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12/11/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


Processo: 10878/2005-7
Relator: PIMENTEL MARCOS
Descritores: CONTRATO DE CONCESSÃO
CONTRATO DE AGÊNCIA
FRANQUIA
INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 14-02-2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIMENTO PARCIAL
Sumário: 1. O contrato de concessão comercial é um “contrato de
distribuição comercial” tal como os contratos de agência, comissão,
mediação e franquia.
2. O contrato de concessão comercial é o acordo pelo qual uma das
partes (o concedente) se obriga a vender os produtos por si
produzidos ou distribuídos à contraparte (o concessionário), a qual
se obriga a comprá-los e a (re)vendê-los a terceiros, por sua conta e
de modo estável, numa determinada circunscrição.
3. É um contrato inominado, não tipificado na lei, não dispondo,
por isso, de regulamentação específica, pelo que se lhe aplicam as
cláusulas acordadas entre as partes, as regras gerais dos contratos
e ainda as normas dos contratos nominados, sempre que a analogia
das situações o justifique, designadamente o de agência, sobretudo
em matéria de cessação do contrato.
4. O concessionário, ao contrário do agente, actua em seu nome e
por sua conta, adquire a propriedade da mercadoria, comprando-a
ao fabricante ou ao fornecedor, para a vender a terceiros,
assumindo os riscos da comercialização e não recebe qualquer
retribuição do concedente, retirando os seus proventos do resultado
da compra e venda dos produtos.
5. Enquanto o agente é um colaborador autónomo da empresa, por
conta da qual se obriga a promover a celebração de contratos e,
algumas vezes a concluí-los ele próprio, mas em nome e por conta
do principal, o concessionário actua em seu nome e por conta
própria. E, em regra, obriga-se a comprar uma quantidade mínima
de produtos durante um certo período de tempo e/ou a revender
uma quantia mínima.
6. O contrato de franquia é um contrato atípico e inominado em
que uma pessoa – o franquiador – concede a outra – o franquiado –
a utilização, dentro de certa área, cumulativamente ou não, de
marcas, nomes, insígnias comerciais, processo de fabrico e técnicas
empresariais e comerciais, mediante contrapartidas prestadas por
este.
7. Na concessão existe uma prestação de dare;
Na agência uma prestação de facere;
E na franquia uma prestação de pati, isto é, o franquiador utiliza o
seu nome, a sua marca ou a sua insígnia. E obriga-se a suportar
que o franquiado utilize o seu nome, a sua insígnia ou a sua marca.
8. A indemnização de clientela é uma compensação devida ao
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agente, após a cessação do contrato, pelos benefícios de que o


principal continua a auferir com a clientela angariada ou
desenvolvida pelo agente.
9. Mas não se trata em rigor de uma verdadeira indemnização
devida ao agente (não tendo função reparadora) até porque não
está dependente de prova, a fazer por este, dos danos sofridos. O
que conta são os benefícios proporcionados pelo agente ao
principal, benefícios esses que, na vigência do contrato, eram
comuns, e que, após o seu termo, irão aproveitar apenas a este. Em
suma: trata-se de uma remuneração devida ao agente pela clientela
angariada e da qual virá a beneficiar o principal.
10. Em princípio, dada a similitude de situações entre os contratos
de concessão e de agência, o regime deste é, em regra, aplicável ao
contrato de concessão, nomeadamente o estabelecido no artigo 33º
do DL 178/86 quanto à indemnização de clientela.
11. Entre os dois contratos existe uma grande analogia nesta parte:
tanto o agente como o concessionário promovem os produtos do
“principal”, assim contribuindo para a sua divulgação. E tal como
sucede num contrato de agência, o concessionário adquire e fideliza
determinada clientela. Daqui resulta uma certa afinidade entre o
contrato de agência e o contrato de concessão comercial, não só
quanto à actividade desenvolvida pelo agente e pelo concessionário,
mas ainda quanto à situação de dependência económica em que
ambos se encontram relativamente à outra parte.
12. Mas é fundamentalmente pela integração do revendedor na
rede de distribuição do concedente, com tudo o que isso implica e
pressupõe em termos de colaboração entre as partes, e de
promoção dos bens distribuídos, que se aproximam os dois
contratos e que, nessa medida, mais se justifica a aplicação ao
contrato de concessão do regime da agência.
13. Em relação ao requisito a que alude a alínea a) do artigo 33º do
DL 178/86 é necessário que se prove que o concessionário angariou
novos clientes para o concedente ou que aumentou
substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente,
bastando, porém, a verificação de um destes dois factos.
14. Mas, não basta a angariação de alguns (poucos clientes), pois,
só se justificará a indemnização de clientela se for angariado um
número significativo de novos clientes. Tal como se torna necessário
o aumentado substancial do volume de negócios com a clientela já
existente
15. No contrato de agência, a retribuição determina-se
fundamentalmente com base no volume de negócios conseguidos
pelo agente, geralmente através de uma comissão ou percentagem
calculada sobre o valor dos negócios por ele obtidos. Mas o mesmo
não sucede no contrato de concessão comercial, onde não existe
uma “retribuição” calculada nestes termos. É que o concessionário
actua em seu nome e por sua conta, adquire a mercadoria,
comprando-a ao fabricante ou ao fornecedor, para a vender a
terceiros, assumindo os riscos da comercialização, não recebendo,

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por isso, qualquer outra retribuição do concedente. Todavia, nada


impede que seja fixada uma indemnização em termos equitativos,
com base na actividade desenvolvida pelo concessionário, desde
que a analgia das situações o justifique.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.
“V...” intentou a presente acção com processo
ordinário,
contra
“C..,”, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe,
a título de indemnização de clientela, uma quantia de
3.900.000$00, acrescida de juros, à taxa legal dos
juros comerciais, vencidos desde a citação e até
integral pagamento.
Para tanto alega, em síntese:
ter celebrado um contrato com a “E...”.”, em que
tomou a actividade de revenda de combustíveis e
lubrificantes, tendo-se, para o efeito, obrigado a
pagar os custos de licenças e taxas necessárias à
exploração do posto, bem como todos os custos de
exploração deste, nomeadamente os referentes a
despesas com pessoal, segurança, energia, água,
aferição de bombas, cabendo à “E...” o fornecimento
exclusivo dos combustíveis e lubrificantes por ela
comercializados;
ter a A. obtido as licenças, contratado trabalhadores,
outorgado o contrato de seguro, divulgado a sua
abertura na região e iniciado um conjunto de obras e
instalação de equipamentos no posto de
abastecimento, cuja exploração foi iniciada em
01.94.96;
ter explorado, no prédio onde está instalado o posto
de abastecimento, uma boutique e um snack bar;
ter organizado todos estes factores de produção e
pago, por isso, taxas de exploração à “E...”;
ter angariado, entre 1.4.1996 e 31.3.1999, para o
aludido posto de abastecimento, várias centenas de
clientes;
ter a ré enviado à autora, em 13.08.1998, sob registo
e com aviso de recepção, uma carta em que
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denunciava o contrato celebrado, com efeitos a partir


de 31.09.1999, altura em que a A. deixou de explorar
o posto de abastecimento de combustíveis;
ter a clientela desse posto de abastecimento sido
angariada ex novo pela Autora, clientela que continua
a abastecer-se naquele posto;
ter a Autora deixado de receber, após a cessação do
contrato, qualquer retribuição por contratos
negociados ou concluídos com esses clientes;
ter a boa imagem que o estabelecimento hoje desfruta
ficado a dever-se ao investimento da Autora e ao
tratamento que esta, entre 1.4.1996 e 31.3.1999,
sempre dispensou aos seus clientes;
ter a Autora, durante esse período, recebido
comissões no total de 11.733.556$00, limite que, de
acordo a média anual estabelecível, aparece cifrado,
para efeito da indemnização de clientela, em
3.911.185$00.
A ré contestou, pedindo a improcedência total da
acção e a consequente absolvição do pedido, assim
como a condenação da A. como litigante de má fé.
Invocou, para tanto, que:
não foi celebrado qualquer contrato de agência;
a concessão do aludido posto de combustível foi feita
nos termos a celebrar posteriormente entre a “E...” e
“V...”, o que efectivamente veio a acontecer;
o contrato celebrado entre “E:::” e a Autora, através
do qual esta se obrigou a fazer a exploração do posto
de abastecimento de combustíveis por sua exclusiva
conta e risco, é um contrato misto de cessão de
exploração de abastecimento, de compra e venda de
combustíveis e lubrificantes e de franquia quanto à
marca “E...”;
a Autora não auferiu quaisquer comissões da R. e/ou
da “E...”
a denúncia do contrato não dá lugar a qualquer
indemnização.
**
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Foi proferido despacho a saneador.


Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento e
a matéria controvertida foi julgada nos termos do
despacho de fls. 213 e segs., que não foi objecto de
reclamação.
Seguidamente foi proferida a competente sentença julgando-se a
acção parcialmente procedente, por provada e, em consequência,
condenando-se a ré a pagar à autora a quantia de 9.975,96 euros,
acrescida dos juros de mora, à taxa de juro comercial, vencidos
desde o dia 21 de Março de 2000, data da citação, até integral
pagamento.
E foi ainda julgada não verificada a litigância de má fé.

Dela recorreu a ré, formulando as seguintes


conclusões:
.....
A apelada não alegou.
Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir.
Em 1ª instância foram dados como provados os
seguintes factos:
.....
O DIREITO.
Questões a decidir:
a) Eventual alteração da matéria de facto;
b) Da caracterização do contrato celebrado entre
A. e R.
c) A indemnização de clientela.
I
.......
II
Para a caracterização do contrato parece-nos que
devem ser tidos em consideração os seguintes
factos que foram dados como provados:
4 - Em 24/09/91, “E....” e “V....” outorgaram um contrato:
.......
b) em que «a “E....” obriga-se a fornecer ao cliente, e este obriga-se a
adquirir em exclusivo à “E...”, os combustíveis e os lubrificantes (…)
vendidos ao cliente, quer directamente pela “E...”, quer por quem esta
indicar para o efeito, aos preços oficiais em vigor, ou, na sua falta, aos
preços de mercado que constam das tabelas aprovadas pela “E...” (…) e
que são vendidos ao público sob as marcas ou denominações “E...”»
(cláusula 2.ª),
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c) em que o “cliente tem direito a 80% (oitenta por cento) das


comissões de revenda fixadas oficialmente”, nestas se considerando
“incluída a comissão referida no parágrafo 2 do art.º 269.º do Código
Comercial”, com “ as restantes condições comerciais como, por
exemplo, preços de venda ao público e condições de pagamento, são as
constantes do Anexo 1 e podem ser modificadas pela “E...”, devido a
condições do mercado, alterações de custos, como consequência de
decisões de organismos oficiais, etc.” (cláusula 5.ª),
d) em que «a “E...” obriga-se a instalar no estabelecimento, uma vez
obtidas as necessárias autorizações por parte das entidades oficiais, se
for o caso, os materiais e equipamentos de que conserva propriedade,
constante da relação Anexa (Anexo III), sendo obrigação do cliente, em
relação a esses materiais e equipamentos, «mantê-los em perfeito
estado de funcionamento, avisar imediatamente a “E...” de qualquer
avaria ou deficiência neles verificados, não utilizar para fins distintos
daqueles que se destinam, não alterar o local em que se encontram nem
o seu aspecto, assumir plena responsabilidade pelos danos neles
causados por terceiros, cabendo-lhe exigir do causador as
indemnizações a que tiverem direito, restituí-los à “E...” logo que cesse
o presente contrato qualquer que seja a causa ou motivo”, sendo que
«“a E....” apenas será responsável pelos custos de reparação,
substituição, verificação, afinação e beneficiação, decorrentes de
defeitos de construção ou de instalação dos materiais de equipamento
atrás referidos» (cláusula 6.ª).
e) em que «o funcionamento do estabelecimento e sua exploração são
da exclusiva conta e risco do cliente, que será o único responsável por
qualquer acidente ou dano causado pelas instalações, produtos ou
material nele existentes, bem como pelo cumprimento das obrigações
assumidas pelas pessoas com que contrata” e em que “os custos de
exploração, manutenção e reparação do estabelecimento, incluindo os
seus equipamentos, são da responsabilidade do cliente, competindo à
“E...” promover a adjudicação e fiscalização dos trabalhos e
equipamentos necessários, sendo outrossim da “de responsabilidade da
“E...” os custos de grandes reparações e substituições necessárias
devido ao uso e degradação normal do estabelecimento (cláusula 8.º),
j) que, prevendo uma entrada em vigor na data da sua assinatura e o
período de duração de um ano a contar da data de abertura do posto de
abastecimento, era renovável automaticamente por iguais períodos, se
nenhuma das partes o denunciasse com pelo menos 180 dias de
antecedência do seu termo, por carta registada com aviso de
recepção(cláusula 15.ª),
l) em que, “cessada a vigência deste contrato, qualquer que seja a causa
ou o motivo, o cliente obriga-se de imediato a: a)liquidar integralmente
à “E...” todas as importância sem dívida ou ainda não pagas, b)libertar
o estabelecimento e entregá-lo com todo o material, equipamentos e
instalações em boas condições de funcionamento, pagando todos os que
estiverem em falta ou danificados, aos preços que tiverem na altura”
(cláusula 16.ª),
6- Em 24 de Setembro de 1991, a “E...”., por escritura de compra e

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venda outorgada no 2º Cartório Notarial de L..., de fls. 32 a fls. 34º do


Livro nº 38-F, adquiriu a J... e mulher, livre de quaisquer ónus ou
encargos, o prédio misto, composto de edifício destinado a estação de
serviço, oficina de reparação de ....
11- As obras e instalação de equipamentos por referência ao acordo
celebrado em 24/09/91 ficaram concluídas em 31/03/96.
12 - A A. iniciou a exploração do posto de abastecimento de
combustíveis.
13 - No âmbito da exploração de abastecimento referido nos autos, a
Autora contratou trabalhadores por referência à exploração daquele
posto.
14 - Recebeu a Autora pela venda de combustíveis da Ré e antes dela
pela “E...” postos de Abastecimento quantias referentes à venda de
combustíveis.
15 - Entre 01.04.96 e 12.12 96 a Autora recebeu da “E:::” a quantia
total de 2.053.562$00 relativa à venda de combustíveis e lubrificantes.
16 - De 1/1/97 a 31/12/97, recebeu, a esse mesmo título, daquela” E...”
e da Ré, a quantia total de 4.189.290$00.
17 - De 1/1/98 a 31/12/98, recebeu, da Ré, àquele mesmo título, o total
de 4.412.087$00.
18 - De 01.01.99 a 31.03.99 recebeu a Autora da Ré a quantia de
1.078.617$00 a esse mesmo título.
22 - Naquela data, a Ré recebeu, da A., aquele posto de abastecimento,
com todos os respectivos factores produtivos organizados e aptos a
funcionar em termos de gerar lucros.
30 - Com vista a preparar o posto para o seu normal funcionamento, a
A. divulgou, na região onde o mesmo se situa, a notícia relativa à sua
abertura.
34 - Deu ordens, dirigiu e fiscalizou os trabalhadores afectos à
exploração do posto de combustível.
35 - Explorou, no prédio onde está instalado o posto de abastecimento,
uma boutique e um snack bar.
36 - Vendeu, aí, entre outros, os seguintes produtos: lubrificantes, café,
chocolates, bolos, cervejas, águas e refrigerantes.
37 - Encomendou os produtos vendidos quer no posto de
abastecimento, quer na boutique e no snack bar.
38 - Pagou esses produtos.
39 - Pagou todas as despesas inerentes ao funcionamento do posto de
abastecimento, da boutique e do snack-bar, nomeadamente salários dos
trabalhadores, prémios de seguros, taxas administrativas, electricidade,
água e telefone.
42 - Entre 1/4/96 e 31/3/99, a A. angariou para o mencionado posto de
abastecimento meia centena de clientes.
43 - Todos esses clientes continuam, actualmente, a ser clientes do
posto de abastecimento.
44 - A A. deixou de receber, após a cessação do contrato ocorrida em
31.03.99, qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos
com esses clientes.
45 - Deixou igualmente de receber, após essa mesma cessação,

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qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos com


quaisquer outros clientes do posto de abastecimento.
46 - Todo o volume de negócios relativo a esse posto de abastecimento
foi iniciado pela A..
Parece-nos estar fora de dúvida que se trate de um
contrato de agência. Aliás, ninguém faz tal
caracterização.
Cremos tratar-se antes de um contrato de
concessão comercial.
O contrato de agência passou a estar legalmente
tipificado no ordenamento jurídico português com a
entrada em vigor do Decreto-Lei nº 178/86 de 3 de
Julho, alterado posteriormente pelo Decreto Lei nº
118/93, de 13 de Abril, o qual transpôs para a ordem
jurídica interna a Directiva nº 86/653/CEE do
Conselho, de 18.12.86, relativa à coordenação do
direito dos Estados membros sobre os agentes
comercias.
Assim, a agência é “o contrato pelo qual uma das
partes se obriga a promover por conta da outra a
celebração de contratos, de modo autónomo e
estável e mediante retribuição, podendo ser-lhe
atribuída certa zona ou determinado vínculo de
clientes” (artº 1º do DL 178/86, na redacção do DL 118/93)
Acontece que:
- a autora (eventual agente) não se limitou a
promover, por conta da R (que seria o principal) a
celebração de contratos; pelo contrário, comprava os
produtos à R. e (re)vendia-os depois aos seus
clientes, por conta própria, assumindo os riscos da
comercialização.
- a autora não recebia qualquer retribuição da R.
Esta defende que se trata de um contrato misto, isto é,
constituído por elementos típicos de uma cessão de
exploração de estabelecimento (ao estipular que a “E...”,
enquanto proprietário do prédio referido nos autos o dá em exploração
à A., Apelada, que a aceita), de um contrato de compra e
venda (ao estipularem que a “E...” forneceria à A., Apelada,
combustíveis e lubrificantes, obrigando-se esta a pagar o respectivo
preço) e de franquia (quanto à marca “E...” quando estipula que
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“os produtos obrigatoriamente adquiridos à “E....” ou a quem esta


indicar, são vendidos ao público sob a marca ou denominação “E...”).
E diz ainda a apelante que, por isso, se aplicam as
regras destes três contratos.
Vejamos.
Cessão de exploração de estabelecimento comercial
é o contrato pelo qual se transfere temporária e
onerosamente, para outrem, juntamente com o gozo
do prédio, a exploração de um estabelecimento
comercial ou industrial nele instalado (artº 111º do
RAU).
O que o distingue, por exemplo, do trespasse, é
que na cessão há uma transferência temporária da
exploração e no trespasse há uma transferência
definitiva da titularidade do estabelecimento.
Mas, em ambos os casos existe uma transferência, em
conjunto, das instalações, utensílios, mercadorias e
outros elementos que integrem o estabelecimento.
É certo que se refere logo na 1ª cláusula do contrato
que a ré é proprietária do posto de abastecimento de
combustíveis cuja exploração é entregue “ao cliente”,
(ora autora).
A verdade é que tal estabelecimento não era
explorado pela ré. Esta limitou-se a equipá-lo, como
resulta directamente da cláusula 6ª. Na sequência do
contrato em causa é que foram feitas obras para aí ser
instalada uma estação de venda de combustíveis. E
esta seria explorada justamente ab initio pela ora
autora.
O estabelecimento (1) era efectivamente propriedade
da cedente. Mas isso justifica-se por ser necessário
fazer grandes investimentos, que o concessionário,
em princípio, por si só não poderia ou não quereria
suportar, tendo em consideração que o contrato
apenas vigoraria por um ano, embora renovável por
iguais períodos de tempo, desde que não fosse
denunciado. Ora, como é obvio, não seria razoável
que o “concessionário” criasse de raiz um
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estabelecimento de venda de combustíveis quando


apenas lhe era assegurado que o contrato vigoraria
por um ano.
O Prof. Ferrer Correia diz-nos que a expressão
“estabelecimento comercial” empregue em sentido
lato significa o mesmo que “o complexo da
organização comercial do comerciante, o seu negócio
em movimento ou apto para entrar em movimento”
(2).

E tal organização versa sobre um conjunto de bens de


variada natureza, designadamente coisas corpóreas e
incorpóreas.
Mas aí se refere também que o estabelecimento
comercial pode ser entendido numa acepção mais
restrita. E pode ser nomeadamente “o complexo de
coisas corpóreas de que o comerciante se serve para
explorar a sua empresa, mais aquelas em que recai
essa actividade ou que se representam o seu produto.
Tomada a palavra neste sentido, ela abrange,
juntamente com a loja, armazém ou fábrica, o
conjunto dos móveis, máquinas, utensílios, matérias
primas e mercadorias que lá existam” (3). E a palavra
“estabelecimento” é também usada, por vezes, na lei,
para designar o local onde se exerce o comércio.
A pags. 229 e 230 escreve o mesmo autor que o
estabelecimento comercial deve ser entendido não só
como uma unidade jurídica, mas também como uma
unidade económica (releva a ideia de uma unidade
económica e também a duma unidade em sentido
jurídico - uma unidade jurídica objectiva).
O estabelecimento comercial em sentido amplo e
numa acepção técnica e mais rigorosa deve, pois, ser
entendido como uma verdadeira unidade jurídica e
não apenas como uma unidade económica. A
universalidade não compreende apenas as
mercadorias, máquinas ou instrumentos produtivos,
abrangendo também bens imateriais.
Por isso se deve entender que o vocábulo
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“estabelecimento” foi tomado numa acepção menos


rigorosa, querendo as partes referir-se essencialmente
ao conjunto de coisas corpóreas ali instaladas – o
posto de abastecimento de combustíveis.
Ora, como vimos, o estabelecimento nunca foi
explorado pela ora ré. Pelo contrário, pois foi criado
para ser explorado justamente pela apelante. Até
porque, como ficou provado, todo o volume de
negócios relativo ao posto de abastecimento de
combustíveis foi iniciado por ela.
No fundo, o “estabelecimento”, enquanto unidade
jurídica e mesmo económica, foi também criado pela
autora. Esta é que se obrigou a fazer a sua
exploração, por sua conta e risco (como diz a própria
ré).
E repare-se que, nos termos do nº 4 da cláusula 6ª, a
“E...” apenas seria responsável pelos custos das
reparações. Além disso, embora o contrato tenha sido
celebrado em 1991, as obras e instalação de
equipamentos apenas ficaram concluídas em
31/03/96. E a autora não pagou à ré qualquer quantia
a título de retribuição pela ocupação do local, sendo
certo que a cessão de exploração de estabelecimento
é oneroso (4).
Portanto, não estamos perante um mero contrato
de exploração de estabelecimento comercial.
Bem mais importante para a caracterização do
contrato é o estabelecido na cláusula 2ª (nº 4. b. dos
factos provados)
Daqui decorre que a “E...” se obrigou a fornecer à
autora os seus produtos e que esta se obrigou a
adquiri-los em regime de exclusividade, e ainda que
os mesmos seriam vendidos ao público sob as marcas
e denominações “E....”.
Por outro lado, como resulta da cláusula 8ª, a autora
seria a única responsável pelo fornecimento e
exploração do estabelecimento. A “E...” apenas seria
responsável pelos custos resultantes de “grandes
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reparações...”. E resulta da cláusula 16ª , “cessada a


vigência do contrato, qualquer que seja a causa ou o motivo, o cliente
obriga-se de imediato a: a)liquidar integralmente à E... todas as
importância sem dívida ou ainda não pagas, b)libertar o
estabelecimento e entregá-lo com todo o material, equipamentos e
instalações em boas condições de funcionamento, pagando todos os que
estiverem em falta ou danificados, aos preços que tiverem na altura
E, como consta claramente da cláusula 3ª do anexo I,
os artigos fornecidos pela “E...” (e depois pela ré)
seriam pagos pela autora nos prazos aí referidos.
Ora, estas cláusulas não são próprias de um
contrato de cessão de exploração de
estabelecimento comercial. Neste apenas se
verifica a transferência temporária e onerosa,
para o cessionário, juntamente com o gozo do
prédio, da exploração do estabelecimento
comercial ou industrial nele instalado. Depois,
toda a actividade desenvolvida será da
responsabilidade do cessionário, sem qualquer
interferência do cedente.
III
Também não estamos seguramente perante um
simples contrato de compra e venda.
Pelo contrato de concessão, o concessionário obriga-
se a efectuar determinadas compras ao concedente, e
este obriga-se a vender-lhe os seus produtos. E a
compra (e posterior venda) pela autora dos produtos
da “E...”, e depois da ré, faz parte precisamente do
contrato de concessão comercial. Mas não se trata de
um puro contrato de compra e venda, como
facilmente resulta das respectivas cláusulas. É que
além das meras obrigações resultantes destes
contratos (artº 879º do CC), muitas outras foram
assumidas.
Na concessão comercial, as partes obrigam-se a
celebrar contratos vários para futuro. O
concessionário assume a obrigação de comprar os
produtos ao concedente para revenda. Mas ficam
desde logo estabelecidas regras gerais pelas quais se
regularão esses contratos. E, por isso, quando são
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efectivados, estão as partes a cumprir as obrigações


assumidas anteriormente no contrato de concessão.
Estabelece-se uma relação contratual duradoura e não
instantânea. Existem interesses comuns na
prossecução das respectivas actividades comerciais.
E daí que as partes assumam outras obrigações para
além das resultantes do simples contrato de compra e
venda (ou mesmo de compra para revenda), sendo
através delas que verdadeiramente se efectua a
integração do concessionário na rede de distribuição
do concedente.
Mas, para revender os produtos aos seus clientes, o
cessionário tem de os comprar ao cedente. Todavia,
não são as questões relativas a essas vendas que aqui
estão em causa.
IV
Parece-nos que, no essencial, estamos perante um
verdadeiro contrato de concessão comercial.
Trata-se, com efeito, de um contrato
genericamente designado de “contrato de
distribuição comercial”.
Sucede, porém, que, dentro desta categoria ampla de
contratos, existem diferenças sensíveis entre eles,
nomeadamente os contratos de agência, comissão,
mediação, franquia e concessão comercial.
O contrato de concessão comercial é na verdade um
contrato de distribuição comercial, mas com
características que o distinguem dos restantes do
mesmo género (como sejam a própria agência ou o
"franchising", por exemplo). Este género de contratos
tem lugar essencialmente em situações que exigem
elevados investimentos e em que o produtor dos bens
ou serviços a distribuir não quer ou não pode efectuá-
los directamente.
Perante os factos provados parece-nos estarmos
efectivamente perante um contrato de concessão
comercial, ou seja, "um acordo pelo qual uma das
partes (o concedente) se obriga a vender os
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produtos por si produzidos ou distribuídos à


contraparte (o concessionário), a qual se obriga a
comprá-los e a (re)vendê-los a terceiros, por sua
conta e de modo estável". Ou, como escreve
Menezes Cordeiro (5), “é um contrato atípico e
inominado e que tem sido definido como aquele no
qual uma pessoa - o concedente - reserva a outra –
o concessionário – a venda de um seu produto,
para revenda, numa determinada circunscrição”.
Na concessão, o cedente e o cessionário acordam em
que este proceda à distribuição dos produtos daquele
(em exclusivo ou não) inserindo-se o concessionário
na rede de distribuição do cedente, ao qual adquire o
“produto”, obrigando-se a vendê-lo por sua conta e
risco.
Trata-se, contudo, de um contrato inominado, não
tipificado na lei, não dispondo, por isso, de
regulamentação específica, pelo que se lhe aplicam as
cláusulas acordadas entre as partes (artº 405º do
CC), as regras gerais dos contratos e ainda as normas
dos contratos nominados, sempre que a analogia das
situações o justifique, designadamente o de agência,
sobretudo em matéria de cessação do contrato (6). Mas
é sem dúvida um contrato “socialmente típico”, tal é
a sua implantação nos dias de hoje. Desempenha,
com efeito, uma função económico-social própria
pela organização da comercialização dos produtos,
com carácter duradouro, de tal forma que permite ao
concedente controlar a distribuição e pôr em prática a
sua política comercial, transferindo para o
concessionário os riscos da comercialização. É um
contrato-quadro, desprovido de um regime jurídico
próprio “que faz surgir entre as partes uma relação
obrigacional complexa, por força da qual uma delas,
o concedente, se obriga a vender à outra, o
concessionário, e este a comprar-lhe, para revenda,
determinada quota de bens, aceitando certas
obrigações (mormente no que concerne à sua
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organização, à política comercial e à assistência a


prestar aos clientes) e sujeitando-se a um certo
controlo e fiscalização do concedente” (7)
Assim, o concessionário, ao contrário do agente,
actua em seu nome e por sua conta, adquire a
propriedade da mercadoria, comprando-a ao
fabricante ou ao fornecedor, para a vender a terceiros,
assumindo os riscos da comercialização e não recebe
qualquer retribuição do concedente, retirando os seus
proventos do resultado da compra e venda dos
produtos.
Mais pormenorizadamente podemos apontar
entre ambos os contratos (agência e concessão
comercial) as seguintes diferenças (8):
1. Ao contrário do agente, o concessionário age em seu nome e por
conta própria, não representando juridicamente o concedente;
2. Diversamente do que sucede com outros colaboradores da
empresa, o concessionário adquire a propriedade da mercadoria,
embora, por vezes, o concedente beneficie de uma cláusula de
reserva de propriedade, acordada entre ambos;
3. Ao contrário do agente, o concessionário é um comerciante que
compra para revenda, estando muitas vezes obrigado a adquirir
determinada quota mínima de produtos;
4. Por isso, o concessionário assume o risco da comercialização,
podendo mesmo ter prejuízos avultados;
5. Geralmente o agente beneficia do regime de exclusividade;
6. As obrigações do concessionário para com o concedente não
cessam com a alienação dos bens, estando igualmente vinculado a
prestar assistência pós venda aos clientes, mediante pessoal
especializado e meios técnicos.
Em síntese: enquanto o agente é um colaborador
autónomo da empresa, por conta da qual se obriga
a promover a celebração de contratos e, algumas
vezes a concluí-los ele próprio, mas em nome e por
conta do principal, o concessionário actua em seu
nome e por conta própria. Este compra os
produtos ao cedente para os revender aos seus
próprios clientes. E, em regra, obriga-se a
comprar uma quantidade mínima de produtos
durante um certo período de tempo e/ou a
revender uma quantia mínima.
Ora, como se viu, a apelada comprava os produtos à
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apelante, comprometendo-se esta a vender-lhos nas


condições acordadas. E a venda destes era feita pela
autora a terceiros em seu nome e por conta própria,
não estando previsto o pagamento de qualquer
retribuição.
Não se trata, portanto, de um contrato de agência.
Mas nem sempre é fácil proceder à exacta
caracterização do contrato de concessão, sobretudo
quando nele são incluídas cláusulas próprias doutros
contratos.
Com efeito, nele são incluídas frequentemente
cláusulas próprias de figuras afins, de tal modo que
essa distinção se torna, por vezes, difícil.
Assim acontece, nomeadamente, quando o
concessionário se obriga à utilização de marcas ou de
insígnias que identifiquem o(s) produto(s) objecto do
contrato.
E daqui que possa haver alguma confusão com o
contrato de franquia, por exemplo.
Este é também um contrato atípico e inominado em
que “uma pessoa – o franquiador – concede a outra
– o franquiado – a utilização, dentro de certa área,
cumulativamente ou não, de marcas, nomes,
insígnias comerciais, processo de fabrico e técnicas
empresariais e comerciais, mediante contrapartidas”
(9)
Assim, relativamente à sua distinção do contrato de
concessão comercial, o que a franquia tem de mais
específico é a autorização dada pelo franquiador ao
franquiado para o uso da marca, insígnia ou similar. E
na franquia de distribuição, o franquiador limita-se a
vender certos produtos num armazém que usa a
insígnia do franquiador.
Na concessão existe uma prestação de dare;
Na agência uma prestação de facere;
E na franquia uma prestação de pati, isto é, o
franquiador utiliza o seu nome, a sua marca ou a
sua insígnia. E obriga-se a suportar que o
franquiado utilize o seu nome, a sua insígnia ou a
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sua marca.
Com efeito, o franquiador obriga-se a suportar ou
tolerar a actuação do franquiado, ao qual permite que
actue na sua esfera comercial privativa. Por sua vez o
franquiado beneficia duma organização empresarial
já existente, e na maior parte das vezes gozando já de
imenso prestígio, sendo conhecida da generalidade do
consumidores (10). Beneficia, pois, da promoção
comercial já desenvolvida pelo franquiador, ao
contrário do que sucede na agência (ou na concessão)
onde a actividade promocional cabe ao agente. E daí
as contrapartidas de que goza o franquiador.
A este respeito poderá considerar-se provado o
seguinte:
a ré explorou, no prédio onde está instalado o posto de abastecimento,
uma boutique e um snack bar.
vendeu, aí, entre outros, os seguintes produtos: lubrificantes, café,
chocolates, bolos, cervejas, águas e refrigerantes.
encomendou os produtos vendidos quer no posto de abastecimento,
quer na boutique e no snack bar.
Pagou, à “E....”, e, posteriormente, à Ré, a taxa de exploração
mencionada na cláusula 4ª do anexo I do acordo celebrado em 24/09/91
(ou seja, 20% do valor das vendas na boutique e no snack bar.
O franquiador obtém lucros resultantes do exercício
da sua actividade, ao contrário do que acontece, por
exemplo, com o agente, que, como vimos, é
retribuído pelo volume dos negócios por ele
realizados.
No fundamental, o contrato de franquia é
caracterizado pela autorização dada pelo franquiador
ao franquiado para usar determinadas marcas ou
insígnias, utilizando determinados esquemas de
comercialização, mediante contrapartidas prestadas
por este.
Assim, no caso dos autos, em relação a estes produtos
ainda se poderá pensar na existência de um contrato
de franquia. Mas o mesmo já não se pode dizer em
relação à venda de combustíveis, tendo em
consideração os factos provados e o que foi referido
quanto à sua caracterização. E aquela actividade era
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sem dúvida acessória em relação a esta, pelo que


jamais se poderá defender que o contrato celebrado
entre autora e ré é um simples contrato de franquia.
De fls. 275 a 277 invoca a apelante alguns dos factos
provados que, em seu entender, caracterizariam o
contrato de franquia.
Salvo o devido respeito não tem razão.
A maioria deles caracteriza antes um contrato de
concessão.
O facto de os produtos serem vendidos ao público
sob as marcas ou denominações “E....” não significa
necessariamente que se trate de um contrato de
franquia. Com efeito, a A. revendia os produtos da ré,
e estes tinham, naturalmente, a sua marca, pois, numa
empresa como esta, outra coisa não seria de esperar.
Mas isso não significa que, mesmo em relação a
esses produtos, não vigorasse um contrato de
concessão comercial. É preciso não esquecer que o
concessionário integra-se na organização de venda do
concedente, razão pela qual muitas vezes tem de
subordinar a sua empresa aos ditames deste, o que se
torna mais nítido quando existe um regime de
exclusividade.
De qualquer maneira, a não ser assim entendido,
sempre haveria que ter em consideração que o pedido
de indemnização de clientela nada tem a ver com os
produtos comercializados na “boutique” ou no “snak-
bar”. Aliás, as condições relativas à venda destes
produtos eram diferentes das da venda dos
combustíveis. Mas só em relação a estes é feito o
pedido de indemnização de clientela. Por isso nem
sequer tem interesse averiguar se se trata de um
contrato misto ou de uma união de contratos ou de
um único contrato. A solução final seria a mesma.
V
Vejamos agora a apelação no que diz respeito à
chamada “indemnização de clientela”.
Está em causa a chamada “indemnização de
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clientela” prevista nos artigos 33º e 34º do DL 178/86


para o contrato de agência, na redacção dada pelo DL
nº 118/93, de 13.04.
Com efeito, estabelece o artigo 33º que, sem prejuízo
de qualquer outra indemnização, nos termos das
disposições anteriores, o agente tem direito, após a
cessação do contrato, a uma indemnização por
clientela, desde de que sejam preenchidos,
cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) O agente tenha angariado novos clientes para a
outra parte ou aumentado substancialmente o volume
de negócios com a clientela existente;
b) A outra parte venha a beneficiar
consideravelmente, após a cessação do contrato, da
actividade desenvolvida pelo agente;
c) O agente deixe de receber qualquer retribuição
por contratos negociados ou concluídos, após a
cessação do contrato, com os clientes referidos na
alínea a).
Do contrato em causa nada consta a este respeito.
Todavia, tem-se entendido que esta indemnização
também é devida noutros contratos, sempre que a
analogia das situações o justifique. No próprio
preâmbulo daquele diploma legal diz-se
expressamente que, no direito comparado, o contrato
de concessão comercial se tem mantido como um
contrato atípico, mas que, ao mesmo tempo, vem
sendo posta em relevo a necessidade de se lhe aplicar,
por analogia - quando e na medida em que ela se
verifique - o regime da agência, sobretudo em
matéria de cessação do contrato.
Como diz A. Pinto Monteiro (11), isto acontece porque
a finalidade do contrato de concessão envolve,
frequentemente, uma actividade e um conjunto de
tarefas similares às da agência, estando os
contraentes unidos, de modo idêntico, por uma
relação de estabilidade e de colaboração...
Prevê a lei que, sem prejuízo de qualquer outra
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indemnização a que haja lugar, a indemnização de


clientela seja concedida, desde que se verifiquem
cumulativamente os requisitos a que aludem as
alíneas a) a c) do nº 1 do artº 33º.
"Trata-se, na sua essência, de uma indemnização
destinada a compensar o agente dos proveitos de
que, após a cessão do contrato, poderá continuar a
usufruir a outra parte, como decorrência da
actividade desenvolvida por aquele. Verificadas as
condições de que depende a indemnização de
clientela é devida, seja qual for a forma de cessação
do contrato" (conf. preâmbulo já citado).
A indemnização de clientela será uma compensação
devida ao agente, após a cessação do contrato, pelos
benefícios de que o principal continua a auferir com a
clientela angariada ou desenvolvida pelo agente.
Será como refere Helena Brito, in “Novas
perspectivas do Direito Comercial” um direito à
retribuição por serviços prestados; o originário direito
à comissão transforma-se, por efeito da cessação do
contrato, em direito a uma compensação, que terá em
conta as retribuições esperadas pelo agente se o
contrato não fosse interrompido. Trata-se, assim, de
uma compensação pela “mais-valia” que é
proporcionada, graças à actividade desenvolvida, na
medida em que o principal continua a aproveitar-se
dos frutos dessa actividade após o termo do contrato
de agência.
De resto tem-se entendido que não se trata em rigor
de uma verdadeira indemnização devida ao agente
(não tendo função reparadora) até porque não está
dependente de prova, a fazer por este, dos danos
sofridos. O que conta são os benefícios
proporcionados pelo agente ao principal,
benefícios esses que, na vigência do contrato, eram
comuns, e que, após o seu termo, irão aproveitar
apenas a este. Trata- se de um direito à retribuição
pelos serviços prestados. Mesmo que o agente não
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sofra danos, haverá um enriquecimento do principal


que legitima e justifica uma compensação. Em suma:
trata-se de uma remuneração devida ao agente pela
clientela angariada e da qual virá a beneficiar o
principal; a finalidade desta indemnização é, pois, a
de compensar o agente na medida dos benefícios de
que o principal continue a auferir após a cessação do
contrato, em virtude da actividade por ele
desenvolvida. Ou, como refere Maria Helena Brito
(12), «o fundamento desta “indemnização” é o

incremento da clientela, que reverte a favor do


principal, enquanto o agente perde a retribuição que
poderia auferir daquela clientela se o contrato não
terminasse»
Portanto, mesmo que o agente não sofra danos,
poderá exigir a indemnização de clientela.
Mas, nos termos do artigo 34º do referido decreto-lei,
a indemnização é calculada em termos equitativos.
Assim sendo, há que fixar a indemnização pelo
recurso à equidade.
Todavia, após a redacção de 1993, aplicável ao
caso, essa indemnização não pode exceder um
valor equivalente a uma indemnização anual,
calculada a partir da média anual das
remunerações recebidas pelo agente durante os
últimos cinco anos. Mas, tendo o contrato durado
menos tempo, atender-se-á à média do período em
que esteve em vigor
Trata-se, contudo, e apenas, de um limite máximo.
A este respeito foi tido em consideração na
sentença recorrida:
«A A. quantificou a indemnização de clientela em 3.900.000$00.
Perante os factos apurados resulta que a R. ao fazer cessar o contrato,
transferiu para si uma clientela calculada em meia centena criada pelo
esforço da A. ao longo do período de vigência do contrato, tirando
proveito da boa imagem dada pela A. aos produtos da R..
Ponderando em termos de equidade, critério que vai ínsito no art.º 34.º,
valorado o número de clientes que surge indicado no petição
apresentada pelo autor e verificando-se, à luz da factualidade provada,
www.dgsi.pt/jtrl.nsf/e6e1f17fa82712ff80257583004e3ddc/238cf974dec69796802571a7003876de 21/30
12/11/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

que os benefícios auferidos pela “C...”, sem prejuízo da sua


atendibilidade, não têm a extensão que o Autor lhes atribui, fixar-se-á
em 2.000.000$00 (valor que constitui cerca de metade da média anual
das comissões recebidas pela A.), a indemnização a que a Autora tem
direito....»

Parece-nos que se trata duma questão bastante


complexa, não só quanto a saber se é devida a
indemnização, mas também, em caso afirmativo, qual
o seu montante.
Trata-se dum problema que, a priori, não é fácil de
resolver, pois, além do mais, está dependente da
verificação de pressupostos bastante exigentes.
Por isso compete ao eventual titular alegar e
provar os factos conducentes à requerida
indemnização. A causa de pedir (factos jurídicos de que
deriva o direito invocado) deve ser devidamente
fundamentada. Além disso, há que ter em
consideração os conceitos indeterminados
utilizados pelo legislador.
Como vimos, é necessária a verificação cumulativa
daqueles três requisitos.
Diz a apelante que não se verifica qualquer deles. E
isto porque, por um lado, não se sabe que clientes a
A. teria angariado para o posto de abastecimento de
combustível (“se é que algum angariou”) e, por outro,
nada consta quanto aos benefícios – e muito menos
“consideravelmente” – por parte da apelante após a
cessação do contrato. E ainda porque, não se
conhecendo os clientes da autora, não se sabe se se
mantiveram após a cessação do contrato. E a ser
devida qualquer indemnização, continua a apelante,
seguindo o raciocínio constante da sentença, ao ter-se
considerado o montante de Esc. 2.000.000$00,
considerou-se implicitamente que esse valor
representaria que cerca de 50% das vendas efectuadas
no posto de abastecimento de combustíveis seriam de
clientes angariados pela A..
A este respeito há que ter em consideração
essencialmente os seguintes factos:
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- o contrato vigorou durante três anos;


- após a sua cessação, a A. deixou de explorar o posto de abastecimento
de combustíveis;
- a A. divulgou, na região onde o mesmo se situa, a notícia relativa à
sua abertura;
- após 01/04/96 a autora manteve-o em funcionamento, aberto ao
público, durante todos os dias da semana, das 07.00 às 23.00 horas;
- atendeu os clientes que o frequentaram;
- vendeu, a estes, combustíveis comercializados pela “E...”, e, a partir
de 30.01.97, pela R.;
- entre 1/4/96 e 31/3/99, a A. angariou para o mencionado posto de
abastecimento meia centena de clientes;
- todos esses clientes continuam, actualmente, a ser clientes do posto de
abastecimento;
- a A. deixou de receber, após a cessação do contrato ocorrida em
31.03.99, qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos
com esses clientes;
- deixou igualmente de receber, após essa mesma cessação, qualquer
retribuição por contratos negociados ou concluídos com quaisquer
outros clientes do posto de abastecimento;
- todo o volume de negócios relativo a esse posto de abastecimento foi
iniciado pela A.;
- por intermédio do seu sócio gerente, “V...”, e dos trabalhadores ao seu
serviço, a A. sempre actuou com a máxima correcção e urbanidade
junto dos clientes do posto de abastecimento, conquistando, desse
modo, a simpatia destes;
- a actividade por ela desenvolvida contribuiu para que aqueles clientes
tivessem uma boa imagem dos produtos da Ré, convencendo-os de que
estes eram, efectivamente, os melhores;
- em resultado da actividade da A., os produtos da Ré mantiveram, após
a cessação do contrato, junto dos aludidos clientes, uma imagem de alta
qualidade.
- nos 3 anos de duração do contrato celebrado em 24/09/91, a A.
recebeu comissões no total de 11.733.556$00.

“Naturalmente que não é qualquer acréscimo de


clientela ou qualquer beneficio que daí resulte para o
principal que justificará a atribuição ao agente de
uma “indemnização” de clientela; terá de se tratar
de um acréscimo e de um beneficio de proporções
minimamente relevantes para o efeito: um acréscimo
“substancial” do volume de negócios do principal
donde resulte para este um beneficio “considerável”-
Caberá, aqui, à actividade jurisprudencial a cuidada
concretização dos conceitos indeterminados
utilizados pelo legislador (13)”.
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Em relação ao requisito da referida alínea a) é


necessário que se prove que o concessionário
angariou novos clientes para o concedente ou que
aumentou substancialmente o volume de negócios
com a clientela já existente (porém basta a
verificação dum destes factos)
Mas, como é evidente, não basta a angariação de
alguns (poucos clientes), pois, só se justificará a
indemnização de clientela se for angariado um
número significativo de novos clientes. Tal como se
torna necessário o aumentado substancial do volume
de negócios com a clientela já existente
Com base nos factos agora referidos, parece-nos que
pode dar-se como verificado o primeiro dos referidos
requisitos, à semelhança do que foi feito em 1ª
instância, pois a autora, durante 3 anos de contrato,
angariou pelo menos meia centena de clientes, e todo
o volume de negócios foi iniciado por ela. Além
disso, a actividade por ela desenvolvida contribuiu
para que aqueles clientes tivessem uma boa imagem
dos produtos da Ré, convencendo-os de que estes
eram, efectivamente, os melhores. E a tanto não obsta
a circunstância de o posto de combustíveis ter sido
construído pela apelante. É que o trabalho de
prospecção e angariação de clientes foi feito pela
autora.
Foi, pois, pelo trabalho realizado pela autora que se
desenvolveu a actividade ali exercida.

Vejamos agora o requisito da alínea b): que a autora


venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da
actividade desenvolvida pelo cessionário.
Antes de mais dir-se-á que não é necessário que os
benefícios para o concedente já tenham ocorrido,
“bastando que, de acordo com um juízo de
prognose, seja bastante provável que eles se
venham a verificar, isto é, que a clientela
angariada pelo agente constitua em si mesma uma
chance para o principal” (14).
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O mais importante é que o principal (neste caso a ré e


cedente) fique em condições de continuar a usufruir da
actividade desenvolvida pelo ex-concessionário, o
que, in casu, se verifica. Mas não só: provou-se que a
concedente, após a cessação do contrato, continuou a
vender os seus produtos no território onde vigorava o
exclusivo dado à ré e que, em resultado da actividade
da A., os seus produtos mantiveram, após a cessação
do contrato, junto dos aludidos clientes, uma imagem
de alta qualidade.
Ora, como se disse, a indemnização de clientela
destina-se essencialmente a compensar o
concessionário dos proventos de que, após a cessão
do contrato, poderá continuar a beneficiar o
concedente, como resultado da actividade por
aquele desenvolvida. Ou dito doutro modo: a
indemnização de clientela a que se refere o artigo 33º traduz-se
numa compensação devida ao agente, após a cessação do contrato,
pelos benefícios de que o principal continue a auferir com a
clientela angariada ou aumentada pelo agente.
Por isso, essencial é apurar se, e em que medida,
após a cessação do contrato, o cedente fica a
beneficiar da actividade desenvolvida pelo
concessionário.
Vejamos agora o requisito da alínea c).
Em relação a este nenhuma questão se levanta,
tendo em consideração os factos provados. É que a
A. deixou de receber, após a cessação do contrato,
qualquer retribuição por contratos negociados ou
concluídos com os anteriores clientes. E deixou
igualmente de receber qualquer retribuição por
contratos negociados ou concluídos com quaisquer
outros clientes do posto de abastecimento. Nada mais
recebeu, pois, como contrapartida pelo contrato
celebrado com a ré.
VI
Verificar-se-iam, pois, os pressupostos da
obrigação da “indemnização de clientela”, nos
termos do referido artigo 33º.
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Em princípio, dada a similitude das situações entre os


contratos de concessão e de agência, o regime deste
é, em regra, aplicável ao contrato de concessão.
Parece, contudo, que há que ver caso a caso se se
verifica uma analogia tal que justifique essa
aplicação.
E, como se vem dizendo, entre os dois contratos
existe uma grande analogia nesta parte: tanto o
agente como o concessionário promovem os produtos
do “principal”, assim contribuindo para a sua
divulgação. E tal como sucede num contrato de
agência, o concessionário adquire e fideliza
determinada clientela. Daqui resulta uma certa
afinidade entre o contrato de agência e o contrato de
concessão comercial, não só quanto à actividade
desenvolvida pelo agente e pelo concessionário, mas
ainda quanto à situação de dependência económica
em que ambos se encontram relativamente à outra
parte.
É que o contrato de concessão envolve, com muita
frequência, um conjunto de actividades semelhantes
às que se verificam no contrato de agência, estando
os contraentes unidos, em ambos os casos, de modo
idêntico, por relações de estabilidade e cooperação,
com um objectivo comum.
Mas é fundamentalmente pela integração do
revendedor na rede de distribuição do concedente,
com tudo o que isso implica e pressupõe em
termos de colaboração entre as partes, e de
promoção dos bens distribuídos, que se
aproximam os dois contratos (o de agência e o de
concessão) e que, nessa medida, mais se justifica a
aplicação ao contrato de concessão do regime da
agência.
É ainda tal integração que torna mais fácil ao
concedente impor a sua política comercial e controlar
a fase da distribuição, sendo certo, por outro lado,
que o concessionário também retira daí benefícios,
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nomeadamente pela posição de privilégio e a


vantagem concorrencial que passa a ter. O que, tudo
junto, evidencia a função económico-social deste
contrato (a sua causa «hoc sensu») e explica a sua
importância e frequente utilização prática (15).
Se é verdade que o agente promove a realização de
contratos por conta do cedente, também, no caso sub
judice, a concessionária vendeu os produtos da ré
durante três anos, tendo angariado clientes, e a
actividade por ela desenvolvida contribuiu para que
estes tivessem uma boa imagem dos produtos da Ré.
E convém não esquecer que a indemnização é
concedida precisamente pelos benefícios que o
principal continua a poder auferir pela clientela
angariada. E, como vimos, também a actividade
desenvolvida pela autora proporcionou à ré a
possibilidade de mais facilmente vender os seus
produtos na região onde aquela esteve implantada.
Portanto, o regime da indemnização por clientela
previsto no citado artigo 33º é aplicável por
analogia aos contratos de concessão comercial,
nomeadamente ao celebrado entre as partes nesta
acção.
VII
No entanto, a apelante diz que não pôs termo ao
contrato, tendo apenas impedido a sua renovação.
E, por isso, exercendo o seu direito de denúncia,
nenhuma indemnização teria de pagar à autora.
Mas não é essa a questão, pois a autora não põe em
causa a validade da denúncia. E uma coisa é certa: o
contrato cessou por iniciativa da ré, pois, caso
contrário, ter-se-ia renovado. A autora não põe em
causa o direito da ré a denunciar o contrato (a
impedir a sua renovação). Nem é esse o fundamento
desta acção. Como dissemos, o direito à
indemnização de clientela existe mesmo que o
cessionário não tenha sofrido prejuízos.
Aliás, estes contratos são a maioria das vezes
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celebrados por um prazo determinado (um ou mais


anos), contendo uma cláusula de renovação por
iguais períodos de tempo, desde que não sejam
denunciados por qualquer das partes com uma certa
antecedência. É o que acontece no caso dos autos.
O contrato só não se renovou porque a R. o
denunciou. Portanto, cessou por vontade da ora
ré/apelante.
VIII
Vejamos agora o montante da indemnização.
O artigo 34º refere-se à média anual das
remunerações recebidas pelo agente durante os
últimos cinco anos, ou, como sucede neste caso
concreto, à média dos três anos que o contrato esteve
em vigor. No contrato de agência existe a retribuição
(artº 1º), a qual é determinada essencialmente com
base no volume dos negócios conseguidos pelo
agente, em regra sob a forma de comissão ou
percentagem calculada sobre o volume dos negócios
por ele conseguidos (ver ainda os artigos 15º e 16º).
Pode também ser fixada, pelo menos parcialmente,
em quantia determinada. Mas a forma mais corrente
de cálculo é a comissão sobre as vendas promovidas
pelo agente, o que é facilmente determinável.
Portanto, no contrato de agência, a retribuição
determina-se fundamentalmente com base no volume
de negócios conseguidos pelo agente, normalmente
através de uma comissão ou percentagem calculada
sobre o valor dos negócios obtidos. Mas o mesmo
não sucede no contrato de concessão comercial, onde
não existe uma “retribuição” calculada nestes termos.
O concessionário, como vimos, ao contrário do
agente, actua em seu nome e por sua conta, adquire a
mercadoria, comprando-a ao fabricante ou ao
fornecedor, para a vender a terceiros, assumindo os
riscos da comercialização, não recebendo, por isso,
qualquer outra retribuição do concedente.
Já vimos quais os critérios para a fixação da
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indemnização.
A autora invoca que durante os 3 anos de vigência do
contrato recebeu comissões no total de
11.737.556$00. Este montante é a soma das parcelas
referidas nos números 15 a 18 dos “factos provados”,
ou seja, das quantias auferidas pela ré nos termos da
cláusula 5ª do Contrato: “80% das comissões de
revenda fixadas oficialmente”.
E é com base nestes dados, e tendo em consideração
a clientela que diz ter angariado, que formula o
pedido de condenação da ré a pagar-lhe a quantia de
3.900.000$00. A verdade é que apenas ficou provado
que angariou “meia centena” de clientes, ou seja,
pouco mais de 1/6 dos referidos.
Mas não conta apenas para a fixação da
indemnização o número de clientes angariados. Até
porque, em regra, este número não é facilmente
apurado. Há que ter em consideração todas as
circunstâncias referidas no anteriores números V e
VI.
Por todo o exposto, parece-nos mais adequada uma
indemnização de 5.000, 00 euros.
Por todo o exposto acorda-se em conceder parcial
provimento à apelação, alterando-se a sentença
recorrida e condenando-se a ré a pagar à autora a
quantia de sete mil e quinhentos euros (7.500,00)
acrescida de juros de mora, à taxa de juro
comercial, vencidos desde o dia 21 de Março de
2000, data da citação, até integral pagamento.
Custas em ambas as instâncias na proporção do
vencido.
Lisboa, 14.02.2006.
Pimentel Marcos
Abrantes Geraldes
Maria do Rosário

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(1).-Na acepção que será referida.

(2).-Lições de Direito Comercial, vol. I-202.

(3).-Ob. cit. pag. 209.

(4).-E o contrato de cessão de exploração teria de ser feito por escritura pública, sob pena de
nulidade (artº 81, nº 2, m. do Código do Notariado)

(5).- “Do Contrato de Concessão Comercial”, ROA pag. 600.

(6).- (conf. "Anotações Ao Novo Regime do Contrato de Agência" de Carlos Lacerda Barata,
sobretudo as anotações ao artigo 1º).

(7).-Veja-se PINTO MONTEIRO, «Contrato de Agência», 4.ª edição, págs. 49 e «Denúncia de um


Contrato de Concessão Comercial», in RLJ 130, págs. 92. Pode ver-se, ainda MARIA HELENA
BRITO, «O Contrato de Concessão Comercial», 1990, págs. 155 e ss.

(8).-Ver estudo publicado por A. Pinto Monteiro no BMJ 360-83.

(9).-Menezes Cordeiro ob. cit. pag. 600.

(10).-Veja-se o que sucede, por exemplo, com marcas mundialmente conhecidas.

(11).-"Contrato de Agência", pag 60.

(12).-O Contrato de Concessão Comercial, pag. 100.

(13).-Carlos Lacerda Barata, in “Anotações ao Novo regime do Contrato de Agência”., pag. 82.

(14).-A. Pinto Monteiro, in Contrato de Agência pag. 115.


No mesmo sentido Carlos Lacerda Barata, in Anotação ao Novo Regime do Contrato de Agência,
pag. 82.

(15).-António Pinto Monteiro, Denúncia de um Contrato de Concessão Comercial, R.L.J., ano


130º, pág. 94.

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