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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Processo: 1.0702.15.049217-2/001
Relator: Des.(a) Lílian Maciel
Relator do Acordão: Des.(a) Lílian Maciel
Data do Julgamento: 15/04/2020
Data da Publicação: 17/04/2020

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL - CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E


VENDA DE IMÓVEL - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA - ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL -
OCORRÊNCIA - CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA DE 180 DIAS - VALIDADE - MULTA MORATÓRIA - INVERSÃO DE
CLÁUSULA CONTRATUAL - POSSIBILIDADE - MULTA COMPENSATÓRIA - AUSÊNCIA DE PREVISÃO
CONTRATUAL - ARBITRAMENTO - IMPOSSIBILIDADE - INVIABILIZAÇÃO DE OBTENÇÃO FINANCIAMENTO
IMOBILIÁRIO - PREVISÃO CONTRATUAL DE PAGAMENTO DO PREÇO VIA RECURSOS PRÓPRIOS -
INDENIZAÇÃO INDEVIDA - COMISSÃO DE CORRETAGEM - VALIDADE - PRECEDENTE DO STJ - DANOS
MORAIS - NÃO COMPROVAÇÃO - ATRASO ÍNFIMO.
- Tendo o magistrado, na condição de destinatário das provas, elementos suficientes para a solução do litígio, é
autorizada a dispensa de produção de quaisquer outras provas que considere impertinentes ou protelatórias, podendo
julgar antecipadamente a lide, sem que isso configure cerceamento de defesa.
- Não é abusiva a cláusula de tolerância nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel em construção,
desde que o prazo máximo de prorrogação seja de até 180 dias. STJ. 3ª Turma. REsp 1.582.318-RJ, Rel. Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/9/2017.
- O Superior Tribunal de Justiça definiu, no julgamento do Recurso Especial 1.631.485/DF, sob a sistemática dos
recursos repetitivos, que é possível a inversão da cláusula penal contratualmente prevista apenas para a hipótese de
inadimplemento do adquirente.
- Incabível o arbitramento judicial de multa compensatória em favor do promitente vendedor, quando inexistente
qualquer previsão contratual da referida penalidade seja em face do comprador ou do vendedor.
- Tendo o apelante declarado no contrato que pretendia quitar o preço mediante utilização de recursos próprios, a não
obtenção posterior de financiamento imobiliário em decorrência de hipoteca constituída pelas apeladas sobre o bem,
não gera direito à reparação.
- É válida a cláusula que transfere para o consumidor a obrigação de pagar a comissão de corretagem, cabendo ao
consumidor, contudo, o ônus da prova quanto à cobrança e respectivo pagamento.
- O atraso ínfimo na finalização do empreendimento configura mero descumprimento contratual, seguido de
dissabores, razão pela qual não enseja o dever de indenizar danos morais não demonstrados.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0702.15.049217-2/001 - COMARCA DE UBERLÂNDIA - APELANTE(S): ANDRE CUNHA DE
FARIA - APELADO(A)(S): ELGLOBAL CONSTRUTORA LTDA, SPE CONDOMINIO TEMPO UDI LTDA

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 20ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na
conformidade da ata dos julgamentos, em REJEITAR A PRELIMINAR E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO
RECURSO.

DESEMBARGADORA LÍLIAN MACIEL


RELATORA.

DESEMBARGADORA LÍLIAN MACIEL (RELATORA)

VOTO

Trata-se de recurso de apelação aviado por ANDRÉ CUNHA FARIA em face da sentença prolatada pelo juízo da
5ª Vara Cível da Comarca de Uberlândia, (fls. 253/258_origem), que julgou improcedentes os pedidos formulados
contra a SPE CONDOMÍNIO TEMPO UDI LTDA e ELGLOBAL CONSTRUTORA LTDA.
Narra a parte autora, ora apelante, na inicial ter celebrado com as rés promessa de compra e venda de uma sala
comercial em construção, com previsão de entrega para março de 2014. Alega que o imóvel somente foi entregue em
março de 2015, sem conclusão, com vários defeitos e sem documentação necessária.

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Aduz ainda ter suportado prejuízos por não ter conseguido obter financiamento imobiliário, uma vez que o réu não
forneceu os documentos do imóvel. Assim, afirma ter sido forçado a contratar empréstimo pessoal ao invés de
financiamento imobiliário para quitar o restando do imóvel quando da entrega.
Formulou os seguintes pedidos: a) declaração de nulidade da cláusula contratual de tolerância de 180 dias para a
entrega ou sua redução para 30 dias; b) aplicação de multa não inferior a 1% ao mês, ou não inferior a R$1.500,00 ao
mês, pelo atraso na entrega do imóvel; c) condenação no pagamento da multa contratual, no percentual mínimo de
15%, a ser arbitrada pelo juízo em razão da quebra de contrato em razão da documentação do empreendimento,
saldo devedor, entrega fora do prazo, qualidade da obra; d) indenização por danos morais; e) indenização pelo
prejuízo decorrente de ter sido contratado empréstimo pessoal, em razão da impossibilidade de obter financiamento
imobiliário em razão da inexistência da documentação do empreendimento e f) devolução em dobro da comissão de
corretagem.
Na contestação (fls. 79/89_origem), os requeridos alegaram, em síntese, não haver previsão contratual de que
parte do preço do negócio seria pago mediante financiamento imobiliário. Afirmam ter sido providenciada toda a
documentação do empreendimento e que vários adquirentes obtiveram o financiamento imobiliário. Quanto à entrega,
afirmam que ocorreu ao autor em 23.10.2014, quando foram entregues as chaves e que faltavam apenas pequenos
detalhes na construção que foram concluídos em seguida. Assim, pugna pela improcedência de todos os pedidos
iniciais.
Intimadas as partes para especificarem provas, o autor requereu a inversão do ônus, bem como a oitiva de
testemunhas e depoimento pessoal dos réus. Os requeridos, por sua vez, também requereram a produção de prova
oral.
O juiz consignou na sentença que "após detida análise dos autos, formo convencimento no sentido de ser cabível
o julgamento do presente feito no estado em que se encontra" e julgou improcedentes os pedidos autorais.
Nas razões de apelação, o recorrente afirma ter havido cerceamento de defesa, uma vez que não foi produzida a
prova oral pleiteada. No mérito, afirma ter restado incontroverso o atraso de pelo menos um mês na entrega do
imóvel.
Argumenta haver sim previsão contratual de multa equivalente a 0,5% do preço por mês de atraso e que o prazo
de tolerância deve ser comunicado ao adquirente, sob pena de ilegalidade de sua utilização. Reitera que não basta
haver o habite-se para ser possível a utilização do empreendimento; aduz que o uso do edifício só foi possível meses
após, conforme pretendia provar na instrução.
Sobre a impossibilidade de obter o financiamento imobiliário, afirma ter produzido prova de que os réus não deram
baixa na hipoteca que havia sobre o bem, impedindo o financiamento. Assim, pleiteia seja cassada a sentença para
determinar a produção das provas ou que seja reformada e julgados procedentes os pedidos iniciais.
Recolheu o preparo prévio (fls. 273/274_origem).
Contrarrazões dos réus pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
O recurso deve ser conhecido, presentes os pressupostos de admissibilidade e processamento que lhe são
próprios.

DO CERCEAMENTO DE DEFESA
Sustenta o apelante ter havido cerceamento de defesa em razão da não realização de audiência para colheita da
prova oral requerida.
Sem razão.
Compulsando os autos, verifica-se que o magistrado "a quo" intimou as partes para especificarem provas (fl.
201/origem), tendo o autor requereu a produção de prova testemunhal e depoimento pessoal (fl. 205/origem). As rés
pugnaram pelo depoimento pessoal do autor e oitiva de testemunhas.
Às fls. 208/origem, foi deferida a inversão do ônus da prova. As rés procederam à juntada dos documentos de fls.
211/247.
Em seguida, o magistrado concluiu que o feito encontrava-se apto para julgamento e proferiu sentença de
improcedência.
O julgamento antecipado do mérito poderá ocorrer, nos termos do art. 355 do Código de Processo Civil (CPC),
quando não houver necessidade de produção de outras provas.
Segundo o recorrente, os fatos cuja prova pretendia produzir por meio da oitiva das testemunhas eram: ausência
de prévia comunicação pelas rés de que usariam o prazo de tolerância do contrato; as condições do imóvel quando
entregue e a dificuldade em obter o financiamento imobiliário em razão das pendências que recaiam sobre o bem.
Todavia, a prova documental coligida aos autos é robusta o suficientes para elucidar satisfatoriamente os pontos
debatidos, em especial sobre as condições do imóvel e os impedimentos para obtenção do financiamento imobiliário,
conforme fundamentação que se seguirá.
A questão atinente à necessidade de prévia comunicação do promitente comprador para utilização do

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prazo de tolerância contratual é resolvida no plano do direito, sendo despicienda a prova pretendida.
Nesse cenário, não se verifica qualquer cerceamento de defesa, tal como alegado pelo apelante, uma vez que a
prova oral não contribuiria para a solução da lide e apenas prolongaria o tempo de espera até pronunciamento judicial
definitivo.
Não se pode olvidar que o NCPC traz como diretriz ao julgador:
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
I - (...) omissis...;
II - velar pela duração razoável do processo; ( g.n)>

Embora não se descuide do direito fundamental da parte ao devido processo legal, do qual desdobra o direito à
produção probatória, tal direito não é absoluto, encontrando limites de exercício no próprio ordenamento jurídico que
faculta ao juiz, enquanto destinatário das provas, a possibilidade de prolatar de sentença quando não houver
necessidade de outras provas, bem como indeferir aquelas que considerar impertinentes ou protelatórias.
Em casos semelhantes, a jurisprudência deste Tribunal:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL -


CERCEAMENTO DE DEFESA - PROVA ORAL DESNECESSÁRIA - PRELIMINAR REJEITADA - ENTREGA DO
IMÓVEL - CONDICIONAMENTO À ASSINATURA DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO - PRAZO DE
TOLERÂNCIA FIXADO EXPRESSAMENTE NO CONTRATO (180 DIAS) - LEGALIDADE.
- Tendo o magistrado elementos suficientes para a solução do litígio, autorizada a dispensa de produção de quaisquer
outras provas, podendo julgar antecipadamente a lide, sem que isso configure cerceamento de defesa.
- É válida a cláusula que prevê, no contrato de promessa de compra e venda, a fixação da data de entrega das
chaves a partir da assinatura do contrato de financiamento entre a construtora e a instituição financeira, em razão do
programa "Minha Casa Minha Vida", acrescida da tolerância de 120 dias corridos. (TJMG - Apelação Cível
1.0433.12.007160-3/001, Relator(a): Des.(a) Valdez Leite Machado , 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em
13/07/0017, publicação da súmula em 21/07/2017)

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RESCISÃO DE PERMUTA DE IMÓVEIS - CERCEAMENTO DE DEFESA -


INOCORRÊNCIA - INADIMPLEMENTO DA RÉ COMPROVADO - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - FIXAÇÃO
DO 'QUANTUM' - RAZOABILIDADE.
- Não há que se falar em cerceamento de defesa, quando a prova oral não contribuirá para o convencimento do Juiz,
e ainda retardará a prestação jurisdicional sem necessidade, em patente afronta ao princípio da celeridade
processual.
- Restando evidenciado o descumprimento contratual por parte da permutante requerida, que injustificadamente não
entregou na data aprazada as unidade imobiliárias, esta deve arcar com os ônus do seu inadimplemento.
- Embora o descumprimento contratual não seja apto a configurar indenização por dano extrapatrominial, o
cancelamento da entrega de unidades imobiliárias, injustificadamente, ocasiona séria e fundada angústia no espírito
dos permutantes autores, não se tratando de mero dissabor, ensejando assim, o ressarcimento do dano moral.
- Na fixação da reparação por dano moral, incumbe ao julgador, ponderando as condições do ofensor, do ofendido, do
bem jurídico lesado e aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, arbitrar o valor da indenização que se
preste à suficiente recomposição dos prejuízos, sem importar enriquecimento sem causa da parte. (TJMG -
Apelação Cível 1.0000.18.088553-5/001, Relator(a): Des.(a) Valdez Leite Machado , 14ª CÂMARA CÍVEL,
julgamento em 29/11/2018, publicação da súmula em 29/11/2018)

Assim, sem demonstração por parte do apelante do efetivo prejuízo para a instrução e para sua defesa, não se há
de falar em cerceamento.
Ante o exposto, rejeito a preliminar.
Não há outras questões preliminares ou prejudiciais ao mérito.
Inexistem quaisquer nulidades ou outros vícios suscitáveis ex officio.

DO MÉRITO
Cuida-se de ação indenizatória movida por particular, adquirente de uma sala comercial na planta em face das
pessoas jurídicas responsáveis pela venda e construção do imóvel.
Formulou diversos pedidos conforme relatado, os quais, para melhor inteligibilidade do julgado, serão apreciados
em tópicos apartados.

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I - DO ALEGADO ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL E DA VALIDADE DA CLÁSULA DE TOLERÂNCIA


Narra o autor, ora apelante, ter recebido o imóvel tão somente em março de 2015, ainda inacabado. Aduz que o
prazo contratual havia se esgotado um ano antes, em março de 2014.
Em atenta análise ao instrumento de contrato assinado pelas partes (fl. 23/origem), é possível constatar a
expressa previsão de entrega do imóvel em março de 2014, conforme contido no quadro resumo que antecede a
primeira cláusula contratual.
A cláusula 9.2, por sua vez, estipulou prazo de tolerância de 180 dias para a entrega do imóvel, ipsis litteris:

9.2. O prazo de obras poderá ser antecipado ou prorrogado pela promitente vendedora até o máximo de 180 (cento e
oitenta) dias, por conta de fatores naturais o desenvolvimento da construção civil.

Nessa esteira, o prazo final para entrega se encerrou em setembro de 2014.


O réu controverteu a afirmação autoral de que o imóvel somente teria sido entregue em março de 2015, juntando
"Termo de recebimento do Imóvel" subscrito pelo apelante datado de 23.10.2014.
No referido documento juntado às fls. 128/130 (origem), o autor exarou assinatura e declarou ter recebido as
chaves do imóvel e que as instalações estão de acordo com as condições estabelecidas em contrato, com exceção
dos pisos e pinturas referentes à copa. Fez contar ainda que não foram realizados testes do sistema elétrico ou
hidráulico.
Há prova, portanto, de entrega do imóvel em 23 de outubro de 2014, não tendo o autor alegado falsidade do
documento ou vício volitivo na assinatura ali exarada.
Assim, considerando o prazo final, com tolerância, para entrega do imóvel o mês de setembro/2014 é
incontroverso o atraso na entrega em pelo menos pelo período de um (01) mês.
Não merece prosperar a argumentação da parte autora no tocante a alegada abusividade da referida cláusula de
tolerância de 180 dias para a entrega.
Em primeiro lugar percebe-se que a cláusula consignou que as circunstâncias de caso fortuito ou força maior
justificariam a prorrogação do prazo para além dos 180 dias.
Os réus demonstraram a ocorrência de contratempos, tais como os decorrentes das chuvas documentados às fls.
131 a 144 (origem), instruindo o feito com o boletim de ocorrência policial que registrou as perdas e danos na
construção.
Ademais, sobre o tema, a jurisprudência pátria assentou o entendimento de que a cláusula de tolerância não é
desarrazoada quando fixa prazo de até 180 dias de prorrogação do prazo final.
É o que decidiu o STJ, conforme Informativo nº 612 de 2017:

No contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção ("imóvel na planta"), além do período previsto
para o término do empreendimento, há, comumente, uma cláusula prevendo a possibilidade de prorrogação
excepcional do prazo de entrega da unidade ou de conclusão da obra por um prazo que varia entre 90 e 180 dias.
Isso é chamado de "cláusula de tolerância". Não é abusiva a cláusula de tolerância nos contratos de promessa de
compra e venda de imóvel em construção, desde que o prazo máximo de prorrogação seja de até 180 dias. STJ. 3ª
Turma. REsp 1.582.318-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/9/2017 (Info 612).

Na mesma esteira, veja-se a jurisprudência do egrégio TJMG verbis:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL COM INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS -
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA - CLÁUSULA DE PRORROGAÇÃO - POSSIBILIDADE - ATRASO NA
ENTREGA DO IMÓVEL - CASO FORTUITO/FORÇA MAIOR - INOCORRÊNCIA - CLÁUSULA PENAL MORATÓRIA -
APLICAÇÃO REVERSA - CABIMENTO - RESP Nº. 1.614.721/DF - DANOS EMERGENTES (ALUGUEIS) - NÃO
CUMULÁVEIS - RESP Nº 1.635.428/SC - DANOS MORAIS - NÃO CONFIGURAÇÃO - JUROS DE OBRA -
PREVISÃO CONTRATUAL - RESTITUIÇÃO DEVIDA.
- Não é abusiva cláusula que prevê, no contrato de promessa de compra e venda, a fixação da data de entrega das
chaves a partir da assinatura do contrato de financiamento imobiliário junto à instituição financeira, somada à
tolerância de 180 dias. (...) TJMG - Apelação Cível 1.0024.14.050109-9/001, Relator(a): Des.(a) Sérgio André da
Fonseca Xavier , 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 08/10/2019, publicação da súmula em 11/10/2019)_
destacamos.

Não bastasse, a cláusula de tolerância foi validamente convencionada entre as partes, em especial considerando
os riscos e circunstância inerentes à construção civil que podem justificar eventual diferimento da entrega, não
havendo razões para afastar o princípio da "pact sunt servanda". Nesse sentido, este Tribunal assim já se manifestou:

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EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - DECISÃO PARCIAL DE MÉRITO - AÇÃO REVISÃO CONTRATUAL C/C
INDENIZAÇÃO - PRAZO DE ENTREGA CONDICIONADO À ASSINATURA DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO -
ILEGALIDADE - TOLERÂNCIA 180 DIAS - LEGALIDADE - ATRASO CONFIGURADO. Não há ilegalidade ou
abusividade a vinculação do prazo da entrega do imóvel à celebração do contrato de financiamento. No entanto,
condicionar a assinatura do financiamento à conclusão da obra, com averbação do "habite-se", denota abusividade. O
prazo de tolerância de 180 dias para a entrega do imóvel não pode ser considerado nulo, porque foi assim
convencionado pelas partes e porque podem haver "fortuitos internos inerentes à atividade empresarial", que o
justificam. Restando comprovado o atraso na entrega da obra, deve a construtora arcar com aluguéis
comprovadamente despendidos pelo comprador no período em que ele ficou impedido de usufruir do bem. (TJMG -
Agravo de Instrumento-Cv 1.0024.13.380215-7/001, Relator(a): Des.(a) Alberto Henrique , 13ª CÂMARA CÍVEL,
julgamento em 12/09/0019, publicação da súmula em 12/09/2019)

Inexiste obrigação legal ou previsão contratual que obrigue a parte apelada a comunicar previamente ao
promitente comprador que o prazo de tolerância precisará ser utilizado.
Desse modo, o prazo contratual para o término da obra e entrega do imóvel se findou em março/2014, o qual
restou prorrogado por mais 180 (cento e oitenta) dias, ou seja, até setembro/2014, por força da referida cláusula de
tolerância, que é perfeitamente válida, em razão da autonomia privada, não havendo qualquer ilegalidade ou
abusividade mesmo à luz do art. 51 da Lei nº 8.078, de 1990, aplicável ao caso em voga.
Com relação à data a ser considerada como de entrega vê-se, como dito, que a prova documental juntada pelas
requeridas é induvidosa quanto à entrega das chaves à parte autora em 23.10.2014, com registro tão somente de
necessidade reparo nos pisos e pintura da copa, o que não possui o condão de descaracterizar a entrega do imóvel.
O laudo de vistoria juntado pelo autor com a inicial foi elaborado em março/2015 e não constatou dano estrutural
ou falha capaz de ilidir a entrega ocorrida em outubro/2014, tendo sido registrado na conclusão:
"(...) pode-se concluir que a estrutura da edificação não está comprometida, porém seus vícios construtivos precisam
ser tratados para não impactar na conservação e estabilidade do edifício. Os casos mais significativos são os de
armação exposta em algumas peças estruturais e infiltrações constantes na estrutura conforme descrito nos itens 5.1
e 5.2 (...) as demais situações são menos importantes e também são passíveis de soluções descritas caso a caso no
item 5(...). (fl. 58/origem).

A alegada autoral existência de vícios no acabamento da construção tão somente comprova que o obra havia sido
finalizada, posto que o acabamento perfaz a última etapa do processo de edificação.
A existência dos vícios no imóvel narrados pela parte autora - e que seriam objeto da prova oral pleiteada e
corretamente indeferida - geram tão somente a obrigação da construtora em proceder aos respectivos reparos, mas
não ilide a data em que ocorreu a entrega das chaves, devendo ser considerada aquela constante no termo de
recebimento assinado pelo autor.
Não olvidamos que, conforme certidão de matrícula (fl. 119/origem), o "habite-se" somente foi averbado na
matrícula do imóvel em maio de 2015. Contudo, o referido documento, conforme fl.155/origem, foi emitido pelo
município em outubro de 2014, mesmo mês de entrega das chaves, o que comprova a conclusão das obras.
"Ad argumentandum", ainda que o habite-se tivesse sido expedido meses após a entrega do imóvel, é a partir do
recebimento das chaves que o contratante pode usufruir e gozar do bem adquirido, não havendo que se falar em
prolongamento da mora da construtora até a expedição do habite-se pelo Município.
Nessa esteira, a jurisprudência deste Tribunal:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO - PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - CUMULAÇÃO


DE INDENIZAÇÃO COM MULTA MORATÓRIA - BIS IN IDEM - NÃO OCORRÊNCIA - ATRASO NA ENTREGA -
DANO MORAL - PARTICULARIDADES - DEMORA EXCESSIVA - DEVER DE INDENIZAR RECONHECIDO -
TERMO FINAL DA MULTA. Verificado atraso desarrazoado na entrega de unidade imobiliária, o consumidor faz jus à
reparação dos danos morais/materiais/lucros eventualmente cessantes sofridos, não havendo que se falar em bis in
idem em face da multa prevista em cláusula penal moratória, cuja finalidade típica não é compensatória, mas
preventiva e repressiva da mora do promitente-vendedor. Fugindo à regra de que o mero descumprimento contratual
não enseja danos morais indenizáveis, a conduta da construtora/incorporadora que retarda a entrega de obra por
período muito superior ao prazo de tolerância previsto contratualmente viola direito da personalidade do consumidor,
expondo sua incolumidade moral a impactos lesivos que vão muito além do plano dos meros aborrecimentos
cotidianos, pelo que é devida indenização proporcional aos danos extrapatrimoniais suportados. Considera-se como
termo final de incidência da cláusula penal a data da entrega das chaves, não a data de expedição do habite-se.
(TJMG - Apelação Cível 1.0145.14.060781-6/001, Relator(a): Des.(a) José Augusto Lourenço dos Santos , 12ª

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CÂMARA CÍVEL, julgamento em 25/04/2018, publicação da súmula em 30/04/2018)_destacamos.

Por fim, o termo de recebimento provisório de fl. 59/origem, datado de 03.03.2015, refere-se à área comum do
edifício e não às unidades autônomas.
Conforme o referido documento, a entrega definitiva ocorreria após os reparos cuja necessidade foi identificada
nas vistorias oficiais (rejunte, acabamento, rodapés, defeito na pintura_fl.51/58origem) , o que mais uma vez
demonstra que a obra, de fato, havia sido concluída, que o habite-se tinha sido concedido pela municipalidade e que
faltava apenas reparos e ajustes que não impediam o gozo e fruição do imóvel.
Desse modo, por tudo o que foi exposto, reconhece-se o atraso de apenas 01 (um) mês na entrega do imóvel.

II - DO PEDIDO DE APLICAÇÃO DE MULTA PELO ATRASO DA ENTREGA


Alega o apelante haver no contrato cláusula penal com previsão de multa por atraso na entrega do imóvel "no
valor de 0,5% do que seria o aluguel de uma sala comercial, sendo um engano a fundamentação judicial [da
sentença] de que o contrato não previa multa contratual". Aduz ainda que caso não houvesse previsão de multa,
poderia o Poder Judiciário arbitrá-la.
Compulsando atentamente o conteúdo do contrato, verifica-se não existir efetivamente cláusula com a previsão
mencionada pelo apelante no recurso.
Há, contudo, previsão de multa de mora de 2% e juros de mora de 1% em face do consumidor no caso de atraso
do pagamento de qualquer das parcelas, conforme cláusula 3.4, vejamos:

3.4 Em caso de atraso no pagamento de qualquer das parcelas do preço, o promitente comprador ficará sujeito, de
pleno direito e independentemente de notificação ou interpelação, a partir do vencimento, a multa de 2% (dois por
cento) e juros de mora de 1%
(um por cento) ao mês, incidentes sobre o valor em atraso, a ser reajustado com base no índice contratual até a data
do efetivo pagamento.

Como cediço, o objetivo das cláusulas penais é assegurar que ao menos parte dos prejuízos sejam recompostos,
caso uma das partes não cumpra o contrato.
Existem dois tipos de cláusula penal: a compensatória, em razão do descumprimento total ou parcial de
obrigações previstas em leis ou contrato; e a moratória, para o caso de atraso no adimplemento de determinada
obrigação.
O Superior Tribunal de Justiça assentou o entendimento de que a previsão de multa compensatória exclui o dever
de indenização por perdas e danos, uma vez que referida cláusula penal se presta exatamente à recomposição dos
prejuízos suportados pela parte em razão do inadimplemento da outra (REsp 1.335.617).
No caso concreto, o apelante pretende a inversão ou arbitramento de multa em face da construtora, ao argumento
de que, uma vez reconhecido o atraso na entrega do imóvel, deve haver incidência de multa moratória.
Vê-se, portanto, que pleiteia a inversão da multa moratória, prevista expressamente no contrato somente em face
do consumidor.
No caso, não há dúvidas acerca do atraso de 01 (um) mês na entrega do imóvel adquirido pelo apelante, fato este
já discutido neste voto.
Assim, quanto à multa prevista em caso de mora do consumidor, deve ser aplicada a mesma regra, por equidade,
quando verificada mora do fornecedor.
Nos contratos de consumo, deve ser garantida a reciprocidade de direitos entre fornecedores e consumidores,
sendo nulas as disposições contratuais que coloquem a parte hipossuficiente em flagrante desvantagem, sejam
incompatíveis com a boa-fé ou com a equidade (art. 51 do CDC).
O entendimento do STJ encontra-se firmado no sentido de que a multa moratória inserta em contratos bilaterais,
onerosos e comutativos deve voltar-se aos contratantes indistintamente, ainda que redigida apenas em favor de uma
das partes:

DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE PROMESSA DE


COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESCISÃO POR CULPA DA CONSTRUTORA (VENDEDOR). DEFEITOS DE
CONSTRUÇÃO. ARBITRAMENTO DE ALUGUÉIS EM RAZÃO DO USO DO IMÓVEL. POSSIBILIDADE.
PAGAMENTO, A TÍTULO DE SUCUMBÊNCIA, DE LAUDO CONFECCIONADO EXTRAJUDICIALMENTE PELA
PARTE VENCEDORA. DESCABIMENTO. EXEGESE DOS ARTS. 19 E 20 DO CPC. INVERSÃO DE CLÁUSULA
CONTRATUAL QUE PREVIA MULTA EXCLUSIVAMENTE EM BENEFÍCIO DO FORNECEDOR, PARA A HIPÓTESE
DE MORA OU INADIMPLEMENTO DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. (...) 2. Seja por princípios gerais do direito,
seja pela principiologia adotada no Código de Defesa do Consumidor, seja, ainda, por comezinho imperativo de
equidade, mostra-se abusiva a prática de se estipular penalidade exclusivamente ao consumidor, para a

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hipótese de mora ou inadimplemento contratual, ficando isento de tal reprimenda o fornecedor - em situações de
análogo descumprimento da avença. Assim, prevendo o contrato a incidência de multa moratória para o caso de
descumprimento contratual por parte do consumidor, a mesma multa deverá incidir, em reprimenda do fornecedor,
caso seja deste a mora ou o inadimplemento. Assim, mantém-se a condenação do fornecedor - construtor de imóveis
- em restituir integralmente as parcelas pagas pelo consumidor, acrescidas de multa de 2% (art. 52, § 1º, CDC),
abatidos os aluguéis devidos, em vista de ter sido aquele, o fornecedor, quem deu causa à rescisão do contrato de
compra e venda de imóvel. (...) (REsp 955134/SC, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, j.
16/08/2012, DJe 29/08/2012).

RECURSOS ESPECIAIS. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS NA PLANTA. ENTREGA DA OBRA.


ATRASO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROPRIETÁRIO PERMUTANTE. LEGITIMIDADE. CLÁUSULA PENAL.
RECIPROCIDADE. LUCROS CESSANTES. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. EXCEÇÃO DE CONTRATO NÃO
CUMPRIDO. PROVA. ÔNUS. RÉU. EXCESSO DE CHUVAS. ESCASSEZ DE MÃO DE OBRA. CASO FORTUITO.
FORÇA MAIOR. NÃO CONFIGURAÇÃO. LUCROS CESSANTES. TERMO FINAL. REEXAME DE PROVAS.
INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. DANOS MORAIS. 1. Os recursos especiais
têm origem em ação de indenização por perdas e danos decorrentes de atraso na conclusão de obra objeto de
contrato de compromisso de compra e venda para fins de aquisição de unidades imobiliárias em empreendimento
comercial. 2. O proprietário permutante do terreno não responde pelos atos de incorporação quando se limita à mera
alienação do terreno para a incorporadora sem participar de nenhum ato tendente à comercialização ou construção do
empreendimento. 3. Na espécie, as instâncias de cognição plena, à luz da prova dos autos, e analisando os contratos
celebrados entre as partes, concluíram que a alienante permutante do terreno figurou nos contratos de promessa de
compra e venda ora na condição de "vendedora" ora na condição de credora hipotecária, transmitindo para o
adquirente/consumidor a ideia de solidariedade na efetivação do empreendimento, de forma que não pode ser
reconhecida a sua ilegitimidade passiva. 4. A cláusula penal inserta em contratos bilaterais, onerosos e comutativos
deve voltar-se aos contratantes indistintamente, ainda que redigida apenas em favor de uma das partes. 5. É possível
cumular a cláusula penal decorrente da mora com indenização por lucros cessantes pela não fruição do imóvel, pois
aquela tem natureza moratória, enquanto esta tem natureza compensatória. 6. A alegação de exceção de contrato
não cumprido arguida em defesa deve ser comprovada pelo réu, pois é seu o ônus de demonstrar o fato impeditivo,
modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos no artigo 333, inciso II, do CPC/1973. 7. Essa Corte já se
pronunciou em inúmeras oportunidades no sentido de que a inversão das conclusões da Corte local para afirmar, por
exemplo, que o excesso de chuvas e a escassez de mão de obra configuram fatos extraordinários e imprevisíveis,
enquadrando-se como hipóteses de caso fortuito ou força maior, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório
dos autos. 8. A conclusão da Corte local para fixar a data da expedição da carta de habite-se como termo final do
pagamento dos lucros cessantes resultou da análise das circunstâncias fáticas, bem como da interpretação de
cláusulas contratuais. 9. O simples inadimplemento contratual não é capaz, por si só, de gerar dano moral
indenizável, devendo haver consequências fáticas que repercutam na esfera de dignidade da vítima, o que não se
constatou no caso concreto. 10. Recursos especiais parcialmente conhecidos e não providos. (REsp 1536354/DF,
Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/06/2016, DJe 20/06/2016).

No mesmo sentido, já decidiu este Egrégio Tribunal de Justiça:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA - DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL - CONTRATO DE


PROMESSA DE COMPRA E VENDA - CONTRATO DE ADESÃO - CLÁUSULA DE COMPROMISSO ARBITRAL -
INEXISTÊNCIA DE ALEGAÇÃO EM CONTESTAÇÃO - RENÚNCIA AO JUÍZO ARBITRAL - COMPETÊNCIA
JUSTIÇA ESTADUAL - SENTENÇA CASSADA - ART. 1,013, §3º, INCISO I - ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL -
OCORRÊNCIA - MULTA MORATÓRIA - INVERSÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL - POSSIBILIDADE - LUCROS
CESSANTES - PRESUNÇÃO - PRECEDENTES DO STJ - DANOS MORAIS - COMPROVADOS. Nos moldes do
artigo 337, §5º e §6º do Código de Processo Civil, "A ausência de alegação da existência de convenção de
arbitragem, na forma prevista neste Capítulo, implica aceitação da jurisdição estatal e renúncia ao juízo arbitral". O
Superior Tribunal de Justiça definiu, no julgamento do Recurso Especial 1.631.485/DF, sob a sistemática dos recursos
repetitivos, que é possível a inversão da cláusula penal contratualmente prevista apenas para a hipótese de
inadimplemento do adquirente. De acordo com a jurisprudência dominante do STJ, é cabível a condenação da
construtora em indenização por lucros cessantes pelo retardo na entrega de imóvel, objeto de contrato de compra e
venda, independente de sua comprovação, tendo em vista que tal demora impossibilita o adquirente de fruir do bem.
(TJMG - Apelação Cível 1.0024.14.041675-1/001, Relator(a): Des.(a) Mônica Libânio , 11ª CÂMARA CÍVEL,
julgamento em 11/12/2019, publicação da súmula em 13/12/2019)

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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

O colendo Superior Tribunal de Justiça definiu recentemente, no julgamento do Recurso Especial 1.631.485/DF,
sob a sistemática dos recursos repetitivos, que é possível a inversão da cláusula penal contratualmente prevista
apenas para a hipótese de inadimplemento do adquirente. Confira-se:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA.


ATRASO NA ENTREGA. NOVEL LEI N. 13.786/2018. CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES
ANTERIORMENTE À SUA VIGÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. CONTRATO DE ADESÃO. OMISSÃO DE MULTA EM
BENEFÍCIO DO ADERENTE. INADIMPLEMENTO DA INCORPORADORA. ARBITRAMENTO JUDICIAL DA
INDENIZAÇÃO, TOMANDO-SE COMO PARÂMETRO OBJETIVO A MULTA ESTIPULADA EM PROVEITO DE
APENAS UMA DAS PARTES, PARA MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL. 1. A tese a ser firmada, para
efeito do art. 1.036 do CPC/2015, é a seguinte: No contrato de adesão firmado entre o comprador e a
construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá
ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas
(obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial. 2. No caso concreto, recurso
especial parcialmente provido. (REsp 1631485/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO,
julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019) - destaquei.

Destarte, no caso em apreço, a mesma multa prevista no contrato (cláusula 3.4 retro citada) para o caso de mora
do consumidor deve ser aplicada à construtora inadimplente, no percentual de 2% (dois por cento), sobre o valor
desembolsado pelo adquirente.
Registre-se que o pedido autoral foi de aplicação de multa não inferior a 1%, assim, sob o viés do princípio da
congruência, é adequada a aplicação da multa no patamar contratual de 2%.

III - DO PEDIDO DE APLICAÇÃO DE MULTA NO PERCENTUAL MÍNIMO DE 15%,


O apelante pleiteou ainda aplicação de multa no valor mínimo de 15% a ser arbitrada pelo juízo em razão da
quebra de contrato decorrente da "documentação do empreendimento, do saldo devedor, entrega fora do prazo,
qualidade da obra e demais cláusulas descumpridas".
Vê-se que nesse tópico do pedido, a parte autora pretende seja arbitrada multa de natureza compensatória, em
razão do alegado inadimplemento de diversas cláusulas contratuais por parte das requeridas.
Sem razão.
Não há previsão contratual de multa compensatória, seja em face do adquirente, seja em face dos vendedores.
Desse modo, inviável a fixação, pelo juízo, da pretendida multa, pois não lhe é dado substituir as partes, fora das
hipóteses legais, sob pena de violação do princípio "pacta sunt servanda".
Poderia o Judiciário apenas revisar ou fazer observar as cláusulas contratuais previamente ajustadas entre as
partes, em caso de abusividade ou descumprimento, e mediante provocação, não merecendo modificação a
sentença, nesse tocante.
Na verdade, a pretensão do apelante se reveste na possibilidade de ver arbitrada em seu favor, uma multa a título
de compensação pelas perdas e danos sofridos com o negócio. Entretanto, a dita multa compensatória também
possui natureza de penalidade e não de simples compensação como pretende fazer parecer, de modo de que a
possibilidade de sua fixação deveria estar prevista no contrato firmado entre as partes, o que não aconteceu.
Frise-se, a avença trazida não previu qualquer hipótese de multa pelo descumprimento das obrigações contratuais
para fins de compensação por eventuais prejuízos decorrentes, não cabendo ao Estado-juiz o seu arbitramento.
Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte de Justiça:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS
E MORAIS - CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA - ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL - PERDA
DE OBJETO - INOCORRÊNCIA - CULPA DA CONSTRUTORA - RETENÇÃO DE VALORES - DESCABIMENTO -
DANOS MATERIAIS - PRESENÇA - MULTA - AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL - DESEQUILÍBRIO NA
RELAÇÃO CONTRATUAL - DANO MORAL CONFIGURADO - INDENIZAÇÃO
EMENTA: PRIMEIRO RECURSO - APELAÇÃO CÍVEL (...) PROMESSA DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE
IMÓVEL - DEVOLUÇÃO DA INTEGRALIDADE DO VALOR PAGO PELO PROMITENTE COMPRADOR -
POSSIBILIDADE - PRECEDENTES DO STJ. IMPOSIÇÃO DE MULTA COMPENSATÓRIA - AUSÊNCIA DE
PREVISÃO CONTRATUAL - IMPOSSIBILIDADE. DANOS MORAIS - CONFIGURAÇÃO. - Na esteira do
entendimento do STJ, havendo rescisão do contrato em razão de seu descumprimento por parte da Construtora,
impõe-se a ela, a restituição integral dos valores pagos pelo comprador, na sua integralidade, sem a retenção de
qualquer quantia, sendo abusiva a cláusula contratual que determina a restituição dos valores devidos somente ao
término da obra ou de forma parcelada. - Incabível a fixação de multa compensatória em favor do promitente
vendedor, quando inexistente qualquer previsão contratual sobre tal possibilidade. - Impõe-se

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o pagamento de indenização por danos morais a fim de se minimizar a lesão imaterial sofrida pelo adquirente do
imóvel, não pelo simples inadimplemento contratual por parte do vendedor, mas por ter frustrado a expectativa de
adquirirem seu imóvel residencial. (...) (TJMG - Apelação Cível 1.0024.14.136447-1/001, Relator(a): Des.(a) Adriano
de Mesquita Carneiro , 11ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 20/11/0019, publicação da súmula em
27/11/2019)_destacamos.

Deve ser mantida, portanto, a sentença objurgada neste tocante.

IV - DO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO PELA IMPOSSIBILIDADE DE OBTENÇÃO DO FINANCIAMENTO


IMOBILIÁRIO
Afirma ainda o apelante ter suportado prejuízos decorrentes da impossibilidade de obtenção de financiamento
imobiliário, uma vez que incidia sobre o imóvel hipoteca constituída pelas rés.
Em atenta análise do contrato, vê-se que a principal e mais substancial parcela do preço, no valor R$60.472,10,
deveria ser paga pelo adquirente em 10.09.2014.
Todavia, no momento da contratação, o promissário-comprador declarou que pagaria os valores mediante
"recursos próprios", tal como constou do quadro resumo da avença.
De fato, o contrato, na cláusula 6.1, previu que nos casos de pagamentos mediante financiamento bancário, o
comprador deveria obtê-lo junto à Caixa Econômica Federal, no prazo de 60 dias da averbação do habite-se e
completa: "cabendo à promitente vendedora, exclusivamente, apresentar os documentos relativos ao imóvel e à sua
regularidade jurídico-fiscal". Vejamos:

"6.1 O saldo devedor especificado no quadro resumo para pagamento mediante financiamento bancário pelo
promitente comprador deverá ser por ele contratado junto à Caixa Econômica Federal no prazo de 60 (SESSENTA)
dias contados da data de averbação do "habite-se" da construção e registro da instituição do condomínio do edifício,
cumprindo ao promitente comprador o atendimento a todas as exigências do agente financeiro, bem como as
despesas decorrentes do financiamento e documentos, cabendo à promitente vendedora, exclusivamente, apresentar
os documentos relativos ao imóvel e à sua regularidade jurídico-fiscal."_destacamos.

Os documentos que instruem o feito, em especial a simulação de financiamento imobiliário juntado com a exordial,
indicam que o apelante, posteriormente, buscou a obtenção dos recursos para pagamento da referida prestação
mediante mútuo com garantia imobiliária, não mais com recursos próprios conforme constou no contrato.
Por certo não foi possível o financiamento habitacional, pois conforme certidão de matrícula do imóvel (fl.
179/origem) havia uma hipoteca gravada pelas rés em favor da Caixa Econômica Federal (R-4-146.196), desde
19.12.2012, sobre a sala 505, adquirida pelo autor.
Várias outras salas do empreendimento, todavia, não foram hipotecadas pelas rés.
O contrato de promessa de compra e venda entre o autor e as rés foi celebrado um dia antes, em 18.12.2012.
Assim, é razoável supor que diante da previsão de pagamento mediante recursos próprios, as requeridas tenham
destinado a referida unidade imobiliária do autor para servir de garantia na operação de empréstimo que obtiveram
perante a Caixa Econômica Federal para a construção do empreendimento.
Desse modo, com fincas no princípio da confiança, bem como no dever de informação, anexo ao princípio da boa-
fé objetiva, caberia ao autor/apelante, no mínimo, notificar às requeridas de sua pretensão em obter financiamento
imobiliário dando como garantia o imóvel objeto da promessa de compra, uma vez que tal intenção importou
modificação da declaração constante do contrato de que arcaria com os pagamentos mediante recursos próprios.
Assim, incabível a pretensão autoral de obter reparação pelos juros maiores do empréstimo pessoal que se viu
obrigado a contratar, pela impossibilidade de obtenção do financiamento imobiliário.
Vale frisar que ainda que o autor houvesse notificado as requeridas da pretensão de obter o financiamento
imobiliário, as apeladas não estariam obrigadas a aquiescer com o pedido do comprador, visto que já haviam
hipotecado a unidade, conforme demonstrado alhures.
Dessa feita, deve ser mantida a sentença de improcedência com relação ao referido pleito.

V - DO PEDIDO DE DEVOLUÇÃO EM DOBRO DA COMISSÃO DE CORRETAGEM


Sobre a comissão de corretagem, tem-se que não é vedada a transferência do ônus de arcar com os honorários
do corretor ao comprador, desde que expressamente previsto no contrato, conforme julgado do STJ REsp. 1.599.511-
SP, pela sistemática do art. 1.045, do CPC:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA.
VENDA DE UNIDADES AUTÔNOMAS EM ESTANDE DE VENDAS. CORRETAGEM. CLÁUSULA DE
TRANSFERÊNCIA DA OBRIGAÇÃO AO CONSUMIDOR. VALIDADE. PREÇO TOTAL. DEVER DE INFORMAÇÃO.
SERVIÇO DE ASSESSORIA

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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

TÉCNICO-IMOBILIÁRIA (SATI). ABUSIVIDADE DA COBRANÇA. I - TESE PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO


CPC/2015: 1.1. Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a
comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de
incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o
destaque do valor da comissão de corretagem. (...)(Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, por
unanimidade, DJE 06.09.2016).

No presente caso, todavia, o autor, ora apelante não se desincumbiu do ônus probatório lhe imposto pelo art. 373,
I do CPC, não tendo comprovado a cobrança e muito menos o pagamento de valores a título de comissão de
corretagem, pelo que deve ser mantida a sentença de improcedência neste ponto.

VI - DO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS


Por fim, no que tange ao pleito de condenação em dever de indenizar danos morais, também merece ser
rechaçado e mantida a sentença primeva.
Somente haveria direito à sua compensação se comprovada a humilhação, dor ou sofrimento desarrazoados e
que refogem aos aborrecimentos cotidianos numa sociedade de consumo.
No caso, o atraso na entrega da obra foi de apenas um mês, tratando-se ainda de imóvel com destinação não
residencial.
Evidente, portanto, que não se trata de dano "in re ipsa", uma vez que o atraso não possui "per si" aptidão para
gerar abalo à imagem, ânimo psíquico, na moral ou na honra do autor, a quem cabe o ônus da prova do dano.
A lesão aos direitos da personalidade, tal como vida, liberdade, intimidade, privacidade, honra, imagem,
identificação pessoal, integridade física e psíquica, enfim, à própria dignidade da pessoa humana, não dispensa o
dever de demonstração de acordo com o caso concreto.
Nesse sentido decidiu o TJMG em caso semelhante:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA - ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL - LUCROS CESSANTES
E MULTA - IMPOSSIBILIDADE CUMULAÇÃO - DANOS MORAIS - ATRASO ÍNFIMO - MEROS
ABORRECIMENTOS. É descabida a pretensão de recebimento concomitante de multa moratória com indenização
por perdas e danos (alugueis e taxas condominiais pagas no período de inadimplência pelo promitente vendedor),
consoante entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça. O atraso ínfimo na finalização do
empreendimento configura mero descumprimento contratual, seguido de dissabores, razão pela qual não enseja o
dever de indenizar. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.14.146207-7/001, Relator(a): Des.(a) Jaqueline Calábria
Albuquerque , 10ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 04/02/2020, publicação da súmula em 14/02/2020)

Assim, caberia ao autor, nos termos do inciso I do art. 373 do CPC, a prova de que o atraso ínfimo gerou outros
problemas ou dificuldades que macularam seus direitos da personalidade.
Ausente a prova do dano, resta afastado requisito "sine qua non" para a caracterização da responsabilidade civil,
devendo ser rechaçada a pretensão recursal no tocante à condenação em compensação de danos morais.

CONCLUSÃO
Posto isso, REJEITO A PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA E, NO MÉRITO, DOU PARCIAL
PROVIMENTO AO RECURSO para condenar as apeladas ao pagamento da multa de mora de 2% (dois por cento)
sobre o preço do negócio, em razão do atraso na entrega do imóvel.
Reconheço a sucumbência mínima das rés ante o conjunto dos pedidos autorais.
Assim, custas, honorários e demais despesas recursais pelo apelante.
Nos termos do art. 85, §§1º, 2º e 11 do CPC/2015, os honorários advocatícios de sucumbência devem ser
majorados para 12% (doze por cento) sobre o valor da condenação.

DES. FERNANDO CALDEIRA BRANT - De acordo com o(a) Relator(a).


DES. VICENTE DE OLIVEIRA SILVA - De acordo com o(a) Relator(a).

SÚMULA: "REJEITARAM A PREMILINAR E DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO"

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