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Intertextualidade: Paráfrase e

Paródia
Intertextualidade acontece quando há uma referência explícita ou implícita de
um texto em outro. Também pode ocorrer com outras formas além do texto,
música, pintura, filme, novela etc. Toda vez que uma obra fizer alusão à outra
ocorre a intertextualidade.

A intertextualidade é um recurso realizado entre textos, ou seja, é a influência


e relação que um estabelece sobre o outro. Assim, determina o fenômeno
relacionado ao processo de produção de textos que faz referência (explícita ou
implícita) aos elementos existentes em outro texto, seja a nível de conteúdo,
forma ou de ambos: forma e conteúdo.

Grosso modo, a intertextualidade é o diálogo entre textos, de forma que essa


relação pode ser estabelecida entre as produções textuais que apresentem
diversas linguagens (visual, auditiva, escrita), sendo expressa nas artes
(literatura, pintura, escultura, música, dança, cinema), propagandas
publicitárias, programas televisivos, provérbios, charges, dentre outros.

Tipos de Intertextualidade

Há muitas maneiras de realizar a intertextualidade sendo que os tipos de


intertextualidade mais comuns são:

 Paródia: perversão do texto anterior que aparece geralmente, em forma de


crítica irônica de caráter humorístico. Do grego (parodès) a palavra “paródia”
é formada pelos termos “para” (semelhante) e “odes” (canto), ou seja, “um
canto (poesia) semelhante à outra”. Esse recurso é muito utilizado pelos
programas humorísticos.
 Paráfrase: recriação de um texto já existente mantendo a mesma ideia
contida no texto original, entretanto, com a utilização de outras palavras. O
vocábulo “paráfrase”, do grego (paraphrasis), significa a “repetição de uma
sentença”.
 Epígrafe: recurso bastante utilizado em obras, textos científicos, desde
artigos, resenhas, monografias, uma vez que consiste no acréscimo de uma
frase ou parágrafo que tenha alguma relação com o que será discutido no
texto. Do grego, o termo “epígrafhe” é formado pelos vocábulos “epi” (posição
superior) e “graphé” (escrita). Como exemplo podemos citar um artigo sobre
Patrimônio Cultural e a epígrafe do filósofo Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.): "A
cultura é o melhor conforto para a velhice".
 Citação: Acréscimo de partes de outras obras numa produção textual, de
forma que dialoga com ele; geralmente vem expressa entre aspas e itálico, já
que se trata da enunciação de outro autor. Esse recurso é importante haja
vista que sua apresentação sem relacionar a fonte utilizada é considerado
“plágio”. Do Latim, o termo “citação” (citare) significa convocar.
 Alusão: Faz referência aos elementos presentes em outros textos. Do Latim,
o vocábulo “alusão” (alludere) é formado por dois termos: “ad” (a, para) e
“ludere” (brincar).

Outras formas de intertextualidade são o pastiche, o sample, a tradução e


a bricolagem.

Exemplos

Segue abaixo alguns exemplos de intertextualidade na literatura e na música:

Intertextualidade na Literatura

Fenômeno recorrente nas produções literárias, segue alguns exemplos de


intertextualidade.

O poema de Casimiro de Abreu (1839-1860), “Meus oito anos”, escrito no


século XIX, é um dos textos que gerou inúmeros exemplos de intertextualidade,
como é o caso da paródia de Oswald de Andrade “Meus oito anos”, escrito no
século XX:

Texto Original

“Oh! que saudades que tenho


Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!”

(Casimiro de Abreu, “Meus oito anos”)

Paródia

“Oh que saudades que eu tenho


Da aurora de minha vida
Das horas
De minha infância
Que os anos não trazem mais
Naquele quintal de terra!
Da rua de Santo Antônio
Debaixo da bananeira
Sem nenhum laranjais”

(Oswald de Andrade)

Outro exemplo é o poema de Gonçalves Dias (1823-1864) intitulado Canção do


Exílio o qual já rendeu inúmeras versões. Dessa forma, segue um dos
exemplos de paródia, o poema de Oswald de Andrade (1890-1954), e de
paráfrase com o poema de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987):

Texto Original

“Minha terra tem palmeiras


Onde canta o sabiá,
As aves que aqui gorjeiam
Não gorjeiam como lá.”

(Gonçalves Dias, “Canção do exílio”)

Paródia

“Minha terra tem palmares


onde gorjeia o mar
os passarinhos daqui
não cantam como os de lá.”

(Oswald de Andrade, “Canto de regresso à pátria”)

Paráfrase

“Meus olhos brasileiros se fecham saudosos


Minha boca procura a ‘Canção do Exílio’.
Como era mesmo a ‘Canção do Exílio’?
Eu tão esquecido de minha terra...
Ai terra que tem palmeiras
Onde canta o sabiá!”

(Carlos Drummond de Andrade, “Europa, França e Bahia”)

Intertextualidade na Música

Há muitos casos de intertextualidade nas produções musicais, veja alguns


exemplos:

A música “Monte Castelo” da banda legião urbana cita os versículos bíblicos 1


e 4, encontrados no livro de Coríntios, no capítulo 13: “Ainda que eu falasse as
línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que
soa ou como o sino que tine” e “O amor é sofredor, é benigno; o amor não é
invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece”. Além disso,
nessa mesma canção, ele cita os versos do escritor português Luís Vaz de
Camões (1524-1580), encontradas na obra “Sonetos” (soneto 11):

“Amor é um fogo que arde sem se ver;


É ferida que dói, e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se e contente;
É um cuidar que ganha em se perder;
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?”

Igualmente, a música “GoBack” do grupo musical Titãs, cita o poema


“Farewell” do escritor chileno Pablo Neruda (1904-1973):

“Ya no se encantarán mis ojos en tus ojos,


ya no se endulzará junto a ti mi dolor.
Pero hacia donde vaya llevaré tu mirada
y hacia donde camines llevarás mi dolor.
Fui tuyo, fuiste mía. ¿Qué más? Juntos hicimos
un recodo en la ruta donde el amor pasó.
Fui tuyo, fuiste mía. Tú serás del que te ame,
del que corte en tu huerto lo que he sembrado yo.
Yo me voy. Estoy triste: pero siempre estoy triste.
Vengo desde tus brazos. No sé hacia dónde voy.
...Desde tu corazón me dice adiós un niño.
Y yo le digo adiós.”

Apresenta-se explicitamente quando o autor informa o objeto de sua citação.


Num texto científico, por exemplo, o autor do texto citado é indicado, já na
forma implícita, a indicação é oculta. Por isso é importante para o leitor o
conhecimento de mundo, um saber prévio, para reconhecer e identificar
quando há um diálogo entre os textos. A intertextualidade pode ocorrer
afirmando as mesmas idéias da obra citada ou contestando-as. Há duas
formas: a Paráfrase e a Paródia.

Paráfrase

Na paráfrase as palavras são mudadas, porém a idéia do texto é confirmada


pelo novo texto, a alusão ocorre para atualizar, reafirmar os sentidos ou alguns
sentidos do texto citado. É dizer com outras palavras o que já foi dito. Temos
um exemplo citado por Affonso Romano Sant'Anna em seu livro "Paródia,
paráfrase & Cia" (p. 23):

Texto Original

Minha terra tem palmeiras


Onde canta o sabiá,
As aves que aqui gorjeiam
Não gorjeiam como lá.
(Gonçalves Dias, “Canção do exílio”).
Paráfrase

Meus olhos brasileiros se fecham saudosos


Minha boca procura a ‘Canção do Exílio’.
Como era mesmo a ‘Canção do Exílio’?
Eu tão esquecido de minha terra...
Ai terra que tem palmeiras
Onde canta o sabiá!
(Carlos Drummond de Andrade, “Europa, França e Bahia”).

Este texto de Gonçalves Dias, “Canção do Exílio”, é muito utilizado como


exemplo de paráfrase e de paródia, aqui o poeta Carlos Drummond de Andrade
retoma o texto primitivo conservando suas idéias, não há mudança do sentido
principal do texto que é a saudade da terra natal.

Paródia

A paródia é uma forma de contestar ou ridicularizar outros textos, há uma


ruptura com as ideologias impostas e por isso é objeto de interesse para os
estudiosos da língua e das artes. Ocorre, aqui, um choque de interpretação, a
voz do texto original é retomada para transformar seu sentido, leva o leitor a
uma reflexão crítica de suas verdades incontestadas anteriormente, com esse
processo há uma indagação sobre os dogmas estabelecidos e uma busca pela
verdade real, concebida através do raciocínio e da crítica. Os programas
humorísticos fazem uso contínuo dessa arte, freqüentemente os discursos de
políticos são abordados de maneira cômica e contestadora, provocando risos e
também reflexão a respeito da demagogia praticada pela classe dominante.
Com o mesmo texto utilizado anteriormente, teremos, agora, uma paródia.

Texto Original

Minha terra tem palmeiras


Onde canta o sabiá,
As aves que aqui gorjeiam
Não gorjeiam como lá.
(Gonçalves Dias, “Canção do exílio”).

Paródia

Minha terra tem palmares


onde gorjeia o mar
os passarinhos daqui
não cantam como os de lá.
(Oswald de Andrade, “Canto de regresso à pátria”).

O nome Palmares, escrito com letra minúscula, substitui a palavra palmeiras,


há um contexto histórico, social e racial neste texto, Palmares é o quilombo
liderado por Zumbi, foi dizimado em 1695, há uma inversão do sentido do texto
primitivo que foi substituído pela crítica à escravidão existente no Brasil.

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