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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FULANO DE TAL

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL


DD RELATOR DA APELAÇÃO CÍVEL Nº. 000000/RS
00ª CÂMARA CÍVEL

ANTÔNIO DAS QUANTAS (“Agravante”), já


devidamente qualificada nos autos deste recurso de Apelação, vem, com o devido
respeito à presença de Vossa Excelência, intermediado por seu patrono que abaixo
firma, para, na quinzena legal (CPC, art. 1.003, caput c/c § 5º), interpor o presente

AGRAVO INTERNO,
contra a decisão monocrática que dormita às fls. 83/85, a qual negou atribuição de
efeito suspensivo ao recurso e, além disso, não acolheu pleito de tutela
antecipatória recursal, o que faz sob a égide dos fundamentos que se encontram
nas Razões ora acostadas.

Respeitosamente, pede deferimento.

Cidade, 00 de fevereiro de 0000.

Beltrano de Tal
Advogado – OAB/RS 0000
RAZÕES DO AGRAVO INTERNO

AGRAVANTE: ANTÔNIO DAS QUANTAS


AGRAVADO: BANCO ZETA S/A
Ref.: Apelação Cível nº 0000/RS

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL

PRECLARO RELATOR

1 - DA DECISÃO RECORRIDA

O Recorrente celebrou com a Recorrida, na data de


22/33/0000, a Cédula de Crédito Bancário nº. 3344. Referido pacto visou o
empréstimo da quantia de R$ 00.000,00 ( .x.x.x.x.x ), tendo como garantia, em
alienação fiduciária, o veículo descrito na inicial, alvo de busca e apreensão
concretizada (fls. 17/18).

Feita a apreensão, o Agravante, tempestivamente,


solicitara a purgação da mora (fls. 23/28). Todavia, tal pleito fora rechaçado pelo
Magistrado de piso (fl. 30).

Em momento processual posterior, ainda


tempestivamente, o mesmo apresentara contestação. (fls. 34/44)

No plano dos fatos, o Agravante sustentara que do


contrato financiamento esse pagara um total de R$ 00.000,00 ( .x.x.x.x ). A
remuneração do empréstimo fora atrelada à taxa de juros de 5,3% (cinco vírgula
três por cento) ao mês, esses capitalizados com periodicidade diariamente.
De outro passo, sustentou-se que haveria a
necessidade de produção de prova pericial. Essa com o propósito de demonstrar
fatos: a cobrança de encargos abusivos . Entrementes, essa intenção igualmente
fora indeferida. (fls. 49/50) Ônus, a propósito, do então contestante (CPC, art. 373,
inc. II).

Sobreveio sentença meritória de total procedência dos


pedidos formulados pela parte Agravada, decisão essa hostilizada por meio de
recurso apelatório.

O julgamento antecipado do mérito, sem sombra de


dúvidas, deslocou ao Recorrente cerceamento da produção de sua prova,
concorrendo, destarte, pela nulidade do ato processual ora vergastado. Igualmente
se diz com respeito ao indeferimento do requerimento de purgação da mora.

Diante de tal situação processual, o Recorrente interpôs


o recurso devido recurso apelatório, pedindo em sede de preliminar, com suporte no
art. 995, parágrafo único c/c art. 1.012, § 4º, do Estatuto de Ritos, a concessão de
efeito suspensivo ao recurso e, ainda, tutela recursal no sentido obter-se a purgação
da mora.

Malgrado devidamente demonstrado a pertinência de


atribuição de efeito suspensivo e à tutela recursal, este d. Relator negou ambos
pleitos nestes termos:

No tocante ao pedido de recebimento no efeito suspensivo à


apelação, tenho que a regra disposta no 3º, § 5º, da Lei de
Alienação Fiduciária prioriza o recebimento tão só no efeito
devolutivo, salvo exceção cabalmente demonstrada.
Nesse passo, não foi demonstrada pelo agravante à
ocorrência de quaisquer das hipóteses previstas no § 4º, do
art. 1.012, do CPC.

Assim, INDEFIRO o pedido de efeito suspensivo.

Com respeito ainda ao pedido de tutela recursal, essa com o


propósito de permitir a purgação da mora, igualmente não
encontra guarida no texto legal. A Lei de Alienação Fiduciária
dispõe que compete à parte devedora, querendo, pagar a
totalidade do débito.

Nesse enfoque, INDEFIRO o pleito de purgação da mora e, via


reflexa, a tutela recursal almejada.

À parte agravada para, querendo, oferecer resposta, no prazo


de 15 dias.
Expedientes necessários. “
( os destaques são nossos )

Com efeito, esses são os esclarecimentos necessários


à compreensão do ato vergastado.

PRELIMINARMENTE
Nulidade – Ausência de fundamentação
O Agravante solicitara no recurso em espécie fosse
concedido efeito suspensivo. O Recorrente, na ocasião, fizera longos comentários
acerca da propriedade do referido pleito. Todavia, como visto, o mesmo fora
negado.

A decisão guerreada negara a atribuição de efeito


suspensivo, todavia, concessa venia, sem a devida e necessária motivação.

O Agravante, como se denota do item 2.7 da peça


recursal, fizera o aludido pedido e, para tanto, em obediência aos ditames do art.
995, parágrafo único, trouxera elementos suficientes para concluir-se da
imprescindibilidade da atribuição do efeito suspensivo.

Entre inúmeros outros argumentos e elementos


comprobatórios, o arrazoado trouxera as seguintes justificativas para que fosse
possível tal desiderato almejado:

“ Seguramente o Apelante se encontra acobertado pelo


pressuposto da “fundamentação relevante”, porquanto cristalinamente é
comprovado que, sobretudo alicerçado em decisão proferida em sede de
Recurso Repetitivo em matéria bancária no Superior Tribunal de Justiça (REsp
nº. 1.061.530/RS): a) existiu que a cobrança ilegal de juros capitalizados
diariamente; b) que a cobrança de encargos contratuais indevidos, no período
de normalidade contratual, afasta a mora do devedor; c) a cláusula 17ª da
Cédula de Crédito Bancário anuncia, expressamente, a possibilidade da
cobrança de comissão de permanência, juros moratórios e multa contratual,
ofuscando à diretriz da Súmula do 472 do STJ .
Ademais, além da “fundamentação relevante”, devidamente
fixada anteriormente, a peça recursal preenche o requisito do “risco de lesão
grave e difícil reparação”. , Tratando-se de recurso apelatório em sede de Ação
de Busca e Apreensão, portanto desprovido de efeito suspensivo, essa terá
seguimento normal. (LAF, art. 3º, § 5º) Com isso, certamente o veículo
apreendido tomará outro destino e, mais, poderá ser vendido a terceiros.

Outrossim, o veículo apreendido serve para a finalidade maior de


instrumento de trabalho do Apelante e, além disso, de transporte de suas
crianças à escola. Tudo isso é comprovado e narrado na Ata Notarial aqui
carreada. (doc. 01) Decerto um inescusável valor probante a esse aspecto (CPC,
art. 384 c/c art. 236 da CF e art. 7º, inc. III, da Lei 8.935/94).

De outro turno, é inconteste (CPC, art. 374, inc. I) que o cenário


atual das finanças do País é um dos piores de todos os tempos.

Nesse passo, urge evidenciar o teor substancial inserto na


Legislação Adjetiva Civil:

CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Art. 1º - O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os


valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República
Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

Art. 8º - Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às


exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa
humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a
publicidade e a eficiência.
Em abono ao exposto acima, urge transcrever o magistério de
José Miguel Garcia Medina:

“No contexto democrático, o modo como se manifestam e relacionam os


sujeitos do processo deve observar as garantias mínimas decorrentes do due
process of law. Assim, interessam, evidentemente, as regras dispostas no
Código de Processo Civil em outras leis, MS, sobretudo, a norma constitucional.
Entendemos que os princípios e valores dispostos na Constituição Federal
constituem o ponto de partida do trabalho do processualista. A atuação das
partes e a função jurisdicional devem ser estudadas a partir da compreensão de
que o processo é um espaço em que devem ser estudas a partir da
compreensão de que o processo é um estado em que se devem se materializar
os princípios inerentes a um Estado que se intitula ‘Democrático de Direito’ ...”
(MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil comentado: ... --
São Paulo: RT, 2015, p. 31)

E isso, igualmente, nos remete aos preceitos legais que


preservam a função social dos contratos (CC, art. 421).

No plano constitucional observemos que:

CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos


Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático
de Direito e tem como fundamentos:
(...)
III - a dignidade da pessoa humana;
(...)
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
E ainda no mesmo importe:

LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO

Art. 5º - Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e
às exigências do bem comum.

Há, assim, fortes possibilidades dos pedidos formulados nesta


ação serem julgados improcedentes, razão qual merecida a concessão de efeito
suspensivo ao recurso.

De toda prudência, portanto, que seja concedido efeito suspensivo ao recurso


apelatório em liça, máxime em decorrência das nefastas consequências que a
apreensão do bem está ocasionando à parte Apelante.

O mesmo ocorrera com respeito à tutela recursal,


quando, igualmente, o Recorrente trouxera abundantes fundamentos:

5.3. Possibilidade de purgação da mora

É consabido que atualmente prevalece o


equivocado entendimento da impossibilidade de purgação da mora. As razões
de maior efeito são: (a) alteração ocorrida no teor do art. 3º, § 2º, da Lei de
Alienação Fiduciária, por conta da Lei nº 10.931/2004 e, igualmente; (b)
motivado do entendimento pacificado no STJ, quando, do julgamento do REsp
nº. 1.418.593/MS, analisado sob o enfoque dos recursos repetitivos, definiu-se
que após a execução da liminar é facultado ao devedor somente pagar a
integralidade da dívida.

(a) Quanto ao impedimento por conta do recurso repetitivo


Não fosse isso o suficiente, há de levar-se em
conta que essa norma não tem efeito de “súmula vinculante”, máxime
porquanto não emanada do STF. É dizer, não se pode impedir o
aprofundamento do mérito da questão posta em juízo pelo simples fato de
contrariar, por exemplo, súmula do STJ, TJ´s ou até decisão proferida com efeito
repetitivo.

É consabido que a edição de súmula vinculante é


tarefa constitucionalmente atribuída ao Supremo Tribunal Federal (CF, art. 103-
A). Nesse passo, é tarefa do STF editar súmulas, simples ou vinculantes, e essas
devem orientar e vincular suas teses a todo o Poder Judiciário Nacional, além de
órgãos da administração direta e indireta, na esfera federal, estadual e
municipal.

Assim, não necessariamente o magistrado deve


ficar adstrito àquilo decidido em sede de recurso repetitivo.

(b) Ainda persiste a possibilidade de purgação da mora

A despeito das alterações legislativas insertas na


Lei de Alienação Fiduciária de Bens Móveis (Dec-Lei nº. 911/69), ainda persiste a
possibilidade de purgação da mora nas Ações de Busca e Apreensão de veículos.
Grande parte dessa controvérsia gira em torno da interpretação sistemática da
Lei ora em debate. Não só isso. Há claramente um total conflito aos princípios
da preservação dos contratos (CC, art. 479) e função social dos mesmos (CC, art.
421).

Antes de tudo, o que seria a mencionada


“interpretação sistemática” da norma?
Um dos significados da palavra “sistema”, dentre
tantos, é o da junção de elementos que se relacionam entre si, de sorte a
produzir um todo coerente e unitário.

É manifesto que o Direito é um sistema de normas.


É dizer, forma-se de um contexto que as leis se concatenam uma com as outras.
Com esses fundamentos, a norma jurídica não pode ser vista isoladamente,
solta; ao revés disso, a interpretação da norma reclama uma visão mais extensa,
abrangendo, desse modo, todo o ordenamento jurídico ou sistema jurídico.

Contudo, a decisão do STJ, antes comentada,


filiou-se à impropriedade atual da purgação da mora com uma visão restritiva
da Lei (uma coisa hermética mesmo). Desse modo, analisou-se o corpo frio e
estático da regra prevista no do § 2º, do art. 3º, da Lei de Alienação Fiduciária.

Ora, com o menor esforço compreendemos que o


pagamento tardio de uma dívida não pode representar a inutilidade da
prestação.

Diga-se a propósito que essa é juntamente a


orientação advinda do Código Civil:

CÓDIGO CIVIL
Art. 395 - Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais
juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado.
Parágrafo único - Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este
poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos.
Nesse diapasão, há de existir um obstáculo
insuperável, que atinja a própria substância do negócio, para que inviabilize a
continuação da relação contratual. É o chamado “inadimplemento absoluto” (o
contrário é o “inadimplemento parcial”, que é o caso tratado). Assim, não é
porque algumas parcelas sucessivas de um pacto não estejam inadimplidas que,
por isso, torna-se insustentável a continuação do negócio jurídico.

Outrossim, aqui a ligação fixada entre o mutuário e


mutuante bancário é de relação de consumo (Súmula 297 do STJ). Destarte,
mais claramente é devida a purgação da mora. É que, em harmonia ao que rege
a Lei Consumerista, tratando-se de contrato de adesão, a cláusula resolutória é
admitida, desde que alternativa e que a escolha pertença ao consumidor.
Confira-se:

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR


Art. 54 - Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas
pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor
de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar
substancialmente seu conteúdo.
§ 2° - Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que
alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no § 2°
do artigo anterior.

Assim, caso exista cláusula que “resolva” o


contrato de adesão (extinga), a alternativa de encerrar o pacto é uma escolha
dada ao consumidor. Então, se há inadimplência no contrato de mútuo com
garantia de alienação fiduciária de veículo, a eventual resolução do contrato não
pode ocorrer pelo simples fato de algumas parcelas não terem sido pagas pelo
mutuário, como na hipótese.
Por outro norte, sobretudo motivada pela
interpretação sistemática da norma em relevo, a purgação da mora é devida
quando relacionada a outras situações normativas similares.

Ademais, salientamos algumas normas que


permitem a purgação da mora, razão qual se deve adotar a interpretação
sistemática, in verbis:

LEI DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM “IMÓVEL” ( SFI )


LEI nº. 9514/97
( Capítulo II – Da alienação fiduciária de Coisa Imóvel)
Art. 26 - Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em
mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do
imóvel em nome do fiduciário.
§ 1º - Para os fins do disposto neste artigo, o fiduciante, ou seu representante
legal ou procurador regularmente constituído, será intimado, a requerimento do
fiduciário, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo
de quinze dias, a prestação vencida e as que se vencerem até a data do
pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos
contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais
imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação.

LEI DE LOTEAMENTO E VENDA DE TERRENOS A PRESTAÇÃO


DEC-LEI Nº 58/37
Art. 14 - Vencida e não paga a prestação, considera-se o contrato rescindido 30
dias depois de constituído em mora o devedor.
§ 2º - Purgada a mora, convalescerá o compromisso.

Do exposto, é inquestionável que, mesmo vigente


as alterações advindas da Lei nº. 10.931/2004, ainda persiste o instituto da
purgação da mora nas ações de busca e apreensão de veículos, mormente à luz
dos princípios da preservação do contrato e da função social. Além disso, como
sustentado, referido instituto é acolhido em razão de uma interpretação
sistemática das normas que tratam do tema.

Entrementes, a despeito de tamanha fundamentação, o


pleito fora obstado por meio da decisão antes mencionada.

Seguramente essa deliberação merece reparo.

Com esse enfoque dispõe o Código de Processo Civil


que:

Art. 489. São elementos essenciais da sentença:


§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela
interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo,
sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
(...)
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes
de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

Sem sombra de dúvidas a regra supra-aludida se


encaixa à decisão hostilizada. A mesma passa longe de invocar argumentos
capazes de motivar a rejeição aos pedidos buscados.

A ratificar o exposto acima, é de todo oportuno gizar o


magistério de José Miguel Garcia Medina:
“O conceito de omissão judicial que justifica a oposição de embargos de
declaração, à luz do CPC/2015, é amplíssimo. Há omissão sobre o ponto
ou questão, isso é, ainda que não tenha controvertido as partes (questão),
mas apenas uma delas tenha suscitado o fundamento (ponto; sobre a
distinção entre ponto e questão, cf. comentário ao art. 203 do CPC/2015).
Pode, também, tratar-se de tema a respeito do qual deva o órgão
jurisdicional pronunciar-se de ofício (p. ex., art. 485, § 3º do CPC/2015),
ou em razão de requerimento da parte. Deve ser decretada a nulidade da
decisão, caso a omissão não seja sanada. “( MEDINA, José Miguel Garcia.
Novo Código de Processo Civil comentado: ... – São Paulo: RT, 2015, p.
1.415)
(itálicos do texto original)

Nesse mesmo passo são as lições de Teresa Arruda


Alvim Wambier:

“ Em boa hora, consagra o dispositivo do NCPC projetado ora comentado,


outra regra salutar no sentido de que a adequação da fundamentação da
decisão judicial não se afere única e exclusivamente pelo exame interno
da decisão. Não basta, assim, que se tenha como material para se
verificar se a decisão é adequadamente fundamentada (= é
fundamentada) exclusivamente a própria decisão. Esta nova regra prevê a
necessidade de que conste, da fundamentação da decisão, o
enfrentamento dos argumentos capazes, em tese, de afastar a conclusão
adotada pelo julgador. A expressão não é a mais feliz: argumentos.
Todavia, é larga e abrangente para acolher tese jurídica diversa da
adotada, qualificação e valoração jurídica de um texto etc.
Vê-se, portanto, que, segundo este dispositivo, o juiz deve proferir
decisão afastando, repelindo, enfrentando elementos que poderiam
fundamentar a conclusão diversa. Portanto, só se pode aferir se a
decisão é fundamentada adequadamente no contexto do processo em
que foi proferida. A coerência interna corporis é necessária, mas não
basta. “ (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim ... [et al.]. – São Paulo: RT, 2015,
p. 1.473)
(itálicos e negritos do texto original)

Não fosse isso o bastante, urge transcrever igualmente


as lições de Luiz Guilherme Marinoni:

“Assim, o parâmetro a partir do qual se deve aferir a completude da


motivação das decisões judiciais passa longe da simples constância na
decisão do esquema lógico-jurídico mediante o qual o juiz chegou à sua
conclusão. Partindo-se da compreensão do direito ao contraditório como
direito de influência e o dever de fundamentação como dever de debate,
a completude da motivação só pode ser aferida em função dos
fundamentos arguidos pelas partes. Assim, é omissa a decisão que deixa
de se pronunciar sobre argumento formulado pela parte capaz de alterar
o conteúdo da decisão judicial. Incorre em omissão relevante toda e
qualquer decisão que esteja fundamentada de forma insuficiente (art.
1.022, parágrafo único, II), o que obviamente inclui ausência de
enfrentamento de precedentes das Cortes Supremas arguidos pelas
partes e de jurisprudência formada a partir do incidente de resolução de
demandas repetitivas e de assunção de competência perante as Cortes de
Justiça (art. 1.022, parágrafo único, I). “ (MARINONI, Luiz Guilherme;
ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo civil:
tutela ... vol. 2. – São Paulo: RT, 2015, p. 540)

É necessário não perder de vista a posição da


jurisprudência oriunda do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA.


DECISÃO QUE ANALISA O PEDIDO DE CONCESSÃO DE EFEITO
SUSPENSIVO AOS EMBARGOS À EXECUÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO.
NECESSIDADE. ART. 165 DO CPC.
1. Afasta-se a alegada violação do art. 535 do CPC quando o acórdão
recorrido, integrado pelo julgado proferido nos embargos de declaração,
dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas
nas razões recursais. 2. É nula, por ausência de motivação, decisão que
confere efeito suspensivo a embargos à execução nos termos do art. 739 -
A, § 1º, do CPC, sem que haja fundamento que justifique essa
excepcionalidade. 3. Agravo em Recurso Especial conhecido para negar
provimento ao recurso especial. (STJ; AREsp 120.546; Proc.
2011/0279821-9; RS; Terceira Turma; Rel. Min. João Otávio de Noronha;
DJE 16/06/2014)

No mesmo sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE


SENTENÇA. INDENIZATÓRIA. CEEE. CÁLCULO. CORREÇÃO. DEVER DE
FUNDAMENTAR (ART. 93 DA CF/88). DECISÃO DESCONSTITUÍDA.
Decisão judicial que se limitou a reconhecer a correção do cálculo
apresentado pela contadoria e não apreciou, de forma detida, os
argumentos deduzidos pelos litigantes, não deve ser mantida pela
ausência de fundamentação. Nula toda e qualquer decisão que não
contenha fundamentação, conforme o artigo 165, do código de processo
civil e artigo 93, ix, da constituição federal. Deram provimento ao agravo
de instrumento. (TJRS; AI 0410398-09.2015.8.21.7000; Porto Alegre;
Décima Nona Câmara Cível; Rel. Des. Eduardo João Lima Costa; Julg.
17/12/2015; DJERS 28/01/2016)

PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL.


MORTE DO EXEQUENTE. SENTENÇA DE EXTINÇÃO COM BASE NOS ARTS.
267, IV, E 295, III, AMBOS DO CPC. AUSÊNCIA DE REQUISITO ESSENCIAL.
RELATÓRIO. ART. 458 DO CPC. NULIDADE. FALECIMENTO DO AUTOR DA
DEMANDA. NECESSÁRIA SUSPENSÃO DO PROCESSO. PREVISÃO LEGAL
EXPRESSA. ARTS. 43, 265, I, 791, II, E 1.055, TODOS DO CPC. SENTENÇA
ANULADA EX OFICIO.
1. São requisitos essenciais da sentença o relatório, a fundamentação e o
dispositivo. Inexistente qualquer dos requisitos expressos no art. 458,
impõe-se a anulação da sentença ex oficio. 2. Ademais, havendo notícia
de falecimento do exequente da ação, não há que se falar em extinção do
feito com base nos arts. 267, IV, e 295, III, ambos do CPC. Devendo a ação
ser suspensa, conforme previsão expressa constante nos arts. 265, I, 791,
II e 1.055, todos do mesmo diploma legal, até que seja regularizado o polo
ativo da demanda, pela habilitação-incidente do espólio ou herdeiros do
de cujus. 3. Ante o exposto, impende declarar a nulidade da sentença de
fl. 49, determinando-se a remessa dos autos à primeira instância para
suspensão da ação de execução, nos termos do art. 791, II, do CPC. 4.
Apelo parcialmente provido. (TJPE; Rec. 0093282-86.1996.8.17.0001;
Primeira Câmara Cível; Rel. Des. Roberto da Silva Maia; DJEPE
22/01/2016)
Diante disso, ou seja, face à carência de
fundamentação, mostra-se necessária a anulação do decisum combatido, e, por tal
motivo, seja proferida nova decisão devidamente motivada.

2 - EQUÍVOCO DA R. DECISÃO ORA GUERREADA


ERROR IN JUDICANDO

As questões destacadas na defesa inserta na Ação de


Busca e Apreensão são de gravidade extremada e reclama, sem sombra de
dúvidas, a atribuição de efeito suspensivo. Inquestionável que a hipótese ora trazida
à baila preenche os requisitos exigidos pelo art. 995, parágrafo único c/c art. 1.012,
§ 4º, do Estatuto de Ritos.

Demonstra-se, pois, o preenchimento dos requisitos do


“risco de lesão grave e de difícil reparação” e da “fundamentação relevante”, para,
assim, ser concedido efeito suspensivo ao recurso em liça.

Seguramente o Agravante se encontra acobertado pelo


pressuposto da “fundamentação relevante”, porquanto cristalinamente é
comprovado que, sobretudo alicerçado em decisão proferida em sede de Recurso
Repetitivo em matéria bancária no Superior Tribunal de Justiça (REsp nº.
1.061.530/RS): a) existiu que a cobrança ilegal de juros capitalizados diariamente;
b) que a cobrança de encargos contratuais indevidos, no período de normalidade
contratual, afasta a mora do devedor; c) a cláusula 17ª da Cédula de Crédito
Bancário anuncia, expressamente, a possibilidade da cobrança de comissão de
permanência, juros moratórios e multa contratual, ofuscando à diretriz da Súmula do
472 do STJ .
Ademais, além da “fundamentação relevante”,
devidamente fixada anteriormente, a peça recursal preenche o requisito do “ risco de
lesão grave e difícil reparação”. , Tratando-se de recurso apelatório em sede de
Ação de Busca e Apreensão, portanto desprovido de efeito suspensivo, essa terá
seguimento normal. (LAF, art. 3º, § 5º) Com isso, certamente o veículo apreendido
tomará outro destino e, mais, poderá ser vendido a terceiros.

Outrossim, o veículo apreendido serve para a finalidade


maior de instrumento de trabalho do Recorrente e, além disso, de transporte de
suas crianças à escola. Tudo isso foi comprovado e narrado na Ata Notarial
anteriormente carreada (fls. 22). Decerto um inescusável valor probante a esse
aspecto (CPC, art. 384 c/c art. 236 da CF e art. 7º, inc. III, da Lei 8.935/94).

De outro turno, é inconteste (CPC, art. 374, inc. I) que o


cenário atual das finanças do País é um dos piores de todos os tempos.

Nesse passo, urge evidenciar o teor substancial inserto


na Legislação Adjetiva Civil:

CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Art. 1º - O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado


conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na
Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as
disposições deste Código.

Art. 8º - Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais


e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade
da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a
legalidade, a publicidade e a eficiência.

Em abono ao exposto acima, urge transcrever o


magistério de José Miguel Garcia Medina:

“No contexto democrático, o modo como se manifestam e relacionam os


sujeitos do processo deve observar as garantias mínimas decorrentes do
due process of law. Assim, interessam, evidentemente, as regras dispostas
no Código de Processo Civil em outras leis, MS, sobretudo, a norma
constitucional. Entendemos que os princípios e valores dispostos na
Constituição Federal constituem o ponto de partida do trabalho do
processualista. A atuação das partes e a função jurisdicional devem ser
estudadas a partir da compreensão de que o processo é um espaço em
que devem ser estudas a partir da compreensão de que o processo é um
estado em que se devem se materializar os princípios inerentes a um
Estado que se intitula ‘Democrático de Direito’ ...” (MEDINA, José Miguel
Garcia. Novo Código de Processo Civil comentado: ... -- São Paulo: RT,
2015, p. 31)

E isso, igualmente, nos remete aos preceitos legais que


preservam a função social dos contratos (CC, art. 421).

No plano constitucional observemos que:

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
III - a dignidade da pessoa humana;
(...)
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

E ainda no mesmo importe:

LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO

Art. 5º - Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se
dirige e às exigências do bem comum.

Há, assim, fortes possibilidades dos pedidos formulados


nesta ação serem julgados improcedentes, razão qual merecida a concessão de
efeito suspensivo ao recurso.

Com efeito, lapidar o entendimento jurisprudencial:

AGRAVO DE INSTRUMENTO.
Medida cautelar de exibição de documento julgada procedente para
determinar ao Réu que apresente o documento pretendido, sob pena de
busca e apreensão. Interposição de apelação, que foi recebida no efeito
meramente devolutivo. Pleito visando a concessão de efeito suspensivo à
apelação. Admissibilidade. Relevância da fundamentação que permite a
aplicação do artigo 558, parágrafo único, do CPC. Recurso provido. (TJSP;
AI 2221660-13.2015.8.26.0000; Ac. 9022499; São Paulo; Trigésima Sexta
Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Pedro Baccarat; Julg. 26/11/2015;
DJESP 03/12/2015)

De toda prudência, portanto, que seja concedido efeito


suspensivo ao recurso apelatório em liça, máxime em decorrência das nefastas
consequências que a apreensão do bem está ocasionando à parte Apelante.

No tocante à tutela antecipatória recursal, essa também


merece acolhimento.

É consabido que atualmente prevalece o equivocado


entendimento da impossibilidade de purgação da mora. As razões de maior efeito
são: (a) alteração ocorrida no teor do art. 3º, § 2º, da Lei de Alienação Fiduciária,
por conta da Lei nº 10.931/2004 e, igualmente; (b) motivado do entendimento
pacificado no STJ, quando, do julgamento do REsp nº. 1.418.593/MS, analisado sob
o enfoque dos recursos repetitivos, definiu-se que após a execução da liminar é
facultado ao devedor somente pagar a integralidade da dívida.

(a) Quanto ao impedimento por conta do recurso repetitivo

Não fosse isso o suficiente, há de levar-se em conta


que essa norma não tem efeito de “súmula vinculante”, máxime porquanto não
emanada do STF. É dizer, não se pode impedir o aprofundamento do mérito da
questão posta em juízo pelo simples fato de contrariar, por exemplo, súmula do
STJ, TJ´s ou até decisão proferida com efeito repetitivo.
É consabido que a edição de súmula vinculante é tarefa
constitucionalmente atribuída ao Supremo Tribunal Federal (CF, art. 103-A). Nesse
passo, é tarefa do STF editar súmulas, simples ou vinculantes, e essas devem
orientar e vincular suas teses a todo o Poder Judiciário Nacional, além de órgãos da
administração direta e indireta, na esfera federal, estadual e municipal.

Assim, não necessariamente o magistrado deve ficar


adstrito àquilo decidido em sede de recurso repetitivo.

É necessário não perder de vista a posição da


jurisprudência:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO


DE INSTRUMENTO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. RECEBIMENTO
COMO O AGRAVO INTERNO PREVISTO NO ART. 557, §1º, DO CPC
[CPC/2015, art. 1.021, § 2º]. SÚMULA Nº 42/TJPE. MÉRITO. BUSCA E
APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PURGAÇÃO DA MORA.
POSSIBILIDADE. ART. 401, I, DO CÓDIGO CIVIL. SÚMULA Nº 15 DO TJPE.
INAPLICABILIDADE DA EXCEÇÃO DO ART. 395, PARÁGRAFO ÚNICO, DO
CÓDIGO CIVIL. AUSÊNCIA DE EFEITO VINCULANTE DE ORIENTAÇÃO
ADOTADA PELO STJ EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO. RECURSO
IMPROVIDO. Recebimento do agravo regimental como o recurso de
agravo previsto no art. 557, §1º, do CPC [CPC/2015, art. 1.021, § 2º], por
não ser outro o cabível na espécie e restar respeitado o pressuposto de
admissibilidade do recurso adequado, consubstanciado na sua
tempestividade. Súmula nº 42/tjpe (são fungíveis os agravos regimental e
legal). Mérito. Na ação de busca e apreensão, a propriedade e a posse do
bem apenas se consolidam nas mãos do credor fiduciário após a
realização do devido processo legal, concedendo-se ao devedor a
possibilidade de purgar a mora e discutir o débito, diante da
irreversibilidade do provimento antecipatório, de natureza
eminentemente excepcional. Incidência do art. 401, I, do Código Civil, que
prevê o instituto da purgação da mora, relevante e consolidado
instrumento impeditivo da resolução do vínculo contratual, o que autoriza
sua manutenção desde que o devedor ofereça a prestação devida, com os
encargos legais. Inaplicabilidade da exceção contida no parágrafo único do
art. 395, do CC, permitindo a rejeição da prestação pelo credor, por se
tratar de contrato de alienação fiduciária em garantia, onde se faz
presente uma relação de consumo, devendo ser autorizado o exercício do
direito à purgação da mora das prestações vencidas, e das que se
vencerem no curso da demanda sem qualquer restrição, mesmo porque a
adimplência sempre será mais útil ao credor do que a odiosa recuperação
do bem objeto da garantia. Súmula nº 15/tjpe: nos contratos garantidos
por alienação fiduciária, purga-se a mora mediante pagamento das
parcelas vencidas no ato do ajuizamento e das que se vencerem no curso
da ação de busca e apreensão, mesmo após o advento da Lei nº
10.931/2004. Existência de orientação adotada pelo STJ em sede de
recurso repetitivo (art. 543-c do cpc) [CPC/2015, art. 1.036] que não é
suficiente para alterar o entendimento desta relatoria acerca da matéria,
por não possuir efeito vinculante. Agravo improvido. (TJPE; Rec. 0007818-
33.2015.8.17.0000; Rel. Des. Cândido José da Fonte Saraiva de Moraes;
Julg. 05/08/2015; DJEPE 14/08/2015)

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. BUSCA E APREENSÃO. PURGAÇÃO DA MORA


SOMENTE COM O PAGAMENTO DAS PARCELAS VENCIDAS ATÉ A DATA
DE EVENTUAL.
Depósito o pagamento da totalidade das parcelas (vencidas e vincendas)
torna a situação do credor extremamente vantajosa e coloca o devedor
em situação de enorme desigualdade incidência das regras do CDC
aplicáveis ao caso concreto decisão agravada mantida. Agravo de
instrumento improvido, com observação. (TJSP; AI 2030772-
58.2013.8.26.0000; Ac. 7269949; Monte Mor; Trigésima Quarta Câmara
de Direito Privado; Relª Desª Cristina Zucchi; Julg. 01/07/2015; DJESP
28/07/2015)

(b) Ainda persiste a possibilidade de purgação da mora

A despeito das alterações legislativas insertas na Lei de


Alienação Fiduciária de Bens Móveis (Dec-Lei nº. 911/69), ainda persiste a
possibilidade de purgação da mora nas Ações de Busca e Apreensão de veículos.
Grande parte dessa controvérsia gira em torno da interpretação sistemática da Lei
ora em debate. Não só isso. Há claramente um total conflito aos princípios da
preservação dos contratos (CC, art. 479) e função social dos mesmos (CC, art.
421).

Antes de tudo, o que seria a mencionada “ interpretação


sistemática” da norma?

Um dos significados da palavra “sistema”, dentre tantos,


é o da junção de elementos que se relacionam entre si, de sorte a produzir um todo
coerente e unitário.

É manifesto que o Direito é um sistema de normas. É


dizer, forma-se de um contexto que as leis se concatenam uma com as outras. Com
esses fundamentos, a norma jurídica não pode ser vista isoladamente, solta; ao
revés disso, a interpretação da norma reclama uma visão mais extensa,
abrangendo, desse modo, todo o ordenamento jurídico ou sistema jurídico.
Contudo, a decisão do STJ, antes comentada, filiou-se
à impropriedade atual da purgação da mora com uma visão restritiva da Lei (uma
coisa hermética mesmo). Desse modo, analisou-se o corpo frio e estático da regra
prevista no do § 2º, do art. 3º, da Lei de Alienação Fiduciária.

Ora, com o menor esforço compreendemos que o


pagamento tardio de uma dívida não pode representar a inutilidade da prestação.

Diga-se a propósito que essa é juntamente a orientação


advinda do Código Civil:

CÓDIGO CIVIL
Art. 395 - Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa,
mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais
regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
Parágrafo único - Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao
credor, este poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos.

Nesse diapasão, há de existir um obstáculo insuperável,


que atinja a própria substância do negócio, para que inviabilize a continuação da
relação contratual. É o chamado “inadimplemento absoluto” ( o contrário é o
“inadimplemento parcial”, que é o caso tratado). Assim, não é porque algumas
parcelas sucessivas de um pacto não estejam inadimplidas que, por isso, torna-se
insustentável a continuação do negócio jurídico.

Com esse enfoque:


DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DE AGRAVO EM AGRAVO
DE INSTRUMENTO (ART. 557, §1º, CPC). BUSCA E APREENSÃO.
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PURGAÇÃO DA MORA. ADIMPLEMENTO DAS
PARCELAS VENCIDAS. POSSIBILIDADE. ART. 401, I, DO CÓDIGO CIVIL.
SÚMULA Nº 15 DO TJPE. INAPLICABILIDADE DA EXCEÇÃO DO ART. 395,
PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL. AUSÊNCIA DE EFEITO
VINCULANTE DE ORIENTAÇÃO ADOTADA PELO STJ EM SEDE DE RECURSO
REPETITIVO. RECURSO IMPROVIDO. Na ação de busca e apreensão, a
propriedade e a posse do bem apenas se consolidam nas mãos do credor
fiduciário após a realização do devido processo legal, concedendo-se ao
devedor a possibilidade de purgar a mora e discutir o débito, diante da
irreversibilidade do provimento antecipatório, de natureza
eminentemente excepcional. Incidência do art. 401, I, do Código Civil, que
prevê o instituto da purgação da mora, relevante e consolidado
instrumento impeditivo da resolução do vínculo contratual, o que autoriza
sua manutenção desde que o devedor ofereça a prestação devida, com os
encargos legais. Inaplicabilidade da exceção contida no parágrafo único do
art. 395, do CC, permitindo a rejeição da prestação pelo credor, por se
tratar de contrato de alienação fiduciária em garantia, onde se faz
presente uma relação de consumo, devendo ser autorizado o exercício do
direito à purgação da mora das prestações vencidas, e das que se
vencerem no curso da demanda sem qualquer restrição, mesmo porque a
adimplência sempre será mais útil ao credor do que a odiosa recuperação
do bem objeto da garantia. Súmula nº 15/tjpe: nos contratos garantidos
por alienação fiduciária, purga-se a mora mediante pagamento das
parcelas vencidas no ato do ajuizamento e das que se vencerem no curso
da ação de busca e apreensão, mesmo após o advento da Lei nº
10.931/2004. Existência de orientação adotada pelo STJ em sede de
recurso repetitivo (art. 543-c do cpc) que não é suficiente para alterar o
entendimento desta relatoria acerca da matéria, por não possuir efeito
vinculante. Agravo improvido. (TJPE; Rec. 0015349-73.2015.8.17.0000;
Rel. Des. Cândido J. F. Saraiva de Moraes; Julg. 13/01/2016; DJEPE
27/01/2016)

Outrossim, aqui a ligação fixada entre o mutuário e


mutuante bancário é de relação de consumo (Súmula 297 do STJ). Destarte, mais
claramente é devida a purgação da mora. É que, em harmonia ao que rege a Lei
Consumerista, tratando-se de contrato de adesão, a cláusula resolutória é admitida,
desde que alternativa e que a escolha pertença ao consumidor. Confira-se:

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR


Art. 54 - Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido
aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente
pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa
discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.
§ 2° - Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que
alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto
no § 2° do artigo anterior.

Assim, caso exista cláusula que “resolva” o contrato de


adesão (extinga), a alternativa de encerrar o pacto é uma escolha dada ao
consumidor. Então, se há inadimplência no contrato de mútuo com garantia de
alienação fiduciária de veículo, a eventual resolução do contrato não pode ocorrer
pelo simples fato de algumas parcelas não terem sido pagas pelo mutuário, como
na hipótese.
Por outro norte, sobretudo motivada pela interpretação
sistemática da norma em relevo, a purgação da mora é devida quando relacionada
a outras situações normativas similares.

Ademais, salientamos algumas normas que permitem a


purgação da mora, razão qual se deve adotar a interpretação sistemática, in verbis:

LEI DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM “IMÓVEL” ( SFI )


LEI nº. 9514/97
( Capítulo II – Da alienação fiduciária de Coisa Imóvel)
Art. 26 - Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído
em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a
propriedade do imóvel em nome do fiduciário.
§ 1º - Para os fins do disposto neste artigo, o fiduciante, ou seu
representante legal ou procurador regularmente constituído, será
intimado, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do competente
Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação
vencida e as que se vencerem até a data do pagamento, os juros
convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os
encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais
imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação.

LEI DE LOTEAMENTO E VENDA DE TERRENOS A PRESTAÇÃO


DEC-LEI Nº 58/37
Art. 14 - Vencida e não paga a prestação, considera-se o contrato
rescindido 30 dias depois de constituído em mora o devedor.
§ 2º - Purgada a mora, convalescerá o compromisso.
Do exposto, é inquestionável que, mesmo vigente as
alterações advindas da Lei nº. 10.931/2004, ainda persiste o instituto da purgação
da mora nas ações de busca e apreensão de veículos, mormente à luz dos
princípios da preservação do contrato e da função social. Além disso, como
sustentado, referido instituto é acolhido em razão de uma interpretação sistemática
das normas que tratam do tema.

3 – PEDIDOS E REQUERIMENTOS
Posto isso, o presente Agravo Regimental merece ser
conhecido e provido, principalmente quando foram comprovados os pressupostos
de sua admissibilidade, onde se pede que:

( i ) dê-se provimento ao presente recurso, ofertando juízo de


retratação e em face dos fundamentos levantados neste Agravo
Interno:

( a ) levando-se em conta os ditames do art. 995, parágrafo único c/c art.


1.012, § 4º, ambos do Código de Processo Civil, o Agravante pede seja
concedido efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto;

( b ) provendo-se a tutela recursal, seja admitida de pronto a purgação da


mora e, via reflexa, torne válido o depósito apenas das parcelas vencidas
até o momento desta decisão;

( c ) pleiteia, ainda, após realizado o depósito dos referidos valores, seja a


parte Agravada instada a restituir o veículo no prazo de 10(dez) dias, sob
pena de incidir em multa diária de R$ 100,00 (cem reais).
( ii ) não sendo esse o entendimento de Vossa Excelência, ad
argumentandum, requer-se que o presente recurso seja submetido a
julgamento pelo Órgão Colegiado (CPC, art. 1.021, § 2º).

Respeitosamente, pede deferimento.

Cidade, 00 de fevereiro de 0000.

Beltrano de Tal
Advogado – OAB/RS 0000

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