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DE MENINA POBRE À INCRÍVEL CANTORA

CHC339 - Coluna Gente da Nossa História


Com uma voz rouca e potente, Elza Soares lutou e se tornou uma estrela da música brasileira

Foto Wikipedia

Enquanto a menina brincava no quintal de sua casa, uma vaca se aproximou e deu-lhe umas
lambidas. Todos à sua volta temeram o pior. A menina, porém, ficou calma, brincando, como se entendesse
que nas situações mais difíceis é que se deve manter a tranquilidade. Assim era Elza Soares, a tal menina
que veio a se tornar uma das maiores cantoras brasileiras.
Elza nasceu no bairro de Padre Miguel, subúrbio do Rio de Janeiro, em 1930. Sua infância foi difícil.
Seu pai trabalhou em pedreiras e em uma famosa na fábrica de tecidos. Sua mãe lavava roupas para dezenas
de famílias da cidade. Com a mãe, Elza circulava de trem pela cidade, entregando e recolhendo trouxas de
roupas.
O desgaste no ir e vir levou a família de Elza a mudar de bairro. Eles foram para Água Santa,
também subúrbio, onde Elza conseguiu iniciar os seus estudos. Dos tempos de escola, Elza nunca se
esqueceu da sua professora Maria Augusta. Outra lembrança dela era a música em casa. O pai tocava violão
e trombone, mas o que encantava a menina era o rádio! As vozes das cantoras a faziam sonhar com uma
vida melhor.
Mas nem tudo aconteceu como num conto de fadas. Elza se casou adolescente e logo teve filhos. Na
sua casa, faltava dinheiro, comida e até esperança. Mas o rádio, imagine, iria mudar a sorte da jovem. Em
1953, ela se inscreveu para participar do famoso programa “Calouros em desfile”, apresentado por de Ary
Barroso, um compositor famoso. No programa, quem não se saia bem era interrompido por um forte gongo.
Na vez de Elza, o gongo não sou. Mesmo sem experiência, ela cantou do início ao fim, impressionando a
plateia e o apresentador.
O sucesso não foi instantâneo, mas Elza agora tinha o sonho de ser cantora. Algum tempo depois,
entrou na Orquestra de Bailes Garan, cantando em cerimônias e festas. Destacou-se e foi apresentada à
importante bailarina do Theatro Municipal, Mercedes Baptista, que a convidou para fazer parte do seu corpo
de baile, o Ballet Folclórico Mercedes Baptista. Elza participou de espetáculos pelo Brasil e também em
Buenos Aires, capital da Argentina.
De volta ao Rio, Elza passou a cantar em bares e logo surgiram convites para ela gravar um disco. O
mais importante veio da gravadora Odeon. Elza teve de improvisar uma apresentação para empresários,
músicos e cantores, mas valeu a pena! Saiu com um contrato assinado e a música “Se acaso você chegasse”
se tornou o seu primeiro grande sucesso no ano de 1960.
Mas quanto preconceito ela enfrentaria… A mulher negra, de origem pobre, sofreu perseguição e
racismo, principalmente quando assumiu seu amor por Garrincha, o craque brasileiro da Copa do Mundo de
1962. Mas Elza era forte, tinha consciência de seus direitos e era firme em seus propósitos. Defendeu o
presidente João Goulart na campanha do presidencialismo, em 1963. Em 1968, chegou a fazer um show
chamado “Revolu-samba”. Por esta e outras ações, foi duramente reprimida pelo regime militar
antidemocrático da época, a Ditadura. Como muitos artistas, precisou deixar o Brasil e foi se abrigar na
Itália. Retornou em 1971 e cantou até o fim da sua vida, em 20 de janeiro de 2022. Elza foi potência, força,
amor e resistência.

Pedro Krause,
Professor do Departamento de História do Colégio Pedro II
Doutor em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
Sou professor de História e adoro falar sobre as personalidades que marcaram o Brasil de outras
épocas!
Matéria publicada em 06.12.2022

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