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FACULDADE DE DIREITO
FILOSOFIA DO DIREITO
(Sumários Desenvolvidos)
Parte I
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Apresentação
Este documento resume as matérias abordadas na Cadeira de Filosofia do Direito.
A leitura deste documento não dispensa a leitura da bibliografia recomendada e
disponibilizada no início do ano, com o plano, pelo corpo docente.
Os objectivos do documento são:
***As referências bibliográficas são as indicadas com detalhe no Plano distribuído no primeiro
dia de aulas.
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Introdução
Como qualquer área do saber, se a Filosofia do Direito se pretende disciplina académica, deve
delimitar o seu âmbito de estudo, balizando claramente as questões fulcrais que pretende
responder em sua abordagem.
Porém, diferentemente do que ocorre com as outras disciplinas académicas (em que as
questões por debater parecem unânimes e aceites por todos os investigadores interessados) a
tabela de prioridades das questões próprias da Filosofia do Direito não é um dado adquirido
entre os seus cultores.
Seja enquadrada no âmbito das disciplinas exclusivamente filosóficas, seja no das chamadas
disciplinas humanísticas do direito (com pretende Paulo Ferreira da Cunha), não será fácil
gerar consenso no que sejam as questões relevantes a ser debatidas nesta cadeira.
Esta posição leva-nos ao entendimento de que a Filosofia do Direito, que é a reflexão filosófica
sobre o Direito, há-de se interessar por tudo o que, respeitando à realidade jurídica, suscita
questionamento.
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Este entendimento já devia se bastante para nos tranquilizar: a delimitação do âmbito do
estudo da Filosofia de direito andaria, assim, pelo critério máximo isto é, a Filosofia do Direito
seria a disciplina que estuda a universalidade da realidade jurídica.
Com efeito, no extenso universo que é a realidade jurídica, cada filósofo deverá tomar as suas
rédeas, escolher o seu caminho e fazer a sua via sacra. Terá cada um de enfrentar a dor da
escolha que sempre implica o afastamento de certas tantas questões, facto que a paixão
filosófica detesta fazer.
Quanto a mim, tem me parecido que a Filosofia do Direito tem uma questão fundamental a
responder e a volta da qual gravitam outras questões satélites designadamente: Quais as
condições de um direito justo?
Para responder cabalmente a esta questão deverei dividir-la em três outras questões a saber:
A)O que é o Direito?
B)O que é Justiça?
C)O que é o Direito justo?
Um plano de Filosofia do Direito deverá, por isso, inevitavelmente incluir uma reflexão sobre a
essência do direito (sobre o ser e ser do direito ou, pelo menos, sobre as várias concepções do
Direito) uma concepção da Justiça (ou pelo menos a análise das diversas concepções dessa
Justiça) e, finalmente, uma reflexão sobre as condições fundamentais para que o Direito
cumpra o seu fim que é a materialização da Justiça ou seja uma reflexão sobre as condições de
um direito justo.
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I. Da Filosofia
(Generalidades)
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1. As Origens
2. O Objecto
A princípio, dizer filosofia era o mesmo que dizer ciência já que o conceito englobava todo o
saber humano: Física, Geografia, Biologia, Astrologia, entre outras), daí ter sido desde sempre
considerada mãe de todas as ciências.
A Filosofia está, pois, na raiz de tudo, razão pela qual se entende que tudo pode ser objecto de
indagação filosófica: toda e qualquer realidade pode ser estudada, analisada, questionada pela
Filosofia. Assim, a Filosofia estuda o todo, a totalidade, a generalidade, a universalidade do
real.
Devemos concluir que a Filosofia estuda a universalidade do real por duas razões1:
Primeiro, porque todas as coisas podem ser examinadas no nível científico e também no
filosófico;
Segundo, porque enquanto as ciências estudam esta ou aquela dimensão da realidade, a
Filosofia estuda o todo, o universo tomado globalmente.
3. O problema da definição
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Whitehead – A Filosofia é a ciência que fornece uma explicação orgânica do universo.
Nenhuma das definições pode ser considerada certa ou errada; cada uma delas foca numa
questão particular. Porém, nenhuma delas satisfaz de forma integral, pois nenhuma cobre
todo o objecto da Filosofia, para tal seria necessário abstrair-se praticamente de tudo e não
focar apenas num único elemento.
A diversidade das definições tem sobretudo a ver com o facto de toda a filosofia constituir o
resultado uma vivência e uma experiência. Não há duas experiências iguais. Não há duas
experiências iguais.
4. As Características
Historicidade – ela desenvolve-se tendo em conta as vivências concretas dos povos. Não se
trata de mera especulação teórica, que não esteja enraizada nas vivências concretas do
Homem de cada época, muito pelo contrário; a Filosofia é, na verdade, influenciada por este
curso normal da História e as questões próprias de uma época são distintas das de outra.
Radicalidade – de radice ou radix, é o entendimento de que a Filosofia não se contenta com
respostas superficiais, ela tende a ir à raiz dos problemas, ao seu fundamento, não se satisfaz
com respostas imediatas. Ela visa justamente as “causas últimas”, causas que estão por detrás
e para além de outras causas;
Universalidade – tem uma dupla significação: por um lado, a Filosofia diz respeito à
generalidade das pessoas ou seja, trata de problemas que interessam à globalidade das
pessoas e, por outro lado, ela não se ocupa de um objecto específico, mas é uma disciplina que
trata da generalidade dos problemas. Pode-se filosofar sobre tudo o que se pretender, mas
também todas essas questões afectam a Humanidade em geral;
Autonomia – auto (para si mesmo) + nomos (regulação), consiste na característica daqueles
que criam normas para si próprios. O filósofo é um pensador independente, que labora no
sentido de dar a sua própria explicação a um problema que é geral. A única dependência que
se impõe ao raciocínio filosófico diz respeito à perspectiva em que o mesmo surge. Desta
forma, a Filosofia é independente do senso comum, da religião, da política e de tudo quanto
possa afectar a liberdade de pensar do filósofo.
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Exigência crítica – a Filosofia tem por base um método da justificação lógico-racional. Ela não
se contenta, tudo critica, tudo questiona. O filósofo vive permanentemente angustiado, pois
há sempre dúvidas que geram questões e críticas aos factos quotidianos.
5. Fim e valor
A Filosofia opera sobre aporias (problemas sem solução científica; problemas que constituem
situações-limite, verdadeiros bloqueios do pensamento humano, aquilo que impede o
movimento e não deixa avançar) 4.
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Este é o campo por excelência da Filosofia. Ela é uma disciplina aporética porque se preocupa
com questões cientificamente insolúveis ou sem resposta. A sua actividade interrogativa do
real e do pensamento conduz, desta forma, ao tratamento de aporias.
Em sentido amplo, a Filosofia é também uma ciência, pelo que por aí não há que fazer uma
distinção. A Filosofia é, pois, um conjunto de conhecimentos que visam resolver problemas, os
quais são obtidos com base num método específico.
Contudo, em sentido restrito a ciência compreende um conjunto de conhecimentos obtidos a
partir do chamado método científico. Neste sentido, até o Direito é questionado como ciência.
A Filosofia tem por base o método da justificação lógico-racional.
Portanto, a distinção entre Filosofia e Ciênia em sentido restrito coloca-se, desde logo, a nível
do método.
Por outro lado, estas duas realidades distinguem-se também a nível do objecto: enquanto nas
ciências particulares as soluções aos problemas não dependem dos sujeitos (por exemplo por
haver verificação de pares – quando há uma descoberta científica os outros cientistas
confirmam a validade e eficácia da solução ou proposta avançada), na Filosofia o resultado
depende muito da vivência do sujeito em causa, daí que o raciocínio filosófico dá lugar a
soluções tendencialmente subjectivas. – objectividade vs subjectividade.
A ciência é, de sua essência, fenomenológica (visa o saber a partir de fenómenos), enquanto a
Filosofia é radicalmente ontológica e metafísica, pois preocupa-se com o ser enquanto ser.
Distinguem-se, ainda, quanto ao fim, pois enquanto a ciência visa dar uma solução prática aos
problemas, a Filosofia procura alcançar as causas últimas de todas as coisas. A Filosofia tem
uma finalidade puramete teorética, ou seja, contemplativa, diferentemente da ciência, que
busca fins práticos e tem interesses externos.
Qualquer área do saber debruça-se sobre questões próprias e específicas, relacionadas com
determinados problemas. À Filosofia, embora não haja restrições no seu objecto, interessam
(para o presente estudo) os seguintes problemas:
O problema do ser, que corresponde à Ontologia (ontos + logos, do Grego, significa a ciência
do ser).
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O problema do conhecimento que corresponde à Gnoseologia (do Grego, gnosis), o seu
conceito, a possibilidade do Homem conhecer ou saber alguma coisa e a origem do
conhecimento.
O problema antropológico, que se debruça sobre o Homem;
O problema metafísico, que consiste no estudo de toda a realidade para além do que é físico,
do que é apreensível pelos sentidos, v.g.:, Deus, alma.
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interesses da sociedade, pelo que, ele deve ser exercido tendo em conta o fim social. Por isso
há institutos como o abuso de direito (art 334 do CC), que limitam o seu exercício, no sentido
de não contrariar a boa-fé, sob pena de estar a ser exercido ilegitimamente.
Ao efectuarmos esta análise, estamos a buscar a Filosofia no Direito, o conjunto de
perspectivas, visões, ideias que foram orientando o sistema jurídico ao longo do seu processo
de formação.
Esclarecida esta questão prévia, podemos avançar para a diferenciação entre a Filosofia do
Direito e áreas do saber.
Por um lado, na Filosofia do Direito procuramos respostas globais; por outro, na Ciência
Jurídica procuramos respostas para problemas concretos e particulares. Enquanto a Filosofia
do Direito não se limita à especificade, a Ciência Jurídica parte de um sistema concreto e busca
soluções para problemas específicos e concretos.
Têm, portanto, finalidades distintas, no sentido de que na Ciência Jurídica estão em causa
soluções imediatas para problemas práticos, ao passo que a Filosofia do Direito tem uma
função mais reflexiva e orientativa, isto é, é uma disciplina teórica e não tem em vista a
procura de soluções práticas para problemas concretos.
Mais ainda, no dizer de Braz Teixeira, ao passo que a Ciência Jurídica parte sempre do Direito
positivo, de um sistema jurídico-normativo concreto, espacio-temporalmente definido do
Direito vigente numa determinada comunidade e uma determinada época, a Filosofia do
Direito interroga-se sobre o seu valor e o seu fim, sobre o ser do Direito ou o Direito enquanto
ser e sobre a justiça que o garante, bem como sobre o valor gnoseológico do saber do Direito
dos juristas, i.e., sobre o fundamento e valor da própria Ciência Jurídica.
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ibidem, p. 42
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Isto não se pode confundir com a Filosofia do Direito, que é uma disciplina científica, como
referimos acima, ainda que do ponto de vista amplo.
A Sociologia Jurídica estuda o Direito como um facto social, situando-se, pois, no plano da
eficácia do Direito e não no da validade. A Sociologia Jurídica questiona-se como é que a
sociedade encara os factos jurídicos.
A Filosofia do Direito, diferentemente, situa-se no plano da validade das normas,
questionando-se se uma norma é justa ou não.
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O PROBLEMA ANTROPOLÓGICO
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1. Generalidades
Porque é uma realidade destinada exclusivamente ao Homem – o Direito existe para garantir
a boa convivência social. Não é criado para regular a vida de outro ser, senão o Homem. O seu
dado menor é o direito subjectivo, que só pode ser titulado por pessoas, idem em relação ao
dever jurídico. Só se pode exigir o cumprimento de regras a seres com vontade juridicamente
relevante, liberdade e consciência (salvas excepções) e estas características só o Homem é que
possui, não os animais. Logo, o Direito tem origem exclusivamente humana e dirige-se
exclusivamente ao Homem.
Em suma, a importância do estudo do Homem neste curso resulta do facto de que o Direito é
uma realidade exclusivamente humana, construída exclusivamente pelo Homem e que se
destina ao próprio Homem.
Para reflectirmos filosoficamente sobre o Direito é necessário que reflictamos sobre o Homem,
que é o seu autor e exclusivo destinatário.
O Direito limita-se a interpretar as circunstâncias em que o Homem vive. O Direito não é uma
realidade descritiva (não se limita a dizer o que é); é, na verdade, uma realidade impositiva (diz
o que deve ser). Não é uma realidade sobre o ser, mas sobre o dever ser.
É neste âmbito que Montesquieu defende que o Direito é influenciado por um conjunto de
circunstâncias que influenciam o Homem, inclusivamente o clima, o facto do povo de certo
Estado ser nómada ou sedentário, entre outros factores. Tudo o que rodeia o Homem
influencia, segundo este filósofo, na construção de normas jurídicas. Por exemplo, a criação do
instituto da propriedade horizontal apenas se justifica pelo facto do povo ser sedentário. Não
precisaríamos desta figura, se fôssemos nómadas. Portanto, todas as circunstâncias
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influenciam, efectivamente, na cosntrução de normas jurídicas, por isso, é importante estudar
o Homem, que é seu criador e destinatário.
2.1. Essencialismo
Como sugere a própria designação, “essencialismo” provém de “essência”, que por sua vez, é
oriunda de “esse”, que significa “ser”, qualidade do ser.
Não é propriamente uma teoria, mas sim uma corrente, que é um conjunto de teorias que têm
alguns aspectos em comum.
O aspecto fundamental que une estas teorias que compõem o essencialismo é a crença de que
a todo o Homem corresponde uma essência imutável. Isto significa que podem existir várias
diferenciações acidentais em Homens de várias épocas, mas existe algo que não muda, que o
faz ser o que ele é.
Aristóteles defendeu que “o Homem é um animal racional”, pois todo o Homem, de todos os
tempos, sempre foi racional e o é pelo simples facto de ser humano.
Importa, neste âmbito, referir que o Homem pode ser racional mas não exercer a
racionalidade, como sucede com os dementes absolutos.
Portanto, a essência é tida como imutável, contrapondo-se ao acidente, que é mutável, pois
pode ser ou não ser (v.g.: tamanho ou cor de um objecto).
Tem duas vertentes, quais sejam: a de cariz religioso e a de cariz não religioso ou agnóstico,
que iremos ver de seguida.
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Quanto ao Direito, estas teorias tendem a considerar que o Direito ideal deve se conformar
com os mandamentos da divindade. Considera que a ordem jurídica é constituída por três
camadas:
Deste modo, a validade do Direito Positivo vem do facto dele se conformar com o Direito
Natural e este, por sua vez, como Direito Divino. O Direito Positivo é subalterno, pois a sua
validade está dependente da sua conformação com outras ordens. O que justifica esta
supremacia é justamente o facto de que elas não mudam, ao passo que o Direito Positivo pode
alterar a todo o momento.
Em suma, se a natureza humana e o seu destino foram projectados por um ente divino,, assim,
toda a sua construção deve respeitar os preceitos divinos, bem como as condicionantes de
origem divina.
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2.2. Existencialismo
Do latim "nihilo", nada, a inexistência. Esta vertente teve um grande influenciador, que foi
filósofo Frederich Nietzsche.
A sua tese fundamental vai no sentido de que ao Homem não corresponde qualquer essência
imutável e, tal como os outros seres, o Homem deve sobreviver do manejo das forças, por isso,
os fortes sobrevivem e os fracos sucumbem.
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Nietzsche reflectiu, igualmente, sobre a moralidade. Até à época em que viveu, toda a
construção da moral estava baseada na doutrina cristã, que tendia a sobrevalorizar os mais
fracos, ideal este do qual discordava. Nietzsche defendeu que o Homem devia valorizar-se não
pela sua fraqueza, mas pela sua força vital que fará desaparecer os fracos.
Então, sugeriu que se operasse uma transmutação de valores, com vista a destruir todos os
valores baseados na doutrina cristã e recomeçar a construir uma nova ordem moral, na qual
não figuram os fracos.
A nova ordem moral a sedimentar seria baseada em princípios aristocráticos (privilegiando as
elites), baseando-se exclusivamente na ideia da supremacia dos mais fortes sobre os mais
fracos.
Frederich Nietzsche dá uma explicação alegórica do que a Humanidade devia fazer na
construção da nova ordem moral, começando por seguir três estágios:
Estágio do camelo, que é muito obediente. A lógica do camelo é a de cumprir com todas as
ordens que lhe são dadas. Contudo, o camelo por vezes é abandonado no deserto e assim é
provável que ele ao enfrentar as dificuldades do deserto desenvolva e vá para o estágio
seguinte;
Estágio do leão, que rejeita absolutamente ou conflitua com a moralidade;
Estagio da criança, que não sabe o que é bom e o que é mau. Supera essa dicotomia. Uma vez
atingido este estágio, alcança-se a transmutação de valores.
Do Grego, "hedon", que significa prazer, felicidade. O hedonista é aquele que tem tendência a
seguir os prazeres da vida. Defende esta corrente que não se conhece a origem do Homem,
nem o seu destino, mas este também é desprovido de qualquer essência, assim como de
qualquer fé num ser transcendente.
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Apregoa o desenvolvimento de uma tendência para a realização humana em níveis de mera
superficialidade, que implique o perseguir-se o maior prazer e a menor dor.
O hedonismo possui uma visão positiva do Direito, no sentido de que para que haja uma
constância de prazeres é necessário que haja ordem. Por isso, a ordem é o motivo da
manutenção do prazer, pelo que, é tida como uma realidade positiva.
2.3. HUMANISMO
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2.3.2. Humanismo personalista
É o conjunto de teorias que defende que a realização individual é importante, mas a plena
realização do Homem significa a sua realização como um sujeito em relação. O indivíduo deve
considerar que a sua liberdade não pode colocar em causa a liberdade das outras pessoas. O
indivíduo passa a ser pessoa: um ser-em-relação.
Este pensamento filosófico reflecte-se nas legislações pós-segunda guerra mundial, que
consideram que os direitos subjectivos devem ser realizados atendendendo à integração social
do indivíduo, daí a existência de figuras como o abuso de direito, por exemplo.
A produção filosófica escrita africana tem o seu marco inicial com a publicação em 1945 da
versão francesa da obra do padre belga Placide Tempels;
A tese fundamental da obra é que o Bantu tem um comportamento racional, assente sobre um
sistema de pensamento coerente, concluindo, assim que o negro é completamente racional e
afastando-se de uma certa filosofia eurocêntrica para a qual o negro não era plenamente
racional;
Tempels critica o pré-logismo de Levy-Brhul (segundo o qual a África seria uma comunidade
pré-lógica) e defende a existência, nos povos africanos, de um conjunto de princípios e um
sistema lógico que revela uma filosofia completa sobre a vida e sobre o universo.
O valor supremo do bantu é a força vital.
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Entretanto, para ele, a ordem ontológica do Bantu é directa, colectiva e imediata pelo que ele
não pode apresentar a sua filosofia.
Tempels não acha que o Bantu seja capaz de compreender-se a si próprio ou de apresentar ele
próprio uma filosofia sistemática: “Não pretendemos dizer que o Bantu seja capaz de
apresentar um tratado de filosofia, exposto através de um vocabulário adequado. Só a nossa
formação intelectual nos pode permitir um desenvolvimento sistemático. Nós é que podemos
dizer-lhe de uma maneira exacta, qual é o conteúdo das suas concepções de ser, de tal maneira
que se possa reconhecer nas nossas palavras e possa concordar dizendo: Tu compreendeste-
me”.
Para Kagamé, se o bantu foi capaz de sistematizar uma língua, com estrutura coerente, então
também é capaz de apresentar coerentemente uma filosofia sistemática;
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O Muntuísmo, difere-se do Ubuntuísmo e do Bantuísmo que acentuam mais a dimensão
comunitária, colocando no centro o Muntu o qual não desaparece diante da comunidade (o
comunitarismo africano é muitas vezes um lugar comum contradito pela realidade) e nem
diante de Deus (lembrar que os africanos chegaram ao monoteísmo antes dos gregos e
romanos!)
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O PROBLEMA ONTOLÓGICO DO DIREITO
«Quid ius?»
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1. Generalidades
Ontologia é a junção de dois termos: “ontos”, que significa “ser”e “logia”, que significa
“discurso ou ciência”. A ontologia é, assim, o discurso sobre o ser e, por sua vez, a ontologia
jurídica, a ciência do ser do Direito.
A ontologia jurídica estuda o lugar do Direito na ciência do ser, o «quid ius?». O Direito é uma
realidade eminentemente humana; nesta senda, após a reflexão feita à volta da percepção
sobre a essência do Homem ao longo da história, cabe de seguida discutir a essência do Direito
em si.
2. Correntes
1. O Positivismo jurídico;
2. O Realismo jurídico;
3. A teoria egológica do Direito;
4. A teoria tridimensional do Direito.
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comunidade delega o poder de prosseguir o interesse geral, ao invés de cada um defender-se
por si só.
Nesta ideia está patente o princípio da soberania popular, no sentido de que o poder pertence
sempre ao povo, este apenas o delega ao Estado. Caso o Estado o exerça mal, ser-lhe-á
retirado o poder, pois o Estado não é essencial para a vida da comunidade, ele apenas existe
por razões de conveniência.
Já Hobbes é do entendimento de que a visão romântica da natureza humana é puramente
fictícia, pois o Homem é naturalmente mau, genuinamente violento e tem tendência para o
mal (homo homini lupus – o Homem é lobo do Homem). Assim, a única forma de colmatar esta
situação é fazer com que o Homem renuncie ao poder e o entregue a um terceiro, que é o
Estado. Esta é a justificação para o absolutismo.
Fazendo uma transposição da visão de Hobbes para o Direito, importa referir que:
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b) Jeremy Bentham (1748 – 1832)
Este autor é discípulo de Hobbes, razão pela qual adopta a maior parte do seu pensamento,
em especial no que concerne à visão formal e imperativista, à teoria coactiva do Direito, ao
primado da lei e à concepção legalista da justiça.
Bentham admite apenas a existência do Direito Positivo e rejeita o Direito Natural6. Para ele o
direito subjectivo é atribuído por lei, não há posições activas naturais, nem direitos que
advêm do simples facto de ser humano.
Fixa uma crítica ao sistema da Common Law pela inexistência de códigos e por julgar com base
no precedente. Desde modo, o autor advoga a codificação e sustenta a sua tese nos seguintes
aspectos:
O sistema judiciário gera incerteza e insegurança nos cidadãos, sobre o que está previsto e
quais são as consequências do seu incumprimento. Para os casos ainda nao decididos, o
cidadão não tem como prever o que vai acontecer se ele violar as normas, pois a margem de
previsibilidade implica entrar na mente do juiz;
Um juiz não tem competência técnica, nem preparação para criar Direito, mas apenas para
interpretá-lo. Quem deve criar normas é o legislador;
Cria-se uma impossibilidade, por parte do povo, de fiscalização das normas que vão sendo
criadas pelo judiciário. O Direito Codificado tem a vantagem das normas estarem claras, o que
facilita o processo de fiscalização;
O Direito Judiciário gera, muitas vezes, a retroactividade das normas. Refira-se que esta crítica
deve ser tomada de forma circunstancial e consiste na ideia de que um tribunal decide sobre
um caso, mais tarde, um tribunal superior cria um novo precedente sobre a mesma matéria, o
que possibilita a parte vencida reabir a discussão do caso, que já tinha sido encerrada, o que
acaba por ser um "cancro" que ataca a segurança jurídica.
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idem, pp. 146 - 152
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Garantia da subsistência das pessoas;
Criação de abundância – v.g., quando o povo reclama muito deve-se “dar-lhe pão e
espetáculos” (panen et circenses), promovendo banalidades, para que se esqueça rapidamente
dos desgostos;
Criação de igualdade no tratamento;
Segurança jurídica.
Por um lado considera uma ficção inútil e inadequada, já que pode não ter tido existência real;
Por outro lado, defende que qualquer convenção para que seja válida pressupõe uma lei
positiva anterior que lhe atribua eficácia.
A concepção voluntarista do Direito: coloca a vontade soberana como lei, sob pena de serem
infringidos males aos infractores;
Tentativa de sistematização conceptual do Direito, que é tido pelo autor como uma expressão
de desejo de um ser racional (o soberano), no sentido de que os outros seres racionais actuem
de certo modo, sob pena de aplicação de um certo mal, em caso de actuação diversa.
O seu maior contributo para o positivismo foi a tentativa de determinar os elementos lógico-
científicos do Direito e cinstruir um sistema racional e autónomo do Direito, prescindindo de
todo o conteúdo ético ou de qualquer pressuposto histórico ou sociológico.
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d) Hans Kelsen (1881 – 1973)
a) O princípio da pureza
Refira-se desde logo que a obra “Teoria Pura do Direito” de Hans Kelsen representa uma das
expressões mais notáveis do positivismo jurídico. Ela apresenta-se expressamente como Teoria
do Direito positivo, preocupada com a resposta sobre o que é e como é o Direito, com total
desinteresse por questões axiológicas, por considerar a Justiça como ideal irracional e
inacessível ao conhecimento humano.
É uma teoria pura porque, segundo entende Hans Kelsen, quer-se liberta de todos os
elementos estranhos à ciência jurídica como os de ordem axiológica, metafísica, sociológica
etc.
O principal objectivo da “Teoria Pura do Direito” de Hans Kelsen foi discutir os princípios e
método da teoria jurídica, em razão dos debates metodológicos que eclodiram no final do
século XIX. O Positivismo de diversas tendências, bem como a reacção dos teóricos da livre
interpretação do Direito, colocavam em crise a própria autonomia da Ciência Jurídica.
Hans Kelsen propõe-se então desenvolver o chamado princípio da pureza: o método e o
objecto da ciência jurídica devem ter como premissa básica o enfoque normativo, devendo o
Direito ser encarado pelo jurista exclusivamente como norma e nunca como facto ou valor
transcendente.
Hans Kelsen propõe-se assim apresentar uma teoria “pura” no sentido de que se propõe
garantir um conhecimento dirigido exclusivamente ao Direito, afastando desta cognição tudo o
que não pertença ao seu objecto.
Esta redução do objecto jurídico à norma causou muitas polémicas, sendo Kelsen acusado de
reducionista, de esquecer as dimensões valorativas e sociais, de fazer do fenómeno jurídico
uma mera forma normativa, despida de seu carácter humano.
Todavia, o objectivo de Hans Kelsen não era de negar os aspectos metafísicos dum fenómeno
complexo como o Direito e sim escolher estes aspectos, um que pudesse exclusivamente caber
ao cientista do direito.
Não podia a ética intervir na ciência do Direito por esta ser considerada autónoma. Pretende-
se assim expurgar da teoria do Direito a preocupação do que é justo ou injusto. A Justiça, no
entender de Kelsen, é tarefa da ética, a ciência que investiga as normas morais.
A norma constitui o princípio e o fim do sistema jurídico, o alfa e o ómega da ciência jurídica.
O Direito é então conceituado como um sistema de normas coactivas permeado por uma
lógica interna de validade que legitima, a partir de uma norma fundamental todas as outras
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que lhe integram. Neste sistema, portanto, cada norma busca a sua validade na norma que lhe
é imediatamente superior, numa escala ascendente que termina com a “norma
fundamental”,a pedra de toque que constitui o fundamento primeiro de validade de todas as
normas.
O conhecimento jurídico deve ter como único objecto o Direito positivo, tendo neste em foco
essencialmente a norma (esta entendida como uma criação de um acto de vontade).
c) O princípio da imputação
No entender de Hans Kelsen, o facto de não se poder falar de causalidade no Direito não
impossibilitava, per se, a instituição de uma ciência jurídica. Com efeito, segundo este jurista,
enquanto nas outras ciências temos como base o princípio da causalidade, como ligação
determinística entre o facto condicionante e a consequência condicionada, na ciência jurídica
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temos como base o princípio da imputação, representando uma ligação jurídica (e não uma
ligação necessária e determinística), uma ligação no plano da liberdade entre condição e
consequência. Dado um certo facto, o Direito vai, em princípio, imputar a esse mesmo facto
uma certa consequência.
No mundo normativo, o Direito distingue-se por ser composto por juízos hipotéticos – que
ligam um facto condicionante a uma consequência condicionada. A imputação apresenta-se
assim como o princípio base da ciência jurídica.
d) O normativismo
No entender de Hans Kelsen, o cientista do Direito deve encarar o Direito apenas sob o ponto
de vista da norma, justamente porque na essência, o Direito é norma. Só uma abordagem que
tenha como foco exclusivo o estudo da norma é que permitirá ao jurista criar uma verdadeira
ciência jurídica, caracterizada pelas notas da exactidão e objectividade. Preocupações com
valores como a justiça ou com a pretensa factualidade do Direito deveriam ser deixadas para
outros ramos do saber como a ética, a filosofia, a sociologia entre outros, sendo que ao jurista
deveria interessar o Direito na pureza do seu objecto: a norma.
Segundo Kelsen, o Direito é essencialmente composto por normas de coação – constitui um
aparelho de coação sem qualquer valor ético ou político. E é assim que o Direito deve ser
encarado pelo jurista: como um conjunto de proposições hipotéticas que suportam o aparelho
coactivo do Estado, indiferente a qualquer conteúdo de ordem ética ou política.
Esta tentativa de Kelsen de colocar a norma na qualidade de princípio e fim do Direito valeu à
sua doutrina a caracterização de normativismo jurídico.
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A validade das normas é apresentada por Kelsen na dinâmica da pirâmide normativa que leva
à “Norma Fundamental” que constitui a unidade da pluralidade de todas as normas que
compõem a ordem jurídica.
A validade de uma norma jurídica depende exclusivamente de ela ter nascido de certa
maneira, ter sido criada de harmonia com uma certa regra, definida pela norma fundamental
da ordem jurídica em que essa norma se integra.
A validade da norma depende de ela ter sido criada de harmonia formal com a norma que lhe
é imediatamente superior. Esse “caminhada” escalonada em termos de validade das normas
leva, obviamente, à norma primeira do estado, que é, normalmente a norma constitucional.
Indagando-se sobre o fundamento de validade desta norma constitucional e desejoso de
conferir total coerência ao seu sistema, Kelsen vai afirmar que a norma constitucional busca a
sua validade na Norma Fundamental (Grund Norm). Por sua vez, a norma fundamental é
apenas a regra básica ou primeira, de acordo com a qual devem ser criadas todas as normas de
uma determinada ordem jurídica
O autor começou por defender que esta norma fundamental seria uma norma pertencente a
uma “Constituição histórica” que teria algures existido em algum momento. Mas dadas as
dificuldades óbvias de tal entendimento e às frequentes críticas, Kelsen passou a defender que
a norma fundamental seria simplesmente uma norma pressuposta, não posta por qualquer
autoridade, já que nesse caso haveria que buscar a validade dela também.
Já no fim da sua carreira, Kelsen avança expressamente que a “norma fundamental” é uma
simples ficção cuja defesa se afigura necessária para a coerência do sistema.
f) O Positivismo
Já antes indicámos que, acima de tudo, Hans Kelsen é um verdadeiro positivista. Com efeito, o
próprio faz questão de notar expressamente que a sua teoria é uma teoria do Direito positivo,
ou seja, do Direito posto no âmbito do poder do Estado, o qual representa a manifestação da
vontade da colectividade política. Essa concepção voluntarista do Direito – própria dos
positivistas – leva Kelsen a rejeitar a existência do chamado Direito Natural por o considerar
uma realidade indemonstrável objectivamente. Se o objectivo era erigir uma ciência com
exactidão e objectividade, havia que fundá-la em bases que fossem acessíveis objectivamente
a qualquer mente humana, afastando todas as realidades que fossem inquinadas de certo
subjectivismo e consequente incerteza como seria o caso do Direito Natural. Note-se,
entretanto, que a instituição da norma fundamental – não posta por qualquer autoridade –
representou um desvio na linha positivista deste pensador; desvio esse cujo “remendo” Kelsen
lutou por conseguir até o fim de sua vida.
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Conforme anteriormente notado, Hans Kelsen contribuiu de modo decisivo para a teorização
da ciência jurídica, sendo que o seu pensamento não pode ser integralmente espelhado em
tão poucas palavras.
Muitas críticas foram feitas a Kelsen, havendo estudiosos que o apelidaram de grande
jusnaturalista, outros o acusando de positivista cego, outros de fundamentador de governos
tiranos etc. Por isso, nada melhor do que terminar o presente texto com uma afirmação do
próprio Kelsen, comentando sobre as críticas à sua Teoria. Dizia ele que muitos dizem que a
minha teoria é apenas a afirmação de uma determinada expressão política “mas qual das
afirmações é verdadeira? Os fascistas declaram-na liberalismo democrático, os democratas
liberais ou os sociais-democratas consideram-na um posto avançado do fascismo. Do lado
comunista é classificada como ideologia de um estatismo capitalista, do lado capitalista-
nacionalista é desqualificada, já como bolchevismo crasso, já como anarquismo velado. O seu
espírito frio é – asseguram muitos – aparentado com o da escolástica católica; ao passo que
outros crêem reconhecer nela as características distintivas de uma teoria protestante do
Estado e do Direito. E não falta também quem a pretenda estigmatizar com a marca de ateísta.
Em suma, não há qualquer orientação política de que a Teoria Pura do Direito não se tenha
ainda tornado suspeita. Mas isso precisamente demonstra, melhor do que ela própria o
poderia fazer, a sua pureza” (Hans Kelsen, Prefácio à 1.ª edição da obra Teoria Pura do Direito,
Maio de 1934)
As figuras mais notáveis desta corrente são Axel Hagerstrom (Suécia: 1868 - 1939), Vilheln
Lundstedt (Suécia: 1882 - 1955), Karl Olivercrona (Suécia: 1897 - 1980) e Alf Ross (Dinamarca:
1899 - 1979).
Há, desde logo, que indicar que o Realismo Jurídico apresenta-se como uma tentativa de
aplicar ao Direito as ideias básicas do realismo filosófico, daí a necessidade de previamente
abordarmos – ainda que de forma muito sucinta – esta corrente filosófica.
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A) O REALISMO FILOSOFICO
O vector chave do realismo filosófico é a rejeição absoluta da metafísica, sempre entendida
como uma mera combinação de palavras completamente vazias de conteúdo e cujo estatuto
epistemológico não pode, de modo algum, ser determinado.
i) O realismo filosófico e a gnoseologia
No entender do realismo filosófico, só o que é real (significa, no caso, dizer só o que faz parte
do mundo empírico, o que se apresenta no espaço e no tempo), é que pode ser objecto de
investigação científica e do conhecimento humano. Os objectos de que se ocupa a metafísica
(ex. Deus, alma etc.) não são dados no espaço e no tempo e, como tais, são inapreensíveis
pelos órgãos dos nossos sentidos. Por consequência, a metafísica nada pode acrescentar
conhecimento ao Homem, devendo, por isso, ser rejeitada.
ii) O realismo filosófico e a axiologia
No plano axiológico – plano dos valores – a tese fundamental do realismo filosófico é que os
juízos morais não indicam nenhuma qualidade intrínseca dos objetos ou actos a que se
referem. Os juízos morais têm apenas sentido na medida em que os objectos ou actos a que
eles se referem inspiram prazer ou dor no sujeito que emite o juízo. Portanto, o valor moral
atribuído aos actos ou objectos encontra-se sempre ligado ao sentimento que os mesmos
inspiram no sujeito que emite o juízo moral. E sendo que este sentimento sempre depende da
intimidade do sujeito, o juízo moral será sempre subjectivo. A consequência deste raciocínio é
que não é possível uma axiologia objectiva, ou seja, no entender do Realismo filosófico, é
impossível uma ciência da moral. Na verdade, os juízos morais não podem ser verdadeiros
nem falsos, porquanto não contém um juízo sobre o que é real. São, antes, mera expressão
das emoções do sujeito.
Significa dizer que as expressões de tipo “isto é bom/mau”, “aquilo é justo/injusto”, nada nos
dizem sobre a realidade. Não são juízos verdadeiros ou falsos, já que só expressam emoções
de quem os emite, baseadas no prazer ou na dor que os objectos ou actos em referência lhe
inspiram. Insiste-se: em sentido restrito, não há, para esta corrente, uma ciência da moral.
B) O REALISMO NO DIREITO – Realismo Jurídico
No âmbito jurídico e à semelhança do positivismo jurídico, o Realismo rejeita o Direito Natural,
por ser indemonstrável e não sujeito à observação da razão humana, o que o torna uma ideia
metafísica que carece de qualquer fundamento científico.
O realismo jurídico também rejeita a ideia do “direito subjectivo”, considerando esta uma
noção sem qualquer sustentabilidade porquanto não se refere a qualquer realidade empírica
que se dê no espaço e no tempo.
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No que em específico se refere ao conceito do Direito, o realismo – em oposição ao
positivismo – rejeita a ideia de que a essência deste se encontre na vontade individual ou
colectiva (o tal Direito posto pela vontade manifestada no Estado, como pretendia o
formalismo positivista): o Direito positivo, para o realismo, é apenas um conjunto de regras
destinadas aos órgãos do Estado e que asseguram determinadas vantagens para certos
indivíduos.
No entender do realismo, a realidade jurídica consiste simplesmente no facto da força aplicada
pelos funcionários e na base psicológica da obediência que, muitas vezes, torna desnecessário
o uso dessa mesma força, pelo que, em última instância, o Direito pode ser configurado como
”ameaça de uso da força”.
Em oposição ao normativismo, o Realismo não entende o Direito como uma realidade
essencialmente normativa. O Direito é apresentado por esta corrente como um “facto ou
fenómeno psíquico colectivo”. O Direito não possui em si qualquer força vinculante. A sua
vinculatividade é apenas uma ideia – de natureza mística, mesmo – não havendo nada no
mundo externo ou real que lhe corresponda.
As normas jurídicas são simplesmente regras sobre o uso da força. Elas são primariamente
dirigidas aos órgãos do Estado, disciplinado a actuação destas no uso da força. As normas
jurídicas não são “garantidas pela força”; elas são “sobre o uso da força”. O seu objecto
primeiro é justamente o uso dessa força.
Conclui-se assim que a) o realismo jurídico escandinavo é uma tentativa de aplicar no Direito
as teses do realismo filosófico e que b) esta corrente denota pontos de contacto e também
pontos de divergência com o positivismo jurídico.
Relembra-se sempre a necessidade de, individual ou colectivamente, os estudantes darem
uma “espreitadela” ao chamado realismo jurídico norte-americano de que não nos
ocuparemos no alinhamento das matérias do ano 2013.
Esta teoria doi desenvolvida na Argentina pelo jurista e filósofo Carlos Cossio e parte de uma
concepção culturalista, i.e., da visão do Direito como realidade cultural, procurando
surpreender e determinar o que nele há de específico. O seu pressuposto é de uma ontologia
pluralista, que distingue quatro realidades em camadas ônticas (ontos, ser, realidade), quais
sejam:
a) 1ª camada: objectos ideais – são aqueles sem existência física ou sensorial, alheios ao tempo
e axiologicamente neutros; o seu contacto é alcançado através da intelecção (uso a
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inteligência racional). Ex.: o número, que é um elemento que não caduca, não é susceptível de
ser apalpado e não é moralmente avaliável sob os critérios do bom e do mau;
b) 2ª camada: objectos naturais – são aqueles que possuem existência física, ou seja, são dados à
experiência sensorial, existem no tempo e no espaço, entretanto são axiologicamnente
neutros, sendo o seu conhecimento alcançado pela dedução empírica e nem pode ser valorado
moralmente. Ex.: célula, árvore.
c) 3ª camada: objectos metafísicos – são valiosos (moralmente avaliáveis), contudo, não são
dados à experiência sensorial e nem existem no tempo e no espaço. Ex.: liberdade.
d) 4ª camada: objectos culturais – são dados à experiência, existem no tempo e no espaço, são
valiosos e são cognoscíveis por via intuitiva, por meio da compreensão. São, por isso, a
extensão do Homem no mundo exterior. Ex.: Direito, música.
O autor entende que o Direito representa não só um objecto cultural, mas também um elo
entre vários elementos sob um parâmetro de valorações. O Direito pode ser definido, assim,
como a conduta humana em interferência intersubjectiva. Apresenta-se, desta forma, como
um objecto cultural de natureza egológica, representando aquilo que o Homem faz segundo
valorações.
Portanto, o Direito é tido não como a norma, mas apenas como a descrição da conduta. A
norma apenas se refere à conduta. O Direito não é a norma, porque esta refere-se apenas à
descrição da conduta. A realidade e a essência do Direito encontram-se precisamente na
conduta humana.
A teoria egológica, embora aceite de forma clara a lógica normativa da Teoria Pura do Direito,
acrescenta-lhe aquilo que considera a intuição específica do Direito, que é intuição de
liberdade e intuição axiológica.
Foi desenvolvida pelo professor brasileiro Miguel Reale, que é tido como um dos maiores
filósofos do Direito e um dos maiores juristas da Lusofonia.
Foi o único autor que, de modo sistematizado, conseguiu responder a Kelsen. A sua ideia
fundamental é que as correntes que o precederam eram monolíticas, pois sobrevalorizavam
apenas um e único aspecto da realidade jurídica: a norma. Outras limitavam-se à análise dos
factos, sobre os quais era exarada uma sentença e outras, ainda, restringiam o cômputo da sua
análise às condutas.
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Reale vem esclarecer que não é possível conhecer a realidade jurídica focando só num dos
seus aspectos. Há sempre factos previstos, daí a necessidade de existirem normas jurídicas,
integradas em previsões normativas.
Com efeito, toda a norma jurídica visa um fim, que é a justiça. Ademais, o Direito nunca é só
um facto. Ele possui, na verdade, três dimensões inseparáveis e indissociáveis: facto, norma e
valor.
As três são importantes e interdependentes. O Direito será tido, desta forma, como a
integração normativa de certos factos segundo certos valores. Para que haja Direito, é
necessário que se verifique a reunião e coexistência destes três elementos, que são orientados
segundo valores de liberdade e justiça.
Por isso, o Direito é uma realidade complexa, composta por esta tridimensionalidade.
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