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CONSTITUCIONALISMO

1. CONCEITO

O constitucionalismo pode ser definido em dois sentidos, quais sejam:

a) SENTIDO AMPLO - refere-se à existência de uma constituição dentro do Estado (pouco


utilizado, pois todo Estado possui Constituição, mesmo que não seja escrita);

b) SENTIDO ESTRITO - refere-se à garantia de direitos e à limitação de poderes que


devem existir dentro de um Estado.

No sentido estrito, o constitucionalismo contrapõe-se ao absolutismo. Nas palavras de Karl


Loewenstein: “a história do constitucionalismo não é senão a busca pelo homem político das
limitações do poder absoluto exercido pelos detentores do poder, assim como o esforço de
estabelecer uma justificação espiritual, moral ou ética da autoridade, em vez da submissão cega à
facilidade da autoridade existente”.

O constitucionalismo está associado a três ideias básicas:

Garantia de direitos

Separação de poderes

Governo limitado

Canotilho: teoria (ou ideologia) que ergue o princípio do governo limitado indispensável à
garantia dos direitos em dimensão estruturante da organização político-social de uma comunidade.
Portanto, o constitucionalismo moderno representará uma técnica específica de limitação do
poder com fins garantísticos.

A seguir iremos analisar a evolução do constitucionalismo.

2. CONSTITUCIONALISMO ANTIGO

Sua principal característica é uma constituição baseada em costumes e em precedentes


judiciais (constituição costumeira). Não havia, até o final do séc. XVIII, constituições escritas –
apesar da existência de documentos escritos.

Apesar disso, é possível identificar a garantia de direitos e a separação de poderes, por isso
que se fala em constitucionalismo mesmo na antiguidade. Havia Supremacia do Parlamento e forte
influência religiosa.
MANIFESTAÇÕES
Constitucionalismo Primitivo
Marco inicial do constitucionalismo.
Há, pela primeira vez, a limitação do soberano. O Estado Hebreu era
ESTADO HEBREU
teocrático, assim os dogmas consagrados na bíblia eram vistos como
limitações ao governo.

Democracia constitucional, forma mais avançada de governo. Imperava


GRÉCIA
uma absoluta igualdade entre governantes e governados.
Experiência constitucional associada à ideia de liberdade.
Segundo Ihering, nunca em outra experiência jurídica a ideia de
ROMA
liberdade foi concebida de forma tão digna, tão correta como no direito
romano.
Constitucionalismo Medieval
“Rule of Law”, esta expressão é traduzida para o português não de forma
literal, a tradução é feita como “Governo das leis”, em substituição ao
“Governo dos homens”
Ideias: LIMITAÇÃO DO PODER ARBITRÁRIO e IGUALDADE (dos
cidadãos ingleses perante a lei).

A origem das Constituições teria fundamento na Carta Magna de 1215,


a Carta de João Sem-Terra. Consistia em um pacto entre o soberano e
seus súditos, em que o soberano renuncia a parcela do seu poder, que
era absoluto (vinha de Deus), em detrimento de seus súditos (ele havia
sido derrotado e estava falido, precisava de subsídio de seus barões e
INGLATERRA por isso esse acordo). Encontramos aqui súditos impondo ao seu
soberano uma limitação de poder. Não se pode considerar a Carta
Magna de 1215 como uma Constituição concreta, de fato e de direito,
isso porque, é claro, muita coisa ficou de fora para que pudesse ser
considerada uma CONSTITUIÇÃO, mas certamente foi um avanço.

Assim na idade média, em especial com a Magna Carta inglesa de 1215,


o constitucionalismo deslancha em direção à modernidade, ganhando
novos contornos. Há uma imposição do parlamento inglês de forma a
limitar, portanto, o poder do então soberano. A partir daí são elaborados
importantes documentos constitucionais: “Petition of Rights” de 1628;
“Habeas Corpus Act”, de 1679; “Bill of Rights”, de 1689, Act of
Settlement, de 1701, etc., todos com vistas a realizar o discurso do
movimento constitucionalista da época.

3. CONSTITUCIONALISMO CLÁSSICO (LIBERAL/MODERNO)

3.1. CONTEXTO E CARACTERÍSTICAS

O Constitucionalismo Moderno (Clássico ou Liberal) surge no final do Século XVIII.


Conforme ensina Dirley da Cunha Jr., “no constitucionalismo moderno a noção de constituição
envolve uma força capaz de limitar e vincular todos os órgãos do poder político. Por isso mesmo, a
Constituição é concebida como um documento escrito e rígido, manifestando-se como uma norma
suprema e fundamental, porque hierarquicamente superior a todas as outras, das quais constitui
o fundamento de validade que só pode ser alterado por procedimentos especiais e solenesprevistos
em seu próprio texto”.

Aqui, surgem noções de:

 Constituição Escrita;

 Constituição Formal;

 Constituição Rígida;

 Enfim, supremacia da Constituição.

Salienta-se que o principal valor pelo qual se lutava, naquele período, era a liberdade através
de uma limitação do poder do estado.

3.2. PRIMEIRA FASE: ESTADO DE DIREITO OU ESTADO LIBERAL

Compreende o período entre o surgimento das primeiras Constituições escritas até o fim da
1ª Guerra Mundial. Concretizou-se com as experiências do Rule of Law (Inglaterra), Rechtsstaa
(Rússia) e État Légal (França). No entanto, o Estado de Direito, como conhecido hoje, apenas
ocorreu com o fim do antigo regime e após as revoluções liberais - État du Droit = Verfassungsstaat

Características:

a) Abstencionista: é um Estado que não intervém nas relações sociais, econômicas e


laborais. É chamado de Estado Mínimo.

O Estado Mínimo preocupa-se apenas com a proteção contra invasões estrangeiras;


com a administração da justiça; com a implementação de bens e com as instituições que
não geram lucros.

b) Direitos fundamentais correspondem aos direitos da burguesia (liberdade e propriedade),


apenas no aspecto formal.

c) Limitação do soberano: a limitação do estado pelo direito estende-se ao soberano. Ou


seja, todos estão limitados pelo ordenamento jurídico, o soberano não está mais acima
da lei.
d) Princípio da legalidade: a atuação da administração pública depende de expressa
autorização legal. Considerada uma atividade sublegal.

É na primeira fase do constitucionalismo moderno que surgem os direitos de primeira


geração ou dimensão (forma mais correta), teoria desenvolvida por Karel Vazak (1979), difundida
por Norberto Bobbio mundialmente. No Brasil, seu expoente foi Paulo Bonavides, que ampliou as
gerações de direitos fundamentais.

DIREITOS DE PRIMEIRA GERAÇÃO:


 Consagravam os valores relacionados à liberdade.

 Abrangem os direitos civis e os direitos políticos.

Os direitos civis, também chamados de direitos de defesa, compreendem o direito à vida, o


direito à liberdade, o direito à igualdade e o direito à propriedade, como se percebe são os direitos
liberais clássicos. Possuem um caráter negativo, pois exigem do Estado uma abstenção (um não
fazer). Surgem para proteger o indivíduo contra o arbítrio do estado.

Os direitos políticos, também chamados de direitos de participação, permitem que o


indivíduo participe da vida do estado. Possui um aspecto positivo (realização de eleições) e negativo
(atendidos os requisitos, não pode o estado impedir a participação).

Obs.: todo direito fundamental possui aspecto negativo (abstenção por parte do Estado) e um
aspecto positivo (o Estado possui a obrigação de atuar), o que diferencia é o grau de cada aspecto.

3.3. SEGUNDA FASE: ESTADO SOCIAL

Fim da 1ª GM (1918) até o Fim da 2ª GM (1945).

Segundo Novelino, o liberalismo é um modelo ideal do Estado, para os casos em que não
há desigualdade social entre as pessoas, permitindo que cada um faça suas escolhas. Contudo,
havendo desigualdade gritante, não há como funcionar de forma correta, não há equilíbrio.

A segunda fase do constitucionalismo moderno surge a partir do esgotamento fático da


visão liberal, incapaz de atender as demandas por direitos sociais surgidas no fim do século XIX.
Quando se percebeu que apenas garantir a liberdade não era suficiente começaram a surgir uma
nova demanda de direitos. Os partidos socialistas e cristãos impõem às novas Constituições uma
preocupação com o econômico e com o social, fazendo com que essas Cartas Políticas inserissem
em seus textos direitos de cunho econômico e social. Os direitos de igualdade pressupõem a
liberdade (Paulo Bonavides).

Passaram, pois, as Constituições a configurar um novo modelo de Estado, então liberal e


passivo, agora social e intervencionista, conferindo-lhe tarefas, diretivas, programas e fins a
serem executados através de prestações positivas oferecidas à sociedade. A história, portanto,
testemunha a passagem do Estado liberal ao Estado social e, consequentemente, a metamorfose
da Constituição, de Constituição Garantia, Defensiva ou Liberal para Constituição Social, Dirigente,
Programática ou Constitutiva.

Tem como documentos principais a Constituição do México de 1917 e a de Weimar de 1919,


vindo a influenciar a Constituição brasileira de 1934 (Estado Social de Direito).

Características do Estado Social:

a) Intervencionista: o Estado Social é aquele que intervém em questões que eram deixadas
na esfera individual, tais como as questões econômicas, as questões sociais e as
questões laborais.

Obs.: Estado Social não se confunde com Estado Socialista, pois adere ao capitalismo.

b) Papel decisivo da produção e distribuição de bens: o Estado chama para si inúmeras


questões que ficavam restritas à esfera individual.

c) Garantia de bem-estar mínimo: preocupa-se em garantir mínimas condições de vida


digna. Pode ser relacionado ao mínimo existencial.

Como exemplo, dessa garantia de mínimo bem-estar podemos citar o benefício de prestação
continuada, previsto na LOAS. Este benefício é assegurado independentemente de contribuição,
ou seja, não se exige que a pessoa seja segurada do INSS. Assim, mesmo que nunca tenha
contribuído, tratando-se de pessoa com deficiência (sem condições de exercer atividade laborativa)
ou pessoa com mais de 65 anos, desde que possua renda inferior a ¼ do salário-mínimo, receberá
do Governo o benefício de um salário-mínimo, visando a garantia de uma vida digna. (Veja que no
estado liberal não há essa preocupação).

Nesta fase, surgem os direitos de segunda geração ou de segunda dimensão.

Obs.: A palavra geração dá a ideia de que uma substitui a outra. Ou seja, a primeira geração foi
substituída pela segunda geração, sendo esta substituída pela terceira e, assim, sucessivamente.
Tal ideia é errada, pois os direitos fundamentais não são substituídos por outras gerações, irão
coexistir. Por isso, alguns autores afirmam que o correto é usar a expressão dimensão, garantindo
a coexistência entre todos

DIREITOS DE SEGUNDA GERAÇÃO:

Marco histórico: Revolução industrial (Século XIX).

Possui como principal valor a igualdade. Não se trata de igualdade formal (tratamento
igualitário da lei para com todos), que já havia sido consagrada nas revoluções liberais. A igualdade
aqui é a material, ou seja, atuação do Estado para igualar os cidadãos, dada a crescente
desigualdade social existente à época.

Abrangem os direitos sociais, econômicos e culturais. Exigem uma ação do estado, uma
prestação positiva. Por isso, são considerados direitos prestacionais. São direitos
essencialmente coletivos.

Em suma:
 Direitos sociais, econômicos e culturais.

 São direitos prestacionais (Direitos de Prestação – status positivus ou status


civitatis), ou seja, exigem prestações do Estado. Tanto prestações jurídicas
quanto prestações materiais. Caráter positivo. Exigem atuação estatal.

 São essencialmente direitos coletivos.

 Surgimento de Garantias institucionais: garantias dadas não aos indivíduos,


mas às instituições. É elevada a importância de certas instituições. Exemplo:
família, imprensa livre, funcionalismo público.

Ex.: limitações ao capital, direitos à assistência social, à saúde, à educação, ao trabalho, ao


lazer etc.

Mesmo com essas duas gerações, percebeu-se que não havia suficiente proteção do
homem. Isso porque se constatou que existiam direitos que não são individuais, mas são de grupos,
e que igualmente reclamavam proteção, uma vez que a ofensa a eles acabaria por inviabilizar o
exercício dos direitos individuais já garantidos anteriormente. Surge a nova dimensão (3ª:
fraternidade, ver abaixo).

Obs.’’: A CF/88 ordena e sistematiza a atuação estatal interventiva para conformar a ordem
socioeconômica. É o arbítrio conformador a que se refere Ernest Forsthoff, pelo qual o Estado,
dentro de certos limites estabelecidos pela ordem jurídica, exerce uma ação modificadora de direitos
e relações jurídicas dirigidas à totalidade, ou a uma parte considerável da ordem social.

4. CONSTITUCIONALISMO CONTEMPORÂNEO

4.1. ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO/ESTADO CONSTITUCIONAL DE DIREITO

O Estado Democrático de Direito sintetiza as conquistas dos Estados Liberal e Social e tenta
superar suas deficiências. Prega a conexão entre a democracia e o Estado de Direito, o poder deve
ser organizado e exercido em termos democráticos.

É também denominado de Estado Constitucional Democrático, frisando o caráter


normativo da Constituição. O princípio da soberania popular é a viga mestra deste modelo de
estado, para que o estado seja democrático as normas devem ser elaboradas pelos representantes
do povo.

Características

a) Preocupação com a efetividade dos direitos fundamentais. Ou seja, confere-se uma


dimensão material a tais direitos.

b) A limitação do poder legislativo: abrange tanto o aspecto formal (processo de


elaboração) quanto o material (valores, conteúdo). Ex.: Controle de Constitucionalidade
do conteúdo das EC.

c) Democracia substancial: significa a proteção dos direitos das minorias. Não restringe a
democracia à vontade das maiorias.
4.2. DIREITOS DE TERCEIRA DIMENSÃO: (FRATERNIDADE)

Consagram os valores de fraternidade, solidariedade.

Trata-se de direitos transindividuais (tanto individuais como coletivos) São os seguintes


direitos:
 Autodeterminação dos povos.
 Progresso ou desenvolvimento.
 Direito ao meio ambiente.
 Direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade.
 Direito de comunicação.

OBS: Classificação nova do Prof. Paulo Bonavides, ele mudou o entendimento, no sentido de ser
a paz um direito de 5ª dimensão e não de 3ª (como sustentava até então).

Outros autores: consumidor, criança e idosos.


Conclusão que chegaram: Não adianta cada indivíduo ter seus direitos protegidos, pois
existem direitos coletivos que se forem violados acarretam a inviabilização de todos os demais
direitos.

4.3. DIREITOS DE QUARTA DIMENSÃO (PLURALIDADE)

“Pluralidade” (direito das minorias – Paulo Bonavides). Teríamos aqui:

a) Direito à democracia

A democracia não estaria elencada nos direitos políticos (1ª dimensão)? Hoje, a democracia
é vista em sentido material/substancial: fruição de direitos fundamentais básicos por todos,inclusive
pelas minorias (contrário da democracia em sentido formal = vontade das maiorias).

Consagra-se o sufrágio universal, bem como determinados mecanismos de participação


popular.

b) Direito à informação

Abrange três aspectos:

- Direito a informar

- Direito de se informar

- Direito de ser informado

c) Pluralismo

Art. 1º, V da CF – fundamento da República Federativa do Brasil, faz parte da estrutura do


Estado.

Pluralismo político é muito mais amplo do que o “pluralismo político partidário”, ele abrange
o pluralismo artístico, religioso, político partidário, cultural e de orientações (inclusive sexuais).

Obs.: Igualdade está diretamente ligada ao pluralismo. “Temos o direito de ser iguais quando a
diferença nos inferioriza, mas temos o direito de sermos diferentes quando a igualdade nos
descaracteriza.”

Salienta-se que é importante diferenciar fundamentos, objetivos fundamentais e princípios


que regerem o Brasil em suas relações internacionais.

PRINCÍPIOS QUE REGEM


OBJETIVOS
FUNDAMENTOS AS RELAÇÕES
FUNDAMENTAIS
INTERNACIONAIS
Art. 1º da CF Art. 3º da CF Art. 4º da CF
Referem-se ao modo como o
São as metas a serem Brasil irá agir em sua relação
buscadas pelos poderes com outros países:
públicos: - independência nacional;
- Construir uma sociedade - prevalência dos direitos
Compõem a estrutura do
justa e solidária humanos;
Estado, são eles:
- Garantir o desenvolvimento - autodeterminação dos
- Cidadania
nacional povos;
- Soberania
- Erradicar a pobreza e a -não-intervenção;
- Dignidade da Pessoa
marginalização igualdade entre os Estados;
Humana
- Reduzir as desigualdades - defesa da paz;
- Valores sociais do trabalho e
sociais - solução pacífica dos
da livre iniciativa
- Promover o bem de todos, conflitos;
- Pluralismo político - repúdio ao terrorismo e ao
sem preconceitos de origem,
raça, sexo, cor, idade e racismo;
quaisquer outras formas de - cooperação entre os povos
discriminação para o progresso da
humanidade;
- concessão de asilo político.

Obs.: Parte da doutrina aponta ainda como direitos de quarta geração os direitos relacionados à
biotecnologia e à bioengenharia e identificação genética do indivíduo. Não há um consenso a partir
da terceira geração.

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