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Resgatando o Sentido do Trabalho

Uma visão logoterapêutica para prevenção e tratamento do Burnout

O pontapé inicial…
Trabalho com empresários e suas lideranças, traçando estratégias e pensando junto a
respeito dos desafios diários na condução de seus negócios e equipes. Essa experiência, somada à
paixão pelo conhecimento, levaram-me a aprofundar meus estudos e pesquisas para melhor
contribuir com quem está na "cadeira de tomada de decisão": a pessoa.
Assim, além dos conhecimentos e formações na área de negócios e empreendedorismo,
desde 2017 desbravo e me aprofundo nas temáticas de propósito e desenvolvimento humano. Este
ano, concluí a especialização em Logoterapia e Análise Existencial, direcionando minha formação
para a experiência da Pessoa com o Sentido da Vida por meio do Trabalho.
Durante a formação em Logoterapia - já buscando aplicar a busca pelo Sentido no Trabalho,
o propósito, deparei-me com esta estatística impactante de termos o Brasil em 2º lugar no mundo
em casos diagnosticados de Burnout, segundo pesquisa da International Stress Management
Association (Isma).
Nasceu, assim, a ideia de desenvolver, não apenas o artigo para conclusão do curso - já
apresentado, mas também aprofundar a pesquisa, conhecendo um pouco mais do dia a dia de
quem faz o Brasil se movimentar.
Durante o mês de novembro de 2023, entrevistei 55 pessoas - líderes e empreendedores,
pessoas em posição de tomada de decisão, buscando compreender quais têm sido os maiores
desafios da posição, onde eles têm encontrado suporte para seu desenvolvimento. Neste encontro,
apliquei o Inventário de Maslach - ferramenta desenvolvida por uma logoterapeuta para auxiliar no
diagnóstico do Burnout, com cujos resultados preparei este relatório apontando o grau de desgaste
emocional em que cada um se encontra.
Interessante ressaltar que, ao longo das conversas, ouvi diversas vezes sobre estarem
"parando para pensar agora sobre isso". A vida exige movimento. Entretanto, pausas também. Sendo
assim, seguem os resultados dos pensamentos provocados e compartilhados ao longo desses
encontros.

Conhecendo a Amostra
O critério para participação era ter experiência nas posições de liderança e/ou
empreendedorismo, independente do tamanho ou segmento da instituição. Afinal, o objetivo era
medir os desgastes emocionais de ocupar posições de tomada de decisão.
Foram 55 entrevistadas, todos com experiência em posições de tomada de decisão, sejam
estes líderes ou empreendedores. A maioria jovens adultos - 60% entre 22 e 40 anos, atuando em
vários setores da economia brasileira. As mulheres representaram 78% do grupo.

Os Marcadores de Desgaste Emocional


Cansado todo mundo fica. É normal. Ainda mais considerando que estamos no final do ano.
Naturalmente nosso cérebro já nos conduz para a ideia de encerramento de ciclo e necessidade de
renovo. Somado a isso, as exigências cotidianas de quem ocupa posições de tomada de decisão
tendem a pesar mais.
É válido ressaltar que o excesso de (des)informação a respeito do tema acaba levando à
banalização de termos como Burnout, e tudo parece ser o "tal Burnout", ainda que não seja. Por
outro lado, pessoas realmente em vias de desenvolver a síndrome estão "no mesmo barco" que as
que não irão desenvolver. Ambos estão cansados, correndo para "dar conta de tudo", evitando parar
para respirar e reorganizar a rotina. Muitos seguem tomando decisões importantes a respeito de
negócios e equipes, evitando o mais importante e prioritário processo de decisão - a respeito de si
mesmo. Aqui mora o perigo.

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Cansaço físico se resolve com descanso, ajustes de rotina, uma boa revisão médica, ajustes
na alimentação e práticas de hábitos saudáveis como atividades físicas, meditação, espiritualidade.
Todo mundo sabe. Mas quantos põe em prática?
O cansaço físico "mal" resolvido vai estimulando o cansaço emocional. Não somos máquinas
separadas, somos seres inteiros - corpo, mente, espírito. A "roda viva" das cobranças infindáveis, de
tudo que se tenta "romper limite" sem "dar limite" nos adoece. Então quer dizer que buscar uma
melhor performance pode nos adoecer? Sim e não. Quando se fala em pessoas, não existem
respostas simples, as questões sempre são complexas.
O desenvolvimento de uma liderança pressupõe tensões, a vida as pede para que haja
crescimento, amadurecimento. Entretanto, é imperativo que se observe como a pessoa está
reagindo às tensões e com isso equilibrar o "romper limites" dentro de "um limite" saudável.
Todos os dias, líderes e empreendedores sentam em suas cadeiras de tomada de decisão,
sentem-se responsáveis por carreiras, famílias, salários para pagar, negociações e acordos para
honrar… em um processo saudável, esses desafios são estimulantes, ainda que sigam sendo
desafiadores. É bem provável que se tenha cansaço, frustração, medo, "choro no banho", e outras
coisas semelhantes. A tensão "boa" do desenvolvimento em ação impulsionando a pessoa a ir além
e levar consigo muitos outros. Eis o contexto de alguém que está num nível de Realização Pessoal -
reconhece as tensões, cansa, sente a vida e o dia a dia do trabalho, mas ainda assim não tem
problemas em levantar de manhã e ir trabalhar. Claro que, aquela preguicinha numa sexta-feira
segue existindo. Estamos vivos!
Por outro lado, caso essa pessoa não dê atenção aos seus limites, e o quanto consegue
tensioná-los durante o processo, entrar num movimento contínuo, sem pensar, (quase) sem sentir, é
a tendência. Neste caminho, a pressão do dia a dia deixa de ser estimulante e passa a ser opressiva,
ao mesmo tempo em que a pessoa parece não conseguir sair do lugar. Então, como não consegue
sair dali, começa a "desconectar-se" emocionalmente do outro - sendo esse "outro" qualquer pessoa
que estiver no seu entorno. É uma tentativa de sobrevivência, pode se dizer que até inconsciente.
Este é o nível do Cansaço Emocional, onde se pode dormir e acordar exausto. A desmotivação é
crescente e não se consegue lidar com ela. O jeito de "não sentir" e seguir vivendo é avançando para
o nível de Despersonalizar. O que seria uma suposta proteção inconsciente é um sintoma grave de
quem está caminhando para colapsar.
Casos de Burnout "desligam" a pessoa enquanto ela dirige, anda, trabalha… o cérebro
simplesmente "derruba o disjuntor" de energia porque não aguenta mais. O termo, do inglês, "burn
out" é justamente para exemplificar o que acontece fisicamente no cérebro - queimar. É comum
ficarem sequelas e a necessidade de muitos tratamentos médicos, e não só psicotrópicos, para que
haja uma reabilitação.
A ferramenta aplicada mediu os níveis dos marcadores em cada um dos entrevistados,
resumidamente:
● Cansaço Emocional - avalia a vivência de estar emocionalmente exausto pelas
demandas e interações do trabalho. Pontuação máxima 54.
● Despersonalização - avalia o grau em que cada um reconhece atitudes de frieza e
distanciamento em função da rotina de trabalho. Pontuação máxima 30.
● Realização Pessoal - mede os sentimentos de autoeficiência e realização pessoal no
trabalho que se realiza. Pontuação máxima 48.
O aumento da probabilidade da Síndrome de Burnout é caracterizado por pontuações altas
nas duas primeiras - Cansaço Emocional e Despersonalização, e baixa na terceira - Realização
Pessoal. Cada caso deve ser avaliado, principalmente nos casos diagnosticados e tratados
recentemente, pois ainda podem apresentar sintomas em tratamento.

Os Resultados da Amostra
O grupo pesquisado pontuou:
● Cansaço Emocional: 22
● Despersonalização: 8
● Realização Pessoal: 41

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Apesar da Despersonalização alta, o nível de Realização Pessoal é bastante satisfatório,
acima de 35 pontos. Mantendo-se os demais baixos, caracteriza uma tensão saudável. Se essa
análise fosse a respeito de um time com interação constante, seria indicado um olhar mais atento
aos sintomas de Despersonalização, para um cuidado pontual com as pessoas que elevaram esse
marcador, bem como a redução do índice de Cansaço Emocional para uns 18 pontos, a fim de evitar
a evolução do quadro.
Compreender as interações entre o time, o quanto as pessoas estão atuando dentro das
suas habilidades e talentos e o quanto estão deslocadas, como são comunicadas as metas e a
evolução das mesmas, são ações rápidas que uma liderança pode tomar para melhorar esses índices
e evitar casos de Burnout na sua equipe. Buscar reduzir as pressões desnecessárias ou esclarecer o
que está sendo visto como pressão e talvez não seja. Estratégias de comunicação interpessoal
auxiliam bastante quem precisa conduzir times a resultados satisfatórios e de forma saudável.

Outras Descobertas Interessantes


Dizem que sabedoria mesmo é aprender com os erros dos outros. Concordo e
complemento que aprender com os acertos e boas práticas também. A pesquisa me permitiu
verificar alguns índices interessantes.
Quanto aos seus maiores desafios, pensando na primeira menção de cada um, 27%
sentem-se desafiados pelo negócio em si - processos de gestão, questões financeiras, dia a dia do
seu mercado… enquanto que 73% mencionaram lidar com pessoas.
Em relação aos caminhos para vencer esses desafios:
● 5% não fazem nada…
● 4% delegaram os problemas para equipe contratada;
● 16% contrataram consultoria específica;
● 75% terapia e desenvolvimento pessoal.
Interessante observar esses números…
Costumo ouvir dos meus clientes dos projetos de estratégia de negócios coisas como: "Hoje,
precisamos de uns minutos de terapia antes de começar…". Os números parecem comprovar essa
necessidade em outros líderes e empreendedores.
Outras estratégias que foram mencionadas e valem ser compartilhadas aqui:
● Procurar pares para conversar sobre as questões de forma pontual;
● Seguir pessoas de referência na área para aprender da prática dela;
● Buscar mentores por segmento;
● Planejar e realizar "pausas" estratégicas durante a semana para organizar a vida como um
todo, "religiosamente" cumprindo esta agenda;
● Criar "blocos de enfrentamento", ou seja, descrever e priorizar o que será feito, mantendo
tudo sob controle e realizando dentro do que é possível;
● Participar de grupos de apoio e networking;
● Desenvolver hábitos que melhorem a performance, como o Mindfulness ou Meditação;
● Participar de imersões e retiros temáticos conforme a área que precisa ser desenvolvida;
● Prática de atividade física como um dos "compromissos diários";

A Terapia do Sentido Como Uma Resposta


Por fim, como uma das possíveis ações para prevenção e tratamento do Burnout, e outras
neuroses da nossa era, eis a Logoterapia - terceira escola da Psicologia de Viena, uma
contemporânea, quase "descendente", da psicanálise e da psicologia junguiana.
A abordagem foi desenvolvida por Viktor Frankl, médico e psiquiatra. Sobrevivente de mais
de um campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial, e já com larga experiência
acompanhando pacientes com intenção suicida, ele fundou a Logoterapia. Viktor consolidou todo o
conhecimento adquirido pela prática médica às suas vivências dentro dos campos de concentração,
onde os limites humanos eram testados de forma extrema. Assim, Frankl formatou na Logoterapia

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caminhos terapêuticos que promovem o desenvolvimento humano com base no sentido único de
cada um e considerando a pessoa humana de forma integral.
A Logoterapia conduz a pessoa numa jornada de descoberta do Sentido da Vida a partir do
que se tem hoje. A pessoa é compreendida como um ser inteiro e indivisível - corpo, mente e
espírito, sua história e destinos, como ferramentas que irão construir o amanhã que ela deseja, tudo
baseado no que dá sentido à vida dela - o propósito. Como rotas mais conhecidas para se chegar a
esta descoberta, a Logoterapia auxilia a pessoa a encontrar sentido na vida por meio do amor, do
sofrimento, ou do trabalho, sendo o último, o foco central desta pesquisa.
Dentro da abordagem do Trabalho, a Logoterapia auxilia os pacientes a se conectarem ao
porquê fazem o que fazem, qual sentido de tudo isso, e como esse sentido está conectado ao
sentido maior, o da própria vida.
Considerando quadros de desgaste emocional ocasionados pelo Trabalho, a Logoterapia
surge como uma resposta para restaurar a paixão pelo que se faz, enquanto a pessoa é tratada nos
demais contextos emocionais que foram feridos pela prática do trabalho. Essa abordagem faz com
que a pessoa não desista da sua carreira, antes, permite que esta seja revista e conduzida cada vez
mais para a centralidade essencial que dá sentido à vida da pessoa como um todo.
Fica um convite para que se conheça mais a respeito dessa abordagem e de todos os
benefícios que ela pode trazer para quem ocupa as desgastantes posições de quem toma decisões.

Agradecimento
Descrevo meu propósito pessoal afirmando que "nasci para instigar o mundo a (re)pensar",
e pelos encontros que esta jornada de pesquisa me proporcionou, creio que pude entregá-lo. Parar
e pensar, pela primeira vez, ou permitir-se repensar algo, além de estar ligado diretamente ao que
dá sentido à minha vida, é o que permite à pessoa fazer diferente para obter novos resultados. Parar
a "roda viva" de viver cansado da vida sem fazer nada a respeito, recalcular a rota, em qualquer área
que não esteja de acordo, é desafiador na mesma medida que libertador.
Descobrir o sentido da vida, do trabalho, dá trabalho. Entretanto, como todo trabalho bem
feito, a paga é certa e, neste caso, imensamente gratificante.

Ana Alegre
Mentora de Líderes e Empreendedores
Estrategista de Negócios com Propósito
Conselheira Empresarial

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