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Criminal na Prática - https://criminalnapratica.com.br/ Prof.

Rodrigo Alvarez

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA


2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE TRÊS LAGOAS/MS

Processo nº: XXXX

TÍCIO ALVES DA SILVA, já qualificado nos autos


em epígrafe, que lhe move o Ministério Público Estadual, vem à
presença de Vossa Excelência, por intermédio da Defensoria
Pública Estadual, apresentar:

ALEGAÇÕES FINAIS EM FORMA DE MEMORIAIS

com fulcro no artigo 403, §3º, do Código de Processo Penal,


pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:

I – DOS FATOS

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O acusado está sendo processado porque teria


infringido o disposto no artigo 250, § 1º, inciso II, alínea “a”, do
Código Penal.

Descreve a exordial acusatória que no dia 25 de


fevereiro de 2020, por volta das 16h15, na Rua Crispim
Coimbra, n°3000, Jd. das Paineiras, nesta cidade e comarca de
Três Lagoas/MS, o denunciado TÍCIO ALVES DA SILVA
causou incêndio em casa habitada, expondo a perigo a vida, a
integridade física e o patrimônio das demais pessoas que
residem nas proximidades de sua residência, conforme laudo de
vistoria em local do crimes de fls.37/43.

É o relato do necessário.

II – DA ABSOLVIÇÃO
II.1 - DA AUSÊNCIA DE PROVAS

A acusação imputada ao réu não restou


comprovada, vez que as provas coligidas aos autos são frágeis
e insubsistentes para alicerçar uma sentença condenatória.

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Isso porque, a suposta confissão levada a efeito na


fase extrajudicial (fls. 10), não foi confirmada em juízo.

Com efeito. Perante a autoridade judiciária o


acusado negou ter ateado fogo na residência, alegando para
tanto que muito embora estivesse se submetendo a tratamento
médico a fim de se curar da dependência do álcool, se utilizando
inclusive de medicamentos controlados, no dia dos fatos, em
decorrência de uma discussão ocorrida entre o acusado e sua
esposa, se dirigiu a um bar e ingeriu bebida alcoólica.

Com isso, após retornar do estabelcimento onde


ingeriu bebida alcoolica, aindo sob efeito de medicamento e
álcool, o denunciado perdeu os sentidos, sendo retirado do local
dos fatos pelo corpo de bombeiros ainda desacordado.

O corpo de bombeiros foi acionado pela vizinha e


testemunha PAULA, pois esta percebera o fogo na residência do
acusado.

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Analisando as provas trazidas aos autos, muito


embora a materialidade esteja devidamente comprovada,
mesma sorte não ocorreu em relação à autoria.

Isso porque, não foi possível averiguar de que


maneira o fogo começou. O acusado declarou que “apagou” por
conta da mistura de álcool e remédios. A testemunha PAULA da
Silva Costa declarou que não viu o momento em que o acusado
teria incendiado o local.

Por sua vez, a esposa de TÍCIO, Srª MARIA


Aparecida Almeida, também não soube informar de que maneira
se iniciou o fogo, até porque no momento dos fatos, a
testemunha estava trabalhando.

Como se vê pelas provas amealhadas aos autos não


foi possível averiguar com certeza de que maneira os fatos se
deram, vale dizer, não restou comprovada a existência de dolo
na conduta do denunciado.

Assim sendo a absolvição é medida que se impõem.

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II.2 - DA FALTA DE DOLO ESPECÍFICO

Entretanto, ainda que ficasse devidamente


comprovado que o acusado praticou a conduta delituosa
relatada na denúncia, eis que o delito, sob comento, para ser
classificado como crime, tem de ser capaz de acarretar perigo
para um número indeterminado de pessoas ou bens, o que é em
última análise a configuração do chamado perigo concreto.

Não houve no presente caso perigo para uma


coletividade. Isso porque, a testemunha PAULA, que morava ao
lado da residência do denunciado, informou que as labaredas
não atingiram sua casa.

O laudo pericial acostado aos autos às fls. 62/68 dá


conta de que as chamas, somente atingiram o quarto da
residência do acusado, e não se propagaram por outros
cômodos, sendo contidas pela equipe do corpo de bombeiros.

Ainda que o fogo não tivesse sido extinto de pronto,


ele não alcançaria outros imóveis, justamente porque não tinha

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potencialidade de expansão do dano a outras coisas e a


pessoas indeterminadas.

Assim, face à inocorrência do perigo comum


descaracterizado está o crime de incêndio. Neste sentido:

“Agente que queima barraco que se achava em


local isolado - Perigo comum inexistente –
“Inocorrendo perigo comum, descaracteriza-se o
crime de incêndio, como no caso em que o barraco
queimado pelo acusado se achava em local isolado
e não havia nas proximidades outras choupanas ou
casas.

A lei dispõe ser o incêndio crime de perigo comum.

Sendo comum a tutela se estende a um grupo social,


a um número indeterminado de pessoas. Assim,
jamais poderia ser considerado como comum o
perigo causado a uma, duas ou até mesmo três
pessoas ou a um número determinado e certo de

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indivíduos residentes no mesmo local” (TJSP – AC


131. 054 – 3/8 – Rel. Silva Pinto – RT 710/264 ).

Destarte, sem a existência de perigo comum para a


vida ou o patrimônio de outrem é de se concluir pela não
configuração do delito imputado ao acusado.

III –DA DESCLASSIFICAÇÃO PARA A MODALIDADE


CULPOSA

Caso Vossa Excelência entenda de modo diverso, e


reconheça que foi o acusado quem realmente provocou o
incêndio, eis que o fez em razão do estado de dormência que se
encontrava.

É dos autos que o denunciado após ingerir os


medicamentos controlados dos quais ainda faz uso contínuo, se
dirigiu até um bar e fez uso de bebida alcoólica.

Com a mistura de medicamentos e álcool, retornou


para sua residência sonolento, entretanto, conforme se colhe de

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seu interrogatório (áudio e vídeo) acendeu um cigarro, deitou-se


na cama e perdeu os sentidos com o cigarro aceso.

Posteriormente foi retirado do local pelos soldados


do corpo de bombeiros.

Impende registrar que a documentação acostada


aos autos às fls. 162/168, 193, 201, 204, 208 e 211, confirmam
que o denunciado faz tratamento contra o alcoolismo.

De acordo com as próprias palavras do denunciado,


é possível presumir que muito provavelmente, a causa do
incêndio, foi o fato de o cigarro ter caído de sua mão sobre o
colchão, sem que este percebesse, afinal, estava desacordado.

Deste modo, é forçoso reconhecer que se realmente


o fogo se iniciou pelos motivos acima descritos, o
reconhecimento da modalidade culposa é medida que se impõe,
conforme requereu o Parquet em sede de alegação finais.

IV – DA SEMI-IMPUTABILIDADE

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Caso Vossa Excelência entenda de modo diverso, há


de se reconhecer a parcial capacidade do acusado em se
autodeterminar, como comprova o laudo pericial acostado aos
autos (fls. 200/202).

Prescreve o artigo 26, parágrafo único: “A pena


poderá ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em
virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento
mental incompleto ou retardo não era inteiramente capaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo
com esse entendimento”.

Na hipótese dos autos, o acusado foi submetido a


exame de insanidade mental que constatou que era ao tempo
dos fatos, incapaz de entender plenamente a ilicitude de seus
atos, haja vista que é alcoolatar e havia consumido alcool
juntamente com os remédios controlados que usa para o
tratamento de sua doença.

Assim, as provas produzidas nos autos corroboradas


pelo laudo médico confirmam ser o réu semi-imputável, com

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comprometimento parcial de sua capacidade de entendimento e


determinação, situação determinante da redução da pena.

Portanto, restou demonstrada a capacidade volitiva


diminuída do acusado, devendo incidir na espécie a causa de
diminuição prevista no artigo supramencionado e transcrito.

V – DO PEDIDO

Ante o exposto, requer esta Defensoria Pública:

a) A ABSOLVIÇÃO do acusado TÍCIO ALVES DA


SILVA do crime a ele imputado.

b) Subsidiariamente requer seja desclassificado para


a modalidade culposa;

c) Seja aplicada a redução da pena prevista no


parágrafo único do art. 26, do Código Penal, em
seu patamar máximo, por ser medida de Justiça.

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Termos em que, Pede Deferimento.

Três Lagoas, 7 de fevereiro de 2020

RODRIGO OLIVEIRA ALVAREZ


Defensor Público

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