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Bromatologia

UNIVERSIDADE DE SOROCABA
CURSO NUTRIÇÃO
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO: BROMATOLOGIA
Profa. Maria Aparecida Lopes da Costa

LEITES

1) Sistemas protéicos em alimentos

1.1) Leite
Leite significa o produto oriundo da ordenha completa de vacas sadias e bem alimentadas,
com exceção do produto secretado entre 9 e 30 dias após a parição, o qual é denominado de
colostro.
Fisicamente o leite é composto de uma mistura complexa de substâncias orgânicas, tais
como: lipídios, proteínas, carboidratos, vitaminas e minerais formando uma emulsão da matéria
graxa em solução aquosa num estado coloidal. Apresenta-se como um dos produtos mais
completos do ponto de vista nutricional, sendo uma fonte protéica e de cálcio por excelência,
contendo elevados teores de tiamina, niacina e magnésio. São levemente deficientes em
aminoácidos sulfurados, metionina e cisteína.
1.1.1) Principais proteínas
O leite cru possui aproximadamente 3,5% de proteína com variação em função da ração
do animal, alimentação, sistemas de criação, época do ano, etc., e pH próximo de 6,7.
As principais proteínas presentes são as Caseínas (, ,  e ), com pI próximo a 4,7.
Representa 80% das proteínas do leite da vaca. É uma proteína termoestável, isto porque, na
fração  existe um sítio formando pelos aminoácidos metionina-fenilalanina que confere
estabilidade térmica à proteína, uma vez que esse tipo de ligação não é quebrado pelo calor, mas
sim pela enzima renina.
1.1.2) Formação de micelas - associação da caseína
Na presença de cálcio as caseínas  e  precipitam, enquanto, que na presença do cálcio
e da -caseína elas formam micelas. Micelas perfeitas são formadas apenas na presença de
vários íons: Ca2+, PO4 3+ , citrato e Mg2+. Elas têm uma estrutura frouxa (conteúdo de água maior
que 70%). Aparentemente, micelas seriam formadas por sub-micelas a partir de um núcleo
hidrofóbico, envolvido por camadas polares que juntas formam partes ricas em grupamentos
fosfóricos e hidrofílicos. A -caseína protege a micela da precipitação por íons de cálcio.
1.1.3) Coagulação do leite
A coagulação do leite para produção de queijo pode ser feita de duas formas. Por meio da
acidificação lática ou da adição de ácido até pH 4,6, situação que toda caseína desmineralizada
precipitará. Este método de coagulação ou floculação não é muito usado na produção de queijo
francês, mas é amplamente empregada na produção de queijo na região do Mediterrâneo. Deste
modo, produz-se um pequeno coágulo.
A outra forma seria através da coagulação pela renina ou outra protease coagulante, que
levará a uma quebra mais ou menos específica das ligações entre fenilalanina-metionina na
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molécula de -caseína, provocando a desestruturação da capa-caseína, que abandonará a
micela, deixando as demais caseínas em contado com o cálcio, que provocará a desnaturação
dessas caseínas (alfa, beta e gama-caseínas). Com a desestruturação das micelas, as caseínas
se tornam insolúveis precipitando formando uma massa queijeira (proteína coagulada). Nesse
caso, a coagulação ocorrerá de forma lenta em temperaturas abaixo de 15º C.
1.1.4) Proteínas do soro do leite
Quando a caseína é removida do leite desnatado, o líquido remanescente é denominado
de soro do leite. Quando a caseína é removida através da adição de ácido (pH 4,6) o soro
resultando é dito soro ácido, mas quando a remoção é feita pela adição da enzima renina, tem-se
o soro doce, que apresenta maior quantidade de peptídeos e aminoácidos livres, visto que a
renina hidrolisa a -caseina.
As proteínas do soro representam 20% do total de proteínas do leite, sendo que a -
Lactoalbumina e a -lactoglobulina totalizam entre 70 e 80% desse total de proteínas. Nos 20 a
30% restantes são encontrados soroalbumina, proteases-peptonas, imunoglobulinas, lactoferrina e
transferrina, além de enzimas.
A -Lactoalbumina apresenta 8 cisteínas, ou seja, 4 pontes dissulfeto e alto teor de
triptofano (hidrofóbico). No pH normal do leite a -Lactoalbumina é dentre as proteínas do soro a
mais estável ao aquecimento, não sofrendo agregação mesmo após a desnaturação. Entretanto,
sua desnaturação pelo calor leva a formação de membranas na parede do recipiente de
aquecimento e a nata na superfície. Quando o aquecimento é excessivo, os gases dissolvidos no
leite e o vapor formado durante o aquecimento tendem a se expandirem e serem liberados. Como
há um filme (‘nata’) na superfície, os gases não são liberados, aumentando a pressão, o leite
sobre e derrama. Além disso, o calor provoca o rompimento das pontes dissulfeto presentes na
molécula resultando no sabor e odor de leite ‘cozido’.
-Lactoalbumina juntamente com a UDP galactosil-transferase têm a função de fixar a
galactose, e assim, assegurar a síntese de lactose.
-lactoglobulina é a proteína mais abundante do soro do leite de vaca. Possui inúmeros
grupos SH livres e duas pontes dissulfeto intramolecular, que são responsáveis pelo
desprendimento de hidrogênio sulfurado quando o leite é aquecido acima de 70º C. Aquecimento
em temperaturas acima de 60o C por 3 minutos, provoca desnaturação dessa proteína. A 95o C
ocorre desnaturação completa com extensa transformação na conformação da proteína e
exposição de grupos SH e hidrofóbicos. Os grupos SH passam a interagir (adsorvem às micelas)
com as micelas de caseínas, formando um complexo caseína--lactoglobulina impedindo a ação
da enzima renina no processo de transformação do leite em queijo.
A enzima fosfatase desnatura em temperatura/tempo semelhante aos empregados no
processo de pasteurização do leite. Por tal razão a mesma serve para monitorar o processo de
pasteurização, embora seja passível de renaturação.
Já, a peroxidase (representa 0,5 a 1%) é inativada quando aquecida por 2,5 minutos em
temperaturas superiores a 75o C ou a 80o C imediatamente, tempos de aquecimento superiores
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aos utilizados no processo de esterilização do leite, sendo por tal motivo, utilizada para monitorar
tal processo. Assim, a peroxidase deve estar ativa no leite pasteurizado e inativa no esterilizado.
Além disso, esta enzima catalisa a decomposição do H 2O2 na presença de um doador de oxigênio
ou de um componente oxidável. Por tal razão apresenta ação bacteriostática.
Imunoglobulinas: estão presentes em todos os leites; no leite de vaca é somente um
décimo das proteínas solúveis, porém esta quantidade aumenta muito no colostro.
Lípases: promovem a hidrólise das gorduras dando origem ao sabor amargo ou de ‘ranço’
característico.
Proteases: enzima proteolítica que tem preferência pelas caseínas, sendo por tal razão
denominada de caseinase. Possivelmente esta atividade proteolítica endógena seja a responsável
pela formação da gama-caseína a partir da beta-caseína.
Oxidases de grupos sulfidrilas: essa enzima catalisa a oxidação de grupos sulfidrila a
grupos dissulfeto. O rompimento desses grupos durante o aquecimento com a formação de grupos
sulfidrilas livres é o responsável pelo sabor e odor de leite ‘cozido’. A presença dessas enzimas,
mesmo após o aquecimento do leite, favoreceria o a oxidação dos grupos sulfidrilas em pontes
dissulfeto.

2) Bibliografia:
ALAIS, C.; LINDEN, G. Food biochemistry. London, Ellis Horwood, 1991
CHEFTEL, J. C.; CHEFTEL, H. Introdución a la bioquímica y tecnología de los alimentos.
Zaragoza, Acribia, 2000.
FENNEMA, O. R. Quimica de los alimentos. Zaragoza, Acribia, 2ª ed. 2000
KOOLMAN, J.; RÖHM, K.-H. Color atlas of biochemistry. Stutgart, Library of Congress, 1996.

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