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DIREITO CONSTITUCIONAL: A

ORGANIZAÇÃO DO ESTADO E DOS


PODERES
Prof.ª Ma. Yolanda Mª de Menezes Pedroso Speranza
Prof. Guilherme Bernardes Filho
Diretor Presidente
Prof. Aderbal Alfredo Calderari Bernardes
Diretor Tesoureiro
Prof. Frederico Ribeiro Simões
Reitor

UNISEPE – EaD

Prof. Me. Alexander Lopes Neves

Coordenador EaD de área

Prof. Dr. Renato de Araújo Cruz

Coordenador Núcleo de Ensino a distância (NEAD)

Material Didático – EaD

Equipe editorial:
Fernanda Pereira de Castro - CRB-8/10395
Isis Gabriel Alves
Laura Lemmi Di Natale
Pedro Ken-Iti Torres Omuro
Prof. Dr. Renato de Araújo Cruz – Editor Responsável

Apoio técnico:
Alexandre Meanda Neves
Anderson Francisco de Oliveira
Douglas Panta dos Santos Galdino
Fabiano de Oliveira Albers
Gustavo Batista Bardusco
Kelvin Komatsu de Andrade
Matheus Eduardo Souza Pedroso
Vinícius Capela de Souza

Revisão: Débora de Freitas Dias, Flávia Cristina Carrara, Ana Beatriz Torres Omuro

Diagramação: Nikolas Fellipe de Morais, Felipe Motta Miguel, Máira Ribeiro Fernandes,
SOBRE A AUTORA:

Yolanda Maria de Menezes Pedroso Speranza

Bacharela em Direito, especialista em Direito Processual Civil e do Trabalho e Mestra


em Direito Internacional pela Universidade Católica de Santos (UniSantos).
Pesquisadora no grupo de pesquisa “Direitos Humanos e Vulnerabilidades”, coordenado
pela Prof. Dra. Liliana Lyra Jubilut. Docente Unisepe. Conciliadora e mediadora judicial
capacitada pelo NUPEMEC-TJ/SP (2013). Mediadora certificada pelo Instituto de
Certificação e Formação de Mediadores Lusófonos (ICFML). Advogada.

SOBRE A DISCIPLINA:

Em “Direito Constitucional: a organização dos Estados e dos Poderes” abordaremos o


modo como a República Federativa do Brasil é organizada. Por ser um Estado
Federado, veremos as características de seus entes federados e como as competências
são divididas entre eles. Ainda sobre a temática da organização estatal, estudaremos a
tripartição dos poderes em Legislativo, Executivo e Judiciário e as atribuições que
competem a cada um deles. Dando seguimento à matéria, passaremos para análise da
arrecadação, do modo como o sistema tributário nacional é organizado, a fim de
identificar o que é de competência de cada ente federado e as limitações constitucionais
ao poder de tributar. Também veremos a organização das finanças públicas, seus
princípios e as características das leis orçamentárias, além da estrutura da ordem
econômica e financeira, seus princípios e fundamentos e a atuação estatal. A defesa do
Estado e das instituições democráticas será estudada através da análise dos meios
utilizados para tal, como é o caso do estado de defesa e do estado de sítio. Por fim,
veremos o que a Constituição Federal classifica como ordem social, que consiste na
seguridade social, na educação e em outros tantos temas considerados por ela de
necessária regulamentação.
Os ÍCONES são elementos gráficos utilizados para ampliar as formas de
linguagem e facilitar a organização e a leitura hipertextual.
SUMÁRIO

UNIDADE I .............................................................................................05
1º A organização político-administrativa do estado......................05
2º A organização dos poderes......................................................20

UNIDADE II ...........................................................................................32
3º O Sistema Tributário Nacional e as Finanças Públicas...........32
4º Da Ordem Econômica e Financeira.........................................45

UNIDADE III ..........................................................................................54

5º ADefesa do Estado e das Instituições Democráticas.............54


6º Da Ordem Social......................................................................66
UNIDADE I
CAPÍTULO 1 - A ORGANIZAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA
DO ESTADO
Ao término deste capítulo, você deverá saber:
✓ A forma federativa do Estado e suas principais características;
✓ A organização político-administrativa do Estado: União, Estados, Municípios e Distrito
Federal;
✓ As principais características de cada ente federativo;
✓ As regras referentes à repartição de competências entre os entes federativos.

Introdução
Estudar a organização de um Estado significa compreender como se dá a sua estruturação e
funcionamento. A Unidade I da nossa disciplina tem esse como tema principal, que, seguindo a
sistematização da Constituição Federal, pode ser subdividido de duas formas: a chamada
organização político-administrativa, ligada à divisão territorial ou vertical dos poderes políticos, e
a organização dos poderes, relacionada à divisão funcional ou horizontal dos poderes políticos
(PADILHA, 2020, p. 524). Isso significa que, no âmbito político-administrativo, veremos como os
poderes políticos, ou seja, os poderes do Estado, dividem-se territorialmente entre cada ente
federativo e, no âmbito dos poderes em si, estudaremos como é a distribuição de funções a cada um
dos três poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário).

Neste capítulo, examinaremos a organização político-administrativa da República Federativa do


Brasil, que, segundo o artigo 18 da CF (Constituição Federal), compreende a União, os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos do texto constitucional. Essa
separação constitui um modo de repartição territorial dos poderes própria de uma Federação, que é
o motivo pelo qual as unidades autônomas são chamadas de entes federativos.

Para a exata compreensão do nosso tema de estudo, abordaremos o que seria uma Federação e as
características do Brasil enquanto República Federativa, a fim de, então, seguirmos para o estudo
de cada ente federativo. Porém, antes de tudo, é importante relembrarmos alguns conceitos de
Ciência Política e Teoria Geral do Estado.

Podemos iniciar a nossa retomada de conceitos a partir de uma breve noção do que seria o Estado:
“organização político-jurídica de uma sociedade para realizar o bem público, com governo próprio e
território determinado” (AZAMBUJA, 2006, p. 6), ou, em outras palavras, “o estado moderno é uma
sociedade à base territorial, dividida em governantes e governados, e que pretende, nos limites do
território que lhe é reconhecido, a supremacia sobre todas as demais instituições” (AZAMBUJA,
2006, p. 4). Da definição de Estado, pode-se já verificar os seus elementos essenciais: população,
território e governo, além da finalidade (bem comum), que muitos doutrinadores também relacionam
como elemento que compõem o Estado (LENZA, 2021).

Ademais, é importante relembrar de algumas classificações relevantes ao estudo da organização e


da estrutura estatal: as formas, os sistemas e os regimes de governo. Assim, são formas de governo
a república e a monarquia; são sistemas de governo o presidencialismo e o parlamentarismo; e são
regimes de governo as formas autocráticas (ditadura e totalitarismo) e a democracia (PAULO;

5
ALEXANDRINO, 2020, p. 296–304). A classificação relacionada à forma do Estado, que adentrará
na explicação do que é uma Federação, será tratada na primeira seção.

1.1 A Federação enquanto forma de Estado adotada pela Constituição Federal de 88


Conforme explicam Paulo e Alexandrino, quando falamos da forma de Estado, estamos nos referindo
“ao modo de exercício do poder político em função do território de um dado Estado” (2020, p. 296).
Isso significa, de forma resumida, que pode haver ou não uma divisão interna em regiões, de modo
que haja uma distribuição das funções estatais, que serão praticadas por cada uma delas com
determinado nível de autonomia ou descentralização. Pode ser que haja divisão, mas depende do
jeito que ela ocorre, depende do nível de autonomia e de responsabilidade que cada ente possui.
Assim, com relação à forma, os Estados podem ser classificados como unitários, federados ou
confederados (ver classificação dos Estados quanto à forma em tabela anexa ao final do capítulo).

Na Federação, forma adotada pelo Estado brasileiro, há uma descentralização política,


caracterizada pela divisão do poder entre vários entes federados dotados de autonomia. Dessa
forma, em uma Federação, não haverá uma concentração de poder em um ente central, mas sim
uma repartição constitucional de competências entre entidades federadas autônomas (PAULO;
ALEXANDRINO, 2020, p. 296). De acordo com Pedro Lenza (2021, e-book), podem-se relacionar
como características principais da Federação:

• Descentralização política: distribuição do poder político feita pela Constituição, que prevê
a autonomia dos entes federados (ou federativos). Cada ente que compõe a Federação
possui personalidade jurídica própria diversa daquela do Estado Soberano (PAULO;
ALEXANDRINO, 2020, p. 296) e não há hierarquia entre nenhum dos entes federados;
• Repartição de competência: a autonomia dos entes federados permite o equilíbrio de
toda a federação;
• Constituição rígida como base jurídica: essencial para garantir a distribuição de
competências entre os entes federados, garantindo a estabilidade institucional;
• Indissolubilidade do vínculo federativo (ou inexistência do direito de secessão – ver:
glossário) - o Estado Soberano só existe em razão da união entre os entes políticos, que
ocorreu em razão do pacto federativo. Como a manutenção da unidade é imprescindível para
a existência do Estado Soberano, não é reconhecido aos entes federados o chamado direito
de secessão (ver glossário ao final da unidade). Exemplo: no Brasil, a CF/88 prevê a
decretação de intervenção federal no Estado-membro que pretender se separar (art. 34, I), e,
inclusive, a forma federativa é cláusula pétrea (ver: glossário), não podendo ser abolida por
Emenda Constitucional (art. 60, § 4.º, I);
• Soberania do Estado Federal: a soberania do Estado Federado decorre da própria
reunião dos entes, em razão do pacto federativo. Exemplo: a CF/88 prevê que a soberania é
fundamento da República Federativa do Brasil (art.1º, I);
• Intervenção: consiste em instrumento a ser utilizado para assegurar o equilíbrio e a
manutenção da Federação;
• Auto-organização dos Estados-membros: possibilidade de os Estados-membros serem
organizados por Constituições Estaduais (art. 25, CF/88);
• Órgão representativo dos Estados-membros: possibilidade de cada Estado-membro ter
representação legislativa. Exemplo: No Brasil, os Estados-membros são representados no
Senado Federal (art. 46, CF/88);

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• Guardião da Constituição: a guarda da Constituição, no Brasil, é feita pelo Supremo
Tribunal Federal (STF) (art. 102, CF/88);
• Repartição de receitas: a divisão da arrecadação é repartida entre os entes federados,
de modo a assegurar o equilíbrio entre eles (arts. 157 a 159, CF/88).

Pesquise sobre a forma do Estado português, pois é importante que você conheça outros modos de
organização do Estado diferentes do nosso.

1.2 Organização político-administrativa da República Federativa do Brasil


Conforme já mencionado anteriormente, o Estado brasileiro adota a forma federativa, que é dividida
nos seguintes entes autônomos: União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 18, CF/88). É
importante ressaltar que os Territórios Federais não são entes federativos, os quais apenas integram
a União (art. 18, §2º, CF/88), e que, atualmente, não há mais nenhum deles.

1.2.1 União

Pode-se conceituar a União (ou União Federal) como a pessoa jurídica de direito público interno que
compõe a República Federativa do Brasil enquanto unidade federativa autônoma conjuntamente com
os outros entes federados.

A União possui dois papéis diferentes: internamente, fala por si enquanto ente federativo, ordem
central, que se forma pela reunião de partes; e internacionalmente, fala pela República Federativa
do Brasil. O seu papel perante os outros estados soberanos não a torna um sinônimo de Estado
Federal: o Estado Federal é a República Federativa, a pessoa jurídica de direito público internacional
em sua integralidade, sendo que a União está nele contido (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 340).
Os bens pertencentes à União estão enumerados no artigo 20, incisos I a XI da CF/88, os quais são
enumerados a seguir:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;

II - as terras devolutas (ver: glossário) indispensáveis à defesa das fronteiras, das


fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à
preservação ambiental, definidas em lei;

III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que
banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a
território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias
fluviais;

IV -as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias
marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que
contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público
e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II;

V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva;

VI - o mar territorial;

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VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;

VIII - os potenciais de energia hidráulica;

IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo;

X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos;

XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.

Nos atos de Direito Internacional, a União apenas terá a função de ser representante da República Federativa
do Brasil. Isso significa que, nas relações internacionais, não será a União que agirá, mas sim o Estado Federal
por intermédio dela. Sua atuação internacional é de mero representante, como representante da República
Federativa do Brasil perante outros Estados Soberanos, mas somente nessas situações de relações
internacionais, pois assim o é determinado pela Constituição (art. 21, I, CF/88).

Conforme indica o §1º, art. 20, CF/88, todos os entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios) têm asseguradas, nos termos da lei, a participação no resultado da exploração de
petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros
recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica
exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.

Intervenção da União nos Estados-membros ou no Distrito Federal - decretar a intervenção federal


compete à União (art. 21, V, CF). Apesar disso, em regra, ela não irá intervir nos Estados ou no Distrito Federal,
exceto nos casos enumerados no artigo 34, incisos I a VII da CF/88. Não deixe de consultar!

1.2.2 Estados-membros

Os Estados-membros são as pessoas jurídicas de direito público interno que compõem a Federação
como ente federado e são dotados de autonomia, o que lhes conferem a capacidade de auto-
organização, autogoverno, autoadministração e autolegislação:

• Auto-organização - art. 25, CF/88 – os Estados-membros organizam-se por Constituição e


lei próprias;
• Autogoverno - arts. 27, 28 e 125, CF/88 - regras para a estruturação dos poderes:
Assembleia legislativa (Legislativo), Governador do Estado (Executivo) e Tribunais e Juízes
(Judiciário) (LENZA, 2021);
• Autoadministração e autolegislação - arts. 18 e 25 a 28, CF/88 – a repartição de
competências é tratada no item 1.3 desta unidade.

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Com relação à formação dos Estados-membros, aos Estados é permitido incorporarem-se entre
si, subdividirem-se ou desmembrarem-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados
ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada, por meio de
plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar (art. 18, §3º, CF/88).

Os bens pertencentes aos Estados-membros constam no artigo 26, incisos I a IV da CF/88, os quais
estão enumerados a seguir:

I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito,


ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União;
II - as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio,
excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros;
III - as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União;
IV - as terras devolutas não compreendidas entre as da União.
Aos Estados é permitido explorar, diretamente ou mediante concessão, os serviços locais de gás
canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação (§2º,
art. 25, CF/88).

A fim de integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse


comum, lei complementar estadual poderá instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas
e microrregiões (§3º, art. 25, CF/88): região metropolitana é “a unidade regional instituída pelos
Estados, mediante lei complementar, constituída por agrupamento de Municípios limítrofes para
integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum” (VII,
art. 2º, Lei 13.089/15 – Estatuto da metrópole); aglomeração urbana é “unidade territorial urbana
constituída pelo agrupamento de 2 (dois) ou mais Municípios limítrofes, caracterizada por
complementaridade funcional e integração das dinâmicas geográficas, ambientais, políticas e
socioeconômicas” (I, art. 2º, Lei 13.089/15); e microrregiões são “grupos de Municípios que, apesar
de não possuírem continuidade urbana, apresentam certa homogeneidade e problemas
administrativos comuns” (PADILHA, 2020).

Intervenção dos Estados-membros em seus Municípios - em regra, um Estado-membro não irá intervir em
seus municípios, exceto nos casos enumerados no artigo 35, incisos I a IV da CF/88. Não deixe de consultar!

1.2.3 Municípios

Os municípios podem ser conceituados, assim como os outros entes federados, como pessoas
jurídicas de direito público dotados de autonomia, que lhes conferem a capacidade auto-
organização, autogoverno, autoadministração e autolegislação.

• auto-organização – art. 29, I a XIV, CF/88 – os municípios organizam-se por meio de Lei
Orgânica, que deve seguir o estabelecido nas Constituições Federal e Estadual;
• autogoverno - art. 29, incisos I a VI, CF/88 – Prefeito, vice-prefeito e vereadores. Não há
judiciário municipal;
• autoadministração e autolegislação – art. 30, CF/88 – a repartição de competências é
tratada no item 1.3 desta unidade.

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A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios ocorrerão por meio de lei
estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta
prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos
de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei (art. 18, § 4º, CF/88)

1.2.4 Distrito Federal

O Distrito Federal é pessoa jurídica de direito público dotado de autonomia, pois, como os outros
entes federados, possui capacidade de auto-organização, autogoverno, autoadministração e
autolegislação.

• auto-organização – art. 32, caput, CF/88 – se organizará por meio de Lei Orgânica;
• autogoverno - art. 32, §§2º e 3º, CF/88 – Governador, vice-governador e deputados
distritais;
• autoadministração e autolegislação – a repartição de competências é tratada no item 1.3
desta unidade.
Ainda existem características do DF que lhe são próprias: a impossibilidade de divisão do DF em
municípios, nos termos do art. 32, caput, CF/88, e autonomia parcialmente tutelada pela União
(SILVA apud LENZA, 2021), nos termos do arts. 32, §4º, 21, XIII, e 22, XVII, CF/88.

Toda vez que houver menção a artigos da CF/88 ou de outras leis, realize a leitura deles para que você consiga
se habituar com a estrutura da norma. Você verá que isso irá facilitar e muito quando precisar pesquisá-los
novamente para a prova! Você sabia que é possível consultar a Constituição Federal de forma online,
atualizada e totalmente gratuita? Acesse por meio do link:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

1.3 Repartição de competências entre os entes federativos na CF/88


Classicamente, as competências podem ser classificadas em administrativas, legislativas e
tributárias (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 356). As competências administrativas, materiais
ou não legislativas delimitarão a atuação político-administrativa (atividades administrativas,
políticas públicas, etc.) do ente federado (art. 21 e 23, CF/88); as competências legislativas
estabelecem quais matérias o ente federado têm poder para normatizar (arts. 22 e 24, CF/88); e a
competência tributária refere-se ao poder de instituir tributos concedidos aos entes federados como
forma de garantir-lhes a autonomia (Capítulo I, Título VI, CF/88).

Como a competência tributária será abordada na unidade II de nossa disciplina, veremos agora as
competências administrativas e legislativas, que são distribuídas pela CF/88 da seguinte forma:

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Competências EXCLUSIVAS - União - art.21; COMUNS - União /Estados/
administrativas Municípios: arts. 30, I, III ao IX, Distrito Federal/ Municípios - art.
art. 144, § 8.º e art. 149-A. 23
Competências PRIVATIVAS - União – art. 22 CONCORRENTES - União/
Legislativas Estados/ Distrito Federal - art. 24

O critério seguido pelo legislador constituinte para efetuar a repartição de competências entre os
entes federativos consiste no chamado princípio da predominância do interesse, pelo qual a
competência é outorgada de acordo com o interesse predominante quanto à matéria: há assuntos
cuja natureza depreende um tratamento uniforme em todo o país e há outros em que é desejável um
tratamento regional ou local (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 356). Dessa forma, para matérias
de interesse predominantemente geral, a competência será da União; para as de interesse
predominantemente regional, será dos estados; e para as de interesse predominantemente local,
será dos municípios. Ao Distrito Federal, será atribuída a chamada competência cumulativa: lhe
serão outorgadas as competências dos estados e dos municípios (art. 32, §1º, CF/88).

O doutrinador Rodrigo Padilha, em seu livro “Direito Constitucional”, publicado pela editora Método, apresenta
explicações detalhadas, mas ao mesmo tempo claras, sobre a repartição de competências entre os entes
federados. Caso haja interesse em se aprofundar nesse tema, sugiro ainda o livro “Direito Constitucional
Simplificado”, de Paulo Vicente e Marcelo Alexandrino, também publicado pela editora Método, que, apesar de
trazer em seu título a palavra “simplificado”, possui a profundidade necessária para o completo entendimento
da questão.

A competência exclusiva, que tem natureza administrativa, é aquela atribuída especialmente ao


ente federado, o qual deve exercê-la sem a participação de qualquer outro, pois não há a
possibilidade de delegação (PADILHA, 2020).
Competência exclusiva (Atenção: Indelegável)
Ex: Planejar e promover a defesa permanente contra as
calamidades públicas, especialmente as secas e as
União art. 21, I a XV, CF/88
inundações (XVIII); estabelecer princípios e diretrizes
para o sistema nacional de viação (XXI);
Ex.: Constituir guardas municipais destinadas à proteção
arts. 30, I, III ao IX;
de seus bens, serviços e instalações municipais e instituir
Municípios art. 144, § 8º; e
contribuição para o custeio de iluminação pública (art. 30,
art. 149-A, CF/88
IX, CF/88).

Já com relação à competência privativa, com natureza legislativa, é aquela atribuída a uma
entidade federativa, com a possibilidade de delegação (art. 22, parágrafo único, CF/88) para
determinadas matérias (PADILHA, 2020).

Competência privativa (Atenção: delegável)


Ex.: Nacionalidade, cidadania e naturalização (XII);
União art. 22, I a XXVI
registros públicos (XXII).

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Acerca da competência comum, que possui natureza administrativa, todos os entes federativos
possuem competência em determinadas matérias (PADILHA, 2020).

Competência comum
União Ex.: Cuidar da saúde e da assistência pública, da proteção e
Estado da garantia das pessoas
art. 23, I a XII, CF/88
Município portadoras de deficiência (II); preservar as florestas, a fauna
Distrito Federal e a flora (VII).

Por fim, a competência concorrente tem natureza legislativa e é aquela atribuída a diversos entes
federativos (PADILHA, 2020).

Competência concorrente
União Ex.: Direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e
Estado art. 24, I a XVI, CF/88 urbanístico (I); previdência social, proteção e defesa da
Distrito Federal saúde (XII).

Além delas, ainda há a competência residual dos Estados: a eles são reservadas as competências
que não lhes sejam vedadas pela CF/88 (art. 25, §1º).

Leia a ementa abaixo e reflita sobre a competência dos Estados-membros na atuação em casos de emergência
sanitária, como é o caso da pandemia de covid-19, ao qual o julgamento se refere:
EMENTA: REFERENDO EM MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DA
INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE.
EMERGÊNCIA SANITÁRIA INTERNACIONAL. LEI 13.979 DE 2020.
COMPETÊNCIA DOS ENTES FEDERADOS PARA LEGISLAR E ADOTAR
MEDIDAS SANITÁRIAS DE COMBATE À EPIDEMIA INTERNACIONAL.
HIERARQUIA DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. COMPETÊNCIA COMUM.
MEDIDA CAUTELAR PARCIALMENTE DEFERIDA. 1. A emergência internacional,
reconhecida pela Organização Mundial da Saúde, não implica nem muito menos
autoriza a outorga de discricionariedade sem controle ou sem contrapesos típicos do
Estado Democrático de Direito. As regras constitucionais não servem apenas para
proteger a liberdade individual, mas também o exercício da racionalidade coletiva,
isto é, da capacidade de coordenar as ações de forma eficiente. O Estado
Democrático de Direito implica o direito de examinar as razões governamentais e o
direito de criticá-las. Os agentes públicos agem melhor, mesmo durante
emergências, quando são obrigados a justificar suas ações. 2. O exercício da
competência constitucional para as ações na área da saúde deve seguir parâmetros
materiais específicos, a serem observados, por primeiro, pelas autoridades políticas.
Como esses agentes públicos devem sempre justificar suas ações, é à luz delas que
o controle a ser exercido pelos demais poderes tem lugar. 3. O pior erro na
formulação das políticas públicas é a omissão, sobretudo para as ações essenciais
exigidas pelo art. 23 da Constituição Federal. É grave que, sob o manto da
competência exclusiva ou privativa, premiem-se as inações do governo federal,
impedindo que Estados e Municípios, no âmbito de suas respectivas competências,
implementem as políticas públicas essenciais. O Estado garantidor dos direitos
fundamentais não é apenas a União, mas também os Estados e os Municípios. 4. A
diretriz constitucional da hierarquização, constante do caput do art. 198 não significou
hierarquização entre os entes federados, mas comando único, dentro de cada um

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deles. 5. É preciso ler as normas que integram a Lei 13.979, de 2020, como
decorrendo da competência própria da União para legislar sobre vigilância
epidemiológica, nos termos da Lei Geral do SUS, Lei 8.080, de 1990. O exercício da
competência da União em nenhum momento diminuiu a competência própria dos
demais entes da federação na realização de serviços da saúde, nem poderia, afinal,
a diretriz constitucional é a de municipalizar esses serviços. 6. O direito à saúde é
garantido por meio da obrigação dos Estados Partes de adotar medidas necessárias
para prevenir e tratar as doenças epidêmicas e os entes públicos devem aderir às
diretrizes da Organização Mundial da Saúde, não apenas por serem elas obrigatórias
nos termos do Artigo 22 da Constituição da Organização Mundial da Saúde (Decreto
26.042, de 17 de dezembro de 1948), mas sobretudo porque contam com a expertise
necessária para dar plena eficácia ao direito à saúde. 7. Como a finalidade da
atuação dos entes federativos é comum, a solução de conflitos sobre o exercício da
competência deve pautar-se pela melhor realização do direito à saúde, amparada em
evidências científicas e nas recomendações da Organização Mundial da Saúde. 8.
Medida cautelar parcialmente concedida para dar interpretação conforme à
Constituição ao § 9º do art. 3º da Lei 13.979, a fim de explicitar que, preservada a
atribuição de cada esfera de governo, nos termos do inciso I do artigo 198 da
Constituição, o Presidente da República poderá dispor, mediante decreto, sobre os
serviços públicos e atividades essenciais.
(ADI 6341 MC-Ref, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON
FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 15/04/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-
271 DIVULG 12-11-2020 PUBLIC 13-11-2020)

Considerações Finais
Estudamos, neste capítulo, a temática relativa à organização político-administrativa da República
Federativa do Brasil, que se divide em uma análise aprofundada das características de uma
Federação, forma adotada pela CF/88.

Redirecionando o foco para o direito interno, foram analisados aspectos relativos às características,
estrutura e competências de cada ente federativo que forma a federação brasileira.

Diante disso, passamos a verificar a repartição de competências entre a União, os Estados, os


Municípios e o Distrito Federal, que também atende à característica de distribuição de funções
própria da forma estatal adotada.

A CF/88 trata o Estado brasileiro como uma República que segue a forma Federativa: República porque o
povo elege seus representantes para um determinado período e segue a forma Federativa porque o Estado
organiza-se por meio de uma descentralização política, caracterizada pela divisão do poder entre os vários
entes autônomos que compõem a federação, o que é denominado de repartição constitucional de
competências.
Ainda sobre a forma federativa de Estado, podem-se relacionar como suas características principais:
descentralização política, repartição de competência, constituição rígida como base jurídica, indissolubilidade
do vínculo federativo (ou inexistência do direito de secessão), soberania do Estado Federal, intervenção, auto-
organização dos Estados-membros, órgão representativo dos Estados-membros, guardião da constituição e
repartição de receitas.

13
A organização político-administrativa do Estado brasileiro é repartida entre quatro entes: União, Estados,
Distrito Federal e Municípios (art. 18, CF/88). Todos esses quatros entes federativos são pessoas jurídicas
de direito público interno dotados de autonomia e, juntos, formam a República Federativa do Brasil.
A União (ou União Federal), internamente, fala por si enquanto ente federativo e, internacionalmente, fala pela
República Federativa do Brasil. O seu papel perante os outros Estados Soberanos não a torna um sinônimo
de Estado Federal: o Estado Federal é a República Federativa, a pessoa jurídica de direito público internacional
em sua integralidade, sendo que a União está nele contido (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 340).
A União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal são pessoas jurídicas de direito
público interno dotadas de autonomia, que lhes confere capacidade de auto-organização, autogoverno,
autoadministração e autolegislação.
Para a repartição de competências entre os entes federados, o legislador constituinte seguiu o princípio da
predominância do interesse, pelo qual a competência é outorgada de acordo com o interesse predominante
quanto à matéria: para matérias de interesse predominantemente geral, a competência será da União; para as
de interesse predominantemente regional, será dos estados; e para as de interesse predominantemente local,
será dos municípios. Ao Distrito Federal será atribuída a chamada competência cumulativa: lhe serão
outorgadas as competências dos estados e dos municípios (art. 32, §1º, CF/88).
Tal repartição de competências segue uma divisão clássica: competências administrativas, legislativas e
tributárias (esta última será estudada na unidade 2). As competências administrativas, que são aquelas
relacionadas à gestão política, envolvem competências exclusivas e comuns; e as competências
legislativas, relativas ao poder de normatizar, envolvem competências privativas e concorrentes.

• Competência exclusiva – natureza administrativa: atribuída especialmente ao ente federado, o


qual deve exercê-la sem a participação de qualquer outro, pois não há a possibilidade de delegação;
• Competência comum – natureza administrativa: todos os entes federativos possuem competência
em determinadas matérias;
• Competência privativa – natureza legislativa: é aquela atribuída a uma entidade federativa, com
a possibilidade de delegação para determinadas matérias;
• Competência concorrente – natureza legislativa: é aquela atribuída a diversos entes federativos.
Além delas, ainda há a competência residual dos Estados: a eles são reservadas as competências que não
lhes sejam vedadas pela CF/88.

(FGV - 2013 - OAB - Exame de Ordem Unificado - XII - Primeira Fase) A Constituição da República de 1988
adotou elementos de federalismo cooperativo e de federalismo dual na repartição de competências entre os
entes federados, distribuindo competências exclusivas, privativas, comuns e concorrentes. Assim sendo, a
respeito da organização do Estado estabelecida na Constituição, assinale a afirmativa correta.
a) É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios proteger o meio
ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, competindo à lei complementar fixar normas de
cooperação entre os entes.
b) É vedado aos Estados criar códigos tributários próprios, uma vez que compete privativamente à União
legislar sobre direito financeiro e tributário.
c) É vedado à União decretar intervenção federal em Município localizado em território federal quando este
não tiver aplicado o mínimo exigido de sua receita na manutenção e desenvolvimento do ensino.
d) Em relação às competências legislativas concorrentes da União e dos Estados, havendo norma federal e
estadual divergentes, deve prevalecer a norma federal, que serve de fundamento de validade à norma estadual.

Orientações para a resolução: a resposta correta é a de letra A, de acordo com o artigo 23, inciso VI da
CF/88: “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios proteger o meio
ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, competindo à lei complementar fixar normas de
cooperação entre os entes”.

14
As outras afirmações estão incorretas porque:
Letra b) O artigo 24, inciso I da CF/88, estabelece que é de competência concorrente à União, Estados e
Distrito Federal legislar sobre códigos tributários próprios;
Letra c) O artigo 35, inciso III da CF/88, prevê que a União pode intervir em Municípios localizados em território
federal;
Letra d) O artigo 24, §4º da CF/88, estabelece que, em relação às competências legislativas concorrentes da
União e dos Estados, havendo norma federal e estadual divergentes, a norma federal SUSPENDERÁ o que
na norma estadual lhe for contrária.

Questão Objetiva
(VUNESP - 2020 - Câmara de Boituva - SP - Agente Legislativo) Nos termos da Constituição Federal, compete
privativamente à União legislar sobre:
A) Propaganda comercial.
B) Juntas comerciais.
C) Custas dos serviços forenses.
D) Organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis.
E) Criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas.

Questão Discursiva
Qual a diferença entre competência exclusiva e competência privativa?

Questão Objetiva
GABARITO: A (art. 22, XXIX, CF)

Questão Discursiva
Sugestão de resposta: A competência exclusiva tem natureza administrativa, ou seja, não legislativa, e é
atribuída especialmente ao ente federado (a CF relaciona a União e os Municípios), o qual deve exercê-la sem
a participação de qualquer outro, pois não há a possibilidade de delegação. Já a competência privativa possui
natureza legislativa, é aquela atribuída a um ente federativo (só a União possui competência privativa), com a
possibilidade de delegação para outros entes sobre determinadas matérias.

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Pessoa jurídica: Entidade detentora de direitos e obrigações a qual o Direito, em razão do que se chama
“ficção jurídica”, atribuiu personalidade jurídica.
Longa Manus: Expressão de origem latina que significa, literalmente, mão longa, e que é usada para designar
a atuação de uma pessoa ou ente em nome de outra, como se essa outra o fosse.
Direito de secessão: Direito de separação, retirada; desligamento de um ente que forma uma unidade política
para a constituição de uma unidade independente. É fenômeno vedado pela Constituição Federal de 1988 (art.
34, I e art. 60, §4º, I);
Cláusula pétrea: Dispositivo constitucional que não pode ser alterado nem mesmo por emenda constitucional.
São relacionadas no art. 60, § 4º, CF/88: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e
periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e garantias individuais.
Autonomia dos entes-federados: significa que cada um deles tem capacidade de auto-organização,
autogoverno e autoadministração.
Terras devolutas: são terras públicas sem destinação pelo Poder Público e nunca integradas ao patrimônio
de algum particular.

Ao ler sobre a União e os Estados, você encontrou informações ao final de cada uma dessas sessões sobre
as intervenções federal e estadual. Nessa ocasião, foram mencionados os artigos 34 (intervenção federal) e
35 (intervenção estadual) da CF/88, que relacionam todas as hipóteses que possibilitam essa ação, a qual,
como visto, é uma exceção à regra. Além dos mencionados requisitos, a decretação da intervenção dependerá,
nos termos dos incisos I, II e III do art. 36, CF/88:
I- No caso do art. 34, IV, de solicitação do Poder Legislativo ou do Poder Executivo coacto ou impedido,
ou de requisição do Supremo Tribunal Federal, se a coação for exercida contra o Poder Judiciário (o
inciso IV do art. 34 diz o seguinte: “garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da
Federação”);
II - No caso de desobediência a ordem ou decisão judiciária, de requisição do Supremo Tribunal Federal,
do Superior Tribunal de Justiça ou do Tribunal Superior Eleitoral;
III - De provimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de representação do Procurador-Geral da República,
na hipótese do art. 34, VII, e no caso de recusa à execução de lei federal (o inciso VII do art. 34 diz o
seguinte: “assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana,
sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta; e) aplicação do mínimo exigido da
receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na
manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde”).

16
AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. 44ª ed. Porto Alegre: Editora Globo, 2006.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília,
1988. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 23 jul. 2021.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 25ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2021.
PADILHA, Rodrigo. Direito Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Editora Método, 2020.
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 19ª ed. São Paulo:
Editora Método, 2020.

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Tabela 1: Classificação dos estados quanto à forma

18
19
UNIDADE I
CAPÍTULO 2 - A ORGANIZAÇÃO DOS PODERES
Ao término deste capítulo, você deverá saber sobre:
✓ Separação e tripartição dos poderes
✓ Poder Legislativo
✓ Poder Executivo
✓ Poder Judiciário

Introdução
Após estudarmos, no Capítulo 1 desta Unidade, a organização político-administrativa, ligada à
divisão territorial ou vertical dos poderes políticos, trataremos, neste Capítulo, do modo pelo qual
os poderes políticos são organizados e divididos funcional ou horizontalmente (PADILHA, Rodrigo,
2020, p. 524), ou seja, como se dá a organização dos poderes do Estado: o Legislativo, o Executivo
e o Judiciário.

Esses ditos poderes foram identificados por Aristóteles, filósofo da Antiguidade Grega, o qual
observou que o soberano exercia três funções diferentes e os descreveu na obra Política: “a função
de editar normas gerais a serem observadas por todos, a de aplicar as referidas normas ao caso
concreto (administrando) e a função de julgamento, dirimindo os conflitos oriundos da execução das
normas gerais nos casos concretos” (LENZA, 2021). Esse pressuposto foi revisitado principalmente
por Montesquieu, que, em seu livro O espírito das leis, teorizou estarem tais funções ligadas cada
qual a um órgão diferente, que seriam autônomos e independentes entre si, de modo que o poder
estatal não se concentrasse em uma só pessoa. O pensamento em questão se contrapôs ao
absolutismo e foi a base das democracias do ocidente ao ser posto em prática após a Revolução
Constitucional Inglesa, com a edição do Bill of Rights, de 1689 (LENZA, 2021).

Preservando as liberdades individuais por evitar excessos dos soberanos, a tripartição dos poderes
age mediante aplicação do chamado sistema ou teoria dos freios e contrapesos, que será estudada
na próxima seção. Posteriormente, seguiremos analisando as características de cada um dos
poderes pela ótica da Constituição Federal de 1988.

2.1 Tripartição dos poderes do Estado


Conforme a Constituição Federal de 1988 prevê em seu artigo 2º, o chamado princípio da separação
dos poderes aponta que: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o
Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

Tal separação, ou o que chamamos de tripartição dos poderes, dá-se pelo fato de o Poder do
Estado estar repartido em três partes, dividido em diversos órgãos diferentes e autônomos, que se
complementam e fiscalizam, diferentemente do que ocorria com os regimes absolutistas, em típica
aplicação da teoria dos freios e contrapesos, “estabelecendo mecanismos de fiscalização e
responsabilização recíproca dos poderes estatais” (LENZA, 2021).

20
[...] o sistema de separação de poderes, consagrado nas Constituições de quase todo
o mundo, foi associado à ideia de Estado Democrático e deu origem a uma
engenhosa construção doutrinária, conhecida como sistema de freios e
contrapesos. Segundo essa teoria, os atos que o Estado pratica podem ser de duas
espécies: ou são atos gerais ou são especiais. Os atos gerais, que só podem ser
praticados pelo poder legislativo, constituem-se na emissão de regras gerais e
abstratas, não se sabendo, no momento de serem emitidas, a quem elas irão atingir.
Dessa forma, o poder legislativo, que só pratica atos gerais, não atua
concretamente na vida social, não tendo meios para cometer abusos de poder nem
para beneficiar ou prejudicar a uma pessoa ou a um grupo em particular. Só depois
de emitida a norma geral é que se abre a possibilidade de atuação do poder
executivo, por meio de atos especiais. O executivo dispõe de meios concretos
para agir, mas está igualmente impossibilitado de atuar discricionariamente, porque
todos os seus atos estão limitados pelos atos gerais praticados pelo legislativo.
E se houver exorbitância de qualquer dos poderes surge a ação fiscalizadora do
poder judiciário, obrigando cada um a permanecer nos limites de sua respectiva
esfera de competência (DALLARI apud LENZA, 2021, e-book, grifo do autor).

Nossa Constituição Federal disciplina tais poderes nos seguintes artigos:

• Poder Legislativo: arts. 44 a 75, CF;


• Poder Executivo: arts. 76 a 91, CF;
• Poder Judiciário: arts. 92 a 126, CF.

Lembre-se de sempre consultar a Constituição Federal durante sua leitura, pois isso irá auxiliar nos seus
estudos! Aproveite para consultá-la virtualmente e de forma gratuita no site do planalto:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

2.2 Poder Legislativo


O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, composto da Câmara dos Deputados
e do Senado Federal (ver bicameralismo no glossário) (art. 44, CC/88), durando quatro anos cada
legislatura (art. 44, parágrafo único, CF/88). A Câmara dos Deputados é composta “de
representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no
Distrito Federal” (art. 45, CF). O Senado Federal é composto de representantes dos Estados e Distrito
Federal, sendo eleitos três senadores para cada Estado e DF, com mandato de oito anos e
renovação a cada quatro anos, alternadamente, por um e dois terços (art. 46, CF). Vale mencionar
que, salvo não haja disposição constitucional em contrário, as deliberações das Casas do Congresso
e de suas Comissões serão, em regra, por maioria dos votos, presente a maioria de seus membros
(art. 47, CF).

No tocante às atribuições do Congresso Nacional, a Constituição Federal disciplina tal temática nos
arts. 48 a 50, sendo muito importante sua leitura, visto ser essencial seu conhecimento. Já o art. 51,

21
CF, prevê atividades de competência privativa da Câmara dos Deputados, ou seja, as quais
somente ela pode desempenhar, enquanto o art. 52, CF, regula as atividades de competência
privativa do Senado Federal.

Um ponto muito relevante quando da análise do Poder Legislativo é a inviolabilidade (ver glossário)
dos Deputados e Senadores por suas opiniões, palavras e votos, conforme dispõe o art. 53, CF:
Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por
quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

§ 1º Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos


a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.

§ 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não


poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os
autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que,
pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.

§ 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a


diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por
iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus
membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação.

§ 4º O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo


improrrogável de quarenta e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora.

§ 5º A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o mandato.

§ 6º Os Deputados e Senadores não serão obrigados a testemunhar sobre


informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre
as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações.

§ 7º A incorporação às Forças Armadas de Deputados e Senadores, embora militares


e ainda que em tempo de guerra, dependerá de prévia licença da Casa respectiva.

§ 8º As imunidades de Deputados ou Senadores subsistirão durante o estado de sítio,


só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos membros da Casa
respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso Nacional, que
sejam incompatíveis com a execução da medida.

Outra temática importantíssima quando do estudo do Poder Legislativo é o processo legislativo,


disciplinado pela Constituição Federal a partir de seu art. 59, aplicando diferentes processos
conforme o instrumento normativo a ser criado. Tais processos são regulados pelos dispositivos
constitucionais mencionados, entretanto seu estudo fica bem mais interessante e facilitado quando
os analisamos na forma de fluxogramas.

A Câmara dos Deputados disponibiliza, em seu site, um material incrível sobre processo legislativo,
apresentando tanto fluxogramas como explicações acerca de suas fases e até videoaulas. Não deixe de
conferir! Acesso em: https://www.camara.leg.br/entenda-o-processo-legislativo/

22
2.3 Poder Executivo
O chefe do Poder Executivo exerce funções típicas e atípicas: prática, tipicamente, atos de chefia de
Estado e de Governo e atos de administração; atipicamente, ele legisla (ex.: medida provisória, art.
62, CF/88) e julga no chamado contencioso administrativo, que são procedimentos que ocorrem no
âmbito da administração pública, fora do Poder Judiciário (LENZA, 2021). Será eleito
democraticamente por meio de sufrágio universal (art.14, CF/88), durante um mandato de 4 anos
(art. 82; art. 28; art. 29, I, CF/88), com possibilidade de reeleição para um único período subsequente
(art.14, §5º, CF/88).

No âmbito federal, o Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República (art. 76, CF/88) – o
presidencialismo é o sistema de governo adotado pela CF/88 e mantido pelo plebiscito do art. 2º,
ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) –, que é chefe de Estado e de Governo. O
presidente é eleito democraticamente por meio de sufrágio universal nos moldes do art. 77 e
seguintes, CF, sendo auxiliado pelos Ministros de Estado (art. 87, CF). Nos Estados-membros e no
Distrito Federal, o Poder Executivo será exercido pelo Governador, auxiliado pelos Secretários de
Estado e podendo ser sucedido pelo Vice-Governador (art. 28, CF/88). Nos municípios, o chefe do
Poder Executivo será o Prefeito, podendo ser sucedido pelo vice-Prefeito (art. 29, I, CF/88).

O art. 84, CF, disciplina as atividades de competência privativa do Presidente da República, sendo sua
leitura recomendada.

Ponto muito significativo em relação ao chefe do Executivo são os crimes de responsabilidade e


seu processamento, que resultam em impeachment. Em relação a esses crimes, o art. 85, CF,
disciplina quais são:
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que
atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

I - a existência da União;

II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e


dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;

III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;

IV - a segurança interna do País;

V - a probidade na administração;

VI - a lei orçamentária;

VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.

Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as
normas de processo e julgamento.

23
Por sua vez, o art. 86, CF, regula o procedimento para conhecimento e julgamento dos crimes
praticados pelo Presidente da República, quer comuns ou de responsabilidade. In verbis (ver
glossário):
Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da
Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo
Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos
crimes de responsabilidade.

§ 1º O Presidente ficará suspenso de suas funções:

I - nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa-crime pelo


Supremo Tribunal Federal;

II - nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado


Federal.

§ 2º Se, decorrido o prazo de cento e oitenta dias, o julgamento não estiver concluído,
cessará o afastamento do Presidente, sem prejuízo do regular prosseguimento do
processo.

§ 3º Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o


Presidente da República não estará sujeito a prisão.

§ 4º O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser


responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.

Note, aqui, alguns pontos importantes: a acusação contra o Presidente da República por quaisquer
delitos é feita à Câmara dos Deputados; sendo admitida, será julgada pelo STF, no caso de
crimes comuns, ou pelo Senado, no caso de crimes de responsabilidade (descritos no art. 85,
CF). Para facilitar o entendimento e a memorização desses pontos, podemos expor graficamente da
seguinte forma:

STF

Acusações contra Câmara dos Admissão


o Presidente da Deputados por 2/3 da
República Câmara

Senado

O livro “Direito Constitucional Simplificado”, de Paulo Vicente e Marcelo Alexandrino, é de grande ajuda para
a compreensão de toda a temática trabalhada neste capítulo, sendo uma opção interesse para eventual
aprofundamento.

24
2.4 Poder Judiciário
O Poder Judiciário é composto órgãos elencados no art. 92, CF:
Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:

I - o Supremo Tribunal Federal;

I-A o Conselho Nacional de Justiça;

II - o Superior Tribunal de Justiça;

II-A - o Tribunal Superior do Trabalho;

III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;

IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;

V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;

VI - os Tribunais e Juízes Militares;

VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.

Parágrafo único. O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores têm sede na


Capital Federal e jurisdição em todo o território nacional.

§ 1º O Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais


Superiores têm sede na Capital Federal.

§ 2º O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o


território nacional.

Tais órgãos são organizados da seguinte forma:


[...] o Poder Judiciário divide-se basicamente em duas esferas: a Justiça Federal e a
Justiça Estadual. Não existe Poder Judiciário municipal em nosso País. A regra é as
competências da Justiça Federal serem enumeradas expressa e taxativamente no
texto constitucional, deixando-se a competência residual à Justiça Estadual. A Justiça
Federal, por seu turno, classifica-se em comum e especializada, esta com
competência para apreciar matérias específicas (Justiça do Trabalho, Justiça Militar,
Justiça Eleitoral). Têm-se, ademais, dois tribunais de superposição, o Superior
Tribunal de Justiça, última instância nas questões que envolvam leis, e o Supremo
Tribunal Federal, instância derradeira (ou única, especialmente no controle
concentrado de constitucionalidade) nas questões concernentes à Constituição
Federal (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 690).

Com reação à Magistratura, o art. 93, CF, versa que o Estatuto da Magistratura será criado por Lei
Complementar (no caso Lei Complementar nº 35/79, recepcionada pela ordem constitucional
vigente), fornecendo balizas sobre o cargo. Já o art. 95, CF, discorre sobre as garantias dos juízes,
quais sejam:
Art. 95. Os juízes gozam das seguintes garantias:

I - vitaliciedade, que, no primeiro grau, só será adquirida após dois anos de


exercício, dependendo a perda do cargo, nesse período, de deliberação do tribunal

25
a que o juiz estiver vinculado, e, nos demais casos, de sentença judicial transitada
em julgado;

II - inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, na forma do art. 93, VIII;

III - irredutibilidade de subsídio, ressalvado o disposto nos arts. 37, X e XI, 39, §
4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I.

Parágrafo único. Aos juízes é vedado:

I - exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de


magistério;

II - receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo;

III - dedicar-se à atividade político-partidária.

IV - receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas


físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei;

V - exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos


três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração.

O art. 94, CF, regula o chamado quinto constitucional, ferramenta bastante relevante que assegura
a pluralidade de visões dentro dos Tribunais, mediante o ingresso de Advogados e Promotores de
Justiça na Magistratura exercida nesses órgãos. Segundo tal dispositivo constitucional:
Art. 94. Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos
Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros, do Ministério
Público, com mais de dez anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico
e de reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional,
indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes.

No tocante à atividade dos tribunais, o art. 96, CF, disciplina que compete a eles, privativamente:
Art. 96. Compete privativamente:

I - aos tribunais:

a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância
das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a
competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e
administrativos;

b) organizar suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos que lhes forem
vinculados, velando pelo exercício da atividade correicional respectiva;

c) prover, na forma prevista nesta Constituição, os cargos de juiz de carreira da


respectiva jurisdição;

d) propor a criação de novas varas judiciárias;

e) prover, por concurso público de provas, ou de provas e títulos, obedecido o


disposto no art. 169, parágrafo único, os cargos necessários à administração da
Justiça, exceto os de confiança assim definidos em lei;

26
f) conceder licença, férias e outros afastamentos a seus membros e aos juízes e
servidores que lhes forem imediatamente vinculados;

II - ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça


propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169:

a) a alteração do número de membros dos tribunais inferiores;

b) a criação e a extinção de cargos e a fixação de vencimentos de seus membros,


dos juízes, inclusive dos tribunais inferiores, onde houver, dos serviços auxiliares e
os dos juízos que lhes forem vinculados;

b) a criação e a extinção de cargos e a remuneração dos seus serviços auxiliares e


dos juízos que lhes forem vinculados, bem como a fixação do subsídio de seus
membros e dos juízes, inclusive dos tribunais inferiores, onde houver, ressalvado o
disposto no art. 48, XV;

b) a criação e a extinção de cargos e a remuneração dos seus serviços auxiliares e


dos juízos que lhes forem vinculados, bem como a fixação do subsídio de seus
membros e dos juízes, inclusive dos tribunais inferiores, onde houver;

c) a criação ou extinção dos tribunais inferiores;

d) a alteração da organização e da divisão judiciárias;

III - aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e


Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes comuns e de
responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral.

Há, ainda, outros dispositivos cuja leitura e compreensão são essenciais, tais como:

• Art. 102, CF/88: regula a competência do Supremo Tribunal Federal, composto de 11


Ministros “escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco
anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada”, conforme art. 101, CF/88;
• Art. 105, CF/88: disciplina a competência do Superior Tribunal de Justiça, composto
consoante o art. 104, CF/88;
• Art. 108, CF/88: versa sobre a competência dos Tribunais Regionais Federais;
• Art. 109, CF: discorre sobre a competência dos Juízes Federais;
• Arts. 125 e 126, CF/88: disciplinam os Tribunais da Justiça Estadual;
• Art. 111 e seguintes, CF/88: estabelecem o regramento constitucional da Justiça
Especializada, que abrange a Justiça do Trabalho, a Eleitoral e a Militar.

27
A separação dos poderes reparte as funções para evitar que ocorra abusos decorrentes da concentração do
poder estatal, sendo isso nomeado de sistema de freios e contrapesos, já que cada poder pode fiscalizar o
outro. Ainda, é importante lembrar que cada um possui funções típicas e atípicas, o que possibilita que cada
poder entre um pouco na esfera do outro.

Considerações Finais
Neste capítulo, foi apresentada a organização dos poderes do Estado, que adota critério funcional,
ou seja, aquele que se baseia na função de cada poder. Dessa forma, verificamos que ocorre a
tripartição dos poderes em Legislativo, Executivo e Judiciário, que foram estudados de modo a
identificar as suas características, atribuições e competências, sempre com a indicação do artigo
relacionado.

Diante disso, constatou-se que a atuação de cada um dos poderes autônomos visa atender ao
sistema de freios e contrapesos, pelo qual visa-se limitar abusos e permitir que um controle o outro,
garantindo que nenhum poder não exceda suas competências estabelecidas constitucionalmente.

A CF/88 prevê a separação dos poderes em três: Legislativo, Executivo e Judiciário, todos independentes
e harmônicos entre si (art. 2º, CF/88). Essa separação, ou o que chamamos de tripartição dos poderes, dá-
se pelo fato de o Poder do Estado estar repartido em três partes.
A separação de poderes visa evitar a concentração do poder em um só ente ou pessoa, como era nos Estados
Absolutistas, e é clara aplicação da teoria ou do sistema de freios e contrapesos, que estabelece
mecanismos de fiscalização mútua entre os poderes, de modo a evitar a ocorrência de abusos que possam
afetar as liberdades individuais.
O Poder Legislativo é regrado pelos artigos 44 ao 75 da CF/88. É poder estatal exercido pelo Congresso
Nacional, que segue o regime bicameral: composto da Câmara dos Deputados, formada por representantes
do povo, eleitos pelo sistema proporcional em cada Estado e no Distrito Federal (art. 45, CF) e do Senado
Federal, constituído por representantes dos Estados e do Distrito Federal, sendo eleitos 3 Senadores para
cada Estado e DF, com mandato de 8 anos e renovação a cada 4 anos, alternadamente, por um e dois terços
(art. 46, CF).
O Poder executivo, no âmbito federal, tem por chefe o Presidente da República (art. 76, CF/88), que
concentra, em si, a chefia de Estado e de Governo. Ele é eleito democraticamente por meio de sufrágio
universal nos moldes do art. 77 e seguintes, CF, sendo auxiliado pelos Ministros de Estado (art. 87, CF). Nos
Estados-membros e no Distrito Federal, o Poder Executivo será exercido pelo Governador de Estado, auxiliado
pelos Secretários de Estado e podendo ser sucedido pelo Vice-Governador (art. 28, CF/88). Nos municípios,
o chefe do Poder Executivo será o Prefeito, podendo ser sucedido pelo Vice-Prefeito (art. 29, I, CF/88).
O Poder Judiciário tem duas grandes esferas principais, a Justiça Federal (competência expressa e
taxativa) e a Justiça Estadual (competência residual com relação à Federal). Dentro da Justiça Federal, há
uma outra divisão, na qual se encontram a Justiça Comum Federal e a Justiça Federal Especializada, que
envolvem a Justiça do Trabalho, a Militar e a Eleitoral. Ainda há o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que
é a última instância para tratar questões que contemplam normas infraconstitucionais, com exceção das
esferas especializadas da Justiça Federal, quando o STJ é substituído pelo Tribunal Superior do Trabalho
(TST), pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e pelo Superior Tribunal Militar (STM). Acima de todos e com

28
a função de guardar a Constituição, há o Supremo Tribunal Federal (STF), última instância em questões
relativas à Constituição Federal, ou instância única, como é o caso no controle concentrado de
constitucionalidade.

(FGV - 2015 - OAB - Exame de Ordem Unificado - XVII - Primeira Fase) A discussão a respeito das funções
executiva, legislativa e judiciária parece se acirrar em torno dos limites do seu exercício pelos três tradicionais
Poderes. Nesse sentido, sobre a estrutura adotada pela Constituição brasileira de 1988, assinale a afirmativa
correta.
a) O exercício da função legislativa é uma atribuição concedida exclusivamente ao Poder Legislativo, como
decorrência natural de ser considerado o Poder que mais claramente representa o regime democrático.
b) O exercício da função jurisdicional é atribuição privativa do Poder Judiciário, embora se possa dizer que
o Poder Executivo, no uso do seu poder disciplinar, também faça uso da função jurisdicional.
c) O exercício de funções administrativas, judiciárias e legislativas deve respeitar a mais estrita divisão de
funções, não existindo possibilidade de que um Poder venha a exercer, atipicamente, funções afetas a outro
Poder.
d) A produção de efeitos pelas normas elaboradas pelos Poderes Legislativo e Executivo pode ser limitada
pela atuação do Poder Judiciário, no âmbito de sua atuação típica de controlar a constitucionalidade ou a
legalidade das normas do sistema.

Orientações para a resolução - a alternativa correta é a de letra D. Vejamos o motivo:


Para a resolução da questão deve-se levar em conta que existem funções típicas e atípicas de cada um dos
poderes, e, por isso, não se pode falar em uma separação rígida e em uma divisão absolutamente restrita de
funções.
O Legislativo tem a função típica de legislar e fiscalizar as contas do executivo, mas também tem por funções
atípicas ações de natureza executiva quando de sua organização interna (provimento de cargos, concessão
de férias, etc.) e de natureza judicial (responsabilidade por julgar os crimes do Presidente da República – art.
86, CF/88). Já o Executivo tem por função típica a realização de atos administrativos (Chefia de Estado e de
Governo) e por função atípica legislar (edição de medidas provisórias) e julgar (apreciação de processos
administrativos). Por fim, o Judiciário tem por função típica a jurisdicional, mas também age como legislador
(elaboração de regimentos internos de seus tribunais) e como executivo (administração dos servidores)
enquanto funções atípicas.
Diante disso, quando vemos o termo “exclusivamente” na letra A, o “privativa” na letra B e a expressão
“respeitar a mais estrita divisão de funções” na letra C, já podemos concluir que são menções que exageram
e tornam as afirmações equivocadas, restando somente a letra D como verdadeira, que leva em consideração
as funções típicas e atípicas dos Poderes Legislativo e Executivo, que podem ser limitadas pela atuação típica
do Poder Judiciário.

29
Questão Objetiva
FGV - 2021 - OAB - Exame de Ordem Unificado XXXII - Primeira Fase
No dia 1º de janeiro de 2015, foi eleito o Presidente da República Alfa, para um mandato de quatro anos. Pouco
depois, já no exercício do cargo, foi denunciado pelo Ministério Público de Alfa por ter sido flagrado cometendo
o crime (comum) de lesão corporal contra um parente. Embora o referido crime não guarde nenhuma relação
com o exercício da função, o Presidente da República Alfa mostra-se temeroso com a possibilidade de ser
imediatamente afastado do exercício da presidência e preso. Se a situação ocorrida na República Alfa
acontecesse no Brasil, segundo o sistema jurídico-constitucional brasileiro, dar-se-ia
a) O afastamento do Presidente da República se o Senado Federal deliberasse dessa maneira por maioria
absoluta.
b) A permanência do Presidente da República no exercício da função, embora tenha que responder pelo crime
cometido após a finalização do seu mandato.
c) O afastamento do Presidente da República se, após autorização da Câmara dos Deputados, houvesse sua
condenação pelo Supremo Tribunal Federal.
d) A autorização para que o Presidente da República finalizasse o seu mandato, caso o Senado Federal assim
decidisse, após manifestação da Câmara dos Deputados.

Questão Discursiva
Por que é possível afirmar que o nosso Poder Legislativo segue o sistema bicameral? Explique.

Questão Objetiva
Gabarito: Letra B (art. 86, § 4º da CF)

Questão Discursiva
Gabarito: É possível afirmar que o nosso Poder Legislativo segue o sistema bicameral, porque ele é dividido
em duas câmaras, a Câmara dos Deputados, que representa o povo, e o Senado Federal, que representa os
Estados e o Distrito Federal, que compõem o Congresso Nacional.

Bicameralismo: bicameralismo, bicameralismo federativo ou sistema bicameral, consiste no regime em que o


Poder Legislativo é dividido em duas câmaras;
Bill of Rights: Carta de direitos desenvolvida e aprovada pelo parlamento inglês em 1689, que efetuou
alterações constitucionais na Inglaterra e foi considerada um avanço para a democracia;
In verbis: expressão em latim que significa “nestes termos”;

30
Inviolabilidade parlamentar: liberdade do parlamentar de se expressar, sem que incorra em delito, quando o
pronunciamento ocorre durante o exercício do mandato.

Cada uma das casas do Congresso Nacional pode formar comissões parlamentares, conforme regramento
do art. 58 da CF/88. Elas podem ser definidas como “organismos constituídos em cada Câmara, composto de
número geralmente restrito de membros, encarregados de estudar e examinar as proposições legislativas e
apresentar pareceres” (SILVA apud LANZA, 2021). As comissões poderão ser permanentes ou temporárias,
sendo constituídas de acordo com o regimento interno do Congresso Nacional e de cada Casa (art. 58, CF/88).
Classificam-se em:

• Comissões temáticas, ordinárias ou em razão da matéria (art. 58, §2º, CF/88): são comissões
permanentes, caracterizadas por seu caráter especializado. Integram a estrutura da casa (Ex.:
Comissão de Defesa do Consumidor, Educação, Meio Ambiente e Minorias etc.);
• Comissões representativas ou especiais (art. 58, §4º, CF/88): Comissão que funcionará durante o
recesso;
• Comissão de ética (Conselho de ética): “órgão constituído por quinze membros titulares e igual
número de suplentes com mandato de dois anos para apurar irregularidades cometidas por
parlamentares” (PADILHA, 2020), de acordo com o art. 7 do Código de Ética e Decoro Parlamentar da
Câmara dos Deputados e art. 23 do Código de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal;
• Comissões parlamentares de inquérito (CPI): “As comissões parlamentares de inquérito, que terão
poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos
das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto
ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato
determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério
Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores” (art. 58, §3º, CF/88).

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília, 1988.
Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 23 jul 2021.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 25ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2021.
PADILHA, Rodrigo. Direito Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Editora Método, 2020.
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 19ª ed. São Paulo:
Editora Método, 2020.

31
UNIDADE II
CAPÍTULO 3 – O SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL E AS
FINANÇAS PÚBLICAS
No término deste capítulo, você deverá saber:
✓ As linhas gerais acerca do sistema tributário nacional;
✓ Sobre a competência tributária, suas características, classificação e o modo de sua distribuição
entre os entes federativos;
✓ Acerca das limitações ao poder de tributar;
✓ Sobre o conceito e regramento da atividade financeira do Estado, que é estudado pelo Direito
Financeiro;
✓ Os conceitos de receita, despesa e orçamento públicos;
✓ Os princípios do Direito Financeiro e os princípios orçamentários;
✓ Acerca das leis orçamentárias (PPA, LDO e LOA): suas definições, regramentos, vigências e
prazos para a proposição.

Introdução
Neste capítulo trataremos do sistema tributário nacional e das finanças públicas, que são temas
regulamentados pelo Direito Tributário e pelo Direito Financeiro, respectivamente. São disciplinas
interdependentes, no entanto, em razão do modo como o constituinte organizou as matérias,
seguindo uma tendência da doutrina, elas acabaram se desvinculando, mas só com relação à
normatização: são disciplinas que tratam de questões correlatas, que não precisariam ser
autônomas, já que a arrecadação, hoje própria do Direito Tributário, e a gestão das receitas e de
seus gastos, de responsabilidade do Direito Financeiro, são atividades intimamente relacionadas
(PISCITELLI, 2018, e-book).

Apesar de ingressar em temáticas que serão tratadas posteriormente em disciplinas próprias, a


intenção não é esgotar toda a matéria, já que o foco do estudo será verificar como a CF/88 organiza
o sistema tributário, principalmente através da distribuição da competência tributária, e o financeiro,
através do estudo de seus princípios e leis orçamentárias.

As Finanças Públicas são regulamentadas não só pela CF/88, mas também por duas Leis Complementares
(ver glossário): a LC 4320/64, que estatui as normas Gerais de Direito Financeiro, e a LC 101/2000, também
chamada de Lei de Responsabilidade Fiscal. Além disso, os créditos extraordinários são tratados através de
medidas provisórias.

3.1 O sistema tributário nacional


O poder de tributar, ou seja, de auferir receita pela arrecadação de tributos, é inerente ao Estado e
decorre de sua soberania: “no exercício de sua soberania que o Estado exige que os indivíduos lhe
forneçam os recursos de que necessita. Institui o tributo. O poder de tributar nada mais é que um

32
aspecto da soberania estatal ou uma parcela desta” (MACHADO, 2010, p. 49). Ele é repartido entre
os entes da federação ao distribuir-se a competência tributária.

A própria legislação conceitua tributo como sendo “toda prestação pecuniária compulsória, em
moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída
em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (art. 3º, Código
Tributário Nacional — CTN). Assim, tributo é toda obrigação em dinheiro imposta ao contribuinte,
que não constitua penalidade, criada por lei e cobrada por meio de formas e procedimentos
administrativos também previstos em lei.

O tributo é gênero do qual existem outras espécies, que serão brevemente apresentadas aqui, já que
serão objeto de estudo aprofundado na disciplina de direito tributário: empréstimo compulsório,
tributo que a União poderá instituir se for necessário atender a despesas extraordinárias (calamidade
pública, guerra externa ou investimento público urgente/relevante); impostos, cobrados em razão
de situação decorrente do próprio contribuinte, que não dependa de contraprestação do Estado (Ex.:
auferir renda, ser proprietário de imóvel); taxas, incidem sobre os fatos realizados mediante
contraprestação individual do Estado; contribuição de melhoria, incidente sobre um acréscimo de
valor sobre bem imóvel em razão da realização de obra pública; contribuições especiais, voltadas
para financiar a seguridade social, atender a classes profissionais ou à intervenção do domínio
econômico.

3.1.1 A competência tributária


A Constituição Federal não será responsável pela instituição de tributos, mas sim por autorizar que
os entes federativos o façam através da competência tributária a eles conferida. Ex.: o tributo IPTU
(imposto predial e territorial urbano) é de competência dos municípios (art. 156, I, CF/88); a
competência de instituir o IR (imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza) foi outorgada
à União (art. 153, III, CF/88).

Pode-se conceituar competência tributária como sendo a possibilidade, prevista


constitucionalmente, que os entes federados têm de instituir determinados tributos em seus
territórios. Ela caracteriza-se por ser facultativa, indelegável, imprescritível e irrenunciável
(AMARO, 2014, e-book).

➢ Facultativa: como visto na conceituação de competência tributária, não há uma


obrigatoriedade na instituição dos tributos estabelecidos pela CF. Por conta dessa
facultatividade, o ente poderá ou não instituir o tributo, podendo decidir se deverá ampliar a
sua arrecadação com os tributos que são de sua competência;

➢ Indelegável (art. 7º, CTN): a indelegabilidade consiste no fato de a competência poder ser
exercida somente pelos entes autorizados pela CF, não sendo possível um ente delegar a
outro a possibilidade que lhe foi passada de criar e arrecadar certo tributo.

É importante frisar que há um outro conceito, o de capacidade tributária, que não se


confunde com a competência tributária e que pode sofrer delegação: em razão da
capacidade tributária, um determinado tributo, que já foi instituído, pode ter a sua
arrecadação transferida a outros entes;

➢ Imprescritível (art. 8º, CTN): a imprescritibilidade decorre do fato de, apesar de a instituição
do tributo ser facultativa ao ente, o seu não exercício não implicar na prescritibilidade da

33
atribuição feita pela CF: o não exercício da competência tributária não permite que ela seja
exercida por ente diverso daquele a quem a CF atribuiu a possibilidade de instituição
tributária, assim o ente competente poderá instituir o tributo quando achar oportuno;

➢ Irrenunciável: a irrenunciabilidade refere-se à impossibilidade de o ente renunciar, parcial


ou integralmente, de sua competência tributária.

Lembre-se de que competência e capacidade tributárias são conceitos diversos: enquanto a competência
tributária permite que os entes federados instituam tributos em seus territórios, a capacidade tributária é a
aptidão de arrecadar (capacidade tributária ativa) ou o dever de recolher (capacidade tributária passiva) um
tributo que já foi instituído.
Outra diferença é importante: apesar de a competência tributária não poder ser delegada, ou seja, transferida,
para outro ente, a capacidade tributária poderá ser delegada. A arrecadação do tributo, que depende da
capacidade tributária ativa, poderá ser feita pelo ente que não o instituiu, que é aquele que tem competência
tributária.

Quanto à sua classificação, a doutrina classifica a competência tributária como comum, privativa
ou residual (AMARO, 2014, e-book):

➢ Comum: é aquela que pode ser exercida por todos os entes federativos, dentro de suas
atribuições;

➢ Privativa: é a competência para criar tributos atribuída exclusivamente a determinado ente


federativo. Ex.: impostos de competência exclusiva da União (art. 153, CF/88);

➢ Residual: é a competência que a União possui de criar impostos diferentes daqueles


expressamente previstos (art. 154, I, e art. 195, §4º, CF/88).

A distribuição da competência tributária entre os entes federados foi feita pela CF/88 na forma da
tabela abaixo:

34
Lembre-se de sempre consultar a Constituição Federal para melhor fixação da matéria:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

3.1.2 Limitações ao poder de tributar


Os artigos 150, 151 e 152 da CF/88 preveem as limitações ao poder de tributar ou mesmo
princípios fundamentais do Direito Constitucional Tributário (MACHADO, 2010, p. 291). Tais
princípios limitam a atividade fiscal do Estado, a fim de preservar direitos fundamentais, tais como
liberdade de crença, de associação, direito de ir e vir, dentre outros.

Um livro que apresenta de forma muito clara os conceitos de cada uma das limitações ao poder de tributar é o
Curso de Direito Tributário, do doutrinador Hugo de Brito Machado.

Tais princípios, ou limitações ao poder de tributar, são os seguintes:

➢ Legalidade (art. 150,1): a criação, o aumento ou a diminuição de tributos se dará sempre


em virtude de lei;

➢ Isonomia (art. 150, II): também conhecido como princípio da igualdade, prevê que todos
são iguais para o direito tributário, na medida de suas desigualdades. Dessa forma, a todos
aqueles que se encontram na mesma situação fática e jurídica, a incidência de tributos deve
ser a mesma, enquanto que para aqueles em situações diferentes, é perfeitamente possível
a incidência variada do mesmo tributo (Ex.: Alíquotas progressivas em imposto de renda à
medida que a renda aumenta);

➢ Irretroatividade (art. 150, III, “a”): nova lei tributária não tem aplicação sobre fatos
pretéritos, ou seja, a instituição ou alteração de tributo não afeta os fatos ocorridos antes de
sua vigência;

➢ Anterioridade (art. 150, III, “b”): impõe regramento sobre a vigência de tributos e de suas
alterações, após criados ou modificados por lei. Manifesta-se de duas formas: a
anterioridade de exercício, pela qual o tributo apenas poderá ser cobrado a partir do
exercício financeiro seguinte à sua criação (exercício financeiro: inicia-se em 1º de janeiro
de cada ano e encerra-se em 31 de dezembro), e a anterioridade nonagesimal, pela qual o
tributo poderá ser cobrado após transcorridos 90 dias de sua criação.

A regra geral será de que as duas anterioridades deverão ser respeitadas por todo tributo: um tributo
será cobrado no exercício financeiro seguinte e após transcorrido o prazo de 90 dias de sua
publicação, porém haverá tributos que, excepcionalmente, não precisarão atender a uma
anterioridade ou, até mesmo, às duas, como será tratado pelo Código Tributário Nacional, a ser
estudado com maior profundidade na disciplina de Direito Tributário.

35
➢ Proibição ou vedação ao confisco (art. 150, IV): não poderá o ente tributante impor
obrigação excessivamente onerosa por sobre o contribuinte de modo que a retenção dos
bens seja percebida como uma penalidade: “o tributo, sendo instrumento pelo qual o Estado
obtém os meios financeiros de que necessita para o desempenho de suas atividades, não
pode ser utilizado para destruir a fonte desses recursos” (MACHADO, 2010, p. 298);

➢ Liberdade de tráfego (art. 150, V): é vedada a imposição de tributos intermunicipais ou


interestaduais que impliquem na limitação ou impossibilidade de trânsito de pessoas ou
coisas pelo território nacional. “Isto não significa devam ser as operações interestaduais
imunes a qualquer tributação. O que não pode haver é agravamento do ônus tributário pelo
fato de ser interestadual, ou intermunicipal, a operação” (MACHADO, 2010, p. 298);

➢ Imunidades (art. 150, VI): As imunidades tributárias consistem em normas jurídicas


constitucionais limitadas, ou seja, editadas em casos especiais, que restringem a
competência tributária dos entes públicos, com o objetivo de impedir tributações específicas
e determinadas em lei. A imunidade atacará o tributo em sua raiz, impedindo a sua criação:
impedem que os fatos nelas descritos se tornem geradores de quaisquer tributos. São elas:
imunidade recíproca (art. 150, VI, a); imunidade dos templos de qualquer culto (art. 150,
VI, b); imunidade dos partidos políticos e das instituições educacionais ou
assistenciais (art. 150, VI, c); imunidade de livros, jornais, periódicos e do papel
destinado à sua impressão (art. 150, VI, d); imunidade de fonogramas e
videofonogramas musicais produzidos no Brasil (art. 150, VI, e) (ver: “Saiba mais” ao
final do capítulo para ver mais detalhes acerca de cada uma das imunidades tributárias).

É muito importante que o princípio da anterioridade seja bem compreendido, pois ele é bastante importante
para a compreensão do início da vigência de cada tributo, o que será essencial, também, quando você for
estudar direito tributário. Então, lembre-se:
➢ Há duas anterioridades: a de exercício, pela qual o tributo somente poderá ser cobrado no ano
seguinte ao de sua criação, e a nonagesimal, pela qual sua cobrança somente será possível após 90
dias após a sua publicação;

➢ A regra é que as duas anterioridades deverão ser respeitadas por todo tributo, mas haverá exceções
em que somente uma ou mesmo nenhuma delas deverá ser respeitada, mas sempre de acordo com o
definido em lei.

3.2 As finanças públicas


As Finanças Públicas, sob o aspecto jurídico, são estudadas pelo Direito Financeiro e são
abordadas pela Constituição Federal de 1988 do artigo 163 ao 169.

Pode-se conceituar Direito Financeiro como aquele que “tem por objetivo disciplinar a atividade
financeira do Estado e, assim, estabelecer regras relativas aos três pilares dessa atividade: o
orçamento público, a receita pública e a despesa pública” (PISCITELLI, 2018, e-book, grifo
nosso). Por sua vez, a atividade financeira é representada pelo “conjunto de ações que o Estado
desempenha visando à obtenção de recursos para seu sustento e a respectiva realização de
gastos para a execução de necessidades públicas” (PISCITELLI, 2018, e-book). Já orçamento,

36
receita e despesa públicos, os três pilares da atividade financeira do Estado, podem ser definidos
assim:

➢ Receita Pública: as formas, condições e os limites para a obtenção de receita para custear
as despesas;

➢ Despesa Pública (ou Gastos Públicos): as formas, as condições e os limites para os


gastos do dinheiro público, ou seja, os métodos de aplicação e desembolso da receita
pública;

➢ Orçamento Público: delimitação das receitas e despesas em determinado período


(exercício); as normas relativas às metas e diretrizes da Administração, bem como à
distribuição de receitas e despesas (PISCITELLI, 2018, e-book).

Resumidamente, ao estudar as finanças públicas, veremos o modo como o Estado se relaciona


com a receita, a despesa e o orçamento (PISCITELLI, 2018, e-book).

É importante destacar a atuação dos Tribunais de Contas, que são órgãos fiscalizadores,
independentes e autônomos, que atuam auxiliando o Poder Legislativo no chamado controle
externo da atividade financeira do Estado (art. 71: Tribunal de Contas da União – TCU; art. 235, III:
Estados; art. 16, §2º: Distrito Federal; art. 76-B, IV: Municípios).

Consulte o site do tribunal de contas do Estado em que você mora e aprenda mais sobre o seu funcionamento.

3.2.1 Princípios de direito financeiro


O Direito Financeiro possui alguns princípios gerais que o fundamentam: o da legalidade, da
transparência e da responsabilidade fiscal.

➢ Princípio da legalidade (art. 165, CF; art. 48, II, da LC 101/2000 — Lei de
Responsabilidade Fiscal; medida provisória para créditos extraordinários: art. 62, §1º,
d, e art. 167, §3º, CF/88): sob a perspectiva do Direito Financeiro, esse princípio pode ser
observado no que se refere ao planejamento de receitas e despesas: sob o ponto de vista
da realização de despesas públicas ou da possibilidade de aprovação do orçamento
(PISCITELLI, 2018, e-book), ou seja, dependerá de prévia autorização legal (também
podemos pensar em prévia autorização do Poder Legislativo):

I) o gasto de dinheiro público;


II) o orçamento público;

➢ Princípio da economicidade (art. 70, caput, CF/88): ao trazer a ideia de eficiência sob a
perspectiva da economia para o gasto público, prescreve que com o mínimo de recursos
deve-se alcançar o máximo de satisfação das necessidades públicas;

➢ Transparência (art. 48 e 49 da LC 101/2000 — Lei de Responsabilidade Fiscal; art. 74,


§2º, CF/88; Lei 12.527/11 — Lei de acesso à informação): a transparência financeira

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viabiliza o controle dos gastos públicos pelo cidadão, maior responsável pela arrecadação
de recursos. Destaca Tathiane Piscitelli o modo como a Lei Complementar 101/2000 (Lei de
Responsabilidade Fiscal) prevê meios para que ocorra transparência nas finanças públicas:

O artigo 48 assegura a transparência de dois modos diversos. Em primeiro lugar, nos


termos da previsão do caput, (I) pela disponibilização, ao público, em meios
eletrônicos, das versões completa e simplificada das leis orçamentárias, (II) bem
como das prestações de contas e relatórios de execução orçamentária e gestão
fiscal. Trata-se de dar acesso aos cidadãos aos documentos que embasam a
realização de despesas públicas e, assim, possibilidade de controle dos gastos
(PISCITELLI, 2018, e-book);

➢ Responsabilidade Fiscal (art. 1º, §1º, LC 101/2000 — Lei de Responsabilidade Fiscal):


consiste em garantir a existência de limitações para o gasto público através de regras
estritas, sob pena de sanção aos entes públicos que desrespeitarem os parâmetros traçados
(PISCITELLI, 2018, e-book).

3.2.2 Orçamento público e princípios orçamentários


Como mencionado, o orçamento público é um dos pilares da atividade financeira do Estado e, por
isso, possui princípios próprios, que se somam aos princípios de Direito Financeiro. São princípios
orçamentários: o da exclusividade, da universalidade, da unidade, da anualidade, da programação e
do equilíbrio.

➢ Princípio da exclusividade (art. 165, §8º, CF/88): assegura que as leis orçamentárias se
limitem ao tratamento das receitas e despesas, não podendo dispor sobre temas além; se
isso ocorrer, a disposição que ultrapassem a temática do orçamento não terá efeito. Apesar
disso, há exceções previstas no próprio §8º do art. 165 da CF/88, fazendo com que essa
proibição não se aplique: à autorização para abertura de créditos suplementares e à
contratação de operações de crédito, ainda que por antecipação de receita;

➢ Princípio da universalidade (art. 165, §5°, CF; art. 6° da Lei 4.320/64 — Direito
Financeiro): prevê que todas as receitas e despesas devem estar previstas no orçamento
(Lei orçamentária anual), o que inclui “os aspectos do programa orçamentário de cada
órgão, o que inclui, naturalmente, as previsões de receitas e despesas, mas também as
explicações sobre os objetivos, metas e metodologia que o Governo pretende adotar na
realização das despesas previstas”. Exceção: súmula 66/STF;

➢ Princípio da unidade do orçamento (art. 2º da Lei 4.320/64 — Direito Financeiro): prevê


que cada ente da federação deve possuir o seu próprio orçamento, devendo observar-se a
periodicidade anual.

O objetivo estaria na possibilidade de verificar todas as receitas e todas as despesas


a um só tempo e, ainda, identificar a existência ou não de equilíbrio orçamentário. O
princípio ainda está vigente e não seria correto afirmar que sofreu relativização pelo
fato de a própria Constituição admitir e exigir, como será visto mais adiante, a
presença de diversas contas (chamadas de “orçamentos”) na LOA da União, nos
termos do artigo 165, § 5º. [...] Em verdade, o dispositivo acima transcrito reafirma o
princípio da unidade, na medida em que exige que todas essas previsões acerca
das receitas e despesas estejam previstas em uma única lei: a lei orçamentária
anual (PISCITELLI, 2018, e-book);

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➢ Princípio da anualidade (art. 2º, caput, da Lei 4.320/64 — Direito Financeiro): os
orçamentos valerão para um único exercício financeiro, que consiste no intervalor entre 1º
de janeiro a 31 de dezembro de cada ano (art. 34, Lei 4.320/64).

O objetivo é garantir que as contas públicas e as previsões respectivas sejam


reavaliadas ano a ano, seja do ponto de vista político, pelas mãos do Congresso
Nacional, que aprova a proposta orçamentária para o exercício seguinte e, assim,
tem oportunidade de fiscalizar as contas do ano anterior, seja do ponto de vista
financeiro, para representar o encerramento das atividades de obtenção de receitas
e dispêndio de dinheiro público (PISCITELLI, 2018, e-book);

➢ Princípio da programação (§§4º e 7º, art. 165, CF/88): segundo esse princípio, o
orçamento não só servirá como meio de previsão de receitas e despesas, mas também
como um mecanismo para satisfazer objetivos que atendam às necessidades públicas,
como é o caso do §7º do art. 165, que estabelece ser função do plano plurianual a redução
das desigualdades inter-regionais;

➢ Princípio do equilíbrio orçamentário (art. 1º, §1º, da LC 101/2000 — Lei de


Responsabilidade Fiscal): é princípio relacionado às contas públicas, que deverão
apresentar o mesmo valor ao contabilizar receitas e despesas. “Dessa forma, esse princípio
busca a igualdade numérica entre as entradas e saídas da administração, afastando-se a
presença de déficit ou superávit” (PISCITELLI, 2018, e-book).

3.2.3 Leis orçamentárias


As leis orçamentárias são ordinárias e de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo (art. 165,
CF/88). Com relação à vigência e ao prazo delas, como ainda não há a lei complementar mencionada
pela CF/88 no art. 165, § 9º como responsável para tanto, seguem-se as regras constantes no art.
35, §2º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).

O art. 165 da CF/88 prevê que serão três as leis que tratam sobre orçamento: o Plano Plurianual
(PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA).

➢ Plano Plurianual (PPA): “o plano plurianual estabelecerá, de forma regionalizada, as


diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e
outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada” (§1º,
art. 165, CF/88). O PPA planejará os 4 exercícios financeiros subsequentes (inciso I,
§2º, art.35, ADCT):

[...] O Presidente da República deverá encaminhar o projeto de lei do PPA ao Poder


Legislativo até 31 de agosto (quatro meses antes do encerramento do exercício
financeiro) do primeiro ano do mandato presidencial. Uma vez aprovado, o PPA terá
vigência até o final do primeiro exercício financeiro do mandato presidencial
subsequente (ADCT, art. 35, §2º).

Vale frisar este ponto: a vigência do PPA não coincide com o mandato do Presidente
da República. Nos dias atuais, considerando-se o mandato presidencial de quatro
anos (CF, art. 82), a vigência do PPA alcança os três últimos exercícios financeiros
do mandato presidencial em que aprovado o projeto e o primeiro exercício financeiro
do mandato presidencial subsequente. Ou seja: o último ano de vigência do PPA será
o primeiro ano do mandato presidencial subsequente (PAULO; ALEXANDRINO,
2020, p.998);

39
➢ Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO): estabelecerá as metas e prioridades da
administração pelo período de 1 ano (PISCITELLI, 2018, e-book). O Presidente da
República deverá encaminhar o Projeto de LDO ao Poder Legislativo até 15 de abril, sendo
que os parlamentares deverão aprová-lo e devolvê-lo para sanção até 17 de julho, quando
ocorre o encerramento do primeiro período legislativo (inciso II, §2º, art. 35, CF/88), sob
pena de não entrarem em recesso (§2º, art. 57, CF/88). A CF/88 define a LDO como sendo
a lei que

compreenderá as metas e prioridades da administração pública federal,


estabelecerá as diretrizes de política fiscal e respectivas metas, em consonância com
trajetória sustentável da dívida pública, orientará a elaboração da lei orçamentária
anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a
política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento (§2º, art. 165,
CF/88);

➢ Lei Orçamentária Anual (LOA): é o tipo de lei orçamentária mais concreta, pois trata
quase que exclusivamente sobre as receitas e despesas para o exercício financeiro
seguinte (PISCITELLI, 2018, e-book). Essa objetividade é prevista pela própria CF/88, ao
limitar do que a LOA pode tratar em seu texto no seu art. 165, §8º (ver: Princípio da
Exclusividade no item 3.2.3). A LOA conterá três orçamentos: III, §5º, art. 165, CF/88). O
Presidente da República deverá encaminhar o fiscal, o de investimento e o da seguridade
social (Incisos I, II e ao Poder Legislativo o Projeto de LOA até 31 de agosto de cada
exercício que deverá ser devolvido para sanção até 22 de dezembro, quando se encerra a
sessão legislativa (III, §2º, art.35, CF/88)

Considerações Finais

Neste capítulo desenvolveram-se duas temáticas relacionadas, mas que, em razão de escolhas
doutrinárias e legais, são tratadas por disciplinas autônomas: o sistema tributário nacional, que trata
sobre a arrecadação de recursos através de tributos, e as finanças públicas, que regulam a gestão
das receitas e dos gastos públicos.

Ao abordarmos o sistema tributário nacional, focamos especificamente no que está relacionado à


competência tributária, suas características e classificações e ao modo que é transferida aos entes
federativos. Ainda com o fim de complementar o entendimento da matéria, estudamos as limitações
ao poder de tributar, princípios constitucionais essenciais para compreensão do funcionamento de
nosso sistema tributário, agora introduzido e que será trabalhado de forma mais aprofundada e
específica em disciplina específica.

Estudamos a atividade financeira do Estado, analisando o orçamento público, a receita pública e a


despesa pública, ou seja, o conjunto de ações que o Estado desempenha visando à obtenção de
recursos para seu sustento e à respectiva realização de gastos para a execução de necessidades
públicas. Passamos pelos princípios de Direito Financeiro e pelos princípios orçamentários, detendo-
nos nas leis orçamentárias, essenciais para o aprofundamento da matéria.

40
A instituição dos tributos não será de responsabilidade da CF/88, mas sim dos entes federativos, que terão a
autorização para criar os tributos que a constituição permitir, o que se chama de Competência Tributária, que
tem por característica ser: facultativa, indelegável, imprescritível e irrenunciável.
A Capacidade Tributária não se confunde com a competência tributária: enquanto a primeira relaciona-se à
possibilidade de instituição de um tributo, a capacidade tributária está relacionada à possibilidade de
arrecadar/cobrar (ativa) ou recolher/pagar (passiva) aquele tributo instituído.
Pode-se classificar a competência tributária como: comum, que é aquela que pode ser exercida por todos os
entes federativos; privativa, que é aquela atribuída exclusivamente a determinado ente federativo; residual,
que é a competência que a União possui para criar impostos diferentes daqueles que existem expressamente
na CF/88.
Os artigos 150, 151 e 152 da CF/88 preveem as limitações ao poder de tributar, que limitam a atividade
fiscal do Estado, a fim de preservar direitos fundamentais. São eles: a legalidade, a isonomia, a
irretroatividade, a anterioridade, a proibição ou vedação ao confisco, a liberdade de tráfego e as
imunidades (recíproca; templos; partidos políticos, instituições educacionais ou assistenciais; livros, jornais,
periódicos e papel destinado à sua impressão; fonogramas e videofonogramas nacionais).
As Finanças Públicas, sob o aspecto jurídico, são estudadas pelo Direito Financeiro e são reguladas do artigo
163 ao 169 da CF/88. O Direito Financeiro é aquele que disciplina a Atividade Financeira do Estado, que,
por sua vez, consiste nas ações tomadas pelo Estado para a obtenção de recursos e o modo que serão
realizados os gastos.
Assim, a Atividade Financeira do Estado funda-se em três pilares, quais sejam, a Receita Pública, a
Despesa Pública e o Orçamento Público: a Receita Pública consiste nas formas, condições e os limites
para a obtenção de receita para custear as despesas; a Despesa Pública refere-se às formas, às condições
e aos limites para os gastos do dinheiro público; e Orçamento Público pode ser conceituado como a
delimitação das receitas e despesas em determinado exercício, além de tratar de metas e diretrizes da
administração.
O Controle Externo da atividade financeira do Estado será realizado pelo Poder Legislativo, que terá o auxílio
dos Tribunais de Contas de cada ente da Federação, que são órgãos independentes e autônomos.
São princípios do Direito Financeiro: o da legalidade, da transparência e da responsabilidade fiscal. Já
os Princípios Orçamentários são: o da exclusividade, da universalidade, da unidade, da anualidade, da
programação e do equilíbrio.
As Leis Orçamentárias são ordinárias e de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo e têm vigência
e prazo definidos no art. 35, §2º, do ADCT. São 3 as leis orçamentárias, quais sejam, o Plano Plurianual (PPA),
a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA), cuja explicação segue na tabela
a seguir:

41
Prazo para proposição do
Lei orçamentária Conceito
projeto de lei
até 31 de agosto do 1º ano de
para grandes objetivos da administração
mandato e a devolução até o
(Planos, diretrizes e metas regionais)
Plano Plurianual (PPA) encerramento da sessão legislativa
pelo prazo de 4 anos
(22 de dezembro de cada ano)
(§1º, art. 165, CF/88)
(§2º, art.35, ADCT).
estabelecer as metas e prioridades da até 15 de abril de cada ano e a
Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) administração pelo prazo de 1 ano devolução até 17 de julho
(§2º, art. 165, CF/88) (inciso II, §2º, art. 35, CF/88)
é o tipo de lei orçamentária mais
concreta, pois dispõe quase que
até 31 de agosto de cada exercício
exclusivamente acerca das receitas e
e a devolução até o encerramento
despesas para o exercício financeiro
Lei Orçamentária Anual (LOA) da sessão legislativa (22 de
seguinte. Conterá 3 orçamentos: o
dezembro de cada ano)
fiscal, o de investimento e o da
(III, §2º, art.35, CF/88)
seguridade social
(Incisos I, II e III, §5º, art. 165, CF/88).

Assinale a ALTERNATIVA CORRETA que indique uma imunidade tributária:


a) Patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, e das entidades sindicais
do empregador.
b) Livros, jornais periódicos e o papel destinado à sua impressão, devendo o livro ser impresso e publicado
por editora sediada no Brasil no idioma português.
c) Autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, bem como sobre as Empresas
Públicas que concorrem com o setor privado.
d) Templos de qualquer culto, compreendendo somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados
com as suas finalidades essenciais.
e) Fonogramas e videofonogramas musicais produzidos no estrangeiro, contendo obras musicais ou
literomusicais de autores brasileiros ou estrangeiros.

Resposta Correta: Alternativa D

Questão Objetiva
O artigo 156 da Constituição Federal estabelece os impostos de competência dos municípios. É CORRETO
afirmar que esse ente federado é competente para instituir imposto sobre:
a) Grandes fortunas, nos termos de lei complementar.
b) Transmissão “intervivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão
física e de direitos reais sobre imóveis; exceto os de garantia, bem como cessão de direitos à sua
aquisição.
c) Transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos.

42
d) Operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte
interestadual e intermunicipal e de comunicação.
e) Propriedade de veículos automotores.

Questão Discursiva
Julgue como certa ou errada a seguinte afirmativa: “Seria inconstitucional que o município de Peruíbe/SP
cobrasse taxa de limpeza urbana relativamente a um imóvel que funcionasse como templo religioso, pois a
Constituição Federal determina que os templos de qualquer culto são imunes à incidência de tributos”.

Lei Complementar: criada para complementar as normas constitucionais. A sua aprovação depende da
maioria absoluta dos votantes.
Exercício ou Exercício Financeiro: período, que coincide com o ano civil, em que deve vigorar ou ser
executada a lei orçamentária anual.

Conforme estudado em nosso capítulo, as chamadas imunidades tributárias (art. 150, VI) visam restringir a
competência tributária dos entes públicos para impedir a existência de tributos em situações específicas.
Vejamos agora, com maiores detalhes, o que cada uma das imunidades representa:

➢ Imunidade Recíproca (art. 150, VI, a): impede que os entes federativos instituam tributos sobre a
renda, o patrimônio e os serviços uns dos outros (administração direta e indireta). Por exemplo, não
pode ser cobrado de um Estado taxa sobre algum serviço prestado pela União;

➢ Imunidade dos templos de qualquer culto (art. 150, VI, b): veda a tributação de todo e qualquer
templo religioso, a fim de garantir a liberdade religiosa protegida pela CF/88. Por templo de qualquer
culto deve-se entender qualquer lugar de reunião para manifestação religiosa, ainda que a religião
seja incomum ou até mesmo exótica;

➢ Imunidade dos partidos políticos e das instituições educacionais ou assistenciais (art. 150, VI,
c): ante a sua importância para a Administração e para a manutenção da Democracia, os partidos
políticos fazem jus à imunidade, assim como as instituições educacionais e assistenciais, que,
embora privadas, exercem atividade tipicamente estatal, contribuindo, dessa forma, para o bem
público. Vale ressaltar que os sindicatos de trabalhadores também são abrangidos por essa
imunidade;

➢ Imunidade de livros, jornais, periódicos e do papel destinado à sua impressão (art. 150, VI, d):
visa garantir a liberdade de expressão, o acesso à cultura e à educação. É de reconhecimento
automático: uma vez constatada a característica de que o impresso é livro, jornal ou periódico, ou
que o papel é destinado à impressão;

➢ Imunidade de fonogramas e videofonogramas musicais produzidos no Brasil (art. 150, VI, e):
envolve as obras, a produção e os insumos de fonogramas e videogramas compostos por autores
nacionais, a fim de incentivar a indústria musical do país.

43
RESPOSTAS
Questão Objetiva
Resposta Correta: Alternativa B

Questão Discursiva
Resposta Padrão: Errada, pois as imunidades referem-se somente a impostos e não tributos em geral.

44
UNIDADE II
CAPÍTULO 4 – DA ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA
No término deste capítulo, você deverá saber:
✓ No que consiste a ordem econômica, seus fundamentos e finalidade;
✓ Os princípios constitucionais que regem a ordem econômica;
✓ Aa situações nas quais o Estado irá atuar ou intervir na ordem econômica;
✓ Sobre o Sistema Financeiro Nacional.

Introdução
A chamada ordem econômica e financeira é tratada pela Constituição Federal de 88 a partir de seu
artigo 170. Conhecê-la significa aprender sobre as normas que regulamentam o comportamento dos
agentes econômicos, que, para a economia, são aqueles que podem gastar recursos disponíveis,
produzir bens e serviços e escolher como agir economicamente (MASSO, 2013, e-book). Mais
especificamente, pode-se dizer que agente econômico é aquele que desenvolve a atividade
econômica, seja ela de produção ou de consumo, que pode ser conceituada como “o esforço
humano para a produção de bens e serviços, cuja finalidade é promover a satisfação das ilimitadas
necessidades” (MASSO, 2013, e-book).

Durante nossos estudos entraremos no âmbito do Direito econômico (ver: glossário), ramo voltado
às normas de intervenção do Estado no domínio econômico, funcionando como um instrumento de
tal intervenção: as normas jurídicas serão responsáveis por delimitar o alcance do Estado na
economia, ao mesmo tempo que equilibram a força do mercado (MASSO, 2013, e-book).

A CF/88 estruturou a ordem econômica por meio da ideia de descentralização, na qual o mercado
tem importante papel de controle na atividade econômica (MASSO, 2013, e-book). Mesmo o Estado
Brasileiro sendo obrigatoriamente capitalista, a atuação Estatal possui atuação importante na
economia, seja direta ou indiretamente, mas nunca com o objetivo de planificar a economia, ou seja,
controlar todo o processo econômico do país (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 1022).

Para quem tiver interesse em se aprofundar em Direito Econômico, posso recomendar o livro Direito Econômico
Esquematizado, de Fabiano Del Masso, e o Curso de economia — introdução ao direito econômico, de Fábio
Nusdeo, sendo este último um clássico no ensino da matéria.

4.1 Fundamentos e fim da ordem econômica


O fundamento e a finalidade da ordem econômica estão expressos no caput do art. 170 da CF/88:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na
livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os
ditames da justiça social (grifo nosso).
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade
econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos
previstos em lei.

45
Como visto, aparece como fundamento da ordem econômica a livre iniciativa, que também é
fundamento da República Federativa do Brasil (inciso IV, art. 1º, CF/88), que consiste na
possibilidade de todos serem empresários, ou seja, de exercerem profissionalmente a atividade
econômica (art. 866, Código Civil), ideia base da ordem capitalista.

Ela é respaldada, inclusive, pelo parágrafo único do artigo 170, que estabelece a liberdade de
empresa, ou seja, a livre prática da atividade econômica, independentemente de autorização,
havendo exceções em que o Estado intervirá, mas sempre de acordo com a lei e nunca a ponto de
controlar toda a economia (planificação da economia).

A valorização do trabalho humano também é fundamento da ordem econômica, que, igualmente


à livre iniciativa, consta no inciso IV, art. 1º, CF/88 como fundamento da República Federativa, mas
sob o nome de valores sociais do trabalho.

A soma de tais fundamentos traz a mensagem de que a livre iniciativa deve atender aos valores
do trabalho humano acima de qualquer outro valor existente na economia de mercado (SILVA,
2013, p. 800). Seguindo a ideia de trazer contornos sociais à ordem capitalista vigente, a justiça
social e a garantia de existência digna aparecem como fim da ordem econômica.

Apesar de serem ideias que historicamente se opõem (capital/trabalho; empresário/trabalhador), a


Constituição pretende estabelecer uma harmonia entre os conceitos, o que pode ser lido como uma
limitação ao liberalismo através da justiça social: “o empreendedorismo é um valor consagrado,
desde que valorize o trabalho humano e contribua para assegurar a todos uma existência digna”
(PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 1022).

Lembre-se de sempre consultar a Constituição Federal para melhor fixação da matéria:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

4.2 Princípios básicos da ordem econômica


A CF/88, dos incisos I a IX de seu artigo 170, prevê os princípios constitucionais que regerão a ordem
econômica:
Art. 170
[...]
I. Soberania nacional;
II. Propriedade privada;
III. Função social da propriedade;
IV. Livre concorrência;
V. Defesa do consumidor;
VI. Defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o
impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e
prestação
VII. Redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII. Busca do pleno emprego;
IX. Tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as
leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país.

46
Vejamos, detalhadamente, os princípios da ordem econômica:

➢ Soberania nacional (inciso I, art. 170, CF/88): sob o ponto de vista econômico, colocação
da soberania nacional como princípio específico da ordem econômica traz a noção de
independência perante os Estados estrangeiros, devendo a política econômica estar livre
de interferências externas e voltada a atender os interesses nacionais (PAULO;
ALEXANDRINO, 2020, p. 1023);

➢ Propriedade privada e sua função social (inciso II e III, art. 170, CF/88): em termos
gerais, são direitos fundamentais (art. 5º, XXII e XXIII). Sob a perspectiva econômica,
permite-se a apropriação privada dos meios de produção (próprio do capitalismo), mas essa
propriedade deve atender à sua função social (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 1024),
situação que é detalhada pela CF/88 quando disciplina a propriedade privada no âmbito da
política urbana (art. 182 e 183, CF/88) e da política agrícola e fundiária, perpassando por
preceitos sobre a reforma agrária (art. 184 a 191, CF/88);

➢ Livre concorrência (inciso IV, art. 170, CF/88): é manifestação da livre iniciativa e meio
de evitar o abuso do poder econômico. O artigo 173, §4º, CF/88 estabelece como esse
princípio será concretizado: “A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à
dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”.
Essa repressão ocorre, por exemplo, através da atuação do Conselho Administrativo de
Defesa Econômica (CADE) ou de tributação específica instituída por lei complementar;

Essa prática abusiva, que decorre quase espontaneamente do capitalismo monopolista, é o que a Constituição
condena, não mais corno um dos princípios da ordem econômica, mas como um fator de intervenção do Estado
na Economia, em favor da economia de livre mercado. Pululam leis antitrustes, sem eficácia. O que cumpre
reconhecer, na verdade, é que não existe mais economia de mercado, nem livre concorrência, desde que o
modo de produção capitalista evoluiu para as formas oligopolistas. Falar hoje em economia descentralizada,
como economia de mercado, é tentar encobrir uma realidade palpável de natureza diversa. A economia está
centralizada nas grandes empresas e em seus agrupamentos. Daí por que se toma praticamente ineficaz a
legislação tutelar da concorrência. E que a concentração capitalista não é um fenômeno patológico, mas uma
realidade fundamental do novo Estado industrial, como bem observa Farjat:
“A verdade é que não é preciso buscar, na regulamentação econômica da
concorrência, o que não se encontra (ou jamais se encontrou). A concorrência não é
(ou nunca foi) o que se acreditava que ela era, à época em que nasceram as
legislações antitrustes. As combinações, as posições dominantes, as práticas
restritivas, as concentrações não são, em si mesmas, fenômenos patológicos, mas
constituem, ao contrário, uma realidade fundamental do novo Estado industrial- a
ordem privada econômica". É uma realidade que não se modificará com mera
determinação legal formal, senão com as transformações de seus próprios
fundamentos (SILVA, 2013, p. 808).

➢ Defesa do consumidor (inciso V, art. 170, CF/88): dialoga com o fim da ordem econômica,
que é o da existência digna, pois é obtida através do consumo de bens. Dentro da relação
fornecedor e consumidor, este é economicamente hipossuficiente, então depende de uma
proteção jurídica para que ocorra um nivelamento. É direito fundamental (XXXII, art. 5º,

47
CF/88), tanto individual, quanto coletivo, cuja proteção é regulamentada pela Lei 8.078/1990
(Código de Defesa do Consumidor);

➢ Defesa do meio ambiente (inciso VI, art. 170, CF/88): a produção de riqueza não deve
acarretar custos ambientais irreparáveis, razão pela qual a atividade econômica deve guiar
a sua atuação através do chamado desenvolvimento sustentável (PAULO; ALEXANDRINO,
2020, p. 1029). É fundamental o direito a um meio ambiente equilibrado (LXXIII, art. 5º, CF);

➢ Redução das desigualdades regionais e sociais e busca do pleno emprego (inciso VII
e VIII, art. 170, CF/88): a busca do pleno emprego relaciona-se com a valorização do
trabalho humano, um dos fundamentos da ordem econômica, pois para que ele ocorra é
necessário que a mão de obra esteja empregada. A redução das desigualdades regionais é
objetivo que se repete várias vezes na CF/88, como é o caso dos incentivos fiscais
mencionados no inciso I, art. 151 (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 1030). Também
constam como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (III, art. 3º, CF):
“erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”;

➢ Tratamento favorecido às empresas de pequeno porte (inciso IX, art. 170, CF/88):
refere-se às microempresas e às empresas de pequeno porte (SILVA, 2013, p. 811) que já
possuem tratamento diferenciado pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art.
179, CF/88).

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério da
Justiça, responsável por regular e fiscalizar a livre concorrência do mercado, evitando práticas anticompetitivas,
como é o caso do Cartel (ver: Glossário). Conheça mais sobre o CADE acessando o seu site:
https://www.gov.br/cade/pt-br (acesso em 19 ago. 2021).

4.3 Atuação e intervenção do estado na ordem econômica


Normalmente não há uma diferenciação das palavras utilizadas para designar as ações do Estado
na ordem econômica, sendo comum utilizar apesar a expressão intervenção. Entende-se que não é
errado utilizar somente a palavra intervenção, mas, para ajudar na compreensão do modo em que o
Estado poderá agir, vamos falar rapidamente da diferença do que seria o atuar e o intervir na ordem
econômica.

Segundo Fabiano Del Masso (2013, e-book), o Estado poderá atuar ou intervir, sendo que as duas
representam situações diferentes, pois uma refere-se à atuação normal do Estado enquanto agente
econômico que age para atender e suprir as necessidades da sociedade e a outra relaciona-se à
atividade regulatória do mercado que o Estado tem quando intervém na ordem econômica.

Mesmo que seja utilizada a expressão intervenção, que, como dito, pode ser utilizada para as duas
situações em menção, o importante é saber que há formas diferentes em que o Estado irá atuar na
atividade econômica: intervindo diretamente (como agente econômico em competição com a
iniciativa privada, em regime de monopólio ou em parceria com a iniciativa privada) ou intervindo
indiretamente (regulando, fiscalizando, incentivando, normatizando e planejando) (MASSO, 2013, e-
book). A CF/88 regulamenta quatro modos de intervenção: como agente econômico em sentido

48
estrito, como prestador de serviços públicos, como agente econômico em regime de monopólio e
como agente regulador:

➢ Como agente econômico em sentido estrito (stricto sensu): em regra, a atividade


econômica em sentido estrito cabe ao setor privado; o Estado somente atuará diretamente
na economia, como agente produtivo, quando necessário “aos imperativos da segurança
nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei” (art. 173, caput,
CF/88). Fala-se que a atuação do Estado segue o chamado princípio da subsidiariedade:
“somente quando a iniciativa privada não tiver capacidade de atuar suficientemente em
determinado setor econômico (ou não tiver interesse), deve o Estado colmatar essa lacuna”
(PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p.1033);

➢ Como prestador de serviços públicos (art. 175, caput, CF/88): “Incumbe ao Poder
Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre
através de licitação, a prestação de serviços públicos”;

➢ Como agente econômico em regime de monopólio (incisos I a V, art. 177, CF/88): há


casos em que a CF/88 impõe ou autoriza a exploração da atividade econômica pelo Estado,
estabelecendo o monopólio da União. Tais atividades são enumeradas em rol exaustivo nos
incisos de I a V do art. 177:

Art. 177. Constituem monopólio da União:


I. A pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros
hidrocarbonetos fluidos;
II. A refinação do petróleo nacional ou estrangeiro;
III. A importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das
atividades previstas nos incisos anteriores;
IV. O transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados
básicos de petróleo produzidos no país, bem assim o transporte, por meio de
conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem;
V. A pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o
comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos
radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser
autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso xxiii do
caput do art. 21 desta constituição federal.

Poderão ser contratadas pela União empresas estatais ou privadas para a realização das atividades
previstas nos incisos I a IV, desde que atendidas as condições estipuladas pelos incisos I, II e III do
§2º do art. 177:
I. A garantia do fornecimento dos derivados de petróleo em todo o território nacional;
II. As condições de contratação;
III. A estrutura e atribuições do órgão regulador do monopólio da união.

➢ Como agente regulador (art. 174, CF/88): consiste na atuação indireta na economia por
parte do Estado: “Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este
determinante para o setor público e indicativo para o setor privado” (caput, art. 174). A
atuação como agente regulador, que se dá por meio de fiscalização, incentivo e
planejamento,

49
[...] abrange as normas que disponham especificamente sobre a atuação dos agentes
econômicos, condicionando, coordenando e disciplinando a atividade econômica
privada (delineando os assim chamados “marcos regulatórios” de cada setor
econômico), mas também inclui medidas concretas de intervenção na economia,
como tabelamento de preços, formação de estoques reguladores para controle de
abastecimento, garantia de preços mínimos para produtos agrícolas etc. Engloba,
ainda as atividades administrativas de fiscalização, solução de litígios, repressão às
infrações administrativas etc. Merece especial menção, aqui, a atuação das agências
reguladoras (que recebem essa denominação exatamente em função de sua
finalidade específica) (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p.1044);

A ação regulatória do Estado ocorre para garantir os fundamentos e o fim da ordem econômica, pois, apesar
de ser de livre iniciativa e livre exercício, deve-se buscar a valorização do trabalho humano, a justiça social e
a garantia de uma existência digna (art. 170, caput, CF/88).

4.4 O sistema financeiro nacional


O Sistema Financeiro Nacional é previsto unicamente no artigo 192 da CF/88 e cuida “das instituições
financeiras creditícias, públicas ou privadas, de seguro, previdência (privada) e capitalização, todas
sob estrito controle do Poder Público” (SILVA, 2013, p. 837). Somente pode ser regrado por Lei
Complementar; atualmente a sua principal regulamentação se dá, principalmente, pela Lei
4.595/1964, que foi recepcionada pela Constituição como complementar.

O artigo 192 estabelece que o sistema financeiro nacional deve ser “estruturado de forma a promover
o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade”. Tal regra é válida
tanto para instituições públicas quanto para as privadas, devendo todas cumprirem as suas funções
sociais (SILVA, 2013, p. 839), dialogando com os princípios da ordem econômica.

A participação do capital estrangeiro nas instituições que integram o sistema financeiro nacional deve
ser regrada por lei complementar (art. 192, caput, última parte, CF/88), a fim a atender aos requisitos
relacionados ao desenvolvimento equilibrado do Estado e aos interesses da coletividade.

O STF resolveu uma discussão relacionada à possibilidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor
às instituições bancárias, pois havia o argumento de não ser possível em razão do art. 182 da CF/88 mencionar
que será lei complementar a responsável pela regulamentação das partes que compõem o sistema financeiro
nacional, característica que o CDC não possui. Apesar disso, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 2591/DF,
de 07.06.2006, decidiu que é possível a aplicação do CDC, o que traz uma maior proteção aos usuários de
sistema bancário, que são considerados consumidores e, por isso, terão os benefícios trazidos pelo Código
Consumerista:
“O Supremo Tribunal Federal já decidiu que o Código de Defesa do Consumidor
(CDC) é aplicável às relações entre as instituições financeiras e seus usuários.
Entendeu a Corte não haver conflito entre o regramento do sistema financeiro e a
disciplina do consumo e da defesa do consumidor, haja vista que, nos termos do
disposto no art. 192 da Constituição, a exigência de lei complementar refere-se
apenas à regulamentação da estrutura do sistema financeiro, não abrangendo os
encargos e obrigações impostos pelo CDC às instituições financeiras, relativos à

50
exploração das atividades dos agentes econômicos que a integram — operações
bancárias e serviços bancários” (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 1051).

Considerações Finais
Neste capítulo estudamos a ordem econômica e financeira definida pelo CF/88, iniciando-se com a
apresentação dos conceitos principais para a melhor compreensão de como ocorre a relação entre
Estado e economia.

Após verificarmos o que fundamenta e qual é o fim da ordem econômica, seguimos para os princípios
constitucionais que a regulam, concluindo que, apesar de estruturar-se através do ideal capitalista e
com princípios próprios do liberalismo, a CF/88 desenvolveu mecanismos para limitar a atuação sem
freios do mercado, que poderia ferir os valores humanos garantidos em seu texto.

A CF/88 estabelece que a ordem econômica tem por fundamentos a livre iniciativa e a valorização do trabalho
humano e por finalidade a justiça social e a garantia de uma existência digna (art. 170, caput, CF/88).
A atividade econômica, qualquer que seja, é considerada de livre exercício, sendo-lhe assegurado, também,
que não há necessidade de autorização dos órgãos públicos, sendo excepcionais as situações em que a
lei estabelecer o contrário (art. 170, parágrafo único, CF/88).
A ordem econômica possui princípios básicos previstos no artigo 170, dos incisos I a IX, assim ela será
regida pelos princípios da soberania nacional, da propriedade privada, da função social da propriedade,
da livre concorrência, da defesa do consumidor, da defesa do meio ambiente, da redução das
desigualdades regionais e sociais, da busca do pleno emprego e do tratamento favorecido para as
empresas de pequeno porte nacionais.
O Estado poderá, excepcionalmente, quando estabelecido em lei, atuar na ordem econômica. Pode-se
enumerar quatro formas em que tal atuação poderá ocorrer: como agente econômico em sentido estrito
(stricto sensu), quando, em razão de uma necessidade de segurança nacional ou por interesse coletivo (art.
173, caput, CF/88), seguindo-se a ideia de uma atuação subsidiária à da iniciativa privada; como prestador de
serviços públicos (art. 175, caput, CF/88); como agente econômico em regime de monopólio de atividades
específicas, que constam no art. 177, incisos I a V, CF/88 como de exploração estrita por parte da União; e,
por último, como agente regulador, quando o Estado atua de forma direta na economia com o objetivo de
regulamentar e fiscalizar as atividades econômicas (art. 174, CF/88).
Por fim, há o Sistema Financeiro Nacional, que será responsável por cuidar e controlar das instituições
financeiras de crédito, de seguro, de previdência privada e capitalização. A estrutura do sistema financeiro
nacional deve ser feita de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir os interesses
da coletividade (art. 192, caput, CF/88), que também deve nortear a participação do capital estrangeiro em
tais instituições (art. 192, caput, última parte, CF/88).

A soberania nacional, a propriedade privada, a função social da propriedade, a livre concorrência e a defesa
do meio ambiente são princípios vinculados:
a) À ordem social.
b) À administração pública.

51
c) Ao sistema tributário nacional.
d) À ordem econômica brasileira.
e) À intervenção federal nos Estados.

Resposta Correta: Alternativa D

Questão Objetiva
Ocorre intervenção no domínio econômico quando o Estado
a) Não determina fiscalização da atividade econômica, mas seu planejamento estratégico para os setores
públicos e privados.
b) Configura uma estratégia de enfrentamento à anarquização das relações econômicas que decorrem de
um modelo limitado de ingerência do Estado.
c) Determina, de forma absoluta, a atividade econômica, visando à realização dos fins de um Estado Social.
d) Determina os conceitos de mercado, propriedade privada dos bens de produção e liberdade de iniciativa
econômica.
e) Não determina, de forma absoluta, a atividade econômica, deixando espaço à manifestação da liberdade
de iniciativa.

Questão Discursiva
Com relação às modalidades de intervenção do Estado na ordem econômica, julgue como certa ou errada a
seguinte afirmativa: “O constituinte reservou ao Estado o monopólio de duas importantes matrizes energéticas
— combustível fóssil derivado e materiais nucleares —, tendo detalhado hipóteses de atuação nesses
segmentos, sem prejuízo de outras a serem definidas em lei.”

Agente econômico: representa, para a economia, o sujeito que desenvolve a atividade econômica, seja ela
de produção ou de consumo.
Atividade econômica: consumo ou produção de bens e serviços voltados para satisfazer as necessidades
humanas.
Cartel: é um acordo feito por diferentes empresas para a padronização dos preços nos mesmos produtos, com
o objetivo de aumentar a margem de lucro. Diferentemente do truste, não precisa de uma união empresarial
para que ocorra, mas apenas um acordo expresso entre as organizações.
Direito Econômico: “disciplina que possui a particularidade de cuidar, sobretudo, da intervenção do Estado
no domínio econômico, ou seja, os parâmetros normativos criados pelo Estado de Direito no delineamento das
práticas econômicas, seja instituindo políticas específicas, coibindo condutas, prevendo as formas de
fiscalização, regulação e participação do Estado na atividade econômica.” (MASSO, 2013, e-book).
Truste: estrutural empresarial que reúne várias empresas, que, mesmo já detendo a maior parte de um
determinado mercado, unem-se para controlá-lo, fixando preços altos para aumentar o lucro.

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Também é tratada dentro da ordem econômica e financeira a chamada política urbana (art. 182 e 183, CF/88)
e a política agrícola e fundiária e a de reforma agrária (art. 184 a 191, CF/88).
A política urbana está relacionada ao desenvolvimento urbano, executado pelos municípios de acordo com as
diretrizes fixadas pelo Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001). É política que visa ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes (art. 182, CF/88),
estimulando o adequado aproveitamento da propriedade urbana, sob pena de parcelamento ou edificação
compulsórios, progressão do valor do IPTU e desapropriação (art. 182, §4º, I, II e III, CF/88).
Já a política agrícola visa garantir a função social do imóvel rural, sob a competência da União, que poderá
desapropriá-lo por interesse social, mediante prévia e justa indenização (art. 184).

RESPOSTAS
Questão Objetiva
Resposta Correta: Alternativa D

Questão Discursiva
Resposta Padrão: A afirmação está errada, pois o art. 177 da CF/88 traz lista taxativa que não comporta
outras hipóteses definidas em lei.

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 20ª ed. São Paulo: Saraivajur, 2014.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31ª ed. São Paulo: Malheiros editores, 2010.
MASSO, Fabiano Del Masso. Direito Econômico Esquematizado. São Paulo: MÉTODO, 2013.
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. São Paulo, MÉTODO, 2020.
PISCITELLI, Tathiane. Direito financeiro. 6ª ed. São Paulo: MÉTODO, 2018.
SILVA, José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo.

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UNIDADE III
CAPÍTULO 5 - A DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES
DEMOCRÁTICAS
No término deste capítulo, você deverá saber:

✓ Do conceito e requisitos do Sistema Constitucional de Crises;


✓ As regras relativas ao estado de defesa e de sítio;
✓ A função e estruturação das Forças Armadas;
✓ A organização e distribuição de funções da segurança pública.

Introdução

Trataremos neste capítulo sobre a defesa do Estado e das instituições democráticas, abordados na
CF/88 em seu Título V, que começa partir do art. 136. Assim, dentro da temática relacionada à
defesa, a CF regulamenta: i) o seu Sistema Constitucional de Crises, que admite a adoção de
medidas de exceção, os chamados estado de defesa (art. 136, CF/88) e estado de sítio (art. 137 a
139, CF/88) para o restabelecimento da normalidade constitucional; ii) a defesa do Estado ou da
sociedade, através das Forças Armadas (art. 142 a 143, CF/88) e da Segurança Pública (art. 144,
CF/88), por meio da defesa territorial contra invasão estrangeira (art. 34, lI, e 137, lI), da defesa da
soberania nacional (art. 91) e da defesa da Pátria (art. 142).

Mediante o Sistema Constitucional de Crises instaura-se um estado de exceção para administrar


situações que põem em risco a ordem constitucional e, por consequência, a democracia. Esse
desequilíbrio da ordem constitucional poderá ocorrer em razão de eventual desarmonia decorrente
da coexistência entre grupos sociais que pregam valores diferentes, guerra ou agressão armada
externas e até calamidades naturais de grandes dimensões. Como a manutenção de tal estado de
desequilíbrio põe em risco a ordem constitucional, podendo gerar o rompimento das instituições
democráticas (SILVA, 2013, p. 773), a Constituição prevê a possibilidade de utilização de algumas
medidas de exceção para o reestabelecimento da ordem.

Tais medidas de exceção consistem nos chamados estado de defesa e estado de sítio, que,
enquanto estiverem vigorando, possibilitarão que o Estado aja de forma mais repressiva, tendo em
vista que alguns direitos fundamentais individuais passam por restrição ou suspensão – efeitos estes
sempre provisórios e dentro dos limites da permissão Constitucional, com a finalidade de não permitir
que o Estado aja de acordo com o seu próprio arbítrio.

Como mencionado, outro braço relacionado à defesa é o das forças armadas e da segurança pública,
cujas funções e organização serão verificados em seção própria. Segundo a doutrina, a sua
regulamentação dentro do título que trata da defesa possibilita a interpretação de que tais instituições
estão constitucionalmente comprometidas com o regime democrático, o que faz com que qualquer
desrespeito aos direitos fundamentais seja mais grave por parte de seus agentes (SILVA, 2013, p.
772).

54
5.1 O Sistema Constitucional de Crises

Como visto, para lidar com situações que caracterizam uma crise constitucional, a CF/88 traz em seu
texto medidas excepcionais para preservar o equilíbrio de forças existente dentro do Estado
democrático de direito por ela delineado.

Sobre o estado de crise constitucional e a necessidade de restabelecimento da ordem:

Esse equilíbrio de forças é o que caracteriza – e preserva – a ordem jurídica


constitucional. Assim, enquanto a concorrência entre os diferentes grupos estiver
ocorrendo dentro dos limites constitucionais, a democracia e as instituições do Estado
estarão preservadas. Entretanto, quando a competição entre os grupos sociais
extrapola os parâmetros jurídicos preestabelecidos, surge a chamada crise
constitucional, que, se não for bem administrada, provocará o rompimento do equilíbrio
constitucional, fragilizando as instituições democráticas (PAULO; ALEXANDRINO,
2020, p. 969).

A instauração de um estado de exceção, ou seja, do estado de defesa ou de sítio, é manifestação


do assim denominado sistema constitucional de crises, que é conceituado como

o conjunto ordenado de normas constitucionais, que, informadas pelos princípios da


necessidade e da temporariedade, tem por objeto as situações de crises e por
finalidade a mantença ou o restabelecimento da normalidade constitucional (SANTOS,
Aricê Moacyr Amaral apud SILVA, José Afonso da, 2013, p. 773, grifo nosso).

Como visto no conceito acima, há menção de que a necessidade e a temporariedade são princípios
que devem guiar a aplicação do Estado de defesa e de sítio, sendo imprescindíveis para a validade
da implementação dos Estados de Exceção (SILVA, 2013, p. 773). A doutrina (PAULO;
ALEXANDRINO, 2020, p. 969) ainda acrescenta pelo menos mais um requisito: o da obediência
irrestrita aos comandos constitucionais. Vejamos mais sobre cada um desses princípios do
Sistema Constitucional de Crises:

• Necessidade: são medidas que “só deverão ser decretadas diante de situações fáticas cuja
gravidade torne imprescindível a sua adoção” (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 969). A
doutrina estabelece que desrespeitar esse princípio resultaria em arbítrio e verdadeiro golpe
de Estado (SANTOS, Aricê Moacyr Amaral apud SILVA, José Afonso da, 2013, p. 774);
• Temporariedade: “deverão vigorar somente pelo prazo necessário ao restabelecimento da
normalidade, sob pena de se converterem em arbítrio ou ditadura” (PAULO; ALEXANDRINO,
2020, p. 969; SANTOS, Aricê Moacyr Amaral apud SILVA, José Afonso da, 2013, p. 774);
• Obediência irrestrita aos comandos constitucionais: o Estado não poderá agir
arbitrariamente: “a atuação do Estado deverá obedecer fielmente às regras e limites
constitucionais, sob pena de ulterior responsabilização – política, criminal e cível – dos
executores (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 969).

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A seguir veremos em quais situações os estados de defesa e de sítio poderão ser decretados, além
das regras relativas ao procedimento, à duração e à fiscalização da atuação do Estado e quais
medidas coercitivas poderão ser adotadas. Cada uma das medidas relativas ao estado de exceção
será tratada em seções individualizadas, a fim de facilitar a compreensão.

Lembre-se de sempre consultar a Constituição Federal para melhor fixação da matéria:

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>.

5.2 O estado de defesa

O estado de defesa é espécie de estado de exceção pelo qual se objetiva a manutenção ou


restauração da ordem pública abalada por instabilidades institucionais ou graves calamidades
naturais. Ele traz restrições menos rigorosas que o estado de sítio, que será estudado no item 5.2.
Assim como no estado de sítio, a competência para a sua decretação é privativa ao Presidente da
República (art. 84, IX, CF/88).

→ Pressupostos para a decretação: a CF/88 trata do estado de defesa em seu artigo 136.
Através da leitura de seu caput, vê-se que o objetivo do estado de defesa é “preservar ou
prontamente restabelecer a ordem pública ou a paz social”. Essa finalidade é direcionada para a
concretização de duas hipóteses que podem perturbar o que a CF/88 chamou de “ordem pública ou
paz social”:
• situações de grave e iminente instabilidade institucional;
• ocorrência de calamidades de grandes proporções na natureza.

Além disso, ainda traz mais dois requisitos:

• Consulta prévia ao Conselho da República (art. 89 e 90, CF/88) e o Conselho de Defesa


Nacional (art. 91, CF): apesar desses órgãos serem apenas consultivos – e, por causa disso,
não emitirem parecer vinculante, o que possibilita ao Presidente da República decretar o estado
de defesa mesmo havendo parecer em contrário – sua manifestação é obrigatória, sob pena
de inconstitucionalidade da decretação do estado de defesa (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p.
971);
• A ocorrência deve limitar-se a locais restritos e determinados: revoltas populares ou um
desastre ambiental a ponto de ameaçar a ordem pública e a paz social de determinado local do
país. Mesmo assim, é importante destacar que, para a CF/88, apenas uma calamidade de
grandes proporções que gere grave perturbação possibilita a decretação do estado de defesa
(PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 971).
Quanto à área abrangida, ela será especificada no decreto presidencial que instituiu o estado de
defesa (§2º, art. 136, CF/88). Ainda sobre a abrangência do estado de defesa:

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A Constituição Federal não estabelece limites objetivos para a definição de “locais
restritos e determinados”, mas uma interpretação sistemática do texto constitucional
leva a concluir que não pode ela ter amplitude nacional, pois, nesse caso (isto é, no
caso de comoção grave de repercussão nacional), a medida a ser adotada seria o
estado de sítio, conforme determina o art. 137, I, da Lei Maior (PAULO;
ALEXANDRINO, 2020, p. 972).

→ Prazo de duração: o estado de defesa poderá durar no máximo 30 dias, podendo ser
prorrogado somente uma única vez, por período não superior a 30 dias, caso a ordem pública e a
paz social ainda não tenham sido restauradas (art. 136, §2º, CF/88). Caso as situações que
justificaram a decretação do estado de defesa não tenham sido superadas mesmo após o período
de prorrogação, deverá ser decretado o estado de sítio (art. 137, I, CF/88).
→ Medidas coercitivas que podem ser adotadas: nos termos do §1º do art. 136, o decreto
que instituir o estado de defesa indicará, nos termos e limites da lei, quais das medidas coercitivas
apontadas nos incisos I e II entrarão em vigor. As medidas poderão ser:
• Para qualquer hipótese de decretação: art. 136, §1º, inciso I: restrições aos direitos de
reunião, ainda que exercida no seio das associações (alínea a), sigilo de correspondência
(alínea b) e sigilo de comunicação telegráfica e telefônica (alínea c);
• Somente para a hipótese de calamidade de grandes proporções: art. 136, §1º, inciso II:
ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública,
respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.

A decretação do estado de defesa e do estado de sítio está sujeita a controle político (imediato, concomitante
e sucessivo), exercido pelo Congresso Nacional, e a controle jurisdicional (imediato e concomitante), de
responsabilidade do Poder Judiciário (LENZA, 2021). Como o controle político concomitante e sucessivo e o
controle jurisdicional imediato ao estado de defesa e de sítio, eles serão abordados na seção que trata dos
controles comuns aos dois institutos.

→ Controle político e jurisdicional:


• Controle político imediato: art. 136, §§ 4º a 7º, CF/88: após decretar o estado de defesa ou
a sua prorrogação, o Presidente da República entregará, em 24 horas, o decreto para o
Congresso Nacional (§ 4º), que em 10 dias deverá apreciá-lo (§6º). Caso o decreto seja
rejeitado, o estado de defesa cessará imediatamente (§7º);

• Controle jurisdicional concomitante: art. 136, §3º, CF/88: há algumas regras referentes à
prisão durante o período de vigência do estado de defesa. Nenhuma pessoa poderá ser
mantida presa ou detida por período superior a 10 dias, exceto se houve autorização do Poder
Judiciário (art. 136, §3º, inciso III, CF/88), além de ser vedada a sua incomunicabilidade
enquanto estiver presa (art. 136, §3º, inciso IV, CF/88). Com relação à prisão por crimes
cometidos contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada
imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso
requerer exame de corpo de delito à autoridade policial (art. 136, §3º, inciso I, CF/88). A

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comunicação da prisão será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico
e mental do detido no momento de sua autuação (art. 136, §3º, inciso II, CF/88).

5.3 O estado de sítio

Assim como o estado de defesa, o estado de sítio deverá ser decretado pelo Presidente da
República, tendo em vista ser sua competência privativa (art. 84, IX, CF/88). Ele será utilizado nas
situações em que há comoção grave de repercussão nacional, quando o estado de defesa for ineficaz
e quando for declarado estado de guerra ou em resposta a agressão armada estrangeira.

→ Pressupostos: o estado de sítio é abordado pelo artigo 137, incisos I e II, da CF/88.
Analisando o dispositivo constitucional, vê-se que são três as hipóteses necessárias para que o
estado de sítio possa ser decretado:
• comoção grave de repercussão nacional (art. 137, inciso I);
• ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de
defesa (art. 137, inciso I);
• declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira (art. 137, inciso
II).

Veja que há uma maior amplitude da situação de crise, que não é mais restrita, e sim a nível nacional, como
indica a primeira parte do inciso I do art. 137. Além disso, na segunda parte do inciso I do art. 137, a situação
aponta maior gravidade, já que o estado de defesa se mostra ineficiente. O inciso II reforça ainda mais a
seriedade da aplicação da medida ao indicá-la em situações de guerra ou resposta a agressão armada
estrangeira.

Outros requisitos são:

• Consulta prévia ao Conselho da República (art. 89 e 90, CF/88) e ao Conselho de Defesa


Nacional (art. 91, CF): no estado de sítio, assim como no de defesa, também há a
necessidade de manifestação desses órgãos consultivos (art. 137, caput, CF/88);

• Autorização do Congresso Nacional: uma característica própria do estado de sítio, que o


diferencia do estado de defesa, é a necessidade de que o Presidente da República solicite a
autorização do Congresso Nacional para a sua decretação (art. 137, caput, CF/88). Ao
solicitar autorização para decretar o estado de sítio ou sua prorrogação, o Presidente da
República relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional
decidir por maioria absoluta (art. 137, parágrafo único, CF/88).
O decreto do estado de sítio indicará sua duração, as normas necessárias à sua execução e as
garantias constitucionais que ficarão suspensas. Depois de publicado, o Presidente da República
designará o executor das medidas específicas e as áreas abrangidas (art. 138).

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→ Prazo de duração: há duas regras referentes à duração do estado de sítio, aplicando-se uma
ou outra dependendo da hipótese que o fundamenta:
• O estado de sítio que se fundamenta na ocorrência de comoção grave de repercussão
nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o
estado de defesa, previstas no inciso I do artigo 137, não poderá ser decretado por mais de
30 dias, nem prorrogado, de cada vez, por prazo superior (art. 138, §1º, primeira parte,
CF/88).
• Já o que se justifica em declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada
estrangeira, como indica o inciso II do artigo 137, poderá ser decretado por todo o tempo que
perdurar a guerra ou a agressão armada estrangeira (art. 138, §1º, segunda parte, CF/88).
→ Medidas coercitivas que podem ser adotadas:
• no caso do art. 137, I: somente poderão ser tomadas as medidas constantes do inciso I ao
VII do art.139;
• no caso do art. 137. II: qualquer garantia constitucional poderá ser suspensa, desde que:
se atenda a necessidade e temporariedade da medida (enquanto durar a guerra ou resposta
a agressão armada estrangeira); haja prévia autorização do Congresso Nacional; e que no
decreto constem as garantias constitucionais que ficarão suspensas (LENZA, 2021).
→ Controle político e jurisdicional:
• Controle Político Prévio: art. 137, caput, CF/88: a necessidade de autorização do
Congresso Nacional é um modo de controle político no estado de sítio;
• Controle Jurisdicional Concomitante: através de remédios constitucionais, pois o Poder
Judiciário não poderá apreciar qualquer lesão ou ameaça a direito e abuso ou excesso de
poder (LENZA, 2021).

5.4 Controles comuns aos estados de defesa e sítio:

• Controle Político Concomitante: art. 140, CF/88: a Mesa do Congresso Nacional, ouvidos
os líderes partidários, designará Comissão composta de cinco de seus membros para
acompanhar e fiscalizar a execução das medidas referentes ao estado de defesa ou de sítio;
• Controle Político Sucessivo (ou a posteriori): art. 141, parágrafo único, CF/88: logo que
cesse o estado de defesa ou de sítio, as medidas aplicadas em sua vigência serão relatadas
pelo Presidente da República, em mensagem ao Congresso Nacional, com especificação e
justificação das providências adotadas, com relação nominal dos atingidos e indicação das
restrições aplicadas.
• Controle Jurisdicional Sucessivo (ou a posteriori): art. 141, caput, CF/88: cessado o
estado de defesa ou de sítio, cessarão também seus efeitos, sem prejuízo da
responsabilidade pelos ilícitos cometidos por seus executores ou agentes.

5.5 Forças armadas

Regidas nos artigos 142 e 143 da CF/88, as Forças Armadas são constituídas pela Marinha, pelo
Exército e pela Aeronáutica. São instituições nacionais, permanentes e regulares, que têm por
objetivo (art. 142, CF/88):

• a defesa da Pátria: “contra agressões estrangeiras em caso de guerra externa” (SILVA,


2013, p. 784);

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• a garantia dos poderes constitucionais: “[...] defesa das instituições democráticas, pois a
isso corresponde a garantia dos poderes constitucionais, que, nos termos da Constituição,
emanam do povo (art. 1º, parágrafo único)” (SILVA, 2013, p. 784);
• por iniciativa de qualquer dos Poderes, da lei e da ordem: atuação subsidiária e eventual,
pois:
essas atribuições são ordinariamente desempenhadas pelas forças da segurança pública, que
compreendem a polícia federal e as polícias civil e militar dos estados e do Distrito Federal.
Tanto é assim que a intervenção das forças armadas na defesa da lei e da ordem depende da
iniciativa de um dos Poderes constitucionais, vale dizer, do Supremo Tribunal Federal, do
Congresso Nacional ou da Presidência da República. Sem a provocação de um desses
Poderes, a atuação das forças armadas na garantia da lei e da ordem pública é inconstitucional
(PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 981).

Para acompanhar a matéria, recomendamos o livro de Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado,
que traz informações sobre questões atuais e jurisprudência dos Tribunais Superiores.

A hierarquia e a disciplina são as bases da organização das Forças Armadas, sendo que a autoridade
e a responsabilidade crescem com o grau hierárquico (LENZA, 2021). Elas estão sob a autoridade e
comando supremos do Presidente da República, a quem é atribuída a função de nomear os
comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, promover seus oficiais-generais e nomeá-
los para os cargos que lhes são privativos (Art. 84, XIII, CF/88).

Como as Forças Armadas são organizadas com base na hierarquia e na


disciplina, atualmente temos o seguinte: internamente, elas se subordinam,
hierárquica e disciplinarmente, aos respectivos Comandantes do Exército, da
Aeronáutica e da Marinha, todos integrados no Ministério da Defesa, devendo
ser obedientes, ainda, ao Presidente da República, que corporifica o comando
supremo das três forças (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 982).

Aos seus membros dá-se o nome de militares; o serviço militar será obrigatório (art. 143, CF/88),
excetuadas as mulheres e os eclesiásticos, que são isentos (§2º, art. 143). Aos militares a CF/88
reserva boa parte de suas disposições sobre as forças armadas: incisos I a X, §3º, art. 142, CF/88.

Consulte a CF/88 para conhecer o regramento dado aos militares. Para isso, procure o §3º do artigo 142 e leia
os incisos I a X no link abaixo.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>.

60
5.6 Segurança pública

Regulamentada no artigo 144 da CF/88, a segurança pública é considerada um dever do Estado e


um direito e responsabilidade de todos. Visa preservar a ordem pública e a incolumidade das pessoas
e do patrimônio, sendo exercida através dos seguintes órgãos (art. 144, inciso I a VI, CF/88):

• Polícia Federal: art.144, § 1°, I a IV, CF/88: instituída por lei como órgão permanente,
organizado e mantido pela União, compõe a estrutura básica do Ministério da Justiça e tem
suas atribuições definidas nos incisos de I a IV, § 1°, art. 144:
I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento
de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e
empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha
repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme,
segundo se dispuser em lei;
II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o
contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros
órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;
III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras;
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.

• Polícia Rodoviária Federal: art.144, § 2º, CF/88: é órgão permanente, organizado e mantido
pela União e estruturado em carreira. Destina-se ao patrulhamento ostensivo das rodovias
federais;
• Polícia Ferroviária Federal: art.144, § 3º, CF/88: órgão permanente, organizado e mantido
pela União e estruturado em carreira. Destina-se ao patrulhamento ostensivo das ferrovias
federais;
• Polícias Civis: art.144, § 4º, CF/88: dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem,
ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações
penais, exceto as militares;
• Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares: art.144, § 5º: às polícias militares
cabem o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros
militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa
civil;
• Polícias Penais Federais, Estaduais e Distritais: art.144, § 5º-A: às polícias penais,
vinculadas ao órgão administrador do sistema penal da unidade federativa a que pertencem,
cabe a segurança dos estabelecimentos penais.

→ Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios: a eles estão


subordinadas: as polícias militares e os corpos de bombeiros militares, as forças auxiliares e a
reserva do Exército, as polícias civis e as polícias penais estaduais e distrital (§ 6º, art. 144, CF/88).

→ Guarda municipal: art.144, § 8º: a Constituição não autorizou que os Municípios criassem
órgão policial de segurança ou polícia judiciária, mas somente guardas municipais, cuja atividade
estará destinada à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei (§8º).
Assim, a Guarda Municipal assegurará “a incolumidade do patrimônio municipal, que envolve bens
de uso comum do povo, bens de uso especial e bens patrimoniais, mas não é de polícia ostensiva”
(SILVA, p. 794).

61
Considerações Finais

Neste capítulo foi apresentada a estrutura dada pela Constituição Federal à Defesa do Estado e das
instituições democráticas, que é dividida em dois grandes temas, um relativo ao Sistema
Constitucional de Crises e outro voltado às forças armadas e à segurança pública.

Analisou-se como situações de desequilíbrio da ordem constitucional podem ser danosas ao regime
democrático, fato que fundamenta a possibilidade de instauração, por parte do Presidente da
República, de estado de exceção provisório para a restauração da normalidade. Assim, através dos
mecanismos do estado de defesa e do estado de sítio, sendo este muito mais restritivo que aquele,
determinados direitos fundamentais são suspensos temporariamente para viabilizar o controle de
situações em que a instabilidade institucional ou calamidades naturais perturbem a ordem pública ou
a paz social (estado de defesa) ou, em casos mais graves, em que haja comoção grave de
repercussão nacional, ineficácia das medidas tomadas durante o estado de defesa, declaração de
guerra ou resposta a agressão armada estrangeira (estado de sítio).

Voltando-se à defesa do Estado de forma regular, conheceu-se as instituições que compõem as


forças armadas, a fim de examinar seu modo de organização e objetivos, bem como estudou-se o
regramento da segurança pública, suas instituições e objetivos.

Conceitua-se o Sistema Constitucional de Crises como o conjunto de normas voltadas para administrar as
situações de crise, que têm o objetivo de manter ou restabelecer a normalidade constitucional. Para a utilização
das medidas que o compõem, o sistema somente será utilizado seguindo os princípios da: necessidade
(quando a adoção de medidas excepcionais for imprescindível), temporariedade (as medidas terão validade
apenas pelo tempo necessário ao restabelecimento da normalidade) e obediência irrestrita aos comandos
constitucionais (a ação do Estado deverá ser guiada pelas regras e limites fixados na CF).

O estado de defesa será aplicável para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e
determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçada por grave e iminente instabilidade institucional ou
atingida por calamidades de grandes proporções na natureza (art. 136). Será decretado pelo Presidente da
República após serem ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional (art. 136).

Durará pelo prazo máximo de 30 dias, podendo ser prorrogado somente uma única vez, por período não
superior a 30 dias, caso a ordem pública e a paz social ainda não tenham sido restauradas (art. 136, §2º,
CF/88).

O decreto de instituição do estado de defesa indicará, nos termos e limites da lei, quais das medidas
coercitivas apontadas nos incisos I e II, do §1º do art. 136, entrarão em vigor: para qualquer das hipóteses
de decretação, poderão ser usadas as medidas indicadas no inciso I (alínea a: restrições aos direitos de
reunião, ainda que exercida no seio das associações; alínea b: sigilo de correspondência; alínea c: sigilo de
comunicação telegráfica e telefônica); e para a hipótese de calamidade de grandes proporções, poderão
ser usadas as do inciso II (ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade
pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes).

Já no estado de sítio (art. 137, I e II, CF/88), o Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República
e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de
sítio nos casos: i) de comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a

62
ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa – caso em que o estado de sítio não poderá ser
decretado por mais de 30 dias, nem prorrogado, de cada vez, por prazo superior (art. 138, §1º, primeira parte,
CF/88) e no qual poderão ser adotadas as medidas coercitivas inciso I ao VII do art.139; ii) declaração de
estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira – caso em que poderá ser decretado por todo
o tempo que perdurar a situação (art. 138, §1º, segunda parte, CF/88) e qualquer garantia constitucional
poderá ser suspensa, nos termos do art. 137, II, CF/88.

As Forças Armadas (art. 142 e 143 da CF/88) são constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela
Aeronáutica. São instituições nacionais, permanentes e regulares, que têm por objetivo a defesa da pátria, a
garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer dos Poderes, da lei e da ordem (art. 142).
São organizadas com base em hierarquia e disciplina e seu comando supremo é do Presidente da República
(art. 142). Seus membros têm o nome de militares e o serviço militar será obrigatório, exceto para as mulheres
e os eclesiásticos (art. 143, caput e §2º).

A Segurança Pública (art. 144, CF/88) é dever do Estado e um direito e responsabilidade de todos, que visa
preservar a ordem pública e a incolumidade das pessoas e do patrimônio, sendo exercida através dos
seguintes órgãos (art. 144, inciso I a VI, CF/88): Polícia Federal, art.144, § 1.°, I a IV, CF/88; Polícia
Rodoviária Federal, art.144, § 2º, CF/88; Polícia Ferroviária Federal, art.144, § 3º, CF/88; Polícias Civis,
art.144, § 4º, CF/88; Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, art.144, § 5º; e, por fim, pelas
Polícias Penais Federais, Estaduais e Distritais, art.144, § 5º-A. As guardas municipais não são órgãos
policiais e estarão voltadas para a proteção dos bens, serviços e instalações do município (art.144, §8º).

Alguns fatos podem abalar substancialmente a normalidade da vida em sociedade e as estruturas do Estado.
Como forma de defesa do estado e das instituições democráticas, a Constituição Federal brasileira estabeleceu
o sistema constitucional de crises e as formas de defesa do país ou da sociedade. Considerando-se a defesa
do Estado brasileiro e das instituições democráticas, são feitas as seguintes afirmações:

I. O estado de defesa tem por escopo preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e
determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçada por grave e iminente instabilidade
institucional ou atingida por calamidades de grandes proporções na natureza.
II. O Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional são órgãos consultivos do Presidente da
República, mas suas opiniões não vinculam a decisão do chefe do Executivo em se tratando da
necessidade da decretação do estado de defesa ou do estado de sítio.
III. O estado de sítio e o estado de defesa serão fiscalizados através do controle político concomitante,
em que a Mesa do Congresso Nacional, ouvidos os líderes partidários, designará Comissão composta
de cinco de seus membros para acompanhar e fiscalizar a execução das medidas adotadas.
Após a leitura, é possível concluir que:

a) As afirmações I, II e III estão corretas.


b) Apenas as afirmações I e II estão corretas.
c) Apenas as afirmações I e III estão corretas.
d) Apenas as afirmações II e III estão corretas.
e) Apenas a afirmação II está correta.
GABARITO: Letra A.

A questão trata do sistema constitucional de crises e apresenta afirmações próximas à letra da lei. A afirmação
correta é a de letra A, com base nas disposições constitucionais acerca do estado de defesa (art. 136, CF/88),
do estado de defesa e de sítio (art. 136 e 137, CF/88) e do controle político concomitante (art. 140, CF/88).

63
Questão Objetiva

Assinale a alternativa que indique característica que é comum ao estado de sítio e ao estado de defesa:

a) vedação à decretação da medida em todo o território nacional.


b) subordinação da medida à aprovação prévia do Congresso Nacional.
c) sujeição da medida à fiscalização por comissão do Congresso Nacional.
d) possibilidade de detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns.
e) titularidade exclusiva do Conselho de Defesa Nacional para a decretação.
Questão Discursiva

Em que situações é possível a instauração do estado de defesa? Explique e fundamente.

Soldo: nome dado à remuneração do militar;


a posteriori: expressão latina usada para indicar um momento posterior aos fatos ocorridos.

Dentro da temática das forças armadas, o STF já se manifestou em duas questões importantes:

• A primeira refere-se à interpretação do dispositivo constitucional que estabelece não ser cabível
habeas corpus em relação a punições disciplinares militares (art. 142, §2º). Apesar de ser necessário
limitar a interferência do judiciário nas penalidades militares, que se baseiam em regras bem mais
rígidas sobre disciplina e hierarquia que o meio civil (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 982), o STF
admitiu que essa vedação refere-se aos habeas corpus que abordam o mérito das sanções
disciplinares, sendo possível a impetração do remédio constitucional que pretenda o exame dos
“pressupostos de legalidade da medida adotada pela autoridade militar, tais como: a competência da
autoridade militar, o cumprimento dos procedimentos estabelecidos no regulamento militar, a pena
suscetível de ser aplicada ao caso concreto – dentre outros (HC 70.648/RJ, 1.a T, rel. Mini Moreira
Alves, DJU 04.03.1994);
• A outra questão relaciona-se ao valor correspondente à remuneração do serviço militar obrigatório, o
soldo, que poderá ser inferior ao salário-mínimo, “haja vista que os conscritos, na prestação do serviço
militar, não se enquadram como trabalhadores na acepção que o inciso IV do art. 7° da Constituição
Federal empresta ao conceito” (PAULO; ALEXANDRINO, 2020, p. 982). Este entendimento foi
consolidado na Súmula Vinculante nº 6/2008: “Não viola a Constituição o estabelecimento de
remuneração inferior ao salário-mínimo para as praças prestadoras de serviço militar inicial”.

64
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Presidência da
República, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso
em: 23 jul. 2021.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 25. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2021.
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 19. ed. São Paulo: Método,
2020.
SILVA, José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2013.

Questão Objetiva - GABARITO: Letra C.

Questão Discursiva - GABARITO: O estado de defesa poderá ser instaurado para preservar ou prontamente
restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçada por grave e
iminente instabilidade institucional ou atingida por calamidades de grandes proporções na natureza (art. 136).

65
UNIDADE III
CAPÍTULO 6 - DA ORDEM SOCIAL
No término deste capítulo, você deverá saber:

✓ No que consiste a ordem social;


✓ A base e o objetivo da ordem social;
✓ O agente detentor do planejamento das políticas sociais;
✓ A composição dada pela CF/88 à ordem social.

Introdução

Para finalizar os nossos estudos, veremos a chamada ordem social, que está intimamente
relacionada com os direitos sociais tratados no art. 6º da Constituição Federal; desta forma, estão
reunidos no Título VIII da CF/88, que trata da ordem social, os mecanismos e aspectos
organizacionais dos direitos sociais (SILVA, 2013, p. 287).

A Constituição Federal de 88 deixou para tratar da ordem social nos seus artigos finais, mas isso não
significa que a temática é desprezada pelo constituinte, muito pelo contrário; ela possui destaque
suficiente para que forme juntamente “com o título dos direitos fundamentais o núcleo substancial
do regime democrático instituído” (SILVA, 2013, p. 841). Assim, a partir do artigo 193, são
abordadas questões sobre diversas matérias, sendo que muitas forçosamente são enquadradas no
conceito de ordem social, como é o caso da ciência, tecnologia e inovação, do meio ambiente e dos
índios, assuntos “que serão tratados dentro de um contexto bastante alargado de ordem social,
simplesmente pela conveniência didática da sequência apresentada pela Constituição” (LENZA,
2021).

Para dar início aos estudos da ordem social, precisamos conhecer seus aspectos gerais, que
norteiam toda a sua regulamentação. Quanto aos valores que regem a ordem social, a CF/88 indica
o primado do trabalho, que é a sua base, e o bem-estar e a justiça social, que são seus objetivos
(art. 193, caput, CF/88). É nos valores que ordem econômica e social encontram um ponto em
comum, já que ambas se baseiam “na valorização do trabalho e têm como fim (objetivo) assegurar
a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social” (SILVA, p. 841, 2013).

Com relação às políticas sociais, será função do Estado o seu planejamento, sendo assegurada, na
forma da lei, a participação da sociedade nos processos de formulação, de monitoramento, de
controle e de avaliação dessas políticas (art. 193, parágrafo único, CF/88).

Partamos, agora, para a análise de cada componente da ordem social, seguindo a ordem dada pela
própria CF/88: seguridade social (art. 194 a 204); educação, cultura e desporto (art. 205 a 217);
ciência, tecnologia e inovação (art. 218 a 219-B); comunicação social (art. 220 a 224); meio
ambiente (art. 225); família, criança, adolescente, jovem e idoso (art. 226 e 230); índios (art. 231
e 232).

66
Com o intuito de recordar o que são direitos sociais, vejamos como o jurista José Afonso da Silva os define:

[...] são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou


indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam
melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a
igualização de situações sociais desiguais (SILVA, p. 289, 2013).

Lembre-se de sempre consultar a Constituição Federal para melhor fixação da matéria:

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>.

6.1 Seguridade Social: Saúde, Previdência e Assistência Social

A seguridade social (art. 194 e 195, CF/88) compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa
dos Poderes Públicos e da sociedade destinado a assegurar os direitos relativos à saúde, à
previdência e à assistência social:

• Saúde (art. 196 a 200): direito de todos e dever do Estado, garantido por políticas sociais e
econômicas que visem: i) à redução do risco de doença e de outros agravos; e ii) ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação;
• Previdência (art. 201 a 202): organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social,
de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, os eventos dos incisos I a V do
art. 201 da CF/88;
• Assistência social (art. 203 a 204): será prestada a quem dela necessitar,
independentemente de contribuição à seguridade social, e tem seus objetivos listados nos
incisos de I a V do art. 203 da CF/88.

São princípios que orientam a organização da seguridade social (art. 194, parágrafo único,
incisos I a VII): universalidade da cobertura e do atendimento; seletividade e distributividade na
prestação dos benefícios e serviços; irredutibilidade do valor dos benefícios; equidade na forma de
participação no custeio; diversidade da base de financiamento e caráter democrático e
descentralizado da administração.

Financiamento da seguridade social (art. 195, CF/88): será feito por toda a sociedade, de forma
direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos

67
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das contribuições sociais indicadas nos incisos I a
IV.

Consulte o organograma oficial do Sistema Único de Saúde, disponibilizado pelo governo federal, e saiba mais
sobre sua estrutura e quais são as suas entidades vinculadas:

Disponível em: <https://antigo.saude.gov.br/images/pdf/2020/October/15/-A3-Organograma-Basico-MS-Dec-


9795-alterado-10.477.pdf>.

6.2 Educação

A educação (art. 205 a 214, CF/88) é direito de todos e dever do Estado e da família. Será promovida
e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (art. 205, CF/88).

• Princípios que regem o ensino: art. 206, I a IX (ampliados pela EC 108/2020).


• Financiamento da educação básica (art. 212-A): a educação básica engloba a educação
infantil (0 a 5 anos), o ensino fundamental (6 a 14 anos) e o ensino médio (15 a 17 anos), nos
termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, e é financiada pelo Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação
(FUNDEB). Anteriormente era considerado provisório e terminaria ao final de 2020, mas a
Emenda Constitucional 108/2020 tornou-o permanente e ele agora é conhecido como “novo
FUNDEB”.
• Plano nacional de educação (PNE) (art. 214): a CF prevê que lei complementar
estabelecerá o PNE, que durará dez anos. O seu objetivo é articular o sistema nacional de
educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de
implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos
níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das
diferentes esferas federativas.

O homeschooling ou educação domiciliar consiste na educação ministrada pelos pais ou responsáveis da


criança em idade escolar, de modo que ela não tenha vínculo com nenhuma instituição escolar formal. A prática
dessa modalidade, pelo menos por enquanto, não é permitida no Brasil, sendo que já foi objeto de julgamento
no STF (RE 888.815-RS), que firmou o Tema 822: “Não existe direito público subjetivo do aluno ou de sua
família ao ensino domiciliar, inexistente na legislação brasileira”. Vejamos alguns trechos da ementa do acórdão
do julgamento mencionado:

Ementa: CONSTITUCIONAL. EDUCAÇÃO. DIREITO FUNDAMENTAL


RELACIONADO À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E À EFETIVIDADE DA
CIDADANIA. DEVER SOLIDÁRIO DO ESTADO E DA FAMÍLIA NA
PRESTAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL. NECESSIDADE DE LEI

68
FORMAL, EDITADA PELO CONGRESSO NACIONAL, PARA
REGULAMENTAR O ENSINO DOMICILIAR. RECURSO DESPROVIDO. [...]
3. A Constituição Federal não veda de forma absoluta o ensino domiciliar, mas
proíbe qualquer de suas espécies que não respeite o dever de solidariedade
entre a família e o Estado como núcleo principal à formação educacional das
crianças, jovens e adolescentes. São inconstitucionais, portanto, as espécies
de unschooling radical (desescolarização radical), unschooling moderado
(desescolarização moderada) e homeschooling puro, em qualquer de suas
variações. 4. O ensino domiciliar não é um direito público subjetivo do aluno
ou de sua família, porém não é vedada constitucionalmente sua criação por
meio de lei federal, editada pelo Congresso Nacional, na modalidade
“utilitarista” ou “por conveniência circunstancial”, desde que se cumpra a
obrigatoriedade, de 4 a 17 anos, e se respeite o dever solidário Família/Estado,
o núcleo básico de matérias acadêmicas, a supervisão, avaliação e
fiscalização pelo Poder Público; bem como as demais previsões impostas
diretamente pelo texto constitucional, inclusive no tocante às finalidades e
objetivos do ensino; em especial, evitar a evasão escolar e garantir a
socialização do indivíduo, por meio de ampla convivência familiar e comunitária
(CF, art. 227) [...].

6.3 Cultura

A cultura é regrada pelos artigos 215, 216 e 216-A. A CF/88 reconhece o princípio da cidadania
cultural (LENZA, 2021) ao estabelecer que o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos
culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das
manifestações culturais (art. 215).

As manifestações culturais populares, indígenas, afro-brasileiras e as de outros grupos participantes


do processo civilizatório nacional serão protegidas pelo Estado (§1º, art. 215). A lei disporá sobre a
fixação de datas comemorativas de alta significação para os diferentes segmentos étnicos nacionais
(§2º, art. 215).

O conceito de patrimônio cultural brasileiro trazido pela lei é extenso e envolve bens de natureza material e
imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação e à memória
dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira (art. 216, caput). Essa amplitude do conceito faz com
que ainda sejam incluídas (art. 216, incisos I a V): as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as
criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, os objetos, os documentos, as edificações e os demais
espaços destinados às manifestações artístico-culturais; e os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico,
paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

• Plano nacional de cultura (art. 215, §3º, CF/88): o Plano Nacional de Cultura, de duração
plurianual, foi instituído pela Lei nº 12.343/10. Propõe-se ao desenvolvimento cultural do país
e à integração das ações do poder público que conduzem à:

I - defesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro;


II - produção, promoção e difusão de bens culturais;

69
III - formação de pessoal qualificado para a gestão da cultura em suas múltiplas dimensões;
IV - democratização do acesso aos bens de cultura;
V - valorização da diversidade étnica e regional.

• Sistema Nacional de Cultura (SNC) (art. 216-A): visa aumentar a participação de todos os
entes federativos na promoção da cultura. O SNC, organizado em regime de colaboração, de
forma descentralizada e participativa, institui um processo de gestão e promoção conjunta de
políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da
federação e a sociedade, tendo por objetivo promover o desenvolvimento humano, social e
econômico com pleno exercício dos direitos culturais.

6.4 Desporto

O desporto (art. 217) possui conceito amplo, que também envolve a ideia de recreação, lazer e
divertimento, tendo em vista que o poder público incentivará o lazer como forma de promoção social,
nos termos do art. 217, §3º (LENZA, 2021). O lazer é direito social, nos termos do art. 6º da CF/88,
relacionando-se com a ideia de qualidade de vida.

• Fomento e promoção do desporto (art. 217, caput): ao Estado cabe estimular as práticas
desportivas formais e não formais, sendo direito (subjetivo) de cada cidadão, mas a prestação
é atribuída às entidades desportivas, dirigentes e associações com autonomia para sua
organização e funcionamento (art. 217, I) (LENZA, 2021);
• Financiamento (art. 217, II e III): para a compreensão do financiamento, deve-se saber as
modalidades de desporto: formal, educacional, de participação, de rendimento, de rendimento
profissional, de rendimento não profissional (art. 217, caput, I a IV, da CF/88; art. 1º e 3º da
Lei nº 9.615/98, a Lei Pelé). A destinação dos recursos públicos para o desporto deverá ser
prioritária para o desporto educacional e, em casos específicos, para o desporto de alto
rendimento. Como o de alto rendimento pode ser profissional e não profissional, Pedro Lenza
(2021) entende que o desporto não profissional será priorizado;
• Justiça desportiva (§§ 1º e 2º do art. 217; art. 50, caput, Lei nº 9615/98, a Lei Pelé): é
instância administrativa que, portanto, não integra o Poder Judiciário. Desempenha a função
exclusiva de julgar as questões relativas à disciplina e às competições esportivas.

6.5 Ciência, Tecnologia e Inovação

• Papel do Estado (art. 218, caput): “O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento


científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação”.
Promover deve ser entendido como o dever do Estado de, por si, realizar as tarefas derivadas
da ciência, da tecnologia e da inovação, destacando-se aqui o papel das Universidades,
instituições de educação profissional e tecnológica e institutos de pesquisa. [...] Incentivar, por
sua vez, significa que o Estado deverá estimular a produção científica, a pesquisa, as
capacitações científica e tecnológica, a inovação, e, para tanto, deverá estabelecer incentivos,
inclusive para as instituições privadas (LENZA, 2021).

• Modalidades de pesquisa com tratamento prioritário (art. 218, §§ 1º e 2º): pesquisa


científica básica e pesquisa tecnológica. O Estado apoiará a formação de recursos humanos
nas áreas de ciência, pesquisa, tecnologia e inovação (§3º, art. 218);
• Mercado interno enquanto patrimônio nacional (art. 219): “A previsão do mercado interno
enquanto patrimônio nacional afasta, assim, a ideia liberal clássica e consagra uma

70
perspectiva de Estado Social de Direito, fixando uma concepção social do mercado” (LENZA,
2021). O mercado interno “será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural
e socioeconômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do país” (art. 219).
O Estado estimulará a formação e o fortalecimento da inovação nas empresas, bem como nos
demais entes, públicos ou privados, a constituição e a manutenção de parques e polos
tecnológicos e de demais ambientes promotores da inovação, a atuação dos inventores
independentes e a criação, absorção, difusão e transferência de tecnologia (LENZA, 2021).

6.6 Comunicação Social

• Liberdade na comunicação social (art. 220): a manifestação do pensamento, a criação, a


expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer
restrição, observado o disposto na Constituição. Mesmo assim, importa considerar que “não se
trata de liberdade irresponsável, visto que, enfatize-se, a comunicação social não sofrerá
limitação, exceto, naturalmente, aquelas previstas na própria Constituição” (LENZA, 2021).
• Princípios orientadores da comunicação social (LENZA, 2021):
→ inexistência de restrição;
→ plena liberdade de informação jornalística (art. 5º): IV (liberdade de pensamento, vedado o
anonimato); V (direito de resposta proporcional ao agravo e indenização por dano material,
moral ou à imagem); IX (proibição da censura); X (inviolabilidade da intimidade, vida privada,
honra e imagem, assegurando-se o direito à indenização); XIII (liberdade de exercício de
qualquer trabalho, ofício ou profissão); e XIV (liberdade de informar e ser informado);
→ Vedação à censura (art. 5º, IX);
→ Regulação estatal sobre as diversões e espetáculos: são “exceções” as situações que
necessitam de intervenção para a proteção de direitos: art. 221, art. 220, § 3.º, I e II, e 21,
XVI;
→ Regulação estatal em relação ao tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e
terapias: limites à publicidade comercial desses produtos: art. 220, §3º, inciso II, e Lei
9294/96;
→ Regulação estatal em relação ao tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e
terapias (art. 173, § 4.º);
→ Publicação de impressos de comunicação: independe de licença de autoridade (art. 220, §6º);
→ Produção e programação das emissoras de rádio e TV: “sofrerão controle de qualidade por
parte do Estado, devendo respeitar a cultura nacional e regional, bem como os valores éticos
e sociais da pessoa e da família” (LENZA, 2021);
→ Propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens: serão
serviços explorados diretamente pela União, ou mediante autorização, concessão ou
permissão (art. 21, XII, a, e 223, §§1º a 5º); a propriedade de empresas que exploram essas
atividades será reservada aos brasileiros natos ou naturalizados (art. 222).

6.7 Meio Ambiente

O meio ambiente (art. 225, CF/88), cuja preservação é direito humano de terceira dimensão, pode
ser conceituado, nas palavras de José Afonso da Silva, como “a interação do conjunto de elementos
naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas
formas. A integração busca assumir uma concepção unitária do ambiente compreensiva dos
recursos naturais e culturais” (1997, p. 2). Dessa forma, vê-se que o meio ambiente poderá ter, pelo
menos, quatro aspectos:

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i) meio ambiente natural ou físico (art. 3º, I, Lei nº 6938/81 – política nacional do meio
ambiente): “Constitui-se pelo solo, água, ar atmosférico, energia, flora, fauna, ou seja, a
correlação entre os seres vivos e o meio em que vivem” (LENZA, 2021);
ii) meio ambiente cultural (art. 225, caput, 215 e 216): “história e a cultura de um povo, as
suas raízes e identidade, sendo integrado pelo patrimônio histórico, artístico,
arqueológico, paisagístico e turístico” (LENZA, 2021);
iii) meio ambiente artificial ou humano (entre outros, os art. 225, caput, 5º, XXIII, 182 e s.
etc.): espaço urbano construído, destacando-se as edificações (espaço urbano fechado)
e os equipamentos públicos, como as ruas, os espaços livres, os parques, as áreas
verdes, as praças etc. (espaço urbano aberto);
iv) meio ambiente do trabalho (art. 196 e s. e 7º da CF/88): espécie de meio ambiente
artificial que é caracterizado por ser o local de exercício das atividades do trabalhador.

• Titulares do dever de preservação (art. 225, caput): por ser bem de uso comum do povo,
será do Estado e da coletividade;
• Justiça distributiva entre as gerações (intergeracional) (art. 225, caput): uma vez que o
meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito de todos, as gerações futuras também
estão englobadas, devendo a geração do presente fruir do meio ambiente de modo que a
posteridade também o possa (ligada à ideia de sadia qualidade de vida);
• Incumbência do Poder Público: art. 225, § 1º, I a VII;
• Responsabilidade por danos ambientais (art. 225, § 3º): as condutas e atividades
consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas,
a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados – a responsabilidade será criminal, administrativa e civil.

Caso você tenha interesse em aprofundar os seus estudos em direito ambiental, recomendamos o livro Direito
ambiental constitucional, de José Afonso da Silva.

6.8 Família, Criança, Adolescente, Jovem e Idoso

→ FAMÍLIA (art. 226)

A família (art. 226) é considerada a base da sociedade e tem a proteção especial do Estado.

O casamento, que será civil, de celebração gratuita (§1°) e que, se religioso, terá efeitos civis, nos
termos da lei (§2°), é instituição na qual a mulher e o homem exercerão igualmente os direitos e
deveres referentes à sociedade conjugal (§5º), e que poderá ser dissolvida pelo divórcio (§6º). A
união estável também é reconhecida como entidade familiar, para efeito da proteção do Estado,
devendo a lei facilitar sua conversão em casamento (§3º, art. 226). A CF/88 também amplia o
conceito de entidade familiar para também reconhecer as famílias monoparentais, ou seja, a
comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (§4º).

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Apesar da CF/88 originalmente referir-se apenas à união estável heteroafetiva, atualmente
interpreta-se que ela alcança também as uniões homoafetivas (conforme ADI 4.277 e a ADPF 132,
julgadas em 5 de maio de 2011), que foram equiparadas às uniões estáveis para atender ao
princípio da dignidade da pessoa humana, que é a regra-matriz dos direitos fundamentais, bem como
ao direito à intimidade, a não discriminação e à igualdade (LENZA, 2021). Como desdobramento,
hoje também é viável o casamento homoafetivo, através da Resolução do CNJ nº 175/2013, que
veda a recusa das autoridades competentes.

• Planejamento familiar: será de livre decisão do casal, com base nos princípios da dignidade
da pessoa humana e da paternidade responsável, competindo ao Estado propiciar recursos
educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva
por parte de instituições oficiais ou privadas (§7º). Também será assegurada pelo Estado a
assistência à família, na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para
coibir a violência no âmbito de suas relações (§8º).
• Paternidade socioafetiva: “prioriza-se a família socioafetiva à luz da dignidade da pessoa
humana, com destaque para a função social da família, tendo em vista a igualdade absoluta
de cônjuges (226, §5º) e dos filhos (227, § 6º)” (LENZA, 2021).

→ CRIANÇA, ADOLESCENTE E JOVEM (art. 227)

A proteção da criança, do adolescente e do jovem (art. 227, CF/88) é dever da família, da


sociedade e do Estado, que devem lhes assegurar, prioritariamente, “o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão” (art. 22, caput).

• Saúde: a saúde da criança, do adolescente e do jovem será objeto de programas de


assistência integral por parte do Estado, podendo ocorrer a participação de entidades não
governamentais através de políticas específicas (§1º). O Estado deverá aplicar percentual
dos recursos públicos destinados à saúde na assistência materno-infantil (§1º, inciso I).
• Proteção especial: a Constituição prevê que eles terão o direito à proteção especial, cujos
aspectos são indicados nos incisos de I a VII do §3º.
• Igualdade entre os filhos: os filhos, havidos ou não da relação do casamento ou por adoção,
terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias
relativas à filiação (§ 6º).
• Pessoas com deficiência: criação de programas de prevenção e atendimento especializado
para as pessoas com deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social
do adolescente e do jovem com deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a
convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de
obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação (§1º, II).

→ IDOSO (art.230)

Será idosa toda pessoa com idade igual ou superior a 60 anos (Lei nº 8.842/94 – Política Nacional
do Idoso; Lei nº 10.741/2003 – Estatuto do Idoso), sendo que aos maiores de 80 anos será
assegurada prioridade especial, atendendo-se suas necessidades sempre preferencialmente em

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relação aos demais idosos, destacando-se os casos de atendimento de saúde, exceto em caso de
emergência, ou de tramitação de processos judiciais (Lei nº 13.466/17).

A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua
participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à
vida (art. 230, caput).

Por fim, a constituição estabelece que os programas de amparo aos idosos serão executados
preferencialmente em seus lares (§1º) e que aos maiores de 65 anos é garantida a gratuidade dos
transportes coletivos urbanos (§ 2º).

6.9 Indígenas

São reconhecidos aos povos indígenas sua organização social, costumes, línguas, crenças e
tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo
à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens (art. 231, caput).

As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios são as por eles habitadas em caráter
permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos
recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e
cultural, segundo seus usos, costumes e tradições (§1º). Elas são de posse permanente dos
indígenas, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas
existentes (§2º). Ainda, estas terras são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas,
imprescritíveis (§4º).

O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra


das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivadas com autorização do Congresso
Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados
da lavra, na forma da lei (art. 231, §3º).

Veda-se a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, com a aprovação do Congresso
Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou, no interesse
da soberania do país, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o
retorno imediato logo que cesse o risco (§5º).

São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação,
o domínio e a posse das terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas, ou a exploração das
riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse
público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção
direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias
derivadas da ocupação de boa-fé (§6º).

Ainda, às terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas, não se aplica o disposto no art. 174, §
3º e § 4º, o que significa, de forma resumida, que não é possível estímulo à atividade garimpeira
nessas terras (§7º).

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Os indígenas, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em
defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo
(art. 232).

Considerações Finais

Em nosso último capítulo, tratamos da regulamentação constitucional da ordem social, que está
ligada aos direitos sociais, explicando-lhe os mecanismos para a instituição de políticas específicas.

Verificamos que foram unidos uma série de temas, mesmo que não fossem necessariamente
relacionados à ordem social em si. Mesmo assim, a constituição estabeleceu valores que guiam
todas as matérias regradas como pertencentes à ordem social, fazendo com que se baseiem no
primado do trabalho e tenham por objetivo alcançar o bem-estar e a justiça social.

Apesar de serem de planejamento do Estado as políticas sociais que tensionam tratar dos temas
incluídos na ordem social, é assegurada a participação da sociedade enquanto agente formulador,
fiscalizador e controlador dessas políticas, o que consiste em expressão do quanto a Constituição
tensiona aproximar os detentores dos direitos sociais da estrutura que detém seus mecanismos de
execução.

A ordem social trata dos mecanismos e aspectos organizacionais dos direitos sociais e é regulamentada a
partir do art. 193 da CF/88. Conjuntamente com o título dos direitos fundamentais, a ordem social forma o
núcleo substancial do regime democrático instituído. Sua base é o primado do trabalho e seu objetivo é
o bem-estar e a justiça social (art. 193, caput, CF/88).

A seguridade social (art. 194 e 195, CF/88) compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos
Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à
assistência social.

A educação (art. 205 a 214, CF/88) é direito de todos e dever do Estado e da família. Será promovida e
incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para
o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (art. 205, CF/88).

A cultura (art. 215, 216 e 216-A, CF/88) será assegurada pelo Estado, que garantirá a todos o pleno exercício
dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão
das manifestações culturais (art. 215). A doutrina indica que a mencionada previsão constitui um
reconhecimento por parte da CF/88 do chamado princípio da cidadania cultural.

O desporto (art. 217) possui conceito amplo, que também envolve a ideia de recreação, lazer e divertimento,
tendo em vista que o poder público incentivará o lazer como forma de promoção social, nos termos do art. 217,
§3º. Seu fomento é de responsabilidade do Estado (art. 217).

Quanto à ciência, tecnologia e inovação (art. 218, CF/88), o Estado terá por papel a promoção e o incentivo
do desenvolvimento científico, da pesquisa, da capacitação científica e tecnológica e da inovação (art. 218,
caput). Existem modalidades de pesquisa com tratamento prioritário (art. 218, §§ 1º e 2º) e o mercado interno
é considerado patrimônio nacional que será incentivado “de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e
socioeconômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do país” (art. 219).

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No que se refere à comunicação social, estabelece-se que a manifestação do pensamento, a criação, a
expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição (art. 220,
CF/88).

Com relação ao meio ambiente (art. 225, CF/88), determina-se que todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se
ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

A família (art. 226) é considerada a base da sociedade e tem a proteção especial do Estado. A proteção da
criança, do adolescente e do jovem (art. 227, CF/88) é dever da família, da sociedade e do Estado. Será
idosa toda pessoa com idade igual ou superior a 60 anos, sendo que aos maiores de 80 anos será assegurada
prioridade especial.

Por fim, no que tange aos povos indígenas (art. 231, CF/88), reconhece-se sua organização social,
costumes, línguas, crenças e tradições, além dos direitos originários sobre as terras que
tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens
(art. 231, caput).

A fim de assegurar a efetividade do direito que todos têm ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
incumbe ao poder público, nos termos da Constituição Federal de 1988:

I. Preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e
ecossistemas.
II. Preservar a diversidade e a integridade do patrimônio cultural do país e fiscalizar as entidades
dedicadas à pesquisa e manipulação de qualquer material cultural público.
III. Controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que
comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.
IV. Promover a educação ambiental na educação básica e a conscientização individual para a preservação
do meio ambiente.

Estão corretos somente os itens

a) I, II, III e IV.


b) I, II e III.
c) II e IV.
d) I e III.
e) II, III e IV.

GABARITO: D.

Verifiquemos cada um dos itens apresentados na questão:

I- “Preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies
e ecossistemas” – CORRETO – é obrigação do poder público, nos termos do art. 225, § 1º, I, CF/88;
II- “Preservar a diversidade e a integridade do patrimônio cultural do país e fiscalizar as entidades
dedicadas à pesquisa e manipulação de qualquer material cultural público” – ERRADO – a lei refere-
se ao patrimônio genético e não ao cultural, nos termos do art. 225, § 1º, II, CF/88;
III- “Controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que
comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente” – CORRETO – é o texto do inciso
V do §1º do art. 225 da CF/88;

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IV- “Promover a educação ambiental na educação básica e a conscientização individual para a
preservação do meio ambiente” – ERRADO – conscientização pública (art. 225, § 1º, VI, CF/88).

Questão Objetiva
Nos termos do instituído na Constituição Federal, assinale a alternativa que indica corretamente a base da
sociedade:
a) Seguridade social
b) Cultura
c) Família
d) Meio ambiente
e) Trabalho

Questão Discursiva
Conceitue o que é seguridade social. Fundamente sua resposta.

Direitos sociais: “podemos dizer que os direitos sociais, como dimensão dos direitos fundamentais do homem,
são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas
constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a
igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se ligam ao direito de igualdade” (SILVA,
p. 289, 2013).
Planejamento familiar: entende-se por planejamento familiar “[...] o conjunto de ações de regulação da
fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo
homem ou pelo casal” (art. 2º, Lei nº 9.263/96).
Infância, adolescência e juventude: juridicamente, a primeira infância será até os 6 anos completos (art. 2º,
Lei nº 13.257/2016 – Estatuto da Primeira Infância) e será criança a pessoa com até 12 anos incompletos (art.
2º, Lei nº 8069/90 – ECA); serão adolescentes aquelas pessoas que possuem 12 a 18 anos (art. 2º, Lei nº
8069/90 – ECA) e serão jovens as pessoas com idade entre 15 e 29 anos de idade (Lei nº 12.852/2013 –
Estatuto da Juventude).

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Presidência da


República, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso
em: 23 jul. 2021.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 25. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2021.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2013.

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SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. São Paulo: Malheiros, 1997.

Questão Objetiva - Resposta correta: C.


Questão Discursiva - GABARITO: A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de
iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à
previdência e à assistência social (art. 194 e 195, CF/88).

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