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RESUMO DO ARTIGO:

The genotype–phenotype distinction: from Mendelian genetics to 21st century biology (A


distinção entre genótipo e fenótipo: da genética mendeliana à biologia do século XXI)

Discente: Sulamita Silva Leão

O artigo aborda os pilares da distinção entre genótipo-fenótipo (G-P), novas descobertas sobre
hereditariedade e abordagens recentes relacionadas aos genótipos e fenótipos. Embora a distinção
G-P ainda seja utilizada em casos específicos, existem questionamentos sobre sua relevância na
atualidade, visto que o conhecimento sobre o tema evoluiu no decorrer do tempo. Ela precisa ser
repensada, já que foi elaborada por volta do século XIX e tem como base a genética mendeliana, no
início dos estudos sobre a hereditariedade. Nessa época, pesquisadores conceituaram a
hereditariedade biológica como o processo de transmissão de características entre gerações por
meio da reprodução e acreditavam que essa teoria deveria explicar, além das semelhanças entre pais
e filhos e características parentais híbridas, as irregularidades na transmissão dessas características
(que fazem os filhos nem sempre se parecerem com os pais, ou filhos de mesmos pais não serem
idênticos). Assim, as teorias da época sugeriram que a hereditariedade envolve não apenas
transmitir aos descendentes características observáveis, mas também “germes” latentes que
poderiam ou não se tornar características observáveis nas gerações seguintes.

Para Darwin, os germes eram diferentes das partes do corpo, sendo formados de “gêmulas” ou
elementos expelidos pelas partes do corpo durante a ontogênese, podendo ser mapeadas nessas
partes mesmo sem serem desenvolvidas. Essa concepção era coerente com o fato de que
características podem ser transmitidas de forma latente, mas sua teoria ainda manteve o conceito de
transmissão direta de características. O neodarwinista Weismman, entretanto, afirmou que os
caracteres e seus determinantes são de natureza distinta, permitindo diferenciar o
“germen”(continuidade da espécie) e o soma (partes do corpo dos pais e da prole). Segundo ele,
durante a ontogênese as linhagens de células germinativas e somáticas se separam e o germe
determina as características dos pais e dos descendentes. Galton também teve um pensamento
semelhante, diferenciando a soma dos germes transmitidos do organismo pessoal. Ele achava que, se
o corpo possui mais germes do que aqueles que seriam produzidos na ontogênese, o indivíduo
poderia transmitir tanto uma característica como uma doença, ainda que ele não a apresentasse.

Por volta do século XX, houve uma redescoberta das leis que mais tarde ficaram conhecidas
como genética mendeliana, e que, inicialmente, destacavam a formação e o desenvolvimento de
híbridos. A lei da segregação de Mendel aborda a separação de pares de caracteres nas células
sexuais, e a lei da segregação independente sustenta que pares de caracteres diferentes se
comportam de forma independente. Mendel, (através do experimento das ervilhas), diferenciou
caracteres puros, híbridos, dominantes e recessivos. Ele destacou que os caracteres dominantes
seriam transmitidos à prole, porém, os recessivos ficariam latentes nos híbridos e se manifestariam
nos descendentes, distinguindo, dessa forma, entre o que é transmitido e o que é observado nas
gerações. A redescoberta das leis de Mendel mudou a visão da hereditariedade, que passou de uma
força versátil para um fenômeno regido por regras específicas dando origem à genética mendeliana.
A partir de então, surgiram novos termos como alelo, homo/heterozigoto, a distinção G-P e o
conceito de gene, que representava “fatores unitários” enviados aos gametas como elementos
teóricos e funcionais, observados indiretamente por meio do fenótipo.

A partir dos anos 1900, surgiram avanços na teoria cromossômica da hereditariedade.


Johannsen enfatizou que o gene é inobservável, mas prevê o resultado da reprodução de um
organismo com outro, por isso evitou formular hipóteses sobre sua natureza física. O genótipo seria
a soma dos genes no gameta e também não era diretamente observável. O fenótipo representava o
conjunto de características observáveis. Essa concepção genotípica explicava que os pais transmitem
aos seus descendentes apenas os gametas, ou seja, as características adquiridas na ontogênese não
influencia o que é transmitido aos descendentes, destacando a diferença em relação à teoria da
“concepção de transmissão”. Essa visão foi um obstáculo na biologia no início do século XX.

A distinção G-P é baseada, primeiro, na observabilidade: distinção entre fatores hereditários


não observáveis e características hereditárias observáveis. Segundo, na transmissibilidade: distinção
entre fatores transmissíveis e não transmissíveis. Terceiro, na causalidade: os genótipos
transmissíveis não observáveis são a causa de fenótipos recorrentes observáveis, mas não vice-versa,
ou seja, é unidirecional. Os genótipos criam diferenças discretas que geram diferenças nos fenótipos,
assim, eles são considerados criadores de diferenças pela genética mendeliana. A distinção G-P
separou a hereditariedade da ontogênese. O desenvolvimento passou a ter uma dependência
assimétrica da hereditariedade. Avanços científicos, contudo, abalaram as bases da distinção G-P.

Os primeiros mapas genéticos da teoria cromossômica da hereditariedade surgiram nas


décadas de 1910 e 1920. Na década de 1940, experimentos mostraram que a base dos genes é o
DNA e não as proteínas. Na década de 1950 a estrutura helicoidal do DNA foi revelada e foi suposto
que os genes eram compostos por nucleotídeos em fita dupla, sendo um modelo para a síntese
protéica e, portanto, observável. Isso levou ao conceito atual de que o genótipo é uma parte
relevante do DNA transmitida pelos pais, e o fenótipo são as características físicas e
comportamentais do organismo. A partir daí, a biologia molecular fez a distinção entre genes
estruturais (unidades codificadoras) e reguladores (controlam as taxas de transcrição). Após a
descoberta de vários tipos de genes na década de 1960, ficou claro que eles não podiam ser
reduzidos a sequências de DNA lineares espacialmente limitadas, e podem determinar mais de uma
característica (pleiotropia). Dessa forma, o genótipo passou a ser sequências de DNA observáveis e
transmissíveis que determinam o fenótipo, enquanto o fenótipo não é transmissível. Assim, com as
descobertas da biologia molecular, o mapeamento G-P se tornou mais complexo que o esperado já
que os fatores causais da hereditariedade não podem ser facilmente mapeados pelo modelo
mendeliano.

A ampliação da hereditariedade restringe a validade da distinção G-P. Ela inclui transmissões


epigenéticas, comportamentais, simbióticas, ecológicas e outras, que permitem a transmissão direta
de algumas características. Isso reforça a ideia de que os legados biológicos não se limitam ao DNA, o
que limita o segundo pilar da distinção G-P. Segundo a literatura, a ontogênese é importante para a
hereditariedade, pois as características adquiridas no processo podem ser transmitidas às gerações.

O terceiro pilar da distinção G-P é avaliado com base em uma perspectiva teórica sistêmica
chamada organicismo. Essa teoria questiona a determinação unidirecional entre as partes e o todo
do organismo. Ela afirma que partes funcionais diferentes em um sistema biológico dependem uma
das outras para se manterem ao longo do tempo. Esse conceito apoia a visão de que a relação entre
as sequências de DNA e todo organismo deve ser mútua em três sentidos: nas condições de
existência (genótipo e fenótipo se interdependem para se manterem); especificação mútua de
poderes causais (os genes contribuem para formar as redes moleculares e as redes moleculares
determinam a atividade dos genes); relações de causa e efeito (genótipos e fenótipos criam
diferenças entre si), por exemplo, processos epigenéticos podem modificar sequências de DNA em
uma única geração de organismos levando à assimilação mutacional. Nesse processo, um gene
defeituoso é regulado positivamente (por mutação) para compensar seu defeito, cessando quando o
organismo encontra um estado viável e levando a conclusão que a variação genética pode ser
orientada e adaptada no nível do genoma.

Assim, a distinção G-P tem validade limitada diante da materialização molecular do


gene. Fica claro que ela não se aplica às situações biológicas gerais, mas apenas às situações
especiais (como nas doenças monogênicas). Por isso, o artigo ressalta que ela deve ser abandonada
para avançar em direção a um relato que especificaria de que forma as partes mais estáveis tendem
a se envolver mais na transmissão entre as gerações do que as partes menos estáveis, e como as
primeiras tendem a determinar unidirecionalmente as últimas.

Entretanto, a hereditariedade estendida é melhor explicada por meio de um relato


organizacional, que coloca no centro o sistema organizado como um todo e reavalia as complexas
relações entre os genes e as outras características. Ela não separa a transmissão de variação do
entendimento da hereditariedade como conservação. Assim, a distinção G-P ainda é usada na
prática, embora com menor força, como hábito linguístico ou por sua presença na literatura,
permitindo a continuidade da ciência. Por isso, uma opção seria reinterpretá-la, até porque a história
é importante e termos-chave não podem ser separados de termos antigos. Apesar disso, os autores
concluem defendendo o abandono da distinção G-P a fim de iniciar uma nova visão mais geral e
adequada do que a genética mendeliana, a partir de uma perspectiva organicista.

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