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UM CRUZAMENTO

DE FRONTEIRAS
O discurso dos concelhos
da Guarda em Cortes
Iberografias | 4

UM CRUZAMENTO
DE FRONTEIRAS
O discurso dos concelhos
da Guarda em Cortes
Maria Helena da Cruz Coelho
Luís Miguel Malva de Jesus Rêpas
Abertura

Desde 2004 encontra-se inscrito na Linha de Investigação do Centro de Estu-


dos Ibéricos “Sociedades de Fronteira, Fronteiras da Sociedade: Tradição,
Modernidade, Identidades”, um projecto intitulado “Os concelhos do distrito
da Guarda nos Capítulos de Cortes (1385 a 1490)”, coordenado por Maria
Helena da Cruz Coelho, que contou, desde o início, com a participação do
investigador Luís Miguel Malva de Jesus Rêpas. Este projecto visava, num pri-
meiro momento, o levantamento e a recolha dos capítulos especiais de Cortes
solicitados pelos procuradores dos concelhos da região da Guarda, entre 1385
e 1490, para depois se poder proceder à sua leitura e transcrição integral.
Correndo os trabalhos a bom ritmo, os autores apresentaram uma primeira
abordagem desta temática no Ciclo de Conferências “Territórios e Culturas
Ibéricas”, promovido pelo Centro de Estudos Ibéricos, que decorreu na
Guarda, nos dias 2 e 3 de Dezembro de 2004. Surgiu, então, a hipótese de pas-
sar os resultados deste projecto a livro.
Desde esse momento preocuparam-se os autores com a fixação dos textos
para a sua edição, que agora se concretiza, com o alargamento cronológico do
projecto inicial a toda a Idade Média, com a elaboração de quadros sistemati-
zadores da informação dos capítulos especiais de Cortes e, finalmente, com a
redacção de um estudo introdutório que contextualiza e explora os documen-
tos que a seguir se apresentam.
Com a publicação desta obra, pretende-se um melhor conhecimento da
região e dos problemas das suas gentes em tempos medievais, que, muitas
vezes, só chegam até nós pelos agravos que os procuradores dos concelhos
apresentavam nas assembleias de Cortes. Trata-se de um conjunto significativo
de textos. Por eles perpassam, nesse cruzamento de fronteiras que é a exposi-
ção dos problemas locais nas altas instâncias da administração central e do
Parlamento, as preocupações dos habitantes desta região raiana com questões
demográficas, económicas, sociais, administrativas, judiciais e religiosas
comuns a outras cidades e vilas do reino ou com outras mais específicas, que
exigiam um firmar de laços de irmandade e coesão para serem ultrapassadas.
Neles se desenha o colorido das feiras, festas e romarias, bem como a azáfama

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das actividades laborais, os cuidados com a construção e reconstrução de pon-


tes para a circulação de pessoas e bens e de estruturas de defesa, como torres e
muralhas, para garantir a segurança da população. Neles se capta ainda o sen-
tido múltiplo da fronteira, a um tempo limite político, numa sinalética de
exclusão, e espaço de vizinhança e assimilação, que convidava à permuta de
trabalho e de bens ou mesmo à convivialidade festiva.
A variedade de temas apresentados nas Cortes poderá mesmo contribuir
Um cruzamento
para alargar o público interessado na obra, captando todos aqueles leitores de fronteiras:
que no ontem queiram enraizar o hoje para melhor prepararem o amanhã.
Assim esperamos que seja… o discurso dos
A divulgação deste trabalho deve-se sobremaneira à Câmara Municipal da
Guarda e ao Centro de Estudos Ibéricos. O comprometimento destas institui-
concelhos da
ções com o desenvolvimento e divulgação da ciência e da cultura tem já sóli- Guarda em Cortes
dos fundamentos e amplas provas dadas. Os autores muito se honram, assim,
de com elas colaborarem nesses mesmos objectivos. Mas igualmente querem
deixar um público agradecimento por todas as deferências com que foram dis-
tinguidos, relevando como a maior a edição desta obra na prestigiada colecção
do Centro de Estudos Ibéricos “Iberografias”.
Esperamos, pois, que ela sirva também os objectivos científicos e culturais
da Câmara Municipal da Guarda e do Centro de Estudos Ibéricos e que possa
motivar as mulheres e os homens que vivem neste espaço raiano à sua leitura
para mais profundamente conhecerem e comprometidamente se identificarem
com as densas memórias do seu passado multissecular.

Maria Helena da Cruz Coelho


Luís Miguel Malva de Jesus Rêpas

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Resgatando memórias escritas centenares, querem-se desenhar nesta obra
alguns traços do rico passado dos concelhos fronteiriços da região da Guarda.
Centrámo-nos nos capítulos especiais de Cortes dos séculos XIV e XV, docu-
mentação riquíssima, a suscitar múltiplas leituras1.
Mas tais memórias radicam já num longínquo processo histórico de povoa-
mento e estabilização dos homens, definido por marcos enquadradores.
Implantara-se um poder local, corporizado em comunidades concelhias que os
forais reconheceram, e que lentamente se permeabilizaram ao poder senhorial
de nobres que se adentraram por terras beirãs. Organizara-se uma rede ecle-
siástica, com as suas dioceses e igrejas, a par de ordens militares e casas monás-
ticas. Erguera-se uma linha de castelos que garantiam a defesa da fronteira
política, que moldara o espaço do reino em finais de Duzentos.
Na verdade, como é sabido, os concelhos, instituições legitimadas pelo
poder central desde os tempos dos condes D. Henrique e D. Teresa, foram con-
solidando, nos séculos XII e XIII, o seu protagonismo político e socio-econó-
mico. Assumindo-se como espaços de um poder local específico, assegurado
por autoridades próprias e suportado por direitos e deveres reconhecidos, tor-
nam-se peças-chave no movimento de avanço por terras de ocupação muçul-
mana e de redefinição de povoadores, que caracterizou essas centúrias de
Reconquista. Os monarcas neles se apoiavam para a guerra ofensiva e defen-
siva, fazendo apelo às milícias concelhias, compostas sobretudo por cavalei-
ros-vilãos, como igualmente recorriam aos seus vizinhos em geral para
colonizarem velhos e novos espaços, dinamizando a economia e organizando
o tecido social. No xadrez político, a par dos velhos senhorios de nobres ou da
Igreja, firmava-se o poder destes senhorios colectivos que eram os concelhos2.

1 Uma primeira abordagem desta temática foi já apresentada pelos autores. Trata-se do estudo “As petições dos
concelhos do distrito da Guarda em Cortes e a política transfronteiriça”, in Territórios e Culturas Ibéricas,
coord. de Rui Jacinto e Virgílio Bento, Porto, Campo das Letras, 2005, pp. 131-142.
2 Sobre a evolução concelhia leia-se Maria Helena da Cruz Coelho, “Concelhos”, in Portugal em Definição de

Fronteiras. Do Condado Portucalense à Crise do Século XIV, coord. de Maria Helena da Cruz Coelho e

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Os reis foram-se cada vez mais acercando deles e envolvendo-os nos seus pro-
gramas governativos, até como meio de contrabalançar o forte poderio dos privi-
legiados. E é assim que ao longo da centúria de Duzentos certos homens de
concelhos mais urbanizados vão começando a estar presentes nos órgãos consul-
tivos da realeza, em particular nas cúrias extraordinárias, que os monarcas iam
reunindo para auscultar as diversas forças sociais sobre os problemas mais
momentosos e cruciais do reino. Nas cúrias sempre os soberanos conheceram o
querer e a vontade da nobreza e da clerezia, os seus ancestrais aliados. Mas, à
medida que a vida urbana se redimensionava nas suas actividades mercantis e
artesanais, fortalecendo, com a circulação e transacção dos produtos, os réditos
da coroa, e a sua elite servia militarmente o exército real, os monarcas tiveram de
auscultar também os interesses desta gente trabalhadora. Ouvindo primeiro indi-
vidualmente um ou outro homem-bom em cúrias, os soberanos vêm por fim a
convocar alguns com representatividade, pois se apresentam como procuradores
dos concelhos a que pertencem. E assim as cúrias estão a transformar-se em Cor-
tes, o novo órgão consultivo da coroa, no qual têm assento as três forças sociais
do reino – clero, nobreza e povo. Os concelhos ganham o direito de aconselhar o
rei, o que para a nobreza e o clero integrava ancestralmente os seus deveres, no
consilium que, como vassalos, deviam prestar ao seu senhor, todos discutindo
com ele as mais essenciais opções políticas, desde a desvalorização da moeda à
ponderação da guerra ou da paz3.
Esta proximidade com o rei levou a que os povos aproveitassem maxima-
mente estas reuniões apresentando-lhe os seus agravos e pedidos. Podiam eles
englobar os interesses da maioria dos concelhos e saíam então de Cortes, pelo
menos desde 1331, capítulos gerais, entendendo-se por capítulo a petição for-
mulada e a correspondente resposta do monarca, ou cada concelho podia
expor apenas os seus problemas específicos em capítulos especiais. São estes
que verdadeiramente nos falam das realidades locais, dando-nos a conhecer as
suas dificuldades quotidianas ou mais extraordinárias4.
Assim, é através dos capítulos especiais dos concelhos da região da Guarda
que queremos evocar algumas memórias do longo passado histórico deste
Fig. 01 Representação de Cortes (séc. XV)
Primeira figuração conhecida de uma reunião de Cortes, finais do século XV.
Armando Luís de Carvalho Homem, vol. III de Nova História de Portugal, dir. de Joel Serrão e A. H. de Oli- BNL, Colecção Pombalina, 443, fl. 41v.º.
veira Marques, Lisboa, Editorial Presença, 1996, pp. 554-584; Maria Helena da Cruz Coelho e Joaquim
Romero Magalhães, O Poder concelhio das origens às Cortes Constituintes, Coimbra, CEFA, 1986, pp. 1-28.
3 Veja-se, entre a muita bibliografia sobre o tema, Marcelo Caetano, As Cortes de Leiria de 1254, 2ª ed. fac-simi-

lada, prefácio de Joaquim Veríssimo Serrão, Lisboa, Colibri, 2004.


4 Sobre as Cortes nos séculos XIV e XV seguiremos a obra, já clássica, de Armindo de Sousa, As Cortes Medie-

vais Portuguesas (1385-1490), 2 vols., Lisboa, INIC – Centro de História da Universidade do Porto, 1990.

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espaço, desde logo transcrevendo e publicando os seus capítulos especiais nas a Cortes. Como igualmente, na demarcação muito significativa da identificação
Cortes da época medieval e reflectindo um pouco sobre o seu conteúdo. geo-histórica das terras de Riba Côa, aí marcou presença a “irmandade de Riba
Como pano de fundo deste cenário institucional, ou como matriz do dis- Côa” que englobava as sete vilas acasteladas de Alfaiates, Sabugal, Vilar Maior,
curso, sempre teremos ecos da complexa problemática fronteiriça que atra- Castelo Bom, Almeida, Castelo Rodrigo e Castelo Melhor10. •
vessa diálogos e identifica geografias.
Desde logo a presença dos concelhos em Cortes envolve linhas definidoras,
estratégias de passagem e movimentos de assimilação ou exclusão.
Nas Cortes, o poder local concelhio enfrenta-se com o poder central, as
periferias decisórias ascendem à centralidade da autoridade e prática políticas.
Linhas verticais e hierarquizadoras de poder demarcam-se, mas em consentâ-
neo permeabilizam-se. Paralelamente, esse mesmo poder concelhio encontra-
se com o poder senhorial. Linhas horizontais de poder, que no geral se excluem
e raramente se assimilam, afrontam-se e acusam-se.
A ida dos procuradores às Cortes envolve também a passagem de um limes,
uma fronteira, uma barreira, a um tempo real, ideológico e simbólico.
Conhecida que era a decisão régia de reunir Cortes por uma carta convoca-
tória que chegava aos concelhos, decidiam estes, nas suas assembleias, quem
os devia representar. •
Mas, antes de mais, perguntemo-nos que concelhos da região da Guarda
terão recebido tais cartas, ou, formulando a questão de outro modo, averigue-
mos que concelhos gozavam do privilégio ou tiveram ensejo de estar presentes
em Cortes. Não dispomos de qualquer informação segura sobre a representati-
vidade dos concelhos em Cortes. Somente para as Cortes de Évora/Viana de
1481-82 conhecemos os concelhos com assento nos bancos do povo5. Assento
ordenado, em lugar e posição, que do primeiro para o último e da centralidade
para os lados marcavam as linhas hierarquizadoras do seu maior ou menor pres-
tígio. Figurava a Guarda logo no segundo banco, a par de outras cidades episco-
pais6. No oitavo sentava-se Trancoso7, no nono Pinhel8, enquanto no décimo
primeiro tomava lugar Castelo Rodrigo9. Estes concelhos teriam, sem dúvida,
uma participação mais assídua e permanente em Cortes. Mas outros aí estiveram Mapa 1 Mapa Concelhos
ao longo dos séculos XIV e XV, como Alfaiates, Almeida, Castelo Mendo, Concelhos representados em Cortes
Marialva e Sabugal, dos quais temos testemunhos de capítulos especiais levados
10Sobre o povoamento e enquadramento social deste espaço, leia-se A. Angel Barrios García, “El proceso de
ocupación y de ordenación del espacio en la raya leonesa”, in O Tratado de Alcanices e a importância histórica
5 Nestas Cortes tiveram assento oitenta terras, dispostas em 16 bancos, já que o décimo sétimo estava vazio. Cfr. das terras de Riba Côa, Actas do Congresso Histórico Luso-Espanhol, 12-17 de Setembro de 1997, Lisboa, Uni-
Armindo de Sousa, As Cortes Medievais Portuguesas…, vol. I, pp. 190-193. versidade Católica, 1998, pp. 155-183; e sobre os foros e concelhos ribacudanos vejam-se os estudos de José
6 Eram elas Braga, Lamego, Viseu e Silves. Artur Anes Duarte Nogueira, “Os municípios medievais em Riba Côa dos inícios do século XIII a 1297”, in O
7 Ao lado de Serpa, Mourão, Lagos e Olivença. Tratado de Alcanices…, pp. 197-209, e de José Ignacio de la Torre Rodríguez, “La sociedade de frontera de
8 A par de Abrantes, Arronches, Loulé e Avis. Ribacôa: fueros y modelos de poblamiento”, in As relações de fronteira no século de Alcanices. Actas das IV Jor-
9 Enfileirando com Penamacor, Marvão, Castelo de Vide e Sertã. nadas Luso-Espanholas de História Medieval, vol. I, Porto, 1998, pp. 783-799.

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Com a sua deslocação e estadia em Cortes tiveram pois estes concelhos plexa burocracia régia. Fronteira de cerimoniais, hierarquias e estratégias que a
fronteiriços e beirãos a oportunidade de conhecer diferentes espacialidades, de inépcia, o desconhecimento e o temor mais carregavam de barreiras a ultrapassar.
estabelecer vivos diálogos, interiorizando problemas e particularidades, e até
de dirimir tensões ou fomentar solidariedades horizontais inter-concelhias. 1. Como representantes dos concelhos em Cortes estavam os seus procurado-
Teriam tomado consciência das especificidades de valências ou dificuldades res11. Chegada a carta de convocação de Cortes ao concelho, a vereação escolhia
que as condições naturais, a posição geo-estratégica e as matrizes civilizacio- aquele ou aqueles que até elas deviam seguir. Nos séculos XIV e XV, a que se
nais e culturais das diversas comunidades implicavam. Sendo concelhos do reporta o nosso estudo, sabemos já que os concelhos eram governados por um
interior relacionaram-se com os do litoral, conhecendo as suas diferentes ape- restrito número de oficiais e homens bons que, reunidos numa câmara em verea-
tências económicas e abertura para o exterior. A realidade fronteiriça alar- ção, decidiam os destinos da vida concelhia. Essa elite dirigente, se bem que
gava-se nos seus horizontes mentais, pois que se a sua fronteira era terrestre a governasse em nome do bem comum, privilegiava sobretudo os interesses do
destes lugares era marítima e bem mais vasta, mas ambas se apresentavam per- grupo ou grupos sociais a que pertencia, os quais variavam de acordo com a voca-
meáveis a contraditórias ameaças ou ajudas vindas do exterior. ção económica do concelho, mas que nestes concelhos beirãos se corporizavam
Estando posicionados no centro do reino percepcionaram por certo, com essencialmente em interesses de proprietários, criadores de gado e agentes de um
maior realismo, a assimilação que acumulavam no seu seio de componentes comércio raiano12. Era, no geral, de entre esse conjunto de homens bons da gover-
senhoriais, tão presentes nas terras nortenhas, e de dinâmicas mais urbaniza- nança que eram escolhidos os procuradores dos concelhos. Logo, como vem
das e mercantis, herdadas da longa convivência com povos outros, como os sendo largamente repetido, as petições e os agravos que apresentavam iam de
muçulmanos, e que se manifestavam com grande evidência nos concelhos do encontro aos objectivos desse pequeno grupo de mandantes.
centro-sul do país. Curiosamente Trancoso, Pinhel e Castelo Rodrigo senta- Passando do geral ao particular, muito pouco poderemos apurar sobre os
ram-se lado a lado essencialmente com concelhos do Alentejo e do Algarve. procuradores dos concelhos da região da Guarda. No geral conhecemos
Muitos deles posicionavam-se do mesmo modo na extrema fronteiriça com o nomes e não profissões ou estatutos sociais. Mas chegaram-nos ainda algumas
reino vizinho de Castela, como Serpa, Mourão, Marvão, Olivença e Castelo de cartas de procurações em que os concelhos indigitavam e mandatavam os seus
Vide, logo partilhando essa ambiguidade de atracção e exclusão que tal linha procuradores. Assim a do concelho de Sortelha para as Cortes de Leiria de
política implicava. Como não deixariam de se aperceber e sentir o jogo de 1376, em que os povos deviam prestar preito e menagem a D. Beatriz, filha de
influências que os maiores concelhos podiam exercer sobre os mais pequenos, D. Fernando, nos seus esponsórios com D. Fradique, filho ilegítimo de D. Hen-
o que bem se manifestaria na selecção dos capítulos gerais a apresentar, e o rique II de Castela. A reunião concelhia teve lugar na igreja de Santa Maria,
peso político que o seu querer e vontade teria perante a coroa. participando nela, como oficiais, os dois juízes, três vereadores, o procurador
Uma outra demarcação, muito nítida e quase sempre assinalada pela oposi- do concelho e mais cinco homens bons cujos nomes se expressam, para além
ção, colheriam os concelhos da presença dos privilegiados em Cortes. Os inte- da procuração referir ainda “mujtos homeens boons da dicta villa”, numa fór-
resses do clero e da nobreza, que rogavam pela manutenção dos seus ancestrais mula estereotipada, que nada esclarece sobre o real vivido. Escolhidos foram
privilégios e liberdades, eram no geral contrários aos direitos dos concelhos e dois moradores da vila, sendo um deles o procurador do concelho13. •
aos princípios gerais de política régia em prol do bem comum, que os povos 11 Para a análise do perfil e poderes destes delegados, veja-se Armindo de Sousa, As Cortes Medievais Portuguesas…,

aconselhavam. Para além de que o seu amplo poder senhorial em jurisdições e vol. I, pp.188-241.
12 Sobre a caracterização social destas elites, leia-se Maria Helena da Cruz Coelho, “Les élites municipales”,
cobrança de rendas e direitos oprimia os vizinhos dos concelhos que, legal ou
Anais – Série História, 2, Lisboa, Universidade Autónoma de Lisboa, 1995, pp. 51-56; idem, “O Estado e as
ilegalmente, caíam sob a sua tutela Sociedades Urbanas”, in A génese do Estado Moderno no Portugal tardo-medieval (séculos XIII-XV). Ciclo de
Finalmente o poder concelhio tinha de alcançar os seus objectivos junto de um Conferências, Lisboa, Universidade Autónoma de Lisboa, 1999, pp. 269-292; e os artigos de Adelaide Costa,
Maria Isabel del Val Valdivieso e Luís Miguel Duarte, em Elites e redes clientelares na Idade Média, ed. de Filipe
outro patamar do poder, o do rei e da corte. Patamar superior, a requerer um
Themudo Barata, Lisboa, Colibri – CIDEHUS-UE, 2001, pp. 63-106.
movimento ascensional de etapas difíceis de cruzar, porque exigia postura con- 13 Cortes Portuguesas. Reinado de D. Fernando I (1367-1383), vol. I (1367-1380), edição preparada por A. H.

digna, discurso certeiro e convincente, conhecimento de órgãos e oficiais da com- de Oliveira Marques e Nuno José Pizarro Pinto Dias, Lisboa, INIC, 1990, pp. 163-164.

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Procuradores do concelho da Guarda (Cortes dos séculos XIV-XV) apuramos que Castelo Bom parece ter enviado um homem que na reunião onde
Ano Cortes Procuradores foi escolhido desempenhava o cargo de vereador por substituição, juntamente
1325 Évora ———————
com um ferreiro; Castelo Mendo designou um vereador; Castelo Rodrigo fez-se
1380 Torres Novas Vasco Peres e Gomes Peres
1383 Santarém Gonçalo Gonçalves [vereador] e Luís Peres [juiz] representar por um dos seus juízes; a Guarda mandou um dos seus vereadores e
1385 Coimbra «procuradores» um dos seus juízes; Pinhel escolheu também um juiz e um vereador e o Sabugal
1394 Coimbra «os procuradores» delegou num juiz e no procurador do concelho16.
1396 Santarém ———————
Para o século XV averiguamos que Pinhel e Guarda tiveram como mesmo
1436 Évora «os procuradores»
1438 Torres Novas ———————
procurador às Cortes de Coimbra/Évora de 1472-73 o escudeiro do rei,
[1439] Lisboa Lopo Dias e Luís Peres Duarte Gonçalves, que parece ter sido escolhido como procurador de toda a
1441 Torres Vedras Luís Peres e Diogo Lopes Portocarreiro comarca da Beira17. A Guarda fez-se ainda representar por um nobre da famí-
1442 Évora Gonçalo Eanes, almoxarife do rei na Guarda, e João Afonso da Vela lia Portocarreiro nas Cortes de Torres Vedras de 1441 e por um escudeiro,
1455 Lisboa Lopo Fernandes e Diogo Lopes
Lopo Fernandes, nas Cortes de Évora/Viana de 1481-82 e de Évora de 1490,
1459 Lisboa ———————
1460 Évora «o procurador» tendo designado para seus procuradores, nas Cortes de Évora de 1442, o
1465 Guarda João Afonso do Bispo e Diogo de Pinhel almoxarife régio da cidade e um escudeiro. Curiosamente somos ainda infor-
1468 Santarém João Afonso do Bispo e Diogo de Pinhel mados que, por vezes, estando os procuradores eleitos já em Cortes, outros se
1472-73 Coimbra/Évora Duarte Gonçalves
lhe podiam juntar com mais capítulos especiais, que o concelho julgaria de
1481-82 Évora/Viana Lopo Fernandes
1490 Évora Lopo Fernandes, escudeiro urgente resolução, como aconteceu com a Guarda nas Cortes de 1441, que
enviou, além dos dois delegados que já lá estavam, um terceiro, que era escu-
deiro do infante D. Pedro, ao tempo regente, justamente aquele que irá à reu-
nião do ano seguinte18. Na verdade, alguns concelhos saberiam rentabilizar a
O mesmo aconteceu quando o concelho da Guarda escolheu dois vizinhos experiência adquirida e os possíveis contactos estabelecidos com o oficialato
para, nas Cortes de Torres Novas de 1380, jurarem o novo acordo de casamento régio, enviando sucessivamente a várias Cortes os mesmos procuradores,
da herdeira do trono português, desta vez com D. Henrique, filho de D. João I como o fez Castelo Rodrigo e a Guarda19.
de Castela14. Mas D. Beatriz viria, por fim, a esposar-se com o próprio rei de
Castela, D. João, que entretanto ficara viúvo, aliança matrimonial jurada pelos aldeãos do termo, que era de Mata de Lobos, participando ainda na assembleia o alcaide da vila, o corregedor, qua-
povos nas Cortes de Santarém de 1383. Castelo Bom, Castelo Mendo, Castelo tro tabeliães, o alferes da vila e mais um homem, que testemunharam a procuração; na Guarda o pregoeiro cha-
Rodrigo, Guarda, Pinhel, Sabugal e Trancoso enviaram os seus procuradores – mou a concelho, que teve lugar atrás dos paços, e comparecerem dois juízes, quatro vereadores, o procurador, o
almoxarife, doze homens bons, além de testemunhar o acto o corregedor e o escrivão da correição; na assembleia
dois cada um –, como nos dão a saber as respectivas cartas de procuração15. de Pinhel, convocada para lugar que se desconhece, estiveram três juízes, três vereadores e seis homens bons; Sabu-
Quando nos é dado perceber a função ou actividade de algum desses homens, gal reuniu na igreja de Santa Maria do Castelo, estando presentes dois juízes, três vereadores, o procurador do con-
celho e cinco homens bons, entre eles um tabelião; Trancoso apregoou a reunião para o alpendre da igreja de S.
Pedro e nela estiveram dois juízes, dois vereadores, o procurador do concelho e talvez ainda o corregedor e seis vizi-
14 Ibidem, pp. 173-174. nhos, entre eles um escudeiro e tabeliães que testemunharam o acto.
15 Cortes Portuguesas. Reinado de D. Fernando I (1367-1383), vol. II (1383), edição preparada por A. H. de Oli- 16 Estas identificações são, em alguns casos, apenas presumíveis, pois ocorrendo nomes iguais, cujo cargo ou

veira Marques e João Paulo Salvado, Lisboa, JNICT, 1993, respectivamente, pp. 77-82, 89-94, 95-100, 143-148, profissão surgia na discriminação dos homens presentes na reunião concelhia, admitimos que os procuradores,
263-268, 294-299, 367-372. Castelo Bom reuniu-se no lugar de Pombal, a par da vila, e na reunião estiveram pre- no geral ditos apenas moradores das vilas, pudessem ser alguns deles. Para um confronto com a caracterização
sentes dois juízes, dois vereadores (um deles substituto), o procurador do concelho e pelo menos vinte e três homens social dos procuradores dos demais concelhos do reino veja-se Maria Helena da Cruz Coelho, “No palco e nos
bons, alguns de Vilar Formoso, S. Pedro (de Rio Seco), Naves e Freixeda, lugares do termo, especificando-se entre bastidores do poder local”, in O poder local em tempo de globalização. Uma história e um futuro, Coimbra,
eles um clérigo, um sapateiro e um ferreiro; Castelo Mendo fez anunciar a reunião pelo pregoeiro, a qual teve lugar Imprensa da Universidade – CEFA, 2005, pp. 49-57.
ante a porta da audiência, nela participando dois juízes, dois vereadores (um deles ferreiro), o procurador do con- 17 Cortes de Coimbra/Évora de 1472-73 – Guarda e Pinhel (docs. 24 e 33).

celho e seis homens bons, em que se inclui um alfaiate; Castelo Rodrigo reuniu concelho, depois de o apregoar, no 18 Cortes de Torres Vedras de 1441 – Guarda (5) (doc. 16).

cabido de Santa Maria, estando presentes dois juízes, dois vereadores, o procurador da vila, o procurador dos 19 Por Castelo Rodrigo esteve Gil Fernandes como procurador nas Cortes de Évora de 1444 e de Lisboa de 1459.

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São muito escassos estes elementos para tirarmos algumas conclusões e tal- Despesas elevadas que exigiam a quase todos os concelhos o lançamento de
vez nem as hipóteses sejam legítimas20. Pressente-se ainda assim a passagem de um imposto extraordinário, uma finta, para lhes fazer face. A essa taxa desti-
uma representação dos concelhos em Cortes por alguns dos seus oficiais con- nada a “mesejeiros que vem a corte”, a que muitos moradores se querem exi-
celhios no século XIV para a delegação em certos oficias régios com actuação mir, invocando privilégios ou protecção senhorial, se refere a Guarda em
local ao longo do século seguinte, o que nos remete para a assimilação cada 145521 e Castelo Rodrigo em 1481-8222. Na Guarda, em 1465, uma finta fora
vez mais sentida, no evoluir do tempo, entre os delegados do poder régio com lançada para subsidiar os procuradores às Cortes, no valor de 3 000 reais, a
incidência local e os mandantes concelhios. E seriam justamente tais oficiais qual, aliás, se veio a manifestar indevida, dado que as mesmas se reuniram na
régios que, na centúria de Quatrocentos, mais aptos estariam para fazer valer própria cidade, e aqueles “nunca sayram de suas casas nem leixaram de pro-
os interesses dos maiores dos concelhos, que não deviam andar longe dos seus, veer suas fazemdas23. Por sua vez os procuradores de Pinhel agravaram-se ao
nos meandros das Cortes e da corte, que de mais perto conheciam. monarca, em seu próprio nome, explicando que o concelho lhes dera apenas
Em consentâneo o processo de aristocratização da governança concelhia 500 reais a cada um, para irem às Cortes de Lisboa de 1459, na presunção de
estava em crescendo no século XV, dada a política régia de doações de muitas que em três dias estariam despachados, o que seria impossível em tão curto
terras e direitos nos centros urbanos à alta e média nobreza, que permeabili- prazo, devendo o concelho pagar-lhes a mesma quantia que Trancoso e outros
zava a sociedade e a liderança de tais lugares à miscegenação com os acosta- concelhos comarcãos entregaram aos seus procuradores, pois haviam traba-
dos e a clientela da fidalguia. E depois esses vassalos estariam em melhores lhado diligentemente e regressavam com as petições desembargadas, pedido
condições que os demais vizinhos para entrar no areópago das Cortes, cum- que o soberano atende24.
prindo cerimoniais, respeitando hierarquias, satisfazendo comportamentos, Mas os procuradores deviam também ser homens de trato, capazes de se
rompendo cadeias burocráticas, a fim de apresentar queixas e colher favores. integrar numa assembleia onde, pelo menos no acto de abertura, estaria o rei
A representação dos concelhos às Cortes, através dos seus procuradores, com os altos oficiais do desembargo e membros do clero e da nobreza. Não
tratava-se de um acto a sopesar sob múltiplas facetas. Escolhidos os represen- menos teriam de conhecer um pouco a política do reino, a nível geral e local,
tantes concelhios era necessário dotá-los de meios para a empresa. E os custos e de possuir capacidade de diálogo e persuasão para discutirem com os demais
eram elevados. Dois procuradores podiam significar uma comitiva de pelo concelhos os agravos gerais a apresentar ao monarca e, se necessário fosse,
menos seis pessoas, contando com dois criados por cada um, para cuidar dos defender as suas petições especiais junto do oficialato régio, já que o rei não
bens e dos animais. A todos era necessário acomodar e alimentar durante a devia estar em pessoa em tais sessões mais particulares.
viagem de ida e volta, a estadia na reunião, que por vezes chegava a durar mais Estes ónus e requisitos terão levado a muitas desistências. Certos concelhos
de um mês, e o tempo de espera pela escrita dos capítulos na chancelaria, para não se fizeram representar em algumas Cortes, sobretudo as reunidas em vilas
além de que os procuradores deviam apresentar-se, nessas instâncias do poder muito distantes da sua, porque não tinham rendas para enfrentar os custos da
régio, devidamente vestidos e calçados. sua delegação. Outros negavam-se porque achariam que não dispunham de
moradores à altura de ombrearem com os modos cortesãos e a oratória discur-
siva própria do parlamento, sabendo-se que, na verdade, alguns procuradores
O procurador do concelho da Guarda, Luís Peres, esteve nas Cortes de Lisboa de 1439 e depois nas de Torres
Vedras de 1441; por sua vez Diogo Lopes Portocarreiro representou o referido concelho nas Cortes de Torres menos adaptados ao ambiente da corte se exporiam a críticas.
Vedras de 1441 e nas de Lisboa de 1455; João Afonso da Vela juntou-se, como vimos, aos dois procuradores da
Guarda que já se encontravam nas Cortes de Torres Vedras de 1441 e depois esteve nas Cortes de Évora de 1442.
O par ‘João Afonso do Bispo e Diogo de Pinhel’ representou a Guarda nas Cortes da Guarda de 1465 e nas de 21 Cortes de Lisboa de 1455 – Guarda (4) (doc. 18). Aí se pedia que os besteiros do conto também participas-
Santarém de 1468. O escudeiro Lopo Fernandes foi procurador do mesmo concelho nas Cortes de Évora/Viana sem em tal finta, do que, segundo o rei, os seus privilégios os isentavam, ainda que devessem contribuir para as
de 1481-82 e nas de Évora de 1490. Por sua vez, o escudeiro do rei, Duarte Gonçalves, esteve nas Cortes de soldadas que anualmente se davam a dois carniceiros.
Coimbra/Évora de 1472-73 como representante da Guarda, de Pinhel e mesmo de toda a comarca da Beira. 22 Cortes de Évora/Viana de 1481-82 – Castelo Rodrigo (5) (doc. 9). Aqui eram os caseiros de quatro aldeias de
20 Para um confronto com os procuradores concelhios às Cortes de 1439, veja-se Maria Helena da Cruz Coe- senhorio eclesiástico que se queriam eximir de tal contribuição, o que não lhes é consentido.
lho, “Relações de domínio no Portugal concelhio de meados de Quatrocentos”, Revista Portuguesa de História, 23 Cortes da Guarda de 1465 – delegação paralela da Guarda (6) (doc. 21).

t. XXV, Coimbra, 1990, pp. 244-249. 24 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (11) (doc. 31).

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

Acresce que, a nível individual, a tarefa de ir às Cortes podia ser ambigua- Os concelhos da Guarda em Cortes (sécs. XIV-XV)
mente desejada ou repudiada. Alguns julgariam prestigiante a sua eleição, Ano Cortes Concelhos
1325 Évora Guarda
dando-lhes ensejo de pugnarem por decisões que também lhes interessariam e
1340 Santarém Castelo Rodrigo
de se aproximarem do oficialato régio e do centro do poder. Já outros, mergu- 1376 Leiria Sortelha
lhados nos seus negócios, pensariam ser uma perda de tempo essa diligência, 1380 Torres Novas Guarda
alegando uns quantos falta de saúde para desempenhar tal missão. 1383 Santarém Castelo Bom, Castelo Mendo, Castelo Rodrigo, Guarda, Pinhel,
Sabugal, Trancoso
Refira-se, por fim, que muito excepcionalmente, e à margem destas repre-
1385 Coimbra Celorico da Beira, Guarda, Marialva, Pinhel, Trancoso
sentações oficiais, certos concelhos conseguiram enviar a Cortes algumas dele- 1390-91 Évora Pinhel, Trancoso
gações paralelas, que falavam em nome dos que eram dominados pelas 1394 Coimbra Guarda
aristocracias da governança. Poderiam nunca ter participado nas sessões ofi- 1396 Santarém Guarda
ciais de abertura, mas lograram contactar com os oficiais do desembargo régio 1436 Évora Guarda, Trancoso
1438 Torres Novas Guarda
e obter mesmo provimento às suas queixas em nome do monarca, o que bem
1439 Lisboa Castelo Rodrigo, Guarda, Pinhel, Trancoso
demonstra estarem os soberanos conscientes das clivagens existentes por den- 1441 Torres Vedras Guarda
tro do poder local. No conjunto destes concelhos raianos, foram os lavradores 1442 Évora Guarda
e povo da Guarda que conseguiram ter “voz” na excepcional conjuntura da 1444 Évora Castelo Rodrigo, Irmandade de Riba Côa, Pinhel, Trancoso
1447 Évora Castelo Rodrigo, Pinhel
realização de Cortes na própria cidade, em 1465.
1455 Lisboa Guarda
1459 Lisboa Alfaiates, Almeida, Castelo Rodrigo, Guarda, Pinhel, Sabugal,
2. Sopesados todos estes condicionalismos, atentemos nos factos. Factos Trancoso
que, estejamos conscientes, podem estar muito aquém da realidade por falta de 1460 Évora Guarda, Pinhel
informações que até nós tenham chegado. Mas só com esses podemos lidar, 1465 Guarda Guarda
1468 Santarém Castelo Mendo, Castelo Rodrigo, Guarda, Marialva, Sabugal
não sendo susceptível qualquer outra aproximação à realidade. • 1472-73 Coimbra-Évora Guarda, Pinhel
1481-82 Évora-Viana Castelo Rodrigo, Guarda
1482 Santarém Pinhel
1490 Évora Guarda

Em 25 Cortes – 2 de Afonso IV, 3 do reinado de D. Fernando, 4 do de D. João


I, 1 do de D. Duarte, 12 do de Afonso V (sendo 5 durante a regência do Infante
D. Pedro) e 3 do de D. João II – temos conhecimento de terem estado represen-
tados, pelos seus procuradores, concelhos da região fronteiriça da Guarda. Ao
todo subiram até à instância parlamentar 12 concelhos. Mas com assinaláveis
diferenças quanto à sua frequência. Na verdade os mais significativos concelhos
tiveram uma presença muito mais assídua, com a Guarda à cabeça, que se fez
representar em 19 reuniões, seguida de Pinhel que marcou lugar em 10. Logo
depois, Castelo Rodrigo e Trancoso tomaram lugar, respectivamente, em 8 e 7 e,
já a uma larga distância, Sabugal em 3 e Castelo Mendo e Marialva em 2. Todos
os demais concelhos apenas por uma vez frequentaram as Cortes25.

25 São eles Alfaiates, Almeida, Castelo Bom, Celorico da Beira e Sortelha. Alguns traços deste concelho e do vizi-

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Participação dos concelhos da Guarda em Cortes


Concelho Cortes Com capítulos Sem capítulos
Alfaiates 1 1 (3 capítulos) —
Almeida 1 1 (5capítulos) —
Castelo Bom 1 — 1
Castelo Mendo 2 1 (2capítulos) 1
Castelo Rodrigo 8 6 (19 capítulos) 2
Celorico da Beira 1 — 1
Irmandade Côa 1 1 (4capítulos) —
Guarda 19 14 (64 capítulos) 5
Marialva 2 1 (1 capítulo) 1
Pinhel 10 7 (32 capítulos) 3
Sabugal 3 2 (7 capítulos) 1
Sortelha 1 — 1
Trancoso 7 3 (14 capítulos) 4
Total - 38 (151 capítulos) 20

Guarda
Pinhel
Castelo Rodrigo
Trancoso
Sabugal
Castelo Mendo
Marialva
Alfaiates
Mapa 2 Reuniões de Cortes
Almeida Reuniões de Cortes em que participaram
Castelo Bom os concelhos da Guarda.
Sem capítulos
Celorico da Beira Com capítulos
Sortelha
Tomemos como exemplo a Guarda26. Terá ido 7 vezes a Évora, 3 a Santa-
00 05 10 15 20
rém e 2 a Lisboa, o que lhe permitiria ter conhecido bem o triângulo de capi-
talidade da corte no século XV. Como não menos conheceria Coimbra, onde
Nessas deslocações as vilas da Beira Interior rumaram até à Beira Litoral, por três vezes se reuniram Cortes, a cidade que abria o interior à espacialidade
Estremadura e Alentejo, contactando com diversas cidades e vilas do reino, atlântica.
como Coimbra, Leiria, Torres Novas, Santarém, Torres Vedras, Lisboa, Évora
nho de Sabugal nos fornece o estudo de Humberto Baquero Moreno, “Dois concelhos medievais da Beira Inte-
e Viana do Alentejo. Conheceram centros urbanos de maiores dimensões e rior: Sabugal e Sortelha”, Revista de Guimarães, vol. 103, 1993, pp. 343-358.
diferentes vocações socio-económicas. E alguns destes teriam sido bem apreen- 26 Um estudo particularizado sobre a presença da cidade da Guarda em Cortes encontra-se em Maria Helena da

Cruz Coelho, “A Guarda em Cortes nos séculos XIV e XV”, Revista Portuguesa de História, t. XXXV, Coim-
didos se os procuradores dos concelhos reiteradamente a eles voltassem e neles
bra, 2001/2002, pp. 123-142. Para um mais amplo conhecimento deste centro urbano recorra-se à monografia
permanecessem todo o tempo da reunião de Cortes, que nunca era menor que de Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval. Posição, Morfologia e Sociedade (1200-1500), [Cadernos da Revista
uma semana, mas em média rondaria as três semanas ou mesmo um mês. • de História Económica e Social, 9-10,] Lisboa, Livraria Sá da Costa Editora, 1987.

22 23
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Nestas Cortes os concelhos raianos participaram em questões fulcrais da resolveram, embora o assentimento à arrecadação de pedidos para pagar ten-
política geral do reino. Em tempos de Afonso IV assentiram em legislação ças em atraso viesse a acontecer nas Cortes de Évora de 1460. Igualmente nas
vária, sobremaneira restritiva de luxos e excessos, e no governo fernandino Cortes de Santarém de 1468 estes concelhos terão aceitado um pedido com
ratificaram sucessivas alianças matrimoniais da herdeira do trono com preten- vista ao pagamento do que era devido à rainha viúva de Castela, D. Isabel,
dentes castelhanos. Nas Cortes de Coimbra de 1385, contribuíram para o filha do infante D. João, que se matrimoniara com D. João II de Castela. Com
invulgar acto da escolha de um rei, como depois nas de Lisboa de 1439 entre- uma excepcional motivação, o Africano convocou Cortes para Coimbra, em
garam a regência, em tempos de menoridade de Afonso V, em mãos do seu tio, Agosto de 1472, que foram suspensas, e só acabadas no ano seguinte, em
o infante D. Pedro, contrariando as determinações do falecido rei D. Duarte. Évora, entre Fevereiro e Março, manifestando a vontade de reformar e corri-
Nas de Évora de 1390-91 prestaram menagem ao infante D. Afonso, aquele gir o reino, sobretudo nas candentes matérias da justiça e da fazenda.
que devia ser o herdeiro de D. João I, mas que a morte arrebatou ainda Finalmente, já governando D. João II, os concelhos raianos, depois de o
criança, como nas Cortes de Évora/Viana de 1481-82, com todo o ritual e ceri- haverem jurado nas Cortes de Évora/Viana de 1481-82, como dissemos, con-
monialidade, juraram obediência ao novo rei, D. João II. Mas na maioria das sentiram em contribuir monetariamente para obviar ao pagamento das dívidas
Cortes foram confrontados com a momentosa questão da escassez de recursos do monarca anterior, logo em 1482, nas Cortes de Santarém, para, nas Cortes
do erário régio. Recursos que eram tanto mais necessários quando o espectro de Évora de 1490, estarem a aceitar a cobrança de 100 mil cruzados para hon-
da guerra surgia no horizonte ou quando a coroa tinha de enfrentar despesas rar as bodas de casamento do herdeiro do trono, D. Afonso – um outro malo-
extraordinárias. Para o conflito armado que em tempos de D. João I o reino grado infante que morreu inesperadamente de uma queda de um cavalo –, com
havia com Castela, os concelhos da região da Guarda, a par dos demais do D. Isabel, futura Isabel a Católica.
reino, decidiram auxiliar a coroa com sisas e pedidos nas Cortes de Coimbra Lado a lado com os demais concelhos do reino, os homens destas vilas fron-
de 1391, 1394 e nas de Santarém de 1396. Em tempos do sucessor D. Duarte teiriças conheceram muitas das principais linhas políticas dos monarcas rei-
terão participado na acesa discussão sobre a expedição a Tânger, havendo nantes e nelas se envolveram, acatando, mais livre ou pressionadamente, as
assentido na concessão de um pedido e meio para a subsidiar, nas Cortes de propostas da coroa. Mas, como dissemos, a reunião de Cortes dava ensejo a
Évora de 1436. Depois, em tempos da regência do infante D. Pedro, e sob a que os concelhos ponderassem os seus mais vitais e momentosos problemas, e
ameaça do perigo de guerra com Castela e Aragão, consentiram na cobrança os apresentassem em nome de todos em capítulos gerais27, o que aconteceu, em
de pedidos para esse fim nas Cortes de Torres Vedras de 1441 e nas de Évora número variável, em quase todas estas cortes, sendo de salientar que das de
de 1442, 1444 e 1447. Coimbra/Évora de 1472-73 saíram 203 e das de Évora/Viana de 1481-82 se
Com o mesmo fardo económico, mas sem temor bélico no horizonte, esses conhecem 17228. Mas, e é isso que verdadeiramente nos importa e o que
concelhos anuíram à imposição de pedidos para suportar o casamento de D. damos a conhecer neste trabalho, nove destes concelhos raianos, a que se
Isabel, filha do regente D. Pedro, com D. Afonso V, nas Cortes de Évora de acrescenta ainda a irmandade de Riba Côa, apresentaram em algumas cortes
1447, e o da irmã de D. Afonso V, D. Joana, com o rei de Castela, Henrique capítulos especiais, que davam corpo aos seus problema locais.
IV, nas Cortes de Lisboa de 1455. Depois esta D. Joana veio mesmo até junto
de seu irmão, encontrando-se com ele na Guarda, no ano de 1465, para rogar 3. A leitura e a reflexão sobre tais agravos e petições permitem que nos acer-
ajuda para o seu marido, que enfrentava a oposição dos grandes do reino, quemos do viver quotidiano nesses concelhos da raia. De facto tais queixas são
muito em particular do seu rival Afonso XII. Reuniu então Afonso V Cortes muito significativas em número e ricas em conteúdo. •
nessa cidade, as quais devem ter acordado na concessão de pedidos com esse
objectivo.
Ainda para obter fundos para o erário, bastante debilitado, sobretudo 27O resumo destes capítulos encontra-se na obra citada de Armindo de Sousa, vol. II, pp. 223-499.
depois da campanha marroquina da tomada de Alcácer Ceguer, foram convo- 28Não conhecemos capítulos gerais das Cortes fernandinas de Leiria/1376, Torres Novas/1380, Santarém/1383,
cadas Cortes para Lisboa no ano de 1459, que muito discutiram mas nada das de D. João I de Santarém/1396, das da regência de D. Pedro de Torres Vedras/1441 e Évora/1447 e das de

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Capítulos especiais dos concelhos da Guarda Natureza dos capítulos

Alfaiates 3 3
14 27
Almeida 5 Administrativa
Castelo Mendo 2 16 Económica
Castelo Rodrigo 19 Judicial
Irm. Riba Côa 4 Fiscal
Guarda 64 26 Social
19
Marialva 1
Jurídica
Pinhel 32
Militar
Sabugal 7
Religiosa
Trancoso 14 21
25

00 10 20 30 40 50 60 70
Deu-se, pois, expressão a uma heterogeneidade de problemas que densifica-
vam a vivência quotidiana destes concelhos fronteiriços. Problemas que, como
Frequentando as diversas Cortes, os concelhos da Guarda apresentaram, veremos, agora através das exposições e justificações dos pedidos, decorriam
em mais de uma vintena delas, o avultado número de 151 agravos. Como seria de actuações ilegais e opressivas daqueles que detinham outros poderes, que
de esperar, a cidade da Guarda ultrapassou largamente os demais concelhos, do centro para a periferia e do exterior para o interior convergiam sobre os
fazendo eco de mais de seis dezenas de queixas. Destacam-se depois Pinhel, homens e a vida destes centros raianos. Não sem que as inquietações pudessem
com um número superior a três dezenas de capítulos, e, já a uma grande dis- vir de dentro dos microcosmos políticos e sociais que eram em si mesmos os
tância, Castelo Rodrigo (19) e Trancoso (14). Os concelhos com maior capa- concelhos ou das pulsões, ora tensionais, de dominância e afrontamento, ora
cidade económica foram mais assíduos nas Cortes e, por isso, levaram perante aglutinantes, de comunidade e identidade, que atravessavam o relacionamento
o desembargo régio um conjunto mais avultado de problemas. inter-concelhio. •
A natureza dos capítulos, determinada pelos requerimentos, diz-nos que os
pedidos incidiram mais sobre questões económicas, administrativas, judiciais e Respostas aos Capítulos
fiscais29. Relevância tiveram ainda os aspectos sociais, jurisdicionais e milita-
7 4
res, sendo quase inexpressivos os assuntos de índole propriamente religiosa,
9 Deferimento
ainda que a clerezia como grupo tivesse sido alvo de críticas, mas tal insere-se
Def. Parcial
nas demais componentes temáticas, sobretudo nas de incidência social. • 9
Def. Condicional
65 Non Innovandum
10
Adiamento
Delegação
11
D. João II de Santarém/1482. Nas restantes foram apresentados 74 capítulos gerais nas de Coimbra/1395, 14 Evasiva
nas de Évora/1390-91, 34 nas de Coimbra/1394, 25 nas de Évora/1436, 52 nas de Lisboa/1439, 4 nas de Indeferimento
Évora/1442, 5 nas de Évora/1444, 28 nas de Lisboa/1455, 49 nas de Lisboa/1459, 8 nas de Évora/1460, 15 nas 13
Desconhecida
da Guarda/1465, 34 nas de Santarém/1468 e 47 nas de Évora/1490.
29 Veja-se o seu resumo no Quadro dos Capítulos Especiais de Cortes, no final da obra. 23

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Ao levarem até às Cortes esta panóplia de agravos, os concelhos, represen- Évora de 144430. E mesmo quando conhecemos os agravos específicos de cada
tados pela “voz” das elites ou dos dominados, esperavam sempre uma delibe- concelho pressentimos certas identidades que a comum posição geográfica
ração favorável do monarca. E ela veio, na esmagadora maioria dos casos, fronteiriça congregava, fosse por exclusão, como linha política que conduzia
ainda que por vezes o soberano pusesse condições ou só em parte deferisse os ao perigo das guerras e dificuldades de fixar gente em terras pobres e ameaça-
pedidos. Verdadeiramente só indeferiu sete agravos, mas usou algumas outras das, fosse por assimilação, no partilhar das mesmas possibilidades económicas
armas, que poderiam ter um sentido mais negativo ou positivo, de acordo com de ambos os lados, balizadas pela criação de gado e por alguma agricultura e
as circunstâncias. Não se definia quando dava uma resposta evasiva, o que pela comercialização dos bens produzidos, que a raia vivamente potenciali-
aconteceu em nove casos, e protelava as situações problemáticas, quando zava31.
adiava as resoluções, o que ocorreu dez vezes. Já quando delegava, na maior Por isso, enquanto em muitos concelhos do reino sentimos uma forte opo-
parte das vezes no corregedor, ou defendia que não se inovasse, poderia estar sição entre a sede do concelho e o seu termo, nestes concelhos, por vezes,
a ir de encontro aos pedidos, se os privilégios e usos e costumes concelhios esti- encontramos as elites das vilas a pugnar pelos interesses das suas aldeias, que
vessem a ser ultrapassados, ou a contrariá-los, se assim não fosse. Acresce que lhes eram imprescindíveis para a sua viabilidade, dado que uma comum rura-
nos casos de delegação remetia para outrem a deliberação em concreto, que na lidade, baseada no amanho de algumas terras e sobretudo na pastorícia, e sus-
verdade desconhecemos. tentadora de uma economia de trocas mais ou menos desenvolvida, a todos
No xadrez do jogo de poderes, os monarcas tinham dificuldade em decidir irmana.
de imediato, muito em particular se estivessem em causa enfrentamentos face Estas linhas de forças gerais não impedem, todavia, que se detectem ao
à nobreza e clerezia. Remetiam as contendas para o seu principal delegado, o longo do tempo algumas clivagens internas nos concelhos ou mesmo inter-con-
corregedor da comarca, revelando prudência e sensatez, uma vez que só este celhias. Clivagens que muitas vezes são mesmo fomentadas ou atiçadas por
nobre ou letrado poderia julgar de facto e com conhecimento de causa, agentes externos.
ouvindo as partes e inquirindo os factos. Mas, ainda que tal ocorresse, mais
uma vez não sabemos para que lado se inclinaria o prato da balanças da jus- 4. Na verdade apercebemo-nos facilmente que estes concelhos beirãos foram
tiça régia delegada. Talvez até, em alguns casos, não se tivesse chegado a qual- atingidos pela crescente senhorialização do reino32. A sua posição fronteiriça e o
quer decisão ou, havendo-a, poderia ter sido ou não cumprida.
30 Sobre a ocupação militar, humana e religiosa de Riba Côa, leiam-se Manuel Themudo Barata, “Importância
Na verdade, como iremos intuir, muitos agravos similares são equacionados
de Riba Côa para a consolidação e segurança de Portugal”, in O Tratado de Alcanices…, pp. 53-60; Pedro
repetidamente em sucessivas Cortes. E tal pode mesmo acontecer face a ante- Gomes Barbosa, “Organização defensiva na fronteira beirã oriental: ‘Extremadura’ e Riba Côa até ao século
riores deferimentos, pois que do decidido e escrito ao executado e cumprido XIII”, António M. Balcão Vicente, “A ‘Extremadura’ leonesa – o caso da fronteira de Riba-Côa nos séculos XII-
vai uma enorme distância. Distância que muitas vezes não se alcançava, de XIII”, Juan José Sánchez-Oro Rosa, “Iglesia y poder en Ribacôa y Ciudad Rodrigo. La construcción del espacio
político mirobrigense (1161-1211)”, in As Relações de fronteira no século de Alcanices…, vol. I, respectiva-
pouco valendo, em acto, o legislado. A aplicação da lei exige meios para a mente, pp. 199-212, 287-300, 313-322. Quanto ao sentido desta irmandade, consulte-se Humberto Baquero
impor. Logo, os diferentes contextos socio-políticos e a variável fidelidade e Moreno, “A irmandade de Ribacoa dos fins do século XIII”, in Os municípios portugueses nos séculos XIII a
operacionalidade dos agentes executivos ditariam os mecanismos de maior ou XVI. Estudos de História, Lisboa, Editorial Presença, 1986, pp. 27-32. E sobre os capítulos desta irmandade e
seus concelhos levados a Cortes, veja-se Maria Helena da Cruz Coelho, “Riba Côa em Cortes (séc. XV)”, in O
menor exequibilidade do mandado régio, para minimizar dominâncias e con- Tratado de Alcanices…, pp. 233-246.
denar prepotências, tendo em vista o equilíbrio e a viabilidade dos poderes 31 Uma referência ao processo histórico da fixação da fronteira colhe-se em Maria Helena da Cruz Coelho, “As

fronteiras da história, a história das fronteiras”, in Fronteira, Emigração, Memória. Exposição de Fotografias,
implantados.
coord. de Rui Jacinto e Virgílio Bento, Guarda, Centro de Estudos Ibéricos, 2004, pp. 8-13; e quanto à tessitura
Atentemos, agora, mais de perto, nas problemáticas apresentadas pelos de relações fronteiriças no contexto hispânico, leia-se Miguel-Angel Ladero Quesada, “Reconquista y definicio-
concelhos da Guarda nos seus capítulos especiais. nes de fronteira”, in As Relações de fronteira no século de Alcanices…, vol. I, pp. 655-691.
32 Processo já assinalado por Humberto Baquero Moreno no estudo “Abusos e violências na região da Beira
Genericamente, e antes de tudo o mais, diga-se que em alguns concelhos de
interior durante o reinado de D. Afonso V”, in Exilados, marginais e contestatários na sociedade portuguesa
fronteira existe uma grande coesão. Desde logo os sete castelos de Riba Côa medieval. Estudos de História, Lisboa, Editorial Presença, 1990, pp. 108-123 e reiterado por João Silva de
assumem-se como uma irmandade que se apresentou como tal nas cortes de Sousa em “Senhores laicos e senhorios na comarca da Beira no século XV. Nomeações régias”, in Os Reinos Ibé-

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

clima de guerra desde logo a fomentaram, já que os monarcas, para além dos ofi-
ciais que para elas nomeavam, como alcaides, fronteiros e adiantados, recom-
pensavam serviços e fidelidades de vassalos, entregando-lhes rendas e direitos ou
terras destes concelhos, muitas vezes amputadas dos seus termos33, que assim jul-
gariam até mais seguros e bem protegidos34. Os povos evocavam por vezes um
tempo de respeito pelos privilégios e liberdades municipais que decorrera até ao
reinado de D. João I, contrapondo-o ao subsequente da governança eduardina e
sobretudo de Afonso V, incluindo os anos da regência de D. Pedro, em que os
senhores se foram apropriando de terras, direitos e jurisdições. E a irmandade do
Côa em geral e alguns dos seus concelhos em particular acolhiam-se mesmo à
boa memória do rei que as tomara, D. Dinis, e lhes confirmara os seus foros para
reclamarem orgulhosamente uma perene soberania régia35.
Todavia alguns concelhos da raia vieram mesmo a ser doados pelos monar-
cas à alta nobreza. Não podendo os povos contrariar o senhor da graça, ape-
lavam, porém, ao senhor da justiça. •
Almeida foi dada ao conde de Vila Real36 e logo ele exorbitava. Erguiam-se
as queixas do concelho contra tal senhor, nas Cortes de Lisboa de 1459 37.
Colocava na vila oficiais por si nomeados – ouvidores, juízes e outros – em
detrimento dos escolhidos pelo concelho. Detentor dos direitos reais, apro-
priava-se também dos municipais, como os dos resíduos, fontes, pesqueiras,
montados e montes rotos e por romper. Não aceitava como coudel um homem
bom da vila, como era costume, e colocava um homem seu no cargo.
A fidalguia passou a atravessar-se na vida concelhia. Por si ou pelos seus ofi-
ciais, acostados e clientelagem. Intrometiam-se na administração municipal.
Procuravam isentar os caseiros das suas terras dos serviços e tributos conce-

ricos na Idade Média. Livro de Homenagem ao Professor Doutor Humberto Baquero Moreno, coord. de Luís
Adão da Fonseca, Luís Carlos Amaral e Maria Fernanda Ferreira Santos, vol. II, Porto, Livraria Civilização,
2003, pp. 631-641.
33 A este propósito veja-se a contenda entre a Guarda e a aldeia de Vela, retirada do seu termo e doada a Álvaro

de Sousa, que é estudada por Humberto Baquero Moreno em “Uma aldeia medieval no termo da Guarda: Vela”,
in Os municípios portugueses…, pp. 152-166. Fig. 02 Agravo de Almeida contra o conde de Vila Real
34 O movimento tem antecedentes longínquos, radicando na progressão da Reconquista. Basta lembrar que a Agravo de Almeida contra o conde de Vila Real. IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fl. 213v.º (pormenor).
Guarda, nas Cortes de Évora de 1325, já apresentara três capítulos queixando-se de que os nobres estavam a
entrar no concelho como possidentes, dando mesmo cobertura aos moradores de certas aldeias para se escusa-
rem dos serviços e encargos concelhios. Se num caso se alude a Afonso Sanches, o filho bastardo de D. Dinis, os
demais são genéricos, ainda que se aluda à potencialização destes maus usos por causa da fractura da nobreza lhios. Intentavam apropriar-se de terras e direitos concelhios. Procuravam
ao envolver-se no conflito entre D. Dinis e o infante D. Afonso, futuro rei D. Afonso IV (sobre este conflito leia- imiscuir-se nos seus circuitos comerciais.
se José Mattoso, “A guerra civil de 1319-1324”, in Estudos de História de Portugal, vol. I, Séculos X-XV.
A nobreza, visando aumentar os seus rendimentos à custa dos concelhos
Homenagem a A. H. de Oliveira Marques, Lisboa, Estampa, 1982, pp. 161-176).
35 Cortes de Évora de 1444 – Côa (1) (doc. 10); Cortes de Lisboa de 1459 – Castelo Rodrigo (1) (doc. 7). que dominava ou lhe eram vizinhos, cobiçava a terra alheia. Em particular os
36 Trata-se de D. Pedro de Meneses, terceiro conde e primeiro marquês de Vila Real.
maninhos concelhios que eram penhor de áreas de pastagem para a sua

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extensa criação de gado. Reclamavam-nos por isso frequentemente junto do Pinhel fora esbulhada das aldeias de Santa Eufémia e Ervilhão, que haviam
rei, contra o que se insurgiam na generalidade os concelhos, como faziam sido dadas a Gonçalo Vaz Coutinho por termo de Trancoso46. Nesta última
Almeida38 e Sabugal39. E este último concelho tinha razões muito concretas aldeia fizera ele uma coutada para criar éguas e vacas, impedindo os morado-
para se agravar. De facto, estando a aldeia da Lageosa em monte, por despo- res de Pinhel de aí apascentarem o gado. Mas, o que ainda era pior, o grande
voamento devido às guerras, e só uns quantos nela lavrassem pão, em que se número de animais que aí pastava danificava as terras de pão dos vizinhos, que
contavam até alguns castelhanos, logo era reclamada por Martim de Melo40, perdiam o cereal – de 1.000 que poderiam colher, só arrecadavam 200 – e gas-
que aí queria cobrar montado41. Ainda mais lesiva da sua integridade territo- tavam muitos dias de trabalho – 1.500 jeiras – a taparem as suas lavras. Ainda
rial seria a doação da aldeia de Quadrazais, com toda a jurisdição cível e que os números possam estar sobreavaliados, como convém ao discurso argu-
crime, com que D. Afonso V, depois da conquista de Alcácer Ceguer, agraciara mentativo do pedir, seria real esta opressão da intensa criação de gado senho-
Vasco Martins de Resende42, mas que o concelho consegue anular, alegando rial, prejudicando as lavouras concelhias.
que tal contrariava os seus privilégios de senhorio régio, os quais o soberano E não terminava aqui o rol dos males sofridos pelos vizinhos de Pinhel, já
já havia confirmado43. que o alcaide de Castelo Rodrigo, João Gouveia47, e Gonçalo Pereira48 isenta-
Também Castelo Rodrigo, “depos que a Deus aprouve de poer a paz”, arro- vam os caseiros de algumas aldeias do termo, das quais eram possidentes, dos
teara terras que estavam despovoadas e maninhas há mais de cinquenta e ses- encargos e tributos concelhios, embora estes aldeãos se acolhessem na vila em
senta anos por causa da guerra, mas temia-se de que alguns as pudessem tempo de guerra, logo, como bem dizia o concelho, “quem sente(ia) o proveito
reivindicar – no que só poderia estar a pensar na nobreza –, pedindo ao sobe- deve(ia) sentir o trabalho”49. •
rano que em tal não consentisse, ao que ele acedeu44.
As queixas desfiavam-se como um rosário contra Meneses, Melos, Coutinhos,
Távoras, Albergarias e muito outros e a malha da senhorialização alastrava e
estreitava as suas redes de domínio ao longo da centúria de Quatrocentos.
Trancoso deixara de ver atravessados os seus portos por homens e merca-
dorias, no que também se ressentia a cobrança da portagem régia, como bem
assinalavam, porque os impediam de cruzar as suas terras Vasco Fernandes
Coutinho e Álvaro Peres de Távora45.
Fig. 03 Argumentação de Pinhel
37 Cortes de Lisboa de 1459 – Almeida (1, 2 e 3) (doc. 2). Argumentação de Pinhel. IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 254v.º (pormenor).
38 Cortes de Lisboa de 1459 – Almeida (2) (doc. 2).

39 Cortes de Lisboa de 1459 – Sabugal (1) (doc. 35).

40 Martim Afonso de Melo, para além dos muitos cargos que teve, era senhor de Ferreira de Aves (veja-se a sua

biografia em Humberto Baquero Moreno, A Batalha de Alfarrobeira. Antecedentes e significado histórico, vol.
II, Coimbra, Biblioteca Geral da Universidade, 1980, pp. 857-859). e marechal do reino. Álvaro Peres de Távora era senhor de terras transmontanas como, entre outras, Moga-
41 Cortes de Lisboa de 1459 – Sabugal (2) (doc. 35). douro, Mirandela e Alfândega da Fé (para a biografia de ambos, veja-se Humberto Baquero Moreno, A Bata-
42 Vasco Martins de Resende é cavaleiro-fidalgo da casa de D. Duarte e depois está próximo e é muito benefi- lha de Alfarrobeira…, vol. II, respectivamente, pp. 792-794, 979-983).
ciado por D. Afonso V (veja-se a sua biografia em Humberto Baquero Moreno, A Batalha de Alfarrobeira…, 46 Cortes de Lisboa de 1439 – Pinhel (1 e 2) (doc. 28). Gonçalo Vaz Coutinho é filho de Vasco Fernandes Cou-

vol. II, pp. 931-933). tinho, segundo conde de Marialva (biografia em Humberto Baquero Moreno, A Batalha de Alfarrobeira…, vol.
43 Na realidade conhecemos esta queixa por um documento régio de 9 de Julho de 1459 (doc. 36), enquanto os II, pp. 784-788).
demais pedidos com as respostas régias estão exarados em documento de 2 de Julho (doc. 35). E do primeiro 47 João Gouveia foi alcaide de Castelo Rodrigo, coudel de Castelo Rodrigo e Almendra e teve a jurisdição cível

desses agravos, em que o monarca se compromete a respeitar os privilégios concelhios e a não dar nenhuma terra e crime de Castelo Melhor e Almendra (para ler a sua biografia recorra-se a Humberto Baquero Moreno, A
concelhia a ninguém, à semelhança do que fizeram os seus antecessores, parece ter resultado esta capacidade de Batalha de Alfarrobeira…, vol. II, pp. 825-827).
ter visto anulada a doação régia. 48 Trata-se de Gonçalo Pereira de Riba de Vizela das Armas, que possuía o couto do Lamegal, no termo de

44 Cortes de Lisboa de 1459 – Castelo Rodrigo (1) (doc. 7). Pinhel (veja-se Humberto Baquero Moreno, A Batalha de Alfarrobeira…, vol. II, p. 925).
45 Cortes de Évora de 1436 – Trancoso (1) (doc. 38). Vasco Fernandes Coutinho era primeiro conde de Marialva 49 Cortes de Lisboa de 1439 – Pinhel (3) (doc. 28).

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Queixas feitas, mas não males corrigidos. Pinhel continuava, em 1444, a homens se “ampararem” na religião, fazendo-se irmãos terceiros das Ordens, a
expor os agravos do conde de Marialva na aldeia de Ervilhão, onde criava de fim de não servirem nos encargos do concelho, o que o monarca não permitirá56.
80 a 100 éguas, sofrendo as aldeias em redor nas suas terras de pão, para além Em Pinhel sentia-se a pressão da própria clientelagem das casas dos infan-
de que se algum gado deles era achado no couto “arrançoavam-nos”50, como tes, citando-se, em particular, as de D. Pedro e de seu sobrinho D. Fernando57.
se fossem mouros, o que levava as referidas aldeias a estarem em ponto de se Em Castelo Rodrigo, o ouvidor da vila, “afeiçoado” com os criados do
despovoarem51. conde de Vila Real, quebrava as solidariedades vicinais, impedindo que todos
Mais latamente, toda a irmandade dos sete castelos de Riba Côa – Sabugal, cozessem pão num forno comum, que era boa fonte de rendimento para o con-
Alfaiates, Vilar Maior, Castelo Bom, Almeida, Castelo Rodrigo e Castelo celho, no montante de cinco a seis mil libras. Além disso, interferia na eleição
Melhor –, que vira respeitado o seu senhorio real desde D. Dinis a D. João I, dos jurados das doze aldeias do termo e exigia jeiras indevidas aos lavradores,
como afirmava, encontrava-se, em 1444, nas mãos do conde de Marialva, de nas searas que tinha espalhadas pelas aldeias58. Tensões havia entre a Guarda
D. Duarte de Meneses52 e de João Gouveia, alcaide de Castelo Rodrigo, que e Celorico, terra do infante D. Henrique, porque quando os homens de Linha-
nos seus concelhos exigiam portagens, interferiam nas eleições municipais, res rumavam à cidade, para a feira de S. João, o portageiro de Celorico exigia-
tomavam bens sem pagar e isentavam os seus homens de serviços e pagamen- lhes portagem e tomava-lhes os animais e cargas por descaminhados59. Como
tos concelhios. também o escrivão do porto de Almeida reclamava dinheiro das bestas e armas
E de pouco valeria insistir, como fez Pinhel nas Cortes de 1459 e de 1472- dos comerciantes da Guarda, que até então vendiam e compravam livremente
7353, de que a maioria desses concelhos eram de soberania régia, porque a mercadorias – sal, castanhas e nozes – por toda a comarca da Beira60.
senhorialização estava cada vez mais a avançar e não tinha retrocesso54. A interferência no regular comércio dos concelhos raianos, que nesta activi-
Acresce que esta opressão senhorial não se confinava apenas aos fidalgos, dade económica tinham um dos seus fortes pilares, por parte dos oficiais
detentores de terras e direitos, mas se estendia à sua vasta rede de clientelagem, senhoriais, era também sentida nas terras das Ordens61. De facto a clerezia
criadagem, oficialato e apaniguados, que muitas vezes era ainda mais abusa- emparceirava com a nobreza como força de bloqueio, uma vez que os irmana
dora, já que os abusos se constituíam em fontes de recurso. Eram estes vassa- a mesma condição de privilegiados e de poderosos senhores territoriais e juris-
los que, na verdade, desvirtuavam a vivência concelhia, intrometendo-se na dicionais.
sua vereação para melhor defenderem a política de domínio dos seus senhores A aldeia de Touro era termo da Guarda, mas porque pertença da Ordem de
e incentivando muitos dos vizinhos a acostarem-se à fidalguia para não servir Cristo, os seus moradores queriam isentar-se de todos os serviços e tributos
nas obras ou pagar nos tributos concelhios. concelhios62.
O quase “epidémico” vício de acostamento dos vizinhos, resultando daí que Também Castelo Rodrigo se queixava, nas Cortes de Évora/Viana de 1481-
muito poucos contribuíssem nas fintas concelhias, é denunciado pela Guarda em 82, que, havendo no seu termo três aldeias da comenda da Ordem de Cristo –
144155, para logo nas Cortes seguintes dar conta de um outro expediente, o de os
domo-mor de D. Duarte, Pero Lourenço Ferreira foi alcaide de Pinhel e Diogo Soares de Albergaria era grande
50 Arrançoar significa acusar com rancor. fidalgo da Beira e veio a ser alcaide da Guarda (cfr. Humberto Baquero Moreno, A Batalha de Alfarrobeira…,
51 Cortes de Évora de 1444 – Pinhel (1) (doc. 29). vol. II, pp. 966, 809-811, 687-689).
52 D. Duarte de Meneses era terceiro conde de Viana e alferes-mor do reino. Foi alcaide do castelo de Vilar 56 Cortes de Évora de 1442 – Guarda (3) (doc. 17). Uma mais desenvolvida especificação dos agravos da Guarda

Maior (leia-se a sua biografia em Humberto Baquero Moreno, A Batalha de Alfarrobeira…, vol. II, pp. 874- no parlamento encontra-se no estudo de Maria Helena da Cruz Coelho “A Guarda em Cortes no séculos XIV e
881). XV”, Revista Portuguesa de História, t. XXXV, Coimbra, 2001/2002, pp. 123-142.
53 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (5) (doc. 31); Cortes de Coimbra/Évora de 1472-73 – Pinhel (1) (doc. 33). 57 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (3) (doc. 31); Cortes de Évora de 1460 – Pinhel (2) (doc. 32).
54 Por isso as questões permaneciam nos finais do século XV, concretamente envolvendo a família Coutinho, 58 Cortes de Évora/Viana de 1481-82 – Castelo Rodrigo (1, 3 e 4) (doc. 9).

como dá conta Humberto Baquero Moreno em “Um conflito social em Pinhel e seu termo no século XV”, in 59 Cortes de Torres Vedras de 1441 – Guarda (5) (doc. 16). Sobre a feira da Guarda, leia-se Virgínia Rau, Feiras

Marginalidade e conflitos sociais em Portugal nos séculos XIV e XV. Estudos de História, Lisboa, Editorial Pre- medievais portuguesas. Subsídios para o seu estudo, Lisboa, Editorial Presença, 1982, pp. 71-73.
sença, 1985, pp. 172-211. 60 Cortes da Guarda de 1465 – Guarda (2) (doc. 20).

55 Cortes de Torres Vedras de 1441 – Guarda (1) (doc. 16). Aí se referem acostados de D. Duarte (de Meneses), 61 Cortes de Santarém de 1468 – Guarda (2) (doc. 22).

Diogo Lopes de Sousa, Pero Lourenço Ferreira e Diogo Soares de Albergaria. Diogo Lopes de Sousa foi mor- 62 Cortes de Coimbra de 1394 – Guarda (3) (doc. 12).

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Reigada, Fontanares e Cinco Vilas – e uma do mosteiro de Santa Maria de 5. Os abusos, as opressões e os constrangimentos não advinham apenas do
Aguiar – Torre dos Frades –, os seus moradores, se bem que se recolhessem na poder senhorial. Inerentes ao exercício de todo e qualquer poder, elas sentiam-
vila no tempo da guerra, não queriam suportar os encargos concelhios em ser- se também por parte do poder real. Que em acto se delegava e era executado
viços ou pagamentos, o que aliás o monarca não vai consentir63. • por meio dos oficiais régios. Este oficialato, na voz dos povos em geral e na dos
concelhos da raia em particular, mais do que cumprir os ordenamentos reais,
ultrapassava-os e exorbitava no seu mando. Os desmandos estendiam-se por
todas as esferas da autoridade soberana, da justiça à fiscalidade, do militar ao
administrativo.
Corregedores e juízes por el-rei adensavam a tramitação judicial, em si
mesma já bem demorada, complexa e onerosa. •

Fig. 04 Sé da Guarda
Sé da Guarda.

Na Guarda detectavam-se tensões permanentes com os seus prelados, que


pertenciam, como era normal ao tempo, a linhagens fidalgas. O bispo e
Fig. 05 Pelourinho do Sabugal
cabido, até acobertados pelos oficiais régios, metiam vinho de fora na cidade,
Pelourinho do Sabugal.
infringindo os seus privilégios foraleiros64. Além disso o prelado permanecia
longamente na urbe, com a sua vasta clientela, sem visitar o bispado65, o que
dava ensejo a danos e excessos, ou exigia ainda que os seus presos fossem Sabugal acusava o corregedor de não cumprir convenientemente as cláusu-
guardados nas prisões concelhias66. las do couto de homiziados que possuía, o que levava muitos desses homens a
preferir Castela67.
63 Cortes de Évora/Viana de 1481-82 – Castelo Rodrigo (5) (doc. 9).
64
Na Guarda o corregedor não respeitava as coutadas de erva regadia que os
Cortes de Lisboa de 1455 – Guarda (1) (doc. 18). Ao tempo seria bispo D. Luís da Guerra (1427-1458). Este
abuso continuava a cometer-se e a ser denunciado pela cidade nas Cortes de Évora/Viana de 1481-82 (9) (doc. vassalos e os cidadãos tinham para criar os seus cavalos e bestas68 e sobrecarre-
25), embora não se especifiquem os prevaricadores, ou associado ao comportamento dos estalajadeiros, auto-
res, aliás, de outras irregularidades que penalizavam o comércio dos vinhos, nas Cortes de Évora de 1490 – 67 Cortes de Lisboa de 1459 – Sabugal (3) (doc. 35). Sobre o couto de homiziados do Sabugal, veja-se Humberto

Guarda (1) (doc. 26). Baquero Moreno, “Elementos para o estudo dos coutos de homiziados instituídos pela coroa”, in Os municí-
65 Cortes da Guarda de 1465 – Guarda (4) (doc. 20). O bispo era D. Fr. João Manuel (1459-1476). pios portugueses…, pp. 101-104.
66 Cortes de Évora de 1490 – Guarda (2) (doc. 26). Era prelado, pela segunda vez, D. Álvaro de Chaves (1484-1496). 68 Cortes de Lisboa de 1455 – Guarda (3) (doc. 18).

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gava os homens com os custos dos escrivães e inquiridores que indigitava para a Guarda que, apenas por três audiências que viera fazer à vila, levara 3.000
circularem pela comarca nos processos judiciais69. E nas Cortes de reais, reclamando o concelho a sua devolução, alegando que o magistrado não
Coimbra/Évora de 1472-73 a “voz” do concelho só se ergueu para denunciar os merecera tal montante75.
múltiplos desmandos do corregedor Fernão Cabral – queria julgar os feitos da Era ainda na principal cidade deste espaço fronteiriço, a Guarda, que se sen-
almotaçaria; ouvia acções que competiam aos juízes; mandava tirar os presos da tia o peso das irregularidares dos oficiais militares.
cadeia e levá-los até onde se encontrava70. As acusações prolongaram-se ainda Nas Cortes de 1436 o concelho expunha que o coudel, que aliás era um
contra o seu ouvidor nas Cortes de 1481-82 – permanecia um ou dois anos na escudeiro e criado de um nobre, morava em Valhelhas e nesse lugar fazia os
cidade e substituía-se aos juízes nos pleitos; fazia da cadeia do concelho cadeia alardos, obrigando os homens a deslocarem-se umas boas léguas. E se não
da relação; exigia homens para a guarda dos presos e carros para o seu trans- obteve do monarca a ordem de residência na cidade, pelo menos foi-lhe conce-
porte, que, aliás, se concretizava nas mais degradantes condições humanas, para dido que o alardo aí se realizasse76. Do mesmo modo habitava fora o anadel e
além de reclamar indevidamente bens e serviços pessoais71. Face a todos estes aí treinava os homens, conseguindo o concelho que tivesse na cidade um ana-
atropelos, a cidade não hesitava em proclamar junto do poder régio, até com del pequeno para preparar os besteiros. Certo é que, em 1441, ainda nenhum
uma certa arrogância, a sua capacidade de justiça própria, equitativa e rápida, anadel viveria na Guarda77, continuando a sentir-se o peso das arbitrariedades
afirmando “nem presumaees de nossas comciemcias que sam tam maas que nam destes recrutadores militares nos agravos levados a várias Cortes posteriores78.
faremos e guardaremos direito aas partes”72. E, pintando a negro, numa lingua- Visado era também o supremo oficial militar do concelho, o alcaide do castelo,
gem quase fílmica, o arrastar dos processos judiciais por aqueles oficiais e a que cometia abusos judiciais e impunha serviços aos vizinhos79.
longa permanência dos homens na cadeia, exigia diligência nos julgamentos Mais pesadas seriam ainda as arbitrariedades fiscais. •
para “os tristes pressos pobres nom andarem apodrrecendo na dicta cadea como
em ella muitos morrem por se fazer III quatro cinquo messes que lhe la nom he
fecta h?a audiencia o que juizes (do concelho) he pello contrayro e lhes fazerem
ao menos trres vezes na somana audiencia”, reiterando, neste final, a maior efi-
ciência da justiça concelhia. Queria, pois, que o ouvidor “brevemente ouça
(ouvisse) e determine (determinasse) os fectos” para os presos não “andarem aly
comendo os pees e mãaos e despenderem ho que tem”73.
O poder dos corregedores parece ter-se fortalecido na segunda metade do
século XV, o que as ordenações régias favoreciam, e com ele, como sempre
acontece, também a exorbitância no seu exercício.
As queixas estendiam-se igualmente ao juiz por el-rei. Na Guarda, esse
magistrado mandava arrecadar todas as coimas dos danos do gado nas lavras
– vinhas, searas, soutos e pomares – para o concelho, não as distribuindo,
como era uso, às terças, pelos jurados que encontrava os animais, o dono da Fig. 06 Selo de Trancoso
Selo pendente de Trancoso. IAN/TT, ???????
terra e o concelho74. Já no Sabugal fora um juiz nomeado pelo monarca para

69 Cortes da Guarda de 1465 – Guarda (5) (doc. 20).


70 Cortes de Coimbra/Évora de 1472-73 – Guarda (1, 2 e 3) (doc. 24). 75 Cortes de Lisboa de 1459 – Sabugal (5) (doc. 35).
71 Cortes de Évora/Viana de 1481-82 – Guarda (1 a 6) (doc. 25). 76 Cortes de Évora de 1436 – Guarda (1 e 2) (doc. 14).
72 Cortes de Coimbra/Évora de 1472-73 – Guarda (1) (doc. 24). 77 Cortes de Torres Vedras de 1441 – Guarda (3) (doc. 16).

73 Cortes de Évora/Viana de 1481-82 – Guarda (5) (doc. 25). 78 Cortes de Santarém de 1468 – Guarda (1) (doc. 23); Cortes de Évora/Viana de 1481-82 – Guarda (10) (doc. 25).
74 Cortes de Coimbra de 1394 – Guarda (4) (doc. 12). 79 Cortes de Évora de 1442 – Guarda (2) (doc. 17); Cortes da Guarda de 1465 – Guarda (3) (doc. 20).

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Pinhel queixava-se de que os siseiros varejavam indevidamente os lavrado- vila87. Por sua vez a Guarda reclamou contra a presença de um juiz dos resí-
res, trazendo-os em revolta80, e de que o alcaide das sacas prendia os homens duos88 e um juiz dos órfãos e dos judeus89.
e os arrastava até à Guarda para aí serem ouvidos81. Por isso Trancoso, em Não menos o monarca estava propenso a dar cartas de tabelionado a alguns
1439, propunha ao monarca o arrendamento das sisas, mesmo pelo maior que lhas reclamavam, como expunha Pinhel90. Tal garantiria ao soberano a fide-
preço que até aí fora estipulado, acreditando por certo que desse modo o con- lidade dos detentores de um cargo, que conheciam de perto a vivência interna
celho ficaria menos sobrecarregado82. Se tal aconteceu não durou muito concelhia e podiam ser preciosos informadores e colaboradores da realeza.
tempo, porque em 1459 o concelho denunciava, com veemência, os abusos Também as ordenações reais sobre os agentes da escrita trouxeram novas
dos rendeiros das sisas que muito prejudicavam a sua feira, uma das mais con- preocupações, quando estes oficiais eram já em si mesmos elementos de gran-
corridas e afamadas da Beira, como bem sabemos83. des tensões. A sociedade medieval apresentava-se, genericamente, como ile-
Não raras vezes os oficiais régios conluiavam-se com as autoridades locais. trada. Mas a escrita invadia o dia-a-dia dos homens, da sua vida pública à
O que só conhecemos, como é óbvio, pela denúncia dos concelhos vizinhos. privada, e os peritos que sabiam escrever e davam fé pública aos actos, os tabe-
Castelo Rodrigo expunha que o almoxarife da Guarda tinha amigos em liães, tornaram-se imprescindíveis. E porque eram poucos e detentores de um
Pinhel e por isso mandava cobrar o pedido régio por um homem desse conce- poder raro, o da escrita, não raras vezes oprimiam os muitos que deles neces-
lho e não por um vizinho do lugar, havendo aí homens bons, honrados e de sitavam91.
fazenda que bem o poderiam executar84. Sendo as críticas formuladas pelas eli- Tudo se complicava ainda mais se havia interferências no comum quoti-
tes dirigentes rodriguenses, percebemos como essa actuação atentava contra a diano. Assim aconteceu em Castelo Rodrigo. Até então – como expunha o
sua dignidade e prestígio, ainda que esgrimissem com o bem comum do povo concelho nas Cortes de 1447 – os tabeliães da vila escreviam, todos em con-
para se defenderem, referindo que havendo dúvidas na cobrança, os vizinhos junto, as escrituras da vila e do termo. Dera-se, porém, a repartição entre tabe-
tinham de se deslocar a Pinhel, assim perdendo muitas jeiras que deviam ser liães do paço e escrivão dos órfãos e acontecia que este último nunca estava
investidas no amanho de seus bens. disponível – “he(ra) la omde o Deus ajuda”, como sugestivamente dizia o con-
Acresce que na fluidez da nomeação régia ou da escolha concelhia de certos celho –, e se requeriam o outro, ele negava-se, e daí nasciam as contendas92.
ofícios, sempre os monarcas se foram aproveitando para agraciar alguns dos Em Pinhel a distinção entre tabelião do paço e tabelião do banco fazia com que
seus homens e vassalos com tais provimentos, contra os quais em contínuo se ninguém encontrasse o primeiro no seu posto, recusando-se o segundo, por
insurgiam depois os concelhos. E assim um juiz das sesmarias foi colocado, temor, a escrever as suas escrituras, nunca ficando servidos os que delas care-
por nomeação régia, em Almeida85 e Pinhel86, em meados do século XV, cargo ciam93.
que até então nunca aí existira, a par ainda de um juiz dos órfãos nesta última
6. A voz que acusava a nobreza e o oficialato régio, que lhes atravessava o
mando e ensombrava a autoridade, foi a dos dirigentes concelhios. Mas por-
80 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (1) (doc. 31). que as opressões dos privilegiados e delegados do poder real seriam sem
81 Cortes de Coimbra/Évora de 1472-73 – Pinhel (3) (doc. 33).
82 Cortes de Lisboa de 1439 – Trancoso (4) (doc. 39). Este concelho sentiria muito o peso das arbitrariedades

fiscais, uma vez que, nas Cortes de Évora de 1444, pedira um capítulo geral – o qual acrescenta a lista dos capí- 87 Cortes de Évora de 1460 – Pinhel (1) (doc. 32).
tulos gerais apresentados por Armindo de Sousa para esta reunião – que pretendia evitar que os descendentes 88 Cortes de Lisboa de 1455 – Guarda (2) (doc. 18). Mas aqui o cargo fora dado pelo escrivão da puridade e
dos que morriam, ainda que nada herdassem, tivessem de pagar nos pedidos por esses antepassados (IAN/TT, membro do conselho real, Nuno Martins da Silveira.
Chancelaria de D. Afonso V, L.º 24, fl. 54v.º). 89 Cortes de Santarém de 1468 – Guarda (4) (doc. 22).
83 Cortes de Lisboa de 1459 – Trancoso (1 a 6) (doc. 41); cfr. sobre a feira de Trancoso Virgínia Rau, Feiras 90 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (4) (doc. 31).

medievais portuguesas…, pp. 85-90 e Humberto Baquero Moreno, “A feira de Trancoso nos séculos XIV e 91 Para uma caracterização social destes oficiais leia-se Maria Helena da Cruz Coelho, “Os tabeliães. Perfil pro-

XV”, Revista de Ciências Históricas – Universidade Portucalense, vol. III, Porto, 1988, pp. 217-221. fissional e socio-económico”, in Estudos de Diplomática, Lisboa, Edições Colibri – Faculdade de Letras de
84 Cortes de Évora de 1444 – Castelo Rodrigo (2) (doc. 5). Coimbra, 2001, pp. 93-137.
85 Cortes de Lisboa de 1459 – Almeida (5) (doc. 2). 92 Cortes de Évora de 1447 – Castelo Rodrigo (1) (doc. 6).
86 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (10) (doc. 31). 93 Cortes de Coimbra/Évora de 1472-73 – Pinhel (2) (doc. 33).

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dúvida, em parte, verdadeiras, ao denunciarem os seus desmandos estariam No seu todo, estes honoratiores eram orgulhosos do seu poder e da sua
também a servir o interesse geral dos vizinhos. Noutros casos, porém, como já posição social. Claramente o atestava Pinhel, quando pugnava em conjunto
vimos, sentiam-se conluios entre os oficiais concelhios e os régios ou entre pelos fidalgos, cavaleiros, escudeiros de linhagem e bem criados, vassalos e
aqueles e os acostados dos senhores na prossecução de objectivos comuns. cidadãos honrados, a quem o corregedor obrigava a irem “com todo o
Na verdade estas elites não hesitavam em lutar abertamente pelos seus inte- comum”, junto da forca e do pelourinho, ver a lição punitiva e o espectáculo
resses específicos – possuidores de boas fazendas, pediam mão-de-obra para as exemplar da execução da justiça, ou mesmo acompanhar os presos. Com alta-
suas lavouras, entre órfãos e mancebos94; criadores de gado pugnavam por ter- naria afirmavam, uma vez que “deferemciadamemte ham (haviam) de servir
ras de pastagens e pela isenção de montado, que a todos serviria, mas muito vossa senhoria nas guerras no que a elles pertemce(ia) em seus graaos razoada
em especial aos donos de um maior número de animais; detentores de exceden- cousa seria serem deferemciados dos menores”97. Como vemos, os cidadãos
tes de produção queriam transaccionar livremente as suas mercadorias, sem honrados dos concelhos assimilavam-se, como tantas vezes o atestámos, ao
peias de circulação nem ónus de portagens. estado da nobreza, em estatuto e função, e, no seu todo, constituíam os maio-
Elites que em número se queriam restritas para melhor se imporem e mais res, a elite social e dirigente que se opunha, com altivez, aos minores e ao povo
alto se guindarem – 12 homens bons na relação pretendia a Guarda e não 36, comum.
em nome do bom regimento e prol da terra95. Medida bem restritiva que, Logo esses “comuns”, quando conseguiam fazer ouvir as suas queixas junto
alguns anos decorridos, o concelho verificava que não servia o seu mando, do rei e dos seus oficiais, como aconteceu com os lavradores e povo da Guarda
impedindo o rejuvenescimento do grupo do poder96. nas Cortes que nessa cidade se realizaram em 1465, criticavam asperamente as
elites98. Acusavam-nas de cobrarem mais fintas do que as inicialmente estipu-
ladas, que em si mesmas já eram muito duras, para além de nunca se saber
como despendiam o dinheiro ou até se teriam sido arrecadadas injustamente.
Daí reclamarem um procurador, que requeresse os direitos do povo, devendo
estar presente quando se lançassem as fintas 99, para que, como afirmavam,
“por (sua) simpreza e pouco vallor” não lhes ser feita cousa indevida. Igual-
mente queriam ter permissão para trazerem algum vinho de for a, para bodas,
baptismos e despesas de suas casas, sem contradizer o privilégio de não se
poder meter vinho de fora na cidade para vender, também pugnando pela
liberdade de comerciarem o seu vinho quando o entendessem, sem serem a tal
constrangidos pelos cidadãos e oficiais da cidade. Sente-se aqui um confronto
entre a sede e o termo concelhio, um domínio dos cidadãos sobre os lavrado-
res do termo, recorrente dicotomia opressiva vivida no mundo concelhio.

7. As elites locais desenvolveram a um tempo uma política elitista e redu-


Fig. 07 Forca tora ou mais comunal e integradora. Serviram-se do poder a bem dos seus inte-
Vilar Maior e a sua forca, à direita.
Duarte de Armas, Livro das Fortalezas,
97 Cortes de Santarém de 1482 – Pinhel (1) (doc. 34).
fl. 67 – Século XVI.
98 Cortes da Guarda de 1465 – Guarda (1 a 6) (doc. 21).
99 Referem três fintas lançadas para o castelo, para a festa do Corpo de Deus e para o pagamento a três servi-
94 Cortes de Évora de 1436 – Guarda (3) (doc. 14); Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (1) (doc. 31). dores, no valor de 7.000 reais. Depois sabemos que lançaram uma finta para subsidiar os procuradores a enviar
95 Cortes de Santarém de 1468 – Guarda (3) (doc. 22). às Cortes, quando, na realidade, eles “nunca sairam de suas casas nem leixaram de prover as suas fazendas”,
96 Cortes de Évora/Viana de 1481-82 – Guarda (7) (doc. 25). como expõem, dado que as Cortes tiveram lugar na Guarda.

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resses e regalias e com ele serviram, correlativamente, os objectivos militares, Pinhel e Almeida desde há vinte anos101. Ainda sob a alegação de tal ponte
fiscais e controladores da coroa. Mas, em consentâneo, ergueram também a haver sido construída com muitos dispêndios, Pinhel queria isentar-se, em
voz para pugnar por maiores liberdades e privilégios concelhios, menos abusos 1459, da sua contribuição para o pedido régio, argumentando que “o lugar he
de poderosos e agentes do poder real, direitos de igualdade de vizinhança inter- (hera) tam pobre que os pobres escasamente se podem (podiam) manteer”102.
concelhios, obras de defesa e de interesse público, melhores condições de vida Não menos meritória seria a obra assistencial de um hospital que Pinhel,
em terras difíceis de fronteira. • por estar no estremo e ser “muy grande estrada por homde vãao muitos pro-
vees”, levantara, pedindo para lançar uma finta de 2 reais por pessoa para o
sustentar, não sendo dela ninguém escusado103.

Fig. 09 Hospital de Pinhel


Hospital de Pinhel. IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 36, fl. 172v.º (pormenor).

Fig. 08 Ponte
Ponte sobre o rio Côa, junto ao Sabugal. Duarte de Armas, Livro das Fortalezas, fl. 65 (pormenor) –
Igualmente havia que pugnar pelos bens comuns que eram os recursos natu-
Século XVI.
rais da floresta e dos rios, sustentadores dos proventos da caça e da pesca. Os
concelhos sempre requeriam que estas actividades fossem por todos partilha-
As obras públicas em prol do bem comum eram tema recorrente levado das, mas já tinham bem a noção de que os desregramentos e ambições desme-
pelos procuradores concelhios às Cortes. Pinhel afirmava que nas ribeiras do didas prejudicavam a natureza, repercutindo-se na qualidade de vida dos
Côa e de Pinhel havia pontes que, com a força das águas tinham ruído, o que homens. Assim, Pinhel acusava alguns homens que, “por mall fazer”, toma-
levava a que muitos homens morressem na sua travessia. Pedia então ao vam grande número de ovos de perdizes ou as matavam com todo o tipo de
monarca que ajudasse a reconstruí-las, dando-lhe os resíduos da vila e os de armas, reclamando penalizações para tais abusos, e denunciava outros que
Castelo Rodrigo, o que lhe foi concedido por seis anos. Em 1444 insistia na lançavam ervas venenosas nos pegos dos rios, para apanhar o peixe que, deste
construção da ponte, achando que também a Ordem do Pereiro devia concor- modo, vinha à tona, o que fazia com que o gado e os homens, que depois
rer para as obras100. Na realidade, uma “muy fremosa” ponte se erguera na bebiam dessa água, ficassem à beira da morte104.
ribeira do Côa, entre Castelo Rodrigo e Pinhel, mas tal obra ficara muito cara,
envolvendo custos no valor de 200 mil reais, e desta vez foi Castelo Rodrigo
101 Cortes de Évora de 1447 – Castelo Rodrigo (2) (doc. 6).
que requereu os resíduos, concedendo-lhe o monarca os da vila e ainda os de 102 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (7) (doc. 31).
103 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (6) (doc. 31).
100 Cortes de Évora de 1444 – Pinhel (2) (doc. 29). 104 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (8 e 9) (doc. 31).

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Bem atentos deviam estar os dirigentes, no mesmo zelo em prol do bem


comum, face à conflitualidade que se podia gerar no interior dos concelhos
entre os seus vizinhos. Candente era nestes concelhos, com forte presença
judaica, a convivência entre cristãos e judeus105. Castelo Rodrigo já em 1340
declarava que os judeus que moravam na vila causavam muito “nojo” (mal)
aos cristãos, tendo D. Afonso IV mandado escolher lugar apartado onde fos-
sem morar, sendo para tal obrigados106.
Mas ainda que houvesse judiarias, nem tudo estava resolvido. Na verdade,
a Guarda expunha que a serventia da judiaria se fazia pelo adro da igreja de S.
Vicente, o que dava azo a que os judeus fizessem aí muitas “sujidades” e, o que
seria mais grave, desrespeitassem o culto dos mortos, quando aí tinham lugar
funerais, e escarneciam o símbolo da cruz, tendo o monarca de imediato man-
dado fechar tal porta e substituí-la por outra, exigindo ainda que todas elas
cerrassem à noite107. Não sendo muitas as queixas contra este grupo socio-reli-
gioso, elas testemunham, porém, a sua presença neste espaço raiano que, algu-
mas vezes, envolveria confrontos e tumultos.
Com especial denodo tiveram os mandantes concelhios de enfrentar os pro-
blemas específicos da posição fronteiriça destes concelhos. Corporizando a
fronteira uma linha política de separação entre reinos, estavam as suas vilas e
aldeias sempre ameaçadas pelas lutas que entre eles se movessem108.
Na verdade a guerra é pano de fundo neste lugares fronteiriços. Na reali-
dade e no discurso. Por causa dela sofrem os homens destes concelhos beirãos,
que estão sempre na rota dos castelhanos. Logo depois, em tempos de paz,
esgrimem os malefícios das guerras, para obterem do rei as benfeitorias que
pretendem. •
Sem qualquer intuito de exaustividade, será de recordar que, em Dezembro
de 1372, Henrique II de Castela entra em Portugal por Almeida e Pinhel, entre Mapa 3 Guerra Portugal-Castela
Nas Invasões de 1384 e de 1385 os
Julho e Agosto de 1381 os castelhanos invadem Trás-os-Montes e na Beira cer-
Castelhanos entraram pela Beira.
cam e capturam Almeida, em Maio de 1385 ocorre a batalha de Trancoso, Mapa de A. H. de Oliveira Marques,
enquanto em Julho desse mesmo ano D. João I de Castela avança em direcção Nova História de Portugal, IV, p. 531.

105 Veja-se a este propósito o estudo de Maria José Ferro Tavares, “Judeus e cristãos-novos: o ante e pós bap-

tismo nas terras de Riba Côa e arredores”, in O Tratado de Alcanices…, pp. 271-284. E, mais latamente, con-
sulte-se a obra Guarda. História e Cultura Judaica, Guarda, Museu – Câmara Municipal da Guarda, 1999.
106 Cortes de Santarém de 1340 – Castelo Rodrigo (2) (doc. 4).

107 Cortes da Guarda de 1465 – Guarda (1) (doc. 20).

108 Mas mesmo esta linha política era assimilada de formas desiguais pelos concelhos fronteiriços, como o expõe

Rui Cunha Martins, no estudo “Fronteira e sociedade raiana: Riba Côa nos finais da Idade Média”, in O Tra-
tado de Alcanices…, pp. 259-267, e se ilustra pelos conflitos e outra documentação reunida por este mesmo
autor na obra Portugal en el Archivo Municipal de Ciudad Rodrigo, Ciudad Rodrigo, 1997.

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ao nosso reino por Almeida e prossegue através de Pinhel, Trancoso, Celorico Pinhel corrigira, de uma forma simples, um pano da muralha que caíra, mas
da Beira, Fornos e Mortágua até Coimbra. Também no regresso da campanha pairando no ar, em 1439, a ameaça de guerra, queria reforçar essa obra com
anglo-lusa por terras castelhanas os exércitos passam, em 1387, por Almeida uma torre111, enquanto a Guarda, pela mesma ocasião, envidava esforços, para
e Trancoso, bem como D. Dinis de Castro, aclamado rei de Portugal, corre, em reerguer a cerca da muralha, em grande parte derrubada112. Castelo Rodrigo,
1398, pelo Sabugal e Guarda, seguindo em direcção a Viseu e à Covilhã109. assumindo-se como “huum dos lugares fromteyros e h?ua das fortellezas de
Antes de mais, por causa da guerra e para a guerra deviam estar preparados toda esta comarqua do estremo de Castella e […] lugar homde portam muitos
os homens e as terras. Com fortificações em bom estado, o que exigia a cons- castellãaos e homeens estramgeyros”, desejava uma fortaleza bem provida
trução ou reparação de muros, muralhas e torres110, e armas capazes e não para segurança da terra, rogando ao monarca que as quebradas que nela exis-
velhas ou gastas. • tiam fossem reparadas, não com a má pedra e seixo que na terra havia, mas
com argamassa e cal, para ficar bem assente113.
Trancoso, por ser lugar de “moor frontaria”, pretendia, para refazer três que-
bradas da muralha e alçar as barreiras derrubadas, o concurso dos homens das
aldeias do termo, aqueles que em tempo de guerra também se acolhiam à vila e
nela se defendiam. E à frente dos trabalhos devia estar como vedor um homem
bom do concelho e não qualquer outro imposto pela nobreza, que só alongava
o tempo da sua feitura e pouco os vigiava114. Também Castelo Mendo pugnava
por reerguer as duas torres que estavam sobre a porta da vila115. •

Fig. 11 Castelo Mendo (conforme aqui se


apresenta)
Fig. 10 Fotografia de castelo de Pinhel ou Guarda ou Castelo Rodrigo ou Trancoso
Castelo Mendo. À esquerda as duas torres
sobre a porta da vila; à direita a degradação
109 A. H. de Oliveira Marques, Portugal na Crise dos séculos XIV e XV, vol. IV de Nova História de Portugal, da muralha.
dir. de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, Lisboa, Editorial Presença, 1987, pp. 515, 520, 530, 534, 536; Duarte de Armas, Livro das Fortalezas, fls.
Maria Helena da Cruz Coelho, D. João I, Lisboa, Círculo de Leitores, 2005, pp. 30, 75-76, 78, 102, 110. 69 e 70 (pormenores) – Século XVI.
110 Para uma maior conhecimento e contextualização destas construções militares veja-se, entre outros, António

Lopes Pires Nunes, “Os castelos medievais de Riba Côa”, in O Tratado de Alcanices…, pp. 247-258; Mário 111 Cortes de Lisboa de 1439 – Pinhel (6) (doc. 28).
Jorge Barroca, “D. Dinis e a arquitectura militar portuguesa”, in As relações de fronteira no século de Alcani- 112 Cortes de Lisboa de 1439 – Guarda (3) (doc. 15).
ces, vol. I, pp. 801-819; Rita Costa Gomes, Castelos da Raia, vol. I, Beira, 2.ª ed., Lisboa, IPPAR, 2001; João 113 Cortes de Évora de 1447 – Castelo Rodrigo (3) (doc. 6).

Gouveia Monteiro, Os castelos portugueses dos finais da Idade Média. Presença, perfil, conservação, vigilância 114 Cortes de Lisboa de 1439 – Trancoso (1, 2 e 3) (doc. 39).

e comando, Coimbra, Colibri – Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1999. 115 Cortes de Santarém de 1468 – Castelo Mendo (2) (doc. 3).

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A par de obras de defesa queria-se material bélico capaz. Armas novas – termo, Monforte, ficara ermo e Pinhel apropriara-se dele, não permitindo
bacinetes, solhas e arneses116 – requeria Pinhel em 1439117, por ser castelo fron- depois que aqueles aí apascentassem os seus gados123.
teiro que os monarcas sempre proviam, do mesmo modo que Castelo Rodrigo A diminuição dos homens, acarretando falta de braços para a lavoura e
se preocupava em renovar e reparar as trinta ou quarenta solhas velhas que na outros serviços, é uma referência constante na “voz” destes concelhos. Pinhel
terra existiam, já que podia vir o tempo de precisar delas, o que nos remete afirmava, em 1439, que devido a pestes e guerras descera de 1.500 ou 2.000
para o espectro da guerra sempre presente nesta linha fronteiriça118. homens para 700, havendo de contribuir para o exército real com 30 bestei-
Mas o rasto da guerra atingira mesmo as memórias concelhias. Almeida viu ros, o que dizia ser muito, mas o regente não diminuiu tal contingente, apenas
arderem-lhe os seus privilégios e foros no tempo da guerra. Regiam-se pelos de permitindo que alguns oficiais privilegiados se contassem naquele número124.
Castelo Bom e Castelo Rodrigo, mas queriam trasladá-los em carta, para recu- Já Marialva, expondo em 1468 que perdera três quartos das suas gentes, res-
perar, na perenidade da escrita, os seus ancestrais usos e costumes119. Como tringindo-se a 150 homens, viu o seu número de besteiros baixar de 21 para
tantas vezes aconteceu em contexto bélico, os inimigos sabiam que ao destruí- 12125. Sendo embora os números sempre de ler com reservas, porque enfatiza-
rem os documentos dos concelhos estavam a roubar-lhes a sua memória, invia- dos pelos discursos, certo é que os monarcas assentiram por vezes na descida
bilizando a capacidade de fundamentarem as suas liberdades e negando-lhes a do corpo de besteiros, confirmando o cenário de escassez de homens nestes
sua própria identidade120. É a guerra a manifestar-se no redimensionamento povoados do estremo.
dos seus malefícios físicos, mas também psicológicos. Sem esquecer que, para combater a interioridade e dinamizar a atracção de
Na verdade os efeitos da guerra foram sentidos, em toda a sua amplidão, gentes para estas periferias fronteiriças, D. Fernando concedera o privilégio de
nas terras e nos homens destes concelhos raianos. couto de homiziados a Sabugal (antes de 1369) e à Guarda (em 1371), acres-
Castelo Rodrigo claramente afirmava nas Cortes de Lisboa de 1459: “esta centando-lhe D. João I Castelo Mendo (1387)126. Aliás, a Guarda afirmava,
terra he em este estremo por bem das guerras e trabalhos se despoborou e as em 1460, que, sendo “tam fria e de ma servidam”, só não estava perdida e des-
terras que sempre foram aproveitadas se meterom a montes”121. Da mesma povoada por ser sede de bispado, cabeça de almoxarifado e couto de homizia-
destruição pela guerra, concretamente em tempo de D. João I, havendo as ter- dos127.
ras ficado abandonadas e a população da vila e termo caído de 500 para 200 A ameaça do despovoamento é, pois, uma arma frequentemente esgrimida
homens, se lamentava Pinhel. E todas estas realidades se tornaram argumentos por estes concelhos, muito em particular contra o abuso dos privilegiados na
do seu discurso, a par dos trabalhos sofridos por estarem na fronteira, para apropriação das terras maninhas, que vedavam aos homens a pastagem dos
reclamar contra um juiz das sesmarias que lhe tinha sido imposto, demovendo- seus gados ou o arroteamento de terras para pão128.
se o monarca a seu favor122.
Mais. A guerra fomentou mesmo as divisões inter-concelhias. Por causa 8. Face a todo o tipo de interferências externas, os concelhos raianos busca-
dela, como expunham os vizinhos de Castelo Rodrigo, um dos lugares do seu vam, com persistência, as suas linhas de coesão. Intentando mesmo ultrapas-
sar dominâncias, que sempre os maiores e mais fortes concelhos, muitas vezes
116 Bacinetes são protecções para a cabeça, solhas ou couraças para o tronco, e arneses são o conjunto das várias apoiados pelos seus senhores, exerciam sobre os mais pequenos, e fazendo pre-
peças metálicas para proteger todo o corpo. Para uma definição mais detalhada destas armas, consulte-se João
Gouveia Monteiro, A guerra em Portugal nos finais da Idade Média, Lisboa, Editorial Notícias, 1998, glossário valecer as “vicinidades” locais.
de armas, pp. 531-547.
117 Cortes de Lisboa de 1439 – Pinhel (9) (doc. 28). 123 Cortes de Évora de 1444 – Castelo Rodrigo (1) (doc. 5).
118 Cortes de Évora de 1447 – Castelo Rodrigo (2) (doc. 6). 124 Cortes de Lisboa de 1439 – Pinhel (8) (doc. 28).
119 Cortes de Lisboa de 1459 – Almeida (3) (doc. 2). 125 Cortes de Santarém de 1468 – Marialva (1) (doc. 27).

120 Nas guerras, os castelhanos haviam roubado as arcas, os selos e os documentos aos concelhos de Penama- 126 A conexão dos coutos de homiziados e seus privilégios com o povoamento em localidades de fronteira é estu-

cor, Monsanto e Alter do Chão, que disso deram fé nas Cortes de Lisboa de 1439 (veja-se Maria Helena da Cruz dado por Margarida Garcez Ventura, “Os coutos de homiziados nas fronteiras com direito de asilo”, in As rela-
Coelho, “Relações de domínio…”, p. 266). ções de fronteira no século de Alcanices…, vol. I, pp. 601-625.
121 Cortes de Lisboa de 1459 – Castelo Rodrigo (1) (doc. 7). 127 Cortes de Évora de 1460 – Guarda (1) (doc. 19). Por isso mesmo pedia que o contador vivesse na cidade.
122 Cortes de Lisboa de 1459 – Pinhel (10) (doc. 31). 128 Cortes de Lisboa de 1459 – Alfaiates (2) (doc. 1).

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Insistiam, empenhadamente, em possuir idênticos privilégios, já que todas E os procuradores de Castelo Rodrigo argumentavam nesta pugna com
as vilas eram comarcãs, como referiam, e estavam no “estremo que parte com todas as armas para o conseguir. Afirmavam que “a milhor cousa que temos
Castela”. Dois objectivos eram particularmente visados – a criação de gado e (tinham) pera repairo de nossas (suas) vidas he (hera) a criaçom de guado e
a circulação de pessoas e mercadorias – bem ilustrativos das potencialidades bestas que em ella trazemos (traziam) e criamos (criavam)”, acrescentando que
económicas regionais. os termos das outras vilas eram “muy grandes e o nosso (seu) muy pequeno e
Queriam livremente poder apascentar os gados entre concelhos vizinhos, mais no malham e estremo que os seus”, para, finalmente, no intuito de mover
lutando para que nenhum concelho ficasse favorecido em relação ao outro, o monarca ao deferimento, que conseguiram, alegarem que “esta villa nos
mas todos se igualassem “porque a justiça deve ser igall”129. tempos passados servio bem e fiellmemte a coroa reall de vossos regnos e he
Trancoso assim o pedia genericamente em relação a todos os concelhos vizi- h?ua chave das primcipaaes desta comarca”.
nhos130. Por sua vez, exigiam bilateralidade de logradouro dos termos conce- Mais alto clamavam pela comum liberdade de não pagarem portagem na
lhios Castelo Mendo em relação a Castelo Bom131, Sabugal face a Almeida e circulação de pessoas e mercadorias entre os concelhos beirãos, ou, avançando
Castelo Bom132, Castelo Rodrigo frente a Pinhel e Trancoso133. • ainda mais, que em conjunto estivessem igualados na isenção de a pagar em
todo o reino. Logo, se os concelhos ao redor – Sabugal, Sortelha, Guarda,
Vilar Maior, Castelo Bom – tinham este privilégio de isenção de portagem em
todo o reino, também o queria Alfaiates134.
Para a obtenção destes magnos privilégios, as elites dirigentes da sede do
concelho chegavam mesmo a pugnar pelos interesses dos moradores do termo,
como aconteceu com a Guarda, rogando, em 1394, que todos por igual fruís-
sem da isenção de montado e portagem em todo o reino135, o que não obteve
então quanto à portagem, mas apenas em 1396, quando reiterou o pedido136.
Alguns anos passados e os rendeiros régios só respeitavam a isenção da porta-
gem aos vizinhos da cidade, obrigando os do termo a pagá-la. Uma vez mais
os governantes citadinos saíram a favor dos aldeãos, apresentando uma vasta
argumentação – desde logo os muitos privilégios outorgados pelos reis para
“poborar esta cidade e ho lugar honde he situada”; depois a sua dedicação à
coroa, nos “stremados serviços que desta cidade forom fectos a el rey e ao
regno”; e por fim avocavam a sustentabilidade filosófica da causa, estribados
na teoria política do corpo místico do reino, aplicada à sociedade local,
Fig. 12 Castelo Bom
Castelo Bom. Evidencia-se a vizi- expondo “que a cidade he (hera) corpo cujos nenbros som (eram) aldeas”,
nhança com Almeida e Castelo sendo que corpo e membros deviam ser uma só unidade137. No entanto, nem
Rodrigo, ao fundo. mesmo a identificação da cidade com o termo impediria a rapacidade da
Duarte de Armas, Livro das
Fortalezas, fl. 71 – Século XVI.
134 Cortes de Lisboa de 1459 – Alfaiates (1) (doc. 1).
135 Cortes de Coimbra de 1394 – Guarda (1) (doc. 12). Ficamos então a saber que o monarca havia concedido
129 Cortes de Évora/Viana de 1481-82 – Guarda (8) (doc. 25). estes privilégios à cidade nas Cortes de Coimbra de 1385, mas depois, nas Cortes de Viseu de 1391, restringira
130 Cortes de Lisboa de 1439 – Trancoso (1) (doc. 40). a isenção da portagem aos vizinhos da cidade, o mesmo acontecendo nestas.
131 Cortes de Santarém de 1468 – Castelo Mendo (1) (doc. 3). 136 Cortes de Santarém de 1396 – Guarda (1) (doc. 13).

132 Cortes de Santarém de 1468 – Sabugal (1) (doc. 37). 137 Cortes de Lisboa de 1439 – Guarda (5) (doc. 15). Na resposta o monarca remete para o cumprimento do cos-
133 Cortes de Santarém de 1468 – Castelo Rodrigo (1) (doc. 8). tume antigo.

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nobreza ou de outros que se queriam indevidamente aproveitar da portagem e E muito naturalmente as gentes raianas peregrinariam em comum pelas
montado de todos os vizinhos da Guarda, como expuseram os seus procura- romarias da região, como a de Santa Maria de Açores, no concelho de Celo-
dores noutras reuniões parlamentares138. rico143. Os dirigentes da Guarda, afirmando que por essa ocasião estavam pre-
A fronteira era, também ela, elemento inclusivo, de permeabilização, bilate- sentes alguns estrangeiros, pretendiam que o concelho desfilasse, com todo o
ralidade, vizinhança e convivialidade entre Portugal e Castela139. aparato, encabeçado pelo alferes hasteando a bandeira, devendo todos os
Sabugal desejava pois que os castelhanos pudessem lavrar pão numa aldeia moradores da cidade e termo acompanhá-lo desde a saída até ao regresso144.
sua perto da raia, que estava despovoada, e que lhes fosse lícito levá-lo para As gentes de aquém e de além permutavam trabalho e mercadorias e con-
suas casas, no que o soberano consentiu, na base de uma mútua igualdade de gregavam-se em festejos de comemoração e celebração do humano e do
condições de vizinhança entre as gentes de ambos os reinos140. divino145.
Alfaiates, por sua vez, pretendia vizinhar com a vila fronteiriça de S. Marti-
nho de Trebelho141. Numa solidariedade fraternal, como expunha, prestavam- Enfim, como expusemos no título, ao estudarmos os capítulos especiais dos
se “huuns com os outros como parentes e comprades e amigos”, querendo por concelhos da Guarda em Cortes, cruzámos fronteiras.
isso poder vender-lhes alguma vaca ou porco por ocasião de bodas e reuniões Galgaram-se barreiras espaciais, desde logo na movimentação dos procura-
confraternais, como também o fazia o Sabugal, o que lhe é outorgado no pres- dores raianos da Beira até espacialidades do litoral, de norte a sul, ou terras
suposto da mútua cooperação de “como usarem com elles usassem elles”142. • alentejanas, pondo em contacto poderes periféricos com centros de capitali-
dade ou de forte poder político. Ultrapassaram-se esferas de competências
locais para se ascender ao contacto com órgãos e oficiais da superior autori-
dade real.
E nesse cenário particular de Cortes, reunião de um centrípeto poder régio,
de uma cabeça, com os múltiplos poderes locais, os seus membros, sempre se
viveram experiências de limites. Lindaram nobreza e clero com o povo, enfren-
tando-se e afrontando-se. Atingiram os concelhos os mais altos patamares hie-
rárquicos e criticaram o oficialato régio ou requereram justiça e graça ao
soberano.
Nesse palco de encenação e diálogo, a fronteira foi expressão de uma reali-
dade vivida e um topos da retórica persuasiva. Fronteira, plena de significân-
cia de um limes, de margens móveis e dinâmicas, convidando às solidariedades
e intercâmbios, interpenetrando-se com uma linha outra, ideal, estática e
impermeável, criada pelo poder político, que impunha a alteridade e disjun-
Fig. 13 Altar com dois Santos de pau ção.
«Neste altar estam dous Santinhos velhos de paao», junto à entrada
oeste do Sabugal.
Duarte de Armas, Livro das Fortalezas, fl. 65 (pormenor) – Século XVI. 143 Esta romaria seria afamada na região já que também a ela – e a Santa Maria da Ribeira – acorriam os vizi-
nhos de Trancoso (IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 211-211v.º). E sobre estes movimentos peregrinantes
138 Cortes de Évora de 1442 – Guarda (1) (doc. 17); Cortes de Évora/Viana de 1481-82 – Guarda (8) (doc. 25). a nível de todo o reino, leia-se Mário Martins, Peregrinações e Livros de Milagres na nossa Idade Média, sep.
139 Sobre a assimilação das gentes para além da linha política da fronteira, veja-se Miguel-Angel Ladero Que- Revista Portuguesa de História, t. V, Coimbra, 1954.
sada, “Reconquista y definiciones de frontera”, pp. 660-662. 144 Cortes de Lisboa de 1439 – Guarda (2) (doc. 15).
140 Cortes de Lisboa de 1459 – Sabugal (4) (doc. 35). 145 Assim era também noutros espaços fronteiriços do reino, como se pode ver em Maria Helena da Cruz Coe-

141 Trata-se de S. Martín de Trevejo. lho, “As relações fronteiriças galaico-minhotas à luz das Cortes do Século XV”, Revista da Faculdade de Letras,
142 Cortes de Lisboa de 1459 – Alfaiates (3) (doc. 1). II série, vol. VII, Porto, 1990, pp. 59-70.

54 55
Iberografias | 4
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

Guerra, espoliação, despovoamento, terras incultas e abandonadas foram


feridas e cicatrizes de uma fronteira política desenhada entre dois reinos. Rea-
lidades que serviam não poucas vezes de argumentos para criticar, exigir ou
pedir. Esta similar fisionomia de baluartes defensivos dos concelhos da raia
criava entre eles uma mesma identidade, que exigia comunidade, se não
mesmo irmandade, nas liberdades e privilégios económicos e sociais. Comu-
nhão que, sendo quebrada, tinha de se repor, como o rogavam os lesados.
Apêndice Documental
Mas esse intercâmbio e essa convivialidade não se queriam restritos aos
limites definidos pelas autoridades régias, que foram, aliás, muito diversa-
mente vivenciados ao longo dos tempos e dos espaços. Justamente a fronteira
política estimulava e favorecia as relações comerciais legais ou, mais ainda, ile-
gais. E, para além dela, as idênticas condições geográficas, sociais e económi-
cas de ambos os lados dessa frontaria eram factores agregadores e
aglutinantes, convidando a uma permanente comunicação e circulação de bens
e pessoas.
Terminadas as duras ocasiões de defender e atacar, era tempo de retornar ao
quotidiano de lavrar, pastorear e mercandejar, entremeado com um tempo
extraordinário de peregrinar, comemorar e banquetear. Labuta de trabalho ou
festa, moldada em solidariedades de vizinhança, que as linhas de fronteira
mais fomentam que repelem, na contínua inquietação humana de ir mais além
do “eu” e dos “seus”, rasgando novos caminhos e descobrindo o “outro” e
“os outros”.

56
Nota Prévia

A começar, importa esclarecer os critérios que estão subjacentes à selecção dos


textos que a seguir se publicam. Atendendo a que esta obra resulta do trabalho
desenvolvido num determinado projecto, com objectivos previamente defini-
dos146, optámos por publicar neste apêndice apenas os capítulos especiais dos
concelhos que pertencem ao actual distrito da Guarda, apresentados às Cortes
dos séculos XIV e XV, não atendendo a outra documentação produzida
durante ou no âmbito das Cortes (mormente concessão ou confirmação de pri-
vilégios) que a estes concelhos possa ter sido outorgada147. Esses documentos
serviram-nos, porém, para abonar a presença de alguns destes concelhos em
Cortes148. Assim, pela mesma lógica, deixámos também de parte duas cartas
régias com capítulos de cortes, uma dirigida aos juízes de Trancoso e outra pas-
sada a pedido dos procuradores desta mesma vila, por se tratarem de capítulos
gerais: a primeira contém um capítulo geral saído das cortes de Évora de 1390-
91149 e a segunda apresenta o traslado de um outro capítulo geral de umas cor-

146 Veja-se, a este propósito, Maria Helena da Cruz Coelho e Luís Miguel Rêpas, “As petições dos concelhos do

distrito da Guarda em Cortes e a política transfronteiriça”, in Territórios e Culturas Ibéricas, coord. de Rui
Jacinto e Virgílio Bento, Porto, Campo das Letras, 2005, pp. 131-142.
147 É o caso, por exemplo, de uma carta de feira franca, passada em Évora, em 12 de Fevereiro de 1391, pouco

depois do encerramento das Cortes que aí se realizaram. Armindo de Sousa serve-se de um resumo desta carta
para considerar a participação de Pinhel nestas Cortes (As Cortes Medievais Portuguesas…, vol. II, pp. 11 e 56,
a partir de Biblioteca Municipal de Viseu, Provas e Apontamentos da História Portuguesa, II, fl. 136v.º). O refe-
rido documento, que Humberto Baquero Moreno publica na íntegra a partir de outra fonte, não faz qualquer
referência à assembleia e deve considerar-se como um despacho régio à margem das sessões (IAN/TT, Chance-
laria de D. João I, L.º 2, fl. 53, publ. por Humberto Baquero Moreno, “Um conflito social em Pinhel e seu termo
no século XV”, in Marginalidade e conflitos sociais em Portugal nos séculos XIV e XV. Estudos de História, Lis-
boa, Editorial Presença, 1985, p. 192).
148 É natural que os concelhos, por intermédio dos seus procuradores, aproveitassem a ocasião das Cortes para

obter do monarca a confirmação de anteriores privilégios ou a concessão de novos. Procuravam, desta forma,
rentabilizar o investimento que faziam ao enviar os seus representantes às Cortes. Na verdade, estes documen-
tos podem comprovar a realização de determinadas Cortes ou precisar a data e o local em que decorreram; por
outro lado, por eles ficamos também a saber que um determinado concelho esteve presente nesta ou naquela
assembleia. Assim, cremos que se poderia justificar a publicação de todas estas cartas se o trabalho tivesse por
objecto de estudo as Cortes, o que não é o caso, na medida em que, desde o início, o projecto esteve sempre voca-
cionado para o estudo das petições apresentadas pelos concelhos da Guarda e das respostas dadas pelo monarca.
149 IAN/TT, Chancelaria de D. Manuel, L.º 28, fl. 122 e IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fls. 210v.º-211. Rita

59
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

tes também realizadas em Évora, desta vez em 1444150. Pelo contrário, incluí- 1335158; o segundo, com os agravos expostos pelo concelho de Castelo
mos duas cartas régias que expressamente têm por base agravos apresentados Rodrigo a D. Afonso IV nas Cortes de Santarém, e com as respostas do mesmo
pelos representantes dos concelhos em Cortes: uma, de D. João I, responde a rei, datado de 8 de Junho de 1340159, conservava-se ainda inédito e devemos a
uma petição do concelho da Guarda apresentada nas Cortes de Santarém de sua inclusão à amabilidade do Professor Doutor João Alves Dias e do Dr.
1396151 e a outra, de D. Afonso V, decorre de uma queixa apresentada pelo con- Pedro Pinto, seu colaborador, que no-lo referiram160.
celho do Sabugal nas Cortes de Lisboa de 1459152. Do mesmo modo, transcre-
veu-se o resumo dos capítulos especiais de Pinhel às Cortes de Évora de 1447, Fig. 5 – Distribuição dos documentos por reinado
dado que se perdeu o texto original153. A credibilidade desta leitura pode con-
firmar-se nos resumos que foram feitos dos capítulos especiais do mesmo con- Todos os restantes textos pertencem à segunda dinastia, a de Avis. Datam,
celho às Cortes de Évora de 1460 e de Coimbra/Évora de 1472-73154, de que se na sua quase totalidade, do século XV e incidem essencialmente no reinado de
conservam os textos integrais155, embora seja evidente a actualização da lingua- D. Afonso V. Para a recolha dos documentos correspondentes a este período
gem para uma forma mais moderna e mesmo, no texto das Cortes de Évora de tomámos por base o inventário feito por Armindo de Sousa161, não deixando,
1447, um certo cunho pessoal do autor destes apontamentos156. porém, sempre que se justificava, de corrigir algumas cotas e de acrescentar
Assim, cronologicamente, os dois textos mais antigos que fazem parte da outras, procurando assim apresentar os quadros de tradição dos documentos
presente obra remontam ao reinado de D. Afonso IV: o primeiro, que contém de uma forma completa e rigorosa. Alertamos para o facto de não termos
os capítulos especiais apresentados pela Guarda nas Cortes de Évora de 1325, registado a participação de Trancoso nas Cortes de Évora de 1442, nem qual-
encontrava-se já publicado, por Rita Costa Gomes157, ainda que com a data de quer capítulo especial da Guarda nas Cortes de Lisboa de 1459, ao contrário
do que assinalara Armindo de Sousa, que em ambos os casos se fundamentou
em textos da Leitura Nova que copiam outros da Chancelaria de D. Afonso V
Costa Gomes, na obra Castelos da Raia, vol. I, Beira, 2.ª ed., Lisboa, IPPAR, 2001, pp. 45 e 58, transcreve
alguns excertos deste capítulo, identificando-o incorrectamente como “capítulos especiais de Trancoso”. Como atribuídos pelo mesmo autor às Cortes de Lisboa de 1439162.
dissemos, por ser geral, ainda que dirigido aos juízes de Trancoso, optámos por não o transcrever. Este capítulo
encontra-se resumido por Armindo de Sousa, As Cortes Medievais Portuguesas…, vol. II, p. 239, n.º 4, a partir
de uma outra fonte.
Fig. 6 – Distribuição dos Capítulos Especiais de Cortes
150 IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 24, fls. 54v.º-55. Armindo de Sousa indica este documento para

demonstrar a presença do concelho de Trancoso nas Cortes de Évora de 1444, mas omite-o quando inventaria
a documentação manuscrita relativa às Cortes e novamente quando sintetiza a informação dos capítulos gerais
das Cortes celebradas entre 1385 e 1490 (As Cortes Medievais Portuguesas…, vol. II, pp. 65, 124, 194 e 336).
151 Doc. 13. 158 De facto, no documento (que conhecemos apenas pela Leitura Nova) regista-se «Era de mill e satemta e tres
152 Doc. 36. annos», o que corresponde ao ano de 1[3]35 (o século não levanta dúvidas, já que se trata de uma carta de D.
153 Biblioteca Municipal de Viseu, Provas e Apontamentos da História Portuguesa, II, fl. 137 (doc. 30). Afonso IV). No entanto, nesse ano não se realizou qualquer reunião de Cortes. Aliás, em todo o reinado de D.
154 Biblioteca Municipal de Viseu, Provas e Apontamentos da História Portuguesa, II, fl. 137v.º. Afonso IV só se realizaram Cortes na cidade de Évora no ano de 1325, precisamente no mês de Abril (cfr. Cor-
155 IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 240, para as Cortes de Évora de 1460 (doc. 32), e IAN/TT, Chance- tes Portuguesas. Reinado de D. Afonso IV (1325-1357), edição preparada por A. H. de Oliveira Marques,
laria de D. Afonso V, L.º 33, fl. 71-71v.º e IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 186v.º-187v.º, para as Cor- Maria Teresa Campos Rodrigues e Nuno José Pizarro Pinto Dias, Lisboa, INIC, 1982). Tendo em consideração
tes de Coimbra/Évora de 1472-73 (doc. 33). este aspecto, parece-nos crível e muito provável que se trate de um erro da Leitura Nova, em que «sasemta» foi
156 As frases «alegaõ que qualquer piqueno fidalgo de quem elles fossem vassallos os defenderia de similhantes tomado por «satemta», o que explicaria o inusitado da data. O documento em questão encontra-se publicado
roubas[,] quanto mais hum rei taõ poderoso», e «se fossem castelaõs se nos fizesse huma, far-lhe-yamos outra: neste trabalho com o n.º 11.
Deos sois da terra: fazei-nos direito e justiça» são exemplo disso (doc. 30). Os apontamentos em questão terão 159 Doc. 4.

sido feitos por um amigo de Fr. Joaquim de Santa Rosa de Viterbo, que lhos terá enviado para este os utilizar no 160 Agradecemo-lhes ainda a indicação de algumas cotas da Leitura Nova que permitiram melhorar os quadros

seu Elucidário das palavras, termos e frases que em Portugal antiguamente se usaram e que hoje regularmente de tradição de textos que conhecíamos apenas pelas chancelarias régias e a salutar troca de ideias que contribuiu
se ignoram: obra indispensável para entender sem erro os documentos mais raros e preciosos que entre nós se para o esclarecimento de algumas dúvidas.
conservam, cuja primeira edição, em dois volumes, remonta aos anos de 1798-1799 (ed. crítica de Mário Fiúza, 161 Armindo de Sousa, As Cortes Medievais Portuguesas…, vol. II, pp. 35-68.

2.ª Reimpressão, 2 vols., Porto – Lisboa, Livraria Civilização, 1993; na pág. 39 do primeiro volume diz-se que 162 IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 2, fl. 3 e IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 101v.º-102, para

este manuscrito não é da letra de Viterbo). Trancoso (doc. 40), e IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 2, fls. 10v.º-11 e IAN/TT, Leitura Nova, Beira,
157 Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. I, pp. 163-164. L.º 1, fl. 253, no caso da Guarda (doc. 15).

60 61
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

Os documentos que a seguir se publicam encontram-se no Instituto dos Arqui- Por fim, entendemos que seria útil para o leitor existir um índex que o condu-
vos Nacionais / Torre do Tombo, em Lisboa, distribuídos por vários fundos: zisse pela documentação sem ter de a reler sucessivamente, na íntegra, cada vez
Chancelarias, Leitura Nova (Beira) e Gavetas. Por sua vez, os resumos dos capí- que iniciasse uma nova pesquisa. Por isso, ao jeito de Armindo de Sousa, elabo-
tulos especiais de cortes do concelho de Pinhel, atrás referidos, conservam-se na rámos um quadro em que se apresentam sumariamente, em sete campos, as Cor-
Biblioteca Municipal de Viseu, no segundo volume das Provas e Apontamentos tes (com a indicação do ano e do local em que se realizaram), os concelhos que
da História Portuguesa, entre os manuscritos e papéis particulares de Fr. Joaquim dispõem de capítulos especiais, a natureza de cada um dos capítulos, o assunto
de Santa Rosa de Viterbo, apesar de não serem da sua letra163. Consultou-se, tratado (com um breve resumo do pedido), o tipo de resposta, algumas observa-
ainda, outra documentação manuscrita guardada nos Arquivos Históricos Muni- ções (quando necessário) e o n.º de ordem do documento nesta edição.
cipais das cidades de Lisboa e do Porto com informações relevantes sobre a par- Para além da forma de apresentação dos dados, aceitámos, grosso modo, as
ticipação ou representação dos concelhos da Guarda em Cortes. tipologias e os critérios definidos e utilizados por Armindo de Sousa quando
Da pesquisa desenvolvida resultou um total de 41 textos com agravos con- inventariou e estudou os capítulos gerais de cortes167. Assim, para determinar
celhios, 57 presenças de concelhos distribuídas por 25 Cortes diferentes (37 a natureza dos capítulos especiais, utilizámos as seguintes categorias: adminis-
daquelas com capítulos especiais) e 151 queixas e petições com as respectivas trativa168, económica, fiscal, judicial, jurídica, militar, religiosa e social. No
respostas. Localizaram-se capítulos especiais apresentados em Cortes pelos campo em que se insere o assunto dos capítulos apresenta-se, em primeiro
concelhos de Alfaiates, Almeida, Castelo Mendo, Castelo Rodrigo, Guarda, lugar, o tema de cada um deles, numa ou em poucas palavras, seguido do res-
Marialva, Pinhel, Sabugal e Trancoso, bem como pela Irmandade de Riba Côa pectivo requerimento. Omitimos, por uma questão de gestão do espaço e da
(que incluía as sete vilas acasteladas de Alfaiates, Sabugal, Vilar Maior, Cas- informação, os fraseados que exprimem os factos motivadores e as justifica-
telo Bom, Almeida, Castelo Rodrigo e Castelo Melhor). Sabemos ainda terem ções dos requerimentos, até porque, a anteceder este quadro, apresentamos a
ido a Cortes, sem que se conheçam os respectivos capítulos, os concelhos de transcrição integral dos capítulos especiais, podendo o leitor, sempre que
Castelo Bom (Santarém/1383)164, Celorico da Beira (Coimbra/1385)165 e Sor- entender necessário, consultar com facilidade o teor do documento. Por sua
telha (Leiria/1376)166. vez, as respostas distribuem-se por seis espécies: deferimentos, delegações, eva-
Os 41 textos que integram esta publicação encontram-se organizados por sivas, non innovandum, adiamentos e indeferimentos. Considerámos ainda
concelhos, seguindo a ordem alfabética, e só depois, dentro de cada concelho, deferimentos parciais e deferimentos condicionais, pelo que os deferimentos
se apresentam por ordem cronológica da realização das Cortes. Esta opção absolutos surgem designados apenas como deferimentos.
privilegia o factor espaço relativamente ao factor tempo. Na realidade, tra- Estes quadros, que se apresentam em anexo à obra, permitem ainda ao lei-
tando-se de um estudo de história regional, com enfoques pontuais sobre um tor obter a visão diacrónica das queixas e das Cortes, já que estão organizados
conjunto de concelhos que nos séculos XIV e XV apresentaram os seus agra- por ordem cronológica, entrecruzando-se assim com a disposição do apêndice
vos em Cortes, é de esperar que o factor geográfico seja preponderante na documental que, como dissemos, segue, prioritariamente, uma vertente geo-
escolha de cada leitor. gráfica (por concelho).

163 Cfr. supra, nota 156. Veja-se, mais detalhadamente, a «Breve descrição dos manuscritos e papéis particula-

res de Fr. Joaquim de Santa Rosa de Viterbo que se guardam na Biblioteca Municipal de Viseu», in Elucidário
das palavras, termos e frases que em Portugal antigamente se usaram e que hoje regularmente se ignoram: obra
indispensável para entender sem erro os documentos mais raros e preciosos que entre nós se conservam, ed. crí-
tica de Mário Fiúza, 2.ª Reimpressão, vol. I, Porto – Lisboa, Livraria Civilização, 1993, pp. 33-51.
164 Cortes Portuguesas. Reinado de D. Fernando I (1367-1383), vol. I (1367-1380), edição preparada por A. H.

de Oliveira Marques e Nuno José Pizarro Pinto Dias, Lisboa, INIC, 1990, pp. 77-82.
165 IAN/TT, Gavetas, gav. 13, m. 10, doc. 12; IAN/TT, Leitura Nova, L.º 1 de Reis, fls. 1-7v.º; Fernão Lopes, 167Cfr. Armindo de Sousa, As Cortes Medievais Portuguesas…, vol. I, pp. 517-518, 528-531, 539-544.
Crónica de D. João I, Caps. CLXII e CLXXXII. 168 Ao considerarmos determinados capítulos de natureza administrativa, atendeu-se mais aos procedimentos
166 Cortes Portuguesas. Reinado de D. Fernando I…, vol. I, pp. 163-164. inerentes ao provimento e funcionamento dos cargos que à natureza dos mesmos.

62 63
Critérios de Transcrição

Na transcrição dos documentos que a seguir apresentamos, seguimos essen-


cialmente os critérios aconselhados por Avelino de Jesus da Costa, nas Normas
gerais de transcrição e publicação de documentos medievais e modernos,
Coimbra, INIC, 1993, que, nas suas linhas gerais, passamos a expor:
1. Desdobraram-se as abreviaturas sem sublinhar as letras que lhes corres-
pondem. As abreviaturas com mais de um valor desabreviaram-se conforme o
contexto o exigia.
2. Actualizou-se o uso de maiúsculas e minúsculas; do i e do j, do u e do v,
conforme eram vogais ou consoantes; do c e do ç. Conservou-se o X aspado,
XL (= XL), equivalente a quarenta.
3. Ignoraram-se os sinais de pontuação colocados no texto, mas inseriu-se
alguma pontuação para tornar o documento mais compreensível. Mantive-
ram-se, porém, os caldeirões que o texto apresenta, utilizando o sinal ¶.
4. Os erros existentes nos documentos, que dificultam o sentido dos mes-
mos, foram corrigidos, indicando-se em nota a forma textual. Nos outros
casos, porém, mantiveram-se os erros, mas explicitando-se com sic em nota,
para não induzir o leitor em erro.
5. As omissões do texto ou reconstituições de formas textuais incompletas,
regra geral por esquecimento de sinais de abreviatura, foram indicadas por
letras, sílabas ou palavras em itálico e entre [].
6. As partes truncadas ou ilegíveis dos documentos, sempre que possível,
completaram-se por outras fontes ou formulações similares entre []. Utilizou-
se […] para representar as partes que não puderam ser reconstituídas.
7. As leituras duvidosas foram seguidas de (?).
8. As letras, palavras ou frases entrelinhadas colocaram-se entre < >.
9. Separaram-se as palavras incorrectamente juntas e uniram-se os elemen-
tos dispersos da mesma palavra.
10. Mantiveram-se as consoantes duplas em posição intervocálica, mas
reduziram-se a simples quando no início das palavras.
11. O til das abreviaturas nasais desdobrou-se em m ou n segundo o crité-
rio seguido pelo texto, quando essas palavras estavam desabreviadas. Caso

65
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

contrário, usou-se o m e o n de acordo com o contexto etimológico mais cor- 1


rente na época. Manteve-se o til quando a sua substituição por m ou n modi-
ficava a pronúncia da palavra (ex.: h?a).
12. Deu-se preferência ao exemplar original ou mais antigo, anotando as
diversas cópias que se conhecem no respectivo quadro de tradição. Os origi-
nais são assinalados com a letra A e as cópias com a letra B ou seguintes.
1459, Julho, 4, Lisboa – Capítulos especiais de Alfaiates (fr. c. Sabugal) às
Cortes de Lisboa de 1459.

A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 36, fl. 174-174v.º.


B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 127-127v.º.

[fl. 174] ¶ Dom Afomso e etc. a quantos esta carta virem fazemos saber que
estando ora nos em as cortes que fezemos em Lixboa per Afomso Lopez pro-
curador da villa d’Alfaiates nos forom apresentados certos capitollos e ao pee
de cada huum delles lhe mandamos poer nosa reposta segundo se adiante
segue:
(1) 169 Senhor o voso concelho e homens boons d’Alfaiates fazemos saber aa
vosa mercee que este logar he em este 170 estremo que parte com Castella e
todos concelhos d’arredor asi como o Sabugall, Sortelha e a Guarda, Villar
Mayor, Castello Boom sam previlegiados que nom paguem portajem no regno
e teem cartas por que os vizinhos seendo conhocidos atee oyto legoas que nom
sejam constrangidos nem theudos a hir recadar aa villa. Pidimos-vos por mer-
cee que pois os logares comarcaaos destes taaes privilegios que mais sam a
dereito do regno que nos façaaes privilegiados como elles de nom pagarmos
portajees no regno e que seendo registada a oyto legoas que sem carta seendo
conhocido nom sejamos costrangidos nem theudos hir recadar como destes a
todos estes logares comarcaaos.
[fl. 174v.º] A esto respondemos que se os outros logares semelhantes hi arre-
dor teem semelhante privilegio nos praz de lhe esto outorgarmos.
(2) Senhor fazemos saber aa vosa mercee que d’antigamente senpre ouve-
mos os maninhados e sa pouca renda que renderem pera arca do concelho per
que se escusam muitas fintas asi pera hir com alguuns agravos aa vosa mercee
como pera vos fazer <saber> represarias que se fazem e pera muitos outros
encarregos per que os moradores vivem mais sem sojeiçom e nos he dicto que

169 Na margem esquerda regista-se: Alfaiates capitollos.


170 Seguem-se letras riscadas.

66 67
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

muitas vezes vo-llo pedem fidalgos e os podiees dar e como somos pobres o 2
nom poderiamos requerer e seria muito contra voso serviço e aazo de se este
logar despovorar. Pidimos-vos por mercee que nos dees vosa carta per que aja-
mos taaes maninhados como senpre ouvemos e que posto que lenbrado nom
sejaaes que mandees que outro nehuum vo-llos nom posa pedir.
A esto respondemos que nos praz fazermos-lhe destes maninhos mercee
emquanto nosa mercee for. 1459, Junho, 28, Lisboa – Capítulos especiais de Almeida às Cortes de Lis-
(3) Senhor avemos vizinhança com Sam Martinho de Trebelho que em breve boa de 1459.
huso nos prestamos huuns com os outros como parentes e conpadres e amigos
muitas vezes por lhe vendermos h?ua vaca pera h?ua voda ou confraria loguo A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 36, fls. 163v.º-164.
somos constrangidos e asi por huum porco e sobre esto ja vos scpreveo o con- B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 213v.º-214.
celho do Sabugall e lhe destes voso mandado que asi como husarem com elles
husasem elles e que podesem pera taaes cousas dar h?ua vaca ou porco. Pidi- [fl. 163v.º] Aa villa d’Almeida capitollos espiciaaes por que praz a el rey que
mos-vos por mercee que asi como destes ao Sabugall mandees que se entenda o oficio de coudelaria se dee a huum homem bom morador da dita villa e que
a este concelho. o julgado das sesmaryas amde nos juizes hordenayros e eles guardem o regi-
A esto respondemos que nos praz de lhe esto outorgar como aos do Sabu- mento acerqua delas.
gall. 172 Dom Afomso etc. a quantos esta carta virem fazemos saber que estando

Pidindo-nos por mercee o dicto Afomso Lopez por parte do dicto 171 ora nos etc. per Estevom Dominguez e Joham Andres procuradores da nossa
concelho que lhe mandasemos dar h?ua nosa carta com o theor dos dictos villa d’Almeyda nos forom apresentados certos capitollos etc:
capitollos com nosas repostas porque lhe eram necesarias e se entendia delles (1) ¶ Senhor vos destes ao conde de Villa Reall toda a jurdiçam da dicta villa
ajudar. E nos veendo o que nos asi diziam a nos prouve dello e lha assi e pella guisa que a vos perteencia que outra cousa nom leixastes senom
mandamos dar segundo dicto he. E porem mandamos e etc. em forma. Dada alçada e correiçom de vosso corregedor e logo por bem dello nos [foy] posto
em Lixboa a IIII.º de Julho. El rei o mandou per Fernam da Silveira e etc. ouvidor e juizes e oficiaaes todo da mãao do dicto conde e merinho do dicto
Diogo Lopez a fez. Ano do Noso Senhor Jhesu Christo de mil IIIIc LIX. conde que de senpre naquella terra nunca se custumou.
E a esto respondemos que declarem milhor e mostrem o privillegeo.
(2) Senhor lhe fezestes 173 mercee de todollos dereitos que naquella [villa] e
termo a vos perteenciam antre os quaees declara res[i]os fontes 174 pesqueiras e
montados e montes rotos e por ronper pellas quaees declaraçõoes esperamos de
sermos todos demandados e constrangidos por suas justiças que lhe teendes dadas
e som postas aa sua mãao e faram e encaminharam em ello que viier em prazer ao
dicto comde postas que das cinquo cousas a vos dellas nom perteençam <n[e]huum
dereito>. E elle per seu senhorio jurdiçam que lhe teemdes dada os apropriara assi
posto que de senpre foy <e> he custume os moradores da dicta villa e termo as
posoyrem sem por ellas fazerem trebuto nem foro aa vossa senhoria.

172 Registado na margem: Villa d’Almeyda.


173 Segue-se das riscado.
171 Seguem-se letras riscadas. 174 Seguem-se letras riscadas.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

A esto respondemo[s] nom se entende en tall doaçom cousa que ao conce-


lho perteença.
(3) E ao que dizees que nos tempos das guerras arderom os privillegeos e
foraaes vossos e senpre atee ora forom guardados os de Castell Boom e de Cas-
tell Rodrigo nos pidirom que assi vo-llos confirmemos porque todos eram de
huum foro.
A esto respondemos que os tirem da Torre honde os acharom e lhe manda-
remos dar alvara per que lhos busquem. 175
(4) Ao que dizees que foy custume em essa terra ser dado o oficio da coudel-
laria a huum homem boo morador na villa e naturall dhi176 e que agora o dicto
comde mandara lançar mãao pella dicta coudellaria e poem em ella quem lhe
praz por mais sojugar a terra pello quall nos pidiis que nos queiramos veer os
privillegeos e foraaes e husos e custumes que de sempre ouve essa terra e vos
restetumamos177 e mamtenhamos em ellas assi e pella guisa que vos senpre
manteverom e defemderom os rex pasados que forom ante nos e ysso meesmo
atee dada do dicto comde. E nom queiramos perder os povoradores da terra
por ser em si tall e em estermo que britando-lhos como britados teemos e nom
os restituyndo ao que dantes eram de necesidade a terra se despovoraria e
cad’huum hira viver honde lhe bem vier.
¶ A esto re[s]pondemos que pedem bem e assi nos praz que se faça.
(5) ¶ Senhor nos somos muyto agravados porque em esta villa nunca 178
ouve juiz de sesmaria soomeente quamdo alg?uas se nom aproveitavam os ren-
deiros per bem de vossa hordenaçom as demandavam a seus dopnos que as
nom queriam aproveitar perante os juizes hordenarom?? e os juizes o julguam
per sentença. E vossa mercee deu h?ua carta a huum Bernald’Eannes que fosse
juiz da sesmaria e mandou dar preguões por certos lugares sorraticiamente
sem delles alguuns saberem e que sem a parte mais ser citada nem ouvida poem
per obra mamdar fazer carta de posysom. Pidimos aa vossa alteza que man-
dees tall juiz nom aja hi e que os juizes hordenairos conhoçam dello como sen-
pre foy de custume.
[fl. 164] A esto respomdemos que pedem bem e nos praz que [se] tall jul-
guado senpre andou nos juizes hordenairos que assi 180 amde daqui en diamte

175 Segue-se uma anotação de difícil leitura, que parece ser Emviamdo-nos.
176 Segue-se e a que agora, mas sem estar riscado.
177 Sic.
178 Segue-se foy riscado.
Fig. 14 Capítulos especiais dos concelhos de Almeida e Castelo Rodrigo. Cortes de Lisboa de 1459. 179 Sic. Por hordenarios.
IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, Lº 36, fl. 163vº. 180 Seguem-se letras riscadas.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

e o que o era per sua carta o nom seja mais e os dictos juizes sejam avysados 3
de guardarem o regimento dado e feito sobre as dictas sesmarias e sejam cer-
tos que se o nom fezerem como devem que lhes sera dada aquella pena que por
ello 181 merecerem.
Pidimdo-nos por mercee o dicto Estevom Dominguez e Joham Andres
procuradores da dicta villa por parte do dicto concelho 182 que lhe
mamdasemos dar h?ua nossa carta com o theor dos dictos capitollos com 1468, Maio, 26, Santarém – Capítulos especiais de Castelo Mendo (fr. c.
nossas respostas porque lhe eram necesarios e se entemdiam delles d’ajudar. Almeida) às Cortes de Santarém de 1468.
E veendo o que nos asi diziam e pidiam etc. Dada em Lixboa XXVIII dias de
Junho. El rey o mandou per o sobredicto. Diogo Lopez a fez. Anno de Nosso A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 28, fl. 47-47v.º.
Senhor de IIIIc LIX. B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 197v.º-198.

[fl. 47] 183 Castel Memdo capitollos espiciaaes per que prouve a el rei que o
concelho da dita villa se posa lograr do termo de Castel Bom e viziinhar com
eles e outros.

Fig. 15 – Castelo Mendo (página inteira, ao lado)


Capítulos especiais do concelho de Castelo Mendo. Cortes de Santarém de
1468.
IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fl. 197v.º.

Dom Afomso etc. a quantos esta nossa carta virem fazemos saber que em as
cortes que ora fezemos em esta muy nobre e leall villa de Sanctarem per os pro-
curadores de Castell Meendo que a ellas mandamos viir nos forom dados cer-
tos capitollos especiaees por parte da dita villa dos quaees o theor delles com
nossas respostas he este que se segue:
(1) Primeiramente quanto ao que dizees que tiinhees feito contracto e con-
vençam com os moradores da villa de Castell Boom que os gaados nom pasas-
sem d’h?ua parte pera outra nem cortassem madeira nem caçassem salvo cada
huum em seu termo e que ora os moradores da dicta villa de Castel Boo 184
ouverom ora nosso privillegio per que podessem montar per todos nossos reg-
nos pollo quall elles vos quebrarom o dicto vosso contracto e conveençam e
vos paciam com seus gaados em vosso termo o quall era mui pequeno e penho-
ram a vos por vossos gaados no seu [fl. 47v.º] termo. Pedindo-nos que a esto
vos ouvessemos remedio porquanto per esta guissa ficavees defraudados.

181 Seguem-se letras riscadas. 183 Regista na margem esquerda: Capitolos de Castel Mendo.
182 Repete concelho. 184 Regista duas vezes a palavra ouverom, riscando a primeira.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

¶ Resposta: porquanto a nos parrece que pediis bem e razom a nos praz e 4
mandamos que vos possaaees hussar e vos lograr do termo de Castel Boo e
vizinhar com elles assy e pella guisa que elles ussam e vezinham comvosco sem
embargo do dicto privillegio que lhe ora assy outorgamos novamemte185.
(2) ¶ Item quanto ao que diizees que de cinquo annos acaa 186 cairan duas
tores que estam sobre a porta dessa villa pollas quaees entram a ella per cima
do muro nos pediiees que proveessemos sobre ello porque estam muyto no 1340, Junho, 8, Santarém – Capítulos especiais de Castelo Rodrigo (fr. c.
estremo. Figueira de Castelo Rodrigo) às Cortes de Santarém de 1340.
¶ Resposta: A nos apraz o mamdarmos proveer e correger segundo nos
pediis e vos requerre-nos sobre isso ou a dom Joham Galvom bispo de Coim- B) IAN/TT, Chancelaria de D. Manuel I, L.º 28, fl. 89v.º.
bra do nosso conselho e scprivam da nossa puridade e vedor-moor das nossas C) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fls. 130v.º-131v.º188.
obras etc.
Pedindo-nos os dictos procuradores por parte da dicta villa que lhe [fl. 89v.º] Dom Afonso pella graça de Deus rey de Purtugal e do Algarve a
mandassemos assy dar nossa carta com o theor dos dictos capitollos porque vos Joham Domingez corregedor por mym na Beira e em Riba de Coa saude.
lhe eram compriidoiros e se entendiam delle ajudar e nos visto seu pedhiir lhe (1) Sabede que Estevam Martinz morador e vezinho de Castell Rodrigo em
mandamos dar como dito he. E porem mandamos a todollos nossos nome dos homens boons e concelho da dicta villa me dise que vos tomades em
corregedores juizes e justiças contadores almoxariffes e a quaeesquer outros vos muitos feitos asy cyves como criminaes desa villa e termo e que outrosy
oficiaees e pessoas a que esto pertecer e esta nossa carta for mostrada que lhe premdedes e mandades premder muytos homens moradores e vezinhos desa
cuompram187 e guardem e façam bem e inteiramente comprir e gardar como villa e termo e que outrosy tomades outros presos que tem os alcaides desa
em ella he contheudo. Dada em a dicta nossa villa de Santarem XXVI dias de villa em suas prisoes e que os trazedes em pos vos presos de villa em villa e que
Mayo. Rodrigo Annes a fez. Anno do Nascimento de Noso Senhor Jhesu outrosy levades cacerajees dos presos que sam livres pellos allcaides desa villa
Christo de mil IIIIc LXVIII. e outrosy dos que jazem presos em esa villa que chegades vos hy e os mamda-
des soltar e levades a cacerajem deles pero que nom amdam na vosa prisam e
que em esto recebe ese concelho gramdes agravamemtos.
(2) Outrosy me dise que os judeus moram em esa villa amtre os cristãos e
que recebem delles muyto nojo.
(3) Outrosy me dise que alguuns tabalyães desa villa vos dam querelas e em
seus estados d’alg?uas pessoas das quaes querelas sam livres que per esta
razam fazem prender muitos e amdar outros hamorados e recebem muitas per-
das e dapnnos.
(4) Outrosy me dise que alguuns desa villa e termo desa comarca ham cou-
tadas189 per minhas cartas e que alg?uas se fazem per sy e que estes que asy tem
estas coutadas comem as ervas nas erdades alheadas190 com os seus gados e
com as suas bestas e que se estes em cujas erdades asy comem as ervas querem

185 Repete novamente. 188 Datado de 8 de Julho de 1340. Preferimos a leitura da Chancelaria.
186 Regista duas vezes a palavra cairan, riscando a primeira. 189 No texto comtadas.
187 Sic. 190 Sic. Assim está registado também na Leitura Nova.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

comer ou comem com seus gados ou com as suas bestas as ervas nas dictas Outrosy do que me dise em razam das coutadas tenho por bem e mamdo
coutadas que levam porem delles coimas e que os chamam191 pellos meus que se os que asy teverem esas coutadas comerem com os seus gados ou com
emcoutos e que os trazem em perlonngas demandas e que por esta razam rece- as sas bestas as ervas nas erdades alheas que aqueles em cujas erdades asy
bem muitos agravamemtos. comerem as ervas posam comer e comam sem coimas nenh?uas com os seus
(5) Outrosy me dise que o alcaide desa villa e alguuns outros fidalgos e gados e com as sas bestas as ervas nas dictas coutadas nom embargamdo as
poderosos tomam viamdas e outras muitas cousas e que nom querem pagar dictas minhas cartas.
por ellas os dinheiros. Outrosy do que me dise que o alcaide desa villa e alguuns outros fidalgos e
E pedio-me sobre todo merce em nome dos dictos homens boons e concelho poderosos tomam vyamdas e outras cousas e que as nom querem pagar tennho
e eu vemdo o que me pediam e queremdo fazer graça e merce a ese concelho por bem e mando que o alcaide desa villa nem outros nenhuuns fidalguos nem
temnho192 por bem e mamdo a vos e a Joham Monteiro juiz em Riba de Coa e poderosos nom tomem viamdas nem outras cousas nenh?uas salvo a prazi-
a quallquer outro que por mym amdar em esa comarca que vejades a minha memto daqueles cujas forem ou pela almotaçaria se a hy ouver em esas cousas
ordenaçam que vos Joham Domingez laa trazees e o mamdado que vos eu des- que asy tomarem ou per mandado dos alcaides desa villa ou de dous homens
pois mandey em razam deses feitos e presos e cacerajes e que façades sobre boons sem sospeita a que ho eses alcaides mandem ver pagamdo amte por esas
todo pella gisa que per mym he mandado em esa ordenaçam e mamdado que cousas <os dinheiros> pella guisa que dicto he. E posto que dem por ellas
vos despois mamdey como dicto he. penhores nom lhes tomem nem lhes leixem levar esas cousas salvo se pagarem
Outrosy do que me dise por razam dos judeus tennho por bem e mamdo a amte por ellas os dinheiros ou se prouver aquelas cujas esas cousas forem.
vos Joham Domingez que vades a dicta villa e escolhede huum lugar hapartado Por que mando a vos Joham Domingez corregedor e a quallquer outro que
quall vyrdes que he comvinhavell em guisa que eses judeus posam hy morar e por mym amdar em esa comarca que asy ho faça comprir e goardar. Omde
se conprir hagisadamemte e costramgede-os que vãao alaa todos morar a ese vos e elle al nom façades. Dada em Sanctarem VIIIº dias de Junho193. El rey o
lugar que lhe[s] por vos for asinado agardamdo hy o meu serviço e a proll mandou per Mestre Pedro e Mestre Gonçalo da[s] Leix seus vasalos.
cumunall dese concelho. Estev’Eannes de Pedroso a fez. Era de mill e IIIc LXXVIIIº annos.
Outrosy do que me dise em razam dos tabalyães tenho por bem e mando
que daquy em diamte se faça per esta gisa: que se forem dadas querelas
d’alg?as pessoas pellas quaes sejam ou devam ser presos e forem livres desas
querelas per sentenças ou per alvaraes dos alcaides desa villa que levem as sen-
tenças ou alvaraes per que forem livres aos tabalyães desa villa que as registem
em seus livros aos quaes eu mamdo que as registem e se eses tabalyães derem
a vos esas querelas com seus estados despois que as teverem registadas ou a
Joham Madeiro ou a quallquer outro que por mym amdar em esa comarca se
per esa razam forem presos ou amorados vos mandade soltar eses que asy
forem presos como o achardes que he dereito e costramgede eses tabalyães que
os asy fezerom premder que lhes corregam as prisoes e desomrras que lhes
fezeram fazer e que lhes pagem as custas e perdas e dapnnos que pella dicta
razam receberem e demais estranhade-o a eses tabalyães como em taes feitos
couber.

191 Na Leitura Nova regista-se coymam.


192 Sic. 193 Na Leitura Nova regista-se Julho.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

5 nom leva em toda Riba de Coa que he irmiindade honde este lugar jaz e este
vosso poboo recebe em esto muy grande agravo e perda do seu termo lhe leva-
rem montado e ainda senhor recrecem desvayros e contendas em que as jentes
gastam o seu como nom devem. Vossa mercee seja restituyr o dicto Moomforte
aa dicta villa de Castell Rodrigo como he derreito e como he contehudo na
dicta carta del rey dom Fernando e em esto lhe sera fecto mercee ou quando a
1444, Fevereiro, 29, Évora – Capítulos especiais de Castelo Rodrigo (fr. c. vossa mercee em esto posser duvyda ajam carta por que possam paceer e mon-
Figueira de Castelo Rodrigo) às Cortes de Évora de 1444. tar em elle sem pena pois que o asy nom podem escusar por bem de seus gaa-
dos asy seerem desviados do estremo de Castella como dicto he.
A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 24, fls. 56v.º-57. Nos mandamos ao corregedor da comarqua que ouça este concelho com o
de Pinhell e veja as escrituras que cada h?a das partes sobr’ello tever e lhes faça
[fl. 56v.º] Dom Afomso etc. a quantos esta carta virem fazemos saber que comprimento de dereito dando apellaçom e agravo197 nos casos e etc.
em as cortes que ora fezemos em esta cidade d’Evora per os procuradores da (2) Outrosy senhor he fecto e devulgado que a vosa mercee com acordo de
nosa villa de Castell Rodrigo que a ellas veerom nos forom dados certos capi- vosso poboo manda lançar pedido e os pedidos que ja outra vez forom lança-
tollos espiciaaes e ao pee da cada huum lhe mandamos poer nossa reposta dos dos em vosso regno ou esto foy per negligencia ou per grande afeiçom dos vos-
quaaes o tehor de dous he este que se adeante segue: sos contadores do vosso almoxarifado da Guarda que tiinham com alguuns
(1) Senhor o concelho e homees boons da vossa villa de Castell Rodrigo faze- seus amigos moradores em Pinhell davam-lhe carrego que os de Pinhell lancem
mos saber aa vossa mercee que o termo desta villa he devisado per certas devi- e tirem o dicto pedido em a dicta villa de Castell Rodrigo e em todo seu termo.
sooes scilicet parte 194 e da outra per a ribeira de Coa e dentro no termo da dicta E em esto senhor a dicta villa e termo della recebem muyto grande agravo e
villa esta huum lugar hermo que em outro tenpo foy poborado e tem seu termo perda e ainda senhor sob vossa mercee e reverença a dicta villa e moradores
sobre sy ao quall chamom Moomforte. E este Moomforte jaz no termo da dicta della se ham por injuriados porque senhor hy ha boons homeens e honrrados
villa e todo em huum bispado que he de Lamego e a freguesia deste Moomforte e de fazenda pera tirarem e apanharem e lançarem vosso pedido per a horde-
e dalguuas lavras que se fazem a redor delle en os Luzellos que he seu termo nança do vosso contador e pellas recadaçõoes delle e acrecentarem em vossos
todo[s] seus dizimos vaam aa Pena d’Aguya que he termo da dicta villa porque dereito[s] a todo seu poder e darem ao vosso contador ou a quem per vossa
assy jaz aalem da auga de Cooa en o termo da dicta villa o quall senhor per mercee for hordenado boom conto com entregua de todo vosso dereito e tam
necessidade [fl. 57] 195 das guerras antygas dantre Purtugall e Castella e per bem como os de Pinhell. Vossa mercee seja dar vossa carta pera o contador que
ignorancia das gentes Pinhell ouve o dicto Moomforte por seu termo e ao o lançador do dicto pedido com seu escrivam seja de Castell Rodrigo que lhes
depois foy restituydo o dicto Moomforte aa dicta villa per hua carta del rey he agravo viinrem a Pinhell asy por bem de juizo como por grandes duvydas
dom Fernando segundo aquy a vossa mercee vera e ao depois esso medes por que antre partes ha e se recrecem tres e quatro e cinquo legoas e mais e perdem
outras guerras que se seguyrom nunca della poderom hussar e em esto senhor de suas jeiras e fazendas que nom perderiam se os lançadores do pedido fos-
esta villa e termo recebe grande agravo. Em esta guisa a vosa mercee mande sem de Castell Rodrigo.
devisar os gaados do estremo pera dentro pollo desvayro que ha antre os reg- Mandamos ao contador que se taaes pessoas achar no lugar de Castell
nos e se os gaados desta vylla <e seu termo> entrom em <o dicto> Moomforte Rodrigo que pera ello sejam pertecentes que lhe de o dicto carrego e nom os
ou em seu termo ou alguum corta alg?a lenha ou arados porque esta asy tam achando que faça em ello o que sentir por mays nosso serviço.
preto196 que o nom podem escusar levan-lhe os de Pinhell montado o que se Dos quaaes capitollos e nossas repostas a elles dados Gill Fernandez e
194
Rodrigo Afomso procuradores da dicta villa de Castell Rodrigo nos pedirom
Sic.
195 No cimo da página e na margem esquerda regista-se a palavra capitollos.
196 Sic. Por perto. 197 Seguem-se letras riscadas.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

de mercee que lhe mandassemos dar o trellado dellas com nossas repostas e 6
visto per nos seu requerimento mandamos-lhos dar em esta carta e porem
mandamos ao corregedor da dicta comarca e a quaesquer outras justiças a
que esto perteecer que conpram e guardem e façam conprir e guardar em
todo os dictos nossos capitollos com nossas repostas e lhe no[m] vaam contra
elles em maneyra alg?ua sem outro enbargo. Hunde all nom façam. Dada em
a cidade d’Evora XXIX dias de Fevereiro per actoridade do senhor ifant[e]
dom Pedro regente etc. Rodrigo Anes a fez. Anno do Senhor de mill IIIIc RIIII 1447, Março, 22, Évora – Capítulos especiais de Castelo Rodrigo (fr. c.
anos. Figueira de Castelo Rodrigo) às Cortes de Évora de 1447.

B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 126-127v.º.

[fl. 126/2.ª col.] ¶ Aa villa de Castell Rodrigo capitollos espiciaaes per huum
dos quaaes he mandado que se guarde a hordenaçam que falla acerqua da
repartiçam dos taballiaaes das notas e judiciaaes e que per fallecimento do
escprivam dos orfãaos a que foy dado per el rey dom Joham o dito comcelho
possa dar o dito officio segumdo ordenamça e etc e outros a que he provido
per repostas.

Dom Affomsso etc. a quamtos esta carta virem fazemos saber que em as
cortes que ora fezemos em esta cidade d’Evora pello procurador da nossa villa
de Castell Rodrigo que a ellas veo nos forom dados certos capitollos espiciaaes
aos quaaes nos respomdemos e ao pee de cada huum mamdamos poer nossa
reposta dos quaaes o theor delles todos he este que se adiamte segue:
(1) ¶ Senhor o comcelho e homeens boons de Castello Rodrigo com aquella
reveremcia que devemos emviamos beyjar vossas mãaos e emcomemdar em
vossa mercee aa quall praza saber que em esta villa ha taballiãaes vossos della
sempre e de tempo amtiigamente escpreviam todos misticamente todallas
escprituras que a esta villa e seu termo e assy a outrem que os avia mester sem
avemdo hi nehuum apartamento d’escprituras pruvicas nem doutras neh?uas
mas todos iguallmente escpreviam e todos pagavam sua pemssom aa vossa mer-
cee per iguall. E aqui nom avia outra devisom neh?ua nem briga nem comtemda
[fl. 126v.º/1.ª col.] era muy gramde bem e proll da terra porque os lavradores e
os que aviam mester as escprituras quamdo as vem buscar acham sem outra
comtemda quem lhas faça. E ora senhor de pouco tempo aqua foram aqui gaa-
nhados e repartidos officiaaes.scilicet. a huum que fosse taballiam do paaço
pera escprever no paaço escprituras pruvycas e outro escprivam de horfãaos
que faz no dito officio escprituras pruvicas como numqua foram salvo o que era

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

posto pollo comcelho por escprivam dos horfãaos fazia seu livro dos beens dos he amtre esta villa e a villa de Pinhell muy fremosa ponte toda de camto
horfãaos e de suas remdas e vinha a toda boa recadaçam e as outras escprituras talhada e esta pomte senhor posto que seja muy gramde trabalho e muy
pruvicas que perteeciam faziam os taballiãaes per sua estribuiçom e pagavam gramde custo a esta terra e a Pinhell e a sua terra he h?ua muy fremosa obra se
de todo sua pemssam. E agora o nom fazem assy mas amte o que he assy escpri- apraz ao Senhor Deus de seer acabada e meritoria a que todo o mumdo devia
vam ouve assi este officio per rogo de huum Dieg’Allvarez que vivia no Porto d’ajudar ca neesta ribeyra todollos annos e tempos pereciam e morriam
que ora he em Castella que se foy com a rainha sem ho avemdo per emliçom homeens e outros muitos negocios que se della seguiam em barcos e em outros
nem per outra guisa salvo assy per vomtade o que he muito em perjuizo do maaos passos que em ella avia muitos o que a Deus prazemdo se agora escusa-
poboo e em esta villa posto que alg?uas pessoas querem fazer alg?uas escpritu- ram per bem desta pomte. Senhor aa vossa mercee apraza saber que esta
ras e cousas que lhes comprem muitas vezes vãao buscar taballiam que lhas pomte nos custa a fazer e amte que de todo seja acabada duzemtos mill reaaes
façam e se acertam que nom acham este escprivam que he la omde o Deus ajuda e muito mais segumdo a obra que a ela he necessaria e esta terra he prove e
nom fazem escpritura neh?ua e outro taballiam nom lha quer fazer dizemdo nom pode esto soportar ca esta he h?ua obra que nom poderia soportar senom
que nom perteemce a seu officio ou se a faz per autoridade de justiça quamdo soomente a vossa reall senhoria ca ella he obra reall e assy o pode saber a vossa
vem o escprivam diz que lhe tomou seu officio. E por esto vem muitas vezes em mercee. E porquamto senhor aa nossa simprez noticia he dito que a vossa mer-
gramdes desvayros e comtemdas e outrossy os lavradores e outras [fl. 126v.º/2.ª cee ha-de lamçar pedidos e nos outros proves assaz teemos de pedidos em esta
col.] muitas pessoas por assi esto seer e outrossy alguuns teem odeo ao tabal- obra a quall nom podemos soportar porem senhor seja vossa mercee que em
liam do paaço como a este escprivam dos horfãaos e por esto lhe nom dam a todo ou dello nos façaaes mercee e ajuda em guisa que possamos acabar tam
fazer suas escprituras. E assy nace amtre este pequeno lugar muitas comtemdas homrrada obra como he começada em a dita pomte e esto he serviço de Deus
e brigas o que nom seria nem averia hi briga nem comtemda nem se perderiam e a nos farees mercee.
tamtas geyras como se per este aazo perdem se todollos taballiãaes husassem de Reposta: a nos praz de vos outorgarmos pera a obra da dita pomte todollos
fazer todallas escprituras pruvicas que lhe perteemcem que nom ouvesse hi resiidos que se poderem percallçar em essa villa e em Pinhell e em Almeyda de
nehuum escprivam apartado nem escprivam damte o juiz das sisas senom soo- vimte annos passados pera aca.
mente todos husem como sempre d’amtiigamente husarom. Vossa mercee seja (3) ¶ Outrossy senhor a vos praza saber e tall he a [fl. 127/2.ª col.] verdade
de mamdar que assy husem e façam suas escprituras per sua destribuiçom que esta villa he huum dos lugares fromteyros e h?ua das fortellezas de toda
iguallmente segumdo pagam sua pemssom. E em esto senhor nos farees mercee esta comarqua do estremo de Castella e he lugar homde portam muitos castel-
e este lugar e sua terra vivera em mayor assessego e sera milhor provehuda <a lãaos e homeens estramgeyros e emquamto a fortelleza do lugar esta mais forte
comarca> de suas escprituras pruvicas do que he. e milhor repayrada tamto he mayor seguramça assy da fortelleza como de toda
Reposta: quamto he aos taballiãaes que sam repartidos mamdamos que se a terra outrossy he mayor proll e serviço e homrra vossa d’estar aportellada e
guarde a hordenaçom que acerca desto per nos he feita. E quamto he ao escpri- mall repayrada. Senhor aa vossa mercee praza saber que esta villa he fumdada
vam dos orfãaos se elle foy posto per el rey dom Joham meu avoo que Deus aja em serra homde nom ha outra pedra senom seixo tall puro e pedra muy maa
queremos que serva o dito seu officio em sua vida segumdo ja sobre esto he d’assemtar nem obrar com ella assy os muros d’arredor como d’alvenaria e
hordenado e depois de seu fallecimento esse comcelho o possa dar segumdo com call e argamassa e senhor sempre foy d’amtiigamente el rey vosso avoo
sua hordenamça e quamto he aas escprituras que a elle perteemcem de fazer que Deus tem em gloria e assi os outros rex quamdo alg?uas quebradas cahiam
aja o dito comcelho o trellado da hordenamça sobrello feita a quall mamda- em terra era compridoyro de se corregerem sempre puinha a call e os morado-
mos que se cumpra segumdo em ella he comtheudo. res e a terra dava a servidom e assy se husou sempre e se faziam as quebradas
(2) ¶ Outrossi senhor aa vossa mercee praza saber que per vossa carta e per dos muros quamdo cahiam e o lugar estava em sua fortelleza e nom desfalle-
vosso mamdado se faz ora em [fl. 127/1.ª col.] ribeyra que chamam Toa198 que cia a obra que assy era feita amte estava queda e esta firme pera sempre. E
agora senhor de pouco tempo cahirom aqui duas quebradas as quaaes senhor
198 Sic. Por Coa. se faziam com pedra e barro que muy pouco rimava a tall fortelleza como esta

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e tornam a cayr e caaem assi per mimgua de caall que se fossem feitas seme- 7
lhamtes obras d’argamassa seriam firmes pera sempre como ho sam outras que
assy som feytas arredor desta villa. E vossa mercee seja mamdar proveer estas
obras e as mamdar repayrar de call e d’alguum repayramento que lhe faz mes-
ter e esto [fl. 127v.º/1.ª col.] he vosso serviço.
Reposta: mamdamos ao corregedor da comarqua que sayba parte per si
como acerqua desto amtiigamente se custumou e quamto he o dano do dito 1459, Julho, 30, Lisboa – Capítulos especiais de Castelo Rodrigo (fr. c.
castello e no-llo faça todo saber per sua carta pera nos sobre ello proveermos Figueira de Castelo Rodrigo) às Cortes de Lisboa de 1459.
em aquella maneyra que for por nosso serviço e bem da dita villa.
(4) ¶ Outrossy senhor nos vos pedimos por mercee que porquamto aqui esta A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 36, fl. 163v.º.
h?ua soma d’armas de tempo amtiigo pera deffemssom desta villa e sam trimta B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 247-247v.º.
ou quoremta corpos de solhas e som tam velhas e deneficadas e os panos e
guarniçõoes dellas som ja podres e compria muito serem ja repayradas e reno- [fl. 163v.º] Aa villa de Castel Rodrigo capitollos espiciaaes per que el rey
vadas porque aimda podem viir a tempo que se averom mester e porem assy prometeo de nam dar as terras manynhas e as manter naqueles em que as sem-
pollo repayro destas armas como per outras alg?uas necessidades que com- pre manteveram os reys pasados e etc.
prem vossa mercee seja de nos proveer e fazer mercee d’alguuns resiidos que
em esta comarqua de Riba de Coa ouver e que per nosso procurador os possa- 199 Dom Afomso a quantos esta carta virem fazemos saber que nos 200

mos aver e demamdar sejam despesos e destrebuidos em alg?ua cousa que seja estando201 ora202 em a cidade de Lixboa em as cortes que ora nos em ella feze-
bõoa quer na dita obra da pomte ou em outra quallquer obra que a vossa mer- mos per Gill Fernandez e Fernand’Eannes procuradores da villa de Castell
cee vir que he meritoria e serviço de Deus e em esto senhor nos farees gramde Rodrigo nos forom apresentados certos capitollos e ao pee de cad’huum delles
mercee que de vos esperamos e etc. lhe mandamos poer nossas repostas como se adiante segue:
Reposta: mamdamos ao nosso comtador daquella comarqua ou ao almoxa- (1) O concelho e homees boos da villa de Castell Rodrigo beijamos vossas
rife della que saybam parte do repayramento que aas ditas armas he necessa- maaos co<mo> a nosso rey e senhor e nos encomendamos em vossa mercee aa
rio e do que sobre ello acharem no-llo façam saber per sua carta pera sobre ello quall praza saber que o primeiro 203 rey de que teemos memoria que cobrou
proveermos em aquella maneyra que por nosso serviço for compridoyro. esta villa e esta hirmindade de Riba de Coa que esta em este estremo de Cas-
¶ Os quaaes capitullos assy apresemtados Pedr’Eannes procurador da dita tella foy el rei dom Donis d’hu vos descendestes o quall deu privillegeo a esta
villa [fl. 127v.º/2.ª col.] de Castell Rodrigo nos pedio por mercee que lhe villa e lhe outorgou todos seus foros e seus custumes que de sempre ouveram
mamdassemos dar o trellado delles pera o comcelho da dita villa. E visto per e lhe outorgou que nunca 204 elle nem outros que delles205 decendessem dessem
nos seu requirimento mamdamos-lhos dar em esta nossa carta e etc em aa dicta villa e termos della a cavaleiro nem a rico homem nem a outra alguua
forma. Dada em a cidade d’Evora XXII dias de Março per autoridade do pesoa soomente fosse da sua coroa reall dando maldiçom aos que contra ello
senhor iffamte dom Pedro regemte e etc. Rodrigu’Eannes a fez. Anno do fossem etc.
Senhor Jhesu Christo de mill e IIIIc RVII.
199 Registado na margem: Castell Rodrigo.
200 Segue-se querendo fazer graça e mercee riscado e, depois, repete que nos.
201 Segue-se nas riscado.

202 Segue-se nas riscado.


203 Seguem-se letras riscadas.

204 Segue-se lhe riscado.


205 Sic.

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(2) Senhor a vossa alteza sabera como esta terra he em este estremo por bem 8
das guerras e trabalhos se despovorou e as terras que senpre forom aproveita-
das se meteram a montes e ora as gentes desta terra de L e LX annos ou mais
tempo depois que a Deus aprouve de poer a paz se meteram per esses montes
206 maninhos a que nom sabem donos e os aproveitam 207 assi pera pam como

pera vinho em guisa que a terra he aprov[e]itada e afruytada e he milhor e mais


serviço de Deus e vosso que estar em montes perdidos. E do que lhes Deus da 1468, Agosto, 2, Lisboa – Capítulo especial de Castelo Rodrigo (fr. c.
nunca souberom que era paguar trebuto alguum soomente dizimo a Deus do Figueira de Castelo Rodrigo) às Cortes de Santarém de 1468.
quall vos avees a terça parte e ora nos he dicto que alguuas pesoas pedem estas
terras que assi ronperom dizendo que estam manhiadas o que nunca foy nem A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 28, fl. 76v.º.
sabemos208. Pidimos aa vossa alteza que tall dadiva nom passe e nos mamte- B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 201v.º-202.
nhaaes no que senpre foy no que nos manteverom vossos avoos e padre e afar-
nos-ees em ello mercee. [fl. 76v.º] 209 A villa de Castell Rodrigo capitollo espiciall per que prouve a
¶ A esto repondemos que pedem bem e assi o faremos segundo requerem. el rey que eles posam com seus gados pacer e momtar nos termos de Pynhell e
¶ Pidimdo-nos por mercee o dicto Gill Fernandez e Fernand’Eannes por Tramcosso e per todo o regnno livremente.
parte do dicto concelho que lhe mamdasemos dar h?ua nossa carta com o
theor dos capitollos e com nossas respostas porque lhe eram necesarios e se Fig. 16 – Castelo Rodrigo (página inteira, ao lado)
entendiam d’ajudar. E nos veendo o que nos assi diziam e pidiam a nos Capítulos especiais do concelho de Castelo Rodrigo. Cortes de Santarém
prouve dello e lhe mamdamos dar segundo dicto he e porem mandamos ao de 1468.
corregedor da dicta comarca e a quaaesquer out[r]os nossos juizes e justiças a IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fl. 201v.º.
que esto perteenceer que lhe conpraaes e façaaes conprir e guardar en todo
pella guisa que em elles he comtheudo sem outro embargo. Dada em Lixboa Dom Afomso a quantos esta carta virem fazemos saber que nas cortes que
XXX dias de Julho. El rey o mandou per Fernam da Silveira coudell moor de ora fezemos na nossa nobre e senpre leall villa de Santarem pollos procurado-
seus regnos. Diogo Lopez a fez. Anno de mill IIIIc LIX. res da nossa villa de Castell Rodrigo nos foram dados certos capitollos amtre
os quaees era huum delles este com a reposta ao pee delle se segue:
(1) Outrossy senhor fazemos saber aa vossa mercee que o termo desta villa
de Castel Rodrigo he muy pequeno e a milhor coussa que temos pera repairo
de nossas vidas he a criaçom de gaado e bestas que em elle trazemos e criamos
e alem de seer asy nosso termo pequeno a villa de Pinhell e Trancosso e outras
villas a esta comarquãas tem privilegios antiigos que seus gaados possam
paceer e montar livremente per todos vossos regnos e que nenhuuns nom
paçam nem montem nos seus termos pollo quall alem de seus termos serem
muy grandes e o nosso muy pequeno e mais no malham e estremo que os seus
seus gaados montam e pacem em elle quamdo lhes praz e os nossos nom
206 Segue-se a que nom riscado. podem sair fora do nosso e se nos perdem por ello. E pero que vossa mercee
207 Segue-se assi riscado.
208 Segue-se que lhe, sem sentido, podendo o escrivão ter utilizado eventualmente a perna envolvente do h para
nos ja desse carta que livremente podessemos montar e paceer com nossos gaa-
cortar estas letras. Na Leitura Nova o escrivão escreve que, mas, apercebendo-se de que tal palavra não faz sen-
tido, risca-a. 209 Na margem esquerda: Castell Rodrigo capitollo.

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dos per todos vossos regnos elles nos nom querem conssentir que entrem em 9
seus termos per bem de seus privilegios. Pedimos aa vossa senhoria que a este
agravo nos proveja e pois 210 esta villa nos tenpos passados servio bem e fiell-
mente a coroa reall de vossos regnos e he h?a chave das principais desta
comarqa que nos dees carta que sem embargo de quaeesquer privylegios anti-
igos nem doutros alguns nem cartas capitollos nem alvaras que em comtrairo
tenham a dicta villa de Pinhell e Trancosso nem outras nenh?as nos possamos 1482, Janeiro, 15, Évora – Capítulos especiais de Castelo Rodrigo (fr. c.
com nossos gados paceer e montar em seus termos e per todos vossos regnos Figueira de Castelo Rodrigo) às Cortes de Évora/Viana de 1481-82.
livremente sem outra contradiçom. E em esto senhor nos farees muyta mercee
e derreito. A) IAN/TT, Chancelaria de D. João II, L.º 2, fls. 56v.º-57v.º.
A este capitollo respondemos que porquamto ante que em esto dessemos B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 164v.º-166.
[de]trimynaçom quissemos aveer desto verdadeira enformaçom a quall ja
temos avida e achamos seer como nos dizees e alegaees e avemdo respeito aos [fl. 56v.º] Capitollos de Castell Rodrigo
serviços que a dicta villa tem fectos aa coroa real de nossos regnos e querendo-
lhos guallardoar em alg?a parte a nos praz conprirmos em ello vosso requeri- Dom Joham etc. a quantos esta carta virem fazemos saber que aas cortes
211

mento e vo-llo outorgamos segundo per vos he pedido. que ora fizemos por parte dos juizes procurador e homeens boons da villa de
E porem mandamos ao regedor da nossa justiça na dicta comarqa e a Castell Rodrigo per Joham Lourenço que por procurador da dicta villa aas dic-
todallas outras nossas justiças de nossos regnos que asy vo-llo conpram e tas cortes foy envyado nos foram apresentados certos capitollos dos quaees
façom conprir sem outro enbargo nem duvida que huns nem outros sobre com nossas repostas a elles dadas ho theor he este que se adiante segue:
ello vos ponham porque asi he nossa mercee e quallquer que vos contra ello (1) Item senhor vossa mercee sabera que enquanto os juizes e oficiaaes e
for e vos nom conprir e guardar esta carta enteiramente avemo-llo por homeens boons da rolaçam foram todos de dentro da dicta villa acrec[e]nta-
condenado na pena dos nossos encoutos que sam VI soldos os quaees vam muyto nas liberdades e privilegios e rendas do concelho antre as quaees
mandamos ao nosso almoxarife da dicta comarqa que pera nos recade e ao rendas avia huum forno do concelho em que todos coziam afora 212 vasallos
scprivam de seu oficio que os ponha sobre elle em recepta. Dada em a nossa que tinham fornalhas em que coziam seu pam e mais nam o quall rendia em
cidade de Lixboa dous dias d’Agosto. Antam Gonçallvez a fez. Anno de cada hum anno V e VI reais da quall renda o dicto concelho com outros ache-
Nosso Senhor Jesu Christo de mil e IIIIc LXVIII. guos tem comprado muitas terras de pam em que lavram e prados e hervas
pera seus boois e outras posisooes que em cada hum anno rendem pera o dicto
concelho sobre o quall forno Fernam Cabrall adiantado na dicta comarqua
determinou que todos fossem cozer a elle sob certas penas e estando asy o
dicto concelho em posse de cozer e arrendar seu forno tanto que os oficiaes do
termo entraram loguo hy leixaram destroyr e danificar e asy outras rendas
nom esguardando a perda que a todos tangia e ora o dicto concelho querendo
recobrar e tornar a cozer ao dicto forno como dantes fazia por escusarem mui-
tas fintas em que os pobres nom podiam pagar e por seer grande proveito do

211 Na margem esquerda regista-se: capitolos de Castel Rodrigo; Castel Rodrigo; Capitolos de cortes especiaes

per que he provydo a cousas imsertas na dicta carta.


210 Segue-se em riscado. 212 Segue-se uma letra riscada.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

concelho huum Joham Borges que he ouvidor da dicta villa por ser afeiçoado por dia de Natall dous jurados segundo custume antiguo os quaees sam enle-
com allguuns criados do conde e por demenoyr as rendas do concelho e as hy gidos por a mayor parte dos moradores de cada h?a aldea e des que asy sam
nom aveer jullgou e mandou que cada huum fezesse forno se quissesse o que enlegidos vãao receber juramento que lhes ha-de seer dado per os juizes da
senhor he grande perda do concelho. Pedimos a vossa alteza que mandees que dicta villa e des que asy sam escolheitos e juramentos recebidos o ouvydor do
se cumpra o desembarguo do adiantado que sobre ello pasou pois que per elle conde e os juizes hordenayros escusam os que querem e pasam alvaraes pera
ja foy determinado e ho sentyo por grande proveito do concelho e em esto os lugares que enlejam214 outros quaees elles querem e muitas vezes acontece
senhor farees mercee. que pasam primeiro XV ou XX dias que hy aja jurados nas dictas aldeas
Responde el rey que manda ao adiantado ou a quem o carreguo tiver que se levando dos que asy escusam serviços e outras coussas. Pidimos a vossa alteza
enforme loguo disto e veja o mandado que sobre ello he pasado e asy o que que mandees que nenhuum ouvidor nem outra pesoa nom possa escusar nem
pasou o ouvidor do conde e o derreito e posse que o concelho senpre teve e tirar nenhuum dos dictos jurados des que forem postos e enlegidos salvo tendo
nom consenta que se faça nenh?a coussa contra justiça nysto. tall privilegio de vossa mercee per que per derreito possa seer escusso e em esto
(2) Item senhor vossa mercee sabera que antre a dicta villa de Castell senhor nos farees mercee.
Rodrigo e a villa de Pinhell passa huum ryo que chamam Coa em o quall ryo Responde el rey que pedem bem e que manda aas suas justiças que o cum-
estaa huum vãao que se chama o Porto da Vide pello quall vãao os moradores pram asy como no capitolo he contehudo.
da dicta villa de Castell Rodrigo e seu termo senpre per ell andaram d’antiguy- (4) Item senhor vossa mercee sabera que o alcaide que ora he em a dicta
dade sem nenh?a pesoa lho contradizer asy com bestas de carregas como com villa por seer ouvidor com poder de seus oficios faz em cada huum ano em
boois e carros por seer muito chãao e derreito pera a villa de Mariaalva e pera quaeesquer aldeas do termo da dicta villa que pode aveer terras pera poder
Trancosso e asy pera outros muitos logares e ora senhor de pouco tempo pera lavrar de pam faz h?a seara as quaees lhe os lavradores lavram duas e tres
qua o marichall alcaide moor da dicta villa 213 quer que lhe vãao fallar <todos> vezes e lha semeam e seguam e apanham ate lhe pooer todo seu pam na eira e
ao castello sem enbargo de sermos conhecidos e escussos de nom paguar por- esto fazem com temor dos oficios que tem mais que por nenh?a obrigaçam em
tagem e de termos nosso privilegio registado no livro da camara da dicta villa que lhe sejam e muitas vezes alguuns pobres perdem o seu por apanhar o alheo
e elle seer sabedor dello e pero que [fl. 57] asy sejamos conhecidos nos defende e ainda os jurados das aldeas os apenam per as cassas que vam lavrar contra
que nom andemos pello dicto caminho vaao do quall caminho nos tem toma- suas vontades e lhe executam as penas dando consentimento o ouvidor e os
das muitas bestas e carreguas de pescado e sall e outras mercadorias dando juizes per a jurdiçam seer do conde. Vossa alteza mande que n[e]hum nom
grande opresam e perda aa dicta villa e termo. Pedimos a vossa allteza que pois possa seer costrangido nem rogado pera serviço das dictas pesoas nem de
somos escussos de nom paguar portagem e tam cerquaaos e conhecidos com outras e quallquer que geira deer ou pedir que pague certa pena pera a vossa
todos os da dicta villa de Pinhell que mandees que livremente posamos andar camara porque doutra guissa nom se guardara nem executara e em esto senhor
e passar per o dicto porto com nossas bestas e carregas e outras quaaesquer nos farees mercee.
coussas que nos necesairas forem sem hir fallar aa dicta villa de Pinhell nem Responde el rey que pedem bem e que asy ho ha por seu serviço e que todos
descaminhar segundo que elles fazem em a dicta villa de Castell Rodrigo e seu aquelles que tiverem jurdiçam ou oficios seus ou do concelho que se lhe nom
termo que pasam sem hir fallar e em esto nos farees mercee. dem nem recebam as dictas geiras nem as peçam sob pena de quatro mill reais
Responde el rey que o marichall mostre des quinze dias do mes de Janeiro a pera a sua camara e a metade pera quem o acusar.
hum mes primeiro seguinte o forall da villa de Pinhell pera seer visto e se o nom (5) Item senhor vossa mercee sabera que em termo da dicta villa estam qua-
mostrar ante do dicto mes seer passado que ha por bem que se faça como pedem. tro aldeas.scilicet. Arreigada e Fontenares e Cinquo Villas que sam em
(3) Item senhor sabera vossa mercee que em termo da villa de Castello comenda da hordem de Christo e a Torre dos Frades que he do moesteiro de
Rodrigo ha doze aldeas de bõa cantidade de gente e em cada h?a dellas se põoe Santa Maria d’Aguyar as quaees aldeas se aproveitam e gozam de todos privi-

213 Segue-se nom riscado. 214 No texto enlegejam com as letras ge riscadas.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

legios e liberdades que a dicta villa tem e no tempo das guerras e doutros tra- 10
balhos nom querem vellar nem rolldar na dicta villa nem outrosy nom querem
contrebuyr nem pagar nas fimtas e taixas que se lançam pera os mesejeiros que
vem aas cortes como hora vem nem em certas despesas que se fazem por proll
e honrra da dicta villa e liberdades della. Vossa alteza nos de vossa carta que
pois que vivem em termo da dicta villa e gozam de todos os privilegios e liber-
dades que vellem e roldem com todos os outros que na dicta villa e termo 1444, Janeiro, 22, Évora – Capítulos especiais da irmandade de Riba de
moram e asy paguem em todas as fintas e taixas que [fl. 57v.º] forem <lança- Côa (que inclui as sete vilas acasteladas de Sabugal, Alfaiates, Vilar Maior,
das pera> proll e honrra da dicta villa pois que della galardam ham e em esto Castelo Bom, Almeida, Castelo Rodrigo e Castelo Melhor) às Cortes de Évora
senhor nos farees mercee. de 1444.
Responde el rey que pedem bem e que manda que asy se faça salvo se
alguuns taaes privylegios tiverem per que per derreito o nom devam de fazer e A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 24, fl. 12v.º.
tendo-os comete todo a<o> seu adiantado ou a quem seu carreguo tiver que Publ.: Humberto Baquero Moreno, “A irmandade de Ribacoa dos fins do
ouça as partes a que pertencer e proveja sobre ello dando apellaçam e agravo. século XIII”, in Os municípios portugueses nos séculos XIII a XVI. Estudos
Dos quaaes capitollos com as dictas nossas repostas o dicto Joham de História, Lisboa, Editorial Presença, 1986, pp. 31-32.
Lourenço procurador nos pedio que lhe mandassemos dar o trellado
porquanto se entendia delles ajudar e nos visto seu requerimento lhe [fl. 12v.º]215 Dom Affomso etc. a vos corregedor da comarqua e correiçom
mandamos dar o dicto trellado em esta nossa carta pella quall mandamos a da Beira e a todollos outros juizes e justiças oficiaes e pesoas de nossos reinos
todollos nossos corregedores juizes e justiças oficiaaes e pesoas a que o a que desto o conhicimento per quallquer gisa <que seja> pertencer e esta carta
conhecimento desto pertencer per quallquer guissa que seja que c[u]mpram e for mostrada saude. Sabede que os concelhos da irmandade de Riba de Coa
guardem e façam inteiramente cumprir e guardar as dictas nossas repostas nos enviaram h?a carta em que se continham certos capitollos aos quaaes
como em ellas he contheudo sem outra duvida nem enbarguo que a ello demos nossa reposta ao pee de cada huum dos quaes capitollos ho theor tall
ponhaaes porque asy he nossa mercee. Dada em a nossa cidade d’Evora a XV he:
dias do mes de Janeiro. Joham Diaz a fez. Anno de Nosso Senhor Jhesu (1) Senhor os vossos concelhos da irmandade de Riba de Coa homildosa-
Christo de mill IIIIc LXXXII. E eu Alvaro Lopez secretario do dicto senhor mente e com grande reverença enviamos beijar vossas maaos e encomendar em
rey a fiz escrepver per seu mandado. vossa mercee a quall praza saber que em esta irmandade som sete castellos
Sabugal e Alfa[ia]tes216, Vilar Maior e Castell Boom, Almeida e Castell
Rodrigo e Castell Melhor e todas estas villas 217 com suas aldeas foram de Cas-
tella e avemos que o primeiro rei de Purtugall que as cobrou foy el rei dom
Denis cuja alma Deus aja e a terra cobrada mandou chamar os concelhos e
confirmou-lhes todollos hussos e custumes e foros e privilegios que elles dan-
tes aviam em seendo asy de Castella e mais deu a estes concelhos privilegios
e218 em que jurava e prometia de nunca estas villas com suas aldeas dar nem

215 Regista-se na margem, de forma espaçada, as seguintes palavras: capitulos; Riba de Coa; Sete castellos e,

novamente, Sete castellos.


216 Omite as letras ia ao mudar de linha.

217 Segue-se fo riscado.


218 Sic.

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leixar a ifante nem a cavaleiro nem a outra neh?a pessoa219 mais que fossem Requeiram ao corregedor ao quall mandamos que lhe faça fazer logo paga-
suas e dos reis que depos elle veesem e deitou benço a todollos sobcesores que mento realmente e com asento.
depos ell veesem que guardasem e mantevesem a dicta posse e privilegios que (4) Outrosy senhor fazemos saber a vossa mercee que muytos homes ha em
per elle eram confirmados e quallquer que os quebrasse seja maldito e aja a sua esta hirmindade que nom querem bem viver nem amar vosso serviço nem da
maldiçom das quaaes honrras e privilegios nos senpre forão guardadas ataa terra e por serem escusados de nom servirem com os concelhos nem pagar com
morte del rei dom Joham vosso avoo cuja alma Deus aja em sua gloria220 e ell elles em fintas nem em talhas que avemos mester por honrra da terra [e] vosso
finado logo se o conde de Mariaalva e dom Duarte de Menesses e Joham de serviço se fazem dos alcaides e os dictos alcaides os tomam e os defendem o
Gouvea apoderam em esta terra e pooem alcaides de saas maaos porque os que he grande perjuizo ao dicto concelho por que vos pedimos por mercee que
dictos concelhos nom querem teer outra voz senom del rei nos buscam e fazem a taaes como estes que nom som caseiros nem amos nem seus criados mandees
muytas sem razooes e lhes dam gentes com que a terra he toda destroida e ja que pagem em finta e talha com os dictos concelhos e se nom quiserem pagar
por vezes enviamos saber a vossa mercee o mall e sem razom que os ditos con- sejam devassos e pagem portagem e montados em toda a irmindade e nom
celhos recebiam e nunca dello aveemos gallardom se a vossa mercee a esto ajam nem gozem dos privilegios que a dicta irmindade tem e em esto nos farees
nom acude a terra he perdida e se despovoa de cada hum dia os custumes mercee.
senhor que nos sempre em esta terra ouvemos pacer as hervas bever as augas Bem pedem porem mandamos aos juizes que aquellas pessoas que forem
e cortar os montes e andar pellos caminhos sem pagar portagem nem outra escusadas per ordenaçom ou privilegios que aquellas escussem e as outras nom
costumagem asy como se vivesemos todo[s] em huum lugar por que vos pedi- posto que sejam acostadas ao alcaide ou a outro fidalgo.
mos por mercee que nos dees vossa carta que nom pagemos portagem e husse- Porem vos mandamos que asy o façaaes conpriir como per nos he
mos como senpre hussamos. mandado. Hunde al nom façades. Dada em a cidade d’Evora vinte e dous
¶ Se privilegio tem pera nom pagar portagem requeiram que lho conpram e dias do mes de Janeiro. El rei ho mandou per o doutor Ruy Gomez
guardem e se o fazer nom quiserem tragam estormentos com reposta e ser-lhe- d’Alvaremga seu vasallo221 do222 seu desembargo e das pitiçoes e per o doutor
a proveudo. Beleauga deam da Guarda outrosy do seu desenbargo. Affomso Trigo a fez.
(2) Outrosy senhor fazemos saber a vossa mercee que em esta irmindade Ano do Nacimemto de Noso Senhor Jhesu Christo de mill IIIIc RIIII anos.
ouvemos senpre em costume de os concelhos porem juizes e vereadores e ofi-
ciaaes pera regerem a terra sem mandado do corregedor e agora ho corregedor
desta comarca o nom quer consentir dizendo que asy lhe he mandado per vos.
Os concelhos recebem em esto grande perda porque a rogo dos alcaides som
postos alguns juizes que som pella sua parte asy como se mostra per estes jui-
zes de Castell Boom e per outros taaes semelhantes por que vos pedimos por
mercee que mandees que os concelhos os ponham per sy sem fazer saber ao
corregedor e a terra estara em paz.
¶ Mandamos que se senpre o teveram de costume que lhes seja guardado.
(3) Outrosy senhor saibha a vossa mercee que o conde de Mariaalva veeo a
Castell Boom lugar desta irmindade e tomou em Sam Pedro termo desta villa dez
e oyto almudes de vinho a huum lavrador e nom os pagou nem paga. Pidimos-
vos por mercee que os façaaes pagar e monta em cada huum almude LXII reais.

219 Segue-se mais que fossem riscado. 221 No texto vaasallo com o segundo a riscado.
220 No texto: grolia. 222 No texto: dos.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

11 cartas e foro mando que lho filhedes e lho tenhades pera meu mandado e ho
que filhardes assy filhade-o peramte huum tabaliam e emviade-mo dizer per
estormento pruvico e quamto he ao que ja tem comprado ou ganhado que
aymda nom temdes filhado fromtarde-lhes peramte huum tabaliam que do dia
desa f[r]omta a dous meses vemdam hessas posyssõoes a taaes pesoas 225 que
sejam de vosa condiçam e que façam vizinhamça em todallas cousas comvos-
1[32]5223, Abril 26, Évora – Capítulos especiais da Guarda às Cortes de quo e paguem a mym os meus foros e direitos e que servam a mym com seus
Évora de 1325. corpos quamto mester for e se alguuns dos sobreditos dyserem que nom que-
rem leixar as ditas posyssooes que ja tem compradas porque ham alg?ua
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fls. 107v.º-108. razam com direito per que acham e devem e podem reter mando ao tabaliam
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval. Posição, Morfologia e Socie- dessa villa que lhos empraze que do dia desse emprazamento a dous nove dias
dade (1200-1500), [Cadernos da Revista de História Económica e Social, 9- venham peramte minha corte a mostrar rezam per que os devem 226 reter ou
10,] Lisboa, Livraria Sá da Costa Editora, 1987, doc. I, pp. 163-164224. direito alguum se o ham pera ave-llas; outrosy emprazade hese concelho que
per seu precurador venham ao dito dia peramte a minha corte pera ver o
[fl. 107v.º/1.ª col.] ¶ Dom Afomsso per graça de Deus rey de Purtugall e do direito que mostrarem os sobreditos pera reter as ditas posyssoees.
Alguarve a vos juizes da Guarda saude. (2) Outrosy me emvyou dizer que o Jermello he no seu termo e que da povora-
(1) Sabede que o comcelho dessa villa me emvyou dizer que cavaleiros e çam da terra <que> quamdo apelavam que as apelaçõoes dy vinham aos juizes da
escudeiros e donas e creliguos e hordens compraram em essa villa e ganharam Guarda e husavam no dito loguo de toda minha jurdiçam assy como nas outras
e em seus termos erdades e posyssooes comtra seu foro no quall dizem que he aldeas do seu termo e que esto lhe foy embarguado per [fl. 108/1.ª col.] Afomsso
contheudo que n[e]huum dos sobreditos nom comprem nem ganhem no dito Samchez pello gramde poderio que aviam como eu sabia e todollos da terra.
loguo e o que hy comprar perca a erdade e o que a vemder peite cem maravi- E este tenho eu por estranho del nem outro n[e]huum querer embargar a
dis e que sobre esto ouveram cartas del rey dom Denis meu padre a que Deus minha jurdiçam e os meus direitos e outrosy de vos sofrerdes de se esto fazer
perdoe e de meu avoo nas quaaes mandava que se comprisse e guardasse seu per que vos mando que vos husedes nas ditas coussas no dito loguo de Ger-
foro e pediam-me por mercee que eu lhes quisese guardar seu foro e as ditas mello assy como sempre husastes e tambem em justiça como em todo ho all e
cartas de meu padre e de meu avoo que sobre esto tinham. nom comsemtades a n[e]huum poderosso que seja que esto embargue.
E eu vemdo que me pediam direito tenho por bem e mando-vos que nom (3) Outrosy me emvyaram dizer que aldea de Codeseiro della povoraçam da
sofrades que n[e]huum dos sobreditos comprem nem ganhem des aqui adiante terra ataa o tempo da descordia que foy amtre mym e meu padre os do dito
em essa villa nem em seus termos comtra has cartas e defessas dos meus ante- loguo vyesem sempre a seu alardo desse comcelho da Guarda e pagarem com
cesores sobreditos nem comtra seu foro e mando que as ditas cartas lhe sejam elles nas fimtas e talhas e vynham a Guarda jurar aos juizes que fiziam com
guardadas em todo assy como em ellas he comtheudo [fl. 107/2.ª col.] e quall- elles todallas outras cousas como com seus aldeannos e que agora cavaleiros e
quer dos sobreditos que daquy em diamte comprar ou ganhar comtra as ditas outros embargam as ditas cousas.
Por que vos mamdo que huusedes nas ditas cousas assy como sempre huu-
223 No documento regista-se «Era de mill e satemta e tres annos», o que corresponde ao ano de 1[3]35. No
sastes e que nam sofrades a n[e]huum 227 que vos hy ponham embarguo e estas
entanto, nesse ano não se realizou qualquer reunião de Cortes. Aliás, em todo o reinado de D. Afonso IV só se sobreditas cousas compride e guardade e nom sofrades a n[e]huum que vos
realizaram Cortes na cidade de Évora no ano de 1325, precisamente no mês de Abril (cfr. Cortes Portuguesas.
Reinado de D. Afonso IV (1325-1357), edição preparada por A. H. de Oliveira Marques, Maria Teresa Cam- 224 Publica-se o documento com o ano de 1335. Veja-se, na nota anterior, a crítica a esta data.
pos Rodrigues e Nuno José Pizarro Pinto Dias, Lisboa, INIC, 1982). Tendo em consideração este aspecto, 225 Segue-se que sejam riscado e depois repete que sejam.
parece-nos crível e muito provável que se trate de um erro da Leitura Nova, em que «sasemta» foi tomado por 226 Segue-se a letra e, mas a sua inclusão na frase retira-lhe o sentido.

«satemta», o que explicaria esta inusitada data. 227 Segue-se que vos riscado e depois repete que vos.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

sobre esto faça mall nem força sob penna da minha mercee e nom leixedes a 12
fazer por medo nem por recto nem por ameaça nem por defessa que vejades de
n[e]huum e se vo-llo alguum fizer emvyade-mo dizer pera o eu estranhar como
for minha mercee e mando a esse comcelho que vos hajude a comprir e guar-
dar todas estas cousas.
Homde all nom façades senam a vos me tornaria eu porem e estranhar-vo-
hey nos corpos e nos dinheiros e assy como aquelles que vam comtra 1395, Janeiro, 2, Coimbra – Capítulos especiais da Guarda às Cortes de
mandado del rey e de senhor. [fl. 108/2.ª col.] Damte em Evora a XXVI dias Coimbra de 1394.
do mes d’Abrill. El rey o mandou per Stevam Periz envogado e per Vasquo
Estevez seu creliguo e seu precurador. Martim Annes a fez. Era de mill B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fls. 108109.
[trezentos]228 e satemta229 e tres annos. Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. II, pp. 164-166.

[fl. 108/2.ª col.] ¶ A dita cidade da Guarda outra carta com o theor de cer-
tos capitollos per que os moradores da dita cidade nam paguem portagem e
lhes guardem o privilegio do montado e o forall acerca dos amdadores e que
com aldea de Touro usem como na sentença he comtheudo.

¶ Dom Joham per graça de Deus rey de Portugall e do Alguarve a quamtos


esta carta virem fazemos saber que em estas cortes que ora fizemos em esta
cidade de Coimbra nos foram dados por os precuradores do concelho da nossa
cidade da Guarda que as ditas cortes vieram em nome do dito concelho nos
foram dados artigos especiaaes amtre os quuaaes nos derom estes ajusso scpri-
tos e nos demos a elles nossa reposta pella guissa que he contheudo ao pee de
cada huum capitollo primeiramente:
(1) Outrosy senhor per el rey dom Samcho e per el rey dom Afomsso foy
dado foro a esta cidade o quall he asynado per os ditos reix e asellado com seus
sellos de chumbo no quall he contheudo que n[e]huum nom tome montado
dos guados da dita cidade e outrosy no dito forall he comtheudo que os da dita
cidade nom paguem portagem em todo seu regno o quall forall nos foy outor-
gado per vos e despoys foy mercee del rey dom Afomsso vosso avoo de man-
dar que todollos moradores da dita cidade do corpo della nom paguasem
portagem em todos seus regnos e vos despoys que a Deus prouve de vos poer
em estado fezestes mercee [fl. 108v.º/1.ª col.] a esta cidade que todos os mora-
dores della nom pagassem portagem nem usagem custumagem e usamdo estes
comcelhos destes privilegios quamdo fezestes cortes em Visseu destes vossa
228 Tratando-se de uma carta de D. Afonso [IV] (logo no início do texto refere-se «el rey dom Denis meu
carta asynada per Gomçallo Periz e Martym da Maya veedores da vossa
padre»), a omissão do século não levanta problemas de datação. fazemda que nom guardasem a dita carta de portagem salvo aos moradores da
229 Sic. Provavelmente por sasemta. Cfr. supra, nota crítica à data deste documento.
dita cidade. E por se esta cidade e termo della milhor povorar pedimos-vos por

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

mercee que nos dedes vosa carta em que nos guardem o dito foro assy na por- cidade no que recebemos gramde agravo [fl. 109/1.ª col.] no que vos pedimos
tagem como no montado e outro nos guardem a vossa carta que da portagem por mercee que quamdo for guerra venham vellar e roldar a esta cidade.
e husagem e pasagem e custumagem que nos destes nas cortes de Coymbra Outrosy paguem e servam com os deste comcelho nas fimtas talhas que elle
nom embargando a dita carta que assy comtra elle despoys destes e que quall- lamçar.
quer que comtra ella for que mandedes que seja citado perante vos. Item mandamos que usem como os das ditas aldeas pella guissa que na sen-
A esto respondemos que lhes guardem seus privillegios na parte do mon- tença he contheudo e custumaram de o usar e na parte do roldar quamdo for
tado e na parte das portajeens sejam escusados os do corpo da cidade per a guerra mandem-lhe seu recado e fara sobre ello ho que for seu serviço.
guisa que per seu avoo e per nos foy mandado. (4) Outrosy senhor fazemos saber a vossa mercee que per vos e per os reix
(2) Outrosy senhor fazemos saber a vossa mercee que em hum foro desta que amte vos foram nos foram outorgados todos foros e privilegios e custumes
cidade he comtheudo que hos aldeãos paguem aos amdadores senhas oytavas de que sempre husaram ataa ora e foy husso e custume desta cidade que
de triguo e os da villa mea oytava e hos andadores preitejaram com alg?uas quando alguum acha algum gado em dapnno na sa vinha ou em seu pam ou
aldeas que pollo triguo lhes dessem dinheiros certos no que no dito forall nom em orta ou souto ou pomar ou em outro lugar quallquer que seja o senhor do
faz mençam que o podessem fazer e ora as gemtes sam tam poucas que os dano seja creudo per seu juramento e aja per<a> sy toda a coyma e se o jurado
andadores nom podem ser bem pagos porque muytas aldeas lhes nom querem achar o guado fazer dapno que o jurado aja huum terço e o comcelho ho outro
mais pagar que dous soldos da moeda antigua por que vos pedimos por mer- e seu dono do dano outro e ora Mend’Afomsso juiz por vos em esta cidade
cee que mandedes que todos os aldeãaos e outrosy hos [fl. 108v.º/2.ª col.] da julga que todas has coimas sejam per o comcelho. Porem vos pedimos por mer-
dita cidade paguem aos ditos andadores como he contheudo no foro da dita cee que mandedes que se guarde o custume amtiguo e se paguem as coimas
cidade sem embarguo da dita avemça que assy fizeram os ditos andadores pois como se sempre pagaram.
nom avia poder de o fazer. E praz-nos que lhe guardem seu custume.
A esto respomdemos que se guarde o forall per aquella guissa que em elle he E pediram-nos por mercee os precuradores da dita cidade da Guarda que
comtheudo salvo se da outra parte for mostrada razam com dereito por que se lhes mandasemos dar os ditos artiguos em nossa carta com o nosso sello
nam deve agardar. porque s’emtendiam d’ajudar delles e nos mandamos-lhos dar e porem
(3) Outrosy senhor fazemos a saber a vossa mercee que a ordem de Chris- mandamos a todollos ouvidores corregedores juizes justiças dos nossos
tus ha em termo desta cidade h?ua aldea que chamam Touro o quall lugar he regnos e a outros quaaesquer officiaaes e pessoas que esto [fl. 109/2.ª col.]
nosso termo e nos feitos cives apelam pera esta cidade e desta cidade apelam dever e que esta carta for mostrada que cumpram e guardem e façam
pera vos e nos feitos crimes nom ham poder de conhecer salvo a premderem os comprir e guardar os ditos artigos pella guissa que per nos sam outorgados e
malfeitores e trage-llos pressos a esta cidade e esta cidade fazer direito delles. nas repostas delles he contheudo e nom vãao nem comsentam hir comtra
Outrosy no dito lugar de Touro n[e]huum tabeliam nam daa hy fee salvo hos elles em n[e]h?ua guissa que seja que nossa mercee he de lhe serem
tabaliãees desta cidade e dam outrosy em cada huum anno I jamtar ha este compridos e guardados e al nom façam. Damte em Coymbra a dous dias do
comcelho e ham d’ir com a syna delle homde quer que for e todo esto he jul- mes de Janeiro el rey o mandou per Alvaro Pirez escollar em Leix coniguo de
gado per el rey dom Denis. Outrosy ho mordomo do dito comcelho vay Lixboa juiz de seus feitos a que esto mandou livrar nom semdo hy os do seu
penhorar por as divydas que devem os moradores do dito loguo de Touro. desembarguo. Gomçallo Caldeira a fez. Era de mill e IIIIc XXXIII annos.
Outrosy vam os amdadores e porteiro deste comcelho ao dito lugar de Touro
citar e penhorar e constranger assy como em cada h?ua das outras aldeas que
sam do termo desta cidade e quamdo vem guerra vãao-se todos ao Sabugall. E
toda esta guerra esteverom alla e nom querem aquy vir velar nem roldar nem
querem pagar em finta nem em talha ho que he comtra direito estarem em
nosso termo e nom usarem comnosco como usam os lugares do termo desta

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

13 tra ella hyr em n[e]h?ua guy[fl. 103v.º/2.ª col.]ssa ca nossa mercee he talemte he
de lhe assy ser comprida e guardada nom embargamdo que ja assy per nos fosse
mandado que lhe nom guardassem salvo a do dito nosso avoo a que Deus per-
dooe o quall mandado avemos por n[e]huum e que ajam de gouvir da dita
nossa carta como em ella per nos he mandado homde all nom façades.
E em testemunho 232 desto lhe mandamos dar esta nossa carta. Dada em
139[6]230, Maio, 8, Santarém – Capítulo especial da Guarda às Cortes de Samtarem a VIII dias do mes de Mayo. El rey o mandou per Ruy Louremço
Santarém de 1396, inserido em carta régia. lecemceado em Degredos adayam233 de Coymbra e per Joham Affomsso
escollar em Leix seus vassallos ambos do seu desembarguo. Vasquo Martinz
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 103v.º. a fez. Era de mill e IIIIc XXXIII234.
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. III, pp. 166-167.

[fl. 103v.º/1.ª col.] ¶ Dom Joham per graça de Deus rey de Purtugall e do
Alguarve a todollos juizes e justiças dos nossos regnos e a quaaesquer outros
que desto ouverem o conhecimento e esta carta virem saude.
(1) Sabede que o comcelho e homens boons da nossa cidade da Guarda nos
emviaram dizer a estas cortes que ora fizemos em Santarem que el rey dom
Afomso nosso avoo a que Deus perdoe fez mercee a dita cidade em que man-
dou que todos os que em ella morasem nom pagassem portageens em todo
seus senhorios231 e que outrosy ouveram de nos carta per que os da dita cidade
e termo nom pagassem portagens custumageens per todos os ditos nossos reg-
nos e que tendo assy sobre ello nossa carta que viemos a dar outra nossa carta
per que se nom guardasse a que assy ja de nos tinham e que lhe guardassem a
que tinham do dito nosso avoo por a quall razam dizem que a mayor parte dos
moradores do termo da dita cidade que pera ella trazem os mantimentos se
vãao da dita cidade e termo a morar a outras partes o que dizem que a nos
nom he serviço nem proll da terra e pediram-nos sobre ello mercee e nos
vemdo o que nos asy dizer e pedir emviaram e queremdo-lhe fazer graça e mer-
cee temos por bem e mandamos que todos os do seu termo ajam os ditos pri-
vilegios pella guissa e comdiçam que os da dita cidade ham.
E porem vos mandamos que vejaes a dita carta que assy demos e de nos sobre
ello ja ouveram e tem e compride-lha e fazede-lha comprir em todo e per todo
pella guyssa que em ella he contheudo e nam lhe vades nem consemtades com-

230 No único texto que se conhece destes capítulos especiais, o da Leitura Nova, regista-se a «Era de mill e IIIIc
XXXIII», ou seja, o ano de 1395. Estamos, contudo, perante um erro de cronologia, dado que em 1395 não se 231 Sic.
realizaram quaisquer Cortes. Como se alude às Cortes de Santarém, que tiveram lugar no ano de 1396, e, de 232 Segue-se desto riscado, porque repete a palavra.
facto, as cartas que saíram dessas Cortes foram passadas entre os dias 8 e 10 de Maio de 1396 (Armindo de 233 Sic.

Sousa, As Cortes Medievais Portuguesas…, vol. I, p. 313), a data correcta deverá ser 8 de Maio de 1396. 234 Sic. Veja-se a nota crítica à data deste documento.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

14 com os moradores na cidade e termo e nom doutra guisa e hi venham os cont-


hiados ao dicto alardo e se perventura o coudel os quiser constranger que vãao
ao alardo hu elle morar ou a outra parte seja certo que lhe tiraremos ho dicto
officio e o daremos a outrem e posto que queira veer alguum conthiado em
special mandamos que o nom possa veer salvo em a dicta cidade sob pena de
perder ho officio como dicto he.
1436, Abril, 14, Estremoz – Capítulos especiais da Guarda às Cortes de (2) ¶ Outrossy senhor d’antiigamente ouvemos em custume de o anadal dos
Évora de 1436. besteiros viver em a dicta cidade e jugarem a besta em a dicta cidade cada
Domingo como per vos he hordenado e ho anadal que ora he vive fora h?a
A) IAN/TT, Chancelaria de D. Duarte, L.º 1, fls. 216-217. legoa e mea entanto que elles nom husam do que lhes he mandado [fl.
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. IV, pp. 167-168; 216v.º/2.ª col.] pera saberem quãaes comprem a vosso serviço quando fosse
Chancelarias Portuguesas. D. Duarte, vol. I, tomo 2 (1435-1438), Centro de mester e ainda he peyor que quando acontece que os juizes ham mester
Estudos Históricos, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 1998, doc. 1180; alguuns beesteiros pera hirem por vosso serviço com alguum preso ou com
Cortes Portuguesas. Reinado de D. Duarte: Cortes de 1436 e 1438, Centro de dinheiros ante ho vãao buscar onde assy vive entanto que desto se segue muito
Estudos Históricos, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2004, pp. 55-57. trabalho e fadiga. Seja vossa mercee que mandees aos juizes que lhe ponham
pena que venha viver aa dicta cidade e que faça jugar os dictos beesteiros como
[fl. 216/2.ª col.] Capitullos da Guarda. per vos he hordenado.
¶ A esto vos respondemos que pediis bem e mandamos que assy se faça ou
[fl. 216v.º/1.ª col.] Dom Eduarte etc. a quantos esta carta virem fazemos requeiram o anadal moor que faça anadal pequeno tal que more na cidade
saber que em as cortes que ora fizemos em a nossa cidade d’Evora nos forom conthinuadamente.
dados certos capitullos speciãaes per os procuradores da nossa cidade da (3) ¶ Outrossy senhor vos pedimos que nos mandees dar os horfãaos aos
Guarda que vierom as dictas cortes os quãaes som estes que se seguem com a235 vasallos e cidadãaos talhando-lhas soldadas como he contheudo nas hordena-
respostas a elles dadas: ções.
(1) ¶ Senhor somos muito agravados per razam do vosso coudel e cou- ¶ A esto vos respondemos que pediis bem e mandamos que assy se faça.
delaria que vossa mercee foy de dardes a Afonso Annes scudeiro criado de (4) Item senhor vos pedimos que qualquer 236 comprar ou vender besta ou a
Joham Rodriguez que vive em Valhelhas que som boas tres legoas da dicta trocar e cada huum for em posse que se nom possa mais arrepender nem seja
cidade e quando faz seus alardos e licença alg?as armas a alg?as pesoas a tem- recebido a juizo.
pos que lhas vaao allo mostrar onde elle vive da qual cousa os moradores da A esto vos respondemos que se faça como ora mandamos que se fizese em a
dicta cidade e termo se ham por muito agravados de seerem constrangidos fora cidade d’Evora e mandamos que vos seja dello dada carta na nossa cha[n]cela-
da cidade e termo tal alardo porque sempre d’antiigamente foy coudel em ella ria pella hordenaçam que ora sobre ello fizemos.
morador. Pedindo-vos por mercee que mandees ao dicto coudel que vaa viver (5) ¶ Outrossy senhor vos pedimos por mercee que mandees que em todal-
aa dicta cidade pois dhi he coudel ou leixe ho officio e os homens boons emle- las cousas que os vossos vasallos pagarem per bem do regno e da terra que os
geram huum de quantos boons hi ha pera o seer como se sempre custumou e beesteiros paguem em ello sem embargo de seus privilegios.
foy hordenado per vossos regimentos e em esto senhor nos farees mercee e os ¶ A esto vos respondemos que pediis bem e mandamos que se faça.silicet.
lavradores e outras pesoas nom perderam suas geiras. que os dictos beesteiros paguem em todallas cousas que os vasallos pagarem
¶ A esto vos respondemos e mandamos que o coudel faça na Guarda alardo comtanto que sejam proveito comuum.

235 Sic. 236 Sic.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

E porem mandamos a todollos nossos corregedores juizes e justiças e 15


officiãaes e a outros quaeesquer que o conhecimento desto perteencer que
compram e guardem esta nossa carta como [fl. 217/1.ª col.] em ella he
contheudo e nom lhe vãao nem consentam hir contra ella em nenh?a guisa. E
por sua guarda lha mandamos dar asignada per nos e seelada do nosso
seello. Umde al nom façades. Dante em Stremoz XIIII dias d’Abril. Lopo
Afonso a fez. Era de mil IIIIc XXXVI anos. [1439]237 – Capítulos especiais da Guarda às Cortes de Lisboa de 1439.

A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 2, fls. 10v.º-11.


B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 253-253v.º238.
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. V, pp. 169-170.

[fl. 10v.º] 239 Capitolos da Guarda

Aa cidade da Guarda capitolos espiciaaes per que he mandado aos morado-


res da dicta cidade que quamdo forem fora com a bamdeira venham com ela
atee a poerem em casa do alferez da cidade e outros a que he provido per
repostas.

(1) Item senhor o foral da dicta cidade he que quando fallecer o alcaide do
castello que os homeens boos enllejam alcaide tal que o mereça e vosa mercee
o dar aaquelle que per elles for enlleyto e receber delle menagem como he cus-
tume. Pedem-vos por mercee que em esto nos guardees noso foral que tal nos
poderia vosa mercee dar por alcaide que seria pouco vosso serviço e grande
dano da terra.
Faça-se como se antigamente custumou.

237 Cfr. infra, nota seguinte.


238 Armindo de Sousa, por lapso, refere que os capítulos especiais da Guarda às Cortes de Lisboa de 1439 se
encontram em IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 146v.º, o que não é correcto (As Cortes Medievais Portu-
guesas…, vol. II, pp. 18 e 48). Na realidade, a cota referida por este autor corresponde aos capítulos especiais
da Guarda às Cortes de Évora de 1490. Há ainda um segundo equívoco. Armindo de Sousa refere esta cota
(IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 253) como prova documental da participação da Guarda nas Cortes de
Lisboa de 1459 (As Cortes Medievais Portuguesas…, vol. II, pp. 26 e 48). Comparando IAN/TT, Leitura Nova,
Beira, L.º 1, fl. 253-253v.º, com IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 2, fls. 10v.º-11, verifica-se que se trata
do mesmo texto e, por isso, das mesmas Cortes, como, aliás, já havia sido notado por Rita Costa Gomes, A
Guarda Medieval…, doc. V, pp. 169-170. Como existem vários textos com os capítulos especiais das Cortes de
Lisboa de 1459, sempre datados, enquanto os textos dos capítulos especiais de Cortes de Lisboa de 1439 se
encontram sem data, depois da análise do L.º 2 da Chancelaria de D. Afonso V, concluímos que devemos estar
perante os capítulos especiais das Cortes de Lisboa de 1439.
239 Regista-se a Guarda e Beira na margem esquerda.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

(2) Item senhor os moradores desta cidade e termo en cada huum anno vãao como sejam h?ua cousa devem gouvir de huum previllegio por que senhor vos
em romaria a h?a egreja que chamam Santa Maria d’Açores que he duas legoas pidimos por mercee que oolhees bem o desejo que os rex antigos teverom de
da dicta cidade a qual romaria teemos per carta dos rex antigos e levamos a poborar esta cidade e ho lugar honde he situada e ainda os stremados serviços
syna da dicta cidade em o dicto dia o mais sollempnemente que podemos e que desta cidade forom fectos a el rei e ao regno e mandees per vossa carta
porque em o dicto dia se acerta estarem em a dicta cidade alguuns estrangeiros declarando a verba do dicto foral que se entenda o dicto foral aos do termo e
seja vosa mercee que nos mandees dar vosa carta per que os moradores da em esto senhor obrarees de justiça e a nos farees mercee.
cidade e termo pois ja com ella ham d’hiir que venha[m] com a dicta syna ataa Mandamos que se guarde em esto o custume antigo.
poe-lla em casa do alferez da cidade e esso meesmo que sayam todos com a
dicta syna de dentro da cidade.
Nos praz de vos outorgar vosso pitytorio e mandamos que asi se faça.
[fl. 11] (3) Item senhor da cerca do muro da dicta cidade he derribado
grande parte. Pedem-vos por mercee que os240 mandees correger.
Nos parece que he bem por nosso serviço e vossa defenssom de se o dicto
muro fazer e porem vos mandamos que o façaaes logo correger e quando vier
ao tempo do aseentamento requeree-nos sobre ello e mandar-vos-emos desen-
bargar alguuns dinheiros pera ajuda dello.
(4) Item senhor vossa mercee ha huum direito na dicta cidade que he: «san-
gue sobre olhos». E aquelle que em vosso nome ha o dicto dirreito quando
alg?ua pesoa he culpada em a dicta cooyma ante que por vosso juiz pernun-
ciado seja se a ha-de pagar ou nom e ainda ante que seja citado nem ouvido he
penhorado e em esto senhor som muyto agravados. Pedem-vos por mercee que
ataa que achado seja quem he em culpa que nom seja nenh?ua pesoa em esto
penhorada.
Mandamos que se guarde em esto o huso e custume antigo.
(5) Item senhor esta cidade quando primeiro foy poborada os rex con-
siirando como era seu serviço e prol comunal destes regnos em o sito241 honde
he situada esta cidade seer de grande poboaçom derom grandes privillegios aos
poboradores della e seu termo antre os quaaes asiinadamente lhe derom privil-
legio scripto em tonbo antre as condiçõoes com que esta cidade foy poboada
he scripta h?ua verba que tal he: «Nemhuum nom filhe montadego dos gaados
da Guarda». E ora senhor os vosos rendeiros como oficiaaes que em voso
nome tiram o dicto montado ou em logares que o ha d’aver alg?ua hordem ou
senhorio limitam a verba do dicto foral e dizem que se nom entende senom
tam soomente aos moradores dentro na cidade e nom no termo nom sguar-
dando que a cidade he corpo cujos nenbros som as aldeas por corpo e nenbros

240 Sic.
241 Sic.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

16 dom Duarte e outros per Diego Lopez de Sousa e outros por o de Pero Lourenço
de Ferreira e outros por o de Diego Soares da Albergaria e outros por outros
fidalgos que aqui veem e comarquam em esta cidade e seu termo os quaaes
dizem que nom ham de pagar em as dictas fyntas porque vivem com os dictos
fidalgos e estes que se aquy scusam que som dos dictos fidalgos nom som seus
criados nem se achegarom a elles senom por seer scusos das dictas fyntas e dou-
1441, Maio, 24, Torres Vedras – Capítulos especiais da Guarda às Cortes tros encarregos em guisa senhor que se vossa mercee da lugar a esto que os pri-
de Torres Vedras de 1441. villegios que os dictos fidalgos teem os scuse das dictas fyntas e encarregos a
pouco tempo todos se farom seos e os que nom quiserem seer dalguum fidalgo
A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 2, fls. 88v.º-89. he-lhes força244 leixar a terra que doutra guisa nom poderia nenhuum vyver em
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fls. 258v.º-260. esta cidade [fl. 89] e termo pella qual razom senhor esta cidade sera de todo por
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. VI, pp. 170-172. tempo despoboada a qual cousa senhor he pouco vosso serviço. Por o que
senhor vos pidimos por mercee que mandees que nenhuum nom seja scuso das
[fl. 88v.º] Aa cidade da Guarda outro de capitollos espiciaaes per que praz dictas fyntas e encarregos ou se mandardes que nom paguem que se descontem
a el rey que acerqua do acomthiiar que fazem os coudes se tenha a maneira dos dinheirros que vos asy ham de pagar como dicto he.
que se tem a cidade de Lamego e seu termo e os outros capitollos necesarios ¶ Se este privillegio <dos> de que aqui fazees meençom som scusados per
a que he provydo per repostas. nossas cartas ou alvaraaes ou hordenaçõoes a taaes como estes nos parece
razom que lhe sejam guardados e se teverem privillegios <ou> alvaraaes dal-
Dom Affomso etc. a quantos esta carta virem fazemos saber que em os con- guuns fidalgos e outras pesoas con taaes como estes mandamos que se tenha
sselhos que ora fezemos em esta villa de Torres Vedras per os procuradores da aquella hordenaçom que os senhores rex meu padre e avoo cujas almas Deus
nossa cidade da Guarda que a elles mandamos viir forom dados certos capi- aja sobresto teem fecta. E taaes nom obedecendo ao mandado dos juizes elles
tollos spiciaes e ao pee de cada huum nos demos nossa resposta dos quaaes o lhes dem aquella pena que entenderem que com razom devem dar segundo
theor d’alguns 242 delles he este que se adeamte segue: requerer sua desobediencia.
(1) ¶ Muy alto e muyto honrrado excellente poderoso principe senhor. O con- (2) ¶ Item senhor vossa mercee sabera que esta terra he tam fragosa que
celho juizes vereadores procurador e homeens boons da cidade da Guarda faze- huum chaao dez ou XX reais val comunalmente mil e dous mil reais e asy as
mos saber aa vosa mercee que vos avees de colheyta em esta cidade em cada outras herdades pello curso e porque senhor vossa hordenaçom he que o que
huum anno seseenta libras da moeda antiga as quaaes vos este concelho em cada em esta terra tever contia de viinte e quatro marcos de prata que seja acontiado
huum anno paga. Item senhor este concelho paga em cada huum anno ao alcaide em cavallo e o que tever contia de doze que o seja em beesta de garrucha. Pidi-
que vosa mercee segundo costume da este castello cem libras de moeda antiga mos-vos por Deus e por mercee que por a terra nom seer danyficada nem
em cada huum anno e senhor vossa mercee sabera que este concelho per estas assayoada per os coudees que em esta cidade e termo se tenha a hordenaçom
pagas e per outras despesas necesarias nom tem de renda senom quatro mil reais. segundo que se tem na Estremadura.
Sabera a vossa mercee que em cada huum anno de 243 necesydade se despendem ¶ A esto vos respondemos que nos praz que se tenha em esto que requerees
em esta cidade dezooyto ou XX reais os quaaes senpre se tirarom per finta a qual aquella maneyra que teem em Lamego e seu termo.
fynta he lançada aas pesoas segundo sua fazenda. Ora senhor vossa mercee (3) ¶ Item senhor em esta cidade ha huum 245 anadal dos beesteiros do
sabera que em esta cidade ha muy poucos poboradores e huuns se scusam por comto o qual vive fora desta cidade e porque senhor alg?uas vezes som mester

242 Segue-se he raspado. 244 No texto: forçam com a letra m riscada.


243 Segue-se ce riscado. 245 Segue-se coudel riscado.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

beesteiros pera voso serviço e por aazo de elle nom seer em esta cidade mora- sobredictos homeens nos envyavam dizer que aallem dos capitollos suso scpri-
dor nom se podem tam aginha aver como compre a vosso serviço e ainda ha tos presentasemos aa vosa senhoria estes dous que se seguem:
dez ou doze anos que he anadal que he contra vossa hordenaçom que o nom (5) ¶ Senhor vosa mercee sabera que da Guarda pera Linhares he strada
deve seer senom tres annos. Pidimos-vos por mercee que mandees que este publica da qual strada he h?ua gram parte por termo de Cellorico e quando
nom seja mais anadal e que o que ouver de seer more dentro em esta cidade. asy vãao da dicta cidade pera Linhares e conversom248 spicialmente por h?ua
¶ A esto vos respondemos que este anadal que dizees seja requerido que feira que se faz na dicta cidade por Sam Joham e o portageiro de Celorico se
venha viver dentro aa cidade e se o asy fazer nom quiser a nos praz que vos põe na dicta strada e nom soomente tira a dicta portagem mais ainda os que
scolhaaes huum besteiro que entendaaes que pera esto sera perteencente do pello dicto caminho vãao toma-lhes as bestas e carregas por descaminhadas e
qual vos envyaae o nome pera lhe seer dada sua carta do dicto oficio e o ana- ainda porque em o lugar honde asy fazem as dictas sem razõoes he despo-
dal que ora he fique por beesteiro. boado fazem o que lhes praz por que senhor vos pidimos por mercee que man-
(4) ¶ Item senhor em esta cidade e termo sempre ouve huum procurador e dees que o portageiro este em h?a aldea que chamam Miserella a qual aldea he
que he da dicta cidade e termo e de pouco tempo a ca alguuns homeens mora- termo de Linhares e de Cellorico e ally recadem a portagem com dirreito e em
dores deste termo se meterom per os lugares do termo da dicta cidade e derom esto nos farees mercee e ainda senhor a sisa da feira da dicta cidade vallera
a entender aos moradores do dicto termo que as fyntas que elles pagavam se mais.
despendiam nom bem e que elles encaminhariam que se fezessem as despesas ¶ A esto vos respondemos que porquanto estas terras som do ifante dom
da dicta cidade per seu encaminhamento por menos e que lhe dese cada mora- Anrrique meu muyto prezado e amado tio nos lhe screpveremos sobre ello que
dor246 do dicto termo huum alqueire de pam e seu real.247 E em fazendo el esto o faça emendar o que nos creemos que elle fara e quando o fazer nom quiser
assy veo per esta cidade per vosso mandado Joham de Beja que aaquel tempo vos nos screpvee sobre ello e vo-llo emendaremos como entendermos que sera
era corregedor da corte veendo como nom era prol desta terra e era destroiçom compridoiro.
della mandou da vosa parte que nom ouvesse em esta cidade senom huum pro- (6) ¶ Item senhor a vosa mercee ha em a dicta cidade o moordomado da
curador na cidade e termo e senhor estes que erom procuradores outra vez tor- vara o qual ora ha Alvaro Machado alcaide da dicta cidade. E porque senhor
narom a dizer ao poboo que pois nom podiam seer procuradores que seriam este mordomado ha-d’aver a dizima das sentenças [fl. 89v.º] que per el som
contadores e com este nome que traz pouco proveyto a esta cidade e traz perda dadas a execuçom e que aquecese que huum homem alcança h?ua sentença
em a dicta renda pidimos-vos por mercee que mandees que nom aja em esta contra outro de mil reais e da ao dicto mordomo e o moordomo nom acha pel-
cidade senom huum procurador como dicto he ca nom soo traz este dano suso- los beens daquelle contra que foy dada a dicta sentença mais de duzentos reais
dicto mais ainda poem desensom antre a dicta cidade e termo e fazem honiom dos quaaes a elle viinham per bem de dizima viinte e o dicto alcaide se de sen-
e ainda senhor pidimos-vos por mercee que mandees que a estes que asy leva- tença de mil reais nom acha mais de duzentos reais entrega-sse logo da dizima
rom o dicto pam e dinheirros que o dem a este concelho. de toda a sentença que som cem reais e da os outros cento aa parte. Pidimos-
¶ A esto vos respondemos que a nos praz que tal procurador nem contador vos de mercee que pois a sentença ao principal nom ha lugar que mandees que
hi nom aja e que qualquer que achado for que da este pam e dinheirro que o nom aja o asseçorio e que o dicto alcaide nom aja dizima da sentença salvo
dizees que o pague em tresdobro e aquele que o levar que o pague anoveado. daquello que montar na execuçom e em esto nos farees mercee.
E desto nos praz que aja qualquer que esto acusar h?ua parte e as duas fiquem ¶ A esto vos respondemos que sobre esto he fecta hordenaçom a qual vos
ao concelho. sera dada na nossa chamcelaria e mandamos que se guarde segundo em ella he
¶ Item senhor depois que aqui estamos em estas cortes en Torres Joham contheudo.
Afonso da Vella scudeiro da casa do senhor regente voso tio nos disse que os ¶ Dos quaaes capitollos e nosas respostas a elles dadas Luis Periz e Diego
Lopez Portocarreiro procuradores da dicta cidade nos pidirom por mercee
246 Repete morador ao mudar de linha.
247 Segue-se E em riscado, porque repete as referidas palavras. 248 Sic. Talvez no sentido de convergir.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

que lhe mandasemos dar o trellado destes capitollos susoscriptos pera o 17


concelho da dicta cidade porque se entendiam ajudar delles e visto per nos
seu requerimento mandamos-lhes dar em esta nosa carta. E porem
mandamos a todollos corregedores juizes justiças dos nosos regnos e a outros
quaaesquer oficiaaes e pessoas a que o conhocimento desto perteecer que lhe
compram e guardem e façom comprir e guardar em todo estes capitollos com
nosas respostas asy e pella guisa que em elles he contheudo e lhe nom vãao 1442, Fevereiro, 29, Santarém – Capítulos especiais da Guarda às Cortes de
contra elles em nenh?ua maneira sem outro alguum embargo que lhe sobre Évora de 1442.
ello seja posto. Hunde al nom façades. Dada em a dicta villa XXIIII dias de
Mayo per autoridade do senhor ifante dom Pedro etc. Rodrigo Anes a fez. A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 23, fl. 13v.º, muito danificado,
Anno de IIIIc RI. com prejuízo de parte do texto249.
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 95v.º-96v.º.
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. VII, pp. 173-174.

[fl. 13v.º] 250 Aa cidade da Guarda capitolos espiciaaes per que he mamdado
ao comtador e almoxarife que requeiram ao alcaide que nam mande fazer
penhoras pelos direitos do mordomado sem lhe serem julgados e mais etc.

Dom Afonso e etc. a quantos esta carta virem fazemos saber que em os con-
selhos que ora fezemos em a muy nobre e leal cidade d’Evora per os procura-
dores da leal cidade da Guarda que a ellas mandamos 251 viir nos forom dados
certos capitollos spiciaaes e ao pee de cada huum nos lhe demos nosa reposta
dos quaaes o theor dalguuns he este que se segue:
(1) Muyto alto e muyto poderoso senhor os cavaleiros scudeiros e homeens
boons da vosa cidade da Guarda muyto humildosamente beijando vosas
mãaos fazemos saber aa vosa mercee que antre os privillegios que nos derom
os rex que ante vos forom nos fezerom mercee de os moradores desta cidade e
seu termo nom pagasem portagem nem montado e agora senhor porque os
dictos direitos sam dados a certos cavaleiros e scudeiros nom nos querem guar-
dar nosos privilegios nem liberdades nem os vossos juizes nom nos levantam
delles força porque sam poderosos. Pidimos senhor aa vossa mercee que nos
mandees vossa carta per que sob certa pena sejam guardados e os que os asy
nom quiserem guardar e tambem aos ouvidores das terras dos ifantes e em esto
senhor nos farees mercee.
249 Parte do texto foi reconstituído pela Leitura Nova, entre [ ], conforme os critérios de transcrição atrás enun-
ciados.
250 Na margem esquerda: capitolos.
251 Seguem-se letras riscadas.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

A nos desapraz de vos nom guardarem sobre esto vosos privillegios e pera (4) Outrosy senhor em esta cidade ha certas casas foreiras a vos asy de chris-
vos seerem compridos como devem vos tomaae estormentos com reposta tãos como de judeus e porque senhor el rey fez h?a ley que certo tempo
daquelles que contra elles forem e enviaay-no-llos e prazendo a Deus nos tee- [paguassem certa] contia a qual ley Luis Perez contador lhe nom quis guardar
remos maneira de vos seerem conpridamente guardados como for direito e pidimos-vos senhor por mercee que mand[ees que se guar]de asy e pella guisa
daremos por ello pena aaquelles que os nom quiserem comprir segundo devem como per el rey Duarte cuja alma Deus aja era mandado e em esto senhor nos
e asi o teemos mandado aos do nosso desembargo. f[arees mercee.
(2) Item senhor o alcaide desta cidade ha certos direitos os quaaes perteecem Sobr’e]sto vos requeree agora o noso contador e almoxarife desa cidade que
ao moordomado e devem a seer demandados perante o juiz dos vossos direitos vos conpram a dicta ley segundo [em ella faz memçom]. E se perventura tever
e quando acharem que sam culpados sejam dados aa execuçom e senhor este alg?a razom a se nom comprir mandamos-lhe ataa tres meses primeiros
voso alcaide nom sguardando os que sam em culpa como aquelles que sam sem [seguimtes do dia que lhe] esto notificardes no-llo façom saber pera tornarmos
culpa os penhora todos nom os demanda[n]do perante o voso juiz e estes penho- a ello como for direito.
res que lhe asy sam tomados nunca lhos mais querem entregar posto que o juiz D[os quaaes capitollos e nossas repostas a ell]es dadas Gonçalo Anes noso
o mande. Pidimos senhor aa vossa mercee que nos dees vosa carta per que o almoxarife em a dicta cidade e Joham Afomso da Vella [que aos dictos
alcaide nom faça nem mande fazer taaes penhoras ataa lhe seerem julgados per conselhos vierom por procurad]ores da dicta cidade nos pidirom por mercee
o juiz de vossos direitos e seendo-lhe julgado elle leve todo seu direito e asy que lhe mandasemos dar [ho trellado dos suso dictos e visto per nos seu
senhor nom sera nenguem forçado e em esto senhor nos farees mercee. requerimento] mandamos-lho dar em esta nossa carta etc. Dada em Santarem
Nos nom avemos por bem de vos o alcaide fazer tal agravo e porem manda- [XXV de Fevereyro per autoridade do senhor iffamte dom Pedro etc.
mos ao nosso 252 contador e almoxarife desa cidade que lhe requeiram da nosa Lourenço de] Guimarães a fez. Anno de IIIIc RII.
parte que taaes penhoras nom mande mais fazer pois que os outros alcaides
que ante el forom dello asi nom husarom e que aquelles que lhe obrigados
forem em alg?ua cousa dos dictos direitos que os demande perante o juiz del-
les253 como se no tempo dos seus antecesores costumou e nom o querendo elle
asy fazer mandamos ao noso corregedor desa comarca que chegue logo hi e
lho nom consinta e o faça husar como dicto he.
(3) Outrosy senhor em esta cidade e comarcas della se fazem muytos fraires
da terceira hordem seendo homeens mancebos e que teem bem de comer e sam
boos oficiaaes e esto nom fazem senom por <nom> servirem a vossa mercee e
nom averem os encarregos do concelho seendo homeens que merecem seer acon-
tiados em cavallos ou em armas ou em beesta de garrucha e husando parte del-
les em mercadorias e em outras cousas que nom perteecem a relligiom.
Pidimos-vos senhor por mercee que servam nos encarregos do concelho salvo
fazendo elles residencia no dicto moesteyro e em esto senhor nos farees mercee.
A nos praz que estes servam em todollos encarregos como os outros casados
e porem vos mandamos que asi o conpraaes sem poerdes sobre ello outro
nenhuum embargo.

252 Segue-se alm riscado.


253 Segue-se segundo se riscado e corrigido, sobre estas palavras, para como se.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

18 que elle mandou que se conprisse o dicto forall e custume como em elle era
contheudo e mandava aos dictos juizes que assy o fezessem conprir e guardar
e nom o conprindo assy os dictos juizes que pagassem todo per seus beens e
que a dicta cidade senpre assy delle hussou e que sem enbargo da dicta deffessa
o bispo e crerezia medhiam o dicto viinho e o dicto senhor mandou que o nom
metessem sobre o quall o bispo que ora he contendeo tanto per demanda con-
1455, Março, 25, Lisboa – Capítulos especiais da Guarda às Cortes de Lis- tra a dicta cidade que forom d’anballas partes tiradas inqueriçooes e o fecto
boa de 1455. sobr’ellas conclusso e temendo-sse a dicta cidade por muitos favores que o
dicto bispo tiinha se secoreo a Pero Rodriguiz nosso procurador e a nos que
A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 15, fls. 146v.º-147. mandassemos que o dicto fecto se nom dessembargasse sem nos e que nos
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 67-68. pro[u]ve dello e mandamos que estevesse assy quando dando portaria dello ao
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. VIII, pp. 174-176. doutor Pero Lobato e que sem enbargo dello que Gomez Lourenço o dessem-
bargou sem nos e dera em ello sentença contra a dicta cidade e que por caso de
[fl. 146v.º]254 A cidade da Guarda capitollos espiciaaes per que he mamdado ao tempo nos sermos em essa terra nom poderees seguir apellaçom [fl. 147] do
que se cumpra a carta del rey dom Eduarte que manda que nom aja hy juiz dos dicto fecto e por alg?uas outras ocupaçooes que a dicta cidade vierom e que
residos nem scripvãao e porteyro e que o juyz hordenayro conheça da dita jur- nos pidiees que mandemos que o dicto forall se compra como senpre foy e nom
diçam e etc. e outros capitollos necesarios. conssentamos em vos asi seer quebrado per as dictas pessoas ou vos demos
tenpo e lugar que posaaes seguir a dicta apellaçom sem enbarguo de o tenpo
Dom Afonso e etc. a quantos esta carta virem fazemos saber que nas cortes della seer passado.
que ora fezemos em esta muy nobre e senpre leal cidade de Lixboa em o mes A esto respondemos257 pois este fecto he ja antre partes que nom podemos
de Março da Era de 1455 a nos per Lopo Ferrnandez e Diogo Lopez procura- acerca dello dar determinaçom e pois que sobr’esto he fecto hordenado e vos
dores da cidade da Guarda nos forom apressentados certos capitollos os teendes apellado pera casa segundo dizees e por vossas acupaçooes e trabalhos
quaees vistos per nos ao pee de cada huum mandamos poer nossas respostas e nom podestes seguir a dicta apellaçom a nos praz pero que o tenpo della pas-
o theor dellas he este que se adiante segue: sase que o posaaes seguir e nossos dessenbargadores vos façom conprimento
(1) Primeiramente no que dizees que no forall da dicta cidade se contem de dereito e justiça a qual apellaçom mandamos que siigaaes daqui ataa qua-
ante as outras coussas que n[e]huum nom meta viinho de fora do termo da tro messes primeiros seguintes.
dicta cidade salvo o que ouver de suas viinhas proprias e quallquer que o meter (2) E quanto ao que dizees que el rei meu senhor e padre cuja alma Deus aja
quiser primeiro deve jurar por dia de Sam Migell que outro viinho nom meta deu h?a carta aa dicta cidade per que nom ouvesse hi juiz dos resiidos nem stpri-
salvo o que asy ouver de suas viinhas e meteendo-o que perca o viinho e vassi- vam e porteiro mandando que fosse juiz delles o que fosse juiz da dicta cidade
lhas e que page255 de pena cem256 sendo o dicto foro e custume hussado e pro- e outro alguum nom e que o stprivam e porteiro que son do dicto carrego nom
vado per tanto tempo que a memoria dos homeens nom he em contrairo salvo levem dello nenhuum mantimento e que despois desto Nuno Martiiz da Silveira
per alguuns tempos que o bispo e cabiidoo e alcaide e contador e stprivam dos ric’omem do nosso consselho stprivam da nossa poridade e etc. que Deus aja
contos se trabalhavam de meter viinho de fora socorrendo-sse a dicta cidade a dera os dictos oficios per suas cartas a alg?uas pessoas e que nos pidiees que vos
el rei dom Joham nosso avoo recontando-lhe o agravo que lhe assy faziam e mandemos conprir a carta que dello do dicto meu padre teendes.
A eesto respondemos que nos praz que se conpra a carta do dicto meu padre
254
que Deus aja e mandamos que os oficiaaes que per bem da dicta carta desto
Na margem esquerda: cidade da Guarda.
255 Sic.
256 Sic. 257 Segue-se que riscado.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

devem conhocer que o façam muy bem e como compre a serviço de Deus e pertencer que lhe conpram e gardem e façam conprir e guardar em todo os
nosso e bem do povoo e quando o assi nom fezerem nos proveremos sobr’ello dictos capitollos segundo he contheudo em nosas respostas sem outro
segundo sentirmos por serviço de Deus e nosso e bem do dicto povoo. alguum enbargo. Unde all nom façades. [Dada] em Lixboa XXV de Março.
(3) E ao que dizees que em essa cidade ha certos vassallos e cidadaaos258 que Gonçalo Gill a fez. Ano de mill IIIIc LV.
tem regadas d’erva regadia pera seus cavallos e bestas e que senpre forom cou-
tadas e defessas per os rex nossos antecessores e per seus corregedores259 e que
vos forom ora devassadas per Fernand’Aranha corregedor que foy em essa
comarca em o que vos he fecto grande agravo e que nos pidiees por mercee que
mandemos que vos sejam guardadas e deffessas como senpre forom.
A esto vos respondemos que se antigamente estes prados e regadas antiga-
mente forom coutados e os ora devassam e entendees que teendes derreito
alguum que façaes requerimento pressente os juizes da dicta cidade e pressente
as partes a que pertencer o qual o julge segundo ho entender dando apellaçom
e agravo as partes e quanto aos vassallos e acontiados que cavallos teverem
mandamos que lhe sejam guardados e defessos posto que o dicto privillegio
nom tenham e mandamos que asy se conpra.
(4) E ao que dizees que esa cidade he tam pobre de rendas que quando man-
damos que venham aas cortes senpre se lança fiinta pera os que a ellas ham de
viir e em esto pagam todollos moradores della e que constrangees pera ello os
besteiros do conto e que se escusam per bem do privilegiio que tem e tambem
som costrangidos per vos que pagem em nas soldadas que alguuns anos daees
aos carniceiros desa cidade que antre vos fiintaees e que elles se escusam com
o dicto privilegiio e que nos pidiees que mandemos260 que vos ajudem a paguar
no que dicto he.
A esto respondemos e mandamos que os dictos besteiros do conto pagem
nas soldadas dos carniceiros asy como quaeesquer outros e quanto a contribui-
çam da viinda das cortes que lhe seja em ello guardado seu privilegiio segundo
em elle he contheudo.
Dos quaaes capitollos nos pediram por mercee que lhe mandasemos dar o
trelado delles com nosas respostas porquanto se delles entendiam261 d’ajudar
e visto per nos seu requerimento mandamos-lhos dar em este caderno de
duas folhas esprito porem mandamos a todollos corregedores juizes e justiças
dos nossos regnos262 e a outros quaeesquer oficiaes e pesoas a que esto

258 Há uma letra riscada na palavra cidadaaos, entre o primeiro a e o segundo d.


259 No texto: corregadores.
260 Emendado de mandes. Riscou a letra s e corrigiu sobre a palavra com as letras mos.

261 No texto: entenndiam. Repete a letra n ao mudar de linha.


262 No texto: repnos.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

19 mandamos dar segumdo dito he. E porem mandamos a todas nossas justiças
e pessoas a que pertemcer que lha cumpram e façam compryr e guardar
segumdo em ella he comtheudo sem outro embarguo. Dada em a dita cidade
a XII dias do mes de D[e]zembro. Joham do Avelar a fez. Anno de Nosso
Senhor Jhesu Christo de mill e IIIIc LX annos.

1460, Dezembro, 12, Évora – Capítulo especial da Guarda às Cortes de


Évora de 1460.

B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 109-109v.º.


Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. IX, pp. 176-177.

[fl. 109/2.ª col.] ¶ Outra carta da dita cidade per que o comtador estee hii
sempre somente o tempo que deve amdar pella comarqua.

¶ Dom Afomsso per graça de Deus rey de Purtugall e do Alguarve senhor de


Cepta e d’Alcacer em Africa a quamtos esta nossa carta virem fazemos saber
que estamdo nos ora em esta cidade d’Evora nas cortes que em ella fizemos per
o precurador da cidade da Guarda nos foy dado huum capitollo ao quall ao
pee delle mandamos poer nossa reposta segumdo se ao diamte segue:
(1) Item ao que dezes que essa cidade he tam fria e de ma servidam que se
nam fosse pollo colegio da See que he cabeça do bispado e desy por ser cabeça
do almoxarifado em que sempre estam os nossos officiaaes ja fora perdida e
despovorada e que el rey nosso avoo que Deus aja buscamdo maneira como a
poderia povorar a fez couto de omiziados porque he fortaleça e chave de nos-
sos regnos e que aguora Vasquo Afomsso nosso comtador tamto que o alla
mandamos se foy asemtar fora da dita cidade [fl. 109v.º/1.ª col.] com toda sua
<casa> o que alem de ser nosso deserviço he gramde desomrra e perda da dita
cidade e que nos pidiees que lhe ponhamos penna assy a elle como aos conta-
dores que ao diante forem que continuadamente estem na dita cidade.
A esto respomdemos que o avemos por bem o contador estar em essa cidade
conthinuadamente reservamdo os tempos que deve amdar polla comarqua por
nosso serviço com os oficiaaes de seu officio e todo outro tempo estee com seu
domecilio e officiaaes na dita cidade poys he cabeça do almoxarifado e man-
damos ao comtador que assy o cumpra sob penna do officio.
Pedindo-nos o dito precurador por parte da dita cidade que lhe mandas-
semos dar h?ua nossa carta com o theor do dito capitollo com nossa reposta
porque lhe he necesario e se emtemdia della ajudar e visto seu pedir lha

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

20 vossa alteza que mandees aos juizes sob certa penna que a certo dia a façam çar-
rar. E em esto senhor farees gramde serviço a Deus e a nos gramde mercee.
¶ A nos praz e mandamos que aquella porta que veem ao dito adro de Sam
Vicemte seja çarrada logo e os juizes que lhe assynem outro luguar comve-
niemte fora do adro hu se faça outra. E quamto he aas outras [fl. 27/2.ª col.]
portas da dita judaria mandamos que sejam çarradas de noute e os ditos
1465, Setembro, 3, Guarda – Capítulos especiais da Guarda às Cortes da judeus sejam comstramgidos que façam as ditas portas.
Guarda de 1465. (2) ¶ Item os moradores desta cidade e seu termo e assy dos outros luguares
comarquãaos acustumarom sempre e agora de trocarem sall castanhas nozes e
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 26v.º-27v.º. assy outras cousas com os moradores de Riba de Cooa e passam pella villa d’Al-
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. X, pp. 177-179. meyda pera Vall della Mulla e Sam Pedro de Rio Seco e pera Mall Partida e Vall
de Coelha e pera a Vermeosa e assy pera outros luguares da dita comarca de Riba
[fl. 26v.º/2.ª col.] A cidade da Guarda carta com o theor de certos capitullos de Cooa os quaaes luguares sam demtro em vossos regnos. E agora novamente
espiciaaes per que prouve a el rey que os moradores da dita cidade e seu termo Gomçallo de Payva escripvam em o porto da dita villa d’Almeyda faz novo cus-
e lugares comarcãaos nom sejam comstramgidos no porto d’Almeyda que tume.silicet. levamdo aos que per hy passam pera os ditos luguares dinheirros das
escrepvam as cousas que levam pera trocarem huuns com outros e outros a armas que levam e das bestas cavallares d’albarda e lhas faz escrepver e leva
que foy provydo per repostas. dinheirro d’alvaras e bestas e armas assy como se pera Castella ouvessem de pas-
sar. E com seu temor e de seus comstramgimentos muytos leixam de hyr buscar
Dom Affonsso etc. a quamtos esta carta virem fazemos saber que em as cor- seus mantiimentos o que he gramde dampno desta terra e porque se tall cousa
tes que ora fazemos em a nossa leall cidade da Guarda que pellos precurado- nom acustumou de fazer atee ora pedimos aa vossa alteza que mandees que tall
res della nos [fl. 27/1.ª col.] forom dados certos capitollos espiciaaes e ao pee se nom faça. E em esto senhor farees direito e a nos mercee.
de cada huum nos demos nossa reposta dos quaaes o theor d’alguuns delles he ¶ A nos praz e mamdamos que daquy em diamte se nom faça tall comstram-
este que se segue: gimento porque nenhuum nom ha-de seer comstramgido que escrepva mas se
(1) ¶ Item senhor a vossa alteza sabe como per hordenaçom he determinado nom escrepver e for achado que passa pera Castella perde o que levar.
que as judarias sejam çarradas por muytos imcomveniemtes de pecados que (3) ¶ Item senhor Dioguo Soarez alcayde deste vosso castello nos coms-
sobreveem seemdo devassas e abertas e aimda aos judeus sam fectos alguuns tramge per h?ua vossa carta que demos dous velladores com que se velle e
dampnos de noute por assy as judarias nom seerem çarradas. E senhor em esta rollde o dito castello o que amtiigamente numca foy soomente o dito alcayde
cidade ha h?ua judaria em que poderam morar atee cimquoemta ou sesemta e com sua gemte e remda e percalços ha-de poer recado e vel[fl. 27v.º/1.ª col.]lar
tem judaria apartada e ja per alg?uas vezes por escusar estes imcomvenientes foy o dito castello e a cidade pollo comseguynte poer recado e vellar e rolldar em
acordado pellos regedores desta cidade que fosse çarrada e per peytas rogos e ella e ora o poboo por assy seer fecta esta emnovaçam que numca foy a sem-
afeyçõoes nam se çarrou. E aymda aquy ha outra comgeyçom de gramde pecado tem por gramde apressam263 e agravo. Pedimos aa vossa alteza que nos mam-
que os judeus fazem grande sayda e servemtia de dia e de noute pollo adro de tenha nossos husos e custumes como sempre foy assy nos tempos das guerras
h?ua ygreja de Sam Vicemte homde d’amtiigamente e agora sam sepultados muy- como des emtam atee ora. E em ello senhor nos farees direito e mercee que
tos christãaos e fazem cimtimente em este adro muytas çugidades. E quamdo sempre de vos recebemos e esperamos receber.
sepultam alguuns ou saaem sobre os finados como se custuma fazer em cada pri- ¶ A nos praz e mandamos que o dito Diogo Soarez nom huse mays da carta
meyro dia de cada h?ua somana com cruz e augua beemta e escarnecem e volvem que lhe ora pera ello foy dada e pera outros casos e tenha-sse o custume.
as costas comtra a cruz e fazem outras torpidades escusadas de dizer e com todo
263 Sic.
passam sem castiguo per rogos e peytas e afeyçõoes per que senhor pedimos aa

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

(4) ¶ Item senhor vossa mercee sabera que vay em dous annos que o bispo 21
desta cidade comtinuadamente aquy estaa sem amdamdo per seu bispado
como seus amtecessores fezerom. E per bem desta sua perlomguada estada os
seus fazem alg?uas cousas em dampno e perjuizo desta cidade e termo
segumdo vossa alteza podera seer em conhecimento pollo ouvydor de Fernam
Cabrall que dello tem imquiriçõoes pollo quall vos pedimos senhor por mercee
que lhe mandees que nom estee aquy comtinuadamente por se poder recriar 1465, Setembro, 23, S. Romão – Capítulos especiais dos lavradores e povo
esta terra. da cidade da Guarda e seu termo às Cortes da Guarda de 1465.
¶ A nos praz e mandamos-vos por nom podermos fazer o que nos assy
requerees que requeyraaes ao dito Fernam Cabrall e aas outras nossas justiças B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 28v.º-29.
que vos façom direito destas cousas aos quaaes mandamos que vos façom Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. XI, pp. 179-181.
comprimento de direito sobre ello. E nos fallaremos ao bispo sobre esto e lhe
mandaremos que tenha outra maneyra e visite seu bispado. [fl. 28v.º/1.ª col.] Os lavradores e poboo da cidade da Guarda e seu termo
(5) ¶ Item senhor dos fectos de que os corregedores conhecem mandam capitollos espiciaaes per que he defeso que se nam dee carta per fymtarem os
dous escripvãaes de laa da casa a tirar as imquiriçõoes polla comarca levam de sobreditos atee primeyro nam tomarem comta das remdas do comcelho e
cada dia da hida e estada cada dia emquamto tiram as imquiriçõoes oytemta outros a que he respomdido.
reais quoremta ao escripvam e quoremta ao emqueredor e mays a escriptura
aa custa dos cativos lavradores de guisa que os lamçam [fl. 27v.º/2.ª col.] a per- Dom Affonsso etc. a quamtos esta carta virem fazemos saber que os lavra-
der todo por dar proll aos officiaaes fazemdo em esto o que nam devem por- dores e poboo da nossa cidade da Guarda e seu termo nos deram certos capi-
que de taaes fectos de que a elles pertemce o conhecimento quamdo forem em tollos aos quaaes per nosso mandado respomderom os juizes e officiaaes da
pomto de mandarem tirar imquiriçõoes deviam de passar carta pera os juizes dita cidade por serem cousas que lhes tocavam. E vista per nos sua reposta
da terra e pagar a chamcellaria e os juyzes ou emqueredor da villa com huum determinamos acerqua delles o que se ao diamte segue. Os quaaes capitollos e
tabelliam tirar tall imquiriçom e lha mandar çarrada e asseellada sem levarem nossa detriminaçom he esta:
outro mantiimento soomente sua escriptura. Seja vossa mercee que mandees (1) ¶ Item senhor em cada huum anno se lamçam em a dita cidade duas fimtas
que assy se faça e nom comsymtaaes tall mall. h?ua he do castello e outra pera a festa do Corpo de Deus e pera tres servidores da
¶ Nos em esto nom podemos poer outra regra. Porem mandamos ao corre- cidade.silicet. meyrinhos e cadeeyros pera que monta em dinheyro sete mill reais
gedor que huse em esto temperadamente e nom faça tall cousa salvo quamdo de que vem a cada huum morador de paga pera todo sete sete reais. E os ditos offi-
lhe parecer necessario. ciaaes e homeens boons sempre tem maneyra de lhes lamçarem mays a meetade
¶ Pedimdo-nos os ditos precuradores por parte da dita cidade que lhe do que se pera as ditas fymtas requere. E aimda senhor aalem das ditas fymtas que
mandassemos dar nossa carta com o theor dos dytos capitullos com nossas em cada huum anno sam de necessidade sempre buscam como requeyram aos cor-
repostas porque lhes eram necessarios e se emtemdiam delles d’ajudar. ¶ E regedores que lhes dem luguar pera lamçarem dinheirros ao poboo.
visto seu pedir lha mandamos dar como dito he. ¶ E porem mandamos a ¶ A esto respomdemos que mandamos e defemdemos a Fernam Cabrall que
todallas nossas justiças e pessoas a que pertemcer que lha cumpram e façom ora he regedor da nossa justiça em esta comarqua da Beyra e aos que depos elle
comprir e guardar segumdo em ella he comtheudo sem outro embargo. Dada vierem por nossos regedores ou corregedores e a quaaesquer outros seus
em a dita cidade da Guarda tres dias de Setembro. Dioguo Gomçallvez a fez. desembargadores que nom dem daquy em diamte carta nem outro mandado
Anno de Nosso Senhor de mill e IIIIc LXV. ¶ E eu Duarte Galvam secretareo pera fymtarem os ditos lavradores e poboo ataa primeyro nom tomarem a
do dito senhor rey a fiz escrepver. Os quaaes capitullos foram requeridos per comta [fl. 28v.º/2.ª col.] das remdas do dito concelho e saberem como se des-
Joham Affonsso do Bispo e Dioguo de Pinhell procuradores. pemderam e a necessidade que tem pera outros lamçarem.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

(2) ¶ Item senhor ha remdas na dita cidade per que em cada huum anno vinhos se alguuns deses cidadãaos tem aberto ou tem vomtade de abrir a esse
bem podem paguar a meetade das despesas hordenadas della e assy em cada tempo se vãao aas adeguas do[s] pobres lavradores e lhes britam as medidas e
huum anno se tyram devassas que seemdo executadas aimda moorallmente os alcadafes em que vemdem seus vinhos sem nenhuum temor de justiça.
abastava o dinheyro dellas pera a outra meetade das ditas despesas e os que Pedem aa vossa alteza que os provejaaes de remedio com direito.
mall fezessem receberiam castigo e pero hi aja a dita remda e se executem as ¶ A esto respomdemos que se assy he ho avemos por mall fecto e mandamos
ditas devassas nunca lhes he descarreguado cousa alg?ua do dinheyro das ditas ao dito Fernam Cabrall que ouça loguo acerqua desto o dito poboo e lhe faça
fymtas nem sabem como nem per hu se despemdem. comprimento de direito. E nos mandamos ao dito poboo que o requeyram
¶ A esto respomdemos que mandamos ao dyto regedor e aas outras nossas assy.
justiças que depos elle vierem que quamdo forem na dita cidade provejam sem- (6) [fl. 29/2.ª col.] ¶ Item senhor pera estas cortes sam lamçados aos do
pre acerqua desto com diligemcia e façom recadar pera o concelho o que lhe poboo tres tres reais que momta em soma tres mill reais e os que senhor pera
desto pertemce e mandamos ao dito poboo que lho requeyram assy. elles forom hordenados numca sayram de suas casas nem leixaram de proveer
(3) Item pedimos aa vossa alteza que nos dees luguar que possamos fazer suas fazemdas no que senhor nos he fecto gramde agravo. Pedimos aa vossa
huum procurador o quall aja poder d’estar sempre por ho poboo ao lamçar alteza que os mandees comtemtar do que for rezam e nem comsemtaaes esta
dos dinheirros das ditas fymtas e assy aa comta dos procuradores do comcelho com as outras.
pera requerer toda sua liberdade e pera outorgar no que se de rezam requerer ¶ A esto respomdemos que mandamos ao dito Fernam Cabrall que filhe
e assy comtradizer o que comtra o poboo fazer quiserem sem rezam esto vos loguo comta destes tres mill reais poys se nom despemderam naquello pera que
pedimos porque por nossa simpreza e pouco vallor nos nom seja fecta cousa foram lamçados e se achar que de parte delles se fez alg?ua despesa necessaria
nom devyda. lha leve em comta e os que sobejarem faça despemder no anno que ha de viir
¶ A esto respomdemos que porque a cidade allega que tem semtemça que pera se descarreguarem outros tamtos ao poboo d’alg?uas despesas que ouve-
nom aja hy procurador deste poboo mandamos ao dito Fernam Cabrall que rem de paguar.
veja logo esta semtemça e ouça logo os officiaaes da dita cidade com o dito ¶ E porem mandamos ao dito Fernam Cabrall e a todollos outros nossos
poboo e nos man[fl. 29/1.ª col.]de ho trellado da dita semtemça com o que lhe juyzes justiças officiaaes e pessoas a que o conhecimento desto pertencer per
acerqua desto parecer pera todo vermos e determinarmos aquello que rezam e quallquer guisa que seja que vejam os ditos capitollos e lhos cumpram e
direito nos parecer. guardem e façom em todo bem comprir e guardar as nossas repostas a elles
(4) ¶ Item senhor em esta cidade ha huum privillegio segumdo se diz que dadas assy e pella guysa que em cada h?ua dellas he comtheudo. E lhe nom
nenhuum homem da villa nem do termo nom meta vinhos de fora sob certa vãao nem comsemtam hir comtra ellas em parte nem em todo porque assy he
penna o quall privillegio he odioso a toda a ree pruvica. Pedem aa vossa alteza nossa mercee. Dada em Sam Romãao vinte e tres dias de Setembro. Amtam
que lhes dees luguar que pera vodas e bautismos e despesas de suas casas pos- Gonçallvez a fez. Anno de Nosso Senhor Jhesu Christo de mill e
sam meter vinhos de fora sem embargo do dito privillegio. ¶ E os reguatãaes e quatrocemtos e sesemta e cimquo.
taverneyros nom ho metam.
¶ A esto respondemos que nom emtemdemos de quebrar aa cidade seu pri-
villegio se o tem. E que se elles semtem que o dito privillegio se nom estemde a
tamto mandamos ao dito Fernam Cabrall que logo ho veja e nom lhes com-
semta que husem de mays liberdades que daquellas que se no privillegio decla-
rar.
(5) ¶ Item senhor alguuns lavradores deste termo emcubam seus vinhos
demtro na cidade e muytas vezes os ditos cidadãaos e officiaaes lhos fazem
vender comtra suas vomtades e sem tempo. E outras vezes por abrirem seus

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

22 rioridade he nossa vos vos podees a nos socorrer e quamdo em allguum lugar
duvidardes do forall mamdamos aos juizes e justiças delle que vo-llo mostrem
sem outro allguum embargo.
(3) ¶ Outrossi ao que dizees que temdes forall que em essa cidade nom
sejam da rollaçom mais de doze e que asi o mamdou Fernam Ca[fl. 200v.º/2.ª
col.]brall regedor da nossa justiça em essa comarca omde damtes eram trymta
1468, Maio, 28, Santarém – Capítulos especiais da Guarda às Cortes de e seis pedimdo-nos que porquamto esto redumda em boom regimemto e proll
Santarém de 1468. da terra vos comffirmassemos o dicto forall e mamdado do dicto corregedor
porque asi264 nas outras cidades e villas dessa comarca.
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 200-201. ¶ Reposta: a nos praz e vo-llo ouctorguamos segumdo pidiees.
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. XIII, pp. 182-183. (4) ¶ Item outrosi ao que dizeis que recebees agravo em Lopo Fernamdez
seer juiz dos orffãaos homde ha tam pouco povoo e que os juizes o podem bem
[fl. 200/2.ª col.] A cidade da Guarda capitollos espiciaaes per que lhe foi fazer e o devem fazer segumdo nossa ordenamça e capitollos em cortes firma-
outorguado que nam sejam da rollaçam mais de doze e outros a que he pro- dos e que isso meesmo he juiz dos judeus e mouros e faz audiemcia em sua casa
vido. e jullgua os judeus com os cristãaos e os cr[i]stãaos com os judeus e faz em ello
o que nom deve dizemdo que tem pera ello nossa carta sem embarguo das dic-
Dom Affomsso etc. a quamtos esta carta virem fazemos saber que em as tas nossas hordenaçõoes e pedimdo-nos que mamdemos que dello nom huse
cortes que ora fezemos em esta mui nobre e leall villa de Samctarem per os pro- mais leixe o carreguo aos juizes.
curadores da nossa mui nobre e leall cidade da Guarda que a ellas mamdamos ¶ Reposta: se emtendees que Lopo Fernamdez nom husa de seus officios
viir nos forom dados certos capitollos espiciaaes [fl. 200v.º/1.ª col.] por parte como devee265 acusai-o e demamdai-o per huu devees e como devees e nos vos
da dita cidade dos quaaes ho theor d’allguuns delles com nossa reposta he o mamdaremos fazer comprimemto de dereito e justiça.
que se ao diamte segue: ¶ Pedymdo-nos os dictos Joham Affomsso do Bispo e Dieguo de Pinhell
(1) ¶ Primeiramemte ao que dizees que nom demos sacas de guaados por a procuradores por parte da dita cidade que lhe mamdassemos dar nossa carta
careza das carnes e coiramas e isso meesmo consemtam fazer avemças com hos com o theor dos dictos capitollos com nossa reposta porque lhe eram neces-
passadores sallvo eixecutar as hordenações e que cometamos a eixecuçam das sarios e se emtemdiam delles ajudar e nos visto seu pedir lha mamdamos dar
ditas sacas aos juizes da terra nesta comarca. como dicto he e porem mamdamos a todollos nossos corregedores juyzes e
Reposta: nossa voomtade he o fazermos asi daquy em diamte. E quamto aas justiças comtadores e allmoxarifes 266 [fl. 201/1.ª col.] e a outros quaaesquer
avemças asi ho teemos hordenado sobre esto tendes regimemto e capitollos de officiaaes e pessoas a que esto pertemceer que lho cumpram e guardem e
partes que fezemos em essa cidade os quaes mamdamos que se cumpram e façam bem e ymteiramemte comprir e guardar como em ella he comtheudo.
guardem imteiramemte. Dada em a dicta villa de Samctarem vymte oito dias de Mayo. Joham Vaaz a
(2) ¶ Item quamto ao que dizees que cometamos aos juizes ordenairos o fez. Anno de Nosso Senhor Jhesuu Christo de mill e IIIIc LXVIIIº. E eu
conhecimemto das portajeens por primcipallmemte nas terras das hordeens os Duarte Guallvão secretairo do dicto senhor rei a fez escprever.
allcaides e portajeiros aramçoam os que passam com mercadorias e lhes levam
o que querem sem lhes mostrar como poemdo-lhes brados (?) que descamy-
nhem e que vão por camynhos defessos nos quaaes casos nos nom avemos jur-
diçam e vos recebees opressam e agravo. 264 Sic.
¶ Reposta: se privillegio teemdes e vos vão comtra elle em allg?ua parte por- 265 Sic.
266 No final da página escreve: e a outros quaesquer, palavras que repete no início da página seguinte.
quamto nos nom podemos mudar os primeiros juizes com rezam pero a supe-

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

23 mamdassemos dar nossa carta com ho theor do dito capitollo com nossa
reposta porque lhe era compridoiro e se emtemdiam dello ajudar. ¶ E nos
visto seu pedir lhe mamdamos dar como dicto he e porem mamdamos a
todollos juizes e justiças de nossos regnos 268 comtadores allmoxariffes e
quaaesquer outros officiaaes e pessoas a que esto pertemceer que lha
cumpram e guardem e façam mui bem comprir e guardar como em ella he
1468, Maio, 29, Santarém – Capítulo especial da Guarda às Cortes de San- comtheudo. Dada em a dita villa de Samctarem a vymte nove dias de Mayo.
tarém de 1468. Rodrigo Annes a fez. Anno de mill IIIIc LXVIII. ¶ E eu Duarte Guallvam
secretairo del rei nosso senhor a fez escprever.
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fl. 201.
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. XII, pp. 181-182.

[fl. 201/1.ª col.] A cidade da Guarda capitollos espiciaaes per que he mam-
dado que se cumpram os capitollos e ordenaçõoes feictos sobre hos coudees e
escprivãaes nam serem mais de tres annos e ha por revoguadas as cartas e all-
varaaes que passarem em comtrairo.

Fig. 17 – Guarda [1] (página inteira, ao lado)


Capítulos especiais dos concelhos da Guarda e do Sabugal. Cortes de San-
tarém de 1468.
IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fl. 201.

Dom Affomsso etc. a quamtos esta carta virem fazemos saber que em as
cortes que ora fezemos em esta mui nobre e leall villa de Samctarem per os pro-
curadores da cidade da Guarda nos forom dados certos capitollos267 espiciaaes
por parte da dicta cidade dos quaaes o theor de huum delles com nossa reposta
he este que se segue.
(1) ¶ Quanto ao que dezees que per capitollos e hordenações nom devem
seer coudees nem escprivãaes senom tres annos e que elles acabados empetram
mais cartas e allvaraaes doutros tres e asy numca saem de coudees e escpri-
vãaes pedimdo-nos que mamdassemos que taaes allvaraaes lhes nam valham
mais sem embarguo delles se cumpram os capitollos.
¶ Reposta: nos avemos por bem e mamdamos que se cumpram hos capitol-
los e ordenaçõoes sobre esto feitas e se allguuns allvaraes ou cartas nossas sam
passadas ou ao diamte passarem em comtrairo desto as re[fl. 201/2.ª
col.]voguamos e avemos por nenh?uas porquamto nossa temçam he se guar-
darem as dictas hordenaçõoes e capitollos. 267 No texto capitotollos. Repete to ao mudar de linha.
268 Repete de nossos regnos.
¶ Pedimdo-nos os dictos procuradores por parte da dita cidade que lhe

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

24 que vos pedimos por merce que esto queiraees correger e nos nam queiraees
em esto agravar.
¶ Respomde el rey que ha por bem e manda ao dicto corregedor que seme-
lhantes presos nam tire nem leve pera fora salvo nos casos que per seu regi-
mento lhe he outorguado ou per especiall mandado do dicto senhor e fazemdo
o comtrairo tomem estormento com sua reposta e ser-lhes-ha dada provisam
1473, Março, 27, Évora – Capítulos especiais da Guarda às Cortes de quall seja razam e direito.
Coimbra/Évora de 1472-73. (3) ¶ Item senhor ho dicto Fernam Cabrall e seu ouvidor manda citar
peramte sy muitas pessoas desta cidade e termo e os ouve per nova auçam o
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 187v.º-188. que he contra nossa liberdade e privillegeo que acerca dello temos. Pedimos-
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. XIV, pp. 183-184. vos por merce que mandees esto correger e nos 269 mandees fazer em ello o que
devees e esperamos.
[fl. 187v.º/1.ª col.] A cidade da Guarda carta com ho theor de certos capi- ¶ Responde el rey que ha por bem e manda ao dicto corregedor que salvo
tollos que fallam [fl. 187v.º/2.ª col.] em o corregedor da comarqua nam se nos casos que declarados sam em seu regimento ou per hordenaçom alg?ua
emtremeter nos feitos d’almotaçaria nem leve os presos miseraveis fora da nam tome conhecimento per auçam nova e antremetendo-sse elle per nova
cidade nem tome conhecimento dos feitos per nova auçam aos qua?s he res- auçam de conhecer allem dos ditos casos tomem estormento com sua reposta
pomdido. e mandara prover sobre ello.
¶ Pedimdo-nos por merce o dicto Duarte Gomçalvez que porquanto ha
Dom Afomsso etc. a quantos esta nossa carta virem fazemos saber que per dicta cidade se emtendia ajudar dos dictos capitollos e nossas repostas a elles
Duarte Gomçalvez nosso escudeiro que por procurador da nossa cidade da dadas lhos mandassemos dar per nossa carta. E visto per nos seu requeri-
Guarda foy emviado a estas cortes que ora fizemos nos forom apresemtados mento prouve-nos dello e porem mandamos a todollos nossos corregedores
certos capitollos dos quaes com nossas repostas a elles dadas o theor de verbo juizes e justiças officiaees [fl. 188/2.ª col.] e pessoas a que o conhecimento
a verbo he este que se adiamte segue: desto pertemcer que cumpram e guardem e façam em todo bem comprir e
(1) ¶ Senhor Fernam Cabral vosso regedor da justiça nesta comarqua toma guardar os dictos capitollos com nossas repostas assy e pella guisa que em
conhecimento dos feitos d’almotaçaria o que nam deve tomar segumdo a hor- ellas he contheudo e lhe nam vãao nem comsentam hiir comtra elles em
denaçam porque depois que o almotace julgua a cousa vem por agravo aos jui- alg?ua maneira porquamto assy he nossa mercee. Dada em a nossa cidade
zes e dos juizes a rollaçam e allii faz fim. Pedimos-vos por merce que esto d’Evora a XX e sete dias do mes de Março. El rey o mandou per dom Joham
mandees correger por as partes nam averem tamta custa e nam quebrantes Galvãao bispo de Coinbra etc. escprivam de sua puridade etc. Fernam d’Es-
nossos privillegeos nem presumaees de nossas comciemcias que sam tam maas panha a fez. Anno de mill IIIIc LXXIII.
que nam faremos e guardaremos direito aas partes.
¶ Respomde el rey que ha por bem e manda a seu corregedor que ora hor-
dena que fica naquella comarqua que dos feitos das almotaçarias se nam antre-
meta salvo nos casos que detreminados e declarados forem em seu regimento
ou per hordenaçõees que ho possa ou deva fazer.
(2) ¶ Item senhor ho dicto Fernam Cabrall e seu ouvidor manda levar da
cadea desta cidade a sua correiçam pessoas miseraves que sam presas per os
juizes desta cidade [fl. 188/1.ª col.] e de que elles podem fazer direito e em os
269 Segue-se nam riscado.
assy mandar levar nos faz o que numca fez nenhuum que amte elle fosse por

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

25 daquy em diante elle nem outro alguum que tall carreguo tever nom tome273
tall conhocimento e o leyxe aos juizes hordenairos.
Responde el rey que nom ha por bem que estee mays do que he determinado
per a hordenaçam e capitollos de cortes nem tome conhocimento de nenhuuns
fectos senom daquelles que pode per bem da dicta hordenaçam e capitollo e
manda que mais o nom faça sem seu espiciall mandado so pena de privaçam
1482, Abril, 16, Viana do Alentejo – Capítulos especiais da Guarda às Cor- do oficio.
tes de Évora/Viana de 1481-82. (2) Item senhor quando vem aa dicta cidade manda meter a cadea da
correyçam dentro no paaço do concelho honde a dicta nossa cadea esta e o que
A) IAN/TT, Chancelaria de D. João II, L.º 2, fls. 79-80. pior he que hainda que os juizes mandem prender alguum homem vãao aa sua
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 166-168v.º. cadea e nom quer que o cadeiro nosso ajasse dirreito. Seja vossa mercee lhe
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. XV, pp. 184-188. poerdes tall pena que daquy em diante elle ou outro quallquer que tall carre-
guo tever nom meta ahy a cadea e se ponha como senpre hantygamente custu-
[fl. 79]270 A cidade da Guarda capitollos espiciaaes de cortes per que he pro- mou de lhe darem casa assaz forte em que hos pressos da correyçam bem
vydo a cousas imsertas nesta carta. possam estar.
Responde el rey que manda que o ouvidor ou corregedor senpre mande bus-
Fig. 18 – Guarda (página inteira, ao lado) car cassa pera ter sua cadea apartada da da cidade. Soomente quando chegar
Capítulos especiais do concelho da Guarda. Cortes de Évora/Viana de ataa tres dias a possa neella teer se antes a nom poder aver que seja perten-
1481-82. cente. E porem que nestes dias nom seja tyrado274 o dirreito ao cacereiro e aos
IAN/TT, Chancelaria de D. João II, L.º 2, fl. 79. juizes da vylla segundo seu foro.
(3) Item senhor tanto que aqui he manda que lhe dem contynoadamente
Dom Joham etc. a quantos esta carta vyrem fazemos saber que aas cortes guardas pera os pressos o que se nunca fez nos tempos dos outros corregedores
fezemos271 por parte dos juizes oficiaaes provereadores272 e procuradores e e como quer que lhe seja defesso e asy requerido que nos nom faça tall opres-
homeens boons da nossa cidade da Guarda nos forom apressentados certos som procede loguo contra os juizes com asperas penas e por vossa alteza seer
capitollos espiciaes per que estas cortes emvyarom por procurador dos quaes senpre allongado desta terra com seu temor lhas dam. Pedimos-vos por merce
com nossas repostas a elles dadas ho theor he este que se adiante segue: que lhe ponhaes taaes penas que taaes guardas nom peça e pedindo-as que lhas
(1) Item senhor Gonçalo Gonçallvez ouvydor de Fernam Cabrall see veem a nom demos nem posamos emcorrer em penas per elles postas em tall casso.
esta cidade e esta em ella huum anno e acerqua de dous conthinuamente sem [fl. 79v.º] Responde que manda ao ouvidor que nom de opresam ao povoo
nunca daquy partir. E o que pior he toma conhecimento de todollos fectos asy das dictas guardas salvo quando lhe parecer que som assy necesairas per bem
civees como crimes sem querer que os juizes conhoçam dello e como quer que de justiça per alguuns cassos spiciaaes que se nom podem escussar.
seja defesso per capitollos de cortes e hordenaçõoes e asy pello regimento que (4) Item senhor outro agravo recebemos do dicto ouvidor que quando ha-
lhe he dado que dos fectos que os juizes disserom que podem fazer dirreito que de aballar desta cidade pera outra parte manda coutar XX ou XXX carros
elle nem outro alguum nom tomem conhocimento e elle faaz todo pello con- pera levar os pressos nelles e muitos se acenta que vãao assy atrouxados que se
trairo. Seja vossa merce mandardes tall mandado sob certas penas graves que nom podem bulliir e alguuns que vãao doentes e outros muito trabalhados das

270 Regista-se na margem capytollos e a anteceder o texto capitollos da Guarda. 273No texto tomem com o último m riscado.
271 Sic. 274O escriba rematou aqui a resposta com o sinal que habitualmente utiliza para o efeito, o qual em seguida ris-
272 Sic. cou para escrever as palavras em falta.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

prisõoes prelongadas en que os tem e per o tormento dos dictos carros morrem der e ouver por emfformaçom que hy <nom> ficariam seguros por fraqueza
e outros ficam cassy mortos. E porque en todos vossos regnos nom se fez nem das prisõoes ou sendo pessoas poderossas e assy aparentados per que a elle
faaz tall coussa nem opresam ao povoo como este pidimos-vos per mercee que pertencer ho conicimento segundo forma da hordenaçom.
deffendaaes assy a elle como a outro quallquer que tall carreguo tever que taiis (6) Outro agravo senhor recebemos do dicto ouvidor que quada vez que nos
boiis nem carros lhe nom dem e os levem pressos assy como os pressos da a dicta cidade vem que he muito hameude e per grandes tempos manda logo
cadea da vossa corte que he mayor coussa de vossos reynos. E assy senhor se aos officiiaes que lhe mandem trazer muitas carradas de lenha e palha e junco
arredara perdiimento de boiis e homens e outros homens e outros malles que sem dinheiro e como lhe tam asinha nom vem manda penhorar os officiiaes em
se desto segem e muitas geyras aos pobrres dos lavradores porque em duas certo dinheiro pera chancelaria ho que se nom faaz em nenh?a terra nem tan-
legoas pohem huum dia todo e os boiis ficam taiis pera todo huum mes nom pouco em vossa corte que cada huum manda por semelhantes coussas per seus
fazerem coussa alg?a. azemes e se alg?as oras vossos oficiaes mandam por semelhantes cousas e os
Responde el rey que manda ao ouvidor que quando ouver de mandar os mandam pagar as vontades de seus donos pidimos por merce que mandes que
pressos de h?a parte pera outra que os tratem bem e assy os morradores da tall palha nem lenha nem junco lhe nom seja trazido e querendo elles estas
terra com a menos opressom que poder guardando a segurança que conpre ao coussas que as pagem as vontades de seus donos e nom as querendo pagar que
bem da justiça. mandes que tall coussa ou coussas lhes nom tragam e ajaaes por nenh?as as
(5) Item senhor outro agravo recebemos do dicto ouvidor que quando quer penas sobre tall casso postas.
que os juizes desta cidade mandam prender alguns homens ou molheres por as Responde el rey que nom ha por bem de em as taaes coussas se servir de
culpas em que os acham ou por taaes querellas per que pressos devem ser logo graça mas que as deve de pagar pellos preços da terra segundo he determinado
manda aos juizes da dicta cidade sob certas penas que lhes emviiem a cadea da por ha hordenaçom e que se alg?as coussas levou como nom deve as apontem
correyçom que he contra todo dirreito e justiça e contra275 os dictos capitollos pera sobre ello prover277.
e hordenações e regimento seu como dicto he. Pidimos-vos por mercee que def- (7) Item senhor de custume antiigo foy sempre que quando quer que se acer-
fendaaes assy ao dicto ouvidor como a outro quallquer que daqui em diante tava viinrem i casar ha esta cidade alguuns criados dos rex pasados e asy dou-
tall carrego tever sob certas penas que tall conhicimento nom tomem nem tros senhores os cidadãoos que aaquelle tempo erom vyvos lhe davom logo
mandem ir taaes pressos a cadea da correyçom e os leyxem276 livrar com seu juramento que fossem a seu serviço e que prometiiam de seer sempre em ajuda
dirreito aos juizes da dicta cidade dando apellaçom e agravo nos cassos que e acrecentamento das liberdades e franquezas da dita cidade e asy que per este
devem e que faram dirreito e justiça inteyramente daquelles que elles manda- respeito a dita cidade era asy regida e governada que toda ha Beira tomava della
rem prender. E que posto que por elles mandem que lhes nom guardem tall regra e ora de poucos anos ha esta parte Gonçalo Gonçallvez ouvidor de Fer-
mandado e os tristes pressos pobrres nom andarem apodrrecendo na dicta nam Cabrall por fazer divissom antre nos foy fazer XII da rollaçom meteendo
cadea como em ella muitos morrem por se fazer III quatro cinquo messes que em ella os que lhe aprouve e leixando fora della outros muitos boons que ho
lhe la nom he fecta h?a audiencia o que juizes he pello contrayro e lhes faze- mui bem mereciam seer pella qual cousa a dita cidade des entom atee ora sem-
rem ao menos trres vezes na semana audiencia. E ysso mesmo lhe mande que pre foy mall regida e desgovernada pella divissam que antre nos geerou nem
brevemente ouça e determine os fectos dos pressos que em sua cadea andam estes doze nunqua podem seer sempre juntos pella quall razom muitas cousas se
porque muito relleva senhor saber vossa conciencia andarem aly comendo os deixam fazer. Pidimos-vos por mercee que por serviço de Deus e vosso e bem
pees e mãaos e despenderem ho que tem. desta cidade e asesego nosso mandeeis que sem embargo de tais doze quais per
Responde el rey que ha por bem que se nom mudem dos lugares donde for- o dito ouvidor forom feitos e husemos e nos regamos como sempre d’antiga-
rem pressos e em que fezerem os malifficios salvo quando ho ouvydor enten- mente se sempre costumou e asy senhor viveremos em muita paz e fareis a nos
muita mercee alleem de seer muito vosso serviço taaes XII hy aver.
275 Segue-se a letra e riscada.
276 Palavra emendada: a letra x está escrita sobre um z. 277 Palavra emendada: escreveu proverem, riscando depois as últimas letras de forma a ler-se prover.

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Responde el rey que vaa carta ao ouvidor que emvie quallquer carta ou soomente de tres em tres anos e que em este tempo façam os allardos ordena-
determinaçom que ouver pera seerem ordenados XII que rejam ha cidade com dos em seus regimentos e ora senhor sem embargo da dita ordenaçom e capi-
seu parecer do que acerqua desto souber. tollos <ha hi> mui muitos que teem ho dito officio em suas vidas per cartas
(8) Item senhor como ja dito he conheceendo os rex pasados que tamto era aselladas com clausullas que dizem expresamente que os tenhom sem embargo
seu serviço a dita cidade seer povorada lhe dera muitas liberdades antre as de tal ordenaçom nem capitollos feitos em comtrairo e ho que pior he que
quais he que os moradores da villa e termo nom paguem portagem nem husa- fazem em cada huum ano tres allardos e de cada h?a pesoa da marca das armas
gem em todos vossos reinos e como quer que mostrem vossos privillegios lhos levom dous reaaes que he huum roubo a vosso povoo. Seja vossa mercee pro-
nom querem gardar amtes lhe vaam em todo comtra o dito privillegio. Seja veer sobre ello e nom consinta taaes sayorias e taes cartas seerem em sy
vossa mercee agravardes mais vosso mandado sob certas penas a quem quer nenh?as nem levem dinheiros soomente ho primeiro alardo como emtrarem no
que as nom quisser gardar. E bem assy teemos privillegios que nom paguemos dito officyo per que se paga a carta e seello della como sempre se costumou
montados em todos vossos regnos o quall vos nom querem gardar. Seja vossa porque senhor he huum carrego de grande sayoraria e sogeiçom no que lhes
mercee mandardes a todos em geerall que nos gardem o dito privillegio de vossa senhoria fara grande mercee e a vosso povoo grande desencarrego.
montado pois todos nossos vizinhos veem pacer em nosso termo sem pagarem Responde ell rey que ha por bem que se garde niisto a determinaçom e orde-
montado que razom seria nos nom pacermos asy co[m] elles porque a justiça naçam a quall he que nom aja hy coudell senom de tres em tres anos e que se
deve seer igall. carta alg?a hy ha comtra histo ou alvara que ho ha por revogado e quanto he
[fl. 80] Responde ell rey que ha por bem e manda que lhe sejom gardados ao marcar das lanças que manda que nom levem mais do que per seu regi-
seus privillegeos e enteiramente e per dirreito deve e se os gardar nom quisse- mento lhe perteence levar e manda ao coregedor da comarca que lho nom
rem que tomem stormento com reposta dante as justiças a que perteemceer e comsemta mais levar.
lhe darom provissom e castigo aos que ho asy nom fezerem. Dos quais capitollos com nossas respostas ha elles dadas ho dito Lopo
(9) Item senhor por em esta cidade em ella nom aver lavras nem outros olli- Fernandez procurador nos pidio que lhe mandassemos dar ho trellado
vaais nem outra cousa pera seu soportamento soomente alguuns vinhos que porquanto se emtemdia dello ajudar e nos visto seu requerimento lhe
emcubam em a dita cidade com muito trabalho e despesa que sobre ello faz mandamos dar ho dito trellado em esta nossa carta pella quall mandamos a
como quer que hy aja privillegio e forall e asy vereaçooens e comfi[r]maçooens todollos nossos corregedores juizes e justiças oficiaaes e pesoas a que ho
dos rex pasados que nenhuum nom meta vinho de fora do termo comtra ho conhocimento desto perteencer per quallquer guissa que seja que cumpram e
dito forall que278 vãao muitos e metendo o dito vinho comtra nossas liberda- gardem e façom280 inteiramente comprir e guardar as ditas nossas repostas
des seja vossa279 mercee agravardes mais a dita pena mandando que quallquer como em ellas he comtehudo sem outra duvida nem embargo que ha ello
que meter vinho de fora comtra o dito forall que seja degradado pera os luga- ponhais porque asy he nossa mercee. Dada em ha nossa villa de Viana de par
res d’aallem por dous anos e asy senhor nossa liberdade nom sera quebrantada d’Alvito aos XVI dias do mes d’Abrill. Joham Diiaz ha fez. Ano do
e sera acrecentamento de vossas rendas porque se se ho foral bem gardasse e Nacimento de Nosso Senhor Jhesu Christo de mill e IIIIc LXXXII anos. E eu
se nom metessem os ditos vinhos de fora senom os da cidade renderia quo- Alvaro Lopez secretario do dito senhor rey a fiz screver per seu mandado.
reenta ou cinquoemta mill reais e por causa desto nom rende XV ou XX reais.
Responde ell rey que ha por bem que se garde e quanto aa pena que lhe nom
parece rezom de agravar mais.
(10) Item outrosy senhor he hordenaçom do reino e capitollo<s> em cortes
que nenhuum nom tenha officio de coudellaria de nenh?a cidade nem villa

278 Segue-se riscado: seja degradado pera os lugares d’aallem per dous anos.
279 Repete seja vossa ao mudar de linha. 280 Segue-se gardar sopontado.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

26 cada anno quorenta e cinquoenta mill reais e estes que ho ora novamente fazem
estas estalages tem tavernas pubricas dos vinhos que asy metem de forra da dicta
cydade pella quall razam os vinhos dos moradores da dicta cydade nam podem
ser vendidos ho que he mui pouco voso serviço e dano e estroyçam daquelles que
continoadamente vos am de servir e servem. Pedem a vosa alteza que sobre esto
os provejaees com justiça e mandes e defendaees aos dictos estallajadeyros que
1490, Julho, 15, Évora – Capítulos especiais da Guarda às Cortes de Évora taees vinhos aos moradores da dicta cydade nam vendam salvo aos que asy
de 1490. derem pousadas e dando-ho doutra guisa que pagem ha pena contheuda no
dicto forall e per aqui os cavaleyros e escudeyros vosos teram com que vos ser-
A) IAN/TT, Chancelaria de D. João II, L.º 16, fls. 26v.º-27. vir e vosas rendas nom seram abatidas como sam. E bem asy se alguns pescados
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fls. 146v.º-147. mandam trazer do mar como reguataees que os posam vender sem almotaçaria
Publ.: Rita Costa Gomes, A Guarda Medieval…, doc. XVI, pp. 188-190. aos que asy derem pousadas segundo ho desejo e forma de seu privilegio e
fazendo ho contrairo que paguem mill reais pera rendiçam dos cativos porque
[fl. 26v.º] A cidade da Guarda carta com o theor de certos capitullos per que senhor com este nome d’estallagadeyros honde ho aratell do pescado vall pellos
he provydo que emquamto na cidade ouver vinhos os estalajadeiros ho nam almocreves da dicta cydade a quatro e cinquo reais pouco mais ou menos elles
metam de fora e gastem da cidade e outras cousas a que he dado reposta. dan-no-o aos cydadaees a dez e a doze ho arratell dizendo que por razam de seu
privilegio lhe nom podem poer almotaçaria no que vendem e a dicta cydade diz
Dom Joham per graça de Deus rey de Portugall e dos Algarves d’aquem e que aquello se entende nos que em suas casas pousam. Pedem a vosa alteza que
d’alem mar em Afryca e senhor de Ginee a quantos esta nosa carta virem faze- lhes confirmes ho per elles pedido porque nom seria razam nem justiça por dous
mos saber que nas cortes que ora fezemos em a nosa cidade d’Evora por parte ou tres regataaes a dicta cydade ser roubada e destroida.
dos juizes e oficiaaes e homeens boons da nosa cidade da Guarda per Lopo Responde el rey que nam he bem vedar as estallajees mas que lhe praz que
Ferrnandez escudeiro que por procurador da dicta cydade as dictas cortes foy emquanto na cidade ouver vynhos que os estalajadeiros nam metam pera abas-
enviado nos foram apresentados certos capitullos dos quaees com nosas repos- timento dellas vynho de fora senam que o guastem da cidade e estas estallajees
tas a elles dadas o theor he este que se ao diante segue: nam sejam vendas mas estalajees que tenham camas e strebarias como devem
(1) Item senhor a vosa leall cidade da Guarda recebe huum muy grande e quanto ao vender do pescado a sua alteza por bem que os vyerem comer a
agravo per aquelles que orra novamente pedem privilegios pera terem estalages sua estallajem ou suas estalajees o vendam a seu prazer e os outros da vylla a
os quaees privilegios lhe vosa alteza daa que posam meter vinhos de forra do que o venderem seja pello estado dos allmocreves da terra.
termo da dicta cydade sem embarguo de seus privillegios que tinhamos en con- (2) Outrosy senhor a dita cidade he muy agravada per huum alvara que ora
trairo e bem asy posam vender quaeesquer carnes e pescados os que a suas pou- novamente vossa alteza deu ao bispo da dicta cidade pello quall nossa alteza manda
sadas vierem pousar porque este he ho desejo de seu privillegio e porque senhor aos juizes e oficiaes que arecebam em suas prisooes quaaesquer pesoas que lhe o
a dicta cydade tem este privillegio em especiall que ne[n]huum nom meta vinho dicto bispo e seus vyguayros mandar o que nunca prellado de vossos regnos ouve
de forra do termo sob certa pena que no dicto forall e sentenças he contheudo281 nem requeresem sallvo este por cuydar que per aquy tem a dicta cidade sogeita e a
pellos moradores e cydadãaos que em ella vivem nom terem outra cousa por que seu mandar. Se vossa alteza esto nam correger o que della nam esperamos serraa azo
viver somente estes vinhos que asy adubam fora da dicta cydade quatro e cyn- de sermos muito pior acordados do que somos porque o dicto bispo nam pidio a
quo legoas e lhe custa a trazer a dicta cydade quatro e cinquo reais cada almude vossa alteza tall alvara por lhe seer necesario pois milhor aljube e cadeas e cacere
e por asy se venderem per ordenança ho ramo dos vinhos da dicta cidade rende teem que a dicta cidade soomente fe-llo por favor seu e abatimento282 dos cidadãees

281 No texto contheudas com as letras das riscadas e corrigidas sobre a palavra para do. 282 No texto abatimentos com o s riscado.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

e rejedores da dicta cidade. Pedem a vossa alteza que tall alvara aja por ne[n]huum 27
pois que por elle a cidade recebe grande agravo e em quebrantamento de vossa jur-
diçam recebe-llo-hemos em grande mercee.
[fl. 27] Responde el rey que ha por bem que se guarde283 huum anno con-
tado da feitura delle e acabado se nam goarde mais.
Os quaaes capitollos com 284 nossas repostas a elles dadas ho dicto Lopo
Fernandez procurador nos pidio que lhe mandesemos dar ho trellado 1468, Maio, 22, Santarém – Capítulo especial de Marialva (fr. c. Mêda) às
porquanto a dicta cidade se entendia delles ajudar e nos vysto seu Cortes de Santarém de 1468.
requerimento lhos mandamos dar. E porem mandamos a todollos nossos
corregedores juizes e justiças oficiaes e pesoas a que conhecimento desto B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 293.
pertencer per quallquer guyssa que seja e esta nossa carta for mostrada que a
cunpram e guardem e façam inteiramente conprir e como em ella he [fl. 293/1.ª col.] Aa villa de Mariaalva capitollos espiciaes per que prouve a
contheudo sem outra duvida nem embarguo que a ello ponham porque assy el rey que o numero dos besteiros do conto fosse tornado em doze.
he nossa merce. Dada em 285 a dicta cidade d’Evora a XV dias do mes de
Julho. Pedr’Eanes a fez. Anno do Nacimento de Nosso Senhor Jesu Christo Dom Afomsso etc. a quamtos esta nossa carta virem fazemos saber que em
de mill e IIIIc e noventa. E eu Alvaro Lopez secretario do dicto senhor rey a as cortes que ora fazemos em esta muy nobre e leall villa de Samtarem per os
fyz escprever por seu mandado. procuradores da villa de Mariaalva que a ellas mandamos viir nos foy dado
huum capitollo espiciall por parte da dita villa e ao pee delle nos demos nossa
reposta do quall o theor he este que se segue:
(1) ¶ Primeiramente ao que dizes que na villa e termo soya avir286 oytocen-
tos homens e nam ha [fl. 293/2.ª col.] mais de cento e cinquoemta e que o
numero dos besteiros do comto sempre foy em essa villa vinte e huum antigua-
mente quamdo hii avia esta gente pidimdo-nos que sejam dez porque a mor
parte dos que os sam sam lavradores que per a hordenamça deviam seer escu-
sos e pois que sam menos as tres partes da gente que soya.
¶ Reposta: a nos praz que seja o numero dos ditos besteiros do conto tor-
nado em doze e nam aja hii mais daqui em diante.
¶ Pidimdo-nos os dictos procuradores que lhe mandassemos dar nossa
carta com o theor do dito capitollo com nossa reposta por que lhe era
necesario e se emtendiam delle ajudar e nos visto seu pedir lha mandamos
dar como dito he. E porem mandamos a todollos nossos corregedores juizes e
justiças contadores e almoxarifes e a quaesquer outros oficiaees e pessoas a
que esto pertencer e esta nossa carta for mostrada que lha cumpram e
guardem e façam bem e imteiramente comprir e guardar como em ella he
comtheudo. Dada em a dita villa de Santarem a XXII dias de Mayo. Joham
283 No texto guardem com o m riscado.
Vãaz a fez. Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jhesu Christo de mil IIIIc
284 Segue-se a riscado. LXVIIIº. E eu Duarte Galvãao secretario del rey que esto fiz escrever.
285 Segue-se a nossa riscado e depois repete em. 286 Sic.

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28 (2) Item senhor em termo da dicta villa ha outra aldea en que antigamente
viviam XV ou vinte homeens aa qual chamam Hervilham desta aldea foy fecta
mercee a Gonçallo Vaasquez Coutinho e como a ouve quisera seer vizinho e por
nom comprazer dello aos homeens boons andarom com elle em demanda en
tanto que per sentença del rey foy mandado que nom fose vizinho. Asy senhor
que por esto ficou elle em tal desacordo com a dicta villa que so teençam de mal
[1439]287 – Capítulos especiais de Pinhel às Cortes de Lisboa de 1439. vizinhar de stragar os moradores della leixou despoboar a dicta aldea de todo a
seer como he herma e meteo-a toda em coutada lançando em ella egoas e vacas
A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 2, fls. 26-27. e fez condiçom no couto que qualquer morador de Pinhel que hi for achado
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fls. 254-255v.º288. com gaados que pague VI292 soldos por os quaaes muitos som penhorados e em
seus beens fecta execuçom em tal guisa que por a dicta aldea seer asy envestida
[fl. 26] Aa vila de Pynhel capitolos espiciaaes per que he mandado que nam dentro em o termo nom se pode scusar que alg?as vezes nom errem e ainda he
se mostramdo carta del rey dom Joham per que se podese fazer a coutada a pior que as egoas e vacas som tantas que huum mes se nom podem manteer em
aldea de Hervylham e comfirmaçam del rey dom Duarte 289 ha nam guardem a dicta coutada293 e saaem della e vãao a stragar os pãaes e frutos dos morado-
por coutada e que <lhe> seja guardada a carta que tem per que servam todos res da dicta villa e pero recebam estes agravos com temor do dicto Gonçallo
no serviço do concelho e 290 outros capitolos 291 necesaryos a que he provydo Vaasquez e asi de Vaasco Fernandez seu filho nom ousaram nem ousam reque-
per repostas. rer acerca desto seu direito. Pedem-vos por mercee que nom dees lugar a tal des-
troiçom como se atee ora fez e mandees que nom seja tal coutada com tal pena
(1) Os cavaleiros e scudeiros e homeens boons moradores da vosa vila de posta nem se guarde. E que outrosy se as egoas e vacas fezerem dano nos pãaes
Pinhel fazemos saber aa vosa mercee que antigamente a dicta villa ouve por e frutos que os paguem e que os moradores de Pinhel ajam servidom e logra-
seu termo h?ua aldea que chamam Santa Oufemea e seendo asy termo Gon- mento da dicta aldea como antigamente ouverom ca sem esto a dicta villa
çallo Vaaz Coutinho pidio a el rey voso padre cuja alma Deus aja que lha dese recebe tal dano que nom he duvida por ello despoboar a moor parte das outras
por termo pera Trancoso e asi lhe fez o dicto senhor a dicta mercee prome- aldeas do termo en que ha bem duzentos moradores porque senhor soomente
tendo ao dicto concelho de lhe dar outra aldea por ella o que nunca veo a exe- por os danos das dictas egoas e vacas [fl. 26v.º] homeens hi ha que poderiam
cuçom avendo desto certas cartas testemunhavees de protestações que a dicta aver mil alqueires de pam nom pode[m] aver duzentos alqueires. A fora que por
villa acerca desto filhou. Pidimos-vos por mercee que em gallardom dos servi- medo dos dictos danos por taparem seus pãaes se perdem mais de mil e qui-
ços que a dicta vila fez e desy por comprirdes a condiçom que com ella fez el nhentas geiras. Vosa mercee proveja esto.
rei de lhe dar outra aldea por aquella que asi lho compraaes ou lhe seja aquella Mandamos que vaa carta ao corregedor da comarca que se se nom mostrar
tornada por termo ou tomada outra a Trancoso e entregue a Piinhel. por parte de Gonçallo Vaasquez carta del rey dom Joham per que podese fazer
Sobr’esto mandamos que citem o procurador do concelho de Trancoso tal coutada e confirmaçom del rey Duarte e nosa que lha nom guarde e mande
perante o corregedor da comarca se tem algum direito ou razom a ello o qual que seja devasada como era dantes e husem como antigamente husavam e se
corregedor queremos que os ouça dando apellaçom ou agravo. se dello agravar que ouça seu procurador com o dicto concelho dando apella-
çom e agravo.
287 Cfr. supra, nota 238. (3) Item senhor em o termo da dicta villa ha outra aldea que chamam Col-
288 Armindo de Sousa refere esta cota para os capítulos especiais de Pinhel às Cortes de Lisboa de 1459 (As Cor- meal e em a dicta aldea vivem certos caseeiros de Joham de Gouvea alcaide de
tes Medievais Portuguesas…, vol. II, pp. 26 e 56).
289 Seguem-se letras riscadas.

290 Seguem-se letras riscadas e repete a letra e. 292 Segue-se reais riscado.
291 Repete e risca a palavra capitolos. 293 Seguem-se as palavras huum mes ligeiramente raspadas.

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Castel Rodrigo e estes moradores da dicta aldea e asy os caseeiros do dicto vinhos ascondidamente contra a postura do dicto concelho. Pedem-vos por
Joham de Gouvea todos recebem a prol comunal e cousas necesarias da dicta mercee que mandees que nom aja hi a dicta estallagem salvo a que antigamente
villa e quando som costrangidos pera soportarem alguuns encarregos do con- foy fecta pello dicto concelho e que outrosy nenhuum nom posa britar os cus-
celho o dicto Joham de Gouvea defende os dictos seus caseeiros que nom ser- tumes e foros que o dicto concelho antigamente hordenou por seu proveyto e
vam e porque vosa mercee sabe que he regra que quem sente o proveyto deve prol e honrra da terra.
sentir o trabalho por esto vos pedem por mercee que mandees que servam asi Agora teemos mandado que se façom pello regno as mais stallageens que se
como os outros moradores do termo da dicta villa e que o dicto concelho os fazer poderem e portanto nom avemos por bem seer ora esta tirada.
possa mandar costranger porque acerca desto tem o dicto concelho carta spi- (6) Item senhor a vosa mercee sayba que no mais fraco lugar que o muro
cial que ouve del rey voso padre. tem pera aver combate cayo huum trauto do dicto muro que esteve huum
Mandamos que seja guardada sua carta que teem sem embargo de novo grande tempo por fazer e ora novamente quando foy dicto que se movia guerra
huso do dicto Joham de Gouvea. o concelho se trabalho<u> de o fazer no quebrado h?ua parede synprez de
(4) Outrossy senhor este concelho tem huum lugar na meetade de seu termo pedra delgada sem quantaria e tal parede nom he pera defensom que proveyte
a que chamam o Colmeal Lamegal e este logar he de Gonçallo Pereira porque e com h?ua torre que se no dito logar fezesse que era pera elle muyto provei-
lhe foy dado per el rey voso padre. Este lugar nos tempos das guerras senpre tosa seria h?ua grande segurança pera qualquer tempo de desacordo. Pedem-
ouverom acolhimento e se defensarom na dicta villa soportando os carregos vos por mercee que mandees como per hordenaçom se faça naquelle logar a
das roldas e vellas e depois que o dito Gonçallo Pereira ouve o senhorio nunca dicta torre dando carrego a quem a encaminhe e sera muito voso serviço e
quis nem quer consentir que servam nos carregos spiciaaes asi como pontes segurança prol e honrra da dicta villa.
fontes muros calçadas vellas e roldas. Em esto senhor recebem agravo os Desto nos praz e antre vos hordenaae o modo que vos parece que se sobre ello
moradores da dicta villa. Pedem-vos por mercee que mandees que pois que pode teer e enviaay-no-llo mostrar e entom mandaremos o que se aja de fazer.
elles defensam no dicto logar e delle am as cousas necesarias que desa guisa (7) Outrosy senhor acerca da dicta villa correm duas ribeiras.scilicet. a
soportem os dictos carregos aqui declarados e pera ello sejam costrangidos ribeira de Coa e ribeira de Pynhel e antigamente forom em ellas fectas pontes e
como os outros. depois por fortunas das aguas cayram as dictas pontes e per tal falicimento se
Mandamos que façom sobre esto requerimento a Gonçallo Pereira e tomem perdem em cada huum anno e morrem nas dictas ribeiras muitas gentes o que
estormento com sua reposta e entom averam desembargo. se bem pode remediar se vosa mercee prouver de o encaminhar. Pedem-vos por
(5) Item senhor este concelho tem por sua h?ua stallagem que he dentro na mercee que por serviço de Deus e por [fl. 27] honrra da terra mandees como se
vila e he h?a das boas casas da Beira. Outrosy senhor o dicto concelho tem façom duas pontes nos dictos rios. E porque o dicto concelho he muyto pobre
antigamente posto foro huso e294 custume que nenhuum nom meta vinho velho e nom pode soportar o dicto encarrego pedem-vos por mercee que pera ajuda
nem novo de fora parte na dicta villa nem termo enquanto em ella ouver vinho de se as dictas pontes fazerem nos mandees dar por alguuns annos o risidoo da
sob certa pena. E senhor pode ora aver dous ou tres annos que el rey voso dicta villa e de Castel Rodrigo tomando-se conta polla recepta e despesa en tal
irmãao cuja alma Deus aja deu h?ua carta a huum Gonçallo Lourenço que guisa senhor que todo posa vir a boa 295 conhocimento e em esto nos farees mer-
fezese h?a stalagem fora da villa e dello segue-se grande perda ao concelho por cee. Aa qual praza proveer estes capitollos e compridamente os dardes aa exe-
estas razõoes: a primeira porque tal enovaçom a estallagem de dentro da villa cuçom como em elle he contheudo como a senhor a que desejamos servir e de
nom ha nenhuum proveyto porque todos pousam fora na outra e aallem desto que speramos receber esta mercee com outras muytas.
he serviço del rey por os muitos conluyos que se em ella fazem de muytas con- Praz-nos averem o residoo desta villa e de Castel Rodrigo e seus termos por seis
pras e vendas e seentarias de que o dicto senhor nom pode aver seu dirreito annos contanto que logo no primeiro anno comecem de poer mãao em alg?ua
porque todos entram e saaem ascondidamente e com esto entram em ella cousa da dicta obra se estes residoos a outrem primeiro ja nom som dados.

294 Segue-se a letra h riscada. 295 Segue-se recadaçom riscado, não havendo depois concordância do adjectivo com o novo substantivo.

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(8) Outrossy senhor em a dicta villa ouve antigamente de moradores antre 29


a villa e termo mil e Vc atee dous mil homeens e em ese tempo foy fecto numero
per el rey em a dicta villa que ouvese trinta beesteiros de conto depois per pes-
tilencias e per outros casos de guerras se despoboou en tanto que agora nom
ha hi ataa setecentos homeens e com todo esto ho dicto numero he todo com-
prido e mais ainda novamente som dados a estes beesteiros outros quatro ofi-
ciaaes.scilicet. scripvam anadal porteiro e meirinho e todos estes ham igual 1444, Fevereiro, 22, Évora – Capítulos especiais de Pinhel às Cortes de
privillegio com elles asy que som XXXIIII scusos e ainda avera hi de296 beestei- Évora de 1444.
ros apousentados per hidade XIIII ou XV e som pousentados com seus privil-
legios. Afora estes ha hi outros muytos privilligiados e scusados de muitas A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 24, fl. 56.
guisas que nom servem nos encarregos nem emprestidos por a qual razom o
dicto concelho nom pode soportar alg?uas cousas que pellos tempos veem a Fig. 19 – Pinhel (pode ser integrado no texto, na mesma página)
necesidade. Pidimos-vos por mercee que pois em a villa fallece as duas partes Capítulos especiais do concelho de Pinhel. Cortes de Évora de 1444.
da gemte que antigamente em ella morou que abaixees o numero dos dictos IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 24, fl. 56 (pormenor).
beesteiros em outro mais pequeno que a dicta villa posa soportar. Outrosy que
vossa mercee mande que os beesteiros que som ou forem daqui em deante [fl. 56]297 Dom Afomso pella graça de Deus rey de Purtugall e do Alguarve
apousentados que sejam costrangidos pera os carregos e servidõoes do conce- e senhor de Cepta a quantos esta carta virem fazemos saber que em as cortes
lho pois nom ham-de servir convosco nem com outrem e asy avera a dicta villa que hora fezemos em esta nossa cidade d’Evora per os procuradores da nosa
encaminhamento de milhor soportar os carregos quando lhe vierem e voso ser- villa de Pinhell que a ellas veerom nos forom dados certos capitollos espiciaaes
viço nom sera mais desfalicido e quando vossa mercee nom for de minguardes e ao pee de cada huum lhe mandamos poer nossa reposta dos quaes o tehor de
no dicto numero a ella praza que o dicto numero seja dos XXX como senpre dous he este que se adeante segue:
foy entrando em elle estes quatro oficiaaes ennovados que novamente som (1) Senhor o concelho e homeens boons da vossa villa de Pinhell fazemos
postos e nom sejam XXXIIII pois antigamente os hi nom ouve e se ouverem de saber aa vosa mercee que em termo desta villa antre a mayor parte das mais e
seer asy XXXIIII que os quatro servam e peytem nos encarregos do concelho. melhores aldeas do dicto termo jaz hua aldea a que chamam o Hirvilhom des-
Na parte do minguamento do numero que ora requerem nom se lhes pode povoada a qual he do conde de Marialva que lhe foy dada por couto pera as
fazer e quanto aos quatro oficiaaes nos praz que sejam dos beesteiros meesmos suas egoas per o senhor rey cuja alma Deus aja em a quall o dicto conde traz
e com elles sejam trinta e mais nom. continoadamente oyteenta noventa e cento egoas com as quaaes os moradores
(9) Outrosy senhor vosa mercee pode saber que por o dicto concelho seer das Freixeedas e da de Soeyro Perez e da Palla e de Vall Boo e Hervas Tenrras
como he fronteiro pellos reis antigos sempre foram dadas armas pera sua nom podem colher nem galardoar nenh?as cousas dos seus paaes por aazo das
defenssom asy como solhas e arneses e bacinetes e alg?as armas que hi asi dictas egoas porquanto cada dia lhes som com ellas estragados e tanto pooem
forom dadas som ja danyficadas e perdidas de que se nom pode seguir pro- em tapar os dictos pãaes e tamanho trabalho tomam como em os lavrar e
veyto nem voso serviço. Pedem-vos por mercee que lhe mandees dar alg?uas colher em tanto que nom som meos lavradores e segundo senhor acontece que
armas de que aos tempos devudos se posam ajudar. os gaados de cada huum dos dictos lavradores som achados no dicto couto ou
Praz-nos de proveermos dellas o castello como virmos que he bem e lhe a redor delle sem os querendo mais citar nem demandar forçosamente lhos
for necesario. tomam e lhos vendem e matam e <os>298 arrançoam como se fosem mouros
297 No início do documento, no lugar da ementa, regista-se: Escusada porque me nam parece necesarya. Na
margem esquerda anotou-se capitollos.
296 Segue-se a letra p riscada. 298 Sobrescrito no espaço de lhe, que aparece riscado.

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polla quall cousa senhor as dictas aldeas som em ponto de seerem despovoa- 30
das de todo o que senhor a vos nom he serviço e a nos he grande perda por que
vos pedimos de mercee que mandees saber a verdade sobr’esto e nos ajaaes a
ello alguum remedio com dereito.
Nos escreveremos ao corregedor da comarca que se enforme do contehudo
em este capitollo e nos enviie dello certidom a quall vista lhe proveeremos
como for dereito e razam. 14[4]7299, Março, 14, Évora – Capítulos especiais de Pinhel às Cortes de
(2) Item senhor na ribeira de Cooa acerca desta villa foy feita senpre anti- Évora de 1447.
igamente h?a ponte que se chama a ponte velha e ha muitos anos e tenpos que
jaz derribada estroyda per mingua da quall se perdem pellos anos e tenpos B) BMV, Provas e Apontamentos da História Portuguesa, II [Ms. 20-I-20],
muytos homeens na dicta ribeira e ainda acerca de vosso serviço nas sisas desta fl. 137 (resumo).
villa se faz grande perda o que nom he serviço de Deus nem vosso e porquanto
a dicta ponte he em meyo dantre nos e Castello Rodrigo e ha hordem do A f. 22 se achaõ hums capitolos especiaes que el rei Dom Afonso desem-
300

Pereiro vos pedimos por mercee que sem mais dellonga nos mandees que antre bargou ao concelho da villa de Pinhel nas cortes d’Evora:
todos façamos a dicta ponte e em esto senhor nos farees grande mercee. (1) 1.º queixaõ-se amargamente de que Dom Gonçalo filho do conde de
Vos requeree esto ao corregedor ao quall mandamos que se achar que a Marialva lhes fizesse huã coutada em Ervas Tenras, que he no termo de Pinhel,
dicta ponte he necesaria a faça correger aaquelles que for razom. sem ali ter herança alguma, e nella lhes toma os gados, e naõ quer ir a justiça:
Dos quaaes capitollos Fernam de Sella e Martinh’Anes procuradores da alegaõ que qualquer piqueno fidalgo de quem elles fossem vassallos os defen-
dicta villa de Pinhell nos pedirom de mercee que lhe mandassemos dar o trel- deria de similhantes roubas quanto mais hum rei taõ poderoso: e continuaõ =
lado pera a dicta villa porquanto se entendem d’ajudar delles. E visto per nos Se fossem castelaõs se nos fizesse huma, far-lhe-yamos outra: Deos sois da
seu requerimento mandamos-lhos dar em esta carta. E porem mandamos ao terra: fazei-nos direito e justiça.
corregedor da dicta comarca e a quaesquer outras nosas justiças e oficiaaes e Resposta: que manda ao corregedor que tal naõ consinta, e proceda contra
pessoas a que esto perteecer que conpram e guardem estes capitollos com Dom Gonçalo na forma das ordenaçoens.
nossas repostas pella guisa que em elles he contehudo sem outro embargo. (2) 2.º A hum Joaõ de Basto Cadieiro lhe fugio huma mulher da cadea da
Dada em a cidade d’Evora XXII dias de Fevereiro per actoridade do senhor qual fogida anda amorado com medo de vossas justiças. E porque este homem
ifant[e] dom Pedro regente etc. Rodrigo Anes a fez. Ano do Senhor de mill era muito fiel no seu officio, e muito util pera este ministerio, e os prezos da
IIIIc RIIII anos. villa se ficaraõ guardando por adua; o que era muito gravoso ao concelho e
homens bons desta villa; e cada dia fogem prezos aos Cadieiros, e som-lhe rele-
vados seos erros: Pedem por merce e a onra da Morte e Paixaõ de Nosso
Senhor Jesus Cristo que lhe perdoe, e lhe de carta de seguro pera se livrar
perante o corregedor da comarca.
Resposta: que aja carta por que venha a inquiriçom […], e depois dara
sobre ella o seu dezenbargo.
(3) 3.º O conde de Marialva, apezar da carta de segurança que os de Pinhel

299 É evidente o erro da data que aparece neste resumo: 1497. Armindo de Sousa atribui esta carta às Cortes de

Évora de 1447 (As Cortes Medievais Portuguesas…, vol. I, p. 371).


300 Na margem: Capitolos Especiaes das Cortes d’Evora para os de Pinhel.

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tinhaõ del rei, se veio lançar sobre a aldea das Freixedas onde esteve 5. sema- 31
nas, tomando as cousas pera seu mantimento; e dos seos sem pagar cousa
alguma, por mais que requireraõ ao corregedor que lhas fizesse pagar: Pedem
que pois este senhor he homem grande e poderoso, e não podem com elle
perialçar direito, os naõ faça andar com elle em prolongada demanda; ca antes
saberemos perder a terra, que tal soportarmos.
Resposta: que manda ao corregedor que sem perda de tempo os restitua. E 1459, Julho, 28, Lisboa – Capítulos especiais de Pinhel às Cortes de Lisboa
fazendo elle o contrario tomem instrumento com sua reposta, e o inviem á de 1459.
corte.
(4) 4.º Dizem que os corregedores da comarqua sem terem que correger A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 36, fls. 172-173v.º.
nesta villa, a Deos graças! Se vem aqui aposentar 6 e 7 meses tomando as cou- B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 215v.º-217v.º.
sas de seu mantimento, pousadas, e roupas pelos preços que elles querem, e
fazendo dar, e pagar a este concelho = pregadura, e maras, e toda fortaleza, [fl. 172] A villa de Pinhell capitollos espiciaaes per que lhe he dada licemça
que comprir, e se fazem pera a cadea que perante elle anda, sem as querendo que em cada huum anno posam lamçar fymta de dous reais pera governamça
fazer pagar da arca da chancellaria. e soportamemto de huum espitall que hy fezeram e outros capitollos a que he
Resposta: que ja tem feito sobre isto sua ordenaçaõ e dado seu regimento ao dado reposta.
seu corregedor. E se elle o naõ quizer cumprir, tomem sobre esso instromento
e lho inviem pera os prover com direito. Dom Afonso per graça etc. a quantos esta carta virem fazemos saber que
303

Estes Capitolos foraõ dados na cidade d’Evora 14 dias de Março por auto- <estando> nos304 em305 esta cidade306 de Lixboa em as cortes que em ella feze-
ridade do senhor infante Dom Pedro, curador do dito senhor rei, e regedor por mos per Alvaro Gonçallvez e Alvaro Rodriguez procuradores de Pinhell nos
elle de seos reinos, e senhorios. Rodrigo Annes a fez Ano de Nosso Senhor forom dados certos capitollos e ao pee de cada huum delles lhe mamdamos
Jesus Cristo de mil e IIIIc LRVII301. / O que se ve ser hum grave anachro- poer nossas repostas segumdo adiamte segue:
nismo302 / E eu Lopo Afonso escrivaõ da puridade do dito senhor rei a fez (1) ¶ Primeirame[nte] quanto ao que dizees que os siseiros dessa villa vare-
escrever. johom os lavradores e os t[r]azem en tanta revolta que ou lhe daram o que lhe
pedem d’aveença ou lhe faram gastar mais do que vall a sisa e se lhes nom que-
Ifante Dom Pedro rem307 dar varejos vaan-sse aos comtadores e fazen-lhe fazer os dictos varejos
no que recebem muy gramde agravo. Pidimdo-nos que a esto vos ajamos
alguum remedeo e vos mamdemos a maneira que em esto tenhaaes.
¶ A esto respondemos que se alguum agravo lhes em esto he fecto nos praz e
mamdamos que se façam os varejos como em seus artiigoos e declaraçõoes. E se
lhe allguum contra elles for tomem estormento com reposta e averan livramento.
(2) [fl. 172v.º] E quanto ao que dizees que sempre de custume antiigoo foy que
nas nossas villas e lugares desse estremo de Castella se davam os moços horfõos

303 Na margem esquerda regista-se concelho de Pinhell.


304 Segue-se queremdo fazer riscado.
301 Sic. Provavelmente 1447, pelo que há um L a mais. 305 Repete em ao mudar de linha.

302 Na margem: Em 1446 he que o infante Dom Pedro lhe entregou a regencia do reino: daqui se vê o quanto 306 No texto cideda.

vai de erro nesta data. 307 Repete E se lhes nom querem.

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e outros que nom eram horfõos per bem de suas fazendas as quaaes nom podem firmados per os rex e ysso meesmo por316 muytos serviços que esse lugar tem
soportar sem seus mancebos e agora por lhes nom quererem dar se lhe perdem fectos a estes regno[s] como por ser da coroa do regno.
sem embargo delles darem boas fianças aas dictas soldadas e os 308 querem A esto respondemos que nossa tençom he de o assi fazer e teemos-vos em
paguar d’antemãao. Pidindo-nos que vos mamdemos vossos mamcebos de guisa serviço de assi no-llo requererdes.
que vossas fazendas se nom percam. (6) E quamto he ao que dizees que esse lugar esta no estremo e he muy
¶ A este respondemos que se guardem as hordenaçõoes e regimentos sobre grande estrada per honde vãao muitos pobres e por nom aver no dicto lugar
os mancebos que se devem de dar aaquelles que o devem d’aver. estpritall317 dormem318 os pobres per o chãao e pasavam muyto mal319 e se per-
(3) Outrossi ao que dizees que em essa villa he bem XXX beesteiros do diam com frio. E esse concelho veemdo como este era tam grande mall e pouco
conto e outros vassallos e de sacadores da arca da piedade e outros que se serviço de 320 Deus hordenarom como se fezesse huum spritall o quall logo
metem com fidalgos de nossos regnos por as quaees razooes nom he no dicto fezerom e por nom te[r]em renda donde possa soportar que nos pediis que vos
lugar quem tirem fintas nem as pase nem pera nosso serviço pella quall razom demos h?ua carta per que lamcees h?ua finta pera o dicto spritall em cad’huum
vos socorryees ja outra vez a nos e vos demos309 h?ua carta per que nom310 anno de dous reais cada posteno?? e que desto nom [sejam] scusado[s] vassal-
guardases alvarees de n[en]huuns fidalgos salvo nossos privillegios. E que los nem beesteiros nem outros privilligiados.
agora hi mandara dom Pedro bem XXIIII alvaraaes e que lhes guardasem A esto respondemos que pois o assi ham por serviço de Deus avemos por
todos alvaraaes que assi esses311 homeens dera por que nos312 pediis que a ben de esto assi fazerem comtanto que nom despendam estes dinheiros em all
semelhante coussa nom demos lugar porque seria cousa de destruyçom desse e que o corregedor lhes tome dello conta.
lugar que como assi desemos313 lugar assi fariam todollos outros fidalgos. (7) E ao que dizees que esse concelho teem huum privillegeo per que nom
A esto respomdemos e mandamos que se nom guardem privillegeos salvo pague pidido e porque esse lugar he tam pobre que os pobres escasamente se
que assi teem nossa carta hussem della. podem manteer e ainda fezerom h?ua ponte de Coa que custou bem duas mill
(4) ¶ Ao que dizees que sempre foy de custume em essa villa e assi o teem- dobras e assi som de todo gastados e que nos temos dado privillegeo322 a
des per nos comfirmado que quamdo se vagam os taballiãaes desse luguar se Freixo e aa Ribeira de Coa toda os quaees luguares todo[s] som comarcãaos a
dam senpre per vossas enliçooes314 alg?uas pesoas nom os preçando se veem a nos e lhe temos confirmados seus privillegeos os quaees privillegeos vos teen-
nos e lhos damos sem enliçom e porque som taaes pesoas que pera ello nom des tan boos como os seus que nos pediis que vos confirmemos o323 dicto pri-
som perteencentes que nos pediis que taaes nom demos sem vossa licença. villegeo e mandees324 que nom pagees o dicto pidido.
A esto respondemos quamdo suas emliçõoes veem nos damos os dictos ofi- A esto respondemos que nos mostrem o dicto privillegeo.
cios aos que as trazem e que quamdo nom veem nos as damos a quem nossa (8) [fl. 173] E quamto he ao que dizees que alguuns homeens por mall fazer
mercee he nom himos contra seu capitollo. desejam de nom aver caça na terra se tra[ba]lham d’averem quantos ovos
(5) Outrossi quanto he ao que dizees a que a esse concelho he dicto que per podem de perdizes e he certo que alguus se gabam que anno se fazia que toma-
alguuns fidalguos destes nossos regnos nos he cometido que lhe demos a jurdi- vam sete[c]entos ovos por a quall cousa nom ha perdizes cassi nada a respecto
çom desse luguar e porque poderia seer que nos moveriamos a faze-llo sem
seemdo em conhecimento dos grandes privilleges315 e liberdades que teem con- 316 Repete por.
317 Sic.
308 Segue-se dictos riscado. 318 Seguimos aqui, pontualmente, o texto da Leitura Nova, já que não encontrámos sentido na palavra registada

309 Repete demos. na Chancelaria de D. Afonso V.


310 No texto: nos. Na Leitura Nova encontra-se nom, o que faz mais sentido. 319 No texto: mil, o que está completamente descontextualizado.

311 Segue-se todos riscado. 320 Repete de.

312 Seguem-se letras riscadas. 321 Segue-se cada pustumeiro riscado e de novo a palavra posteno entrelinhada e também riscada.
313 No texto: desemomos. 322 Seguem-se letras riscadas.

314 Repete enliçooes ao mudar de linha. 323 No texto os com a letra s riscada.
315 Sic. 324 Sic.

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do que soya a ser. Pidimdo-nos que mandasemos poer pena a quall seja apre- vosas cartas e previlegios e liberdades mandando ao dicto Joham Apenteado
goada que todos ajam noticia que quallquer que tomar ovo de pasara pague que nom 331 huse mais do dicto oficio.
por a primeira vez mill reais e Vc sejam pera quem os acusar e os quynhentos A esto respondemos que pedem332 bem a nos praz de lho outorgar.
pera arca da piedade e por a segunda II reais a terceira sejam pressos atee per (11) E quamto he aos333 procuradores desa villa que a nosa corte mandastes
nos ser detreminado e que nom seja nenhuum ousado que mate perdizes com dizem que vos lhe mandastes dar a cada huum334 delles quinhentos reais enten-
boy nem com buchos e fazendo o contrairo encorram as dictas penas nem as dendo que em dous ou tres dias seriam despachados e335 a semelhantes fectos
meter com rede de seer nem em laços. se nom podem tam breve desenbargar por a tardança que em ello ha nos
A esto respondemos que avemos por bem que nom tomem perdizes com pediam que per nosa carta ou alvara mandasemos ao corregedor desa comarca
boy so a pena conteuda na ordenaçom. que lhe faça pagar a cada huum segundo a ordenança de Trancosso e dos
(9) E ao que dizees que alguus riios ha em esa terra e que no Verãao secom outros luguares comarcaaos pois tanto trabalharom por onrra e favor e liber-
alguus pocos grandes recolhem os pexes e alg?uas325 com cobiça e por mall dades da dicta villa de Pinhell e seu termo segundo trabalho[m] os outros pro-
fazerem lançam tanto barbasco e ervas peçonhentas326 em os pegos que todos curadores que ha estas cortes som viindos por que asaz devieis de ser contentes
os peixes se vem acima e filhan-as327 e ja se aconteceeo morem guados e porque ao tenpo de suas partidas pollo presente lhe mais nom podestes dar ou
alguuns homeens que bebiam a dicta agoa serem postos em paso de morte. E nom quisereis esperando que logo tornasem os quaaes se rapairarom o melhor
que nos pediis que mandemos que pesoa alg?ua nom faça esto daqui em diante que poderom asi pollo seu como d’enprestado por vos todavia levarem despa-
sob as penas em cima conteudas. chadamente o desenbargo.
A esto respondemos que avemos que nom lancem truviscada. A esto respondemos que pedem bem e mandamos ao corregedor da nosa
(10) E quamto ao que dizees que a vos he dicto que huum Joham Apentiado corte que lhes dee asy dello sua carta.
criado do conde de Mariaalva que he morador em Trancoso ouve ora nova- [fl. 173v.º] Pedindo-nos por mercee os dictos Alvaro Gonçallvez e Alvaro
mente nossa carta de juiz sesmeiro em esa villa de Pinhell e seu termo e Tran- Rodriguez [por] parte do dicto concelho que lhe mandasemos dar h?ua nosa
coso e em outros lugares em o que vos era fecto agravo e que em tenpo del rey carta com ho th[e]or dos dictos capitollos com nosas repostas porque lhe
dom Joham nosso avoo ouve guerra com Castella veviam soomemte no arre- eram necesarios e se entendiam delles d’ajudar e nos veendo o que nos asi
vallde da dicta villa quinhentos328 homees e mais e que ora na villa nem no diziam e pediam a nos prouve dello e lha mandamos dar segundo dicto he. E
arrevalde vivem pouco mais de IIc e esto por a destruiçom da guerra e que porem mandamos ao corregedor da dicta comarca e a quaaes outros juizes
depois desto alg?as pesoas com cobiça pediram ao dicto rey ese julgado de ses- justiças e pesoas a que o conhecimento desto pertencer que lhe conprees e
marias e os moradores da dicta villa e termo se agravam329 dello ao dicto rey e guardees e façaees bem conprir e guardar e todo per a guissa que em elles he
elle consirando os grandes trabalhos que pasados tiinham por estarem na fron- conteudo sem outro enbargo. Dada em a dicta cidade XXVIII dias de Julho.
taria lhes deu sua carta per que nom ouvese outro juiz de sesmarias salvo os El r[e]i o mandou per Fernam da Silva escprivam da puridade. Jorge
juizes ordenairos da dicta villa os quaaes senpre husarom dello atee ora. E que Machado o fez. Anno do Nacimemto de Nosso Senhor Jhesuu Christo de
pois que teendes a carta do dicto rei meu avoo e confirmada per el rei meu mill IIIIc LIX.
senhor e padre que Deus aje330 e per nos que nos pediis que nos mantenhamos

325 Sic.
326 No texto peçhonhentas com o primeiro h riscado.
327 Sic. 331 Repete que nom.
328 Leitura que pode suscitar algumas dúvidas, porque se baseia apenas numa letra, o q, mas que é também subs- 332 No texto podem, o que não está dentro do contexto.
crita pela Leitura Nova. 333 No texto a nos.
329 Sic. 334 Repete huum.
330 Sic. 335 Seguem-se letras riscadas.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

32 (2) ¶ Ao que dizees que em essa villa ha tamtos homeens do iffamte dom
Fernamdo nosso muyto prezado e amado irmãao e dom Pedro e doutros muy-
tos fidalgos de guissa que se nom podem achar n[en]huuns homeens pera
nosso serviço nem pera caregos do comcelho e que nos pediis que mandemos
a maneira que em esto ajaaes de teer.
¶ Respomdemos que nom deves guardar privillegios doutras pessoas
1460, Dezembro, 15, Évora – Capítulos especiais de Pinhel às Cortes de salvo336 aquelles que per nos ou nossos desembargadores forem assynados e
Évora de 1460. assellados do nosso sello.
¶ Pedimdo-nos por mercee o dito procurador por parte da dita villa que
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fl. 240. lhe mandassemos dar h?ua nossa carta com o theor dos ditos capitollos com
C) BMV, Provas e Apontamentos da História Portuguesa, II [Ms. 20-I-20], nossas repostas por que lhe eram necesarios e se emtendiam delles ajudar e
fl. 137v.º (resumo). visto seu pedir lha mandamos dar segumdo dito he. ¶ E porem mandamos a
todallas nossas justiças officiaaes e pessoas a que esto pertemcer que lha
[fl. 240/1.ª col.] A villa de Pinhell capitollos especiaaes per huum dos quaaes cumpram e guardem e façam comprir e guardar como em ella he comtheudo
he mandado que nam guardem outros privillegios salvo aquelles que per el rey sem outro embargo. Dada em Evora a quimze de Dezembro. Alvaro Gill a
ou seus desembargadores forem assynados e asellados etc. fez. Anno de IIIIc LX annos.

Dom Afomsso etc. a quamtos esta carta virem fazemos saber que estamdo
nos ora em esta cidade d’Evora em as cortes que em ella fezemos per o procu-
rador da villa de Pinhell nos foram dados certos capitollos aos quaaes ao pee
de cada huum mandamos poer nossas repostas segumdo se adiamte segue:
(1) ¶ Ao que dizes que seremos lembrado como temos outorgado certos
officios aos comcelhos de nosos regnos amtre os quaaes he huum o juiz dos
horfãaos e que ora huum Joham Ferraao que o dito oficio tinha em essa villa
matara huum homeem por o que nos veo pedir o dito officio huum Vasquo
Pirez hii morador e nos pedio que vos mantenhamos o que nos temos outor-
gado e vo-llo mandamos despachar e que o servam os juizes hordenairos como
sempre foy de custume amte que o dito Joham Ferram ho ouvesse per nossa
carta o que he serviço de Deus e bem dos ditos orfãaos.
¶ Respomdemos que nos praz se guardar o capitollo sobre esto outorgado e
se este Vaasquo Periiz [fl. 240/2.ª col.] ouve tall officio per nom verdadeira
emformaçam prazer-nos-ha lho revogar. ¶ E porem mandamos que elle venha
logo a nos com sua carta e ouvido elle o detriminaremos como for razam e
dereito.

336 Segue-se que riscado.

160 161
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

33 sempre foy e esto vos pidimos por ser serviço de Deus e vosso e nos farees
gramde mercee.
Respomde el rey que ha por bem e serviço 342 seu ho que lhe pedem e lhe
apraz que a dicta viilla seya sempre sua e dos reys deste regno e nom possa seer
dada em tempo alguum salvo ao filho do rey.
(2) Item senhor fazemos saber a vossa mercee que em esta villa he apar-
1473, Março, 30, Évora – Capítulos especiais de Pinhel às Cortes de Coim- tad<o>343 os ofecios 344 dos tabaliaees comvem a saber os do paço dos do
bra/Évora de 1472-73. bamco345 e ora tem ho dicto ofecio do paço Joham Frade ho quall se acomtece
per muitas veezees de o buscarem as partees que am mester alg?uas escripturas
A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 33, fl. 71-71v.º. de seu ofecio he ho nom acham e os outros tabaliaees do bamco nom houssam
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 186v.º-187v.º. de ?? fazer taaees escripturas per bem da vossa defessa pello quall se leixam de
C) BMV, Provas e Apontamentos da História Portuguesa, II [Ms. 20-I-20], fazer muitas escripturas de que a vosso povoo perdee?? gramde perda e
fl. 137v.º (resumo). dampno. Pidim<os>348 aa vossa alteza que mandee que ho dicto tabaliam do
paço o[u] quallquer que o dicto ofecio tever que estee resydemte em o dicto
[fl. 71] A vila de Pinhel carta de certos capitollos per que praz a el rei que a luguar e quamdo nom for achado segumdo vosso regimento que os tabaliaees
dicta vila seja sempre sua e dos reix que forem destes regnnos e que aja hy dous do bamco posam fazer as dictas escripturas em esto nos farees mercee.
tabaliaaes do paço que servam seus ofícios de guisa que quando huum for fora Respomde el rey que por remidiar ao proveito comodadide349 dos morado-
da vila fique o outro e que nenhuum presso etc. res da dicta villa ha por bem que em a dicta villa aja dous tabaliaees do paço e
que tall usanciia tenham amtre sy que sempre huum fique em a dicta villa em
Dom Afomsso etc. a quamtos esta nossa carta virem fazemos saber que per 350 aussemcia doutro e manda estreitamente que asy se guarde e cumpra.

Duarte Gomçalvez nosso escudeiro que por [pro]curador337 da comarqua da (3) [fl. 71v.º] Item senhor reecebemos gramde agravo per o alcaide das sacas
Beyra a estas cortees que ora fazemos foy emviiaado por parte da nossa viilla desta comarqua a requerimento dos remdeiros que premdem alguns homes em
de Pinhell nos forom apressemtados certos capitullos dos quaaaees338 com 339 esta villa e termo e hos levam pressos a cidade da Guarda pera hy serem ouvi-
nossas repostas a elles dadas ho teeor he este que se segue: dos acerqua dalguuas culpas que dizem que tem em as dictas 351 pasayeens
(1) Item ho comceelho e homens boons da nossa villa de Pynhell com mostramdo vosso mandado por que esto podem fazer do que se segue a dicta
gramde hobidiemcia beiijamos vossas maaos nos encomendamos em vossa villa e termo gramde opressam pellos asy tiirarem da sua jurdiçam e hos leva-
mercee a que muiito podrosso senhor praza saber que a nos he dicto que huum rem fora della por teerem milhor luguar pera os aramcoarem. Pidimos a vossa
dom Joham de Noronha e asy outros senhores e fidalguos destes regnos vos
peedem esta vossa villa e porque a vossa alteza he em conhecimento que esta
342 Segue-se de riscado.
villa sempre foy e he da corrooa do regno e340 asy o temos per vossos privile- 343 No texto apartada com o último a riscado e corrigido por um o registado na entrelinha.
gios e dos reys vossos amteceessores os quaes nos per vos som comfirmados 344 Repete hos ofecios.

por que pidimos a vossa alteza que nos manteenhaees em aa nossa341 libardade 345 No texto: bamço.

346 Segue-se uma letra riscada.


que nos asy dada teemdees a dicta villa e seya sempre da corroa do regno como 347 Sic. Na Leitura Nova, em vez de perdee, regista-se vem (seguindo-se a palavra de riscada), procurando assim

dar sentido à frase através da correcção da formulação equívoca da chancelaria.


337 Palavra incompleta na Chancelaria de D. Afonso V, mas corrigida na Leitura Nova. 348 No texto: pidimdo-nos com as letras do-nos riscadas e corrigidas na entrelinha por os.

338 Sic. 349 Sic. Mais uma vez, na Leitura Nova procura-se o sentido da frase alterando o texto para «remedear ao pro-
339 Segue-se as riscado. veito comuum da comunidade dos moradores»
340 Segue-se he riscado. 350 Repete em e risca absse.
341 Segue-se uma letra riscada. 351 Seguem-se letras riscadas.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

alteeza que todos os moradores da dicta villa e 352 termo que tem as 353 dictas 34
coussas defessas forem achados em culpa que nom sejam tiirados da dicta villa
em ella sejam ouvidos com seu dereito em esto nos senhor farees mercee.
Respomde el rey que haa por bem e manda que nehuum que presso for na
dicta viilla ou termo della que <nom> sejaa levado pera a Gua[rda]354 nem pera
outra parte alg?ua e che?? em a dicta villa se julgue e determine ?? ho casso por
que for presso. 1483, Janeiro, 21, Santarém – Capítulo especial de Pinhel às Cortes de San-
Pydimdo-nos ho dicto Duarte Gomçalvez que porquamto a dicta villa se tarém de 1482.
emtemdia d’ajudar do dicto capitollo e nossas repostas a elles dadas lhes
mandasemos dar per357 vossa358 carta 359 e visto per nos seu requerimento A) IAN/TT, Chancelaria de D. João II, L.º 27, fl. 35v.º, muito danificado,
apro[u]ve-nos dello. E porem mandamos a todollos corregedores juizes e com prejuízo de parte do texto361.
justiças hofeciaaes e pesso[as] a que o conhecimento desto perteemcer que B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 1, fls. 158v.º-159.
cumpram e guardem e façam em todo bem comprir e guardar hos dictos
capitollos com nossa[s] repostas 360 asy e pella guissa que em elles he [fl. 35v.º] A vila de Pinhell previlegio per capitollo de cortes outorgado aos
comtheudo e lhe nom vãao nem comsemtam hyr comtra elles em alg?ua cidadãos e booas p[essoas] que nam sejam costramgidos que vaao com o
maneira porquamto asy he nossa mercee. Dada em a nossa cidade d’Evora cumum per pregãao ou pelourinho.
aos XXX dias do mes de Março. El rey ho mandou per dom Joham Gualvam
bispo de Coimbra comde d’Arganill do seu comsselho e escprivam da sua Dom Joham etc. a quamtos esta carta virem fazemos saber que por parte do
puridade e veedor mor das suas hobras. Fernam d’Espanha a fez. [Anno] de pob[oo] e moradores da nossa cidade de Visseu362 nos foram apressemtados
mill IIIIc LXXIII. em estas cor[tes] que ora fezemos em esta nossa villa de Samtarem certos capi-
tollos e nos demos a e[lles] nossa reposta antre os quaees foy huum do quall e
da reposta a elle dada ho the[or] he este:
(1) Outrossy senhor os dictos corregedores quamdo quer que semelhamtes
caussas acomtece que ajam de fazer justiça comumente chamam e costrangem
fidalguos e cavaleiros escudeiros de linhajem e bem criados e vassallos e cida-
dãaos hom[rra]dos que vãao com todo ho cumuum per pregam e mandado
atee o pe da forca ou [pe]lourinho honde quer que a justiça se a-de fazer e isso
mesmo os cos[trangem] que vaao com pressos nom lhes guardando seus pre-
villegios e yguando-os [em] todo com ho dicto comuum. Seja vossa merce que
mandees aas dictas justiças que semelhante injuria lhes nam seja fecta nem
pera taaes coussas sejam costrangidos que pois deferenciadamente ham-de ser-
352 Seguem-se letras riscadas. vir vossa senhoria nas guerras [no que a] elles pertemce em seus graaos
353 Repete as.
354 Reconstituímos a palavra a partir da Leitura Nova e de acordo com o sentido do pedido.
razoada coussa seria serem deferencia[dos] dos menores.
355 Sic. Certamente por que, como aliás se regista na Leitura Nova.

356 Seguem-se letras riscadas. 361 Parte do texto foi reconstituído pela Leitura Nova, entre [ ], conforme os critérios de transcrição atrás enun-
357 Palavra emendada. ciados.
358 Sic. O sentido é nossa, conforme interpretação correcta da Leitura Nova. 362 Sic. Erro que se repete na Leitura Nova. Dado que na ementa e desenvolvimento da resposta surge Pinhel, o

359 Segue-se a palavra nossa riscada. que é corroborado pelo índice da Chancelaria de D. João II e, em publicação actual, por Armindo de Sousa, con-
360 Segue-se e riscado. siderámos que se trata de Pinhel.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

[Re]sponde ell rey que os cidadaaos e bõas pessoas nam devem pera taaes 35
[cousas ser] costramgidos e que assy ho manda aos juizes e corregedores da
comarqua [e que] se nam entenda nelles o pregam.
E porquanto nos ho procurador da villa [de] Pinhell em nome do poboo e
moradores da dicta villa pedio que nos prouvesse lhe [ou]torgarmos ho dicto
capitollo e nossa reposta a elle dada e coussas [em e]lla contheudas e lho man-
dassemos dar em h?ua nossa carta e [a no]s prouve dello por lhe fazermos mer- 1459, Julho, 2, Lisboa – Capítulos especiais do Sabugal às Cortes de Lisboa
cee lho outorgamos assy e per ha [guissa] que em elle e na reposta a elle dada de 1459.
he contheudo e lho manda[mos] dar em esta nossa carta.
[E] porem mandamos ao nosso corregedor da comarqua e correiçam da A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 36, fl. 148-148v.º.
Beira [e aos] juizes da dicta villa e a quaeesquer outros juizes e justiças de B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 209vº-210v.º.
no[ssos reg]nos a que o conhecimento desto pertemcer que vejam ho dicto
capitollo e nossa [reposta a e]lle dada e lho cunpram e guardem e façom em [fl. 148] 363 A villa do Sabugall capitollos espiciaaes per que praz a el rey lhe
todo bem con[prir e guardar a]sy e per a guissa que em elle he contheudo e guardar e mamter seus previlegios e cartas que tem dos reix pasados. E que
lhe nam vaam [nem comsemtam comtra] elle hiir em parte nem em todo ajam os manynhos como amtigamemte ouveram os quaaes nam emtemde dar
porque assy he nossa [mercee. Dada em a no]ssa villa de Santarem a XXI a pessoa alg?ua e outros a que he provido per repostas.
dias de Janeiro. Br[as Afomso a fez. Anno] de mil IIIIc LXXXIII.
Fig. 20 – Sabugal (pode ser integrado no texto, na mesma página)
Capítulos especiais do concelho do Sabugal. Cortes de Lisboa de 1459.
IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 36, fl. 148 (pormenor).

Dom Afonsso por graça de Deus rey de Portuguall e do Algarve e senhor de


Cepta e d’Alcacer em Afrequa a quantos esta carta virem fazemos saber que
estando ora nos em esta nosa muy nobre e senpre leall cidade de Lixboa em as
cortes que em ella fezemos per Joham Gonçallvez procurador do Sabuguall
nos foram dados certos capitollos e ao pee de cada huum delles lhe mandamos
por nosas repostas segundo se adiante segue:
(1) Primeiramente quanto he ao que dizees que quando el rey dom Donis
cobrou este lugar dera-lhe previleg[i]o que todos ouvesem <suas>364 herdades
e todos seus beens e dees o dicto tempo o concelho posuyo por sua herdade o
termo todo avendo os montados da erva e raçooes das terras maninhas de que
se fazem muitas despesas a voso serviço e de que dam conto em cada huum
anno ao vosso corregedor em o quall previlegio diz que esse lugar nunca o
daria a ifante nem a ric’omem e senpre seria da coroa do reigno lançando mal-
diçom a todos os decendentes que contra elle forem e que muitas vezes veedes

363 Na margem esquerda regista-se Sabugall e Beyra.


364 Registado na entrelinha sobre algumas letras riscadas.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

que fidalgos vos pedem estes maninhados e nos fazem hiir a vos e que pero que ras e que quer aver o montado della e que as lançadas a defen[de]ra e que ese
tenhãees alvara nosso e asy de noso padre el rey Duarte nos pidi?s que vejamos concelho ouve senpre o montado de todo o termo. E que nos pediis que man-
o dicto privilegeo e a requirymento de fidalgos nom vaamos contra o dicto pre- demos ao nosso corregedor que lha defenda que tall <força> nom faça e se
vilegio e maldiçom de nossos aavoos365 e vos outorgemos que taaes maninha- alguum dirreito tem que o demande per hu deve e o concelho aja sua posse
dos se nom posam dar. como senpre ouve por thiirar escandollo. E que outrosy os castellãos que veem
A esto respondemos que nos praz guardar e manteer seus privilegios e car- ao reino lavrar que possam levar o pam de suas colheitas.
tas dos reix nossos antecesores e lhos nom quebrar em alg?a parte e nos praz A esto respondemos e mandamos ao corregedor que ouça o concelho com o
que ajam os dictos maninhados asy como os antiigamemte ouverom nem os dicto Martim de Mello e faça direito dando apellaçom e agravo nos cassos. E
entendemos a dar a alg?ua pesoa nem o dicto lugar em comprimento dos dic- quanto ao tiramento do pam praz-nos que os dictos castellãaos usem em esta
tos privilegios e por seguir a bençom de nossos avoos que lho asy outorgarom. parte como senpre husarom e se vizinhem 368 elles como elles da sua parte com
(2) [fl. 148v.º] E quanto ao que dizes que soees agravados que quando elles vizinharem. E porem mandamos a nossos oficiães que nom consentam se
alguum fidalgo vay per essa villa nom prezam justiça e per sy filham pousadas fazer em ello conluios a seus direitos.
e roupas e alcaceres e galinhas e outras cousas e per vezes se levantam arruidos (5) E ao que diz?es que mandamos hii por juiz Alvaro Monteiro no tempo
e que nos pidies que mandemos que nenhuum fidalgo nom faça semelhantes dos enburilhos e estava na Guarda e vey[o] 369 hii fazer tres odiencias e levou
cousas e que per justiça sejam apousentados e os mantiimentos que os paguem tres mill reais e nom os merecendo pidindo-nos que lhe mandemos tornar os
pella vallia [e] <estado> da terra. dictos dinheiros ao concelho pois os nom mereceu.
A esto respondemos que pedem bem e mandamos que asy se faça e segundo A esto respondemos e mandamos ao corregedor que se enforme dello e
hordenaçom em tall casso fecta do modo que se deve de teer em se darem os achando que asy he e que nom mereceo o dicto solairo lho faça tornar.
dictos mantiimentos. E mandamos aos juizes e corregedor que asy o cunpram Pidindo-nos por mercee o dicto Joham Gonçallvez por parte do dicto
e o dem a eyxucaçom. concelho que lhe mandasemos dar h?ua nossa carta com o theor dos dictos
(3) E quanto he ao que dizes que ese 366 lugar 367 he couto e vem a elle omi- capitollos com nossas repostas 370 porque lhe eram necesareos e se entendiam
ziados e acontecesse serem hii pressos e os corregedores como som pressos delles d’ajudar. E nos vendo o que nos asy dizia e pidia a nos 371 apr[o]uve
loguo os mandam dii tiirrar e que por esto receam muitos viir ao couto e mui- dello e lha mandamos dar segundo dicto he e porem mandamos a nosso
tos se vãao pera Castella. E que nos pedis que mandemos que o homiziado que corregedor da dicta comarca e quaeesquer juizes e justiças oficiaees e pessoas
hi vier morar e hy for presso que hii seja livre com seu direito e o corregedor a que o conhocimento desto pertencer que lhe cunprem372 e guardem373 e
nom tenha que veer com elle e asy se entenda no que omiziado nom for. façam374 mui bem cunprir e guardar em todo per a guissa que em elles he
A esto respondemos que o corregedor nom deve fazer tall coussa senom nos contheudo sem outro embargo. Dada em a dicta cidade dous dias de Julho.
cassos que se per direito e ordenaçoees deve fazer. E se o contrairo fezer façam- El reii o mandou per Fernam da Silveira seu coudel-moor que ora per seu
lhes seus requirimentos e tomem suas cartas com suas repostas. speciall mandado thenho cargo de scprivam da puridade. Jorge Machado a
(4) E quanto he ao que dizes que em termo desa villa esta h?ua aldeia que se faz375. Anno de mill IIIIc LIX.
chama Lageossa que ora he dos filhos de Pero Lourenço de Fereira que esta
junto com a raya que foy despovorada nas gueras e nunca mais foy povorada
368 Seguem-se letras riscadas.
e he colhida a monte e alguuns lavram hii que lhe dam sua raçom e que viera 369 Repete e veyo ao mudar de linha.
ora a essa villa Martim de Mello que diz que quer defender a dicta aldeya e ter- 370 Seguem-se letras riscadas.

371 Segue-se por riscado.

372 Palavra emendada de cunpreis para cunprem.


365 Sic. 373 Palavra emendada de guardeis para guardem.

366 Segue-se uma letra riscada. 374 Palavra emendada de façaees para façam.
367 Repete lugar. 375 Sic.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

36 nom fooy nem he agravarmos a dita villa nem lhes quebrarmos seus priville-
gios nem liberdades mas amtes lhas acrecemtarmos em todo o que bem podes-
semos temos por bem e queremos que a dicta nossa villa do Sabugual
livrememte tenha a dita alldeya de Cadrazaaes por seu termo e reallmemte
huse da jurdiçam della tam ymteiramemte como ata aqui fez e se nos ditos pry-
villegios comtem sem embarguo da carta que asi sobre ello dada teemos ao
1459, Julho, 9, Lisboa – Capítulo especial do Sabugal às Cortes de Lisboa dito Vaasco Martiinz a qual avemos em sy por nenh?ua e queremos e mamda-
de 1459, inserido em carta régia. mos que em maneira allg?ua nom aja acerca desto luguar.
E porem mamdamos a quaaesquer nossos corregedores juizes justiças
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 224v.º-225. officiaaes e pessoas a que o conhecimemto desto pertemceer per quallquer
guisa que seja e esta nossa carta for mostada que lha cumpram e guardem e
[fl. 224v.º/2.ª col.] A villa do Sabugual per que prouve a el rey que a dicta façam comprir e guardar asi e tam [fl. 225/2.ª col.] compridamemte como em
villa tiinha por seu termo a aldea dos Quadraçaes que realmemte use da jurdi- ella faz memçam sem lhe poerem sobre ello nenhuum embarguo nem duvida
çam della. allg?ua por que asi he nossa mercee. Dada em a dita cidade nove dias de
Julho. Guomçallo Cardoso a fez. Anno do Nascimemto de Nosso Senõr
Dom Affomsso per graça de Deus rei de Purtugual e do Allgarve sennõr de Jhesuu Christo de mill IIIIc LIX.
Cepta e d’Alcacer em Africa a quamtos esta carta virem fazemos saber que em
estas cortes jeeraes que ora fezemos em esta nossa cidade de Lixboa
(1) nos foi dicto da parte da nossa villa do Sabugual per Joham Guomçallvez
que aas ditas cortes veyo por seu procurador que el rey dom Dinis nosso bisavoo
que Deus aja quamdo filhou o dito luguar lhe comfirmou certas alldeas por
termo com sua jurdiçam segumdo as ja d’amtiiguidade tiinha amtre as quaaes he
alldeya que se chama Quadrazaes damdo-lhe sobre ello seus privillegios que tem
comfirmados per os reix meu avoo e padre cujas allmas Deus aja e per nos quaes
lhe prometeu a dicta villa e alldeias numca sairem da coroa real mamdamdo a
seus decemdemtes por sua beemçom e defemdemdo-lhe sob penna de sua maldi-
çam que asi o comprissem segumdo em os dictos privillegios mais comprida[fl.
225/1.ª col.]memte faz memçam e per bem dos quaes a dita villa sempre esteve
em posse das dictas alldeyas e husou da jurdiçam dellas ataa que a Deus prouve
filharmos a dicta nossa villa d’Allcaceer omde outorguamos a jurdiçam da dita
alldeya de Cadrazaaes aa Vasco Martiinz de Resemde do nosso comsselho no que
allegua lhe seer feito gramde agravo. ¶ Pidimdo-nos por mercee que a ello lhe
ouvessemos remedio per a guisa que seus privillegios lhe nom fossem quebrados.
E nos visto seu requerimemto e como ao tempo que asy outorguamos a dita
jurdiçam ao dito Vaasco Martiinz nom eramos em conhecimemto dos dictos
privillegios e claussollas em elles declarados376. ¶ E desy porque nossa temçom

376 Sic.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

37 Samctarem XXX dias de Mayo. Joham Vaazquez a fez. Anno do Nasci-


memto de Nosso Senhor Jhesuu Christo de mill e quatrocemtos e sassemta e
oito annos. ¶ E eu Duarte Guallvão secretairo del rey a fiz escprever.

1468, Maio, 30, Santarém – Capítulo especial do Sabugal às Cortes de San-


tarém de 1468.

B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fl. 201-201v.º.

[fl. 201/2.ª col.] A villa do Sabuguall privillegio que possam lograr e paceer os
termos dos [o]utros luguares comarcãaos e vizinhos a dicta villa e possam etc.

Dom Affomsso per graça de Deus rei de Portuguall e do Allguarve e senhor


de Cepta e d’Allcacer em Affrica a quamtos esta nossa carta virem fazemos
saber que em as cortes que ora fezemos em esta mui nobre e leall villa de Samc-
tarem per os procuradores da villa do Sabugual que a ellas mamdamos viir nos
forom dados certos capitollos espiciaaes por parte da dita villa dos quaaes ho
theor de huum delles com nossa reposta he o que se adiamte segue:
(1) ¶ Primeiramemte quanto ao que dizees que esse vosso termo he [fl.
201v.º/1.ª col.] pequeno e que no Verãao por causa das auguas que temdes se
veem a elle muitos guaados d’Allmeida e Castello Boom per bem de vossas car-
tas que tem per que possam comer nos termos alheos pedimdo-nos que nos
demos que vossos guaados possam paceer nos termos dos outros sem pagua-
rem momtado como ho tem todallas outras villas a vos comarcãas.
¶ Reposta: que vista a emformaçam que desto ouve per Fernam Cabrall ao
quall sobre esto escpreveo que lhe praz e mamda que possam lograr e paceer
os termos dos outros luguares comarcãaos e vizinhos aa dicta villa e possam
husar com elles como hos outros husam e vizinham com elles meesmos. ¶ E
esto sem embarguo de seus privillegios.
Pedimdo-nos os dictos procuradores por parte da dicta villa que lhe mam-
dassemos dar nossa carta com ho theor do dito capitollo com nossa reposta
porque lhe era compridoiro e se emtemdiam delle d’ajudar. ¶ E visto per nos
seu pedir lho mamdamos dar como dicto he. E porem mamdamos a todollos
juyzes e justiças comtadores e allmoxariffes e a outros quaaesquer officiaaes
e pessoas a que esto pertemceer que lha cumpram e guardem e façam bem
comprir e guardar como em ella he comtheudo. Dada em ha dicta villa de

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

38 este aazo rende a vos muyto menos e este concelho perde seus boons husos e
costumes que de sempre ouverom e costumarom confremados per os reis. Por
que senhor vos pedimos por mercee que vos praza de mandardes per vossa
carta que os dictos portos e caminhos sejam guardados per os dictos portagei-
ros e seus requeredores como sempre forom e que os dictos fidalgos nem
outras nenh?as pesoas os nom embarguem em suas terras e lhes leixem trazer
1436, Abril, 14, Estremoz – Capítulo especial de Trancoso às Cortes de os que assy filharem por descaminhados aa dicta villa pera hi seerem ouvidos
Évora de 1436. com seu direito sob certa pena que lhe per vos seja posta se os reteverem ou
embargarem.
A) IAN/TT, Gavetas, gav. 1, m. 4, doc. 17. ¶ A esto vos respondemos que pediis bem e mandamos que assy se faça e
B) IAN/TT, Chancelaria de D. Duarte, L.º 1, fl. 216. qualquer que embargar tal descaminhado seja citado que venha per pessoa
Publ.: Chancelarias Portuguesas. D. Duarte, vol. I, tomo 2 (1435-1438), perante nos a se escusar dello e mais pague o dicto descaminhado em dobro a
Centro de Estudos Históricos, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 1998, metade pera quem ho acusar e a outra metade pera o concelho.
doc. 1179; Cortes Portuguesas. Reinado de D. Duarte: Cortes de 1436 e 1438, E porem mandamos a todollos corregedores juizes e justiças e oficiãaes e a
Centro de Estudos Históricos, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2004, outros quaeesquer que esto ouverem de veer que assy o compraaes e guardees
pp. 115-116. pella guisa que aqui he contheudo e lhe nom vaades nem consentades ir contra
ello em nenh?a guisa.
Dom Eduarte per graça de Deus rey de Portugal e do Algarve e senhor de E por sua guarda lhe mandamos dar esta carta siinada per nos e seelada do
Cepta a quantos esta carta virem fazemos saber que em as cortes que ora fize- nosso seello. Umde al nom façaaes. Dante em Stremoz XIIII dias d’Abril
mos em a nossa cidade d’Evora nos forom dados certos capitollos especiaaes Lop’Afomso a fez ano do nacimento de Nosso Senhor Jhesus Christo de mil
per os procuradores da nossa villa de Trancoso que vierom aas dictas cortes IIIIc XXXVI.
antre os quaees he huum que se adiante segue com nossa reposta: XXV reais.
(1) Senhor vossa mercee sabera que este concelho tem certas cartas da por- (Assinado) El Rey
tagem que he vossa antre as quaees tem h?a del rey dom Fernando em a qual
se contem que todollos merchantes que ouverem de passar a augoa do Doyro
e a augoa de Tavora e a de Maçoeyme e a de Mondego e a agoa de Cooa e
ouverem de passar cada h?a das dictas augoas e nom forem per a dicta villa de
Trancoso que sejam descaminhados e percam as bestas e carregas e averes que
levarem e sejam pera a dicta portajem e se estes que assy filharem ouverem
alg?a razom a nom seerem descaminhados que o que ham de viir poer perante
os juizes de Trancoso e hi seerem livres e ouvidos com seu direyto e que os ren-
deiros da dicta vossa portajem e seus requeredores em vosso nome esteverem
sempre em posse de guardarem os dictos portos e caminhos e que ora os dic-
tos vossos rendeiros e requeredores se temem e nom ousam de guardar os dic-
tos portos e caminhos defesos com temor de Vasco Ferrnandez Coutinho e
d’Alvaro Periz de Tavora e doutros fidalgos que hi teem as terras que lhe nom
querem leixar em suas terras filhar dos dictos descaminhados assy como
soyam e lhos embargam e esto nom he vosso serviço e a vossa portajem por

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

39 ria na terra e pella espeytar mais que por fazer a vos serviço. E porque as obras
que se poderiam 379 fazer em seis meses nom se fazem em huum anno porque
senhor huuns fazem viir aa dicta obra XV dias e viinte e outros nom veem tres
e esto por peytas que delles recebem en que senhor a terra recebe grande
agravo e perda e a vos he fecto pouco serviço. E porquanto senhor esta servi-
dom perteece a vos e avia mester de todos servirmos ygualmente pidimos aa
[1439] – Capítulos especiais de Trancoso às Cortes de Lisboa de 1439. vosa mercee que nos dees vossa carta por que ponhamos antre nos huum
homem boo que seja veedor das dictas obras e huum scripvam e nos senhor o
A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 2, fls. 2v.º-3377. poeremos tal que a vos faça serviço e a terra seja contente dando-lhe vosa mer-
cee aquelle muito que hordenardes de dar aos outros que taaes oficios teverem.
[fl. 2v.º] 378 (1) O concelho e homeens boons da vosa lial villa de Trancoso (4) Outrossy senhor fazemos saber aa vossa mercee que nos recebemos em
fazemos saber aa vossa mercee que em esta villa ha tres quebradas do muro esta terra grandes agravos e sem razões daquelles que as vosas sisas arrendam
grandes e a moor parte das barreiras derribadas e porquanto senhor este lugar tanto que esta terra se vay a perder por aazo destes rendeiros por que senhor
he da moor frontaria que em esta terra ha logar pidimos aa vossa mercee que vos pidimos por mercee que vos a dees a este concelho em a monta que esteve
as mandees correger. este anno que he mayor que 380 foy e em esto senhor nos farees grande mercee.
A nos praz de se corregerem e asy mandamos que se faça e nos aseentamen- Se asy he que as dictas sisas esteverom este anno na mayor monta que
tos requeiram esto e seer-lhe-ham desembargados dinheiros pera ello. nunca asy como dizees, nos praz de vo-llas outorgar pello dicto preço.
(2) Outrossy senhor seja vossa mercee mandar fazer estas obras da dicta
villa pidimos-vos por mercee que nos ajudem aa servidom das dictas obras
estes lugares que se adeante seguem.scilicet. Fornos e Anfyas e Algodres e
Figueiroo e Pena Verde e Aguiar e a Matança e os Casaaes do Monte e Cras-
teiçom e Carapito porquanto senhor todos os destes lugares senpre servirom
em as obras da dicta villa quando as a vosa mercee manda fazer e todos estes
lugares som terras chãas e arredor da dicta villa e em o tempo da guerra todos
estes [fl. 3] se colhem aa dicta villa e hi ham sua defenssom e em esto senhor
nos farees mercee.
Se estes lugares senpre servirom em as obras dessa villa asy como dizees, asy
mandamos que eles sejam costrangidos pera servirem agora em corregimento
das dictas barreiras.
(3) Outrosy senhor quando asy a vosa mercee manda fazer estas obras
alg?uas pesoas asy vosas como dos ifantes como dalguus fidalgos pedem que
os façom veedores das dictas obras. E esto senhor pedem mais por fazer sayca-

377 Armindo de Sousa omite estes capítulos ou baralha os fólios (refere 3v.º por 2v.º) (As Cortes Medievais Por-
tuguesas…, vol. II, pp. 19 e 65). De facto, eles não são precedidos pela habitual ementa, nem tão-pouco data-
dos, sendo assinalados apenas por uma nota lateral que nos indica tratar-se de capítulos de Trancoso.
Atendendo aos que se seguem e porque os capítulos de Cortes não datados, no geral, dizem respeito às Cortes
de 1439, destas os considerámos. Cfr. supra, nota 238. 379 Segue-se seguir riscado.
378 Na margem esquerda regista-se Trancoso. 380 Seguem-se letras riscadas.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

40 Vos pidiis bem e outorgamos-vo-llo e mandamos que asy o façaaes e que


nom paguees montados naquellas terras que teem cartas de montar em vosos
termos.383

[1439] – Capítulo especial de Trancoso às Cortes de Lisboa de 1439.

A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 2, fl. 3.


B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 101v.º-102381.

[fl. 3] 382 Aa vila de Tramcoso capitolo espicial per que he mamdado que
nam paguem montados naquelas terras que tem cartas de montar em seus ter-
mos e etc.

(1) Os procuradores da vosa villa de Trancoso que ora vierom a estas cortes
fazem saber aa vosa mercee que elles por parte della nos derom huum capitollo
spicial en que se continha que no foral della se contem que nenhuum gaado de
Trancoso nom seja montado e que semelhante foral tiinham os outros lugares aa
dicta villa vizinhos e comarcãaos os quaaes de pouco tempo aca ouverom cartas
em geeral que montem per todo o regno per bem das quaaes elles montam e
pacem nos montados da dicta villa e a dicta villa nom ousava de montar com
elles por nom teerem semelhantes cartas no que recebyam agravo. E que porem
pidiam aa vossa mercee que mandasees que montasem com seus vizinhos asy
[como] elles com elles montavom per bem das dictas cartas que asy ouverom e
vos senhor respondestes ao dicto concelho que mostrasemos o foral da dicta villa
o qual vos ora mostram e vos pedem por mercee que lhes dees semelhante desem-
bargo como o teem os dictos lugares a elles vizinhos e que os da dicta villa posam
pacer e montar com elles asy como elles fazem e montam com os da dicta villa ca
seria cousa sem razom seus vizinhos montarem com elles e elles nom montarem
asy como elles. E em esto senhor farees dereito que theudo sooes fazer.

381 Segundo Armindo de Sousa, o texto que consta na Chancelaria de D. Afonso V, L.º 2, fl. 3 corresponde aos

capítulos especiais de Trancoso nas Cortes de Lisboa de 1439 e o texto que se encontra na Leitura Nova, Beira, L.º
2, fls. 101v.º-102 reporta-se aos capítulos especiais de Trancoso nas Cortes de Évora de 1442 (As Cortes Medievais
Portuguesas..., vol. II, p. 65). No entanto, os dois textos são precisamente iguais. Como os textos de Cortes não
datados do L.º 2 da Chancelaria de D. Afonso V dizem respeito às Cortes de Lisboa de 1439, destas os considerá-
mos, até porque os capítulos especiais das Cortes de Évora de 1442 nos surgem com a respectiva data.
382 A anteceder regista-se Beira e escripta. 383 Segue-se, a vermelho: aquy se acaba este capitolo.

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Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

41 curam de lhe dar susidoo386 nem remedio porque loguo os comtadores e juizes
das sisas dizem que nom pertence387 a elles o conhecimento e os rendeiros dam
soom e voz que as justiças da villa sam contra vosso serviço e asy fazem o que
querem. Senhor pidimos aa vossa mercee que nom consemtaees abomenações
que trazem especia de roubos mais que de vosso serviço e mandees que quando
semelhamtes cousas se fezerem que as justiças da388 dicta villa lhas nom com-
1459, Junho, 25, Lisboa – Capítulos especiais de Trancoso às Cortes de Lis- sentam e logo as geentees aveerom vomtade de viir aa dicta feira e sera milho-
boa de 1459. rada e nom pegorada.
A esto respomdemos que nom avemos por bem se fazerem taees opresomen-
A) IAN/TT, Chancelaria de D. Afonso V, L.º 36, fls. 149-150. tees389 e mandamos ao comtador que as nom consenta e asy lho escpreveremos
B) IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fls. 210v.º-212v.º. per nosa carta. E fazemdo-se o contrairo nos lho estranharemos como he
razom sendo dello certeficado.
[fl. 149]384 Aa villa de Tramcoso capitollos espiciaaes per que he mamdado (2) ¶ Senhor outro muito grande agravo recebem os moradores desta villa
que se nam pague sisa se nam de cousa vemdida ou trocada e nam se tome <a> dos comtadores e rendeiros das sisas porque de pouco tempo pera ca fazem
sisa em cousa alg?ua amtes de ser vemdida e outros a que he provydo per h?a enovaçam a quall nunca foy na dicta villa e nom poderya soprir e esto he
repostas. porque mandam fechar as portas da dicta villa todas de noute e de dia que
nom leixom correr nem abrrir salvo h?a ou duas o que se nunca fez da quall
Fig. 21 – Trancoso (noutra página, ao lado) coussa recebem os moradores della muitos agravos e grandes dannos porque a
Capítulos especiais do concelho de Trancoso. Cortes de Lisboa de 1459. vossa alteza sabeera que todollos moradores som grandes criadores e lavrado-
IAN/TT, Leitura Nova, Beira, L.º 2, fl. 210v.º. res asy escudeiros como outros quaeesquer vizynhos e muitas vezes acomtence
quando he a maior força da feira que nom podem dhii tirar suas beestas e por-
Dom Affomso etc. a quamtos esta carta virem fazemos saber que estamdo cos e gados fora da villa porque as dictas portas som çaradas e se alg?a estaa
ora nos em a nosa mui nobre e senpre leall cidade de Lixbõa em as cortes que aberta estaa tam acupada com as gemtes que nom tem por hu sair ou se o lan-
en ella fezemos per Lopo Fernandez Fraiom e Joham Gomez procuradores de çam fora nom os podem tornar asy os perdem muitas vezes que nunca os mais
Trancoso nos foram dados certos capitollos e ao pee de cada huum delles lhe podem achar. Pydiimos-vos senhor por mercee que mandes que as portas todas
mandamos poer nosa reposta segundo se adiamte segue: sejam corremtes como sempre forom e que ponham hii suas guardas como
(1) ¶ Senhor a feira [se] despovoa porque de pouco tempo pera ca os vossos sempre esteverom.
comtadores e juizes das sisas dam tam grande lugar e favoramça aos vossos A esto respomdemos que nos praz nom se fazer em esto alg?a mudamça
rendeiros que em a feira fazem tantas apresooes aos que a ella veem e tam daquello que se faziia em tempo del reii meu senhor e padre e del reii meu
grandes agravos que muitos juram e prometem de nuunca a ella mais tornar avoo. E mandamos ao comtador que asy o faça comprir se em espiciall nom
como de fecto fazem porque lhe nom avomda pagarem-lhe sua sissa direyta tem noso mandado em comtrairo.
mas ainda lhe dam juramentos endebetos385. E se nom querem jurar lhe fazem (3) ¶ Senhor outrosy de pouco tempo pera ca mudam a feira e mercadarias
pagar as sisas em dobro e os trazem em tanta revolta que allem do que lhe donde soyam de estar e se façam da hordenança390 que soiam de teer pella
ham-de pagar os despeitam e sujugam em quanto querem comtra Deus e com-
tra voso serviço. E porque se ainda querellam aas justiças da dicta vila nom 386 Sic. Por subsídio, como, aliás, se encontra no texto da Leitura Nova: subsidio.
387 Palavra corrigida: pertenc~e com a nasalação riscada.
388 Palavra emendada: das com a letra s riscada.

384 Registado na margem esquerda: Trancoso e capitollos. Sobre o documento anotou-se Beyra. 389 Por opressõoes, como se encontra na Leitura Nova.
385 Sic. Por indevidos, como, aliás, se encontra no texto da Leitura Nova: endevidos. 390 No texto: hordenancamça, erro que talvez se deva à mudança de linha. Na Leitura Nova lê-se ordenamça.

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Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

quall razom a porta da dicta villa nom he tam bem povorada nem acompa- os agravar apelle delle ou 393 agravem ou tomeem es[tormento]394 e ser-lhe-ha
nhada como soya de ser asy outros bairos e freguesias e esto per mingoa de boa ca proveudo como for dirreito.
governamça d’apousemtar. Pedem-vos senhor que mandes que os tendeiros (6) ¶ Senhor o vosso povoo recebe grande dano na feira que de todollos
esteem em seu lugar homde sempre esteverom e asy os mercadores e aas outras foramentas395 e queixos e cabritos e cordeiros e avees e bem asy feixes d’erva e
mercadarias que pera esto sera sem escandallo mandes que hum homeem de palha que vem vemder loguo lhe tomam de dez hum e esto he milhor. E
boom de boa fama ponham em a dicta villa por apousemtador que faça apou- ainda que dizem que lhos leixem vender que lhe pagarom seu dirreito nom o
semtar cada h?a mercadaria em seu lugar e ainda que depois da feira apou- querem fazer e logo emdestymente396 lho filhom casy per força. Pedem-vos
semte os corregedores e outros que hii veerem que pousadas ajam d’aver. senhor por mercee que nom dees lugar a taees apresooes e esbulhos e mandees
A esto respondemos que quando se a feira fezer o comtador que hii for com que despois que cada hum vemder a mercadaria pague seu dirreito e damtes
os officiaees da dicta villa hordene aquello que acherca do alogamento das nam.
pesoas e mercadarias entenderem por milhor e mais asesego da dicta villa e nom A esto respondemos que nom avemos por <bem> se tall fazer e mandamos
se fazer desto oficiall novo nem he necesario. Isto se faça em tall maneira que se que se nom pague a sisa senam de coussa vendida ou trocada ou em escam-
recadem os nosos dirreitos como devem sem engano nem outra mallycia. bada e nom se tome a sisa em coussa alg?a antes de ser vendida e mandamos
(4) ¶ Senhor outro mui grande agravo recebe o voso povo pellos juizes das aos nossos officiaes que o nom consemtam.
sacas e escprivam damte elle porque quamdo algum veem vemder ou torcar (7) ¶ Senhor temos per noso huso e custume per tamto e tamto remoto e
alguns gados ou beestas as feiras elles lhe fazem pagar de quamtas cabeças tra- longuo tempo que a memoria dos homens nom he em comtrairo e ainda
zem e por cada h?a dous reais e hum leva o esprivam e o outro o juiz e esto segundo a desposiçom do dirreito cumum?? ja nos he tornado em foro de em
quer vemdam e quer nom vemdam polla quall razom muitos leixam de viir aa esta villa nom serem ajuizados os fectos das sesmarias salvo peramte ?? os jui-
dicta feira o que pouco vosso serviço que he grande dano do povoo. Peedem- zes hordenairos. Ora senhor estamdo nos em esta posse viimos h?a emnova-
vos por mercee que defemdaees que tall soyaria nom façam nem levem taees çom a quall nunca aqui vymos que hum escudeiro a que chamam Joham
dinheiros pois os nom teem per regimento nem nunca se custumou levarem Apemteado que se agora pera aca veo morar trazer h?a vossa leterra porque
salvo agora porque per esta 391 caussa muitos se trabalham de vemder e troca- no-llo daees por juiz em esta villa das dictas sesmarias e asy em termo della e
rem pellos montes e vom em lugares escondiidos e vos senhor perdees vosso se esta mercee lhe fazees por elle hiir com a vossa senoria na tomada d’Alcacer
direito. no que semtiimos muito grande agravo por muitas razoees espressas que nos a
A esto respomdemos e mandamos ao comtador que se emforme de tall ello movem: a primeira por ronpymento de nossas lyberdades husos custumes
coussa e se achar que se tall coussa faz em sua autoridade que nom consemta e a segunda porque esta terra he muito pobre e mesteirossa e muitos nom teem
se fazer e manda que se faça como se antiigamente fez sem outra emnovaçom. tam perfeitamente guisado pera repairar seus beens e se os elles nom podem
[fl. 149v.º] (5) ¶ Senhor vos pede este concelho e vossa villa de Trancosso por correger ficam asy e bem seus herdeiros e corregen-os e todavia vyvem no seu
mercee que porquamto emtemdemos a aver demanda e letigo392 com Alvaro patrimonio. E se se loguo ouvesse de conprir a hordenaçom das sesmarias 399
Martinz de Covilhãa recebedor que foy o anno de LIIII e Jaco Castellão Jacoo muitos perderiom sua legytiima contra razom e comtra dirreito porque em tall
Çoleimam emtemdem de pretender e teer dirreito comtra elles sobre a feira lugar nom se deve tall hordenaçom conprir.
mudada da villa per’Alverca que nos dees o corregedor da comarca por juiz que
nos ouça com elles porque segundo sua boa fama sera sem sospeita aas partees. 393 Segue-se uma letra riscada.
A esto respondemos que o comtador deve dello tomar conhecimento por 394 Palavra em grande parte ocultada por um borrão de tinta e reconstituída a partir da Leitura Nova.
pertencer a seu officio e se sospeita for lhe seja dado outro em seu loguo e se 395 Palavra corrigida de foramentos para foramentas. A Leitura Nova regista ferrametas.

396 Sic. Por indistintamente, como, aliás, se encontra no texto da Leitura Nova: emdestintamemte.
397 No texto: cuum.

391 Seguem-se letras riscadas. 398 Seguem-se letras riscadas.


392 Sic. Por litígio, como, aliás, se encontra no texto da Leitura Nova: letigio. 399 Segue-se de riscado.

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Iberografias | 4
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

A esto respondemos que se per ordenamça antiiga se nom derom sesmarias


en este lugar que se nom deem e o juiz que dado pera ello he avemo-llo por
escusado e mandamos que o nom seja e se se deve per dirreito ou hordenaçom
dar nos praz que as deem os juizes hordenairos que pellos tempos forem os
quaees os façam direitamente e se[m] alg?a saioria senam sejam certos que lhes
sera gravemente estranhado.
(8) ¶ Senhor esta villa de Trancosso e moradores della com seu termo teem
Quadro dos Capítulos
por foro e seu custume muito antigo de se fazer hum mercado cada somana em Especiais de Cortes
a dicta villa o qual soya de ser bem povorado e abastado e servido de muitas
cousas e mercadarias. E porque senhor despoiis foram fectos outros mercados
em outros lugares em estas comarcas asy com a villa de Piinhell e na cidade da
Guarda e na villa de Celorico e em Aguyar da Beira e asy em outros lugares se
fazem estes mercados per tall hordenamça cada mes que as gemtes asy do
termo desta villa como dos outros lugares vãao a elles e nom veem ja aos mer-
cados della. Ora senhor pidiimos aa vossa alteza que por abytar estes comvii-
niiemtes todo se fazer a serviço de Deus e vosso e proll deste logar nos façaees
tamta mercee que mandes que em esta villa se faça hum soo mercado cada
mees co[n]vem a saber na derradeira somana aos dous dias por andar do mes
porque allii achamos que se pode bem fazer e que logo as jemtees de muito bõa
vomtade verom a ella.
[fl. 150] A esto respomdemos e mandamos que o corregedor da comarca
com o comtador vãao aquelle lugar e façam ajuntar os milhores do dicto lugar
e termo e se acharem por nosso serviço e bem da terra e poboo fazer-se a dicta
feira como diizem asy o façam fazemdo do primeiro dia de Janeiro seguinte em
diiamte e se acharem o comtrairo nom façam em ello mudança e faça-se como
se sempre fez.
Pydymdo-nos por mercee os dictos Lopo Fernandez Fraian e Joham Gomez
por parte do dicto concelho que lhe mandasemos dar h?a nossa carta com o
teor dos dictos capitollos e com nossas repostas porque lhe erom necesarios e
se entendiam dellos ajudar e nos vemdo o que nos asy diiziam e pidiiam a nos
prouve dello e lha mandamos dar segundo dicto he. E porem mandamos a vos
Martiim Vicente nosso corregedor que ora soees por nos em a comarca da
Beira e a quaes outros juizes justiças oficiaees e pesoas a que esto pertencer que
lhe compraees e guardes e façaees bem conprir e guardar em todo per a guiissa
que em elles he comtheudo sem outro embargo. Dada em a dicta cidade XXV
dias de Junho. El reii o mandou per Fernam da Silveira seu coudell moor que
ora per seu espiciall mandado teem c[a]rrgo de scprivam da puridade. Jorge
Machado a fez. Anno de Nosso Senhor Jhesu Christo de mill IIIIc LIX.

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187
Capítulos especiais de cortes relativos aos concelhos do actual distrito da Guarda
Ano (Cortes) Concelho Natureza Assunto Tipo de resposta Observações N.º
1325 Guarda (1) Social (1) Compra de propriedades por privilegiados: que os (1) Deferimento. Doc. 11
(Évora) cavaleiros, escudeiros, donas, clérigos e ordens não
possam comprar nem ganhar herdades e posse-
ssões na Guarda e nos seus termos, segundo o foro
da cidade e as cartas de D. Dinis e de D. Afonso IV,
sob pena de o comprador perder a herdade e o ven-
dedor pagar cem maravedis.

(2) Jurídica (2) Jarmelo (jurisdição): que possam usar no (2) Deferimento.
Jarmelo, que fica no termo da Guarda, de toda a
jurisdição régia, tal como usam nas outras aldeias
do seu termo e tal como aí usavam antes de lhes ter
sido embargada por Afonso Sanches, pelo grande
poderio que tinha.

(3) Militar/fiscal (3) Codesseiro: que os moradores da aldeia de (3) Deferimento.


Codesseiro vão a alardo ao concelho da Guarda,
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

paguem com eles nas fintas e talhas e venham à


Guarda jurar aos juízes, sem que os cavaleiros ou
quaisquer outras pessoas lhes ponham qualquer
embargo nas ditas coisas.

1
1340 Castelo (1) Judicial (1) Abusos do corregedor: queixam-se de João (1) Deferimento1. Manda ao corregedor e ao Doc. 4
(Santarém) Rodrigo Domingues, corregedor na Beira e em Riba Côa, juiz de Riba Côa que cumpram
tomar para si muitos feitos, tanto cíveis como crimi- a ordenação que ele fez e o
nais, da vila de Castelo Rodrigo e do seu termo; de mandado que depois lhes
prender e mandar prender muitos homens morado- enviou sobre os feitos, os
res e vizinhos da vila e do termo e de tomar outros presos e as carceragens.
presos que os alcaides dessa vila têm nas suas
prisões, trazendo-os com ele presos de vila em vila;
de levar carceragens dos presos que são livres
pelos alcaides da vila; de, quando chega à vila,
mandar soltar os que aí jazem presos, levando-lhes
a carceragem, ainda que não andem na sua prisão.

2
(2) Social (2) Judeus: queixam-se de os judeus da vila (2) Deferimento2. Manda ao corregedor que
morarem entre os cristãos e de deles receberem vá à dita vila escolher um
muito «nojo». lugar apartado em que esses
judeus possam morar e
(3) Administrativa (3) Tabeliães: queixam-se de alguns tabeliães da (3) Deferimento3. obrigue-os a morar todos lá.
vila, porque dão ao corregedor querelas passadas
3
das quais as pessoas já são livres, fazendo com Manda que os tabeliães da
que muitos sejam presos e outros andem fugidos, vila registem nos seus livros
do que recebem muitas perdas e danos. as sentenças e os alvarás
dos alcaides por que as
(4) Económica (4) Coutadas: queixam-se de que alguns da vila e do (4) Deferimento4. pessoas forem livres e que
termo da comarca têm coutadas por cartas régias se esses tabeliães derem
ou por sua iniciativa e que o gado que aí têm sai essas querelas às justiças
das coutadas e come as ervas nas herdades depois de as terem regis-
alheias, mas se o gado dos outros comer as ervas tado, sejam responsabiliza-
nas coutadas são-lhes logo levadas coimas, são dos por tal acto,
chamados pelos encoutos do rei e trazem-nos em corrigindo-lhes as prisões e
prolongadas demandas. as desonras que daí decor-
rem e pagando-lhes as
(5) Social (5) Abusos dos fidalgos: queixam-se de o alcaide de (5) Deferimento. custas, as perdas e os danos
Castelo Rodrigo e outros fidalgos e poderosos que por isso receberem.
tomarem viandas e muitas outras coisas, não as
4
querendo pagar. Manda que, se o gado dos
que tiverem essas coutadas
comer as ervas nas herda-
des alheias, seja lícito aos
donos dessas herdades pôr

188
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

o seu gado a comer as ervas

nas ditas coutadas, sem

189
qualquer coima, não embar-
gando as suas cartas.

5
1394 Guarda (1) Fiscal (1) Montado e portagem: que lhes dê uma carta por (1) Deferimento Manda que lhes guardem Doc. 12
(Coimbra) que lhes guardem o foro da cidade, no que respeita parcial5. os seus privilégios na parte
à isenção do pagamento de portagem e de montado; do montado; na parte das
que lhes guardem a carta da portagem, usagem, portagens, os do corpo da
passagem e costumagem que o rei (D. João I) lhes cidade sejam isentos pela
deu nas cortes de Coimbra, não embargando a carta forma que foi mandada por
que contra ela deu nas Cortes de Viseu (1391); que D. Afonso IV e por ele (D.
mande que qualquer que for contra ela seja citado João I).
perante o rei.

(2) Administrativa (2) Andadores: que todos os aldeãos e os da cidade (2) Deferimento
da Guarda paguem aos andadores como consta no condicional.
foro da cidade.

6
(3) Militar e fiscal (3) Vila do Touro: que os moradores da Vila do Touro, (3) Adiamento6; Na parte do roldar, quando
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

da Ordem de Cristo, situada no termo da Guarda, non innovandum. for guerra, mandem-lhe seu
quando for guerra, venham velar e roldar à cidade recado e fará sobre o
da Guarda; que paguem e sirvam com os do conce- assunto o que for seu
lho da Guarda nas fintas e talhas que ele lançar. serviço.

(4) Judicial (4) Gado: que se guarde o costume antigo e se (4) Deferimento.
paguem as coimas relativas aos danos provocados
pelo gado como sempre se pagaram.

1396 Guarda (1) Fiscal (1) Portagens e costumagens: que os moradores do (1) Deferimento7. 7 Altera, desta forma, a res- Doc. 13
(Santarém) termo da Guarda sejam isentos do pagamento de posta dada nas Cortes de
portagens e costumagens por todo o reino, tal 1391 e 1394 (doc. 12).
como o são os moradores da cidade.
1436 Guarda (1) Administrativa (1) Coudel: que o coudel, que vive em Valhelhas, a(1) Indeferimento8. 8 Manda, porém, que o Doc. 14
(Évora) três léguas da Guarda, vá viver para a dita cidade coudel faça alardo na
ou deixe o ofício. Guarda, com os moradores
da cidade e do termo, e que
(2) Administrativa (2) Anadel dos besteiros do conto: que os juízes (2) Deferimento os aquantiados aí venham
ponham pena ao anadel dos besteiros para que parcial9. ao dito alardo.
9
venha viver para a cidade da Guarda e que aí faça Em alternativa, requeiram
treinar os ditos besteiros, em cada Domingo, como ao anadel-mor que faça um
é ordenado pelo rei. anadel pequeno que more
continuamente na cidade.
(3) Social (3) Órfãos: que se dêem os órfãos aos vassalos e (3) Deferimento.
cidadãos, estipulando-lhes as soldadas, como
consta nas ordenações.

10
(4) Económica (4) Bestas (comércio de bestas): que quem comprar (4) Manda que se faça como
ou vender besta ou a trocar, assim que tomar posse Desconhecido10. mandou que se fizesse na
do animal, não mais possa denunciar o negócio cidade de Évora.
nem ser recebido em juízo.

(5) Social. (5) Besteiros: que os besteiros contribuam em todas (5) Deferimento.
as coisas que os vassalos do rei pagarem para bem
do reino e da terra, sem embargo de seus privilégios.

1436 Trancoso (1) Fiscal (1) Descaminhados: que os portos e caminhos (1) Deferimento. Doc. 38
(Évora) sejam guardados pelos portageiros e seus reque-
redores, como sempre foram; e que nem os fidal-
gos nem outras pessoas os embarguem em suas
terras e lhes deixem levar os que filharem por des-
caminhados à vila de Trancoso para aí serem
ouvidos, sob certa pena, caso os retiverem ou
embargarem.

190
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

191
[1439] Guarda (1) Administrativa (1) Alcaide: que, quando o alcaide do castelo (1) Non innovan- Doc. 15
(Lisboa) falecer, os homens bons elejam um alcaide que o dum.
mereça e que o rei dê o castelo àquele que por eles
for eleito e receba dele menagem, como é costume
e consta no foral da Guarda.

(2) Religiosa (2) Romaria à igreja de Santa Maria de Açores: que (2) Deferimento.
os moradores da cidade e do termo da Guarda,
quando vão em romaria anual à igreja de Santa
Maria de Açores, a duas léguas de distância, saiam
todos com a sina da cidade de dentro da cidade e
venham com ela até a pôr em casa do alferes.

(3) Militar (3) Obras públicas (muralha): que se repare a cerca do (3) Deferimento11. 11 Manda que, quando vier o
muro da Guarda, já que grande parte está derrubada. tempo do assentamento, lhe
requeiram sobre o assunto e
(4) Jurídica (4) «Sangue sobre olhos»: que, no que respeita ao (4) Non innovan- mandar-lhes-á desembargar
direito que o rei tem na Guarda designado «sangue dum. algum dinheiro para a ajuda
sobre olhos», ninguém seja penhorado até que se das obras.
encontre o culpado.
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

(5) Fiscal (5) Montado: que a isenção do pagamento do (5) Non innovan-
montado que consta no foral da Guarda também se dum.
entenda para os moradores do termo e não apenas
para os de dentro da cidade.

12
[1439] Pinhel (1) Jurídica (1) Santa Eufémia: por a aldeia de Santa Eufémia ter (1) Delegação12. No corregedor da Doc. 28
(Lisboa) sido subtraída ao termo de Pinhel para integrar o comarca.
termo de Trancoso, pedem que lhe seja dada outra
aldeia por ela ou que aquela lhe seja devolvida por
termo ou que se tome outra a Trancoso e se entre-
gue a Pinhel.
13
(2) Judicial (2) Coutada: que não se guarde a pena de 6.000 soldos (2) Delegação13. No corregedor da
posta a qualquer morador de Pinhel que for encon- comarca.
trado com gado na coutada que Gonçalo Vasques
Coutinho fez na aldeia de Ervilhão, no termo de Pinhel;
e que se as éguas e vacas que ele nela lançou fizerem
dano nos pães e frutos dos moradores da dita vila que
os pague; e que os moradores de Pinhel hajam servi-
dão da dita aldeia como antigamente houveram.

(3) Jurídica (3) Colmeal: que os caseiros de João de Gouveia,


alcaide de Castelo Rodrigo, que moram na aldeia (3) Non innovan-
de Colmeal, termo de Pinhel, sirvam tal como os dum.
outros moradores do termo de Pinhel e que o dito
concelho os possa mandar constranger.

(4) Jurídica (4) Lamegal: que os habitantes do lugar do Lamegal,


14
termo de Pinhel, que pertence a Gonçalo Pereira, (4) Adiamento14. Manda que façam sobre
suportem os encargos especiais (como pontes, isto requerimento a Gonçalo
fontes, muros, calçadas, velas e roldas) e para isso Pereira e tomem instrumento
sejam constrangidos como os outros. com a sua resposta e então
haverão desembargo.
(5) Económica (5) Estalagens: que não haja aí outra estalagem
para além da que antigamente foi feita pelo conce- (5) Indeferimento.
lho de Pinhel (dentro da vila); e que ninguém possa
quebrar os costumes e foros que o dito concelho
antigamente ordenou por seu proveito e prol e
honra da terra (ou seja, que ninguém meta vinho
velho nem novo de fora na dita vila nem no termo
enquanto nela houver vinho).
(6) Deferimento.
(6) Militar (6) Obras públicas (construção de uma torre): que
se faça uma torre na parte da muralha que caiu,
que era também a zona mais desguarnecida em

192
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

caso de combate.

(7) Económica (7) Obras públicas (construção de duas pontes): (7) Deferimento

193
que o rei mande fazer duas pontes nas ribeiras de condicional.
Côa e de Pinhel, que correm junto da vila de Pinhel,
e que, para ajudar à construção das ditas pontes,
lhes mande dar, por alguns anos, o resíduo das
vilas de Pinhel e de Castelo Rodrigo.

15
(8) Militar e social (8) Besteiros do conto (número e oficiais): que (8) Deferimento Mantém o número dos
reduza o número dos besteiros ou, continuando a parcial15. besteiros (em 30), mas
ser de 30, que entrem nesse número os quatro ofi- manda que os 4 oficiais
ciais novos (escrivão, anadel, porteiro e meirinho), sejam escolhidos entre os
de forma que não sejam 34; se tiverem de ser 34, besteiros. Ignora o último
que os 4 sirvam e contribuam nos encargos do con- pedido.
celho; que os besteiros que são ou vierem a ser
aposentados sejam constrangidos para os encar-
gos e servidões do concelho.

(9) Militar (9) Armas: que lhes dê algumas armas para sua (9) Deferimento.
defesa porque as que têm já estão danificadas e
perdidas.
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

16
[1439] Trancoso (1) Militar (1) Obras públicas (muralha): que se repare a (1) Deferimento16. Manda que requeiram isto Doc. 39
(Lisboa) muralha e as barreiras da vila de Trancoso. nos assentamentos e ser-
lhes-á desembargado
(2) Militar (2) Obras públicas (muralha): que os moradores de (2) Deferimento dinheiro para o efeito.
Fornos, Anfias, Algodres, Figueiró, Pena Verde, condicional.
Aguiar, Matança, Casais do Monte, Casteição e
Carapito os ajudem no serviço das referidas obras
na vila de Trancoso.

17
(3) Administrativa (3) Obras públicas (vedor e escrivão das obras): que (3) Desconhe- O rei não responde a este
ponham entre eles um homem bom que seja vedor cido17. requerimento.
das ditas obras da muralha e um escrivão, dando-
lhes o rei o mesmo que der aos outros que tais
ofícios tiverem.

(4) Fiscal (4) Sisas: que se dê o arrendamento das sisas ao (4) Deferimento
concelho pelo valor que o rei as recebera nesse condicional.
ano, o qual dizem ter sido o maior de sempre.

[1439] Trancoso (1) Fiscal (1) Montado: que tenham os mesmos direitos que (1) Deferimento. Doc. 40
(Lisboa) os lugares seus vizinhos, podendo, assim, os da vila
de Trancoso apascentar os seus gados e montar
com os outros tal como eles fazem e montam com
os da dita vila.

1441 Guarda (1) Fiscal (1) Pagamento de fintas e encargos: que ninguém (1) Evasiva. Doc. 16
(Torres seja dispensado de pagar nas fintas e encargos do
Vedras) concelho por viver com fidalgos ou, em alternativa,
se o rei mandar que não paguem, desconte-se a
parte deles ao dinheiro que se há-de dar ao rei.
18
(2) Desconhe- Ao rei apraz-lhe que se
(2) Militar (2) Quantias: que se tenha nesta cidade e termo a cido18. tenha nisto a maneira que
ordenação que se tem na Estremadura, a propósito têm em Lamego e seu termo.
dos aquantiados em cavalo e em besta de garrucha.

19
(3) Administrativa (3) Anadel dos besteiros do conto: que o actual anadel (3) Deferimento Mantém o anadel, mas
dos besteiros do conto deixe de exercer o cargo e parcial19. exige que vá viver para a
que o próximo more dentro da cidade da Guarda. cidade, sob pena do dito
ofício.
(4) Administrativa (4) Procurador: que não haja na Guarda mais que
um procurador na cidade e no termo; que aqueles (4) Deferimento.
que levaram o pão e o dinheiro dos moradores do
termo o dêem ao concelho.

194
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

20
(5) Fiscal (5) Portagem: que o portageiro de Celorico esteja (5) Adiamento20. Porque essas terras são do

195
na aldeia da Mizarela, no termo de Linhares e de infante D. Henrique, seu tio,
Celorico, e ali arrecade a portagem. o rei escrever-lhe-á sobre o
assunto para que o faça
(6) Judicial (6) Mordomado da vara: que Álvaro Machado, (6) Non innovan- emendar, o que crê que ele
alcaide da Guarda, que agora tem o mordomado da dum. fará, e se o não quiser fazer,
vara por parte do rei, não haja a dízima das senten- eles escrevam ao rei sobre o
ças que por ele são dadas à execução, mas tão-só assunto e lho emendará.
a dízima do montante da execução.

21
1442 Guarda (1) Fiscal (1) Portagem e montado: que o rei lhes mande uma (1) Evasiva21. Manda que tomem instru- Doc. 17
(Évora) carta (a eles e aos ouvidores das terras dos infan- mentos com reposta daque-
tes) por que, sob certa pena, seja guardado aos les que forem contra esses
moradores da cidade e do seu termo o privilégio de privilégios e que lhos enviem
não pagarem portagem nem montado. e assim terá maneira de lhes
serem guardados e dará por
(2) Judicial. (2) Mordomado: que o rei lhes dê uma carta por que (2) Deferimento. isso pena àqueles que os
o alcaide da Guarda não faça nem mande fazer não quiserem cumprir.
penhoras para levar o seu direito do mordomado
22
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

até lhe serem julgados pelo juiz do rei. No corregedor da


comarca.
(3) Religiosa (3) Irmãos terceiros de S. Francisco: que os freires (3) Deferimento.
da ordem terceira sirvam nos encargos do conce-
lho da Guarda, salvo se residirem no mosteiro.

(4) Económica (4) Foreiros: que, quanto às casas foreiras ao rei, se (4) Deferimento
guarde a lei feita por D. Duarte. condicional.

1444 Castelo (1) Jurídica/fiscal (1) Monforte: que se restitua o lugar de Monforte a (1) Delegação22. Doc. 5
(Évora) Rodrigo Castelo Rodrigo ou que hajam carta por que possam
pastar e montar em Monforte sem pagarem pena.
(2) Fiscal (2) Pedido (cobrança): que o rei dê uma carta ao con- (2) Deferimento
tador para que o lançador do pedido (régio) e o seu condicional.
escrivão sejam de Castelo Rodrigo (e não de Pinhel).

1444 Irmandade de (1) Fiscal (1) Portagem: que o rei dê uma carta à irmandade (1) Deferimento Doc. 10
(Évora) Riba Côa de Riba Côa para que não paguem portagem e para condicional.
(Sabugal, que usem como sempre usaram.
Alfaiates, Vilar
Maior, Castelo (2) Administrativa (2) Oficiais do concelho (eleição): que os concelhos (2) Deferimento
Bom, Almeida, ponham por si os juízes, vereadores e oficiais para condicional.
Castelo Rodrigo regerem a terra, sem o fazer saber ao corregedor.
e Castelo
Melhor) (3) Social (3) Abusos de fidalgos: que faça o conde de (3) Deferimento.
Marialva pagar 18 almudes de vinho que tomou a
um lavrador sem os pagar (a 62 reais o almude).

23
(4) Social (4) Encargos municipais: que os que se fazem (4) Deferimento23. Contudo, manda aos juízes
homens dos alcaides, sem serem deles caseiros, que escusem aquelas
amos ou seus criados, paguem em fintas e talhas pessoas que forem escusa-
com os seus concelhos; e se não quiserem pagar das por ordenação ou privi-
sejam devassos e paguem portagem e montado em légios.
toda a irmandade e não hajam nem gozem dos pri-
vilégios que a dita irmandade tem.

1444 Pinhel (1) Jurídica (1) Coutada: que mande apurar a verdade sobre os (1) Deferimento24. 24 O rei escreverá ao corre- Doc. 29
(Évora) problemas motivados pela coutada que o conde de gedor da comarca para que
Marialva tem na aldeia de Ervilhão, no termo de se informe do conteúdo
Pinhel, e que lhes haja para tal algum remédio. deste capítulo e lhe envie
disto certidão, a qual vista
(2) Económica (2) Obras públicas (construção de uma ponte): que (2) Delegação25. lhe proverá como for direito
mande a Pinhel, Castelo Rodrigo e à ordem de e razão.
Alcântara que, entre todos, refaçam a ponte sobre 25 No corregedor.

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a ribeira de Côa, junto à vila de Pinhel.

26

197
1447 Castelo (1) Administrativa (1) Tabeliães (distribuição das escrituras públicas): (1) Non innovan- Quanto à distribuição dos Doc. 6
(Évora) Rodrigo que todos os tabeliães façam as escrituras públicas dum26. tabeliães, manda que se
por sua distribuição, sem que haja entre eles qual- guarde a ordenação; quanto
quer divisão, ou seja, sem que haja um escrivão ao escrivão dos órfãos, se
apartado (escrivão dos órfãos), nem um escrivão ele foi posto por D. João I,
diante o juiz das sisas. quer que mantenha esse
ofício em sua vida e depois
(2) Económica (2) Obras públicas (construção de uma ponte): que (2) Deferimento. de morrer o concelho pode-
os ajude a concluir a construção da ponte sobre o o dar, segundo sua ordena-
Côa, entre Castelo Rodrigo e Pinhel. ção; quanto às escrituras
que lhe pertencem fazer, o
(3) Militar (3) Obras públicas (muralha): que mande prover as concelho haja o traslado da
obras de correcção das quebradas dos muros e as (3) Adiamento27. ordenação sobre isso feita, a
mande reparar de cal e do mais que necessitar. qual manda que se cumpra.
27
Manda ao corregedor da
(4) Militar (4) Armas (reparação): que o rei lhes dê alguns resí- (4) Adiamento28. comarca que se informe e o
duos que houver na comarca de Riba de Côa, quer faça saber ao rei, que depois
para a reparação e renovação das armas antigas decidirá como for por seu
que há em Castelo Rodrigo (30 ou 40 corpos de serviço e bem da dita vila.
28
solhas), que estão velhas e danificadas, quer para Manda ao contador ou ao
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

serem gastos e distribuídos nalguma coisa que seja almoxarife daquela comarca
boa, como a referida obra da ponte sobre o Côa ou que se informem sobre a
outra qualquer obra que o rei vir que é meritória. reparação que é necessária
às ditas armas e o rei proverá
na maneira que for seu
serviço.

1447 Pinhel (1) Jurídica (1) Coutada: que o rei lhes faça justiça sobre a (1) Deferimento. Doc. 30
(Évora) coutada que D. Gonçalo, filho do conde de
Marialva, fez em Ervas Tenras, no termo de Pinhel,
sem aí ter alguma herança, e sobre a força que ele
aí lhes faz.
(2) Judicial (2) Carcereiro: que perdoe João de Basto, carce- (2) Adiamento.
reiro, por lhe ter fugido uma mulher da cadeia e lhe
dê carta de seguro para se livrar perante o corre-
gedor da comarca.

(3) Social (3) Abusos de fidalgos (conde de Marialva): que não (3) Deferimento.
os faça andar em prolongada demanda com o
conde de Marialva, para cobrar o mantimento que
tomou para si e para os seus, durante cinco
semanas, na aldeia de Freixedas, porque ele é um
homem grande e poderoso e não podem com ele
demandar justiça.

(4) Judicial (4) Corregedores (aposentadorias e guarda dos (4) Deferimento


presos): que os corregedores da comarca não se parcial.
aposentem em Pinhel por seis e sete meses,
tomando as coisas de seu mantimento, pousadas e
roupas pelo preço que querem; e que paguem da
arca da chancelaria tudo o que cumprir (pregos e
amarras) para a sua cadeia. (Requerimento inferido
do resumo da exposição)

29
1455 Guarda (1) Judicial (1) Vinho: que o foral da Guarda se cumpra – no que (1) Deferimento Como este feito é já entre Doc. 18
(Lisboa) respeita a que ninguém possa meter vinho de fora parcial29. partes, não pode acerca
do termo da dita cidade, salvo o que houver de suas dele dar determinação, mas
próprias vinhas – e não permita que o bispo e clere- permite que possam seguir a
zia lho quebrem; ou que lhes dê tempo e lugar para dita apelação no prazo de
que possam seguir a apelação da sentença dada quatro meses.
contra a cidade, sem embargo do tempo dela ter
passado.

(2) Administrativa (2) Oficiais dos resíduos: que se cumpra a carta que (2) Deferimento.

198
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

o rei (seu pai) deu à dita cidade por que não hou-

vesse aí juiz dos resíduos nem escrivão e porteiro,

199
mas que fosse juiz deles o que é juiz da cidade (e
nenhum outro); e que o escrivão e porteiro do dito
cargo não levem dele nenhum mantimento.
(3) Deferimento
(3) Social (3) Coutadas: que sejam guardadas e defendidas as parcial.
terras de erva regadia que certos vassalos e cida-
dãos da cidade da Guarda têm para os seus
cavalos e bestas e que sempre foram coutadas e
defendidas pelos reis seus antecessores e por seus
corregedores.
30
(4) Deferimento Manda que os besteiros do
(4) Social (4) Besteiros do conto (privilégios): que os besteiros parcial30. conto paguem nas soldadas
paguem nas fintas que se lançam para as despesas dos carniceiros tal como os
da ida às cortes e para as soldadas que nalguns outros e quanto à contribui-
anos dão aos carniceiros da cidade. ção da ida às cortes que
lhes seja guardado o seu pri-
vilégio como nele consta.
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

1459 Alfaiates (1) Fiscal (1) Portagem: que Alfaiates tenha os mesmos privi- (1) Deferimento Doc. 1
(Lisboa) légios que têm todos os lugares comarcãos condicional.
(Sabugal, Sortelha, Guarda, Vilar Maior e Castelo
Bom), nomeadamente o de não pagarem portagem
no reino, e de os vizinhos, sendo conhecidos até
oito léguas (mesmo sem carta), não serem obriga-
dos a irem dar recado à vila.

31
(2) Económica (2) Maninhos: que o rei lhes dê uma carta por que (2) Deferimento Faz-lhes mercê dos mani-
hajam os maninhados como sempre houveram e parcial31. nhos enquanto quiser.
que ninguém lhos possa pedir.

(3) Social (3) Vizinhança com S. Martín de Trevejo (Castela): (3) Deferimento.
que o concelho de Alfaiates possa vizinhar com S.
Martín de Trevejo tal como o rei o permitiu ao con-
celho do Sabugal.

32
1459 Almeida (1) Jurídica (1) Jurisdições: queixa contra o conde de Vila Real, a (1) Evasiva32. Manda que declarem Doc. 2
(Lisboa) quem o rei deu toda a jurisdição da vila de Almeida, melhor e mostrem o privilé-
o qual lhes pôs ouvidor, juízes e oficiais da sua mão, gio.
bem como meirinho, o que nunca se costumou
naquela terra. (Requerimento inferido da exposição,
que se apresenta mais como uma queixa)

33
(2) Jurídica (2) Jurisdições: queixa por o rei ter dado ao conde (2) Evasiva33. Responde que não se
de Vila Real todos os direitos que lhe pertenciam entende em tal doação coisa
naquela vila e termo, entre os quais rossios, fontes, que ao concelho pertença.
pesqueiras, montados e montes rotos e por romper,
tendo-se o dito conde apropriado de tudo isto,
apesar de, pelo costume, os moradores da dita vila
e termo sempre os terem possuído sem por eles
fazerem tributo nem foro ao rei. (Requerimento infe-
rido da exposição, que se apresenta mais como
uma queixa)

(3) Jurídica (3) Privilégios e forais: que lhes confirme os privilé- (3) Deferimento34. 34 Manda que os tirem da
gios e forais dos concelhos de Castelo Bom e de Torre, onde os acharão, e
Castelo Rodrigo, em virtude de os de Almeida terem lhes mandará dar alvará por
ardido no tempo das guerras e até então sempre que lhos busquem.
lhes terem sido guardados os daqueles concelhos,
porque todos eram de um foro.

(4) Administrativa (4) Coudel: que o ofício da coudelaria seja dado a (4) Deferimento.
um homem bom morador na vila e natural daí, res-
peitando-se o costume da terra, e não como agora
faz o conde de Vila Real, que põe nele quem lhe

200
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

praz, por mais subjugar a terra.

(5) Administrativa (5) Juiz das sesmarias: que na vila não haja juiz das (5) Deferimento

201
sesmarias e que os juízes ordinários conheçam do condicional.
ofício como sempre foi costume.

35
1459 Castelo (1) Jurídica (1) Jurisdições: exposição ao rei que lhe lembra o (1) Desconhe- Por falta de resposta do rei. Doc. 7
(Lisboa) Rodrigo privilégio dado por D. Dinis de a vila ser de senhorio cida35.
régio.
(2) Económica
(2) Montes maninhos: que o rei não dê a ninguém as (2) Deferimento.
terras outrora abandonadas, de que não se conhe-
cem os donos, que entretanto as gentes da terra
romperam e aproveitaram para pão e para vinho.

1459 Pinhel (1) Fiscal (1) Varejos: que o rei haja algum remédio para os (1) Non innovan- Doc. 31
(Lisboa) varejos praticados pelos siseiros da vila aos lavra- dum.
dores e para outras situações com eles relaciona-
das e lhes mande a maneira que nisto devem ter.
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

(2) Social (2) Mancebos: que o rei mande dar mancebos aos (2) Non innovan-
que têm fazendas para que não as percam. dum.

36
(3) Social (3) Alvarás de fidalgos: que não sejam obrigados a (3) Deferimento36. Manda que usem da carta
guardar os 24 alvarás passados por D. Pedro. que lhes deu por que não
guardassem os alvarás de
(4) Administrativa (4) Tabeliães: que o rei não lhes dê tabeliães sem (4) Evasiva37. nenhum fidalgo, salvo os pri-
licença da vila. vilégios do rei.
37
Responde que, quando vêm
(5) Jurídica (5) Jurisdição de Pinhel: que o rei mantenha a juris- (5) Deferimento. com as suas eleições, o rei
dição de Pinhel nas mãos da Coroa e não a dê a dá os ditos ofícios aos que as
nenhum fidalgo do reino. (Requerimento inferido da trazem e quando não vêm o
exposição) rei dá-os a quem quer, não
indo contra o seu capítulo.
(6) Social (6) Hospital para os pobres: que lhes dê uma carta por (6) Deferimento
que lancem uma finta anual para suportar um hospital condicional.
para os pobres e que disto não sejam dispensados
vassalos nem besteiros nem outros privilegiados.

38
(7) Fiscal (7) Isenção do pagamento de pedido (privilégio): (7) Adiamento38. Manda que lhe mostrem o
que confirme ao concelho de Pinhel o privilégio de dito privilégio.
não pagar pedido.

39
(8) Económica (8) Caça (perdizes): que mande pôr uma pena que (8) Deferimento Responde que tem por bem
qualquer que tomar ovo de perdiz pague pela pri- parcial39. que não tomem perdizes
meira vez 1.000 reais, pela segunda 2.000 reais e à com «boi», sob a pena que
terceira sejam presos até pelo rei ser determinado; consta na ordenação.
e que ninguém seja ousado de matar perdizes com
«boi», buchos, rede ou laços.

(9) Económica (9) Pesca (por envenenamento): que mande que (9) Deferimento.
ninguém lance barbasco e ervas peçonhentas nos
rios sob as penas que constam em cima.

(10) Administra- (10) Juiz das sesmarias: que lhes mantenha o privi- (10) Deferimento.
tiva légio de não terem juiz das sesmarias (sendo estes
feitos da competência dos juízes ordinários da dita
vila) e mande que João Penteado, criado do conde
de Marialva, morador em Trancoso, não use mais
desse ofício na vila de Pinhel e seu termo, em Tran-
coso e noutros lugares. (11) Deferimento.

(11) Administra- (11) Procuradores enviados às Cortes (despesas):


tiva [os procuradores de Pinhel enviados às cortes
pedem] que o rei, por uma carta ou alvará, mande
ao corregedor da comarca que faça o concelho de
Pinhel pagar a cada um deles segundo a ordena-

202
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

ção de Trancoso e dos outros lugares comarcãos.

203
1459 Sabugal (1) Económica (1) Maninhados: que se guarde o privilégio de D. (1) Deferimento. Doc. 35
(Lisboa) Dinis, não permitindo dar os maninhados do conce-
lho.

(2) Social (2) Abusos dos fidalgos: que nenhum fidalgo, (2) Deferimento.
quando vai à vila, tome pousadas, géneros e bens,
promovendo a desordem, mas que, por justiça,
sejam aposentados e paguem os mantimentos pela
valia e estado da terra.

40
(3) Judicial (3) Homiziados: que o homiziado que aí vier morar (3) Deferimento O corregedor não deve
se na vila for preso também nela seja liberto com parcial40. fazer tal coisa senão nos
seu direito, sem que o corregedor o possa daí levar. casos que se por direito e
ordenações deve fazer.
41
(4) Social (4) Privilegiados (abusos): que o corregedor (4) Delegação41; No corregedor.
42
defenda a Martim de Melo que não faça força ao Deferimento42. Quanto ao tiramento do
concelho do Sabugal no que respeita ao montado pão, apraz-lhe que os caste-
da aldeia de Lajeosa, situada no termo dessa vila, o lhanos «vizinhem» com eles
qual alegam sempre ter sido do concelho; que os como eles da sua parte com
castelhanos que vêm ao reino lavrar possam levar eles «vizinharem».
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

o pão de suas colheitas. (5) Delegação41.

(5) Judicial (5) Juiz régio (queixa): que Álvaro Monteiro, juiz do
rei, devolva ao concelho os 3.000 reais que levou
por aí fazer três audiências, pois não os mereceu.

43
1459 Sabugal (1) Jurídica (1) Jurisdição de Quadrazais: que o rei remedeie a (1) Deferimento43. Anula a doação que fizera. Doc. 36
(Lisboa) doação que fizera da aldeia de Quadrazais a Vasco
Martins de Resende, de forma que os privilégios do
Sabugal não sejam quebrados.
42
1459 Trancoso (1) Fiscal (1) Feira (abusos): que não permita que os rendeiros (1) Deferimento Manda ao contador que Doc. 41
(Lisboa) do rei oprimam os que vêm à feira, obrigando-os a parcial42. não consinta que se façam
fazer juramentos indevidos ou a pagar as sisas em tais opressões.
dobro, e mande que quando tais coisas se fizerem
as justiças da vila não lhas consintam.

(2) Económica (2) Portas da vila: que todas as portas sejam cor- (2) Non innovan-
rentes como sempre foram e que ponham aí suas dum.
guardas como sempre estiveram.

(3) Económica (3) Feira (alojamento das pessoas e mercadorias): (3) Indeferimento.
que os tendeiros estejam no lugar onde sempre
estiveram e que ponham por aposentador na vila
um homem bom e de boa fama que faça aposentar
cada mercadoria em seu lugar; e que, depois da
feira, aposente os corregedores e os outros que aí
vierem que tiverem de haver pousadas.

(4) Fiscal (4) Feira: que os juízes das sacas e o respectivo (4) Non innovan-
escrivão não levem dois reais por cada cabeça de dum.
gado que se traz para vender ou trocar na feira,
independentemente de o venderem ou não, como
agora começaram a fazer.

43
(5) Judicial (5) Corregedor: que o corregedor da comarca seja (5) Indeferi- Responde que deve ser o
juiz numa demanda que o concelho entende haver mento43. contador a tomar conheci-
com certos homens por causa da mudança da mento da questão, por perten-
feira. cer a seu ofício; se houver
suspeita, seja-lhes dado outro
(6) Fiscal (6) Feira (pagamento da sisa): que só se pague a (6) Deferimento. em seu lugar; e se os agravar
sisa depois de se vender a mercadoria. apelem dele ou agravem ou
tomem instrumento e ser-lhes-
(7) Judicial (7) Juiz das sesmarias: que os feitos das sesmarias (7) Deferimento. á provido como for direito.

204
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

não lhes sejam julgados, salvo perante os juízes

205
ordinários da vila, segundo seu uso e costume; que
João Penteado, escudeiro, que para aí foi morar,
levando uma carta do rei que o dava por juiz das
sesmarias nessa vila e no seu termo, seja destituído
do referido cargo. (Requerimento inferido da expo-
sição e da resposta)

44
(8) Económica (8) Mercado: que o mercado semanal que se fazia na (8) Delegação44. No corregedor e no conta-
vila passe a fazer-se apenas uma vez por mês, na dor.
última semana, aos dois dias por andar de cada mês.

1460 Guarda (1) Administrativa (1) Contador régio (residência): que ponha pena a (1) Deferimento. Doc. 19
(Évora) Vasco Afonso, contador régio, e aos seus sucesso-
res no cargo, que estejam continuamente na
cidade da Guarda.

1460 Pinhel (1) Administrativa (1) Juiz dos órfãos: que os juízes ordinários sirvam no (1) Deferimento Doc. 32
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

(Évora) ofício de juiz dos órfãos como sempre foi costume condicional.
antes de João Ferrão o haver por carta do rei.

45
(2) Social (2) Privilégios: que mande como se há-de proceder (2) Evasiva45. Responde que não devem
quanto à questão de na vila haver tantos homens guardar privilégios de outras
do infante D. Fernando, irmão do rei, de D. Pedro e pessoas, salvo aqueles que
de muitos outros fidalgos, pelo que se não podem pelo rei ou pelos seus desem-
achar homens para o serviço do rei nem para bargadores forem assinados
cargos do concelho. e selados do seu selo.

1465 Guarda (1) Social (1) Judiaria: que mande aos juízes, sob certa pena, (1) Deferimento. Doc. 20
(Guarda) que a certo dia façam fechar a judiaria.
46
(2) Económica (2) Comércio: que mande que Gonçalo de Paiva, (2) Deferimento46. Diz que ninguém há-de ser
escrivão no porto da vila de Almeida, não possa constrangido a escrever,
levar aos que por aí passam, para comerciar na mas se não escrever e se
comarca de Riba Côa, dinheiro das armas que descobrir que passa para
levam e das bestas cavalares de albarda, nem lhas Castela perde o que levar.
possa fazer escrever, como se as houvessem de
passar para Castela.

(3) Militar (3) Veladores para velar e roldar o castelo: que lhes (3) Deferimento.
mantenha os seus usos e costumes, não os obri-
gando agora a dar dois veladores para velar e
roldar o castelo.

(4) Religiosa (4) Bispo da Guarda: que mande ao bispo da (4) Evasiva.
Guarda que não esteja continuamente na cidade da
Guarda.

47
(5) Judicial (5) Inquirições ordenadas pelo corregedor (custas): (5) Indeferi- Manda, porém, ao corre-
que os corregedores, na altura em que devem mento47. gedor que use nisto modera-
mandar tirar as inquirições nos feitos que julgam, ção e não faça tal coisa
passem uma carta para os juízes da terra e estes salvo quando lhe parecer
ou o inquiridor da vila, com um tabelião, tirem tal necessário.
inquirição e mandem-lha fechada e selada, sem
levarem outro mantimento senão a sua escritura.

48
1465 Guarda (1) Fiscal (1) Fintas: queixam-se de que anualmente se (1) Deferimento Manda a Fernão Cabral, Doc. 21
(Guarda) (Povo)1 lançam na cidade da Guarda duas fintas no valor parcial48. regedor na comarca da
de 7.000 reais e que os oficiais e homens bons lhes Beira, e aos seus sucesso-
exigem mais do que aquele valor; e, além das ditas res que daqui em diante não
1 fintas anuais, procuram sempre uma forma de autorizem qualquer finta sem
Capítulos dos
lavradores e do requerer aos corregedores que os autorizem a primeiro tomarem conta das
povo da cidade da lançar dinheiro ao povo. (Requerimento inferido da rendas do dito concelho e
Guarda e seu termo

206
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

exposição e da resposta) saberem como se despende-

(2) Fiscal (2) Rendas e fintas: queixam-se de haver rendas na (2) Deferimento. ram e se há necessidade

207
cidade da Guarda com que anualmente se pode para lançar outras.
pagar metade das suas despesas; afirmam que se
as devassas que se tiram anualmente fossem exe-
cutadas, o dinheiro que renderiam chegaria para
pagar a outra metade das ditas despesas e os que
fizessem mal receberiam castigo. No entanto,
embora aí haja a dita renda e se executem as ditas
devassas, nunca lhes é descarregada nenhuma
coisa no valor das ditas fintas, nem sabem como
nem por onde se despendem.

49
(3) Administrativa (3) Procurador do povo: que possam nomear um (3) Adiamento49.Porque a cidade alega que
procurador que os represente quando se lança o tem sentença por que não
dinheiro das ditas fintas e quando os procuradores haja aí procurador do povo,
do concelho prestam contas, e que defenda manda ao dito Fernão Cabral
sempre os seus direitos. que veja logo essa sentença
e ouça os oficiais da cidade
(4) Económica (4) Vinho de fora: que todos possam meter vinhos (4) Non innovan- com o povo e lhe mande o
de fora para bodas, baptismos e despesas de suas dum. traslado da dita sentença
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

casas, à excepção dos regatães e taberneiros, sem com o que lhe acerca disto
embargo do privilégio que a cidade da Guarda tem parecer para o rei ver tudo e
em que se diz que nenhum homem da vila nem do determinar aquilo que lhe
termo meta vinhos de fora sob certa pena. parecer justo.

(5) Económica (5) Vinho: que os cidadãos e oficiais não os obri- (5) Delegação.
guem a vender os vinhos que alguns lavradores do
termo encubam dentro da cidade contra a sua
vontade e sem tempo, nem lhes partam as medidas
com que os lavradores vendem os seus vinhos.

(6) Fiscal (6) Finta: que os do povo sejam compensados pelos (6) Deferimento50. 50 Manda a Fernão Cabral que
três reais que foram lançados para estas cortes (ao tome conta desses 3.000 reais,
todo 3.000 reais), porque os que para elas foram porque não se gastaram naqui-
ordenados nunca saíram de suas casas nem deixa- lo para que foram lançados. Se
ram de prover as suas fazendas. achar que se fez alguma des-
pesa necessária leve-lha em
conta e o que sobrar fique para
o ano seguinte, descarregando
o povo de algumas despesas
que tiverem.

1468 Castelo (1) Económica (1) Vizinhança com Castelo Bom: que possam usar (1) Deferimento. Doc. 3
(Santarém) Mendo e lograr do termo de Castelo Bom e vizinhar com
eles da mesma maneira que eles usam e vizinham
com os de Castelo Mendo.
(2) Militar
(2) Torres do castelo: que proveja sobre as duas (2) Deferimento51. 51 Apraz-lhe mandá-lo prover
torres que estão sobre a porta da vila, que caíram e reparar; manda que o
nos últimos cinco anos, pelas quais se entra na vila, requeiram a ele ou a D. João
por cima do muro. Galvão, bispo de Coimbra, do
conselho do rei, escrivão da
puridade e vedor-mor das
suas obras.

1468 Castelo (1) Económica (1) Pastar e montar: que lhes dê uma carta por que, (1) Deferimento. Doc. 8
(Santarém) Rodrigo independentemente dos privilégios, cartas, capítu-
los e alvarás que as vilas de Pinhel e Trancoso (ou
quaisquer outras) tenham em contrário, eles
possam pastar e montar livremente o seu gado nos
termos das ditas vilas e por todo o reino.

52
1468 Guarda (1) Económica (1) Gado (saca de): que não dê sacas de gados por (1) Deferimento; Quanto às avenças, diz que Doc. 22
(Santarém) causa da careza das carnes e coiramas; e não con- non assim o tem ordenado.

208
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

sintam fazer avenças com os passadores, salvo innovandum52. Remete ainda para o

executar as ordenações; e que cometa a execução regi¬mento e capítulos de

209
das ditas sacas aos juízes da terra nesta comarca. partes que fez nas Cortes da
Guarda (1465), os quais
(2) Judicial (2) Juízes (alçada dos): que cometa aos juízes ordi- (2) Evasiva. manda que se cumpram e
nários o conhecimento das portagens, porque, prin- guardem inteiramente
cipalmente nas terras das ordens, os alcaides e
portageiros causam danos aos que passam com
mercadorias.

(3) Administrativa (3) Foral (aplicação de): que confirme o foral da (3) Deferimento.
cidade e o mandado do corregedor Fernão Cabral
de que na relação não sejam mais de doze (dantes
eram 36).

(4) Administrativa (4) Juiz dos órfãos: que mande que Lopo Fernandes (4) Evasiva.
não use mais do cargo de juiz dos órfãos e o deixe
aos juízes.

1468 Guarda (1) Administrativa (1) Coudéis e escrivães: que os coudéis e escrivães (1) Deferimento. Doc. 23
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

(Santarém) não se possam valer mais dos alvarás que os recon-


duzem em novos mandatos de três anos e que se
cumpram os capítulos que prescrevem que os coudéis
e escrivães só o possam ser durante um mandato.

53
1468 Marialva (1) Militar (1) Besteiros do conto: que reduza o número de (1) Deferimento Fixa o número de besteiros Doc. 27
(Santarém) besteiros de 21 para 10. parcial53. do conto em 12.

1468 Sabugal (1) Económica (1) Montado: que os gados dos do Sabugal possam (1) Deferimento. Doc. 37
(Santarém) pastar nos termos dos outros sem pagarem
montado, como o fazem todas as outras vilas suas
comarcãs.
54
1472-73 Guarda (1) Judicial (1) Feitos da almotaçaria: que Fernão Cabral, (1) Deferimento Manda ao corregedor da Doc. 24
(Coimbra- regedor da justiça régia na comarca, não tome parcial54. comarca que não o faça,
Évora) conhecimento dos feitos da almotaçaria, pois, salvo nos casos em que no
segundo a ordenação, não o deve fazer. seu regimento, em ordena-
(2) Deferimento ções ou por especial
(2) Judicial (2) Justiça (aplicação): que Fernão Cabral não parcial54. mandado do rei for decla-
mande levar da cadeia da cidade para a sua correi- rado que o possa ou deva
ção pessoas miseráveis que são presas pelos fazer. Nos capítulos 2 e 3,
juízes da cidade e de que eles podem fazer justiça. manda ainda que, fazendo
(3) Deferimento ele o contrário, tomem ins-
(3) Judicial (3) Justiça (aplicação): que Fernão Cabral e o seu parcial54. trumento com sua reposta e
ouvidor, quando mandam citar perante si as mandará prover sobre isso.
pessoas da cidade e do termo, não os ouçam por
nova acção, pois tal procedimento é contra o privi-
légio que os da Guarda acerca disso têm.

55
1472-73 Pinhel (1) Jurídica (1) Jurisdição: que a vila de Pinhel seja sempre da (1) Deferimento55. Manda que a vila de Pinhel Doc. 33
(Coimbra- Coroa, como sempre foi, e como o têm por privilé- nunca possa ser dada, salvo
-Évora) gios do rei e dos seus antecessores. ao filho do rei.

56
(2) Administrativa (2) Tabeliães: que quando não encontrarem o tabe- (2) Indeferi- Porém, para remediar tal
lião do paço, os tabeliães do banco possam fazer mento56. situação, determina que na
as escrituras. vila haja dois tabeliães do
paço e que um deles fique
(3) Judicial (3) Justiça (aplicação): que todos os moradores da (3) Deferimento. sempre na vila quando o
vila e do termo de Pinhel que forem achados em outro se tiver de ausentar.
culpa não sejam tirados da vila e nela sejam
ouvidos com o seu direito.

57
1481-82 Castelo (1) Económica (1) Forno do concelho: que se cumpra o desem- (1) Delegação57. No adiantado. Doc. 9
(Évora-Viana) Rodrigo bargo passado por Fernão Cabral, adiantado na dita

210
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

comarca, em que determina que todos vão cozer no

211
forno do concelho.

58
(2) Económica (2) Circulação de pessoas e bens: que os morado- (2) Adiamento58. Manda que o marechal
res de Castelo Rodrigo possam andar e passar mostre o foral da vila de
livremente pelo Porto de Vide, no rio Côa, com as Pinhel de 15 de Janeiro a um
suas bestas e cargas sem irem falar à vila de mês, para ser visto, e se o
Pinhel, como eles fazem na vila de Castelo Rodrigo não mostrar antes do dito
e seu termo, porque estão dispensados de pagar prazo, tem por bem que se
portagem e são muito próximos e conhecidos de faça como pedem.
todos os da vila de Pinhel.

(3) Administrativa (3) Jurados das aldeias do termo: que ninguém (3) Deferimento.
(nem o ouvidor nem outra pessoa) possa escusar
nem tirar nenhum dos dois jurados postos por cada
aldeia do termo de Castelo Rodrigo a partir do
momento em que estes forem eleitos e postos pelos
respectivos moradores, salvo se tiver tal privilégio
do rei por que por direito possa ser escuso.
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

(4) Administrativa (4) Alcaide (abusos): que ninguém possa ser cons- (4) Deferimento.
trangido nem rogado para serviço do alcaide nem
de outras pessoas e quem der ou pedir alguma jeira
pague certa pena para a câmara do rei.

59
(5) Jurídica (5) Senhorios: que os moradores das aldeias de Rei- (5) Deferimento Se os moradores dessas
gada, Fontanares e Cinco Vilas (que são comenda da condicional59. aldeias tiverem algum privi-
ordem de Cristo) e da aldeia da Torre dos Frades (que légio por que o não devam
é do mosteiro de Santa Maria de Aguiar), todas do fazer, delega a decisão do
termo da vila de Castelo Rodrigo, velem e roldem com assunto no seu adiantado ou
todos os outros que moram na dita vila e termo e pa- a quem tiver o seu cargo.
guem em todas as fintas e taxas que forem lançadas
para prol e honra da dita vila, pois vivem no seu termo
e gozam de todos os seus privilégios e liberdades.
1481-82 Guarda (1) Judicial (1) Abusos do ouvidor (conhecimento dos feitos): (1) Deferimento. Doc. 25
(Évora- que Gonçalo Gonçalves, ouvidor de Fernão Cabral,
Viana) não possa tomar conhecimento dos feitos que com-
petem aos juízes ordinários.

60
(2) Judicial (2) Abusos do ouvidor (cadeia da correição): que (2) Deferimento Manda que o ouvidor ou o
Gonçalo Gonçalves, ouvidor de Fernão Cabral, parcial60. corregedor só possam ter a
quando vai à Guarda, não meta a cadeia da sua cadeia junto da do conce-
correi¬ção dentro do paço do concelho, onde está lho desde que chegarem à
a cadeia do concelho, mas que lhe dêem uma cidade até três dias, se antes
casa suficientemente forte em que os presos da a não puderem haver apar-
correição possam estar, como sempre se costu- tada; manda ainda que nestes
mou. dias não seja tirado o direito
(3) Judicial ao carcereiro e aos juízes da
(3) Abusos do ouvidor (guardas para os presos): (3) Deferimento vila, segundo o seu foro.
61
que Gonçalo Gonçalves, ouvidor de Fernão Cabral, parcial61. Só peça guardas quando
não peça guardas para os presos e que os juízes lhe parecer que são neces-
não possam incorrer em penas por ele postas sários para bem da justiça,
quando os pede e eles não lhos dão. nalguns casos especiais em
(4) Judicial que se não podem escusar.
62
(4) Abusos do ouvidor (transporte dos presos): que (4) Indeferi- Manda, porém, ao ouvidor
Gonçalo Gonçalves, ouvidor de Fernão Cabral, mento62. que trate bem os presos,
quando parte da cidade, não peça bois nem carros quando tiver de os transpor-
para levar os presos, mas que os leve tal como os tar, e o mesmo aos morado-
presos da cadeia da corte régia. res da terra, com a menor
(5) Judicial opressão que puder, guar-
(5) Abusos do ouvidor (presos): que Gonçalo Gon- (5) Deferimento dando a segurança que
çalves, ouvidor de Fernão Cabral, não tome conhe- parcial63. cumpre ao bem da justiça.
63
cimento dos feitos julgados pelos juízes da cidade Os presos só se mudem
nem mande que os que por estes são presos vão à quando o ouvidor entender e
cadeia da correição, mas deixe que os juízes os houver informação de que aí
livrem com seu direito, dando apelação e agravo não ficariam seguros, por
nos casos em que devem; que Gonçalo Gonçalves fraqueza das prisões, ou,

212
Maria Helena da Cruz Coelho | Luís Miguel Malva de Jesus Rêpa

ouça e determine com brevidade os feitos dos sendo pessoas poderosas e

213
presos que andam na sua cadeia. aparenta¬das, por a ele per-
(6) Judicial tencer o conhecimento,
(6) Abusos do ouvidor: que Gonçalo Gonçalves, (6) Deferimento. segundo a forma da ordena-
ouvidor de Fernão Cabral, quando quer palha, lenha ção.
e junco pague-as pela vontade dos seus donos, e Ignora o segundo requeri-
se não as quiser pagar, tais coisas não lhe tragam; mento.
que haja por nulas as penas que o dito ouvidor pôs
sobre tal caso.
(7) Administrativa
64
(7) Relação: que, sem embargo dos doze da relação (7) Adiamento64. Pede disto informação e
que por Gonçalo Gonçalves, ouvidor de Fernão parecer ao ouvidor.
Cabral, foram feitos, usem e se rejam como sempre
antigamente se costumou.
(8) Fiscal
65
(8) Privilégios (isenção de portagem e montado): (8) Deferimento Manda que lhes guardem
que agrave as penas para quem não quiser guardar parcial65. todos os seus privilégios,
os privilégios da cidade, nomeadamente o de os mas não agrava as penas.
moradores da vila e do termo não pagarem porta-
gem nem usagem em todo o reino; que mande que
Um Cruzamento de Fronteiras: O discurso dos concelhos da Guarda em Cortes

todos lhes guardem o privilégio de não pagarem


montado em todo o reino.
(9) Económica
66
(9) Vinho: que agra¬ve a pena que consta no foral, (9) Deferimento Manda que se guarde o
mandando que o que meter vinho de fora seja parcial66. foral, mas não agrava a
degredado para os lugares de além por dois anos. pena.
(10) Administra-
67
tiva (10) Coudel: que anule as cartas que permitem a (10) Revoga as cartas e manda
alguns coudéis terem esse ofício de forma vitalícia; Deferimento67. que não levem mais do que
que os coudéis só levem dinheiro no primeiro lhes pertence levar por seu
alardo, quando entram no dito ofício, por que se regimento.
paga a carta e o selo dela, como sempre se costu-
mou.
1482 Pinhel (1) Social Doc. 34
(Santarém) (1) Privilegiados: que os corregedores não chamem (1) Deferimento.
nem constranjam os fidalgos, cavaleiros, escudei-
ros, vassalos e cidadãos honrados a irem com o
povo comum, por pregão e mandado, até ao pé da
forca ou pelourinho, onde quer que a justiça se há-
de fazer, nem tão-pouco a irem com os presos.

1490 Guarda (1) Económica Doc. 26


(Évora) (1) Estalagens: que os estalajadeiros não vendam (1) Deferimento.
vinhos de fora do termo da Guarda aos moradores
da cidade, salvo aos que derem pousadas, e
dando-os de outra forma paguem a pena que
consta no foral; que os estalajadeiros possam
vender o pescado que mandam trazer do mar, como
regatães, sem almotaçaria, aos que em suas casas
pousam, levando o preço que entenderem, mas que
se o venderem aos cidadãos façam-no pelo estado
dos almocreves da terra.
(2) Judicial 68
(2) Justiça: que anule o alvará que recentemente (2) Deferimento Manda que o dito alvará se
deu ao bispo da Guarda pelo qual manda aos juízes parcial68. guarde durante um ano,
e oficiais que recebam nas suas prisões quaisquer contado a partir da data em
pessoas que lhes o dito bispo e os seus vigários que foi passado, e depois
mandarem, já que por ele a cidade recebe grande não se guarde mais.
agravo e quebra da sua jurisdição.

214
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Iberografias | 4

Índices
Índice dos Documentos

Alfaiates (fr. c. Sabugal)


1. Cortes de Lisboa de 1459 (1459, Julho, 4, Lisboa) 00

Almeida
2. Cortes de Lisboa de 1459 (1459, Junho, 28, Lisboa) 00

Castelo Mendo (fr. c. Almeida)


3. Cortes de Santarém de 1468 (1468, Maio, 26, Santarém) 00

Castelo Rodrigo (fr. c. Figueira de Castelo Rodrigo)


4. Cortes de Santarém de 1340 (1340, Junho, 8, Santarém) 00
5. Cortes de Évora de 1444 (1444, Fevereiro, 29, Évora) 00
6. Cortes de Évora de 1447 (1447, Março, 22, Évora) 00
7. Cortes de Lisboa de 1459 (1459, Julho, 30, Lisboa) 00
8. Cortes de Santarém de 1468 (1468, Agosto, 2, Lisboa) 00
9. Cortes de Évora/Viana de 1481-82 (1482, Janeiro, 15, Évora) 00

Côa (Irmandade de Riba Côa)


10. Cortes de Évora de 1444 (1444, Janeiro, 22, Évora) 00

Guarda
11. Cortes de Évora de 1325 (1[32]5, Abril 26, Évora) 00
12. Cortes de Coimbra de 1394 (1395, Janeiro, 2, Coimbra) 00
13. Cortes de Santarém de 1396 (139[6], Maio, 8, Santarém) 00
14. Cortes de Évora de 1436 (1436, Abril, 14, Estremoz) 00
15. Cortes de Lisboa de 1439 (S.d.) 00
16. Cortes de Torres Vedras de 1441 (1441, Maio, 24, Torres Vedras) 00
17. Cortes de Évora de 1442 (1442, Fevereiro, 29, Santarém) 00
18. Cortes de Lisboa de 1455 (1455, Março, 25, Lisboa) 00
19. Cortes de Évora de 1460 (1460, Dezembro, 12, Évora) 00
20. Cortes da Guarda de 1465 (1465, Setembro, 3, Guarda) 00

217
21. Cortes da Guarda de 1465 (1465, Setembro, 23, S. Romão) 00 Índice Geral
22. Cortes de Santarém de 1468 (1468, Maio, 28, Santarém) 00
23. Cortes de Santarém de 1468 (1468, Maio, 29, Santarém) 00
24. Cortes de Coimbra/Évora de 1472-73 (1473, Março, 27, Évora) 00
25. Cortes de Évora/Viana de 1481-82 (1482, Abril, 16, Viana do Alentejo). 00
26. Cortes de Évora de 1490 (1490, Julho, 15, Évora) 00

Marialva (fr. c. Mêda) Abertura 00


27. Cortes de Santarém de 1468 (1468, Maio, 22, Santarém) 00 Um cruzamento de fronteiras: o discurso dos concelhos
da Guarda em Cortes 00
Pinhel
28. Cortes de Lisboa de 1439 (S.d.) 00 Apêndice documental
29. Cortes de Évora de 1444 (1444, Fevereiro, 22, Évora) 00 Nota prévia 00
30. Cortes de Évora de 1447 (14[4]7, Março, 14, Évora) 00 Critérios de transcrição 00
31. Cortes de Lisboa de 1459 (1459, Julho, 28, Lisboa) 00 Documentos
32. Cortes de Évora de 1460 (1460, Dezembro, 15, Évora) 00 Alfaiates 00
33. Cortes de Coimbra/Évora de 1472-73 (1473, Março, 30, Évora) 00 Almeida 00
34. Cortes de Santarém de 1482 (1483, Janeiro, 21, Santarém) 00 Castelo Mendo 00
Castelo Rodrigo 00
Sabugal Côa (Irmandade de Riba Côa) 00
35. Cortes de Lisboa de 1459 (1459, Julho, 2, Lisboa) 00 Guarda 00
36. Cortes de Lisboa de 1459 (1459, Julho, 9, Lisboa) 00 Marialva 00
37. Cortes de Santarém de 1468 (1468, Maio, 30, Santarém) 00 Pinhel 00
Sabugal 00
Trancoso Trancoso 00
38. Cortes de Évora de 1436 (1436, Abril, 14, Estremoz) 00 Quadro dos capítulos especiais de Cortes 00
39. Cortes de Lisboa de 1439 (S.d.) 00
40. Cortes de Lisboa de 1439 (S.d.) 00
41. Cortes de Lisboa de 1459 (1459, Junho, 25, Lisboa) 00

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