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1ª Fase | 41° Exame da OAB

Direito Empresarial

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1ª FASE OAB | 41° EXAME

Direito Empresarial
Prof.ª Cristiane Pauli
Prof. Douglas Azevedo
Prof.ª Luciana Aranalde

Sumário

1. Teoria Geral do Direito Empresarial ......................................................................................... 4


2. Sociedade .............................................................................................................................. 20
3. Arbitragem e Procedimento Arbitral ....................................................................................... 62
4. Contratos Empresariais.......................................................................................................... 70
5. Títulos de Crédito ................................................................................................................. 120
6. Direito Recuperacional e Falimentar .................................................................................... 138
7. Propriedade Industrial .......................................................................................................... 164
8. Lei Geral de proteção de Dados (LGPD) ............................................................................. 169

Olá, aluno(a). Este material de apoio foi organizado com base nas aulas do curso preparatório para
a 1ª Fase OAB e deve ser utilizado como um roteiro para as respectivas aulas. Além disso, reco-
menda-se que o aluno assista as aulas acompanhado da legislação pertinente.

Bons estudos, Equipe Ceisc.


Atualizado em janeiro de 2024.

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1. Teoria Geral do Direito Empresarial

Prof. Douglas Azevedo


@prof.douglasazevedo

1.1. Parte geral: empresário; estabelecimento; nome empresarial


1.1.1. A empresa
O Direito Empresarial historicamente é organizado a partir de três grandes fases.
A primeira fase é a do Direito Mercantil, no final da Idade Média (a partir do século XII),
quando os usos e costumes eram concebidos nos estatutos das Corporações de Ofício, verda-
deiras jurisdições privadas de direito consuetudinário e corporativista. Trata-se da chamada Te-
oria das Corporações de Ofício. É nessa fase que são criados os primeiros títulos de créditos e
alguns protótipos de sociedades e de contratos.
A segunda fase do Direito Comercial, já na Idade Moderna, é marcada pelas inspirações
advindas da codificação napoleônica. No Brasil, o Código Comercial (1850) marcou a fase da
Teoria dos Atos de Comércio. O Direito Comercial era destinado a todos os comerciantes e, em
razão da codificação, assumiu um papel autônomo em relação ao Direito Civil. Destaca-se que
os comerciantes eram considerados exclusivamente aqueles que exerciam atos de comércio.
A terceira fase corresponde à fase atual, chamada de Teoria da Empresa. Com a criação
da figura do empresário, passa-se do Direito Comercial ao Direito Empresarial. A inspiração foi
o CC italiano de 1942. A Teoria da Empresa passa a ser disciplinada com a redação do art. 966
do CC, que preconiza que é considerado empresário aquele que exerce profissionalmente ativi-
dade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

1.1.2. Empresário
Atualmente, existem no ordenamento jurídico duas categorias que são enquadradas no
conceito de empresário: a) o empresário individual; e b) a sociedade empresária.
Extinção da EIRELI: a Lei no 14.195/2021 revogou tacitamente o art. 980-A do CC e foi
somente a MP no 1.085/2021, convertida na lei 14.382/22, que revogou de forma expressa o
dispositivo, extinguindo, portanto, a EIRELI.
O empresário individual é uma pessoa natural, porém, de natureza jurídica. Como indica
o seu próprio nome, representa um tipo empresarial no qual não é admitida a existência de um

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sócio. Seu modelo já não é tão corriqueiro, tendo em vista que a escolha atrai a obrigação da
responsabilidade direta e ilimitada. Ou seja, o CPF e o CNPJ acabam interpenetrando-se.
A responsabilidade do empresário individual é direta e ilimitada. O Enunciado n o 5 das
Jornadas de Direito Comercial veio a indicar que primeiramente deve o empresário responder
com os bens da empresa, depois com os particulares.
Conforme referido, o art. 966 do CC conceitua o empresário, e seu parágrafo único deter-
mina: “não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica,
literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício
da profissão constituir elemento de empresa”. Isso impõe destacar que aqueles que exercem
profissão intelectual (dentistas, contadores, médicos, advogados, professores etc.) não são con-
siderados empresários para os fins legais. A exceção é quando o exercício da profissão constituir
elemento de empresa, ou seja, quando exploram a profissão de forma a fazer desaparecer as
características personalíssimas do profissional.
O art. 972 do CC indica que, para que se possa exercer a atividade de empresário, é
necessário estar em pleno da capacidade civil e, ainda, não pode ser legalmente impedido. Um
exemplo disso é a restrição aos magistrados, que não podem ser empresários. Não se pode
confundir esse impedimento com a possibilidade de ser sócio/acionista que lhe é resguardada
desde que a responsabilidade seja limitada e não exerçam cargos de administração.
Caso aquele legalmente impedido exerça a atividade, irá responder pessoalmente pelas
obrigações contratadas. Nesse caso, precisamos diferenciar impedimento com incapacidade. O
art. 974 do CC indica que “poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assis-
tido, continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor de
herança”. Assim, não se pode começar uma empresa individual sendo incapaz, contudo, é pos-
sível, em casos de incapacidade superveniente ou incapacidade do sucessor na sucessão
por morte, que a empresa continue as atividades dessa forma.
Como visto, o art. 974 do CC disciplina a questão referindo que, para tanto, é necessária
a autorização judicial e que, nesse caso, uma espécie de limitação da responsabilidade, referindo
que “não ficam sujeitos ao resultado da empresa os bens que o incapaz já possuía, ao tempo da
sucessão ou da interdição, desde que estranhos ao acervo daquela”. A questão deve estar clara
no alvará que concede a autorização.
O legislador previu no art. 975 do CC que “se o representante ou assistente do incapaz
for pessoa que, por disposição de lei, não puder exercer atividade de empresário, nomeará, com
a aprovação do juiz, um ou mais gerentes”.

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Em relação ao empresário casado, a regra do art. 978 do CC merece muita atenção pois
refere textualmente que “o empresário casado pode, sem necessidade de outorga conjugal,
qualquer que seja o regime de bens, alienar os imóveis que integrem o patrimônio da empresa
ou gravá-los de ônus real”. Contudo, há que destacar-se que o Enunciado no 58 das Jornadas
de Direito Comercial afirma que a regra apenas vale “desde que exista prévia averbação de
autorização conjugal à conferência do imóvel ao patrimônio empresarial no cartório de registro
de imóveis, com a consequente averbação do ato à margem de sua inscrição no registro público”.
Porém, cumpre reforçar que, pelo CC, esse “porém” não existe.
O empresário deve observar sempre a regra do art. 979 do CC, mantendo o arquivamento
na Junta de todos os pactos e declarações antenupciais, bem como os títulos de doação, he-
rança, ou legado, de bens clausulados de incomunicabilidade ou inalienabilidade. Ainda, desta-
que-se a previsão do art. 980 do CC, que determina que a “sentença que decretar ou homologar
a separação judicial do empresário e o ato de reconciliação não podem ser opostos a terceiros,
antes de arquivados e averbados no Registro Público de Empresas Mercantis”.
Por fim, um empresário pode ser representado pela sociedade empresária, que será
estudada com maiores detalhamentos na Seção 2. Contudo, para fins de caracterização, tem-se
que possui natureza jurídica de pessoa jurídica. Os sócios podem ser pessoa natural ou jurídica
e a responsabilidade dos sócios é subsidiária e limitada, ilimitada ou mista, a depender do tipo
societário eleito.

1.1.3. Estabelecimento empresarial


A primeira questão a ser pontuada é a de que estabelecimento empresarial não é sinô-
nimo de local onde são desenvolvidas as atividades empresariais, o conceito de estabelecimento
comercial é muito mais longo. Segundo o art. 1.142 do CC, “considera-se estabelecimento todo
complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade
empresária”. Ainda, o local onde se exerce a atividade empresarial poderá ser físico ou virtual:
• Quando o local onde se exerce a atividade empresarial for virtual, o endereço in-
formado para fins de registro poderá ser, conforme o caso, o do empresário indivi-
dual ou o de um dos sócios da sociedade empresária; art. 1.142, § 2 o do CC.
• Quando o local onde se exerce a atividade empresarial for físico, a fixação do ho-
rário de funcionamento competirá ao município, observada a regra geral do inciso
II do caput do art. 3o da Lei no 13.874, de 20-9-2019; art. 1.142, § 3o do CC.

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Com isso é preciso entender que o estabelecimento comercial compreende tanto os bens
de natureza material quanto imaterial, utilizados para que possa se dar o exercício da atividade
econômica. Tem-se, portanto, um olhar à universalidade dos bens. Tanto é que é possível reali-
zar a venda do estabelecimento empresarial como um todo: o chamado contrato de trespasse,
conforme regulado no art. 1.144 do CC.
Percebe-se que, para que seja válido perante terceiros, é necessário o seu registro e pos-
terior publicação. Há que se pontuar que o CC determinou diversas regras aplicáveis ao tres-
passe, tendo em vista a sua evidente importância.
Assim, por exemplo, a regra insculpida no art. 1.145 do CC prevê que, antes da alienação,
deve ser providenciado o pagamento dos credores ou deve ser colhida uma autorização que
contenha o consentimento desses. Essa autorização se dá por meio de uma notificação cuja
resposta deve dar-se em trinta dias, sob pena de ser considerada uma autorização tácita.
Outro ponto de suma importância diz respeito à sucessão empresarial, prevista no art.
1.146 do CC: “o adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores
à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solida-
riamente obrigado pelo prazo de um ano [...]”. Esse prazo de um ano é contado, em relação aos
créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento.
Obviamente tal regra é considerada apenas em relação às dívidas que podem ser nego-
ciadas, o que não se aplica no caso das dívidas de natureza tributária e trabalhista. Nesses casos
devem ser observadas as previsões do art. 133 do CTN e do art. 448 da CLT.
É lícito e usual que esses contratos venham com a previsão de uma cláusula de não con-
corrência. Em referência a isso, inclusive, o art. 1.147 do CC indica que “não havendo autoriza-
ção expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos
cinco anos subsequentes à transferência”. Nada impede de ser previsto um prazo menor, va-
lendo esse regramento no silêncio.
Por fim, vale mencionar o caso de sub-rogação nos contratos de exploração, pelo art.
1.148 do CC, que indica que “salvo disposição em contrário, a transferência importa a sub-roga-
ção do adquirente nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento, se não tiverem
caráter pessoal”. Refere ainda que nada impede que os terceiros rescindam o contrato em no-
venta dias, a contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa, ressalvada, neste
caso, a responsabilidade do alienante.

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1.1.4. Nome empresarial


O nome empresarial é o que irá identificar a pessoa jurídica perante a sociedade em todas
as suas relações. A escolha do nome empresarial irá aparecer no ato constitutivo da sociedade,
ou seja, ou no contrato social ou no estatuto, que posteriormente será arquivado na Junta Co-
mercial. Não se confunde o nome empresarial com a marca, nome de domínio e nem com o
nome fantasia.
Marca: sinal distintivo que identifica produtos e/ou serviços. Vide art. 122 da Lei no
9.279/1996.
Nome de domínio: endereço eletrônico que hospeda o sítio eletrônico do empresário.
Nome fantasia: é o título do estabelecimento.
Ele deve obedecer ao princípio da novidade e da veracidade (arts. 1.158 e 1.165 do CC).
Isso quer dizer que não pode valer-se de uma expressão que não corresponda à realidade em-
presarial e, ainda, não se deve utilizar de um registro igual ou que guarde notória semelhança
com outro já registrado na Junta Comercial (vide arts. 1.163 e 1.666 do CC).
O nome empresarial pode ser constituído de firma ou denominação. Essa é a regra tra-
zida no art. 1.155 do CC. Enquanto a firma necessita possuir um nome civil em seu núcleo (ex-
tenso ou abreviado), a denominação admite a inserção de qualquer expressão linguística.
Lei no 14.195/2021: a Lei no 14.195/2021 incluiu o art. 35-A na Lei de Registro Público de
Empresas Mercantis (Lei no 8.934/1994), dispondo que: “O empresário ou a pessoa jurídica po-
derá optar por utilizar o número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ)
como nome empresarial, seguido da partícula identificadora do tipo societário ou jurídico, quando
exigida por lei”. Outra importante alteração se deu no art. 35 da mesma lei, que antes vedava o
arquivamento de atos de empresas mercantis com nome idêntico ou semelhante a outro já exis-
tente. Agora, a palavra “semelhante” foi retirada do dispositivo, permitindo o registro de empresas
com nome empresarial parecido a outro já registrado.
Existe uma polêmica no que diz respeito à necessidade de indicação da atividade empre-
sarial. Na firma a indicação é facultativa, já na denominação, em que pese haja exigência pelo
art. 1.158 do CC, a Lei no 8.934/1994 indica a desnecessidade.
Um cuidado importante é que na sociedade limitada há a opção de escolha entre firma
e denominação, contudo, ao final do nome deve estar incluída a palavra “limitada” ou “ltda.”.
Caso essa regra não seja observada, haverá responsabilidade solidária e ilimitada dos adminis-
tradores que assim utilizarem-se da firma ou denominação.

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Outro importante detalhe é que a cooperativa deve utilizar-se de denominação inte-


grando a palavra “cooperativa’’ por extenso. Por outro lado, as sociedades anônimas devem
utilizar-se da denominação junto do vocábulo “sociedade anônima” ou “companhia”, sendo facul-
tado utilizar-se da abreviatura “cia” ou “S.A.”. Nada impede que o nome de um fundador ou aci-
onista importante componha o nome empresarial.
Por seu turno, a sociedade em comandita por ações pode, em lugar de firma, adotar de-
nominação aditada da expressão ‘comandita por ações’, facultada a designação do objeto social.

TIPO SOCIETÁRIO NOME EMPRESARIAL

EI FIRMA OU CNPJ

COMANDITA SIMPLES FIRMA OU CNPJ

COMANDITA POR AÇÕES FIRMA, DENOMINAÇÃO OU CNPJ

EM NOME COLETIVO FIRMA OU CNPJ

LTDA FIRMA, DENOMINAÇÃO OU CNPJ

ANÔNIMA DENOMINAÇÃO OU CNPJ

EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO SEM REGISTRO

1.1.5. Registro e escrituração


O registro (arts. 1.150 a 1.154 do CC) dos empresários no Brasil é uma obrigação legal.
A inscrição deve ser feita na Junta Comercial ainda antes do início das atividades empresariais.
A questão está prevista de forma taxativa no art. 967 do CC.
O art. 984 do CC é uma exceção importante, indicando que o empresário rural é o único
que possui a faculdade de registrar-se, ou seja, o seu registro é facultativo.
Caso as atividades iniciem sem o devido registro, estará imposta a sua irregularidade,
mas não a sua inexistência, uma vez que desde que reúna os requisitos do art. 966 do CC, será
considerado empresário.
Importante que se saiba que é a Lei n o 8.934/1994 que dispõe sobre o Registro Público
de Empresas Mercantis e Atividades Afins. O registro nas Juntas Comerciais possui um principal
interesse: o da publicidade dos atos e, portanto, qualquer pessoa pode consultar os contratos e
documentos lá arquivados.
De acordo com o art. 36 da Lei n o 8.934/1994, o registro do Contrato Social deve se dar
em até trinta dias contados de sua assinatura. Caso feito nesse prazo, os efeitos retroagem. Se

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fora do prazo, o arquivamento só possui eficácia a partir do despacho de concessão. O mesmo


texto é trazido pelo art. 998 do CC.
O pedido de inscrição deve ser acompanhado do instrumento autenticado do contrato, e,
de acordo com o Código Civil, “se algum sócio nele houver sido representado por procurador, o
da respectiva procuração, bem como, se for o caso, da prova de autorização da autoridade com-
petente” (letra do § 1o do art. 998).
A escrituração (arts. 1.179 a 1.195 do CC) é outra obrigação legal estendida aos empre-
sários e está prevista no art. 1.179 do CC. A lei impõe a obrigação do empresário de manter a
escrituração contábil dos resultados dos negócios que participa. A escrituração tem uma função
interna ou administrativa, na medida em que possibilita:
• Verificar os resultados do negócio;
• Fundamentar ações corretivas visando aumento/diminuição dos lucros/prejuízos;
• Posicionar os sócios acerca do desempenho da sociedade empresária.

Por outro lado, também possui uma função externa:


• O Estado se vale da escrituração para fiscalizar e cobrar tributos;
• Os registros servem como prova do exercício da atividade comercial e de seus
resultados perante órgãos do Poder Judiciário.

Prejuízos ao empresário pela ausência de escrituração contábil:


• Impossibilidade de usufruir dos benefícios da recuperação judicial (art. 51 da Lei
no 11.101/2005);
• Crime falimentar se for decretada a falência (art. 178 da Lei n o 11.101/2005);
• Inviabilidade de utilizar os dados da escrituração para fazer prova a seu favor;
• Possibilidade de o fisco lançar Imposto de Renda devido com base no lucro anual
por arbitramento.

Assim, compreende-se que existe a obrigação de ser mantido um sistema de contabili-


dade (mecanizado ou não), com base na escrituração uniforme dos seus livros. A escrituração
deve ser elaborada com base na documentação a ela vinculada. Ainda, anualmente deve ser
levantado balanço patrimonial e resultado econômico.
Dica: cuidado com a exceção do § 2o, que flexibiliza a exigência aos pequenos empresá-
rios, conforme art. 970 do CC.

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A regra é de que a escrituração seja elaborada pelo contabilista, em idioma e moeda cor-
rente, a partir da obrigatoriedade da ordem cronológica de dia, mês e ano. Deve ser feita a au-
tenticação na Junta Comercial. Esses livros são sigilosos, salvo os casos de autorização judicial
ou para fins fiscalizatórios.
Lei no 14.195/2021: a Lei no 14.195/2021 esclarece que os órgãos e entidades envolvidos
no processo de registro de empresas deverão disponibilizar, de forma gratuita, informações que
permitam pesquisas prévias sobre as etapas de registro, inscrição, alteração e baixa de empre-
sas, além de informações para licenciamento e autorização de funcionamento. Antigamente a
gratuidade era apenas para pesquisa da denominação social.
Outro importante detalhe é que não poderão mais ser exigidos, no processo de registro
via REDESIM, quaisquer dados e informações que já constem da base de dados do governo
federal. Isso se deve à centralização de dados das empresas no CNPJ.
Além disso, o art. 6o-A da Lei no 11.598/2007 agora dispõe que, nos casos em que o grau
de risco da atividade seja considerado médio, o alvará de funcionamento e as licenças serão
emitidos automaticamente, sem análise humana.

1.2. Parte geral: registro e elementos do contrato social


1.2.1. Especificidades
Constituída a sociedade pela formalização e assinatura do contrato social, devem os só-
cios proceder ao registro do ato constitutivo da sociedade no órgão competente (Cartório ou
Junta, a depender do objeto social), para que ela adquira personalidade jurídica (art. 985 do CC)
e possa dar início às suas atividades (art. 967 do CC).
De acordo com o art. 998 do CC, o prazo para a efetivação do registro do ato constitutivo
da sociedade é de 30 dias após sua constituição (ver também art. 36 da Lei n o 8.934/1994).
Complementando a regra citada, dispõem seus parágrafos: “o pedido de inscrição será
acompanhado do instrumento autenticado do contrato, e, se algum sócio nele houver sido repre-
sentado por procurador, o da respectiva procuração, bem como, se for o caso, da prova de au-
torização da autoridade competente” (§ 1 o); e “com todas as indicações enumeradas no artigo
antecedente, será a inscrição tomada por termo no livro de registro próprio, e obedecerá a nú-
mero de ordem contínua para todas as sociedades inscritas” (§ 2o).
A constituição das sociedades empresárias, do tipo limitada, para o correto registro pe-
rante o Registro Público de Empresa, deve conter, obrigatoriamente o instrumento de contrato
social, em três vias, assinado por todos os sócios ou seus procuradores.

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No caso de o instrumento de constituição social que será levado a registro conter repre-
sentação por procurador, é obrigatório exigir a respectiva procuração com poderes específicos
para o ato, bem com a aprovação prévia do órgão governamental competente, quando for o caso.
É preciso estar devidamente consignado no corpo do instrumento de constituição a declaração
de desimpedimento do administrador ou em ato separado, se não constar em cláusula própria.
Participação societária de empresa estrangeira: deve ser anexada ao instrumento de
constituição que será levado a registro a prova da existência legal da empresa e da legitimidade
de sua representação.
Participação societária de empresa pública: para sociedade de economia mista, autar-
quia ou fundação pública, é necessário juntar ao instrumento de constituição social a edição da
folha do Diário Oficial da União, do Estado ou do Município que contiver o ato de autorização
legislativa; ou citação, no contrato social, da natureza, número e data do ato de autorização
legislativa, bem como do nome, data e folha do jornal oficial em que foi publicada; fotocópia do
documento de identidade do representante legal; ficha de cadastro; comprovantes de pagamento
dos emolumentos dos serviços: recolhimento federal; recolhimento estadual.
Elementos: título; preâmbulo; corpo do contrato; cláusulas obrigatórias (Lei n o
8.934/1994); fecho. O instrumento contratual não poderá conter emendas, rasuras ou entreli-
nhas.
Obrigatoriamente constará do preâmbulo do instrumento de constituição social a qualifi-
cação completa dos sócios, pessoas físicas ou jurídicas, e ou de seus representantes. Caso
qualquer dos sócios seja representado por procurador, deve vir no preâmbulo do instrumento a
qualificação completa do mesmo.
O contrato social conterá: o nome empresarial (poderá ser razão social ou denominação
social – a razão social deve ser composta com sobrenome ou nome civil completo ou abreviada
de, pelo menos, um dos sócios); capital da sociedade; a participação de cada sócio; a forma e o
prazo de sua integralização; município da sede, com endereço completo, bem como o endereço
das filiais – se houver; declaração precisa e minuciosa do objeto social; prazo de duração da
sociedade; data de encerramento do exercício social, quando não coincidente com o ano civil; e
a nomeação do administrador, devidamente qualificado.
No final do instrumento contratual deverá constar local e data; nomes dos sócios e res-
pectivas assinaturas; nomes das testemunhas instrumentárias (duas, pelo menos) respectivas
assinaturas, com o número do documento da identidade (RG) e órgão expedidor e o visto de

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advogado, sendo este último não determinado para as Microempresas (ME) e as Empresas de
Pequeno Porte (EPP).
Podem ser sócios: desde que não haja empecilho legal, os absolutamente capazes e o
menor emancipado. Os menores, desde que devidamente representados.
Não podem ser sócios: os estrangeiros sem visto permanente.
Nome empresarial: obedecerá ao princípio da veracidade e da novidade, incorporando
os dados específicos ou complementares exigidos ou não proibidos em lei (tanto na razão social
como na denominação social deve haver a indicação do objeto social).
Capital social: as quotas serão correspondentes ao montante da contribuição de cada
sócio. Poderão ser utilizados para integralização de capital quaisquer bens, desde que suscetí-
veis de avaliação em dinheiro.
Filiais: é necessário que o instrumento de constituição para cada uma delas indique o
respectivo município e endereço completo.

1.2.2. Da alteração contratual


São os mesmos requisitos exigidos para o registro de instrumento de alteração contratual
e para o instrumento de constituição social, principalmente no que se refere ao preâmbulo e
quanto ao seu corpo. Deve-se mencionar as alterações pretendidas e, no caso de consolidação,
inserir uma nova redação, conforme a alteração efetuada.
Redução de capital: Devido a perdas irreparáveis, o instrumento de alteração contratual
deverá ser firmado pelos sócios, onde se formalizará a redução, com a diminuição proporcional
do valor nominal das quotas (arts. 1.082 e 1.083 do CC).
Por ser considerado demasiado em relação ao objeto da sociedade, o instrumento de
alteração contratual deverá ser formalizado com a indicação da redução com a devolução de
parte do valor das quotas aos sócios, ou dispensando-os de prestações ainda devidas, com a
redução proporcional também neste caso, do valor nominal das quotas.
Instrumento de alteração: em uma via original, podendo ser realizado por escritura pú-
blica ou particular, independentemente da forma de que se houver revestido o respectivo ato de
constituição. Devem conter os seguintes elementos: título, preâmbulo e corpo da alteração (nova
redação das cláusulas alteradas, expressando as modificações introduzidas, redação das cláu-
sulas incluídas, indicação das cláusulas suprimidas; fecho.

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Quando o instrumento de alteração for requerido por deliberação majoritária, deverá cons-
tar do preâmbulo apenas o nome dos sócios que dela fazem parte e que a deliberação se faz
por maioria do capital.
O instrumento de alteração pode conter a hipótese de a sociedade adquirir quotas de sócio
quando houver quotas liberadas, ou seja, integralizadas, desde que o faça com fundos disponí-
veis e sem ofensa ao capital, por acordo dos sócios; e quotas não liberadas de sócio remisso
excluído, desde que o faça com fundos disponíveis e sem ofensa ao capital.
As alterações contratuais, quando registradas por instrumento particular, serão assinadas
por todos os sócios e por duas testemunhas, salvo na hipótese de determinação majoritária.
Em hipótese alguma os registros de instrumentos de alterações sociais representam a
constituição de nova sociedade.

1.2.3. Da natureza jurídica do capital social


O conceito de capital social está intrinsecamente ligado à estrutura do contrato social.
Estabelece-se a partir da constituição de um patrimônio separado para a criação de uma socie-
dade, via de regra, para conciliar a limitação da responsabilidade dos sócios, com a garantia dos
credores.
Em outras palavras, a sociedade, para dar início à sua atividade econômica, necessita de
recursos. Cabe aos sócios prover tais recursos. Fazem-no transferindo do seu patrimônio ao da
pessoa jurídica. O capital social é a medida da contribuição dos sócios para a sociedade e serve
como referência à sua força econômica.
Capital social subscrito: mensuração do montante prometido pelos sócios para a socie-
dade a título de capitalização.
Capital social integralizado: recursos já transferidos para o patrimônio social.
Uma das principais funções do capital social é a de mensurar a contribuição dos sócios,
de modo a funcionar como um fundo de garantia dos credores – e assenta-se na ideia da limita-
ção da responsabilidade dos sócios.
Princípios do regime legal do capital social:
1. Unidade: toda sociedade deve ter um único capital social;
2. Fixidez: o capital social somente pode ser modificado nos casos previstos em lei e
de acordo com as normas legais;
3. Irrevogabilidade: os sócios não podem ser dispensados da obrigação de realizar
as entradas que se obrigaram perante a sociedade;

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4. Realidade: a cifra do capital deve corresponder ao valor real das entradas feitas
pelos sócios;
5. Intangibilidade: os sócios não podem “beliscar” o capital social, ou seja, não po-
dem tocar neste fundo permanente enquanto a sociedade continua operando e os
credores não foram integralmente satisfeitos.

1.2.3.1. Do entendimento da Junta Comercial


O art. 35, III, da Lei no 8.934/1994 é claro e não admite concessões, quando proíbe o
arquivamento dos atos constitutivos se deles não constar o capital da sociedade, a forma e o
prazo de sua integralização. No mesmo sentido, temos o art. 1.054 c/c o art. 997, III e IV, do CC.
Entre as orientações das Juntas Comercial, insertas nas instruções normativas do DREI,
constam a necessidade de indicação numérica e por extenso do total do capital social; bem como
a necessidade de mencionar o valor nominal de cada quota, que pode ter valor desigual.
Há de se mencionar o total de quota(s) de cada sócio e declarar a forma e o prazo de
integralização do capital – se houver sócio menor, o capital deverá estar totalmente integralizado.
No caso de se tratar de integralização com bem imóvel, obrigatoriamente, haverá a des-
crição e identificação do imóvel, sua área, dados relativos à sua titulação, número de matrícula
no Registro de Imóveis e autorização do cônjuge no instrumento contratual com a referência
pertinente, salvo se o regime de bens for o de separação absoluta.
O legislador concedeu liberdade aos sócios de escolherem a maneira de integralizar o
capital social, tornou, porém, obrigatória cláusula contratual dispondo sobre o prazo e a forma
de sua integralização (dinheiro ou bens suscetíveis de avaliação em dinheiro).

1.3. Parte geral: tipos de desconsideração da pessoa jurídica


1.3.1. Personalidade jurídica
A personalidade jurídica é o que confere à pessoa jurídica a aptidão de adquirir direitos,
bem como contrair obrigações. Assim, não é pura e simplesmente a condição de sujeito de direito
que caracteriza a personalidade, mas a aptidão genérica para tanto, até porque os entes des-
personalizados também são sujeitos de direitos capazes de praticar atos jurídicos, ainda que de
forma limitada, como é o caso da massa falida e do espólio.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

1.3.2. Pessoas jurídicas


As pessoas jurídicas se dividem em dois grupos: de direito público (interno ou externo)
e de direito privado (estatais ou particulares), que possuem regulamentação nos arts. 40, 41,
42 e 43, todos do CC:

PESSOAS JURÍDICAS DE PESSOAS JURÍDICAS DE PESSOAS JURÍDICAS DE


DIREITO PÚBLICO INTERNO: DIRIEITO PÚBLICO EXTERNO: DIREITO PRIVADO:

União;
Estados, DF e Territórios; Associações;
Municípios; Estados estrangeiros; Sociedades;
Autarquias, inclusive as associa- Todas as pessoas regidas pelo Fundações;
ções públicas; Dir eito Interno Público. Organizações Religiosas;
Demais entidades de caráter pú- Partidos públicos.
blico criadas por lei.

Lembre-se de que as pessoas jurídicas de direito público estão submetidas a regime dis-
tinto das pessoas jurídicas de direito privado, na medida em que têm suas regras sujeitas ao
Direito Administrativo, submetendo-se ao princípio da estrita legalidade.
Quanto às pessoas jurídicas de direito privado, é importante saber que não se limitam
àquelas previstas no art. 44 do CC, podendo existir outras, tais como os sindicatos, as confede-
rações, as federações, dentre outras.

1.4. Autonomia patrimonial da pessoa jurídica


Assim prevê o art. 1.024 do CC: “Os bens particulares dos sócios não podem ser execu-
tados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais”.
Isso se dá em virtude da autonomia patrimonial das sociedades, a qual determina que a
responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais será subsidiária, podendo também ser li-
mitada a depender do tipo societário. Essa concepção tornou-se ainda mais forte a partir da
edição da Lei da Liberdade Econômica (Lei no 13.874/2019) a partir da inclusão do art. 49-A no
CC.

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Direito Empresarial

1.4.1. Responsabilidade subsidiária dos sócios


A regra geral, portanto, é que os bens da sociedade responderão pelas dívidas sociais
enquanto a empresa ainda os possuir. Isso garante aos sócios o chamado benefício de ordem.
No caso de a empresa não possuir bens, deve-se atentar para o tipo de responsabilidade
dos sócios. Se ilimitada, seus bens particulares poderão ser executados. Se limitada, seus bens
particulares não poderão, a princípio, ser executados.
Exemplos:
• Sociedade em nome coletivo: responsabilidade ilimitada.
• Sociedade anônima: responsabilidade limitada.

1.5. Desconsideração da personalidade jurídica


A desconsideração da personalidade jurídica surge para solidificar o instituto do princípio
da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, a fim de evitar que haja fraude ou abuso de direito.
Ou seja, ela é um reforço indireto para que sócios e administradores atuem visando ao bem
comum da sociedade empresária, preservando-a e mantendo a sua função social, coibindo ma-
nipulação da pessoa jurídica com o fim de fraudar credores.
Assim, se utilizada para fazer valer fraude em detrimento de terceiros, considerar-se-á
ineficaz a personificação com relação aos atos praticados de forma abusiva ou fraudulenta, po-
dendo atingir os bens particulares dos sócios envolvidos na administração da sociedade.
O CDC foi a primeira norma a prever a possibilidade de desconsiderar a personalidade
jurídica; neste caso a aplicação se dá quando há abuso em detrimento do consumidor, excesso
de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito, violação dos estatutos ou do contrato social, ou ainda
quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica
provocados por má administração (art. 28). A teoria presente no CDC é chamada de “teoria me-
nor”, sendo a “teoria maior” aquela presente no CC (art. 50).

1.5.1. Teoria maior versus teoria menor


Existem duas teorias aplicadas quando da desconsideração da personalidade jurídica: a
“teoria menor” e a “teoria maior”.
A teoria menor é aplicada nos casos que envolvam relação de consumo (art. 28 do CDC),
condutas lesivas ao meio ambiente (art. 4 o da Lei no 9.605/1998) ou ainda quando se tratar de
infração da ordem econômica (art. 34 da Lei no 12.529/2011). A teoria menor incide com a mera

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prova de insolvência da pessoa jurídica para o pagamento de suas obrigações, independente-


mente da existência de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial.
Já a teoria maior é considerada aquela prevista no art. 50 do CC. Sobre a distinção entre
o art. 50 do CC e as demais regras legais que tratam da desconsideração da personalidade
jurídica, o Enunciado no 9 das Jornadas de Direito Comercial do CJF diz o seguinte: “quando
aplicado às relações jurídicas empresariais, o art. 50 do CC não pode ser interpretado analoga-
mente ao art. 28, § 5o, do CDC ou ao art. 2o, § 2o, da CLT”.

1.5.2. Desvio de personalidade e confusão patrimonial


De acordo com o art. 50, § 1o, CC: “Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finali-
dade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos
ilícitos de qualquer natureza”.
No abuso por desvio de finalidade a personificação existe para um fim ilícito, como acon-
tece quando a atividade da pessoa jurídica é em si lícita, mas seria ilícita se exercida pelo sócio,
ou seja, a pessoa jurídica é usada para encobrir a ilicitude da ação dos sócios.
Não é desvio de finalidade:

Art. 50, § 5o, CC. Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da
finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica.

Confusão patrimonial:

Art. 50, § 2o, CC. Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato
entre os patrimônios, caracterizada por:
I – Cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou
vice-versa;
II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de
valor proporcionalmente insignificante; e
III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.

O pagamento de obrigações do sócio pela pessoa jurídica ou vice-versa é um exemplo


clássico caracterizado como hipótese de confusão patrimonial, contudo, verifica-se que o dispo-
sitivo exige expressamente que se trate de um comportamento repetitivo.
A transferência de ativos ou passivos realizada sem a devida justificativa econômica pode
ser caracterizada quando os sócios ou administradores utilizam o patrimônio da pessoa jurídica
e vice-versa. Empréstimos entre a pessoa jurídica e o sócio, por exemplo, embora comuns,

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precisam obedecer às condições normais de mercado, sob pena de representarem um meca-


nismo de mistura dos patrimônios.

1.6. Desconsideração da personalidade jurídica e seus efeitos


A desconsideração da personalidade jurídica tem os seus efeitos ligados ao caso concreto
em que foi requerida, ou seja, continua a existir normalmente e a ter os efeitos da sua persona-
lização respeitados em todas as demais relações jurídicas em que figurar.
A aplicação da teoria da desconsideração atinge, tão somente, aqueles sócios que se
beneficiaram do uso abusivo da pessoa jurídica, logo, não significa que atingirá todos os sócios
e/ou administradores da sociedade, indistintamente.
Essa interpretação ganhou reforço após a edição da Lei n o 13.874/2019 (Lei da Liberdade
Econômica), que alterou a redação do caput do art. 50 do CC para deixar claro que a desconsi-
deração da personalidade jurídica só pode atingir os administradores ou sócios “beneficiados
direta ou indiretamente pelo abuso”.

1.7. Desconsideração inversa da personalidade jurídica


Conforme já vimos, a teoria da desconsideração é aplicada com a finalidade de permitir a
execução de bens particulares dos sócios e/ou administradores por dívidas da sociedade. O
caminho inverso também pode ser feito: desconsiderar a pessoa jurídica para executar bens
sociais por dívidas pessoais de um de seus sócios.
A desconsideração inversa consiste na aplicação dos fundamentos da disregard doc-
trine para permitir que a pessoa jurídica responda por obrigações pessoais de um ou mais sócios.
A aplicação da desconsideração inversa é bem comum em questões que envolvam Direito
de Família, quando se constata, por exemplo, que um dos cônjuges cria uma pessoa jurídica
com o objetivo de ocultar seu patrimônio, o afastando da partilha ou frustrando a cobrança de
pensão alimentícia.
Dispõe o Enunciado no 283 das Jornadas de Direito Civil do CJF: “é cabível a descon-
sideração da personalidade jurídica denominada ‘inversa’ para alcançar bens de sócio que se
valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros”.
Vale destacar que, desde a edição da Lei n o 13.874/2019 (Lei da Liberdade Econômica),
a desconsideração inversa está expressamente autorizada pelo CC no § 3 o do art. 50.

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1.8. Desconsideração e dissolução da personalidade jurídica


É comum ocorrer, no Brasil, a chamada “dissolução irregular” da empresa, isto é, o encer-
ramento das atividades sem a devida baixa na Junta Comercial.
De acordo com o Súmula no 435 do STJ, “presume-se dissolvida irregularmente a empresa
que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, le-
gitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.
No entanto, esse entendimento restringe-se à execução fiscal. As Turmas de direito pri-
vado do STJ (3ª e 4ª Turmas, que compõem a 2ª Seção) entendem que a mera dissolução irre-
gular da empresa não é motivo suficiente para aplicação da desconsideração da personalidade
jurídica.

1.9. Prazo para requerimento da desconsideração da personalidade ju-


rídica
Assim prevê o art. 1.032 do CC: “a retirada, exclusão ou morte do sócio, não o exime, ou
a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após
averbada a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual
prazo, enquanto não se requerer a averbação”.
Assim, há quem alegue que a desconsideração da personalidade jurídica não poderia, por
exemplo, atingir um sócio que já se retirou da sociedade há mais de dois anos. No entanto, o
STJ já decidiu que a regra do art. 1.032 do CC não tem aplicação quando se trata de desconsi-
deração da personalidade jurídica, conforme é possível verificar no REsp n o 1.269.897 /SP (STJ,
rel. Min. Nancy Andrighi – 3ª T. – DJe 23 -11 -2009) e REsp no 1.312.591 /RS. (STJ, rel. Min.
Luis Felipe Salomão, 4ª T. – Dje 11 -5 -2013).
Dica: a desconsideração da personalidade jurídica não se confunde com a despersona-
lização da pessoa jurídica, esta atinge a validade do ato constitutivo, ao passo que a desconsi-
deração objetiva atinge o patrimônio dos sócios, tratando-se de um ato momentâneo.

2. Sociedade

Prof.ª Luciana Aranalde


@luciana_aranalde

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2.1. Sociedade simples


As sociedades simples, além de se constituírem no tipo pertinente a atividade societária
intelectual, também têm suas normas consideradas uma espécie de parte geral do Direito Soci-
etário, pois suas regras têm aplicação subsidiária à maioria das sociedades empresárias contra-
tuais. Nesse sentido, inclusive, as sociedades cooperativas são consideradas sociedades sim-
ples, conforme dispõe o parágrafo único do art. 982 do CC.
Reguladas nos artigos 997 a 1.038 do CC, as sociedades simples são constituídas por
meio de contrato.

2.1.1. Contrato social


2.1.2. Qualificação dos sócios
A qualificação dos sócios no contrato social está prevista no inciso I do art. 997 do CC.

Sócios pessoas naturais Sócios pessoas jurídicas

• Incapazes;
• Impedidos; • Holding.
• Pessoas casadas.

2.1.3. Qualificação das sociedades


Já quanto à qualificação das sociedades, está prevista no inciso II do art. 997 do CC.

Nome empresarial: Objeto social:

• Firma • Profissão intelectual / ativi-


• Denominação dade rural

Enunciado 213 da III Jornada de Direito Civil: O art. 997, inc. II, “não exclui a possibilidade
de sociedade simples utilizar firma ou razão social”.

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2.1.4. Capital social


Capital social é o montante correspondente à participação dos sócios na sociedade, de-
corrente de aportes dos sócios, consistentes na transferência de dinheiro, bens ou créditos para
a sociedade.
Segundo o inciso III do art. 997 do CC, o capital social deverá ser expresso em moeda
corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária.

Art. 1.059 do CC. Os sócios serão obrigados à reposição dos lucros e das quantias reti-
radas, a qualquer título, ainda que autorizados pelo contrato, quando tais lucros ou quantia
se distribuírem com prejuízo do capital.

Capital social = patrimônio inicial;


Patrimônio líquido > capital social > distribuir/reservar lucros.
O capital funciona como uma garantia dos credores, bem como é o que viabiliza a reali-
zação do objeto social e define as relações de poder dos sócios no controle da sociedade, da
mesma forma que define a responsabilidade de cada sócio.
Quanto ao valor do capital social, o debate sobre a necessidade ou não de haver um
capital social mínimo para constituição de uma determinada sociedade é antigo, havendo orde-
namentos jurídicos que fazem essa exigência. Existem diversos fundamentos acerca da exigên-
cia de um capital mínimo, como por exemplo: cumprimento das funções de garantia e produtivi-
dade. No Brasil não se exige capital social mínimo para a constituição de sociedades.
A exigência de adequação do capital social ao objeto social pode ser extraída de uma
interpretação do art. 173 da Lei n o 6.404/1976 (“a assembleia geral poderá deliberar a redução
do capital social se houver perda, até o montante dos prejuízos acumulados, ou se julgá-lo ex-
cessivo”) e art. 1.082, II, do CC (“pode a sociedade reduzir o capital, mediante a correspondente
modificação do contrato: [...] II – se excessivo em relação ao objeto da sociedade” (princípio da
congruência).
Subcapitalização formal: a sociedade possui um capital próprio ínfimo em relação à ati-
vidade que desenvolve, porque obtém recursos de terceiros (financiamentos, por exemplo).
Subcapitalização substancial: há uma clara desproporção entre o volume de negócios
de uma empresa e o seu capital social, sem que existam outras fontes de recursos para com-
pensar.

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Direito Empresarial

2.1.5. Subscrição do capital


No Direito brasileiro, exige-se a subscrição total do capital social no momento da consti-
tuição da sociedade, contudo, a integralização pode ser futura.
O ato de subscrição representa o comprometimento dos sócios de contribuir para a for-
mação do capital social, e é com base nele, em tese, que se estabelecem as respectivas partici-
pações societárias.

Art. 997 do CC. [...] IV – A quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la;
V – As prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços;

A integralização consiste na efetiva contribuição dos sócios para a formação do capital


social, podendo ser feita de diversas formas: com bens – móveis ou imóveis, materiais ou ima-
teriais –, dinheiro ou créditos. Na sociedade simples, admite-se até a contribuição em serviços
(Enunciado no 206 das Jornadas de Direito Civil).
Se o sócio integralizar sua quota com transferência de bens, estes devem ser suscetíveis
de avaliação pecuniária, além de o sócio responder pela evicção, isto é, caso a sociedade perca
esse bem posteriormente em razão de ele ser de outrem (art. 1.005, CC), o sócio que o havia
transferido terá que pagar a ela o seu valor. Já se integralizar sua quota com a transferência de
créditos de sua titularidade, responderá pela solvência do devedor, ou seja, caso os créditos
cedidos não sejam pagos pelos seus devedores, o sócio que os cedeu terá que pagá-los (art.
1.006, CC).

2.1.6. Administração da sociedade simples

Art. 997 do CC. [...] VI – as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade,


e seus poderes e atribuições;

Verifica-se que as sociedades simples (e isso vale também para as demais sociedades
contratuais) não podem ser administradas por pessoa jurídica, já que o dispositivo usa a
expressão pessoas naturais para se referir aos administradores.
Também não podem administrar a sociedade as pessoas mencionadas no art. 1.011, § 1o
do CC:
Não podem ser administradores, além das pessoas impedidas por lei especial, os conde-
nados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por
crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato; ou contra a eco-
nomia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra as normas de defesa da con-
corrência, contra as relações de consumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdu-
rarem os efeitos da condenação.

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Caso o contrato social não designe expressamente seus administradores, aplica-se o art.
1.013 do CC: “a administração da sociedade, nada dispondo o contrato social, compete separa-
damente a cada um dos sócios”. Dispõem seus parágrafos: § 1 o: “se a administração competir
separadamente a vários administradores, cada um pode impugnar operação pretendida por ou-
tro, cabendo a decisão aos sócios, por maioria de votos”; § 2 o: “responde por perdas e danos
perante a sociedade o administrador que realizar operações, sabendo ou devendo saber que
estava agindo em desacordo com a maioria”.
E, ainda, o art. 1.014 do CC, que prevê que: “nos atos de competência conjunta de vários
administradores, torna-se necessário o concurso de todos, salvo nos casos urgentes, em que a
omissão ou retardo das providências possa ocasionar dano irreparável ou grave”.
Nada impede que os sócios, embora não tenham designado o administrador no próprio
contrato social, façam-no em ato separado posteriormente. Nesse caso, deve-se atentar apenas
para a imprescindibilidade de averbação do ato no órgão de registro da sociedade, em obediên-
cia ao art. 1.012 do CC: “o administrador, nomeado por instrumento em separado, deve averbá-
lo à margem da inscrição da sociedade, e, pelos atos que praticar, antes de requerer a averba-
ção, responde pessoal e solidariamente com a sociedade”.
A diferença entre o administrador nomeado no contrato social e o administrador nomeado
em ato separado está no fato de que os poderes daquele, caso seja sócio, são, em tese, irrevo-
gáveis, salvo por decisão judicial que reconheça a ocorrência de justa causa para a revogação.
Já os poderes de administrador não sócio ou de administrador designado em ato separado, ainda
que sócio, são revogáveis a qualquer tempo pela vontade dos demais, conforme prevê o art.
1.019 do CC:
São irrevogáveis os poderes do sócio investido na administração por cláusula expressa
do contrato social, salvo justa causa, reconhecida judicialmente, a pedido de qualquer dos
sócios. Parágrafo único. São revogáveis, a qualquer tempo, os poderes conferidos a sócio
por ato separado, ou a quem não seja sócio.

Nota-se que sócio administrador contratualmente nomeado possui uma espécie de esta-
bilidade, podendo representar aos demais sócios um grave comprometimento de seus interes-
ses. Para afastar essa estabilidade, a nomeação dos administradores pode ser processada por
ato separado. Esse termo, para efeito de eficácia externa, deverá ser averbado à margem da
inscrição da sociedade. Importa mencionar que, ainda que nomeado administrador no próprio
contrato, o não sócio não está protegido contra a destituição.
A atividade do administrador é personalíssima, não podendo outrem exercer suas fun-
ções; o máximo permitido é a delegação de certas atividades a mandatários, nos termos do art.

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1.018 do CC: “ao administrador é vedado fazer-se substituir no exercício de suas funções, sendo-
lhe facultado, nos limites de seus poderes, constituir mandatários da sociedade, especificados
no instrumento os atos e operações que poderão praticar”.
Teoria orgânica: prevê o art. 1.022 do CC que “a sociedade adquire direitos, assume
obrigações e procede judicialmente por meio de administradores com poderes especiais, ou, não
os havendo, por intermédio de qualquer administrador”.
Os administradores são os representantes legais da sociedade. De acordo com a teoria
orgânica, o administrador não é tecnicamente representante, mas presentante (órgão integrante
da própria sociedade, que externa a sua vontade, ou seja, torna-a presente). Não obstante, o art.
1.011, § 2o, do CC dispõe que “aplicam-se à atividade dos administradores, no que couber, as
disposições concernentes ao mandato”.

2.1.7. Dever de diligência dos administradores


O administrador da sociedade deverá ter, no exercício de suas funções, o cuidado e a
diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios
negócios (art. 1.011, CC, art. 153 da Lei no 6.404/1976). Entende-se que esse dever de diligência
será atendido sempre que o administrador atuar em conformidade com os padrões de gestão
fixados pela ciência da administração de empresas. Para tanto, deve-se verificar se sua atuação
foi (i) independente, (ii) desinteressada, (iii) informada e (iv) no interesse da companhia (business
judgement rule).

2.1.8. Limitação de poderes dos administradores


Se houver lacuna no contrato social acerca dos poderes e atribuições dos seus adminis-
tradores, entende-se que estes podem praticar todos e quaisquer atos pertinentes à gestão da
sociedade, salvo oneração ou alienação de bens imóveis, o que só poderão fazer se tais atos
constituírem o próprio objeto social (art. 1.015, CC).
Caso o contrato social estabeleça expressamente os poderes e atribuições dos adminis-
tradores, é preciso analisar que efeitos para a sociedade produzirão os atos de gestão que ex-
trapolarem os limites estabelecidos.

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Direito Empresarial

2.1.9. Distribuição nos lucros e resultados


Da mesma forma que todos os sócios devem contribuir para a formação do capital social,
é também requisito especial de validade do contrato social a garantia de que todos eles partici-
pem dos resultados sociais (lucros ou prejuízos), cabendo-lhes disciplinar a matéria no ato
constitutivo.

2.1.10. Participação proporcional x participação desproporcional


O sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas quotas, mas
aquele cuja contribuição consiste em serviços somente participa dos lucros na proporção da
média do valor das quotas, salvo se os sócios dispuserem em contrário (art. 1007, CC). Portanto,
em tese, a participação dos sócios é proporcional às suas respectivas quotas, porém o contrato
social pode dispor de forma diversa, determinando uma participação desproporcional.

2.1.11. Cláusula leonina


Conforme art. 1.008 do CC “é nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio de
participar dos lucros e das perdas”, depreendendo-se, portanto, que é vedada a chamada “cláu-
sula leonina”.
Outrossim, a distribuição de lucros ilícitos ou fictícios acarreta responsabilidade solidá-
ria dos administradores que a realizarem e dos sócios que os receberem, conhecendo ou de-
vendo conhecer-lhes a ilegitimidade (art. 1.009, CC).

2.1.12. Responsabilidade dos sócios


Conforme já vimos, a pessoa jurídica não se confunde com seus sócios, administradores,
associados, instituidores (art. 49-A do CC).

2.1.13. Responsabilidades subsidiária dos sócios


A responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais, seja qual for o tipo societário, é
sempre subsidiária em relação à sociedade, nos termos do art. 1.024 do CC: “os bens particu-
lares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de execu-
tados os bens sociais”. Desta forma, enquanto a sociedade possuir bens, são esses bens que
devem responder por suas dívidas, garantindo-se aos sócios o benefício de ordem.

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Não havendo mais bens sociais a serem executados, a responsabilidade dos sócios pelas
dívidas sociais remanescentes será determinada pelo tipo societário escolhido: na sociedade em
nome coletivo, todos responderão de forma ilimitada e solidária (art. 1.039 do CC); na sociedade
em comandita simples, apenas os comanditados responderão de forma ilimitada e solidária (art.
1.045 do CC); e na sociedade limitada, nenhum sócio responderá, salvo se o capital não estiver
integralizado, caso em que todos responderão solidariamente pelo que faltar a integralizar (art.
1.052 do CC).
Em se tratando de sociedade simples “pura”, a responsabilidade, em princípio, é ilimitada,
mas não solidária, conforme previsão do art. 1.023 do CC: “se os bens da sociedade não lhe
cobrirem as dívidas, respondem os sócios pelo saldo, na proporção em que participem das per-
das sociais, salvo cláusula de responsabilidade solidária”.
Destaque-se, porém, que a parte final do dispositivo legal em questão ressalva a possibi-
lidade de pactuação de cláusula de responsabilidade solidária, tornando a responsabilidade
dos sócios da sociedade simples “pura”, nesse caso, igual à dos sócios de uma sociedade em
nome coletivo.
Essa cláusula de responsabilidade solidária é a prevista no art. 997, VIII, do CC, que
estabelece a possibilidade de o contrato social prever “se os sócios respondem, ou não, subsi-
diariamente, pelas obrigações sociais”.

2.1.14. Responsabilidade dos sócios na sociedade simples


No caso de omissão no contrato da sociedade simples propriamente dita contrato, valerão
as regras gerais dos arts. 1.023 e 1.024 do CC, ou seja, a responsabilidade dos sócios será
subsidiária em relação à sociedade (art. 1.024), mas ilimitada e proporcional entre eles (art.
1.023, 1ª parte). Porém, se pactuado expressamente, a responsabilidade dos sócios será subsi-
diária em relação à sociedade (art. 1.024), mas ilimitada e solidária entre eles (art. 1.023, parte
final).
Ainda sobre a responsabilidade dos sócios da sociedade simples, o Enunciado no 10 das
Jornadas de Direito Comercial diz o seguinte: “nas sociedades simples, os sócios podem limi-
tar suas responsabilidades entre si, à proporção da participação no capital social, ressalvadas
as disposições específicas”.

Art. 1.025 do CC. O sócio, admitido em sociedade já constituída, não se exime das dívidas
sociais anteriores à admissão.
Art. 1.032 do CC. A retirada, exclusão ou morte do sócio, não o exime, ou a seus herdei-
ros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada

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a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual
prazo, enquanto não se requerer a averbação.

Os ministros da 3ª turma do STJ reconheceram que o sócio que sai da sociedade res-
ponde por dívidas sociais até dois anos após sua saída, mas destacaram que essa responsabi-
lidade se refere a dívidas anteriores à sua saída, e não a dívidas posteriores no julgamento do
REsp 1.537.521/RJ (STJ, rel. Min. Ricardo Villas Boas Cueva – 3ª T. – DJe 5 -2 -2019).

Art. 1.026 do CC. O credor particular de sócio pode, na insuficiência de outros bens do
devedor, fazer recair a execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade, ou
na parte que lhe tocar em liquidação.
Parágrafo único. Se a sociedade não estiver dissolvida, pode o credor requerer a liquida-
ção da quota do devedor, cujo valor, apurado na forma do art. 1.031, será depositado em
dinheiro, no juízo da execução, até noventa dias após aquela liquidação.

Esse dispositivo admite a penhora de quotas para execução de dívida particular de sócio,
nesses casos, aplica-se a regra do art. 861 do CPC.

2.1.15. Deliberações sociais


Em princípio, compete aos administradores praticar os atos pertinentes à gestão dos ne-
gócios da sociedade, conforme o seu objeto social, contudo, quando se tratar de assuntos mais
relevantes, a decisão não cabe ao administrador, mas ao conjunto de sócios, ou seja, exige,
deliberação social prévia.
As matérias que dependem da deliberação dos sócios poderão ser expressas no contrato
social. Em alguns casos, porém, é a própria lei que o faz, como nas hipóteses de dissolução da
sociedade (art. 1.033, III, do CC) ou de exclusão do sócio remisso (art. 1.004, parágrafo único,
do CC).
Quanto ao quórum de deliberação dispõe o art. 1.010: “quando, por lei ou pelo contrato
social, competir aos sócios decidir sobre os negócios da sociedade, as deliberações serão toma-
das por maioria de votos, contados segundo o valor das quotas de cada um”.
A regra é que as deliberações sejam tomadas por maioria, mas a própria lei ou o contrato
social pode estabelecer quórum qualificado para certas matérias, como 2/3 (dois terços), ¾ (três
quartos) ou até mesmo unanimidade (o art. 999 do CC, por exemplo, exige unanimidade para
mudanças nas cláusulas obrigatórias do contrato social, descritas no art. 997).
Enunciado no 385 das Jornadas de Direito Civil: “a unanimidade exigida para a modifica-
ção do contrato social somente alcança as matérias referidas no art. 997, prevalecendo, nos

28
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demais casos de deliberação dos sócios, a maioria absoluta, se outra mais qualificada não for
prevista no contrato”.

Art. 1.010, § 2o, do CC. Prevalece a decisão sufragada por maior número de sócios no
caso de empate, e, se este persistir, decidirá o juiz.

A maioria absoluta não diz respeito ao número de sócios votantes, mas ao valor de suas
quotas. A aferição do número de sócios votantes será importante, entretanto, quando pelo valor
das quotas houver empate na votação. Nesse caso, prevalecerá a decisão que teve o apoio da
maior quantidade de sócios. No caso de empate também no número de sócios, a matéria deverá
ser levada ao Poder Judiciário. Lembrando que, conforme art. 1.101, § 3 o, responderá por perdas
e danos sócio que, tendo interesses contrários a sociedade, participar de deliberação que aprove
graças a seu voto.

2.1.16. Da morte, retirada ou exclusão do sócio

Art. 1.028 do CC. No caso de morte do sócio:


I – se o contrato dispuser diferentemente;
II – se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade;
III – se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido.

Assim consta no manual de registro da sociedade limitada:

4.4.3. Retirada nos casos de prazo determinado ou indeterminado. Além dos casos pre-
vistos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade: I – se de prazo
indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de ses-
senta dias, a contar da notificação do último sócio. Nesta hipótese, observar-se-á o se-
guinte: a) passado o prazo, deverá ser providenciado arquivamento da notificação, que
poderá ser por qualquer forma que ateste a cientificação dos sócios; b) a junta anotará no
cadastro da empresa a retirada do sócio; c) a sociedade deverá, na alteração contratual
seguinte, regularizar o quadro societário; e II – se de prazo determinado, provando judici-
almente justa causa.

Ainda, deve-se observar o que trata o art. 1.030 sobre a exclusão do sócio:

Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído
judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumpri-
mento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente.
Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou
aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.

Em resumo, quanto à exclusão do sócio, pode ser ordenada a seguinte orientação:

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
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a) o sócio remisso, por iniciativa da maioria dos demais sócios, poderá ser excluído
da sociedade, exclusão essa que se realizará de forma extrajudicial;
b) o sócio declarado falido ou civilmente insolvente, na forma das respectivas leis
de regência, bem como o sócio cuja quota for liquidada nos termos do parágrafo
único do art. 1.026 do Código, serão, de pleno direito, excluídos da sociedade, ex-
clusão essa que se dá, portanto, no plano extrajudicial;
c) o sócio que incorrer em falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou,
ainda, o sócio declarado incapaz por fato superveniente, poderão ser excluídos
por decisão da maioria dos demais sócios, mas a exclusão far-se-á judicialmente.

Nesses casos, observa-se quanto às quotas o que prevê o art. 1.031.


Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota,
considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em
contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em
balanço especialmente levantado.

§ 1o O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios supri-


rem o valor da quota.
§ 2o A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liqui-
dação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário.

Importante salientar ainda que, no que diz respeito à apuração de haveres, o ideal é que
esteja disciplinado no próprio contrato social, estabelecendo:
a) O critério de apuração dos haveres (art. 606, CPC).
b) A forma e prazo de pagamento dos haveres (art. 604, §§ 1 o a 3o, CPC).
c) Os direitos do sócio durante a apuração dos haveres (art. 608, parágrafo único,
CPC).

A respeito da dissolução da sociedade simples, importante lembrar que a Lei no


14.195/2021 alterou de forma significativa o art. 1.033 do CC, pois revogou seu parágrafo único,
viabilizando a sociedade unipessoal. Referido parágrafo previa um prazo de 180 dias para re-
composição do quadro societário na hipótese de saída de um sócio, o que, a partir da vigência
da Lei nº 14.195/2021 deixa de existir.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
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2.2. Sociedade limitada


2.2.1. Responsabilidade dos sócios
Na sociedade limitada, conforme previsto no art. 1.052 do CC, a responsabilidade de cada
sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização
do capital social.
a) Responsabilidade subsidiária: se a sociedade tiver bens, é a própria sociedade
quem responde pelas dívidas sociais (autonomia patrimonial da sociedade: arts.
49-A e 1.024 do CC).
b) Responsabilidade limitada: se a sociedade não tiver mais bens, e o capital social
estiver totalmente integralizado, os sócios não respondem com seus bens pessoais
pelas dívidas sociais.
c) Responsabilidade solidária: se a sociedade não tiver mais bens, e o capital social
não estiver totalmente integralizado, os sócios respondem com seus bens pessoais
pelas dívidas sociais, solidariamente, pelo que faltar para a integralização.
d) Responsabilidade direta: se houver abuso de personalidade jurídica, o(s) sócio(s)
que se beneficiou (aram) direta ou indiretamente do abuso responde(m) com seus
bens pessoais pelas dívidas sociais, independentemente de a sociedade ainda ter
bens (desconsideração da personalidade jurídica: art. 50 do CC).

2.2.2. Sociedade limitada unipessoal


Segundo o art. 1.052, § 1 o, do CC, a sociedade limitada pode ser constituída por uma
única pessoa.
Na limitada unipessoal não se exige capital mínimo, o sócio (mesmo sendo pessoa natu-
ral) pode constituir mais de uma limitada unipessoal e pode ser responsabilizado pelas dívidas
da sociedade não apenas em caso de fraude, mas em qualquer situação que permita a descon-
sideração da PJ.
Não se trata de um novo tipo societário.

2.2.3. Aplicação subsidiária das normas da sociedade anônima


A aplicação supletiva das normas da sociedade anônima (art. 1.053, parágrafo único, do
CC) à sociedade limitada será feita quando o contrato social previr e se tratar de matéria que os
sócios podem contratar.

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A regência supletiva não pode ser absoluta, somando-se ao texto da lei da sociedade
limitada todo o texto das normas das sociedades simples ou todo o texto da lei das sociedades
anônimas. Tal forma de regência encontra seus limites no critério de compatibilidade, enten-
dida esta como a necessidade de se respeitar as questões ligadas à natureza e às finalidades
econômicas e empresariais das sociedades, bem como de não lesar normas gerais e abstratas
não adstritas à vontade dos sócios.
Os limites de regência supletiva se aplicam tanto em relação à sociedade anônima como
em relação à sociedade simples.
Tratando-se de direitos disponíveis, reguláveis no contrato social por conta do contratua-
lismo da sociedade, as regras do contrato prevalecem em detrimento das normas de regên-
cia supletiva, ainda que, sobre a questão, o capítulo da sociedade limitada seja omisso.
A regência supletiva não deve implicar a transformação do tipo societário. Assim, a limi-
tada não deve transformar-se em subespécie de sociedade anônima ou subespécie de socie-
dade simples. Não pode ainda implicar a descaracterização, desnaturação, perda de flexibilidade
e adaptabilidade, que são as principais riquezas da sociedade limitada, juntamente com a res-
ponsabilidade limitada dos sócios.

2.2.4. Contrato social


Quanto ao contrato social, prevê o Art. 1.054 do CC que o contrato deverá mencionar, no
que couber, as indicações do art. 997, e, se for o caso, a firma social, quais sejam:

Art. 997 do CC. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público,
que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará:
I – nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas natu-
rais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas;
II – denominação, objeto, sede e prazo da sociedade;
III – capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer
espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária;
IV – a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la;
V – as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços;
VI – as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e
atribuições;
VII – a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas;
VIII – se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais.

Cláusulas obrigatórias:
• Qualificação dos sócios: sócio incapaz, sócio impedido e sócios casados.
• Qualificação da sociedade: nome empresarial, objeto, sede e prazo.
• Capital social: funções, diferença para o patrimônio e “subcapitalização”.

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• Subscrição e integralização das quotas: impossibilidade de contribuições em servi-


ços.
• Administração da sociedade: administrador não sócio e conselho de administração.
• Participação nos lucros e nas perdas: quotas preferenciais.

Art. 1.055 do CC. O capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, cabendo uma
ou diversas a cada sócio.
§ 1o Pela exata estimação de bens conferidos ao capital social respondem solidariamente
todos os sócios, até o prazo de cinco anos da data do registro da sociedade.
Art. 1.005 do CC. O sócio que, a título de quota social, transmitir domínio, posse ou uso,
responde pela evicção; e pela solvência do devedor, aquele que transferir crédito.

2.2.5. Integralização em bens ou créditos


a) Se o sócio integralizar sua quota com transferência de bens, estes devem ser sus-
cetíveis de avaliação pecuniária, além de o sócio responder pela evicção, isto é, caso a socie-
dade perca esse bem posteriormente em razão de ele ser de outrem, o sócio que o havia trans-
ferido terá que pagar a ela o seu valor (segundo doutrinadores, deveria o CC ter previsto também
a responsabilidade do sócio por eventuais vícios redibitórios da coisa).
b) Se o sócio integralizar sua quota com a transferência de créditos de sua titulari-
dade, responderá pela solvência do devedor, isto é, caso os créditos cedidos não sejam pagos
pelos seus devedores, o sócio que os cedeu terá que pagá-los.
c) Nas sociedades limitadas não é necessário laudo de avaliação dos bens usados
para integralização do capital social, e isso vale tanto para a constituição da sociedade quanto
para os casos de aumento do capital social.
d) A doutrina costuma destacar que os bens cedidos à sociedade a título de integralização
do capital social (i) devem estar relacionados ao objeto social, tendo utilidade direta ou indireta
para a atividade exercida pela sociedade, e (ii) devem ser aptos à execução por eventuais cre-
dores sociais, de modo que não seria permitido integralizar quotas com bens impenhoráveis.

2.2.6. Integralização em bens móveis

Art. 35, VII, ‘a’, da Lei no 8.934/1994: o contrato social deve conter “a descrição e identi-
ficação do imóvel, sua área, dados relativos à sua titulação, bem como o número da ma-
trícula no registro imobiliário”.

O arquivamento de contrato social com essa estipulação não é suficiente para transferir a
propriedade do imóvel do sócio para a sociedade. Deve-se observar o art. 64 da Lei no

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
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8.934/1994. Após fazer o arquivamento do contrato social, pega-se a certidão da Junta Comer-
cial para que ela seja levada a registro no cartório de imóveis, e é isso o que operará a transfe-
rência de titularidade do bem.

2.2.7. Contribuição em serviços


Nas sociedades limitadas, não se admite a contribuição em serviços (art. 1.055, § 2 o, do
CC).

2.2.8. Indivisibilidade das Quotas


No que diz respeito às quotas, importante ressaltar que são indivisíveis em relação à so-
ciedade, salvo para efeito de transferência, nos termos do art. 1.056 do CC. De acordo com o
§ 1o, em caso de condomínio de quota, os direitos a ela inerentes somente poderão ser exercidos
pelo condômino representante, ou pelo inventariante do espólio de sócio falecido. Além do mais,
dispõe o § 2o, também do art. 1.056, do CC, que: sem prejuízo do disposto no art. 1.052, os
condôminos de quota indivisa respondem solidariamente pelas prestações necessárias à sua
integralização.
O condomínio de quotas pode ser decorrente de ato inter vivos ou de sucessão causa
mortis. Nesse caso, a quota terá mais de um dono, mas, perante a sociedade, como ela é indivi-
sível, apenas um dos condôminos poderá exercer os direitos que ela confere, o condômino-sócio
(condômino escolhido ou inventariante).

2.2.9. Cessão de quotas


Já com relação à cessão de quotas, tem-se a partir da leitura do art. 1.002 do CC que o
sócio não poderá ser substituído no exercício das suas funções, sem que haja o consentimento
dos demais sócios, expressamente previsto em modificação do contrato social.
Dispõe o Art. 1.003 do CC que a cessão poderá ser total ou parcial de quota, entretanto,
não havendo a correspondente modificação do contrato social e o consentimento dos demais
sócios, não terá eficácia quanto a estes e à sociedade.
Ainda a respeito da cessão de quotas, deve se lembrar que, nos termos do art. 1.057 do
CC havendo omissão do contrato, o sócio pode ceder sua quota, total ou parcialmente, a quem
seja sócio, independentemente de audiência dos outros, ou a estranho, se não houver oposição
de titulares de mais de um quarto do capital social. O parágrafo único do referido artigo

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
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acrescenta que a cessão terá eficácia quanto à sociedade e terceiros, inclusive para os fins do
parágrafo único do art. 1.003, a partir da averbação do respectivo instrumento, subscrito pelos
sócios anuentes.

2.2.9.1. Contrato social


• Quotas transferíveis/intransferíveis;
• Transferência condicionada/incondicionada;
• Direito de preferência aos sócios;
• Silêncio.
a) Livre transferência entre sócios;
b) Transferência condicionada para estranhos.

2.2.9.2. IN 81 do DREI
Item 4.4.2 do Manual de Registro da Sociedade Limitada:

Na omissão do contrato social, a cessão de quotas de uma sociedade limitada pode ser
feita por instrumento de cessão de quotas, total ou parcialmente, averbado junto ao
registro da sociedade, com a devida repercussão no cadastro e independentemente de
alteração contratual (Enunciado no 225 das Jornadas de Direito Civil.

Notas:
I. A reunião ou assembleia de sócios pode ser suprida, se substituída pela expressa
anuência escrita, no instrumento de cessão ou em outro, de detentores de mais de setenta
e cinco por cento do capital social da limitada em questão.
II. Será obrigatória, na primeira alteração contratual que sobrevier após a averbação da
cessão, a consolidação do Contrato Social, com o novo quadro societário.

2.2.10. Responsabilidade do cedente e do cessionário de quotas


O sócio que cedeu suas quotas a outrem não fica automaticamente exonerado de even-
tuais obrigações perante terceiros e perante a própria sociedade. Art. 1.003, parágrafo único:
“Até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, responde o cedente solidariamente
com o cessionário, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio”.
O sócio que ingressou na sociedade, por sua vez, não ficará responsável apenas pelas
obrigações sociais posteriores, mas também pelas anteriores à sua entrada (art. 1.025, CC).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
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2.2.10.1. Sócio remisso


Ao sócio que está em mora quanto à integralização de suas quotas, nos termos do art.
1.004 do CC, dá-se o nome de sócio remisso, podendo os demais sócios, conforme previsto na
regra em comento, cobrar dele uma indenização por eventuais prejuízos que sua mora tenha
causado à sociedade.
Mas essa não é a única medida que os demais sócios podem tomar contra o remisso. Nos
termos do parágrafo único do art. 1.004, “verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios
preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já rea-
lizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1o do art. 1.031”.
Assim, o sócio remisso pode ter sua participação na sociedade reduzida ao número de
quotas que ele efetivamente já integralizou, ou ainda ser excluído da sociedade, por deliberação
da maioria restante (ou seja, a exclusão é extrajudicial, sem necessidade de ação judicial).
Tratando-se de sociedade limitada, há regra especial sobre o sócio remisso, prevista no
art. 1.058 do CC:
Não integralizada a quota de sócio remisso, os outros sócios podem, sem prejuízo do
disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, tomá-la para si ou transferi-la a terceiros,
excluindo o primitivo titular e devolvendo-lhe o que houver pago, deduzidos os juros da
mora, as prestações estabelecidas no contrato mais as despesas.

2.2.11. Administração
A administração da sociedade compete a uma ou mais pessoas, que serão designadas
no contrato social ou em ato separado. Pode, também, haver a criação de um conselho de ad-
ministração.
É importante lembrar que, conforme parágrafo único do art. 1.060 do CC, a administração
atribuída no contrato a todos os sócios não se estende de pleno direito aos que posteriormente
adquiram essa qualidade.
Em 2022 houve uma importante alteração do art. 1.061, do CC, por meio da Lei nº 14.451,
de 2022, que diz respeito ao quórum necessário para aprovação de designação de administrado-
res, conforme segue:

Art. 1.061. A designação de administradores não sócios dependerá da aprovação de, no


mínimo, 2/3 (dois terços) dos sócios, enquanto o capital não estiver integralizado, e da
aprovação de titulares de quotas correspondentes a mais da metade do capital social,
após a integralização.

Da mesma forma, houve alteração no que diz respeito à saída do sócio administrador,
conforme se depreende do art. 1.076, do CC.

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Direito Empresarial

Art. 1.076. Ressalvado o disposto no art. 1.061, as deliberações dos sócios serão toma-
das (Redação dada pela Lei nº 13.792, de 2019)
I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.451, de 2022) Vigência
II - pelos votos correspondentes a mais da metade do capital social, nos casos previstos
nos incisos II, III, IV, V, VI e VIII do caput do art. 1.071 deste Código; (Redação dada pela
Lei nº 14.451, de 2022) Vigência
III - pela maioria de votos dos presentes, nos demais casos previstos na lei ou no contrato,
se este não exigir maioria mais elevada.

Ou seja:

Deve ser
Capital não
aprovado por 2/3
integralizado
dos sócios
Administrador
não sócio
Capital
Maioria simples
integralizado
Administrador
Votos
Nomeado no
correspondentes
contrato
maioria simples
Administrador
sócio
Votos
Nomeado em
correspondentes
ato separado
maioria simples

Da saída do administrador:

Término do
Administrador

prazo
Saída do

Renúncia

Destituição

Já com relação ao art. 1.062, do CC, não houve qualquer alteração.

Art. 1.062 do CC. O administrador designado em ato separado investir-se-á no cargo me-
diante termo de posse no livro de atas da administração.
§ 1° Se o termo não for assinado nos trinta dias seguintes à designação, esta se tornará
sem efeito.
§ 2° Nos dez dias seguintes ao da investidura, deve o administrador requerer seja aver-
bada sua nomeação no registro competente, mencionando o seu nome, nacionalidade,

37
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estado civil, residência, com exibição de documento de identidade, o ato e a data da no-
meação e o prazo de gestão.

2.2.12. Conselho fiscal


O conselho fiscal é um órgão facultativo, podendo ser previsto no contrato social. É per-
mitido ser composto por três ou mais membros, sócios ou não, desde que residentes no país,
conforme art. 1.066 do CC: “Sem prejuízo dos poderes da assembleia dos sócios, pode o con-
trato instituir conselho fiscal composto de três ou mais membros e respectivos suplentes, sócios
ou não, residentes no País, eleitos na assembleia anual prevista no art. 1.078”.
Não podem figurar como membros do conselho, além daqueles elencados no § 1 o do art.
1.011, membros de outros órgãos da sociedade ou de outro órgão controlado por ela. Além dos
seus empregados ou dos respectivos administradores, cônjuges ou parentes dos administrado-
res até o terceiro grau, conforme disposto no § 1 o, do art. 1.066, do CC.

2.2.12.1. Deveres dos membros do conselho fiscal


De acordo com o art. 1.069 do CC, são deveres dos membros do conselho fiscal, além de
outros previstos em lei ou no contrato social:
• Examinar os livros e papéis da sociedade e o estado da caixa e da carteira;
• Denunciar os erros, fraudes ou crimes que descobrirem;
• Lavrar no livro de atas e pareceres os resultados dos exames dos livros e papéis
da sociedade;
• Convocar assembleia dos sócios se a diretoria retardar por mais de 30 dias sua
convocação natural ou em casos graves e urgentes;
• Praticar esses atos durante o período da liquidação da sociedade;
• Apresentar à assembleia anual dos sócios parecer sobre os negócios e operações
sociais do exercício que serviram.

2.2.13. Deliberação dos sócios


Depende da liberação dos sócios, de acordo com o art. 1.071 do CC: a aprovação das
contas da administração; a designação dos administradores, quando feita em ato separado; a
destituição dos administradores; o modo de sua remuneração, quando não estabelecido no con-
trato; a modificação do contrato social; a incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade, ou

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Direito Empresarial

a cessação do estado de liquidação; a nomeação e destituição dos liquidantes e o julgamento


das suas contas e o pedido de concordata.

2.2.14. Assembleia
Depreende-se do art. 1.078 do CC que a assembleia deverá ser realizada pelo menos
uma vez ao ano, nos quatro meses seguintes ao término do exercício social, tendo como objetivo:
• Tomar as contas dos administradores e deliberar sobre o balanço patrimonial e o
resultado econômico;
• Designar administradores, se for o caso;
• Tratar de qualquer outro assunto constante da ordem do dia.

2.2.15. Alteração da Lei no 14.195/2021


A Lei no 14.195/2021 trouxe em seu texto o art. 46. Através dele, as sociedades limitadas
passaram a ter o direito de emitir notas comerciais, que são as chamadas debêntures da limitada.
Essa alteração irá auxiliar as sociedades a capitalizar e conseguir recursos em um curto
prazo, com o objetivo de financiar operações e gerar capital de giro através da emissão de títulos
de dívidas, uma alternativa ao financiamento bancário.

2.3. Sociedade anônima


2.3.1. Legislação aplicável
No Brasil, as sociedades anônimas são regidas pela Lei no 6.404/1976 (LSA).

2.3.2. Características da sociedade anônima


• Natureza capitalista;
• Essência empresarial;
• Identificação por denominação;
• Limitação de responsabilidade dos acionistas.

2.3.2.1. Companhias abertas e fechadas


A companhia poderá ser aberta ou fechada conforme os valores mobiliários de sua emis-
são estejam ou não admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários, nos termos do
Art. 4o da Lei no 6.404/1976.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Nesse aspecto, dispõe os §§1º e 2º do mesmo artigo:

Art. 4º. [...]


§1o Somente os valores mobiliários de emissão de companhia registrada na Comissão de
Valores Mobiliários podem ser negociados no mercado de valores mobiliários.
§2o Nenhuma distribuição pública de valores mobiliários será efetivada no mercado sem
prévio registro na Comissão de Valores Mobiliários.

2.3.2.1.1. Abertura de capital


Pelo fato de possuir instrumentos/mecanismos de captação de recursos junto a inves-
tidores, a sociedade anônima – especialmente a de capital aberto, que pode emitir e negociar
valores mobiliários no mercado de capitais – é o tipo societário ideal para a exploração de gran-
des empreendimentos.
Em contrapartida, para dar um mínimo de segurança a essas operações no mercado de
capitais, o Estado exerce sobre a companhia aberta um maior controle, por meio da uma agên-
cia reguladora específica, que é a Comissão de Valores Imobiliários – CVM.

2.3.3. Comissão de Valores Imobiliários


A CVM é uma entidade autárquica federal de natureza especial, com qualidade de agência
reguladora (art. 5o da Lei no 6.385/1976).
A competência da CVM no controle e na fiscalização do mercado de capitais é exercida,
pode-se dizer, de três diferentes formas:
a) Regulamentar, uma vez que cabe à CVM estabelecer o regramento geral relativo
ao funcionamento do mercado de capitais, expedindo atos normativos para tanto;
b) Autorizante (registrária), uma vez que é a CVM que autoriza a constituição de
companhias abertas e a emissão e negociação de seus valores mobiliários;
c) Fiscalizatória, uma vez que a CVM deve zelar pela lisura das operações realiza-
das no mercado de capitais, sendo investida, para tanto, de poderes sancionató-
rios.

2.3.4. Mercado bancário X mercado de capitais


Mercado bancário: operações de crédito, em que a empresa assume a posição de deve-
dora e se compromete, não raro, a devolver os valores captados em curto espaço de tempo e a
taxas de juros altas.
Mercado de capitais: operações de investimento, em que os investidores não se tornam

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credores da companhia, mas sócios e partes interessadas no sucesso da empresa, pois é dele
que advirá o retorno do investimento feito por eles.

2.3.4.1. Mercado de capitais primário e secundário


No mercado de capitais primário, são realizadas as operações de subscrição e emissão
de ações e outros valores mobiliários das companhias. Por sua vez, o mercado de capitais se-
cundário compreende as operações de compra e venda desses valores.
Primário: operações de emissão e subscrição em que a sociedade anônima está colo-
cando no mercado de capitais um valor mobiliário novo, de modo que há uma relação entre a
própria companhia e o investidor, que pagará o preço de emissão.
Secundário: operações de compra e venda em que se negociam valores mobiliários já
existentes, de modo que há uma relação entre o titular do valor mobiliário e o seu novo “dono”,
que pagará o valor de mercado, o qual oscilará conforme o momento pelo qual passa a com-
panhia.

2.3.4.2. Bolsa de valores


Trata-se de entidades privadas (associações ou sociedades) formadas por sociedades
corretoras que, por meio de autorização da CVM, prestam serviço de interesse público inegável,
consistente na manutenção de local adequado à realização das operações de compra e venda
dos diversos valores mobiliários emitidos pelas companhias abertas.
A grande finalidade da bolsa de valores é dinamizar as operações do mercado de capi-
tais, ampliando o volume de negócios por meio da realização de pregão diário, em que os
agentes das diversas corretoras que a compõem, obedecendo às regras do mercado mobiliário,
se encontram e mantêm relações constantemente.
As bolas de valores realizam operações do mercado de capitais secundário (compra e
venda).

2.3.4.3. Mercado de balcão


O mercado de balcão compreende toda e qualquer operação do mercado de capitais rea-
lizada fora da bolsa de valores (não há um local físico específico).
Quem atua no mercado de balcão, portanto, são as sociedades corretoras, instituições
financeiras e agentes autônomos autorizados pela CVM.

41
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

No mercado de balcão se realizam operações tanto do mercado de capitais primário


(emissão e subscrição) quanto do mercado de capitais secundário (compra e venda), sendo
que neste caso a liquidez é bem menor do que na bolsa de valores.
Há que se distinguir ainda o simples mercado de balcão (mercado de balcão não organi-
zado), cujas operações são realizadas por sociedades corretoras, instituições financeiras e agen-
tes autônomos autorizados, e o mercado de balcão organizado (MBO), composto no Brasil
pela Sociedade Operadora do Mercado de Acesso (SOMA), companhia criada especialmente
com a finalidade de manter um sistema que viabilize as operações de compra e venda de valores
mobiliários, com seu registro e divulgação.

2.3.5. Constituição da sociedade anônima


Sendo a sociedade anônima uma sociedade institucional, e não contratual, ela se cons-
titui não por meio de um contrato social, mas de um ato institucional ou estatutário (estatuto
social).
Ausente a contratualidade, a constituição da sociedade anônima deve seguir uma série
de requisitos formais previstos na legislação acionária, que variam conforme ela seja aberta ou
fechada.
De acordo com o art. 80 da LSA:

Inciso I: exige-se a pluralidade de sócios, não sendo permitida a criação de sociedade


anônima unipessoal, com exceção da subsidiária integral (art. 251 da LSA).
Inciso II: exigência aplicável apenas aos casos de integralização em dinheiro e a prazo.
Ademais, há casos especiais em que se exige percentual maior (o art. 27 da Lei no
4.595/1964 prevê 50% para instituições financeiras.
Inciso III: pode ser em qualquer banco.

2.3.5.1. Contratação de underwriter


De acordo com o art. 82 da LSA, o fundador de uma companhia aberta deverá necessa-
riamente contratar os serviços de uma empresa especializada para constituí-la (underwriter). Ca-
berá a essa empresa colocar as ações junto aos investidores – etapa seguinte – e também cuidar
de uma série de documentos a serem apresentados à CVM, assinando-os.
Contratada a empresa, será apresentado o pedido de registro à CVM, instruído com es-
tudo de viabilidade econômica e financeira do empreendimento, projeto de estatuto social e
prospecto, organizado e assinado pelos fundadores e pela instituição financeira intermediária
(art. 82, § 1o, da LSA). A CVM também exige outros documentos.

42
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

2.3.5.2. Estudo de viabilidade, projeto de estatuto e prospecto


Com base nessa documentação apresentada – estudo, projeto e prospecto –, caberá à
CVM avaliar o empreendimento. Assim, conforme disposto no § 2o do mesmo art. 82 da LSA, “a
Comissão de Valores Mobiliários poderá condicionar o registro a modificações no estatuto ou no
prospecto e denegá-lo por inviabilidade ou temeridade do empreendimento, ou inidoneidade dos
fundadores”.
Caso a CVM aprove os documentos apresentados, com ou sem modificações, ela deferirá
o registro e terá início a segunda etapa desse procedimento constitutivo da companhia aberta,
por meio da colocação das ações junto aos investidores interessados, a fim de que estes possam
proceder à subscrição delas. Em suma, caberá à instituição financeira underwriter captar recur-
sos no mercado, atraindo investidores para o empreendimento a ser desenvolvido pela compa-
nhia.
Colocadas as ações à disposição dos investidores interessados pela empresa underwriter,
todo o capital social deve ser subscrito. Ocorrendo tal fato, passa-se à terceira etapa do pro-
cedimento, com a realização da assembleia de fundação.
Os serviços de underwriting podem ser por (i) melhor esforço, (ii) garantia de subscrição
parcial ou (iii) garantia de subscrição total.

2.3.5.3. Assembleia de fundação


Dispõe o art. 86 da LSA que “encerrada a subscrição e havendo sido subscrito todo o
capital social, os fundadores convocarão a assembléia geral que deverá: I – promover a avalia-
ção dos bens, se for o caso (art. 8o); II – deliberar sobre a constituição da companhia”.
O quórum de instalação dessa assembleia inicial de fundação está previsto no art. 87 da
LSA: “a assembleia de constituição instalar-se-á, em primeira convocação, com a presença de
subscritores que representem, no mínimo, metade do capital social, e, em segunda convocação,
com qualquer número”.
Para que se aprove a constituição da companhia aberta, basta que não haja oposição de
mais da metade do capital social, nos termos do § 3o do art. 87 da LSA, que assim dispõe: “veri-
ficando-se que foram observadas as formalidades legais e não havendo oposição de subscritores
que representem mais da metade do capital social, o presidente declarará constituída a compa-
nhia, procedendo-se, a seguir, à eleição dos administradores e fiscais”.

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2.3.5.4. Constituição por subscrição particular


Em se tratando de constituição de companhias fechadas, o procedimento é bem mais
simplificado, uma vez que é realizado por meio de subscrição particular, sem a captação de
recursos junto a investidores no mercado de capitais.
De acordo com o art. 88 da LSA, “a constituição da companhia por subscrição particular
do capital pode fazer-se por deliberação dos subscritores em assembleia geral ou por escritura
pública, considerando-se fundadores todos os subscritores”.
Vê-se, então, que podem ser adotadas duas modalidades de constituição: (i) a realiza-
ção de assembleia dos subscritores ou (ii) a lavratura de escritura pública em cartório.

2.3.5.5. Constituição por assembleia de fundação


Caso a opção adotada seja a realização de assembleia de fundação, ela deverá submeter-
se ao mesmo procedimento da assembleia de fundação da companhia aberta, analisado no tó-
pico antecedente. É o que determina o § 1o do art. 88 da LSA: “se a forma escolhida for a de
assembleia geral, observar-se-á o disposto nos arts. 86 e 87, devendo ser entregues à assem-
bleia o projeto do estatuto, assinado em duplicata por todos os subscritores do capital, e as listas
ou boletins de subscrição de todas as ações”.

2.3.5.6. Constituição por escritura pública


Caso, em contrapartida, a opção adotada seja a lavratura de escritura pública em cartório,
devem ser observadas as formalidades constantes do § 2o do art. 87 da LSA:

Preferida a escritura pública, será ela assinada por todos os subscritores, e conterá: a) a
qualificação dos subscritores, nos termos do art. 85; b) o estatuto da companhia; c) a re-
lação das ações tomadas pelos subscritores e a importância das entradas pagas; d) a
transcrição do recibo do depósito referido no número III do art. 80; e) a transcrição do
laudo de avaliação dos peritos, caso tenha havido subscrição do capital social em bens
(art. 8o); f) a nomeação dos primeiros administradores e, quando for o caso, dos fiscais.

Ultimadas as referidas providências, conforme o caso, passa-se à fase denominada pela


legislação acionária de formalidades complementares de constituição da companhia.

44
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2.3.6. Regras gerais sobre a subscrição das ações


Independentemente da modalidade de constituição da sociedade anônima, seja por subs-
crição pública ou por subscrição particular, a legislação do anonimato estabelece algumas regras
gerais aplicáveis aos procedimentos anteriormente analisados.
De acordo com o art. 89 da LSA, “a incorporação de imóveis para formação do capital
social não exige escritura pública”. De fato, pode ser que parte do capital social da companhia
seja formado por bens (sejam eles móveis ou imóveis), e a lei deixou claro que, mesmo tratando-
se de bens imóveis, é dispensável que a sua incorporação ao capital da sociedade seja feita
por meio de escritura pública.
O art. 91 da LSA determina que “nos atos e publicações referentes a companhia em
constituição, sua denominação deverá ser aditada da cláusula ‘em organização’”. Somente após
a sua efetiva constituição, com o posterior registro dos atos constitutivos na Junta Comercial,
poderá ser retirada a expressão “em organização” de sua denominação.
O art. 92 da LSA, por outro lado, regula as responsabilidades dos fundadores da compa-
nhia e da instituição financeira prestadora dos serviços de underwriting, dispondo que “os funda-
dores e as instituições financeiras que participarem da constituição por subscrição pública res-
ponderão, no âmbito das respectivas atribuições, pelos prejuízos resultantes da inobservância
de preceitos legais”.
Complementando essa regra do caput, estabelece o seu parágrafo único que “os funda-
dores responderão, solidariamente, pelo prejuízo decorrente de culpa ou dolo em atos ou opera-
ções anteriores à constituição”.
Isso mostra que a exigência de contratação de instituição financeira underwriter é impor-
tante para dar mais segurança aos investidores.

2.3.7. Formalidades complementares


Uma vez ultrapassadas todas as etapas analisadas anteriormente, passa-se à fase de
formalidades complementares da constituição da sociedade anônima, fase esta que compre-
ende, basicamente, os procedimentos de registro na Junta Comercial, além de outras peque-
nas medidas de cunho administrativo e operacional.
Com efeito, segundo o art. 94 da LSA, “nenhuma companhia poderá funcionar sem que
sejam arquivados e publicados seus atos constitutivos”.

45
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Afinal, conforme já estudamos, no Brasil a personalidade jurídica só se inicia com o res-


pectivo registro no órgão competente (art. 985 do CC), e esse registro deve ser prévio ao início
do exercício da atividade empresarial (art. 967 do CC).
Tratando-se de sociedade empresária, como é o caso da sociedade anônima, o órgão
registral competente é justamente a Junta Comercial do Estado em que se localizar a sede da
companhia.
Caso a constituição da companhia tenha ocorrido por meio da realização de assembleia
de fundação, a LSA determina o arquivamento de uma série de documentos, nos termos do seu
art. 95 (“um exemplar do estatuto social, assinado por todos os subscritores”, por exemplo).
Caso, entretanto, a companhia tenha sido constituída por meio da lavratura de escritura
pública em cartório, o que só pode ocorrer, frise-se, com as companhias fechadas, a LSA deter-
mina que basta o arquivamento da certidão expedida pelo cartório no qual foi lavrada a escritura.
É que dispõe o seu art. 96: “se a companhia tiver sido constituída por escritura pública, bastará
o arquivamento de certidão do instrumento”.
Na análise dos atos levados a registro, caberá à Junta Comercial, conforme determinação
do art. 97 da LSA, “examinar se as prescrições legais foram observadas na constituição da
companhia, bem como se no estatuto existem cláusulas contrárias à lei, à ordem pública e aos
bons costumes”.
Sendo negado o registro pela Junta, aplica-se a regra constante do parágrafo único do
dispositivo em questão:

Se o arquivamento for negado, por inobservância de prescrição ou exigência legal ou por


irregularidade verificada na constituição da companhia, os primeiros administradores de-
verão convocar imediatamente a assembleia geral para sanar a falta ou irregularidade, ou
autorizar as providências que se fizerem necessárias [...].

Deferido o arquivamento dos atos constitutivos da companhia pela Junta Comercial, de-
vem os administradores providenciar a publicação de tais atos na imprensa oficial de sua locali-
dade, nos termos do art. 98 da LSA: “arquivados os documentos relativos à constituição da
companhia, os seus administradores providenciarão, nos 30 (trinta) dias subsequentes, a publi-
cação deles, bem como a de certidão do arquivamento, em órgão oficial do local de sua sede”.
Cumpridas todas as formalidades anteriormente detalhadas, a sociedade anônima po-
derá, enfim, entrar em funcionamento. Assim, se a companhia começar a exercer suas atividades
antes de cumpridas as formalidades complementares ora em análise, será considerada irregular,
determinando, inclusive, o art. 99, parágrafo único, da LSA que “a companhia não responde

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pelos atos ou operações praticados pelos primeiros administradores antes de cumpridas as for-
malidades de constituição, mas a assembleia geral poderá deliberar em contrário”. Isso significa
que os atos e operações praticados pelos primeiros administradores antes de cumpridas as for-
malidades de constituição são de responsabilidade deles, e não da companhia, salvo se a as-
sembleia geral, por exemplo, ratificar tais atos.
Finalmente, caso sobrevenha algum prejuízo para a companhia em razão de atraso na
satisfação de todas essas exigências formais da lei, prevê o art. 99 da LSA que os primeiros
administradores devem responder perante a sociedade, podendo esta ingressar com ação de
reparação civil contra eles: “os primeiros administradores são solidariamente responsáveis pe-
rante a companhia pelos prejuízos causados pela demora no cumprimento das formalidades
complementares à sua constituição”.

2.3.8. Ações: conceito, classificação, voto e controle


A ação é o principal valor mobiliário que pode ser emitido por uma companhia. Com a
aquisição da ação alguém se torna sócio (nas SA são chamados de acionistas). Para fins legais.

Tipo de valor Previsão Observação


Com valor nominal art. 11 e 13 Divide-se o capital social pelo nú-
mero total de ações
Sem valor nominal art. 11 Sempre que a companhia emitir no-
vas ações com preço de emissão in-
ferior ao valor patrimonial das ações
já existentes, estas terão seu valor
patrimonial reduzido
Patrimonial - Leva em conta patrimônio líquido.
Divide-se o patrimônio líquido pelo
número de ações.1
Negociação - Feitas no mercado secundário. Alie-
nação livre pelos acionistas.
Podem ser de negociação privada
ou de mercado.
Econômico - Valuation.

Preço de emissão - Novas ações

Ainda, as ações são classificadas quanto aos direitos conferidos aos acionistas. Assim,
podem ser ordinárias, preferenciais ou de fruição, conforme art. 15 da LSA.

1
O patrimônio líquido da S/A é calculado pela diferença entre o seu ativo e seu passivo.

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As ações comuns são as ordinárias e segundo art. 110, cada ação ordinária corresponde
a um voto nas deliberações tomadas em assembleia geral.
Como mencionado no item 2.8.1, a Lei 14.195/2021 passou a disciplinar o voto plural
(artigo 110-A), e a principal mudança é a permissão para que as empresas emitam ações ordi-
nárias, com maior poder de voto. Na prática, a mudança permite que acionistas com uma parti-
cipação pequena no capital e no interesse econômico da companhia controlem os rumos da
empresa. O voto plural pode ter peso de até 10 votos.
Assim, uma empresa que tenha 100% do capital somente com ações ordinárias poderá
ter um controlador com 9,1% desses papéis especiais, considerando que cada "super ação ordi-
nária" tenha peso de 10 votos.
As ações preferenciais impõem vantagens ao seu titular. O art. 17 indica que podem
constituir: I - em prioridade na distribuição de dividendo, fixo ou mínimo; II - em prioridade no
reembolso do capital, com prêmio ou sem ele; ou III - na acumulação das preferências e vanta-
gens de que tratam os incisos I e II.
Assim, por força do art. 18, as ações preferenciais garantem certas vantagens políticas.
Isso porque, "o estatuto pode assegurar a uma ou mais classes de ações preferenciais o direito
de eleger, em votação em separado, um ou mais membros dos órgãos de administração".
Uma questão que merece todo cuidado é o tema que trata do direito de voto nas ações
preferenciais. A questão é relevante tendo em vista que o art. 1112 indica que "estatuto poderá
deixar de conferir às ações preferenciais algum ou alguns dos direitos reconhecidos às ações
ordinárias, inclusive o de voto, ou conferi-lo com restrições".
Uma das categorias das ações preferenciais é a chamada golden share3. Trata-se da
possibilidade de uma classe possuir direito de veto, por exemplo. O art. 17, da LSA, indica que
tais ações podem ser usadas por qualquer ente da União.
Por fim, em relação às ações de fruição, tem-se que estas estão praticamente em de-
suso. Sua previsão está no art. 44 que refere que "estatuto ou a assembleia-geral extraordinária

2
§ 1º As ações preferenciais sem direito de voto adquirirão o exercício desse direito se a companhia, pelo prazo
previsto no estatuto, não superior a 3 (três) exercícios consecutivos, deixar de pagar os dividendos fixos ou
mínimos a que fizerem jus, direito que conservarão até o pagamento, se tais dividendos não forem cumulativos,
ou até que sejam pagos os cumulativos em atraso.
§ 2º Na mesma hipótese e sob a mesma condição do § 1º, as ações preferenciais com direito de voto restrito terão
suspensas as limitações ao exercício desse direito.
§ 3º O estatuto poderá estipular que o disposto nos §§ 1º e 2º vigorará a partir do término da implantação do em-
preendimento inicial da companhia.
3
A Lei 8.031/1990 institui o Plano Nacional de Desestatização e previu que “sempre que houver razões que o
justifiquem, a União deterá, direta ou indiretamente, ações de classe especial do capital social de empresas privati-
zadas, que lhe confiram poder de veto em determinadas matérias".

48
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pode autorizar a aplicação de lucros ou reservas no resgate ou na amortização4 de ações,


determinando as condições e o modo de proceder-se à operação".
Não obstante, as ações ainda podem ser classificadas quanto à forma de transferência:
nominativas ou escriturais.
As ações nominativas presumem-se pela inscrição do nome do acionista no livro de "Re-
gistro de Ações Nominativas" ou pelo extrato que seja fornecido pela instituição custodiante,
na qualidade de proprietária fiduciária das ações. A transferência das ações nominativas opera-
se por termo lavrado no livro de "Transferência de Ações Nominativas", datado e assinado
pelo cedente e pelo cessionário, ou seus legítimos representantes (art. 31).
De outro lado, as ações escriturais estão previstas no art. 34, que indica que o estatuto
pode autorizar ou estabelecer que todas as ações da companhia, ou uma ou mais classes
delas, sejam mantidas em contas de depósito, em nome de seus titulares, na instituição que
designar, sem emissão de certificados.
Assim, a propriedade da ação escritural presume-se pelo registro na conta de depósito
das ações, aberta em nome do acionista nos livros da instituição depositária. A transferência da
ação escritural opera-se pelo lançamento efetuado pela instituição depositária em seus li-
vros, a débito da conta de ações do alienante e a crédito da conta de ações do adquirente, à
vista de ordem escrita do alienante, ou de autorização ou ordem judicial, em documento hábil
que ficará em poder da instituição.
No que diz respeito às ações, há que se ter em mente que existem direitos que recaem
sobre todas as ações: são os chamados direitos essenciais. Tais direitos não podem ser supri-
midos nem no estatuto e nem em assembleia. São eles:

Direito Previsão Observação


Preferência Art. 171 Sempre na proporção das ações que possuem. O
direito pode ser cedido. Prazo não inferior a 30 dias.
Exclusão direito de preferência Art. 172 O estatuto da companhia aberta que contiver auto-
rização para o aumento do capital pode prever a
emissão, sem direito de preferência para os anti-
gos acionistas, ou com redução do prazo de que
trata o § 4o do art. 171, de ações e debêntures con-
versíveis em ações, ou bônus de subscrição

4
A amortização consiste na distribuição aos acionistas, a título de antecipação e sem redução do capital social, de
quantias que lhes poderiam tocar em caso de liquidação da companhia. As ações integralmente amortizadas pode-
rão ser substituídas por ações de fruição, com as restrições fixadas pelo estatuto ou pela assembléia-geral que
deliberar a amortização; em qualquer caso, ocorrendo liquidação da companhia, as ações amortizadas só concor-
rerão ao acervo líquido depois de assegurado às ações não a amortizadas valor igual ao da amortização, corrigido
monetariamente.

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Direito Empresarial

Direito de retirada Art. 137 Não se pode excluir

Outros direitos, por sua vez, são não essenciais. É o caso do direito de voto. O pará-
grafo único do art. 125 refere que "os acionistas sem direito de voto podem comparecer à as-
sembleia-geral e discutir a matéria submetida à deliberação". Ou seja, o direito de voz é garantido
a todos, porém, o de voto somente aos que podem exercê-lo em razão da natureza das ações
que possuem.
A LSA é muito clara no que diz respeito às ações que estão com alguma restrição (penhor,
alienação fiduciária, ou gravadas com usufruto):

2.3.9. Ações com restrição

Art. 113, da LSA O penhor da ação não impede o acionista de exercer o direito de voto;
será lícito, todavia, estabelecer, no contrato, que o acionista não poderá, sem consenti-
mento do credor pignoratício, votar em certas deliberações.
Parágrafo único. O credor garantido por alienação fiduciária da ação não poderá exercer
o direito de voto; o devedor somente poderá exercê-lo nos termos do contrato.
Art. 114, da LSA O direito de voto da ação gravada com usufruto, se não for regulado no
ato de constituição do gravame, somente poderá ser exercido mediante prévio acordo en-
tre o proprietário e o usufrutuário.

O voto pode ser considerado abusivo ou conflitante. Será considerado abusivo quando
o voto é exercido com o fim de causar dano à companhia ou a outros acionistas, ou de obter,
para si ou para outrem, vantagem a que não faz jus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo
para a companhia ou para outros acionistas (Art. 115).
Por sua vez, o parágrafo único indica que

o acionista não poderá votar nas deliberações da assembleia-geral relativas ao laudo de


avaliação de bens com que concorrer para a formação do capital social e à aprovação de
suas contas como administrador, nem em quaisquer outras que puderem beneficiá-lo
de modo particular, ou em que tiver interesse conflitante com o da companhia.

O acionista, além de responder pelos danos causados, pode ter suspenso em assembleia
o exercício dos direitos de voto (art. 120). A forma que se dão os votos é muito importante para
a compreensão de uma companhia.
Dentro do âmbito do Direito de Voto ganha grande relevância a definição legal de um
acionista controlador.
Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pes-
soas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que:

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Direito Empresarial

a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria


dos votos nas deliberações da assembleia-geral e o poder de eleger a maioria dos
administradores da companhia; e
b) usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o funciona-
mento dos órgãos da companhia.

Ou seja, não basta ser titular de grande parte das ações (percentual do capital votante
que confere maioria na assembleia e possibilidade de eleição da maioria dos administradores),
mas sim é preciso identificar se esse controle é utilizado efetivamente.
Um sócio majoritário não é necessariamente um sócio controlador. O art. 117 impõe que
"o acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de po-
der56". Assim, podem existir votos que são vistos como votos de controle societário (exercido
pelos sócios) ou de controle empresarial (exercido pelos administradores).

5
Art. 117, § 1º São modalidades de exercício abusivo de poder:
a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levá-la a favorecer
outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no
acervo da companhia, ou da economia nacional;
b) promover a liquidação de companhia próspera, ou a transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia,
com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em prejuízo dos demais acionistas, dos que traba-
lham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia;
c) promover alteração estatutária, emissão de valores mobiliários ou adoção de políticas ou decisões que não te-
nham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas minoritários, aos que trabalham na
empresa ou aos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia;
d) eleger administrador ou fiscal que sabe inapto, moral ou tecnicamente;
e) induzir, ou tentar induzir, administrador ou fiscal a praticar ato ilegal, ou, descumprindo seus deveres definidos
nesta Lei e no estatuto, promover, contra o interesse da companhia, sua ratificação pela assembléia-geral;
f) contratar com a companhia, diretamente ou através de outrem, ou de sociedade na qual tenha interesse, em
condições de favorecimento ou não equitativas;
g) aprovar ou fazer aprovar contas irregulares de administradores, por favorecimento pessoal, ou deixar de apurar
denúncia que saiba ou devesse saber procedente, ou que justifique fundada suspeita de irregularidade.
h) subscrever ações, para os fins do disposto no art. 170, com a realização em bens estranhos ao objeto social da
companhia.
6
Art. 246. A sociedade controladora será obrigada a reparar os danos que causar à companhia por atos pratica-
dos com infração ao disposto nos Arts. 116 e 117.
§ 1º A ação para haver reparação cabe:
a) a acionistas que representem 5% (cinco por cento) ou mais do capital social;
b) a qualquer acionista, desde que preste caução pelas custas e honorários de advogado devidos no caso de vir a
ação ser julgada improcedente.
§ 2º A sociedade controladora, se condenada, além de reparar o dano e arcar com as custas, pagará honorários
de advogado de 20% (vinte por cento) e prêmio de 5% (cinco por cento) ao autor da ação, calculados sobre o va-
lor da indenização.

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Direito Empresarial

Administradores
Gerencial
detém o poder

Quando ações são


Minoritário pulverizadas (art. 125
da LSA)
Controle
empresarial

Totalitário Empresas familiares

Pode pelo acionista


que detém maioria
Majoritário
das ações (acionista
controlador)

Ainda, não impede que o voto se perfectibilize a partir de um controle de um acordo de


acionistas. Trata-se de uma modalidade de contrato parassocial.
O art. 118 traz a lista de acordos típicos: "os acordos de acionistas, sobre a compra e
venda de suas ações, preferência para adquiri-las, exercício do direito a voto, ou do poder
de controle deverão ser observados pela companhia quando arquivados na sua sede". Esses
asseguram tidos como direitos especiais, que vinculam a companhia.
Qualquer tema fora do art. 188 configura um acordo atípico, onde um descumprimento
gera apenas perdas e danos. Tais acordos somente podem ser opostos a terceiros depois de
averbados no livro de registro e nos certificados das ações, quando emitidos. Um fato de suma
importância é que as referidas ações averbadas não poderão ser negociadas em bolsa ou no
mercado de balcão.

2.4. Tipos menores e operações


2.4.1. Sociedade em nome coletivo
Conforme art. 1.039 do CC:
• Impossibilidade de sócio pessoa jurídica (sócio incapaz/impedido?);
• Responsabilidade ilimitada dos sócios;
• Uso de firma social (art. 1.156 do CC).

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A solidariedade se dá entre os sócios. Entre eles e a própria sociedade, porém, a relação


é de subsidiariedade.
Essa eventual limitação de responsabilidade só produz efeitos entre os sócios. Perante os
credores da sociedade, a responsabilidade dos sócios de uma sociedade em nome coletivo é
sempre ilimitada. Havendo, todavia, a previsão contratual de limitação de responsabilidade entre
eles, isso repercutirá apenas internamente, dando ensejo, por exemplo, ao direito de regresso
de um sócio contra outro.

2.4.2. Legislação aplicável


Conforme prevê o art. 1.040 do CC, a sociedade em nome coletivo se rege pelas normas
do Capítulo II (arts. 139 a 144), e no que for omisso, pelas regras do Capítulo antecedente, qual
seja, da sociedade simples. Além disso, esse tipo de sociedade deve mencionar no seu
contrato a firma social, além das indicações referidas no art. 997 (art. 1.041 do CC).
Contrato social: art. 997 do CC.

2.4.3. Administração da sociedade


Já com relação à administração da sociedade em nome coletivo, de acordo com o art.
1.042 do CC, compete exclusivamente a sócios, sendo o uso da firma, nos limites do contrato,
privativo dos que tenham os necessários poderes.

2.4.4. Penhora de cotas


No que diz respeito à penhora das quotas, dispõe o art. 1.043, do CC, o que segue:

Art. 1.043 do CC. O credor particular de sócio não pode, antes de dissolver-se a socie-
dade, pretender a liquidação da quota do devedor.
Parágrafo único. Poderá fazê-lo quando:
I – a sociedade houver sido prorrogada tacitamente;
II – tendo ocorrido prorrogação contratual, for acolhida judicialmente oposição do credor,
levantada no prazo de noventa dias, contado da publicação do ato dilatório.

Nesse caso, aplica-se subsidiariamente o caput do art. 1.026 (penhora de lucros).

2.4.5. Dissolução
A sociedade se dissolve de pleno direito por qualquer das causas enumeradas no art.
1.033 e, se empresária, também pela declaração da falência (art. 1.044 do CC.)

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

2.4.6. Sociedade em comandita simples


Comanditado: pessoa natural / responsabilidade ilimitada;
Comanditário: pessoa natural ou jurídica / responsabilidade limitada.
O regime jurídico do sócio comanditado é o mesmo do sócio da sociedade em nome co-
letivo, ou seja: (i) o comanditado tem que ser pessoa física, (ii) só o comanditado pode adminis-
trar a sociedade, (iii) só o nome do comanditado pode constar da firma social e (iv) a responsa-
bilidade do comanditado é ilimitada.

2.4.7. Sociedade em comandita por ações


Utiliza tanto a Lei das S.A.s (art. 280) quanto o CC (art. 1.090). Segundo a doutrina, a
sociedade em comandita por ações é uma sociedade empresária híbrida: tem aspectos de so-
ciedade em comandita e aspectos de sociedade anônima. Com efeito, a sociedade em coman-
dita por ações, assim como as sociedades anônimas, tem o seu capital dividido em ações; e,
assim como as sociedades em comandita simples, possui duas categorias distintas de só-
cios, uma com responsabilidade limitada e a outra com responsabilidade ilimitada.

2.4.7.1. Nome empresarial


O nome da sociedade deverá observar o disposto nos seguintes artigos:

Art. 281. A sociedade poderá comerciar sob firma ou razão social, da qual só farão parte
os nomes dos sócios-diretores ou gerentes. Ficam ilimitada e solidariamente responsá-
veis, nos termos desta Lei, pelas obrigações sociais, os que, por seus nomes, figurarem
na firma ou razão social.
Parágrafo único. A denominação ou a firma deve ser seguida das palavras “Comandita
por Ações”, por extenso ou abreviadamente.
Art. 1.157. A sociedade em que houver sócios de responsabilidade ilimitada operará sob
firma, na qual somente os nomes daqueles poderão figurar, bastando para formá-la aditar
ao nome de um deles a expressão “e companhia” ou sua abreviatura.
Parágrafo único. Ficam solidária e ilimitadamente responsáveis pelas obrigações contraí-
das sob a firma social aqueles que, por seus nomes, figurarem na firma da sociedade de
que trata este artigo.
Art. 1.161. A sociedade em comandita por ações pode, em lugar de firma, adotar denomi-
nação aditada da expressão “comandita por ações”, facultada a designação do objeto so-
cial.

2.4.7.2. Administração da sociedade


Quanto à administração dessa sociedade a Lei da Sociedade Anônima prevê o que segue:

Art. 282. Apenas o sócio ou acionista tem qualidade para administrar ou gerir a sociedade,
e, como diretor ou gerente, responde, subsidiária mas ilimitada e solidariamente, pelas
obrigações da sociedade.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

§ 1º Os diretores ou gerentes serão nomeados, sem limitação de tempo, no estatuto da


sociedade, e somente poderão ser destituídos por deliberação de acionistas que repre-
sentem 2/3 (dois terços), no mínimo, do capital social.
§ 2º O diretor ou gerente que for destituído ou se exonerar continuará responsável pelas
obrigações sociais contraídas sob sua administração.

O Código Civil não prevê diferente:

Art. 1.091 do CC. Somente o acionista tem qualidade para administrar a sociedade e,
como diretor, responde subsidiária e ilimitadamente pelas obrigações da sociedade.
§ 1º Se houver mais de um diretor, serão solidariamente responsáveis, depois de esgota-
dos os bens sociais.
§ 2º Os diretores serão nomeados no ato constitutivo da sociedade, sem limitação de
tempo, e somente poderão ser destituídos por deliberação de acionistas que representem
no mínimo dois terços do capital social.
§ 3º O diretor destituído ou exonerado continua, durante dois anos, responsável pelas
obrigações sociais contraídas sob sua administração.

2.4.7.3. Poderes da assembleia geral


Em função de os diretores não serem eleitos pela assembleia geral, mas simplesmente
nomeados no ato constitutivo, e de não terem mandato, a legislação lhes impõe regras severas
quanto à sua responsabilidade. Diante de tal fato, os poderes da assembleia geral são limitados,
não tendo ela competência para deliberar sobre certas matérias específicas que possam reper-
cutir na responsabilidade dos acionistas diretores.
Lei das S.A.s:

Art. 283. A assembleia geral não pode, sem o consentimento dos diretores ou gerentes,
mudar o objeto essencial da sociedade, prorrogar-lhe o prazo de duração, aumentar ou
diminuir o capital social, emitir debêntures ou criar partes beneficiárias nem aprovar a par-
ticipação em grupo de sociedade.
Art. 284. Não se aplica à sociedade em comandita por ações o disposto nesta Lei sobre
conselho de administração, autorização estatutária de aumento de capital e emissão de
bônus de subscrição.

Código Civil:

Art. 1.092 do CC. A assembleia geral não pode, sem o consentimento dos diretores, mu-
dar o objeto essencial da sociedade, prorrogar-lhe o prazo de duração, aumentar ou dimi-
nuir o capital social, criar debêntures, ou partes beneficiárias.

2.4.8. Cooperativas
2.4.8.1. Tratamento constitucional: criação livre

Art. 5°, XVIII, CF – a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas inde-


pendem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;

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Direito Empresarial

Os arts. 17 a 20 da Lei no 5.764/1971, que tratam da “autorização para funcionamento”


das cooperativas, não foram recepcionados pela CF/1988, que assegura a livre criação de soci-
edades cooperativas.

2.4.8.2. Natureza: sociedade simples


Enquanto a sociedade anônima é sempre uma sociedade empresária, pouco importando a
atividade que desempenha, a sociedade cooperativa é sempre uma sociedade simples (art. 982,
parágrafo único, do CC).

2.4.8.3. Registro: Junta Comercial


O registro compreende o arquivamento dos documentos relativos à constituição, altera-
ção, dissolução e extinção de firmas mercantis individuais, sociedades mercantis e cooperativas
(Lei no 8.934/1994, art. 32)
Apesar de a cooperativa ter a natureza de sociedade simples, ela não se registra no Car-
tório (art. 1.150 do CC), mas nas Junta Comercial (art. 32, II, a, da Lei no 8.934/1994).

2.4.8.4. Legislação aplicável: Lei no 5.764/1971


Conforme dispõe o art. 1.093 do CC, a sociedade cooperativa reger-se-á pelo disposto
no Capítulo VII, ressalvada a legislação especial. E no que a lei for omissa, aplicam-se as dis-
posições referentes à sociedade simples, resguardadas as características estabelecidas no art.
1.094, nos termos do art. 1.096 do CC.
A legislação especial das cooperativas é a Lei n o 5.764/1971.

2.4.8.5. Nome empresarial: denominação


A sociedade cooperativa funciona sob denominação integrada pelo vocábulo “coopera-
tiva” (art. 1.159 do CC), vedado o uso da expressão “Banco”, podendo adotar por objeto qualquer
gênero de serviço, operação ou atividade, assegurando-se lhes o direito exclusivo e exigindo-se
lhes a obrigação do uso da expressão “cooperativa” em sua denominação (art. 5° da Lei nº
5.764/1971).

2.4.8.6. Características da cooperativa


São características da sociedade cooperativa (art. 1.094 do CC):

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• Variabilidade, ou dispensa do capital social;


• Concurso de sócios em número mínimo necessário a compor a administração da
sociedade, sem limitação de número máximo;
• Limitação do valor da soma de quotas do capital social que cada sócio poderá to-
mar;
• Intransferibilidade das quotas do capital a terceiros estranhos à sociedade, ainda
que por herança;
• Quórum, para a assembleia geral funcionar e deliberar, fundado no número de só-
cios presentes à reunião, e não no capital social representado;
• Direito de cada sócio a um só voto nas deliberações, tenha ou não capital a socie-
dade, e qualquer que seja o valor de sua participação;
• Distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das operações efetuadas
pelo sócio com a sociedade, podendo ser atribuído juro fixo ao capital realizado;
• Indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda que em caso de dissolu-
ção da sociedade.

2.4.8.7. Responsabilidade dos sócios


Segundo o art. 1.095 do CC, na sociedade cooperativa, a responsabilidade dos sócios
pode ser limitada ou ilimitada:
• É limitada a responsabilidade na cooperativa em que o sócio responde somente
pelo valor de suas quotas e pelo prejuízo verificado nas operações sociais, guar-
dada a proporção de sua participação nas mesmas operações.
• É ilimitada a responsabilidade na cooperativa em que o sócio responde solidária e
ilimitadamente pelas obrigações sociais.
• Ainda que a responsabilidade dos sócios da sociedade cooperativa seja ilimitada,
ela não deixa de ser subsidiária em relação à sociedade (art. 1.024 do CC e art. 13
da Lei no 5.764/1971).

2.4.8.8. Administração
A cooperativa será administrada por uma Diretoria ou Conselho de Administração, com-
posto exclusivamente de associados eleitos pela Assembleia Geral, com mandato nunca

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superior a quatro anos, sendo obrigatória a renovação de, no mínimo, 1/3 do Conselho de Admi-
nistração.

2.4.8.9. Fundos
Fundos de reserva são destinados a reparar perdas e a atender ao desenvolvimento de
suas atividades, constituído com 10%, pelo menos, das sobras líquidas do exercício, já os Fun-
dos de Assistência Técnica, Educacional e Social são destinados à prestação de assistência aos
associados, seus familiares e, quando previsto nos estatutos, aos empregados da cooperativa;
constituído, pelo menos, das sobras líquidas apuradas no exercício.

2.4.8.10. Associados
O ingresso nas cooperativas é livre a todos que desejarem utilizar os serviços prestados
pela sociedade, desde que façam a adesão aos propósitos sociais e preencham as condições
estabelecidas no estatuto. A previsão legal está contida nos arts. 30 e 31, ambos da Lei no
5.764/1971.
Além disso, o órgão normativo respectivo pode restringir a admissão de associados às
pessoas que exerçam determinada atividade ou profissão, ou que estejam vinculadas a determi-
nada entidade.

2.4.8.11. Assembleia geral


É feita pelas pessoas que compõem a cooperativa e tem poderes para decidir os negócios
relativos ao objeto da sociedade e tomar resoluções convenientes ao desenvolvimento e defesa
desta. Ainda, suas deliberações vinculam a todos, mesmo que ausentes ou discordantes.

2.4.8.12. Dissolução e liquidação


A dissolução poderá ser feita de forma voluntária (art. 63 da Lei n o 5.764/1971) ou através
de medida judicial, a pedido de qualquer associado ou por iniciativa de órgão executivo federal.
Importante ressaltar que a dissolução da cooperativa importa no cancelamento de sua
autorização para funcionar e de seu registro.

Art. 63, Lei nº 5.764/1971. As sociedades cooperativas se dissolvem de pleno direito:


I – quando assim deliberar a Assembleia Geral, desde que os associados, totalizando o
número mínimo exigido por esta Lei, não se disponham a assegurar a sua continuidade;
II – pelo decurso do prazo de duração;
III – pela consecução dos objetivos predeterminados;

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IV – devido à alteração de sua forma jurídica;


V – pela redução do número mínimo de associados ou do capital social mínimo se, até a
Assembleia Geral subsequente, realizada em prazo não inferior a 6 (seis) meses, eles não
forem restabelecidos;
VI – pelo cancelamento da autorização para funcionar;
VII – pela paralisação de suas atividades por mais de 120 (cento e vinte) dias.

2.4.9. Sociedade em comum


A sociedade em comum está prevista nos arts. 986 a 990 do CC.
Prevê o art. 986, primeira parte, do referido Código que: “enquanto não inscritos os atos
constitutivos, reger-se-á a sociedade”, logo, infere-se que a sociedade, ainda que irregular, exis-
tirá de fato, porém não terá personalidade jurídica.
Na sociedade em comum, a responsabilidade dos sócios será solidária e ilimitada, de
forma ampla, sendo excluído do benefício de ordem aquele que contratou, nos termos do art.
990 do CC.

2.5. Operações societárias


A matéria está disciplinada tanto na Lei n o 6.404/1976 quanto no Código Civil. Assim, se
numa determinada operação societária há a participação de uma sociedade anônima, aplicam-
se as regras previstas na LSA, em razão da especialidade desse diploma legislativo. Todavia, se
a operação não conta com a participação de uma sociedade anônima, aplicam-se as regras do
CC.
Enunciado no 70 das Jornadas de Direito Civil: “As disposições sobre incorporação,
fusão e cisão previstas no CC não se aplicam às sociedades anônimas. As disposições da Lei
no 6.404/1976 sobre essa matéria aplicam-se, por analogia, às demais sociedades naquilo em
que o CC for omisso”.

2.5.1. Transformação
A transformação é operação pela qual a sociedade altera o seu tipo societário (por exem-
plo: uma sociedade limitada que passa a ser uma sociedade anônima). Não há mudança no
quadro societário, no patrimônio e nas obrigações. Não há que se falar em sucessão, e os bens
continuam sob mesma titularidade, sendo preciso apenas averbar no órgão de registro o novo
nome da sociedade.

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Direito Empresarial

Art. 1.113 do CC. O ato de transformação independe de dissolução ou liquidação da so-


ciedade, e obedecerá aos preceitos reguladores da constituição e inscrição próprios do
tipo em que vai converter-se.

Art. 220, da Lei das S/A. A transformação é a operação pela qual a sociedade passa,
independentemente de dissolução e liquidação, de um tipo para outro. Parágrafo único. A
transformação obedecerá aos preceitos que regulam a constituição e o registro do tipo a
ser adotado pela sociedade.

2.5.1.1. Transformação de sociedade cooperativa


O DREI não admitia a transformação de sociedades cooperativas em sociedades empre-
sárias, mas, a partir da IN no 81, o departamento alterou seu entendimento, e passou a permitir
expressamente.
O novo entendimento do departamento se deu em função das regras da Lei da Liberdade
Econômica (art. 3o, V e VII, e art. 4o, VII), bem como em razão da existência de decisões judiciais
que reconheciam às cooperativas o direito de se transformar (converter) em sociedades empre-
sárias:
O art. 63, IV, da Lei 5.764/1971 prevê que, em caso de transformação da forma jurídica,
ocorrerá, de pleno direito, a dissolução da sociedade cooperativa, dissolução esta com-
preendida como a resolução da função social para a qual foi criada a cooperativa
em decorrência da transformação do tipo de sociedade.

O art. 1.113 do CC de 2002 autoriza o ato de transformação societária independentemente


“de dissolução ou liquidação da sociedade”, resguardando, apenas, a observância dos “preceitos
reguladores da constituição e inscrição do tipo em que vai converter- se”, de modo que a trans-
formação do tipo societário simples (classificação das cooperativas) não impõe a necessidade
de liquidá-la, porque a pessoa jurídica é uma só, tanto antes como depois da operação, mudando
apenas o tipo (de cooperativa para limitada, na hipótese) (REsp no 1.528.304/ RS, rel. Min. Hum-
berto Martins, rel. p/ Acórdão: Humberto Martins, 2ª Turma, j. 20-8-2015, DJe 1- 9 -2015).

2.5.2. Conversão de associação civil


Conversão é a operação pela qual uma sociedade simples se converte em sociedade
empresária, passando do registro civil (Cartório) para o registro empresarial (Junta Comercial),
e vice-versa.
O DREI também não admitia a conversão de associações civis em sociedades empresá-
rias, mas, a partir da IN no 81, o departamento alterou seu entendimento, e passou a permitir
expressamente:

60
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Dessa forma, considerando a ausência de vedação legal e o disposto no art. 2.033 do CC


uma associação que tenha interesse em realizar a operação de conversão, deverá proce-
der aos mesmos trâmites que uma sociedade empresária realiza ou seja, inicialmente
aprovar, por unanimidade, em assembleia acerca do assunto, salvo se no estatuto social
constar previsão de quórum diferenciado, nos termos da legislação (item 103 da Nota Téc-
nica do DREI que embasou a IN no 81).

2.5.3. Incorporação
Na incorporação, não surgirá uma nova sociedade. Apenas a sociedade incorporada de-
saparecerá, e será sucedida pela sociedade incorporadora em todos os seus direitos e obriga-
ções (art. 1.116 do CC e art. 227 da LSA):

Art. 1.117. A deliberação dos sócios da sociedade incorporada deverá aprovar as bases
da operação e o projeto de reforma do ato constitutivo.
§ 1º A sociedade que houver de ser incorporada tomará conhecimento desse ato, e, se o
aprovar, autorizará os administradores a praticar o necessário à incorporação, inclusive a
subscrição em bens pelo valor da diferença que se verificar entre o ativo e o passivo.
§ 2º A deliberação dos sócios da sociedade incorporadora compreenderá a nomeação dos
peritos para a avaliação do patrimônio líquido da sociedade, que tenha de ser incorporada.

Art. 227. § 1º. A assembleia-geral da companhia incorporadora, se aprovar o protocolo da


operação, deverá autorizar o aumento de capital a ser subscrito e realizado pela incorpo-
rada mediante versão do seu patrimônio líquido, e nomear os peritos que o avaliarão.
§ 2º A sociedade que houver de ser incorporada, se aprovar o protocolo da operação,
autorizará seus administradores a praticarem os atos necessários à incorporação, inclu-
sive a subscrição do aumento de capital da incorporadora.

Art. 1.118. Aprovados os atos da incorporação, a incorporadora declarará extinta a incor-


porada, e promoverá a respectiva averbação no registro próprio.

Art. 227, § 3º. Aprovados pela assembleia geral da incorporadora o laudo de avaliação e
a incorporação, extingue-se a incorporada, competindo à primeira promover o arquiva-
mento e a publicação dos atos da incorporação.

2.5.3.1. Incorporação: extinção da incorporada


Como na incorporação não surge uma nova sociedade, apenas a sociedade incorporada
será extinta. A sociedade incorporadora continuará normalmente, mas com novo capital social
(em regra, há aumento de capital, mas ele pode continuar igual ou até mesmo sofrer diminuição,
porque o art. 70, parágrafo único, da IN no 81 do DREI prevê que “não há vedação para a incor-
poração de sociedade com o patrimônio líquido negativo”).

2.5.4. Fusão
A fusão determina a extinção das sociedades que se unem, para formar sociedade
nova, que a elas sucederá nos direitos e obrigações (art. 1.119 do CC e art. 228 da LSA). Ou

61
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

seja, ao contrário do que se dá na incorporação, ocorre a extinção de todas as sociedades en-


volvidas, com o surgimento de uma nova sociedade.
Na primeira etapa do procedimento, cada sociedade envolvida na operação realizará uma
assembleia geral, a qual deverá aprovar a fusão e nomear os peritos que avaliarão os patrimô-
nios das outras sociedades
Na segunda etapa do procedimento, haverá uma assembleia conjunta, na qual deverão
ser aprovados os respectivos laudos (obviamente, os sócios só votarão os laudos das outras
sociedades, e não o da sociedade da qual fazem parte) e a constituição definitiva da nova soci-
edade.
Como na fusão há a constituição de uma nova sociedade, ela deverá ser registrada na
Junta Comercial competente (art. 1.121 do CC e art. 228, § 3 o, da LSA).

2.5.5. Cisão
A cisão pode ser definida, sucintamente, como transferência de patrimônio de uma socie-
dade para outra. Se se transferem apenas alguns bens da sociedade cindida, há uma cisão
parcial. Por outro lado, havendo a transferência de todos os bens da sociedade cindida, há uma
cisão total, e nesse caso a sociedade cindida se extingue (art. 229 da LSA):

Art. 229. § 2o Na cisão com versão de parcela do patrimônio em sociedade nova, a ope-
ração será deliberada pela assembleia geral da companhia à vista de justificação que in-
cluirá as informações de que tratam os números do art. 224; a assembleia, se a aprovar,
nomeará os peritos que avaliarão a parcela do patrimônio a ser transferida, e funcionará
como assembleia de constituição da nova companhia.
§ 3o A cisão com versão de parcela de patrimônio em sociedade já existente obedecerá
às disposições sobre incorporação (art. 227).
§ 4o Efetivada a cisão com extinção da companhia cindida, caberá aos administradores
das sociedades que tiverem absorvido parcelas do seu patrimônio promover o arquiva-
mento e publicação dos atos da operação; na cisão com versão parcial do patrimônio,
esse dever caberá aos administradores da companhia cindida e da que absorver parcela
do seu patrimônio.
§ 5o As ações integralizadas com parcelas de patrimônio da companhia cindida serão atri-
buídas a seus titulares, em substituição às extintas, na proporção das que possuíam; a
atribuição em proporção diferente requer aprovação de todos os titulares, inclusive das
ações sem direito a voto.

3. Arbitragem e Procedimento Arbitral

Prof.ª Luciana Aranalde


@luciana_aranalde

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Direito Empresarial

3.1. Resolução adequada ou alternativa de conflitos (ADR)


A expressão métodos adequados de resolução de conflitos (ou ainda métodos alternativos
de solução de conflitos) corresponde à homônima em língua inglesa “alternative dispute reso-
lution” (ADR) e representa uma variedade de métodos de resolução de disputas distintos do
julgamento que se obtém ao final de um processo judicial conduzido pelo Estado.
São exemplos:
• Arbitragem;
• Mediação;
• Conciliação;
• Negociação.

Processo Ordinário

Heterocomposição:
decisão de um JEC
terceiro

Arbitragem

Métodos adequados
de resolução de Autocomposição:
conflitos solução consensual Negociação
entre parte

Conciliação
Autocomposição
Assistida:
partes chegam a um
consenso, com
auxílio de terceiro
Mediação

3.2. Arbitragem
Arbitragem é um método heterocompositivo e extrajudicial de solução de conflitos, por
meio do qual o terceiro imparcial (árbitro ou Tribunal Arbitral), escolhido pelas partes, profere
sentença para solucionar a controvérsia submetida à sua análise, nos limites fixados na conven-
ção de arbitragem.

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Direito Empresarial

3.2.1 Desenvolvimento da arbitragem no brasil


Em 2015, a Lei nº 13.129 alterou dispositivos da Lei nº 9.307 para aumentar o poder
das partes na escolha dos árbitros, permitir que as partes firmem adendos à convenção de arbi-
tragem, regular efeitos sobre a prescrição entre outros dispositivos.
Entretanto, a principal novidade trazida pela reforma da Lei da Arbitragem foi a admissão
de que os órgãos da Administração Pública Direta e Indireta possam fazer uso do procedimento
arbitral:
Art. 1º As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir lití-
gios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
§ 1º A administração pública direta e indireta poderá utilizar-se da arbitragem para dirimir
conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
§ 2º A autoridade ou o órgão competente da administração pública direta para a celebra-
ção de convenção de arbitragem é a mesma para a realização de acordos ou transações.

3.2.2. Convenção de arbitragem - (Lei 9.307/96)

Art. 3º As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral
mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o
compromisso arbitral.

• Cláusula compromissória;
• Compromisso arbitral.

A Convenção de arbitragem é gênero que se divide em duas espécies:


a) Cláusula compromissória: “convenção através da qual as partes em um contrato
comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, rela-
tivamente a tal contrato.” (art. 4º, da Lei 9.307/76).
b) Compromisso arbitral: convenção através da qual as partes submetem um litígio
à arbitragem de uma ou mais pessoas, podem ser judicial ou extrajudicial. (art. 9º,
da Lei 9.307/76).

Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um con-


trato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, re-
lativamente a tal contrato.
§ 1º A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no
próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira.
§ 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente
tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua insti-
tuição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou
visto especialmente para essa cláusula.
Art. 9º O compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um
litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

§ 1º O compromisso arbitral judicial celebrar-se-á por termo nos autos, perante o juízo ou
tribunal, onde tem curso a demanda.
§ 2º O compromisso arbitral extrajudicial será celebrado por escrito particular, assinado
por duas testemunhas, ou por instrumento público.
Art. 10. Constará, obrigatoriamente, do compromisso arbitral:
I - o nome, profissão, estado civil e domicílio das partes;
II - o nome, profissão e domicílio do árbitro, ou dos árbitros, ou, se for o caso, a identifica-
ção da entidade à qual as partes delegaram a indicação de árbitros;
III - a matéria que será objeto da arbitragem; e
IV - o lugar em que será proferida a sentença arbitral.

Cláusula compromissória: divide-se em duas categorias.


1. Cláusula compromissória cheia: definição prévia das questões relacionadas à insti-
tuição e ao procedimento arbitral, contendo os requisitos mínimos para instauração do pro-
cedimento arbitral, como, por exemplo, a forma de indicação dos árbitros, fazendo desne-
cessário o compromisso arbitral. As partes podem pactuar as regras, podem delegá-las aos ár-
bitros ou podem ainda delegar ao regulamento de uma instituição arbitral já existente. (art. 5º,
da Lei 9.307/96).
2. Cláusula compromissória vazia (ou em branco): as partes apenas definem a sub-
missão do contrato a arbitragem, sem definir ou detalhar a instituição e as características do
procedimento arbitral. Assim, surgido o conflito, será necessário o compromisso arbitral para
preencher as lacunas da cláusula compromissória.

3.2.3. Espécies de arbitragem


Arbitragem institucional: as regas procedimentais encontram-se previamente definidas
por determinada câmara arbitral. Nesse caso, as partes escolhem uma entidade especializada
(instituição arbitral) para conduzir o procedimento arbitral.
Arbitragem ad hoc (ou arbitragem avulsa): as partes definem o procedimento arbitral
e, em caso de lacuna ou dúvida, os árbitros decidirão.

3.2.4. Efeitos da convenção arbitral


A convenção de arbitragem tem um duplo caráter ou efeito:
• Positivo: obriga as partes a se submeterem ao juízo arbitral; deriva do princípio
contratual do pacta sunt servanda (os contratos vinculam as partes).
• A convenção arbitral é capaz de execução específica, tendo em vista que, se a
sanção pelo descumprimento de uma convenção arbitral fosse meramente indeni-
zatória, a arbitragem não estaria atingindo o seu objetivo principal.

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• A LBA, nesse sentido, adotou, em seu art. 7.º, um mecanismo próprio para permitir
a execução específica da cláusula compromissória quando houver resistência de
uma das partes em instaurar o procedimento, por meio de sua instauração judicial.
• Negativo: derroga a jurisdição estatal, submetendo as partes à jurisdição dos árbi-
tros.

3.2.5. Processo e procedimento


• Processo pode ser entendido como a via pela qual o Estado realiza a jurisdição,
em face do exercício do direito de ação. O processo seria o conjunto dos atos
dirigidos para cumprir uma finalidade: aplicação da norma, solução de um conflito.
• Procedimento é a forma como o processo se exterioriza e se materializa no mundo
jurídico.
• Lembrando que não é só o Estado que exerce a função jurisdicional, mas também
o árbitro ou o tribunal arbitral, por meio de um método adequado de resolução de
conflitos.

Três momentos do procedimento:


• Instauração da arbitragem;
• Organização da arbitragem;
• Desenvolvimento da arbitragem.

3.2.6. Instauração da arbitragem


Etapa preliminar: é a provocação da outra parte sobre o conflito, com o intuito de instau-
rar a arbitragem, e a tomada de providências para indicação e nomeação do árbitro quando for
o caso. Tem seu êxito na aceitação do árbitro indicado ou nomeado.
Alegações iniciais: o reclamante apresenta, detalhadamente, a fundamentação perti-
nente à sustentação de seus alegados direitos e específica os respectivos pedidos.
Atos processuais: as manifestações das partes são escritas, acompanhadas de docu-
mentos, sem exigências formais ou burocráticas. Admite-se, ainda, quando convencionado ou
regulado pela entidade, o peticionamento eletrônico, mantendo virtual todo o procedimento.
Intimações e comunicações: normalmente são feitas por envio de carta registrada ao
escritório do advogado ou através de entrega pessoal. As decisões interlocutórias do árbitro são

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designadas, geralmente, por ordem processual. Raramente são feitos despachos de expediente,
visto que o procedimento tende a correr de forma espontânea.

3.2.7. Procedimento arbitral

Art. 19. Considera-se instituída a arbitragem quando aceita a nomeação pelo árbitro,
se for único, ou por todos, se forem vários.
§ 1o Instituída a arbitragem e entendendo o árbitro ou o tribunal arbitral que há necessi-
dade de explicitar questão disposta na convenção de arbitragem, será elaborado, junta-
mente com as partes, adendo firmado por todos, que passará a fazer parte integrante
da convenção de arbitragem.

Atenção: a recusa de assinatura na “ata de missão” estipulada no artigo acima mencio-


nado não significa que a arbitragem não poderá se desenvolver.

3.2.8. Liberdade para determinar as regras


• Convenção arbitral definirá o procedimento adotado respeitando os limites do art.
21 § 2º da L.A.
• Judicialização do procedimento arbitral – arts. 190 e 191 (calendarização procedi-
mental) do CPC.
• CPC de 2015 aproveitou o conceito de liberdade procedimental da arbitragem.

3.2.9. Princípios

Princípio do contraditório
e da ampla defesa: arts. 5º,
LV da CF e 21, §2º da LBA

Princípio da igualdade:
art. 5º, caput e inciso I da
Princípios impositivos CF
(devem ser observados,
sob pena de nulidade do
procedimento arbitral)
Livre convencimento

Imparcialidade e
independência Jurídica
dos árbitros: art. 5º,
XXXVII e LIII da CF

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Direito Empresarial

1. Contraditório - o contraditório consiste no direito que as partes têm de serem in-


formadas a respeito dos atos processuais e de poderem se manifestar a respeito.
Esse princípio abrange a ampla defesa, que representa a possibilidade dos litigan-
tes de produzirem provas necessárias à sua defesa.
Em obediência a esses princípios, o árbitro deve, necessariamente, garantir que as
partes tenham ciência dos pontos relevantes no processo e que tenham a oportu-
nidade de se manifestar.
2. Igualdade das partes - através da informação dos atos praticados por uma parte
é que a outra poderá reagir. Importante ressaltar que o que se protege é a oportu-
nidade de manifestação, não havendo afronta ao contraditório se, sabendo de seu
direito, o contendor se mantiver inerte. Deve haver cautela na comunicação dos
atos processuais, ainda que seja da forma estipulada pelas partes ou pela entidade
arbitral, permitindo que os litigantes possam influir nas decisões que serão toma-
das.
3. Imparcialidade - é dever do árbitro tratar de maneira igualitária as partes, sendo
imparcial e conferindo-lhes as mesmas oportunidades.
4. Livre convencimento - corresponde à liberdade que o árbitro possui de apreciar e
avaliar as provas existentes no processo para constituir livremente a sua convicção.
Sendo a fundamentação obrigatória na sentença arbitral, o livre convencimento
deve sempre ser motivado (art. 26 da LBA).
5. Autonomia da vontade - as partes também podem indicar os árbitros; o local da
arbitragem; se optam por arbitragem institucional ou ad hoc; podem escolher as
regras de direito a serem aplicadas; se a arbitragem será de direito ou de equidade;
e o procedimento a ser aplicado. Nada as impede, também, de alterar aquilo que
pactuaram, com mútuo consentimento.
6. Participação de Advogados - não é obrigatória a participação de advogados no
procedimento arbitral (art. 21, §3º, LA). Sendo assim, a ausência do advogado na
audiência não prejudica a realização do ato.

Art. 21, § 3º. As partes poderão postular por intermédio de advogado, respeitada, sempre,
a faculdade de designar quem as represente ou assista no procedimento arbitral.

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Entretanto, pelo princípio da igualdade entre os litigantes, se um dos reclamantes se


faz representar por advogado, o árbitro deve abrir prazo para que o outro, se quiser, igualmente
nomeie procurador.

3.2.10. Interrupção da prescrição

Art. 19, LA. Considera-se instituída a arbitragem quando aceita a nomeação pelo árbitro,
se for único, ou por todos, se forem vários.
§ 1o Instituída a arbitragem e entendendo o árbitro ou o tribunal arbitral que há neces-
sidade de explicitar questão disposta na convenção de arbitragem, será elaborado, junta-
mente com as partes, adendo firmado por todos, que passará a fazer parte integrante da
convenção de arbitragem.
§ 2o A instituição da arbitragem interrompe a prescrição, retroagindo à data do requeri-
mento de sua instauração, ainda que extinta a arbitragem por ausência de jurisdição.

3.2.11. Competência-competência
Oriundo do direito alemão, o princípio da “competência-competência” está contido no pa-
rágrafo único do art. 8º, da LA: “Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes,
as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato
que contenha a cláusula compromissória”.

Já em momento posterior, a matéria pode ser submetida à apreciação do juízo estatal,


no caso de uma das partes ajuizar ação visando a anulação da sentença arbitral por invalidade
da convenção. Art. 32, da LA: “É nula a sentença arbitral se: I – for nula a convenção de arbi-
tragem.”

3.2.12. Sentença arbitral


A sentença que põe fim ao procedimento arbitral é definitiva e, a princípio, não é sujeita a
recursos. É considerada um título executivo.

Art. 18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a
recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário.
Art. 31. A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos
da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui
título executivo.

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4. Contratos Empresariais

Prof.ª Luciana Aranalde


@luciana_aranalde

4.1. Visão geral dos contratos


Viver em sociedade demanda a realização de negócios entre pessoas. Para a consecução
desse objetivo é que surgiu o contrato, escrito ou verbal. Com isso, o contrato é uma avença
entre duas ou mais pessoas físicas ou jurídicas para, entre si, regularem e solucionarem uma
relação que os envolva, tornando-se uma das fontes mais comuns, se não a mais comum, de
obrigações.
O CC brasileiro disciplina a matéria de contratos na sua Parte Especial, Livro I, sendo que
no Título V trata “Dos Contratos em Geral” e no Título VI, das “Das Várias Espécies de Contra-
tos”.
Sendo um negócio jurídico, o contrato deve preencher todos os requisitos estabelecidos
no art. 104 do CC: agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma
prescrita ou não defesa em lei.
A vontade da parte é essencial para a configuração de um contrato, e será mitigada em
maior ou menor grau a depender do momento histórico das sociedades, bem como da espécie
contratual que se analisa. A massificação própria de determinados negócios modificou o papel
do elemento volitivo na formação do contrato. Na visão de Fabio Ulhoa Coelho (in Curso de
direito civil: Contratos), na atualidade vigora a distinção entre o contrato firmado pelos “iguais” e
o contrato firmado entre “desiguais”, prestigiando-se a vontade das partes naquele e protegendo-
se o economicamente mais fraco neste, mediante normas de aplicação cogente e regras de in-
terpretação dos pactos que buscam o equilíbrio entre os envolvidos.
Os princípios tradicionais que orientaram a formação da teoria clássica dos contratos (au-
tonomia privada, força obrigatória e relatividade) foram, ao longo dos anos, flexibilizados em
decorrência do crescimento da importância de novos princípios, tais como a boa-fé objetiva, fun-
ção social do contrato, reequilíbrio econômico-financeiro do contrato e identificação da função
econômica do contrato.
O CC de 2002 nos apresenta as normas básicas que regem os contratos, sejam eles civis
ou empresariais. Os vetores fundamentais a serem observados estão ali: liberdade negocial,
função social do contrato, boa-fé objetiva, probidade, lealdade, eticidade e assim por diante.

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O estatuto material revogou grande parte do Código Comercial de 1850, circunstância que
deixou as relações empresariais sem um conjunto normativo próprio. Todavia, não foi apresen-
tada uma seção específica para tratar dessas relevantes relações, mesmo que nem todas as
regras obrigacionais civis sejam monoliticamente aplicadas ao Direito Empresarial e exista auto-
nomia entre ambas.
Importante sinalar que o Código Civil foi parcialmente alterado pela Lei n o 13.874/2019,
chamada de “Lei da Liberdade Econômica”, a qual promoveu importantes mudanças, em boa
parte aplicáveis aos contratos empresariais.

Art. 421 do CC. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do
contrato.
Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da
intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.
Art. 421-A do CC. Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e
simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa
presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, garantido
também que:
I – as partes negociantes poderão estabelecer parâmetros objetivos para a
interpretação das cláusulas negociais e de seus pressupostos de revisão ou de
resolução;
II – a alocação de riscos definida pelas partes deve ser respeitada e observada; e
III – a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada.

Ao fim, há que se destacar a existência de diversos diplomas legais na legislação extra-


vagante tratando de forma mais detalhada de várias espécies de contratos estritamente empre-
sariais, como, por exemplo, contrato de franquia e contrato de leasing.

4.1.1. Classificação dos contratos


Os contratos podem ser classificados de várias formas. As classificações mais comuns
são:
1. Dever obrigacional: a) unilaterais, quando apenas um dos contratantes tem obri-
gações a cumprir (comodato); e b) bilaterais, se todos os contratantes têm obriga-
ção a cumprir (compra e venda);
2. Vantagem econômica: a) onerosos, quando a regular execução do contrato im-
plica vantagem econômica para todos (compra e venda); ou b) gratuitos, quando
uma das partes não aufere vantagem econômica imediata;
3. Os contratos onerosos: podem ser subdivididos em a) comutativos, quando todas
as partes envolvidas auferem vantagem econômica, e b) aleatórios, quando apenas

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

um dos contratantes terá vantagem econômica, não podendo saber, antecipada-


mente, qual deles será, em face do risco de sorte ou de azar;
4. Constituição: são divididos em a) consensuais, para cuja constituição é suficiente
o encontro de vontades, b) formais (ou solenes), em que o aperfeiçoamento do
negócio depende de num instrumento escrito, e os c) reais, que se constituem ape-
nas com a tradição da coisa;
5. Forma de execução: a) instantâneos, quando a obrigação da parte corresponde a
um só ato, e b) contínuos, quando pelo menos um dos contratantes cumpre a obri-
gação com uma sucessão de atos;
6. Tipicidade: os contratos podem ser a) típicos, que possuem formalidades, direitos
e obrigações disciplinados na lei, por normas cogentes ou supletivas, não se esgo-
tando nas previsões contratuais definidas pelas partes, os b) atípicos, que são re-
gidos exclusivamente pelo convencionado no contrato, dentro dos limites legais, e
os c) mistos, que se situam na transição entre os típicos e atípicos, ou seja, as
partes criam um negócio contratual não tipificado em lei com o aproveitamento de
normas de um ou mais contratos típicos;
7. Liberdade de contratação: a) voluntários, nos quais as partes têm alternativa de
não contratar, e b) necessários, nos quais não existe a opção de não contratar, pelo
menos para uma das partes, como o contrato de seguro DPVAT;
8. Ramo jurídico: a) administrativo, no qual uma das partes será a pessoa jurídica
de direito público, com a primazia, portanto, do interesse público; b) de trabalho,
caracterizado quando houver entre duas pessoas privadas a relação de prestação
de serviços pessoais, subordinados, não eventuais e mediante remuneração; c) de
relação de consumo, formalizados entre consumidor e fornecedor, nos moldes de-
finidos pelos arts. 3o e 5o do CDC; d) comercial ou empresarial, quando as duas
partes são empresários; e) civil, pacto em que nenhum dos contratantes é pessoa
jurídica de direito público, empregado, consumidor ou empresário.

4.2. Contrato empresarial e direito contratual


O cotidiano da vida empresarial deixa evidente a importância de se estabelecerem negó-
cios com terceiros como meio de viabilizar a atividade econômica, voltada para a satisfação de
alguma necessidade do mercado. Há que se reconhecer, dessarte, a essencialidade da relação
contratual para a própria prática mercantil.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Assim, a atividade econômica desempenhada pela empresa resulta na celebração de di-


versos contratos com variados regimes jurídicos – poderão ser trabalhistas, administrativos, co-
merciais e até mesmo, excepcionalmente, de consumo. São inúmeros contratos bancários; de
aquisição de insumos para sua atividade de produção, comércio ou prestação de serviços; de
contratação de empregados, prestadores autônomos ou empresas terceirizadas; participação
em licitações, e assim por diante. Em suma, as atividades econômicas de uma empresa irão
demandar algum tipo de avença.
Havendo necessidade de interpretação ou intervenção externa para a readequação (judi-
cial ou privada mediante arbitragem ou negociação direta), será preciso considerar as especifi-
cidades desta relação, o contexto de sua formação e execução, observando a necessidade de
assegurar aos agentes econômicos segurança e previsibilidade nas contratações e o respeito ao
direito concorrencial para evitar indesejável intervenção na liberdade própria da competitividade
inerente ao capitalismo. São todos indicativos fundamentais para o bom desempenho das ativi-
dades econômicas. Do contrário, existe a possibilidade de efetivo prejuízo para a economia de
mercado, pois o risco da atividade e a busca do lucro são partes integrantes da relação comercial.

4.3. Peculiaridades dos contratos empresariais


Como já referido, as normas gerais dos pactos empresariais estão estampadas no CC de
2002. Todavia, existem certas singularidades que precisam ser observadas para a correta com-
preensão e interpretação dessa relação contratual. É o que nos ensina Paula Forgioni (Teoria
Geral dos Contratos Empresariais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 29):

A atenção do comercialista recai necessariamente sobre os contratos interempresariais,


ou seja, aqueles celebrados entre empresas, i.e., em que somente empresas fazem parte
da relação. Ao assim proceder, identificamos os contratos empresariais com aqueles em
que ambos (ou todos) os polos da relação têm a sua atividade movida pela busca do lucro.
É preciso reconhecer: esse fato imprime viés totalmente peculiar aos negócios jurídicos
entre empresários. Entretanto, adotar esse método de análise da realidade do mercado
descortina visão jurídica pouco usual entre nós, porquanto: (i) Considera como objeto do
direito comercial apenas os contratos celebrados entre empresas (contratos interempre-
sariais, i.e., aqueles em que os partícipes têm sua atuação plasmada pela procura do lu-
cro); e (ii) Coloca em relevo a necessidade do esboço da teoria geral que leve em consi-
deração as peculiaridades dos contratos interempresariais no contexto do mercado (i.e.,
que considere a empresa na teia contratual em que se insere e que ajuda a construir).

Nos contratos empresariais existe, como pressuposto, a ideia de equiparação entre os


empresários-partes, os quais estarão, em tese, em condições semelhantes de conhecimento
técnico e profissionalismo para definirem seus interesses, resultando em maior autonomia da

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

vontade, ainda que não se despreze a potencial assimetria de informações ou de poder econô-
mico entre os envolvidos.
Na eventualidade de ser necessária uma readequação da avença, algo possível e even-
tualmente recomendável, a linha interpretativa não pode ser a mesma adotada nas legisla-
ções trabalhista, consumerista e mesmo a puramente civilista – afinal, como já afirmado,
apesar da revogação parcial do Código Comercial, o Direito Empresarial manteve sua auto-
nomia.
Oportuno, nesse momento, definir o exato alcance da legislação consumerista na relação
contratual da qual participem empresas. Como ensina a reiterada jurisprudência do Superior Tri-
bunal de Justiça (aqui representada pelo REsp n o 1599042 / SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão,
rel. p/ Acórdão: Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 14-3-2017, DJe 9-5-2017):

consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza, como destinatá-
rio final, produto ou serviço oriundo de um fornecedor. Por sua vez, destinatário final,
segundo a teoria subjetiva ou finalista, adotada pela Segunda Seção desta Corte Superior,
é aquele que última a atividade econômica, ou seja, que retira de circulação do mercado
o bem ou o serviço para consumi-lo, suprindo uma necessidade ou satisfação própria, não
havendo, portanto, a reutilização ou o reingresso dele no processo produtivo. Logo,
a relação de consumo (consumidor final) não pode ser confundida com relação de insumo
(consumidor intermediário).

A partir dessa lição, percebemos que eventualmente o empresário será tratado como con-
sumidor, titular das garantias e normas protetivas do CDC. Normalmente atuará como “insumi-
dor”, e assim as regras aplicáveis serão as do próprio pacto, sob o pálio das regras gerais do
Código Civil e da Constituição Federal.
Postas tais premissas, percebe-se que o dirigismo contratual praticado pelo atual ordena-
mento jurídico (capitaneado pelos princípios da função social do contrato – art. 421 – e da probi-
dade e boa-fé – art. 422 – ambos do CC) atua de forma singular nas relações empresariais pelo
potencial efeito em toda a cadeia produtiva e econômica e o risco de irradiação dos efeitos inter-
ventivos para o mercado, tão sensível a quaisquer alterações não previstas ou precificadas. Jus-
tamente para definir melhor essa questão foi publicada a Lei no 13.874/2019, com as mudanças
já destacadas.
Se existe a importante função social do contrato, não se pode olvidar também a função
social da empresa como um dos pilares do Direito Empresarial.
De um lado, a necessidade de um sistema contratual socialmente justo, no qual os eco-
nomicamente mais frágeis ficam protegidos contra obrigações excessivamente onerosas; de ou-
tro, um importante princípio e vetor para o exercício da atividade econômica, tendo em vista que

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

o seu sentido advém da articulação entre os diversos princípios da ordem econômica constituci-
onal. Mais do que mera regra interpretativa e integrativa, a função social da empresa apresenta
abstenções e deveres positivos que orientam a atividade empresarial, de maneira a contemplar,
além dos interesses dos sócios, os interesses dos diversos sujeitos envolvidos, como é o caso
dos trabalhadores, dos consumidores, dos concorrentes, do poder público e da própria socie-
dade, compatibilizando os diversos interesses envolvidos na atividade econômica ao mesmo
tempo em que se busca a preservação da empresa e da atividade lucrativa.
No mesmo passo, percebe-se que as teorias da imprevisão e da onerosidade excessiva
(art. 478 do CC) não podem ser aplicadas indistintamente aos contratos empresariais, pois, como
anteriormente afirmado, uma certa dose de risco é seu elemento essencial.
O tratamento especial a incidir sobre os contratos empresariais também se justifica em
virtude do ambiente dinâmico e específico no qual estão inseridos. As regras comerciais miram
a rapidez de transações, e a otimização das ações e do ambiente econômico requerem uma
ampla margem de negociação dos contratos legalmente previstos, bem como demandam a
atipicidade contratual, possibilidade conferida às partes para a criação de contratos não pre-
vistos na legislação, amparados na expertise dos envolvidos e que visam atender necessida-
des de seus empreendimentos.
Os contratos atípicos não dispõem de regramentos próprios e estão expressamente con-
sagrados pelo art. 425 do CC. “é lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as nor-
mas gerais fixadas neste Código”.
Nesse tocante, leciona Paula Forgioni (Teoria Geral dos Contratos Empresariais. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 65):

As partes, quando negociam e contratam, não tomam confortavelmente assento diante de


um código e escolhem, entre fórmulas pré-existentes [i.e., tipificadas], aquela que mais
lhes apraz. Os contratos empresariais nascem da prática dos comerciantes e raramente
de tipos normativos preconcebidos por autoridades exógenas ao mercado.

Tratando-se de contrato atípico, a criação e interpretação devem ser fundadas nas regras
ordinárias aplicáveis aos contratos em geral e nos demais preceitos legais criados para situações
semelhantes. Haverá maior prevalência, claro, do princípio da força obrigatória dos contratos
(pacta sunt servanda), notadamente por se tratar de relação empresarial, admitindo-se a inge-
rência externa nas obrigações livremente pactuadas entre as partes somente em situações ex-
cepcionais.

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Direito Empresarial

A esse respeito, oportuno ressaltar as considerações lançadas pelo Ministro Paulo de


Tarso Sanseverino, quando do julgamento do REsp n o 1.158.815 /RJ, rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, rel. p/ Acórdão: Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, j. 15-9-2011, DJe 7-
2-2012:
[... ] Neste contexto, visando à promoção destes fins, admite o Direito brasileiro, expres-
samente, a revisão contratual, diante da alteração superveniente das circunstâncias que
deram origem ao negócio jurídico (teoria da imprevisão, teoria da base objetiva etc.). Nada
obstante, a par de não se ter reconhecido, no caso dos autos, qualquer destas alterações,
não previstas, aliás, no Código de 1916, a intervenção do Estado no campo do Direito
Privado, mais precisamente no plano do Direito Empresarial – em que se situa a relação
jurídica estabelecida entre a recorrente e as recorridas –, deve ser mínima, em respeito à
vontade manifestada de forma efetivamente livre pelas partes. Neste sentido, Fábio Ulhoa
Coelho (O futuro do direito comercial. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 166) chega a reconhe-
cer a vigência, neste campo do direito, do princípio da “plena vinculação dos contratantes
ao contrato”, ou seja uma força obrigatória dos efeitos do contrato (pacta sunt servanda)
em grau superior ao do Direito Civil, cujo afastamento somente poderia ocorrer em hipó-
teses excepcionais. Efetivamente, no Direito Empresarial, regido por princípios peculiares,
como a liberdade de iniciativa, a liberdade de concorrência e a função social da empresa,
a presença do princípio da autonomia privada é mais saliente do que em outros setores
do Direito Privado. Naturalmente, mesmo no Direito Empresarial, pode haver a necessi-
dade de mitigação do princípio da autonomia privada, especialmente quando houver desi-
gualdade material entre as empresas contratantes.

Ao interpretar a relação contratual empresarial, não podemos esquecer:


• Presumível equiparação entre as partes;
• Maior autonomia da vontade (pacta sunt servanda);
• Risco da atividade e busca do lucro integram a relação;
• Função social do contrato X função social da empresa;
• Possibilidade de formação de contratos atípicos.

4.4. Enunciados das Jornadas de Direito Comercial do Conselho da Jus-


tiça Federal
Cumpre, então, destacar algumas importantes conclusões da I Jornada de Direito Comer-
cial do Conselho da Justiça Federal (CJF) indicadas nos enunciados a seguir e que bem resu-
mem as especificidades da relação contratual empresarial:

20. Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor aos contratos celebrados entre em-
presários em que um dos contratantes tenha por objetivo suprir-se de insumos para sua
atividade de produção, comércio ou prestação de serviços.
21. Nos contratos empresariais, o dirigismo contratual deve ser mitigado, tendo em vista a
simetria natural das relações interempresariais.
23. Em contratos empresariais, é lícito às partes contratantes estabelecer parâmetros ob-
jetivos para a interpretação dos requisitos de revisão e/ou resolução do pacto contratual.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

25. A revisão do contrato por onerosidade excessiva fundada no CC deve levar em conta
a natureza do objeto do contrato. Nas relações empresariais, deve-se presumir a sofisti-
cação dos contratantes e observar a alocação de riscos por eles acordada.
26. O contrato empresarial cumpre sua função social quando não acarreta prejuízo a di-
reitos ou interesses, difusos ou coletivos, de titularidade de sujeitos não participantes da
relação negocial.
27. Não se presume violação à boa-fé objetiva se o empresário, durante as negociações
do contrato empresarial, preservar segredo de empresa ou administrar a prestação de
informações reservadas, confidenciais ou estratégicas, com o objetivo de não colocar em
risco a competitividade de sua atividade.
28. Em razão do profissionalismo com que os empresários devem exercer sua atividade,
os contratos empresariais não podem ser anulados pelo vício da lesão fundada na inex-
periência.
29. Aplicam-se aos negócios jurídicos entre empresários a função social do contrato e a
boa-fé objetiva (arts. 421 e 422 do CC), em conformidade com as especificidades dos
contratos empresariais.

4.5. Compra e venda mercantil


É a modalidade mais importante dos contratos empresariais, com enorme aplicação no
cotidiano das empresas. É consensual, bilateral, oneroso e comutativo e sem maiores formalida-
des para sua concretização, salvo hipóteses apontadas na legislação (como bens imóveis).
O parcialmente revogado Código Comercial de 1850 estabelecia três requisitos para que
o contrato fosse considerado mercantil: subjetivo (qualidade das partes), objetivo (somente
bens móveis ou semoventes) e finalístico (destinação obrigatória da mercadoria). Só seria co-
mercial a compra e venda que o comerciante realizasse no exercício de sua profissão, em con-
sonância com a teoria dos atos de comércio.
Já o CC de 2002, que afastou a teoria dos atos de comércio para fixar o conceito de teoria
jurídica de empresa, estabeleceu como requisito único para a compra e venda mercantil a
condição de empresário para ambos os contratantes. Assim, toda compra e venda em que
comprador e vendedor são empresários é considerada mercantil, não se questionando o tipo de
objeto e tampouco a destinação do insumo:

Art. 481, CC. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir
o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.

Em havendo a utilização do objeto como destinatário final, retirando-o do circuito econô-


mico, poderemos ter uma relação de consumo, regulada pelo Código de Defesa do Consumidor,
como já esclarecido anteriormente (REsp n o 1.599.042 /SP).
Existe grande liberdade para sua perfectibilização, que se dá quando as partes chegam
ao consenso sobre três elementos: preço, forma de pagamento e objeto do contrato (art. 482
do CC). Este pode se constituir em grande quantidade de mercadorias, e então o contrato será

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compra e venda em atacado, ou poucas unidades de uma mesma mercadoria, quando então
teremos uma avença varejista.

4.5.1. Situações especiais da compra e venda mercantil


a) Pacto de retrovenda: previsto nos arts. 505 a 508 do CC.
Trata-se de cláusula acessória que funciona como cláusula resolutiva expressa de desfa-
zimento do negócio. Assegura ao vendedor o direito de recomprar o bem vendido no prazo má-
ximo decadencial de três anos após a venda, mediante reembolso do principal, mais as despesas
do comprador. O direito pode ser exercido inclusive contra terceiro comprador (CC, art. 507).
b) Venda a contento e sujeita a prova: previstas nos arts. 509 a 512 do CC.
Conhecida também como cláusula ad gustum, é adjeta ao contrato de compra e venda e
suspende sua eficácia até que o comprador manifeste, em determinado prazo, o seu agrado
com o produto entregue pelo vendedor. Enquanto não apresenta sua manifestação de vontade,
o comprador é considerado comodatário dos bens.
Podemos encontrar contratos de compra e venda submetidos às condições suspensivas
de a) degustação; b) peso, medida e contagem; c) experimentação; d) exame.
Já a compra e venda sob amostra (CC, art. 484) caracteriza-se pela manifestação de
vontade positiva do comprador a partir do exame de uma amostra do produto. Houve prévia
avaliação favorável, mas o contrato somente se aperfeiçoa com a constatação de que o produto
entregue possui as mesmas características da amostra previamente apresentada pelo vendedor,
configurando também uma condição suspensiva para o aperfeiçoamento do contrato.
c) Preempção ou preferência: prevista nos arts. 513 a 520 do CC.
Assegura ao vendedor o chamado direito de prelação. Caso o comprador queira vender
um bem que adquiriu a terceiros, estará obrigado pela cláusula contratual a oferecer o bem ao
primitivo vendedor, que, se pagar o mesmo valor oferecido pelo terceiro (e demais termos e
condições), terá preferência para a aquisição.
O prazo para exercer o direito é de no máximo 180 dias se a coisa for móvel e de dois
anos se imóvel. Na ausência de estipulação contratual, presumir-se-á como sendo três dias para
bem móvel e 60 dias para bem imóvel.
d) Compra e venda com reserva de domínio: contratos nos quais a forma de pagamento
for parcelada podem apresentar cláusula de reserva de domínio, pela qual a posse direta do bem
alienado e os riscos da conservação são transferidos para o comprador desde o início da vigência

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do contrato, mas o domínio (portanto, a propriedade) somente será transferida após o pagamento
da última parcela, conforme os arts. 521 a 528 do CC.

Art. 521 do CC. Na venda de coisa móvel, pode o vendedor reservar para si a propriedade,
até que o preço esteja integralmente pago. [...]
Art. 522 do CC. A cláusula de reserva de domínio será estipulada por escrito e depende
de registro no domicílio do comprador para valer contra terceiros.
Art. 524 do CC. A transferência de propriedade ao comprador dá-se no momento em que
o preço esteja integralmente pago. Todavia, pelos riscos da coisa responde o comprador,
a partir de quando lhe foi entregue.

A venda com reserva de domínio restringe-se aos bens móveis e exige forma escrita,
pois, se não houver previsão expressa da reserva de domínio, aplicar-se-á a regra geral de que
a propriedade do bem móvel transfere-se com a tradição.
e) Venda sobre documentos: prevista nos arts. 529 a 532 do CC.
A tradição da coisa é substituída pela entrega de seu título representativo e de outros
documentos exigidos pelo contrato ou, no silêncio deste, pelos usos.
O pagamento, em regra, será feito na data e local da entrega dos documentos, que, es-
tando em ordem, não permite recusa sob alegação de defeito de qualidade ou estado da coisa
transacionada.

4.5.2. Termos de comércio internacional – INCOTERMS


A intensa troca de mercadorias e produtos entre países e entre empresas de países dis-
tintos demandou uma padronização de regras para viabilizar maior segurança entre as partes
contratantes.
Assim, para atender à necessidade global, a Câmara Internacional de Comércio estipulou
as Regras de Comercio Internacional (International Commercial Terms – INCOTERMS), padrões
internacionais criados há 83 anos e utilizados em contratos de compra e venda no setor de trans-
porte e logística para processos de importação e exportação, informando quem é o responsável
pelo frete, definindo o ponto de coleta da mercadoria e identificando o responsável pelo seguro.
Os INCOTERMS são regras que dizem respeito, sobretudo, à definição de responsabili-
dades no transporte dos produtos comercializados entre países.
Observando a versão 2020 dos INCOTERMS, percebemos que seguem sendo 11, dividi-
dos em quatro grupos: a) Categoria E (ex / partida); b) Categoria F (free/transporte principal
não pago); c) Categoria C (carriage/transporte principal pago); d) Categoria D (delivery/chegada).

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Em resumo: requisito único para compra e venda mercantil: a condição de empresário


para ambos os contratantes.
Possibilidade de relação de consumo regida pelo CDC: REsp n o 1.599.042/SP.
Cláusulas especiais de compra e venda: pacto de retrovenda; venda a contento e sujeita
à prova; preempção ou preferência; compra e venda com reserva de domínio; e venda sobre
documentos.
INCOTERMS: termos de regulação para comércio internacional.

4.6. Arrendamento mercantil – leasing


O contrato de arrendamento mercantil está regulado pela Lei no 6.099/1974 e pela Reso-
lução no 2.309/1996 do Banco Central. Operação muito comum no ambiente mercantil, o leasing
está assim descrito:
Art. 1o, Lei no 6.099/1974. O tratamento tributário das operações de arrendamento mer-
cantil reger-se-á pelas disposições desta Lei.
Parágrafo único – Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta Lei, o ne-
gócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física
ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens
adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio
desta.

Assim, é o contrato no qual uma pessoa jurídica (arrendadora) arrenda a uma pessoa
física ou jurídica (arrendatária), por determinado tempo, um bem, móvel ou imóvel, de fabricação
nacional ou estrangeira (desde que autorizados pelo Conselho Monetário Nacional) comprado
pela primeira de acordo com as indicações da segunda.
O arrendador é o proprietário e possuidor indireto do bem (o que garante a viabilidade do
aforamento de reintegração de posse), sendo que a posse direta e o usufruto, durante a vigência
do contrato, são do arrendatário, o qual paga uma mensalidade para o exercício de tal direito. É
a marca central dessa espécie de operação e que a diferencia claramente de um financiamento
bancário, na qual o bem é de propriedade do mutuário, ainda que alienado, já no ato da compra.
No caso do leasing, o bem é adquirido pelo arrendador, que se torna seu proprietário. Este
concede o direito de uso do bem, mediante o pagamento de contraprestações, por um prazo
determinado. Ao fim do contrato, pode existir a possibilidade de compra do bem pelo arrendatá-
rio. Já no financiamento comum, a empresa compra o bem que deseja, utilizando recursos de
terceiros fornecedores do crédito, que reservam a si garantias de adimplemento. Ao quitar todas
as prestações, o adquirente se torna em definitivo titular do bem.

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Direito Empresarial

Esta distinção fica muito nítida no corriqueiro caso de aquisição de veículos, pois na hipó-
tese de leasing, os documentos são emitidos em nome da sociedade de arrendamento mercantil.
Com a quitação do contrato, o agente financeiro deverá, no prazo de até trinta dias úteis, após
recebimento destes documentos, remeter ao arrendatário o documento único de transferência
(DUT) do veículo devidamente assinado pela arrendadora, a fim de possibilitar que o arrendatário
providencie a respectiva transferência de propriedade do veículo junto ao departamento de trân-
sito do Estado (Lei no 11.649/2008).
Segundo a Lei no 6.099/1974, são requisitos básicos da contratação:

Art. 5º – Os contratos de arrendamento mercantil conterão as seguintes disposições:


a) prazo do contrato;
b) valor de cada contraprestação por períodos determinados, não superiores a um semes-
tre;
c) opção de compra ou renovação de contrato, como faculdade do arrendatário;
d) preço para opção de compra ou critério para sua fixação, quando for estipulada esta
cláusula.

Dessa feita, percebemos que, ao final do contrato, caberá ao arrendatário solicitar a re-
novação da locação, encerrá-la ou adquirir o bem arrendado, mediante pagamento do valor
residual, menor do que o da sua aquisição inicial, se previamente fixado.
A partir dessas definições, podemos resumir as obrigações contratuais da seguinte forma:
Arrendador: adquirir o bem para ser dado em arrendamento; conceder a posse direta do
bem ao arrendatário; permitir seu pleno uso, embora mantenha a propriedade; vender o bem ao
final (caso haja interesse do arrendatário).
Arrendatário: pagar, na forma estabelecida, as prestações; conservar o bem arrendado,
respondendo pelos prejuízos que causar; encerrado o contrato, devolver o bem ao arrendador-
proprietário, caso não opte pela compra ou renovação do arrendamento.

4.6.1. Modalidades de leasing


1. Financeiro, puro ou bancário: o fabricante não figura como locador. Há uma em-
presa que desempenha esse papel, que se dedica exclusivamente a adquirir bens
fabricados por terceiros para arrendá-los, através de redistribuição, a outra socie-
dade que necessite destes bens.
2. Lease-back ou de retorno: forma eficiente para obtenção de capital de giro, ca-
racterizado quando uma sociedade proprietária de um bem o vende para outra

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empresa, e esta última, ao adquirir o bem, em ato contínuo, o arrenda para a ven-
dedora. Existe então o retorno do bem para a primeira empresa.
3. Operacional ou renting: casos em que a sociedade é proprietária de bens e os dá
em arrendamento para terceiro, mediante o pagamento de determinadas parcelas.
Não há uma terceira pessoa nesta relação, porquanto o próprio fabricante ou ven-
dedor figurará como arrendante. Além disso, se compromete a prestar assistência
ao arrendatário por todo o período do arrendamento. Difere do modelo financeiro
pois neste sempre encontramos a obrigatoriedade do cumprimento da obrigação
contraída por todo o período do arrendamento, enquanto no leasing operacional o
contrato pode ser rescindido a qualquer momento pelo arrendatário desde que me-
diante aviso prévio.

4.6.2. Valor residual garantido – VRG


Acerca do pagamento do valor residual, importa destacar a orientação do STJ em sua
Súmula no 293, que, mesmo não sendo recente, causa alguma confusão: “A cobrança antecipada
do valor residual garantido (VRG) não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil”.

O pagamento adiantado do Valor Residual Garantido – VRG não implica necessariamente


antecipação da opção de compra, posto subsistirem as opções de devolução do bem ou
prorrogação do contrato. Pelo que não descaracteriza o contrato de leasing para compra
e venda à prestação. Como as normas de regência não proíbem a antecipação do paga-
mento da VRG que, inclusive, pode ser de efetivo interesse do arrendatário, deve preva-
lecer o princípio da livre convenção entre as partes. (EREsp no 213828/RS – rel. Min. Mil-
ton Luiz Pereira, Rel. p/ Acórdão Min. Edson Vidigal – Corte Especial –j. em 07-05-2003 –
DJ 29-09-2003, p. 135).

A edição da Súmula no 293 cancelou a de no 263, que deliberava em sentido oposto: “a


cobrança antecipada do valor residual (VRG) descaracteriza o contrato de arrendamento mer-
cantil, transformando-o em compra e venda a prestação”.
E quanto ao tema, lembremos o Enunciado n o 38 da I Jornada de Direito Comercial do
CJF (afastando preceito do CDC): “É devida a devolução simples, e não em dobro, do valor
residual garantido (VRG) em caso de reintegração de posse do bem objeto de arrendamento
mercantil celebrado entre empresários”.
Em resumo: no leasing, o bem é adquirido pelo arrendador, que se torna seu proprietário.
Este concede o direito de uso do bem, mediante o pagamento de contraprestações, por um prazo
determinado.

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Ao final do contrato, caberá ao arrendatário solicitar a renovação da locação, encerrá-la


ou adquirir o bem.
Modalidades: financeiro, lease-back e operacional.
Valor residual garantido (VRG): Súmula no 293 do STJ.

4.7. Alienação fiduciária


Contrato por meio do qual o devedor (fiduciante – empresa que busca crédito para obter
o bem desejado) obtém financiamento para a aquisição de bem durável de uma instituição finan-
ceira credora (fiduciária – instituição financeira que concede o financiamento). A garantia do pa-
gamento será o próprio bem, pois o devedor aliena-o ao credor. A alienação fiduciária é, portanto,
um negócio jurídico onde o devedor negocia a transferência da propriedade junto ao credor como
forma de garantir uma dívida.
Envolve a realização de contratos simultâneos: a) compra e venda e b) a alienação fidu-
ciária do bem adquirido.
Lembremos as partes envolvidas no contrato: a) fiduciante – possuidor direto e devedor;
b) fiduciário – possuidor indireto e credor.
Sendo uma espécie contratual com larga aplicação no mercado financeiro, e em contínua
expansão, existe, como decorrência, um variado espectro normativo regulamentando as relações
decorrentes, exigindo do intérprete a delimitação das hipóteses de incidência dos regimes jurídi-
cos concorrentes.
O CC terá aplicação supletiva para casos não alcançados por legislação específica. Para
aclarar o conflito das leis, restou lançado o art. 1.368-A:

Art. 1.368-A, CC. As demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciá-


ria submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se apli-
cando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação
especial.

A aplicação do CC é realizada de forma subsidiária, mas de qualquer forma é imprescin-


dível seu conhecimento pelas partes da relação negocial.
No contrato, devem constar todas as informações sobre a operação em questão, notada-
mente: a) descrição detalhada do bem em alienação e o seu modo de aquisição; b) valor do bem,
assim como seus critérios de atualização e revisão; c) cláusula indicando livre utilização da pro-
priedade fiduciária, pois o bem pode ser utilizado pelo devedor (possuidor direto) como lhe

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aprouver enquanto vigorar o contrato; d) valor da dívida, juntamente com o seu prazo de venci-
mento e demais condições de pagamento; [5] taxa de juros e encargos.
Para a garantia ser assentada, em se tratando de veículo automotor, necessário o registro
no departamento de trânsito. Sendo bem imóvel, deve ser registrado no Ofício de Registro de
Imóveis.
A alienação fiduciária apresenta largas vantagens para o mercado de crédito. Traz segu-
rança jurídica, por prever a propriedade compartilhada sobre um bem (o devedor deixa de ter
propriedade plena sobre o bem e assim o credor fica protegido de situações inesperadas); me-
nos burocracia, por ser mais simples em seus atos formais de constituição e também para a
execução da garantia do que outros contratos, como a hipoteca; redução do risco de inadim-
plência, com a ampliação das garantias e da rapidez no procedimento de cobrança frente a
outros tipos de financiamento pois o processo de satisfação do crédito é mais ágil, refletindo
também na diminuição do grau de risco calculado nas operações de concessão de crédito. Se
houver o efetivo pagamento, o direito pleno de propriedade volta a ser do devedor. Caso não se
perfectibilize a quitação da dívida, o credor retomará a coisa, que juridicamente também é sua.
O preço obtido com a venda da coisa será utilizado para satisfazer o pagamento que ainda tem
a receber, devolvendo-se eventual excedente.
Na hipótese de inadimplemento, a execução do contrato ocorre pela via extrajudicial. Em
outras palavras, a cobrança é mais ágil para o credor.
Exemplificando a simplificação e o fortalecimento do sistema de garantias ao credor, te-
mos dois temas repetitivos do STJ:

Tema Repetitivo no 530 STJ: A notificação extrajudicial realizada e entregue no endereço


do devedor, por via postal e com aviso de recebimento, é válida quando realizada por
Cartório de Títulos e Documentos de outra Comarca, mesmo que não seja aquele do do-
micílio do devedor.
Tema Repetitivo no 722 STJ: Nos contratos firmados na vigência da Lei no 10.931/2004,
compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de
busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os valores
apresentados e comprovados pelo credor na inicial –, sob pena de consolidação da pro-
priedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária.

Em resumo: negócio jurídico no qual o devedor negocia a transferência da propriedade


junto ao credor como forma de garantir uma dívida. Realização de contratos simultâneos: a)
compra e venda e b) alienação fiduciária do bem adquirido. O Código Civil terá aplicação suple-
tiva para casos não alcançados por legislação específica. Traz segurança jurídica, menor buro-
cracia e redução do risco de inadimplência para o mercado de crédito.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

4.8. Locação
A locação de prédio urbano com finalidade comercial está submetida à lei especial, Lei n o
8.245/1991, e assim seguiu mesmo com a edição do Código Civil de 2002, segundo define seu
art. 2.036: “A locação de prédio urbano, que esteja sujeita à lei especial, por esta continua a ser
regida”.
No tocante, vale destacar a lição de Arnaldo Rizzardo:

Atualmente, vige a Lei no 8.245, de 18.10.1991, que substituiu a Lei no 6.649, de


16.05.1979, regulando todos os contratos de locação de prédios urbanos, sejam residen-
ciais ou não residenciais, tanto no pertinente ao campo de sua aplicação, como no que se
refere aos deveres e direitos dos locadores e locatários, às garantias locatícias, à prorro-
gação dos contratos, ao reajuste de aluguéis, à rescisão ou resolução contratual, à reto-
mada do prédio ou despejo do locatário, às penalidades a que se sujeitam as partes (Con-
tratos. 2. Ed, Rio de Janeiro: Forense, 2001).

Todavia, algumas exceções são trazidas pela legislação especial, definindo a regulação
pelo Código Civil (art. 1o, parágrafo único).
Enfim, a seção III da Lei no 8.245/1991 está dedicada para a locação não residencial.
O ponto mais sensível da locação empresarial reside no direito de renovação do contrato,
porquanto é natural da atividade mercantil a realização de elevados investimentos na estrutura
física do espaço locado, bem como na construção de uma relação imaterial com a clientela.
Começou com a Lei de luvas (Decreto n o 24.150. de 20 -04-1934), cuja sistemática era a
de proteção ao local onde o empresário estabelecia seu comércio. Assim a Lei de Locações (Lei
no 8.245/1991) manteve o instituto prevendo a possibilidade da ação renovatória, submetida a
uma série de requisitos:

Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a reno-
vação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente:
I – o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado;
II – o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos
escritos seja de cinco anos;
III – o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e
ininterrupto de três anos.
§ 1o O direito assegurado neste artigo poderá ser exercido pelos cessionários ou suces-
sores da locação; no caso de sublocação total do imóvel, o direito a renovação somente
poderá ser exercido pelo sublocatário.
§ 2o Quando o contrato autorizar que o locatário utilize o imóvel para as atividades de
sociedade de que faça parte e que a esta passe a pertencer o fundo de comércio, o direito
a renovação poderá ser exercido pelo locatário ou pela sociedade.
§ 3o Dissolvida a sociedade comercial por morte de um dos sócios, o sócio sobrevivente
fica sub-rogado no direito a renovação, desde que continue no mesmo ramo.
§ 4o O direito a renovação do contrato estende-se às locações celebradas por indústrias e
sociedades civis com fim lucrativo, regularmente constituídas, desde que ocorrentes os
pressupostos previstos neste artigo.
§ 5o Do direito a renovação decai aquele que não propuser a ação no interregno de um

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

ano, no máximo, até seis meses, no mínimo, anteriores à data da finalização do prazo do
contrato em vigor.

A demanda renovatória visa a garantir os direitos do locatário contra eventuais pretensões


do locador em se apropriar do patrimônio imaterial que foi agregado ao imóvel pela atividade
exercida pelo locatário, notadamente o fundo de comércio e o ponto comercial. Evidente que,
sob outro enfoque, não pode a ação judicial se tornar uma forma de eternizar a relação locatícia,
restringindo o direito de propriedade do locador. Com isso, o STJ definiu que a renovação, se
acolhida, deve ser por novo prazo de cinco anos.
De outro lado, a legislação também nos informa quando não haverá obrigação de reno-
vação do contrato:
Art. 52. O locador não estará obrigado a renovar o contrato se:
I – por determinação do Poder Público, tiver que realizar no imóvel obras que importarem
na sua radical transformação; ou para fazer modificações de tal natureza que aumente o
valor do negócio ou da propriedade;
II – o imóvel vier a ser utilizado por ele próprio ou para transferência de fundo de comércio
existente há mais de um ano, sendo detentor da maioria do capital o locador, seu cônjuge,
ascendente ou descendente.
§ 1o Na hipótese do inciso II, o imóvel não poderá ser destinado ao uso do mesmo ramo
do locatário, salvo se a locação também envolvia o fundo de comércio, com as instalações
e pertences.
§ 2o Nas locações de espaço em shopping centers, o locador não poderá recusar a reno-
vação do contrato com fundamento no inciso II deste artigo.
§ 3o O locatário terá direito a indenização para ressarcimento dos prejuízos e dos
lucros cessantes que tiver que arcar com mudança, perda do lugar e desvalorização do
fundo de comércio, se a renovação não ocorrer em razão de proposta de terceiro, em
melhores condições, ou se o locador, no prazo de três meses da entrega do imóvel,
não der o destino alegado ou não iniciar as obras determinadas pelo Poder Público
ou que declarou pretender realizar.

O direito ao recebimento de indenização pelo locatário, em virtude da perda ou desvalori-


zação do fundo de comércio, estará vinculado ao direito à renovação compulsória, bem como
forma de penalizar o locador pela retomada insincera do imóvel. Ou seja, o não preenchimento
de um dos requisitos legais para a renovação obrigatória afasta a possibilidade deste direito.

4.8.1. Locação built to suit


Forma de locação que foi consolidada na legislação brasileira em 2012, com a inserção
do art. 54-A à Lei de Locações.
Com nítido caráter mercantil, o locador constrói ou promove substancial reforma em seu
imóvel com finalidade de atender exigências específicas da empresa locatária. Assim, torna-se
possível viabilizar projetos de empreendimentos imobiliários que atendam as normas estabele-
cidas pelos futuros usuários, ao mesmo tempo em que evita a imobilização do capital de giro da

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Direito Empresarial

locatária. Há ampla liberdade de negociação, justamente em atenção à sofisticação do pacto,


valores envolvidos e qualidades técnicas das partes envolvidas.
Nesse sentido, vale destacar a conclusão da II Jornada de Direito Comercial, no Enunci-
ado no 67: “Na locação built to suit, é válida a estipulação contratual que estabeleça cláusula
penal compensatória equivalente à totalidade dos alugueres a vencer, sem prejuízo da aplicação
do art. 416, parágrafo único, do CC”.
Em suma, o valor da cláusula penal está limitado pelo art. 54-A, § 2o, da Lei no 8.245/1991,
mas tal regra não é incompatível com o art. 416, parágrafo único, do CC.

4.8.2. Locações em shopping center


Forma de locação mercantil em empreendimento que sinaliza um ambiente mais sofisti-
cado de atividade comercial, também está regulada pela Lei de Locações.

Os empreendimentos conhecidos por shopping center no Brasil não são núcleos de mer-
cancia com um surgimento espontâneo, mas uma tradução de uma evolução das técnicas
de administração empresarial. A orientar sua instalação há uma estratégia profissional,
buscando determinar uma “concentração territorial do comércio, anteriormente dissemi-
nado pelo espaço urbano nas ruas do centro ou nos subcentros comerciais”, engendrada
por empreendedores conscientes da envergadura da oportunidade, bem como dos lucros
de tais iniciativas. (MAMEDE, Gladston. Contrato de locação em shopping center: abusos
e ilegalidades. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 26-28).

Não por outra razão o art. 54 da lei em comento estipula liberdade para a pactuação das
cláusulas no contrato de locação de espaço em shopping center firmado entre lojistas e empre-
endedores.
Tanto a confecção do contrato quanto a interpretação das suas cláusulas devem ter como
premissa os princípios maiores do sistema de Direito Empresarial, notadamente a autonomia da
vontade. Como já sinalizamos nos tópicos anteriores, o controle judicial sobre cláusulas (em
tese) abusivas em contratos empresariais é mais restrito, pois as negociações são entabuladas
entre profissionais da área empresarial. E quanto maior a sofisticação da avença, menor o âmbito
de intervenção estatal, sendo aceita como válida até a chamada cláusula de raio, para obstar
que o lojista com empreendimento dentro do shopping instale empreendimento idêntico nas pro-
ximidades.
Adiante, nessa espécie de locação, é muito usual a presença do 13 o aluguel. O STJ (REsp
no 1409849 /PR – rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – 3ª T. – D Je 05 -05 -2016) se pronunciou
sobre a legalidade da cláusula, entendendo não ser abusiva a previsão que estabelece a du-
plicação do valor do aluguel no mês de dezembro.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

E se existe uma parcela variável, mostra-se necessária uma forma de fiscalizar a correção
desses pagamentos. A I Jornada de Direito Comercial do CJF pronunciou-se sobre o tema, no
Enunciado no 30: “Nos contratos de shopping center, a cláusula de fiscalização das contas do
lojista é justificada desde que as medidas fiscalizatórias não causem embaraços à atividade do
lojista.”
Em resumo: locação comercial está submetida à Lei n o 8.245/1991. As exceções estão
previstas na própria lei. Ação renovatória de locação comercial depende do implemento de re-
quisitos objetivos. Locação built to suit: o locador constrói ou promove substancial reforma em
seu imóvel com a finalidade de atender exigências específicas da empresa locatária. Locação
em shopping center: o art. 54 da Lei no 8.245/1991 estipula liberdade para pactuação das cláu-
sulas no contrato de locação firmado entre lojistas e empreendedores.

4.9. Factoring
No factoring, ou fomento mercantil, o empresário transfere a uma instituição financeira
(parabancária) a administração de determinado crédito. A operação caracteriza-se pela aquisi-
ção de direitos creditórios de contas a receber a prazo por um valor à vista, mediante a incidência
de taxas de juros e de serviços. Possibilita liquidez financeira imediata para empresas e não deve
ser confundida com a operação de crédito praticada por bancos.
Fran Martins assim o define: “O Contrato de Faturização ou Factoring é aquele em que
um comerciante cede a outro os créditos, na totalidade ou em parte, de suas vendas a terceiros,
recebendo o primeiro do segundo o montante desses créditos, mediante o pagamento de uma
remuneração” (Contratos e Obrigações Comerciais. Rio de Janeiro: Forense, 2002, 15. ed., p.
469).
Ainda que o contrato de fomento mercantil se forme entre faturizador e faturizado (o ven-
dedor do título), é de suma importância também a figura do comprador originário, uma vez que
são os créditos que o vendedor tem contra esse que são cedidos. Dessarte, temos como pres-
supostos sempre uma inicial venda à prazo e, havendo a cessão de crédito, o comprador deve
ser notificado da transação, para que efetue o pagamento do título ao faturizador.
Podemos então definir a operação em quatro etapas sucessivas: a) empresa vende seu
bem ou serviço a prazo, gerando um crédito no valor correspondente; b) a empresa (faturizada)
negocia este crédito com a faturizadora; c) de posse desse crédito, a factoring informa o com-
prador daquele bem ou serviço sobre o fato e a forma de cobrança; d) findo o prazo do negócio

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de origem, a empresa compradora pagará o valor deste crédito à faturizadora, encerrando o


processo.
Modalidades:
a) Faturização interna: operações realizadas dentro do mesmo país ou região;
b) Faturização externa: operações realizadas no exterior, como nos casos de impor-
tação e exportação;
c) Faturização no vencimento (maturity factoring): as faturas são remetidas ao fatu-
rizador, que as liquida somente na data de seu vencimento.
d) Faturização tradicional (old line factoring): as faturas remetidas ao faturizador são
liquidadas antes da data de vencimento. Em todos os casos há a assunção dos
riscos pelo faturizador do inadimplemento por parte do comprador/cliente. Se o
risco faz parte do negócio, caso a dívida não seja paga, não tem o faturizador direito
de cobrança em face do faturizado (Resp n o 1.289.995 /PE, rel. Min. Luis Felipe
Salomão, rel. p/ Acórdão: Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 20-2-2014, Dje 10-6-2014).

Em resumo: empresa vende seu bem ou serviço a prazo, gerando um crédito no valor
correspondente. A empresa (faturizada) negocia esse crédito com a faturizadora. De posse
desse crédito, a factoring informa o comprador daquele bem ou serviço sobre o fato e a forma
de cobrança. Findo o prazo do negócio de origem, a empresa compradora pagará o valor deste
crédito à faturizadora.

4.10. Franquia
O sistema de franquia foi inicialmente disciplinado no Brasil pela Lei n o 8.955/1994. Atu-
almente vigora a Lei no 13.966, de dezembro de 2019, que dispõe sobre o sistema de franquia
empresarial e expressamente revogou a normativa anterior:

Art. 1o Esta Lei disciplina o sistema de franquia empresarial, pelo qual um franqueador
autoriza por meio de contrato um franqueado a usar marcas e outros objetos de proprie-
dade intelectual, sempre associados ao direito de produção ou distribuição exclusiva ou
não exclusiva de produtos ou serviços e também ao direito de uso de métodos e sistemas
de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvido ou detido
pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem caracterizar relação de
consumo ou vínculo empregatício em relação ao franqueado ou a seus empregados, ainda
que durante o período de treinamento.
§ 1o Para os fins da autorização referida no caput, o franqueador deve ser titular ou reque-
rente de direitos sobre as marcas e outros objetos de propriedade intelectual negociados
no âmbito do contrato de franquia, ou estar expressamente autorizado pelo titular.
§ 2o A franquia pode ser adotada por empresa privada, empresa estatal ou entidade sem
fins lucrativos, independentemente do segmento em que desenvolva as atividades.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Franquia empresarial ou franchising é o sistema pelo qual um franqueador cede ao fran-


queado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou
não de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de im-
plantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo
franqueador sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício.
Existe autonomia jurídica, administrativa e financeira do franqueado como empresário,
que não está ligado ao franqueador por qualquer vínculo de subordinação, devendo apenas obe-
decer às regras e limitações impostas como padronização da comercialização do produto, bem
como o franqueado pagará remuneração (royalties) ao franqueador. Ao contrário da taxa de fran-
quia, que é paga uma única vez, logo após a assinatura do pacto, os royalties são pagos regu-
larmente em razão da contínua exploração da marca e do suporte recebido.
Há vantagens para ambos: o franqueador amplia a oferta da mercadoria e serviço sem
aporte de capital; o franqueado desenvolve um negócio consolidado perante o público e sem
encargos de marketing e criação de produto.
É um contrato atípico (nem a lei nem o Código Civil definem direitos e deveres do fran-
queador e do franqueado) que respeita a autonomia da vontade dos empresários. Entretanto, o
franqueador deve prestar ao franqueado serviços de organização empresarial, que se desdo-
bram em três contratos de orientação: engineering – do processo de montagem e planejamento
do estabelecimento; management – no treinamento da equipe de funcionários e gerência; mar-
keting – procedimento de divulgação e promoção dos produtos comercializados.
Dessarte, pelo contrato de franquia, com a colaboração do franqueador, o franqueado,
com algum capital, pode estabelecer-se sem precisar proceder ao estudo e equacionamento de
muitos dos aspectos do empreendimento, pois encontram-se já suficientemente equacionados
pelo titular de uma marca de comércio, produto ou serviço.
Circular de Oferta de Franquia – COF (art. 2o): o franqueador deve fornecer ao potencial
franqueado um documento escrito em língua portuguesa, de forma objetiva e acessível, contendo
os dados fundamentais do negócio (requisitos obrigatórios) para que ele tome ciência dos riscos
e custos inerentes ao negócio. O art. 2 o indica vinte e três incisos que apresentam um mapea-
mento geral do negócio a ser entabulado pelas partes. Deve ser disponibilizada ao candidato a
franqueado no mínimo dez dias antes da assinatura do contrato ou pré-contrato, ressalvada a
possibilidade de licitação promovida por órgão ou entidade pública, caso em que a COF será
divulgada no início do processo de seleção. Ao contrário, as relações entre franqueador e

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

franqueado continuam regendo-se exclusivamente pelas cláusulas contratualmente pactuadas.


Tal legislação visa a assegurar transparência nas negociações que antecedem a adesão do fran-
queado à franquia.
O contrato deve ser registrado no INPI para valer contra terceiros, como previsto na Lei
de Propriedade Industrial (Lei no 9.279/1996), em seu art. 211: “O INPI fará o registro dos con-
tratos que impliquem transferência de tecnologia, contratos de franquia e similares para produzi-
rem efeitos em relação a terceiros”.

4.11. Representação comercial


A Lei no 4.886/1965, com as alterações introduzidas pelas Leis n o 8.420/1992 e no
12.246/2010, é a legislação aplicável ao contrato de representação comercial, sendo que deve
ser celebrado por escrito e observar os diversos requisitos do art. 27.
A representação comercial é um contrato de colaboração (ao lado da concessão mer-
cantil, a franquia e a distribuição). Esses têm como característica atribuir a um dos contratantes
(o colaborador) a responsabilidade de criar ou ampliar mercado de bens e/ou serviços da outra
parte. Em razão da obrigação essencial que os caracteriza, possuem como marca comum uma
subordinação empresarial entre as partes. No que toca à representação em si, é o instrumento
pelo qual um representante comercial autônomo se obriga, em delimitada região geográfica, a
buscar pedidos de compra e venda das mercadorias fabricadas ou comercializadas pelo repre-
sentado.
Não há, em regra, vínculo societário ou empregatício entre o representado e o represen-
tante comercial. A atividade desenvolvida possui disciplina jurídica própria, tratando-se de ativi-
dade autônoma. Além disso, o representante comercial não tem poderes para concluir a negoci-
ação em nome do representado. O representante se obriga, mediante remuneração, mas sem
vínculo de subordinação pessoal, a obter negócios para o representado, negocia as merca-
dorias do representado, mas caberá exclusivamente a este a conclusão do negócio. Portanto,
não se confunde com o mandato, no qual o mandatário recebe poderes para negociar em nome
do mandante.
É obrigatório o registro no Conselho Regional dos Representantes Comerciais (Lei n o
4.886/1965, art. 2o).
Obrigações contratuais mais comuns do representante comercial autônomo: a) buscar,
com diligência, pedidos de compra e venda, em nome do representado, ajudando-o a expandir
o seu negócio e promover os seus produtos; b) seguir as instruções fixadas pelo representado;

91
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

c) informar o representado sobre o andamento dos negócios, nas oportunidades definidas em


contrato ou quando solicitado e prestar-lhe contas; d) observar as obrigações profissionais.
As obrigações mais comuns do representado: a) o principal dever do representado é pagar
a retribuição devida ao representante, assim que o comprador efetuar o seu pagamento ou, an-
tes, se não manifestar recusa por escrito no prazo de 15, 30, 60 ou 120 dias, conforme a locali-
zação do domicílio desse (mesma praça, mesmo Estado, Estado diverso ou exterior, respectiva-
mente – arts. 32 e 33); b) respeitar a cláusula de exclusividade de zona, não podendo vender os
seus produtos na área determinada em contrato, senão através do representante contratado para
atuar naquela área. Caso concretize negócios sem a observância dessa condição, o represen-
tante terá direito à comissão correspondente (art. 31).
A resolução do contrato pode ser de forma motivada ou imotivada. Na hipótese de encer-
ramento imotivado do contrato que haja vigorado por mais de seis meses, obriga-se o denunci-
ante à concessão de pré-aviso, com antecedência mínima de 30 dias ou ao pagamento de 1/3
das comissões auferidas pelo representante nos três meses anteriores, além da indenização.
Se a rescisão ocorrer por justo motivo, ou seja, motivada, não cabe nenhuma indenização.
São razões de rescisão do contrato por parte do representado (art. 35 da Lei n o 4.886/1965
(na grafia original da lei):

Art. 35. Constituem motivos justos para rescisão do contrato de representação comercial,
pelo representado:
a) a desídia do representante no cumprimento das obrigações decorrentes do contrato;
b) a prática de atos que importem em descrédito comercial do representado;
c) a falta de cumprimento de quaisquer obrigações inerentes ao contrato de representação
comercial;
d) a condenação definitiva por crime considerado infamante;
e) força maior.

De outro lado, o art. 36 do mesmo diploma aponta os motivos de rescisão pelo represen-
tante (grafia original da lei):

Art. 36. Constituem motivos justos para rescisão do contrato de representação comercial,
pelo representante:
a) redução de esfera de atividade do representante em desacordo com as cláusulas do
contrato;
b) a quebra, direta ou indireta, da exclusividade, se prevista no contrato;
c) a fixação abusiva de preços em relação à zona do representante, com o exclusivo es-
copo de impossibilitar-lhe ação regular;
d) o não-pagamento de sua retribuição na época devida;
e) força maior.

92
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

O contrato pode ser firmado por prazo determinado ou indeterminado. Uma vez prorro-
gado, torna-se a prazo indeterminado.
A Lei no 8.420/1992 inseriu na legislação original a vedação da cláusula del credere (art.
43). Esta cláusula corresponde à previsão contratual expressa que permita à parte representada
deduzir de comissões e vendas do representante comercial valores na hipótese de o negócio ser
cancelado ou desfeito. Há que se ter presente que a responsabilidade do representante comer-
cial deve ser limitada apenas à transação e à intermediação do negócio e nada mais, lembrando
que a representação comercial é atividade de meio na relação de venda. A responsabilidade de
aceitação da venda é do representado.
Havendo rescisão contratual imotivada, discute-se a pertinência de indenização, que de-
penderá se o prazo do contrato é determinado ou se o contrato é por prazo indeterminado.
Sendo determinado, a indenização corresponderá à média mensal multiplicada pela me-
tade dos meses que faltam para o fim do contrato. Se for prazo indeterminado, será 1/12 sobre
o valor total do contrato (Lei no 4.886/1965, art. 27, j e § 1o).
Ainda quanto à indenização, cumpre sinalar a conclusão da III Jornada de Direito Comer-
cial do CJF, em seu Enunciado no 82: “A indenização devida ao Representante, prevista no art.
27, alínea j, da Lei no 4.886/1965, deve ser apurada com base nas comissões recebidas durante
todo o período em que exerceu a representação, afastando-se os efeitos de eventual pagamento
a menor, decorrente de prática ilegal ou irregular da Representada reconhecida por decisão ju-
dicial ou arbitral transitada em julgado ”.
Em resumo: modalidade de contrato de colaboração. Não há vínculo societário ou em-
pregatício entre o representado e o representante comercial. Trata-se de atividade autônoma. O
representante comercial não tem poderes para concluir a negociação em nome do representado.
Vedada a inserção de cláusula del credere.

4.12. Distribuição
A criação, consolidação ou ampliação de mercados, através da colaboração empresarial,
pode resultar de aproximação ou de intermediação. O contrato de distribuição é modalidade de
colaboração empresarial que pode ser enquadrada em qualquer uma dessas espécies:
Aproximação: o colaborador identifica pessoas interessadas em adquirir produtos do ou-
tro empresário contratante. Na distribuição-aproximação, o distribuidor é remunerado por um
percentual (comissão) dos negócios que ajuda a realizar.

93
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Intermediação: o colaborador adquire os produtos do outro contratante e os oferece de


novo ao mercado. É o clássico contrato celebrado entre distribuidores de combustível e os postos
de abastecimento; fábricas de produtos alimentícios e depósitos/atacadistas em geral.
Consoante Arnaldo Rizzardo, o contrato de distribuição tem como objeto “a comercializa-
ção dos bens produzidos e fornecidos pelo fabricante, e a prestação de serviços de assistência
técnica e mecânica aos bens” (in Contratos, ed. Forense).
O Código Civil assim tipifica o contrato de distribuição:

Art. 710. Pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem
vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição,
a realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição
quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada.
Parágrafo único. O proponente pode conferir poderes ao agente para que este o repre-
sente na conclusão dos contratos.

Como se vê, o Código Civil regula em conjunto com o contrato de agência, o que resulta
em certa celeuma. O contrato de distribuição típico (distribuição-aproximação) está associado ao
contrato de agência. Nesta modalidade há maior ingerência do fornecedor sobre as atividades
do distribuidor.
Tem como cláusulas (implícitas ou explícitas) a de exclusividade de distribuição (pela qual
o distribuidor não pode trabalhar para outros proponentes na zona de atuação) e de exclusivi-
dade de zona (pela qual o proponente deve abster-se de realizar negócios na zona de atuação,
a não ser com os aproximados pelo distribuidor ou agente).
Para garantir o cumprimento dessas obrigações, a lei assegura ao distribuidor o direito à
remuneração pelos negócios realizados pelo proponente em desrespeito à cláusula de territori-
alidade, conforme dispõe o art. 714 do CC.

Art. 714. Salvo ajuste, o agente ou distribuidor terá direito à remuneração correspondente
aos negócios concluídos dentro de sua zona, ainda que sem a sua interferência.

Entretanto, o contrato de distribuição mais utilizado (distribuição-intermediação) é aquele


que não é previsto em lei, ou seja, é um contrato atípico. A ele se aplicam as normas contratuais
gerais, mas é regulado pelas cláusulas negociadas entre as partes, sendo muito importante que
sejam estipuladas de maneira equilibrada e adequada para ambos. Nesta distribuição atípica
aplicam-se os direitos e obrigações ajustadas. Age o distribuidor em seu próprio nome adquirindo
o bem para posterior revenda a terceiros, tendo como proveito econômico a diferença entre o
preço de venda e aquele pago ao fornecedor (margem de comercialização).

94
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Fazendo a distinção entre as duas modalidades, o CJF editou o Enunciado n o 31 na I


Jornada de Direito Comercial:

O contrato de distribuição previsto no art. 710 do CC é uma modalidade de agência em


que o agente atua como mediador ou mandatário do proponente e faz jus à remuneração
devida por este, correspondente aos negócios concluídos em sua zona. No contrato de
distribuição autêntico, o distribuidor comercializa diretamente o produto recebido do fabri-
cante ou fornecedor, e seu lucro resulta das vendas que faz por sua conta e risco.

Em resumo: modalidade de contrato de colaboração. Pode ser típico (distribuição-apro-


ximação) ou atípico (distribuição-intermediação). Contrato típico: regras legais. Contrato atípico:
regras contratuais.

4.13. Concessão comercial


Trata-se de contrato atípico em que determinado empresário (concessionário) se obriga a
comercializar, com ou sem exclusividade, com ou sem cláusula de territorialidade, os produtos
fabricados por outro empresário (concedente), nas condições estipuladas pelo último.
De plano, vale destacar valiosa lição de Fábio Ulhoa Coelho (in Curso de direito comercial.
v. 3. 17. ed. São Paulo: RT, 2016, p. 109):

Na categoria dos contratos de colaboração por intermediação, distinguem-se duas espé-


cies: a distribuição-intermediação e a concessão. A diferença entre elas é sutil, e alguns
autores consideram incorreto considerá-las modalidades distintas de contrato. Orlando Go-
mes, por exemplo, não as diferencia. Há, entretanto, na distribuição-intermediação e na
concessão certa variância do grau de subordinação da empresa do colaborador em relação
à do fornecedor. No contrato de distribuição-intermediação, o distribuído tem menos
poder de ingerência sobre a organização empresarial do distribuidor que o conce-
dente, na concessão, relativamente à empresa do concessionário. Essa gradação na su-
bordinação empresarial, inclusive, vocaciona a concessão como espécie de contrato de
colaboração por intermediação mais apropriada à hipótese em que o colaborador não só
vende os produtos do fornecedor como também presta serviços de assistência técnica
aos consumidores ou adquirentes.

Na concessão atípica (por vezes chamada de distribuição), os direitos e deveres das


partes são aqueles previstos contratualmente, uma vez que não existe uma legislação pró-
pria. Portanto, é fundamental que sejam objeto de pactuação:
• cláusulas de exclusividade;
• quotas de aquisição e fornecimento;
• condições e vantagens especiais ao distribuidor;
• rescisão (indenização).

95
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Diferentemente, na concessão comercial da venda de automóveis, trata-se de contrato


típico, disciplinado especificamente pela Lei no 6.729/1979 – “Lei Ferrari” -, alterada pela Lei no
8.132/1990. A aludida lei tem seu âmbito de aplicação restrito às relações empresariais estabe-
lecidas entre produtores e distribuidores de veículos automotores de via terrestre, e contempla
as condições comerciais para concessão comercial de veículos automotores, sendo taxativa em
relação a:
• Delimitação de área geográfica para comercialização de veículos de uma marca
específica;
• Assistência técnica, garantia e revisão;
• Uso gratuito, como elemento identificador, da marca do produtor;
• Fidelidade e exclusividade recíproca concernente aos produtos e à marca;
• Prazo de vigência do contrato de concessão comercial por prazo indeterminado, ou
pelo prazo mínimo e inicial de cinco anos.

Nos termos da iterativa jurisprudência desta Corte, a Lei n o 6.729/1979 (Lei Ferrari) não
se aplica a hipóteses diversas da distribuição de veículos automotores (STJ, REsp n o 680329
/RS, rel. Min. Raul Araújo, rel. p/ Acórdão: Raul Araújo, 4ª T., j. 22-4-2014, Dje 29- 4 -2014.).

4.14. Comissão
Delineado pelos arts. 693 a 709 do CC.
Trata-se de vínculo contratual em que um empresário (comissário) se obriga a realizar
negócios mercantis por conta de outro (comitente), mas em nome próprio, assumindo, portanto,
responsabilidade pessoal pelos atos praticados. Apesar de agir em nome próprio, não tem plena
liberdade e deve agir sempre considerando os limites estabelecidos pelo comitente.
Nesta forma de contratação, o comissário concretiza operações comerciais do interesse do
comitente, mediante um percentual (comissão). O comitente não participa dos negócios, podendo
até permanecer incógnito.
A comissão assemelha-se ao mandato. Em ambos, uma pessoa (comissário ou manda-
tário) se obriga a praticar atos em nome de outra pessoa (comitente ou mandante). A diferença
fundamental da comissão em relação ao mandato consiste na imputação da responsabilidade
perante terceiros. O comissário fica diretamente obrigado para com as pessoas com quem con-
tratar, sem que estas tenham ação contra o comitente, nem este contra elas, salvo se o comis-
sário ceder seus direitos a qualquer das partes (art. 694, CC).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Por expressa previsão do Código Civil, admite o contrato de comissão a inserção da cláu-
sula del credere. Esta representa a obrigação do comissário de responder solidariamente com o
terceiro perante o comitente (ex.: o comissário vende café do comitente e dá prazo ao terceiro
para pagar, porém o terceiro não paga, devendo então o comissário pagar ao comitente). Inse-
rindo-se esta cláusula del credere, fará o comissário jus a uma remuneração maior em face do
risco assumido (art. 698 do CC).
Em resumo: empresário se obriga a realizar negócios em favor de outro, mas em nome
próprio. O comissário atua nos limites definidos pelo comitente. Remunerado via comissão. Pos-
sível a inserção da cláusula del credere.

4.15. Mandato
Extensamente regulamentado no CC, nos arts. 653 a 691.
O mandato mercantil é contrato no qual mandatário se obriga a praticar atos negociais em
nome e por conta do empresário mandante, que confia a outrem a gestão de um ou mais negó-
cios mercantis.
É materializado, concretizado, pela procuração outorgada ao mandatário.
Trata-se de contrato bilateral, pois gera deveres tanto para o mandante quanto para o
mandatário.
A principal obrigação do mandatário é praticar atos negociais, em nome e por conta do
mandante, observando, para tanto, as instruções e poderes dele recebidos. Também é obrigado
a prestar contas dos atos por ele praticados em nome do mandante, informando-lhe sobre tudo
o que se passa com os negócios.
Já o mandante é obrigado a cumprir as obrigações contraídas pelo mandatário (dentro
dos limites do mandato), bem como pagar o valor ajustado como remuneração. É igualmente
obrigado a ressarcir ao mandatário as perdas que este sofrer com a execução do mandato, sem-
pre que não resultem de culpa sua ou de excesso de poderes.
A extinção do mandato ocorre, segundo o art. 682 do CC, nas seguintes situações:

Art. 682. Cessa o mandato:


I – pela revogação ou pela renúncia;
II – pela morte ou interdição de uma das partes;
III – pela mudança de estado que inabilite o mandante a conferir os poderes, ou o manda-
tário para os exercer;
IV – pelo término do prazo ou pela conclusão do negócio.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Dica: conferido o mandato com a cláusula “em causa própria”, a sua revogação não terá
eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das partes (art. 685 do CC).
Em resumo: mandatário atua em nome do mandante, dentro das instruções recebidas.
Procuração é o instrumento do mandato. O mandato em causa própria não é extinto pelo faleci-
mento do mandante.

4.16. Métodos adequados


A expressão “métodos adequados de resolução de conflitos (ou ainda métodos alternati-
vos de solução de conflitos)” corresponde à homônima em língua inglesa “alternative dispute
resolution” (ADR) e representa uma variedade de métodos de resolução de disputas distintos do
julgamento que se obtém ao final de um processo judicial conduzido pelo Estado.
São exemplos:
• Arbitragem;
• Mediação;
• Conciliação;
• Negociação.

No Brasil, a história dos métodos adequados de resolução de conflitos tem uma defasa-
gem temporal de duas décadas em relação à experiência norte-americana, por exemplo, mas se
desenvolve por argumentos e etapas relativamente semelhantes: parte de uma crítica à demora
e aos custos da jurisdição estatal, ancora-se inicialmente na arbitragem privada para, mais tarde,
disseminar-se pela conciliação e mediação.
Assim tem-se:
• 1996 – Lei no 9.307 – Instituição da Lei de Arbitragem no Brasil;
• Resolução no 125/2010 do CNJ;
• Novo CPC;
• Lei no 13.140/2015 (Lei de Mediação).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Métodos adequados de
resolução de conflitos

Autocomposição
Heterocomposição: Autocomposição:
assistida: as partes
decisão de um solução consensual
chegam a um consenso,
terceiro entre as partes
com auxilio de terceiro

Processo
JEC Arbitragem Mediação Conciliação Mediação
Ordinário

4.16.1. Mediação
Considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder de-
cisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver
soluções consensuais para a controvérsia (art. 1 o, parágrafo único, Lei no 13.140/2015).
O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre
as partes, auxiliará os interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de
modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, solu-
ções consensuais que gerem benefícios mútuos (art. 165, § 3 o, do CPC).

Mediação

É a atividade técnica exercida por


um terceiro imparcial, sem poder
decisório, que, escolhido pelas
partes, as auxilia e estimula a
identificar ou desenvolver soluções
consensuais para a controvérsia.

Mediador extrajudicial: pode ser


qualquer pessoa capaz, que Mediador judicial: é exigido
tenha a confiança das partes e a capacitação em curso
seja capacitada para fazê-lo, realizado por entidade
mesmo não vinculada a conselho credenciada.
ou entidade.

99
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

4.16.2. Conciliação
É exercida, normalmente, por força de lei e compulsoriamente por servidor público que
usa a autoridade de seu cargo para tentar promover a solução de controvérsias.
O conciliador é uma pessoa da sociedade que atua, de forma voluntária e após treina-
mento específico, como facilitador do acordo entre os envolvidos, criando um contexto propício
ao entendimento mútuo, à aproximação de interesses e à harmonização das relações. Conforme
art. 165, § 2o, do CPC “O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver
vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização
de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem”.
Na conciliação judicial o procedimento é iniciado pelo magistrado ou por requerimento
da parte, com a designação de audiência e a intimação das partes para o comparecimento (arts.
165 e seguintes e 331 do CPC). Já na conciliação pré-processual, a parte comparece à uni-
dade do Poder Judiciário apta a atendê-la, no caso, as unidades de conciliação já instaladas ou
os Juizados Especiais, que marca uma sessão na qual a outra parte é convidada a comparecer.
Na efetivação do acordo, o termo da conciliação se transforma em título executivo.
Na falta de acordo, é dado o encaminhamento para o ingresso em juízo pelas vias nor-
mais.
4.16.3. Mediação e conciliação no CPC
Depreende-se do art. 3o do CPC:

Art. 3o Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.


§ 1o É permitida a arbitragem, na forma da lei.
§ 2o O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3o A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos
deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Minis-
tério Público, inclusive no curso do processo judicial.

Em consonância com o referido artigo, o Código de Processo Civil prevê no art. 165 que
“Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela
realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de pro-
gramas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.”
Logo, constata-se claro avanço no que diz respeito ao incentivo à solução de conflitos por
vias não judiciais.
Os princípios aplicados no procedimento de conciliação e mediação estão elencados no
art. 166, do CPC. São eles: independência, imparcialidade, autonomia da vontade, confi-
dencialidade, oralidade, informalidade e decisão informada.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Art. 166, CPC. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da indepen-
dência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade,
da informalidade e da decisão informada.
§ 1o A confidencialidade estende-se a todas as informações produzidas no curso do pro-
cedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele previsto por ex-
pressa deliberação das partes.
§ 2o Em razão do dever de sigilo, inerente às suas funções, o conciliador e o mediador,
assim como os membros de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos
ou elementos oriundos da conciliação ou da mediação.
§ 3o Admite-se a aplicação de técnicas negociais, com o objetivo de proporcionar ambiente
favorável à autocomposição.
§ 4o A mediação e a conciliação serão regidas conforme a livre autonomia dos interessa-
dos, inclusive no que diz respeito à definição das regras procedimentais.

Alguns pontos principais precisam ser lembrados pelo aluno ao estudar o tema no Código
de Processo Civil, quais sejam:
Tentativa de conciliação no início da audiência de instrução e julgamento:

Art. 359, CPC. Instalada a audiência, o juiz tentará conciliar as partes, independentemente
do emprego anterior de outros métodos de solução consensual de conflitos, como a me-
diação e a arbitragem.

Produção antecipada de prova para viabilizar a autocomposição:

Art. 381, CPC. A produção antecipada da prova será admitida nos casos em que: [...]
II – a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio
adequado de solução de conflito;

Decisão homologatória de autocomposição como título executivo judicial:

Art. 515, CPC. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com
os artigos previstos neste Título: [...]
II – a decisão homologatória de autocomposição judicial;
III – a decisão homologatória de autocomposição extrajudicial de qualquer natureza;

Homologação de autocomposição nos tribunais:

Art. 932, CPC. Incumbe ao relator:


I – dirigir e ordenar o processo no tribunal, inclusive em relação à produção de prova, bem
como, quando for o caso, homologar autocomposição das partes;
Máxima priorização da solução consensual nas ações de família:
Art. 694, CPC. Nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solu-
ção consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras
áreas de conhecimento para a mediação e conciliação.
Parágrafo único. A requerimento das partes, o juiz pode determinar a suspensão do pro-
cesso enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento mul-
tidisciplinar.

101
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Art. 695, CPC. Recebida a petição inicial e, se for o caso, tomadas as providências refe-
rentes à tutela provisória, o juiz ordenará a citação do réu para comparecer à audiência de
mediação e conciliação, observado o disposto no art. 694.

4.16.4. Etapas do procedimento de mediação


Primeiro criam-se opções para que os mediandos busquem soluções para a situação, a
fim de trazer o maior número de ideias possíveis. A agenda é utilizada como instrumento de
organização de acordo com as prioridades, baseadas na importância e urgência. No fechamento,
o procedimento de mediação é encerrado e o acordo é redigido, se for o caso.

4.16.5. Etapas do procedimento de conciliação


1) Apresentação;
2) Abertura;
3) Criação de opções;
4) Acordo.

Veja o esquema na página a seguir...

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Coibir/inibir ações judiciais;

Termo de mediação e
minuta do termo-pré-
mediação;
Antes do procedimento
Assegurar a participação
dos que possuem poder de
decisão;

Sempre os mesmos
participantes;

Reuniões separadas - o
Mediação empresarial

mediador deve evitar ser o


portador das propostas;

Assegurar que estejam com


Durante o procedimento as informações legais
necessárias para decidir;

Refletir sobre a relação


passada e deliberar sobre a
futura relação;

Cumprimento espontâneo;

Nova relação de negócios:


Após o procedimento
novo contrato;

Rompimento de traumas:
acompanhamento.

4.16.6. Mediação empresarial


A mediação empresarial pode ocorrer em diversos tipos de conflitos, tais como: comer-
cial; construção civil; propriedade intelectual; franchising; societária; empresa familiar; organiza-
cional/corporativa; e com entes públicos.

4.16.7. Arbitragem
Regida pela Lei no 9.307/1996, a arbitragem é um procedimento litigioso privado, con-
trolado por um profissional especializado e independente, que dita uma sentença e soluci-
ona o conflito entre as partes.

103
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

4.16.7.1. Convenção de arbitragem – Lei no 9.307/1976


A convenção de arbitragem é gênero que se divide em duas espécies:

Art. 3o As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral
mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o
compromisso arbitral.
a) Cláusula compromissória: “convenção através da qual as partes em um contrato com-
prometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a
tal contrato ” (art. 4o da Lei no 9.307/1976).
b) Compromisso arbitral: convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbi-
tragem de uma ou mais pessoas, pode ser judicial ou extrajudicial (art. 9o da Lei no
9.307/1976).
Art. 4o A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um con-
trato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir,
relativamente a tal contrato.
§ 1o A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no
próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira.
§ 2o Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente
tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua insti-
tuição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou
visto especialmente para essa cláusula. [...]
Art. 9o O compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um
litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial.
§ 1o O compromisso arbitral judicial celebrar-se-á por termo nos autos, perante o juízo ou
tribunal, onde tem curso a demanda.
§ 2o O compromisso arbitral extrajudicial será celebrado por escrito particular, assinado
por duas testemunhas, ou por instrumento público.
Art. 10. Constará, obrigatoriamente, do compromisso arbitral:
I – o nome, profissão, estado civil e domicílio das partes;
II – o nome, profissão e domicílio do árbitro, ou dos árbitros, ou, se for o caso, a identifica-
ção da entidade à qual as partes delegaram a indicação de árbitros;
III – a matéria que será objeto da arbitragem; e
IV – o lugar em que será proferida a sentença arbitral.
Art. 11. Poderá, ainda, o compromisso arbitral conter:
I – local, ou locais, onde se desenvolverá a arbitragem;
II – a autorização para que o árbitro ou os árbitros julguem por equidade, se assim for
convencionado pelas partes;
III - o prazo para apresentação da sentença arbitral;
IV - a indicação da lei nacional ou das regras corporativas aplicáveis à arbitragem, quando
assim convencionarem as partes;
V - a declaração da responsabilidade pelo pagamento dos honorários e das despesas com
a arbitragem; e
VI – a fixação dos honorários do árbitro, ou dos árbitros.
Parágrafo único. Fixando as partes os honorários do árbitro, ou dos árbitros, no compro-
misso arbitral, este constituirá título executivo extrajudicial; não havendo tal estipulação, o
árbitro requererá ao órgão do Poder Judiciário que seria competente para julgar, originari-
amente, a causa que os fixe por sentença.

A cláusula compromissória divide-se em duas categorias, quais sejam:


Cláusula compromissória cheia: contém definições prévias das questões relacionadas à
instituição e ao procedimento arbitral, contendo os requisitos mínimos para instauração do pro-
cedimento arbitral, como, por exemplo, a forma de indicação dos árbitros, fazendo desneces-
sário o compromisso arbitral. As partes podem pactuar as regras, podem delegá-las aos árbitros

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

ou podem ainda delegar ao regulamento de uma instituição arbitral já existente (art. 5o da Lei no
9.307/1996).
Art. 5o Reportando-se as partes, na cláusula compromissória, às regras de algum órgão
arbitral institucional ou entidade especializada, a arbitragem será instituída e processada
de acordo com tais regras, podendo, igualmente, as partes estabelecer na própria cláu-
sula, ou em outro documento, a forma convencionada para a instituição da arbitragem.

Cláusula compromissória vazia (ou em branco): as partes apenas definem a submis-


são do contrato a arbitragem, sem definir ou detalhar a instituição e as características do pro-
cedimento arbitral. Assim, surgido o conflito, será necessário o compromisso arbitral para preen-
cher as lacunas da cláusula compromissória.
Discute-se, nesse aspecto, a impossibilidade de instauração imediata da arbitragem nos
casos em que a cláusula é vazia, isto porque, ausentes os elementos mínimos necessários para
a instauração da arbitragem, necessário que as partes firmem acordo a respeito do compromisso
arbitral e, na falta desse acordo, poderá haver a intervenção (motivada) do Poder Judiciário.

Art. 6o Não havendo acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem, a parte inte-
ressada manifestará à outra parte sua intenção de dar início à arbitragem, por via postal
ou por outro meio qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento, con-
vocando-a para, em dia, hora e local certos, firmar o compromisso arbitral.
Parágrafo único. Não comparecendo a parte convocada ou, comparecendo, recusar-se a
firmar o compromisso arbitral, poderá a outra parte propor a demanda de que trata o
art. 7o desta Lei, perante o órgão do Poder Judiciário a que, originariamente, tocaria
o julgamento da causa.
Art. 7o Existindo cláusula compromissória e havendo resistência quanto à instituição da
arbitragem, poderá a parte interessada requerer a citação da outra parte para comparecer
em juízo a fim de lavrar-se o compromisso, designando o juiz audiência especial para tal
fim.
§ 1o O autor indicará, com precisão, o objeto da arbitragem, instruindo o pedido com o
documento que contiver a cláusula compromissória.
§ 2o Comparecendo as partes à audiência, o juiz tentará, previamente, a conciliação
acerca do litígio. Não obtendo sucesso, tentará o juiz conduzir as partes à celebração, de
comum acordo, do compromisso arbitral.
§ 3o Não concordando as partes sobre os termos do compromisso, decidirá o juiz,
após ouvir o réu, sobre seu conteúdo, na própria audiência ou no prazo de dez dias, res-
peitadas as disposições da cláusula compromissória e atendendo ao disposto nos arts. 10
e 21, § 2o, desta Lei.
§ 4o Se a cláusula compromissória nada dispuser sobre a nomeação de árbitros, ca-
berá ao juiz, ouvidas as partes, estatuir a respeito, podendo nomear árbitro único para a
solução do litígio.
§ 5o A ausência do autor, sem justo motivo, à audiência designada para a lavratura do
compromisso arbitral, importará a extinção do processo sem julgamento de mérito.
§ 6o Não comparecendo o réu à audiência, caberá ao juiz, ouvido o autor, estatuir a res-
peito do conteúdo do compromisso, nomeando árbitro único.
§ 7o A sentença que julgar procedente o pedido valerá como compromisso arbitral.

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Direito Empresarial

Cláusula arbitral escalonada: determina a solução da controvérsia por meio da media-


ção antes da instauração da arbitragem (cláusula med-arb) ou ainda, durante o procedimento
arbitral (cláusula arb-med).
Desta forma, prestigia-se a autocomposição dos conflitos, por meio da mediação, inclusive
nas hipóteses em que as partes pactuaram a arbitragem.

4.16.7.2. Autonomia da cláusula compromissória


A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em que estiver inserta, de
tal sorte que a nulidade deste não implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromis-
sória (art. 8o da Lei no 9.307/1996).
Além, disso, dispõe o parágrafo único. Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provoca-
ção das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitra-
gem e do contrato que contenha a cláusula compromissória.

4.16.7.3. Espécies de arbitragem


1) Arbitragem institucional: as regras procedimentais encontram-se previamente
definidas por determinada câmara arbitral. Nesse caso, as partes escolhem uma
entidade especializada (instituição arbitral) para conduzir o procedimento arbitral.
2) Arbitragem ad hoc (ou arbitragem avulsa): as partes definem o procedimento
arbitral e, em caso de lacuna ou dúvida, os árbitros decidirão.

4.16.7.4. Efeitos da convenção arbitral


A convenção de arbitragem tem um duplo caráter ou efeito:
Positivo: obriga as partes a se submeterem ao juízo arbitral; deriva do princípio contratual
do pacta sunt servanda (os contratos vinculam as partes).
A convenção arbitral é capaz de execução específica, tendo em vista que, se a sanção
pelo descumprimento de uma convenção arbitral fosse meramente indenizatória, a arbitragem
não estaria atingindo o seu objetivo principal.
A LBA, nesse sentido, adotou, em seu art. 7 o, um mecanismo próprio para permitir a exe-
cução específica da cláusula compromissória quando houver resistência de uma das partes em
instaurar o procedimento, por meio de sua instauração judicial.
Negativo: derroga a jurisdição estatal, submetendo as partes à jurisdição dos árbitros.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Um requisito de validade da convenção de arbitragem é a arbitrabilidade, que significa a


possibilidade de um litígio ser submetido à arbitragem voluntária. Divide-se em duas espécies:
objetiva e subjetiva.

Art. 1º As pessoas capazes de


contratar poderão valer-se da
arbitragem para dirimir litígios Disponível: pode ser exercido
relativos a DIREITOS livremente - alienado,
PATRIMONIAIS DISPONÍVEIS. transaciondo, negociado pelo
seu titular.
Arbitralidade

Cunho patrimomial: passível de


apreciação pecuniária.

Arbitralidade objetiva: relaciona-se às


matérias ou espécies de litígios que podem
ser submetidos à arbitragem, com projeção
no objeto (ratione materiae)

Arbitralidade
Arbitragem subjetiva: é a aptidão que
certas pessoas possuem para
submeterem-se à arbitragem (ratione
personae).

Os entes despersonalizados, em razão da ausência de personalidade jurídica e, por-


tanto, de capacidade de direito e de fato, não podem firmar, em princípio, convenção arbitral.
À exceção, o ordenamento jurídico confere capacidade contratual para determinados en-
tes despersonalizados, como o condomínio edilício, massa falida, espólio, que poderiam subme-
ter suas controvérsias à solução arbitral, desde que com a devida autorização e representação
adequada.

4.16.7.5. Arbitragem de direito ou de equidade


Enquanto na arbitragem de direito, os árbitros devem decidir a controvérsia com funda-
mento nas normas em vigor no ordenamento jurídico, na arbitragem por equidade, a decisão é
adotada com apoio nos critérios de justiça, de bom senso e de equilíbrio dos árbitros.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Na arbitragem por
equidade o árbitro
julgará o caso segundo o
seu bom senso,
coerência e justiça.

§1º Poderão as partes


escolher, livremente, as
Art. 2º A arbitragem regras de direito que
Arbitragem de direito ou poderá ser de direito ou serão aplicadas na
de equidade de equidade, a critério arbitragem, desde que
das partes. não haja violação aos
bons costumes e à
ordem pública.

§2º Poderão, também,


as partes convencionar
que a arbitragem se
As partes podem
realize com base nos
livremente escolher a lei
princípios geraisde
a ser aplicada na
direito, nos usos e
arbitragem.
costumes e nas regras
internacionais de
comércio.

4.16.7.6. Árbitros
Quanto aos árbitros, disciplina o art. 13 da Lei n o 9.307/1996:

Art. 13. Pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes.
§ 1o As partes nomearão um ou mais árbitros, sempre em número ímpar, podendo nomear,
também, os respectivos suplentes.
§ 2o Quando as partes nomearem árbitros em número par, estes estão autorizados, desde
logo, a nomear mais um árbitro. Não havendo acordo, requererão as partes ao órgão do
Poder Judiciário a que tocaria, originariamente, o julgamento da causa a nomeação do
árbitro, aplicável, no que couber, o procedimento previsto no art. 7o desta Lei.
§ 3o As partes poderão, de comum acordo, estabelecer o processo de escolha dos árbitros,
ou adotar as regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada.
§ 4o Sendo nomeados vários árbitros, estes, por maioria, elegerão o presidente do tribunal
arbitral. Não havendo consenso, será designado presidente o mais idoso.
§ 4o As partes, de comum acordo, poderão afastar a aplicação de dispositivo do regula-
mento do órgão arbitral institucional ou entidade especializada que limite a escolha do
árbitro único, coárbitro ou presidente do tribunal à respectiva lista de árbitros, autorizado
o controle da escolha pelos órgãos competentes da instituição, sendo que, nos casos de
impasse e arbitragem multiparte, deverá ser observado o que dispuser o regulamento apli-
cável.
§ 5o O árbitro ou o presidente do tribunal designará, se julgar conveniente, um secretário,
que poderá ser um dos árbitros.
§ 6o No desempenho de sua função, o árbitro deverá proceder com imparcialidade, inde-
pendência, competência, diligência e discrição.
§ 7o Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral determinar às partes o adiantamento de verbas
para despesas e diligências que julgar necessárias

E no que diz respeito ao impedimento do árbitro, preveem os art. 14 a 16 da referida lei:

108
1ª Fase | 41° Exame da OAB
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Art. 14. Estão impedidos de funcionar como árbitros as pessoas que tenham, com as par-
tes ou com o litígio que lhes for submetido, algumas das relações que caracterizam os
casos de impedimento ou suspeição de juízes, aplicando-se-lhes, no que couber, os mes-
mos deveres e responsabilidades, conforme previsto no Código de Processo Civil.
§ 1o As pessoas indicadas para funcionar como árbitro têm o dever de revelar, antes da
aceitação da função, qualquer fato que denote dúvida justificada quanto à sua imparciali-
dade e independência.
§ 2o O árbitro somente poderá ser recusado por motivo ocorrido após sua nomeação. Po-
derá, entretanto, ser recusado por motivo anterior à sua nomeação, quando:
a) não for nomeado, diretamente, pela parte; ou
b) o motivo para a recusa do árbitro for conhecido posteriormente à sua nomeação.
Art. 15. A parte interessada em arguir a recusa do árbitro apresentará, nos termos do art.
20, a respectiva exceção, diretamente ao árbitro ou ao presidente do tribunal arbitral, de-
duzindo suas razões e apresentando as provas pertinentes.
Parágrafo único. Acolhida a exceção, será afastado o árbitro suspeito ou impedido, que
será substituído, na forma do art. 16 desta Lei.
Art. 16. Se o árbitro se escusar antes da aceitação da nomeação, ou, após a aceitação,
vier a falecer, tornar-se impossibilitado para o exercício da função, ou for recusado, assu-
mirá seu lugar o substituto indicado no compromisso, se houver.
§ 1o Não havendo substituto indicado para o árbitro, aplicar-se-ão as regras do órgão ar-
bitral institucional ou entidade especializada, se as partes as tiverem invocado na conven-
ção de arbitragem.
§ 2o Nada dispondo a convenção de arbitragem e não chegando as partes a um acordo
sobre a nomeação do árbitro a ser substituído, procederá a parte interessada da forma
prevista no art. 7o desta Lei, a menos que as partes tenham declarado, expressamente,
na convenção de arbitragem, não aceitar substituto.

Art. 17: os árbitros, quando no exercício de


suas funções ou em razão delas, ficam
equiparados aos funcionários públicos, para os
efeitos da legislação penal.

Árbitro
Art. 18: o árbitro é juiz de fato e de direito,e a
sentença que proferir não fica sujeita a recurso
ou a homologação pelo Poder Judiciário.

4.16.7.7. Instituição do procedimento de arbitragem


Considera-se instituída a arbitragem quando aceita a nomeação pelo árbitro, se for único,
ou por todos, se forem vários (art. 19, da Lei de Arbitragem). Uma vez constituída e enten-
dendo o árbitro ou o tribunal arbitral que há necessidade de explicitar questão disposta na con-
venção de arbitragem, deverá ser elaborado, juntamente com as partes, adendo firmado por
todos, que passará a fazer parte integrante da convenção de arbitragem (§ 1o do Art. 19).
A recusa de assinatura na “ata de missão” estipulada no artigo anteriormente mencionado
não significa que a arbitragem não poderá se desenvolver.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Judicialização do
procedimento arbitral
(calendarização Art. 190 e 191 do CPC
Procedimento arbitral

procedimental)

A convenção arbitral definirá


o procedimento adotado,
respeitando os limites do art.
21, §2º da LBA O procedimento arbitral não
O mais comum é que a
está sujeito às normas do
CPC. Assim, as partes convenção remete às regras
de entidades
podem, com total liberdade,
administradoras ou às
Regra de ouro fixar asregras aplicáveis.
regras da UNCITRAL
Caso as partes não
(United Nations Commission
estipulem procedimento,
presume-se que delegaram Oninternational Trade Law)
para arbitragens ad hoc.
aos árbitros.

4.16.7.8. Três momentos do procedimento


• Instauração da arbitragem;
• Organização da arbitragem;
• Desenvolvimento da arbitragem.

Etapa preliminar: é a provocação da outra partesobre o conflito, com o intuito


de instaurar a arbitragem, e a tomada de providências para indicação e
nomeação do árbitro quando for o caso. Tem seu êxito na aceitação do árbitro
indicado ou nomeado.

Alegações iniciais: o reclamante apresenta, detalhadamente, a fundamentação


Instauração da

pertinente à sustentação de seus alegados direitos e específica os respectivos


arbitragem

pedidos.

Atos processuais: as manifestações das partes são escritas, acompanhadas de


documentos, sem exigências formais ou burocráticas. Admite-se, ainda, quando
convencionado ou regulado pela entidade, o peticionamento eletrônico, mantendo
virtual todo o procedimento.

Intimações e comunicações: normalmente são feitas por envio de carta


registrada ao escritório do advogado ou através de entrega pessoal. As decisões
interlocutórias do árbitro são designadas, geralmente, por ordem processual.
Raramente são feitos despachos de expediente, visto que o procedimento tende a
correr de forma espontânea.

O procedimento arbitral depende da vontade das partes para ser instaurado. As partes
precisam, voluntariamente, pactuar que a lide seja apreciada pelo juízo arbitral, abdicando da via
judicial.

110
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

As partes também possuem a faculdade de indicar o(s) árbitro(s), o local da arbitragem,


de optar pela arbitragem institucional ou ad hoc, de escolher as regras de direito a serem empre-
gadas no caso, se a arbitragem será de direito ou de equidade e o procedimento a ser apli-
cado. Inclusive, podem modificar o que estabeleceram, contanto que com mútuo consentimento.
O poder conferido ao árbitro emana da lei, e não da vontade das partes.

4.16.7.9. Liberdade para determinar as regras


Convenção arbitral definirá o procedimento adotado respeitando os limites do art. 21, § 2 o,
da L.A.
Art. 21. A arbitragem obedecerá ao procedimento estabelecido pelas partes na convenção
de arbitragem, que poderá reportar-se às regras de um órgão arbitral institucional ou enti-
dade especializada, facultando-se, ainda, às partes delegar ao próprio árbitro, ou ao tribu-
nal arbitral, regular o procedimento. [...]
§ 2o Serão, sempre, respeitados no procedimento arbitral os princípios do contraditório, da
igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento.

Judicialização do procedimento arbitral – arts. 190 e 191 (calendarização procedimental)


do CPC, que aproveitou o conceito de liberdade procedimental da arbitragem:

Art. 190, CPC. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito
às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às es-
pecificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres
processuais, antes ou durante o processo.
Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções
previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de
inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em mani-
festa situação de vulnerabilidade.
Art. 191, CPC. De comum acordo, o juiz e as partes podem fixar calendário para a prática
dos atos processuais, quando for o caso.
§ 1o O calendário vincula as partes e o juiz, e os prazos nele previstos somente serão
modificados em casos excepcionais, devidamente justificados.
§ 2o Dispensa-se a intimação das partes para a prática de ato processual ou a realização
de audiência cujas datas tiverem sido designadas no calendário.

4.16.7.10. Princípios impositivos


A possibilidade de as partes disciplinarem o procedimento arbitral ou, em caráter supletivo,
o tribunal ou os árbitros, não significa que possam fazê-lo de forma absolutamente livre.
Alguns princípios devem ser observados sob pena de nulidade do procedimento arbitral
(“Art. 32. É nula a sentença arbitral se: [...] VIII – forem desrespeitados os princípios de que trata
o art. 21, § 2o, desta Lei”).
São princípios que decorrem da CF como garantia mínima aos litigantes em qualquer es-
pécie de processo, seja judicial ou não.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Princípio do contraditório e ampla defesa (art. 5o, LV, da CF e art. 21, § 2o, da Lei de
Arbitragem).

Princípios impositivos

Devem ser
observados, sob pena
de nulidade do
procedimento arbitral

Princípio do
contraditório e da Princípio da igualdade: Imparcialidade e
art. 5º, caput e inciso I independência jurídica
ampla defesa: arts. 5º, Livre convencimento dos árbitros: art. 5º,
LV da CF e 21, §2º da da CF XXXVII e LIII da CF
LBA

O contraditório consiste no direito que as partes têm de serem informadas a respeito dos
atos processuais e de poderem se manifestar a respeito. Esse princípio abrange a ampla de-
fesa, que representa a possibilidade dos litigantes de produzirem provas necessárias à sua de-
fesa.
Em obediência a esses princípios, o árbitro deve, necessariamente, garantir que as partes
tenham ciência dos pontos relevantes no processo e que tenham a oportunidade de se manifes-
tar.
Através da informação dos atos praticados por uma parte é que a outra poderá reagir.
Importante ressaltar que o que se protege é a oportunidade de manifestação, não havendo
afronta ao contraditório se, sabendo de seu direito, o contendor se mantiver inerte.
Deve haver cautela na comunicação dos atos processuais, ainda que seja da forma esti-
pulada pelas partes ou pela entidade arbitral, permitindo que os litigantes possam influir nas
decisões que serão tomadas. É dever do árbitro tratar de maneira igualitária as partes, sendo
imparcial e conferindo-lhes as mesmas oportunidades.
Já em relação ao livre convencimento, este corresponde à liberdade que o árbitro possui
de apreciar e avaliar as provas existentes no processo para constituir livremente a sua convicção.
Sendo a fundamentação obrigatória na sentença arbitral, o livre convencimento deve sempre ser
motivado (art. 26 da LBA).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Art. 26. São requisitos obrigatórios da sentença arbitral:


I – o relatório, que conterá os nomes das partes e um resumo do litígio;
II – os fundamentos da decisão, onde serão analisadas as questões de fato e de direito,
mencionando-se, expressamente, se os árbitros julgaram por equidade;
III – o dispositivo, em que os árbitros resolverão as questões que lhes forem submetidas
e estabelecerão o prazo para o cumprimento da decisão, se for o caso; e
IV – a data e o lugar em que foi proferida.
Parágrafo único. A sentença arbitral será assinada pelo árbitro ou por todos os árbitros.
Caberá ao presidente do tribunal arbitral, na hipótese de um ou alguns dos árbitros não
poder ou não querer assinar a sentença, certificar tal fato.

O procedimento arbitral depende da vontade das partes para ser instaurado, sendo as-
sim, as partes precisam, de forma livre, pactuar que a lide será apreciada pelo juízo arbitral,
abdicando da via judicial.
As partes também podem indicar os árbitros; o local da arbitragem; se optam por arbitra-
gem institucional ou ad hoc; podem escolher as regras de direito a serem aplicadas; se a arbi-
tragem será de direito ou de equidade; e o procedimento a ser aplicado. Nada as impede, tam-
bém, de alterar aquilo que pactuaram, com mútuo consentimento.
Não é obrigatória a participação de advogados no procedimento arbitral (art. 21, § 3 o,
LA). Sendo assim, a ausência do advogado na audiência não prejudica a realização do ato.

Art. 21, § 3o. As partes poderão postular por intermédio de advogado, respeitada, sempre,
a faculdade de designar quem as represente ou assista no procedimento arbitral.

Entretanto, pelo princípio da igualdade entre os litigantes, se um dos reclamantes se faz


representar por advogado, o árbitro deve abrir prazo para que o outro, se quiser, igualmente
nomeie procurador.

4.16.7.11. Prescrição na arbitragem


A respeito da prescrição, institui o art. 19, em seu § 2 o, da Lei de Arbitragem que “A insti-
tuição da arbitragem interrompe a prescrição, retroagindo à data do requerimento de sua instau-
ração, ainda que extinta a arbitragem por ausência de jurisdição”.

4.16.7.12. Princípio da competência-competência


Oriundo do Direito alemão, o princípio da “competência-competência” está contido no pará-
grafo único do art. 8o da LA: “Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as
questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que
contenha a cláusula compromissória”.

113
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Já em momento posterior, a matéria pode ser submetida à apreciação do juízo estatal, no


caso de uma das partes ajuizar ação visando à anulação da sentença arbitral por invalidade da
convenção. Art. 32, da LA: “É nula a sentença arbitral se: I – for nula a convenção de arbitragem”.

4.16.7.13. Efeitos
1. Dois efeitos:
a) O positivo é a concretização da jurisdição do árbitro, na medida que é ele quem
analisa, inicialmente, a viabilidade ou inviabilidade de sua atuação no processo ar-
bitral.
b) O negativo consiste no afastamento do juízo estatal dessa análise, que é poster-
gada para oportunidade posterior à sentença arbitral, nas hipóteses previstas no
art. 32 da LBA.

O princípio competência-competência é extremamente importante para a valorização da


arbitragem, pois se ao Judiciário coubesse decidir, em primeiro lugar, sobre a validade da cláu-
sula, a instauração do procedimento arbitral restaria postergada por longo período e, por vezes,
apenas com o intuito protelatório de uma das partes em esquivar-se do cumprimento da conven-
ção.
Art. 20. A parte que pretender arguir questões relativas à competência, suspeição ou im-
pedimento do árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia da con-
venção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que tiver de se manifestar,
após a instituição da arbitragem.
§ 1o Acolhida a arguição de suspeição ou impedimento, será o árbitro substituído nos ter-
mos do art. 16 desta Lei, reconhecida a incompetência do árbitro ou do tribunal arbitral,
bem como a nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, serão as par-
tes remetidas ao órgão do Poder Judiciário competente para julgar a causa.
§ 2o Não sendo acolhida a arguição, terá normal prosseguimento a arbitragem, sem pre-
juízo de vir a ser examinada a decisão pelo órgão do Poder Judiciário competente, quando
da eventual propositura da demanda de que trata o art. 33 desta Lei.

4.16.7.14. Carta arbitral


A Lei no 13.129/2015 ampliou o âmbito de atuação da arbitragem brasileira, como, por
exemplo, a possibilidade de a Administração Pública se utilizar da arbitragem para dirimir confli-
tos relativos a direitos patrimoniais disponíveis, a possibilidade da concessão de tutelas cautela-
res e de urgência pelos árbitros (art. 22-B da LBA), a oportunidade de prolação de sentenças
parciais (art. 23, § 1o, da LBA) e a utilização da carta arbitral (art. 22-C).
Art. 22-C. O árbitro ou o tribunal arbitral poderá expedir carta arbitral para que o órgão
jurisdicional nacional pratique ou determine o cumprimento, na área de sua competência
territorial, de ato solicitado pelo árbitro.

114
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Parágrafo único. No cumprimento da carta arbitral será observado o segredo de justiça,


desde que comprovada a confidencialidade estipulada na arbitragem.

A carta arbitral consiste num procedimento específico de cooperação entre a jurisdição


arbitral e estatal, por meio do qual o árbitro ou Tribunal arbitral pode solicitar a cooperação do
Poder Judiciário, na área de sua competência, para prática de determinado ato, como, por exem-
plo:
• A condução de alguma testemunha renitente;
• A efetivação de tutela de urgência ou de evidência deferida pelo árbitro;
• Ou, ainda, que um terceiro entregue documento ou coisa, bem como conceda in-
formações específicas.

De acordo o art. 260, § 3°, do CPC, a carta arbitral atenderá, no que couber, aos requisitos
a que se refere a carta de ordem, precatória e rogatória, devendo ser instruída com a convenção
de arbitragem e com as provas da nomeação do árbitro e de sua aceitação da função.
A análise do mérito e da pertinência da expedição ou não da carta será apreciada pelo
próprio juízo arbitral, sob o crivo do contraditório e de acordo com as regras do procedimento.
Ao Poder Judiciário, cabe apenas, no exercício do seu poder de império, promover direta ou sob
sua autoridade, o cumprimento das providências solicitadas .
O juízo estatal não reexamina o conteúdo da decisão arbitral, mas apenas lhe confere
efetividade como agente colaborador. Deste modo, por exemplo, não se avalia a pertinência da
oitiva da testemunha ou da necessidade de eventuais informações solicitadas aos Órgãos Públi-
cos, muito menos a adequação dessa ou daquela medida de urgência, apenas se processa seu
cumprimento.
Conforme expressamente previsto no parágrafo único do art. 22-C da LAB e no art. 189,
IV, do CPC, no “cumprimento da carta arbitral será observado o segredo de justiça, desde que
comprovada a confidencialidade estipulada na arbitragem”.
A confidencialidade da arbitragem pode ser comprovada por meio da estipulação expressa
das partes ou mediante previsão no próprio regulamento arbitral.

115
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

4.16.7.15. A revelia
Na arbitragem, à revelia representa deixar de praticar atos durante o procedimento (não
indica árbitro, ausência de defesa, falta na audiência, omissão na produção de provas etc.) e
para qualquer uma das partes (solicitante/solicitados). Art. 22, § 3 o, da LBA:

Art. 22. Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral tomar o depoimento das partes, ouvir teste-
munhas e determinar a realização de perícias ou outras provas que julgar necessárias,
mediante requerimento das partes ou de ofício. [...]
§ 3o A revelia da parte não impedirá que seja proferida a sentença arbitral.

O não comparecimento da parte para apresentar defesa durante o procedimento arbitral


não terá como efeito a sua confissão ficta. Naturalmente, haverá grave prejuízo a quem não
apresentar sua versão dos fatos e indicar as provas que as amparam. Porém, o árbitro ou tribunal
arbitral apreciarão as alegações e a prova produzida no procedimento com a ausência da parte
e julgarão o feito sem a imposta presunção de confissão.
Processo judicial (art. 344 CPC) – ausência de contestação – presumem-se verdadeiros
os fatos alegados pelo autor.

4.16.7.16. Instrução e produção de provas


O árbitro, revestido da jurisdição de juiz de fato e de direito (art. 18 da LBA), possui pode-
res instrutórios semelhantes aos conferidos ao Juiz de Direito, podendo requisitar documentos e
informações diretamente aos órgãos públicos, determinar a oitiva de testemunhas não arroladas
pelas partes, determinar vistorias e exames, e ainda aplicar regras típicas da common law, co-
lhendo depoimentos técnicos, determinar que as partes forneçam todos os documentos que en-
tender necessários para esclarecimento da controvérsia, ainda que preservado pelo sigilo (art.
22 da LBA).
Além disso, não existe previsão na LBA vinculando as partes ao CPC na ausência de
fixação de procedimento próprio. A LBA autoriza as partes a criarem as regras procedimentais
que serão aplicadas ao processo arbitral (art. 2 o, § 1o, art. 11, IV, art. 19, § 1o, e art. 21, caput e
§§ 1o e 2o).
Dessa forma, não existe previsão legal também a respeito do ônus da prova, ou seja,
quem tiver interesse pelo esclarecimento do fato é que deve produzir ou requerer a produção da
prova correspondente.

116
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

4.16.7.17. Depoimento das testemunhas


Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral tomar o depoimento das partes, ouvir testemunhas
e determinar a realização de perícias ou outras provas que julgar necessárias, mediante reque-
rimento das partes ou de ofício, conforme expresso no art. 22. Deve o depoimento das partes e
das testemunhas ser tomado em local, dia e hora previamente comunicados, por escrito, e redu-
zido a termo, assinado pelo depoente, ou a seu rogo, e pelos árbitros, de acordo com o § 1 o do
referido artigo.
O depoimento das testemunhas poderá ser realizado por meio eletrônico, se assim for
convencionado respeitado sempre o prazo de 48 horas para intimação do art. 218, § 2 o, do CPC.

4.16.7.18. Recusa de depoimento das partes


Não haverá confissão ficta (art. 385, § 1 o, do CPC) e, a respeito da recusa em prestar
depoimento, os árbitros levarão em consideração no momento do proferimento da sentença (art.
22, § 2o, L.A.).
Art. 22. Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral tomar o depoimento das partes, ouvir teste-
munhas e determinar a realização de perícias ou outras provas que julgar necessárias,
mediante requerimento das partes ou de ofício.
§ 2o Em caso de desatendimento, sem justa causa, da convocação para prestar depoi-
mento pessoal, o árbitro ou o tribunal arbitral levará em consideração o comportamento
da parte faltosa, ao proferir sua sentença; se a ausência for de testemunha, nas mesmas
circunstâncias, poderá o árbitro ou o presidente do tribunal arbitral requerer à autoridade
judiciária que conduza a testemunha renitente, comprovando a existência da convenção
de arbitragem.

4.16.7.19. Expert witness – testemunha técnica


Convocada para emitir opinião com base no seu conhecimento técnico no tema (em regra
não tem conhecimento de nada sobre o conflito).
Similar a convocação de perito para esclarecimento em audiência (art. 477, § 3 o, e 361, I
do CPC) sem ter sido apresentado laudo.

4.16.7.20. Despesas com arbitragem


Prevalece a convenção, senão será estipulado por sentença (art. 27 da L.A.).
a) Custas da entidade (taxa de administração do procedimento e instauração);
b) Despesas com diligências, reuniões, audiências, gravações;
c) Honorário(s) do(s) árbitro(s).

117
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Art. 27. A sentença arbitral decidirá sobre a responsabilidade das partes acerca das custas
e despesas com a arbitragem, bem como sobre verba decorrente de litigância de má-fé,
se for o caso, respeitadas as disposições da convenção de arbitragem, se houver.

4.16.7.21. Sentença arbitral


A sentença da arbitragem é definitiva, pondo fim ao procedimento e, em regra, não está
sujeita a recurso. Assim, se produz um título executivo.

Art. 18, LA. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita
a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário.
Art. 31, LA. A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos
efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória,
constitui título executivo.

4.16.7.22. Nulidade da sentença arbitral


Conforme previsão do art. 32 da LBA, a sentença arbitral será nula:

Art. 32. É nula a sentença arbitral se:


I – for nula a convenção de arbitragem;
II – emanou de quem não podia ser árbitro;
III – não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei;
IV – for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem;
VI – comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva;
VII – proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e
VIII – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2o, desta Lei.

De acordo com o art. 26 da LBA, são requisitos obrigatórios da sentença arbitral:

I – o relatório, que conterá os nomes das partes e um resumo do litígio;


II – os fundamentos da decisão, em que serão analisadas as questões de fato e de direito,
mencionando-se, expressamente, se os árbitros julgaram por equidade;
III – o dispositivo, em que os árbitros resolverão as questões que lhes forem submetidas
e estabelecerão o prazo para o cumprimento da decisão, se for o caso; e
IV – a data e o lugar em que foi proferida.

O parágrafo único do mesmo artigo detalha que: “a sentença arbitral será assinada pelo
árbitro ou por todos os árbitros. Caberá ao presidente do tribunal arbitral, na hipótese de um ou
alguns dos árbitros não poder ou não querer assinar a sentença, certificar tal fato”.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

4.17. Marco Legal das Startups


4.17.1. O que é uma startup e quais são suas características?
Uma startup é uma empresa que possui um modelo de negócios repetível e escalá-
vel, e que trabalha para desenvolver soluções em um cenário de incertezas. Além disso, ela
necessita de inovação para não ser considerada uma empresa tradicional.
Nesse sentido, o modelo de negócios está ligado ao valor da empresa e à sua rentabili-
dade. Ou seja, o foco do negócio é a solução para determinado problema, e essa solução
será vendida ao cliente de forma lucrativa.
Para ser uma startup, o modelo de negócios deve ser inovador, o que não significa
necessariamente algo novo, podendo vir a ser uma adaptação de um modelo de negócios já
utilizado.
Um produto repetível e escalável promete atingir um grande número de clientes e gerar
lucro de forma rápida:
a) Repetível: a empresa é capaz de entregar o mesmo produto em escala potencial-
mente ilimitada.
b) Escalável: a empresa deve crescer cada vez mais sem que isso influencie o mo-
delo de negócios.

A respeito do enquadramento de empresas startup, a Lei Complementar no 182/2021,


denominada o Marco Legal das Startups, dispõe em seu art. 4o:

Art. 4o São enquadradas como startups as organizações empresariais ou societárias, nas-


centes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a mo-
delo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados.
§ 1o Para fins de aplicação desta Lei Complementar, são elegíveis para o enquadramento
na modalidade de tratamento especial destinada ao fomento de startup o empresário indi-
vidual, a empresa individual de responsabilidade limitada, as sociedades empresárias, as
sociedades cooperativas e as sociedades simples:
I – com receita bruta de até R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais) no ano-calen-
dário anterior ou de R$ 1.333.334,00 (um milhão, trezentos e trinta e três mil trezentos e
trinta e quatro reais) multiplicado pelo número de meses de atividade no ano-calendário
anterior, quando inferior a 12 (doze) meses, independentemente da forma societária ado-
tada;
II – com até 10 (dez) anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ)
da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia; e
III – que atendam a um dos seguintes requisitos, no mínimo:
a) declaração em seu ato constitutivo ou alterador e utilização de modelos de negócios
inovadores para a geração de produtos ou serviços, nos termos do inciso IV do caput do
art. 2o da Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004; ou
b) enquadramento no regime especial Inova Simples, nos termos do art. 65-A da Lei Com-
plementar no 123, de 14 de dezembro de 2006.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

4.17.2. Diferença entre startup e empresa tradicional


Muitas pessoas têm dúvidas acerca das diferenças entre uma startup e uma empresa
tradicional. A empresa tradicional costuma focar na rentabilidade e na estabilidade a longo
prazo; tende a acumular lucros organicamente; se concentra na sobrevivência do negócio, com
fluxo estruturado e planejamento a longo prazo; cada trabalhador costuma ter suas funções bem
definidas; costuma atuar em sua zona de conforto; os sócios normalmente detêm o controle ab-
soluto do negócio; busca operar sem necessidade de grande investimento além do inicial (recei-
tas cobrem os custos e geram lucro).
Já uma startup se preocupa com o potencial de crescimento a curto e médio prazo;
objetiva crescer de forma acelerada e sustentável; foca em oportunidades para atender rapida-
mente a uma demanda; começam a operar com grupos pequenos, em que há um acúmulo de
funções entre os sócios; estimula a inovação; busca investimento externo em troca de participa-
ção no empreendimento.

4.17.3. Investidor-anjo
Segundo a Lei Complementar no 182/2021, considera-se investidor-anjo: “aquele investi-
dor que não é considerado sócio nem tem qualquer direito a gerência ou a voto na administração
da empresa, não responde por qualquer obrigação da empresa e é remunerado por seus apor-
tes”.
Muito se confunde o investidor-anjo com o sócio oculto da Sociedade em Conta de Parti-
cipação, mas a diferença é clara:
Sócio oculto é aquele que irá investir no projeto, mas sem participar da gestão da em-
presa, e possui participação nos lucros finais, sem se envolver no processo.
Investidor- anjo é aquele que irá investir no projeto da sociedade e permanecer anônimo.
Assim, a principal diferença é que o primeiro tem a opção de participar da gestão, en-
quanto o segundo só investe, sem poder se envolver na gestão da startup.

5. Títulos de Crédito

Prof.ª Cristiane Pauli


@profacrispauli

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

5.1. Títulos de crédito: princípios e atos


5.1.1. Considerações iniciais
Os títulos de crédito são os documentos necessários ao exercício do direito literal e
autônomo, que produzem efeitos desde que preencham os requisitos legais. É daí que nascem,
inclusive, os três princípios basilares aos títulos de crédito: cartularidade, literalidade e auto-
nomia, e que em breve serão estudados.
Os títulos de créditos são pautados na confiança e na boa-fé, uma vez que consistem em
um direito ao recebimento de uma prestação futura. Além disso, o Código Civil funciona como
uma teoria geral para os chamados títulos atípicos ou inominados, ou seja, para os títulos que
não possuem lei específica que os descreva, a regulação está nos arts. 887 a 926 do CC.
Por outro lado, temos os títulos típicos ou nominados, que são os que possuem lei
especial os definindo. Como exemplo de títulos típicos ou nominados, tem-se a duplicata, a letra
de câmbio, a nota promissória e o cheque. Ainda, em relação a estes, o Código Civil apenas é
aplicado em caso de lacuna na legislação especial ou quando compatível com esta.
Assim, verifica-se que as normas contidas no Código Civil são de aplicação supletiva,
destinando-se a suprir o vácuo existente no regramento jurídico específico. Ressalta-se que as
normas constantes no Código Civil não possuem o condão de afastar ou revogar a incidência do
disposto nas leis especiais.
Pode-se dizer, ainda, que a aplicação do Código Civil é apenas quando a lei cria um novo
título e não a disciplina exaustivamente, nem nomeia outra legislação cambial como fonte suple-
tiva para regê-lo.

5.1.2. Características e princípios


Conforme já mencionado, o título de crédito é documento necessário ao exercício do di-
reito literal e autônomo nele contido, somente produzindo efeitos quando preenchidos os requi-
sitos previstos na lei. A partir do conceito dos títulos de crédito, extraem-se suas principais
características. A primeira delas é a sua natureza essencialmente comercial, sendo que o
direito cambiário é conhecido como sub-ramo específico do Direito Empresarial por ser desen-
volvido com a finalidade de conferir aos títulos de crédito as prerrogativas necessárias para o
cumprimento de sua função primordial – a circulação de riqueza com segurança.
Além disso, tem-se que os títulos de crédito são documentos formais, haja vista a ne-
cessidade de observação dos requisitos essenciais previstos na legislação cambiária; são

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

considerados bens móveis, por se sujeitarem aos princípios basilares da circulação de tais
bens, como, por exemplo, o princípio que prescreve que a posse de boa-fé possui valor de pro-
priedade; são títulos de apresentação, tendo em vista serem documentos essenciais para o
exercício do direito nele previsto. Ainda, os títulos de crédito são títulos executivos extrajudi-
ciais, pois contêm obrigações líquidas e certas.

5.1.2.1. Princípio da cartularidade


O próprio conceito trazido pelo Código Civil de 2002 de que o título de crédito é um docu-
mento necessário ao exercício do direito literal nele mencionado é uma clara referência ao prin-
cípio da cartularidade, que pressupõe que, para o exercício de qualquer direito representado no
título, é imprescindível a sua posse legítima.
Assim, tem-se que o titular do crédito representado na cártula deve estar na posse
desta, sendo que este é, inclusive, o modo para comprovação da própria existência e exigibili-
dade do crédito.

5.1.2.2. Princípio da literalidade


De acordo com esse princípio, o título de crédito vale pelo que tem escrito nele, ou seja,
somente os atos que são lançados na própria cártula produzem efeitos jurídicos.
O princípio da literalidade concede segurança às partes da relação cambial da exata cor-
respondência entre o teor do título e o direito que ele representa. Assim, tem-se que o credor
pode exigir tudo o que estiver expresso na cártula, do mesmo modo que o devedor tem o direito
de pagar somente o que estiver manifesto no título.

5.1.2.3. Princípio da autonomia


Segundo o princípio da autonomia, o título de crédito é um documento constitutivo de
um direito novo, autônomo, originário e totalmente desvinculado da relação que lhe originou.
Dessa forma, evidencia-se que o direito representado em um título de crédito é autônomo
porque a sua posse legítima caracteriza a existência de um direito próprio, insuscetível a ser
contaminado por vícios de relações anteriores.
No mais, importante ressaltar dois princípios decorrentes do princípio da autonomia: o
princípio da abstração e o princípio da inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro
de boa-fé. Tais princípios são chamados por alguns autores de subprincípios, por entenderem

122
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

que estes não trazem uma ideia nova em relação à autonomia, mas apenas uma outra forma de
encará-la.
O princípio da abstração dispõe que, quando o título circula, ele se desvincula da
relação que lhe originou. Assim, tem-se que, enquanto o título está na relação cambiária que
lhe originou, existe uma vinculação entre esta relação e a origem do título, mas quando o título
é, por exemplo, endossado, a relação que originou a cártula não mais interessa.
Já o princípio da inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro de boa-fé é a exata
manifestação do princípio da autonomia. Isto porque a atuação deste princípio preceitua que o
portador do título de boa-fé não será prejudicado por eventuais vícios que a relação origi-
nária do negócio jurídico venha a ter. Os vícios constantes na relação originária apenas podem
ser considerados nesta relação cambial, entre os sujeitos participantes desta. Quando o terceiro
adquire o título, de boa-fé, este o adquire sem sujeição a vícios da relação cambiária princi-
pal. Dessa forma, o portador do título não pode ser atingido por defesas relativas ao negó-
cio jurídico do qual ele não participou.

5.1.3. Atos cambiários


Endosso, aval, protesto, saque e aceite são os principais institutos cambiários aplicáveis
aos títulos de crédito, assim, necessário estudar as particularidades de cada instituto referido.

5.1.3.1. Endosso
Esse instituto é classificado como um ato cambiário necessário para a circulação de
títulos de crédito nominais à ordem, produzindo, principalmente, dois efeitos: a) transferência
da titularidade do crédito, b) responsabilidade do endossante, que se torna devedor indi-
reto do título.
O endosso deve ser realizado no verso do título, sendo que, nesse caso, basta a assi-
natura do endossante. Contudo, caso ele seja realizado no anverso da cártula, além da assina-
tura do endossante, é obrigatório que contenha a menção expressa de que se trata de endosso,
para que assim produza seus efeitos.
O endosso deve ser total ao valor da dívida do título, dessa forma, tem-se que é vedado
o endosso parcial, sendo considerado nulo. Ainda, o endosso não pode ser subordinado a
alguma condição, sendo que, caso esta exista, será considerada não escrita, conforme disci-
plina o art. 12 da Lei Uniforme de Genebra (LUG) e o art. 912 do CC.

123
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

5.1.3.2. Endosso em branco e endosso em preto


Endosso em branco é o que não identifica o beneficiário, chamado aqui de endossa-
tário. Nessa hipótese, o endossante somente assina no verso, não identificando a quem está
endossando o título, o que, na prática, permite que o título circule ao portador, isto é, circule
por mera tradição da cártula.
Já o endosso em preto é aquele que identifica, expressamente, quem será o endos-
satário, ou seja, a quem está sendo transferida a titularidade do título. Com o endosso em preto,
o endossatário não pode colocar o título em circulação por mera tradição, tendo em vista
que é necessário que realize novo endosso, seja ele em preto ou em branco, assumindo, assim,
a qualidade de codevedor da dívida constante no título.

5.1.3.3. Endosso impróprio


Endosso impróprio é aquele que não produz os principais efeitos do endosso (trans-
ferência da titularidade do crédito e responsabilização do endossante), tendo como finalidade,
apenas, a legitimação da posse de alguém sobre o título. O endosso impróprio pode ser en-
dosso-mandato e endosso-caução.
Endosso-mandato (ou endosso-procuração) é aquele em que o endossante confere
poderes ao endossatário (como, por exemplo, poderes de representação em nome do endos-
sante, podendo cobrar o título, protestá-lo, executá-lo etc.). Esta modalidade de endosso possui
previsão no art. 18 da LUG e no art. 917 do CC.
O endosso-caução (ou endosso-pignoratício ou endosso-garantia) caracteriza-se
quando o endossante transmite o título como forma de garantia de uma dívida contraída perante
o endossatário. Nesta hipótese de endosso, o endossatário não assume a titularidade do crédito,
apenas fica na posse do título como forma de garantia da dívida que o endossante contraiu
perante ele. Se a dívida for adimplida, o endossante resgata o título; caso a dívida não seja paga,
o endossatário pode executar a garantia, assumindo a titularidade total do título. O endosso-
caução está disciplinado no art. 19 da LUG e no art. 918 do CC.

5.1.3.4. Endosso póstumo ou tardio


O endosso póstumo ou tardio é disciplinado pelo art. 20 da LUG e também pelo Código
Civil junto ao art. 920. Evidencia-se que o endosso pode ser dado após o vencimento do título,
produzindo os efeitos de transferência do crédito e responsabilização do endossante

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

normalmente. Contudo, percebe-se que, no caso de o endosso ser realizado após o protesto do
título ou, após o prazo para protesto, este apenas valerá como cessão civil de crédito. Por fim,
tem-se que se presume realizado, antes do prazo para protesto, o endosso sem data.

5.1.3.5. Aval
O aval, por sua vez, é um ato cambiário pelo qual um terceiro, chamado aqui de avalista,
se responsabiliza pelo adimplemento da obrigação constante no título. Neste caso, o avalista
garante o cumprimento da obrigação do avalizado, respondendo, assim, de forma equiparada a
este. Tal instituto possui previsão no art. 30 da LUG e no art. 897 do CC.
O aval deve ser realizado no anverso do título, bastando apenas a assinatura do ava-
lista, porém, e caso o aval seja realizado no verso da cártula, além da assinatura do avalista,
é necessária a menção expressa de que se trata de aval.
Os avais simultâneos, também chamado de coavais, ocorrem quando duas ou mais pes-
soas avalizam um título conjuntamente, como forma de garantir a mesma obrigação cambial. A
responsabilidade assumida pelos avalistas nos avais simultâneos é solidária, razão pela qual o
avalista que adimplir a obrigação integralmente ao credor possui o chamado direito de regresso
contra os demais coavalistas apenas em relação à sua parte. Ou seja, caso sejam dois avalistas
e um pagou a totalidade da dívida, surge a este o direito de regresso contra o outro, apenas em
relação a metade da dívida.
Já os avais sucessivos, também conhecidos como aval do aval, acontecem quando al-
guém avaliza outro avalista. Nesta situação, todos os avalistas dos avalistas possuem a mesma
responsabilidade do avalizado, sendo que o avalista que pagar a totalidade da obrigação possui
direito de regresso em relação ao total da dívida em face dos demais.
Ademais, importante referir sobre o aval parcial. Este ocorre quando o avalista se respon-
sabiliza por parte do adimplemento da obrigação constante no título, por conseguinte, garantindo
apenas uma parte do cumprimento da obrigação do avalizado.
Como regra, o aval parcial é vedado (art. 897, parágrafo único, do CC). Contudo, este é
admitido caso haja expressa previsão legal na legislação especial. Neste sentido, temos que a
LUG prevê, em seu art. 30, a possibilidade de aval parcial para a letra de câmbio e a nota pro-
missória, enquanto a Lei do Cheque o prevê junto ao seu art. 29.
Já quanto à duplicata e considerando que sua legislação específica (Lei n o 5.474/1968) é
omissa quanto à possibilidade ou não de aval parcial, esta segue a regra geral do Código Civil,
ou seja, na duplicata não é permitido o aval parcial.

125
1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

5.1.4. Protesto
O protesto pode ser definido como o ato formal através do qual se atesta um fato relevante
para a relação cambial. O fato relevante pode ser: a) a falta de aceite do título; b) a falta de
devolução do título; ou c) a falta de pagamento do título.
No caso de protesto por ausência de aceite, este somente poderá ser efetuado antes do
vencimento da obrigação e após o decurso do prazo legal para aceite ou devolução. Se o pro-
testo for feito após o vencimento da obrigação, somente será efetuado por falta de pagamento.
Vejamos o que disciplina o art. 21 da Lei no 9.492/1997.
O protesto, em regra, apenas é indispensável se o credor quiser executar os codeve-
dores do título, como, por exemplo, os endossantes, razão pela qual se diz que o protesto
garante o direito de regresso em face dos devedores indiretos do título. Por outro lado, caso
o credor deseje executar apenas o devedor principal do título, o protesto se torna desneces-
sário.

5.1.4.1. Saque
O saque é a emissão de um título de crédito, ou seja, é a sua criação. Assim, quem realiza
a emissão do título é chamado de sacador. Nas diferentes espécies de títulos de créditos típicos
ou nominados, a figura do saque pode dar origem a situações jurídicas distintas, o que estuda-
remos em outro momento.

5.1.4.2. Aceite
O aceite é o ato por meio do qual o sacado assume a obrigação cambial, se tornando o
devedor principal do título. O aceite ocorre apenas em títulos típicos ou nominados que estrutu-
ram uma ordem de pagamento, como é o caso da letra de câmbio e da duplicata.
O aceite pode ser facultativo, como ocorre na letra de câmbio, sendo que, após realizado
o aceite, ele se torna irretratável ou obrigatório, como ocorre na duplicata, salvo exceções que
serão tratadas em ponto específico.
Pelo fato de o aceite na duplicata ser obrigatório, ele pode ser expresso (ordinário) ou
presumido (por presunção). Além disso, na letra de câmbio, o aceite pode ser limitativo, por meio
do qual o sacado aceita apenas parte do valor do título ou, modificativo, que ocorre quando o
sacado altera alguma condição de pagamento do título.

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Direito Empresarial

5.2. Títulos de crédito: letra de câmbio


5.2.1. Letra de câmbio
A letra de câmbio possui sua regulamentação específica na Lei Uniforme de Genebra –
LUG, sendo que se estrutura como ordem de pagamento. Por esta razão, em relação ao saque
da letra, ao ser emitida, a letra de câmbio dá origem a três situações jurídicas distintas: a) a
do sacador, que emite a ordem; b) a do sacado, a quem a ordem é destinada, e c) a do tomador,
que é o beneficiário da ordem.
Em relação às três situações jurídicas distintas referidas, é importante ressaltar que não
precisam, necessariamente, ser ocupadas por três pessoas diferentes. Neste sentido, o art.
3o da LUG admite que a letra seja sacada: a) à ordem do próprio sacador; b) sobre o próprio
sacador; e c) por ordem e conta de terceiro.
É admitida a emissão da letra de câmbio e de qualquer outro título de crédito, em branco
ou incompleta, podendo ser completada pelo credor de boa-fé antes da cobrança ou do protesto
da cártula, nos termos da Súmula n o 387 do Supremo Tribunal Federal. Vejamos: “a cambial
emitida ou aceita com omissões, ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-fé antes
da cobrança ou do protesto”.
Na letra de câmbio, o aceite é um ato facultativo para o sacado. Contudo, após realizado,
se torna irretratável. Assim, como o aceite é uma faculdade do sacado, ele pode simplesmente
recusá-lo, sem precisar se justificar. A recusa do aceite produz efeitos relevantes para o sacador
e para o tomador, uma vez que ocorrerá o vencimento antecipado do título. Com o vencimento
antecipado do título, surge ao tomador a possibilidade de exigir o pronto pagamento do título do
sacador, eis que é codevedor da letra.
Ainda o sacado pode aceitar parcialmente a letra, caso em que ocorrerá a recusa parcial
desta. Há duas espécies de aceite parcial: a) aceite limitativo, através do qual o sacado aceita
apenas parte do valor do título, e b) aceite modificativo, por meio do qual o sacado altera alguma
condição de pagamento do título, como, por exemplo, o seu vencimento. Nos casos de aceite
parcial da letra, igualmente ocorre o vencimento antecipado do título, podendo o tomador
cobrar a totalidade do crédito do sacador.
Percebe-se assim que, ao emitir uma letra de câmbio, o sacador corre o risco de, antes
mesmo do seu vencimento, ter que pagá-la, caso o sacado não aceite a letra, total ou parcial-
mente. Contudo, há uma possibilidade para o sacado se prevenir quanto ao vencimento anteci-
pado da letra: colocar no título a cláusula não aceitável, conforme prevê o art. 22 da LUG.

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Como visto, a cláusula não aceitável impõe ao tomador a obrigação de só procurar o sa-
cado para o aceite na data do vencimento da cártula. Tal cláusula se perfaz em verdadeira ga-
rantia ao sacador de que não será surpreendido com o vencimento antecipado do título.
No que se refere ao prazo de protesto da letra de câmbio, o art. 44 da LUG nos traz essa
definição. Assim, temos dois prazos distintos para protesto: a) em caso de recusa de aceite ou
b) em caso de falta de pagamento. Em relação ao protesto por recusa de aceite, tem-se que o
protesto pode ser realizado ainda no prazo de apresentação do título ou até o primeiro dia útil
subsequente ao término do prazo ou da recusa, que gera o vencimento antecipado. Já no se-
gundo caso, protesto por falta de pagamento, o prazo é de até dois dias úteis contados do ven-
cimento do título.
Ressalta-se que, caso o credor perca o prazo para realizar o protesto, em consequência
este perde o direito de cobrar os coobrigados.
No mais, o prazo prescricional para ação de execução da letra de câmbio é determi-
nado pelo art. 70 da LUG, sendo: a) três anos contra o devedor principal (sacado), contados da
data de vencimento; b) um ano contra os codevedores (sacador e endossantes), contados da
data do protesto e, c) seis meses, a contar do dia do pagamento, quando for o caso de exercício
de direito de regresso entre codevedores.
O prazo para ajuizamento de ação monitória em face do emitente é de cinco anos, conta-
dos a partir do dia seguinte ao vencimento do título, de acordo o que dispõe a Súmula n o 504 do
Superior Tribunal de Justiça, aqui utilizada por analogia: “O prazo para ajuizamento de ação
monitória em face do emitente de nota promissória sem força executiva é quinquenal, a contar
do dia seguinte ao vencimento do título”.
Ademais, quanto ao prazo para interposição de ação de cobrança em face do sacador ou
do aceitante, este dependerá da causa que deu origem ao título, podendo ser utilizado o prazo
de dez anos, de acordo com o art. 205 do CC ou os prazos fixados junto ao art. 206 do mesmo
diploma legal.

5.3. Títulos de crédito: nota promissória e duplicata


5.3.1. Nota promissória
A nota promissória, assim como a letra de câmbio, possui sua regulamentação especí-
fica na Lei Uniforme de Genebra – LUG, sendo que se estrutura como uma promessa de
pagamento. Por esta razão, em relação ao saque da letra, ao ser emitida, a nota promissória
dá origem a duas situações jurídicas distintas: a) a do sacador ou promitente (chamado na

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LUG de subscritor), que é quem emite a nota e promete pagar determinada quantia a alguém,
e b) a do tomador, em favor de quem a nota é emitida e que receberá a importância prometida.
Assim como a letra de câmbio, a nota promissória deve atender aos requisitos essenci-
ais previstos em lei para que possua valor como título de crédito. Tais requisitos possuem
previsão no art. 75 da LUG, sendo eles: a) a expressão nota promissória, que é uma cláusula
cambiária; b) uma promessa incondicional de pagamento de quantia determinada; c) o
nome do tomador; d) a data do saque; e) a assinatura do sacador; e f) o lugar do saque ou
a menção de um lugar junto ao nome do sacador.
Verifica-se, assim, que a nota promissória se submete ao mesmo regime jurídico da letra
de câmbio. Contudo, ambos os títulos de crédito possuem suas distinções. Primeiramente, a
letra de câmbio se estrutura como ordem de pagamento, enquanto a nota promissória é uma
promessa de pagamento. Dessa forma, não se aplicam em face da nota promissória as regras
sobre o aceite (cláusula não aceitável, prazo de respiro, vencimento antecipado por recusa do
aceite etc.).
Vale ressaltar que o prazo de prescrição para a interposição de ação de execução em
face do sacador é igual ao da letra em relação ao aceitante: três anos contados do venci-
mento (art. 70 da LUG). Se a execução for em face do endossante, o prazo é de um ano, con-
tado da data do protesto tempestivo ou do vencimento, se o protesto for dispensado, e de
seis meses, a contar do dia do pagamento, quando for o caso de exercício de direito de
regresso entre codevedores.
Ademais cumpre mencionar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre a acei-
tação de propositura de ação monitória para a nota promissória prescrita. Vejamos o que prevê
a Súmula no 504 do Superior Tribunal de Justiça: “O prazo para ajuizamento de ação monitória
em face do emitente de nota promissória sem força executiva é quinquenal, a contar do dia se-
guinte ao vencimento do título”.
Verifica-se assim que, apesar de prescrita a nota promissória, perdendo, assim, sua
força executiva, o credor desta ainda pode requerer o seu pagamento no prazo de cinco anos
a contar do dia seguinte ao vencimento do título.
Já quanto ao prazo para interposição de ação de cobrança em face do sacador, este,
igualmente como ocorre na letra de câmbio, dependerá da causa que deu origem ao título,
podendo ser utilizado o prazo de dez anos, de acordo com o art. 205 do CC ou os prazos fixa-
dos junto ao art. 206 do mesmo diploma legal.

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Relativamente ao prazo para protesto da nota promissória, tem-se que é de dois dias
úteis após a recusa de pagamento ou do seu vencimento. Além disso, como já frisado acerca
da letra de câmbio, para que possam ser vinculados os coobrigados, o protesto é indispen-
sável.
Ademais, e nos termos da Súmula no 258 do Superior Tribunal de Justiça “a Nota Promis-
sória vinculada a contrato de abertura de crédito não goza de autonomia em razão da iliquidez
do título que a originou”.

5.3.2. Duplicata
A duplicata possui sua regulamentação específica na Lei no 5.474/1968 – Lei das Dupli-
catas, sendo um título causal, isto é, só pode ser emitida para documentar determinadas relações
jurídicas pré-estabelecidas por sua legislação, sendo elas: a) uma compra e venda mercantil ou
b) um contrato de prestação de serviços.
A questão de a duplicata ser um título causal não retira dela a aplicação do princípio da
abstração, sendo assim, a duplicata, igualmente aos demais títulos em espécie, se desvincula
do negócio jurídico que lhe deu origem após ser aceita. A causalidade da duplicata significa tão
somente que ela só pode ser emitida nas causas em que a lei admite expressamente a sua
emissão. Em caso de ser posta em circulação através de endosso, o sacado não pode opor ao
terceiro de boa-fé exceções pessoais que possui contra o sacador.
Na prática, a duplicada mais utilizada é a que representa uma compra e venda mercan-
til. Frisa-se que o Superior Tribunal de Justiça já decidiu a nulidade da duplicata emitida em
contrato de leasing.
Em relação às posições jurídicas existentes na duplicata, temos o sacado, que é o de-
vedor, podendo ser um comprador ou um tomador de serviços, e o sacador, que é o credor,
o qual pode ser um vendedor ou um prestador de serviços.
Além de ser um título causal, a duplicata é um título de modelo vinculado, ou seja, sua
emissão deve obedecer aos padrões fixados pelo Conselho Monetário Nacional. Percebe-
se que, diferentemente do que ocorre com as notas promissórias e as letras de câmbios, as
duplicatas somente podem ser emitidas com dia certo ou à vista, sendo vedada sua emis-
são com vencimento a certo termo da vista e a certo termo da data.
Após sua emissão, obedecendo aos requisitos anteriormente listados, a duplicata deve
ser enviada ao sacado para que ele a pague (duplicata à vista) ou a aceite e devolva (duplicata
a prazo).

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Ademais, importa referir que a duplicata é um título estruturado como ordem de paga-
mento, sendo que seu aceite é obrigatório, isto é, emitido o título, com base na fatura ou nota
fiscal que documenta a venda, o sacado é obrigado a aceitá-lo. Além disso, ainda que o sacado
não assine o título, aceitando-o expressamente, assumirá a obrigação que nele consta.
Contudo, explica-se que o aceite obrigatório da duplicata não significa aceite irrecu-
sável. A obrigatoriedade do aceite neste título significa que, caso o sacado o recuse, este deve
apresentar uma justificativa plausível para tanto. E é neste sentido que disciplinam os arts. 8 o
e 21 da Lei das Duplicatas.
Assim, após a realização da remessa do título, cabe ao sacado aceitar a duplicata e de-
volvê-la, salvo se tiver razões para recusá-la (conforme já mencionado anteriormente), caso em
que deve fazê-lo de forma escrita e justificada, de acordo com o que prevê o art. 7o da Lei das
Duplicatas.
Art. 7o. A duplicata, quando não for à vista, deverá ser devolvida pelo comprador ao apre-
sentante dentro do prazo de 10 (dez) dias, contado da data de sua apresentação, devida-
mente assinada ou acompanhada de declaração, por escrito, contendo as razões da falta
do aceite.
§ 1o Havendo expressa concordância da instituição financeira cobradora, o sacado poderá
reter a duplicata em seu poder até a data do vencimento, desde que comunique, por es-
crito, à apresentante o aceite e a retenção.
§ 2o A comunicação de que trata o parágrafo anterior substituirá, quando necessário, no
ato do protesto ou na execução judicial, a duplicata a que se refere.

Frisa-se que, considerando que o aceite no regime da duplicata é obrigatório, ele inde-
pende de ser expresso, ou seja, neste título de crédito o aceite pode ser expresso – ordinário –
ou presumido – por presunção.
O aceite expresso é aquele realizado na própria cártula, no local indicado para tanto. Já o
aceite presumido ocorre quando o devedor recebe, sem reclamação, as mercadorias adquiridas
e enviadas pelo credor. Neste caso, o simples fato de o devedor receber as mercadorias sem
recusa formal já caracteriza o aceite do título. Atualmente, na prática, a regra é a utilização do
aceite presumido.
Ademais, tem-se ainda um terceiro tipo de aceite, o aceite por declaração ou comunica-
ção. Tal modalidade é feita por uma instituição financeira ou pelo próprio devedor, sendo reali-
zada através de uma assinatura que declara o aceite.
A principal diferença entre o aceite expresso e o presumido ocorre quando da execução
da duplicata. A duplicata com aceite expresso é um título de crédito perfeito e acabado, podendo
ser executada sem a exigência de maiores formalidades, bastando a apresentação do título. Já
para a execução de duplicata aceita por presunção, além da apresentação do título, são

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necessários o protesto (mesmo que a execução seja dirigida contra o devedor principal) e o
comprovante de entrega das mercadorias, conforme preceitua o art. 15 da Lei das Duplicatas.
Em relação ao pagamento da duplicata, como já vimos, este pode ser dar à vista ou a
prazo. Quanto o pagamento for realizado a prazo, pode ser emitida uma duplicata única, dis-
criminando todas as parcelas e seus vencimentos, ou uma série de duplicatas, uma para cada
prestação, distinguindo-as por letras do alfabeto (art. 2o, § 3o, da Lei das Duplicatas).
Relativamente ao protesto da duplicata, tem-se que este pode ser realizado por três ra-
zões: a) por falta de aceite; b) por falta de devolução do título; ou c) por falta de pagamento,
conforme disciplina o art. 13 da Lei das Duplicatas.
No caso da especificação contida no § 1o do art. 13 do já referido dispositivo legal, tem-se
que o protesto por indicações é realizado quando há a retenção (não devolução) do título
por parte do sacado (comprador/devedor). Nesta situação, o sacador (vendedor/credor) não
possui o título em sua posse, motivo pelo qual deve fornecer ao cartório de protesto de títulos
as indicações da duplicata emitida, retiradas da fatura e do Livro de Registro de Duplicatas
(art. 19, Lei das Duplicatas).
Ademais, a ação de execução da duplicata prescreve em: a) três anos, a contar do
vencimento do título, contra o devedor principal e seus avalistas; b) um ano, do protesto
ou do vencimento (quando dispensado o protesto), contra os codevedores e seus avalis-
tas; e c) um ano, para ação de regresso contra os codevedores, a contar do dia em que
pagou o título ou foi acionado, nos termos do art. 18 da Lei das Duplicatas.
Já quanto ao prazo para propositura de ação monitória em face do sacado, temos que
é de cinco anos, conforme preceitua a Súmula no 504 do Superior Tribunal de Justiça (utilizada
por analogia) e o art. 206, § 5 o, I do CC. Com isso, segundo a súmula n o 504, tem-se o prazo
para ajuizamento de ação monitória em face do emitente de nota promissória sem força execu-
tiva é quinquenal, a contar do dia seguinte ao vencimento do título.
No que se refere ao prazo para ajuizamento de ação de cobrança em face do sacado,
tem-se que é de dez anos a contar do vencimento do título, nos termos do art. 205 do CC.

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5.3.2.1. Duplicata escritural ou duplicata virtual


A duplicata escritural ou virtual ou, ainda, eletrônica possui regulamentação junto à
Lei no 13.775/2018, que entrou em vigor em 20-04-2019, após os seus cento e vinte dias de
vacatio legis (art. 13 da referida lei).
Esse modelo de duplicata é emitido “mediante lançamento em sistema eletrônico de es-
crituração gerido por quaisquer das entidades que exerçam a atividade de escrituração de dupli-
catas escriturais”, conforme dispõe seu art. 3o, sendo que tais entidades devem ser autorizadas
por órgão ou entidade da administração federal direta ou indireta a exercer essa atividade.

5.4. Títulos de crédito: cheque


5.4.1. Cheque
O cheque possui sua regulamentação específica na Lei no 7.357/1985 – Lei do Cheque,
sendo que se estrutura como ordem de pagamento à vista emitida contra um banco, em
razão dos fundos que o emitente tem naquela instituição financeira. Além disso, o cheque é um
título de modelo vinculado, haja vista que só pode ser classificado como cheque o documento
emitido pelo banco, em talonário específico, com uma numeração própria, seguindo os pa-
drões fixados pelo Banco Central do Brasil.
Em relação às posições jurídicas existentes no cheque, tem-se a figura do sacador, que
é quem emite o título, a figura do sacado, que é a instituição financeira que deverá pagar a
quantia constante no título, e o tomador, que é o beneficiário da importância contida na cártula.
O cheque, assim como os títulos de crédito já estudados (letra de câmbio e nota promis-
sória), possui requisitos essenciais que devem ser observados. Neste sentido, a Lei do Cheque
dispõe em seu art. 1o que o cheque deve conter: a) a expressão cheque, que é uma cláusula
cambiária; b) uma ordem incondicional de pagamento de quantia determinada; c) o nome da
instituição financeira contra quem foi emitido (sacado); d) a data do saque; e) o lugar do saque
ou a menção de um lugar junto ao emitente; f) a assinatura do próprio emitente (sacador).
Importante mencionar que, como o cheque é uma ordem de pagamento à vista, a data
do saque deveria ser sempre aquela em que o título é emitido. Contudo, como sabemos, na
prática já se consolidou a utilização do cheque “pré-datado”, no qual o sacador indica uma
data posterior à sua emissão para pagamento do título. A jurisprudência entende que nesta
hipótese há um acordo entre as partes, sendo que a apresentação antecipada do cheque “pré-

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datado” configura dano moral, de acordo com o previsto na Súmula n o 370 do Superior Tribunal
de Justiça.
Além disso, deve constar no cheque o local de sua emissão, que deve ser o mesmo
onde o emitente se encontra no momento de seu preenchimento. Tal informação é de suma
importância, pois irá determinar a duração do prazo de apresentação do título ao banco sa-
cado, conforme estudaremos em breve. No mais, a assinatura do emitente é fundamental,
sendo que esta será conferida pela instituição financeira antes de efetuar o pagamento da cár-
tula.
Por se tratar de um título de crédito, o cheque possui implícita a cláusula à ordem, o que
admite sua circulação via endosso. Contudo, o sacador do cheque pode fazer constar, expres-
samente, a cláusula não à ordem, caso em que fica impedida sua circulação via endosso,
não impedindo, entretanto, que este circule via cessão civil de crédito. Neste caso, a circula-
ção da cártula não se submete às regras do regime jurídico cambiário, mas sim do regime
jurídico civil.
Esclarece-se, ainda, que, em caso de circulação do título via cessão civil de crédito, o
cessionário não possui imunidade em relação às exceções pessoais que o emitente venha
a suscitar, ainda que seja um terceiro de boa-fé.
No mais, há algumas modalidades específicas de cheque, dispostas na legislação es-
pecial. A primeira a ser citada é o cheque cruzado, que possui previsão junto aos arts. 44 e 45
da Lei do Cheque.
Como sabemos, o cheque cruzado é muito utilizado na prática comercial. “Cruzar” um
cheque significa fazer dois traços transversais e paralelos no anverso do título. A finalidade
deste cruzamento é justamente trazer segurança à liquidação de cheques ao portador, tendo
em vista que o cheque cruzado só pode ser pago a um banco ou a um cliente de banco,
através de crédito em conta, evitando seu desconto na “boca do caixa”.
Ademais, o cruzamento pode ser realizado em branco ou em preto. No cruzamento em
branco – também conhecido como cruzamento geral – apenas são apostos os dois traços no
título, podendo ser mencionada a expressão “banco” entre os traços. Já no cruzamento em
preto – também chamado de cruzamento especial –, além da aposição dos dois traços, é
mencionado um banco entre estes (coloca-se o nome da instituição financeira ou seu número
junto ao Banco Central), o que faz com que o cheque apenas possa ser pago ao banco identi-
ficado ou a um cliente deste, mediante crédito em conta-corrente.

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A lei específica do cheque disciplina também o cheque visado, junto ao seu art. 7o. O
cheque visado é aquele em que o banco confirma, mediante assinatura no verso do título,
que o sacado possui fundos suficientes para o pagamento do valor referenciado na cártula.
De acordo com o que a lei preceitua, somente o cheque nominativo que ainda não tiver sido
endossado pode receber o visto do banco.
Após visar um cheque, o banco garante que o sacador possui fundos e assegura o
pagamento do título durante o prazo de apresentação. Salienta-se que o visto dado pelo
banco não se confunde com um aceite, não implicando nenhuma assunção de obrigação
cambial por parte do banco, nem exonerando o emitente e eventuais codevedores (endos-
sante, por exemplo) da responsabilidade pelo pagamento do título.
O cheque administrativo é previsto no inciso III do art. 9o da Lei do Cheque, sendo emi-
tido por um banco contra ele mesmo, para ser liquidado em uma de suas agências. Nesta
modalidade, o banco é o emitente e o sacado, ao mesmo tempo.
Por fim, a lei ainda menciona o cheque para ser creditado em conta, junto ao seu art.
46. Nesta espécie de cheque, o sacado não pode pagar o título em dinheiro, por expressa
vedação exposta no anverso do título pelo sacado. Tal vedação consiste na expressão “para
ser creditado em conta” (de acordo com o que a lei preceitua) ou da menção ao número da
conta do beneficiário entre os traços de cruzamento (como é realizado na prática). Neste
caso, o pagamento do título pelo banco sacado deve ser realizado através de lançamento con-
tábil (crédito em conta, transferência ou compensação).
O ato de “sustar” um cheque possui previsão legal junto aos arts. 35 e 36 da Lei do Che-
que. Como visto, a primeira hipótese legal que autoriza o cheque a ser “sustado” é a revogação
ou contraordem, que somente produz efeitos após expirado o prazo de apresentação do
título, devendo ser apresentadas as razões que motivam o ato. A segunda hipótese é a da
oposição, que pode ser realizada dentro do prazo de apresentação do título, devendo o emi-
tente apresentar relevante razão de direito para tanto. Contudo, a própria lei disciplina que
não cabe ao banco sacado realizar uma análise da relevância da razão invocada pelo emi-
tente. Assim, a exigência, feita pelos bancos na prática, de apresentação de boletim de ocorrên-
cia para realizar a sustação do cheque é descabida.
Contudo, o prejudicado pela sustação do cheque pode responsabilizar o emitente, caso
entenda que houve abuso de direito. Pode, ainda, ser requerida a responsabilização penal do
emitente pela prática do crime de estelionato (art. 171, § 2o, VI, do CP).

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Em relação ao protesto do cheque, temos as indicações previstas no art. 6 o da Lei de


Protesto de Títulos (Lei no 9.492/1997) e no art. 48 da Lei do Cheque.
Percebe-se, assim, que o protesto do cheque deve ser realizado ou no lugar indicado
para o pagamento ou no domicílio do emitente. Além disso, o protesto do cheque pode ser
realizado no Cartório de Registro de Protestos, como ocorre nos demais títulos ou, ainda, pode
ser protesto bancário, realizado na instituição financeira, através de declaração do banco.
O prazo de apresentação do cheque é o prazo dentro do qual o emitente deve levar
o título junto à instituição financeira sacada (art. 33 da Lei do Cheque). Importante referir que
o prazo de apresentação do cheque não se confunde com o seu prazo de prescrição. Este
funciona como “prazo de protesto dos demais títulos”, pois sua finalidade, precipuamente, é de
assegurar o direito de execução contra os codevedores do título (art. 47, II, da Lei do Che-
que).
O prazo de apresentação do cheque deve observar se o cheque é “da mesma praça”, ou
seja, foi emitido no mesmo local onde deve ser pago ou se é “de praças diferentes”, isto é, quando
o lugar onde o cheque deve ser pago é diferente do que foi emitido. Levando em consideração
essas observações, verifica-se a importância de constar no cheque o seu local de emissão.
Assim, caso o cheque seja “da mesma praça”, o prazo para sua apresentação é de trinta
dias, caso seja “de praças diferentes”, o prazo de apresentação será de sessenta dias. Tal prazo
é calculado a partir da emissão do título.
Dessa forma, caso o portador do cheque perca o prazo para apresentação, como conse-
quência ele perderá o direito de executar os codevedores do título. Ainda, há um caso excepci-
onal em que a perda do prazo de apresentação, além de retirar o direito de executar os devedo-
res, acarreta a perda do direito de executar o próprio emitente. Tal hipótese é prevista no art. 47,
§ 3o, da Lei do Cheque e ocorre quando o emitente comprova que possuía fundos para quitar o
valor da cártula, durante o prazo de apresentação, mas que os perdeu por motivos alheios à sua
vontade.
O transcurso do prazo de apresentação, contudo, não impede que a cártula seja levada
ao banco sacado para ser descontada. A instituição financeira não pode mais processar e re-
ceber o título apenas após o transcurso do seu prazo prescricional (art. 35, parágrafo único,
da Lei do Cheque).
Como sabemos, o cheque é um título de crédito, portanto, possui força executiva, sendo
considerado pela legislação processual civil como um título executivo extrajudicial (art. 784, I, do
CPC).

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Assim, em caso de seu não pagamento, o portador da cártula pode promover ação de
execução de título extrajudicial contra o emitente e demais eventuais codevedores do título.
O prazo para promover essa ação de execução do cheque é de seis meses, contados
a partir do término do prazo de apresentação (art. 59 da Lei do Cheque). Dessa forma, evi-
dencia-se que, independentemente de quando o cheque foi apresentado ao banco sacado, o
prazo de prescrição da ação de execução só se inicia após o término do prazo de apresentação.
No mais, frisa-se que por óbvio prescrito o cheque, não poderá mais ser executado. Con-
tudo, é possível ainda a propositura de ação de enriquecimento ilícito (ou ação de locupleta-
mento) contra o emitente e os demais coobrigados, conforme previsão do art. 61 da Lei do Che-
que. Tal ação prescreve em dois anos, após a prescrição para propositura da ação de execução
do cheque.
A ação de enriquecimento ilícito – ou ação de locupletamento – é uma ação cambial, que
segue o rito ordinário de uma ação de conhecimento, tendo em vista que o cheque prescrito
perde sua executividade. Contudo, o cheque preserva suas características intrínsecas de tí-
tulo de crédito, tal como sua autonomia e consequente inoponibilidade das exceções pes-
soais ao terceiro de boa-fé.
No mais, o cheque ainda pode ser cobrado via ação de cobrança, após terminado o prazo
de prescrição da ação de enriquecimento ilícito – ou ação de locupletamento, desde que seja
comprovado o seu não pagamento e a relação causal que originou o título (art. 62 da Lei
do Cheque).
Esta ação de conhecimento não configura uma ação cambial, sendo que nela o portador
do cheque não mais se beneficia dos predicados decorrentes dos princípios cambiários.
Assim, nesta ação o devedor do título pode discutir a causa que originou o cheque e opor
quaisquer exceções contra o autor da demanda.
Ademais, cumpre mencionar que já é consolidada a jurisprudência no sentido de que é
totalmente cabível a propositura de ação monitória de cheque prescrito. É neste sentido
que as Súmulas nos 299 e 503 do Superior Tribunal de Justiça foram editadas. Vejamos:

Sum. nº 299. “É admissível a ação monitória fundada em cheque prescrito”.


Sum. nº 503. “O prazo para ajuizamento de ação monitória em face do emitente de cheque
sem força executiva é quinquenal, a contar do dia seguinte à data de emissão estampada
na cártula”.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

6. Direito Recuperacional e Falimentar

Prof.ª Cristiane Pauli


@profacrispauli

6.1. Considerações iniciais


O Direito Recuperacional e Falimentar é um sub-ramo específico do Direito Empresarial,
sendo aplicado tão somente aos empresários, sendo estes pessoas físicas ou jurídicas.
Esse regime jurídico disciplina a crise econômico-financeira dos empresários, trazendo
sua solução através dos processos recuperacionais judiciais e extrajudiciais, ou as resolvendo
por meio do processo de falência. A legislação brasileira atual que disciplina tais institutos é a
Lei no 11.101/2005 – LRF.

6.2. Aspectos gerais da falência e recuperação de empresas


A Lei no 11.101/2005 (LRF) estrutura três principais institutos: a recuperação extrajudicial,
a recuperação judicial e a falência.
Em linhas gerais, a recuperação extrajudicial é aquela na qual o devedor está autorizado
a propor e negociar com credores plano de recuperação extrajudicial, dependendo do Poder
Judiciário apenas para homologação.
A recuperação judicial, por sua vez, representa um procedimento judicial no qual o de-
vedor busca seu erguimento. A recuperação judicial pode se dar de duas formas: ou de forma
ordinária ou via apresentação de plano especial para ME e EPP, que é uma faculdade. Ou seja,
uma ME ou EPP pode apresentar plano pela via ordinária se assim preferir.
Por fim, a falência presta-se ao procedimento de execução concursal, cujo principal ob-
jetivo é a venda dos ativos, para pagamento do passivo, a partir de uma ordem de preferência
estipulada pela lei.
Feitas as primeiras considerações, passa-se à análise de todos os institutos.

6.3. Disposições comuns aos dois institutos


A Lei no 11.101/2005 – LRF preceitua, inicialmente, em seu art. 1o, quem se sujeita a sua
disciplina, sendo estes o empresário individual e a sociedade empresária.
Percebe-se assim que as regras da LRF não são aplicadas aos devedores civis, sendo
que, em caso de serem caracterizadas suas insolvências, estes devem ser submetidos às

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

regras do concurso de credores previstas no Código de Processo Civil. Além disso, a LRF igual-
mente não se aplica a fundações, partidos políticos, organizações religiosas e sociedades
simples.
Ainda, o art. 2o da LRF preceitua as demais pessoas jurídicas que não se submetem ao
seu regime. Referente às empresas públicas e sociedades de economia mista, tem-se que,
ainda que sejam exploradoras de atividade econômica, as regras da LRF não são a elas
aplicadas.
Já no que tange às instituições financeiras públicas ou privadas, cooperativas de crédito,
consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano de assistência
à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades equiparadas a
estas, a LRF não é aplicada, pois se trata de agentes econômicos que atuam em mercados
regulados e possuem legislações específicas que disciplinam o tratamento jurídico concedido a
suas insolvências, submetendo-se aos procedimentos especiais de liquidação extrajudicial.
Ainda, insta indicar que, com a alteração advinda no início de 2021, o produtor rural e as
cooperativas médicas podem pleitear recuperação judicial.
Em relação ao foro competente para julgar e processar os procedimentos recupera-
cionais e falimentares, tem-se que é o juízo do local do principal estabelecimento do deve-
dor ou da filial da empresa que tenha sede fora do Brasil (art. 3o, LRF). Importante referir que
o local do principal estabelecimento do devedor nem sempre é o local da sede da empresa,
tendo em vista que considera-se como principal estabelecimento o que concreta maior vo-
lume de negócios.
Dessa forma o que se tem é a criação do juízo universal, sendo que as obrigações do
empresário ou da sociedade empresária são atraídas para este juízo, não se falando mais em
relações jurídicas bilaterais, eis que se estabelece um foro comum, no qual as relações jurídi-
cas da empresa não são mais consideradas como unidades esparsas, mas como parte de
um patrimônio.
Na LRF a atuação do Ministério Público ficou restrita às hipóteses expressamente pre-
vistas em lei, como, por exemplo, nos casos em que haja indícios de responsabilidade penal do
devedor (art. 22, § 4o, da LRF) e em que for determinada a alienação de bens do devedor (art.
142, § 7o, da LRF), entre outras.
Ademais, a decretação da falência ou o deferimento da recuperação judicial suspende o
curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor. Devemos ter
cuidado especial com a expressão “todas”, utilizada no dispositivo legal, haja vista que algumas

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

ações não possuem seus trâmites suspensos. Tais informações possuem previsão no art. 6 o da
LRF.
Observa-se que as ações que demandam quantias ilíquidas têm prosseguimento no
juízo em que estiverem sendo processadas. O mesmo ocorre com as ações trabalhistas que
seguem seus trâmites até a apuração do respectivo crédito, o qual será incluído no Quadro
Geral de Credores com o valor determinado na sentença. Ainda, as execuções fiscais não são
suspensas com o deferimento da recuperação judicial, salvo por questão de concessão
de parcelamento pelo fisco.
Ainda, ressalta-se que o requerimento de recuperação judicial ou de falência torna o juízo
prevento, isto é, previne a jurisdição para qualquer outro pedido dessa natureza, relativo
ao mesmo devedor.
A partir do art. 7o até o art. 20 da LRF temos o tratamento concedido para a verificação
e habilitação dos créditos nos processos recuperacionais e falimentares. O art. 7o preceitua
que a verificação dos créditos será realizada pelo administrador judicial, a partir dos livros
contábeis e documentos comerciais e fiscais do devedor e nos documentos que lhe forem apre-
sentados pelos credores. Após ser publicado o edital de decretação da falência ou de processa-
mento da recuperação judicial, os credores possuem o prazo de 15 (quinze) dias para apre-
sentar suas habilitações ou divergências de crédito, diretamente ao administrador judicial.
Após o término deste prazo, o administrador judicial possui o prazo de quarenta e
cinco dias para confeccionar a sua relação de credores e posterior publicação de edital. Além
disso, no edital da relação de credores do administrador judicial deve constar o local, o horário e
o prazo comum em que os credores, o Comitê, o Ministério Público ou os sócios do devedor
podem ter acesso aos documentos que fundamentaram a elaboração desta relação.
O art. 7o-A da LRF, incluído pela Lei no 14.112 de 2020, disciplina que, em processos
falimentares, após a realização das intimações e publicação do edital de decretação da Falên-
cia, incumbe ao juiz a instauração – de ofício – para cada Fazenda Pública credora, inci-
dente de classificação de crédito público, determinando a intimação eletrônica da Fazenda
credora para que, no prazo de trinta dias, apresente ao administrador judicial ou ao juízo –
considerando o momento processual – a relação completa de seus créditos inscritos em dí-
vida ativa, acompanhada dos cálculos, da classificação e das informações sobre a situa-
ção atual.
Além disso, o § 1o do art. 7o-A da LRF dispõe que considera-se Fazenda Pública credora
aquela constante na relação presente no edital de decretação de falência ou a que alegue

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

nos autos, após intimada, possuir crédito contra o falida. Ainda, os créditos não definitivamente
constituídos, não inscritos em dívida ativa ou com exigibilidade suspensa podem ser in-
formados em momento posterior (art. 7o-A, § 2o, LRF).
Após o encerramento do prazo para a Fazenda Pública apresentar seus créditos, o falido,
os demais credores e o administrador judicial possuem o prazo de quinze dias para objeções
sobre os cálculos e a classificação dos créditos da Fazenda Pública (art. 7o-A, § 3o, I, LRF).
Findo tal prazo, a Fazenda Pública será intimada para, no prazo de dez dias, prestar esclare-
cimentos sobre as eventuais objeções apresentadas (art. 7 o-A, § 3o, II, LRF). Ressalta-se que
os créditos serão objeto de reserva integral até o julgamento definitivo, quando rejeitados
os argumentos apresentados (art. 7o-A, § 3o, III, LRF).
Já os créditos incontroversos e exigíveis serão imediatamente incluídos no Quadro
Geral de Credores, observada a sua classificação (art. 7o-A, § 3o, IV, LRF). Ademais, o juiz,
antes de homologar o Quadro Geral de Credores, concederá prazo comum de dez dias para
que o administrador judicial e a Fazenda Pública se manifest em sobre a situação atual do crédito
objeto de reserva, para que, findo o prazo, decida acerca da necessidade de mantê-lo (art. 7o-A,
§ 3o, V, LRF). Cumpre ressaltar que não há condenação em honorários sucumbenciais neste
incidente de habilitação de crédito da Fazenda Pública (art. 7 o-A, § 8o, LRF).
O art. 8o da LRF traz o prazo de dez dias, contados da publicação do edital da relação
de credores do administrador judicial, para que os interessados apresentem, diretamente ao
juízo universal, eventuais impugnações de crédito contra a referida relação de credores, apon-
tando a ausência de qualquer crédito ou manifestando-se contra a legitimidade, importância ou
classificação de crédito relacionado. A impugnação de crédito será autuada em apartado,
sendo dirigida ao juiz por meio de petição, instruída com os documentos que o impugnante con-
siderar pertinente e com a indicação de provas consideradas necessárias (art. 13, LRF).
Os requisitos necessários para que o credor realize sua habilitação de crédito – direta-
mente ao administrador judicial – estão dispostos no art. 9o da LRF.
Além disso, caso o credor perca o prazo de quinze dias para apresentar sua habilitação
de crédito ao administrador judicial, ele ainda poderá apresentá-la, contudo esta será recebida
como habilitação retardatária, possuindo alguns efeitos importantes (art. 10, LRF). A primeira
consequência da habilitação retardatária que cumpre mencionar é que, no caso de recuperação
judicial – salvo créditos derivados da relação de trabalho –, os credores não terão direito a
voto nas deliberações da Assembleia Geral de Credores (art. 10, § 1o, LRF). Já na falência,
os titulares de créditos retardatários perderão o direito a eventuais rateios realizados,

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

podendo ser requerida pelo credor a reserva do valor para satisfação do seu crédito (art. 10,
§§ 3o e 4o, LRF).
Ademais, caso, quando houver a Assembleia Geral de Credores, o valor do crédito cons-
tante na habilitação retardatária não tenha sido incluído no quadro geral de credores homo-
logado, o credor, assim como ocorre na recuperação judicial, perderá o direito ao voto.
No mais, cumpre ainda referir que as habilitações retardatárias que forem apresentadas
antes da homologação do quadro geral de credores serão recebidas como impugnação
de crédito (art. 10, § 5o, LRF). Caso o quadro geral de credores já tenha sido homologado, o
procedimento para habilitação de créditos é o ordinário, previsto no Código de Processo Civil,
requerendo ao juízo da falência ou da recuperação judicial a retificação do quadro geral para
inclusão do respectivo crédito (art. 10, § 6o, LRF).
Ademais, os §§ 7o, 8o, 9o e 10 do art. 10 da LRF restaram incluídos pela Lei n o 14.112, de
2020. Neste sentido, tem-se que o quadro geral de credores será confeccionado com o jul-
gamento das impugnações tempestivas e habilitações e impugnações retardatárias que
tiverem decisão até o momento da sua formação (art. 10, § 7o, LRF).
Por fim, o § 10 do art. 10 da LRF dispõe que o credor possui o prazo máximo de três
anos, contados da data de publicação da sentença de decretação de falência, para apresentar
pedido de habilitação ou reserva de crédito, sob pena de decadência.
No que se refere à impugnação de créditos, os credores cujos créditos forem impugna-
dos possuem o prazo de cinco dias para contestar a impugnação (art. 11, LRF). Após trans-
corrido tal prazo, o devedor e o comitê de credores (caso haja) serão intimados para se mani-
festarem da impugnação no prazo comum de cinco dias. Por fim, o juiz intimará o adminis-
trador judicial para emitir parecer, também no prazo de cinco dias, devendo juntar à sua
manifestação o laudo elaborado pelo profissional ou empresa especializada e todas as informa-
ções existentes nos livros fiscais e demais documentos do devedor acerca do crédito objeto da
impugnação (art. 12, LRF).
Transcorridos tais prazos, os autos irão conclusos ao juiz. O art. 15 da LRF dispõe as
medidas a serem tomadas pelo juiz. A decisão judicial que julgar a impugnação é atacável
por agravo (art. 17, LRF). Caso não haja impugnações, o juiz homologará, com efeito de
quadro geral de credores, a relação de credores pelo administrador judicial, ressalvado o
disposto no art. 7o-A da LRF (art. 14, LRF).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Após o julgamento das eventuais impugnações de crédito, o administrador judicial é o


responsável pela consolidação do quadro geral de credores, conforme disciplina o art. 18 da
LRF.
Em caso de descoberta de falsidade, dolo, simulação, fraude, erro essencial ou documen-
tos ignorados na época do julgamento do crédito, o administrador judicial, o comitê, qualquer
credor ou o representante do Ministério Público podem pedir a exclusão, diferente classificação
ou retificação de qualquer crédito, até o encerramento da recuperação judicial ou da falência
(art. 19, LRF).
A Seção II – A Das Conciliações e das Mediações Antecedentes ou Incidentais aos
Processos de Recuperação Judicial restou incluída na LRF através da reforma trazida pela
Lei no 14.112, de 2020. Assim, restaram acrescentados os arts. 20-A, 20-B, 20-C e 20-D.
Nesta senda, o art. 20-A estabelece que a mediação e a conciliação devem ser incen-
tivadas em qualquer grau de jurisdição, até mesmo em grau de recurso, junto aos Tribunais
Superiores. Importante referir que a própria previsão já aduz que a realização de tais atos não
implica a suspensão dos prazos previstos na LRF – salvo consenso entre as partes em sentido
contrário ou determinação judicial.
Na hipótese da letra d, o § 1o do referido art. prevê que será facultado às empresas em
dificuldade que preencham os requisitos legais para requerer a recuperação judicial obter tutela
de urgência cautelar, nos termos do art. 305 e seguintes do CPC, com o intuito de que sejam
suspensas as execuções contra elas propostas pelo prazo de até sessenta dias, para ten-
tativa de composição com seus credores, em procedimento de mediação ou conciliação já ins-
taurado perante o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) do Tribunal
competente ou da câmara especializada, observados, no que couber, os arts. 16 e 17 da Lei no
13.140/2015.
Além disso, são vedadas a conciliação e a mediação que versem sobre a natureza jurídica
e a classificação de créditos, bem como sobre critérios de votação na Assembleia Geral de Cre-
dores (art. 20-B, § 2o, LRF). Ainda, o § 3o do já referido artigo dispõe que, em caso de pedido de
recuperação judicial ou extrajudicial, de acordo com os critérios da LRF, o período de suspensão
previsto no § 1o deste art. (sessenta dias) será deduzido do período de suspensão previsto no
art. 6o da LRF (cento e oitenta dias).
O art. 20-C inteligência a imprescindibilidade da homologação pelo juízo competente do
acordo obtido por meio de mediação e conciliação, nos termos da Seção II-A da LRF. A LRF
trata do administrador judicial e do comitê de credores nos arts. 21 a 34.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Referente ao administrador judicial, cumpre ressaltar que este é o principal auxiliar do


juiz na condução dos processos falimentares e recuperacionais. Além de desenvolver di-
versas atividades de cunho administrativo (como veremos em breve), este ainda é o responsável
por representar legalmente a massa falida.
A lei aponta que a nomeação do administrador judicial deve ser dirigida a profissional
idôneo, preferencialmente advogado, economista, administrador de empresa ou contador (art.
21, LRF). Além disso, a nomeação para administrador judicial pode recair em pessoa jurídica,
devendo, para tanto, ser declarado no termo de compromisso o nome do profissional responsável
pela condução do processo falimentar ou recuperacional.
O administrador judicial funciona como uma extensão do judiciário, sendo que sua no-
meação parte muito da confiança do magistrado. Assim, caso o profissional deixe de cumprir
com os prazos estabelecidos na legislação, ele será pessoalmente intimado para fazê-lo, no
prazo de cinco dias, sob pena de desobediência. Na hipótese de não cumprimento, o juiz desti-
tuirá o administrador judicial e nomeará substituto (art. 23).
Relativamente à remuneração do administrador judicial (art. 24, LRF), tem-se que serão
observados os seguintes critérios: a) a capacidade de pagamento do devedor; b) o grau de
complexidade do trabalho; e c) os valores praticados no mercado para o desempenho de
atividades semelhantes.
Como regra geral tem-se que o valor pago a título de remuneração ao auxiliar do juízo
não poderá exceder 5% do valor devido aos credores submetidos à recuperação judicial ou
do valor de venda dos bens na falência. Ademais, no caso de microempresas, empresas de
pequeno porte e produtor rural, o valor da remuneração não poderá exceder o limite de
2%.
A remuneração do administrador judicial deve ser paga pelo devedor – no caso de recu-
peração judicial, ou pela massa falida – no de falência (art. 25, LRF), salvo a exceção da nova
possibilidade prevista no art. 114-A, § 1o.
Ainda quanto ao administrador judicial, tem-se que, em caso de substituição, sua remu-
neração será proporcional ao trabalho realizado. Contudo, se o profissional renunciar – sem
relevante razão, ou for destituído por desídia, culpa, dolo, descumprimento de suas obrigações
ou tiver sua prestação de contas desaprovada, ele não receberá remuneração.
Já quanto ao comitê de credores, temos que este não é um órgão obrigatório nos proces-
sos falimentares e recuperacionais. Se o juiz entender por necessária a sua criação, ele deverá
convocar a assembleia geral de credores para eleição de seus membros. Caso o comitê

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

não seja formado, deve o administrador judicial ou, na incompatibilidade deste, o juiz exercer
suas atribuições (art. 28, LRF).
A composição do comitê de credores é discriminada no art. 26 da LRF, sendo a se-
guinte:
a) Um representante indicado pela classe de credores trabalhistas, com dois suplen-
tes;
b) Um representante indicado pela classe de credores com direitos reais de garantia
ou privilégios especiais, com dois suplentes;
c) Um representante indicado pela classe de credores quirografários e com privilégios
gerais, com dois suplentes;
d) Um representante indicado pela classe de credores representantes de microem-
presas e empresas de pequeno porte, com dois suplentes.

O art. 30 da LRF prevê as possibilidades de impedimento para exercer as funções de


administrador judicial ou ser membro do comitê de credores, sendo elas:
a) Quem, nos últimos cinco anos, no exercício do cargo de administrador judicial ou
de membro do Comitê em Falência ou Recuperação Judicial anterior, foi destituído,
deixou de prestar contas dentro dos prazos legais ou teve a prestação de contas
desaprovada;
b) Quem tiver relação de parentesco ou afinidade até o terceiro grau com o devedor,
seus administradores, controladores ou representantes legais ou deles for amigo,
inimigo ou dependente.

6.4. Insolvência transnacional


Além das já citadas importantes inovações que a Lei n o 14.112, de 2020, trouxe à LRF,
temos, ainda, a criação do Capítulo IV-A, que trata da “insolvência transnacional”.
O referido capítulo vai desde as disposições gerais até as disposições atinentes à coope-
ração entre entes estatais, sendo que o art. 167-A elenca os objetivos da insolvência transnaci-
onal como mecanismo efetivo para:
a) A cooperação entre juízes e outras autoridades competentes do Brasil e de outros
países em casos de insolvência transnacional;
b) O aumento de segurança jurídica para a atividade econômica e para o investi-
mento;

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

c) A administração justa e eficiente de processos de insolvência transnacional, de


modo a proteger os interesses de todos os credores e dos demais interessados,
inclusive do devedor;
d) A proteção e maximização do valor dos ativos do devedor;
e) A promoção da recuperação de empresas em crise econômico-financeira, com a
proteção de investimentos e a preservação de empregos;
f) A promoção da liquidação dos ativos da empresa em crise econômico-financeira,
com a preservação e a otimização da utilização produtiva dos bens, dos ativos e
dos recursos produtivos da empresa, inclusive os intangíveis.

6.5. Assembleia geral de credores


A LRF prevê a maior participação dos credores nos processos de falência e recupe-
ração judicial através da Assembleia Geral de Credores (AGC), que tem suas atribuições
descritas no art. 35 do referido dispositivo legal.
A convocação da Assembleia Geral de Credores será realizada via edital publicado junto
ao órgão oficial (Diário de Justiça Eletrônico) e será disponibilizado no sítio eletrônico do
administrador judicial, com o mínimo de quinze dias de antecedência. Tal edital deve conter:
a) o local, a data e a hora da assembleia em primeira e em segunda convocação, não podendo
esta ser realizada menos de cinco dias depois da primeira; b) a ordem do dia; c) o local onde os
credores poderão, se for o caso, obter cópia do Plano de Recuperação Judicial a ser submetido
à deliberação da assembleia. Ademais, a cópia do aviso de convocação da assembleia deve ser
afixada de forma ostensiva na sede e filiais do devedor (art. 36 da LRD).
A Assembleia Geral de Credores é convocada pelo juiz, a pedido do administrador judicial,
em caso de objeção ao plano de recuperação judicial ou requerida por credores que representem
no mínimo 25% do valor total dos créditos de uma determinada classe.
O direito de voto na AGC é conferido aos credores arrolados no quadro geral de cre-
dores ou, na sua falta, na relação de credores apresentada pelo administrador judicial ou,
caso esta ainda não tenha sido confeccionada, na relação de credores apresentada pelo de-
vedor, acrescidas, em qualquer das hipóteses, dos credores que estejam habilitados na data
da realização da assembleia ou que tenham créditos admitidos ou alterados por decisão
judicial, inclusive os que tenham obtido reserva de importâncias (art. 39, LRF).
Os votos dos credores somente serão declarados nulos por abusividade quando mani-
festamente exercidos com o intuito de obtenção de vantagem ilícita para si ou para outrem, sendo

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prerrogativa do credor votar de com acordo com seu juízo de conveniência e interesse (art. 39,
§ 6o, LRF). No mais e relativamente à cessão ou promessa do crédito habilitado, esta deverá ser
imediatamente comunicada ao juízo da recuperação judicial (art. 39, § 7o, LRF).
Os credores podem ser representados nas deliberações da AGC por mandatário ou re-
presentante legal, desde que o documento hábil que comprove os poderes ou a indicação das
folhas dos autos do processo em que se encontre o documento seja entregue ao AJ, com no
mínimo, vinte e quatro horas de antecedência da data do ato (art. 37, § 4 o, LRF).
Os sindicatos de trabalhadores poderão representar seus associados titulares de crédi-
tos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidente de trabalho que não compa-
recerem, pessoalmente ou por procurador, à assembleia (art. 37, § 5 o, LRF).
A Assembleia Geral de Credores, nos processos de recuperação judicial, é dividida em
quatro classes: a) a primeira, formada por credores titulares de créditos derivados da legis-
lação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho; b) a segunda, formada por cre-
dores titulares de créditos com garantia real; c) a terceira, formada por titulares de créditos
quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados; d) a quarta,
formada por titulares de créditos enquadrados como microempresa ou empresa de pequeno
porte (art. 41, LRF).
Em tese, as deliberações em AGC são aprovadas por voto favorável dos credores que
representem mais da metade do valor total dos créditos presentes, ou seja, por maioria
simples. Contudo, a LRF prevê exceção à regra geral, no caso de deliberações a respeito de:
a) aprovação, rejeição ou alteração do plano de recuperação judicial; b) composição do
comitê de credores; c) alternativa de realização do ativo em processos falimentares (art.
42, LRF).
Assim, relativamente às deliberações sobre a composição do comitê de credores, tem-se
a votação de cada classe separadamente, para a escolha dos seus respectivos membros (art.
44, LRF).
A respeito da votação para deliberação do plano de recuperação judicial, tem-se a pre-
visão do art. 45 da LRF, que preceitua que cada classe vota separadamente, sendo necessária
a aprovação do plano por todas.
Assim, na classe dos credores com garantia real e na classe dos credores quirogra-
fários, com privilégio especial ou geral e subordinados, a aprovação depende do voto fa-
vorável dos credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presen-
tes e, cumulativamente, pela maioria simples dos credores da classe presentes.

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Direito Empresarial

Na classe dos credores trabalhistas ou decorrentes de acidente de trabalho e na


classe dos credores enquadrados como ME/EPP, a proposta precisa ser aprovada pela mai-
oria simples dos credores presentes, independentemente do valor dos seus créditos.
Os credores titulares de créditos retardatários não possuem direito a voto – salvo os
trabalhistas – e os credores subordinados também não possuem esse direito.

6.6. Recuperação judicial


No que tange ao instituto da recuperação judicial (RJ), tem-se que é um instrumento
apto a viabilizar a superação da crise que as empresas venham a estar passando. Todavia,
não é toda e qualquer empresa que pode se utilizar desse meio, sendo necessário possuir
alguns requisitos para tanto. E é nessa linha de pensamento que se passa a expor.
A recuperação judicial, conforme disciplina o art. 47 da Lei n o 11.101/2005 (LRF), possui
como objetivo viabilizar a superação da crise econômica pela qual uma empresa está pas-
sando, objetivando a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos inte-
resses dos credores, preservando, dessa forma, a empresa, sua função social e o estímulo à
atividade econômica.
O art. 48 da LRF dispõe os requisitos indispensáveis que o devedor deve apresentar
para que o juiz autorize o processamento do seu pedido de recuperação judicial. Dessa forma,
tem-se que o pedido de recuperação judicial só pode ser realizado por empresas regularmente
constituídas e que possuam exercício regular da atividade há pelo menos dois anos. Além
disso, é necessário que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: a) não ser falido
e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsa-
bilidades daí decorrentes; b) não ter, há menos de cinco anos, obtido concessão de recu-
peração judicial; c) não ter, há menos de cinco anos, obtido concessão de recuperação
judicial com base no plano especial; e d) não ter sido condenado ou não ter, como admi-
nistrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos na
LRF.
Evidencia-se, assim, que tais requisitos se tratam de verdadeiras condições da ação,
se traduzindo em elementos de possibilidade jurídica do pedido.
Dessa forma, evidente se torna que o primeiro requisito é que o devedor comprove estar
exercendo atividade regular há pelo menos dois anos. Tal comprovação é feita através da jun-
tada de Certidão da Junta Comercial competente, que ateste o exercício regular da atividade
por prazo igual ou superior ao exigido na legislação. Contudo e a respeito da recuperação

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judicial do produtor rural, devido ao fato de ele não ser obrigado a se registrar na Junta Co-
mercial, o § 2o do art. 48 da LRF – de acordo com a Lei no 14.112/2020 – preceitua que a com-
provação do prazo de dois anos de atividade regular pode ser através da Escrituração Con-
tábil Fiscal (ECF), ou por meio de obrigação legal de registros contábeis que venha a subs-
tituir a ECF, desde que tenha sido entregue tempestivamente.
Para além e conforme já referido, o instituto da recuperação judicial é um importante me-
canismo apto a auxiliar na superação da crise econômico-financeira que uma empresa ve-
nha a estar passando. Neste sentido, o art. 50 da LRF dispõe alguns meios para que a supe-
ração ocorra. Importante frisar que tal rol é apenas exemplificativo, podendo existir outros,
como bem especifica o referido dispositivo legal.
Caso não estejam presentes todos os requisitos da petição inicial, o juiz pode pedir
que o devedor emende a inicial, apresentando as determinações faltantes. Por outro lado, es-
tando presentes os requisitos do art. 51 da LRF e os do art. 319 do CPC, o juiz deferirá o
processamento da recuperação judicial. Frisa-se que, neste momento processual, o juiz não
está concedendo ao devedor a recuperação judicial, mas sim apenas determinando o seu pro-
cessamento.
O art. 51-A restou criado pela Lei no 14.112, de 2020, preceituando a possibilidade de
“constatação prévia”, que se traduz na possibilidade de, após o pedido de recuperação ju-
dicial ser distribuído, o juiz, se reputar necessário, nomear profissional de sua confiança,
com capacidade técnica e idoneidade, para promover a constatação exclusivamente das re-
ais condições de funcionamento da requerente e da regularidade e da completude da do-
cumentação apresentada junto à exordial.
Dessa forma e com o deferimento do processamento da RJ, o juiz tomará as providências
contidas no art. 52 da LRF, sendo elas: a) a nomeação do administrador judicial; b) a determina-
ção da dispensa da apresentação de certidões negativas para que o devedor exerça suas ativi-
dades, observado o disposto no § 3 o do art. 195 da CF e no art. 69 da LRF; c) a determinação
da suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor, salvo exceções; d) a determi-
nação ao devedor de apresentação das contas demonstrativas mensais enquanto perdurar a
recuperação judicial, sob pena de destituição de seus administradores; e e) a ordenação de inti-
mação eletrônica ao Ministério Público e às Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e
Municipais em que o devedor tiver estabelecimento, a fim de que tomem conhecimento da recu-
peração judicial e informem eventuais créditos perante o devedor, para divulgação aos demais
interessados.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Em relação à determinação da suspensão de todas as ações ou execuções contra o


devedor, cabe a este realizar a comunicação aos juízos competentes (art. 52, § 3o, LRF).
Aliás, ainda sobre o prazo de suspensão por cento e oitenta dias, este é conhecido como stay
period e encontra guarida no princípio basilar da RJ, qual seja, a preservação da empresa,
tendo em vista que são vedados atos que inviabilizam a possibilidade de efetiva recupera-
ção da devedora. Ressalta-se que também serão suspensos eventuais pedidos de falência
que tramitem em face do devedor, ficando no aguardo do julgamento do pedido de recuperação.
Em relação ao plano de recuperação judicial, este deve ser apresentado no prazo de ses-
senta dias a contar do despacho de processamento da RJ, devendo conter a discriminação por-
menorizada dos meios de recuperação a serem empregados, bem como um resumo de cada ato
que o compõe, a demonstração analítica de sua viabilidade econômica e o laudo econômico-
financeiro e de avaliação dos ativos do devedor, subscrito por profissional habilitado ou por so-
ciedade especializada, conforme dispõe o art. 53 da LRF.
Caso o plano não seja apresentado no prazo de sessenta dias, a falência do devedor
será decretada, nos termos do inciso II do art. 73 da LRF, o qual estudaremos em breve.
Caso sejam apresentadas objeções ao plano de recuperação judicial, o juiz deverá con-
vocar a Assembleia Geral de Credores para deliberar sobre este (art. 56, LRF). Veja-se que
o ato praticado pelo juiz é apenas de convocação da assembleia, não cabendo a este julgar
e analisar as objeções.
No mais, a Assembleia Geral de Credores deverá ser convocada pelo juiz, para reali-
zação, em até cento e cinquenta dias, abrangendo a primeira e a segunda convocação, a partir
da data do despacho de deferimento da recuperação judicial (art. 56, LRF). Tal prazo é es-
tabelecido a fim de que se tenha uma deliberação sobre o plano antes de cessar o período de
suspensão das ações e execuções, o stay period. Além disso, antes da aprovação da Lei n o
14.112 /2020, inexistia previsão legal para a prorrogação do stay period, sendo que a jurispru-
dência admitia que sua prorrogação por mais cento e oitenta dias ou até a realização da
Assembleia Geral de Credores. Contudo, a referida lei inovou ao trazer a previsão legal de
prorrogação desse período junto ao § 4o do art. 6o.
O plano de recuperação judicial alternativo é uma novidade da LRF e poderá ser apresen-
tado em duas situações: 1) o decurso do prazo de suspensão a que se refere o art. 6 o, sem que
o PRJ tenha sido levado à deliberação em assembleia (§ 3 o do art. 6o); e 2) no caso de rejeição
do PRJ em assembleia e do não preenchimento para cram down (art. 56, § 4o).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Na segunda hipótese, caberá ao administrador judicial submeter à votação a concessão


do prazo de trinta dias para que os credores realizem a apresentação de plano alternativo, sendo
necessário que sua aprovação se dê com base em mais da metade dos créditos presentes na
Assembleia Geral de Credores (art. 56, § 5º, LRF).
Outra novidade veio no art. 56-A, que incluiu a possibilidade de apresentação de termo de
adesão, firmado pelos credores. Em suma, tem-se que, até cinco dias antes da Assembleia Geral
de Credores convocada para a deliberação do plano de recuperação judicial, poderá a empresa
devedora apresentar termo de adesão, desde que observado o quórum previsto pelo art. 45.
Apresentado o termo de adesão, a devedora irá requerer a homologação de tal, sendo que a
realização da AGC ficará imediatamente dispensada.
Frisa-se que a votação de aprovação, rejeição ou alteração do plano de RJ segue a
regra do art. 45 da LRF, sendo que cada classe vota separadamente e o plano tem que ser
aprovado por todas. Na classe dos credores com garantia real e na classe dos credores
privilegiados, subordinados e/ou quirografários, a aprovação depende do voto dos credo-
res que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembleia e
que representem também a maioria simples dos credores – da classe – presentes. Já na
classe dos credores trabalhistas ou decorrentes de acidentes de trabalhos e na classe dos
credores enquadrados como ME ou EPP, a aprovação precisa ser pela maioria simples dos
credores presentes, independentemente do valor de seus créditos.
Contudo, pode ocorrer uma situação excepcional em que o juiz concederá a recupera-
ção judicial ao devedor que não tiver o plano aprovado na Assembleia Geral de Credores.
Tal hipótese é chamada de “cram down” e está prevista no art. 58, § 1o, da LRF.
Para que o juiz possa fazer uso de tal ferramenta, é necessário que a devedora tenha
obtido as seguintes disposições de forma cumulativa: a) voto favorável de credores que repre-
sentem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembleia, independente-
mente de classes; b) a aprovação de três das classes de credores ou, caso haja somente três
classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos duas das classes ou, caso haja
somente duas classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos uma delas, sempre
nos termos do art. 45 da LRF; e c) na classe que o houver rejeitado, o voto favorável de mais de
um terço dos credores, computados na forma dos §§ 1 o e 2o do art. 45 da LRF (art. 58, § 1 o,
LRF).
Ademais, a decisão judicial de concessão da recuperação judicial constitui título execu-
tivo judicial, podendo ser executada por qualquer credor (art. 59, § 1 o, LRF), sendo que tal

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

decisão é atacável por agravo de instrumento, nos termos do § 2o do art. 59 da LRF. Ainda,
dessa decisão serão intimados eletronicamente as Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Dis-
trital e Municipais em que o devedor tiver estabelecimento (art. 59, § 3 o, LRF).
Após ter concedida sua recuperação judicial, o devedor nela permanece até que sejam
cumpridas todas as obrigações previstas no plano que se vencerem em até dois anos
depois da concessão da RJ, independentemente do eventual período de carência (art. 61,
LRF). Durante este período, o descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano enseja
a convolação da recuperação judicial em falência (art. 61, §1o, LRF).
No caso de descumprimento das obrigações após o período de dois anos, qualquer
credor poderá requerer a execução específica ou a falência do devedor (art. 62, LRF).
A recuperação judicial, em princípio, não retira do titular da empresa o direito de ad-
ministração dos bens. Nesse sentido, o art. 64 da LRF preceitua as hipóteses em que devem
ser destituídos. Na eventualidade de ser declarada a destituição dos sócios administrado-
res, deve-se ser convocada a Assembleia Geral de Credores, a fim de deliberarem sobre o nome
do gestor judicial que assumirá a administração das atividades do devedor, nos termos do
art. 65 da LRF. Ademais, o § 1o do referido artigo indica que, enquanto a assembleia geral não
tiver escolhido quem será o gestor judicial, deve o administrador judicial exercer tal fun-
ção.
A Lei no 14.112/2020 inovou ao criar a Seção IV-A – Do Financiamento do Devedor e
do Grupo Devedor durante a Recuperação Judicial, incluindo dispositivos que irão abordar o
tema. Neste sentido, tem-se que o art. 69-A disciplina a possibilidade de o juiz autorizar, durante
a RJ, a celebração de contratos de financiamento com o devedor, garantidos pela oneração ou
pela alienação fiduciária de bens e direitos, seus ou de terceiros, pertencentes ao ativo não
circulante, para financiar as suas atividades e as despesas de reestruturação ou de preservação
do valor de ativos, após ouvido o comitê de credores. Essas modalidades de dip financing.
A Seção IV-B – Da Consolidação Processual e da Consolidação Substancial emergiu
com a nova redação dada pela Lei nº 14.112/ 2020 e surgiu com o objetivo de consolidar algo
que há tempos vinha sendo discutido pela jurisprudência, sendo que o art. 69-G dispõe, em
breves linhas, que os devedores que atendam aos requisitos elencados pela LRF e que integrem
um grupo econômico poderão requerer a recuperação judicial na forma de consolidação proces-
sual.
Neste caso, é incumbência de cada devedor apresentar – individualmente – a docu-
mentação exigida no art. 51 da LRF (art. 69-G, § 1o, LRF). A competência para deferir a RJ é

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

a do juízo do local do principal estabelecimento entre os dos devedores (art. 69-G, § 2o,
LRF). O § 3o deste art igo dispõe que “exceto quando disciplinado de forma diversa, as demais
disposições da LRF aplicam-se aos casos de que trata esta Seção”.
No caso de a documentação de cada devedor ser aprovada, será nomeado apenas um
administrador judicial para auxiliar o juiz na condução do processamento da RJ (art. 69-H,
LRF).
A consolidação processual acarreta a coordenação de atos processuais, garantindo
a independência dos devedores, dos seus ativos e dos seus passivos (art. 69-I, LRF). Além
disso, os meios de recuperação serão propostos independentes por cada devedor, sendo
estes específicos para a composição de seus passivos, admitindo-se, contudo, a sua apresen-
tação em plano único (art. 69-I, § 1o, LRF).
O art. 69-J dispõe que é faculdade do juiz, em caráter excepcional, autorizar a consoli-
dação substancial de ativos e passivos dos devedores integrantes do mesmo grupo eco-
nômico que estejam em RJ sob consolidação processual – independentemente da realiza-
ção de Assembleia Geral de Credores – no caso de ficar constatada a interconexão e a confu-
são entre ativos ou passivos dos devedores, de modo que não seja possível identificar a
sua titularidade sem excessivo dispêndio de tempo ou de recursos, cumulativamente com a
ocorrência de, no mínimo, duas das seguintes hipóteses: a) existência de garantias cruzadas;
b) relação de controle ou de dependência; c) identidade total ou parcial do quadro socie-
tário ; e d) atuação conjunta no mercado entre os postulantes.
Além disso, o art. 73 da LRF dispõe algumas hipóteses em que será decretada a falência
do devedor durante o processo de recuperação judicial. Tais regras tiveram alterações em suas
redações e acréscimos de possibilidades na Lei n o 14.112/2020.

6.7. Recuperação judicial de ME/EPP


Inicialmente, é imperioso relembrar questões de suma importância relativas às ME/EPP
s. Dessa forma, temos que a Lei Complementar no 123, de 14 -12-2016, instituiu o Estatuto
Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, alterando os dispositivos ante-
riormente existentes. Assim temos que são consideradas microempresas (ME) ou empresas
de pequeno porte (EPP) a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa indivi-
dual de responsabilidade limitada e o empresário individual, registrados devidamente no
Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, desde que no
caso microempresa (ME), aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e, em caso de empresa de pequeno porte (EPP),
aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta
mil reais) e igual ou inferior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitenta mil reais) (art. 3 o, LC
no 123/2016).
Inicialmente cumpre destacar que o pedido de recuperação judicial com base no plano
especial é uma faculdade para as empresas enquadradas como ME ou EPP, ou seja, os
devedores classificados como microempresa ou empresa de pequeno porte devem optar em
sua petição inicial pela apresentação de plano especial ou plano normal de recuperação
judicial (art. 70, § 1o, LRF).
Para que o produtor rural possa apresentar plano especial de recuperação judicial, o
valor da causa não pode exceder a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais) (art.
70-A, LRF). Destaca-se, contudo, que independentemente da opção do devedor, este deverá
preencher os requisitos do art. 48 da LRF, bem como apresentar a documentação exigida no art.
51 da LRF, com as devidas ressalvas já constantes na lei.
O prazo para a apresentação do plano especial é de sessenta dias, assim como ocorre
no plano normal (art. 71, LRF). As condições para apresentação desse plano especial limi-
tam-se ao previsto no dispositivo legal anteriormente referido.
Ademais, temos que o pedido de recuperação judicial com base em plano especial
não acarreta a suspensão do curso da prescrição e das ações e execuções por créditos
não abrangidos pelo plano (art. 71, parágrafo único, LRF). Ainda, os credores não abrangi-
dos no plano especial não possuem seus créditos habilitados na RJ (art. 70, § 2o, LRF).

6.8. Recuperação extrajudicial


A LRF disciplina a recuperação extrajudicial junto aos arts. 161 a 167, sendo que, logo no
art. 161, dispõe que, para que o devedor possa ser beneficiário deste instituto, deve preen-
cher os requisitos do art. 48.
Ademais, cumpre ressaltar que o preenchimento dos requisitos referidos é indispensável
apenas se o devedor pretender a homologação do plano de recuperação extrajudicial pelo
Judiciário. Caso o devedor apenas pretenda negociar com seus credores uma saída para a
crise em que se encontra, em forma de acordo privado, sem a necessidade de intervenção
do juízo, o preenchimento dos requisitos é dispensável (art. 167, LRF).
O art. 161, § 4o, da LRF dispõe que o pedido de homologação de plano de recuperação
extrajudicial não obsta o prosseguimento das ações e execuções que tramitam em face do

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

devedor e nem impossibilita o pedido de decretação de falência eventualmente requerido pelos


credores sujeitos ao plano de recuperação extrajudicial.
Em relação ao plano de recuperação extrajudicial, este não pode prever o pagamento
antecipado de dívidas e tampouco o pagamento desfavorável aos credores a ele não su-
jeitos (art. 161, § 2o, LRF). Veja-se que tal disciplina possui como finalidade o respeito ao
princípio do par conditio creditorum. Além disso, apenas podem ser submetidos ao Plano de
recuperação extrajudicial os créditos constituídos até a data do pedido de homologação em
juízo (art. 163, § 1o, LRF).
O devedor pode requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial, obri-
gando a todos os credores a este submetidos, desde que seja assinado por credores que
representem mais da metade dos créditos de cada espécie por ele abrangidos. Nesta hipó-
tese, salienta-se que já não se trata de mera faculdade do devedor a homologação judicial
do plano, tendo em vista que, sem ela, este não pode obrigar aos credores que não aderi-
rem ao plano o seu cumprimento.
Além disso, o devedor pode requerer a homologação do plano antes de atingir o quórum
de mais da metade dos créditos por ele abrangidos, desde que o apresente com a comprovação
de anuência de credores que representem pelo menos um terço de todos os créditos por
ele abrangidos e que se comprometa a atingir o quórum exigido através de adesão expressa,
no prazo improrrogável de noventas dias, contados da data do pedido, sendo-lhe facultada
a conversão do procedimentos em Recuperação Judicial a pedido do devedor (art. 163,
§7o, LRF).
Se forem apresentadas impugnações ao plano, será ofertado o prazo de cinco dias
para o devedor se manifestar (art. 164, § 4o, LRF). Após o término de tal prazo, sobrevindo ou
não manifestação do devedor, os autos irão conclusos ao juiz, para que este, no prazo de
cinco dias, aprecie e decida acerca das eventuais impugnações, homologando o plano
sentença, se entender que este não implica prática de atos com a intenção de prejudicar
credores e que não há outras irregularidades que recomendem sua rejeição (art. 164, § 5 o,
LRF).
Caso haja comprovação de simulação de créditos ou vícios de representação dos
credores que assinaram o plano, sua homologação será indeferida (art. 164, § 6o, LRF). Da
sentença que homologa ou não o plano do devedor, cabe apelação sem efeito suspensivo
(art. 164, § 7o, LRF).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

6.9. Falência
O procedimento falimentar ocorre quando a crise econômico-financeira de uma em-
presa se torna invencível, ou seja, não se localizam mais possibilidades de recuperação para a
empresa. Outrossim, e como ocorre com os legitimados para a recuperação judicial, a falência é
destinada somente a empresários e sociedades empresárias, ou seja, é vedado o uso do
instituto para empresas públicas, sociedades de economia mista, instituições financeiras, entre
outras.
Importante referir que a falência é vista como uma execução coletiva concursal, haja
vista ser arrecadado o ativo do falido para ser realizado o pagamento dos credores, ou seja,
o pagamento do passivo. Além disso, são previstas punições aos atos considerados crimi-
nosos eventualmente praticados pelo falido.
Ademais e a se considerar o processo falimentar como uma execução coletiva concur-
sal, evidencia-se a submissão de todos os credores ao princípio do par conditio creditorum,
o qual indica a necessidade de ser concedido a todos os credores do devedor um tratamento
igualitário.
O art. 75 da LRF estabelece que, ao promover o afastamento do devedor de suas
atividades, a falência possui como objetivos: a) preservar e otimizar a utilização produtiva dos
bens, dos ativos e dos recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa; b) permitir a
liquidação célere das empresas inviáveis, com vistas à realocação eficiente de recursos na eco-
nomia; e c) fomentar o empreendedorismo, inclusive por meio da viabilização do retorno célere
do empreendedor falido à atividade econômica.
O instituto falimentar pressupõe a necessidade de formação do juízo universal. Neste
aspecto, cumpre ressaltar que a competência para a arrecadação de todos os bens e para a
suspensão das execuções individuais pertence a este juízo universal, objetivando-se, assim, ga-
rantir que todos os credores sejam submetidos ao processo falimentar, sendo classificados e
satisfeitos de acordo com a natureza de suas obrigações.
No que tange ao sujeito ativo da falência, temos que, conforme dispõe o art. 97 da LRF,
podem requerer a falência do devedor: a) o próprio devedor, neste caso se trata de uma
liquidação voluntária, chamada de autofalência; b) o cônjuge supérstite, herdeiros ou in-
ventariante do devedor, tratando-se de uma liquidação póstuma; c) o sócio cotista ou aci-
onista do devedor; e d) qualquer credor, se configurando em uma liquidação involuntária.
Em relação à resposta do devedor quanto ao pedido de decretação de sua falência, temos
que o prazo é de dez dias, de acordo com o art. 98 da LRF. Na contestação o devedor pode

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

alegar: a) a falsidade do título; b) a prescrição; c) a nulidade de obrigação ou de título; d) o


pagamento da dívida; e) qualquer outro fato que extinga ou suspenda obrigação ou não legitime
a cobrança de título; f) o vício em protesto ou em seu instrumento; g) a apresentação de pedido
de recuperação judicial no prazo da contestação, observados os requisitos do art. 51 da LRF; e
h) a cessação das atividades empresariais há mais de dois anos antes do pedido de falência,
comprovada por documento hábil do Registro Público de Empresas, o qual não prevalecerá con-
tra prova de exercício posterior ao ato registrado (art. 96, LRF).
O devedor pode, ainda, elidir a falência, ou seja, fazer depósito em juízo do valor da
dívida reclamada no pedido falimentar, sendo que o depósito deve ser acrescido de correção
monetária, juros e honorários advocatícios (art. 98, LRF). Nesta hipótese, não haverá a de-
cretação da falência do devedor, por expressa disposição legal. Contudo, caso o pedido venha
a ser procedente, o juiz irá ordenar o levantamento do valor pelo autor.
Já no que tange ao foro competente em que o pedido de decretação de falência deve ser
ajuizado, tem-se que é o foro do local do principal estabelecimento do devedor, ou seja, é o
mesmo da recuperação judicial. Assim, entende-se que deve ser onde a empresa possui maior
volume de negócios.
O art. 94 traz as hipóteses plausíveis para pedido de quebra. A impontualidade injusti-
ficada é a primeira hipótese hábil a elucidar o pedido de decretação da falência, na medida em
que a decretação da falência do devedor apenas pode ocorrer se este ficou inadimplente sem
relevante razão de direito. Cumpre ressaltar a previsão de requisitos indispensáveis para que o
título possa embasar o pedido: a) seja executivo – judicial ou extrajudicial; b) esteja protes-
tado; e c) represente dívida superior a quarenta salários mínimos. No que se refere ao último
requisito, há previsão expressa na LRF que permite a reunião de credores em litisconsórcio a
fim de alcançar o limite mínimo (art. 94, § 1 o, LRF).
A execução frustrada se traduz na segunda hipótese em que pode ser decretada a fa-
lência do devedor. Esta possibilidade se caracteriza pela tríplice omissão do devedor. Contudo,
é necessário que a petição inicial seja instruída com a apresentação de uma certidão emitida
pelo juízo onde se processe a execução (art. 94, § 2o, LRF), sendo prescindível o protesto
do título e sem a imposição de valor mínimo.
Por fim, têm-se os chamados atos de falência, que possuem disciplina – taxativa – no
rol do art. 94, III, de acordo com o já indicado. As referidas práticas, caso exercidas pelo devedor,
possuem o condão de ocasionar o requerimento e a decretação de sua falência.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

No que tange aos recursos cabíveis, da sentença que denega o pedido cabe apelação,
enquanto a decisão que decreta a falência é atacável por agravo de instrumento (art. 100,
LRF).
Neste sentido, o art. 99 da LRF estabelece o conteúdo que deve estar presente na sen-
tença que decretar a falência. Ademais, e a se considerar que a sentença que decreta a falên-
cia inicia o procedimento falimentar propriamente dito, esta é uma decisão interlocutória
especial, tendo em vista que se interlocuta entre a cognição e a execução. A natureza jurí-
dica dessa sentença é híbrida, sendo ao mesmo tempo constitutiva e declaratória. Possui
efeito ex nunc, ou seja, da constituição em diante, enquanto o decreto falimentar possui
efeito ex tunc, tendo em vista que será fixado o termo legal da falência em até noventa dias
anteriores ao seu pedido.
Assim, importante frisar que a fixação do termo legal da falência, conforme dispõe o
inciso II do art. 99, é importantíssima, haja vista ser a partir dessa fixação que se torna possível
determinar a presunção de fraude e a consequente ineficácia de certos atos praticados
pelo devedor. Este lapso temporal é conhecido como período suspeito.
Relativamente à determinação de suspensão das ações e execuções individuais movidas
em face do falido, salvo as ações que demandam quantias ilíquidas e as reclamatórias trabalhis-
tas, tem-se que, diferentemente do que ocorre na recuperação judicial, em que são suspensas
pelo prazo de cento e oitenta dias, na falência, a suspensão perdura por todo o processo
falimentar.
Em relação às execuções fiscais, tem-se que é competência do juízo da execução decidir
quanto ao valor do crédito, à exigibilidade e à existência, nos termos do art. 7 o-A, § 4o, II, LRF e,
a habilitação e classificação de tal crédito acontecerá no incidente processual previsto no caput
do art. 7o-A da LRF. Veja-se que as execuções fiscais ficarão suspensas até o fim do feito fali-
mentar, sendo possível seu prosseguimento em face dos corresponsáveis (art. 7 o-A, V, LRF).
Ademais, a decretação da falência inaugura o juízo universal, que é indivisível e com-
petente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, salvo
as ações trabalhistas, fiscais e as não reguladas na LRF, nas quais o falido figure como autor ou
litisconsorte ativo, de acordo com o previsto no art. 76 da LRF.
No mais, a decretação da quebra determina o vencimento antecipado das dívidas do
devedor, realizando o abatimento proporcional dos juros e a conversão dos créditos em moeda
estrangeira para a moeda brasileira, considerando o câmbio da data da decisão judicial (art. 77,
LRF). Isso ocorre, haja vista, a exigência de ser confeccionada a relação de credores.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Insta mencionar que, no caso de falência de concessionárias de serviços públicos, a que-


bra implica, de imediato, a extinção da concessão, de acordo com o preceituado pelo art. 195 da
LRF.
A decretação da falência acarreta a inabilitação empresarial do falido, que subsiste da
decretação da falência até a sentença que extinguir suas obrigações (art. 102, LRF). Já no
caso de o falido ser condenado por crime falimentar e essa condenação tenha o efeito espe-
cífico de inabilitação para o exercício de atividade empresarial, esta se manterá por até cinco
anos após a extinção da punibilidade (art. 181, § 1o, LRF).
A regra geral contida na legislação estabelece que os contratos bilaterais não se resol-
vem de imediato pela decretação da quebra, podendo ser cumpridos pelo administrador ju-
dicial (art. 117, LRF). O contratante pode entrar em contato com o administrador judicial, no
prazo de noventa dias contados a partir da assinatura do termo de compromisso do auxiliar,
para que, no prazo de dez dias, o administrador judicial declare se irá cumprir o contrato ou
não (art. 117, § 1o, LRF).
A partir da decretação da falência, a administração dos bens do falido passa a ser
atribuição do administrador judicial, que deve, após assinar o termo de compromisso, efetuar
a arrecadação dos bens e documentos e fazer a avaliação destes, onde eles se encontrarem.
A fim de realizar as medidas citadas, o AJ pode requerer ao juiz o que for necessário para tanto
(art. 108, LRF).
A arrecadação dos bens do falido pode atingir bens de terceiros que estejam em sua
posse na data da decretação da falência, sendo prevista, assim, a possibilidade de os titulares
de tais bens formularem pedidos de restituição. É o que preceitua o art. 85 da LRF. Exemplos
desse caso seriam os bens que estavam na posse do falido em virtude de contratos de alienação
fiduciária em garantia ou arrendamento mercantil.
Além disso, o parágrafo único do art. 85 da LRF prevê que também é possível o pedido
de restituição de bem que foi vendido a crédito ao falido e entregue a ele em até quinze
dias antes do pedido de falência, se ainda não alienado para terceiros.
Nesta senda, o art. 86 da LRF inteligência as possibilidades em que a restituição será
realizada em dinheiro. Ainda, o pedido de restituição deve ser fundamentado, individualizando,
de maneira específica, o bem reclamado, nos termos do art. 87 da LRF. Oportuno destacar que
tal pedido suspende a disponibilidade do bem até o trânsito em julgado da ação (art. 91,
LRF).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Caso o pedido de restituição seja julgado procedente, a entrega do bem ao reque-


rente deve ser realizada no prazo de quarenta e oito horas, sendo tal determinado na sen-
tença que o reconhecer (art. 88, LRF). No entanto, se a sentença negar a restituição, o reque-
rente poderá, se for o caso, ser incluído no quadro geral de credores da falida (art. 89, LRF).
Além disso, a sentença do pedido de restituição, seja ela procedente ou improcedente, é
atacável por apelação sem efeito suspensivo (art. 90, LRF). No mais, o interessado pode ajui-
zar embargos de terceiro, na eventualidade em que não se encaixar pedido de restituição (art.
93, LRF).
Evidencia-se, portanto, que o art. 129 da LRF dispõe um rol taxativo de situações que,
quando caracterizadas, o ato será objetivamente ineficaz. Além disso, e conforme disciplina o
parágrafo único do art. 129, a ineficácia do ato pode ser declarada de ofício pelo juiz, alegada
em defesa ou pleiteada em ação própria ou incidentalmente no curso do processo fali-
mentar. No entanto, o art. 131 prevê que, no caso de os atos referidos nos incisos I, II, III e VI
do caput do art. 129 terem sido previstos e realizados na forma definida no plano de recu-
peração judicial ou extrajudicial, eles não serão declarados ineficazes ou revogados.
Já o art. 130 da LRF prevê os casos em que, para a revogação dos atos praticados pelo
falido, é necessária a prova da intenção de prejudicar os credores, o conluio fraudulento
praticado entre o devedor e o terceiro com quem ele contratar e o efetivo prejuízo sofrido
pela massa falida. A ação própria para revogação de atos é chamada de ação revocatória, que
pode ter como o autor o administrador judicial, qualquer credor ou o Ministério Público, no prazo
de três anos contados da decretação da falência, nos termos do art. 132 da LRF.
A fase de realização do ativo é iniciada após a arrecadação dos bens do falido, se reali-
zando na alienação dos bens arrecadados (art. 139, LRF), com a finalidade de angariar valores
a fim de propiciar o pagamento dos credores. Sabe-se que, após o administrador judicial assinar
o termo de compromisso, o auxiliar possui o prazo de sessenta dias para apresentar o plano de
venda dos ativos, devendo realizá-lo em prazo não superior a cento e oitenta dias, contados da
juntada do auto de arrecadação.
As modalidades de venda dos bens do falido estão previstas no art. 140 da LRF, em ordem
de preferência, sendo elas: a) alienação da empresa, com a venda de seus estabelecimentos
em bloco; b) alienação da empresa, com a venda de suas filiais ou unidades produtivas isolada-
mente; c) alienação em bloco dos bens que integram cada um dos estabelecimentos do devedor;
ou d) alienação dos bens individualmente considerados. Além disso, o § 2o do referido diploma

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

legal dispõe que a venda dos bens pode iniciar antes mesmo da formação do Quadro Geral de
Credores.
A alienação do ativo ocorrerá sob uma das modalidades típicas preceituadas no art. 142
da LRF, sendo através de leilão eletrônico, presencial ou híbrido; processo competitivo or-
ganizado promovido por agente especializado e de reputação ilibada, cujo procedimento
deverá ser detalhado em relatório anexo ao plano de realização do ativo ou ao plano de
recuperação judicial, conforme o caso, ou qualquer outra modalidade, desde que aprovada
nos termos da LRF.
Como já exposto e a respeito da verificação e habilitação de créditos, temos que, já na
decisão que decreta a quebra do devedor, o juiz toma duas medidas importantes para tanto, o
fato de ordenar ao falido que apresente, no prazo máximo de cinco dias, a sua relação nominal
de credores e a explicação sobre o prazo para as habilitações de crédito.
De acordo com o já estudado, a classificação dos créditos ocorre a fim de possibilitar a
reunião de credores de acordo com a similaridade de seus créditos, objetivando tratamento idên-
tico perante a liquidação dos ativos no processo falimentar. Assim, objetiva-se atingir o princípio
do par conditio creditorum.
Antes de expor a classificação de créditos concursais, necessário abordar os chamados
créditos extraconcursais.
Os créditos extraconcursais referidos estão descritos no art. 84 da LRF, sendo eles: I-
A) as quantias referidas nos arts. 150 e 151 da LRF; I-B) o valor efetivamente entregue ao deve-
dor em recuperação judicial pelo financiador, em conformidade com o disposto na Seção IV-A
da LRF (dip financing); I-C) os créditos em dinheiro objeto de restituição, conforme previsto no
art. 86 da LRF; I-D) as remunerações devidas ao administrador judicial e aos seus auxiliares, os
reembolsos devidos a membros do comitê de credores, e os créditos derivados da legislação
trabalhista ou decorrentes de acidentes de trabalho relativos a serviços prestados após a decre-
tação da falência; I-E) as obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a
recuperação judicial, nos termos do art. 67 da LRF, ou após a decretação da falência; II) as
quantias fornecidas à massa falida pelos credores; III) as despesas com arrecadação, adminis-
tração, realização do ativo, distribuição do seu produto e custas do processo de falência; IV) as
custas judiciais relativas às ações e às execuções em que a massa falida tenha sido vencida; V)
os tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência, respeitada a or-
dem estabelecida no art. 83 da LRF.

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Direito Empresarial

Evidencia-se, assim, que os créditos extraconcursais são créditos que surgiram após
a decretação da falência, em decorrência dela. Sendo assim, são dívidas da própria massa
falida, e não do devedor falido. Neste sentido, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça
decidiu que os honorários advocatícios resultantes de trabalhos prestados à massa falida após
a decretação da quebra são classificados como créditos extraconcursais.
Após os pagamentos das restituições em dinheiro e dos créditos extraconcursais, inicia-
se o pagamento dos credores constantes no Quadro Geral de Credores, os chamados créditos
concursais, que seguem uma ordem de classificação legal.
Essa ordem de classificação legal é estabelecida no art. 83 da LRF, sendo ela: I – os
créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a cento e cinquenta salários mínimos por
credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho; II – os créditos gravados com direito real de
garantia até o limite do valor do bem gravado; III – os créditos tributários, independentemente da
sua natureza e do tempo de constituição, exceto os créditos extraconcursais e as multas tributá-
rias; IV – os créditos quirografários, a saber: a) aqueles não previstos nos demais incisos deste
artigo; b) os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao
seu pagamento; e c) os saldos dos créditos derivados da legislação trabalhista que excederem
o limite estabelecido no inciso i do caput deste artigo; V – as multas contratuais e as penas
pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, incluídas as multas tributárias; VI –
os créditos subordinados, a saber: a) os previstos em lei ou em contrato; e b) os créditos dos
sócios e dos administradores sem vínculo empregatício cuja contratação não tenha observado
as condições estritamente comutativas e as práticas de mercado; VII – os juros vencidos após a
decretação da falência, conforme previsto no art. 124 desta lei.
Ademais, indica-se que a Lei no 14.112/ 2020 excluiu da classificação de créditos con-
cursais os créditos com privilégio geral e com privilégio especial, incluindo-os nos crédi-
tos quirografários, conforme preceituado no § 6o do art. 83 da LRF.
Além disso, os créditos cedidos, a qualquer título, manterão sua natureza e classificação
(art. 83, § 5o, LRF).
A limitação de pagamento de até cento e cinquenta salários mínimos por trabalhador não
engloba os créditos decorrentes de acidente de trabalho, os quais concorrem como créditos pre-
ferenciais pela totalidade do seu valor.
Sobre créditos concursais, tem-se que os créditos devidos aos representantes comerciais
autônomos a título de comissões (art. 44 da Lei n o 4.886/1965), os créditos referentes a

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
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honorários advocatícios e quaisquer créditos que tenham natureza alimentar são créditos que
possuem equiparação à trabalhistas para fins de classificação na falência.
Os créditos com garantia real, até o limite do bem gravado, estão em segundo lugar na
ordem de classificação legal (art. 83, II, LRF). Necessário mencionar que o valor considerado do
bem objeto de garantia real é o arrecadado com a sua venda ou, no caso de venda em bloco, o
valor da sua avaliação individual (art. 83, § 1 o, LRF). Além disso, o § 2o do art. 83 da LRF inteli-
gência que, da massa falida, não são exigíveis os valores referentes ao direito de sócio ao rece-
bimento de sua parcela do capital social na liquidação da sociedade.
Os créditos tributários estão dispostos em terceiro lugar na ordem de classificação le-
gal, sem ter em conta sua natureza e tempo de constituição, com exceção das multas tributárias.
Já as multas tributárias são classificadas em sétimo lugar, juntamente com as outras penas
pecuniárias e multas contratuais.
Os créditos com privilégio especial e com privilégio geral eram classificados em quarto
e quinto lugar, respectivamente. Contudo, com a reforma da LRF, suas disposições foram re-
vogadas, fazendo parte, a partir de então, dos créditos quirografários.
Os créditos quirografários, que são os que não possuem nenhuma espécie de prefe-
rência ou garantia, estão em sexto lugar na ordem de classificação. Como exemplo de tais
créditos temos os decorrentes de obrigações contratuais ou cambiais não adimplidas.
Além disso, classificam-se como quirografários o saldo do crédito trabalhista ou equipa-
rado, excedente a cento e cinquenta salários-mínimos, e o saldo do crédito com garantia real,
cujos valores arrecadados com a alienação dos bens vinculados não tenham sido suficientes.
Ademais e conforme já mencionado, os créditos com privilégio geral ou especial passa-
ram a fazer parte dos créditos quirografários a partir da reforma da LRF.
As multas contratuais e tributárias e as penas pecuniárias por infração de leis penais
ou administrativas se encontram em sétimo lugar na ordem legal de classificação. Assim, ape-
sar de a LRF permitir a cobranças de tais penas à falida, sua classificação está abaixo dos cré-
ditos quirografários.
Os créditos subordinados, que são basicamente os créditos dos próprios sócios da fa-
lida, são classificados em oitavo lugar.
Por fim, os juros vencidos após a decretação da falência se classificam em nono lugar,
nos termos da previsão contida no art. 124 da LRF.
Como vimos, o objetivo do processo falimentar é a liquidação do ativo para o pagamento
do passivo.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Antes de iniciar o pagamento dos credores concursais descritos no quadro geral de cre-
dores, o administrador judicial tem que realizar alguns pagamentos com os recursos que possui
em caixa. Como exemplos deste caso, temos o que preceitua o art. 150 da LRF, que dispõe que
as despesas cujo pagamento antecipado seja indispensável à administração da falência,
inclusive na hipótese de continuação provisória das atividades, serão pagas pelo administrador
judicial com os recursos disponíveis em caixa, e o art. 151 da LRF, que preceitua que os créditos
trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos nos três meses anteriores à decre-
tação da falência, até o limite de cinco salários mínimos por trabalhador, serão pagos tão
logo haja disponibilidade em caixa. Percebe-se, portanto, que tais pagamentos devem ser re-
alizados a partir do momento em que se tenha disponibilidade de valores em caixa.
Além disso, também devem ser pagos, antes dos credores concursais, as restituições
em dinheiro deferidas pelo juiz e os créditos extraconcursais (art. 149, LRF).
O pagamento dos credores concursais, como estudado, deve observar a ordem legal de
classificação prevista no art. 83 da LRF.

7. Propriedade Industrial

Prof. Douglas Azevedo


@prof.douglasazevedo

Noções introdutórias importantes: propriedade intelectual é gênero dentro do qual en-


contram-se duas espécies: a propriedade industrial e o direito de autor. Nossa aula é somente
sobre propriedade industrial.
Outro aspecto fundamental consiste na ideia de função social da propriedade industrial,
previsto tanto no art. 5o, XXIX, da CF como no art. 2o da Lei de Propriedade Industrial (LPI).
Assim como os imóveis possuem função social – devem ser utilizados, por exemplo –, os bens
de propriedade industrial também devem ser utilizados sempre que pleiteados, pois trata-se de
uma ideia de desenvolvimento tecnológico e social de um país. Caso você seja um titular de
patente, deverá utilizá-la, atentando-se a sua função social e finalidade, sob pena de ter a titula-
ridade licenciada compulsoriamente (veremos tal ponto em breve).
Também é vital lembrar que, conforme o art. 5 o da LPI, os bens tutelados pela lei são
equiparados a coisas móveis. Assim, mesmo bens incorpóreos como marcas e patentes pos-
suem proteção especial e podem ser comercializados.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

7.1. Propriedade industrial: patentes


A patente consiste no direito temporário garantido pelo Estado ao titular para que possa
explorar economicamente um dos seguintes bens: invenção e modelo de utilidade. Em outras
palavras, quando você desenvolve um dos bens que a seguir iremos trabalhar, você possui um
determinado tempo para, exclusivamente, usufruir desta criação derivada do seu intelecto.
O art. 6o da LPI nos revela quem pode ser titular de uma patente (via de regra, o próprio
autor ou seus sucessores), já o art. 7 o nos introduz uma importante noção sobre a LPI: não
importa quem foi o primeiro a criar algo, o dono será aquele que primeiro buscar a concessão da
patente junto ao INPI – por isso, lembrem: a busca da patente é ato constitutivo do direito.
Os artigos subsequentes nos trazem o conceito de modelo de utilidade e os requisitos da
patente de invenção e de modelo de utilidade.
Invenção:
Art. 8o da Lei no 9.279/1996. É patenteável a invenção que atenda aos requisitos de
novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.

Modelo de utilidade:

Art. 9o da Lei no 9.279/1996. É patenteável como modelo de utilidade o objeto de uso


prático, ou parte deste, suscetível de aplicação industrial, que apresente nova forma ou
disposição, envolvendo ato inventivo, que resulte em melhoria funcional no seu uso ou
em sua fabricação.

Importante: requisitos da patenteabilidade.


1. Novidade, arts. 11 e 12;
2. Atividade inventiva, arts. 13 e 14;
3. Aplicação industrial, art. 15;
4. Ausência de impedimentos legais, art. 18.

Já o art. 10 nos ilustra o que não pode ser considerado uma invenção. São muitos
incisos, mas associem sempre a algo derivado da criatividade humana e com aplicação prática
na indústria. Por exemplo, descobrir algo é diferente de inventar algo. Na descoberta, o objeto já
existia. No ato de inventar, algo novo é criado. Obras artísticas são protegidas pela lei de direitos
autorais, e não pela LPI. Ainda, vale destacar que softwares independentes (aplicativos, por
exemplo) são protegidos pela Lei de Softwares, contudo, se estivermos falando de um software
acoplado em uma criação, esta poderá ser patenteada junto do software.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Após concedida, a patente vigorará por: 20 anos, se for invenção, e 15 anos, se for modelo
de utilidade. Importante atentar que o prazo passa a contar da data do depósito, ou seja,
do dia em que houve o encaminhamento do pedido ao INPI, e não da concessão.
Os direitos concedidos ao titular da patente encontram-se no art. 41 e subsequentes. Vi-
olação a estes direitos gerarão indenizações, que, conforme art. 44, retroagem à data da publi-
cação pelo INPI.

7.1.2. Contratos de licença


Temos três tipos de contratos de licença:

I – Voluntária (art. 61) – ato de vontade do autor da patente, que deseja, voluntariamente,
licenciar outrem para realizar a exploração. Tal ato deverá ser averbado junto ao INPI para
que produza efeitos – a contar de sua publicação. Caso a parte que esteja utilizando,
mediante licença, patente, venha a melhorá-la, tal melhoria lhe pertence (art. 63).
II – Por oferta (art. 64) – cuida-se de espécie de “leilão” – o titular da patente solicita ao
INPI que este a coloque em oferta para fins de exploração. Ou seja, o INPI anuncia a oferta
e em suas revistas no intuito de atrair interessados.
III – Compulsória (art. 68) – caso o titular exerça a patente de forma abusiva, ou pratique
abuso de poder econômico (decisão administrativa do CADE), poderá ter sua patente li-
cenciada de forma compulsória após decisão administrativa ou judicial. Isso significa que,
em virtude da má utilização da patente, o ente público permite que outras empresas a
utilizem, desde que preenchidos requisitos (legítimo interesse e capacidade de produção).
O titular não deixa de ser dono da patente, apenas perderá a exclusividade na exploração
econômica da mesma. O art. 69 apresenta as hipóteses de defesa daquele que está sendo
alvo de licenciamento compulsório:

Art. 69. Não haverá a concessão da licença compulsória caso o titular:


I – justificar o desuso por razões legítimas;
II – comprovar a realização de sérios e efetivos preparativos para a exploração; ou
III – justificar a falta de fabricação ou comercialização por obstáculo de ordem legal.

Fala-se, ainda, em licença compulsória nos casos do art. 70, se preenchidos alguns re-
quisitos cumulativamente:

I – ficar caracterizada situação de dependência de uma patente em relação a outra (aquela


cuja exploração depende obrigatoriamente da utilização de patente anterior. Imagine uma
invenção que é aplicada a uma linha de montagem recém-inventada – temos duas paten-
tes distintas, mas a primeira depende da segunda para funcionar);
II – o objeto da patente dependente constituir substancial progresso técnico em relação à
patente anterior; e
III – o titular não realizar acordo com o titular da patente dependente para exploração da
patente anterior.

Por fim, há a patente compulsória nos casos de emergência nacional ou interesse público
(art. 71).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

Nesses casos, se o titular não for capaz de suprir demanda emergencial (como uma epi-
demia, por exemplo), poderá haver a licença da patente de ofício – sem prejuízo dos direitos do
titular. Trata-se de medida temporária para suprir alguma questão emergencial.

7.1.3. Patente por empregado ou prestador de serviço


Temos, como regra apresentada pelo art. 88 da LPI, que as patentes desenvolvidas du-
rante a vigência do contrato de trabalho pertencem ao empregador. Isto porque é o empregador
quem fornece os meios e recursos pelos quais o empregado desenvolve a produção intelectual
que resultará na patente. A remuneração do empregado, nesses casos, é o próprio salário. Con-
tudo, é importante atentarmos para um detalhe, caso o empregado interrompa seu contrato de
trabalho:
Art. 88, § 2o. Salvo prova em contrário, consideram-se desenvolvidos na vigência do con-
trato a invenção ou o modelo de utilidade, cuja patente seja requerida pelo empregado até
1 (um) ano após a extinção do vínculo empregatício.

Ainda sobre a remuneração, o empregador poderá conceder ao empregado, autor do in-


vento, participação nos ganhos econômicos resultantes da exploração da patente. Tal participa-
ção, contudo, não conta como salário do empregado.
Já nas hipóteses em que o empregado desenvolver algo no seu âmbito particular, sem
utilização de recursos do empregador, a ele toca a propriedade da patente. Caso empregado e
empregador contribuam com recursos materiais, monetários, intelectuais etc., a patente perten-
cerá a ambos.

7.2. Propriedade industrial: patentes e desenho industrial


A característica de fundo do desenho industrial é a sua futilidade: a alteração não amplia
a utilidade do objeto, apenas o reveste de um aspecto diferente. Esse traço também aproxima o
desenho industrial da obra de arte, com a diferença de que o objeto revestido de desenho indus-
trial tem necessariamente função utilitária, ao contrário da arte, desprovida dessa função.
Os requisitos do desenho industrial são a novidade absoluta (art. 95), a originalidade (art.
97), a aplicação industrial (art. 95) e a legalidade (art. 100).
Já o prazo de proteção é diferente do da patente. Aqui, conforme art. 108, temos que o
período de proteção é de dez anos a contar da concessão, prorrogável por mais três períodos
de cinco anos, ou seja, o mínimo é dez anos e o máximo é vinte e cinco anos.

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7.3. Propriedade industrial: marca


Conceito: marca é o sinal distintivo visualmente perceptível. Ou seja, é o elemento visual
que serve para diferenciar um produto ou um serviço, facilitando muito a vida dos consumidores
que buscam estes produtos/serviços. No Brasil, os sinais sonoros não são suscetíveis de registro
como marca. O mesmo ocorre com características de cheiro, gosto ou tato de que se revestem
os produtos e os serviços.
Apenas podem ser registrados como marca no INPI os sinais visualmente perceptíveis.
Os signos não visuais são tutelados pela disciplina jurídica da concorrência, se sua usurpação
servir de meio fraudulento para desviar clientela.
1. Classificação das marcas:
a) Nominativas (compostas exclusivamente por palavras, sem apresentar particular
forma de letras);
b) Figurativas (consistentes de desenhos ou logotipos);
c) Mistas (palavras escritas com letras revestidas de uma particular forma, ou inseri-
das em logotipos).

Para fins jurídicos, qualquer que seja o tipo de marca, a proteção é idêntica.
2. Requisitos das marcas:
a) Novidade relativa: a marca precisa ser nova dentro da sua classe, quer dizer, seu
ramo de atividade. O INPI possui uma lista com diversos segmentos mercadológi-
cos e, ao fazer o registro, o titular deve especificar a qual classe o produto pertence.
Assim, a marca precisa ser novidade dentro daquela classe, sendo perfeitamente
possível marcas com o mesmo nome coexistirem, contanto que em segmentos dis-
tintos. Ex.: desinfetante VEJA e revista VEJA. Não há como haver confusão entre
os consumidores.
b) Não colidência com marca de alto renome ou notória: a marca não pode incidir
nas hipóteses previstas nos arts. 125 e 126 da LPI (veremos a seguir).
c) Ausência de impedimento legal: o art. 124 da LPI apresenta um rol de diversos
incisos apontando o que não é registrável como marca. A ideia central do artigo é,
por um lado, proteger o consumidor, que não pode ser enganado, e, em um segundo
momento, proteger o titular legítimo de marca e evitar que este seja prejudicado.
Assim, temos incisos versando, por exemplo, sobre a proibição da utilização de ban-
deiras na marca (o que passa a ideia de que o produto foi fabricado em outro país),

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bem como vedação de marcas muito semelhantes ou idênticas à marcas já registra-


das.

O que é uma marca de alto renome?

Art. 125. À marca registrada no Brasil considerada de alto renome será assegurada pro-
teção especial, em todos os ramos de atividade.

Sua eficiência e alcance extrapolam a marca originária (exorbitando o princípio da espe-


cialidade – proteção dentro de um ramo de atividade).
Para conseguir, requerer no INPI provando:
• Reconhecimento da marca por ampla parcela do público;
• Qualidade, reputação e prestígio dos produtos ou serviços;
• Grau de distintividade e exclusividade do sinal marcário.

O que é uma marca notoriamente conhecida?

Art. 126. A marca notoriamente conhecida em seu ramo de atividade nos termos do art.
6o bis (I), da Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial, goza
de proteção especial, independentemente de estar previamente depositada ou registrada
no Brasil.

Vigência da marca: o registro da marca vigorará pelo prazo de dez anos, contados da
data da concessão do registro, prorrogável por períodos iguais e sucessivos. Ou seja,
diferente dos outros bens da propriedade industrial, a marca pode, em tese, vigorar para sempre,
contanto que seja renovada a cada dez anos.

8. Lei Geral de proteção de Dados (LGPD)

A Lei Geral de Proteção de Dados (13.709/2018) surgiu no intuito de proteger, em espe-


cial, os direitos de privacidade, liberdade e livre desenvolvimento da pessoa física. Trata-se de
um marco muito relevante dentro do universo do direito empresarial, pois impõe a criação de
uma nova cultura organizacional aos empresários, visando à proteção dos dados pessoais de
todos os cidadãos.

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
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Para plena compreensão da lei e seus efeitos, é necessário conhecer alguns conceitos
importantes por ela introduzidos, como a diferença entre dados pessoais e dados pessoais sen-
síveis. O primeiro refere-se às informações relacionadas a pessoa natural que a tornam identifi-
cada ou identificável (RG, CPF, nome, endereço, etc.). O segundo, por sua vez, versa sobre os
dados que envolvem origem racial, étnica, convicção religiosa, condição de saúde, vida sexual e
afins, os quais exigem cuidados muito específicos, no intuito de proteger o titular de possíveis
condutas discriminatórias.
Outro importante conceito é o do tratamento de dados, que consiste em toda operação
realizada com dados pessoais, como as que se referem a coleta, produção, recepção, classifi-
cação, utilização, acesso, reprodução, transmissão, distribuição, processamento, arquivamento,
armazenamento, eliminação, avaliação ou controle da informação, modificação, comunicação,
transferência, difusão ou extração.
O tratamento é realizado conforme os princípios previstos na LGPD em seu artigo 6º. Entre
eles, cabe destacar o da finalidade, que dispõe sobre a necessidade do tratamento de dados
possuir um propósito legítimo e devidamente informado ao titular; necessidade, o qual impõe
uma limitação do tratamento ao mínimo necessário para a realização de suas finalidade e; trans-
parência, segundo o qual os titulares devem ter garantia de informações claras e precisas sobre
a realização do tratamento de seus dados pessoais.
Já o art. 7º da LGPD elenca as hipóteses nas quais o tratamento de dados poderá ocorrer.
Aqui cabe ressaltar a hipótese do consentimento, ou seja, o titular de dados precisa fornecer o
seu consentimento para que o mesmo seja tratado. Tal medida exige toda uma readequação nos
contratos firmados pelos empresários, bem como a adoção de medidas no âmbito digital para
que reste claro o consentimento fornecido pelo titular de dados.
Outra medida que exige adequação dos empresários vem prevista no art. 18, o qual des-
creve os direitos dos titulares de dados. Assim, todo titular têm o direito de obter do controlador
informações sobre a existência do tratamento de dados, possuir acesso aos seus dados pessoais
em tratamento e sua devida correção, caso incompletos ou desatualizados, assim como a sua
anonimização, bloqueio ou eliminação de dados.
Por fim, cabe mencionar os agentes de tratamento de dados previstos pela LGPD, a saber,
o controlador, o operador e o encarregado. O controlador é quem fornece as instruções acerca
do tratamento de dados, que são realizados pelo operador. Já o encarregado é alguém indicado
pelo controlador para atuar como canal de comunicação entre o controlador, os titulares de dados
e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

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1ª Fase | 41° Exame da OAB
Direito Empresarial

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