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Edilton Meireles
1. Introdução
A Lei n. 13.467/17, que implantou a Reforma Trabalhista no Brasil, acabou por incluir
na Consolidação das Leis Trabalhistas expressa menção à possibilidade de homologação
judicial de acordo extrajudicial (autocomposição).
O disposto no art. 855-B da CLT, com a redação dada pela Lei n. 13.467/17, com vigência
a partir de 11 de novembro de 2017, a rigor, não introduziu qualquer novidade no processo
do trabalho. Isso porque, conforme legislação processual civil subsidiariamente aplicável,
o processo de homologação de acordo extrajudicial já tinha cabimento na Justiça do
Trabalho em face da previsão na lei processual civil 1.
Essa possibilidade foi introduzida no processo brasileiro pelo art. 57 da Lei n. 9.099/95,
que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais.
Em seu art. 57, essa Lei, em regra de direito processual civil aplicável a qualquer demanda
cível, dispõe que “O acordo extrajudicial, de qualquer natureza ou valor, poderá ser
homologado, no juízo competente, independentemente de termo, valendo a sentença
como título executivo judicial”.
Semelhante disposição foi introduzida no CPC de 1973 pela Lei n. 8.953/94, que
acrescentou ao então código processual civil brasileiro o inciso III do art. 584,
posteriormente, reintroduzido pela Lei n. 10.358/01, para estabelecer que é título
executivo judicial a sentença homologatória de transação, “ainda que esta não verse
questão posta em juízo”.
Já o atual CPC, em seu art. 725, inciso VIII, seguindo a linha da Lei n. 9.099/95, foi mais
explícito, estabelecendo expressa disposição quanto ao cabimento do processo de
“homologação de autocomposição extrajudicial, de qualquer natureza ou valor”.
É, pois, neste caminhar, que os arts. 855-B a 855-E da CLT vieram disciplinar, na
realidade, apenas o procedimento do processo de homologação de acordo extrajudicial no
âmbito da Justiça do Trabalho. Isso porque, na pior das hipóteses, por força da aplicação
subsidiária ou supletiva, desde o início da vigência do CPC de 2015, já tinha cabimento
na Justiça do Trabalho o processamento desta espécie de processo de jurisdição
voluntária.
1
Teixeira Filho, Manoel Antonio, As Recentes Alterações no Processo Civil e suas Repercussões
no Processo do Trabalho, p. 111.
2
Calmon de Passos, Inovações no Código de Processo Civil, p. 132; Theodoro Junior, Humberto,
As Inovações no Código de Processo Civil, p. 39-40.
A Reforma Trabalhista, portanto, apenas se preocupou em disciplinar o processamento,
não o cabimento, desta espécie de demanda judicial.
Antes de tratar do processamento em si, no entanto, é preciso delimitar o que se tem por
acordo extrajudicial.
A transação, ainda, está limitada “a direitos patrimoniais de caráter privado” (art. 841 do
Código Civil).
O CPC menciona, ainda, que ele pode ser “de qualquer natureza ou valor” (inciso VIII do
art. 725 do CPC/15). Logo, não se limita “a direitos patrimoniais de caráter privado” (art.
841 do CC). E essa disposição processual bem revela que a expressão acordo extrajudicial
não se equivale a transação, já que esta somente pode envolver direitos patrimoniais
privado.
Ele, assim, pode se referir a um acordo para alterar um contrato, um acordo para distratar
o contrato, para quitar direitos e obrigações, etc. Em suma, pelo acordo as partes podem,
nos limites da lei, pactuar qualquer acerto, com declarações recíprocas de vontade, ainda
que por mera liberalidade ou graciosa.
Neste caminho, acrescentando com outros exemplos, podem ser objeto de homologação
judicial: o acordo para rescisão contratual (art. 484-A da CLT), o acordo (cláusula ou
compromisso) de arbitragem (art. 507-A da CLT), a quitação anual de obrigações (art.
507-B da CLT), a alteração contratual (art. 468 da CLT) e o acordo de compensação de
jornada de trabalho (arts. 59 e 59-A da CLT), dentre outras hipóteses.
Nada impede, ainda, que o acordo coletivo possa ser levado a homologação judicial,
passando a gozar da natureza de sentença normativa.
4. Procedimento.
4.1. Iniciativa
O CPC/15, em seu art. 720 dispõe que na demanda de jurisdição voluntária para
homologação judicial de acordo extrajudicial “o procedimento terá início por provocação
do interessado, do Ministério Público ou da Defensoria Pública, cabendo-lhes formular o
pedido devidamente instruído com os documentos necessários e com a indicação da
providência judicial” (art. 720). No caso, a providência judicial seria a mera homologação
do acordo.
E aqui vale lembrar que nossa legislação, em diversas situações, submete o exercício do
direito ao consentimento de outrem. E, em geral, nessas situações, o legislador prevê a
possibilidade de o consentimento ser suprimido por decisão judicial.
Podemos, assim, citar o caso do menor que somente pode se casar com o consentimento
de seus responsáveis (art. 1.517 do CC), mas a lei possibilita ao juiz suprir esse
consentimento quando “injusta” a recusa (art. 1.519 do CC). Igualmente, o Código Civil
também estabelece que o cônjuge, salvo quando casado sob regime de separação absoluta
de bens, somente pode concretizar determinados negócios jurídicos com o consentimento
do outro (art. 1.647 do CC). O juiz, no entanto, poderá suprir o consentimento quando a
recusa não tenha um “justo motivo” (art. 1.648 do CC).
Vale acrescentar, ainda, que nada impede de a parte ser substituída processualmente nesta
demanda, seja pela entidade sindical, seja pelo Ministério Público do Trabalho.
A CLT dispõe que, uma vez proposta a demanda, “no prazo de quinze dias a contar da
distribuição da petição, o juiz analisará o acordo, designará audiência se entender
necessário e proferirá sentença” (art. 855-D).
Caso, porém, a demanda seja proposta por apenas um dos interessados, a hipótese é de
aplicação da regra subsidiária do CPC, em seu art. 721, determinando-se a citação de
“todos os interessados” para se manifestarem no prazo de quinze dias.
Assim, mesmo na hipótese de a demanda ser proposta por apenas um dos acordantes, não
cabe ao juiz, de logo, extinguir o feito pela ausência de manifestação de interesse do outro
acordante. No caso, cabe-lhe, em verdade, mandar citar o interessado para que ele se
pronuncie quanto a concordância ou não com o pedido de homologação judicial.
Em qualquer hipótese, porém, cabe intimar o Ministério Público nos casos previstos no
art. 178 do CPC/15, ou seja, nos processos que envolvam “interesse público ou social”,
“interesse de incapaz” ou quando envolver “litígios coletivos pela posse de terra rural ou
urbana”, lembrando que a “participação da Fazenda Pública não configura, por si só,
hipótese de intervenção Parquet (parágrafo único do art. 178 do CPC/15).
A CLT ainda prevê (e nada impediria qualquer omissão legislativa neste ponto) a
possibilidade de o juiz do trabalho designar audiência, “se entender necessário”. No caso,
na audiência o juiz poderia pedir que as partes prestassem algum esclarecimento, tirar
dúvidas, etc., podendo, ainda, sugerir alterações no acordo de modo a adequá-lo aos
limites da lei, evitando, assim, eventual decisão desfavorável aos interessados.
Nada impede, ainda, que a audiência sirva como meio de ratificação do acordo
extrajudicial, especialmente quando, pelo menos, um dos acordantes esteja numa
condição de vulnerabilidade qualificada. Esclarecemos.
Por certo que, em regra, o trabalhador pode ser classificado como vulnerável, já que se
encontra numa situação de fragilidade, permanente ou provisória, perante o empregador.
Daí porque necessita de maior proteção. Logo, em tese, o juiz do trabalho sempre pode
designar a audiência como meio de controle do acordo, já que na oportunidade pode
apurar o grau de vontade do trabalhador na celebração do acordo.
Dentre todos eles cabe especial aplicação o princípio da decisão informada. Por este, cabe
prestar ao interessado todas as informações e esclarecimentos necessários à compreensão
do que está sendo acordado, inclusive quanto as suas consequências. Ou seja, é condição
necessária que o interessado tenha plena consciência quanto aos seus direitos e a realidade
fática na qual se encontra e as consequências que possam advir do acordo celebrado.
Logo, ao menos em casos especiais, o juiz pode se valer da audiência para prestar esses
esclarecimentos, solicitando a ratificação do acordado antes de sua homologação.
Neste caminhar, optando pela realização dessa audiência, mas desde que advertindo
previamente as partes, cabe, ainda, a aplicação da regra do § 8º do art. 334 do CPC, de
modo que o não comparecimento injustificado da parte audiência poderá ser “considerado
ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento
da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União
[...]”.
Nada impede, ainda, de o juiz, antes de homologar o acordo, pedir esclarecimentos por
escrito, sugerir retificação de cláusulas, ou, ainda, ouvir terceiros na qualidade de amicus
curiae, “considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da
demanda ou a repercussão social da controvérsia” (art. 138 do CPC).
Com ou sem a realização da audiência, seja qual for a hipótese, o juiz deve pronunciar
sua decisão em sentença. Essa poderá ser simplesmente homologatória do acordo, ainda
que parcialmente, ou extintiva sem resolução do mérito (ilegitimidade de parte, etc) ou,
ainda, de rejeição do pleito com resolução de mérito (improcedência do pedido de
homologação).
O CPC, no parágrafo único do art. 723, aplicável por força do disposto no art. 725, caput,
estabelece que neste procedimento “O juiz não é obrigado a observar critério de
legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a solução que considerar mais
conveniente ou oportuna”.
Por exemplo: a CLT estabelece que somente o empregado que perceba salário mensal
igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de
Previdência Social e seja portador de diploma de nível superior possa firmar acordo
contratual nas hipóteses previstas no art. 611-A da CLT (conforme disposto no parágrafo
único do art. 444 da CLT).
Quem não preencha essas duas condições, no entanto, poderá firmar o acordo
extrajudicial e pedir sua homologação judicial. Imaginem que esse acordo fosse celebrado
por um jogador de futebol que percebe salário elevadíssimo. No caso, então, o juiz, não
se limitando a legalidade estrita, tendo em conta a conveniência ou a oportunidade, poderá
homologar o acordo, referendando a vontade da parte cuja autonomia para negociar é
limitada.
Da decisão judicial, por sua vez, cabe embargos de declaração e eventual apelo (recurso
ordinário).
Óbvio, ainda, que se o juiz perceber que as partes se valem do procedimento “para praticar
ato simulado ou conseguir fim vedado por lei”, cabe-lhe proferir decisão que impeça os
objetivos das partes (art. 142 do CPC).
Diga-se, ainda, que mesmo diante da recusa do acordo extrajudicial, nas hipóteses
previstas em lei, ele, por si só, já pode ser título executivo extrajudicial (por exemplo, nas
hipóteses dos incisos II, III e IV do art. 784 do CPC/15).
4.4. Efeitos
A CLT dispõe de duas regras quanto aos efeitos que decorrem do ajuizamento da ação de
homologação de acordo extrajudicial.
5. Controle judicial.
Outra questão bastante relevante é em se saber se o juiz pode exercer o controle judicial
quanto ao acordo extrajudicial.
A resposta, por óbvio, deve ser positiva, até porque a decisão judicial não é vinculante à
vontade das partes.
Assim por óbvio, que o juiz deve verificar o preenchimento de todos os requisitos
necessários para validade do negócio jurídico (arts. 104 e 166 do Código Civil), negando
homologação aos atos nulos de forma absoluta.
Caso, porém, esteja diante de ato anulável, ele somente poderá negar a homologação se
provocado (art. 141 do CPC).
6. Anulação e rescisão.
O juízo que homologou o acordo, por sua vez, é o prevento para a respectiva ação
anulatória3.
No caso em que o juiz nega a homologação judicial, no entanto, a decisão respectiva pode
ser objeto de ação rescisória nas hipóteses taxativas prevista no CPC (art. 966 do CPC).
Isso porque, no caso, por lógica, não se trata de decisão meramente homologatória de ato
de vontade. E a que nega a homologação é de mérito.
7. Conclusão.
3
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Conflito de competência n. 120.556. Rel. Min. Luis Felipe
Salomão. Julgado em 09/10/2013. DJe 17/10/2013. Disponível em:
https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=2011031
09345&totalRegistrosPorPagina=40&aplicacao=processos.ea. Acesso em: 25 set. 2017; BRASIL.
Superior Tribunal de Justiça. Recurso especial n. 1.150.745. Rel. Min. Marco Buzzi. Julgado em
11/02/2014. DJe 19/02/2014. Disponível em:
https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=2009014
37560&totalRegistrosPorPagina=40&aplicacao=processos.ea. Acesso em: 25 set. 2017.
Assim, em apertada síntese podemos concluir que o procedimento de homologação de
acordo extrajudicial já tinha cabimento na Justiça do Trabalho pelo menos desde o início
da vigência do Código de Processo Civil de 2015, por força de sua aplicação subsidiária
e supletiva, tendo em vista o disposto no art. 725, inciso VIII, deste diploma legal.
A Lei n. 13.467/17, por sua vez, apenas veio disciplinar, em alguns aspectos, o
processamento deste procedimento de jurisdição voluntária, estabelecendo algumas
regras mais especiais em relação ao CPC de 2015, a exemplo da exigência do seu
ajuizamento em petição conjunta pelas partes interessadas.
O acordo extrajudicial difere da transação, já que aquele pode ter por objeto matéria de
qualquer natureza e valor (inciso VIII do art. 745 do CPC/15), enquanto esta outra
(transação) é reservada a direitos patrimoniais privados.
Por fim, cabe ressaltar que a decisão que homologa o acordo extrajudicial é passível de
anulação nos termos da legislação civil. Já a decisão que rejeita o pedido ou que
eventualmente extingue sem resolução de mérito o procedimento pode, nas hipóteses
legais, ser objeto de rescisão judicial.
8. Referências
BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. 1973.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm; Acesso em: 17 set. 2017.
BRASIL. Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis
e Criminais e dá outras providências. 1995. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm. Acesso em: 17 set. 2017.
BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 03 jul. 2017.
BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. 2015. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 05
jun. 2017.
BRASIL. Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT), aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, e as Leis nos 6.019, de 3
de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de
adequar a legislação às novas relações de trabalho. 2017. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm. Acesso em: 28
ago. 2017.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Conflito de competência n. 120.556. Rel. Min. Luis
Felipe Salomão. Julgado em 09/10/2013. DJe 17/10/2013. Disponível em:
https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=
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2017; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso especial n. 1.150.745. Rel. Min. Marco
Buzzi. Julgado em 11/02/2014. DJe 19/02/2014. Disponível em:
https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=
200901437560&totalRegistrosPorPagina=40&aplicacao=processos.ea. Acesso em: 25 set.
2017.