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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ


INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
MICOLOGIA

FISIOLOGIA DOS FUNGOS

Toda a complexa atividade que ocorre no interior do protoplasma de uma célula viva enquanto ela
realiza as funções de um organismo vivo, é compreendida com o nome de METABOLISMO. Todas as
reações químicas que ocorrem para a realização das funções são controladas por enzimas e incluem reações
de “quebra” ou CATABÓLICAS, que liberam energia (isto é, são exergônicas) e reações de “síntese” ou
ANABÓLICAS, que requerem energia (isto é, são endergônicas).
Para que isso ocorra, os organismos precisam encontrar em seu meio, unidades estruturais e fontes
de energia para a construção e manutenção de sua estrutura e organização. Esses elementos são os nutrientes,
que os indivíduos retiram do meio em que vivem.
Para se conhecer as exigências nutricionais da célula, é necessário que se conheça a composição
química da própria célula. Assim, temos para os fungos:
- Elementos não metálicos essenciais: H, C, O, N, P, S
- Elementos metálicos essenciais: Mg, K, Fe, Zn, Cu, Mn, Mb.
A água representa de 68 a 90% da massa miceliana, sendo que nas leveduras é de 75%, nos filamentos
de 84 a 88% e nos esporos de 40 a 50%.
Vários compostos orgânicos são encontrados entre os fungos. Entre eles há alguns muito complexos,
como nucleoproteínas, enzimas (queratinase, catalase, escarase, entre outras) e polissacarídeos, etc.
Dessa forma, com tais necessidades, os fungos vão utilizar na sua nutrição, essencialmente matérias
nitrogenadas, hidratos de carbono, sais minerais e água.
Além dos elementos, temos as VITAMINAS, que são compostos orgânicos que atuam como
coenzimas ou parte constituinte de coenzimas, as quais catalisam reações específicas. São requeridas em
pequenas quantidades. Entre as vitaminas produzidas por fungos, encontramos:
- Tiamina (vit. B1) – é a mais exigida por fungo em cultura.
- Biotina (vit. H)
- Piridoxina (vit. B6)
- Riboflavina (vit. B2)
Alguns fungos são capazes de sintetizar sua própria vitamina, muitos são deficientes para tiamina,
biotina, etc.
Respostas favoráveis após a adição de uma vitamina a um meio de cultura significam que o micro-
organismo dela necessita, mas não a produz, ou que dela necessita, mas a produz em quantidade insuficiente,
este caso é o mais comum dos dois.
SNELL – Baseado nos conhecimentos sobre as substâncias nutritivas, classificou-as em dois grupos:
a) ENERGÉTICOS – fontes de energia
b) PLÁSTICOS – síntese do protoplasma.
Convém salientar que certos nutrientes podem atuar ora como energéticos, ora como plásticos.
Os energéticos são aqueles dos quais as células obtêm energia nas operações de síntese.
Os plásticos são aqueles que a célula transforma e incorpora ao protoplasma. Estão subdivididos em:
- Fontes de carbono (compostos orgânicos e inorgânicos)
- Fontes de N (compostos orgânicos e inorgânicos)
- Íons inorgânicos (intermediários – P, K, Ca, Mg, S, Fe)
- Fator de crescimento.
Segundo SNELL, o fator de crescimento é qualquer composto orgânico que não pode ser sintetizado
por um organismo e que deve ser fornecido ao mesmo, intacto.
Para LOOFF, “fator de crescimento, para um dado organismo é uma substância que esse organismo
é incapaz de sintetizar na ausência da qual a multiplicação do organismo é impossível”.
Muitas espécies de fungos podem exigir os chamados fatores de crescimento, para o seu
desenvolvimento, e estes devem ser fornecidos geralmente em pequeníssimas quantidades.
Segundo VILLEIA e CURY (1956), esses fatores podem ser classificados em:
a) ESSENCIAIS – são os absolutamente indispensáveis correspondendo à incapacidade total de
biossíntese por parte do organismo. Ex. tiamina, para Phytophtora cinnamoni.(Stramenopila)

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b) ESTIMULANTES – não sendo indispensável, quando acondicionados ao meio de cultura, aceleram


o crescimento do microrganismo. Neste caso, o indivíduo é capaz de realizar a síntese do fator, mas o
faz muito lentamente. São, por conseguinte, fatores que correspondem a uma biossíntese deficiente ou
lenta do microrganismo. Ex.: biotina para Trichophyton álbum (atualmente Trichophyton verrucosum).
c) CONDICIONAIS – são aqueles fatores exigidos em condições especiais. Ex: determinando mutante
de Neurospora crassa exige riboflavina quando em temperatura superior a 28o C, a dispensa.

Os fungos se comportam variavelmente em relação aos fatores de crescimento, ou seja, podem ser
exigentes quanto a certos fatores e independentes quanto a outros. Uma determinada espécie pode não exigir
um fator de crescimento, porém algumas amostras podem sofrer mutações e perder a capacidade de sintetizá-
lo, passando assim a depender do mesmo. As exigências podem ser quanto à molécula inteira de um fator
qualquer ou apenas parte dela.
A exigência de tiamina (vit. B1) pelos microrganismos serve como bom exemplo para ilustrar a
variabilidade dos diversos tipos de formas de suprimento de um fator de crescimento. Como se sabe, a
molécula de tiamina é constituída de duas frações quimicamente definidas – piridimina e tiazol – e, com
base na exigência desse fator, ou de seus componentes, os microrganismos podem ser agrupados nos
seguintes tipos principais:
1- Não exigentes. Sintetizam o fator (tiamina). O crescimento do fungo não depende da presença, no meio
de cultura, quer da tiamina quer de seus componentes. Exemplo: Aspergillus niger
2- Exigem a fração tiazol. Este fungo é capaz de sintetizar a fração pirimidina e soldá-la à fração tiazol
adicionada ao meio, pré-formado. Ex: Mucor ramannianus
3- Exigem a fração pirimidina. Ex: Rhodotorula rubra.
4- Exigem as duas frações. Tiazol e pirimidina. Ex: Phycomyces blakesleeanus.
5- Exigem a molécula inteira de tiamina pré-formada. Não se satisfazem com a presença de duas frações,
uma vez que não são capazes de soldá-las para formar a molécula inteira. Ex: Phythophotora cinnamoni
(Oomycota).

CRESCIMENTO
O crescimento resulta primeiramente em um aumento irreversível no tamanho de uma célula, de um
organismo e também em um aumento no peso seco ou fresco.
O aumento acima referido vai depender do suprimento de nutrientes, das condições físicas ambientais
como luz, temperatura, aeração entre outros, da constituição e estágio de desenvolvimento do organismo.
Convém salientar que, sendo o crescimento acompanhado predominantemente por divisão celular, resulta de
um processo reprodutivo.
A hifa nos fungos é composta primariamente de uma rígida parede celular, a qual cerca o citoplasma
e a extremidade de hifa enquanto a porção mais velha é incapaz de crescer. Apesar disso, essa porção tem
importante papel como suporte de crescimento da extremidade, pois novos protoplasmas são formados
através da hifa e transportados para a extremidade por uma ativa corrente citoplasmática. Com ativa
translocação de componentes sintetizados, torna-se possível o rápido crescimento da extremidade da hifa.
Quando se cultiva organismo unicelular, em meios líquidos, sob condições satisfatórias, o
crescimento medido pelo número de células apresenta três fases:
FASE LATENTE OU LAG – ao serem inoculadas em meios novos, as células levam várias horas
para se adaptar e, em vista disso, não há crescimento.
FASE LOGARITÍMICA ou LOG – adaptadas as células, o organismo sofre rápido crescimento,
com divisão regular de todas as células presentes. Também chamada de fase exponencial.
FASE ESTACIONÁRIA – abruptamente cessa a divisão celular livre e a cultura passa a uma fase
estacionária, pois sendo um sistema fechado os nutrientes se esgotam, o pH é alterado, etc. Com a adição
contínua de novos nutrientes no meio é possível manter a fase LOG por longos períodos.
FASE DE DECLÍNIO ou MORTE: corresponde ao período em que o número de células mortas
excede o número de células novas. A exaustão dos nutrientes do meio e dos compostos de reserva no interior
da célula podem causar a morte e lise do indivíduo.

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FATORES FÍSICOS QUE INFLUENCIAM O CRESCIMENTO

TEMPERATURA
É de extrema importância, uma vez que atua diretamente sobre a atividade química e enzimática da
célula. De modo geral, os fungos, tem exigências semelhantes quanto à temperatura, se bem que as exceções
existem.
A maior parte dos fungos têm: Mínimo de 0 a 50C
Temperatura ótima entre 15 e 300C
Temperatura máxima de 35 a 400C.
Certas espécies dos gêneros Cladosporium e o Sporotrichum podem crescer sob temperatura de 5 a
80C (Cookrane, 1958). Cladosporium herbarum suporta temperatura de até 600C enquanto Byssoclamys fulva
suporta até 900C.
Saliente–se também que os fungos necessitam de mínimas, máximas e ótimas temperaturas para
as suas diversas fases de vida, como o crescimento a reprodução e a germinação de esporos.
Ex: Helminthosporium sativum – ótimo p/ germinação: 220C
- ótimo p/ crescimento: 280C
- ótimo p/ esporulação: 240C.
Os fungos, de um modo geral, suportam melhor as baixas temperaturas. Os esporos especialmente
são muito resistentes ao frio. RANGEL conservou esporos de Thielaviopsis paradoxa em blocos de gelo
durante 6 (seis) meses e eles não se alteraram, mantendo o seu poder germinativo.
Considerando o crescimento assimilativo, os fungos podem ser classificados como:
Psicrófilos: com temperatura ótima entre 0-30ºC
Mesófilos: com temperatura ótima entre 15-40ºC (maioria)
Termófilos: com temperatura ótima entre 35- 50C

LUMINOSIDADE
Tanto a luz solar como a artificial, podem exercer influência sobre o desenvolvimento dos fungos,
embora eles não sejam autotróficos (fotossintetizantes), para os quais a luz é essencial.
A luz solar direta pode às vezes, para alguns fungos, atuar como fungicida, porém a sensibilidade é
muito variável de uma espécie para outra. Há fungos fototróficos positivos, negativos e indiferentes.
Luz ultravioleta, infravermelha e raios X também afetam os fungos, assim como todos os organismos.
Quando a ação dessas irradiações é prolongada, pode provocar a morte; quando passageira pode produzir

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mutações. A luz ultravioleta, por exemplo, pode estimular, inibir ou até matar fungos, dependendo da onda,
do tempo de exposição e distância da fonte.
Certos fungos, sob luz difusa ou na obscuridade, formam apenas o sistema somático, necessitando
de mais luminosidade para se reproduzir. Nos casos em que ocorre formação das estruturas reprodutivas na
obscuridade, em geral eles são anormais e estéreis.

AERAÇÃO
A maioria dos fungos é inibida por altas concentrações de CO2, porém a quantidade que pode ser
suportada varia de acordo com a espécie. Fusarium oxysporum por exemplo, cresce sob condições
atmosféricas normais, porém tolera concentrações de até 75,3% de CO2.
O O2 é de vital importância para que possa ser efetuada a respiração celular, com consequente
fornecimento de energia para os processos metabólicos. Assim, na grande maioria das espécies, não há
crescimento na ausência de O2.

pH
A ação de pH sobre o crescimento pode processar-se por mais de um mecanismo. Assim, um pH
baixo (ácido) acarretará um decréscimo no crescimento, por influir no sistema enzimático; e um pH alto
(básico) dará o mesmo efeito por alterar a solubilidade dos metais.
No decorrer do seu crescimento no meio de cultura, o fungo pode alterar o pH desse meio através de
suas secreções metabólicas. Dessa forma se produz amônia, o pH aumenta, se produz ácidos orgânicos ele
se reduz. Como resultado, o fungo pode se adaptar a uma ampla faixa de pH.
Valores de pH para que certos fungos se desenvolvam:
- Aspergillus flavus: 5,5 a 8,4
- Neurospora crassa: 4,3 a 6,5.
Em geral o pH menor que 6 (seis) é mais propício para a maioria dos fungos; limites máximos estão em
torno de 8 e os mínimos em 1.

UMIDADE
Os fungos exigem em geral um alto nível de umidade para o seu crescimento. Maior umidade do ar
e do substrato favorecem os processos metabólicos intensificando a esporulação e germinação dos esporos.
A esporulação é inibida ou reduzida, quando a umidade do ar está abaixo de 60 a 70%.

GRAVIDADE
A gravidade provoca uma resposta sensível em muitas estruturas de fungos que transportam esporos
aéreos. A precisão com que os esporos de frutificação de muitos fungos superiores são orientados é típica e
em muitos experimentos mostrou-se ser devida à gravidade.

RESPIRAÇÃO
A respiração é um processo complexo pelo qual os seres vivos absorvem O2 e eliminam CO2. Nos fungos
predomina a respiração aeróbia; a anaeróbia só ocorre quando no meio, as condições são de anaerobiose.
Algumas leveduras, por exemplo, podem proliferar em anaerobiose parcial, produzindo a fermentação
alcoólica. Nos fungos o produto final da respiração anaeróbia ou fermentação, pode ser álcool etílico ou
ácido lático. Poucas espécies de fungos são anaeróbias obrigatórias. Pertencem ao filo
Neocallimastigomycota, os quais liberam hidrogênio molecular (H2) como um subproduto da geração de
energia em condições anaeróbicas.

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