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MUCOCELE (FENÔMENO DE EXTRAVASAMENTO DE MUCO;

REAÇÃO
AO ESCAPE DE MUCO)

A mucocele é uma lesão comum da mucosa oral resultante da ruptura de um ducto de


glândula salivar e do extravasamento de mucina para dentro dos tecidos moles vizinhos.
Geralmente, este extravasamento é resultante de um trauma local, embora em muitos
casos não haja história de trauma associado. De forma contrária aos cistos de ducto
salivar, a mucocele não é um cisto verdadeiro, já que não apresenta revestimento
epitelial interno. Entretanto, alguns autores têm incluído os cistos de ducto salivar em
seus relatos de séries de casos, algumas vezes sob a classificação de mucocele de
retenção ou cisto de retenção mucoso. Devido ao fato de essas duas entidades exibirem
características clínicas e histopatológicas distintas, elas são discutidas em tópicos
separados neste capítulo.

Características Clínicas
As mucoceles geralmente se apresentam como aumentos de volume mucosos
arredondados que podem ter seu tamanho variando de 1 a 2 mm a alguns centímetros
São mais comuns em crianças e adultos jovens, talvez pelo fato de indivíduos mais
jovens estarem mais propensos a traumas, os quais induzem o extravasamento de
mucina. Entretanto, as mucoceles têm sido relatadas em pacientes de todas as idades,
desde bebês até adultos mais velhos. A mucina extravasada abaixo da superfície mucosa
geralmente confere uma coloração azulada à lesão, embora mucoceles profundas
possam ser normocrômicas. Caracteristicamente, a lesão é flutuante, mas algumas
mucoceles são firmes à palpação. O tempo de evolução relatado para a lesão pode variar
de poucos dias a diversos anos; a maioria dos pacientes relata que a lesão está presente
há diversos dias ou semanas. Muitos pacientes relatam a
história de um aumento de volume recorrente que se rompe periodicamente e libera seu
conteúdo fluido.

O lábio inferior é o sítio de acometimento mais comum para a mucocele; um recente


grande estudo com 1.715 casos relatou que 81,9% dos casos ocorreram nesta
localização. As mucoceles de lábio inferior geralmente são encontradas lateralmente à
linha média. Localizações menos comuns incluem o assoalho da boca (rânulas: 5,8%), a
região anterior do ventre da língua (das glândulas de Blandin-Nuhn: 5,0%), a mucosa
jugal (4,8%), o palato (1,3%) e o trígono retromolar (0,5%). As mucoceles raramente se
desenvolvem no lábio superior. Nos estudos de grandes séries de casos, resumidos na
Tabela 11-1, nenhum único exemplo foi localizado no lábio superior. Isso se opõe ao
fato de as neoplasias de glândula salivar, que não são incomuns no lábio superior, serem
distintamente incomuns no lábio inferior.

Como observado, o palato e a região retromolar são localizações incomuns das


mucoceles. Entretanto, uma interessante variante, a mucocele superficial, pode se
desenvolver nestas áreas e ao longo da mucosa jugal posterior.
As mucoceles superficiais se apresentam como vesículas distendidas únicas ou
múltiplas que medem 1 a 4 mm de diâmetro. As lesões geralmente se rompem,
deixando úlceras rasas dolorosas que cicatrizam em poucos dias. Episódios repetidos na
mesma localização não são incomuns. Alguns pacientes relatam o desenvolvimento das
lesões próximo ao horário das refeições. Também tem sido relatada a ocorrência de
mucoceles superficiais em associação a doenças liquenoides, como o líquen plano,
erupções liquenoides relacionadas com drogas e a doença do enxerto versus hospedeiro
(GVHD). A aparência vesicular é criada pela natureza superficial do extravasamento de
mucina, que causa a separação entre o epitélio e o tecido conjuntivo. O patologista deve
ter conhecimento dessa lesão para não confundi-la microscopicamente com uma doença
vesículo-bolhosa, especialmente o penfigoide benigno de mucosa.

Características Histopatológicas
No exame microscópico, a mucocele exibe uma área de mucina extravasada, circundada
por tecido de granulação reacional . A inflamação usualmente inclui numerosos
histiócitos espumosos (macrófagos). Em alguns casos, um ducto salivar rompido pode
ser identificado desembocando dentro da área. As glândulas salivares menores
adjacentes geralmente contêm um infiltrado inflamatório crônico e ductos dilatados.

Tratamento e Prognóstico
Algumas mucoceles são lesões autolimitantes que se rompem e cicatrizam sozinhas.
Entretanto, muitas dessas lesões são de natureza crônica, e a excisão cirúrgica local é
necessária. Para minimizar o risco e a recorrência, o cirurgião deve remover qualquer
glândula salivar menor que possa estar localizada dentro da lesão quando a área for
excisada. O tecido excisado deve ser submetido à avaliação microscópica para
confirmar o diagnóstico e descartar a possibilidade de neoplasias de glândula salivar. O
prognóstico é excelente, embora mucoceles ocasionais possam recorrer, necessitando
ser submetidas à nova excisão cirúrgica, especialmente se as glândulas subjacentes não
tiverem sido removidas.

RELATO DE CASO CLÍNICO

Mucocele em lábio inferior de adolescente: relato de caso

RESUMO

Mucocele ou fenômeno de retenção de líquido é uma lesão cística benigna, com saliva
em seu interior, relacionada a trauma local e obstrução de glândulas salivares menores.
Geralmente, ocorre no lábio inferior de crianças e adolescentes, e apresenta-se
clinicamente como uma bolha, de cor igual à mucosa adjacente ou azulada, e seu
tamanho varia de 1 mm à centímetros. É assintomática, e muitas vezes há o rompimento
espontâneo. Porém, se houver várias recorrências é necessário o tratamento cirúrgico
para remoção das glândulas salivares adjacentes. O objetivo deste trabalho é apresentar
a remoção cirúrgica de uma lesão de mucocele em lábio inferior de um adolescente de
17 anos de idade.

RELEVÂNCIA CLÍNICA

Alertar odontopediatras e clínicos gerais quanto às alterações bucais como o mucocele,


que é uma das lesões benignas mais comuns de tecido mole da cavidade bucal que
acomete crianças, adolescentes e adultos jovens.

INTRODUÇÃO

Mucocele é um fenômeno de extravasamento ou retenção de muco também conhecido


como pseudocisto ou cisto mucoso. É uma lesão causada por traumatismo mecânico,
principalmente por mordidas, comprimindo e colabando o ducto das glândulas salivares
menores. Como a produção de saliva continua a ocorrer, o ducto colabado não permite
sua vazão e a saliva então retida, aumenta o diâmetro do ducto.

Clinicamente é representado por uma bolha contendo saliva em seu interior de


coloração igual a da mucosa adjacente ou azulada, assintomática, podendo ultrapassar
10 mm de diâmetro. Pode romper-se espontaneamente e não haver mais episódios,
embora as recorrências sejam muito frequentes, principalmente se o fator etiológico
permanecer. Ocorre em vários locais da cavidade bucal, onde o epitélio é menos
queratinizado como ventre anterior da língua, mucosa jugal retrocomissural, soalho
bucal (recebendo o nome de rânula), e principalmente na mucosa labial inferior.
Diastemas, elementos dentais girovertidos e aparelhos ortodônticos, assim como
"mordidas" na mucosa labial inferior, constituem em situações que propiciam o
surgimento do mucocele.

A ocorrência deste tipo de lesão se dá principalmente nas primeiras décadas de vida.

Recentemente foi realizado um estudo retrospectivo no qual foram avaliados 1824 casos
de mucocele. Verificou-se que a idade média dos pacientes acometidos foi de 24,9 anos,
que não houve uma predileção significante quanto ao gênero, e a localização mais
comum foi no lábio inferior (81.9%), seguido do assoalho bucal (5.8%), ventre da
língua (5.0%), e mucosa bucal (4.8%). As lesões apresentaram-se com coloração igual à
mucosa adjacente, azul, roxa e acinzentada e o tamanhão da lesão variou entre 0,1 a 4,0
cm, com uma média de 0,8 cm. Em 456 casos, foi relatado trauma local13.

A literatura mostra várias opções para o tratamento do mucocele como a criocirurgia, a


homeopatia, a marsupialização, enucleação, eletrocirurgia, vaporização com laser de
CO2 e o tratamento cirúrgico por meio de excisão total da lesão, apresentando um bom
prognóstico4.
CASO CLÍNICO

Paciente de 17 anos, gênero masculino, compareceu à Clínica de Odontopediatria da


Universidade de São Paulo, alegando que após sua namorada lhe dar um beijo e uma
mordida em seu lábio, surgiu uma "bolha" no local após 20 dias do ocorrido. Ao exame
clínico foi constatada uma lesão circunscrita, de coloração semelhante a da mucosa,
flutuante à palpação, com 1,7 cm de diâmetro em lábio inferior esquerdo, com
características semelhantes à de um mucocele..

Devido ao tamanho e localização, foi proposto como tratamento a remoção cirúrgica da


lesão cística. Sendo assim, realizou-se a assepsia, anestesia tópica, seguida de
infiltrativa com Lidocaína a 2%. Seguiu-se com delicada incisão de forma semilunar
com lâmina de bisturi para exérese da lesão. Em seguida, removeram-se as glândulas
acessórias, a fim de evitar recorrência. Finalizou-se com sutura de pontos isolados, com
fio de seda 3-0. O material colhido foi fixado em formol a 10% e encaminhado para
exame histopatológico. Após sete dias da cirurgia, foi realizado o pós-operatório para
remoção dos pontos onde se observou boa cicatrização da ferida cirúrgica). O resultado
do exame confirmou o diagnóstico de retenção de muco (mucocele) e o paciente foi
mantido em acompanhamento, e não houve recorrência da lesão.

DISCUSSÃO

A lesão de mucocele pode acometer diferentes regiões da cavidade bucal, como por
exemplo, lábio, bochecha, língua, palato e assoalho de boca. Em 44 a 79% dos casos
ocorrem em lábio inferior, como no caso clínico apresentado.

Não há na literatura um consenso quanto a predileção por gênero e idade no que diz
respeito à prevalência do mucocele. Enquanto alguns autores apontam uma maior
frequência no gênero feminino, outros mostram uma prevalência maior no gênero
masculino, e a lesão de mucocele pode surgir em qualquer idade. Embora frequente em
crianças e adolescentes, não há estudos específicos sobre mucocele nesta população.

Apesar da evidência experimental e clínica apontarem o trauma como a causa mais


provável de mucocele é importante salientar que, em alguns casos, pode ser associada a
lesões congênitas, Síndrome de SjÖgren, e também fibrose cística. Em geral, pode-se
mencionar que é possível que fatores predisponentes não traumáticos podem também
contribuir para o desenvolvimento desta lesão.

A excisão cirúrgica da glândula tem sido a principal opção terapêutica. No entanto,


outras opções têm sido relatadas na literatura, tais como a marsupialização (criação de
uma bolsa), micromarsupialização, o congelamento (criocirurgia), e a vaporização com
o laser de CO2. Existem também alguns relatos que sugerem a utilização de
corticosteroides injetáveis como uma alternativa à cirurgia.
A vaporização do laser tem a vantagem de menor sangramento, nenhuma sutura, e
economia de tempo, especialmente adequado para crianças com mucocele bucal.

A cirurgia a laser de diodo é um procedimento mais rápido, sem sangramento, e bem


aceito pelos pacientes. Os problemas pós-operatórios, desconforto, e as cicatrizes são
mínimas. Sendo assim, o tratamento de mucocele com o laser de alta intensidade
fornece resultados satisfatórios e permite um exame histopatológico do tecido excisado.

CONCLUSÃO

Embora existam diferentes tipos de tratamento para a lesão de mucocele, a remoção


cirúrgica da glândula salivar obstruída ainda é a técnica mais utilizada, mostrando-se ser
uma manobra relativamente simples, rápida, segura e de bom prognóstico, podendo ser
realizada tanto por odontopediatra como clínico geral, desde que haja o correto
diagnóstico e correta indicação como no caso apresentado.

APLICAÇÃO CLÍNICA

Demonstrar através de fotos que um bom planejamento e uma boa técnica cirúrgica,
possibilitam a realização de cirurgias bem sucedidas na clínica odontopediátrica.

RÂNULA

Rânula é um termo usado para mucoceles que ocorrem no assoalho de boca. Este nome
é derivado da palavra em Latim rana, que significa “rã”, pois o aumento de volume
pode lembrar o ventre translúcido de uma rã. O termo rânula também tem sido usado
para descrever outros aumentos de volume semelhantes no assoalho de boca, incluindo
cistos de ducto salivar verdadeiro, cistos dermoides e higromas císticos. Entretanto, o
melhor uso do termo é para as reações de extravasamento de muco (mucoceles).
A glândula sublingual possui uma anatomia complexa. A menor glândula sublingual é
constituída, na verdade, por 15 a 30 glândulas menores, cada uma secretando através de
um pequeno ducto de Rivinus para a prega sublingual. Alguns indivíduos possuem uma
glândula sublingual maior com um ducto excretor (ducto de Bartholin) que ou se une ao
ducto de Warton ou desemboca próximo à carúncula lingual. Ao contrário da glândula
submandibular, a glândula sublingual produz um fluxo contínuo de muco, mesmo na
ausência de estimulação neural, o que contribui para a sua capacidade de produzir
rânula após a ruptura de um de seus múltiplos ductos.
Características Clínicas
Em geral, a rânula se apresenta como um aumento de volume arredondado flutuante, de
coloração azulada, no assoalho bucal, embora lesões profundas possam apresentar
coloração normal da mucosa. As rânulas são vistas mais frequentemente em crianças e
adultos jovens. Geralmente, essas lesões se desenvolvem como grandes massas que
preenchem o assoalho bucal e elevam a língua, tendendo a ser maiores que as
mucoceles nas outras localizações intraorais. Em geral, a rânula se localiza lateralmente
à linha média, uma característica que pode auxiliar no diagnóstico diferencial do cisto
dermoide da linha média. Assim como outras mucoceles, as rânulas podem se romper e
liberar seu conteúdo mucinoso e, então, formam-se novamente.
Uma variante clínica não usual, a rânula cervical ou mergulhante, ocorre quando a
mucina extravasada disseca através do músculo milo-hioide e produz o aumento de
volume dentro do pescoço . Um aumento de volume concomitante no assoalho bucal
pode ou não estar presente. Se não houver lesão bucal, o diagnóstico clínico de rânula
pode não ser considerado. Exames imaginológicos podem auxiliar no diagnóstico de
rânula mergulhante e na determinação da origem da lesão. Imagens de TC e IRM de
rânulas mergulhantes originárias da glândula sublingual geralmente exibem uma
discreta extensão da lesão dentro do espaço sublingual, conhecida como “sinal de
cauda”.

Características Histopatológicas
A aparência microscópica da rânula é semelhante à da mucocele em outras localizações
clínicas. A mucina extravasada incita à formação de um tecido de granulação reacional
que normalmente contém histiócitos espumosos.

Tratamento e Prognóstico
O tratamento da rânula consiste na remoção da glândula sublingual e/ou
marsupialização. A marsupialização (descompressão) consiste na remoção da porção
superior da lesão intraoral, que geralmente pode ser bem-sucedida para rânulas
pequenas e superficiais. Entretanto, a marsupialização frequentemente não é bem-
sucedida em rânulas grandes, em que a maioria dos autores enfatiza que é importante
considerar a remoção da glândula acometida para a prevenção de recorrências da lesão.
Se a glândula for removida, a dissecção meticulosa do limite da lesão pode não ser
necessária para sua resolução, mesmo para as rânulas mergulhantes. Caso seja possível
a identificação da porção específica da glândula sublingual que originou a lesão, a
excisão parcial da glândula pode ser bem-sucedida.

RELATO DE CASO CLÍNICO

Rânula mergulhante: relato de caso clínico

RESUMO

Rânulas são lesões resultantes do extravasamento de saliva da glândula sublingual,


sendo usualmente unilaterais e relativamente incomuns. As rânulas bilaterais são raras.
Duas variedades de rânula já foram descritas: a rânula oral ou superficial e a rânula
mergulhante ou cervical. A patogênese exata dessas lesões ainda é incerta. O objetivo
deste trabalho é o de relatar um caso de rânula oral e mergulhante, presente, simultânea
e ipsilateralmente, em uma criança. A possível patogênese e o tratamento cirúrgico do
caso nele também são descritos.

INTRODUÇÃO

Rânulas, termo usado para os mucoceles, que ocorrem no soalho da boca, são
pseudocistos resultantes do extravasamento de mucina para os tecidos moles
circunjacentes, após ruptura ou obstrução de um ou mais ductos excretores da glândula
sublingual1. Apresentam-se como tumefações azuladas, flutuantes, com forma de
cúpula, usualmente localizadas à linha média do soalho bucal.

Uma variante clínica incomum, a rânula mergulhante ou rânula cervical, ocorre quando
o extravasamento de mucina disseca o músculo milohioide e produz tumefação no
pescoço. A tumefação concomitante no soalho da boca pode ou não estar presente.

As formas de tratamento para as rânulas incluem marsupialização, excisão da lesão,


excisão da glândula sublingual ou combinação de excisão da lesão e da glândula
sublingual. Tratamentos que não incluem remoção da glândula envolvida, como incisão
e drenagem, excisão apenas da rânula e marsupialização, parecem apresentar altos
índices de recorrência3.

O objetivo deste trabalho é o de relatar um caso de rânula oral associada à rânula


mergulhante em uma criança de 9 anos assim como discutir a patogênese da lesão e os
métodos de tratamento para esses casos, visando alcançar a cura completa dos pacientes.

RELATO DE CASO

Paciente T.M.N., 9 anos, gênero feminino, leucoderma, compareceu à Clínica


Odontológica da Universidade Estadual de Maringá (UEM), acompanhada da mãe. A
queixa era de tumefação na região submandibular esquerda, com duração aproximada
de 6 meses. A mãe relatou que acreditava inicialmente tratar-se de uma caxumba. A
criança mostrava-se triste, desmotivada, com sono agitado e perda de peso, decorrente
de sua condição estética, motivo de grande dificuldade em termos de relacionamento
social. Ausência de problemas sistêmicos e antecedentes familiares.

Ao exame físico extrabucal, notou-se a presença de assimetria facial, decorrente de


aumento volumétrico assintomático na região submandibular do lado esquerdo, sem
alteração na coloração do tecido cutâneo circunjacente, flutuante à palpação e
ligeiramente crepitante.
O exame intrabucal revelou tumefação na região de soalho bucal esquerdo, de coloração
azulada, translúcida, indolor, de textura lisa, flutuante e com aproximadamente 4 cm de
diâmetro. A mobilidade da língua estava preservada.

Observou-se ainda que, quando era realizada palpação na região extrabucal, havia um
aumento da tumefação intrabucal, mostrando que havia associação entre estas regiões.

A primeira conduta foi a realização de punção aspirativa na tumefação extrabucal, onde


foi coletado um material visco-seroso, de coloração levemente amarelada, compatível
com material amiloide (amilase salivar). Com base nos aspectos clínicos, na história
atual da doença e na punção aspirativa, a hipótese diagnóstica foi de rânula
mergulhante.

O plano de tratamento consistiu em excisão da rânula e da glândula sublingual esquerda


por acesso intrabucal. A paciente foi submetida à cirurgia, sob anestesia geral, em que a
lesão intrabucal foi incisada e removida, seguida da excisão da glândula sublingual
envolvida. A região de soalho bucal não foi suturada, sendo, apenas, tamponada com
gaze furacinada. Após 7 dias, a região de soalho encontrava-se totalmente reparada, e a
paciente demonstrava restabelecimento da simetria facial.

O exame microscópico da peça removida revelou mucosa bucal revestida de epitélio


estratificado pavimentoso paraqueratinizado hiperplásico. Profundamente, cavidade
cística virtual parcialmente revestida de epitélio pseudoestratificado ciliado. Notou-se,
ainda, nas áreas de perda de revestimento epitelial, extravasamento de muco relacionado
a moderado infiltrado inflamatório mononuclear. Essas características associadas aos
achados clínicos confirmaram o diagnóstico.

A paciente está em proservação há 5 anos, sem nenhum indicativo de recidiva.

DISCUSSÃO

O termo "rânula" é derivado do latim rana, que significa "rã" e descreve uma tumefação
azulada e translúcida no soalho bucal, dita como tendo aspecto de rã4. O extravasamento
de muco pode ocorrer ao longo do lobo profundo da glândula submandibular, saindo
posteriormente entre os músculos hioglosso e milohioide ou diretamente através da
deiscência no músculo milohioide5. Também é sugerido que trauma local dos ductos
salivares ou variações anatômicas da glândula sublingual podem estar envolvidos na
ocorrência da rânula mergulhante5.

Engel et al. (1987)6 reportaram que uma herniação no músculo milohioide foi
encontrada em 45 de 100 cadáveres estudados. A mais comum estrutura herniada é a
glândula sublingual, seguida da glândula submandibular, do tecido adiposo e do
colesteatoma. É sugerido que a extensão cervical ou submandibular da rânula possa ser
facilitada pela herniação no milohioide6.
O diagnóstico diferencial da rânula mergulhante inclui cisto da fenda branquial, cisto
dermoide lateral, cisto epidermoide, higroma cístico, laringocele, malformação
arteriovenosa, lipoma e neoplasias7. Como testes diagnósticos específicos para essa
patologia não são conhecidos, o diagnóstico da rânula mergulhante é baseado na história
detalhada, no exame físico e, se necessário, exames de imagem, como tomografia
computadorizada e ultrassonografia. Se ainda persistir dúvida no diagnóstico, a punção
aspirativa da região pode confirmar a natureza salivar do cisto, com material coletado,
contendo altos níveis de amilase e proteína. No presente caso, a punção da região
mostrou que a cavidade cística continha, em seu interior, material de consistência visco-
serosa, rico em amilase salivar, confirmando o diagnóstico.

O tratamento preconizado para as rânulas é a cirurgia, incluindo a excisão apenas da


rânula, marsupialização ou remoção da rânula e da glândula sublingual
simultaneamente. Este último parece ser o método mais confiável para esses casos, com
baixos índices de recidiva.

O estudo de Yoshimura et al. (1995) comparou os 3 métodos mencionados para


tratamento de rânulas. Dos 27 pacientes estudados, 24 possuíam rânulas orais e 4
rânulas mergulhantes. Quatro pacientes foram submetidos apenas à excisão da rânula,
16, à marsupialização, e 7, à excisão da rânula e da glândula sublingual. Os resultados
demonstraram uma recorrência no grupo submetido à excisão apenas da rânula e 6
recorrências no grupo submetido à marsupialização. O grupo no qual foi realizada
excisão da rânula e da glândula sublingual não apresentou nenhuma recorrência8.

Segundo estes autores, do ponto de vista anatômico, a marsupialização permite que as


margens da ferida fiquem em contato, devido ao espaço limitado e movimentos da
língua e soalho, acarretando fechamento da ferida (uma vez que o tecido do soalho é
facilmente e rapidamente reparado) e novo acúmulo de saliva no local; a remoção
apenas da lesão pode acarretar trauma à glândula sublingual; procedimentos de incisão e
drenagem proporcionam fácil fechamento da porção incisada, podendo acarretar
recidiva. Dessa maneira, este trabalho7 concluiu que o melhor método de tratamento
para as rânulas é a excisão da lesão e da glândula envolvida, procedimento que foi
adotado no presente caso, em que, por meio de acesso intrabucal, as porções da lesão
em soalho e espaço submandibular foram removidas junto à glândula sublingual. A
técnica utilizada também proporcionou uma rápida e completa cicatrização assim como
preservação das estruturas adjacentes e ausência de sequelas cirúrgicas.

Qualquer tratamento invasivo tem potencial de traumatizar os ductos e o parênquima da


glândula salivar, exceto nos casos de remoção da glândula. Dessa maneira, a nossa
opção de tratamento para este caso foi viabilizada pelos baixos índices de recorrência já
bem documentados na literatura em relação à técnica utilizada e pela ausência de danos
ao parênquima glandular ou às estruturas adjacentes, evitando sequelas pós-cirúrgicas e
possibilitando cura completa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A remoção da lesão juntamente com a glândula sublingual realizada neste caso


corrobora a maioria dos autores que acreditam ser esta a técnica mais segura para evitar
a recidiva da rânula mergulhante apresentando prognóstico excelente.

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