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Processo: 1.0702.15.049217-2/001
Relator: Des.(a) Lílian Maciel
Relator do Acordão: Des.(a) Lílian Maciel
Data do Julgamento: 15/04/2020
Data da Publicação: 17/04/2020
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 20ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na
conformidade da ata dos julgamentos, em REJEITAR A PRELIMINAR E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO
RECURSO.
VOTO
Trata-se de recurso de apelação aviado por ANDRÉ CUNHA FARIA em face da sentença prolatada pelo juízo da
5ª Vara Cível da Comarca de Uberlândia, (fls. 253/258_origem), que julgou improcedentes os pedidos formulados
contra a SPE CONDOMÍNIO TEMPO UDI LTDA e ELGLOBAL CONSTRUTORA LTDA.
Narra a parte autora, ora apelante, na inicial ter celebrado com as rés promessa de compra e venda de uma sala
comercial em construção, com previsão de entrega para março de 2014. Alega que o imóvel somente foi entregue em
março de 2015, sem conclusão, com vários defeitos e sem documentação necessária.
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Aduz ainda ter suportado prejuízos por não ter conseguido obter financiamento imobiliário, uma vez que o réu não
forneceu os documentos do imóvel. Assim, afirma ter sido forçado a contratar empréstimo pessoal ao invés de
financiamento imobiliário para quitar o restando do imóvel quando da entrega.
Formulou os seguintes pedidos: a) declaração de nulidade da cláusula contratual de tolerância de 180 dias para a
entrega ou sua redução para 30 dias; b) aplicação de multa não inferior a 1% ao mês, ou não inferior a R$1.500,00 ao
mês, pelo atraso na entrega do imóvel; c) condenação no pagamento da multa contratual, no percentual mínimo de
15%, a ser arbitrada pelo juízo em razão da quebra de contrato em razão da documentação do empreendimento,
saldo devedor, entrega fora do prazo, qualidade da obra; d) indenização por danos morais; e) indenização pelo
prejuízo decorrente de ter sido contratado empréstimo pessoal, em razão da impossibilidade de obter financiamento
imobiliário em razão da inexistência da documentação do empreendimento e f) devolução em dobro da comissão de
corretagem.
Na contestação (fls. 79/89_origem), os requeridos alegaram, em síntese, não haver previsão contratual de que
parte do preço do negócio seria pago mediante financiamento imobiliário. Afirmam ter sido providenciada toda a
documentação do empreendimento e que vários adquirentes obtiveram o financiamento imobiliário. Quanto à entrega,
afirmam que ocorreu ao autor em 23.10.2014, quando foram entregues as chaves e que faltavam apenas pequenos
detalhes na construção que foram concluídos em seguida. Assim, pugna pela improcedência de todos os pedidos
iniciais.
Intimadas as partes para especificarem provas, o autor requereu a inversão do ônus, bem como a oitiva de
testemunhas e depoimento pessoal dos réus. Os requeridos, por sua vez, também requereram a produção de prova
oral.
O juiz consignou na sentença que "após detida análise dos autos, formo convencimento no sentido de ser cabível
o julgamento do presente feito no estado em que se encontra" e julgou improcedentes os pedidos autorais.
Nas razões de apelação, o recorrente afirma ter havido cerceamento de defesa, uma vez que não foi produzida a
prova oral pleiteada. No mérito, afirma ter restado incontroverso o atraso de pelo menos um mês na entrega do
imóvel.
Argumenta haver sim previsão contratual de multa equivalente a 0,5% do preço por mês de atraso e que o prazo
de tolerância deve ser comunicado ao adquirente, sob pena de ilegalidade de sua utilização. Reitera que não basta
haver o habite-se para ser possível a utilização do empreendimento; aduz que o uso do edifício só foi possível meses
após, conforme pretendia provar na instrução.
Sobre a impossibilidade de obter o financiamento imobiliário, afirma ter produzido prova de que os réus não deram
baixa na hipoteca que havia sobre o bem, impedindo o financiamento. Assim, pleiteia seja cassada a sentença para
determinar a produção das provas ou que seja reformada e julgados procedentes os pedidos iniciais.
Recolheu o preparo prévio (fls. 273/274_origem).
Contrarrazões dos réus pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
O recurso deve ser conhecido, presentes os pressupostos de admissibilidade e processamento que lhe são
próprios.
DO CERCEAMENTO DE DEFESA
Sustenta o apelante ter havido cerceamento de defesa em razão da não realização de audiência para colheita da
prova oral requerida.
Sem razão.
Compulsando os autos, verifica-se que o magistrado "a quo" intimou as partes para especificarem provas (fl.
201/origem), tendo o autor requereu a produção de prova testemunhal e depoimento pessoal (fl. 205/origem). As rés
pugnaram pelo depoimento pessoal do autor e oitiva de testemunhas.
Às fls. 208/origem, foi deferida a inversão do ônus da prova. As rés procederam à juntada dos documentos de fls.
211/247.
Em seguida, o magistrado concluiu que o feito encontrava-se apto para julgamento e proferiu sentença de
improcedência.
O julgamento antecipado do mérito poderá ocorrer, nos termos do art. 355 do Código de Processo Civil (CPC),
quando não houver necessidade de produção de outras provas.
Segundo o recorrente, os fatos cuja prova pretendia produzir por meio da oitiva das testemunhas eram: ausência
de prévia comunicação pelas rés de que usariam o prazo de tolerância do contrato; as condições do imóvel quando
entregue e a dificuldade em obter o financiamento imobiliário em razão das pendências que recaiam sobre o bem.
Todavia, a prova documental coligida aos autos é robusta o suficientes para elucidar satisfatoriamente os pontos
debatidos, em especial sobre as condições do imóvel e os impedimentos para obtenção do financiamento imobiliário,
conforme fundamentação que se seguirá.
A questão atinente à necessidade de prévia comunicação do promitente comprador para utilização do
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prazo de tolerância contratual é resolvida no plano do direito, sendo despicienda a prova pretendida.
Nesse cenário, não se verifica qualquer cerceamento de defesa, tal como alegado pelo apelante, uma vez que a
prova oral não contribuiria para a solução da lide e apenas prolongaria o tempo de espera até pronunciamento judicial
definitivo.
Não se pode olvidar que o NCPC traz como diretriz ao julgador:
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
I - (...) omissis...;
II - velar pela duração razoável do processo; ( g.n)>
Embora não se descuide do direito fundamental da parte ao devido processo legal, do qual desdobra o direito à
produção probatória, tal direito não é absoluto, encontrando limites de exercício no próprio ordenamento jurídico que
faculta ao juiz, enquanto destinatário das provas, a possibilidade de prolatar de sentença quando não houver
necessidade de outras provas, bem como indeferir aquelas que considerar impertinentes ou protelatórias.
Em casos semelhantes, a jurisprudência deste Tribunal:
Assim, sem demonstração por parte do apelante do efetivo prejuízo para a instrução e para sua defesa, não se há
de falar em cerceamento.
Ante o exposto, rejeito a preliminar.
Não há outras questões preliminares ou prejudiciais ao mérito.
Inexistem quaisquer nulidades ou outros vícios suscitáveis ex officio.
DO MÉRITO
Cuida-se de ação indenizatória movida por particular, adquirente de uma sala comercial na planta em face das
pessoas jurídicas responsáveis pela venda e construção do imóvel.
Formulou diversos pedidos conforme relatado, os quais, para melhor inteligibilidade do julgado, serão apreciados
em tópicos apartados.
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9.2. O prazo de obras poderá ser antecipado ou prorrogado pela promitente vendedora até o máximo de 180 (cento e
oitenta) dias, por conta de fatores naturais o desenvolvimento da construção civil.
No contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção ("imóvel na planta"), além do período previsto
para o término do empreendimento, há, comumente, uma cláusula prevendo a possibilidade de prorrogação
excepcional do prazo de entrega da unidade ou de conclusão da obra por um prazo que varia entre 90 e 180 dias.
Isso é chamado de "cláusula de tolerância". Não é abusiva a cláusula de tolerância nos contratos de promessa de
compra e venda de imóvel em construção, desde que o prazo máximo de prorrogação seja de até 180 dias. STJ. 3ª
Turma. REsp 1.582.318-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/9/2017 (Info 612).
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL COM INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS -
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA - CLÁUSULA DE PRORROGAÇÃO - POSSIBILIDADE - ATRASO NA
ENTREGA DO IMÓVEL - CASO FORTUITO/FORÇA MAIOR - INOCORRÊNCIA - CLÁUSULA PENAL MORATÓRIA -
APLICAÇÃO REVERSA - CABIMENTO - RESP Nº. 1.614.721/DF - DANOS EMERGENTES (ALUGUEIS) - NÃO
CUMULÁVEIS - RESP Nº 1.635.428/SC - DANOS MORAIS - NÃO CONFIGURAÇÃO - JUROS DE OBRA -
PREVISÃO CONTRATUAL - RESTITUIÇÃO DEVIDA.
- Não é abusiva cláusula que prevê, no contrato de promessa de compra e venda, a fixação da data de entrega das
chaves a partir da assinatura do contrato de financiamento imobiliário junto à instituição financeira, somada à
tolerância de 180 dias. (...) TJMG - Apelação Cível 1.0024.14.050109-9/001, Relator(a): Des.(a) Sérgio André da
Fonseca Xavier , 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 08/10/2019, publicação da súmula em 11/10/2019)_
destacamos.
Não bastasse, a cláusula de tolerância foi validamente convencionada entre as partes, em especial considerando
os riscos e circunstância inerentes à construção civil que podem justificar eventual diferimento da entrega, não
havendo razões para afastar o princípio da "pact sunt servanda". Nesse sentido, este Tribunal assim já se manifestou:
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EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - DECISÃO PARCIAL DE MÉRITO - AÇÃO REVISÃO CONTRATUAL C/C
INDENIZAÇÃO - PRAZO DE ENTREGA CONDICIONADO À ASSINATURA DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO -
ILEGALIDADE - TOLERÂNCIA 180 DIAS - LEGALIDADE - ATRASO CONFIGURADO. Não há ilegalidade ou
abusividade a vinculação do prazo da entrega do imóvel à celebração do contrato de financiamento. No entanto,
condicionar a assinatura do financiamento à conclusão da obra, com averbação do "habite-se", denota abusividade. O
prazo de tolerância de 180 dias para a entrega do imóvel não pode ser considerado nulo, porque foi assim
convencionado pelas partes e porque podem haver "fortuitos internos inerentes à atividade empresarial", que o
justificam. Restando comprovado o atraso na entrega da obra, deve a construtora arcar com aluguéis
comprovadamente despendidos pelo comprador no período em que ele ficou impedido de usufruir do bem. (TJMG -
Agravo de Instrumento-Cv 1.0024.13.380215-7/001, Relator(a): Des.(a) Alberto Henrique , 13ª CÂMARA CÍVEL,
julgamento em 12/09/0019, publicação da súmula em 12/09/2019)
Inexiste obrigação legal ou previsão contratual que obrigue a parte apelada a comunicar previamente ao
promitente comprador que o prazo de tolerância precisará ser utilizado.
Desse modo, o prazo contratual para o término da obra e entrega do imóvel se findou em março/2014, o qual
restou prorrogado por mais 180 (cento e oitenta) dias, ou seja, até setembro/2014, por força da referida cláusula de
tolerância, que é perfeitamente válida, em razão da autonomia privada, não havendo qualquer ilegalidade ou
abusividade mesmo à luz do art. 51 da Lei nº 8.078, de 1990, aplicável ao caso em voga.
Com relação à data a ser considerada como de entrega vê-se, como dito, que a prova documental juntada pelas
requeridas é induvidosa quanto à entrega das chaves à parte autora em 23.10.2014, com registro tão somente de
necessidade reparo nos pisos e pintura da copa, o que não possui o condão de descaracterizar a entrega do imóvel.
O laudo de vistoria juntado pelo autor com a inicial foi elaborado em março/2015 e não constatou dano estrutural
ou falha capaz de ilidir a entrega ocorrida em outubro/2014, tendo sido registrado na conclusão:
"(...) pode-se concluir que a estrutura da edificação não está comprometida, porém seus vícios construtivos precisam
ser tratados para não impactar na conservação e estabilidade do edifício. Os casos mais significativos são os de
armação exposta em algumas peças estruturais e infiltrações constantes na estrutura conforme descrito nos itens 5.1
e 5.2 (...) as demais situações são menos importantes e também são passíveis de soluções descritas caso a caso no
item 5(...). (fl. 58/origem).
A alegada autoral existência de vícios no acabamento da construção tão somente comprova que o obra havia sido
finalizada, posto que o acabamento perfaz a última etapa do processo de edificação.
A existência dos vícios no imóvel narrados pela parte autora - e que seriam objeto da prova oral pleiteada e
corretamente indeferida - geram tão somente a obrigação da construtora em proceder aos respectivos reparos, mas
não ilide a data em que ocorreu a entrega das chaves, devendo ser considerada aquela constante no termo de
recebimento assinado pelo autor.
Não olvidamos que, conforme certidão de matrícula (fl. 119/origem), o "habite-se" somente foi averbado na
matrícula do imóvel em maio de 2015. Contudo, o referido documento, conforme fl.155/origem, foi emitido pelo
município em outubro de 2014, mesmo mês de entrega das chaves, o que comprova a conclusão das obras.
"Ad argumentandum", ainda que o habite-se tivesse sido expedido meses após a entrega do imóvel, é a partir do
recebimento das chaves que o contratante pode usufruir e gozar do bem adquirido, não havendo que se falar em
prolongamento da mora da construtora até a expedição do habite-se pelo Município.
Nessa esteira, a jurisprudência deste Tribunal:
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Por fim, o termo de recebimento provisório de fl. 59/origem, datado de 03.03.2015, refere-se à área comum do
edifício e não às unidades autônomas.
Conforme o referido documento, a entrega definitiva ocorreria após os reparos cuja necessidade foi identificada
nas vistorias oficiais (rejunte, acabamento, rodapés, defeito na pintura_fl.51/58origem) , o que mais uma vez
demonstra que a obra, de fato, havia sido concluída, que o habite-se tinha sido concedido pela municipalidade e que
faltava apenas reparos e ajustes que não impediam o gozo e fruição do imóvel.
Desse modo, por tudo o que foi exposto, reconhece-se o atraso de apenas 01 (um) mês na entrega do imóvel.
3.4 Em caso de atraso no pagamento de qualquer das parcelas do preço, o promitente comprador ficará sujeito, de
pleno direito e independentemente de notificação ou interpelação, a partir do vencimento, a multa de 2% (dois por
cento) e juros de mora de 1%
(um por cento) ao mês, incidentes sobre o valor em atraso, a ser reajustado com base no índice contratual até a data
do efetivo pagamento.
Como cediço, o objetivo das cláusulas penais é assegurar que ao menos parte dos prejuízos sejam recompostos,
caso uma das partes não cumpra o contrato.
Existem dois tipos de cláusula penal: a compensatória, em razão do descumprimento total ou parcial de
obrigações previstas em leis ou contrato; e a moratória, para o caso de atraso no adimplemento de determinada
obrigação.
O Superior Tribunal de Justiça assentou o entendimento de que a previsão de multa compensatória exclui o dever
de indenização por perdas e danos, uma vez que referida cláusula penal se presta exatamente à recomposição dos
prejuízos suportados pela parte em razão do inadimplemento da outra (REsp 1.335.617).
No caso concreto, o apelante pretende a inversão ou arbitramento de multa em face da construtora, ao argumento
de que, uma vez reconhecido o atraso na entrega do imóvel, deve haver incidência de multa moratória.
Vê-se, portanto, que pleiteia a inversão da multa moratória, prevista expressamente no contrato somente em face
do consumidor.
No caso, não há dúvidas acerca do atraso de 01 (um) mês na entrega do imóvel adquirido pelo apelante, fato este
já discutido neste voto.
Assim, quanto à multa prevista em caso de mora do consumidor, deve ser aplicada a mesma regra, por equidade,
quando verificada mora do fornecedor.
Nos contratos de consumo, deve ser garantida a reciprocidade de direitos entre fornecedores e consumidores,
sendo nulas as disposições contratuais que coloquem a parte hipossuficiente em flagrante desvantagem, sejam
incompatíveis com a boa-fé ou com a equidade (art. 51 do CDC).
O entendimento do STJ encontra-se firmado no sentido de que a multa moratória inserta em contratos bilaterais,
onerosos e comutativos deve voltar-se aos contratantes indistintamente, ainda que redigida apenas em favor de uma
das partes:
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hipótese de mora ou inadimplemento contratual, ficando isento de tal reprimenda o fornecedor - em situações de
análogo descumprimento da avença. Assim, prevendo o contrato a incidência de multa moratória para o caso de
descumprimento contratual por parte do consumidor, a mesma multa deverá incidir, em reprimenda do fornecedor,
caso seja deste a mora ou o inadimplemento. Assim, mantém-se a condenação do fornecedor - construtor de imóveis
- em restituir integralmente as parcelas pagas pelo consumidor, acrescidas de multa de 2% (art. 52, § 1º, CDC),
abatidos os aluguéis devidos, em vista de ter sido aquele, o fornecedor, quem deu causa à rescisão do contrato de
compra e venda de imóvel. (...) (REsp 955134/SC, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, j.
16/08/2012, DJe 29/08/2012).
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O colendo Superior Tribunal de Justiça definiu recentemente, no julgamento do Recurso Especial 1.631.485/DF,
sob a sistemática dos recursos repetitivos, que é possível a inversão da cláusula penal contratualmente prevista
apenas para a hipótese de inadimplemento do adquirente. Confira-se:
Destarte, no caso em apreço, a mesma multa prevista no contrato (cláusula 3.4 retro citada) para o caso de mora
do consumidor deve ser aplicada à construtora inadimplente, no percentual de 2% (dois por cento), sobre o valor
desembolsado pelo adquirente.
Registre-se que o pedido autoral foi de aplicação de multa não inferior a 1%, assim, sob o viés do princípio da
congruência, é adequada a aplicação da multa no patamar contratual de 2%.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS
E MORAIS - CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA - ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL - PERDA
DE OBJETO - INOCORRÊNCIA - CULPA DA CONSTRUTORA - RETENÇÃO DE VALORES - DESCABIMENTO -
DANOS MATERIAIS - PRESENÇA - MULTA - AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL - DESEQUILÍBRIO NA
RELAÇÃO CONTRATUAL - DANO MORAL CONFIGURADO - INDENIZAÇÃO
EMENTA: PRIMEIRO RECURSO - APELAÇÃO CÍVEL (...) PROMESSA DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE
IMÓVEL - DEVOLUÇÃO DA INTEGRALIDADE DO VALOR PAGO PELO PROMITENTE COMPRADOR -
POSSIBILIDADE - PRECEDENTES DO STJ. IMPOSIÇÃO DE MULTA COMPENSATÓRIA - AUSÊNCIA DE
PREVISÃO CONTRATUAL - IMPOSSIBILIDADE. DANOS MORAIS - CONFIGURAÇÃO. - Na esteira do
entendimento do STJ, havendo rescisão do contrato em razão de seu descumprimento por parte da Construtora,
impõe-se a ela, a restituição integral dos valores pagos pelo comprador, na sua integralidade, sem a retenção de
qualquer quantia, sendo abusiva a cláusula contratual que determina a restituição dos valores devidos somente ao
término da obra ou de forma parcelada. - Incabível a fixação de multa compensatória em favor do promitente
vendedor, quando inexistente qualquer previsão contratual sobre tal possibilidade. - Impõe-se
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o pagamento de indenização por danos morais a fim de se minimizar a lesão imaterial sofrida pelo adquirente do
imóvel, não pelo simples inadimplemento contratual por parte do vendedor, mas por ter frustrado a expectativa de
adquirirem seu imóvel residencial. (...) (TJMG - Apelação Cível 1.0024.14.136447-1/001, Relator(a): Des.(a) Adriano
de Mesquita Carneiro , 11ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 20/11/0019, publicação da súmula em
27/11/2019)_destacamos.
"6.1 O saldo devedor especificado no quadro resumo para pagamento mediante financiamento bancário pelo
promitente comprador deverá ser por ele contratado junto à Caixa Econômica Federal no prazo de 60 (SESSENTA)
dias contados da data de averbação do "habite-se" da construção e registro da instituição do condomínio do edifício,
cumprindo ao promitente comprador o atendimento a todas as exigências do agente financeiro, bem como as
despesas decorrentes do financiamento e documentos, cabendo à promitente vendedora, exclusivamente, apresentar
os documentos relativos ao imóvel e à sua regularidade jurídico-fiscal."_destacamos.
Os documentos que instruem o feito, em especial a simulação de financiamento imobiliário juntado com a exordial,
indicam que o apelante, posteriormente, buscou a obtenção dos recursos para pagamento da referida prestação
mediante mútuo com garantia imobiliária, não mais com recursos próprios conforme constou no contrato.
Por certo não foi possível o financiamento habitacional, pois conforme certidão de matrícula do imóvel (fl.
179/origem) havia uma hipoteca gravada pelas rés em favor da Caixa Econômica Federal (R-4-146.196), desde
19.12.2012, sobre a sala 505, adquirida pelo autor.
Várias outras salas do empreendimento, todavia, não foram hipotecadas pelas rés.
O contrato de promessa de compra e venda entre o autor e as rés foi celebrado um dia antes, em 18.12.2012.
Assim, é razoável supor que diante da previsão de pagamento mediante recursos próprios, as requeridas tenham
destinado a referida unidade imobiliária do autor para servir de garantia na operação de empréstimo que obtiveram
perante a Caixa Econômica Federal para a construção do empreendimento.
Desse modo, com fincas no princípio da confiança, bem como no dever de informação, anexo ao princípio da boa-
fé objetiva, caberia ao autor/apelante, no mínimo, notificar às requeridas de sua pretensão em obter financiamento
imobiliário dando como garantia o imóvel objeto da promessa de compra, uma vez que tal intenção importou
modificação da declaração constante do contrato de que arcaria com os pagamentos mediante recursos próprios.
Assim, incabível a pretensão autoral de obter reparação pelos juros maiores do empréstimo pessoal que se viu
obrigado a contratar, pela impossibilidade de obtenção do financiamento imobiliário.
Vale frisar que ainda que o autor houvesse notificado as requeridas da pretensão de obter o financiamento
imobiliário, as apeladas não estariam obrigadas a aquiescer com o pedido do comprador, visto que já haviam
hipotecado a unidade, conforme demonstrado alhures.
Dessa feita, deve ser mantida a sentença de improcedência com relação ao referido pleito.
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No presente caso, todavia, o autor, ora apelante não se desincumbiu do ônus probatório lhe imposto pelo art. 373,
I do CPC, não tendo comprovado a cobrança e muito menos o pagamento de valores a título de comissão de
corretagem, pelo que deve ser mantida a sentença de improcedência neste ponto.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA - ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL - LUCROS CESSANTES
E MULTA - IMPOSSIBILIDADE CUMULAÇÃO - DANOS MORAIS - ATRASO ÍNFIMO - MEROS
ABORRECIMENTOS. É descabida a pretensão de recebimento concomitante de multa moratória com indenização
por perdas e danos (alugueis e taxas condominiais pagas no período de inadimplência pelo promitente vendedor),
consoante entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça. O atraso ínfimo na finalização do
empreendimento configura mero descumprimento contratual, seguido de dissabores, razão pela qual não enseja o
dever de indenizar. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.14.146207-7/001, Relator(a): Des.(a) Jaqueline Calábria
Albuquerque , 10ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 04/02/2020, publicação da súmula em 14/02/2020)
Assim, caberia ao autor, nos termos do inciso I do art. 373 do CPC, a prova de que o atraso ínfimo gerou outros
problemas ou dificuldades que macularam seus direitos da personalidade.
Ausente a prova do dano, resta afastado requisito "sine qua non" para a caracterização da responsabilidade civil,
devendo ser rechaçada a pretensão recursal no tocante à condenação em compensação de danos morais.
CONCLUSÃO
Posto isso, REJEITO A PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA E, NO MÉRITO, DOU PARCIAL
PROVIMENTO AO RECURSO para condenar as apeladas ao pagamento da multa de mora de 2% (dois por cento)
sobre o preço do negócio, em razão do atraso na entrega do imóvel.
Reconheço a sucumbência mínima das rés ante o conjunto dos pedidos autorais.
Assim, custas, honorários e demais despesas recursais pelo apelante.
Nos termos do art. 85, §§1º, 2º e 11 do CPC/2015, os honorários advocatícios de sucumbência devem ser
majorados para 12% (doze por cento) sobre o valor da condenação.
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