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CURSO SUPERIOR DE PSICOLOGIA

CAROLINA FONTOURA DA MOTTA


LAURO ADRIANO PRIEBE

DILEMA ÉTICO NO SETTING ANALÍTICO

Novo Hamburgo
2023

CAROLINA FONTOURA DA MOTTA


LAURO ADRIANO PRIEBE
DILEMA ÉTICO NO SETTING ANALÍTICO

Trabalho apresentado para o Curso de Psicolo


gia, da Ftec Faculdade Novo Hamburgo, como
parte dos requisitos para avaliação da unidade
curricular de Ética e Ligislação Profissional.

Professora Lídia Käfer Schünke

Novo Hamburgo
2023

INTRODUÇÃO
Como apresentado por Roberts & Dyer (2004)1, a ética busca, por meio da reflexão,
conceber um sentido coerente do que é bom e correto na vivência humana, direcionar as ações
e decisões que tomamos, todos os dias, no sentido de responder adequadamente às necessidad
es com as quais somos confrontados. Na medida em que transpõe os limites de diversas discip
linas e áreas de atuação profissional específicas, a ética, bem como o estudo dos dilemas que a
cercam, caracteriza-se como uma matéria interdisciplinar, vigente em todas as especialidades
voltadas para as relações humanas.
Assim, a ética está direcionada para a responsabilidade assumida nas relações com o outro,
nas decisões e interpretações de todas as situações pelas quais passamos, sejam pessoais ou
profissionais, e na maneira como são encaradas as suas problemáticas. Olhar que exige reflexã
o e questionamento, adequação de conhecimentos a novos contextos sociais, como nos casos
dos dilemas éticos, que surgem frequentemente no trabalho dos psicólogos.
Na prática clínica do profissional de psicologia os dilemas éticos apresentam contornos es
pecíficos, subjetivos e em constante transformação, dada a própria transformação da
sociedade como um todo. Logo, o profissional, no fazer terapêutico, deve manter-se atento a e
ste processo evolutivo e procurar novas estratégias e meios para enfrentar dos dilemas éticos
que a ele se apresentam.
Buscando debater questões éticas e dilemas que podem se apresentar ao profissional da
Psicologia, tendo como pano de fundo a encenação de uma sessão terapêutica, este trabalho se
divide em três partes distintas. Na primeira parte, desenvolvemos o vídeo da sessão de terapia,
disponível em https://www.youtube.com/watch?v=3gPp_X-HyDg. O tema escolhido para
caracterizar o dilema ético enfrentado pelo terapeuta se deu, em grande parte, pela própria
atuação profissional dos autores.
Na segunda parte do trabalho, apresentamos a fundamentação teórica não só acerca da
ética e seus dilemas, mas, também, sobre as questões éticas específicas da profissão de
Psicologia, a abordagem teórica escolhida para a encenação terapêutica e a situação trazida
pelo ‘paciente’ no setting terapêutico.
Por fim, trazemos o debate, com fulcro no Código de Ética Profissional do Psicólogo 2,
acerca do dilema ético que se apresentou ao terapeuta no setting terapêutico e as conclusões
dos autores quanto à aplicação do Código de Ética profissional na prática clínica da
Psicologia.

1 Tradução nossa.
2 Disponível em https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2012/07/codigo-de-etica-psicologia.pdf
2 PROBLEMA

Os desafios éticos que envolvem o fazer do profissional de Psicologia perpassam o que


versa o Código de Ética da profissão, trazendo questionamentos e ressignificações pessoais
para o profissional. Porém, quando o terapeuta tem dúvidas quanto à veracidade dos relatos
trazidos por seus pacientes, questões como sigilo profissional e dever funcional entram em
conflito.
Assim, pretendemos debater como a dúvida do profissional quanto à veracidade do que é
relatado pelo paciente pode influenciar na tomada de decisões que envolvem questões
relacionadas à ética e ao Código de Ética profissional.

3 JUSTIFICATIVA

Entendemos que a simulação de situações práticas e a elaboração de possíveis


enfrentamentos éticos e teóricos, para a formação do profissional da Psicologia, é de extrema
importância na medida em que instiga a busca pelo fazer profissional adequado a cada uma
das circunstâncias e especificidades dos pacientes.

4 OBJETIVO

O objetivo principal deste trabalho é identificar como seguir, adequadamente, as regras do


Código de Ética da Psicologia frente ao fazer clínico, incerto e desafiador, com pacientes que
não trazem, para o setting terapêutico, relatos verdadeiros.

5 METODOLOGIA

Antes

6 DESCRIÇÃO DO VÍDEO

O vídeo apresentado, um dos requisitos da tarefa, é composto por duas partes. Na primeira
parte do vídeo é apresentado o setting terapêutico, onde a profissional de Psicologia, de
orientação teórica psicanalítica, recebe um analisando, servidor público, que exerce suas
atividades laborais junto ao morgue do Grupo Hospitalar Conceição, na cidade de Porto
Alegre.
O analisando traz para o encontro um relato sobre como se sente sexualmente excitado
com os corpos de mulheres jovens, mortas. Conta que, enquanto prepara os corpos, os toca de
maneira inapropriada e que, em alguns casos, chega a ter ereções. Quando questionado sobre
o relacionamento com sua esposa, diz que é um relacionamento adequado e que se satisfaz
sexualmente com a esposa.
A segunda parte do vídeo traz a profissional de Psicologia em sua sessão de supervisão
profissional, onde ela discute com o supervisor a veracidade do relato, o sigilo da sessão,
como tratar a informação recebida do analisando, como aprofundar o relato com o analisando
e, principalmente, as questões éticas envolvidas entre a denúncia de um relato falso ou a
manutenção do sigilo de um ato criminoso.

7 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

As questões éticas, como ocorrem no dia-a-dia, não são simples ou fáceis e, assim, exigem
do profissonal o ato de reflexão. Assim, códigos de ética e outras diretrizes não podem ser apl
icados mecânica e automaticamente, sem levar em conta a complexidade das relações sociais,
profissionais e comunitárias (Pope & Vasquez, 2007).
Como profissionais psicólogos, trabalhamos com o outro e suas dificuldades, problemas, c
rises, ansiedades e frustrações que podem surgir nos mais variados contextos e momentos da v
ida da pessoa. As intervenções acontecem, muitas vezes, em situação de vulnerabilidade, nos
convocando a sermos cuidadosos, respeitosos e acolhedores e a prestar serviços de qualidade,
respeitando os deveres e direitos do cliente.
E, dentro desta relação entre o terapeuta e o cliente, podem surgir os dilemas éticos. Logo,
é importante, desde o início do processo terapêutico, deixar clara as regras da relação, que dev
e ser estritamente profissional. Considerando que a ética e a construção do pensamento ético a
contecem com a prática diária, tendo como base o conhecimento acerca dos códigos profissio
nais e a consciência de que cada relação terapeuta/cliente é única e deve ser respeitada enquan
to espaço de individualidade (Pope & Veasquez, 2007).
Conceitualmente, um dilema ético pode ser visto como uma situação em que determinada
escolha precisa ser feita, sendo que tal escolha envolve princípios éticos que estão em conflito.
O dilema, então, traz consigo a necessidade de justificativa da alternativa escolhida, visto que
escolher uma alternativa implica em não escolher outra. Assim, os dilemas éticos nem sempre
tem respostas ‘fáceis’, nos casos concretos, mesmo existindo princípios, valores e regras livre
mente adotados.
No caso desenvolvido no vídeo, o analisando, Eduardo, coloca para a profissional uma sit
uação, pela primeira vez, que envolve necrofilia. Sadock (2017) define como necrofilia a grati
ficação sexual com pessoas mortas. Por seu turno, Dias (2016) faz distinções entre tipos de ne
crofilia: “a necrofilia dita verdadeira, na qual são mantidas relações sexuais com mortos; a nec
rofilia homicida, em que há assassinato com objetivos sexuais premeditados; e a necrofilia fan
tasiada, que diz respeito a fantasias sobre atos sexuais com mortos”.
O caso apresentado no setting terapêutico caracteriza-se, dentro das definições de Dias (20
16) como um caso de ‘necrofilia verdadeira’, visto que Eduardo faz o relato da relação sexual
com o corpo da jovem morta. Independente de possível diagnóstico para o caso de Eduardo, s
urge o dilema ético para o profissional, que precisa decidir se acredita no relato do analisando
e toma as providências cabíveis, ou se retoma os relatos para tentar confirmar a veracidade do
s fatos e, só então, diagnosticar e buscar alternativas para o tratameto adequado.
Especificamente, no que tange ao Código de Ética Profissional do Psicólogo (2005), há o
conflito entre princípios de atuação do profissional, deveres e vedações impostas. O conflito a
contece por que é vedado ao profissional, conforme versa o art. 2º, alínea a, do referido Códig
o, ser conivente com atos de exploração ou violência. Mas, por outro lado, o art. 9º reza que é
dever do psicpologo manter o sigilo e proteger a intimidade das pessoas.
Também, com fulcro no Código de Ética Profissinal, o profissional se depara com questõe
s éticas relacionadas aos Princípios Fundamentais, principalmente o Princípio II que diz ao pr
ofissional para trabalhar em prol da qualidade de vida das pessoas e da coletividade, eliminan
do exploração e violência.

8 DEBATE SOBRE A SITUAÇÃO APRESENTADA

Inicialmente, surge a pergunta: a prática sexual relatada por Eduardo deve ser denunciada
como atividade criminosa ou deve ser mantida em sigilo, resguardando a intimidade sexual de
le?
Entendemos que, antes de qualquer atitude por parte do profissional de Psicologia, é neces
sário verificar, tanto quanto possível, a veracidade do relato do paciente. No caso desenvolvid
o, trata-se de uma situação que, em tese, configura ilícito penal. Porém, como fazer a denúnici
a sem, antes, saber se o fato é real?
Associar o paciente à uma situação que pode constrangê-lo e, até mesmo, levar à prisão, re
quer grande reflexão por parte do profissional de Psicologia. Eventual quebra de sigilo profiss
ional, a fim de denunciar situações de violência ou negligência, só deve acontecer quando o pr
ofissional está seguro da veracidade do fato relato no setting terapêutico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Código de ética profissional do Psicólogo.


Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2012/07/codigo-de-etica-
psicologia.pdf. Acesso em: 15/10/2023.

DIAS, A.L. Desmantelando o monstro: o necrófilo de Gabrielle Wittikop. Universidade


Federal de Santa Catarina, 2016. Disponível em:
https://periodicos.ufsc.br/index.php/Outra/article/view/2176-8552.2016n22p209. Acesso em:
15/10/2023.

POPE, Kenneth S.; VASQUEZ, Melba J.T. Ethics in psychotherapy and counseling: a
practical guide. 3 ed. San Francisco: Jossey-Bass, 2007.

ROBERTS, Laura Weiss; DYER, Allen R. Concise guide to ethics im mental health care.
Disponível em: https://psycnet.apa.org/record/2004-12375-000. Acesso em: 15 out. 2023.

SADOCK, B.J.; SADOCK, V.A.; RUIZ, P. Compêndio de psiquiatria: ciência do


comportamento e psiquiatria clínica. 11 ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.

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