
vibra.

— Tínhamos combinado que

não o encontraria pessoalmente sozinha.


Que iria chamar Rose ou mesmo essa tal

de Doris — comento aborrecido. —

Não sabemos o que ele é capaz de fazer.

Ela revira os olhos, descrente.

— Ele não vai fazer nada,

amor. Está conformado e tranquilo.

— Não acredito em Edgard. Ao


menos, poderia ter me contado — digo
realmente chateado.

— Amor, se eu tivesse contado,


você iria ficar aborrecido e preocupado

de forma desnecessária. Foi rápido e

num lugar público. E já entreguei os

documentos ao advogado. E estou muito

feliz. Não vai ficar contente comigo?

Passo a mão no rosto,


procurando não me deixar dominar por
esse aborrecimento.

Tive certo embate com Edgard

há alguns dias.

Saí do escritório no mesmo

momento que ele e nossos carros

estavam próximos no estacionamento

aberto do prédio. Ali, recordei-me das

tantas vezes em que peguei sua carona,


pois ia para academia correndo e depois
seguia para o trabalho. E, naquele
instante, não passávamos de dois

inimigos.

— A sua palhaçada com Safira


já foi bem longe, não? — ele provocou.

— Se engana. Está apenas

começando — rebati.

— Não vale nada, Eric. Ficava

posando de bom moço, cheio de


argumentos politicamente corretos e
depois roubou a minha mulher — ele
acusou. — Você a seduziu debaixo do

meu nariz. Você não vale nada, me tirou


tudo que eu tinha!

Desisti de entrar no meu sedan

e fui até ele com o rosto tomado de

raiva.

— Você a ofereceu a quem

quisesse como se fosse um item barato.


Enfim, não roubei o que me foi dado por
você. — Apontei o dedo indicador em
seu peito. — Se é do seu interesse, eu

amo Safira e estamos muito bem! Fique


longe, Edgard. Só fique longe com toda

a sua sujeirada — expus como uma


trovoada.

— Isso não vai durar! Safira

gosta...

Peguei-o pelo colarinho

interrompendo a sua fala. Edgard me


empurrava sem conseguir me afastar.
— Êpa! Nada de brigas, manos.

— John se aproximou e nos separou. —


São dois adultos.

Suspirei e o encarei.

— Você é um brutamontes,

Eric. Quando a sua máscara cair...

— Chega! — John o

interrompeu de modo autoritário. — É


uma situação chata, mas vamos seguir

em frente, cada um com a sua vida.


— Isso não vai ficar assim —

Edgard disse me fitando.

Então, John piscou para mim.


Abraçou Edgard e eles foram conversar.

Eu peguei o carro e vim embora.

Afasto as recordações da

mente, afinal, está tudo bem. É o que

importa.

Safira põe um prato com


suculentos medalhões de filé
acompanhados de batatas, na mesa

primorosamente arrumada por ela em


cada detalhe. Em seguida, serve um

pouco de arroz separadamente. Para


completar a minha perdição, ela cozinha
muito bem e faz tudo com muito amor.

— Tínhamos um combinado e

você não seguiu o que acertamos — falo

de forma sincera.

— Desculpe, Eric. Mas as


minhas intenções foram as melhores.

Queria trazer essa boa notícia, logo


hoje, que combinamos avaliar a nossa

relação — ela diz e retira as luvas de


proteção. Em seguida, acende as velas.

— Tudo bem, mas se ficarmos

quebrando acordos... — Não concluo a

frase, pois prefiro dar outro rumo à

nossa conversa.

Pego o vinho e me sirvo mais


um pouco. Ela segura a própria taça e
toma um gole, com um ar entristecido.

— Me perdoe. Tem razão, não


custava te enviar uma mensagem, mas

não queria te aborrecer. — Ela vem até

mim e deposita a mão no meu peito.

Abraço-a, rendido.

— Está tudo bem, amor —

afirmo e beijo suavemente os seus


lábios. Quando nos fitamos outra vez,
parece que a nuvem pesada se dissipou

entre nós. Seus olhos parecem arder em


duas brasas, o que me hipnotiza. Ainda

não me acostumei completamente com a


sua beleza. Aliás, talvez isso nunca
aconteça.

— Vamos? Espero que goste do

jantar — ela fala com um ar jovial e

lindo.

Dou-lhe um beijo suave,


coberto de afeto.

— Estamos completando quatro

meses juntos — comento, mudando de


assunto. — Parece que foi ontem, mas

também tenho a sensação de que se

passaram anos. Amo tudo isso que

estamos vivendo — declaro-me.

Não sou muito de externar as

minhas emoções, sou um pouco travado


nesse sentido, mas o meu peito só bate
para ela.

Safira sorri.

— Eu te amo, sou doidinha de

tão apaixonada — ela diz e beija o meu

peito. — Venha, amor. A comida vai

esfriar.

Jantamos romanticamente, à luz

de velas, uma comida deliciosa.


Conversamos amenidades, nos
admiramos e trocamos carinhos. Ao fim
do jantar, volto a falar da nossa relação.

— Então, Safi, estou aprovado

como seu namorado? Ou vai preferir se


mudar? — indago num tom leve.

Seus olhos se dilatam em puro

contentamento.

— Isso quer dizer que... está

feliz comigo aqui?

— Por acaso estou com cara de

quem anda aborrecido? — pergunto de


modo zombeteiro.

— Não... — ela responde.

Seguro as suas mãos.

— Quero você, Safi. Nem por


um segundo me imaginei sem você

morando aqui, mas preciso escutar se

quer continuar ou prefere sair.

— É claro que quero continuar,


Eric — Ela pega a minha mão e leva aos

seus lábios. — Nunca fui tão feliz em


toda a minha vida.

As suas palavras afagam a

minha alma, pareço levitar. Então,


abraço-a e roubo os seus lábios, toco os

seus seios, aperto as suas ancas. Em

seguida, sorrimos um para o outro, sem

mencionar uma única palavra, não é

necessário, afinal, nossos olhares


conversavam. Sempre foi assim desde o

primeiro encontro, mas só agora estamos


conseguindo decifrar a sua linguagem.

Após a refeição, colocamos os

pratos sujos na lava-louça e seguimos


para a sala.

Acendi a lareira, pois ainda

está um pouco frio em Austin. Liguei

baixinho uma playlist romântica e nos

sentamos no tapete, abraçados,


observamos as labaredas, em silêncio,

por algum tempo.


Então, toca You Are The

Reason, do Calum Scott. Fico de pé e


puxo-a para se levantar comigo. Safira

só ri, feliz.

Abraço-a e começamos a

dançar agarradinhos, lentamente. Não

precisamos mais de pressa para nos

amar. Temos todo o tempo do mundo ao


nosso dispor. Pressiono o seu cóccix
para juntinho de mim e passeio a outra
mão por suas costas. Meus sentimentos

explodem.

— Observe a letra dessa


música, Safi. É tão linda! E tão a ver

com o que sinto. “Lá se vai o meu

coração batendo e você é a razão” —

sussurro um trecho.

— Ah! Eric, te amo tanto, meu

amor. “Eu escalaria todas as montanhas


e nadaria todos os oceanos só para estar
com você” — ela murmura outro trecho
da canção.

Sorrio, feliz.

— Não pensei em encontrar um

grande amor dessa forma. — Nós nos

olhamos e eu posso perceber o seu amor

e sua paixão incendiarem seus belos

olhos azuis.

Seguro o seu corpo com


firmeza e saio bailando, feliz, por toda a
sala. Encantado por apenas existir diante

dela e me sentir o cara mais sortudo do


mundo.

— Eu te amo, Safi — digo bem

alto. — Porra, como te amo!!

Rodopio com ela, que sorri

feliz, o que me faz ser um homem

incrivelmente realizado.
Um mês depois

Finalmente, concluo a

arrumação no estoque da última coleção


de lingerie que chegou à loja. São peças

lindas para todos os tipos de gostos e

corpos. Estou amando o meu novo


emprego, como também as meninas com
quem trabalho, Dana, Lizie e Ashley, no

meu turno de seis horas, além das outras


que estão no turno oposto.

Embora o foco seja peças

íntimas, a loja também comercializa


outros produtos, como baby-dolls,
camisolas, corseletes, espartilhos e
meias. Inclusive, já comprei algumas
delas e usei com Eric.

Eric e eu continuamos muito

bem. Nos últimos dias, ele tem virado

algumas noites no ateliê, pois se

aproxima a data da próxima exposição.

Só que não permite que eu entre no

ateliê, nem para limpar. Fico um pouco


melindrada, mas procuro entender.
Enfim, dizem que artistas são

esquisitos, até passei a ler sobre a vida


de alguns deles. Ao menos, Eric não é

excêntrico, boêmio ou possui problemas


emocionais. É apenas ranzinza, sério e

metódico. Às vezes, tenho a impressão

de que ele tem mais idade que os seus

quase 31 anos.

Sorrio ao pensar nisso. A


verdade é que considero fantástico esse
seu jeito. Eric me passa segurança e
estabilidade e me sinto querida e amada,
mesmo que ele não seja afeito a fazer

grandes declarações de amor.

Parece que seu coração está

isolado por um grande muro que o

protege de mim, mesmo não se furtando

de viver intensamente esse amor. É meio

esquisito a coexistência dessas duas


situações, mas é real. Ao menos, sinto
essa situação.

Também ando um pouco

preocupada com o atraso da minha


menstruação. Mas acho que é só um

medo bobo. Quer dizer, espero que sim,

porque não saberia dizer qual seria a

reação de Eric caso soubesse. Afinal,

constantemente, ele me pergunta se estou

tomando o anticoncepcional da maneira


correta.
É que nunca fiz uso de

anticoncepcional antes, porque Edgard


era estéril e as relações com os touros

aconteciam com o uso de preservativos.


Então, eu me atrapalhei com o uso da

pílula e esqueci de tomar algumas vezes,

na loucura da mudança do apartamento

dele para a casa e as nossas saídas para

comprar os móveis. Eric não escolheu

nada sozinho, quis a minha opinião em


tudo.

— Safira, tem um sujeito aí

pegando calcinhas e sutiãs, mas ele não


fala inglês. Parece que é brasileiro. Vá

lá conversar com ele, que termino isso

aqui — conta Lizie, que puxa o

banquinho para ficar diante das

prateleiras.

Franzo o cenho, curiosa, depois


sorrio. Deve ser Eric, que veio mais
cedo do que o combinado. Decerto,
adiantou as compras de seus materiais
de pintura e, como é impaciente, veio

logo para o shopping.

— Obrigada, Lizie. Acho que

já sei quem é... — Sorrio para ela, que

faz uma careta. Lizie é uma garota de 19

anos.

Desço as escadas, ajeito a


minha farda, um tailleur marinho de
bom corte, com uma blusa branca por
dentro. Alegremente, avanço para o
salão onde estão as araras, mostruários

e manequins. Mas logo meu sorriso se


desmancha.

Não é Eric. É Edgard.

Reduzo os passos, já

planejando dar meia-volta, quando ele

me fita, sorri e vem em minha direção.


Meu coração dispara.
— Olá, Sah, resolvi te fazer

uma surpresa.

Continuo tensa. Edgard está


mais magro e elegante, a barba, curta e

bem-cuidada.

— Como descobriu meu novo

trabalho? — indago, apreensiva, pois só

Eric e Rose Hoover sabem que trabalho

nesse shopping.

— Relaxe, Sah. Vim dar um


simples “oi”. Na verdade, passei aqui
outro dia e, por coincidência, te vi aqui.

Não acredito no que ele diz.

— Vai levar as peças? —

Aponto para algumas que estão em suas

mãos.

Ele sustenta um sorriso

descarado no rosto, que me causa

repulsa.

— Só se você quiser usar pra


mim — murmura.

— Me respeite, Edgard, não

tem essa liberdade — reclamo.

Ele coloca as peças sobre a

bancada. Então, apanho-as, ponho numa

cesta e lhe dou as costas, com a

finalidade de sair dali.

— Desculpe, espere.

Aperto os olhos em busca de

forças e me viro em sua direção,


fitando-o em silêncio.

— Também posa nua para Eric?

— ele questiona num tom de desdém.

Faço-me de desentendida.

— De onde tirou essa

suposição?

Ele se aproxima de mim.

— Não consigo entender como


me deixou por causa de algo que
vivíamos juntos, para se enfiar numa
relação em que acontecem coisas das
quais você não participa — ele

acrescenta baixinho e estreita o olhar, do


jeito de sempre, como se tivesse uma

carta na manga para dar um xeque-mate.

— Não entendo o que quer,

Edgard. — Já estou nervosa.

— Vou mandar algo para o seu


celular e você tira as suas próprias
conclusões. Enquanto trabalha aqui, o
seu namorado pinta outras mulheres, ou
melhor, pinta com outras mulheres.

Gargalho.

— Está enlouquecendo? —

pergunto e finjo descrença.

— Porque não confere você

mesma... — ele diz e sai.

Meu coração bate acelerado.

As mãos gelam. Reponho as


mercadorias e, em seguida, pego o meu
telefone. Quando baixo as imagens
enviadas por Edgard, um ódio corrói as

minhas entranhas. São vários desenhos


de Helga, de rosto, de corpo e

completamente nua.

Levo a mão à testa, tensa. Um

frio sobe pela coluna e uma pressão

parece afundar o peito. Os traços dos


desenhos são de Eric. Observo melhor,
num deles tem até a sua assinatura. Será
que é esse o motivo de ele não permitir
que eu entre no ateliê?

Ele diminuiu a carga horária na

STW e tem trabalhado de casa, em

alguns dias. Então venho para a loja e

ele fica em casa. Aliás, isso acontece

em tantas ocasiões, que até fico com o

carro dele.

Uma forte decepção insiste em


me assaltar os sentidos. Será que Eric é
assim? Será que a inspiração dele vem
através da visão de mulheres nuas? Fui

tão imbecil que caí em sua lábia e por


isso ele levou tanto tempo sem ninguém?

São tantas perguntas que transpassam o

cérebro, que podem me fazer surtar.

Nunca falamos de fidelidade ou

cobramos algo um do outro. Quer dizer,


ele gosta de falar quando fazemos sexo,
“é minha e só minha”. Em outros
momentos, pede para que eu diga que
sou dele. Mas... nem sei o que pensar.

Lágrimas já marejam os olhos e ofuscam


a visão. E a vontade de pegar essa

Helga pelos cabelos só aumenta.

O tempo parece se arrastar.

Quanto mais penso, mais me desespero.

Será que esse é o real motivo de ele não


querer que eu entre no ateliê?
Lá é um espaço confortável

que, inclusive, tem um sofá grande...


Pego o celular e volto a navegar nos

desenhos de Helga. O ódio e o ciúme


voltam a me atormentar. Ela aparece

deitada em cima de um sofá! A oferecida

está com a genitália exposta. Consigo

até imaginar a posição dele diante dela,

desenhando-a.

Duas lágrimas descem pelas


minhas bochechas e eu as enxugo rápido,
para que ninguém perceba. Meu celular
vibra. Tem mensagens de Eric. Porém,

vejo a mensagem de Edgard, que é um


ponto de interrogação. Sinto-me

humilhada, mas tento resistir a acreditar

nisso, ao menos por causa de Edgard.

Envio: Essas imagens são

antigas, afinal, eles já ficaram juntos.

O desgraçado do Edgard
responde: Tire suas provas amanhã, por
volta das 11 horas.

Digito: Tudo que quer é me ver


separada de Eric e que eu volte com o

rabo entre as pernas para você. Mas

saiba que, se um dia terminar com ele,

nunca voltarei pra você!

Envio a mensagem e o

bloqueio, mas ele já plantou a


sementinha do mal em minha cabeça.
Quando estou mais calma, Eric

chega à loja com um largo sorriso nos


lábios. Mas não consigo disfarçar o meu

aborrecimento. Quase no automático,


apresento-o às minhas colegas. Em

seguida, vamos almoçar na praça de

alimentação, mesmo que já passe das 15

horas.

— Sei que não tenho sido um


bom companheiro nos últimos dias —

comento no carro, sentindo-me culpado,


quando voltamos para casa.

Safira quase não interagiu

enquanto almoçávamos. Em geral, ela

conversa bastante. Está apaixonada pelo

novo trabalho e me conta várias

situações do seu cotidiano. Quis

almoçar com ela para que pudéssemos


fazer algo diferente, porque estou sendo
sugado pelo trabalho.

Não posso abandonar a STW,

pois o projeto que desenvolvo está


quase no final, seria antiético de minha

parte e me fecharia portas no futuro. Não

quero sair do mercado de informática de

modo desonroso, sobretudo, na empresa

que me deu muitas chances.

Em contrapartida, em um mês,
estarei expondo numa das melhores
galerias de Miami. Vou levar alguns
trabalhos antigos, mas preciso
incrementar com telas novas, seguindo o

estilo do que fez sucesso em Nova York.


Enfim, com tantos afazeres, tenho dado

menos atenção à Safira.

— Já falamos sobre isso — ela

responde, com o ar entristecido.

— Conhece Cancún? —
pergunto.
— Não... — Ela me fita com

um olhar de peixe morto.

— Após a exposição, vamos


passar alguns dias lá. O que acha? —

Tento imprimir entusiasmo à minha

proposta.

— Pode ser — ela responde

bem baixinho.

— Meu amor, o que aconteceu?


— pergunto e acaricio a sua perna.
Ela suspira, coça as têmporas e

faz uma careta.

— É que... Edgard apareceu na


loja hoje — confessa com certa

dificuldade.

— Filho da puta! — esbravejo.

— Disse a ele onde trabalhava?

Edgard mais parece um

fantasma sobre nós.

— Claro que não contei — ela


rebate com certo ar de indignação. —
Não sei como ele descobriu.

— Não é possível que ainda


ele te monitore — acrescento, assustado.

Dou um leve soco no volante. — O que

ele queria?

— Ele... ele me provocou. Eu

estava no depósito, ele entrou na loja e

foi pegando algumas lingeries expostas,


mas só falava em português, até que as
meninas me chamaram. Então, quando
apareci, ele ficou com umas piadas...
inconvenientes — ela revela,

constrangida.

— Nem me conte o resto. Já

imagino a piada indecente. Desgraçado

— brado, tomado pelos ciúmes. — Na

segunda-feira, tenho reunião da STW,

vou confrontá-lo e ter uma conversinha


com ele. Vou exigir que se afaste de
você — exalto-me.

A raiva aperta o peito e

comprime a garganta.

— Não, Eric. Não tem

necessidade. Edgard é um problema meu

— ela contrapõe, de um modo um pouco

inflamado, o que me incomoda.

Cravo os olhos nos dela e a

encaro de maneira fria.

— Não vai me dizer que está


balançada por causa de Edgard! —
Elevo o tom.

— Eric, acha mesmo que


Edgard mexeu comigo? Está esquecendo

e jogando no lixo tudo que vivemos nos

últimos meses? — Safira põe as mãos

na cintura. — Acha mesmo? Por que a

pergunta? A sua ex, Helga, anda te

balançando por acaso? — ela retruca


sem disfarçar a zanga.
A minha mandíbula trava.

Nunca discutimos.

— Já te expliquei centenas de
milhares de vezes que Helga é uma

amiga. Por que sempre bate nessa

mesma tecla? — reclamo, impaciente.

— Por que você fez... — Ela

fecha a cara. — Por que ela tem fotos

suas em nas redes sociais?

Franzo o cenho e contraio o


nariz.

— Nem vou responder... — Eu

me calo, por alguns segundos. — Qual o


controle que tenho sobre as vontades

dela? Nenhum, as fotos não têm nada de

mais. Você é engraçada, Safi. Eu aceito

o seu passado, nem vou entrar nessa

questão, e você joga na minha cara

sobre um rolo que tive antes de você!


Quero que me explique racionalmente
por que faz isso — peço de modo mais
duro do que gostaria.

Seu rosto infla, os lábios


engrossam, como uma tromba, de tanta

zanga. E, de repente, acho graça de seu

semblante, mas estou com tanta raiva e

ciúmes de Edgard, que não consigo

relaxar.

Seguimos em silêncio até


chegarmos em casa.
Aciono o portão da garagem.

— Caso não me queira com o

meu passado, é só falar que vou embora.


— Safira parece ter remoído a questão

no restante de trajeto. — Mas, se me

quiser, tem que ser no modelo

tradicional de uma relação, com

fidelidade. — Ela me fita com o

semblante sisudo.

Estreito o olhar e também fecho


a cara. Entro na garagem, aperto o
comando para fechar o portão e, antes
de sair do carro, digo:

— Não consigo imaginar como

pode ser tão cabeça-dura! E depois eu

que sou ranzinza.

Abro a porta de trás do sedan e

começo a retirar as minhas compras,

sacolas com tintas, pincéis, produtos e


tecidos. Safira dá a volta ao redor do
veículo e vem me ajudar. Assim que a
fito, algo mexe dentro de mim ao
deslizar os olhos por suas curvas.

Sem o casaco da sua farda, que

esconde a blusinha justa, o seu corpo

sexy fica bem desenhado, ressaltado por

seu par de scarpin. Para completar, ela

continua com o semblante zangado, com

sua tromba quase quilométrica.

Não tenho estrutura para


aguentar isso e ignorar, ainda mais
consumido de ciúmes. Deixo as sacolas
no chão e avanço em sua direção. Ela

me fita, surpresa.

— Ah! — É tudo que a deixo

dizer, quando a cubro com os lábios e a

puxo de um jeito brusco para cima de

minha ereção.

Morro de tesão nessa mulher.


Beijo-a com vontade, como se fosse
possível devorá-la e provar cada
pedaço de sua pele. Comprimo a sua
pele rudemente, enquanto amasso a sua

roupa.

Pressionando-a contra a lateral

do capô do carro, enfio a mão por baixo

de sua saia e apalpo a sua bunda. Em

seguida, toco a sua calcinha, passando o

dedo por dentro dela. Quando afastamos


nossos lábios, com a outra mão, seguro a
sua mandíbula.

— Acha mesmo que a dividiria

com alguém? — indago, rouco de


desejo. — Acha que vou me tornar como

aquele filho da puta do Edgard?

— Não é isso... — ela

responde quase como um miado.

— Que língua você quer que eu

fale pra você entender que é minha,


somente minha? Me diga. — Chupo os
seus lábios e continuo brincando com o
seu clitóris. — Sou seu também, porra!
— rujo numa afirmação forte e

carregada de vontades.

—Hum... — ela emite um som

monossilábico.

Então viro-a sobre o capô e a

conduzo para a parte mais baixa da

lateral do carro. Checo a temperatura da


lataria, para ter certeza de que ela não
vai se machucar. Inclino-a e ergo a sua
saia abruptamente.

Safi solta um pequeno grito.


Puxo a calcinha para que fique toda

enfiada em sua bunda e lhe dou alguns

tapas, deixando a pele avermelhada.

Rapidamente, abro a braguilha,

liberando o meu pau.

— É o seu castigo por duvidar


de mim — sussurro em seu ouvido e
passo a língua no lóbulo da orelha. —
Vamos treinar um pouco pra me dar esse
cuzinho inteiro.

— É muito tarado, Eric — ela

murmura e balança a bunda de modo

erótico.

— É muito safada, Safira! Mas

é só pra mim, não é?

— Só pra você... e você tem


que ser só meu! — ela profere de modo
possessivo, o que aguça os meus
desejos.

Roço meu pênis duro em suas


nádegas e o pressiono um pouco. Em

seguida, afasto a calcinha, passo saliva

em toda a glande e o posiciono no seu

ânus. Devagar, empurro um pouco,

aguardando a reação dela. Envolvo-a em

meus braços, beijo a sua nuca e a


mordisco. Em seguida, chupo a sua pele
e avanço mais um pouquinho dentro
dela.

— Essa porra é sua! — berro


ferozmente, tomado de tesão. — Não vê

como sou doido por você? — indago.

Safira apenas emite sons

guturais, em sua mistura de incômodo e

prazer. Confesso que morro de vontade

de enfiar bastante, mas não suportaria


vê-la sofrer, nem seria correto sem o seu
consentimento. Então, contento-me em
seguir devagar. Aos poucos, já consigo
colocar até um pouco mais que a glande,

mas nunca me movimento rápido. É tudo


muito sutil e gostoso.

Ela reclama, apertando a minha

camisa, então paro. Retiro meu pau e a

viro pra mim, enchendo-a de beijos.

— Vamos tomar um banho,


depois pegamos essas coisas — ela
propõe e desce a sua saia. Cabisbaixa,
encosta a sua testa nos meus lábios.

— Vamos fazer assim: você vai


subindo, encha a banheira, que daqui a

pouco subo. Vou levar essas sacolas

para o ateliê, porque mais tarde tenho

que trabalhar — contraponho, quase num

sussurro.

— Anda recebendo alguém


aqui nessa casa? — ela pergunta de uma
hora para outra, o que me causa
estranhamento.

— Como assim? Foi Edgard


que colocou coisas na sua cabeça? —

rebato.

— Só queria saber, porque

também nunca me deixa entrar no ateliê.

Bufo, zangado.

— Não sei o que passa na sua

cabeça, mas deixei claro que verá as


minhas telas quando eu decidir. Disso,
não abro mão — declaro de modo sério.

Viro-me para apanhar as


sacolas, e ela segue pela porta lateral

para o interior da casa. Essa decisão

pode ser uma intransigência ou um

exagero de minha parte, mas quero que

ela se surpreenda. Tenho trabalhado

duro para que consiga cumprir os


cronogramas e fazer com que as coisas
aconteçam do jeito que imagino.

Gostaria de fazê-la feliz de

várias maneiras.

Logo em breve teremos outro

carro estacionado na garagem. Então ela

terá o próprio veículo para usar como

quiser, e torço para que ela goste dessa

surpresa. Afinal, estamos morando num

condomínio ainda mais isolado do que o


que ela morava anteriormente. Então
hoje mais cedo encomendei um SUV,
pois preciso de um veículo mais amplo
para carregar as minhas telas, ao invés

de ficar fazendo gambiarras no fundo do


sedan.

No fundo, estou vivendo com

Safira até o que tinha medo de sonhar.

Sem que eu consiga resistir, ela me traz

a paixão, o afeto e o companheirismo


que não imaginava ter, mas de que, nem
por uma fração de segundos, estou
disposto a abrir mão. Eu a amo demais e
tenho certeza de que nascemos um para

o outro.

Tudo que quero é cativá-la e ter

mais confirmações sobre esse amor.

Tudo que desejo é o conforto da certeza

dela para mim...


Dia seguinte, uma sexta-feira

Há algo no ar que não consigo

entender. Após nosso amasso safado na


garagem, ontem, quando retornei para o

quarto bem animado para continuarmos,

Safira já estava tomando banho e com a


porta fechada.

— Safi... — Bati na porta, pois

fiquei preocupado. — Você está bem?

— Estou com enxaqueca — ela

contou. Quando saiu do banheiro, estava

tão pálida que a minha preocupação


aumentou.
Abracei-a e beijei as suas

têmporas.

— Não queria que sentisse


essas dores — falei de forma carinhosa.

— Acho que é a tensão pré-

menstrual, vou deitar um pouco e

esperar que passe.

Troquei de roupa e, por um

tempo, eu me deitei ao seu lado,


encaixado em seu corpo, fazendo-lhe
afagos, mas ela permaneceu em silêncio.
Beijei suavemente os seus lábios e fui
para o ateliê com o coração apertado,

pois queria mesmo era continuar


abraçado com ela.

Quando retornei para o quarto,

Safi já dormia. Tomei um banho e fiquei

sentado ao seu lado, admirando-a por

um tempo. Em seguida, afaguei os seus


cabelos e murmurei baixinho para que
ela despertasse:

— Te amo tanto, minha linda!

Naquele momento, constatei

que nunca fui tão apaixonado por

ninguém como sou por ela. Tenho uma

certeza absoluta de que a quero sempre

ao meu lado. Acariciei a sua pele e fui

preparar um copo de leite morno para

ela não dormir de estômago vazio.

Hoje ela saiu cedo para


trabalhar, mas continuava com aspecto
enfezado. Não perguntei mais sobre o

motivo, deduzi que fosse a TPM[45] dela,


que a deixa dessa forma.

Desde cedo, estou no escritório

de casa trabalhando no projeto de

informática. Em geral, fico nele a manhã

inteira e parte da tarde. Em seguida, vou


para o ateliê.

Então, meu celular chama


insistentemente.

Na tela, aparece o nome

“Helga”.

Estreito o olhar. Em um

primeiro momento, resolvo não atender.

Mas ela insiste. E, ao mesmo tempo,

escuto a campainha tocar. Estranho.

Pego o celular e observo o sistema de

monitoramento que instalei na área


externa da casa. Assombro-me quando
vejo Helga do lado de fora.

— Puta que pariu! Isso cheira à

merda.

Sigo para a porta principal,

com uma sensação estranha. Em

segundos, repassa na mente a visita que

Edgard fez à Safira no trabalho e as

perguntas dela, justo sobre Helga. Mas,

como nada fiz de errado, abro a porta.

— Oi... Helga — digo um


pouco sem graça enquanto ela estampa
um sorriso na face. — Como descobriu
o meu endereço? O que faz aqui? —

pergunto direto.

Seu aspecto suave e alegre se

modifica para um semblante

desconcertado. Alguns alertas acendem

dentro de mim.

— Oi, Eric, bom dia! — Ela


sorri, contente. — Você me enviou seu
endereço, esqueceu? — Ela olha para o
interior da sala. — Não vai me convidar
para entrar?

Saio da frente e contraio o

cenho, em estranhamento. A mente

começa a dar um nó, o que aumenta a

minha apreensão. Parece uma cena

surreal se desenrolando diante de mim.

— Como assim enviei o meu


endereço? — questiono por trás de
Helga, após fechar a porta.

— Que casa maravilhosa, Eric!

É linda, amei, um encanto — ela elogia,


curiosa.

Seus olhos se perdem na sala

ampla, branca, com alguns quadros meus

na parede. Os móveis são clássicos, em

madeira clara e o estofamento entre o

champanhe e o gelo, com alguns


discretos acabamentos em ouro
envelhecido.

— Na verdade, é mérito da

minha namorada. Ela praticamente


escolheu tudo — digo e, pela primeira

vez, estranho me referir a Safira como

namorada. Ela é muito mais que isso. —

Sabe que vivo aqui com Safira, não é?

— Cruzo os braços no peitoral.

— Bom, ela tem muito bom


gosto. E sim, vi fotos de vocês nas suas
redes sociais. Não há risco de ela
aparecer, há?

Como assim? A cada instante,


fico mais confuso e não pego o fio da

meada.

— Não vou bancar o bom moço

o tempo todo! — falo, num tom duro. —

O que veio fazer aqui afinal? Como

conseguiu meu endereço?

Meus instintos indicam que tem


o dedo de Edgard nessa merda.

Ela levanta o ombro, com o

aspecto encabulado.

— Estamos conversando há

alguns dias. E você me fez o convite...

Eu é que não estou entendendo essa sua

grosseria. Se não me quer, por que me

convidou?

Bufo, indignado.

Puta que pariu!


— Que merda estávamos

conversando por acaso? Está doida,


Helga! Não converso contigo desde

Nova York! — continuo com o tom


elevado e aborrecido.

— Mas...

O suave barulho da porta sendo

aberta interrompe a fala de Helga.

Safira avança de modo abrupto


e me encara com seu par de olhos azuis
mais frios que as geleiras do Ártico.
Uma raiva se alastra por ter a sensação
de que fui feito de idiota. Uma corrente

fria parece subir, enroscada à minha


medula, e se espalhar pelo corpo.

O semblante enfurecido de

Safira ocupa os meus sentidos. Vou até

ela.

— Amor, está tudo bem? —


pergunto, sem saber o que dizer.
— Sou eu quem tem que

perguntar isso, não? — Ela desvia o


olhar para Helga. — Como vai?

— Olá, Safira, acabei de

perguntar por você a Eric — Helga diz,

tentando parecer alegre. — A casa é

ótima! — acrescenta e se senta no sofá.

— É de Eric — ela responde e

dá um meio sorriso.

Seguro a mão de Safira e a


sinto gelada e trêmula, mas logo ela se
desvencilha de mim.

— Tem algo errado


acontecendo... — sussurro para ela.

— O que está acontecendo é

que você... é que você é um safado —

Safira vocifera para que Helga a escute.

Em seguida, parte em direção às

escadas.

Meu peito afunda, a sua fala me


atinge em cheio. É a desconfiança que a
cínica da Helga veio plantar.

— Não tenho nada a ver com


isso — Helga alardeia, mas a

ignoramos.

Em passos vigorosos, vou até

Safira e a seguro num firme abraço antes

que suba a escadaria. Ela tenta se

desvencilhar de mim e espalma o meu


peito.
— Calma! Vamos resolver isso

agora — digo, já tomado pela raiva


devido à situação. — Só pode ter sido

Edgard que planejou esse mal-


entendido.

— Gosta de transar com as

mulheres que posam pra você — ela

acusa entredentes.

Arregalo os olhos.

— Não! Safi, não acredito que


pensa isso de mim! — Fito no fundo de
seus olhos. — Não faço isso.

Vou afrouxando o abraço,


atônito. Safira paralisa, com lágrimas já

abundando os seus olhos. Meu peito

aperta e aumenta a minha irritação.

— Acho que já vou embora.

Não pensei que iria causar problemas

— Helga frisa ao se aproximar de nós.

— Vai nada, Helga. Só sairá


daqui quando esclarecer quem te deu o
meu endereço e te instruiu para vir aqui.
Foi Edgard, não foi? — questiono com

brutalidade.

— Não! — ela nega sem graça

e suas sobrancelhas se unem. — Já disse

que foi você.

Seguro Safira pela mão e

avanço sobre Helga.

— Prove que fui eu, porra!


Vamos acabar com essa conversa mole,
dona Helga.

Então, Helga pega o seu


celular, desbloqueia, abre o aplicativo e

me entrega. Leio as mensagens,

perplexo.

O perfil tem até foto minha. São

muitas mensagens de sedução barata, em

que a convido para uma aventura


secreta, “um dia de sexo tórrido”. Nem
foco direito na escrita para que Safi, que
está ao meu lado, não se impressione.

— Esse número não é meu,


entenda... — alego, apreensivo. — Nem

escrevi essas mensagens.

— Mas... mas você disse logo

no início que esse era o seu aparelho

secreto! — Helga revela desconfiada e

seus olhos pousam sobre Safira, que está


ao meu lado.
— Eu? — pergunto, revoltado.

— Não, Helga, não escrevi nenhuma


dessas linhas, nem tenho celular secreto.

Recordo-me do aparelho que

dei a Safira. Essa é uma vingança

escrota de Edgard, não tenho a menor

dúvida.

Começo a printar toda a

conversa desde o início, possesso de


ódio.
— Você tem algum tipo de

envolvimento com Edgard? — Mais


calma, Safira pergunta a Helga, que

passa a mão na testa e demonstra tensão.

— Sim... nós estamos

envolvidos, mas é algo liberal, como era

o seu casamento com ele.

— Eu não tinha um casamento

liberal, mas se Edgard pensa assim, tudo


bem, não me importo — Safi responde
enquanto pega algo em sua bolsa. — Eu
era oprimida e não me dava conta disso.

Helga solta um riso. Safira e eu


a encaramos, e ela, então, desconcerta-

se.

Safira abre o seu celular e nos

mostra desenhos que fiz quando tive um

envolvimento com Helga.

— Edgard quem me mandou e


ele também me disse que você, Helga,
viria aqui se encontrar com Eric.
Insinuou que vocês tinham algo.

Quando escuto essa história,


minhas desconfianças se confirmam.

Canalha!

— Edgard, é um filho da puta.

Esses desenhos são antigos. Fiz e

presenteei Helga. E ele lhe fez acreditar

que eram novos — brado e fito Safira,


estarrecido. — E você, que sabe quem é
o canalha do Edgard, acreditou? —
Meus olhos dilatados caem sobre os
dela de uma maneira mais brutal do que

gostaria.

Bufo e saio andando pela sala

para não explodir e ser injusto com

Safira.

Helga chora. Safira ainda está

muito tensa.

Retorno para perto delas com o


dedo em riste em direção à Helga.

— Se ainda vai conversar com

Edgard, diga que esse plano dele foi


ridículo, mas que ele não vai ficar

impune. Terá um preço — vocifero.

— Eu não mostrei esses

desenhos a Edgard — explica Helga.

— Ele deve ter acessado

arquivos seus, ou deve ter encontrado os


desenhos em sua casa. Ele é o mestre da
sujeira — digo.

Abraço Safi, mesmo ressentido

pelos pensamentos dela sobre mim.


Sorvo o seu cheiro, o que me acalma. O

filho da puta tentou, mas não conseguiu

plantar a discórdia entre nós.

Em seguida, sentindo-se usada,

Helga se desculpa e vai embora.

Acabamos de sair do
departamento de polícia de Austin, onde
prestei queixa contra Edgard, por
falsidade ideológica. Entreguei os prints

que tirei do telefone de Helga. Tivemos


sorte, pois fomos atendidos por uma

mulher, a tenente Madison Cruz.

Então, contamos toda a

situação, desde os abusos que ele

cometia com Safira, as manipulações


para que ela aceitasse os fetiches e as
bebidas com drogas. Explicamos por
alto como se deu o nosso envolvimento,
como também sobre a separação dela.

A tenente Cruz não nos julgou,

mostrou-se indignada diante o relato e

ainda informou que em breve Edgard e

Helga serão convocados para depor. Ela

também fez recomendações sobre a

nossa segurança e nos instruiu a


constituir um advogado.
— Ele pode estar seguindo

vocês ou pagando algum detetive — ela


alertou. — Homens assim são perigosos.

Afeta o psicológico da vítima para


depois agir — ela avaliou. A tenente nos

deu um número em que podemos falar

com ela ou com alguém de sua equipe,

caso haja alguma necessidade.

Safira está aterrorizada.

Acionei a empresa que presta


serviço de segurança no condomínio
para verificar o sistema da casa. Ainda
da polícia, liguei para Tony e sondei

como anda Edgard.

— Ele pediu para se desligar

da STW. Arranjou uma oportunidade em

Singapura. Isso será bom pra você, mas

foi péssimo para nós, sabe como ele é

importante — contou Anthony.

— Quando ele vai embora? —


perguntei.

— Em uma ou duas semanas,

acredito — chutou Tony.

Fiquei preocupado. Talvez ele

queira se vingar de nós até partir, mas

não revelei nada a Safira para não a

preocupar ainda mais.

Neste exato momento, estamos

no carro voltando para a nossa


residência. Começamos a conversar
sobre o fato de ela ter fraquejado diante
da acusação de Edgard de que eu estaria
sendo infiel.

— Temos pouco tempo juntos,

mas o sentimento que nos une é muito

forte, então, não há espaço para

desconfianças. Não aceito que pense que

eu seria capaz de colocar uma mulher

dentro de casa, para servir de modelo e,


em seguida, fazer sexo com ela. Isso me
parece tão infantil e pastelão! Olhe, se
fosse o contrário e fosse a mim que
Edgard quisesse enganar, não acreditaria

numa coisa desse tipo.

— Sei que foi ridículo. Mas

você sabe como é a minha mente e por

tudo que já passei — ela fala com um ar

abatido.

— Isso me magoou, Safi. Já


deixei claro que quero que tenhamos
uma relação totalmente diferente do que
você viveu, bem longe de fetiches. Não
preciso de fantasias. O que temos já me

completa inteiramente. Além disso, sou


um homem, não uma máquina de fazer

sexo. Acha mesmo que teria disposição

para aventuras, após tanto amor que

fazemos? — Acaricio a mão dela, que

está fria.

— Me desculpe... minha cabeça


está um caos. Eu fiquei com ciúmes e
isso ofuscou a situação — ela tenta se
explicar, num fio de voz. — E depois a

casa é sua. Não sabia se pintar mulheres


nuas fazia parte de seu processo

criativo. Artistas podem ser excêntricos

e esquisitos.

— Deveria ter me mostrado os

desenhos de Helga que Edgard te


enviou! Não sou excêntrico, posso até
ser um pouco ranzinza... E, pra deixar
claro a você, não tenho interesse em
desenhar mulheres peladas. Fiz pra

Helga porque ela me pediu, insistiu. Foi


lá no apartamento só para isso, na

época. Concluí os desenhos e a

presenteei... Fiz contigo porque foi uma

exceção, eu quis. Tenho interesse neles,

porque você é linda, tem uma estética

que me emociona e eu... eu te amo, Safi.


— Ah! Eric, me perdoe — ela

pede chorosa e afaga a minha perna e


braço.

— Está tudo bem, amor.

Apesar da minha chateação, eu

a compreendo. Safira foi atormentada

pelas loucuras de Edgard, por muito

tempo. A mente dela ainda está

acostumada com esse tipo de pressão


por parte dele. Mesmo que não perceba,
sutilmente o desgraçado ainda consegue
influenciá-la. Ela precisará lutar para se
livrar completamente do que passou.

— Se lembra que, na última

videochamada que fizemos com a sua

irmã, a Agatha insistiu para que fizesse

uma terapia? Precisa fazer, Safi.

— Vou marcar. Juro que vou

começar a me cuidar. É que estava tudo


tão bem entre nós que... imaginei que
não fosse precisar desse suporte.

— Precisa, sim, meu amor.

Eric recebeu o pessoal da

empresa de segurança, que revisou o

sistema; em seguida, ele voltou a

trabalhar em seus projetos. Preparei


nossa refeição, comemos com

tranquilidade, sem tocarmos mais no

assunto sobre Edgard, embora esse


pareça pairar sobre nós como uma
assombração.

Tomei um banho e tentei


distrair a mente, assistindo a um pouco

de televisão no porão, onde montamos

uma sala íntima para tevê. Estou

envergonhada por não ter desconfiado

da armação de Edgard. Não sei onde

estava com a cabeça que não consegui


analisar a situação com clareza. Fui
movida por um ciúme cego.

Enfim, ontem, pedi a Emma,

uma das garotas do segundo turno da


loja, que trabalhasse a partir das 10

horas, pois já tinha feito esse tipo de

favor para ela. Então, saí do shopping

com sangue nos olhos para tirar a limpo

a história desse encontro de Helga e

Eric.

Apesar do meu papel de idiota,


sinto-me aliviada por meus temores não
terem se concretizado. Afinal, não estou
preparada para ver o chão ruir aos meus

pés. Mas confesso que, quando abri


aquela porta e me deparei com Helga,

tive vontade de avançar sobre ela.

Agradeço aos céus por não ter me

prestado a esse papelão.

Enfim, estou mais tranquila, não


me importa o que tenha de enfrentar, se
for ao lado de Eric, está tudo bem.
Apesar do medo de Edgard tentar
prejudicar a nossa relação, há algo que

está me atormentando bem mais que


isso.

É o medo de estar grávida. Não

sei como contar a Eric, pois ele não toca

nesses assuntos sobre crianças. Se

encontramos algum bebê na rua, ele é


incapaz de mencionar algum comentário
fofo ou fazer qualquer brincadeira
mínima. Sem contar que ele me pergunta
sobre as pílulas todos os meses.

Amanhã vou comprar um teste

de gravidez. Além disso, não sei se é

psicológico, mas me sinto estranha. As

roupas estão apertadas na cintura, os

bicos dos seios parecem mais duros do

que o de costume. Tenho ficado enjoada.


Hoje pela manhã vomitei, mas fui usar
outro banheiro para Eric não desconfiar.

Levo as mãos às têmporas,

preocupada. Estou tão consumida por


essa situação que nem percebo a noite

cair.

— Safi, vamos dormir. — Eric

me desperta dos meus dilemas.

— Já vai dormir agora?

— Vou, amor, quero ficar

contigo. Estou bem preocupado — ele


expõe.

Levanto-me do sofá com

preguiça e o abraço.

— Eric, você é tudo pra mim.

Nunca amei ninguém como te amo.

Ele sorri e acaricia os meus

cabelos.

— É linda de todas as formas.

— Se você me quiser, eu te
quero para todo sempre... — confesso.

Eric me abraça apertado.

— Te amo muito, Safi.

Após essas declarações,


subimos para o quarto.
Sábado

O céu cinzento de Austin, nesse

início de outono, pesa na minha alma.


Uma nuvem de preocupação paira sobre

mim. Pela manhã passei mal outra vez,

mas consegui esconder de Eric. Fui à


farmácia, antes de vir trabalhar, e já
comprei o teste. Vou usá-lo quando

chegar em casa. Se for positivo, conto


logo a Eric e enfrento o que tiver de ser.

Parece que escuto a minha mãe

me chamar de irresponsável e minhas


irmãs fazendo coro. Quer dizer, talvez
Esme não.

Sofri rápidas sensações de

tontura durante o turno de trabalho, que


foi movimentado e vendeu bem para o

público mais seleto para o qual a loja é

voltada, pois os preços são um pouco

salgados. As meninas me convidaram

para uma happy hour mais tarde. Disse

que não poderia, porém me comprometi


a ir ao próximo encontro. Sair com
colegas de trabalho para bater um papo
é algo tão simples e nunca fiz na vida.

Respiro fundo, em busca de


forças para voltar para casa e fazer esse

exame, que está devidamente guardado

na minha bolsa. Saio do terraço do

shopping após me fartar do vento e da

paisagem hostil de céu nublado. Estou

bastante receosa. Os meus instintos


dizem que estou grávida.
Meu coração parece bater em

minhas mãos. Tenho medo de como Eric


vai reagir e como essa notícia irá

impactar a nossa relação tão recente.


Receio que ele não queira que eu

continue com a gestação e proponha um

aborto, que não é liberado no Texas, mas

pode ser feito com tranquilidade em

boas clínicas no México, nem tão longe

daqui, ou, quem sabe, em outro Estado,


onde a prática é liberada.

Pego o elevador e desço para a

garagem. Envio uma mensagem de áudio


para ele:

— Amor, estou voltando pra

casa. Neste exato momento, estou no

estacionamento.

Sigo em busca do sedan no

pátio do estacionamento.

Prontamente, ele envia outra


mensagem:

— Entrou no carro?

— Já vou entrar — respondo.

Após o que Edgard fez, Eric


pediu que lhe comunicasse o exato

momento em que chegasse e saísse do

shopping. Depois da conversa com a

tenente Cruz, do departamento de

polícia, ele ficou bastante preocupado.


Tentei tranquilizá-lo, mas, ontem à noite,
Eric até pediu que parasse de trabalhar
por algum tempo, mas me neguei a fazer
isso.

Vou até o carro e destravo à

porta.

De súbito, sou envolvida por

um braço e sinto algo frio encostar na

minha nuca, por baixo dos meus cabelos.

Assusto-me.

— Vamos, Safira, não resista


porque não terei o menor pudor de
cortar a sua pele e desfigurar a tua cara,
depois de tudo que você me fez nessa

vida. — É a voz de Edgard, carregada


de ira.

Meus olhos parecem pular das

órbitas. Tremo. Paraliso. Minhas pernas

cambaleiam e perdem força, e um gelo

se espalha pela minha medula. Estou


com o celular na mão. O que mais ele
quer de mim? Sem olhar para a tela,
aperto, no que espero ser um botão para
enviar áudio.

— Edgard... não faça isso, por

favor, não me machuque — digo num

tom alto.

Mas ele percebe o que acabei

de fazer, toma o celular, joga no chão e

me empurra violentamente contra a porta


do veículo, estacionado ao lado do
sedan de Eric. Protejo a minha barriga
instintivamente. Grito. Minha bolsa cai
no chão, junto com a chave do carro.

— É uma cadela mesmo... —

vocifera.

Movida pelo impulso, tento

escapar. Mas Edgard bloqueia a minha

passagem e encosta a adaga na minha

barriga.

— Será que preciso te furar


para você entender que não estou de
brincadeira? Decida — ele ameaça.

— Seu verme desgraçado! —


brado.

Penso na possível gravidez,

com a lâmina apontada para o meu

ventre. Olho ao redor, mas ninguém

aparece. Levo as mãos ao rosto, em

desespero. Edgard abre a porta do


veículo e me empurra para dentro, mas
resisto.

— Cretina! — ele fala

entredentes e puxa um revólver de sua


cintura e encosta em mim.

Meu coração dispara. Acabo

cedendo e entrando no veículo.

Em sequência, ele joga a minha

bolsa aos meus pés. Volto a observar ao

redor e ninguém vê o que está me


acontecendo, o local está ermo. Com
vigor, ele estica o meu pulso e o prende
com fita, em seguida, repete a ação com
o outro, unindo os meus dois pulsos com

uma fita larga, dessas prateadas e de


forte adesão. Em seguida, põe o cinto de

segurança em mim. Então corre para

ocupar o lugar no banco do motorista.

Penso em sair correndo, mas nunca

conseguiria me livrar do cinto em tempo

hábil.
— Isso não vai acabar bem. Me

deixe ir embora — peço assim que ele


entra no veículo.

— Me tirou tudo, Safira, e

depois me chutou como cachorro de rua

— alega.

— Não, eu não fiz isso —

respondo em desespero.

Torço para que tenha


conseguido enviar o áudio para Eric.
— Fez! — ele berra e esmurra

a minha perna, o que me faz gritar de


dor.

Edgard está transtornado, com

os olhos dilatados.

— Pare de mimimi! Cale essa

boca — ele exige e me mostra a faca,

uma espécie de adaga, cortante nos dois

lados da lâmina.

Logo entendo por que ele pede


que me silencie. Passamos pela saída do
estacionamento, que é monitorada por
câmeras. Milhões de possibilidades

passam na minha cabeça, mas nada é


viável.

— Por favor, se acalme, vamos

conversar. Eu não tenho culpa de nada

que aconteceu. Foram as circunstâncias.

Além disso, nossa relação já tinha


acabado. Só nós que não nos demos
conta. — Já choro.

— Não aguento mais essa

conversa repetida — ele berra.

Silencio. Um amargor

comprime a garganta. Uma onda de

náusea revira o meu estômago. Meu

coração bate acelerado. Vejo as pessoas

nos veículos e as fito, apelando por

socorro com o olhar. Em seguida,


percebo a película do vidro do carro e
constato que quem está do lado de fora
não consegue me ver direito.

Sinto falta de ar devido ao


choro, mas, em seguida, procuro

controlar a respiração. Penso na minha

possível gravidez, que Edgard nem pode

desconfiar.

— Para onde está me levando?

— Vamos pegar a interestadual.

Então, localizo-me. Edgard


segue para pegar alguma autoestrada na
direção sul. Começo a me bater no
banco, em desespero. Ele quer me levar

para fora de Austin. Nunca vou ser


encontrada.

— Pare, Edgard. Eu imploro,

por tudo que há de mais sagrado. Me

deixe sair — suplico.

Ao parar no sinal, ele pega a


faca e encosta na minha coxa,
pressionando-a. Meu coração parece um
tambor, então, aquieto-me. Tento abrir a
porta de qualquer jeito, mas o puxador

não funciona.

— Quer sangrar até morrer, não

é? Ou prefere um tiro nessa sua cara?

Solto um grito de raiva.

— Por que está fazendo isso?

Vai destruir a tua vida, não vê?

Ele volta a guiar e pega o


caminho para a I-35 S[46].

— A minha vida já está

destruída. O que estou fazendo é

remendá-la. Quem sabe, o remendo se

solidifica e tudo volta a ser como antes.

— Nada voltará a ser como

antes, Edgard. Pra onde estamos indo?

Estou apavorada. Não sei o que

fazer. Minha cabeça não consegue


pensar em nada racionalmente.
— Em quatro horas, estaremos

fora dos Estados Unidos — ele avisa.

Meu coração parece parar,


meus intestinos reviram.

— Vai me levar para o

México? Não faça isso, por favor.

Edgard acaricia a minha perna,

levanta a saia e toca a minha coxa. Uma

angústia se dissemina por mim, junto


com nojo e repulsa.
— Vamos embora e

começaremos uma nova vida juntos. Aos


poucos, vai voltar a me aceitar.

— Para de me tocar, Edgard —

imploro, tomada pela repulsa.

— Conheço o seu corpo como a

palma da minha mão... — ele diz, mas

retira a mão de mim.

Suspiro e fecho os olhos,


lágrimas voltam a rolar de nervoso.
— Os anos em que me explorou

não foram suficientes? Me deixe em paz,


pelo amor de Deus!

— Nunca te explorei. Eu te

tratei como uma rainha. Quem te colocou

isso na cabeça foi o filho da puta do

Eric? — ele berra.

Minha garganta trava.

— Me deixe viver a minha


vida, por favor — volto a suplicar.
Um desespero crescente me

toma. Se estiver grávida, meu filho corre


riscos.

O tempo desafia a minha

sanidade.

Já estamos há quase duas horas

na estrada. Minha mente não para,

preciso encontrar uma forma de sair

dessa situação. Seremos parados pelo


serviço de emigração antes de
atravessar a fronteira. Talvez essa seja a
minha chance de gritar e dizer que estou
sendo levada à força.

Porém, há o risco de Edgard ter

feito alguma armação para que eu seja

levada para o México por algum serviço

criminoso. E se isso acontecer, não sei o

que será de mim, afinal, ele está louco.

Só resta uma saída. Talvez tenha chance


se eu provocar um acidente, mas estaria
colocando a minha vida e a do provável
bebê em risco.

— Por favor, vamos ser


racionais. Esqueça isso que aconteceu,

me deixe ir embora — tento dissuadi-lo

mais uma vez.

Ele gargalha.

— Achava mesmo que ia viver

um “felizes pra sempre” com aquele


ladrão de esposa? Achou mesmo que eu
ia sair do nosso casamento conformado?
Acho que fingi bem — ele debocha.

Estreito o olhar e o fito,


indignada.

— O que pretende? Nos deixe

em paz, por favor — berro.

— Controle-se, Safira. Estava

só dando um tempo pra você ter as suas

memórias com o touro e contar pra mim


a partir de agora. Afinal, sabe que gosto
de assistir, mas também adoro escutar
sobre você e outro. Acho que teremos
um longo repertório para você sussurrar

no meu ouvido enquanto nos amamos.

Meu estômago revira, a bílis

vem até a garganta. Respiro fundo e

consigo evitar o vômito. Nem sei se é de

tanta repulsa pelo que escuto, ou por

causa do meu estado.

— Vai me contar tudo que


viveu na cama com Eric, eu mereço
saber, em nome de nossos bons tempos.
— Ele para por alguns segundos. —

Não quero machucar você, afinal, eu te


amo. Nunca imaginei te fazer mal. — O

tom dele vai se acalmando. — Vai

comigo pra Singapura. Arranjei um bom

emprego lá. Mas primeiro vamos sair

dos Estados Unidos pela fronteira com o

México, por Novo Laredo.


Assustada com que ouço, grito.

— Nãaoo!! Não tem o direito

de fazer isso comigo. Não é meu dono!

Minha cabeça lateja e não sei

mais o que fazer. Pouco depois, peço

para ir ao banheiro, na esperança de que

possamos parar num posto e, quem sabe,

eu possa fazer algo e fugir.

Mas ele para no acostamento da


estrada. Liga o alerta, desce do veículo
e abre a minha porta.

— Se alivie aí. — Ele aponta

paro o vão entre a porta aberta e ele.

— Não quero.

— Então vai ter que esperar —

ele diz e bate a porta.

Meio sem jeito, com as mãos

unidas, tento abri-la de novo enquanto


ele dá a volta no veículo, mas a

maçaneta está quebrada.


— Merda! — berro.

Quando retoma o seu lugar no

banco do motorista, Edgard apanha a


minha bolsa e fuça dentro, em busca de

meus documentos. Peço que pare.

Contudo, ele acaba encontrando o teste

de gravidez.

— O que isso significa? — Ele

tira a caixinha do teste de dentro do


embrulho.
— Não é meu... é... de uma

colega — tento disfarçar.

— Está mentindo. Está


esperando um filho?

— Eu... eu não sei, droga,

Edgard. Me deixe ir embora!

Ele liga o carro e volta para a

estrada.

— Engraçado... quis que

engravidasse de um touro. E agora essa


notícia só me enche de ódio! — ele
berra. Assusto-me. — Nunca vou ter um
filho meu!

— A culpa não é minha! —

grito.

Ele sorri, cínico.

— A facada foi um acidente,

Safira. Mas você sempre foi fraca o

suficiente para se deixar manipular.

Não sei se ter escutado isso é


um alívio ou apenas aumenta o meu ódio
por Edgard.

— Eu te odeio com todas as


forças da minha existência — digo e

avanço sobre ele, mesmo como os

punhos presos.

Mas ele me empurra e me

desfere um murro forte na cara. Sinto-me

tonta.

— Tudo tem a primeira vez, aí


está a sua primeira agressão física —
ele desdenha. — E tem mais... Te
drogava mesmo quando era do meu

interesse. Idiota!

A minha cabeça roda e Edgard

para de me agredir quando escuta o

barulho de um helicóptero.

Um alerta acende dentro de

mim. Será que a polícia está me


procurando?
Meu peito afunda, o coração

deprime e a tensão atinge níveis

inimagináveis desde que descobri que


Edgard fugiu levando Safira à força.

Nunca passei por uma pressão dessas.

Enlouqueci quando escutei o desespero

do seu áudio, pedindo que Edgard não a

machucasse.

De imediato, minhas pernas


enfraqueceram, meus intestinos
reviraram e tive a impressão de que
poderia desmaiar. Mas restabeleci o

prumo e liguei para o número da equipe


da tenente Cruz, do departamento de

polícia.

Em seguida, fui para o

shopping. Por todo o caminho, no carro

por aplicativo, reconheci as minhas


dezenas de erros. Deveria ter me metido
mais nesse impasse entre ela e Edgard.
Como homem, deveria ter delimitado
território de uma forma mais evidente.

Mas não, deixei correr ao sabor dos


acontecimentos.

E agora sou engolido por essa

dor horrível e por minha impotência.

Antes de a polícia chegar,

conversei com a equipe de segurança do


estabelecimento e vimos as imagens de
como se desenrolou o sequestro de
Safira. Meu coração parou de tanta
revolta diante da agressão que ela

sofreu. Com a ajuda dos seguranças,


também encontrei a chave do carro e o

celular dela, que foi coletado e entregue

aos investigadores.

A tenente Madison Cruz agiu

rápido. Através do monitoramento de


imagens, o veículo de Edgard foi
localizado na I-35 S. Ele está fugindo
com ela para o México, no sentido da
cidade de Laredo, no Texas, e Novo

Laredo, no lado mexicano. Meu coração


desapareceu no peito.

Cada minuto pareceu horas. Por

minha mente, transitaram dezenas de

armadilhas. Eu me culpei. Se tivesse

sido mais cuidadoso com ela, essa


situação poderia ter sido evitada. Se a
estivesse levando e a buscando na loja,
nunca que o canalha do Edgard iria se
aproximar. Também temi que tudo

estivesse perdido, sem que dissesse


para ela o tanto de amor que guardo no

meu coração.

A tenente Madison Cruz

acionou uma equipe que patrulhava a

região, para alcançá-los na estrada. E


pediu um helicóptero para acompanhar a
situação pessoalmente com mais dois
agentes, com seus chapéus de caubói,
que fazem parte da indumentária dos

policiais texanos.

Simplesmente, implorei para

que me levassem. A princípio, negaram

o pedido e me prometeram trazer Safira

de volta. Mas, quando me viram ligando

para uma empresa de táxi aéreo, a


tenente mudou de ideia.
— Vamos, senhor Rossi... juro

que as suas súplicas me comoveram. —


Ela estreitou o olhar. — O senhor só

acompanha, não interfira — avisou ela,


enquanto subíamos para o terraço do

prédio onde há um heliponto[47].

Em pouco tempo, entrei no

helicóptero e pus o fone de


comunicação, a aeronave levantou voo

sobre Austin.
Esses últimos instantes têm

sido torturantes. Não fiz Safira se sentir


segura, nem lhe disse exatamente qual é

a extensão dos meus sentimentos por ela.


Sempre me policiava com argumentos

do tipo, “é tão cedo”. E agora as

circunstâncias ameaçam tirá-la de minha

vida.

É desesperador.

Neste exato momento,


sobrevoamos a autoestrada.

Em pouco tempo, um dos

policiais aponta para duas viaturas na


estrada, com quem mantém

comunicação. O piloto se aproxima.

Mais adiante, eles identificam o carro

de Edgard. Só que, ao perceber a

aproximação do helicóptero, o filho da

puta entra numa estrada vicinal e


desaparece entre árvores.
— Ele só está piorando a

própria situação — sentencia a tenente


que, em seguida, avisa a equipe por

terra sobre o seu movimento e instrui o


piloto a encontrar uma clareira para

pouso nessa estrada secundária.

Minha coluna parece uma

geleira. Rogo aos céus que Safira esteja

bem. Meu coração dispara e a


adrenalina bate forte por minhas veias.
Se a situação já estava tensa,

piorou drasticamente com o surgimento


do helicóptero sobre a autoestrada, o
que me enche de esperanças de que

consiga me livrar dessa situação. A


maçã do meu rosto lateja forte após o
soco que levei. Edgard está uma pilha,

parece em surto.

— O mundo é uma selva — ele

fala, como se conversasse consigo

mesmo. — Só sobrevive quem tiver

garra e as melhores estratégias. — Ele


olha o mapa na central multimídia do
carro. — Estudei essa região como a
palma da minha mão. Sei bem o que
fazer.

— Ainda dá tempo de

voltarmos atrás. Juro que não vou te

acusar de nada. Pare o carro e me deixe

ir embora, por favor — peço. O amargor

dilacera a garganta e esganiça a minha

voz.

De repente, num movimento


brusco, ele sai da autoestrada e entra
por uma rotatória à esquerda.

— Isso não vai acontecer,


Safira. Vou até o fim — ele garante.

Então, desembocamos numa

estrada secundária, ladeada por imensas

nogueiras, o que impede o helicóptero

de nos acompanhar.

Meu coração gela porque


Edgard demonstra segurança. Espalha-se
por meus sentidos o pressentimento de
que algo ruim vai acontecer.

Olho a velocidade do veículo,


e percebo que ele reduziu para uns 80

quilômetros por hora. Só vejo uma

saída, provocar um acidente de trânsito

e contar com a ajuda divina. Só não fiz

isso na cidade, porque temi prejudicar

essa provável gestação, mas já estou


arrependida, pois não há outra
escapatória.

Não vou esperar passivamente

que Edgard cometa mais uma insanidade


comigo. Já bastaram os anos que lhe

servi como uma marionete e atendi aos

seus caprichos, desrespeitando as

minhas vontades e planos. Não

trabalhei, não produzi e nem abri um

caminho que pudesse chamar de meu.

Ele me drogava para que


aceitasse os seus fetiches. Ele me

manipulava para que me sentisse


culpada pela facada que ele levou.

Edgard sempre foi um monstro que


nunca enxerguei.

Sem contar que fui para cama

com quem não estava a fim. Mesmo que

tenha sido em ocasiões espaçadas, a

verdade é que isso só tem um nome: eu


me prostituí para agradá-lo, porque não
fui fiel à minha vontade e nem feliz
nesses momentos.

Demorou muito tempo para que


pudesse processar essa realidade e

entender o tanto que fui abusada por

Edgard, de forma velada, de maneira

subliminar, como também tirana,

imprimindo-me o medo e me tolhendo

de mim mesma.

A única gratidão que tenho é a


de ele ter me levado a Eric, que me fez

despertar para a vida, por meio de nossa


paixão e amor.

Meu coração aperta. Mantenho

a imagem de Eric na minha mente, com o

seu sorriso encantador e o seu charme

envolvente.

Espero que Deus esteja do meu

lado e me leve de volta pra você, meu


amor! E que ele proteja também o
nosso filho...

Mas, em definitivo, aqui é a

reta final de Edgard.

Chega de tanto terror!

Desesperada e movida pelo

impulso, mesmo com as duas mãos

unidas, ataco o volante. A princípio,

Edgard me empurra. Porém, mantenho-

me firme e o carro ziguezagueia na pista.

— Largue, sua louca! — berra


Edgard. — Você vai nos matar!

O carro invade a pista contrária

e ficamos quase em frente a um


caminhão baú, que buzina sem parar.

Meu coração parece vir à garganta.

Pressiono o volante para sair da pista e

finalmente conseguimos.

Só que Edgard perde o controle

da direção. Grito. O carro atravessa a


pista, bate na mureta e capota. Os
airbags[48] explodem sobre nós.

Tudo fica escuro e silencioso,

afinal.

A cena parece se desenrolar em

câmera lenta quando desço da viatura

que me levou, junto com a tenente Cruz e

dois de seus policiais, ao ponto onde o

veículo de Edgard deveria ter sido


interceptado. Sinto como se tivesse sido
alvejado por uma metralhadora em que a

munição fosse o sofrer.

Trôpegas, as minhas pernas

amolecem e os joelhos teimam em

querer se dobrar, levando-me à lona,

mas resisto. Os músculos e nervos me

jogam de um lado para outro entre as

sensações de frio e calor. Os


pensamentos são tempestades de
acusações por ter sido negligente, por
não ter cuidado de Safira, conforme lhe
havia prometido.

Meu coração afunda tanto que

nem parece existir mais no peito. Tenho

a impressão de que no lugar dele restou

uma carcaça que ainda teima em bater. O

que o preenchia, que é o grande amor da

minha vida, está no SUV compacto,


tombado a alguns metros de mim.
E não lhe disse isso, nem

confessei a Safira sobre a profundidade


e amplitude do meu amor. Tudo por

causa da minha mania de seguir regras.

Quando as minhas pernas

voltam ao prumo, disparo numa corrida

insana para salvá-la e lhe confidenciar

os meus sentimentos.

— Espere, senhor Rossi! —


vocifera a tenente, mas a ignoro.
Um policial sobe na lataria do

veículo para verificar a situação dos


ocupantes. Meus olhos ardem. Lágrimas
brotam. Não tenho estrutura para

enfrentar o pior, não posso perder

Safira. Isso, não. Minha carne parece

estar sendo passada num triturador. Tudo

dói.

De repente, sinto mãos fortes


me segurarem, contendo-me. Tento me
liberar. Grito.

— Calma, senhor Rossi. Se

continuar assim, vamos ter que detê-lo


— afirma um dos policiais.

— Preciso saber como ela está

— justifico. — Safira... — berro.

— O senhor não vai poder ser

aproximar — o outro oficial afirma.

Volto para perto da viatura que

nos trouxe. De longe, tento decifrar o


que dizem os policiais ao redor.

As sombras das nogueiras

sobre a estrada parecem me tragar para


um lugar triste e obscuro. Ela precisa

sair dessa.

Em pouco tempo, chegam

ambulâncias, um carro do corpo de

bombeiros e mais viaturas, com oficiais

que orientam o trânsito. Dou alguns


passos em direção ao carro acidentado.
Mais alguns minutos e os

paramédicos dispõem duas macas.


Aproximo-me mais. O veículo é aberto
como uma lata de sardinha. Passa-se

mais um tempo, que mais parece uma


eternidade, então, Safira é a primeira a

ser retirada. Corro em sua direção.

Nenhum deles me impede mais. Meu

coração bate tanto que dá a impressão

de que pode explodir.


— Não se aproxime, senhor —

uma das socorristas avisa.

Mas ignoro e chego perto.


Acaricio o seu rosto machucado. O

corpo está preso na maca e aquecido por

um cobertor, e ela usa uma máscara de

oxigênio.

— Safi, eu te amo tanto, meu

amor. Me perdoe...

— Ela está inconsciente, mas


seus sinais vitais estão preservados —

informa a mulher, antes de empurrar a


maca para o fundo da ambulância.

Choro.

Ela está viva.

Não me recordo de outro

momento da minha vida em que tenha

chorado assim. Mas uma sensação de

alívio se espalha. Enxugo as minhas


lágrimas de amor e dor.
Em seguida, de relance, vejo

Edgard sendo retirado e constato que o


canalha está vivo e consciente. Tomado
de ódio, num rampante, vou até a maca

dele.

A tenente Cruz tenta me impedir

de me aproximar.

— Edgard está confuso e

desorientado. Fique aqui! — ela fala.

Meus olhos se encontram com


os dele. Se eu pudesse socá-lo, faria

isso neste exato momento, mas estou


contido pela tenente e outro policial.

— Seu cretino, louco! Nunca

você iria vencer — berro. — Porque, no

fim, o bem sempre vence. Nunca seu

plano daria certo, Safira é minha,

porra... É minha esposa! — vocifero

num tom alto o suficiente para o


desgraçado escutar. — Espero que, se
não morrer no hospital, apodreça na
cadeia, miserável — rujo quando ele é
colocado no fundo da ambulância.

— Calma, Eric. Está muito

nervoso! — pede a tenente.

— Desculpe... — Passo a mão

no rosto, tentando me acalmar.

A tenente Cruz me conta, então,

que Safira está sendo levada para um


hospital em San Antonio, cidade que
está a uns 20 minutos daqui. Ela tenta me

animar ao falar que boa parte do


impacto foi absorvida pelos airbags.
Também relata que um caminhoneiro
reportou, no posto rodoviário próximo,

uma briga de casal dentro do carro antes

do acidente. Ela também diz que as

mãos de Safira estavam presas.

Uma raiva volta a se alojar no


peito. Embora ela não tenha dito,
interpreto que a situação de Safira pode
ser pior do que a desse filho da puta.

— Desgraçado! Só espero que


esse merda pague bem caro por tudo

isso!

— Vamos trabalhar para isso

— ela promete e me entrega a bolsa de

Safira, em que checo os seus

documentos. — Meu objetivo é que ele


seja mantido preso até o julgamento,
conclua a pena e, depois, seja

deportado. Já temos problemas demais


com americanos pra estarmos lidando
com criminosos estrangeiros! — ela
explica.

Agradeço à tenente Cruz por

todo empenho e suporte. Em seguida,

pego uma carona numa viatura em

direção a San Antonio. Durante o


trajeto, aviso a família de Safira. Ligo
para Esme e conto o que aconteceu, ela
vai conversar com os pais e com

Agatha. Converso ainda com Rose, e os


Hoover, que tem sido uma família para
mim, irão para San Antonio me

encontrar. Também telefono para uma

colega de trabalho de Safi, que havia me

dado o seu contato mais cedo, e ela fica

bastante comovida.
O crepúsculo já toma conta do

horizonte quando a viatura trafega por


San Antonio, uma das grandes cidades
do Texas, que foi fundada pelos

espanhóis. Sua arquitetura mescla as


construções contemporâneas e as

heranças coloniais, entre elas o Forte

Álamo, símbolo de resistência pela

independência do Texas, que pertencia

ao México.
Embora um pouco menos

estressado, meu coração ainda está


carregado de apreensão e com muito
receio do que possa acontecer a Safira.
O medo do pior, da palavra em que

sequer cogito pensar, ronda-me feito um


animal perverso. Contudo, não permito

que esses pensamentos me contaminem.


Meu coração vibra em esperança, o que

me faz acreditar que o melhor de nossas


vidas ainda está reservado.

Imagino o seu desespero e

sofrimento dentro daquele carro, sob a


ameaça de Edgard. Ela deve ter se

sentido torturada e impotente diante de

mais essa violência. Se Safira lutou com


ele dentro do carro, o que pode ter

ocasionado o acidente, com certeza, foi

no intuito de preservar a sua vida e se

defender.
Logo chego à grande estrutura

do Methodist Hospital, para onde Safira


foi trazida.

Agradeço a carona e sigo para

a emergência, que fica num dos prédios

do complexo. Vou até o balcão da

recepção e peço notícias dela, mas sou

instruído a aguardar. Entrego os

documentos do seguro saúde e me


acomodo numa das cadeiras da
recepção.

Estou com a bolsa dela, um

modelo que parece uma sacola, dessas


de tamanho médio, em cor neutra. Sou
tentado a bisbilhotar dentro para passar

o tempo, mas desisto em respeito à sua

privacidade. Uns 10 minutos depois, sou

chamado à recepção e informado que ela

está passando por uma bateria de

exames.
— A paciente está estável e já

recobrou a consciência. Daqui a pouco o


plantonista virá conversar com o senhor

— acrescenta o recepcionista.

A notícia me dá um pouco de

alívio, o que não dura muito tempo.

Quando volto a me sentar, após tomar

um café na máquina, já me sinto ansioso

para vê-la e saber mais detalhes do seu


estado de saúde.
Minha cabeça dá muitas voltas.

Da mesma forma que me encho de


confiança de que vamos passar por isso
numa boa, aquela palavra

impronunciável me espreita, como se


estivesse atrás de uma porta com um

machado na mão, só esperando que eu

vacile para destruir tudo.

Tenho a impressão de que o


estado de tensão e preocupação contínua
está mexendo com a minha cabeça.

Finalmente, sou encaminhado a

uma sala reservada onde encontro a


médica, doutora Nora Sato, que tem
ascendência asiática. Meu coração

acelera, as mãos transpiram, apesar do

gelo da central do ar-condicionado.

— O senhor é?

— Eric Rossi, namorado de


Safira. — Outra vez, essa palavra me
incomoda.

— O quadro geral da senhora

Klein é bom.

Sinto uma forte onda de

relaxamento nos músculos, que estavam

tensionados desde Austin, quando

escutei o áudio dela sendo levada.

Sorrio, feliz. Só tenho um leve

incômodo pelo fato de ela ainda ser


chamada pelo sobrenome daquele
bandido do Edgard Klein.

— Que maravilha! —

comemoro.

— E, por um milagre, está tudo

bem com o bebê, também.

Paraliso. Acho que minha cara

nunca ficou tão patética diante de

alguém.

— Bebê? — repito, só para

confirmar o que estou escutando.


— O senhor não sabia? — A

médica leva a mão ao rosto. — É uma


gravidez de pouco mais de oito semanas.

Acho que o acidente me jogou

do penhasco e agora me sinto

arremessado às estrelas meio sem rumo.

Ainda assim, o chão parece tremer.

— Posso falar com ela? —

peço, ansioso e, ao mesmo tempo, com o


coração gelado de tanta apreensão.
— Só amanhã. Vamos deixá-la

na observação e acompanhar a
evolução, porque os exames de imagens
estão dentro da normalidade, mas

precisamos de 24 horas pra ter certeza

de que tudo está bem. Mas, pela manhã,

ela poderá receber visitas — a médica

responde e me fita diante do meu

aspecto assustado.

Não sei direito o que dizer ou o


que devo fazer. Vou ser pai, como
assim? A médica sai e eu fico remoendo

a notícia. Paro por um tempo e me


escoro na parede.

Fiz um filho em Safira? Mas a

vi tomar a pílula, sempre perguntava se

estava tudo certo com relação ao método

anticonceptivo! Só pode ter falhado.

A cabeça dá voltas. Temos tão


pouco tempo juntos! Ainda estamos nos
descobrindo e já surge uma
responsabilidade dessa envergadura!

Um filho é algo sério demais.


Passo a mão no rosto, preocupado com

tantas antecipações. Mas balanço a

cabeça.

O mais importante nós temos,

amor e vontade de dar certo.

De repente, sou invadido por


aquela sensação que nos ocorre toda vez
que algo novo e incrível acontecesse em
nossas vidas.

Puta merda, vou ser pai!!

Em seguida, gargalho. E a

felicidade se espalha por mim.

Então, saio da sala reservada

rindo, e algumas enfermeiras me fitam.

— Vou ser pai! — digo para


uma delas, animado.
— Parabéns — elas respondem

com um sorriso em seus lábios.

Mas logo, esse contentamento é


substituído pelo ódio a Edgard, que

colocou em risco a vida de meu filho. A

prisão é pouco para ele, após se safar

do acidente.
Dia seguinte

Estou grávida!

Não sei como organizar os


pensamentos a respeito, muito menos

faço ideia de como Eric vai reagir

quando souber. De certo, vai me


considerar uma grande irresponsável,
incapaz de cuidar de uma mísera cartela

de anticoncepcional sem que salte


alguns dias.

Por outro lado... estou

esperando um bebê! Penso sob outra


perspectiva. Se estivesse bem, sairia
bailando por aí e cantarolando.
Momentaneamente, chutaria as
preocupações para o alto e comemoraria

a chegada dessa coisinha tão pequena


que vi no ultrassom e já preencheu o

meu coração com tanto amor. Sendo que

ele é o resultado de um outro amor tão

intenso!

Apesar desses sentimentos de


contentamento, meu peito comprime,
porque, se Eric reagir mal, vou me
machucar. Mesmo que racionalmente ele
tenha motivos para isso, não sei se vou

entender. Então, já temo essa decepção.


A médica me falou que ele virá me

visitar essa manhã e preciso estar

preparada para lhe contar que espero um

filho dele.

Tento me mexer na cama, mas


parece que fui triturada por inteiro. Essa
sensação se espalha por quase todo o
corpo. Minha cabeça dói também. Não
estou tomando analgésicos fortes por

causa da gravidez. A médica disse que


tive uma pequena luxação, que devo ter

batido a cabeça em algum lugar antes

dos airbags abrirem.

Estou com um galo no fim da

testa e início do couro cabeludo, mas,


graças ao bom Deus, os exames que fiz
não acusaram nada de mais. Meus
pulsos estão bastante doloridos e
machucados, e também tenho

escoriações pelo corpo. O soco que


Edgard me deu fez a minha pálpebra

esquerda inchar um pouco.

Porém, o melhor de tudo é que,

apesar da pressão da batida e da tensão

do cinto de segurança, nada aconteceu


ao meu bebê. Sou muito grata por isso,
pois tomei uma atitude abrupta ao
provocar o acidente, diante do meu
estado emocional e do medo pelo que

Edgard poderia fazer comigo.

Sei que fui impulsiva, mas não

vi saída quando ele desconfiou que eu

estava grávida. Eu me apavorei. Afinal,

além de querer me escravizar, ele iria

fazer o mesmo com o meu filho. Jamais


permitiria isso. Tinha que fazer alguma
coisa.

Uma sombra paira sobre o

peito. Edgard é louco! Ele pretendia que


contasse sobre a minha intimidade com

Eric, por isso, ficou tantos meses quieto,

como se estivesse aceitando a nossa

separação. Como fui capaz de dedicar

tanto tempo da minha vida a ele?

Quando penso sobre isso, uma dor


profunda alfineta o peito. Vou precisar
de tempo para enterrar os anos tóxicos
que vivi como esposa dele.

O que importa é que eu e meu


filho estamos bem. Uno a mãos diante de

mim, em agradecimento.

Com a cama um pouco

inclinada, acompanho uma

movimentação do outro lado da porta de

vidro, no leito da emergência. Então,


Eric aparece nela. Meu coração samba
no peito de felicidade, mas o temor me
cobre de apreensão pela notícia que
tenho para lhe dar.

Ele abre a porta e entra

esbaforido.

— Safi, céus, graças a Deus!

Ele vem até mim e me abraça

com delicadeza. Tento correspondê-lo,

mas meu corpo reclama. Emocionado,


quando ele pisca, descem lágrimas de
seus olhos escuros que, há alguns meses,
eram uma incógnita para mim. Não me
aguento e também choro.

— Te amo tanto, Safi — ele

balbucia. — Obrigado, Deus, por ter me

devolvido a minha mulher!

Suas palavras são como um

bálsamo que afaga o meu peito. Somos

tomados por uma forte emoção. Nada


mais é dito, apenas choramos abraçados
por algum tempo. Quando nosso pranto
vai diminuindo, Eric começa a depositar
suaves beijos nas minhas bochechas,

lábios, testa, queixo. Aos poucos, vai se


afastando.

Quando nossos olhos se

encontram, sinto uma leve pressão no

peito. Tenho que enfrentá-lo e lhe contar

sobre o bebê. Mas, antes que abra a


boca, ele coloca a mão no meu ventre e
indaga:

— Por que não me contou que

está grávida?

Ele estreita o olhar e comprime

os lábios, pegando-me desprevenida.

Não fazia ideia de que já soubesse.

— Eu... eu... não sabia que

estava grávida. Descobri aqui. Quer

dizer, desconfiava, até comprei o teste,


mas... não houve tempo... — Minha voz
embarga enquanto ele ostenta um sorriso
cínico. — Eu... esqueci de tomar a
pílula alguns dias. Sei que é cedo, que...

Eric sorri.

— Shii... Não é cedo, Safi. É

no nosso tempo... Vamos ficar bem.

Estou muito feliz por você estar aqui

viva e por essa surpresa. — Os seus

dedos percorrem de um lado a outro da


minha barriga. Eric está
verdadeiramente emocionado. —
Preciso te dizer tantas coisas, preciso
que saiba que é a mulher da minha vida,

que me faz experienciar o amor mais


forte, terno, intenso e incrível que já

vivi. Não abro mão de te ter ao meu

lado pra o resto da minha vida...

— Ah! Eric... — interrompo-o

e abro os braços para ele, caindo no


choro outra vez. As suas palavras
aquecem o meu coração e me confortam.
Era tudo que eu queria e precisava
escutar. — Sou louca por você.

Reconheci em você o homem da minha


vida, dos meus sonhos e dos meus

desejos. Além disso, é o pai do meu

filho. Ah! Amor, precisa conhecer o

nosso bebê, vi no ultrassom, é tão

pequeno e eu já o amo tanto. Tive tanto

medo de que você o rejeitasse, que me


considerasse uma irresponsável.

Ele ri de mim e depois

demonstra uma indignação passageira.

— Nunca, meu amor! Imagina

se vou rejeitar o nosso filho! Fiquei

impactado, mas muito feliz. Quando

olharmos para ele ou ela, daqui a alguns

anos, o seu rostinho vai nos fazer

lembrar de nossa paixão e do nosso


início. — Ele suspira e me sorri. Seus
olhos brilham, uma suavidade e ternura
iluminam o seu rosto. — Na verdade,
Safi, concluí que nosso tempo é outro.

Nosso amor veio dessa forma, forte,


bruto e exigente, ao mesmo tempo, terno

e estável. É um amor sem freios, por

isso não é atropelar etapas o que

estamos vivendo. Quem somos nós para

questioná-lo? Na verdade, tudo conspira

para que permaneçamos bem juntinhos.


— Assim, morro do coração...

— digo.

Nunca me senti tão completa e


plena. Eric é tudo que sempre desejei.

Um homem forte, viril, intenso, que me

ama e me quer. E, em sua vida sexual,

nunca vai desejar me ver com outro. Ao

contrário, a sua possessividade na cama

só me realiza, como jamais aconteceu


antes.
— Você já é a minha mulher,

Safi. Agora precisa ser a minha esposa.


Amanhã vou ligar para o advogado para

acelerar a papelada do seu divórcio,


para podermos nos casar antes de o

bebê nascer.

— Vamos nos casar?

— Sim, casar...

— Mas você nem pediu a


minha mão! — pilherio e percebo que
ele fica um pouco sem graça, enquanto
eu não caibo em mim de tanta felicidade.

— Vou pedir no momento certo!

Eric beija a minha mão e me

conta que comprou flores, porém não

sabia que não poderia entrar com elas.

Em seguida, começamos a falar sobre

um assunto espinhoso, o sequestro.

Conto-lhe sobre os momentos


de terror que vivi e ele me escuta
atentamente. Narro o que Edgard disse
para mim e seu plano insano de me levar
para Singapura. Explico a Eric sobre a

minha decisão de atacar o volante do


carro e fazê-lo perder o controle da

direção.

— Graças a Deus, Safi. Ainda

bem que está a salvo — ele comenta,

abraçando-me. E também conta o tanto


que sofreu desde que escutou o áudio
que consegui enviar. — Só espero que
Edgard permaneça atrás das grades por
muito tempo — ele acrescenta.

Também concluímos que

Edgard envolveu Helga e a história dos

desenhos feitos no passado, numa

tentativa de me fazer acreditar que Eric

tinha algo com ela.

— Acho que ele pensou que


você fosse acreditar que eu mantinha um
caso com Helga e isso nos
desestabilizaria. Como fomos dar queixa
à polícia contra ele, então, resolveu

tomar uma atitude drástica e tentar te


sequestrar — Eric também comenta.

Ao mudar de assunto, Eric diz

que Rose e Tom estão ansiosos para me

ver.

Então, ele liga para a minha


mãe, o que me deixa apreensiva.
— Dona Celeste, tudo bem?

Safi está ótima diante do que aconteceu.


E tem uma surpresa pra vocês.

Ele mimetiza uma barriga de

grávida. Faço uma careta de terror,

porque é uma tortura pensar no que

minha mãe pode dizer sobre a minha

gravidez.

— Sim, vou passar pra ela, mas


prepare o coração porque a senhora vai
ser avó. Safi está grávida e estou muito
feliz com essa notícia — Eric emenda, o
que me faz gelar e também me conforta

demais. Minha mãe parece dizer algo.


— Eu amo muito a sua filha, dona

Celeste. Nós nos admiramos e temos

amizade também. Vamos dar certo. E o

bebê foi um susto, descobrimos nos

exames depois do acidente, mas é bem-

vindo. — Ele escuta a minha mãe. —


Assim que puder, vamos aí.

Eric é o maior acerto da minha

vida. Só o admiro mais. E nunca vou


esquecer sua decência nesse momento

em que preciso tanto de suporte.

Choro muito com a minha mãe.

Explico o que aconteceu desde a hora

que saí do estacionamento até despertar

no hospital. Ela conta que todos estão


horrorizados com o desfecho que
Edgard quis dar à situação. Claro, ela
também joga na minha cara o tanto que
me aconselhou a não ter mergulhado

nesse casamento. Mas, no final,


comemora a chegada do seu primeiro

neto.

— Já aviso que vou passar uma

temporada com vocês quando ele ou ela

nascer — alerta minha mãe, animada e


chorosa.
Em seguida, veio os Hoover,

que também estão felizes com o bebê. E


eu me sinto aliviada pelo tanto de amor

que estou recebendo.

Tinha os sonhos secretos de um

dia ter um bebê, mas que não fosse filho

de Edgard. Olho para trás e não consigo

entender como a minha mente funcionava

daquela forma limitada. Como pude ter


tanto desamor por mim a ponto de
sacrificar a minha existência por um
outro alguém que nem amava? Não tenho
essa resposta.

Mas o que importa nesse

momento é que me sinto completa e

feliz. Daqui a pouco minha barriga

começa a crescer e a minha existência

vai ganhar mais um sentido. Também

preciso zelar pela minha relação com


Eric, para que consigamos atravessar os
momentos difíceis sem nunca perdermos
a ternura que existe entre nós dois.

Duas policiais também


aparecem e colhem o meu depoimento.

Para mim, é muito difícil

rememorar os fatos. Tenho a sensação de

que a tentativa de sequestro de Edgard

durou dias e não apenas algumas horas.

Conto cada detalhe para as agentes, com


dificuldade. Gostaria de saber o que
aconteceu a ele, mas não tenho coragem
de perguntar.

A verdade é que nunca mais


quero voltar a olhar na cara de Edgard

na minha vida. A indiferença que sentia

deu lugar ao ódio. Sim, acabamos mal,

de uma forma que não foi correta, mas

ele não precisava fazer o que fez. Ele só

provou que está desequilibrado e a um


passo da loucura.
Enfim, foi o encontro com Eric

que me despertou. Pode parecer tosca a


comparação, mas o seu efeito sobre mim

parece o de uma tomada. Fui religada à


realidade e voltei a viver.

O plantonista passa no quarto

da emergência e informa que vou ficar

mais um dia no hospital, só por

precaução por causa da gestação.

Então, sou transferida para


outro quarto. Rose fica comigo enquanto
Eric vai comprar uma muda de roupa
para nós e itens de higiene pessoal.

Agradeço a ela e a Tom pelo suporte.

— Eric é um grande amigo.

Temos uma afinidade grande, e você faz

muito bem pra ele. No início, confesso

que não torcia pela relação de vocês.

Mas tudo mudou quando vimos que o


que tinham era um amor verdadeiro e
lindo — ela assegura.

— Obrigada, Rose — digo

emocionada.

— Dizem que a gravidez deixa

a mulher boba. Bom, eu não sei. Tom e

eu não pudemos ter filhos — ela diz e

acaricia o meu rosto.

Os Hoover retornam para

Austin. Então, insisto para que Eric vá


para o hotel, afinal a poltrona é muito
desconfortável. Mas ele insiste em ficar.

Na segunda-feira, volto a ser

levada para fazer novos exames de


imagens, como na primeira vez, com a

minha barriga protegida por uma placa

de chumbo. E a mesma médica que me

atendeu no sábado, a doutora Nora Sato,

finalmente me dá alta. Ela orienta que

faça uma revisão neurológica, procure


um obstetra o quanto antes e me receita
umas vitaminas. Também me recomenda
que fique de repouso absoluto.

Durante à tarde, retornamos


para Austin.
Chego em casa quase me

arrastando para caminhar. Minhas


pernas doem e Eric me dá o apoio
necessário para subir as escadas. Estou

louca para tomar um banho demorado.


Então, ele me ajuda a tirar o largo
vestido comprado em San Antonio, uma

vez que a farda da loja foi cortada pelo

pessoal do resgate.

— Tenho a impressão de que se

passaram vários dias — comento

enquanto ele abre o chuveiro para mim.

— É por causa do estresse


emocional que enfrentou — diz Eric

que, em seguida, afasta os fios de cabelo


do meu rosto, beija a minha testa e passa

a mão pelo meu ventre. — Estamos bem


aqui?

Sorrio para ele.

— Muito bem.

Então Eric se agacha e beija a

minha barriga.

— Fico imaginando você


andando por aí barriguda — ele brinca e
eu acaricio os seus cabelos.

Quando ele se ergue, lambe um


dos meus mamilos rapidamente, o que

dispara uma descarga elétrica em mim.

— Tenho que aproveitar,

porque em pouco tempo terá um dono

temporário — ele diz com ar

zombeteiro.

Então abraço-o e deito a


cabeça no seu peito.

— Obrigada por ter ido atrás

de mim. Edgard seria capaz de qualquer


coisa, ele estava muito transtornado —

balbucio, pois tenho dificuldade de falar

dos momentos de terror que passei.

— Moveria montanhas, caso

fosse necessário — ele diz e acaricia os

meus cabelos. — Não consigo pensar


em um futuro sem você, Safi. E só
descobri isso quando tive medo de te

perder. Nunca mais quero ter essa


sensação de impotência, nem sentir
medo de te perder.

— Bom, agora que estou

grávida não tenho muito pra onde correr

— tento brincar e o fito. — Obrigada

por sua coragem, Eric, por acreditar em

mim e confiar no meu coração, mesmo


tendo me conhecido da forma que foi...
— Não consigo mais falar, pois sou
tomada pela emoção.

— Não vou dizer que nos


conhecemos da melhor forma, mas

agradeço por ela ter existido e nos

aproximado. — Ele beija o topo da

minha cabeça. — Vá tomar o seu banho,

que vou preparar um jantar nutritivo

para a mamãe mais linda do mundo.

Gargalhamos.
Eric vai saindo do banheiro,

então, ele para e me chama, enquanto


entro no chuveiro.

— Safi, Edgard já teve alta.

Deslocou o ombro, ou algo do tipo. Só

que ele foi preso e deve continuar assim

por algum tempo. A tenente Cruz

prometeu que vai se esforçar para que

ele permaneça atrás das grades até o


julgamento.
— Está tendo o que merece —

respondo.

— Precisamos atuar para


sepultá-lo de nossas vidas. — Ele me

encara. — Você tem um papel

importante nisso.

— Vou me esforçar... começar a

terapia — digo.

— Ótimo.

Eric sai e eu me enfio debaixo


da ducha quente. O que mais quero é
apagar Edgard da minha memória.

Enfim, uma sensação de alívio


e conforto se espalha pela minha pele.

Estou com o corpo machucado, mas

minha alma flutua. É quase indescritível

essa sensação, não é bem uma vitória,

mas considero uma superação.

Um imenso sentimento de
gratidão se espalha por mim. Acaricio o
meu ventre, ainda lidando com a ideia

de que não seremos apenas Eric e eu em


nossa relação que apenas começa.

Safira come quase como um

passarinho. Vou ter que me esforçar para

ajudá-la a se alimentar melhor. Após

comermos um espaguete com um molho


leve que preparei e levei numa bandeja

para jantarmos, tomo um banho relaxante


e visto apenas a parte de baixo de um

pijama.

Confesso que fiquei muito


assustado com a notícia da gravidez

dada pela médica. Mas, assim que essa

novidade foi se assentando dentro de

mim, entendi que se trata de um presente

divino, resultante desse vínculo tão forte

e especial que forjamos entre nós. Pode


parecer apressado, mas aconteceu. E o
ritmo de minha relação com Safira é
outro.

Estou preparado para ser pai e


ter a minha família, ainda mais se tudo

isso é com a mulher que amo

loucamente. Estou apto a ser um homem

fiel, já tive nos braços uma variação de

mais mulheres do que um dia desejei ter.

Agora é só o meu amor, o meu bebê e a


minha arte, se ela me quiser, é claro. E
vou me esforçar para isso.

Sorrio. Só eu sei que, numa

altura dessas, ainda guardo um


segredinho. Pisco.

Enfim, sinto-me

emocionalmente esgotado, depois de

enfrentar a longa montanha-russa de

sentimentos nas últimas 24 horas, entre

abismos difíceis e alegrias revigorantes.

Saio do banheiro e fito Safira


na cama, de olhos fechados,

descansando, sob a meia-luz do abajur e


em sua camisola de cetim e renda lilás.

É a visão que me acalma,

conforta e preenche o meu coração de

sentimentos. Amo demais essa mulher.

Sinto-me ligado a ela por uma energia

invisível, como se um grande e grosso

cabo nos unisse. Desde o início tive


essa sensação, confesso que lutei para
ignorá-la e considerar isso apenas
atração física.

Mas não foi bem isso que


aconteceu.

Eu entreguei o meu coração a

Safira. E cada dia que passa me sinto

mais envolvido, percebo que essa

ligação invisível está mais fortalecida.

No fundo, nunca imaginei que houvesse


um sentimento assim, que roubasse o
meu chão e destruísse todas as minhas
travas de segurança contra o sofrimento.

Safira me sequestrou com o seu


jeito frágil, olhar intenso e sorriso

cativante. Sem contar que ela é uma

linda mulher e temos uma química

explosiva.

Deito-me ao seu lado e sorvo o

seu cheiro gostoso. Ela ressona e


semicerra os olhos. Encaixo-me nela e
afago o seu quadril.

— Parece um sonho estar de

volta a essa cama ao seu lado — ela


murmura, puxa a minha mão e a beija.

Passo um braço por baixo de

sua nuca e beijo o seu pescoço e

bochecha.

— Esse é nosso recanto de

amor — respondo com afeto, e minha


mão escapole para o seu ventre. —
Estou encantado com a ideia de ser pai.
Vou amar demais a nossa vida, Safi.

Ela sorri enquanto enfio a mão


por baixo de sua camisola, só para ter

nos meus dedos a textura de sua pele e

imaginar que ela vai se dilatar como

uma grande melancia.

— Ainda bem, amor. O que

mais quero é ter uma vida linda e normal


ao seu lado. Cuidar de você e de nosso
filhinho ou filhinha. O que prefere? Que
nome daríamos?

— Hum... tanto faz se for


menino ou menina. E prefiro que sugira

os nomes.

— Se for menina, gosto do

nome Ruby e, se for menino, acho que o

melhor nome é Eric Júnior. O que acha?

Gargalho e minhas mãos sobem


ao seu seio.
— Ruby, de rubi, porque você e

suas irmãs têm nome de pedras


preciosas. Mas o meu nome? Não vale...

— Vale, sim. Amaria.

— Então será como quiser —

digo e enfio o rosto entre os seus

cabelos. Sorvo o seu cheiro e a encho

de beijos.

— Como está se sentindo? —


pergunto, pouco depois.
— Estou ótima. Só a dor no

corpo que incomoda.

Só que esses toques, somados


ao cheiro natural de Safi, já me excitam

e pressionam meus desejos, que foram

assombrados pelo medo de perdê-la.

Encosto o meu pau em suas nádegas e a

faço senti-lo.

Ela sorri.

— Parece que tem uma


eternidade que não o vejo. — Então,

com a mão de pulsos machucados, ela


toca o volume.

— Só seu — instigo e mordisco

o lóbulo de sua orelha.

— Espero mesmo. Quase surtei

quando desconfiei de Helga.

Sorrio.

— Sem riscos, Safi. — Nós nos

entreolhamos intensamente. — Quero um


futuro terrivelmente convencional
contigo... Libertinagem só entre nós
dois. O que acha?

Ela sorri, animada.

— Concordo, totalmente. Muito

me agrada uma vida casta e sem

excentricidades ao lado do homem que

amo — comenta com ar alegre.

Minha mão escorrega para cima


de sua boceta. Enfio a mão dentro da
calcinha, cubro a sua intimidade com a

palma e a comprimo, sentindo os seus


pelos curtos.

— Morto de saudades dela,

mas, até ir ao médico, é bom não brincar

aí dentro.

— Dizem que é normal —

argumenta.

— Prefiro evitar até o médico


dizer que pode, além disso, seria ruim
para as suas dores e machucados.

Safi faz uma cara de poucos

amigos e concorda.

— Melhor não arriscar, ainda

mais considerando o tamanho de um

certo torpedo.

Sorrimos.

— Mas isso não quer dizer que


não vamos fazer nada.
Nós nos fitamos e seus olhos se

iluminam. Sinto-me um homem desejado


por minha mulher. Ela me quer e saber
disso só me estimula. Beijo-a

ardorosamente e ela corresponde, me


entregando a sua língua ávida enquanto

acaricia os meus cabelos.

Tenho dificuldade de me afastar

de seus lábios. Safi mexe com a minha


alma e faz com que me sinta completo
nos seus braços.

— Então, feche os olhos para

mim e só me sinta, minha linda...

Fico diante dela com os braços

e pernas ao seu redor, excitado só com a

ideia de poder explorá-la. Beijo

rapidamente a sua boca outra vez e,

delicadamente, suspendo a sua camisola.

Quando os seus seios balançam para


mim, são um convite para me deliciar
neles, além de que, sei que ela ama.

Circulo a ponta da língua ao

redor da auréola. Em seguida, brinco


com o bico do seu peito, entumecido.
Safira geme baixinho e continuo a

provocá-la, sugando o mamilo e

massageando-os dentro da minha boca.

Quando faço com um, brinco com o

outro com as pontas dos dedos. Alterno-


os até seus gemidos se tornarem uma
música. Inquieta, Safira comprime as

suas coxas.

— Peça o que você quiser —


sugiro-lhe. — Sem pudor, Safira...

— Me chupe, por favor... —

ela implora.

Sorrio.

Então, vou descendo os lábios,


passando a ponta da língua em seu

abdômen, o que a faz contraí-lo. Chego


ao umbigo, beijo-o como se fosse a sua
boca. Ela arqueia, erguendo um pouco o
tórax.

— Por favor... — ela murmura.

Desço a língua e me aproximo

do seu monte de vênus, afinal, quero lhe

dar prazer e não a torturar. Mordisco a

sua boceta por cima da calcinha de

renda branca, logo a sinto encharcada


por entre o tecido. Safira acaricia os
meus cabelos, como se implorasse por
minha boca.

Delicadamente, retiro a sua


lingerie, atendendo à sua ansiedade.

Logo depois, dou uma vigorosa lambida

em seu clitóris. Safira respira, aliviada.

Provo de sua umidade, mas paro em

seguida. Seguro a sua mão que me

afagava e a pouso em sua intimidade.

— Nunca fez isso para mim.


Morro de tesão em ver... Sem pudores,

Safi, sem vergonha... somos só nós dois


e sempre será assim. Faça para mim
como naquele dia que enviou o vídeo,

por favor — peço sedento sobre ela, já

com o meu membro na minha mão, após


colocá-lo para fora do pijama.

— Está bem... — ela topa.

Posicionado entre suas pernas


e, sentado sobre os meus calcanhares,
passo a acompanhá-la.

Ela fecha os olhos e escorrega

o dedo médio em seu clitóris,


massageando-o em círculos. Em
seguida, desce para a extremidade de

sua carne, próximo ao canal, e a

acaricia. Diante da cena, inclino-me e

também passo a minha língua em seus

lábios íntimos.

Safi geme com o seu próprio


dedo e minha língua.

Volto a me movimentar. Pego a

outra mão dela e a pouso em seu seio.

— Se toque, amor, do jeito que

você gosta... — sussurro. — Olha como

estou... — Ergo-me mais para mostrar-

lhe o meu pau duro e latejando de tesão.

E retorno a ficar sobre os tornozelos

diante de suas pernas escancaradas.

Aos poucos, Safi se solta.


Enquanto estimula um seio, passando o

polegar no bico e apertando-o contra o


indicador, ela mergulha dois dedos em
sua boceta, coleta a umidade e a traz

para o clitóris. Geme e se contorce,


dona de seu prazer.

Enlouqueço diante dessa visão.

Masturbo-me freneticamente e,

em pouco tempo, meu gozo pede


passagem para explodir. Então diminuo
os movimentos para esperá-la. Inclino-

me e a lambo, chupo a sua carne e


também os seus dedos molhados. Enfio a
minha cara em sua boceta, e seu cheiro
aumenta a minha excitação. Prendo a sua

carne lisa em meus lábios, balançando-a

de um lado a outro com delicadeza.

Com a ponta dos dedos, Safi

recupera o comando de seu prazer.


Então, volto a me concentrar em meu
pau, ao tempo que sua respiração se
intensifica e ela contrai o abdômen.

Inclino-me sobre ela e sustento meu


corpo com uma mão. Em pouco tempo,
explodimos juntos em nossos gozos.

Deixo minha porra jorrar sobre ela

enquanto vejo o seu rosto se contorcer

entre gemidos de prazer.

Então, vou até a sua boceta e


sugo sua umidade, mas ela pede que
pare. Atendo ao seu pedido e vou até
ela.

— Obrigado, meu amor. —


Roubo-lhe sua língua, num beijo

profundo e cheio de erotismo.

Sabemos que se estivesse tudo

bem, prosseguiríamos nos entregando

um ao outro. Sem afastar os nossos

lábios, gentilmente trago-a para junto de


meu corpo.
— Te amo demais, minha

mulher... — murmuro, encantado,


afastando fios de cabelo de seu rosto. —

Sua entrega foi linda, Safi.

Ela enterra o rosto em meu

ombro.

— Pensei que não fosse

conseguir. É um fetiche? — ela pergunta.

— Não, claro que não. Foi só


uma vontade, um desejo momentâneo.
Ajudo-a a se levantar para ir ao

banheiro. Também faço a minha higiene


e voltamos para cama.

Safi me abraça e choraminga.

— O que foi? — pergunto,

preocupado.

— É o amor. Agora são

lágrimas de alegria. Obrigada por ter me

despertado para esse sentimento,


obrigada por ter me trazido para essa
relação sadia e incrível, quando eu

achei que nem tinha o direito de sonhar


com isso... Te amo tanto, Eric. Sei que
são palavras, mas não são só elas que
tenho guardado pra você, tenho as

melhores intenções para construir uma

bela família contigo. Não me iludo, o

cotidiano pode querer nos engolir, mas

te prometo que serei uma guerreira para

lutar por nós.


— Que lindo, Safi! Não há

mais caminhos sem você ao meu lado.


Obrigado, amor.

— Não concluí... — Ela me

interrompe com a voz embargada. — Sei

que vim de uma relação tóxica, então,

posso não ser uma mulher tão inteira

quanto você merece, ainda assim, quero

te dar a minha melhor versão, quero ser


a melhor mulher que eu conseguir ser...
— Ela não consegue concluir devido ao
choro.

— Ei, Safi, não chore. Você é


uma mulher inteira e completa, que

idolatro, amo, desejo e quero ao meu

lado. — Nós nos fitamos. Limpo as suas

lágrimas com as pontas dos dedos. —

Não há nada que eu queira mais que

você. E é pra sempre. Se prepare para


suportar as minhas rabugices.... Hum,
vou tentar te mostrar como é o meu amor
por você, quem sabe assim você se
acalma. Falta muito pouco.

— Como assim? O que tem pra

me mostrar?

— O quanto te amo! — Mudo

de assunto. — Precisamos planejar se

vamos continuar aqui. Ou se vamos nos

mudar. Gostou dessa casa? O que acha


de nos mudarmos para Nova York?
Conversamos sobre o futuro.

Fazemos planos. Safi se tranquiliza e


dorme nos meus braços. Ela ainda não

faz ideia do que significa para mim.

Safi é o meu amor e a minha

inspiração.
Três meses depois

Com cuidado, tento me

equilibrar entre o salto e a minha barriga


de cinco meses de Ruby, a nossa

filhinha, que parece que vai ser jogadora

de futebol, de tanto que me chuta.


Percorro o pequeno trecho de calçada
para entrar no Mondo Gallery, onde
Eric inaugura uma nova exposição.

Esse parece ser um evento

importante para ele, pois saiu de casa

mais cedo, lindo, num terno elegante


com gravata. Esme e minha mãe me
fizeram comprar um caro e bonito
vestido, na cor champanhe, com renda e
decote princesa, além de um par de

sandálias novas.

Elas vieram me visitar,

queriam me ver grávida, pois não sei se

conseguiremos ir ao Brasil antes do

nascimento de Ruby. Eu não posso ficar

me ausentando do trabalho e Eric está


com a agenda cheia.
— Precisa sempre estar

encantadora nesses momentos, minha


filha — dona Celeste justificou. —

Afinal, tem um marido que vai atrair a


atenção de todos para ele e é essencial

estar linda. Beleza não é um rosto bonito

e um corpo gostoso, beleza é um estado

de ser e de se sentir. A roupa, a

maquiagem e as joias ajudam na

composição para atingir essa plenitude


— completou ela, com a sua filosofia de

loja.

Bom, acabei aceitando os seus


conselhos, pois Eric chama mesmo a

atenção. E vi na exposição em Miami,

no mês passado, como as mulheres

ficam por causa dele. Impactam-se, de

forma bem positiva, ao descobrir que o

autor dos quadros é um belo homem


heterossexual. E, se elas soubessem o
quão viril ele é, eu estaria perdida...

Sejam idosas, jovens, casadas e

solteiras, elas querem tirar fotos com ele


e postar em suas redes sociais. Só

naqueles dias em Miami, realmente

entendi a naturalidade dele ao lado de

Helga em Nova York, que até então eu

não havia digerido direito.

Tive até uma pequena crise de


ciúmes, mas logo compreendi que era o
seu trabalho e não poderia implicar com
algo que é a sua alma, a pintura. Além
de que, ele se comporta da maneira mais

profissional possível. Eric é muito sério


e decente. E me apresenta como sua

esposa, embora não tenhamos casado

ainda. Para o meu terror, ele não voltou

a tocar no assunto de casamento.

Bem, os últimos meses foram


maravilhosos. No seu tempo livre, Eric
está sempre comigo. Pesquisamos
assuntos sobre a gestação e criação de
filhos. Também já começamos a reforma

no quarto de Ruby. E continuo no meu


trabalho, que amo. Eric me dá forças e

me estimula a planejar, no futuro, abrir

meu próprio negócio.

— Trabalhe não só pelo

dinheiro, mas pela sua saúde mental e


realização pessoal. Quero te ver feliz,
Safi — ele disse no dia em que me deu
um cartão de crédito como dependente
dele.

Nos últimos tempos, eu me

questiono se não foi Deus quem enviou

Eric para me salvar. Ele me confessou

que já me admirava no colégio. Mas eu,

com a minha visão perdida e ofuscada

por Edgard, nunca o notei. Então


tivemos uma nova oportunidade de
encontro. Quem iria imaginar que na
realização de algo tão louco, como
cuckolding, eu pudesse encontrar um

cara maravilhoso, com uma alma


incrível e que se apaixonasse por mim?

E, como num milagre, eu o encontrei.

Ladeada por Esme e minha

mãe, finalmente, entramos na recepção

da galeria. Nós nos identificamos e


somos autorizados a seguir para o
saguão.

— Espere, Sah. Me deixe

conferir a sua maquiagem e roupa —


pede minha mãe.

Esme alinha alguns fios que

escapolem do penteado que elas fizeram

no meu cabelo, e minha mãe enxuga

algumas gotas de suor que se formaram

nas têmporas. Afinal, estou tensa, e


Austin voltou ao seu clima mais quente,
bem parecido com o do Brasil.

— Estou bem, chega! Não é o

meu casamento e Eric deve estar


nervoso porque estou atrasada.

— Como minha mãe disse mais

cedo, você deve sempre estar fascinante

para o seu novo marido, que é bonito e

importante — Esme acrescenta.

— Você concordando com


mamãe? Não tem boa coisa aí —
resmungo.

Elas riem de mim, mas estão

igualmente belas em vestidos de noite.

Assim que chego ao saguão,

Eric vem ao meu encontro.

— Como está linda! Aliás, é

linda... Vamos. — Ele me dá um suave

beijo e acaricia a minha barriga. Então,

acena para Esme e minha mãe, toma a


minha mão e me leva para a ala
reservada em que não há pessoas
circulando.

— Vi quadros seus no salão


principal. — Aponto para trás.

— Mas vamos entrar nesse.

Assim que entramos, ele me

para e me fita. Acho-o tenso.

— O que houve? — pergunto


ao franzir o cenho.
— Verá o motivo pelo qual não

te deixava entrar no ateliê.

Eric me conduz à primeira tela.


Um frio gela a minha medula. Sou eu.

— Me ouça, agora... depois de

ver todos os quadros você fala,

combinado? — ele pede.

Balanço a cabeça confirmando.

— Essa pintura você conhecia.

Viu parte dela no apartamento. Comecei


num surto criativo assim que retornei de
San Saba.

Nelas, meus cabelos são ramos


de bluebonnet. Então, vemos outro. É a

minha silhueta misturada a uma

paisagem que me remete ao rancho. Em

mais um, meu corpo se confunde a um

tronco de uma árvore, mas a cabeça se

torna um céu estrelado. E vejo os meus


seios entre montanhas, com os mamilos
camuflados entre nuvens azuis e lilases.

Meu coração parece querer

parar e as pernas ficam trêmulas. Ainda


bem que estou do lado dele.

— Você, Safi, é fonte de

inspiração. Se tornou a minha arte, a

minha forma de ver o mundo e de

interagir com a beleza. Não só a física,

mas a beleza emocional, que eu conheci


através dos seus olhos.
Eric limpa a garganta enquanto

admiramos as obras. Encanto-me com os


ricos detalhes e a beleza do que se

revela diante de mim, provocando uma


ebulição de bons sentimentos.

— Me provocou uma avalanche

de sensações intensas e fortes, Safi —

ele continua —, que atravessaram o meu

peito bagunçando tudo, como também


você trouxe a calmaria reconfortante que
experimento agora. Preencheu o meu
mundo e quase me sufocou de amor.
Como não há palavras exatas para

definir os meus sentimentos por você,


então, eu fiz essas telas.

— Ah... nem sei o que dizer —

digo com a voz embargada. — Eu... eu

não sei se mereço.

— É claro que merece, por


favor, fique calma, porque tem bem mais
— Eric murmura e me abraça. — Esses
quadros são a minha declaração de amor
a você.

Ficamos assim por algum

tempo, em silêncio, só sentindo o calor

de nossos corpos e a emoção desse

instante. Ele é um homem muito especial

e sensível.

Quando nos acalmamos mais,


ele beija a minha mão e volta a me
mostrar mais quadros, alguns sensuais e
outros suaves. Há um com meu perfil
com lábios azuis, num fundo branco. A

penúltima tela é a gestação de uma rosa


vermelha, em alusão a Ruby. A última é

a que ele pintava quando conversamos

pela primeira vez diante da casa dos

Hoover.

— Esse eu conheço — brinco


de nervoso, com os olhos marejados.
— Esse quadro batizei de

Sapphirus. Eu o coloquei por último,


para, na verdade, ele se tornar o

primeiro e todo esse ciclo de


sentimentos ser infinito e apenas evoluir.

— Eric, você é tudo pra mim.

Obrigada por esses quadros lindos. Eu

não imaginava...

Ele sorri, visivelmente


contente.
— Faço qualquer coisa para

ver o seu rosto com esse ar de quem foi


surpreendida. — Ele me dá um beijinho.

Envolvo-me em seu braço, como se


assim fosse possível mantê-lo ainda

mais próximo de mim.

— Na verdade, nunca vivi um

sentimento como o nosso, Safi. Sabe

como sou metódico, então, vi meu


mundo apagar e ser recolorido através
de você. Tinha que colocar pra fora, até
para te explicar os meus sentimentos,
porque dizer que te amo nunca foi

suficiente, então, tentei transmitir isso


desenhando e pintando.

Abraço-o.

— Você foi enviado para mim,

para me salvar, amor — conto o que já

vinha maturando na minha mente.

— Agora o nome da exposição.


— Então, viro-me para fitar a placa que
havia ignorado quando entrei e onde está
escrito: Safira, uma declaração de

amor.

— Obrigada, Eric... — Aperto

sua mão, sem mais caber em mim de

tanta felicidade.

— Não era só esse nome que

queria dar, mas é o mais decente — ele


diz num tom zombeteiro.
— E qual o nome queria dar?

— Sapphirus, um tesão

permanente.

Gargalhamos. Eric me envolve

por minhas costas, beija o meu pescoço

e afaga a minha barriga.

— Te amo mais que tudo, Safi

— ele sussurra em meu ouvido. — E sei

que daqui a alguns anos vou estar te


amando bem mais e farei novas pinturas
sobre nós.

— Quero muito estar ao teu

lado para sempre, com a nossa princesa.

— Estaremos... Mas preciso

saber se autoriza que esses quadros

sejam visitados pelo público.

— E não são? Não vai vendê-

los? — Estreito o olhar, curiosa sobre

esse aspecto.

— Não. Poucas pessoas viram


essas telas. É a sua intimidade, embora
seja bem sutil, você precisa concordar.
E, caso concorde, nada será vendido. É

só para visitação. Por enquanto, vamos


mantê-los em nossa casa.

Repasso os olhos nas telas.

— Não vi nada que me

expusesse de modo leviano. Aliás, estou

encantada com todos. Me senti sexy e


desejada, como também extremamente
amada. Não tem por que isso ficar
guardado para poucas pessoas.

Ele sorri.

— Mas ainda não acabamos

aqui, Safi. — Ele se afasta de mim. —

Cometi um pecado e vou confessar.

Lembra quando te pedi para assinar uns

documentos dizendo que era para o

seguro saúde? — Apenas balanço a


cabeça confirmando. — Menti. Era uma
procuração pra entrar com a papelada
do nosso casamento.

Arregalo os olhos e o seguro


com firmeza para não cair. Meu coração

dispara.

Eric enfia as mãos no bolso,

retira uma caixinha e a abre diante de

mim. Lá tem um solitário grande e

incrível.

— Quer se casar comigo? —


ele pergunta e se ajoelha.

— Sim, sim! Milhões de vezes,

sim... — respondo com voz entrecortada


pela emoção e felicidade. —É claro que

quero, Eric. Céus, é o que mais quero.

— Ele se ergue e põe o anel no meu

dedo. Em seguida, nós nos beijamos e

me sinto a mulher mais amada da face da

terra em seus braços. Amada, desejada e


respeitada.
— Não sei se notou, mas o

casamento é agora... — ele avisa, com


um largo sorriso de felicidade

emoldurando o seu rosto, enquanto meu


queixo cai outra vez, com mais essa

surpresa.

Paraliso.

Eric me abraça outra vez.

— Seremos marido e mulher de


verdade! — ele murmura. — Queria
fazer essa surpresa, mas não quero que
se emocione demais por causa de Ruby.
Então, aviso logo que seu pai e Agatha

também estão aí, como também meus


pais. Eles chegaram hoje cedo e eu os

instalei num hotel. Todos vieram

celebrar o nosso amor. Por favor,

calma...

Essa informação aquece o meu


coração. Choro. Pego na bolsa um lenço
e enxugo o meu rosto. Ainda bem que
minha maquiagem não sai fácil. Minha
irmã e mãe me prepararam para esse

momento sem que eu soubesse.

Respiro fundo e procuro me

acalmar.

— Juro que vou me comportar

— prometo. — Nunca fui tão feliz e me

senti surpreendida e amada. Nunca vou


me esquecer desse dia, desses quadros e
dessas emoções.

— A minha intenção foi essa:

despertar sentimentos que nos marquem


para o resto de nossas vidas.

Observo a silhueta de Safira,

com a nossa Ruby em seu ventre; ela

assina os papéis, linda e feliz. Meu


coração aperta. Safi não consegue mais
conter as suas emoções e chora. Assino

também o documento. Neste exato


momento, Safira se torna oficialmente a

minha esposa. Não há ninguém e nada


mais entre nós.

Então, trocamos alianças.

Além do diamante do anel do

noivado relâmpago, comprei as nossas

alianças nos modelos clássicos. Coloco


a dela e, sem seguida, recebo a minha,
terminando de forjar o nosso enlace.

Uma forte emoção se espalha

por mim, principalmente, ao me lembrar


do terror que vivi quando temi por sua

vida e o horror que ela atravessou ao

lado do ex-marido por tanto tempo. Sem

contar as emoções de há pouco, quando

a levei para receber a declaração de

amor que desenhei e pintei por meses.

Então eu a beijo intensamente


sem me preocupar com olhares sobre
nós. Essa é a concretização de um
desejo que se apropriou de mim desde o

início e que, a princípio, neguei-me a


aceitar. Mas, escondido no fundo do meu

coração, o que sempre quis foi ter Safira

em definitivo ao meu lado.

Somos aplaudidos e também

embalados por dois violinistas que


contratei para a cerimônia. Rose
convidou um pastor para abençoar a
nossa união, que pregou de modo
emocionante.

Aos poucos, vamos diminuindo

o longo beijo. Pode parecer meloso,

afinal, o amor é piegas mesmo, mas

tenho uma certeza absoluta de que, se há

alma gêmea, Safira é a minha, caso

exista um amor predestinado e encontro


de almas, acabei de selar um pacto de
vida com a minha.

Fito-a de modo intenso após o

beijo. Sorrimos ternamente um para o


outro. E lágrimas umedecem os nossos

olhos. Dessa vez, é ela quem colhe a

minha lágrima com as pontas dos dedos.

— Agora é a senhora Rossi

para o resto de nossas vidas.

Seguro na mão da minha esposa


e recebemos os cumprimentos dos
convidados. Dos nossos pais, amigos e
daqueles que torcem por nós.

Agora somos um só, em dois


corpos. Em pouco tempo, seremos três.

E, quem sabe, mais adiante esse número

aumente.

Um coquetel é servido, mas nós

não desgrudamos. Beijo a mão de Safi e

a sua aliança.

— Eu te amo, Eric — ela diz,


com um coquetel sem álcool nas mãos.
— Eu não sei pintar, mas vou me
declarar a você todos os dias em

atitudes e gestos, pois está me dando a


chance de ter um casamento e uma

família de verdade.

— Safi, eu a reverencio com

toda a força do meu coração. E o que

desejo é uma vida bem careta ao teu


lado. — Sorvo um pouco do champanhe.
Ela sorri.

— Ao nosso casamento

tradicional — ela brinda e levanta a


taça.

— Ao nosso grande amor —

brindamos.
Três anos depois

Não tem nada mais encantador

do que acompanhar a interação entre


Ruby e Eric. Ela, com as suas tintas

adequadas para crianças, espalma a

parede do seu quarto de brincar,


enquanto o pai a estimula na escolha das
cores. Eles interagem por algum tempo

enquanto meus olhos se hipnotizam

diante o colorido da parede e, depois,

diante das cores vibrantes de alguns de


seus brinquedos.

Não me sinto mais uma


borboleta quebrada que arrasta as asas
pelos cantos sombrios de mim mesma.
Eu voo por belas e coloridas paragens.

E meu ponto de parada é único, sempre


ao lado dos meus amores, da bela

família que estou construindo só porque

o destino me deu uma chance, e eu a

agarrei com todas as forças.

Assim, recordo-me da paleta


em cinza e branco que me perseguiu por
anos sombrios antes de conhecer Eric.
Foram dias tristes e carregados de
ansiedade; tempos em que normalizei as

pressões e as manipulações em nome do


desafio de quebrar convenções pré-

estabelecidas.

Só os anos de terapia

colocaram cada coisa em seu quadrado.

Roubada de minha liberdade de


consentir, Edgard foi abusivo e violento
sem nunca ter me batido, até antes de sua
tentativa de me sequestrar.

Balanço a cabeça em negação.


São águas passadas que deixaram

cicatrizes.

Suspiro. Já está difícil respirar

com facilidade.

Enfim, só voltei a encontrá-lo

no dia do julgamento, que aconteceu


cinco meses depois do acidente. Apesar
de todo apoio de Eric e da proteção do
aparato judicial, recordo-me do quanto
me senti vulnerável. Nós nos vimos

rapidamente. Mas foi o tempo suficiente


para que os olhos deles parecessem me

invadir e me questionar por minha

barriga de quase oito meses de

gravidez.

Edgard foi condenado a dois


anos de detenção. Durante o tempo em
que ficou preso, ele me escreveu uma
carta, pedindo perdão por tudo de ruim
que me causou e assumindo os seus

erros. Nada respondi. Há alguns meses,


ele foi liberado, mas acabou deportado

dos Estados Unidos. Eric soube que ele

se mudou para o Qatar, um país árabe,

onde arranjou um emprego.

— Bom, se lá ele for colocar


em prática os seus fetiches e
insanidades, não será democraticamente
punido — meu marido comentou em
alusão ao quão conservador e rigoroso

são os países árabes.

De todo modo, Edgard é uma

página virada.

Eric e eu continuamos morando

em Austin. Ele comprou uma nova casa,

maior e num condomínio com uma


melhor estrutura de segurança.
Esses anos iniciais de

casamento foram uma adaptação.


Tivemos algumas brigas por motivos

bobos e logo nos entendemos, mas o


nosso amor, graças aos céus, tem se

solidificado numa relação cheia de

afeto, respeito, admiração e paixão.

Bem, saí da loja de lingerie,

onde era gerente, há poucos dias. É que


vou passar esse ano em casa e planejar a
minha própria loja de roupas íntimas em
breve.

Eric foi alçado a uma carreira


brilhante e obteve reconhecimento

internacional. Atualmente, ele só pinta e

trabalha em casa mesmo, num grande

ateliê que mandou construir no fundo de

nossa casa.

Bom, a cada aniversário de


casamento, ele faz uma tela sobre mim.
Claro que ele me proíbe de ver antes da
conclusão e não me importo com isso.

— É uma forma de tentar


expressar o meu amor por você, Safi.

Essa é uma palavra tão pequena e, em

relação a você, tem tantos significados

positivos, elevados, fortes e intensos —

ele se declarou no nosso último

aniversário e me beijou com tanto


capricho e voracidade que me fez
rememorar o beijo guloso que ele
roubou de mim naquele escritório
apertado no Parker.

A cada temporada de

exposições, redobro-me para estar ao

seu lado. Algumas coisas aprendi com

os conselhos da minha mãe:

— Eric é o tipo de marido que

não se pode deixar solto zanzando por


aí. Tem que estar linda, plena e
sorridente ao seu lado.

Dei muita risada dos conselhos

da minha mãe. Mas é lógico que os


atualizei e os considero. Enfim, não dou

marcação cerrada, mas tenho os meus

cuidados. Ainda mais agora...

Ele termina a brincadeira com

Ruby e a leva para lavar as mãos. Com

dificuldade, recolho e guardo as tintas.


Minhas pernas estão inchadas e não me
desloco com tanta facilidade.

Eric entrega Ruby a senhora

Anne, que nos ajuda atualmente. Minha


mãe chega amanhã. Precisamos de

suporte, afinal, estou prestes a ter o

nosso segundo filho, Eric Júnior.

Ando quase como uma patinha,

e ele me alcança quando saio do quarto.

— Cadê a barriguda mais linda


do mundo? — Ele me abraça e afaga o
meu ventre redondo, enquanto deito
minha cabeça em seu peito. — Tenho
muito orgulho de você, Safi — ele diz e

afaga os meus cabelos. — Por tudo que


superou, pela esposa maravilhosa que é

e a mãe excepcional que se tornou.

Eric nunca cansa de me elogiar.

Verdadeiramente, sinto que ele me

admira e isso me faz sentir a mulher


mais especial do mundo. Confesso que
me realizei como mãe e esposa dele.

— Ah, você que é

maravilhoso... — digo, já tomada por


uma emoção repentina. — Ah! Eric,

você é o meu sol. — De repente,

emociono-me.

Ele estreita o olhar.

— Você, Safi, é a minha carne.

Sinto isso tão forte... Você e as crianças


são o meu mundo.
Então, nós trocamos um beijo

terno e carregado de sentimentos e


força. Sabemos que o amor está ali,

entre nós, envolvendo-nos e nos unindo


como se fôssemos, sim, dois corações

que batem numa só alma.

15 anos depois

Quando fito o rosto dos meus


filhos, vejo refletida em seus gestos,
sorrisos e feições a minha história com
Safira. Neles estão a nossa paixão

inicial, nossos medos e a certeza de que


o nosso amor derrotou as dificuldades e

dúvidas. A verdade é que o tempo

transformou o fogo do início em sólidas

bases, firmes e fortes, onde erguemos o

nosso casamento.

Nossos filhos são fruto dessa


beleza. Ruby e Eric Vincent foram
crianças adoráveis e são adolescentes
calmos, estudiosos e inteligentes. Ruby é

um pouco temperamental e fisicamente


se parece com a mãe, com incríveis

olhos azuis. Já Eric é mais tranquilo,

mas bastante sociável e falastrão, é uma

mistura minha com Safira.

Fizemos um excelente trabalho


com eles. E Safi é a melhor mãe e
companheira, amante e esposa. É claro
que tivemos percalços. Enfrentamos
alguns períodos difíceis. Confesso que

sempre tive um pouco de ciúmes de


minha mulher, mas nunca me atrevi a

impedi-la de nada.

Sorrio.

Talvez tenha canalizado esse

sentimento, do qual não me orgulho,


para a minha rabugice.
Safi é proprietária de uma loja

de lingeries sexies, voltadas para todos


os tipos de corpos. E não é que ela foi a

modelo de uma das coleções e saiu


estampada em catálogos, sites e blogs?

Deprimi por dentro, mas superei, após

algumas indiretas e briguinhas, quando

vi as fotos.

Ela estava lá, linda e plena e


veio me apresentar as fotos como uma
surpresa, imaginando que eu iria me
agradar de vê-la quase nua enquanto
outras pessoas também a veriam dentro

daquelas peças sumárias. Dei uma


surtada. Mas, enfim, não agi

corretamente, reconheço. E, como tudo

em nossas vidas, conseguimos

administrar. E engoli a situação.

Mas ela também teve os seus


temores. No início de nosso casamento,
as minhas temporadas de estreias
sempre a deixavam enciumada,
principalmente, quando ela não poderia

me acompanhar nas viagens.

Eu sempre achei graça disso,

pois não há mulher que me encante mais

do que ela própria. Sim, claro, não

morri, sei reconhecer uma linda mulher,

mas nenhuma se compara à minha, a que


escolhi e a que ainda me inspira quando
estou diante do branco instigador de uma
nova tela.

Nós fazemos amor com


frequência, mas agora prezamos mais

pela qualidade que pelos arroubos. Vejo

o corpo dela como um templo, onde

tenho prazer e sossego, onde me realizo

e sou profundamente amado e desejado.

Ela tem o poder de me fazer sentir o


homem mais quente do pedaço.
Enfim, mais um ano se passou...

Estamos em Arouca, Portugal.

Viemos comemorar o nosso aniversário


de casamento. Esse ano, entreguei o seu

quadro antecipadamente. Afinal, já

somamos mais de 25 telas em forma de

declarações de amor a ela. E ainda acho

que não consegui expressar todo o meu

sentimento pela minha mulher.

Olho a janela, o verde parece


ter brilho próprio e o som da natureza
embala os meus sentidos...

— Em que está pensando? —


Safira me arranca dos pensamentos ao

me enlaçar pelas costas.

— Em nossa história, em tudo

que passamos.

— Não troco o Eric de agora

pelo Eric do início. E quero daqui a 10


anos repetir essa frase, preferindo a sua
versão quase sessentona.

Gargalho.

Em seguida, eu me perco em

seus belos olhos, que ficaram ainda mais

lindos com algumas rugas que surgem

quando ela sorri, afinal, Safi é uma linda

quarentona.

— Vamos...

Seguro-a e deposito um suave

beijo nos seus lábios.


— É a minha esposa! — digo,

como se quisesse reafirmar essa


sensação de união, bem distante do

tempo em que ela foi a esposa do meu


amigo.

— E você é meu mundo cheio

de cores. — Seu sorriso me ilumina,

leve suave e expansivo. — Nunca

esqueço o nosso início, quando o nosso


amor me salvou.
Agradeço à minha família por

compreender a minha paixão pela

escrita, o que requer longas horas de

dedicação.

Minha gratidão às leitoras do


Wattpad, um forte beijo às meninas do

pequeno grupo de WhatsApp,


Amadinhas.

Meu agradecimento também às

parceiras de IGs Literários e as


assessorias que tanto me ajudaram na

concretização desse livro:

CrazyForHotBooks, BF Assessoria e

Consultoria, Angels e a D&P. Cada uma

teve o seu importante papel em meu

auxiliar com essa publicação.

Minha gratidão a você, que


chegou até aqui, lendo esse meu sexto e-
book publicado na Amazon.

Abençoada jornada a todas.

Muita paz, tranquilidade e amor

no coração.

Forte abraço!
Cindy Emy é o pseudônimo que
uso para publicar romances
contemporâneos. Moro em Salvador, sou
graduada em Jornalismo e atuo na área
de assessoria.

Mas sempre foram os


devaneios e o intangível que permearam
meus caminhos e me instigaram a
escrever. Comecei com a escrita de
poesias, posteriormente passei a me
dedicar aos contos e aos romances.

Bem, sou mãe de um casal e


muito grata por essa bênção.

Também sou uma mulher de


hábitos simples. Assisto séries, leio
romances e escrevo minhas histórias.

A Esposa do Meu Amigo é o


meu sexto e-book. Antes dele, escrevi
Meu Único Pecado. A minha estreia
como romancista foi com Só Por Um
Ano, publicado em 2019. De lá para cá,
escrevi Um Casamento Por Vingança,
que ganhou uma versão impressa por
meio do Selo Papoula da editora The
Books. Também publiquei Rendido aos
Teus Pés e Medo de Amar.

Enfim, se gostou de meu


trabalho, peço, gentilmente, que me siga
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Até a próxima história!
Cindy Emy
O bem-sucedido investidor de
Nova Iorque, Alexander Thomas Reed,
tem um namoro morno com Rebecca.
Porém, sua vida vira de ponta a cabeça
quando ela lhe exige que contrate uma
governanta para gerir a vida deles.

Ana Júlia é uma brasileira


tímida, ingênua e pura que desembarca
em Nova Iorque para uma temporada de
trabalho. Ela acredita ter conseguido o
emprego dos sonhos, um contrato de
trabalho como assistente pessoal de um
grande diretor de fundos de Wall Street,
por intermédio de duas amigas, mas
acaba como doméstica na casa da
família Reed.

Anaju se depara com um casal


estranho. Rebecca é uma mulher
arrogante e superficial, uma verdadeira
jararaca, que, sempre que pode, a
humilha. Já Alexander é um homem
workaholic, que fez despertar
comichões no corpo da moça.

Alexander se encanta por


Anaju, por sua simplicidade e
sinceridade. Ele procura protegê-la do
veneno de Rebecca, mas não consegue
resguardá-la dele mesmo e de seus
desejos incontroláveis pela moça.

Recomendado para maiores de


18 anos.

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O médico Otto Rangel é um
homem forjado pelo ódio e pela
brutalidade da vida. Otto perdeu Milena,
a esposa grávida, há 8 anos.
Ele tem um ódio mortal do
deputado João Guerra Cruz, e essa é
uma situação envolta em obscuridades e
segredos. Otto credita toda a sua dor e
sofrimento ao deputado.
Para o médico, sangue se paga
com sangue, dor com dor e sofrer por
sofrer.
Nos últimos anos, cresce no
peito o desejo por vingança após
algumas descobertas. Então ele retorna
para a região do Vale dos Segredos,
estabelece-se entre as cidades de Mundo
Verde e Brejo Negro e começa a
articular seus planos.
O destino coloca no seu
caminho a filha do demônio.
Agora Otto está prestes a dar o
primeiro passo para destruir João
Guerra. Vai se casar com uma das três
filhas do deputado, a engenheira
ambiental, Maria Teresa Guerra Cruz.
Maria Teresa, a quem todos
chamam de Maitê, é uma jovem cheia de
ideais, que não se dobra ao poder, nem
de sua família, nem dos desafetos do
pai.
Maitê se apaixona
perdidamente pelo novo cirurgião da
cidade, Otto Rangel. É que Otto salvou
sua vida duas vezes. E, aos poucos, ela
vai entregando o seu coração ao homem
de temperamento sério e duro, que quase
não sorri.
Para o casamento, são apenas
seis meses.
Eles se casam, batendo de
frente com os desejos dos familiares da
moça, que consideram a união muito
precoce. Enfim, enquanto a proximidade
aos Guerra Cruz só faz o ódio de Otto
crescer, Maria Teresa só tem amor no
coração.
Enquanto ele a espera no altar,
como se tivesse uma espada na mão,
Maria Teresa lhe oferece flores e a ela
mesma em sacrifício.
Otto diz fingir amar Maria
Teresa.
Ela lhe dá a sua alma e vida...
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Ter se apaixonado pela mulher

do coronel mais temido de todo Vale dos

Segredos é um pecado que atormenta o


íntegro veterinário Artur Correa. Mas a

sua coragem o impulsiona a desafiar o


perigo, o destino e a desvelar segredos
sobre o seu próprio passado.

O seu amor por Vida, a esposa

do coronel Sampaio, é quase uma


sentença de morte. Mas Artur não se

deixa intimidar e luta por esse

sentimento até o seu último respiro,

quando tudo parece perdido e as tramas

da tragédia insistem em os envolver.

Viridiana, que todos chamam de


Vida, foi vendida pela avó ao coronel
Sampaio, que é viciado em garotas
virgens. Apaixonada por bichos, Vida é
a jovem mãe de Camilinha, uma bebê

fofa, que a faz refrear a forte atração que


passou a nutrir pelo mais novo

veterinário da fazenda Desassossego.

Só que a tensão entre Artur e

Vida aumenta. E essa paixão não pode

ser mais ignorada.

Na esteira dos acontecimentos,


um embate se aproxima e não é possível
evitá-lo. Artur se prepara para enfrentar
o coronel, mas talvez não haja tempo

hábil...

Nesse jogo, só um deles dará a

cartada final.

E nada será como antes, nem

Artur, nem Vida e nem o coronel.

ALERTA! Contêm cenas de violência,

violência doméstica e sexo.


Diálogos coloquiais e regionalismos.

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Tudo começa quando o sádico
neurocirurgião Vicente Max vê sua
reputação ruir devido à sua predileção
por sexo pesado, de instintos perversos,
que pratica com mulheres fidelizadas e
submissas.

Precisando melhorar a própria


imagem, o neurocirurgião manda propor
um casamento de fachada à gerente de
restaurante Suna Ferraz, com a
finalidade de que seja sua esposa de
mentirinha, só por um ano.

Para o médico, Suna se tornou a


garota ideal pela fama de boa moça e
pelo biótipo de mulher frágil, que não
lhe atraía. Por sua vez, a garota aceita
participar dessa farsa porque vem sendo
chantageada pelo ex-namorado Dante
acerca de um segredo do passado.

Só que eles se apaixonam. Ao


longo dessa paixão inicial, Max luta
para esconder sua sexualidade
obsessiva e violenta. Já Suna desconfia
dos mistérios que rondam o homem por
quem se apaixona. Contudo, o que os
dois não percebem é que fazem parte de
um jogo maquiavélico de um dos
personagens que deseja destruir a vida
do médico.

É um livro recomendado para


maiores de 18 anos. Há muitas cenas de
sexo explícito e de violência.

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O destino passou várias
rasteiras no bem-sucedido advogado
Marcel Filares, fazendo dele um homem
quebrado, distante e controlador de suas
emoções. Mas uma fatalidade faz sua
vida cruzar com a jornalista Isla Weber,
uma garota angelical, doze anos mais
jovem, que se torna vítima do advogado.
Marcel não se envolvia
emocionalmente. Era um homem que
impunha regras a si mesmo com o intuito
de evitar ser fisgado por qualquer
afeição que fosse capaz de
desestabilizar a vida milimetricamente
planejada.

Será que as defesas do


advogado sedutor, cheio de ex-
namoradas, iriam ser derrubadas?

A jornalista é uma moça


obstinada e decidida. Quando viu
Marcel pela primeira vez, sentiu-se
encantada e flechada pelo amor à
primeira vista. Só que o destino a joga
em uma sucessão de enrascadas e
eventos ruins, que coloca sua vida em
risco. Marcel acaba se tornando o seu
grande protetor.

A tensão paira entre eles. Ela o


deseja e se arrisca. Ele teme os desejos
e emoções.

Medo de Amar é um spin-off de


Só Por Um Ano. Na história,
encontramos personagens já conhecidos,
como o médico Vicente Max e Suna,
além de serem inseridos novos
personagens.

É um livro recomendado para


maiores de 18 anos. Há muitas cenas de
sexo explícito e de violência.

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[1]
Lupinus texensis, mais conhecida
por bluebonnet é um nome dado às flores azuis
do gênero Lupinus, encontradas
predominantemente no sudoeste dos Estados
Unidos. É considerada a flor do estado do
Texas. A forma das pétalas da flor lembra o
gorro. (Wikipédia).
[2]
Austin é a capital do estado
americano do Texas.
[3]
Treinee é um programa de aprendizado e
treinamento para preparar profissionais recém-
formados para exercer cargos. É uma
oportunidade voltada para estudantes do último
ano da graduação ou formados há, no máximo,
3 anos.

[4]
Azeviche é uma gema de
coloração negra luminosa.
[5]
É um corte bovino do peito, típico
do churrasco texano.
[6]
É um bairro histórico de
entretenimento no centro de Austin.
[7]
Carro de comida.
[8]
Avenida arborizada de seis pistas
que corta o extremo sul da cidade .
[9]
É o nome que se dá ao fetiche no
qual o homem sente tesão em ver a sua parceira
transando com outra pessoa.
[10]
É a pessoa que compra e vende
objetos artísticos, como também cuida dos
interesses do artista e o agencia.
[11]
O impressionismo foi um movimento
que surgiu na pintura francesa, no séc.
XIX. Os seus pintores produziam telas ao
ar livre. A intenção era capturar as
tonalidades que se refletiam da iluminação
solar.
[12]
O lema de Austin é keep Austin
weird, em tradução livre, mantenha Austin
estranha.
[13]
É um apelido para as empresas
de alta tecnologia na região metropolitana de
Austin, no estado do Texas. O nome é análogo
ao Vale do Silício, mas refere-se ao terreno
montanhoso no lado oeste da cidade.
[14]
É o visto permanente de
imigração concedido pelas autoridades
americanas.
[15]
Noz produzida pela nogueira
pecan, que é originária do sul dos EUA.
[16]
Construções que dividem as
paredes laterais.
[17]
Racho Terra do Ouro, tradução
livre do inglês e espanhol.
[18]
Muito, muito bonita (espanhol).
[19]
O rafting é uma atividade
esportiva de aventura, que se baseia no uso de
botes infláveis e equipamentos de segurança
para descer corredeiras.

[20]
Termo inglês pelo qual se designa
cachorrinho, cãozinho.
[21]
É aquela planta em forma de
bolo de feno que roda em filmes de faroeste.
Como é muito quente, as plantas não
conseguem sobreviver e elas evoluem para
essas bolas que rodam pelo oeste americano.
[22]
A metilenodioximetanfetamina, a
popular ecstasy, é uma substância psicotrópica
usada frequentemente como droga recreativa.
Os efeitos mais comuns são aumento da
empatia, estado de euforia e sensação de prazer
(Wikipédia).
[23]
É a prática do cuckold, a arte de
trair o companheiro com o seu consentimento.
[24]
Apelido da metanfetamina
(ecstasy).
[25]
O blues é um gênero e forma
musical originado por afro-americanos no
extremo sul dos Estados Unidos em torno do
fim do século XIX .
[26]
Portas tipo de bar de filmes de
faroeste.
[27]
Nessa escola, os artistas
propunham representar não a realidade, mas o
sonho. Assim, fantasias, devaneios,
inconsciência, ausência de lógica formavam a
base das criações desse movimento.
[28]
A pop art é um movimento
artístico que se caracteriza por reproduzir
temas relacionados ao consumo, publicidade e
estilo de vida.
[29]
Trata-se de um espaço com o pé-
direito elevado, ar industrial e ideia de um
espaço único para todos os cômodos. Valoriza
a iluminação natural e separa os ambientes a
partir dos próprios objetos.
[30]
Palavra do inglês que designa
caso extraconjugal.
[31]
SoCo é a abreviação da South
Congress Avenue, é uma área movimentada
com boutiques vintages, lojas de moda country,
casas de músicas ao vivo, restaurantes e galeria
de arte.
[32]
O Lago Travis é um reservatório
do Rio Colorado de 105 quilômetros de
extensão, que serve para controle de
inundações e tem espaços de lazer ao seu
redor.

[33]
NFT (Non Fungible Token),

token não-fungível é um selo digital associado

a um item que garante a sua autenticidade.

[34]
Arte de rua. Austin é uma cidade
muito artística e tem muitos murais espalhados
pela cidade.
[35]
É o dono da galeria de arte.
[36]
A prática do cuckold. É um
fetiche masculino em que o homem tem o
desejo, uma enorme vontade de ver sua parceira
com outro homem.
[37]
É o quinto maior jornal de
publicação diária dos Estados Unidos, com
sede em Nova York.
[38]
Grande maça (ing.) É um apelido
de Nova York.
[39]
Exposto (ing.) É um termo usado
para definir uma exposição de um fato
criminoso ou questionável em redes sociais.
[40]
Antepasto italiano feito à base
de pão, que é tostado em grelha com azeite e,
depois, esfregado no alho.
[41]
Tulipas de frango (meio da asa),
mergulhadas no molho barbecue.
[42]
É a escala de temperatura
utilizada nos EUA.
[43]
É um famoso arranha-céu de 102
andares que fica no coração de Manhattan.
[44]
Significa cadeira longa, que é
como se chama esse tipo de móvel, que parece
um divã.
[45]
Tensão pré-menstrual. Um
conjunto de sintomas que acomete as
mulheres, em geral, entre a ovulação e o
período menstrual.
[46]
A Interstate 35 é uma autoestrada
interestadual, norte-sul, que se inicia em
Laredo, na fronteira do México.
[47]
Um heliponto é uma área
destinada à realização de operações de
decolagem e aterrissagem de helicópteros.
[48]
São bolsas de ar, um
componente de segurança de veículos.

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