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Mente Afiada - Ano 2, Nº 13 - Abril, 2024

ALÉM DO PRECISAMOS
FÍSICO PERTENCER
O estupro É um desejo natural
também deixa da vida humana
marcas na
mente

3 em cada 10
ç a brasileiros se
Co nh e sentem ansiosos
os c ic lo s
no e têm problemas
do s o com sono

O CÉREBRO
N Ã O PARA!
Enquanto dormimos, ele processa
R$ 9,90

memórias e favorece aprendizados


INÊS249

editorial
HORA DO SONINHO…
Você acha que o cérebro desliga quando Ainda nas próximas páginas, você
dormimos? Pois saiba que é exatamente o vai compreender o porquê sentimos tanta
contrário: é durante o sono que processa- necessidade de pertencer a algum lugar
mos todas as novas memórias e aprendi- ou grupo ao longo da vida, e como cuidar
zados que adquirimos ao longo do dia. Na para que esse desejo não se torne uma
matéria especial desta edição, trouxemos obsessão. E mais: vamos te ajudar a en-
uma especialista em Medicina do Sono contrar uma rotina que realmente funcio-
para nos mostrar quais são os ciclos do ne para você (e que seja real!). Bora afiar
sono, o que acontece em cada um deles e as mentes?
qual a importância de respeitar as horas
de descanso. Também vamos explorar a Boa leitura,
realidade de tantas pessoas que sofrem Ana Kubata
com a insônia e a ansiedade para dormir. anabeatriz.kubata@astral.com.br

PRODUÇÃO GRÁFICA DA CAPA Eugênio Tonon ILUSTRAÇÃO shlyapanama/Shutterstock Images

MAPA DA MENTE MARCAS ALÉM DO ENCONTRE PRECISAMOS


As últimas e mais FÍSICO SUA ROTINA PERTENCER
curiosas descobertas O que acontece na mente Como organizar uma Por que sentimos
da ciência da mulher que sofre dinâmica que funcione necessidade de fazer parte
um abuso para você de um lugar ou grupo

ANSIEDADE E O CÉREBRO O MISTÉRIO DOS PETS E


INSÔNIA NÃO PARA SONHOS SAÚDE MENTAL
A realidade de tantos Durante o sono, O que a neurociência Como os animais de
brasileiros que sofrem processamos memórias diz sobre esse processo estimação podem
com a falta de sono e novos aprendizados do cérebro melhorar nossas emoções

sumário
Erramos: na matéria sobre a história das vacinas, da
última edição, houve um erro no ano em que Edward
Jenner realizou sua experiência. A data correta é 1796.

Coordenadora de revistas digitais Hérica Rodrigues (herica.rodrigues@astral.com.br) ©2024 EDITORA ALTO


Redação Ana Carvalho (ana.carvalho@astral.com.br), Ana Kubata (anabeatriz.kubata@astral.com.br) e Gabrielle Aguiar (gabrielle.aguiar@astral.com.br)
ASTRAL LTDA. TODOS OS
Design Eugênio Tonon (eugenio.tonon@astral.com.br), Roberta Lourenço (roberta.lourenco@astral.com.br)
Marketing digital Marcelo Monico (marceloluiz.monico@astral.com.br) DIREITOS RESERVADOS.
Ano 2, nº13 - Abril 2024 PROIBIDA A REPRODUÇÃO.
DIREÇÃO João Carlos de Almeida e Pedro José Chiquito ENDEREÇO Rua Luso Brasileira, 4-44 Sala 810, Bauru,SP. CEP 17016-230 CONTATO atendimento@astral.com.br.
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MAPA DA MENTE
Texto: Ana Carvalho

BUSQUE AJUDA! pelo nosso país nos últimos anos. Fato-


Ilustração: Mary Long/Shutterstock Images

Segundo dados da Organização Mun- res sociais como desemprego e falta de


dial da Saúde (OMS), 86% dos brasileiros perspectivas acabam agravando senti-
sofrem com algum tipo de transtorno mentos negativos e abrindo caminho
mental, sendo o Brasil o país com maior para diversas doenças. A ajuda de um
índice de depressão da América Latina, profissional especializado é essencial
com cerca de 11,7 milhões de pessoas na reabilitação de quem sofre mental-
diagnosticadas. mente. Por isso, vale o alerta de sem-
Entre as explicações para o fenôme- pre: procure ajuda, você não precisa en-
no estão a crise econômica enfrentada frentar isso sozinho!
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HORA DE LIMPAR A CAIXA DE E-MAIL…


Você tem o costume de acumular conver-
sas antigas? Sabia que, além de organizar
melhor seus compromissos, apagar dados
desnecessários pode, literalmente, ajudar o
meio ambiente. Pelo menos é o que afirma
Ilustração: Explainifybox/Shutterstock Images

um estudo organizado pela empresa Veritas


Technologies, que estima que 6,4 milhões de
toneladas de dióxido de carbono (CO2) foram
lançadas na atmosfera somente no ano de
2020 por conta da chamada poluição digital.
Ainda segundo a mesma empresa, mais de
50% dos e-mails existentes no mundo são
lixo eletrônico e caso não haja conscientiza-
ção, esse número só irá subir.

NO TRABALHO, MENOS É MAIS


Dados compilados pela 4 Days Week, entida-
de que cuida dos projetos-piloto da semana
trabalhista de quatro dias úteis sem redução
salarial em diversos países, concluíram que
78% dos trabalhadores sentem-se menos
estressados no ambiente de trabalho que
aplica o novo regime. Esse conforto tem
Ilustração: eamesBot/Shutterstock Images

impactado positivamente na produtividade,


com 55% dos funcionários descrevendo-se
como mais produtivos.
No Brasil, mais de 300 empresas estão
testando o método e, ao menos por enquan-
to, todos os lados parecem mais felizes, com
as empresas descrevendo também a queda
na rotatividade de funcionários. Se os 50 são
os novos 30, a quinta é a nova sexta!
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PUERPÉRIO TAMBÉM É EMOCIONAL O que muitos acabam esquecendo é

Ilustração: GoodStudio/Shutterstock Images


O puerpério é o período mais intenso que o puerpério também é emocional.
da vida de uma mulher, com os pri- Com uma nova dinâmica familiar se es-
meiros seis meses após a chegada do tabelecendo nos primeiros dois ou até
bebê ocasionando em mudanças físi- três anos após o nascimento, a mulher
cas e muito cansaço. Isso inclui desde pode ter dificuldade em encontrar seu
a amamentação e as noites maldormi- novo lugar no mundo. Um estudo da
das até os hormônios dessa nova mãe Fiocruz revelou que 26% das brasileiras
trabalhando intensamente para que o sofrem com algum grau de depressão
corpo dê conta de cuidar do bebê nes- pós-parto, sendo a maioria das vítimas
sa nova fase. mulheres pobres.
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O ESTUPRO
VAI ALÉM
DO CORPO
Um abuso sexual deixa sua
marca física também na
mente, fazendo a mulher
levar aquele trauma consigo
para o resto da vida
Texto: Gabrielle Aguiar

U
m estudo divulgado pelo Ipea
(Instituto de Pesquisa Econômi-
ca Aplicada), em março de 2023,
estima que 2 mulheres são estupradas
por minuto no Brasil, totalizando cerca de
822 mil casos por ano, dos quais, apenas
8,5% chegam ao conhecimento da polícia
e 4,2% ao sistema de saúde.
Ilustração: nanmulti/Shutterstock Images

O QUE ACONTECE COM A MENTE?


De acordo com a Profa. Andrea Deis, espe-
cialista em Neurociências, quando uma mu-
lher sofre estupro ou outra forma de violência
sexual, seu cérebro pode passar por uma sé-
rie de respostas neurobiológicas complexas.
“Durante o evento traumático, o sistema ner-
voso autônomo pode ser ativado, desenca-
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deando respostas de luta, fuga ou conge- pode causar danos físicos, como lesões,
lamento. Essas respostas são mediadas infecções sexualmente transmissíveis e
por regiões cerebrais como a amígdala gravidez indesejada.”
- que processa emoções intensas como A psicóloga destaca ainda que mui-
medo e raiva - e o córtex pré-frontal - res- tas vítimas desenvolvem o Transtorno de
ponsável pelo processamento cognitivo Estresse Pós-Traumático (TEPT), com
e tomada de decisões”, explica. os sintomas descritos abaixo:
• Flashbacks vívidos do evento
DESENCADEAMENTOS traumático;
A experiência traumática pode resultar • Pesadelos;
em disfunções neuroquímicas, como au- • Evitação de gatilhos relacionados
mento dos níveis de cortisol (hormônio ao trauma;
do estresse) e diminuição da atividade • Hiperexcitabilidade persistente.
de neurotransmissores associados ao
bem-estar, como a serotonina, de acor-
do com a neurocientista.
Já do lado emocional e psicológi-
co, a psicóloga Larissa Fonseca explica
o que acontece com a mente: “O estupro
pode causar um trauma emocional pro-
fundo, resultando em sentimentos inten-
sos de medo, ansiedade, raiva, culpa e
confusão. Além disso, o estupro pode
afetar negativamente a autoestima e a
autoimagem da vítima, levando-a a sen-
tir-se suja, envergonhada ou indigna de
amor e respeito. Isso pode causar difi-
culdades nos relacionamentos interpes-
soais da vítima, tornando-a incapaz de
Ilustração: lucky_xtian/Shutterstock Images

confiar em outras pessoas ou estabele-


cer intimidade emocional”, descreve.
Além disso, as vítimas de estupro
têm maior risco de desenvolver outros
problemas de saúde mental, como de-
pressão, ansiedade e transtornos rela-
cionados ao uso de substâncias. “Além
do trauma emocional, o estupro também
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MARCAS NO CÉREBRO CASO DANIEL ALVES


Embora não haja um marcador Depois de ser condenado a 4 anos e 6
único para o trauma causado por meses após agredir sexualmente uma
um estupro ou violência sexual, a mulher de 23 anos em uma boate de
especialista Andrea Deis, relata Barcelona, na Espanha, em dezembro
que estudos sugerem que a expo- de 2022 - vale relembrar que a pena foi
sição prolongada ao estresse crô- atenuada após o pai do jogador Neymar
nico pode causar alterações na pagar 150 mil euros (cerca de R$ 800 mil)
estrutura e função cerebral. “Por para ser entregue à vítima -, Daniel deixou
exemplo, pode haver redução do a prisão em março deste ano ao pagar
volume de certas áreas do cére- uma fiança de 1 milhão de euros (cerca
bro, como o hipocampo, que está de R$ 5 milhões). Na época, a advogada
envolvido na regulação do humor da vítima se manifestou afirmando que
e da memória. Essas mudanças a jovem disse que “parecia que ela esta-
estruturais podem estar relacio- va sendo estuprada pela segunda vez”.
nadas aos sintomas de Transtor- A psicóloga Larissa Fonseca afir-
no de Estresse Pós-Traumático ma que a notícia de que o agressor se-
(TEPT) observados em vítimas de ria liberado pode gerar uma sensação
violência sexual”, diz. de impotência, injustiça e falta de se-
Ilustração: graphicwithart/Shutterstock Images
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gurança na vítima. “Ela pode sentir que de. A falta de crença pode negar a va-
seu sofrimento não está sendo levado lidação emocional da vítima, levando-a
a sério pelas autoridades ou pela socie- a se sentir desamparada. Além disso,
dade em geral, o que pode reforçar sen- pode aumentar sentimentos de culpa
timentos de desamparo e isolamento. e vergonha, dificultando o processo de
Além disso, essa situação pode trazer recuperação. Isso também reforça es-
à tona memórias dolorosas do estupro tereótipos prejudiciais e pode perpetuar
original, fazendo com que a vítima re- uma cultura de silêncio em torno da vio-
viva o trauma. Isso pode levar a uma lência sexual.”
deterioração do bem-estar emocional
e psicológico da vítima, aumentando FALAR É IMPORTANTE!
o risco de desenvolvimento ou intensi- “Do ponto de vista neurocientífico, a ex-
ficação de sintomas de estresse pós- pressão verbal das experiências traumá-

Ilustração: Uzzal Islam/Shutterstock Images


-traumático, ansiedade, depressão e ticas pode facilitar a regulação emocional
outros problemas de saúde mental.” e a integração cognitiva das memórias.
Além disso, compartilhar a experiência
DESACREDITADA… com outros pode ajudar a diminuir o iso-
A realidade de muitas mulheres que so- lamento social e fortalecer os sistemas
frem algum tipo de abuso sexual está de apoio, fatores que são fundamentais
ligada ao fato de que as pessoas não para a recuperação. Essa atividade au-
acreditam no que está sendo relatado, o xilia na assimilação e compreensão do
que de acordo com Larissa, pode causar evento traumático, enquanto também
ainda mais males. “Isso pode intensifi- fomenta a interação e o supor-
car o trauma e influenciar a vítima te social”, aponta a neurocien-
a se retrair perante a socieda- tista, Andrea.
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TRATAMENTO mento do que realmente aconteceu. “É


Geralmente envolve uma abordagem comum a vítima desenvolver uma sen-
multidisciplinar, que inclui intervenções sação de que não estava presente men-
psicológicas, médicas e sociais. talmente na situação, até como uma
Do ponto de vista neurocientífico, proteção psicológica. É necessário de-
Andrea afirma que é importante reconhe- senvolver mecanismos de enfrentamen-
cer que o cérebro possui plasticidade, ou to eficazes e reconstruir sua autoestima
seja, a capacidade de se reorganizar e e senso de segurança”, conta Larissa.
se adaptar. “Intervenções terapêuticas,
como a Terapia de Dessensibilização e
Reprocessamento por Movimentos Ocu- POR QUE A TERAPIA É
lares (EMDR), têm sido eficazes na redu- TÃO IMPORTANTE?
ção dos sintomas de TEPT e na promoção A terapia ajuda a desenvolver habili-
da recuperação em vítimas de violência dades de enfrentamento saudáveis
sexual. Essas abordagens terapêuticas para lidar com os sintomas de es-
visam ajudar a reprocessar as memórias tresse pós-traumático, ansiedade
traumáticas de maneira adaptativa, per- e depressão. “Além disso, é impor-
mitindo que a pessoa se reintegre à vida tante focar na reconstrução da au-
cotidiana de forma mais saudável.” toestima e confiança da vítima, que
Já psicologicamente, é recomen- podem ser profundamente abala-
dado tratamento com psicoterapia para das pelo trauma. A terapia oferece
compreensão cognitiva da ausência de um espaço propício para explorar
culpa da situação além do reconheci- questões complexas relacionadas
ao trauma, o que é fundamental
para encontrar maneiras construti-
vas de lidar com essas emoções. A
vítima também pode se beneficiar
do desenvolvimento de habilidades
de comunicação e estabelecimento
Ilustração: Olga Strel/Shutterstock Images

de limites, o que facilita a constru-


ção de relacionamentos saudáveis.
Ao integrar o trauma em sua narrati-
va pessoal, a vítima pode encontrar
significado e propósito no processo
de recuperação, transformando o
trauma em uma fonte de força e re-
siliência”, finaliza Larissa.
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COMO ACHAR
UMA ROTINA
QUE FUNCIONE
PARA VOCÊ?
Pode parecer difícil, mas não é! E uma psicóloga
dá todas as dicas que você precisa

Texto: Gabrielle Aguiar

A
char uma rotina pode ser com-
plicado quando vemos todos
aqueles blogueiros que acor-
dam às quatro da manhã, vão correr, to-
mam aquele café da manhã reforçado e
seguem com a vida deles. Mas esse é o
X da questão. A vida deles não é a sua.
Ilustração: Edge Creative/Shutterstock Images

E o que funciona para essas pessoas,


pode não funcionar para você.
Então, vamos encontrar uma
rotina que vai dar certo na
sua realidade? Patricia Pei-
xoto, psicóloga e especia-
lista em Neuropsicologia
e Terapia Cognitivo Com-
portamental, ajuda!
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SE CONHEÇA! E COMO DESCOBRIR


“Quando você se conhece, consegue or- O QUE FUNCIONA?
ganizar tudo aquilo que você precisa fa- “Podemos identificar as atividades que
zer dentro da rotina. Sempre pensando nos tomam mais energia ou dão menos
que tem algumas coisas que são essen- prazer e coloca-lás no período do dia (ma-
ciais, mas que se não tem o costume de nhã, tarde ou noite) que temos mais foco
fazer, comece aos poucos. Como, por e energia. Se for alguma atividade nova,
exemplo, uma atividade física. Procure que seja introduzida aos poucos, reserve
um horário para realizar, mas é impor- tempo uma ou duas vezes por semana.
tante que você o encontre e inclua na Se você consegue seguir a rotina que
rotina de forma gradativa. Se você não planejou, ela está funcionando. Quando
está fazendo atividade física, comece você se encontra completamente fora
fazendo duas vezes na semana, e vá au- dela, é melhor refazê-la de acordo com
mentando até considerar ideal. Vá aos seu funcionamento e necessidades.”
poucos definindo uma rotina, pois assim
as atividades têm muito mais chance de NÃO ESTÁ SE SENTINDO BEM?
serem feitas”, recomenda. Então essa rotina ou atividade não está
funcionando para você! Mas como des-
NÃO FUNCIONA PARA TODOS! cobrir isso? “Quando você realiza as ati-
“Algumas pessoas funcionam bem acor- vidades de forma atropelada, sem qua-
dando muito cedo porque são pessoas lidade. Ou quando muitos imprevistos
mais ativas de manhã, e conforme vai acontecem e você pula coisas que estão
chegando o período da tarde e noite, vão na sua agenda. Por isso é importante não
perdendo energia. São períodos onde se cobrar demais. Precisamos elencar as
não se consegue colocar cuidados que prioridades e fazer de acordo com o que
gastam muita energia. Por outro lado, te- conseguimos”, pontua a psicóloga.
mos pessoas que, pela manhã, a energia
é muito baixa, mas quando vai ficando à
Ilustração: GoodStudio/Shutterstock Images

tarde ou período da noite, ela aumenta.


Em resumo, cada um funciona de manei-
ra diferente e tem mais disposição e foco
em um período determinado do dia. Não
é possível pensar que a rotina de outra
pessoa irá funcionar da mesma forma
para você. Precisamos entender nosso
relógio biológico para definirmos como
serão feitas nossas atividades.”
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PRECISAMOS
PERTENCER

A necessidade de fazer parte de algum lugar ou grupo


é natural do comportamento humano, mas é preciso
evitar o desequilíbrio

Texto: Ana Kubata

E
Em algum momento da vida, NATURALMENTE, VAMOS
Ilustração: Bibadash/Shutterstock Images

todos vamos sentir a necessi- QUERER PERTENCER


dade de pertencer a algum lo- A verdade é que essa vontade pode ser
cal ou grupo. Isso pode aparecer mais um ponto de apoio ou um peso que nos
forte durante a adolescência, fase em afunda, tudo depende da forma como
que estamos buscando nossa identida- gerimos isso tudo. Sabrina Amaral é
de, nosso lugar no mundo, mas não é psicóloga especialista em neurociência
regra, e também pode ocorrer em qual- do comportamento, e nos explica que a
quer outra etapa da vida. necessidade de pertencer é algo muito
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humano e profundamente enraizado em ESTAR EM GRUPO


nossa natureza. “Desde os tempos anti- É CONFORTÁVEL
gos, quando éramos caçadores e cole- O pertencimento também tem um im-
tores, pertencer a um grupo significava pacto positivo em nossa saúde mental.
sobrevivência. Juntos, éramos mais for- Sabrina Amaral explica que estar cerca-
tes e podíamos enfrentar os desafios da do por pessoas que nos apoiam e nos
vida. Essa herança ancestral ainda está entendem nos ajuda a lidar melhor com
presente em nós, mesmo em um mundo as emoções desconfortáveis, como an-
moderno”, conta. gústia, medo ou tristeza. Ou seja, com-
partilhar experiências e sentimentos
AUTOESTIMA E IDENTIDADE com o grupo nos permite processar nos-
Na psicologia, essa necessidade de per- sas emoções de forma saudável.
tencimento é estudada através de di- “Não podemos esquecer do poder
ferentes lentes. Uma delas, segundo a do apoio emocional que encontramos
especialista, é a teoria da ‘autoestima em nossos grupos”, aponta a psicólo-
social’, que sugere que parte de nossa ga. “Quando enfrentamos tempos difí-
autoestima e valor pessoal é derivada ceis, ter pessoas ao nosso lado, que nos

Ilustração: melitas/Shutterstock Images


da maneira como somos percebidos e apoiam e nos entendem pode ser incri-
aceitos pelos outros. “Quando nos senti- velmente reconfortante e fortalecedor.
mos parte de um grupo querido e valori- Saber que temos pessoas em quem po-
zado, fortalecemos nossa autoimagem demos confiar e contar nos momentos
e senso de valor. Isso pode acontecer difíceis reduz o estresse e a ansiedade.
no meio familiar, entre amigos, colegas Sentir-se parte de uma comunidade soli-
de trabalho ou uma comunidade, sem- dária nos dá uma sensação de seguran-
pre que experimentamos um senso de ça e conforto”, acrescenta.
identidade e pertencimento”, exemplifi-
ca Sabrina.
Além disso, ela pontua que per-
tencer nos proporciona uma sensação
de identidade e propósito, pois quando
nos juntamos a um grupo com interes-
ses semelhantes aos nossos, encon-
tramos pessoas que nos entendem e
apoiam. “Isso pode nos ajudar a definir
quem somos e o que valorizamos, além
de nos dar um senso de significado em
nossas vidas.”
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ADOLESCÊNCIA: A FASE É PRECISO BALANCEAR


DE BUSCAR IDENTIDADE Apesar de todos os aspectos positivos, é

Ilustração: Bibadash/Shutterstock Images


Sem sombra de dúvidas, a adolescência preciso compreender até que ponto isso
é a fase em que essa busca por perten- é uma necessidade normal e saudável
cimento se torna mais nítida e acentua- das relações humanas, e a partir de que
da. “É a época da vida em que os jovens, momento pode se tornar uma obsessão
em sua grande maioria, começam a se problemática. O peso mencionado no
distanciar da família para desenvolver início desta matéria.
um senso próprio de identidade, viven- De acordo com Sabina, o equilíbrio
ciando uma série de mudanças físicas, é fundamental para evitar essa questão.
emocionais e sociais”, - o que torna o “O problema surge quando a busca pelo
pertencimento a um grupo ainda mais pertencimento se torna uma obsessão
crucial, segundo Sabrina Amaral. ou quando nos tornamos dependen-
A profissional aponta ainda um es- tes emocionalmente da aprovação das
tudo publicado no Journal of Research pessoas”, aponta.
on Adolescence, que pesquisou como
o pertencimento a grupos influencia o NO CASO DA OBSESSÃO…
bem-estar psicológico dos adolescen- A especialista em neurociência do com-
tes. “Os resultados mostraram que os portamento explica que as pessoas po-
jovens que se sentiam mais conectados dem se sentir constantemente ansiosas
e integrados em seus grupos sociais re- e inseguras sobre sua aceitação pelo
lataram níveis mais altos de autoestima grupo, o que faz com que ela busque
e felicidade”, pontua. constantemente aprovação e validação
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Ilustração: Alphavector/Shutterstock Images


dos outros. “Isso pode levar a um ciclo Ao seguir esse rumo, a dependên-
vicioso de busca desesperada por acei- cia emocional pode levar a comporta-
tação, muitas vezes às custas da própria mentos prejudiciais e autosabotadores,
identidade e valores.” como se submeter a situações ou rela-
cionamentos tóxicos apenas para man-
A DEPENDÊNCIA É SABOTADORA ter a conexão com o grupo. “Isso pode
Já em relação a dependência emocional, resultar em um ciclo de autoestima bai-
é comum que o indivíduo condicione sua xa, onde a pessoa se sente incapaz de se
felicidade ao pertencimento a um grupo. afastar de situações que a prejudicam
Isso significa que a pessoa sente que não emocionalmente”, alerta a psicóloga.
pode ser feliz ou completa sem a presen-
ça ou aprovação constante dos outros. VAMOS ÀS DICAS
“Essa dependência pode se manifestar Mas calma, é possível sim que essa ne-
de diversas formas, por exemplo quando cessidade seja atendida de forma que
as pessoas se sentem perdidas ou va- possa agregar positivamente à sua vida,
zias ou quando não estão cercadas por pois existem várias maneiras de cultivar
outros seres humanos, buscando cons- um pertencimento saudável em nossas
tantemente a validação externa para se vidas diárias. Vamos a algumas dicas
sentirem bem consigo mesmas”, com- práticas listadas por Sabrina Amaral,
preende Sabrina. psicóloga e especialista em neurociên-
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cia do comportamento: seu dia a dia, procure demonstrar empatia


• Seja autêntico: Não tenha medo de ser e compaixão em seus relacionamentos,
quem você realmente é. Seja real consigo ouvindo ativamente, oferecendo suporte
mesmo e com os outros. Relacionamen- e sendo gentil com os outros. Mostre às
tos verdadeiros são construídos com pessoas que você se importa com elas e
base na honestidade e na autenticidade. que estão sendo ouvidas e valorizadas.

• Cultive relacionamentos significativos: • Equilibre o tempo sozinho e em gru-


Dedique um tempo de qualidade para cul- po: É importante estabelecer limites
tivar e fortalecer os relacionamentos com saudáveis entre conexão e solitude.
amigos, familiares e colegas. Você pode Busque o equilíbrio entre o tempo que
fazer isso conversando regularmente, você passa sozinho e o tempo que pas-
compartilhando experiências e demons- sa com os outros. É importante ter mo-
trando interesse genuíno pelo outro. mentos para si mesmo, aproveitando
sua própria companhia.
• Envolva-se em comunidades e gru-

Ilustração: melitas/Shutterstock Images


pos: Você pode procurar grupos ou co- • Busque apoio profissional, se ne-
munidades que compartilhem seus inte- cessário: Se você estiver lutando para
resses, valores ou hobbies. Por exemplo: se sentir pertencente ou se estiver en-
um clube, uma equipe esportiva, um gru- frentando desafios relacionados à de-
po religioso e/ou trabalho voluntário, ou pendência emocional, não hesite em
até mesmo uma comunidade on-line. procurar ajuda de um terapeuta. Ele
pode oferecer suporte e orientação
• Pratique a empatia e a compaixão: No para ajudá-lo a cultivar um pertenci-
mento mais saudável.
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ALERTA
VERMELHO:
BRASIL ENFRENTA
DECLÍNIO NA
SAÚDE MENTAL
Existe um preconceito em lidar com a
saúde mental como uma parte do autocuidado
Texto: Ana Carvalho
Entrevista: Gabrielle Aguiar

Ilustração: Elena Kalinicheva/


Shutterstock Images
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U
ma pesquisa do DataFolha Os alertas da OMS sobre a saúde
concluiu que três em cada dez mental dos brasileiros não são de hoje,
brasileiros se sentem ansio- com os dados compilados pelo Órgão
sos e têm problemas com sono e ali- nos considerando o nosso país como o
mentação sempre ou frequentemente. segundo mais deprimido de todo o con-
No meio desse cenário preocupante, os tinente americano, - perdendo somente
participantes também relataram uma para os EUA - e ainda o com maior ín-
percepção curiosa sobre si mesmos: dice de diagnosticados com ansiedade
somente 7% deles consideram sua saú- no mundo. Ou seja, tanto os especia-
de mental pessoal como ruim ou péssi- listas quanto a própria população reco-
ma. Conversamos com a Doutora em nhecem o problema, mas a dificuldade
psicologia Cristiane Vaz de Moraes Per- de enxergar os efeitos dele a níveis in-
tusi para entender de onde vem esse dividuais em nossas próprias vidas dão
descompasso. uma pista do tamanho do nosso desa-
fio rumo ao bem-estar populacional.
UM PAÍS ANSIOSO E DEPRIMIDO
Ilustrações: Magi Bagi e y.s.graphicart/Shutterstock Images

A Organização Mundial da Saúde (OMS) SONO NEGLIGENCIADO


define saúde mental como “um esta- Cristiane Vaz é Mestra, pesquisadora e
do de bem-estar no qual o indivíduo docente em psicologia, e dá um alerta
é capaz de desenvolver suas habilida- taxativo sobre uma negligência comum
des pessoais, lidar com os estresses entre os brasileiros que ocasiona pre-
da vida, trabalhar de forma produtiva juízos na saúde mental a longo prazo: o
e contribuir para a sua comunidade”. sono. “As pessoas não percebem a rela-
Para a Organização, ‘saúde’ não signifi- ção entre o sono e saúde mental, sendo
ca somente ausência de doenças diag- que o descanso é essencial para a nos-
nosticadas, mas também o resultado sa saúde. Muitas vezes, nem mesmo os
das interações entre fatores biológicos, médicos conseguem fazer essa relação
sociais e psicológicos. com seus pacientes”, comenta ela.
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E não é para menos: a pesquisa Saú- IDENTIFICANDO A ANSIEDADE


de Mental do Médico, de 2022, organi- A profissional aponta como reconhecer
zada pela Research Center, concluiu os sintomas mais clássicos de que algo
que quase 80% dos médicos brasilei- não está bem: “Inquietação, sentimen-
ros apresentam sintomas de ansieda- tos de agitação motora, fadiga, dificul-
de. Como cuidar, precisando primeiro dade para concentrar, sensações de
ser cuidado? branco na mente, irritabilidade, tensões
musculares, dificuldade em conciliar ou
O DESCOMPASSO manter o sono, junto a sintomas físicos
Na visão de Cristiane, a sociedade mo- como taquicardia ou dificuldade para
derna tem enfrentado cada vez mais respirar” pontua Cristiane.
dificuldades na autopercepção, o que
explica porque tantos brasileiros se
sentem ansiosos, deprimidos, dormin-
do e se alimentando mal, ao passo de
que não se veem como doentes: “Para
a maioria das pessoas, a saúde mental,
para ser percebida como um problema,
precisa chegar a comprometer muito a
saúde física, É muito difícil pois existe
um preconceito de se perceber saúde
mental como uma parte do seu autocui-
dado.” lamenta.
“Muitos irão ao hospital, por exemplo,
pensando que estão sofrendo um infarto,
quando na verdade estão com transtor-
no de ansiedade. Outros irão sentir culpa
por só melhorarem tomando remédios.
Ilustrações: Smilingirida/Shutterstock Images

Se você tem um problema de estômago, Se identificou com algumas dessas


você não se culpa por se medicar. Mas situações por mais de duas semanas
quando se fala em saúde mental, muitos consecutivas? Não tenha medo de ir
querem resolver o problema sozinhos, o em busca de um especialista, psicólogo
que só dificulta “, detalha a especialista. ou psiquiatra. O prejuízo causado pelo
Por isso, as campanhas de conscienti- transtorno de ansiedade para a vida
zação em empresas, escolas e até em emocional e social é enorme, e reconhe-
ambientes religiosos são fundamentais cê-los é o primeiro passo para mudar
para quebrar o estigma. esses gatilhos.
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FATORES DE RISCO EM BUSCA DE TRATAMENTO


A psicóloga explica que a predisposição “Combatemos a ansiedade e a depres-
para desenvolver ansiedade crônica é são com um estilo de vida saudável,
tanto biológica, como prevalência na fa- isso é: dormindo melhor, tendo uma
mília, quanto social, como hábitos ruins alimentação balanceada e praticando
Ilustração: Tartila/Shutterstock Images

e a vivência de algum trauma, como um atividade física regularmente. É preci-


assalto. “Existem também fobias es- so também tirar os estigmas sobre os
pecíficas, como a ansiedade de sepa- tratamentos, normalizar a psicotera-
ração, ansiedade social, transtorno de pia como uma forma de se conhecer a
pânico, transtorno de estresse agudo e mente, seus traumas, limites, crenças
transtorno de estresse pós-traumático, limitantes e distorções. Tudo isso aju-
que podem desencadear a ansiedade da a ter uma vida mais leve, saudável e
generalizada” explica a psicóloga. mais positiva” finaliza.
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ENQUANTO
DORMIMOS,
O CÉREBRO
TRABALHA
(E MUITO)
É durante o sono que desempenhamos funções
fundamentais como o processamento de memórias
e consolidações de aprendizados
Texto: Ana Kubata Ilustração: lyubava.21/Shutterstock Images
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A
quela velha história de que o ríodo que são trabalhadas as conexões
cérebro ‘desliga’ enquanto dor- no cérebro responsáveis por aprender
mimos já caiu por terra faz e criar memórias. Além disso, a falta de
muito tempo, mas você sabe realmente sono pode prejudicar as habilidades de
o que acontece nessa região durante o concentração e resposta rápida.
processo de sono? Com certeza, depois “Uma noite maldormida já é suficien-
de ler essa matéria, vai parar de negli- te para trazer consequências negativas
genciar esse momento tão importante para o corpo e para o cérebro. Um exem-

Ilustração: inspiring.team/Shutterstock Images


do dia, e vai entender de uma vez por plo é uma desatenção leve na privação
todas o impacto que boas horas de aguda (após uma noite maldormida)”,
sono têm na nossa saúde e bem-estar. afirma Dra Simone Prezotti, médica es-
pecialista em Medicina do Sono. Mas ela
DORMIR É VIVER reforça que os efeitos podem ser cumu-
Segundo a Biblioteca Nacional de Me- lativos, e, assim, trazer consequências
dicina dos Estados Unidos (NIH, na si- mais graves com o tempo. “A privação
gla em inglês), dormir é tão essencial crônica do sono gera um aumento de
para a sobrevivência quanto comida e risco para Doença de Alzheimer e ou-
água. Isso porque, é durante esse pe- tras doenças neurodegenerativas.”
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MAIS ATIVO DO QUE NUNCA zem uma substância química cerebral


Segundo Simone, várias estruturas den- chamada GABA, que atua reduzindo a
tro do cérebro estão envolvidas no sono, atividade dos centros de excitação no hi-
ou seja, permanecem ativas enquanto potálamo e no tronco cerebral. O tronco
estamos dormindo. Algumas delas são o cerebral também desempenha um pa-
hipotálamo, o tronco cerebral, a glândula pel especial no sono REM: envia sinais
pineal e a amígdala. Mas vamos esmiuçar para relaxar os músculos, para que haja
um pouco mais cada uma delas e quais atonia muscular durante os sonhos.
são suas ações durante esse tempo.
• Tálamo: atua como um retransmissor
de informações dos sentidos para o
córtex cerebral. Durante a maioria dos
estágios do sono, o tálamo fica quie-
to, permitindo que você se desligue do
mundo externo. Mas durante o sono
REM, o tálamo está ativo, enviando ao
córtex imagens, sons e outras sensa-
ções que preenchem nossos sonhos.

• Glândula pineal: recebe sinais do


NSQ e aumenta a produção do hormô-
nio melatonina, que ajuda a adormecer
quando fica escuro.
• Hipotálamo: contém grupos de células
nervosas que atuam como centros de • Prosencéfalo basal: também promo-
controle e afetam o sono e a excitação. ve o sono e a vigília, enquanto parte do
Dentro dele, está o núcleo supraquiasmá- mesencéfalo atua como um sistema
Ilustração: Vitalii Petrenko/Shutterstock Images

tico (SCN), um aglomerado de milhares de de excitação. A liberação de adenosina


células que recebem informações sobre (um subproduto químico do consumo
a exposição à luz diretamente dos olhos de energia celular) das células do pro-
e controlam seu ritmo comportamental. sencéfalo basal, e provavelmente de ou-
tras regiões, apoia o impulso do sono.
• Tronco cerebral: na base do cérebro,
se comunica com o hipotálamo para • Amígdala: uma estrutura em forma de
controlar as transições entre a vigília e o amêndoa envolvida no processamento
sono. As células promotoras do sono no de emoções, torna-se cada vez mais
hipotálamo e no tronco cerebral produ- ativa durante o sono REM.
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O SONO E SUAS FASES… SONO NÃO-REM


Já ouviu falar em sono REM? Pois bem, Essa fase é dividida em três estágios,
esse é considerado o estágio mais profun- como explica a médica especialista:
do do sono, pois, dentre outras funções, é
nesta fase em que as memórias são pro- • Estágio 1 (N1): é a passagem da
cessadas e os aprendizados consolidados. vigília para o sono. “Durante esse
Mas ele não é o único. De acordo com curto período de sono leve, os bati-
Simone Prezotti, existem dois tipos básicos mentos cardíacos, a respiração e os
de sono: sono de movimento rápido dos movimentos dos olhos diminuem, e
olhos (REM), e sono não-REM - que tem três os músculos relaxam. As ondas ce-
estágios diferentes. Cada um deles está li- rebrais começam a diminuir em re-
gado a ondas cerebrais e atividades neuro- lação aos padrões de vigília diurna”,
nais específicas. descreve.

• Estágio 2 (N2): também é um pe-


Estágio 1
ríodo de sono, em que os batimentos
(N1) cardíacos, a respiração e os múscu-
los relaxam ainda mais. “A tempera-
tura do seu corpo cai e a atividade
das ondas cerebrais diminui, mas é
marcada por breves explosões de ati-
vidade elétrica.”

• Estágio 3 (N3): é o período de sono

Ilustração: GreenSkyStudio/Shutterstock Images


profundo, que ocorre principalmente
durante a primeira metade da noite.
Os batimentos cardíacos e a respira-
ção diminuem para níveis ainda mais
baixos e as ondas cerebrais tornam-
-se muito mais lentas. “Este é o está-
gio em que o corpo repara e regenera
os tecidos, constrói ossos e múscu-
los e fortalece o sistema imunológi-
co”, detalha Simone.
Estágio 2 Estágio 3 *É também no estágio 3 em que
(N2) (N3) ocorre o sonambulismo, terrores no-
turnos e enurese noturna.
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O FAMOSO REM QUANTO TEMPO DURA


O tão falado e conhecido sono REM Simone esclarece que uma noite de
ocorre pela primeira vez 90 minutos sono típica consiste em 4 a 5 ciclos
depois de adormecer. “Os olhos se mo- de sono, com a progressão dos es-
vem rapidamente de um lado para o tágios acontecendo na seguinte or-
outro por trás das pálpebras fechadas. dem: N1, N2, N3, N2, REM. “Um ciclo
A atividade das ondas cerebrais de fre- completo de sono leva cerca de 90
quência mista torna-se mais próxima a 110 minutos. O primeiro período
daquela observada na vigília”, explica a REM é curto e, à medida que a noite
especialista. avança, ocorrem períodos mais lon-
Segundo a médica, nesta fase a respi- gos de REM e diminuição do tempo
ração se torna mais rápida e irregular, e a de sono profundo”, detalha.
frequência cardíaca aumenta para níveis O tempo total de sono varia mui-
próximos aos do estado de vigília. to de acordo com a fase da vida,
de acordo com a médica, mas para
“O sono REM é o período associado adultos são recomendadas entre 7 e
a sonhos e movimentos musculares 9 horas de sono por noite.
irregulares, bem como movimentos
rápidos dos olhos. O cérebro
é altamente ativo nesta fase, NÃO DORMIR É PERIGOSO!
aumentando o metabolismo cerebral É fato que a rotina corrida de grande
em até 20%.” parte da população talvez não permita
dormir a quantidade de sono ideal, mas
é importante prezar por dormir o máxi-
mo que você conseguir e tiver de tempo
disponível (claro, de acordo com as ho-
ras indicadas - de 7 a 9). Isso porque a
privação do sono prejudica as funções Ilustração: GoodStudio/Shutterstock Images

mediadas pelo córtex pré-frontal, que


afetam principalmente a memória de
trabalho e a atenção. “Quanto menor for
a duração do sono, maiores serão os dé-
fices cognitivos”, aponta a médica.
À medida em que ficamos mais ho-
ras acordados, há um aumento da pres-
são para o sono e as ondas cerebrais vão
mudando, ficando mais lentas. “Começa
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a haver mais dificuldade de manter o foco “A privação do sono está associada


e a concentração, dificuldade de memo- a estresse e ansiedade, altera
rização, maior risco de erros que podem a forma como as informações
gerar acidentes, por exemplo”, alerta. emocionais são processadas, o
julgamento, a tomada de decisões.”
E A LONGO PRAZO?
Só piora! “Durante a privação persisten- DESLIGUE AS TELAS
te de sono, tanto a sonolência diurna E VÁ DORMIR
como as deficiências cognitivas conti- Se você, assim como a maioria das pes-
nuam a progredir”, afirma Simone. soas que vivem conectadas à internet,
A especialista explica que o sono de- também sente dificuldade em abando-
sempenha um papel neuroprotetor que é nar as telas, saiba que isso pode estar
vital para eliminar os metabólitos tóxicos prejudicando - e muito - a qualidade do
produzidos no cérebro através do siste- seu sono. Simone Prezotti recomenda
ma glinfático. Durante o sono, este liquor buscar atividades que sejam mais rela-

Ilustração: Lio putra/Shutterstock Images


flui mais abundantemente, o que aumen- xantes à noite, para desacelerar o corpo
ta significativamente a eliminação des- e o cérebro no momento que antecede
sas substâncias tóxicas dos neurônios e a hora de dormir. “Apagar as luzes (isso
dos espaços intercelulares. “Já quando inclui não fazer uso de telas), tomar ba-
o sono é restrito, o sistema glinfático não nho, fazer uma leitura em livro físico,
tem tempo suficiente para cumprir a sua anotar em um caderno as preocupações
função de remover toxinas e proteínas e planos para o dia seguinte, técnicas
que, acumuladas, ao longo dos anos po- de relaxamento, respiração, meditação,
dem levar a demência.” são algumas sugestões”, pontua.
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SONHOS: UMA
FASCINANTE
JORNADA
DA MENTE
Sonhamos para consolidar memórias, processar
sentimentos e resolver problemas
Entrevista: Ana Kubata
Texto: Ana Carvalho

Ilustração: StonePictures/Shutterstock Images


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N
a vida, normalmente há qua- sonhos ocorrem, observa-se ativação de di-
tro certezas: vamos nascer, versas áreas do cérebro, resultando em so-
vamos amar, vamos morrer… nhos visualmente vívidos e emocionalmente
e teremos algum sonho sem pé nem intensos. Neurobiologicamente, o hipocam-
cabeça! É assim com você também e po e o córtex pré-frontal desempenham pa-
quer entender o porquê desses sonhos péis-chave nesse momento, influenciando
malucos? Conversamos com o Doutor a formação de memórias e a percepção nos
e pesquisador em Neurociências Fa- sonhos”, pontua o especialista.
biano de Abreu Agrela para desvendar
os segredos que se passam em nossa OS SONHOS TÊM SIGNIFICADO
mente enquanto descansamos. ESPECÍFICO?
As opiniões dos especialistas quanto a
PRIMEIRAMENTE, POR QUE isso variam e os estudos sobre são diver-
NÓS SONHAMOS? sos, tanto no campo da neurociência quan-
“Os sonhos ainda são um mistério to na psicologia. “O conteúdo dos sonhos
científico. Sonhamos para consolidar é frequentemente interpretado como uma
memórias, processar sentimentos e expressão do inconsciente, com teorias
resolver problemas. Esses processos variando desde a psicanálise de Freud, que
ocorrem durante o sono, auxiliando vê os sonhos como caminhos para acessar
na organização de informações do desejos reprimidos, até visões modernas,
dia a dia e no manejo de emoções que consideram os sonhos como reflexos
complexas”, explica Fabiano. de processos psicológicos inconscientes”
“Os sonhos também podem esti- Fabiano comenta.
mular a criatividade e o autoconhe- Esta visão é apoiada por estudos que
cimento, embora a ciência ainda não analisam a natureza e o significado dos
tenha uma explicação definitiva do sonhos dentro de contextos psicológicos
porque eles ocorrem”, contextualiza. e neurológicos.
Ele continua: “Para mim, os sonhos são
O QUE ACONTECE COM NOSSO projetos aleatórios do acaso, influenciados
CÉREBRO DURANTE OS SONHOS? por fatores emocionais. Por exemplo: uma
Muita coisa! Durante o sonho, o cére- mulher sonha que o marido a trai com uma
bro exibe padrões de atividade distin- colega de trabalho. Pode ser que essa pos-
tos: áreas responsáveis pela imagé- sibilidade tenha passado pela cabeça dela
tica são ativadas, enquanto regiões de forma subjetiva durante o dia e sido in-
responsáveis pelo contexto físico e de terpretada, conscientemente, como algo
controle de consciência são inibidas. que jamais ocorreria. Porém, como a pos-
“No sono REM, onde a maioria dos sibilidade passou pela mente, ela acaba
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sonhando com isso. Uma preocupação


ou pensamento aparentemente banal AS FASES DO SONO
quando estamos acordados pode se (E A INFLUÊNCIA DELAS
revelar emocionalmente impactante du- SOBRE OS SONHOS)
rante um sonho.” adiciona ele. O sono é dividido em duas eta-
pas principais: REM (Movimento
O QUE VIVEMOS AO LONGO DO Rápido dos Olhos) e NREM (Mo-
DIA SÃO OS RESPONSÁVEIS vimento Não Rápido dos Olhos).
PELO QUE SONHAMOS, ENTÃO? O NREM é subdividido em três fa-
Mais ou menos! “A frequência e inten- ses: N1, N2 e N3.
sidade dos sonhos são influenciadas

Ilustração: Viktoria Win/Shutterstock Images


• N1: É a fase de transição entre
por fatores neurológicos, psicológi- a vigília e o sono, quando ocorre
cos e de estilo de vida, incluindo ati- aquela famosa sensação de que-
vidade cerebral específica, estresse e da e movimentos involuntários,
traços de personalidade, variando sig- por exemplo.
nificativamente entre indivíduos e ao • N2: O sono se torna mais pro-
longo da vida”, explica o especialista. fundo. O corpo relaxa, diminuindo
Fatores como estresse, uso de medi- a frequência cardíaca e tempera-
camentos ansiolíticos ou antidepressi- tura corporal.
vos e características de personalidade • N3: É o sono profundo. É nesta
também influenciam a intensidade e a fase que o nosso corpo e mente
frequência dos sonhos. Eles podem es- descansam e se recuperam pro-
timular a criatividade e ajudar na conso- priamente.
lidação de memórias emocionais, espe- Após o N3, entra-se na fase
cialmente as negativas. REM, caracterizada por intensa ati-
vidade cerebral. É nesta fase que
ocorrem a maioria dos sonhos.
Cada ciclo de sono dura cerca
de 90 minutos e se repete ao lon-
go da noite. A qualidade do sono
e a alternância eficiente entre as
fases são fundamentais para um
bom descanso e para a saúde
em geral, com a perturbação de
qualquer fase podendo afetar a
qualidade do sono e, consequen-
temente, a capacidade de sonhar.
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ALIADOS
DA NOSSA
SAÚDE MENTAL!
Um estudo afirmou que interagir com
cachorros fortalece as ondas cerebrais associadas
ao descanso e relaxamento
Texto: Gabrielle Aguiar

Ilustração: StonePictures/Shutterstock Images


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T
em coisa melhor nesse • Estímulo da cognição, empatia e respon-
mundo do que fazer carinho sabilidade em crianças e adultos.
em um gatinho fofo ou em
um cachorrinho adorável? Nós sabe- APOIO NAS DIFICULDADES
mos que não, e a ciência também! Os animais estão demonstrando se-
Um estudo publicado no jornal rem aliados importantes na supera-
PLOS One afirmou que interagir com ção de problemas de saúde mental e
cachorros (fisicamente ou vendo ví- até mesmo física. “A companhia de um
deos deles on-line) fortalece as on- pet de estimação pode oferecer apoio
das cerebrais associadas ao des- emocional, reduzir a solidão, promover
canso e relaxamento. Então é por o senso de propósito e incentivar a prá-
isso que nós nos sentimos tão bem tica de exercícios físicos. Além disso, a

Ilustração: Don Graphics/Shutterstock Images


quando estamos com eles? “Um dos interação com os animais pode contri-
mecanismos envolvidos é a libera- buir para a redução da pressão arterial
ção de oxitocina, um neurotransmis- e do estresse em indivíduos, melhoran-
sor relacionado ao bem-estar e à do a qualidade de vida”, pontua Luane.
redução do estresse. Sendo assim,
a presença de um animal de estima-
ção pode promover um ambiente
tranquilo e acolhedor, favorecendo a
regulação das emoções e a sensa-
ção de conforto”, explica a psicóloga
Luane da Guia Vieira. TERAPIA COM PETS
Você sabia que existe uma terapia que en-
BENEFÍCIOS E MAIS volve animais? “Há uma modalidade tera-
BENEFÍCIOS pêutica conhecida como ‘terapia assistida
Interagir com animais, como cães e por animais’ ou ‘pet therapy’, que envolve a
gatos, traz uma série de benefícios presença de animais durante sessões te-
psicológicos, cognitivos e neurológi- rapêuticas com o objetivo de promover o
cos. De acordo com a psicóloga, di- bem-estar físico, emocional e psicológico
versos estudos mostram esses be- dos pacientes, além da coordenação mo-
nefícios, conheça alguns: tora. Essa abordagem tem sido utilizada
• Redução dos níveis de ansiedade e em diversas áreas da saúde, como psi-
depressão; cologia, fisioterapia, pediatria e geriatria,
• Melhora da saúde mental; mostrando resultados positivos na melho-
• Aumento da sensação de felicidade; ria da qualidade de vida e na recuperação
• Promoção da interação social; de pacientes.”

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